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4. O officio da junta provisional da ilha do Principe que em substancia não contem mais do que a participação da sua installação em 8 de Julho de 1821, e dando como razão de não mandar uma deputação com aquella noticia, o não ter algum navio portuguez, e por essa mesma razão mandava aquelle officio por via de Inglaterra: tem cessado a necessidade de tomar este officio em consideração pelo que se tem decretado e providenciado a respeito das provincia ultramarinas.
5. O requerimento dos bachareis, que pertendem entrar no serviço da magistratura: pois está decidido, quaes deve ser as bases, que o conselho de Estado deve adoptar para as propostas, pelas resoluções tomadas nas sessões de 30 de Julho.
6. O requerimento do juiz de fóra do civil de Santarem, a pedir a reunião do seu lugar com o do juiz dos órfãos: porque já está decidido em geral, que lugares de magistrados devem haver.
Paço das Cortes 1 de Agosto de 1822. - José Antonio de Faria Carvalho; Bento Pereira do Carmo; Luiz Nicolao Fagundes Varella.
Deu o Sr. Presidente para a ordem do dia a continuação do projecto de hoje n.° 198, e o projecto n.° 220: e para a prolongação pareceres de Commissão e fechou-se a sessão depois das duas horas da tarde. - Francisco Xavier Soares de Azevedo, Deputado Secretario.

RESOLUÇÕES E ORDENS DAS CORTES.

Para Filippe Ferreira de Araujo e Castro.

Illustrissimo e Excelentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza mandão remetter ao Governo a informação incluza do reverendo Bispo reformador reitor da universidade, datada em 20 de Abril deste anno, e mais papeis juntos relativos ao requerimento do doutor Joaquim Xavier da Silva, sobre os quaes se tomou em Cortes a resolução de Julho proximo passado.
Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em o 1.º de Agosto de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Redactor - Velho.

SESSÃO DE 2 DE AGOSTO.

ABERTA a sessão, sob a presidencia do Sr. Freire, leu-se a acta da antecedente que foi approvada.
Mandou-se lançar na acta a seguinte declaração de voto, que fez o Sr. Peixoto, e a qual tambem assignou o Sr. Moura Coutinho: «Na sessão de ontem fui de voto que não se impetrasse bulla para a secularização das freiras: depois de vencido, votei pela clausula de terem familia honesta que as recebessem em sua casa, e estabelecimento de rendimento vitalicio sufficiente para subsistirem decentemente sem differencia de idade.»
Tambem se mandou lançar outra declaração assignada pelos Senhores Mesquita Pimentel, Corrêa de Seabra, Martins Ramos, Corrêa Telles, Gouvêa Durão, Vaz Velho, Bispo de Castello Branco, Ribeiro Teixeira, Gouvêa Ozorio, Ribeiro da Silva, Assis Barbosa, e Van Zeller, nos termos seguintes: «Na sessão de ontem fomos de voto, que os ordinarios só devião autorisar a secularisação das freiras que tivessem pais, parentes, ou familias honestas, com quem podessem viver em recato, e outro sim meios sufficientes de viver no seculo com decencia.»
O Sr. Secretario Felgueiras, dando conta do expediente, mencionou os seguintes officios:
1.º Do Ministro dos negocios do Reino, acompanhando uma consulta, em que o senado da camara de Lisboa representa, que tendo comparado o numero dos desemborgadores da casa da supplicação, minitros dos bairros em exercicio, e vereadores, com o dos presidentes necessarios para as assembleas eleitoraes dos Deputados, a cuja divsão procedêra em virtude da portaria de 27 de Julho proximo passado, viera no conhecimento de que aquelles não erão bastantes para preencherem as presidencias, faltando ainda dez, que se poderião supprir com o ouvidor da alfandega, juiz de India e Mina, alguns super intendentes de decimas, auditores, e mesmo corregidores do civel; da cidade, se o soberano Congresso assim se dignasse resolver com a urgencia que a naturesa do negocio recommenda. Julgou-se urgente a decisão desta consulta, e sendo offerecida á votação, resolveu-se na fórma della,
2.° Do mesmo Ministro, remettendo em virtude d'uma ordem de 13 de Julho ultimo, as copias das bullas, e breves declarados nos officios do visconde de Azurara de 24, e 29 do dito mez, com a do alvará de 3 de Julho de 1806,
3.° Do Ministro dos negocios da justiça, transmittindo as respostas do prior presidente da collegiada de Nossa Senhora da Misericordia da villa d'Ourem, e do thesoureiro mor da de Nossa Senhora da Oliveira de Guimarães, aos quesitos que lhes forão feitos, em execução da ordem das Cortes de 6 de Julho ultimo. Passou á Commissão ecclesiastica de reforma.
4.° Do mesmo Ministro, enviando a resposta do chantre da collegiada de Santo Estevão da villa de Valença do Minho. Passou á mesma Commissão.
5.° Do Ministro dos negocios da fazenda, remettendo, em cumprimento da ordem das Cortes de 22 de Julho ultimo, a copia do registo das duas consultas, em que os negocios do conselheiro José Maria Dantas, e D. Victorina Isidora Amalia forão resolvidos com a contradicção sobre que elle Ministro dá explicações. Passou á Commissão de fazenda.
6.° Do Ministro da guerra, transmittindo informações e documentos relativos a um requerimento do tenente coronel de cavallaria, addido ao estado maior do Brazil, Francisco Ignacio Pessoa de Mello. Passou á Commissão de guerra.
7.° Do Ministro dos negocios estrangeiros, con-

TOMO VII. C

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cebido nestes termos: - Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. "Depois ter feito subir á presença das Cortes Geraes e Extraordinarias, pelo officio que tive a honra de dirigir a V. Exca. na data de 24 do Dezembro de 1821, as imperfeitas policias, que até áquella época tinhão chegado ao conhecimento do Governo de Sua Magestade, da maneira por que o general Barão da Laguna, havia dado cumprimento ás ordens que de Rio de Janeiro lhe forão expedidas em 16 de Abril do anno proximo passado, a fim de fazer, com que os povos da banda oriental do rio da Prata manifestassem da maneira a mais franca, e livre de toda a apparencia de constrangimento, ou suggestão da nossa parte, a fórma do governo que querião adoptar; e constando então apenas, pela remessa feita pela mesmo Barão de Laguna, do auto de incorporação daquella província aos Estados portuguesas acordado pela assembléa, que elle segurava representar legitimamente, e o mais conformemente possível ás instrucções que recebêra da corte do Rio de Janeiro, os povos cisplatinos; não restava ao Governo outro partido, senão o de expedir ordens ao dito general para que mais circunstanciadamente expozesse a maneira como neste tão importante negocio se havia procedido, a fim de por este modo se conhecer até que ponto erão infundadas: como Sua Magestade esperava se depreendesse da sua franca exposição as a acusações de se haver procurado suspender a desejada incorporação, já por uma illegal composição do Congresso, que Sua Magestade havia mandado juntar, já pela maneira irregular com que se dizia haver-se procedido na emissão da vontade dos povos."
"O Governo acaba de receber a resposta do general a estas tão positivas ordens no officio, que como transcrito autentico, das actas da assembléa cisplatina, e o auto da incorporação impresso, passo ás mãos. de V. Exca. para ser presente ao soberano Congresso.
"Abstendo-me de fazer sobre o intrinseco merecimento destes papeis as reflexões que se oferecerão na discussão que as Cortes Geraes, e Extraordinarias houverem de instituir, he do meu dever participar a V. Exca. que o Governo, na presença destes esclarecimentos só tem convencido de que o general Barão de Laguna faltou em todos os pontos á letra, e ao espirito das ordens, e instrucções que lhe havião sido transmittidas, e que com o meu officio de 24 de Dezembro de 1821 se achão affectas á consideração do soberano Congresso.
Deu-se-lhe ordem para convocar um Congresso de Deputados eleitos com poderes ad hoc, por aquelles povos, e debaixo dos princípios expressos nas instrucções por que se tinhão escolhido os deste soberano Congresso. O general, bem longe de se conformar com esta ordem, convocou empregados da governança dos differentes lugares da província, naturalmente dependentes do Governo portuguez, e alguns delles ainda recentemente agraciados por Sua Magestade, com varias condecorações das suas ordens militares.
Estes homens unicamente em numero de dezeseis, não se chegando mesmo a completar o de dezoito que o general arbitrariamente orçou serem sufficientes para exprimirem a vontade dos povos, não só não trazião instrucções algumas dos seus suppostos constituintes; mas nem por hypothese se póde admittir serem virtualmente com missionados para este tão grave, e tão extraordinario assunto, porque uns os alcaldes o erão unicamente para o governo administrativo, e os outros os syndicos para a inspecção fiscal da administração ordinaria de fazenda, e justiça. Os povos, dizião os Deputados Perez, e Galegos na segunda sessão, não nos derão poderes para este assunto, pois que a maior parte até ignora que se trata de tal.
"Affirma o general no seu officio numero 274, e acha-se inserido por fórma do observação no auto de incorporações, que as condicções de incorporação forão redigidas em conformidade das instrucções particulares, que os Deputados da Assembléa receberão das respectivas camaras, que depois de ouvirem os povos dos seus districtos, approvárão em suas respostas a incorporação, que pelos mesmos Deputados lhes havia sido participada. Mas a simples leitura das actas demostra o contrario desta asserção.
"Decretada a incorporação em consequencia das deliberações dos dias 16 a 19 de Julho, procedeu-se nas seguintes quatro sessões a discutir as condições, de que consta o auto, e nem nos sete dias que esta discussão durou, nem nos doze que decorrêrão até a dissolução da assembléa, chegárão mais respostas que as das camaras de Monviedo, e Guadalupe, e essas bem longe de consultarem o parecer dos respectivos povos, ou de darem aos seus deputados as instrucções particulares, que o general assevera, declarão que apenas tiverão tempo para accusar as participações recebidas, e se louvão inteiramente no que a assembléa fizer.
"A assembléa forçada pela intima convicção da sua incompetencia, quiz supprir ao defeito insanavel da falta de expressão da vontade dos povos, fazendo apresentar em sessão duas supplicas dirigidas era 1815 pela camara de Montevideo no acto da entrada do exercito portuguez, e em 1819 pelas de S. José, e Canelones, pedindo a Sua Magestade a incorporação daquella provincia ao Reino do Brazil. Mas bem longe destes actos poderem supprir é, livre enunciação da vontade dos povos da província, como fôra ordenado ao general, o tempo e circunstancias em que aquellas supplicas se dirigirão no throno, e a incompetencia das camaras, que as dirigirão, como se fossem orgãos da vontade geral da provincia, tudo isto demonstra a insuficiencia da assembléa convocada pelo general para nada resolver sobre um assumpto que não fora autorizada, e muito menos instruída para tratar, em nome, e de accordo com a effectiva vontade da Nação."
"Por tanto não sómente he nullo, illegal, e diametralmente contrario á letra e ao espirito das instrucções, quanto o general praticara na execução das ordens, que havia recebido, mas até he contradictoria com o que consta das actas da assembléa, a asseveração dellas terem procedido na conformidade das instrucções

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particulares, que os Deputados havião recebido dos povos: ao mesmo tempo que nem as recebêrão como fica demonstrado, nem era possível receberem-nas em tão vasta província, e aonde a população se acha espalhada a enormes distancias uns dos outros, no curto espaço de quinze dias que decorrêrão desde a participação feita ás camaras até á effectiva dissolução da assembléa."
"Assim inteirado V. Exc. tanto das ordens expedidas ao general barão de Laguna, como do modo irregular, porque ellas forão executadas, se servirá de levar tudo ao conhecimento das Cortes Geraes e Extraordinarias, a fim de se poder tomar em consideração nas deliberações que se achão pendentes sobre este importantíssimo assumpto."
Deus guarde a V. Exca. Secretaria de Estado dos negocios estrangeiros em 31 de Julho de 1822. - Illustrissimo e Excellentissimo Senhor João Baptista Felgueiras. - Silvestre Pinheiro Ferreira.
Terminada a leitura deste officio, disse
O Sr. Gyrão: - Sr. Presidente, eu desejava que V. Exca. convidasse a Commissão diplomatica para que com a maior urgencia apresentasse o seu parecer a este respeito, pois he materia muito importante que se deve decidir, porque a indecisão fica mal á Nação portugueza. Deve-se tomar uma deliberação para que conste á Hespanha, e a todas as nações da Europa; e bom seria que fosse antes de partirem os navios que vão a sair para a America.
O Sr. Presidente: - Esse negocio já está encarregado á Commissão com urgencia; e se se tem demorado, será sem duvida por dificuldades que tenha achado a Commissão.
O Sr. Miranda: - Algumas informações que se esperão, e se pedirão ao Governo, são as unicas difficuldades que ha. O parecer está quasi pronto, mas sem aquellas informações a que he necessario attender, não he possível apresentalo.
O Sr. Presidente: - Vê-se bem que esta he uma dificuldade real, e que não ha mais nada a dizer á Commissão.
Continuando o Sr. Secretario Felgueiras a dar conta do expediente, mencionou uma felicitação de Villa Nogueira de Azeitão, de que se mandou fazer menção honrosa: uma memoria historica e militar offerecida por Manoel Joaquim Brandão de Sousa, que se remetteu á Commissão militar: uma carta do Sr. Deputado Bettencourt, pedindo um mez de licença, que lhe foi concedida: e outra igual do Sr. Deputado Salema, a quem tambem se concedeu um mez de licença.
O Sr. Barata mandou para a mesa uma representação de varios cidadãos do Maranhão sobre desordens ali acontecidas, a qual fôra enviada ao Sr. Deputado Lino Coutinho, que por estar doente a encarregára o sobredito Sr. Passou á Commissão de petições.
A' mesma Commissão se mandou passar um requerimento, que apresentou o Sr. Castello Branco, de varios officiaes da guarnição de Lisboa, pedindo que se lhes conserve um ecrivão privativo, já que se lhes tirou o privilegio de fóro.
O Sr. Martins Basto, por parte da Commissão encarregada de apresentar os artigos addicionaes á Constituição, leu o seguinte

PROJECTO.

A Commissão encarregada dos artigos addicionaes á Constituição para o Brazil, tendo apresentado em 15 de Junho deste anno o seu parecer sobre a fórma do governo, que julgou mais conforme com a vontade daquelles povos, foi mandada propor outro, por ter sido reprovado aquelle, devendo neste cingir-se ás duas bases vencidas na sessão de 6 de Julho; e segundo ellas offerece o projecto seguinte:
1.° Haverá no reino do Brazil uma delegação do poder executivo, á qual ficarão sujeitas todas as provincias daquelle reino será intitulada Regencia do Reino do Brazil, terá o tratamento de magestade; residirá na parte mais conveniente do Brazil, que a lei designar.
2.° A regencia será composta de sete membros, os quaes serão encolhidos pelo liei, bem como três substitutos, que serão chamados a supprir a falta daquelles, segundo a ordem em que forem designados por ElRei.
3.° Para ter lugar aquella escolha, cada uma das províncias, quando proceder á eleição dos membros das juntas provinciaes, nomeará, além daquelles que hão de compotas, mais um para a regencia, decidindo a sorte no caso de empate, e podendo ser reeleito.
4.° Os nomes dos eleitos para a regencia serão remettidos a ElRei, e a escolha destes será feita de modo que a regencia não tenha a compor-se toda de membros das províncias do Norte, ou do Sul, mas sim de uns, e outros.
O presidente, e vice presidente da regencia serão eleitos pelos mesmos membros, de entre elles.
6.° Terá a regencia tres secretarios de Estado, um dos negocios do reino e fazenda, outro dos de marinha e guerra, outro dos de justiça e ecclesiasticos; o por cada um destes serão referendados os negocios, que lhe compelirem, e expedidos em nome do Rei.
7.° Os secretarios de Estado serão propostos a ElRei pela regencia, em lista tripla, da qual elle escolherá um.
8.° Serão suspensos (no caso de prevaricação) pela regencia, a qual nomeará interinamente outros, dando parte a ElRei; e tanto a regencia, como os seus secretarios, serão responsáveis a ElRei.
9.° Haverá no reino do Brazil um tribunal supremo de justiça; terá as mesmas attribuições que o do reino de Portugal e Algarve; exercerá as suas funções no mesmo lugar, em que residir a regencia.
10. A regencia do reino do Brazil não poderá
11. Apresentar para os arcebispados, e bispados, para cujo provimento porem deverá mandar listas triplas, referendadas pelo secretario de Estado da repartição, dos que foram mais idoneos, para ElRei escolher um.
2.° Prover os lugares do tribunal supremo de justiça.
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3.° Prover os postos de tenente general, e os superiores a estes.
4.° Nomear embaixadores, consules, e mais agentes diplomaticos, e fazer tratados políticos e commerciaes com os estrangeiros, declarar guerra offensiva, e fazer a paz.
5.° Conceder titulos, nem ainda em recompensa de serviços, bem como alguma outra mercê, cuja applicação não esteja determinada por lei. Paço das Cortes 30 de Julho de 1822. - Luiz Martins Basto; João Fortunato Ramos dos Santos; Joaquim Antonio Vieira Belford; Francisco Villela Barbosa.
Mandou-se imprimir com urgencia para entrar em discussão.
Feita a chamada, achárão-se presentes 121 Deputados, faltando com licença os Srs. André da Ponte, Bueno, Arcebispo da Bahia, Sepulveda, Bispo do Pará, Macedo, Lyra, Moniz Tavares, Xavier Monteiro, Costa Brandão, Pinto e Castro, Queiroz, Ferreira da Silva, Belford, Faria, Moura, Lino Coutinho, Isidoro dos Santos, Pamplona, Manoel do Nascimento, Zefyrino dos Santos, Marcos Antonio, Vergueiro, Bandeira, Salema, Silva Corrêa, Feijó; e sem causa reconhecida os Srs. Gomes Ferrão, Aguiar Pires, Baeta, Sousa e Almeida.
Passando-se á ordem do dia continuou a discussão do projecto n.º 198 sobre a secularização dos regulares. (V. a sessão de 19 de Novembro, pag. 3144.)
Lido o artigo 3.°, disse
O Sr. Corrêa de Seabra: - Propõe-se neste artigo que se impetre de S. Santidade a bulla para a secularização dos regulares com a clausula de que os religiosos que permanecerem nos claustros possão ser providos por concurso em quaesquer beneficios; isto he, que o clero regular esteja habilitado para concorrer no provimento dos beneficios com o clero secular. Não sou de opinião que se faça tal dispensa, porque esta habilitação do clero secular por meio da dispensa offende o direito adquirido pelo clero secular de ser provido nos beneficios, com exclusão do clero regular. Este direito he estabelecido nas leis canonicas, e bem sabida aquella notavel regra: secularia, sacularibus; regularia, regularibus. Este direito he sanccionado no concilio de Trento com extenção aos translatos para aquellas ordens regulares que tem por privilegio a dispensa desta lei que inhabilita para o provimento dos beneficios aos regulares. Este direito do clero secular he formalmente reconhecido na nossa, legislação que prohibe mesmo nos egressos o provimento das capelanias, fazendo sobre isto uma recommendação especial aos provedores. Se pois a nossa legislação nem no provimento de capelanias admitte egressos a fortiori, reconhece o direito que tem o clero secular de ser provido com exclusão do regular em quaesquer benefícios. Nem se diga que para isto se pede a dispensa, porque a não póde haver contra direitos adquiridos como he trivial em toda a legislação, e por consequencia só poderia ter lugar esta dispensa quando o pedisse o bem geral da Igreja, o bem geral da sociedade civil, mas por aqui se não verifica este nocivo, e por isso em geral sou de opinião contraria ao que se propõe neste projecto: não o assignei, mas offereci com o preclarissimo membro da Commissão o Sr. Bispo de Béja o projecto n.° 198 A.
O Sr. Borges Carneiro: - O illustre preopinante se oppõe ao artigo, por offender o direito adquirido que os clerigos tem nos benefícios; querendo por consequencia fiquem delles excluídos os frades. Eu pelo contrario não considero os benefícios ecclesiasticos como um posto, porém como um encargo. Não devemos olhar no beneficio a prebenda, quero dizer, os rendimentos temporaes e mundanos, sim o officio sagrado ou o serviço da igreja. Esta he a parte principal do beneficio; a prebenda ou fructos não he senão o meio de sustentação do que trabalha na vinha do Senhor. Ora na vinha do Senhor tanto devem e podem trabalhar os clerigos seculares, como os regulares: o caso he serem clerigos. Nos primeiros tempos do monaquismo os frades erão leigos, e mo-ravão nos bosques e ermos: depois que daquelles lugares passarão para as cidades, e se ordenarão, ficarão não digo com direito senão com obrigação de prestar serviço á igreja, obrigação adquirida pelo acto da sua ordenação. Não se devendo pois considerar nos benefícios as rendas temporaes, porém o officio sagrado, o qual estão obrigados a fazer todos os clerigos ou estejão no claustro ou fóra delle, he injusto que se conservem esses benefícios para os seculares com exclusão dos regulares. Allegou o illustre preopinante em favor da sua opinião uma regra do Concilio Tridentino ut beneficia regularia, regularibus; sacularia, sacularibus conferantur; porém observarei que a maior parte dos bons canonistas a applicão sómente aos beneficios não curados, e não aos beneficios paroquiaes, que podem ter indistinctamente servidos por frades ou clerigos; seculares; o que especialmente tem lugar com os mendicantes, chamados milicias ou tropas auxiliares dos parocos, pois forão instituidos para os auxiliar na administração da cura pastoral. Observarei em segundo lugar que não ha nenhum frade que tenha requerido dispensa daquella regra, que não a tenha conseguido na corte de Roma; pois tal he a presentw disciplina da igreja: he esta uma das dispensas do desembargo do paço, que a ninguem se nega, em pagando os bemditos emolumentos. E por isso me conformo em que seja esta dispensa uma das faculdades que se peça para a impetra da bulla, a fim de se evitarem depois tantas bullas, quantos os pretendentes. Pois ha de votar que até agora a corte de Roma passava uma bulla para cada uma das faculdades referidas neste projecto, e para cada um dos pretendentes: agora o que só quer he uma só bulla para todas e para todos: e por isso desejo que se diga no prologo uma só bulla, e não bullas, como nelle se lê. Ha outra conveniencia nesta habilitação para os beneficios; porque havendo nos claustros muitos padres sabios, logo que se lhes permitta entrarem nos concursos dos benefícios, serão nelles providos, e adquirindo assim uma sustentação decente, se resolverão a deixar a roupeta, e resuscitando com os dotes gloriosos de cidadão, virão ser uteis á igreja, e ao Estado. (Apoiado).
Em lugar pois de achar inconvenientes na secula-

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rização daquelles que a quizerem, eu direi contra o illustre preopinante que ella se deve promover por motivos de utilidade publica e de justiça. Por utilidade publica, para irem vagando a favor do Estado copiosos bens que são propriamente nacionaes, e de que a Nação em tamanhas urgencias nada se aproveita: e bem assim para se irem extinguindo esses status in statu, sociedades separadas da sociedade universal, que nunca podem fazer causa commum com a pátria, nem deixar de estar com ella em perpetua contradicção; sociedades assás oppostas aos dictames da natureza, devidos aos tempos violentos das perseguições, e de excandescencia religiosa, focos do fanatismo e de superstição, que tanto tem envilecido os homens, e adiantado a causa dos despotas; se bem que he já hoje tanta a luz, que até tem penetrado nesses escondrijos do fanatismo, e ha hoje frades que tem as cabeças limpas dessas fabulas da superstição, e por isso mesmo mui dignos de virem servir os cargos ecclesiasticos com verdadeira utilidade da religião.
A outra razão que eu allegava, tinha por fundamento a justiça: pois em verdade he cousa bem cruel e injusta, que os regulares não participem com os mais cidadãos, dos bens da liberdade civil, e da ressurreição constitucional; e que continuem por toda a vida a ser victimas da ambição, crueldade, e inconsideração do seus pais que em idade inhabil para lhes dar conhecimento do que he uma profissão religiosa, os sacrificarão a interesses de familia, e ao despotismo monastico. Sim, despotismo: os claustros são tambem cortes dos Reis com seus aulicos. Ali a oppressão dos pobres frades; ali as intrigas, as simonias, as veadas dos empregos e prelazias da ordem; ali os roubos, os extravios das rendas communs; ali toda a casta de despotismo sobre os vassallos que não chegão a ser mandões naquellas celestiaes monarquias, onde não póde ainda chegar o nectar da liberdade civil. (Apoiado, apoiado). Sim, ainda ali não chegou : os prelados maiores e seus aulicos são ainda os tyrannos dos desvalidos frades; e pois toquei nesta materia não quero perder a occasião do dar os devidos louvores á communidade de S. Francisco do Porto, e de me congratular com ella pela nobreza e energia com que tem recusado obedecer por mais tempo ao despotismo que sobre o atropelamento dos estatutos e definições da ordem tem levantado a mais vergonhosa e punivel arbitrariedade. Oxalá houvesse o Governo tido o cuidado de proteger tão nobres esforços daquella corporação! Quando uma communidade se levanta, como a fez a de S. Francisco do Porto de um vil servilismo, e nobremente se esforça por fazer substituir a observancia da sua regra ao descarado despotismo e inaudita perfidia de seus oppressores, devia o Governo ler apoiado mais do que apoiou a nobreza desses sentimentos: e tal he a natureza do direito de petição.
Vindo á questão, digo que apoio o artigo. Elle diz (leu). Não sei se já está decretado que todos os beneficios, mesmo os não curados, sejão providos por concurso: se não está, he necessario que a esta parte do artigo se dê uma latitude maior, dizendo-se que todos os beneficios de qualquer classe que sejão, serão providos por concurso, e a elle admissiveis os regulares.
Diz a segunda parte do artigo (leu). Parece-me que seria melhor deixar ao arbitrio do frade, o arbitrio de escolher o prelado do lugar do beneficio, o da naturalidade, etc., como no art. 1. Por esta occasião lembra-me advertir que como se trata de reverterem os frades ao estado em que a natureza os creou (pois não he de clausura aquelle em que ella poz os homens, nem mesmo as mulheres), e ha muitos que não tem a ordem de presbiterio, outros leigos mesmo por sua instituição ou profissão, como os de S. João de Deus, etc., estes não necessitão de ter no mundo seguro um patrimonio ou beneficio para poderem sair, e em saindo, achão no mundo occupações uteis em que se empreguem: sem embargo do que, a todos devem os conventos patrimoniados dar uma pensão, como direi quando se tratar da reforma.
O Sr. Dispo de Béja: - Não acho esta determinação muito ajustada com as regras da justiça, ou ao menos com as da equidade. Os regulares durante a sua permanencia no convento não devem ser admittidos ao concurso com os clerigos seculares pelas razões seguintes:
1.º A maior parte dos clerigos seculares, quando chega a occasião do concurso tem já estado muitos annos occupados no serviço da igreja, sem receberem remuneração alguma, e muitas vezes com oppressão das suas familias: ao contrario os regulares tem sido sustentados das rendas do seu mosteiro ou convento, não tendo estado a cargo das suas familias. 2.º Os regulares não empregão capital algum para adquirirem a instrucção e os conhecimentos que os constituem idoneos. para servir a igreja; ao contrario todo o homem que vive no seculo não adquire certo gráo de sciencia, que o constitue digno de empregos ou civis ou ecclesiasticos, sem ter empregado capitães de muito valor. Ultimamente esta determinação vai fumentar e promover as profissões fraudolentas. Muitos haverá que aspirem a entrar nas religiões com as unicas vistas de se habilitarem para os concursos, e não de permanecer no estado religioso que abraçarão. Accresce que em regra virão a preterir os clerigos seculares, pois he indubitavel que os regulares tem meios mais prontos e efficazes para se instruirem do que os clerigos seculares; e isto será capaz de desanimar uma grande parte do clero secular, e ser causa, de se entregar ao ócio, origem fecundissima de muitos vicios, que deshonrão o estado clerical.
O Sr. Gouvêa Osorio: - Soecularia, soecularibus: regularia, regularibus. Isto he um principio de consummada prudencia: a pratica de se proverem os beneficios da igreja, foi sempre por bullas pontificias, e eu não posso approvar este artigo, porque elle he contra a disciplina da igreja. Senhores, um frade por mais secularizações que tenha, he sempre frade, e para mim sempre he suspeito todo aquelle que se pertende secularizar.
O Sr. Rebello: - Tem-se atacado este artigo que a Commissão, quando o lançou esperava que seria approvado sem discussão. O segundo Preopinante refutou as objecções, que o primeiro que falou contra

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o artigo, tinha apresentado: e por isso agora tão sómente me incumbe desenvolver os fundamentos do artigo, e refutar succintamente os argumentos que posteriormente se tem produzido em contrario. Depois das bases juradas, he necessario sermos coherentes com o principio nellas estabelecido, de que todo o cidadão portuguez, deve ter a porta aberta por seus talentos, e virtudes, para ser empregado naquillo em que possa ser util á patria. Esta regra ou ha de ser na sua generalidade applicavel aos religiosos que vivem no claustro, ou então cairemos na odiosa contradicção de dizermos, a lei he igual para todos, o merecimento, e as virtudes devem chamar a todos para os empregos publicos, á excepção dos frades que por terem e infelicidade de o serem, são além disso privados deste precioso direito, e a Nação dos serviços, que elles lhe podem conferir. Os religiosos podem reduzir-se a duas classes, poucos resignados por uma verdadeira vocação, e muitos professos por violencia dos seus parentes, ou por modo de vida. Para os primeiros he inutil o artigo, contentes com a sua sorte, nada mais per tendem do soberano Congresso, senão a continuação do seu proposito religioso conforme o seu instituto. Quanto aos segundos he da sabedoria, humanidade, e justiça do augusto Congresso diminuir o seu infortunio, e chamalos às vantagens, e communhão dos direitos sociaes. Não ha ninguem mais infeliz do que um religioso, que o he pela violencia dos seus parentes, e especulação dos interesses das familias entendidas a seu modo, e preenchidas com prejuizo destas victimas, e sacrificio da sociedade inteira. Pelo que pertence a estes serão os meus desejos ir arrancalos dos claustros, e apresentalos no centro das suas familias, e do mundo na plenitude de todos os seus direitos: se porém não posso conseguir tanto por outros inconvenientes, que o legislador não póde deixar de contemplar, pelo menos procurei e procurou a Commissão franquear-lhe o caminho de sairem do claustro com uma subsistencia certa, e com proveito da Nação. Pelo que toca aos que professarão a vida religiosa por modo de vida, a operação consiste em os convidar a sairem dos claustros por especulação, assim como para elles entrarão por especulação, forao para os conventos para viverem com estas commodidades, e menos trabalho, procuremos que elles achem maiores commodidades em sair, e ganhem amor a um serviço proveitoso de que subsistão, ganhando assim os frades nas suas maiores vantagens, e o estado em diminuir de membros mortos e em adquirir cidadãos activos e laboriosos. A hypothese suppõe uma especulação, e resolve-a politicamente sem a menor offensa do instituto regular, e tem fundado escandalo ainda do maior fanatico. Eis-aqui pois succintamente demonstrado, que os frades tem direito a serem admittidos aos conventos dos beneficios pelo modo que propõe o artigo, e que deste direito resultão tambem á sociedade vantagens de que a não podemos nem devemos privar. Um dos illustres Preopinantes tem desenvolvido com profundidade esta ultima consequencia que acabo de tirar. Em verdade o melhor estado a que póde chegar uma nação he aquelle em que os homens mais benemeritos occupem os empregos publicos de qualquer natureza que elles sejão; e para isso he preciso que ella os vá buscar aonde estiverem, e que elles tambem se lhe venhão apresentar de qualquer parte em que estejão: de maneira que bem analysada a materia, ainda que quizessemos denegar aos frades este direito, não o poderiamos fazer sem dar um golpe mortifero no bem da sociedade.
Por estes fundamentos pois, he que se propõe a admissão dos frades aos concursos dos beneficios, por quanto se elles não forem em geral mais instruidos do que os clerigos seculares, pelo menos engrossarão o numero dos concurrentes com demonstrada utilidade dos fins a que se propõem os concursos, e sem a menor violencia dos institutos regulares na sua essencia. Tem-se opposto a regra canonica, que os beneficios seculares devem dar-se aos seculares, e os regulares aos regulares; mas justamente he para dispensar essa regra, que se offerece artigo. Sem descer aos motivos que derão lugar a esta regra, e contentando-nos com o que nos incumbe no estado actual da disciplina, basta que nos deduzamos a pedir a dispensa daquella regra disciplinar; assim como se tem pedido, e deve-se pedir de outras de igual natureza. Mas será indecoroso que se peça esta dispensa ao summo Pontifice? Terá elle duvida em concedela? Não sei que a possa ter. Nos primeiros seculos da igreja, quando os frades esta vão debaixo da jurisdicção dos bispos, em cujos tempos não apparecerão nos claustros os grandissimos inconvenientes que depois produziu a exempção da jurisdicção ordinaria, os bispos tinhão a faculdade de tirar os frades dos claustros, e apresentar nelles os beneficios. Ninguem duvida desta verdade historica, e juridica; e ainda que os fanaticos daquelles tempos, (porque em todos os tempos os houve) se queixassem de que os bispos com estes provimentos ião distrahir os frades da sua vida silenciosa, todavia nem por isso deixa de ser provada a jurisdicção que tinhão os bispos, e a utilidade que della resultava ao bem do Estado, e da religião, depositando-se os ministerios sagrados nas mãos dos ecclesiasticos mais conspicuos. Formárão-se pelo decurso dos tempos e na decadencia da melhor disciplina as confederações dos conventos, e ordens religiosas: os frades principiarão a sacudir a jurisdicção dos ordinarios, a solicitar, e obter da Sé apostolica excepções exorbitantes, e então os clerigos seculares pela sua parte procurarão tambem segurar as possiveis vantagens; e daqui resultou uma especie de bipartita, que muito particularmente influiu na regra, de que os beneficios regulares pertenção aos regulares, e os seculares aos seculares. Disse um dos Illustres Preopinantes, que a vida do monge he chorar, e não ensinar. Se a vida do monge asceta he chorar, porque o asceta não se occupa senão de si; pelo contrario a vida do monge, que não he asceta, consiste era ensinar, combater, e trabalhar. No Oriente, onde principiou a vida monacal havia muitos monges desses que apenas choravão; mas tambem havia muitos, e a maior parte dos institutos, que ensinavão as escripturas, combatião as heresias, e trabalhavão para si e para os outros. O illustre Preopinante deve saber que o Papa Julio, não admittiu no

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Occidente os monges para chorarem, mas sim para combater a heresia do Ario, e foi positivamente com este fim, que elle cedeu da resistencia, que tinha feito á admissão dos monges no Occidente. Todas as corporações religiosas do Occidente, á excepção dos Brunos, tem reconhecido a obrigação de ensinar, escrever, e trabalhar: pelo decurso dos tempos passando a serem clericaes, de leigos que erão, contrahirão a obrigação de ensinar, e pregar a moral; e em tempos posteriores estabelecêrão-se as ordens mendicantes com o fim de coadjuvarem os párocos na administração dos sacramentos, e administração da palavra divina. Em consequencia o illustre Preopinante conhecerá, que pelos poucos Brunos que chorão, todos os mais institutos religiosos devem ensinar, pregar, coadjuvar os párocos na administração dos sacramentos, e trabalhar segundo os seus institutos para merecerem a sua subsistencia. Passarei agora a fazer-me cargo de responder a outras grandes objecções, que se tem feito, particularmente a de um Preopinante, que diz que se atacavão os direitos que tem o clero secular aos beneficios. Se este principio passasse, visto que o seu unico fundamento consiste na disciplina actual, que, segundo deixo demonstrado, assentou em motivos mais filhos das circunstancias do que do melhor espirito da igreja, então seria tambem preciso para sermos coherentes, respeitarmos o costume, e leis até agora estabelecidas, que conferi ao certos empregos a pessoas pelo fado de gerem filhos de desembargadores, conselheiros de Estado, etc.; destruirmos a regra fundamental de um governo constitucional, que a lei he igual para todos; e declararmos que os empregos não devem ser conferidos aos que se apresentarem mais dignos de os occupar; e se isto he um absurdo quanto ao estado civil, não o he menor quanto ao estado ecclesiaslico, e á religião de Jesus Christo, a qual preferiu sempre os mais dignos, desconheceu cathegorias de individuos para os chamar, ou excluir, e que recusou sempre as alterações, que os homens lhe forão fazendo nesta parte, do mesmo modo que as sociedades civis. Resulta pois que para os beneficios ecclesiasticos devem concorrer todos aquelles que tiverem prestimo, e virtudes. Isto em nada ataca a disciplina da igreja; he seguir invariavelmente a regra, de que todos devem ser Iguaes ante a lei, e todos devem concorrer para os cargos publicos, sendo estes dados aos maiores talentos e virtudes. (Apoiado.)
Disse-se mais que os clerigos tem feito muitas despezas, e que estas ficão frustradas, se os monges forem admittidos aos concursos. Este principio he muito gratuito. A cada passo vemos clerigos, que acabando de estudar a grammatica, ordenão-se, deixão-se estar na sua casa, até ao tempo competente, e entrão só com estes fracos cabedaes nos concursos, e como desgraçadamente os habeis são poucos, dentre elles o menos ignorante obtem o beneficio. Mas suppondo ainda, que o clerigo que entra em concurso, tenha sido educaoa num seminario, que comparação podem ter as despezas que este clerigo tenha feito, com o que o frade tem perdido, pois perdeu tudo para ser frade? O clerigo perderia uma parte de sua fortuna para se instruir, mas o frade para ser frade perdeu tudo, e até o direito ao que podesse adquirir: bem se vê que com quem perdeu tudo, não póde comparar-se quem sómente perdeu alguma cousa.
O mesmo Preopinante diz, que se acaso os frades forem admittidos a todos os concursos, lá vão as esperanças dos clerigos, porque aquelles tem mais literatura. Oxalá isto aconteça em toda a sua extensão! tão differentemente penso eu, do que pensa o Preopinante. (Apoiado). Quando se trata de um destino, que deve ser dado ao que tenha maior merecimento, não será improprio de um pastor da igreja querer que seja dado ao mais inhabil, particularmente quando o concurso está estabelecido, para que seja recompensada a pessoa mais digna? (Apoiado) Isto está em perfeita contradicção como maior bem da religião em geral, a qual não póde ser tratada com o decoro que lhe he próprio, sendo entregue seu ministerio a pessoas inhabeis, e portanto pelo mesmo motivo, que não se quer que os frades sejão admittidos a concurso, he que eu quero que o sejao. Este principio tem-se inculcado com um tanto ou quanto de sofisma, pois parece que se quer dar a entender, que se excluem os clerigos; porém não he esta a nossa regra. Os clerigos não são excluidos; pelo contrario continuão a ter o direito de concorrer, e de serem preferidos, se tiverem maior merecimento. E qual será o interesse da igreja? chamar o maior numero de concorrentes; porque quanto maior for o numero, tanto maior ha de ser a probabilidade de achar pessoas mais dignas.
Diz o mesmo illustre Preopinante, que os clerigos desgostosos de concorrerem com os frades, os quaes só hão de supplantar, se entregarão ao ocio, e abandonarão a feitura, e as outras praticas de seu ministerio. Não me parece que os clerigos que forem aproveitaveis para os beneficios tomem esse partido; pelo contrario espero que considerando, que hão de concorrer com grande numero de pessoas que tem por si a presumpção de literatura se estimulem, e estudem de dia, e de noite; e ainda espero que os frades pratiquem outro tanto, e que em lugar de consumirem o seu tempo com intrigas domesticas, filhas do ócio, e impossibilidade em que se suppunhão de sair do claustro, empregarão o seu tempo em se proporem para merecer os beneficios: e daqui resultará maior instrucçao em todos, e maior merecimento em todos, com grandissima utilidade geral.
Parece-me pois que tenho respondido às duvidas que se tem offerecido, e justificado os motivos porque a Commissão desejou facilitar as secularizações pelos meios geraes propostos, e já sanccionados no artigo 1.º; estendelas por este segundo artigo áquelles religiosos que, faltos de meios proprios de subsistencia, tivessem prestimo, e virtudes para concorrerem aos beneficios ecclesiasticos; e amplialas ainda pelos expedientes propostos no artigo 4.° de que agora não falo por não pertencer á questão. Tenho dito sobre a materia, e com tanta demora que nada mais me resta a dizer sobre ella. (Apoiado)
O Sr. Guerreiro: - Esta materia, por sua natureza ecclesiastica, deveria talvez impor-me silencio

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porque as occupações a que me tenho dedicado desde que saí da universidade, tem-me impedido recordar os principios de direito canonico que aprendi; mas apesar de que tenhão as minhas opiniões uma censura aspera, como já aconteceu n'outra sessão, nem por isso deixarei de dar meu parecer sobre este assumpto.
O primeiro illustre Opinante ochou injustiça na medida proposta no artigo, e custa-me a conceber, como póde consideralo de tal modo. Se nós olhamos a natureza dos corpos monasticos, de certo não vejo que assim possa ser considerado. O voto de obediencia, he verdade que se relaxa por sua natureza todas as vezes que o frade sae da sua clausura, todas as vezes que está ausente do seu superior, e por isso não so póde dizer que se relaxe mais, quando saír do claustro, para obter por meio de um concurso um beneficio. O voto de castidade, subsiste no seu vigor, igualmente dentro e fora do claustro, e provera a Deus fosse observado com pureza: em quanto ao voto de pobreza, que parece seria o mais facil de admittir relaxação, eu peço licença aos illustres membros versados nas materias ecclesiasticas, para dizer que nem nos livros ecclesiasticos, nem nas leis civis, nem nos livros historicos se acha exactamente fixado em que consista o voto de pobreza dos regulares. Nas leis romanas, achão-se exemplos de regulares testarem de seus bens, por conseguinte tinhão dominio até á morte (refiro-me ao decreto de Gratiano, e as novellas de Justiniano ). Nas decretaes se achão formulas para o dominio dos regulares: por conseguinte não obstante que nos diversos seculos da igreja, foi sempre considerado o voto de pobreza, ha disposições incompativeis com o mesmo voto. Deixando aos Preopinantes mais versados na materia, o fixar exactamente quaes são os limites deste voto de pobreza, basta o dito para se ver que não he novo na disciplina da igreja, não obstante o voto de pobreza, o exercerem os monges o acto de dominio; e por isso este voto não obsta para a vida publica, e nem a respeito delle, ha esse absurdo, que se pertende inculcar, na doutrina do artigo; não ha por este lado injustiça alguma em se impetrar da Sé apostolica uma bulla, para que os frades, apesar do seu voto, possão ser empregados nos beneficios ecclesiasticos.
Parece-me que a maior difficuldade que achou um honrado membro, foi a injustiça que julgou que por este meio se fazia ao clero secular, e com effeito parece que seria o mesmo que dizer, que seria injusta a lei, pela qual o Congresso aboliu as leituras, devendo ser preferidos os bachareis da universidade. A inculpação não seria justa, mas a razão de paridade he a mesma. Porém deixemos isso, e tornemos á questão.
A lei que excluiu os regulares dos beneficios, era uma lei disciplinar, porque no principio a vida que estes tinhão, era muito differente, da que actualmente tem; e tanto que nem erão ordenados. Depois houve tempo, em que talvez pela relaxação dos costumes dos frades, uma vez que saião para o seculo, foi necessario que fossem excluidos dos beneficios, e se vê nos estatutos de algumas cathedraes do Reino, que prohibem serem empregadas nas capelanias, as ordens religiosas; mas hoje que não he tal, como era antigamente, a vida monastica, não ha razão nenhuma que impeça obter-se a dispensa daquella lei desciplinaria.
Oa outros argumentos, que produziu um Preopinante, a quem respeito como meu meste, e cujo gráo de saber me he conhecido, apezar de tudo me não convencem, e forão respondidos pelo Preopinante que acabou de falar. O argumento dos grandes capitaes, que tem empregado os clerigos para adquirir a sua instrucção, não he forte argumento, porque quando se quer dar um emprego, não se examina a quem custou mais adquirir as qualidades, para elle necessarias, se não quem as possue em gráo mais eminente: e se vamos a examinar a quem custou mais, um individuo do clero secular empregou um capital, ou fez despezas para adquirir instrucção, e um individuo do clero regular empregou sua industria, e tempo para estudar, que he tambem grande cabedal. De conseguinte essa razão não he exacta.
Quanto a outra razão, de que deste modo ficaria excluido dos concursos o clero secular: que convem mais á igreja, e ao Estado? que os beneficios sejão providos nos mais benemeritos, ou naquelles que são inferiores em merecimento e sciencia? De certo convem á igreja e ao Estado, que sejão providos nos mais dignos; de conseguinte tambem não convence este argumento. Oxalá que este soberano Congresso se decidisse a tirar do clero regular, todo o partido que poderia tirar delle; a crear seminarios, e academias, não só onde se ensinassem as sciencias ecclesiasticas, senão as exactas e naturaes: nós teriamos bem pronto seminarios de homens sabios, e então se conheceria talvez, que as communidades religiosas podião ser mais uteis do que se pensa... Eu queria responder tambem a outro argumento do mesmo illustre Deputado, porem passou-me repentinamente da memoria; e por isso concluirei o meu discurso, lembrando que ha grande numero de bispos, tirados dos claustros. Se os religiosos podem ser empregados nestes maiores beneficios, porque o não poderão ser nos outros? de certo não vejo razão alguma para isso.
Parece-me pois, que não ha inconveniente algum, em que a bulla seja impetrada; como não queirão os Preopinantes, que são de contraria opinião, que deixemos as cousas no mesmo estado em que estavão até aqui, contra os interesses da Nação. Porque uma vez que não se impetre a bulla em geral, se hao de impetrar como até agora para cada caso particular; o que não serve, senão para empobrecer o Reino, e ir enriquecer os officiaes da curia romana.
Occorre-me agora o que me tinha esquecido, que era responder ao que se tem dito do maior serviço feito á igreja pelo clero secular, do que pelo regular. Com effeito, se nós estivessemos nos antigos seculos, em que os religiosos se occcupavão em trabalhos manuaes, ou em cultivar a terra, e mesmo em apascentar gados, como são prova manifesta alguns mosteiros dos Bernardos, que estão em montanhas mais proprias para esse fim, e alguns outros dos Benedictinos, nas planicies mais commodas para a cultura, poderia dizer-se tal cousa com alguma razão; mas depois que as ordens mendicantes se estabelecerão, e seus indi-

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viduos começarão a ser coadjuctores dos parocos, não se pode dizer que não se empregão no serviço da igreja, pelo contrario a pregação he exercida quasi exclusivamente entre nós pelos regulares: frequentemente para a confissão, são por muitas pessoas escolhidos os frades; e de conseguinte tambem aquelle argumento não convence, e tanto que eu não duvido dizer que, feita a escolha ao acaso, entre um individuo do clero regular, talvez se achasse que este ultima tinha feito mais serviços á igreja.
Resumindo pois as minhas idéas, digo, que não sendo attendiveis as rasões que se tem exposto contra o artifo, resultando grandes vantagens para a nação, e para a igreja, de serem providos os beneficios em as pessoas mais dignas, segue-se que deve ser approvado o artigo.
O sr. Serpa Machado: - Está discutida esta materia, que só me levanto para lembrar uma circumstancia, que me parece não foi até agora desenvolvida, e que póde muito bem aclarar a questão. O que diz este artigo não he novidade na disciplina da igreja, antes seria novidade o contrario. Nunca a curia romana, tendo motivos attendiveis, negou estas dispensas aos individuos que as pedião: por tanto a Commissão não propõe senão que se conceda agora collectivamente a todos os religiosos o que antes se concedia a cada um em particular. Antes erão concedidas a cada passo estas dispensas, e não só isto, senão que em algumas corporações religiosas era costume sairem os mesmos individuos dellas para os beneficios da ordem, e muitas vezes voltavão depois ao claustro: de conseguinte, no que se propõe, não há nada de novo, e evita-se o incommodo, e despesa que podião Ter os religiosos de impetrar a bulla separadamente. Em quanto as outras razões que expozerão contra o artigo, não me aprece que se possa dizer mais sobre ellas do que já se tem dito.
O sr. Castello Branco: - Muito se tem falado sobre esta materia, que á primeira vista parece facil, mas todas as vezes que neste congresso se tratarem materias desta e de igual natureza, não me cansarei de trabalhar por [...] ao único e verdadeiro ponto de vista, porque devem ser tratadas n'uma assembléa legislativa.
Nós não devemos discutir aui pontos verdadeiramente religiosos, isso pertence aos concilios: quando se tratem materias ecclesiasticas, devemos consideralas politicamente pela influencia que ellas tem na sociedade civil; e em quanto ao que he essencialmente religioso, não temos outra cousa mais do que procurar que as decisões deste soberano Congresso, não sejão contrarias ás leis propriamente religiosas, e á essencia da religião; he o que temos de fazer em quanto á parte religiosa: o mais que nos compete, he em quanto á parte politica, isto he, a influencia que os estabelecimentos religiosos tem na sociedade civil. Pela parte religiosa eu nenhuma duvuda acho para adoptar a doutrina do artigo. Todos sabem, sem serem canonistas nem theologos, que o essencial para se poder exercitar o officio sagrado, he ter a ordem correspondente ao caracter que ella infunde. Uma vez que se tem esta ordem, he differente que o individuo que a tem, seja clerige secular, isto he, que viva na sociedade, ou seja regular, isto he, que viva retirado no claustro; isso he o mesmo; elle he sacerdote do mesmo modo, e tanto póde exercer este officio sagrado, como o outro: a differença que há entre elles he uma differença accidental que se inventou muito posteriormente ao estabelecimento da religião catholica. Por consequencia se algum obstaculo há, he um obstaculo de disciplina, que póde ser tirado pela mesma autoridade ecclesiatica que o estabeleceu. Nenhuma difficuldade há pois em se approvar o artigo quanto á parte religiosa; vamos á parte politica, que he a que nos compete tratar.
Quando eu li pela primeira vez este artigo, suscitou-se logo uma idéa; e tanto nas suas palavras, como na sua doutrina, vi um perigo para o systema constitucional; perigo que nós não podemos tratar de insignificante, porque a experiencia do que acontece nos outros paizes nos tem mostrado de que grandeza elle he. Todos sabem quanto póde o espirito do partido, o espirito de corporação; e quanto este espirito de corporação tem apparecido sempre, e tem sobresaído nas ordens regulares. As ordens regulares, compostas de homens que em consequencia de seu votos renuncião ao commercio e da sociedade, e tomão sobre si habitos inteiramente diversos daquelles que se adquirem na vida social, de homens que jurão uma obediencia estricta e mui particular a um chefe, que ainda que o seja da igreja, he comtudo estrangeiro, não podem deixar de ter um espirito de corpo que se acha sempre em oppozição com a sociedade. Eu não ataco os individuos: sei que nas corporações regulares há muitos que tem tão bons sentimentos, como os melhores cidadãos que vivem no centro da sociedade: falo das corporações em geral.
Ora sendo assim, e sendo tambem de toda a certeza a influencia que tem sobre o animo do povos aquelles que servem os beneficios, principalmente de cura d'almas, não podia eu deixar de ver neste artigo um grande perigo do systema constitucional. Vi que os regulares sairião do fundo dos claustros a fazer uma invasão, para assim dizer, nos beneficios ecclesiasticos, e a terem nas suas mão a illustração dos povos, para os conduzirem aonde seus interesse particulares, e os interesses da corporação os levassem. He certo que uma nação illustrada, uma nação que primeiro abriu a carreira contitucional, a Hespanha digo, adptou isto mesmo. Ella habilitou, ou fez com que a bulla habilitasse os regulares para os beneficios, ainda aquelles mesmos regulares existentes no claustro. Mas que temos visto em Hespanha? Não vemos nós que as corporações religiosas, apezar destas providencias que deverião, por assim dizer, constitucionalizalas, continuão com toda a sua força a obstar ao systema constitucional de Hespanha? Não vemos nós ainda mais, que os mesmos parocos são em grande parte oppostos ao systema constitucional? Não vemos nós guerrilhas anti-constitucionaes, capitaneadas por esses parocos? E quem me diz que não sejão do numero daquelles que saírão dos claustros para as paroquias? He por isto que eu duvido approvar o arti-

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go, e sou de parecer que não sejão admittidos os regulares aos beneficios, em quanto permanecerem no claustro. He sem duvida que devem ser admittidos, mas depois de serem secularizados. Eu quero que elles, por um acto anterior, tenhão renunciado a vida claustral, e quebrado os laços que os unem aos seus superiores regulares, interessados na continuação do abusivo e desastroso systema anti-constitucional. Quando elles houverem quebrado esses laços, e reformado os seus antigos habitos e costumes, eu serei o primeiro a apoiar que sejão admittidos ao concurso dos beneficios ecclesiasticos, promiscuamente com os clerigos seculares. Isto se acha providenciado no artigo 5.°, quando diz (leu): por consequencia a approvar-se esse artigo, o outro vem a ser inutil.
Ha outra consideração politica, pela qual não approvo o artigo. Que he o que temos em vista em todas estas providencias, politicamente falando? Não he outra cousa mais do que diminuir o numero dos regulares, para que depois as reformas dessas mesmas ordens venhão a ser mais faceis. Por isso nós ja no artigo sanccionado facilitámos quanto he possivel o egresso dos regulares; mas se de approvar-se o artigo em questão resultar o contrario daquillo que temos em vista, he claro que não deve ser approvado. Qual será o regular que tendo a certeza de ser admitido no concurso dos beneficios ecclesiasticos, sem deixar o claustro, queira sair delle? Todos esperarão no claustro (onde estão sustentadas sem trabalho á custa da corporação) a occasião de serem promovidos a um beneficio ecclesiastico; e as providencias que temos dado para que saião do claustro, virão a ser inuteis. Por tanto, eu voto que sejão admittidos os regulares a concurso com os seculares mas depois de secularizados: não só porque he preciso essa condição para evitar que elles conservem o espirito de corporação, mas tambem para que as providencias que se derem para a sua secularização, possão produzir o desejado effeito.
Tenho outra reflexão a fazer, e vem a ser, que he preciso ter sempre em vista a constitucionalidade dos cidadãos, assim para os empregos civis, como para os ecclesiasticos. Eu não digo que seja provido n'um beneficio um clerigo idiota, mas tambem não quero levar a sciencia necessaria para o exercicio do ministerio sagrado a um ponto tal, que se devão perder de vista outros principios que influão muito na sociedade. Em quanto a mim, se me apresentassem de uma parte um regular, o maior theologo do mundo, porem insconstitucional, e da outra um ecclesiastico de bons costumes, mas que não tivesse senão uma sciencia ordinaria, e um verdadeiro amor á sua patria, e ao bem commum da sociedade, não hesitaria um momento em dar a este o beneficio. Por estas razões opponho-me ao artigo.
O Sr. Abbade de Medrões: - Direi poucas palavras, porque julgo que está dito quanto se póde dizer nesta materia: só tenho que expor ao augusto Congresso que quizera que fossemos coherentes. Nós não achámos os regulares, nem com capacidade para serem eleitores de paroquia, e agora os achámos capazes para serem parocos em toda a parte: para serem eleitores de paroquia os julgavamos mortos, e agora já estão vivos! Não me opponho a isto, mas he necessario que sejamos coherentes.
He necessario tambem, que assim como so pede dispensa para isto, se peça dispensa para outras cousas, pois deve saber-se que no concurso não se olha sómente á sciencia, senão aos costumes, idade, etc; e como ha de saber isto o ordinario? Será necessario obrigar os superiores a darem attestações; de outro modo não póde ser. No que diz respeito aos concursos de padroado real, he differente, porque alí não se trata mais do que da sabedoria; mas nos beneficios que são de alternativa, em quanto existe esta alternativa, entre a Sé e a Mitra, hao de preceder necessariamente todas estas informações. Nos beneficios de padroado não ha inconveniente, porque o concurso não dá um direito inaufferivel, he como um concurso civil; mas o concurso canonico dá um direito innaufferivel, e se nisto tem havido abusos, e patronatos, isso não nos deve servir de regra. Em quanto ao mais, não tenho duvida em conceder que os religiosos sejão capazes, e dignos de serem admittidos a todos os cargos ecclesiasticos, e até aos cargos civis; mas he necessario ter em conta a sua constitucionalidade, como bem reflectiu o Sr. Castello Branco. Eu tenho recebido infinitas cartas de frades, descompondo-me dos pés até á cabeça, e chamando-me os nomes mais injuriosos, so porque escrevi aquelle folheto intitulado o Cidadão Lusitano; e na verdade eu fui demasiadamente sincero em o publicar, mas quiz desaggravar o Congresso e rebater os ataques e parvoices dos inimigos da Constituição. Por tanto insisto em que se deve attender ao patriotismo e constitucionalidade dos individuos. Quanto ao mais, estou prompto a conceder aos meus concidadãos tudo o que se lhe possa conceder sem perigo da segurança publica, e conservação do systema que felizmente nos rege.
O Sr. Pinheiro de Azevedo: - Approvo o artigo como está, porque o fundamento e o espirito deste projecto, he facilitar a reforma das ordens religiosas, e ao mesmo tempo a saida dos que tem repugnancia de permanecer no claustro; e como o meio que propõe a Commissão he o mais proprio e efficaz para se observarem os sobreditos fins, não póde haver duvida em se adoptar: muito mais porque este meio não vai encontrar a politica, nem as leis fundamentaes da igreja, nem tambem a essencia das ordens religiosas. Que não he contrario ás leis fundamentaes da igreja nem á essencia das ordens religiosas, bem o mostra o uso e pratica constante da igreja, nos mesmos seculos da maior perfeição; segundo a qual se ião tirar, e não poucas vezes arrancar dos mosteiros homens excellentes para pontifices romanos, patriarcas, arcebispos, bispos, etc. A regra tantas vezes aqui citada = regularia regularibus, saecularia saecularibus = mostra evidentemente que os monges tinhão e possuião exclusivamente muitos beneficios: e muito mais o mostra porque essa regra foi decretada a bem dos seculares, e não dos regulares; pois ninguem ignora que o monaquismo era então como uma habilitação necessaria para todos os empregos e beneficios, com grave prejuizo do clero secular: talvez se possa

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dizer que a Europa estava nessa época reduzida a um geral monaquismo, e que ninguem se reputava grande sem ser em certo modo regular: daqui as innumeraveis ordens militares, confrarias, etc., etc. Em quanto a disciplina presente, supposta a frequencia e facilidade das dispensações que se concedem aos regulares para possuirem beneficios seculares, pode-se dizer que a sobredita regra regularia regularibus, etc. he inteiramente differente; e que ao presente os beneficios regulares se dão só aos regulares, e os seculares a seculares e regulares: por tanto o artigo não faz mais nada, que poupar aos regulares o tirar cada um a sua bulla, como até agora se praticava, e nisto ganhão os particulares, e ganha em geral a Nação.
Ha outro argumento que produziu um sabio Deputado, tirado dos serviços feitos pelos clerigos seculares. E verdadeiramente nos primeiros tempos da igreja, os beneficios tinhão uma escala, e erão preferidos aquelles que tinhão mais e melhores serviços; porém esta regra, que era excellente, ja não está em uso, e eu creio que o presente artigo não vai prejudicar a refórma que nesta parte quizer fazer a igreja lusitana. Resta-me somente responder aos argumentos de politica. Nas ultimas folhas (por noticias de França e de Hespanha) vi eu que os generaes, que estão em campanha, fazendo a guerra aos sublevados de Catalunha, levão de provimento um grande numero de egressos, para substituir os caras das povoações sublevadas; por onde parece que mostra a experiencia que os egressos, entre os clerigos, são os mais constitucionaes; que he o inverso do que se tem supposto.
O Sr. Castello Branco Manoel: - Sr. Presidente, na verdade se eu olhasse a doutrina deste artigo 3.°, pelo lado sómente da justiça e da equidade, não teria duvida assim como a maior parte dos illustres Propinantes que me tem precedido, em votar indistinctamente pela generalidade em que se acha concebido. He incontroverso, como muito bem se tem dito, que a lei he igual para todos; que os regulares são cidadãos; e que nenhum motivo ha (quando elles se achão revestidos das qualidades que os constituem benemeritos ) para que deixem de concorrer com os presbiteros seculares no provimento dos beneficios: e até votarei, em iguaes circumstancias de sciencia, e moralidade, que elles devão ser preferidos aos seculares, isto pela razão em que se funda a doutrina do artigo, e vem a ser para facilitar a sua secularização; sendo certo, que algumas vezes não terão quem lhes faça patrimonio sufficiente, e por esta falta não poderão obtela, o que bem remedeia o artigo, e o que immediatamente se segue, podendo fazelo a titulo de beneficio, sendo-lhe licito, e impetrando-se bulla para conseguir ainda no estado de regulares. Não necessito combater (porque muito bem se lhe tem respondido) os argumentos com que alguns illustres Preopinantes se oppozerão a doutrina do artigo: nenhuma injustiça se faz aos clerigos seculares, e todas as razões de desigualdade que em contrario se oppozerão, todas ellas desapparecêrão á vista do que se tem ponderado.
Comtudo, estando muito bem convencido da justiça com que se tem sustentado a doutrina, eu a não approvo em toda a generalidade, e avisando o artigo pelo lado da politica, e estado actual em que nos achamos, eu faço distincção entre beneficios, e beneficios curados. Em quanto aos primeiros e absolutamente approvo que os regulares, ainda residindo intra claustra, possão concorrer a elles, possão ser providos, quando aliàs as suas virtudes, e a sua sciencia lhes derem a preferencia; e sirvão-lhes esses beneficios de patrimonio, que será o meio de alguns obterem a secularização, que aliàs seria muito difficultoso de alcançar pela falta de patrimonios: e a estes religiosos egressos a titulo de taes beneficios eu contemplaria, asim como os religiosos secularizados a titulo de beneficios parochiaes, como empregados publicos, e em um ministerio de que muito depende a conservação e bem andar do nosso systema constitucional. Sim, ninguem mais do que os parocos, principalmente nas provincias, tem influencia na opinião dos povos. De necessidade, estes hão de ser constitucionaes se os seus pastores o forem, e pelo contrario os seus sentimentos serão oppostos ao actual systema, se aquelles que continuamente lhes falão, e de quem fazem o maior conceito, lhes inspirarem principios anti-constitucionaes. Estes empregados ainda mais que os magistrados, e outros, he que eu quero sejão uns verdadeiros constitucionaes. Por isso não posso em toda a generalidade admittir para estes curatos, para estes empregos publicos a todos os regulares indistinctamente, ainda que aliàs tenhão sciencia, e inculquem virtude; e só os admittirei quando elles a toda a prova pelos seus discursos, pelas suas predicas, tiverem sem contradicção mostrado summa adherencia ao systema constitucional. Não queiramos indistinctamente admittir tem esta prova todos os regulares a curar os povos, e por consequencia a encaminhalos aos fins que pertenderem sem claras demonstrações da sua constitucionalidade. Estes empregados publicos são os obreiros, que mais podem adiantar, e fazer prosperar o nosso magestoso edificio, assim como serão tambem aquelles, que minando-o o podem derribar. Lembremo-nos que se unicamente para lhes facilitar a sua secularização, por desgraça admittissimos a similhantes empregos um anti-constitucional a paroquiar os povos, fariamos maior damno á nossa regeneração, do que o bem que póde resultar, se fossem secularizados mais em consequencia de os admittirmos a um similhante beneficio. O religioso que he liberal, e vive na clausura coacto, como ja se decretou ser esta coacção causa sufficiente para impetrar a secularização, raras vezes deixava de alcançar por falta de patrimonio. Eu estou adiantado em idade, e ainda até agora não vi que individuo algum deixasse de receber ordens sacras por falta de patrimonio, principalmente na relaxação actual, em que muitos patrimonios são fantasticos, ficando sempre na fruição dos doadores. Nunca falta quem faça estas illusorias doacções. E ainda que houvesse um, ou outro, que não podesse alcançar a secularização por esta falta, nunca isto era motivo bastante para nos arriscarmos a confiar de homens (sem prova de adhesão) o leme da náo do Estado, princi-

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palmente em tempos tão criticos. Por um pequeno bem não vamos fazer um grande mal. Lembremo-nos, que o actual systema tem muitos inimigos, e não podemos negar, que alguns existem dentro do claustro. Um regular, e pregador, foi já marcado com o ferrete da inconstitucionalidade: haverá outros muitos dentro da clausura, e aliàs homens conspicuos em literatura, e virtude apparente; estes serião os primeiros que se opporião aos beneficios curados; elles julgarião, e com razão que esta era a melhor estrada, que se lhes franqueava para caminhar a passos largos aos seus sinistros fins; e nós sem o advertir apresentariamos uma tropa de inimigos, não digo bem, uma tropa de generaes para com os seus adeptos (que havião de cathequizar) atacarem o nosso systema. Não se dá este perigo nos beneficiados de beneficios simplices: estes nenhuma influencia tem nos povos. Voto por tanto que os regulares possão ser providos nestes. Em quanto aos curados só quando pelas suas predicas, e outros actos tiverem dado decisivas provas da sua constitucionalidade. O simples titulo de regular, e só com o fim de facilitar a secularização não seja motivo para elles serem admittidos em beneficios curados. Eu seria o primeiro que votasse, e concorresse para que os mesmos regulares depois de secularizados fossem providos nelles. A secularização senão he um acto decisivo, e que constitua prova infallivel de liberal, ao menos já he uma demonstração de liberalísmo. Este religioso já não conservara aquelle afferro a parcialidades. A experiencia me tem mostrado, que muitos religiosos chamados dos claustros para curar almas sempre mostrão adherencia á sua religião. Voto por tanto a favor do artigo, mas modificado pela fórma seguinte: em lugar das palavras por concurso em quaesquer beneficios, diga-se, em beneficios simplices, ou ainda em curados, quando houver a respeito dos mesmos regulares provas incontestaveis da sua constitucionalidade.
O Sr. Barreto Feio: - Eu não sei nada de direito canonico, e por isso mesmo me julgo habilitado para falar nesta materia. O primeiro Rei do mundo (diz Voltaire) foi um soldado feliz; mas se eu recorro á historia dos antigos tempos, encontro fortissimas razões que me inclinão a crer, que o primeiro despota não usou de espada e capacete, mas de mitra e de cajado, e que pela tyrannia religiosa foi depois creada a tyrannia civil. Estes santos conquistadores, tendo concebido o vasto projecto de escravizar o mundo com a arma da superstição, pozerão em campo a sua milicia sagrada; escolhêrão os pontos que lhes parecêrão mais militares para nelles edificar conventos , ou praças fortes; e estabelecerão frades para os guarnecerem. Querendo nós agora reconquistar os nossos perdidos direitos, e dar a Deus o que he de Deus, e a Cesar o que he de Cesar, que deveremos fazer?
Sem duvida o mesmo que elles fizerão na razão inversa. Devemos abrir as portas dessas fortalezas, e com o provimento dos beneficios ecclesiasticos convidar os
frades a sair da clausura. He isto o que conseguiremos, approvando o artigo; e portanto eu o approvo como está. Não acho força alguma na objecção que fizerão alguns dos illustres Preopinantes, de que a sancção deste artigo lesaria os direitos dos ecclesiasticos seculares, que tem servido a igreja: por quanto se elles tem feito bons serviços, Jesus Christo que he o esposo da igreja, lhes recompensará devidamente na outra vida; porque o seu reino não he deste mundo.
O Sr. Ferreira Borges: - Tenho ouvido na discussão, muito vasta erudição canonica acerca da natureza dos regulares, e dos beneficios; mas como cada homem olha a questão por seu lado, eu olho-a por um lado que me parece se não tem ainda tocado; e julgo que quanto se tem dito sobre o artigo, não he muito a proposito. Tem-se questionado se devem entrar em concurso os regulares com os seculares, para serem providos nos beneficios ecclesiasticos; mas eis-aqui o que não se póde tratar, porque quando se venceu o artigo 1.°, venceu-se que os religiosos, pelo facto da secularisação, ficavão habilitados para todos os ministerios e beneficios ecclesiasticos, como quaesquer outros clerigos seculares. Logo não póde tratar-se mais da questão. Do que se trata he de uma cousa restricta, e vem a ser, se se ha de alcançar uma bulla para todos, como aquella que até agora se alcançava de tarifa para cada um. Parece-me que sendo certo, que se póde fazer agora com uma só bulla, o que antes se fazia com tantas, repetindo por cada uma o desembolso do dinheiro que vai para Roma, se lucrão essas riquezas que devem ser nossas, riquezas que eu não pertendo agora esmiuçar, porque há um livro bem conhecido, que analysa esta materia muito individualmente; e basta lançar os olhos sobre o tal livro, para se conhecer aonde chegavão esses abusos.
Digo finalmente que a primeira parte do artigo ja está vencida; e que a respeito da segunda, he ocioso dizer mais nada porque toda a questão se reduz a sabermos se te ha de impetrar uma bulla para todos estes casos, ou continuar como até aqui, a dar dinheiro por muitas bullas, para cada um dos individuos em particular. Debaixo deste ponto de vista voto pelo artigo.
O Sr. Domingos da Conceição: - Sr. Presidente, peço a palavra para sustentar o direito devido aos talentos e virtudes. Nos claustros existem religiosos benemeritos, que por falta de patrimonio ficarião privados das vantagens, que lhe offerece a nossa regeneração politica. Cumpre alcançar uma bulla para se poderem secularizar, e poderem ainda mesmo com o habito, fazer opposição aos beneficios, e magisterios de educação publica, e saíndo approvados, com o titulo da approvação requerer ao bispo a sua secularização, e servir-lhes de titulo para patrimonio o rendimento do mesmo emprego, para que se achão habilitados. Assim cumprimos com o nosso dever, offerecendo a esses infelizes um caminho amplo para serem sem despeza uteis á Nação, e felizes em o resto de seus dias. Com esta medida não se offendem os aspirantes aos beneficios ecclesiasticos, que no seculo tem empregado a seu tempo para este fim. O secular que vencer no concurso ao religioso, leva o beneficio. E se o religioso vencer por ter mais talentos, deu-se o emprego a quem o merece, e fica satisfeita a justiça.
Não nos illudamos. Os claustros encerrão dentro em si amigos e inimigos do systema regenerador.

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Illustremos a uns e outros, façamos-lhes todo o bem possivel, para que os mal intencionados, confundidos com as vantagens offerecidas por esta augusta assembléa, se tornem amigos da patria que lhes deu o ser, e sustento. Por tanto, voto a favor do artigo.
O sr. Andrade: - Sr. Presidente, se eu julga-se que neste artigo a palavra beneficio se entendia como a entendeu o Sr. Ferreira Borges, decerto diria que a discussão era inutil; mas penso que esta palavra tem aqui diverso significado, que no artigo primeiro: ali fala-se dos beneficios simplices, e não dos de cura d'almas, que são aquelles que se dão por concurso. Vejo que neste artigo se trata de duas materias; da impetração de uma bulla em geral, e ao mesmo tempo da permissão aos regulares, de poderem entrar em concurso com os clerigos regulares, para os beneficios. Tratando em geral da materia, ella se acha quasi esgotada; mas eu farei algumas breves reflexões, e tratarei de pôr em ordem as idéas que tenho ouvido manifestar.
He para mim de primeira intuição, que aos religiosos que ficão nos seus conventos por não terem meios de secularização, se lhes devem logo facilitar meios para entrar nos concursos, pois estes meios revertem a favor da sua secularização. A religião he necessidade não só d'alma, não só da vida futura, se não necessidade civil da vida presente: ella influe na moral, e he até mesmo quem a consolida; sem moral não ha bom regimen social, e sem religião não ha moral solida. He preciso que exista o principio de religiosidade; e não só este principio, mas até a religião potitiva, isto he, religiosidade com culto; e he preciso inculcar isto aos homens. Mas quem he capaz de inculcar isto melhor? O mais illustrado, e o mais virtuoso: logo he necessario escolher em qualquer classe, os mais illustrados e virtuosos, para ministros do culto.
A questão he agora, se em concorrencia com os ecclesiasticos seculares, devem ser escolhidos os ecclesiasticos regulares, quando nelles concorrão moralidade, e luzes. Diz-se contra isto em geral, que os ecclesiasticos seculares tem um direito adquirido, a que irião prejudicar os regulares: não sei porque; pois habilitar para ter um emprego, não sei que seja impedir aos outros que o possão obter, quando se achem com as qualidades necessarias. A lei que restringiu o circulo das habilitações, he a mesma, que ensancha, e póde ensanchar este mesmo circulo; que he o que hoje ella faz, concedendo essa faculdade aos ecclesiasticos regulares. Mas disse-se que os regulares não empregarão capitaes, ao contrario dos clerigos seculares, e que seria injustiça frustralos da justa expectação, a que lhes davão direito o tempo e os gastos feitos. Este argumento, se prova alguma cousa, prova mais do que deve, e não he por tanto valioso, pois he bem conhecida a regra de direito: qui magis probat, nihil probat. Se só a despeza feita para uma habilitação fosse degráo para emprego, inepto e vicioso nenhum haveria que não pudesse allegar esse merito. E seria de razão empregado, so porque dispendeu em habilitar-se? Não por certo. O bem da sociedade é o melhor desempenho do serviço, he o farol que nos deve guiar na escolha dos
pretendentes. O indigno, embora dispendesse para se tornar digno, se he preterido, de si e não dos mais tem de queixar-se. Objectou-se tambem, que senão um contrato e sociedade o feito entre o frade e a religião, não podia este abandonala sem consentimento della. Mas este raciocinio provaria que nem com causas justas podia o frade abandonar a sua corporação; o contrario do que já foi sanccionado, e com razão. Só o poder soberano he que cria os corpos collectivos ; elle só tambem póde extinguilos, e muito mais modificar a sua continuação; não he o frade quem rompe o contrato, he o poder social quem novamente põe condições ao contrato, que permittiu, sem renunciar ao direito de extinguir ou restringir a associação, uma vez que assim convenha ao bem de todos. Allegou-se tambem a analogia dos beneficiados, que não podem largar os seus beneficios, e pertende-se que da mesma sorte não possão os frades abandonar a religião a que se ligárão. Mas não se viu, que a analogia he quasi nenhuma entre objectos tão differentes, e que com quanto não possão a seu arbitrio os beneficiados largar os seus beneficios, por serem um onus a que estavão sujeitos, póde porém a legitima autoridade removelos, quando assim convenha ao bem da igreja; e que nada mais se faz neste artigo a respeito dos frades; permitte-se-lhes saír de um encargo, mas para tomarem outro, em que mais interessa a igreja.
Tem-se opposto igualmente que tal medida era contraria no estado proprio do monaquismo; que os monges são dedicados á vida ascetica, e comtemplativa; e por isso mesmo pouco uteis para a vida activa: mas creio que não se reparou que bem que a vida dos monges fosse no Oriente a vida comtemplativa, similhante instituto não podia durar nos climas do Occidente, onde necessariamente havia de influir a nattureza; além de que, vemos que nem ainda no Oriente estavão os monges sómente dedicados á vida contemplativa, pois que lhes era prescripto o trabalho. E que não devemos nós a essa bem entendida actividade dos monges? Devemos aos bernardos o rompimento de muitas terras: aos jesuitas (sociedade que talvez fosse a que fizesse mais bens e mais males á especie humana) grande illustração; e muito se deveu particularmente em Franca á sua celebre corporação de São Mauro. Isto seguramente não se conseguiu sómente com a vida ascetica, mas sim com a vida activa.
Mas tem-se dito que isso produziria espirito de servilismo, e de desordem; e citou-se para o comprovar a historia dos velhos tempos de Inglaterra: tambem se poderia ter citado a historia das desordens de Constantinopla, e Alexandria: não se reparou porém que estes tempos não são aquelles; e que outros tempos, outros costume. Nos tempos velhos, onde em verdade a Instrucção, e as luzes erão rarissimas, os monges não se exceptuavão dos outros homens, participavão da mesma ignorancia, e dos mesmos costumes; erão tão viciosos e servis, como erão os outros. Demais, o espirito do corpo desapparece; quando o corpo se desfaz, ou ao menos quando os laços do corpo se enfraquecem, que he o que se vai a fazer agora, sendo por outra parte util aproveitar homens que adiantem os interesses sociaes.

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Disse-se tambem que era opposto á disciplina actual: estou de accordo; mas não era opposto á disciplina velha: na disciplina velha empregavão-se igualmente os ecclesiaticos regulares, e os seculares, e até leigos; e a historia nos lembra que estes forão empregados em altas dignidades. Exempli gratia: S. Ambrosio, de leigo, foi eleito arcebispo de Milão. Depois estabeleceu-se nova disciplina; mas impetra-se a bulla para a dispensa, até onde chega a jurisdicção papal, reconhecida na Igreja catholica. Voto pois pelo artigo.
O Sr. Aguiar: - Supposto a materia esteja sufficientemente debatida, e não seja possivel dizer nada de novo; com tudo eu me levanto somente para fazer algumas reflexões sobre dois principios que aqui ouví ponderar, porque de certo a não serem esclarecidos, poderião influir na votação, pró, ou contra o artigo; nem se infira do que acabo de dizer, que o meu fim he advogar a causa dos regulares, porque eu ja mais defenderei um frade sómente porque o he, assim como não hei de criticalo tambem porque o he. Não quero que os empregos se dêm aos homens por pertencerem a esta, ou áquella classe, senão que se dêm ao merecimento em qualquer parte que elle se ache: estou por tanto pela opinião de um illustre Preopinante, que propoz fosse uma qualidade para serem preferidos nos concursos dos beneficios, a adhesao ao nosso bom systema, porque vejo quanto isto póde influir na prosperidade geral, e socego publico, e não obstante estar previnida esta materia no decreto que regulou as attribuições do conselho de Estado em quanto a escolher para os cargos de magistratura, etc., pessoas que tenhão constitucionalidade, exijo que isto se declare tambem para os parocos, porque em verdade tem muita influencia; e até para que não veja posto em pratica o que desgraçadamente aconteceu em algumas provincias do Brazil quando chegarão as primeiras noticias da nossa feliz regeneração, e que os povos sacudirão o velho despotismo, installando as suas juntas provisorias, valendo-se alguns parocos do proprio confessionario para perguntar aos penitentes o que pensavão sobre a presente ordem de cousas, e se erão ou não constitucionaes. E como os povos cumprem o preceito quaresmal, confessando-se quasi sempre com os seus proprios parocos, se estes não forem constitucionaes, podem influir muito contra o nosso actual systema. Adopto por tanto na generalidade o que disse o mesmo honrado Membro, que não sejão admittidos para parocos, senão os que mostrarem do melhor modo possivel, que se achão animados de verdadeiros sentimentos constitucionaes.
Não posso porem approvar o que o mesmo illustre Preopinante avançou, dando a entender que quazi todos os frades erão anti-constitucionaes, querendo comprovar a sua asserção com factos que referiu de Hespanha. Primeiro que tudo, não temos dados sufficientes para dizer que todas as desordens, que tem tido lugar em Hespanba, sejão produzidas por parocos que forão frades, porque as folhas culpão a uns, e a outros, e por conseguinte não podemos pezar numa exacta balança, qual he o maior numero de parrocos inconstitucionaes, se os egressos, ou os seculares; mas o que he verdade, he que os acontecimentos de Hespanha não forão só produzidos pelos que diz o honrado membro, porque se esses egressos se não portarão bem, não foi por terem sido frades, mas sim pelas circumstancias particulares em que se acha Hespanha, as quaes tem influido até nos corpos militares sem outras corporações diversas; e por isso senão póde argumentar dos factos de Hespanha para nós, até mesmo porque o numero de frades he alí incomparavelmente maior, e tambem maior o numero de conventos ricos supprimidos. Por tanto não posso deixar passar similhante principio, de que unicamente por terem sido frades, podem passar a ser parocos perigosos.
Tambem não posso approvar o que ouvi dizer a outro illustre Preopinante, que seriamos inconsequentes, por admittir os frades aos concursos, não os tendo admittido a votar nas eleições. Se se não admitirão a votar nas eleições, he porque então erão ainda frades; além de que elles não podem ser providos nos beneficios sem que se verifique primeiro a secularização; e por tanto não ha contradicção alguma.
Em quanto ao que o mesmo Preopinante disse, que são necessarias informações sobre merecimento y idade, etc., he justamente para isso que se estabelece o concurso, porque os prelados vendo concorrerem individuos do clero secular e regular, além de sua sciencia examinarão quaes são os que tem melhores informações, que melhor tem provado os seus principios de constitucionalidade; por conseguinte tambem não acho inconveniente algum por este lado. Por todo o ponderado voto pela doutrina do artigo, porque do contrario seriamos inconsequentes se o não approvassemos; pois sendo os nossos fins politicos preparar a extincção dos frades, por meios directos e indirectos, não o conseguiriamos inteiramente senão approvassemos o artigo, porque admittindo-se sómente a secularização sem os beneficios, só sairião uns dos clausstros e outros não, porque nem todos tem os mesmos meios, nem a mesma fortuna, e a sorte dos que ficassem seria na verdade bastantemente desgraçada. Por outra parte não conseguiriamos o fim de favorecer tambem a secularização dos regulares, que tendo ficado nos claustros, quizessem depois sair delles, o que só póde ter lugar impetrando-se para todos uma bulla, porque de outro modo se verião esses desgraçados na necessidade de recorrer a Roma, e ainda no caso de possuirem os meios sufficientes para procurar essas bullas farião graves despezas, absorvendo constantemente a curia romana immensos interesses.
Resumindo pois as minhas idéas, digo que não seremos inconsequentes, approvando o artigo, e que pelo contrario seriamos até injustos, se não procurassemos igualar a sorte dos frades que ficão nos claustros com a dos egressos. Voto por tanto pelo artigo.
O Sr. Trigoso: - Uma vez que está approvado o artigo 1.°, está approvada a doutrina do artigo 2.°; com tudo, apesar de eu achar esta doutrina incluida no artigo 1.° sempre desejaria que este artigo 2.° passase, e viesse a explicar o artigo 1.º, porque deste modo se evitarião os inconvenientes que se tem apon-

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tado, pois nos concursos examina-se sciencia, religião, constitucionalidade, costumes, etc. para fazer a comparação de todos os concorrentes, e não vejo a razão porque hao de ser excluidos os frades desta comparação. Em consequencia julgo, que não póde haver duvida em adoptar-se este artigo 3.°; a minha duvida he, se este artigo deve limirar o primeiro, ou se pelo contrario poderão os frades obter beneficios, sem ser em concurso. Eu desejaria que não podessem obter, senão os de concurso.
O Sr. Fernandes Thomaz: - Não ha mais que dizer sobre a materia, e eu me admiro, como se tem tido que dizer tanto sobre uma cousa tão clara. Que quer dizer gastarmos uma manhã inteira para decidir-mos se os frades, ou clerigos regulares, são cousa diversa dos clerigos seculares, e se aquelles podem, ou não dedicar-se á vida activa do seculo! Plangentes, non docentes, erão os frades em algum tempo: mas as cousas humanas mudão-se, e corrompem-se, e esta não podia deixar de ter a mesma sorte. Se o Congresso tem determinado que os frades sáião para fora, uma vez que não vivão contentes, porque razão não hão de poder entrar em concurso? Mas, dizem, ha muitos frades máos? E clerigos, não ha nenhuns máos? Ha muitos frades que não entendem dessas obrigações. E todos os clerigos as entendem? Além disso, se um frade póde ser provido n'um bispado, ou arcebispado, porque razão não poderá ser provido n'um beneficio de cura d'almas? Não entendo a differença. Um frade não póde entrar n'um concurso , e em um concurso legitimo e canonico, e pode com tudo ser eleito bispo para o que só concorrem muitas vezes os empenhos das senhoras etc. Não sei porque se ha de julgar isto legitimo e santo, e não se ha de julgar legimo e santo, que os regulares secularizados entrem em concurso com os outros clerigos para obterem aquelles beneficios de que se mostrarem dignos. Voto por tanto a favor do artigo.
Declarada a materia sufficientemente discutida, propoz o Sr. Presidente a votação o artigo, e foi approvado.
Passando-se ao artigo 4.°, disse
O Sr. Ferrão: - Debalde temos tratado desta materia, se agora não tiver lugar o additamento que eu fiz ao projecto do Sr. Borges Carneiro; nada vale quanto temos feito, uma vez que os convendos monacáes, e os que possuirem rendas não dem um patrimonio com que viver aos que sairem do claustro, porque sem isso nenhum saira para fóra. Eu não sei porque um convento que tem 80 mil cruzados de renda, e só 40 frades, não ha de dar uma pensão aos que queirão secularisar-se? Um frade que serviu por muitos annos a sua ordem, porque razão lhe não ha de dar a ordem patrimonio para sair della quando a sua consciencia o obriga a sair? Não he a ordem sua mãi? acaso são elles escravos que se lhes dê carta de alforria, ou são criados que se mandem para a rua, sem mais contemplação? Eu creio mesmo que os conegos regrantes dão patrimonio aos que se querem secularisar. E não se tema que os que se desfradão são inconstitucionaes. Eu tenho tido muitas cartas de frades tanto anonymas, como assignadas, nas quaes me segurão que os dois terços das suas corporações constitucionaes, e que sómente um terço não he constitucional, que se compõe de geraes, provinciaes, definidores, prelados locaes, e outros interessados no embolso das rendas dos conventos. Estes que perdem os lucros certos, o bom passadio sem trabalharem, não gostão da regeneração politica da nação, que lhes traz a sua ruina; todos os que trabalhão, e passão mal (principalmente os mendicantes observantes porque passão mal) todos são addidos á causa, todos amão a Constituição em que tem esperança de melhorar. Se em Hespanha tem havido frades á testa dos servis, são os interessados na existencia dos conventos, e talvez seja tambem a causa de lhes não pagarem as suas pensões: cá não ha esse receio: dê-se aos egressos patrimonio, e não tenha ninguem medo de que se tornem inconstitucionaes. O soberano Congresso decretou que ás freiras que quizessem secularizar-se, se desse uma pensão proporcionada ás rendas dos seus conventos; e porque razão se não ha de decretar o mesmo para os frades?
O Sr. Presidente: - Peço ao Sr. Deputado considere que por agora não se trata senão de impetrar a bulla.
O Sr. Ferrão: - Pois bem, impetre-se a bulla; mas estou certo que sem a medida que proponho nada conseguiremos, pois nenhum frade se quererá secularizar.
Propoz o Sr. Presidente o artigo á votação, e foi approvado como estava no projecto.
Seguiu-se o artigo 5.°, e sendo posto a votos, foi igualmente approvado.
Entrárão em discussão as seguintes addições propostas pelo Sr. Ferrão: 1.ª "Que os ordinarios da naturalidade, ou residencia dos religiosos que pertenderem secularisar-se, sejão obrigados a acceitalos na sua obediencia como presbyteros seculares. 2.ª Que os conventos dos monacaes, e os que possuirem rendas, dem patrimonio aos egressos em quanto não tiverem beneficio, ou congrua; e que os mendicantes egressos sejão logo providos nos primeiros beneficios, que vagarem em qualquer padroado secular, ou ecclesiastico; sendo os padroeiros obrigados a dar-lhes as competentes apresentações com preferencia. 3.ª Que todos os egressos, e os que para o futuro houverem de secularisar-se, sejão reintegrados em todos os direitos de cidadãos, podendo adquirir, possuir, e testar livremente; ficando abolida, e derogada para sempre, a injusta lei fiscal, que os tinha privado deste ultimo direito."
Depois de algumas reflexões, julgárão-se prejudicadas pelas votações que tinha havido sobre o projecto.
Tambem se julgou que não havia lugar a votar sobre a seguinte addição por já se achar providenciado a esse respeito: "Ficão prohibidas daqui em diante todas as admissões para ordens, e todas as ordenações do clerigo secular que se não achar constituido á data deste em ordens sacras."
Propondo-se depois á votação a outra addição, concebida nos termos seguintes: " Ficão igualmente prohibidas todas as admissões, ou acceitações para o estado regular, e entradas para o noviciado de um,

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e outro sexo, em quanto as Cortes não deliberão sobre esta importante materia, fixando o numero dos ministros necessarios para o culto, e o modo de serem ordenados. Julgou-se tambem prevenida pela ordem das Cortes de 21 de Março de 1821: porém que era preciso declarar que esta prohibia, não só a admissão de noviços, mas tambem de noviças, e que todas as que tivessem sido admittidas depois della; não possão professar.
Igualmente se julgou previnida pela mesma ordem a outra addição do Sr. Maldonado, concebida nos seguintes termos: "Que se deve desde logo intimar a Assembléa de Malta, que lhe he prohibido admittir a professar todo, e qualquer cavalleiro, sem excepção, sejão quaesquer que forem os annos de noviciado, ou numero de caravanas que hajão feito.
Tambem se julgou prevenida a outra addição do mesmo Sr. Deputado, concebida nos termos seguintes: - Que se passe ordem para que não possão (os cavalleiros de Malta) de hoje em diante melhorar de commenda.
Tendo chegado a hora da prolongação, annunciou o Sr. Presidente uma felicitação ao Congresso, de Joaquim Antonio de Oliveira, escrivão, e ministro Deputado da junta da fazenda da Paraiba do Norte, o qual se achava a porta: foi ouvida com agrado, e se mandou ter com elle a consideração do costume.
O Sr. Barroso, por parte da Commissão de fazenda, leu os seguintes

PARECERES.

1.° A Commissão de fazenda, para interpor o seu parecer sobre o requerimento do administrador da fabrica dos vidros da marinha grande, e sobre o qual já deu igualmente o seu parecer a illustre Commissão de artes e manufacturas, exigiu que o Governo informasse da importancia do rendimento da lenha que a mesma fabrica pagava á fazenda nacional, tirada do pinhal de Leiria, e foi informada que nada pagava, em consequencia de uma provisão da junta do commercio, de 5 de Março de 1811, que está junta. A Commissão não póde deixar de observar que esta fabrica tem uma protecção da mais alta importancia da Nação, que he dar-lhe gratuitamente o seu combustivel, o que se não concede a alguma outra fabrica
da mesma natureza. Com esta protecção, e com a isenção de todos os direitos, esta fabrica tem rendido para seus proprietarios milhões, como he publico. A
Commissão deixa á consideração do soberano Congresso se esta fabrica deve continuar a gozar deste especial soccorro que a nenhuma outra se concede, de se
lhe dar gratuitamente todo o seu immenso combustivel
Mandou igualmente a Commissão pedir informação do rendimento dos vidros estrangeiros, excepto os inglezes, ouvindo o administrador d'alfandega grande. Da informação consta que o rendimento medio dos 6 annos de 1815, a 1820, dos vidros estrangeiros, pelos direitos pagos na alfandega, era de 7:367$704 réis.
O administrador d'alfandega informa que he muito consideravel o consumo de vidros estrangeiros, que seus valores nas pautas são muito inferiores, e supplica que se proceda com a maior brevidade a uma nova avaliação e classificação; até ao presente os vidros crestalinos de toda a qualidade pagão por arroba dois mil e oitocentos, os de vidraças brancos e verdes, 1$600 réis, e os inglezes pagão a metade destes direitos. Não se póde duvidar que os direitos principalmente em vidros lapidados que são de luxo, são muito insignificantes, e que devem ter um grande augmento, até para favorecer uma fabrica estabelecida na Rua de s. Bento, onde já se fazem vidros lapidados, que não [...] aos estrangeiros.
He pois a Commissão de fazenda de parecer que se diga ao Governo mande á Commissão das pautas que remetta logo do soberano Congresso a parte dos seus trabalhos a respeito dos direitos sobre vidros, classificando-os e informando sobre seus valores, para se estabelecerem os direitos correspondentes, e isto com a maior brevidade, para se poder pôr em pratica, mesmo antes da pauta geral, tendo em consideração o tratado de 1810. Palacio das Cortes em 16 de Maio de 1822.
Manoel Alves do Rio;
Jose Ferreira Borges;
Francisco Barroso Pereira;
Francisco de Paula Travassos;
Agostinho José Freire.
Foi approvado.
2.° Os officiais maiores, e officiaes, amanuenses da primeira classe, e porterros das differentes secretarias de Estado, pedem se lhes torne extensiva a graça concedida a favor do official maior, e officiaes da secretaria das Cortes, de pagarem os novos direitos que deverem, em quatro prestações annuaes.
Parece á Commissão que se lhes deve conceder a mesma graça, mas sómente áquelles que se acharem nas circumstancias já declaradas no parecer da Commissão de fazenda, em sessão de 12 do corrente, isto he , os requerentes que já servissem em alguma das secretarias de Estado, ou de Portugal ou do Brazil.
Igual graça pedem os amanuenses da primeira classe da secretaria das Cortes. E parece á Commissão de fazenda que não podem ser attendidos por se não acharem nas mesmas circumstancias; e seria abrir um exemplo muito prejudicial a fazenda nacional. - Paço das Cortes 29 de Julho de 1822.
Francisco Barroso Pereira; José Ferreira Borges; Manuel Alves do Rio;
Francisco João Moniz; Francisco de Paula Travassos.
Sendo posto á votação, não foi approvado, nem mesmo com a emenda offerecida pelo Sr. Felgueiras que ás palavras: que já servissem em alguma das secretarias de Estado de Portugal, ou Brazil, acrescentava: ou em qualquer outra repartição publica.
O Sr. Secretario Felgueiras deu conta da redacção do decreto sobre a qualificação dos oppositores aos lugares de letras, ao qual se mandárão fazer as seguintes emendas: 1.ª que no 1.º artigo depois das palavras aquelles bachareis, se accrescente ou licenciados: 2.ª que no fim do mesmo artigo se accrescente: para que por aquellas sómente possa qualificara classe a que pertence, e por umas e outras o gráo de

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merecimento na classe a que pertencer: 3.ª que igual declaração se faça no 2.° artigo a respeito das leituras ao Desembargo do Paço; isto he, que sómente por ellas se qualifique a classe a que pertence o bacharel que tiver lido: porem que para qualificar o seu merecimento em cada uma dessas, classes se tenha tambem attenção às informações da Universidade.
Designou o Sr. Presidente para a ordem do dia o projecto sobre o empréstimo e consolidação da divida publica; e como se decidisse que houvesse hora de prolongação, apezar de não ser dia della, deu para então os pareceres de Com missões adiados.
Levantou-te a sessão depois da uma hora da tarje. - Basilio Alberto de Sousa Pinto, Deputado Secretario.

RESOLUÇÕES E ORDENS DAS CORTES.

Para Filippe Ferreira de Araujo e Castro.

Illustrissimo e Excellentissimo, Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portuguesa, tomando em consideração a consulta do senado da câmara datada em 30 de Julho proximo passado, e remettido ás Cortes pela secreteria de Estado dos negócios do Reino em o 1.º do corrente mez, representando que os desembargadores da casa da supplicação, que se achão desimpedidos, os ministros dos bairros em actual exercicio, e os vereadores, não chegão a perfazer o numero necessario para as presidencias das assembleas eleitoraes: resolvem que a falta que liou ver, possa ser supprida pelo ouvidor da alfandega, juiz de índia, e Mina, superintendentes da decima, e corregedores do eivei da cidade. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 2 de Agosto de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para Sebastião José de Carvalho.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza ordenão que a Commissão das pautas remetia logo ao Governo, a fim de ser com a maior brevidade transmittida ao soberano Congresso, a parte de seus trabalhos a respeito dos direitos sobre vidros, classificando-os, e informando sobre seus valores, para se estabelecerem os effeitos correspondentes, tendo em consideração o tratado de 1810. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 2 de Agosto de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para Candido José Xavier.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Gemes e Extraordinárias da Nação portugueza ordenão que pelo ministerio da marinha, sejão transmitidas ao soberano Congresso informações sobre o requerimento incluso de Desiderio de Sousa Pereira Leite, aspirante a guarda marinha da armada, ouvidos os lentes da academia da marinha. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade, Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 2 de Agosto de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza ordenão que lhes sejão transmittidas informações até que mez estão pagos os officiaes marinheiros empregados nos navios desarmados. O que Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exc. Faço das Cortes em 2 de Agosto de 18212 - João Baptista Felgueiras.

Redactor - Gavão.

SESSÃO DE 3 DE AGOSTO.

ABERTA a sessão, sob a presidência do Sr. Freire, leu-se a acta da antecedente, que foi approvada.
Lembrando o Sr. Presidente que lhe parecia não estar conforme ao vencido a declaração da emenda feita á ultima parte do artigo 1.° da redacção do decreto sobre as consultas para os lugares da magistratura, se venceu, e approvou novamente, a mesma emenda nos termos seguintes, salva a redacção - As informações do gráo de licenciado, e da leitura, serão as que devem, regular a qualificação do bacharel, ou licenciado, para ser classificado na 1.º classe; quando porém por estas informações não poder ser classificado na 1.º classe, devera ser presentes ao conselho de Estado as informações de bacharel, juntamente com as de licenciado, e os assentos de leitura, com as informações da universidade, para á vista de todas regular o conselho de Estado o seu prudente arbitrio.
O Sr. Secretario Felgueiras dando conta do expediente, mencionou
1.º Um officio do Ministro da fazenda, remettendo uma consulta da junta do commercio sobre o mesmo objecto da representação do administrador geral da alfandega grande, remettida em officio de 12 do mez passado, que se mandou remetter á mesma Commissão, para onde forão os outros papeis.
2.º As felicitações que ao soberano Congresso envião, por occasião da descoberta d a conjuração, o juiz de fora, e officiaes da camara de Castello Novo; do juiz de fora da Guarda; e do prior de Grandola, José Corrêa Baptista; que todas forão ouvidas com agrado.
3.° Uma carta de felicitação do provedor da comarca de Guimarães, por occasião de haver tomado posse do seu lugar, protestando a sua firme adhesão ao systema politico; que foi ouvida com agrado.
4.° Uma representação da camara e povo da Honra de Bacalhau, na comarca de Trancoso, enviando os seus agradecimentos pela extincção dos privilégios de foro, e pedindo providencias sobre os dizimos; ficarão as Cortes inteiradas quanto á 1.ª parte, e que
TOMO VII. E

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