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decreto, e ordens dos Cortes, que obrigárão aos requerentes pagar novos direitos de seus officios, mas lhe concedeu o satisfazelos em quatro prestações annuaes: e consiste primeiro em querer o mesmo superintendente lotar o rendimento dos mesmo officios com attenção ao interesse de serem os mesmos ordenados livres de decima; e segundo, que a prestação deve verificar-se, pagando logo um anno adiantado. Parece a Commissão de fazenda, em quanto ao primeiro objecto; que se as Cortes julgarão conveniente determinar, que os requerentes não pagassem decima de seus ordenados, que considerou como mezadas, he consequencia necessaria que não podem pagar novos direitos do que não recebem; em quanto ao segundo: determinando-se simplesmente conforme o parecer da Commissão de fazenda em sessão de 12 de Julho, que os requerentes fossem admittidos a pagar os novos direitos que devessem em quatro prestações annuaes, he uma interprelação bem violenta o querer, que os requerentes paguem desde logo adiantada uma das prestações, e até assim se tornaria desnecessaria a fiança que se lhe manda prestem ao pagamento.
Paço das Cortes 29 de Julho de 1822. - Francisco Barroso Pereira; José Ferreira Borges, Francisco de Paula Travassos; Francisco João Moniz.
Se os supplicantes se queixão de excesso do superintendente da chancellaria na execução de uma ordem das Cortes, ha meios competentes, onde se devem dirigir, não pertencendo as Cortes tomar conhecimento. Se vem pedir nova graça, diminuindo-se-lhes o pagamento dos novos direitos, que devem pagar, conforme o rendimento que percebem dos seus empregos, sou de parecer que não tem lugar esta nova graça. Por se conceder aos supplicantes uma graça especialissima, que nenhuns outros empregados publicos tem, de não pagarem decimas de seus ordenados, não se segue, que tambem não devão pagar novos direitos na proporção de seus vencimentos conforme a regra geral, segundo a qual os mais empregados publicos pagão novos direitos. Tambem não posso entender, que na graça da isenção da decima de seus ordenados, se entenda, a de novos direitos respectivos á mesma decima. Tambem não acho razão para se dispensar o decreto de 28 de Janeiro de 1800, que em casos identicos determina, que os devedores de novos direitos devão logo pagar o primeiro anno de prestações, que se lhe concedeu, tendo-se-lhe concedido o favor de pagarem em quatro annos o que devião pagar immediatamente. Sou por tanto de diverso parecer de meus illustres Collegas. Paço das Cortes em 29 de Julho de 1822. Manoel Alves do Rio.
Procedeu-se a votaçã, e em quanto ao primeiro objecto não foi approvado; e se declarou que não competia as Cortes: em quanto, ao segundo tambem nãa foi approvado.
Leu-se mais o seguinte

PARECER.

Raimundo machado de Mattos, mestre de primeiros letras na villa das Caldas da Rainha, pede augmento de ordenado.
A Comissão de instrucção he de parecer, que a este requerimento he applicavel o que se decidiu a 27 do corrente mez de Julho. Paço das Cortes aos 29 de Julho de 1822. - João Vicente Pimentel Maldonado; Francisco Manoel Trigoso; Joaquim Pereira Annes de Carvalho; Ignacio da Costa Brandão.
Posto a votos não foi approvado, e se declarou que não competia ás Cortes.
Deu o Sr. Presidente para a ordem do dia o projecto n.º 220, sobre a reducção da Patriarcal, e 213 sobre a regulação das ordens religiosas; e para a prolongação, pareceres de Commissões, comecando pelo da de marinha, impresso n.° 263: e levantou a sessão depois de uma hora da tarde. - Basilio Alberto de Sousa Pinto, Deputado Secretario.

RESOLUÇÕES E ORDENS DAS CORTES.

Para Sebastião José de Carvalho.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza mandão convocar a V. Exa. para vir assistir a discussão que se ha de continuar em sessão de 9 do corrente mez sobre o incluso projecto n.º 247, ácerca do emprestimo, remettendo-se para instrucção o parecer n.° 247, e a copia do que a respeito delle se acha resolvido. O que participo a V. Exa. para sua intelligencia e execução.
Deus guarde a V. Exc.ª Paço das Cortes em 6 de Agosto de 1822.- João Baptista Felgueiras.

Redactor - Velho.

SESSÃO DE 6 DE AGOSTO.

Assim o Sr. Freire, Presidente, a sessão á hora costumada, o Sr. Secretario Sousa Pinto leu a acta da antecedente, que foi approvada, e o Sr. Secretario Felgueiras mencionou o expediente seguinte.
Um officio do Ministro da justiça, remettendo a resposta dada pelo reverendo bispo de Aveiro aos quesitos, que lhe forão feitos, em execução da ordem das Cortes de 6 de Julho proximo passado, que foi mandado remetter á Commissão ecclesiastica de reforma.
Outro do Ministro da fazenda, remettendo, em observancia da ordem das Cortes de 30 do mez passado, a resposta da junta dos juros sobre a época, em que se deixou de pagar o juro do papel moeda, que foi mandado remetter a Commissão de fazenda.
Outro do mesmo Ministro, remettendo um officio da junta provisoria do Maranhão sobre o augmento do ordenado, que conferio ao official maior da sua secretaria, e a resposta dada a mesma junta pelo ministro da fazenda em officio de 27 do mez passado, que igualmente foi mandado remetter á Commissão de fazenda.

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Outro do Ministro da guerra, remettendo uma felicitação feita a ElRei pelos officiaes do 1.° batalhão de caçadores da divisão dos voluntarios reaes de ElRei, acompanhada de uma circular do barão de Laguna, em consequencia da qual o mesmo batalhão offfereceu os seus serviços por mais dois annos, que se mandou remetter a Commissão, onde estão os outros papeis da mesma natureza.
Uma felicitação da camara da villa de Porto Alegre, capital da provincia de Rio Grande de S. Pedro do Sul, de que se fez menção honrosa.
Outra da camara da villa do Rio Pardo na provincia de S. Pedro de Rio Grande do Sul, de que igualmente se fez menção honrosa.
Outra do brigadeiro nomeado governador das armas da provincia de Matto Grosso Antonio José Claudino de Oliveira Pimentel, renovando ao mesmo tempo o juramento de adhesão a causa nacional, a Constituição, e as Cortes, que foi ouvida com agrado.
Um officio do governador das armas da provincia de S. Pedro do Sul João Carlos de Saldanha e Oliveira Daun, datado de 25 de Novembro passado, em que refere os acontecimentos, que tiverão lugar naquella provincia desde o tempo do seu commando, que foi mandado remetter a Commissão de negocios politicos do Brazil.
Um officio do coronel commandante do 1.° batalhão de caçaadores da divisão dos voluntarios reaes de ElRei Manoel Jorge Rodrigues, remrttendo os documentos pelos quaes o dito batalhão pretende verificar sua conducta civil, e militar, e abusos, que tem havido na divisão, que foi mandado remetter ás Commissões reunidas de gucrra, e, diplomatica, onde se achão outros papeis relativos a este objecto.
Varias felicitações, feitas ás Cortes pelo motivo da descoberta da conspiração: uma da camara da villa de Eixo, de que se fez menção honrosa.
Outra da villa de Alcoutim, acompanhada de uma representação, de que se fez menção honrosa, pelo que pertence a felicitação, e se mandou remetter á Commissão de petições, pelo que pertence a representação.
Outra do tenente Rei governador interino da praça de Valença Antonio Joaquim Silvano, e outra do juiz de fóra da Certã, Romão Luiz de Figueiredo e Sousa, que forão recebidas com agrado.
Um offerecimento de uma homilia recitada em 7 de Julho passado, com recopilação de outras, feita pelo paroco de S. Matheus de villa Nova de Erra João Anacleto da Silva, de que as Cortes ficarão inteiradas.
Uma carta do Sr. Deputado Lyra, pedindo reforma de licença, em razão de se achar impedido de assistir as sessões das Cortes por falta de saude: e lhe foi concedido um mez.
Outra de José de Magalhães, Deputado substituto pela provincia do Minho, accusando o recebimento do aviso das Cortes, que o chamavão para vir tomar nellas assento, expondo ao mesmo tempo as causas de alguma pequena demora, de que as Cortes ficarão inteiradas.
O Sr. Secretario Felgueiras deu conta da redacção do decreto sobre o fixar a verdadeira intelligencia do 2.° do decreto de 9 de Maio do anno passado, relativo a qualificação dos oppositores aos lugares de letras, que foi approvado.
O Sr. Sarmento apresentou uma felicitação, feita as Cortes pelo motivo da descoberta da conjuração pelos parocos das freguezias de Affonsim, parada de Monteiras, e Bragado, que foi ouvida com agrado.
Uma carta do Sr. Deputado Ferreira da Silva participando a impossibilidade de assistir ás sessões das Cortes, e pedindo reforma de licença: e lhe forão concedidos vinte dias.
Um officio do Ministro da guerra servindo pelo da marinha, remettendo duas partes do registo do porto desta cidade, toma as no dia de ontem, uma ao paquete inglez Duque de Kent 2.º, vindo de Falmouth, e bergantim americano Spantam, vindo de Boston, outra á galera portugueza Vinte e seis de Fevereiro, vinda do Rio de Janeiro, de que as Cortes ficarão inteiradas.
Fez-se á chamada, e verificárão-se presentes 116 Srs. Deputados, fallando com causa legitima os Srs. Gomes Ferrão, André da Ponte, Bueno, Sepulveda, Feijó, Aguiar Pires, Lyra, Trigoso, Moniz Tavares, Xavier Monteiro, Jeronymo José Carneiro, Brandão, Almeida e Castro, Queiroga, Pinto de Magalhães, Berford, Faria Carvalho, Ferreira Borges, Gouvêa Osorio, Faria, Moura, Lino Coutinho, Sousa e Almeida, Zeferino dos Santos, Vergueiro, Araujo Lima, Bandeira, Salema, Silva Corrêa: e sem causa motivada os Srs. Arcebispo da Bahia, Borges de Barros, Baeta, João de Figueiredo Luiz Paulino, Sousa Machado, Costa Aguiar.
Ordem do dia. Entrou-se na ordem do dia pela discussão do projecto n.° 220 sobre a reforma da Patriarcal. (Vide Diario Tom. 5.° pag. 190).
O Sr. Rebello: - A Commissão ecclesiastica de reforma apresentou o projecto para a impetra da bulla da extincção da Santa Igreja Patriarcal, e restabelecimento da antiga Sé Archiepiscopal de Lisboa; e limittando-me a falar sobre a primeira parte deste projecto; entendo que ao saberano Congresso só incumbem duas cousas: 1.ª Tendo decretado a extincção da Patriarcal, deixar ao Governo a formalização das premissas. 2.ª Decidir que aos ecclesiasticos que forem collados, e ficarem sem exercicio pela extincção da Patriarcal, de proverá de honesta subsistencia, em quanto não forem empregados em novos beneficios, ou ministerios. Quanto ao primeiro dos indicados objectos, parece-me que o soberano Congresso diminue da sua soberania, encarregando-se de ser o amanuense do Governo. O soberano Congresso decretou a extincção da patriarcal: era, e he da sua competencia, sem lhe poder restar o menor escrupulo. O negocio adquire o seu ultimo estado de evidencia, considerando que o beneficio ecclesiastico consta de duas partes; convem a saber: de uma porção de ministerio sagrado, que he conferido pela igreja, e de uma porção de fructos, ou rendimentos para subsistencia do beneficiado, que he conferida pelo poder temporal; fica claro por tanto, que para a creação do beneficio he preciso, que

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concorrão os dois poderes, cada um com o que exclusivamente lhe pertence; mas para o extinguir basta, que um delles lhe subtraia a parte que lhe toca: o que se diz de um beneficio, diz-se de todos aquelles de que se compõe uma cathedral, ou collegiada.
Applicando estes tão simples como evidentcs principios ao nosso objecto: o soberano Congresso decretou a extincção da Patriarcal como oppressiva ao Estado pela sua exorbitante despeza, e desnecessaria para a Religião, por exceder muito o decoro proprio do culto Divino, que aborrece a pompa, e o fausto mundano, mas quando se decreta a extincção da Patriarcal, determina-se o restabelecimento da antiga Metropoli Archiepiscopal, com a decencia e explendor que a ornava, ao tempo em que se creou a Patriarcal. Eis aqui o que compete ao augusto Congresso quanto a primeira parte do projecto: he preciso, que a Sé Apostolica concorra com o que he da sua competencia, ou seja para retirar o ministerio sagrado, conferido aos ministros de que se compõe a Patriarcal, ou para restaurar o Arcebispado antigo de Lisboa, que pela creação de Patriarcal ficou extincto. Não he o soberano Congresso que se ha de dirigir ao Romano Pontifice, he o Governo; por conseguinte ao Governo pertence formalizar as permissas. O soberano Congresso decreta, o Governo procura, e deve promover o cumprimento, e execução do decreto; a elle portanto incumbe fazer os officios e diligencias para isso necessarias. Acho pois que he abaixo das attribuições, e dignidade do augusto Congresso, convertendo-se em amanuense do Governo; ainda mesmo quando em obediencia ao soberano Congresso lancei como Membro da Commissão as premissas que se achão no projecto, e ainda que esteja persuadido que sejão decorosas, e verdadeiras. O mais a que eu poderia estender a latitude do augusto Congresso, seria lembrar ao Governo, que apresentasse na Curia de Roma premissas dignas de uma Nação, que reconhece os seus direitos, e o decoro que lhe pertence, e isto mesmo seria desnecessario, se me não recordasse das premissas que allegarão para a bulla de dispensa dos dias de abstinencia, nas quaes se a montoão tantas cousas desnecessarias, pequenas, e mal trazidas, que mais parece pertenção de um particular obscuro, do que exigencia de uma Nação, que precisa concordar o seu catholicismo com a sua subtistencia, e economia.
Pelo que pertence ao segundo objecto julgo que he preciso declarar-se, que a Nação ha de prover de subsistencia aos Ministros collados, que ficarem sem exercicio pela extincção da Patriarcal, porque sem isso o Santo Padre ha de ter duvida em conceder a bulla, e porque he da competencia exclusiva das Cortes o decidilo; e de justiça não deixar de o fazer. Nenhum benificiado tem direito a que se lhe conserve o seu beneficio meramente para elle estar occupado; mas todo o beneficiado, cujo beneficio se extingue pelo bem da Religião, e do Estado, tem direito á sua subsistencia, em quanto não fôr occupado em outro. Reduzo por tanto aos dois indicados objectos á minha opinião sobre esta primeira parte do projecto, e pelos fundamentos que deixo ponderados.
O Sr. Borges Carneiro: - O primeiro ponto que está em discussão limita-se a solicitar de Sua Santidade a bulla para a extincção da Patriarcal. Reparo logo nas palavras impetra das bullas, e desejo que se diga, da bulla porque não precisamos mais que de uma: estas bullas são mui caras, e bem basta os innumeraveis contos de réis, que nos tem levado innumeraveis bullas relativas á Patriarcal: só as da fundação custarão milhões; depois bulla para chapéo cardinalicio, bulla para meias roxas, bulla para não cantarem no coro, etc., etc.; cada uma destas não custou menos de 500$ réis: está na Ajuda uma casa cheia de bullas: nada demais bullas, que ha cá muita gente que tem fome: falemos em o numero singular uma bulla. Observo em segundo lugar, que para a dita impetra se não alleguem mais, nem menos motivos, que os que aqui estão designados, como aconteceu com a bulla da carne, para a qual se alegarão motivos pouco decorosos ao Congresso. e a Nação, é talvez alguns delles exaggerados. São tres estes motivos: 1.° a necessidade de applicar as rendas daquelle estabelecimento a amortização da divida publica, e as mais urgencias nacionaes: 2.° a necessidade de reverterem as igrejas os dizimos, que lhe forão tirados para sustentar o luxo da Patriarchal, e que estão por isso arruinados com o culto e freguezes: 3.º a permanencia e ampliação das causas porque o Papa Pio VI concedeu a Sua Magestade a faculdade de applicar as despezas publicas o remanescente da Patriarcal. E por quanto estes tres fundamentos se podem considerar temporarios, desejo que se acrescente a necessidade de restabelecer a agricultura por todos os modos opprimida, a qual nunca poderá melhorar, em quanto tiver para sustentar tão inuteis e ociosos estabelecimentos.
Supposta a verdade destes principios, já se vê que tenho tambem a pedir, que se risquem daqui as palavras; Patriarcal instituida para satisfazer a piedade magnifica do Sr. D. João; e se lhe substituão estoutras: a vaidade supersticiosa. Estou mui longe do honrar com o nome de piedade estas obras da vaidade humana, que se introduzirão na religião, quando são contrarias ao seu espirito, e trazem após si a ruina de tantos milhares de cidadãos sacrificados a nutrir com o seu sangue e suor a tantos occiosos e vaidosos, que se dizem viver no serviço de Deus. Que diria Santo Ambrosio se visse hoje aquelle luxo apparatoso? Diria: Aurun sacramentae non quoerunt neo auro placent quoe auro non emuntur. S. Bernardo vendo aquella pompa mundana, diria: O vanitos vanilatum! fulget ecclesia in parietibus, in pauperibus eget: suos lapides induit auro, suos filius nudos deserit: inveniunt curiosi quo delectentur, non inveninnt miseri quo sustentur. Diga-se pois na impetra: instituida pela vaidade supersticiosa do Sr. D. João V.
Parece-me bem que se diga a Sua Santidade que o Governo proverá á subsistencia dos beneficiados, e empregados da Patriarcal depois da extincção della: tenho porém nisto a duvida de que demorando-se (como he provavel) a chegada da bulla, se a Nação ha de aturar e suttenlar aquelles empregados superfluos que ahi ha, desneccssarios para o culto divino: sou

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de opinião que aquelles empregados civis se possão supprimir desde já, attendendo como convier a sua sustentação; e quanto nos ecclesiasticos diminuir-se já o numero que lhe parecer, pois com isso não deixa de ficar conservada a Patriarcal interinamente.
O Sr. Abbade de Medrões: - A impetra dessa bulla deve fazer-se com a maior simplicidade possivel, que não seja como a da carne, que tantas premissas lhe quizerão fazer, que desacreditou o Congresso, sem nós termos disso culpa; porque o povo que ignorava certas cousas as reputava como falsas, e attribuiu isto ao soberano Congresso; isto fez uma bulha immensa, eu sei que ha confessores que ainda hoje negão a absolvicção a quem come carne; por tanto nós não temos necessidade de expor ao Santo Padre mais de que a Patriarcal não póde ser mantida no estado actual pelo Thesouro, e pedimos que substitua o bispado de Lisboa ao seu antigo estado, e não precisamos dizer-lhe mais nada; em quanto aos ministros collados que tem a Patriarcal, se lhes conservarão aquellas pensões conforme a sua dignidade, isto he o que se deve fazer; e não será máo que ao Governo se dê alguma indicação para que elle não possa entrar em duvida: este he o meu voto.
Julgada a materia sufficientemente discutida, o Sr. Presidente poz a votos o artigo, e foi approvado com as duas unicas alterações, a 1.ª substituindo em lugar da palavras para o pagamento, e amortização da divida publica as palavras para as urgencias do Estado; e a 2.ª supprimindo as palavras piedade magnifica.
Entrou em discussão o artigo 2.°
O Sr. Borges Carneiro: - Em quanto a esta segunda parte, relativa á restauração da antiga sé arcebispal de Lisboa, tambem me parece bom o parecer da Commissão, com as seguintes observações: 1.ª que em lugar de vinte conegos bastão certamente dezeseis; em lugar de vinte e quatro beneficiados dezeseis; em lugar do dezeseis capellães oito: este numero com as dignidades declaradas no projecto fazem um coro e cabido assàs lustroso, como convém a primeira sé de Portugal.
Tambem approvo e louvo o parecer da Commissão em quanto se approveita desta occasião para redificar todas as sés archiepiscopaes, ou episcopaes (pois julgo ser erro typografico falar-sse em collegiadas). Em verdade de que servem quartenarios, tercenarios, meios conegos, meios beneficiados, bachareis, gráos que não houve na antiga igreja, invenções da moderna superstição, que não se fartou de multiplicar seus inventos, como na arithmetica se poderão multiplicar as fracções, e os quebrados ?
Noto em terceiro lugar que se devem tirar as palavras: e que o cabido e todos os seus ministros serão reintegrados na fruição de todos as prerogativas de que gozavão ao tempo em que se creou a Patriarcal pois não se hão de dar a estes ministros em tempos constitucionaes tantos privilegios que tinhão naquelle tempo, muitos delles incompativeis com o actual systema politico.
Diz mais abaixo: " E a sé ha de ficar tendo todos os rendimentos que lhe pertencião antes da instituição da Patriarcal." Mas como se há de saber aonde parão hoje esses rendimentos, talvez já em grande parte trespassados a diversos possuidores? Quem sabe o que elles hoje importarão, sendo tamanha a differença dos valores? E se pelo andar dos tempos convier supprimir algumas prebendas, em dar-lhe outro destino? E deverá hoje ficar a sé com mais rendimentos do que tinha naquelle tempo? Por tanto o meu parecer he, que se adopte aqui a mesma medida que a Commissão muito sabiamente propõe abaixo para a capella Real, convém saber, que sejão chamados para o Thesouro todos os rendimentos que constar possuia naquelle tempo a sé metropolitana de Lisboa, e sem dependencia delles se estabeleção as congruas necessarias para a sufficiente, e decente sustentação da mesma sé, e dos seus ministros. A importante operação do systema Constitucional he quanto a rendimentos nacionaes tirar a quem tem de mais, e dar a quem tem de menos; e se até agora se não tem feito isso, a culpa não he do systema, porém dos que nelle collaborão; mas ha de fazer-se mais cedo, ou mais tarde. Por tanto o Thesouro addministre aquelles bens que são todos nacionaes; e estabeleção-se congruas sufficientes, e dotação da cathedral, as quaes se hão de pagar prontamente, pois os ministros já não poderão divertir os dinheiros das suas aplicações.
O Sr. Rebello: - Nesta segunda parte do projecto trata-se das clausulas com que se deve impetrar a bulla para o restabelecimento da futura Sé Archiepiscopal. Explicarei os motivos, que teve em vista a Commissão sobre algumas destas clausulas, e ratificarei a minha opinião sobre todas. A Commissão propõe, que se restabeleça a futura Sé com o mesmo numero de ministros, de que se compunha pela bulla de Bonifacio IX. Estes ministros erão ao todo 66; quando porém se creou a Patriarchal em lugar de se diminuirem, ou pelo menos não augmentarem, pelo contrario sabirão a 88, e portanto crescerão mais 23: a Commissão pois conserva o numero de 66 ministros 9 que lhe parece sufficiente para a decencia do culto divino; classifica-os pois de uma maneira diversa, do que elles o estavão pela citada bulla de Bonifacio IX e mesmo daquella porque actualmente o estão na basilica de Santa Maria. Reduz a 6 dignidades as 8 dignidades de que primeiro constava, fixa o numero de 20 conegos, 24 beneficiados, e 16 cantores, banindo meios beneficiados, quartanarios, bachareis, etc. por serem entidades indefihiveis, e inexplicaveis, que apenas será em para excitar desordens nos cabidos. Esta explicação porém dava a Commissão ao soberano Congresso, mas não quero que o Congresso a dê ao Governo.
Decidido já 9 que aos ministros collados da Santa Igreja Patriarchal que ficarem sem exercicio pela extincção da Patriarchal se ha de dar uma decente subsistencia, em quanto não forem providos em novos beneficios, ou ministerios, escuso demorar-me em mostrar a justiça, e necessidade de applicar o mesmo principio aos beneficiados collados da basilica de Santa Maria, que ficarem sem exercicio ao momento em que for instaurada a futura Se Archiepiscopal.
A clausula, de que se tranfira para o cabido da

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futura Sé Archicpiscopal a jurisdicção que agora reside no collegio patriarchal, a fim de o cabido a exercitar, sendo necessário, desde o momento, em que for instaurado, esta clausula, digo, nas actuaes circunstancias he indispensável, e a Commissão quiz por ella chamar a attenção do Governo para remover duvidas, que a este respeito podem occorrer, mas que são vencíveis sendo anticipadamente prevenidas.
A outra clausula de ser o cabido da futura Sc reintegrado em todas, e nas mesmas prerogativas de que gozava ao tempo em que foi creada a Patriarchal, restringe-se de sua natureza às prerogativas meramente ecclesiasticas, às providencias dos ministros entre si, aos vestidos sacerdotaes, e outros objectos desta natureza, lista visto que a Sé Apostólica não tem a soberania civil de Portugal para conceder prerogativas civis, assim como o soberano Congresso não tem a autoridade ecclesiastica para conceder prerogativas ecclesiasticas; e por isso quando a Commissão desfia, que a futura Sé seja restabelecida com as prerogativas ecclesiasticas de que gozava nem quer, que se peça a soma o que não he da sua competência, nem que se concedão ao cabido prerogativas civis, que sejão inconsistentes com a legislação civil existente, e que se adoptar para o futuro.
Finalmente a clausula de que a futura Sé Archiepiscopal seria levantada sobre amassa de rendimentos, de que constava a mitra, e cabido da antiga Sé, tinha em vista segurar a sua santidade, a subsistência dos ministros, de que se ha de compor a mesma Sé: todavia não deixarei de convir com o illustre Preopinante, que os ministros que se ha de compor a futura Sé tenhão congruas para sua decente sustentarão, deixando salvo para o futuro o modo, e a quantia por isso, que talvez então seja já chegado o momento de se estabelecerem congruas fixas, e tomar o Estado a si a administração das rendas: e tudo, o gue nesta parte ha a prevenir compete ao Governo, segurando á Santa Sé os emolumentos, que lhe possão competir pelo estabelecimento dessas congruas na occasião em que se executar a bulla.
O Sr. Corrêa de Seabra:- Sr. Presidente, uma das razoes, porque não assignei este projecto sendo Membro da Commissão foi o entender, que elle não correspondia às vistas, que o Congresso teve quando decretou, que se impetrasse bulla da Sé Apostólica para que se supprimisse a Patriarchal, e se restituísse a antiga Sé Archiepiscopal: as razões que então se deixão, e são as mesmas do projecto, reduzem-se á necessidade de economia (diminuindo as despezas o que o estado do thesouro exige), e de fundos para as congruas dos párocos; ora na forma deste projecto, nem uma cousa nem outra se consegue, porque reduzidos já como estão os benefícios da Patriarchal, e sujeitos aceitada, e organizada a cathedral na forma deste projecto com a renda correspondente, que deve assignar-se á mitra, tendo além disso de consignar-se dotação para a capella real, na qual o culto deve ser celebrado copa toda a decência e explendor, exigindo-o assim a piedade dos nossos Monarcas, e interesses sendo nisto mesmo a nação, não podendo tambem deixar de se attender na consignação que se fizer para a capella real, que necessita de fabrica ecoslsamento com o apparato correspondente, se vem a absorver a renda actual da Patriarchal, e nem o Estado, nem temos fundo para as congruas que de justiça se deveu aos párocos. Pelo que a minha opinão he que supprirnida a Patriarchal como está vencido, e a basilica de Santa Maria, se organize a nova cathedral da Sé Archiepiscopal tomando-se por bases a intuição da cathedral da igreja occidental, que contava de seis dignidades, desoito conegos, e doze beneficios, conservando-se unida á capella real como está: devendo todos os beneficiados tanto da Patriarchal como da basilica, gozar os seus beneficios em quanto forem vivos, e só quando vagarem por morte, ou de algum modo legal, os que não ficarem unidos á nova cathedral serão applicados para congruas, ou para outro fim segundo as bases que para isso se devem dar á authoridade competente.
O Sr. Rebello: - O illustre Preopinante não assignou este projecto porque infelizmente quasi nunca concorda com a Commissão, e ainda agora descubro o motivo porque o não assignou. O arbítrio proposto pelo illustre Preopinante he inadmissível: elle não se recommenda nem pela ecconomia, que pretexta, nem pela forma porque se havia de verificar. Extinctaa patriarchal cedem em benefício do estado todos os excedentes em quanto durarem ministros desocupados, a que se hajão de consignar congruas para sua subsistência, e pelo correr dos tempos virá o estado a perceber todos os rendimentos da patriarchal: esta he a grande economia , que o soberano Congresso teve em vista. O arbítrio do illustre Preopinante não augmenta, nem diminue os recursos para o estabelecimento de maiores congruas dos parochos. A supressão da basílica de Santa Maria, na qual tende o corpo moral, e o património da antiga Sé archiepiscopal he uma novidade deslocada, a que se oppôem as recordações da antiga metropoli, o desarranjo de grande parte dos ministros de que ao premente consta, e augmenta despegas em lugar de as diminuir, porque he preciso prover a subsistência dos desempregados da mesma basílica. Mas o que he mais impraticável he a idéa de se erigir a igreja occidental de Lisboa, e reunir-lhe á capella real. Em verdade no actual estado de cousas, quando o nosso grande trabalho consiste em cortar todas as confusões, e anomalias, eu não esperava que o illustre Preopinante propozesse mais uma confusão e anomalia. He preciso, senhores, que se não confunda o que pertence a El Rei, e á Nação. A capella real he relativamente a uma preeminente personagem, o que he para o particular o oratório, que tem em sua casa. Convém á grandeza de um rei catholico Ter uma capella decorosa, mas a religião não admitte que ella se ponha a par de uma cathedral. A religião não está sujeita a homem nenhum, pelo contrario ella socorre a todos, e todos lhe estão sujeitos.
A cathedral de Lisboa he a igreja principal da diocese, e o Rei a primeira ovelha do prelado diocesano.
Sejamos catholicos, e sejamos politicos. Como catholicos evitemos o erro de crear uma cathedral com o designio de servir de capella real, uma cathedral não se póde crear senão para uma diocese; e como politi-

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cos, não confundamos o que devemos á Nação, e a uma diocese com o que toca personalissimamente á piedade de ElRei. O soberano Congresso importa-se com o que pertence á futura Sé Archiepiscopal; e deixa a Sua Magestade o que diz respeito á sua capella: quanto ainda resta ao augusto Congresso, he consignar uma dotação para a capella real: visto, que ella não foi contemplada na dotação que se fez a ElRei; e disto se tratará na ultima parte deste projecto. Eis aqui a meu ver demonstrada a impossibilidade de admittir o arbitrio do illustre Preopinante como menos economico, pouco catholico, e inteiramente impolitico; daquelle arbitrio sobre os ponderados inconvenientes resultava ainda, que sendo a cathedral, como deve ser, no centro de Lisboa, seria ElRei obrigado a ir lá todos os dias rezar, visto ser a sua capella; e mettendo a cathedral no palacio de Sua Majestade para aproveitar a commodidade da capella real resultava então o escandalo, e o inconveniente de sujeitar o grande povo da capital a ir ao palacio de Sua Magestade para assistir, e se edificar com o culto divino da cathedral. Deixemos de uma vez confusões, e prejuizos, demos á religião, o que se lhe deve, aos povos o que lhe pertence, e a ElRei o que elle precisa como Monarca catholico, e teremos feito o que devemos.
O Sr. Abbade de Medrões: - Deve nisto buscar-se toda a simplicidade. Acho que este artigo se deve supprimir onde diz (leu), porque isto não pertence à questão em que estamos: a questão he sómente: (leu): até aqui está muito bem, e mesmo não acho que seja demasiado este numero, porque n´uma cathedral Metropole sempre deve haver toda a decencia. Diz o artigo mais para baixo (leu): se houver de passar esta Segunda parte, he preciso que haja a emenda do Archiepiscopaes, ou Episcopaes, ou senão Cathedraes: porque debaixo deste só termo se entendem ambas. Em quanto ao segundo, quando diz (leu): acho muito necessaria esta explicação para evitar duvidas. Não ha duvida alguma, que logo que o Bispo ordinario falece, a jurisdicção se devolve ao cabido: mas aqui não estamos nestas circunstancias: o Patriarca eivilmente não existe; a jurisdicção está por isso agora no collegio; mas como o cabido não existe, he preciso haver esta declaração, a pezar de que isto não valle nada, mas para tirar duvidas. Quanto ao que aqui se diz de Capella Real, isso não he precioso para aqui: a Capella Real nada tem com esta Bulla da Patriacal, de que agora trata o Congresso.
( o Sr. Presidente interrompeu o orador , dizendo-lhe que aqaella era a terceira parte da discussão, de que ainda se não tratou: o Sr. Abbade de Medrões continuou): mas, eu falo nella, porque um illustre Preopinante, o Sr. Rebello, tambem já tratou a este respeito.
Julgada a materia sufficientemente discutida, o Sr. Presidente poz a votos o artigo 2.º, e foi approvado até ás palavras cantores amoviveis: o resto do artigo foi supprimido. O artigo 3.º, depois de discutido, e posto á votação, foi approvado tal qual está, bem como o foi o artigo 4.°, com o unico accrescentemento depois da palavra prerogativas, as palavras, meramente ecclesiasticas.
Passou-se ao artigo 5.º, e depois de julgado discutido, o poz o Sr. Presidente á votação até ás palavras intituição da Patriarcal, e foi approvado, supprimindo-se as palavras que seguem depois da palavra instaurada, e substituindo em logar dellas seguintes: com os rendimentos sufficientes para decente sustentação dos seus ministros, e culto. O resto do artigo até final foi supprimido.
Passou-se ao artigo 6.°
O Sr. Borges Carneiro: - Sr. Presidente, resta falar-se da Capella Real, a cujo respeito he evidente, que como extingue a Patriarcal, na qual ella estava incorporada, he preciso tratar da sua dotação, o que esta dotação não deve saír da dotação d'ElRei; pois não se attendeu a isso quando se tratou de a fixar. O psojecto parece suppor que será preciso pedir bulla sobre este objecto, mas parece-me que sendo uma capella particular, que nada tem com a jerarquia da igreja, não ha que tratar disso, ficando ao arbitrio do Rei provella segundo sua vontade. Assigna a Commissão para a referida dotação a quantia de 24:000$000 de réis pagos annualmente pelo Thesouro nacional. Tenho por excessiva esta quantia, visto o juizo que já citei de S. Bernardo, e de Santo Ambrosio, a respeito do luxo nas igrejas, e capellas. Os sentimentos de ElRei sabemos muito bem todos os se dirigem a felicidade publica á de todos os seus subditos, e a conciliar a sua piedade com o bem estar da Nação: ora esta não póde presentemente com tão grande dotação, qual a que propõe a Commissão, que faria recaír um grande peso no Thesouro. Pelo que me parece que com 10:000$000 de rs. póde ElRei ter uma mui decente capella. Além disso a Commissão propõe que o Governo faça com que se lhe apresente uma relação dos vasos, paramentos, e mobilia da Patriarcal. Como ella está muito bem mobiliada, e paramentada, hão de sobejar muitos vasos, e mais peças: destes se deve dar á Capella Real quanto ella precisar: e tambem a nova Sé, e das mais peças de prata que restarem, levalas á casa da moeda, como fazia Santo Ambrosio, e os bispos de Italia, que mandavão vender para as urgencias do Estado os superabundantes moveis das igrejas. Por tanto concluo que me parece sufficiente 10:000$000 para a manutenção da capella Real, depois e mobiliada, e se pelo tempo adiante vier algum Rei que seja tão devoto como D. João V, que seja amigo de apparatos ecclesiasticos poderá satisfazer seus gostos por conta da sua dotação.
O Sr. Rebello: - A Commissão partio do principio, de que a ElRei pertence restablecer, ou organizar a suo capella real como lhe dictar a sua piedade, a qual o soberano Congresso não póde, nem deve pôr limites; e tambem se segue deste principio, que segundo a vontade de S. Magestade sobre o restabelecimento, ou nova organização da sua capella real assim se percisavão as bullas, a respeito das quaes do mesmo modo nada tem que fazer o soberano Congresso, por ser objecto privativo de Sua Magrestade. Como porém na occasião em que se estabeleceu a dotação de ElRei, não se contou com a despeza da capella real, por isso a Commissão propõe a dotação fixa

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de 24:000$000. He de notar, que o rendimento próprio da capella sobe a 12:500$000 e tantos mil réis, tirados de repartições fiscaes, entendeu a Commissão que para devida simplicidade tornasse o estado a si esses rendimentos, e pelo thesouro publico, se pagasse a consignação da capella real na occasião, e pelo modo, que pagasse a dotação de Sua Magestade. Reflectindo porém no aperto, em que se acha a Nação, e na impreterivel necessidade de recorrer a toda a possível economia, sou de opinião que a dotação da capella real se limite, e por fixe na consignação annual de 16:000$000. Com esta soturna poderá Sua Magestade formar a sua capella real com o decoro sufficiente, e accommodado á estreiteza das rendas, e despezas da Nação, e estou certo, que Sua Magestade achará muito justa, e rasoavel esta consignação, porque ninguém conhece melhor as urgências publicas, e não he tambem possível offerecer provas mais decisivas, e sinceras de que não deseja cousa alguma que peze desnecessáriamente sobre os seus súbditos. O arbítrio dos 10:000$000 de réis propostos pelo illustre Preopinante parece-me demasiadamente diminuto, e insufficiente para preencher o seu objecto e quando fé não adopte a consignação dos 16:000$000, que eu substitui ao parecer da Commissão, então não seria coherente alterar o rendimento actual da capella real. Quanto ao mais refiro-me ao parecer da Commissão.
O Sr. Barreto Feio:- Eu respeito muito o direito de propriedade: e como a casa do cidadão he, não só uma propriedade sua, mas um asilo inviolável, e o palácio he a casa do Rei; eu não sei se era ofender este sagrado direito, e devassar aquelle inviolável asilo, ir ali estabelecer uma capella, sem sabermos se era esta a vontade de seu dono: alem disso a escassez das rendas publicas não permittir, que façamos uma tal despeja. Parece-me por tanto, que o artigo deve supprimir-se, deixando-se á piedade de S. Magestade o estabelecer, e ornar a sua capella como, e quando quizer.
O Sr. Ferreira de Sousa: - Eu sou de opinião que este artigo fique adiado, até virem as bullas de Roma. Acho muito diminuta a quantia de 16:000$ réis porque he ainda preciso saber se nesta capella ha de haver beneficiados, cantores, músicos, etc. e para tudo isto só aquelle somma parece-me na verdade muito pouco. Por tanto isto deve ficar adiado até á extincção da patriarchal, então este Congresso, ou as outras Cortes determinarão a este respeito: es t a III o I na incerteza da sincera união do Brazil, não sabemos se daqui nos poderão vir alguns rendimentos, portanto acho muito conveniente não decidir este artigo nesta parte.
O Sr. Rebello: - Esta matéria não póde ficar adiada. Não se póde extinguir a patriarchal, e deixar de tratar ao mesmo tempo já capella real, que forma actualmente um corpo com a patriarchal. Bem entendido, que a extincção da patriarchal pertence á nação, e o restabelecimento ou nova organização da capella real pertence a ElRei. Não procede o argumento do illustre Preopinante, de que só depois de viram as bullas he que se póde calcular a dotação, que se
precisa para a capella real, visto que só pelas bullas se ha de saber o numero de ministros, de que o mesma capella ha de constar. Este argumento suppõe, que a curia do Roma he que ha de determinar o numero dos ministros, quando pelo contrario na supplica para a impetra deve ir declara-lo tudo o que pertence ao numero, e cathegoria doa diversos ministros, de que se houver de compor a capella Real. Torno a repetir a organização da capella real pertence a ElRei. O Romano Pontífice não governa o dinheiro que a piedade de Sua Magestade quizer empregar, ou deixar de empregar na capella real: o illustre Preopinante achando diminuta a dotação de 16:000$ réis, não mostrou, que a nação esteja em circunstancias de a aumentar. As Cortes futuras poderão aumentala quando a fazenda publica, e arranjamento dos negocios do Brazil o permittir. Entre tanto nem a evincção da patriarchal se deve demorar, nem ficar ElRei sem capella, extinguindo-se a patriarchal. Contemplo o illustre Preopinante as urgências do Estado que hontem occupárão o soberano Congresso, e citará, que o arbítrio e dotação que se propõe, ainda que não corresponde á magnificência que tem respirado a capella real, corresponde com tudo a situação em que nos achamos, e preenche o decoro indispensável, que se não póde preterir.
O Sr. Alves do Rio:- Sou de voto que se arbitre uma quantia para a sustentação da capella que ElRei a administre como quiser. A respeito do quanto deva ser, poço aos illustres Deputados attendão às necessidades publicas, às circunstancias do thesouro, e á decência da capella.
O Sr. Soma Machado:- Eu queria-me levantar para dizer que este he o parecer da Commissão. ElRei deve ficar com a liberdade de erigir a sua capella como quizer.
Julgada a matéria sufficientemente discutida, o Sr. Preopinante poz a votos o artigo e foi approvado tal qual eslava, substituindo tão sómente a quantia de 16 contos em lugar de 24 contos. O artigo 7.º foi approvado, assim como foi o artigo 8.°, e ultimo até às palavras - Sé Archiepiscopal - o resto foi supprirnido.
Entrou em discussão o projecto n.° 218 sobre a reforma dos regulares: (vide tomo V pag. 106.)
O Sr. Rebello:- Quanto ao voto separado dos dous Srs. que se separarão do projecto da Commissão, parece que a ordem pede que á proporção que forem mostrando doutrinas, que não approvem se vão oppondo ao projecto da Commissão como quaesquer outros Srs. Deputados.
O Sr. Corrêa de Seabra:- Sr. Presidente deve primeiro tratar-se a questão preliminar, se se hão de extinguir as ordens regulares, ou se se hão de reformar: se se vencer a extincção, deve então discutir-se o projecto da Commissão; se se vencer reforma, deve então entrar em discussão o voto separado offerecido por mim e pelo Sr. Bispo de Beja. Faço esta observação sobre a ordem, o que advirto para não ficar privado de falar sobre a matéria.
O Sr. Presidente: - A Commisão o que apresenta he um projecto de refórma.

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O Sr. Caldeira: - Para se poder chamar projecto do extincção, he preciso que o honrado Membro demonstre, que o he.
O Sr. Rebello: - A Commissão foi encarregada de apresentar «m projecto pura a reforma das ordens religiosas he o que faz com o projecto em questão. Se o illustre Preopinanle em Ingar da reforma das corporações religiosas pertende a sua extincção, pode apresentar o seu projecto, e se a reforma que se apresenta lhe não agrada, ir offerecendo outra melhor. Esta he a ordem.
O Sr. Borges Carneiro: - Parcce-me que a ordem deve ser discutirem se os cinco primeiros artigos que tratâo dos freires das ordens militares: e passar-se depois a discutir o artigo sexto até ao fim, que tratão das ordens monásticas. Quando se chegar ao artigo sexto, os Srs. que pertenderem a extincção das ordens monásticas, ou outra emenda, a podem então propôr.
O Sr. Presidente: - Os Srs. que quizerem estender mais as suas idéas, podem fazelo na discussão; esta he a marcha ordinária.
O Sr. Manoel António de Carvalho : - Sr. Presidente: estamos chegados ao ponto de tratar uma das mais essenciaes matérias, que se podem tratar para fazer a felicidade da Nação que se regenera. Desde os primeiros séculos em que principiarão a fugir da sociedade os homens, para se dedicarem a Deus, desviando-se de existirem na sociedade, todos os empregos se servião melhor, mas ou por um excesso de enthusiatmo pela religião, ou para se escaparem aos inales que lhes pesava setírer, elles forão com effeito habitar os campos, e muito lá concorrerão para fazerem a felicidade da agricultura, porém desde que os Príncipes começarão a apreciar muito o religião, estes homens buscárão nelles a duração dos seus interesses, e entregárão-se mais á meditação do que ao trabalho; principiarão pois a erigir conventos, e ainda que estes ao principio o erão, se converterão depois em casas e habitações de homens, que não parecião ter-se esquecido das cousas do mundo: ficando porém estabelecimentos meramente espirituaes; este fervor degenerou nelles, e principiarão estas casas a servir para regalo e descanço cheias de magnificência: cresceu isto immenso, e a um ponto tal, que a Nação se vê inteiramente offendida pelo grande fausto com que estes homens se tratão, e estas religiões se achão convertidas em mero luxo: as suas occupações sendo taes causão incommodo á sociedade. Ha outros que tirão a sua subsistência da piedade dos fiéis, e estes suo os das ordens mendicantes; muitas vezes tem entrado nas famílias talvez com olhos bem nocivos: he por isso preciso reduzir esta classe de cidadãos, quanto for possível aos seus primeiros institutos. Seria uma grande difficuldade querer de uma vez desterrar estes abusos, e até isto traria comsigo alguma injustiça: porém reformata he não somente útil, senão tambem necessário. Não tenho em geral que reprovar este plano que apresenta a Commissão, senão por me parecer muito diminuta esta reforma. Deve ser maior, porque sendo os conventos um mal para a sociedade; do mal quanto menos melhor. Irei por isso expondo TOMO VII os princípios, em que a reforma d a vê ser maior, do a Commissão a propõe: quando diz que só metade dos conventos podem ser supprimidos, eu assento que só deve ficar uma terça parte. Isto he o que me lembra em geral. Falando agora a respeito do artigo 1.º digo que me não parece útil que os conventos das ordens militares sejão os administradores das rendas delles: nós sabemos o máo modo com que esta gente administra os seus bens: elles fazem uma grande falta á sociedade, e por isso he necessário que ainda que se lhes deixem os que são precisos para a sua sustentarão, sejão só os sufficientes; porque são bens da Nação, para os sustentar, e não para lhe servirem para luxo. Senhores, he preciso que de uma vez estabeleçamos, que assim como he preciso sustentar os ministros do culto, devemos cortar-lhe tudo o que foi supérfluo, e lhe servir de luxo, pois que lodo o homem que se apartar desta regra do necessário, não se póde chamar verdadeiramente christão; e te isto manda a nossa santa religião a todos e quaesquer fieis, muito mais he recommondado no evangelho, e nas íeis sagradas, a respeito dos sacerdotes; e quanto mais alto he o seu ministério, tanto mais sóbrea deve ser a sua manutenção: mas como a experiência mostre que os seus bens não tem sido gastos como o devem ser, he necessário que o l besouro os reassuma, e que depois de a cada um delles decente sustentação. Voto por tanto que vá para o thesouro toda esta massa que pertence aos freires, e que delia se lhes arbitre uma sustentação decente: porque isto de meias rações, e rações inteiras, he uma cousa que eu sei bem como se faz.
O Sr. Borges Carneiro: - Eu limito-me presentemente a falar sobre o artigo 1.º, e o approvo. A primeira parte conserva aos contentos a administração de seus bens, dando contas, etc., conformo-me a este parecer, e impugno a opinião do illustre Preopinante que acaba de falar. O exemplo de Hespanha nos mostra, quanto mal fizerão em metter officiaes civis a administrar os frades. Estes officiaes administrar peior do que os frades: de Galiza sei eu, que os intendentes fizerão a cousa como muitos dos que nós por cá temos: thesouro nada melhorou, e os frades virão-se mal tratados, fóra dos seus conventos, • dependendo de seus parentes, ou amigos, pois não sei se o thesouro ali lhes paga alguma cousa. Os frades são cidadãos; porque razão a regeneração lhes he de ser funesta? A mesma política (se queremos attendella) reprova tal proposição.
Far-se hão muitos, e fortes descontentes. Não esperemos cousas que estejão fóra da razão humana. Os frades se tornarão inimigos da Constituição , se a refórma os desgraçar. Elles não só falão no púlpito; falão ao ouvido no confessionario, pelas praças, casas, e campos; e estando descontentes, são um exercito que combaterá invisivelmente a regeneração. Pelo contrario seremos justos, e racionaueis se fizéssemos a reforma de maneira, que se não dê justa razão de queixa a esta classe de cidadãos: os que tiverem assás juizo para quererem resuscitar pura o mundo com os dotes gloriosos de cidadãos, dem-se-lhes todas as commodidades que for possível, e como no século forem empregados, ou fallecerem, irão suas pen-

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tões vagando, e os que quizerem conservar a mortanha, tenhão os mesmos ecommodos que tem agora em quanto vivos. Em verdade posto que estes bens sejão nacionaes, tem as communidades a uso e posse delles; e em quanto viverem, será injustiça desapossados contra sua vontade, e polos á mercê dos fieis, para entregar os bens a officiaes publicos, que aliás hão de administrar mal, e sem proveito do thesouro. Faça-se uma refórma boa, e justa, e os frades, e freiras serão os primeiros que falem bem da regeneeação. Abrão se as portas, e segurem-se boas commodidades a quem quiser sair; feche-se a quem quizer entrar, teremos uma refórma, direi melhor, uma extincção progressiva, e gradual, que dará á Nação os bens que se desejão. Diz o artigo (leu parte delle). Eis-aqui uma medida muito boa darem os freires conta anual de suas administrações aos officiaes de fazenda; com isto primeiro conhece-se com exactidão qual he a collecta ecclesiastica de cada convento: segundo: como forem vagando estas rações, se vão incorporando no thesouro, isto he, não só á divida preterita, mas ás despesas publicas. Por tanto voto pelo artigo 1.º do projecto.
O Sr. Alves da Rio: - Eu approvo em geral o systema da Commissão: pelo que pertence a estas reformas deve-se ter em vista o bem do Estado, e da igreja; e porque alcançamos este fim approvo o systema da Commissão, e este artigo 1.º.
O Sr. Rebello: - Principia a discussão do projecto de reformas das corporações regulares. O primeiro Preopinante attacou o projecto com algumas reflexões geraes, e depois combateu tambem o artigo 1.º com argumentos especificos: A Commissão apresenta no preambulo deste projecto os fundamentos sobre que o edificou, e seria muito util, que de antemão fossemos de accordo sobre a approvação, ou desapprovação daquelles fundamentos, porque o projecto he todo calculado, e combinado na hypothese, de que elles devem passar. Alterados os principios geraes, em que deseança do projecto, altera-se todo elle. O primeiro Preopinante falou largamente sobre o estado progressivo das ordens religiosas; tomou os bens e os males, que ellas tem feito á Religião, e ao Estado; deplorou a decadencia das disciplinas dos institutos regulares; contemplou a oppressão, que causão á fazenda publica os religiosos patrimoniados, e o encargo que fazem á piedade, e caridade dos povos as ordens mendicantes, desapprovou em geral o projecto por diminuto, e combates o artigo primeiro por conceder aos freires mais rendimentos, do que elles podem precisar, concluindo, que os bens dos conventos das tres ordens militares devem ser administrados por conta da fazenda nacional, limitado os mesmos freires a uma subsistencia decente havida do thesouro publico, e privando-os das rações, ou meias rações, de que actualmente gozão. Eu não me encarrego de seguir o mesmo illustre Preopinante na longa, e espinhosa estrada da origem, progressos, e historia dos bens, e males, que as ordens religiosas tem feito á Religião, e ao Estado. Este vasto campo he proprio do historiador; quanto sobre isso se diga neste lagar apenas serve para sacrificar tempo sem proveito. O que nos importa he considerarmos as oprdens religiosas como ellas estão, profundarmos com olho critico e prudente os seus institutos em geral, e concebermos uma reforma pela qual, salvando o que he especial aos institutos regulares, e aos direitos adquiridos pelos religiosos existentes, augmentemos os bens, que as ordens religiosas conferem actualmente á religião, e diminuamos quanto seja possivel o gravame que possão fazer ao Estado, e a caridade dos povos pelos meios de subsistencia, que tirão da fazenda publica, ou da piedade dos fieis. Eis-aqui o grande objecto do legislador: foi este o alvo a que a Commissão desejou chegar, evitando elogios, ou censuras ás corporações, e institutos, como deslocados, inuteis, e impoliticos. Sobordinarei por tanto o discurso do illustre primeiro Preopinante ao indicado fim, para me não extraviar do meu caminho, e conduzir a questão ao que ella póde ter de interessante. Peço licença para dizer ao nobre Deputado, que a Commissão não propoz nem adoptou a regra de reduzir os conventos de frades a metade: pelo contrario a Commissão devidiu as ordens regulares em duas classificações geraes - patrimoniados - ou não patrimoniados - para as primeiras propõem o numero d casa religiosas, qae lhe parece sufficiente para commoda habitação dos religiosos de que ao presente consta cada uma das respectivas ordens; e para as segundas não designa o numero dos conventos, que devem substituir, limitando-se tão sómente a propôr regras geraes, que se commettem á circunspecção do Governo, para se regular por elas na execução da reforma.
Depois desta observação resta refutar o outro principio vago de que os conventos se devem reduzir á 3.ª parte. Se a reforma se podesse verificar com golpes legislativos tão faceis de enunciar, nada haveria mais simples, e mais facil; mas o negocio he mais escabroso. O legislador, que tem que contemplaras suas providencias com todas as affinidades politicas proximas e remotas precisa profundar, e reflectir mais do que profundou, e reflectiu o illustre membro. A regra da Terça parte dos conventos não satisfaz com certeza a commoda dos conventos não satisfaz com certeza a commoda habitação dos religiosos, de uqe actualmente constão algumas ordens religiosas; para outras he demasiadamente crescido aquelle numero de conventos, porque ha corporações que não tem presentemente religiosos bastantes para povoar devidamente a Terça parte dos seus conventos; e se por este modo se demonstra, queesta regra he inapplicavem ás corporações patrimoniadas, ella o he igualmente ás corporações mendicantes, que vivem da caridade dos povos, e que se não poderão reduzir a Terça parte de conventos, sem um de dois inconvenientes a saber: ou assignar prestações a esses conventos, que ficassem, o que a Nação não póde fazer, porque a fazenda publica o não permitte, e o não deveria fazer ainda que o permittisse, ou então entregar ás extremidades da fome, e da miseria os religiosos que habitassem esses conventos, por isso que se amonstoavão os frades, e não se lhesprovia de subsistencia certa. Passando agora a uma Segunda consideração he de advertir, que a politica pede que na execução da reforma se evite o prejuizo de desacreditar a proprie-

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dade rustica, e urbana pela massa enorme a que montaria de um golpe, se se deixassem vagos todos quantos conventos podessem sobejar da habitação dos actuaes religiosos, resultando daqui dois males immediatos; o primeiro aos frades que ficarião menos folgados, do que conviria: o segundo porque a fazenda publica perderia extraordinariamente nos edificios que vendesse por muito menos do seu valor, nos que conservasse esperando comprador, e em todos os bens de raiz, ou elles fossem vendidos, ou administrados, e ainda resultaria o prejuizo irreparavel da agricultura, que as corporações religiosas em geral promovem com desvelo; e que pelo menos contrabalançará o encargo, que as mesmas corporações formão no Estado pelo grande numero de individuos de que no presente ainda constão no seu total. Qual era por tanto a providencia que se devia adoptar? Parece que não havia se não o que adoptou a Commissão, designar o numero de conventos na porporção dos individuos de cada corporação patrimoniado, calculando esta operação parcial, e total de maneira que nem os conventos que ficarem, deixem de ter bastantes frades para os habitarem, nem os frades estejão amontoados, nem vaguem de um golpe mais conventos, do que aquelles que se possão destinar para objectos publicos, ou vender sem os sacrificios, e inconvenientes acima ponderados: medida esta, que decerto será muito excedida, se o projecto foi approvado na sua generalidade. Pelo que toca ao luxo em que o illustre Preopinante diz que vivem varias corporações regulares, esse inconveniente se existe vai remediado no projecto, porque por elle são chamados ao thesouro nacional os excedentes da decente sustentação dos conventos, e individuos, que ficarem existindo ao tempo da reforma.
Passando já a responder aos argumentos offerecidos contra o artigo 1.° refiro-me em grande parte á refutação, que lhe foi feita pelo penultimo Preopinante que me precedeu a falar. Pelo artigo 1,° se propoz a Commissão tirar dos rendimentos actuaes dos conventos das tres ordens militares os possiveis recursos para a Nação, sem attacar os direitos adquiridos pelos freires, e os principais commodos de que ao presente gozão. A Commissão conhece que os rendimentos destes conventos, pagos os tributos, collectas apenas chegão para decente sustentação dos freires, assentou por tanto, que devia conservar aos mesmos conventos a administração de suas rendas, aos freires o accesso a que tem direito de meias rações a rações inteiras; e porque entendeu, que a unica vantagem, que podia accrescer á fazenda publica, seria ficarem-lhe pertencendo as meias rações, ou rações inteiras, que forem vagando; e que para serem devidamente fiscalizadas não só estas rações, mas ainda os tributos, e collectas, seria prudente pôr a administração dos conventos debaixo da fiscalização das autoridades civis para isso competentes; por isso a Commissão adoptou esta providencia pela qual se concilião os interesses da fazenda nacional com os dos conventos, e freires: não sendo tambem difficultoso prever a extensão das vistas da Commissão combinando este artigo com os 4 que se seguem, e em geral com o plano do projecto. Não existe pois a hypothese, que suppoz o illustre Preopinante, de que estes conventos tem riquezas excessivas, tem as que lhe são indispensaveis para a sua subsistencia, salvas as contribuições, e collectas, e as despezas do culto divino.
O illustre Preopinante não ignora, que o decreto dos direitos banaes, o da refórma dos foraes, a collecta destinada para o pagamento da divida publica, tudo isto tem já produzido uma diminuição consideravel dos rendimentos destes conventos; e quando lhe chegar a lei do aumento de congruas parochiaes, então talvez não fiquem com o rendimento meramente necessario. Sempre que a opinião versa sobre uma operação pela qual se propõe uma economia, a obrigação de quem a propõe, consiste em mostrar o proveito que della se tira; eis-aqui o que o illustre Preopinante não demonstrou. Disse excellentes palavras, manifestou excedentes desejos, mas não passárão daqui as expressões do sabio Deputado, porque são inexequiveis. Diz, administre o estudo; e a administração da fazenda publica acha-se em tal perfeição, que o illustre Membro diga sem receio, que se lhe confie ainda a dos conventos das ordens militares. Não temos convindo todos que por entanto não temos administração publica de modo, que possamos assentar sobre ella alguma operação nova; e que em quanto a não crearmos importa não lhe aumentar os objectos, e difficuldades? Pois então para que nos illudimos com boas palavras. Supponhamos que o thesouro podia bem administrar os bens destes conventos, aonde mostra o illustre Preopinante o lucro que lhe resultava de se encarregar desta administração, e de ficar com a pensão certa de sustentar os freires. Se o illustre Membro lhe fizer bem o calculo, talvez conheça, que o resultado das suas palavras importa o contrario dos seus desejos. A administração dos bens dos conventos das ordens militares he fiscalizada pelos freires de modo, que he economica, e legalizada, visto que dos excedentes da despeza da communidade he que resultão as rações, ou meias rações; aproveitado por tanto este principio, e combinado com a providencia da fiscalização interior commettida á autoridade civil competente, entendo, que está feito tudo de modo, que a refórma conserva aos freires os commodos que tem, e confere á nação progressivos recursos, que não tem senão pela mesma refórma.
Lisongeava-se a Commissão, que tinha vencido a grande difficuldade de conciliar as vantagens dos reformados com as da nação que faz as reformas; e que este grande objecto seria particularmente contemplado pelos illustres Deputados, mas enganou-se porque o nobre Membro deseja de uma vez o que não pude obter-se senão por muitas, quer em um dia, o que o tempo deve fazer; e não se importa, que as reformas desgostem os reformados. Ora pois eu entendo tudo pelo contrario. A Constituição não póde ser amada, se ella se não fizer amar; uma nova ordem de cousas não póde progredir em prosperidade, quando uma porção consideravel da geração presente se achar em desgosto; he um dever respeitar os direitos adquiridos na boa fé das leis, que os conferião; deve ser uma maxima gravada no coração de todo o Deputado, que propozer um projecto de reforma, encami-

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nhar os objectos pela estrada real da prosperidade publica, sem transigir com prejuízos; mas tocar com dedos canmosos os empregados, e pessoas com quem entendem de perto as reformas: dar vida ao Estado com as boas reformas, mas não assassinar os reformados, nem atropelar os direitos, que lhes conferião as leis. Tenho em geral respondido ao illustre Deputado que atacou o projecto, e o artigo; e desenvolvido de passagem os fins da Commissão quando concebeo o projecto, de que se trata.
O Sr. Serpa Machado: - Ha duas questões sobre este objecto: primeira, se deve haver extincção ou reforma; segunda, o modo de a fazer. Quanto á primeira os illustres Preopinantes que tem falado sobre esta matéria tem dito muito bem; em geral tudo póde ré formar-só; mas ha cousas que o não podem deixar de ser. Applicando para aqui estes princípios, nós não podemos ainda extinguir as ordens religiosas, por isso que as ciências e os virtudes tem tido nellas grande brilho. Resta a reforma, e he preciso ver o modo porque se deve fazer. Parece-me que deve mathar-se debaixo de dois princípios: primeiro não fazermos os frades mais desgraçados daquelles se achão: segundo, tirar-se-lhes das suas rendas o que for sobejo, e fazelo reverter para o estado. Os frades já não podem voltar todos á sociedade a gozar della, uns pela sua idade, outros pelos seus votos, e outros pelas suas circunstancias; he preciso ter attenção com isto, porque seria uma cousa maravilhosa que no tempo da regeneração se fizesse uma reforma odiosa. He por isso que os artigos deste projecto não estão em harmonia com os princípios que já demonstrei: se acharmos preciso alguma reforma mais ampla façamola, mas coherentes com aquelles princípios. Nada de fazer os homens mais desgraçados do que estão; nada de reformas senão com o tempo, e de forma que se deixe a esta classe alguma cousa suficciente para a sustentação. Este he o meu voto.
O Sr. Corrêa de Seabra:- O illustre Preopinante o Sr. Rebello acaba de dizer, que he o redactor do projecto e que não tem em vista a extincção das ordens militares: neste sentido vou dizer- a minha opinião. O artigo diz, que continuará o acesso......mas que findo o accesso as meias rações serão applicadas para o estado, logo indirectamente fica prohibido o ingresso. Continua o projecto, que as rações inteiras vagando por norte ou por qualquer modo, a applicação tambem para o estado, logo ha de vir tempo em que as ordens não tenhão nem indivíduos, nem rendas, e por consequência as ordens necessariamente se extinguem; mas o illustre Preopinante diz que bem longe está de pertender a extinção das ordens: por tanto deve o artigo voltar á Commissão, para que aquelle primeiro o numero de indivíduos que ha de ficar tendo cada uma das ordens: segundo para que apresente as bases da reforma, tendo em vista o fazer estas ordens úteis á igreja e ao estado, debaixo das considerações políticas e religiosas, com que forão creadas estas ordens. No voto separado do Sr. Bispo de Beja e meu não tratamos destas ordens militares, porque julgamos que o Congresso, não tinha por ora Vistas de bolir nestas ordens, e que a sua reforma pouco tinha de commum com os outras ordens regulares, e necessitava por isso de um regulamento particular.
O Sr. Rebello: - A Commissão foi encarregada de um plano de reforma e apresenta este. He uma tendência de todos os homens quererem governar por toda a eternidade. O illustre Deputado por este principio quer que desde já se fixem conventos, frades, e institutos; e suppõe, que feito isto as Cortes futuras o respeitarião para sempre. A Commissão procurou não cair neste deffeito, lançou o projecto para o estado actual das ordens regulares, deixou para as Cortes futuras irem fazendo aquillo, que as circunstancias fossem exigindo. Por entanto ha convénios de mais, e frades de mais, por tanto a providencia consiste em diminuir estes conventos , e prohibir interinamente as profissões: quando para o futuro, as Cortes acharem que os conventos, e os regulares estão reduzidos áquella justa conta, em que possão ficar com proveito da religião, e sem inconveniente do bem do estado, as Cortes então o facão; ou pronunciem sobre a extinção das ordens religiosas. Quero persuadir-me, que não haverá já mais Deputado ou Congresso que hoje, e para o futuro entenda, que se devem sustentar corporações religiosas das rendas do estado, e bens nacionaes; por tanto até que se chamem ao thesouro as rendas, e bens desta natureza, que disfrutão os actuaes regulares, e a que elles por ora tem direito; até este ponto digo he preciso que a reforma proposta continue. A Commissão não tem novas bases que propor; se o illustre Deputado tivesse querido assentir às suas conferencias teria observado o vagar, a circunspecção, e o calculo em que lançou os princípios, em que se fundamenta o projecto. Se o illustre Preopinante julga, que os bens adoptados pela Commissão não são bons, proponha outros melhores; mas não tomar parte nos trabalhos da Commissão, e sem saber os motivos porque ella se decidiu por este projecto, talhar-lhe obra, he um pouco notável. A Commissão comprehendeu na reforma as ordens militares, porque tem no seu tanto, o mesmo a reformar que as demais: que outras fossem as idéas do illustre Deputado o prova o seu voto separado, mas não se segue dahí, que estas ordens deverão ser excluídas da formar.
Julgada a matéria suficientemente discutida, própoz o Sr. Presidente o artigo l.°, e foi approvado, substituindo-se tão sómente em lugar das palavras amortização da divida publica as palavras as despegas do estado.
Entrou em discussão o artigo 2.º
O Sr. Borges Carneiro: - Vi ha pouco estabelecer-se o principio de que aqui se trata de reforma, e não de extinção. Se se fala de extinção repentina estamos conformes, pois ella tem graves inconvenientes: quanto porém á extinção successiva essa he justa, vem-o succeder uma vez, que se não admitta mais ninguém para frade, porque com isso hão de algum dia acabar. Quando chegar esse tempo, as Cortes que então forem, farão isso como bem lhe parecer, pois creio não cairão no erro de crearem mais conventos de frades. Vindo porém já a falar deste artigo que propõe

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a extinção dos priores mores das ordens militares, e que os conventos sejão governados por priores locaes, eleitos pelos freires dos respectivos conventos, e confirmados pelo grão mostre, quem haverá que se opponha a tão sabia providencia? Quod omnes tangit, ab omnibus debet approbari, diz o direito canónico falando destas eleições. Cessará o despotismo, e a irresponsabilidade destes priorados, que a seu bel prazer tyrannisão os freires.
Não approvo porém que o projecto conserve aos actiaes priores mores em sua vida todos os seus rendimentos, porque estes importão em grandes sommas, e a Nação precisa de que não sejão devoradas por pessoas ociosas. Deve-lhes ficar quanto baste para sua sustentação decente, e os que a tiverem por outra parte, como commendas, benefícios, e outras cousas do estado, a esses não se lhes deve dar mais nada. Tem-se aqui commettido um grande erro em cousas deste natureza (he preciso confessalo) e um erro muito grande: em matérias de fazenda tem faltado a necessaria energia, digo sem medo de errar, tem-se fallado á justiça, tem-se errado o caminho: o tempo he que nos ha de mostrar o erro: a regra do systema constitucional, quando se trata de bens nacionaes, he o que os francezes chamavão nivelar, tirar aos que tem de mais, e dar aos que tem de menos: isso he porque se não tem feito ate agora mas o caso vai-se apertando, e a besta que não pode com a carga, em chegando a certo ponto deita-a a fora, ou deitasse no chão.
Ficou addiado por ter chegado a hora da prolongação.
Entrou em discussão o seguinte

PARECER.

A Commissão de marinha examinou um officio do Ministro da marinha de 7 de Março, remettendo uma consulta do conselho do almirantado, em que elle representa, que em consequência das portarias da secretaria de Estado de 19 de Novembro, e 3 de Dezembro do anno passado, se expedirão as ordens ao corpo da marinha para apronta execução do que nellas se ordenava; e que desejando o conselho accelerar os trabalhos das reformas, e dimissões ordenadas â vista das informações dadas pela corporação, e das secretissimas dadas pelos commandantes dos navios, a fim de formalizar o plano das reformas, tendo meditado sobre semelhante objecto, não póde deixar de expor as difficuldades, e obstáculos que encontra para conciliar as vistas de economia com o que dita a razão, e a justiça; pois que, pelas informações que derão os officiaes, não se póde colligir o merecimento de cada um; e o longo tempo que o corpo da marinha tem estado dividido, não permitte que o Concelho possa, com conhecimento de causa e justiça, personalizar os indivíduos, que devão (pellas suas circunstancias fysicas) entrar na reforma ordenada, e menos aquelles que possuo ser demittidos; porque não sendo justo demittir aquelles officiaes, que pelos seus serviços, e conducta se tem comportado de maneira, que as leis militares, e as mais não reprovão; e sendobem conhecido, que as demissões do serviço só se devem dar, ou a individuos que as requerem, ou aqueles que por erro de serviço lhes são dadas, procedendo concelho de guerra: attendendo mais a que as reformas feitas segunda a lei serião muito onerosa á fazenda, porque a maior parte dos officiaes, que se achão nestas circunstancias, estão em grandes petentes, e com muitas annos de serviço, e por tanto muito dispendiosa a reforma, parece-lhe, que se subdivida a escala em tres classes de officiaes; a primeira, os do activo serviço, que são todos aquelles, que pelas suas circumstancias fisicas, e moraes, devem estar prontos para todo o serviço: segunda, os que não sendo a sua profissão o serviço naval, com tudo obtiverão patentes, ou graduações militares: terceira, os officiaes impossibilitados de todo o serviço pelas suas molestias, e avançada idade.
A Commissão se conforma com a divisão, que propõe o concelho, devendo ser inteiramente (em quanto aos da 3.ª classe) até que as circumstancias do Thesouro permittão que ellas sejão reformadas nos postos, e com os soldos da lei; podendo estes officiaes, em quanto não são reformados, ser empregados em algum serviço em terra, compativel com as suas forças fysicas, tal como são commandantes de fortalezas maritimas, capitães de Porto.
Em quanto aos da 2.ª classe parece á Commissão, que não devem ser comprehendidos nella; mas sim na 1.ª todos aquelles, que tendo servido a bordo dos navios de guerra com as habilitações da lei, passarão depois para outro serviço pertencente ao ramo da marinha. - Sala das Cortes 12 de Maio de 1822. - Mariano Miguel Franzini; Francisco Simões Margiochi; Francisco Villela Barbosa; manoel de Vasconcellos Pereira de Mello; José Ferreira Borges.
O Sr. Franzini:- Sr. Presidente, a Commissão conformou-se com pouca differença com o arbitrio proposto pelo Almirantado, sendo indispensavel tomar uma resolução a este respeito para se poder dar execução á Ordem das Cortes sobre as promoções. A Commissão julgou necessario declarar expressamente que os officiaes devidamente habilitados não ficarão privados do direito que tem ao seu acesso, ainda que actualmente se achassem em exercicios que lhes tolhessem o embarque, como por exemplo, nos arsenaes, academias, e outros similhantes estabelecimentos. Offerecia grandes inconvenientes, quanto aos da terceira classe, ter que os reformar todos: pois que muitos existem desses officiaes, que podem ainda ser empregados em alguns fortes, em capitães de porto, e em outros similhantes objectos, pelo que se não deve determinar a absoluta reforma, sem que por isso fiquem impossibilitados aquelles officiaes de a requererem, no caso de a desejarem, e he isto o que procurou conciliar-se neste parecer.
O Sr. Serpa machado:- Eu conformo-me com o parecer da Commissão, mas parece que não ter contemplação com aquella classe... além de que me parece incoherente querer empregar officiaes impossibilitados de servir nas commissões que aponta. Então a mesma regra que estabelecemos para os empregados

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da marinha, devemos adoptar para todos os outros empregados, para sermos coherentes comnosco mesmo: por isso devemos estabelecer uma regra para esta classe, muito embora se lhe dê menos consideração.
O Sr. Vasconcellos:- A Commissão não exclue estes empregados; o illustre Preopinante está engfanado. O almirantado acha que se devem dividir em tres classes officiaes; primeira dos effectivos: segundo dos empregados; e terceira dos que por suas molestias se achão inibidos de servir. Estes homens de que falou o Sr. Serpa não se lhe tirão as suas patentes, mas o que parece de justiça he, que não devem entrar nas promoções com os outros que andão expostos á força dos elementos, isto he que a Commissão quer, diz, sejão promovidos, mas lá nos seus empregos. Quanto aos da terceira classe diz o Concelho, que devem formar uma classe á parte, e nisto he que a Commissão diz (leu) porque em quanto a estarem estes officiaes naquelles postos, vem a ficar reformados, porque a lei diz, que um official devetá ser reformado passados um nemero de annos do seu serviço; isto pertence-lhe de facto e com toda a justiça; as urgencias do thesouro não permittem que por ora isto se faça, e por isso o governo os poderá empregar no que convier como em commandantes de porto, praças maritimas, etc. Não me parece pois que a duvida do illustre Preopinante tenha lugar: estes officiaes formão uma classe, ficão com as suas patentes, mas não podem entrar em promoções com os activos, por isso que nunca embarcarão, e nem sabem o que he o mar.
O Sr. Vasconcellos:- A Commissão mandou perguntar ao ministro quem erão os officiaes que formavão a segunda classe, respondeu que aquella em que entrão os lentes. Julgou a Commissão que assim devia ser, pelas razões que eu já expuz.
O Sr. Guerreiro:- A respeito desta segunda classe approvo o parecer da Commissão: porque os officeas que entrarão a servir em repartições civis, querem entrar em promoções com os officeas activos, o que não deve ser popr não estarem no mesmo caso. A experiencia mostrou quanto era prejudicial, que alguns officiaes civis entrassem no exercito em promoções com os officiaes combatentes. Quanto aos que estão em outros serviços, e que não tem as habilitações da lei, he justo que sejão excluidos. Quanto aos da terceira classe, direi, que os officiaes depois do serviço prestado por elles um tanto tempo, adquirirão um direito á sua reforma: o negar-se-lhes esta reforma pelo motivo unico das urgencias e naõ estado do Thesouro nacional, seria o mesmo que negar a recompença a quem fizesse grandes serviços á patria, que essa recompença era difficultosa; parece-me que se pedirem a reforma, se lhes deve dar, porque a ella tem direito. Por tanto approvo o parecer da Commissão, menos quanto a esta parte.
O Sr. Barão de Molellos:- Sou contra a opinião da Commissão. Entre as razões que um illustre Opinante já produzido, tocou a incoherencia da illustre Commissão, quer que se empregassem em diversos serviços officiaes impossibilitados de continuar a servir.
Na verdade nada ha mais contradictorio e incombinavel!! Se a Commissão falasse só a respeito de certa natureza de serviços mais activos, e de certos officiaes em certa actividade, ainda poderia haver questão. Nada ha, torno a dizer, mais contradictorio, e mais opposto á justiça, á razão, e até á possibilidade; querer que officiaes que não podem servir, e que tem direito á reforma se não reformem, e continuem a servir! E nada menos que em commandantes de portos, e de praças maritimas como acabo de ouvir, empregados estes da maior importancia.
Sem que eu deixe de fazer o melhor concero da sciencia dos officiaes da armada, não os posso reputar tão proprios para governadores de praças, mesmo que sejão maritimas, porque o serviço das guarnições, a sua defeza, as obras de fortificação que lhes dizem respeito, a sua conservação etc. Tem muito mais relação com o exercito, que com a armada. A outra razão que o illustre Commissão aponta da falta de dinheiro no thesouro, só merecia attenção, se esta decisão se tomasse comprehensiva a todas as outras corporações, o que seria contra a lei, e pratica adoptada.
He por conseguinte contra a lei que permitte as reformas áquelles que estão em circunstancias de as obterem; o parecer da Commissão he finalmente contra a lei e pratica, dar governos de praças a officiaes de marinha, que sempre tem pertencido a officiaes do exercito.
O Sr. Povoas:- Eu conformo-me com a exposição que faz o Concelho do Almirantado. Quanto a primeira classe (leu) acho feita esta decisão.
Vamos á segunda (tornou a ler): será necessario fazer algumas observações sobre as pessoas que entrão nesta classe, alguns empregados civis, e tambem lentes não devem ter um titulo que lhe vá dar ascesso em todas as promoções: o serviço de lente he um serviço recommendavel; mas devem por esta circumstancia ficar fora da classe dos combatentes; mas não me parece que devão ficar com menos consideração que os seus camaradas; pelo que pertence á terceira classe (Leu), se elles estão impossibilitados pelas suas molestias, e tiverem os annos requeridos para a sua reforma, tem um direito impresceptivel a ella: mas a maior parte destes officiaes encintrarem um emprego civil, que lhe dê tanto, ou mais lucro que a reforma, não duvidarão talvez aceitalo. Conformo-me por tanto com o parecer.
O Sr. Villela:- Eu não sou official de marinha, e por isso posso falar nisto, a pezar de ser lente. Seria a cousa amis injusta, que aquelles que se habilitarão para a marinha, que servirão a bordo dos navios de guerra, e que nelles adquirirão postos, perdessem o direito ao ascesso, por serem chamados ao exercicio de lentes, em rasão de unirem a pratica de mar

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os conhecimentos theoricos, necessaros naquella profissão. Seria, accrescento ainda, seria um castigo similhante excepção para um indivíduo, por ter mais uma qualidade, que não tem outros seus camaradas. A Commissão, Sr. Presidente, teve nisto mui particular consideração, a fim de convidar para as cadeiras da academia da marinha homens, que além dos conhecimentos theoricos, tenhão a pratica do mar. Está determinado que nesta academia sejão unicamente admittidos a profissões os doutores ou bacharéis formados em mathematica. Ora qual será o official de marinha, que para accessar este emprego quererá dar-se ao encommodo de ir formar-se à Universidade, como alguns tem feito! E qual reciprocamente o bacharel formado, que para ter a pratica de mar, se resolva a embarcar nos navios da Nação; sabendo uns e outros que hão de vir depois a perder o seu adiantamento naquella carreira? Daqui se segue que não teremos já mais bons. professores, como cumpre que sejão homens theoricos e práticos nos ramos de marinha ; pois a cargo destes lentes está o examinarem todos os pilotos, e bem assim em geral o ensino dos que se destinão á vida da marinha, assim militar, como mercante. Julgo por tanto que se deve approvar o parecer da Commissão.
O Sr. Presidente poz a votos: se a matéria se achava suficientemente discutida, e se decidiu que sim.
Porque alguns Srs. Deputados falarão a respeito do parecer, mesmo depois de se julgar a matéria delle suficientemente discutida, disse.
O Sr. Fernandes Thomaz: - Sr. Presidente, vou a fazer um requerimento a favor da ordem. Depois de um negocio se julgar discutido, não se deve tornar a discutir. Uma vez que o Congresso decidiu, que uru negocio está discutido, não se deve conceder, á palavra a nenhum Sr. Deputado, nem mesmo com aquella estrangeirinha a bem da ordem. Eu roqueiro por tanto a observância da lei, senão foça cada um o que quizer.
O Sr. Presidente : - Eu tenho obrigação de fazer sustentar a ordem, mas como o negocio era importante, por isso aconteceu isto.
Julgada a materia sufficientemente discutida Sr. Presidente poz a votos a parte do parecer, relativa á primeira classificação, e foi a aprovada: e posta á votação a declaração sobre a segunda classificação, foi approvada com o addditamento seguinte: - Enquanto aos outros, não serão para o futuro comprehendidos na escala, e promoções de officiaes da armada nacional, mas só terão direito aos ascessos que lhe tocarem pela sua profissão posta á votação a declaração sobre a terceira classificação, foi approvada era o seguinte additamento: - ficando-lhes salvo o direito que tiverem ás suas refórmas.
O Sr. Pinheiro d'Azevedo, por parte da Commissão de instrucção publica, leu o seguinte

PARECER.

Muitos cidadãos de Tavira representão a necessidade em que estão, do ensino da filosofia racional, e moral, e propõe que se extingua a cadeira da lingua grega estabelecida cm Faro, para que se mantenha com ordenado desta a de filosofia racional u moral, que pedem seja creada em Tavira.
A Commissão de instrucção publica he de parecer, que não se extinga a cadeira de língua grega, e que fique reservada para a reforma geral dos estudos a decisão sobre o pedido da nova cadeira. Paço das Cortes aos 22 de Julho de 1822. - João Vicente Pimentel Maldonado; Joaquim Pereira Annes de Carvalho António Pinheiro de Azevedo e Silva; Ignacio da Costa Brandão; Francisco Manoel Trigoso.
Foi approvado.
Deu o Sr. Presidente para a ordem do dia o projecto n.° 388 dos artigos addicionaes á Constituição, e a continuação do projecto de hoje, n.° 218; e pareceres das Com missões para a prolongação: e fechou a sessão pela uma hora da tarde. - Francisco Xavier Soares d'Azevedo Deputado Secretario.

RESOLUÇÕES B ORDENS DAS CORTES.

DECRETO.

As Cortes Geraes, Extraordinárias, e Constituinses, da Nação portugueza, tomando em consideração as representações de vários bacharéis, e as consultas do desembargo da paço, e Conselho de Estado, transmittidas ás Cortes pela secretaria dos negócios de justiça, em data de 8 de Julho próximo passado, acerca da necessidade de fixar a intelligencia do artigo segundo do decreto de 9 de Maio de 1891, sobre a qualificação dos oppositores aos lugares de letras,
decretão o seguinte:
1.º Nas consultas para os lugares de Magistratura serão considerados em primeira classe aquelles bacharéis, que além do merecimento moral tiverem a sua literatura comprovada por três, ou mais votos de muito bom, sobre a pluralidade de bom, ou por dois prémios ao menos na carreira de seus estudos.
2.º Todos os concorrentes, que não estiverem nas circunstancias do artigo antecedente, com tanto que tenhão pluralidade de votos de bom, formarão a segunda classe, e serão Qualificados por um justo e prudente arbítrio do conselho de Estado, cujos fundamentos terão expressos na consulta, não só á vista das informações da universidade, ou dos assentos da leitura, mas também com attenção á prática do foro, c quaesquer outros documentos, que se produzão, de merecimento moral, e litterario.
3.° Quando o oppositor for licenciado, ou tiver Vido no desembargo do paço, o conselho de Estado se regulará somente pelas informações do gráo de licenciado no primeiro caso, e no segundo, pelos assentos da leitura para qualificar o concorrente em primeira classe. Quando porém por aquellas informações, ou por estes assentos não estiver o oppositor em primeira classe, uma vez que a ella também não pertença pelo outro principio de haver sido duas vezes premiado, serão presentes ao conselho de Estado as informações de bacharel juntamente com as de licenciado, e os acentos de leitura, a fim de que á vista de todos es-

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ses documentos o conselho fundamente o prudente arbitrio, nos lermos do artigo segundo. Em todo ocaso c conselho de Estado consultará somente para os lugares da magistratura os bacharéis, que ás qualidades supra requeridas unirem conhecido amor, e firme adherencia á causa constitucional, segundo se prescreve para todos os cargos em o artigo decimo sétimo do decreto de 22 de Setembro de 1821.
4.ª Fica revogada qualquer disposição na parte cm que for opposta á do presente decreto. Paço das Cortes em 6 de Agosto de 1822. - Agostinho José freire. Presidente; Francisco Barroso Pereira, Deputado Secretario; João Baptista Felgueiras, Deputado Secretario.

Para Filippe Ferreira de Araujo c Castro.

Illustríssimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinárias da Nação portugueza ordenão que lhes seja transmittida uma lista dos empregados na junta da administração do tabaco, com declaração de seus ordenados, e dos mais empregos, que cada um delles tem. O que V. Exc.ª levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exc.ª Paço das Cortes em 6 de Agosto de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Redactor - Velho.

SESSÃO DE 7 DE AGOSTO

ABERTA a sessão, sob a presidência do Sr. Freire, leu-se a acta da antecedente que foi approvada.
Mandou-se inserir na acta a seguinte declaração de voto: - O abaixo assignado na sessão de ontem 6 de Agosto, foi de opinião, que a nova cathedral da sé arquiepiscopal de Lisboa se instituísse tomando por base a forma, porque era organizada a cathedral da igreja occidental, conservando-se unida a capella Real como estava, e supprimindo-se a patriarcal, como estava já vencido, e a basílica de Santa Maria, e que nesta forma se impetrasse a bulia de Sua Santidade. - Corrêa de Seabra.
O Sr. Secretario Felgueiras deu conta do expediente, mencionando
Dois officios do Ministro dos negócios do Reino, remettendo as contas dadas pela camara da cidade do Porto, e pelo juiz ordinário do couto de Cucujães, representando duvidas e embaraços, acerca das presidências das assembléas eleitoraes; que se mandou remetter á Commissão de Constituição com urgência, para dar o sen parecer sobre aquelle, e outros embaraços sobro o mesmo objecto.
Um officio do Ministro dos negócios da justiça , r Pine l tendo o que havia recebido do chanceller servindo de regedor da casa da supplicação, com a copia da formula do juramento, que prestão os ministros daquella casa, e que está em perfeita opposição com o novo systema, que reconhece o principio da soberania da Nação como base do Governo constitucional; que se mandou remetter á Commissão de Constituição.
Das felecitações, que ao soberano Congresso digerírão por occasião da
descoberta da conjuração, os ajudantes do regimento de milícias da villa da Figueira; que forão recebidas com agrado.
O balanço da repartição do terreiro pertencente ao mez de Julho, remettido pela Commissão do mesmo terreiro; que se mandou remetter á Commissão de agricultura.
Uma carta do Sr. Deputado José da Costa Cirne, pedindo algum tempo de licença para se restabelecer do máo catado da sua saúde: forão-lhe concedidos quinze dias.
Feita a chamada, achárão-se presentes 119 Deputados, faltando com licença os Srs. Gomes Ferrão, Sepulveda, Aguiar Pires, Lyra, Trigoso, Miniz Tavares, Xavier Monteiro, Jeronymo José Carneiro, Costa Brandão, Almeida e Castro, Queiroga, Ferreira da Silva, Ramos, Pinto de Magalhães, Beford Faria Carvalho, Gouvêa Osório, Faria, Moura, Lino Coutinho. Sousa e Almeida, Martiniano, Fernandes Thomaz, Zefyrino dos Santos, Araújo Lima, Bandeira, Salema, Cirne; e sem causa reconhecida os Srs. Arcebispo da Bahia, Bispo de Beja, Borges de Barros, Varella, Souza Machado.
Passando-se á ordem do dia, entrou em discussão o projecto, contendo os artigos addicionaes á Constituição, relativos ao Reino do Brazil (V. a sessão de 2 do corrente). Lido o artigo 1.º, disse

O Sr. Girão: - Sr. Presidente, eu não teria duvida de convir na maior parte das coutas que se achão neste projecto, porque até a Commissão o fez, segundo as bases que lhe tinhão sida dadas, mas levanto-me porque minha opinião, em consequência das ultimas noticias chegadas do Brazil, he que se suspenda toda a discussão a este respeito. Ontem vierão papeis, nos quaes se conhece que a mão que os escreveu, he paga para metter a rediculo quanto aqui fazemos; bastava só isto para decidir que nada mais se fizesse, porque legislar para quem não quer obedecer, he dar motivo a Europa para que se ria de nós. Chegarão também ontem noticias de Pernambuco, que eu me não persuado sejão verdadeiras, porém que assegurão que adheríra ás suggestões do Rio de Janeiro: logo aquellas provincias não querem obedecer ás Cortes. Pernambuco une-se a ellas; para quem lemos de legislar? Além disso pegão em todas as palavras dos decretos e ordens das Cortes, e as interpretrão, dizendo que se dirigem a cóloniza-los; para que nos temos de estar a matar? Em uma palavra, não haja syllogismos que possão convencelos, se não os syllogismos de aço ; se tivéssemos dei mil homens disponíveis, que podessemos mandar áquellas províncias, talvez ficassem convencidos, e os decretos das Cortes serião respeitados; mas se não temos essa força, para que havemos de fazer leis, que não sendo respeitadas, nos hão de tornar objectos de escarneo?
A mim me vierão as cores ás faces quando li on-

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