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cidos, só venção um juro igual ao que vencião pelo capital: e foi approvada até á palavra pensões, e o resto rejeitado.
Passou-se ao artigo 4.º, que foi approvado. O artigo 5.º, sendo posto á votação até ás palavras aquella quantia, não foi approvado. Propoz então o Sr. Presidente a votação uma emenda offerecida pelo Sr. Sousa Pinto para o substituir, em que propunha, que o Governo contrahirá o emprestimo decretado a proporção das necessidades, que forem occorrendo, de maneira que não conserve capitaes accumulados: e foi approvado: o resto do artigo foi approvado; assim como igualmente o foi o artigo 6.º
Passou-se ao artigo 7.°: e sendo posto á votação, foi rejeitado. Propoz então o Sr. Presidente para o substituir a 2.ª parte de uma indicação de Sr. Travassos, em que propunha para hypotheca a quinta caixa temporariamente, até que vague a consignação ao barão de Teixeira, em cuja época será substituida por esta consignação, e o restante pelos rendimentos da alfandega, melhorada pela cessação do tratado com Inglaterra, sobre cuja indicação não houve votação, por ser retirada por seu autor. Propoz então o Sr. Presidente, que se autorize o Governo a poder convencionar com os mutuantes para a hypotheca sobre aquelles rendimentos correntes da Nação, que melhor lhe parecer: e foi approvado.
Os artigos 8.° e 9.º forão approvados. Alguns Srs. Deputados propozerão, voltasse este projecto á Commissão, para esta propor donde havião sair os juros respectivos áquellas dividas desde o 1.º de Julho de 1820 até 30 de Setembro do anno corrente, se as houver, e a que não fica obrigada a quinta caixa; e ao mesmo tempo designar o destino que devem ter as dividas procedidas por tenças, e pensões: e posto á votação, assim se determinou; assim como tambem se determinou, que á mesma Commissão se remettesse uma indicação offerecida pelo Sr. Fernandes Thomaz em fórma de projecto, sobre o pagar-se mensalmente a todos os empregados publicos, a quem a lei manda pagar a quarteis, e outra do Sr. Borges Carneiro, em que propunha, que o quartel actual dos ordenados, que já se principiou a pagar, se inteire a todos os empregados, que faltarem, a fim de que a Commissão, tomando-os em consideração, interponha o seu parecer.
O Sr. Presidente participou ao Congresso, que se achavão á porta da sala o Visconde de Villa Nova da Rainha, que vinha pessoalmente agradecer ao soberano Congresso a mercê da sua restituição a esta corte, e o coronal addido ao estado maior do exercito Caetano José Serejo de Carvalho, que chega do Rio de Janeiro, e que vem felicitar o soberano Congresso e protestar sua firme adhesão á causa nacional, o que foi tomado na consideração costumada, e que lhes fosse isto mesmo participado por um Sr. Secretario, o que se verificou pelo Sr. Secretario Barroso.
Deu o Sr. Presidente para a ordem do dia a continuação do projecto n.° 218 sobre a reforma dos regulares: e fechou a sessão depois das duas horas e meia da tarde. - Francisco Xavier Soares de Azevedo, Deputado Secretario.

RESOLUÇÕES E ORDENS DAS CORTES.

Para José da Silva Carvalho.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza concedem a Manoel da Costa, negociante do Pará, a licença que requereu para fazer citar o illustre Deputado em Cortes José Ricardo da Costa Aguiar de Andrade, o qual annuiu a esta pretensão do supplicante. O que V. Exc.ª levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exc.ª Paço das Cortes em 9 de Agosto de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para Candido José Xavier.

Illustrissimo e Excellentissimo Senbor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portuguesa mandão voltar ao Governo, para serem restituidos aonde competem, os inclusos autos de um conselho de guerra feito ao capitão tenente Joaquim Bento da Fonseca, commandante da escuna Princeza Real, remettidos ás Cortes pela secretaria de Estado dos negocios da marinha em 20 de Julho proximo passado, em virtude da ordem de 15 do mesmo mez. O que V. Exc.ª levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exc.ª Paço das Cortes em 9 de Agosto de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Redactor - Velho.

SESSÃO DE 10 DE AGOSTO.

Á Hora determinada disse o Sr. Freire, Presidente, que se abria a sessão, e lida a acta da sessão precedente pelo Sr. Deputado Secretario Soares de Azevedo, foi approvada. E se mandou inserir na de hoje o voto em separado dos Srs. Castro e Silva, Assis Barbosa, Fortunato Ramos, Peixoto, Corrêa de Seabra, Mesquita Pimentel, e Martins Ramos, dizendo: declaramos, que na sessão de ontem votámos contra o emprestimo de quatro mil contos, e de ficar a quinta caixa obrigada não só pela divida contrahida desde 24 de Agosto de 1820 até 30 de Junho de 1821, como da que pagou o thesouro de divida preterita antes de 24 do dito mez de Agosto.
O Sr. Deputado Secretario Felgueiras deu conta da correspondencia, e expediente seguinte.

OFFICIO.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - Achando-se terminada a favor do Sr. Infante D. Sebastião, quanto á posse, mas ainda não quanto á propriedade, a causa que pendia em Hespanha a respeito da casa do infantado que lhe competia por direito de sucessão, como filho do Sr. Infante Dom Pedro Car-

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los; e sendo uma das clausulas o dever Sua Alteza achar-se em terras de Hespanha até ao dia 20 do corrente; pareceu á Serenissima Senhora Princeza D. Maria Teresa, Mái, Tutora, e Administradora do Sr. Infante o dever acompanhalo, havendo precedido o consentimento de ElRei seu Augusto Pai, e a certeza da parte de Sua Magestade Catholica de ser a mesma Senhora alí considerada como Infanta de Hespanha; e contando Sua Alteza principiar a sua jornado no dia 12 do corrente; manda Sua Magestade fazelo assim presente no soberano Congresso. O
que rogo a V. Exc.ª queira levar ao seu conhecimento.
Deus guarde a V. Exc.ª Palacio de Queluz em 9 de Agosto de l822. - Sr. João Baptista Felgueiras - Filippe Ferreira de Araujo e Castro.
Ficárão as Cortes inteiradas.
Deu mais conta de um officio do Ministro dos negocios da justiça, remettendo a resposta do reverendo bispo de Beja aos quesitos, que lhe forão transmittidos em execução da ordem das Cortes de 6 de Julho, que se mandou remetter á Commissão ecclesiastica de refórma.
De uma representação da camara, e povo de Castelo Rodrigo, enviando as suas felicitações ao soberano Congresso por occasião da descoberta da conspiração, e agradecendo os beneficios, que tem recebido em consequencia da nova legislação: mandou-se fazer menção honrosa.
De uma carta de Sebastião José de Carvalho, remettendo exemplares da conta geral do commissariado do mez de Março do corrente anno, ultimo da sua administração, para serem distribuidos pelos Srs. Deputados: mandarão-se distribuir.
De uma carta do Sr. Deputado Joaquim Pereira Annes de Carvalho, pedindo o tempo necessario de licença para uso dos banhos de mar, de que carece: foi-lhe concedido um mez.
E de duas memorias, que offerece João Antonio de Paes Amaral, uma sobre a refórma da fabrica das cartas de jugar; e da fabrica das sedas, e outra sobre varios exclarecimentos para o bom desempenho do novo codigo, que se mandárão remetter ás Commissões competentes.
O Sr. Deputado Innocencio de Miranda apresentou uma memoria do cidadão José Ferreira sobre a fabrica nacional de lanificios de Portalegre, que se mandou remetter á Commissão de artes.
O Sr. Feio disse: - Um sargento de artilheria n.° 3, João Pereira da Costa offerece ao soberano Congresso uma memoria em que mostra a incompatibilidade da existencia de cadetes com o systema de Governo que felizmente havemos adoptado. E na verdade depois que a nossa Constituição, a mais sabia de todas as Constituições da Europa, estabelecendo a igualdade de direitos de todos os cidadãos, elevou tanto a classe da nobreza que a igualou em tudo á classe mais numerosa e mais attendivel da sociedade, a classe popular: eu não acho cousa mais incoherente do que a existencia dos cadetes. Por tanto requeiro que esta memoria seja remettida á Commissão de guerra e marinha, que, segundo a minha lembrança, forão encarregadas de dar o seu parecer sobre este objecto.
Mandou-se remetter á Commissão especial encarregada deste objecto.
Chamada. O Sr. Deputado Secretario Soares de Azevedo fez a chamada, e se acharão faltar os seguintes Srs. Deputados, a saber, com licença os Senhores Gomes Ferrão, Moreira, Arcepispo da Bahia, Sepulveda, Aguiar Pires, Lyra, Moniz Tavares, Xavier Monteiro, Jeronymo Carneiro, Costa Brandão, Almeida e Castro, Queiroga, Ferreira da Silva, Pinto de Magalhães, Berford, Gouvêa Osorio, Faria, Moura, Lino Coutinho, Sousa e Almeida, Martiniano, Soares Franco, Zeferino dos Santos, Bandeira, Salema, Silva Corrêa, Cirne, e sem causa motivada, os Senhores Bueno,
Ribeiro Saraiva, João de Figueiredo, Van Zeller, Baeta, Rosa, Isidoro dos Santos, Franzini, Vergueiro, Araujo Limo, Costa Aguiar, Souza Moreira.
Presentes 113.

Ordem do dia.

Entrou em discussão o artigo 2.º do projecto n.º 218 sobre a reforma das corporações regulares de um e outro sexo.
O Sr. Borges Carneiro: - Approvo o parecer da Commissão em quanto diz, que os freires elegerão todos os annos os seus prelados locaes, e que esta eleição dependerá da approvação do grão mestre. Ficão por consequencia extinctos os priores mores das tres ordens millitares, que são contrarios aos principios canonicos: quod omnes tangit, ab omnibus debet approbari, he no systema das ordens regulares um canon impreterivel: quem governa deve ser eleito por aquelles a quem ha de governar. A constante experiencia tem mostrado, que os priores mores nomeados pelo grão mestre, e só por elle amoviveis se tornão despotas e oppressores dos freires seus subditos, por estar fechado o caminho de se fazer effectiva a sua responsabilidade, visto sómente poderem ser castigados pelo Rei, e que constando que são vitalicios em seus cargos, não curão de se ajustar com as regras da ordem: o que não succederá assim quando no fim de um anno, ou triennio, se houverem de confundir outra vez com seus irmãos, e depender delles para serem reeleitos. Além disto, estas nomeações do grão mestre são modernas, e posteriores á instituição das ordens, segundo a qual estão estes prelados eleitos como propõe a Commissão. E quando a proposta desta se não houvesse de adoptar, eu proporia então que a communidade faça ao grão mestre uma proposta de tres freires, para elle escolher um.
Não opprovo a outra parte do projecto em que se diz, que os actuaes priores mores em quanto vivos forem conservarão seus actuaes rendimentos. Estes rendimentos são mui pingues, não sei se doze mil cruzados, e rações mui avultadas: e que fazem elles a pró da religião ou da Nação? Vamos coherentes em Portugal, onde o pão he dos ociosos, e o lucro está sempre na razão inversa do trabalho: cá o commum he aos que trabalhão dar-se-lhes com que apenas possão manter a triste vida, se he que isso mesmo se

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lhes dá; e aos ociosos, e regalões abundancia, e luxo e mais luxo. Por tanto o meu parecer he que os priores mores fiquem tendo tres mil cruzados, e o resto accresça desde já para as despesas da Nação, bem entendido, que os que tiverem outros rendimentos nacionaes, como commendas, beneficios ecclesiasticos, etc. se lhes descontem com os ditos tres mil cruzados; pois esta instituição dos priores mores, como não tem nada com a jerarquia da igreja, mas he uma mera comedoria humana, não ha que ter contemplações com ella.
O Sr. Ferreira de Sousa: - Não me posso acommodar á proposta extincção dos priores mores das ordens militares em quanto existirem as ordens; porque nellas exercitão os priores a jurisdição espiritual ordinaria, que o grão mestre não póde exercitar por ser leigo; e não ficava esta falla supprida com a providencia que a Commissão apresenta. Pois ainda que se autorizasse por quem compete esta nova fórma de eleição para prelados dos tres conventos de Thomar, Palmella, e Aviz, on ficavão os freires, que vivem fóra dos conventos sem prelado, em quanto por bulla se não mandassem sujeitar aos bispos, ou aliàs deverião concorrer todos para a eleição do prelado conventual pela regra do illustre Preopinante = quod omnes tangit, ah omnibus debit approbari =; o que mal se poderia praticar. Para melhor se entender isto he de saber, que segundo a actual disciplina os freires só estão sujeitos aos bispos no exercicio do officio parochial quando são parocos: em tudo o mais reconhecem por seu prelado ordinario ao respectivo prior mór: e assim se entende facilmente quaes são os inconvenientes, que agora resultarião da extincção dos priores. Tambem me não parece bem, que se tire ao grão-mestre a faculdade de nomear os priores mores, e que se reduza esta eleição ás ordinarias cabalas de eleições conventuaes, no estado actual das cousas perturbarião mais os conventos, e precipitarião a já decadente disciplina delles. Devo tambem lembrar que o prior mor de Christo he tambem prelado ordinario do convento de Thomar, que he um districto de consideração; e não ha de ficar aquelle isempto sem prelado. O meu voto pois he que nos deixemos por era destas novidades, que tem inconvenientes sem proveito, e que cuidemos de tantos negocios mais urgentes, que ha entre mãos.
O Sr. Rebello: - O primeiro illustre Preopinante concordou em parte do artigo 2.° e eu não duvido tambem concordar com algumas das emendas propostas por elle. O principal objecto deste artigo consiste em restituir aos freires conventuaes das ordens militares o precioso direito de elegerem os seus prelados. O illustre Deputado que primeiro falou desenvolveu as origens, e os fundamentos deste direito. Em verdade nada ha tão conforme á natureza das instituições claustraes, como a regra de que as respectivas communidades elegão os prelados que os hão de governar; e que estas eleições sejão annuaes. Os frades conhecem quem possue a necessaria prudencia para melhor os governar, e as eleições annuaes conservão os prelados dentro dos limites da moderação pela certeza de que a sua autoridade he temporaria, e pelo receio de que finda a sua prelazia fiquem abandonados ao despreso dos seus confrades. A natureza desta autoridade exigia ainda esta providencia. Um prelado local exerce dentro do claustro uma autoridade de descripção, igual ou maior á que exercem os pais de familias. As leis achão no sentimento da natureza, no amor paternal, e no respeito filial o apoio do patrio poder, e assim mesmo acautelão os excessos que delle podem resultar, quando em lugar de pais de familias apparecem homens apaixonados, desiguais, e injustos. Nos institutos claustraes reconhece-se a necessidade de conferir aos prelados locaes uma autoridade similhante á dos pais de familias, mas faltando-lhe o apoio da natureza he preciso suprilo pela providencia das regras claustraes; e esta providencia tem sido, e não póde ser outra senão as eleições annuaes feitas pelos frades, que conhecem quem he mais digno de os governar; que são os unicos interessados em eleger os melhores, e que obedecem de melhor vontade aos prelados da sua escolha. Em quanto estas regras governavão nos claustros a vida claustral era mais suave: mas desde que se inventarão as confederaçõees dos conventos, e os capitulos geraes, alterados estavão a vida claustral converteu-se em uma oppressão tematica. Os capitulos geraes fazem os prelados dos conventos, os prelados dos conventos fazem os capitulos geraes; e os feudos, isto he, o todo das corporações religiosas são governados por uns poucos de frades combinados para terem em seu poder o mando, e a fazenda das mesmas ordens. Nesta desordem filha da decadencia da disciplina claustral, as ordens militares forão ainda mais infelizes do que as outras, porque recebem prelados vitalicios da máo do grão mestre. Estes prelados certos da sua autoridade perpetua, orgulhosos com as suas prerogativas, e ufanos com as rendas que desfrutão estendem uma vara de ferro sobre os freires que governão, como ovelhas desamparadas, ignorando a cada passo a disciplina claustral, eximindo-se della ainda quando a conhecem, incommodando os freires quando estão dentro dos conventos, e não sendo seus prelados senão para os seus interesses pessoaes quando estão fora dos conventos. Destas verdades theoricas e praticas concluirá o soberano Congresso os verdadeiros fundamentos da doutrina desta primeira parte do artigo; e he por ellas que eu não posso convir na proposta triple lembrada pelo primeiro Preopinante, porque confere aos freires menos garantia do que aquella a que tem direito. O soberano Congresso achará facilmente o motivo porque a Commissão propõe que estas eleições vejão confirmadas pelo grão mestre. Não duvido subscrever a emenda de que se fixe a congrua de 1:200$000 rs. para os priores mores quando forem extinctos, até que sejão empregados em outros ministerios, e este arbitrio me parece preferivel ao de metade dos seus actuas rendimentos, por não constituir uma medida certa da sua subsistencia. Quanto á duvida a que tem o ultimo Preopinante acerca da jurisdição espiritual que exercem os priores mores, ou seja nesta qualidade, ou na de prelados de isemptos, he preciso que observe, 1.° que este artigo, assim como todo este projecto suppõe, que se hão de pedir bullas para tudo aquillo pa-

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ra que forem necessarias, e de certo o são para os objectos que involvem alteração de jurisdicção espiritual: assenta por tanto este artigo sobre a hypothese da necessaria bulla quanta á jurisdicção espiritual: pergunto então, haverá motivo para que ella se não conceda encaminhando-se o projecto a metter a disciplina conventual na direita estrada de que foi tirada por uma politica tortuosa, contraria aos institutos regulares? E depois de concedida a bulla terá o illustre Preopinante escrupulo sobre a legitimidade de ser exercida a jurisdicção espiritual por pessoa ecclesiastica idonea, e por força das leis, e concessões dos poderes legitimos? Terá pois o illustre Preopinante este escrupulo, não o tendo de que no estado actual das cousas os priores mores exerção uma jurisdicção espiritual delegad pelo grão mestre, o qual como pessoa leiga a não pode exercitar pessoalmente? Pense o illustre Preopinante, e veja de que parte deve estar o escrupulo. Em segundo lugar não havendo o menor inconveniente, em que a prelazia dos isemptos recahia por força da concessão da bulla nos prelados dos conventos das ordens militares, em quanto se não extinguirem os isemptos, supponho que o illustre Deputado se não ha de oppor a um projecto, que a Commissão ha de offerecer brevemente para a extincção dos isemptos, a qual se deverá verificar ou ainda antes, ou ao mais tardar na occasião em que se realizar a reforma das ordens regulares, e sendo assim o illustre Deputado vendo destruido o ruinoso, e intoleravel abuso dos isemptos, menos inquietação sentirá ainda acerca da jurisdição espiritual dos priores mores das ordens militares na qualidade de prelados de isemptos. Parece-me tanto que não occorre duvida fundada para que o artigo não passe nos termos que deixo estabelecido.
O Sr. Corrêa de Seabra: - Sr. Presidente, este artigo não pode sanccionar-se. O prior mór não he só um prior claustral, he como se explicão os definitorios de Aviz, a primeira dignidade que a ordem tem depois de mestre e prelado universal de toda a ordem, e das pessoas della, no que toca á jurisdicção espiritual e interior: verdadeiramente o prelado das ordens militares he ElRei na qualidade de Grão Mestre, mas como elle não póde exercitar a jurisdicção espiritual nomeia um ecclesiastico para o fazer, e he este o prior mór, por conseguinte he forçoso que os priores mores sejão nomeados por ElRei: não ha duvida que o presidente in capite he nomeado pelos freires, e confirmado por ElRei, mas isto he só concedido aos freires nas vacancias, porque era necessario dar alguma em quanto ElRei não nomeava. Deu-se esta muito analoga e similhante á que se pratíca na vacatura dos bispados: não póde por tanto adoptar se a medida, que propõe o projecto, de ser o prelado das ordens nomeado pelos freires. Além disso, que motivos temos para privar a ElRei da prorogativa que legitima e legalmente tem de nomear os prelados das ordens? Ja disse em outra sessão, que a reforma das ordens militares pouco tem de commum com a das outras ordens regulares, e por isso eu, e o Sr. Bispo de Béja não tratamos em voto separado da reforma das ordens militares. Se o Congresso julga conveniente fazer alguma reforma nestas ordens, deve o projecto voltar á Commissão para propor um plano de reforma combinado em todas as suas partes.
O Sr. Castello Branco: - Eu approvaria de muito boa vontade este paragrafo, se elle fosse mais amplo, e estivesse em armonia com outros principios que a meu ver se devião estabelecer sobre esta materia: se se tratasse de secularizar as ordens militares do Reino, pois que ellas se achão em opposição com o estado actual, eu conviria nisso, porque vinha por consequencia a extinguir-se os lugares de priores mores dessas mesmas ordens; mas querer reformar uma parte dessas mesmas ordens, e conservar outra, he a cousa mais extravagante; já se vê que se não pode reconciliar o lugar de prior mór de cada uma das ordens, he um lugar essencial o prior mór nas ordens militares, e contra o que acaba de dizer o honrado Membro, um verdadeiro prelado claustral; e daqui he que resultão os cavalleiros, os commendadores, e o mesmo grão mestre; agora querer conservar as ordens militares, tirar-lhe o prelado, ou impedir a jurisdicção espiritual que elle tem, ja se vê que he uma contradicção, e he, para assim dizer, querer conservar um estabelecimento que hoje não póde ter lugar com os estabelecimentos actuaes: julgo que não he da intenção do soberano Congresso legislar sobre a igreja, deixemos isso á autoridade competente, porque o meu parecer he que elles se devem secularizar porque são contra o estado actual; e porque estes estes estabelecimentos pela sua inutilidade se tornão extravagantes; que quer dizer, ou de que serve um homem para se lhe dar uma condecoração ter de fazer um voto religioso, que o Papa ao mesmo tempo lhe dispensa; póde por ventura isto ter relação alguma com os costumes actuaes? Não seria vergonhoso que uma Nação regenerando-se deixasse subsistir cousas tão contrarias, e hoje tão irrizorias. Nós não devemos tratar de cousas parciaes, e por isso a toda esta parte do projecto se lhe deve substituir uma indicação, que mandei para a meza, para a secularização das ordens militares, e modo porque se devem secularizar, e póde então ter parte o paragrafo que está em discussão; e por consequencia desta secularização das ordens militares resulta a extinção dos priores mores, mas querer deixar-lhe a jurisdição que deixa-mos com todas as suas attribuições, isso he que eu não acho proprio de uma Assembléa legislativa.
O Sr. Caldeira: - A Commissão ecclesiastica de reforma propoz-se a fazer um plano para a reforma das corporações religiosas; olhou estas ordens militares por aquelle lado que as devia olhar, porque ellas não deixão de ser ordens regulares, e tem ao mesmo tempo aquella parle que se póde chamar civil; eu o mais que posso fazer he convidar estes individuos... isto para assim dizer já não existe, porque presentemente são ordens regulares, ora como ha de a Commissão propor um projecto para se reformarem quimeras, e cousas que já não existem; por tanto a Commissão não faz outra cousa mais do que olhar as ordens militares debaixo deste ponto de vista, porque se devem regular as mais ordens; nesta ha um prelado; a prerogativa que tinha o Grão Mestre era no tempo antigo em que as cousas estavão em outro es-

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rado; agora no estado actual não sei como isso possa ser, por tanto a Commissão justamente propoz este artigo, entretanto póde-se reformar na parte que o soberano Congresso julgar conveniente. Em quanto á jurisdicção espiritual de que falou o illustre Preopinnante não lhe acho razão nenhuma: o illustre relator da Commissão já satisfez dando a explicação: os isentos são inteiramente oppostos á disciplina da igreja, e não ha inconveniente nenhum que passem para o prelado ordinario: a Commissão foi só encarregada de fazer a reforma das ordens monasticas, e o principio que achou mais digno de reforma he a respeito do prelado, porque não póde haver cousa mais contraria á justiça do que o prelado ser nomeado por outrem; este he o principio do paragrafo. Sua Santidade não terá duvida em conceder a bulla; eis-aqui o que tenho a dizer sobre isto.
O Sr. Rebello: - Apesar de que o illustre Preopinante satisfez plenamente as duvidas oppostas ou apoiadas, eu direi ainda poucas palavras, porque me não posso dispensar de as dizer. Quando a Commissão propoz a doutrina deste artigo, entendeu que o projecto seria lido todo desde o seu preambulo, que e os illustres membros combinando o mesmo projecto em todas suas partes, ou approvarião este artigo na regra fundamental que apresenta, ou pelo menos o atacarião em fórma. Tornão as duvidas sobre a jurisdicção espiritual dos priores móres. Essa jurisdição, por quem foi dada? pelo Pontifice; pois então o que a Commissão propõe he, que por meio de uma bulla se confira essa jurisdição a quem seja capaz de a exercitar, concordando o seu exercicio com os impreteriveis direitos dos freires e melhor disciplina claustral. Esta he a doutrina, este he o ponto da questão. Quem entende que o que existe he optimo, tem obrigação de o mostrar; quem se persuade, que o que propoz a Commissão he injusto, tem obrigação de o mostrar; e quem assenta, que o que propõe a Commissão he excesso, tem obrigação de o provar e supprir. Objecta-se com o que existe; mas a Commissão entende que o que existe precisa da reforma que propõe. E como se ataca o projecto da Commissão? Por dois caminhos oppostos, e em ambos elles com asserções vagas. Para uns a reforma he excessiva, porque altera o systema actual das ordens militares, e dando tudo pelo plano actual das mesmas ordens, quanto á jurisdicção do grão mestre e priores mores, e nada pelos direitos dos freires, requerem que o projecto volte a Commissão, como se a Commissão tivesse em tal hypothese algua outra reforma que propor: para outros a reforma he escaça, porque não propõe a secularisação das ordens militares; incompetente, porque ao Soberano Congresso não compete decidir sobre a reforma proposta no artigo. Já se vê que nesta divergencia de opiniões não he possivel que o projecto, e a Commissão satisfação os dois extremos: mas o que he ainda mais notavel he, que os illustres membros que desejão a secularisação destas ordens, não combatão em frente a opinião opposta, como uma carreira que se lhe apresenta ainda primeiro que o projecto. Deixemos porem estes reparos, e entremos na materia. Não desconfiarei do que disse na primeira vez que falei nesta materia, nem do que está escripto no projecto acerca dos escrupulos que tem alguns dos illustres membros no tocante á jurisdicção espiritual; eu renovo as respostas que offereci, e que nem levemente forão refutadas, e applico a bulla que se impetrar da Sé apostolica para tranquilisar a sua consciencia sobre a futura sorte das ordens militares, e jurisdicção dos grão mestres e priores mores, assim como appello para esta bulla para me tranquilisar a mim sobre a impressão que me faz o estado actual de anomalias e confusões sagradas e profanas, em que so achão involvidas estas ordens. Direi sim duas palavras sobre a increpação que se faz á Commissão, por não propor a secularisação das ordens militares, sobre a supposta insufficiencia e contradicção do projecto, e sobre a incompetencia do soberano Congresso para pronunciar sobre a reforma offerecida pela Commissão. A Commissão foi encarregada de um projecto de reforma das ordens regulares; e comprehendendo neste projecto as ordens militares, no que ellas tem de commum com as demais corporações regulares. Proveu por tanto a reforma dos bens dos conventos, o ao que diz respeito ás possiveis vantagens, que a reforma podia conferir aos freires, e á disciplina claustral. Tudo isto está dentro da esfera da incumbencia da Commissão: o mais que se accrescenta não pertence á reforma das corporações regulares; pertence sim a outras reformas de diversa natureza. A Commissão não propoz a secularização dos freires conventuaes, porque isto significava a extincção destas ordens na parte que tem de regulares, e a sua incumbencia foi de reforma, e não de extincção; a persuadiu-se mesmo que importava mais que elles continuem por entanto pelo modo proposto no projecto, do que a extincção de uma vez. O plano da Commissão preenche tudo aquillo, que devia ter em vista sem falta, ou contradicção. Proveu sobre a subsistencia dos conventos, sobre os direitos adquiridos pelos freires, procura prover sobre as eleições dos seus prelados locaes com intervenção das autoridades legitimas; e quanto ao mais deixa em vigor os seus estatutos: que falta pois aqui, ou aonde está a contradicção? A Commissão está finalmente persuadida, que o projecto he da competencia do soberano Congresso em tudo o que diz respeito aos bens dos conventos, e rendimentos consignados para os priores mores, e que tambem he da sua competencia decidir pela sua parte de que convém restaurar as regras verdadeiras da disciplina claustral, que protegem os direitos impreteriveis dos freires conventuaes quanto ás eleições dos prelados locaes; e de que elles forão despojados por uma oppressão invencivel, e que o soberano Congresso lhes deve fazer restituir pelos mesmos meios porque lhes forão tirados; sobre tudo isto o soberano Congresso he competente, e porque esta sua competencia se não póde verificar sem a concorrencia da Sé Apostolica, na parte em que se precisa alteração sobre as nomeações actuaes dos priores mores, e jurisdicção que elles exercem, por isso o projecto suppõe a intervenção do poder ecclesiastico naquillo que he da sua partilha privativa, ou concorrente. Supponhamos agora que em lugar da reforma se propunha a secu-

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larização destas ordens. O soberano Congresso só por si seria competente? Para fazer cessar a jurisdicção dos priores mores, e a obediencia claustral dos freires não seria precisa bulla pontificia? Como pois se ataca a competencia do soberano Congresso para uma operação que involve menos ingerencia do poder ecclesiastico, do que para outra, que a demanda muito maior? Sendo o que se disse sobre a resistencia que fazem as luzes do seculo, e o estado actual das ordens militares ás profissões dos cavalleiros, e commendadores militares, sobre prerogativas de que gozavão pela legislação até agora existente, e sobre direitos que os priores mores exercitavão como taes, relativamente aos cavalleiros, e commendadores das respectivas ordens; tudo isto, digo, he exacto, e digno de se providenciar; mas em um projecto á parte, porque ainda que influa muito sobre o bem geral do Estado, e certeza da pozição, e espaço politico que devem occupar as ordens militares, reduzidas a simples condecorações de honra, nada influe sobre a sorte dos conventos das ordens militares, e freires que os habitão, que he justamente o lado porque a Commissão incluiu as ordens militares no seu projecto.
O Sr. Trigoso: - Esta materia tem cousas particularissimas. He sabido que as ordens militares se conservarão muito muito tempo como forão instituidas; o mestre assistia no convento, e fazia vida commum com os commendadores, e cavalleiros, e com os clerigos, que ahi fazião os officios religiosos: mas alterou-se isto desde o tempo d'ElRei D. Manoel, separando-se aquelles da vida commum, e ficando não só livres da solemne profissão religiosa, mas por isso mesmo habeis para poderem casar, testar, etc. Dos clerigos ou freires he que se vierão a formar conmunidades religiosas; elles continuarão a permanecer nos tres conventos, e vierão a constituir o que se chama ordem; porque os outros membros, ou fossem commendadores, ou cavalleiros, nada tinhão já que os fizesse parecer religiosos, ou que os distinguisse dos outros que vivião no seculo. Quando esta mudança já estava inttoduzida entre nós, obteve ElRei D. João III uma bulla do Papa Julio III, que extinguiu os antigos mestrados, e encorporou o governo e dircção das ordens com os Reinos de Portugal. Esta bulla que entre nós tem força de concordata, concede aos Reis Portuguezes nomearem, ou apresentarem livremente os beneficios das ordens, e prover as commendas; e em quanto á jurisdicção espiritual, determina a bulla que ella seja exercitada pelas pessoas ecclesiasticas nomeadas por ElRei, será falar em priores mores das ordens.
Applicando isto á primeira parte do artigo, direi que nem ElRei se póde já chamar Grão-Mestre das ordens, nem os commendedores e cavalleiros, posto que tenhão um simulacro da profissão religiosa, se pódem já chamar religiosos; nem a existencia dos priores móres se póde chamar essencial para a conservação das ordens. O que me parece necessario he manter-se em vigor a bulla do Papa Julio III, de maneira que seja ElRei o que nomeie, não só para as commendas e beneficios, mas tambem para o exercicio da jurisdicção ecclesiastica , ou seja a propriamente espiritual, que provem da igreja, ou a puramente regular, que provem d'ElRei, e que por isso a communidade dos freires não póde conceder, e quando muito só poderia propor na fórma que disse o Sr. Borges Carneiro. Em quanto aos isentos, eu sou o primeiro que desejo que elles se extingão; mas como elles forão em geral concedidos por autoridades ecclesiasticas e em particular os das ordens forão mantidos pela bulla de Julio III; dou de opinião que não se devem tirar sem se impetrar nova bulla da Sé Apostolica.
O Sr. Alves do Rio: - Eu queria dizer, ainda que não tambem, o que acabou de dizer o Sr. Trigoso, e accrescentarei que não ha duvida nenhuma em que haja duas jurirdicções, uma fóra, outra dentro: e não se póde dizer mais do que disse o illustre Preopinante.
O Sr. Guerreiro: - O illustre relator da Commissão deu por estabelecido que se havia impetrar bulla; eu peço a V. Exc.ª que convide a Commissão a dizer se he para todo o paragrafo, on para parte delle; porque eu tinha considerado este paragrafo como meramente temporal; e concordando com as idéas do Sr. Deputado Trigoso, convenho em que se deve pedir a bulla. A creação das ordens militares, ou por outra a... da profissão das ordens militares com as ordens religiosas, foi um monstro da politica para utilidade publica; hoje cessou esta grande utilidade publica, e por tanto devem tambem cessar as consequencias: em quanto os ministros da igreja se limtiávão simplesmente ao exercicio das funções meramente ecclesiasticas, o poder temporal tinha alguma influencia; porém como hoje he uma associação de homens, e he reconhecida a grande influencia que tem, e podem ter na sociedade civil, he por isso que o illustre Deputado, o Sr. Trigoso, achou, e com toda a razão propõe, que em lugar do prelado local ser nomeado pelos freires, seja nomeado por EIRei.
O Sr. Ferreira Borges: - Pelo que respeita á materia do artigo até á palavra ordens, estou pela opinião do illustre Preopinante, que falou antes de mim, e eu a approvo em toda a extensão. Mas pelo que toca ás palavras (leu) por diante; não posso seguir a opinião do derradeiro Preopinante, nem a do artigo: isto he, que se devão dar aos priores mores os rendimentos que tenhão daquella qualidade. Se a monstruosidade da existencia de uma ordem de que o chefe he um leigo exige que... desta fórma os Bispos são os priores nattos dellas: por tanto não vejo que tenhão razão alguma mais do que todos os outros Freires, e parece-me que por isso não tem direito algum a perceber os seus rendimentos. Disse um illustre Preopinante que nós lhos devemos confiar, porque a todos os empregados de repartições extinctas se conservão, e que por identidade de razão se deve conservar aos priores mores, visto que por terem exercido aquelle lugar, tinhão um direito tal ou qual á conservação do seu rendimento: eu não posso considerar um prior mór desta ordem por mais empregado publico do que o geral de uma ordem religiosa; por exemplo o abbade dos bernardos, que no fim do seu cargo não tem outra recompensa mais do que não ter obrigação de ir ao coro, etc; em compensação do trabalho que te

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ve quando governou; e não posso por tanto julgar os priores móres como os empregados publicos, com que se argumentou. Torne para os freires, porque foi tirado dos freires: e os rendimentos, em vez de irem para a amortização da divida publica, de que trata a ultima parte do artigo, deve dizer-se para as urgencias do Estado (vozes; está vencido). então nada tenho a dizer.
O Sr. Vaz Velho: - Como o autor do Projecto tem falado as vezes que lhe compete, e se tem feito algumas perguntas á Commissão, e suscitado algumas duvidas contra o projecto; cumpre-me responder a umas e outras, como Membro da mesma Commissão. Um dos illustres Preopinantes perguntou para que artigos ou materias deste projecto erão necessarias bullas Apostolicas, pois não via nisso se falasse. Ao que respondo, que são necessarias para tudo aquillo que exceder o poder civil, pois nunca foi da mente da Commissão adiantar-se além dos limites deste poder, e por isso diz no fim do projecto quo o Governo promoverá a concorrencia das competentes autoridades ecclesiasticas; sem que seja necessario repetir o mesmo em cada paragrafo do projecto. Tenho por tanto respondido á pergunta de um dos illustres Preopinantes. Outro dos illustres Preopinantes teceu a historia das ordens militares, a qual me não opponho, e da qual tira por conclusão, que se não póde sustensar a doudoutrina do paragrafo, na parte que diz respeito á eleição do prelado local pelos freires conventuaes, sujeita á confirmação de Sua Magestade; por isso que sendo o eleição dos priores mores de Sua Magestade, em conformidade das bullas Apostolicas, e vindo os prelados locaes de Thomar a supprir, ou a succeder nestes lugares, devem as suas eleições pertencer somente a Sua Magestade. Este argumento, por forte que seja, por muito que conclua, como está fundado em uma hypothese falsa, involve necessariamente um paralogismo. Este argumento suppõe que a doutrina do projecto se ha de verificar, antes de se impetrarem as bullas necessarias; e por isso concluo, que só se póde sustentar do modo, e da maneira do actual systema. Mas como a Commissão estabeleceu a doutrina para se impetrarem as bullas, e depois dellas se effectuar o que dispõe, nenhuma incompatibilidade ha; pois que se bullas poderão conceder uma cousa, outras bullas podem conceder outra. Julgo por isso que o argumento não faz força alguma para não se poder sustentar a doutrina do paragrafo.
Julgada a materia discutida, disse
O Sr. Annes de Carvalho: - Peço ao Congresso, que me queira dispensar de votar, porque eu sou um subdito do prior mór.
O Sr. Ferreira Borges: - O illustre Preopinante não he subdito do prior mór; agora he subdito do Congresso.
O Sr. Presidente: - O regimento só prohibe que assista á votação quando haja respeito a parentesco. Todos nós somos subditos, cada um do superior da classe a que pertence.
O Sr. Presidente entregou á votação a primeira parte do artigo até ás palavras, que os governe; e bem assim a segunda parte até ás palavras: como Grão Mestre. E não forão approvadas como estão; pelo que propoz: se se approvava a emenda do Sr. Deputado Trigoso, que diz: Os prelados conventuaes dos conventos das tres ordens militares serão triennaes, e nomeados por ElRei, que tem a administração perpetua das ditas ordens. A jurisdicção espiritual será exercitada pelas pessoas ecclesiasticas nomeadas por ElRei em quanto se não obtem a bulla apostolica para a extincção dos isentos. E foi approvada para substituir a primeira, e segunda parte do artigo, que havião sido regeitadas. Entregou o Sr. Presidente á votação a terceira parte do artigo, que declara extinctas os priores móres; e foi approvoda. Propoz mais a quarta parte do artigo, que - lhes manda conservar as honras - foi approvada. Mas a quinta parte, que diz: se lhes conservarão os rendimentos: não foi approvada. Pelo que o Sr. Presidente propoz: Se conservarão somente metade dos rendimentos? E não sendo approvado; propoz: Se terião de rendimento tres mil cruzados, alem dos bens nacionaes, que possuem? E não se approvando assim, propoz: Se terião de renda tres mil cruzados, comprehendendo o que tivessem de bens nacionaes? E foi assim approvado: A sexta, e ultima parte foi approvada, com a emenda de se dizer: Serão applicados para as despesas do Estado: em lugar de ser - para a amortização da divida publica - como se achava no artigo.
O Sr. Sousa Machado: - Seria bom que os prelados que Sua Magestade houvesse de nomear, fossem dos mesmos freires, e por isso não tivessem mais rendimento algum.
O Sr. Rebello: - Já que o artigo passou de modo que os freires hão de receber de tres em tres annos um prelado que ElRei lhe nomear, e a refôrma vai por isso recair sobre os priores móres com muito pouca vantagem dos freires, pelo menos adopte-se o additamento do illustre Membro para evitar, que de tres em tres annos não vá de fóra um prelado, que se ha de fazer freire, e acautele-se tambem que o prelado não tenha mais rendimento do que outro qualquer freire; porque do contrario como ElRei tem a liberdade de nomear quem quizer, podem ir crescendo os freires a titulo de priores, e não se acautelando, que os priores não tenhão maior ração que os freires, vir a inutilisar-se com prejuizo da fazenda publica, a economia que se procurou com a extincção dos priores mores. Ficando certos, de que segundo as regras da disciplina claustral, os prelados locaes não tem, nem devem ter senão a mesma ração, o mesmo refeitorio, e os mesmos subsidies que o convento der aos outros frades; e quanto a este respeito se tem innovado, he abuzo, e monstruosidade, qualquer que seja o especioso titulo em que se funde. Façamos pois á Nação o beneficio que lhe resulta da lembrança do illustre Autor do additamento, já que não fizemos aos freires o beneficio que a refórma lhes devia liberalizar.
O Sr. Trigoso: - Não tem razão o honrado Membro, porque necessariamente ha de haver uma de duas cousas: ElRei ha de nomear um freire do convento, ou outra pessoa de fóra, no primeiro caso não
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ha duvida que o freire fica no convento; e no segundo tambem não ha duvida, que não póde entrar de novo para o convento; póde ElRei conferir-lhe o habito da ordem; mas senão pertence ao convento, não entra para elle.
O Sr. Vaz Velho: - Parece-me que agora temos uma anomalia maior ainda; se ElRei nomear para prelado pessoa de fóra, não vai para dentro do convento! Então estamos peiores do que até agora: governar os freires, estando da banda de fóra, e prelado; isso he que eu não entendo...
O Sr. Presidente propoz o additamento apresentado pelo Sr. Deputado Sousa Machado, que diz: Proponho que os prelados nomeados por ElRei, sejão dos mesmos freires conventuaes, e que não tenhão por isto mais alguns emolumentos: foi approvado. Passou-se ao artigo 3.°: e entregue á votação, foi approvado.
Passando-se ao artigo 4.º, disse
O Sr. Trigoso: - Este artigo he desnecessario: os conventos nunca podérão fazer isto: e se o não podérão fazer ale agora, parece-me que menos o farão daqui por diante.
O Sr. Annes de Carvalho: - Os conventos pedem fazer o que diz o artigo com licença de ElRei como administrador das ordens militares.
O Sr. Trigoso: - Isso era uma cousa, que pertencia aos capitulos geraes, os conventos nunca tiverão esta faculdade só por si. Na bulla do Papa Julio prohibe expressamente a ElRei a alienação.
O Sr. Annes de Carvalho: - Depois que cessarão os capítulos geraes, os conventos podião fazelo com licença do Grão Mestre, esta era a pratica: agora porém necessitasse mais alguma cousa, que he a licença das Cortes.
O Sr. Guerreiro: - Já existe essa lei, então he inutil absolutamente esse artigo.
O Sr. Rebello: - Este artigo he indispensavel, porque estabelece a regra de que se não poder ao alienar, hypothecar, ou distratar bens, ou fundos dos conventos sem licença das Cortes; e como toda a legislação ecclesiastica, ou civil até agora existente, não podia incluir a clausula da licença das Cortes, porque ellas não existião; por tanto o artigo he indispensável. E tambem não he de facto que os conventos dos ordens militares não podessem alienar bens sem licença do Grão Mestre; assim como he lambem certo, que os conventos das outras ordens podem alienar os bens e fundos, de que se trata, sem licença de ElRei. Donde se conhece que o artigo he por todos os lados necessario.
O Sr. Presidente poz a votos o artigo, e foi approvado.
Passando-se ao artigo 5.º disse
O Sr. Ferreira de Soma: - Neste artigo «e propõe a secularisação dos dois collegios dos militares, e de Christo, que ha em Coimbra; a união delles; e até o augmento de rondas ao collegio assim unido. Quanto á união dos dois collegios, não me opponho, ficavão as tres ordens militares reunidas em um ao collegio, assim como até agora estavão no collegio dos militares as duas ordens de S. Thiago e Aviz e senão estava tambem a de Christo, he porque quando se fundou o collegio para freires, ainda os thomaristas erão frades, e muito tempo o forão, até que nos nossos tempos passárão para freires. Reunidos agora os freires das tres ordens em uma só casa com as rendas dos dois collegios, que tão pequenas, melhor se poderá sustentar um só collegio, e melhor ainda se lhe accrescentarem a renda, como lembra o projecto. Com effeito este estabelecimento do collegio he digno de conservar-se a bem das letras, pulos subsídios que ali achão os doutores na excellente livraria, e n'outras commodidades: e a experiencia mostrou quanto ali tem aproveitado tanto» professores insignes, e literatos egrégios alumnos do collegio. No que não convenho he na secularisação; porque não lhe acho nenhuma vantagem real, e acho-lhe muitos inconvenientes, e incoherencias. Em quanto houver freires e conventos de freires, como ainda fica havendo pelo projecto, porque não ha de haver collegios de freires, que he como uma dependência desses conventos? E porque «e ha de tirar aos freires conventuaes o direito que tem pelos estatutos do collegio de irem lá viver em quanto se formão? E seria regular que na mesma casa vivessem collegiaes freires com prelado da ordem, e do mesmo tempo collegiaes seculares, com prelado secular? Uns sujeitos no espiritual ao pároco, e bispo; e outros ao prelado da ordem? Accresce que as rendas dos collegios são pertencentes ás ordens, e não he justo que em quanto essas rendas não estão secularisadas, sejão para seculares. Não nos apressemos pois com isto, cuidemos em cousas importantes de que estamos sobrecarregados, e se os freires conventuaes vierem a acabar, então sé poderá mudar a naturesa ao collegio pelos meios competentes, e sem offensa de ninguem: eis-aqui o meu voto sobre este artigo.
O Sr. Rebello: - A Commissão tratando da refórma das ordens militares entendeu, que os collegios, que estas ordens tem em Coimbra se devião reunir, e secularisar. Que se devião reunir attendendo, a que as rendas de um e outro são pequenas, mas unindo-as podião formar uma dotação quasi suficiente para um collegio litterario, em que seja admittido um numero razoavel de oppositores às cadeiras da universidade. Considerou a Commissão, que no collegio de Christo não ha presentemente senão tres freires, e que não póde por entanto haver mais, a continuar a prohibição de novas acceitações de freires; em tal caso não seria economico reduzir um grande edificio a ser habitado por 3 freires sómente: e tambem considerou que o collegio dos militares se acha com 4 freires, e que não podendo esperar novos alumnos dos conventos das ordens pela interina prohibição de acceitações, convinha desde logo reunir os freires, e os fundos de ambos os collegios, de que resultão maiores commodos aos freires actuaes, e uma economia certa, que talvez equivalha a diminuição que hão de soffrer as suas rendas com a lei, que proscreveo os direitos banaes, e a outra da reforma dos foraes. Legitimada por este modo a operação da reunião dos dons collegios, era necessario adoptar de dous partidos um: ou comprehender collegios em regra geral dos mais conventos das

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ordens militares, applicando-lhes o que se acha já sanccionado nos 3 artigos antecedentes; ou então secularizar os collegios. Digo que seria necessario na primeira hypothese subordinar estes collegios á legislação dos 4 artigos antecedentes, e incluindo na prohibição interina de novos acceitações, porque eu não acho motivo, que podesse justificar uma excepção a favor destes collegios na qualidade de regulares; porem adoptado este primeiro arbitrio viria talvez a extinguirem-se estes collegios, que de preterito se tornão recommendaveis por grandes homens, que os tem illustrado, e de futuro podem servir de grande auxilio para os alumnos da universidade. Decidida a Commissão por este ultimo arbitrio já se vê, que não podia deixar de propor a secularização dos collegios como consequencia necessaria das considerações ponderadas, e fundamento indispensavel do destino litterario, que os mesmos collegios devião Ter para o futuro. Em verdade seria curioso deixar na reforma estes collegios com a porta aberta para admittirem freires, tendo-a fechado por entanto nos conventos das respectivas ordens. Convém todos os membros do soberano Congresso, que as ordens militares estão inteiramente fóra da sua instituição, e que não he possivel tornarem a ella pelas luzes, politica, e milicia de que a nação se serve, e há deservir; se pois um freire hoje não he mais do que um ecclesiastico regular de um convento, que nuca há de ser capelão das ordens militares em campanha, porque as ordens militares não hão de mais fazer campanhas, como se poderão explicar freires simplesmente para poderem entrar para collegios militares? Que tem de commum estas possessões de freires com a vida, ou aptidão litteraria dos oppositores da universidade? Por ventura com a profissão ficão mais hábeis, e mais bem morigerados? Não será uma profanação escandalosa reduzir as profissões religiosas a meras habilitações de um collegio literario?
Não deverá ser censurado pela opinião publica um homem tão adjecto, que abuse do sagrado de uma profissão para Ter lugar no refeitorio de um collegio?
E será nos nossos dias, e na regeneração das letras, dos costumes, e dos direitos da nação, e dos individuos, que nós sanccionassemos aquillo mesmo que nos escandaliza? Eu não digo uma só palavra sobre a falta de vida clautral, que não há, e talvez nunca houve nestes collegios; e não fallo em totall por duas razões: 1.a porque os actos de coro, e communicação roubão muito tempo, que os oppositores, que se fazem freires não entrão para os collegios para rezar, mas sim para se accomodarem. As difficuldades desta secularização lembrados pelo illustre membro que acabou de falar, desapparecem todas, quando se reflectir preciso, que a secularização se há de fazer pela concorrencia dos poderes legitimos, e necessarios revogações das leis, que se precisem revogar; secundo, que secularização não prejudica os dieitos adquiridos pelos actuaes freires. Tercio, que uma vez legitimada a secularização, o reitor que houver de ser do collegio não tem jurisdicção espiritual que exerce, e então os collegios, que forem ecclesiasticos entrão, e vivem ali como os collediaes dos dous collegios de S. Pedro, e S. Paulo, que são ecclesiasticos. Por tanto não há nada mais simples do que a verificação destas secularizações: a difficuldade pelo contrario consiste em saber conciliar estes collegios regulares a que elles pertencem, com a sua pouca connexão com os conventos das respectivas ordens, com a falta de vida regular segundo a disciplina das casas religiosas, e com a deploravel profissão que teve de habilitação para lá entrar. Quanto ao juizo, que os freires actuaes e futuros soffrerão de não poderem Ter direito nos beneficios simplices das ordens; o illustre Preopinante sabe, que a nação tem por ora tomado para as despezas, e pagamento da divida publica os rendimentos desta qualidade de beneficios; e quero persuadir-me, que as Cortes futuras mais consentirão, que se provão taes beneficios por estarem em contradicção com a essencia de beneficios= pois que sendo a regra canonica que o beneficio se dá causa do officio= nos beneficios simplices tem de dar-se o beneficio sem officio, e por isso dá-se um rendimento a uma pessoa, que por elle não he obrigada a um ministerio pessoal; resultando por isso que o artigo deve passar como está, por se não Ter dito, nem poder dizer cousa attendivel, que o ataque.
O Sr. Trigoso:- Sr. Presidente, diz o artigo (leu). Os collegios das ordens militares não estavão sujeitos aos conventos, porque os seus pelados, não erão os piores mores, nem estes tinhão nelles o direito de visita. ElRei he quem nomeia os reitores: em consequencia parece-me escusado secularizalos para os subtrair da jurisdição dos conventos. Além disto não vejo razão alguma para que os collegios devão ser secularizados, e veio razão porque o não devão ser; qual a do accesso que os collegeais tem a certos beneficios das ordens militares; o qual accesso lhes dá um direito que lhes não deva ser tirado; além disso as oredns tendo um collegio seu em Coimbra, gosão da commodidade de mandarem ali estudar os seus freires. Por isso em quanto existirem as ordens e os beneficios dellas, não me parece justo que se secularizem os collegios.
O Sr. Serpa Machado:- Eu approvo a doutrina do artigo, e tambem não acho razão para a necessidade da secularização. Quando de uma medida não resulta utilidade nenhuma não se deve fazer inovação; privar os membros destas ordens de irem ali fazer os seus estudos, vai damnificar as mesmas letras. Nós vemo-nos obrigados por uma razão de conveniencia a conservar as ordens por um arazão de conveniencia a conservar as ordens militares po algum tempo, he preciso que tiramos o partido que podermos disto mesmo, fazendo com que os seus institutos sejão conservados pela parte das letras; e por isso me parece que esta secularização pertendida no artigo tem um inconveniente muito grande, qual he o de não poderem os freires ir fazer os seus estudos nestes collegios, porque eu estou muito convencido da utilidade que há, em elles serem feitos nos collegios; e conservemos por ora este bem ás letras, já que lhe podemos ainda fazer outro. He por isso que me parece que nós não temos utilidade alguma em que elles se secularizem, e tem elles a vantagem de fazer alli os seus

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estudos, e além disto a de que falou o Sr. Trigoso, que he o terem accessão a certos beneficios pertencentes ás ordens, e não vejo razão nenhuma para que delles devão ser privados, visto a tenuidade dos rendimentos da universidade, he por isso que dahi não approvo esta parte do artigo; visto que dahi não provem utilidade alguma.
O Sr. Guerreiro: - Quando eu pedi a palavra queria dizer, que me não podia conformar com a opinião do illustre Deputado o Sr. Trigoso a respeito da secularização dos collegios militares; e agora digo o mesmo não obstante o que acaba de ponderar o Sr. Serpa Machado. Se os collegios das ordens militares estivessem na mesma razão que os das ordens religiosas, que acabados os seus estudos elles voltão para os conventos a exercitar os seus talentos, eu estaria pela conservação, em quanto os conventos existissem, mas os individuos que entrão para estes collegios em Coimbra não voltão depois para os conventos das respectivas ordens; e ordinariamente professão só para ter entrada no collegio. Se considerarmos estes institutos como religiosos veremos que nelles não ha observancia claustral, e que nem ha motivo algum que impossibilite a sua secularização. He preciso sim que haja estes collegios na universidade, porém he necessario e muito conveniente, que esteja a porta aberta para quem dever entrar para elles, e que não seja necessario primeiro ligar-se a esses votos monasticos, a que muitos tem grande repugnancia, nem ha motivo para que a este fim se faça uma profissão religiosa, e até mesmo os collegios lucrão mais. Quanto á accessão que estes collegios tem aos beneficios da ordem, a secularização dos conventos não involve a secularisação de cada um dos individuos delles; e podem entrar nos concursos delles, não vendo razão para que os outros devão ser excluidos. Acho ainda mais um motivo para isto, e he que todos os empregados da universidade que não são clerigos, hão de passar muito mal, e no fim deixar a sua familia desgraçada; devemos fazer com que isto vá acabando, para que não seja necessario para todos os empregos outro requesito, que não seja o saber, a virtude, e o merecimento. (Apoiado.)
O Sr. Corrêa de Seabra: - Sr. Presidente, os collegios das ordens militares da universidade, ou estejão annexados, ou estejão desannexados são realmente collegios das ordens militares, e não devem secularizar-se, não só pelas razões já dadas, mas porque he absurdo e contradictorio, que subsistão as ordens militares regulares, e que uma ramificação das mesmas ordens se secularize: isto he inteiramente novo e desconhecido na historia da igreja. Não posso tambem deixar de notar que a experiencia tem mostrado que o conservarem os collegios esta natureza das ordens, de que são ramificação, não tem sido prejudicial ás letras, pois que nellas em todo o tempo tem florecido homens conspicuos, em saber, letras e virtudes, como he bem sabido e constante.
O Sr. Caldeira: - O illustre Preopinante o Sr. Guerreiro, poz a questão em toda a clareza. Não me parece conveniente que conservemos estes collegios sem secularização só pela razão de proporcionarmos certos beneficios a estes homens. Além de que ha muitos individuos capazes que não entrão para lá pela repugnancia que tem aos votos, e o que eu quero he, que para entrar nos collegios não seja ninguem obrigado a professar. O dizer-se que he uma ramificação de uma ordem religiosa, não me parece que por isso possão existir uns membros religiosos, e outros não: he preciso fazer nisto grande reflexão, e basta a grande difficuldade que ordinariamente ha em fazer a profissão religiosa. Talvez que neste Congresso esteja um membro que saiba isto por experiencia. Por tanto não posso deixar de votar pela secularização.
O Sr. Pinheiro de Azevedo: - Sr. Presidente, approvo o artigo, excepto no que pertence á secularização do collegios das ordens militares. Primeiramente porque não considero nisso nenhuma utilidade; pois gozando os freires de todos os direitos ecclesiasticos, civis, e polilicos, como os mais cidadãos sem nenhuma differença, claro está que os freires e os collegios são verdadeiramente seculares. Depois o collegio dos militares, considerado como collegio literario, tem desempenhado suas obrigações, e satisfeito ao seu instituto de tão districta maneira, que parece não haver mais que desejar, se não que continue como até agora. E he sem duvida que o ser das ordens militares tanto não tem servido de obstaculo á sua conservação e melhoramento, que he muito facil mostrar que isso mesmo tem visivelmente concorrido para o seu adiantamento. - Accresce que ha na secularização entre muitos um gravissimo inconveniente: porque sendo este collegio fundado para nelle estudarem os freires dos conventos, e se habilitarem competentemente para os beneficios e empregos das ordens estabelecidas para esse fim não menos de seis collegiaturas) parece manifesta contradicção, e muito grande injustiça conservar os conventos, e secularizar o collegio. E he muito falso o que temerariamente se disse, que no collegio não entrão se não oppositores, porque desde a sua fundação o numero dos freires dos conventos tem sido muito maior que o dos oppositores, e eu mesmo tenho visto cheias as seis collegiaturas, e juntamente alguns freires pensionistas e extranumerarios.
Em fim parece cousa muito para ser notada, que a Commissão considerando o collegio das ordens, como collegio literario, especialmente incorporado na universidade, proponha esta reforma de que não foi encarregada pelo Congresso, a qual estando conexa com a da universidade, da qual os tres collegios, segundo os estatutos e leis porteriores, fazem parte muito principal, não se deverá tratar separadamente, muito mais depois que o mesmo Congresso tem já determinado proceder a ella, e estar na mesa o parecer do outra Commissão. - Tambem não he menos notavel, que havendo no reino unido tantas ordens religiosas, tantos conventos, tantos collegios, a Commissão propozesse unicamente a secularização de dois collegios, e tres collegios... Voto por tanto contra a secularização, e que se reserve para quando se discutir o projecto de reforma da universidade.
O Sr. Manoel Antonio de Carvalho: - Sr. Presidente, eu sou inteiramente da opinião da Commissão, acho mesmo que ella não podia buscar uma

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providencia mais util para o augmento literario, que era facilitar a entrada, secularizando os tres collegios militares compostos de S. Thiago, Christo, e Aviz. Eu pela experiencia que tenho da universidade, conheço muitos oppositores que forão convidados a entrar nos collegios, e o não quizerão fazer para não se submetterem aos votos; e por este motivo perdeu igualmente a literatura portugueza muitos homens, que se para lá entrassam se esforçarião em dar prova do seu grande talento, e que muitas obras farião que immortalizarião os seus nomes, e o daquellas corporações a que pertencessem se lá tivessem sido admittidos. E estando nós aqui para fazer bem, e não para demoralo, direi com o illustre Deputado que tanto tem falado a favor da nossa causa "para que havemos nós demorar este bem que podemos fazer já" se não podemos por ora fazer uma reforma na universidade geralmente, façamola em aquillo que lhe possa já ser util; façamos já com que os homens verdadeiramente liberaes, verdadeiramente constitucionaes, entrem para estes collegios, para o que só se deve olhar ao merecimento. Não vejo por tanto motivo algum para se não approvar este meio que offerece a Commissão, que he o mais necessario, o mais util, e o mais proprio para regenerar as letras: querer fazer o bem não se deve empecelo, pelo contrario, esta pequena cousa quero-a fazer logo, que se possa fazer.
O Sr. Sousa Machado: - Sr. Presidente, sou membro da Commissão, assignei o projecto, e devo dar a razão, que me moveu. Os que entrão nos collegios das ordens militares não fogem do mundo; não tem por fim cumprir as obrigações do estado religioso; mas sim obter meios de continuar na sua carreira literaria: seria pois uma monstruosidade obrigalos a fazer uma profissão, de que não resulta proveito, nem á Religião, nem ao Estado. Não se seguem os inconvenientes apontados por um illustre Preopinante. Nas ordens militares presentemente não ha individuos em circunstancias de occupar os lugares, que tem nos collegios as mesmas ordens: achão-se prohibidas as acceitações, e eu nunca me poderia persuadir, que hajão algumas Cortes que consintão, que elles tornem a acceitar noviços. Além disto devo accrescentar, que se as ordens tinhão esses lugares nos collegios, de facto lhe não servião, porque eu conheci muitos freires frequentando as aulas da universidade, sem que jámais podessem obter algum lugar, estando todos desoccupados. Não se segue prejuizo aos collegiaes, que hão de occupar para o futuro as collegiaturas; por quanto os beneficios das ordens, a que elles pertendião ter accesso, todos são de sua natureza simplices, cujo provimento está prohibido, e persuado-me não tornarão a ser providos; sendo absurdo se conceda o util, sem o oneroso, quando este he o principal, e aquelle o accessorio. Por tanto voto a favor do artigo do projecto, que me parece muito conveniente.
Declarando-se sufficientemente discutido o artigo, o Sr. Presidente propoz: se se approvova a 1.ª parte até ás palavraa - perfeitamente secularizados? E foi approvada.
O Sr. Castello Branco apresentou a seguinte

INDICAÇÃO.

Proponho como additamento á primeira parte do projecto de reforma dos regulares, os artigos seguintes:
1.° As ordens militares do Reino serão secularizadas, extinctos para o futuro seus votos religiosos, e consideradas unicamente como corporações civis.
2.° O Rei será declarado grão mestre de todas ellas, ficando subsistindo os grãos, dignidades, e insignias das mesmas ordens, para serem distribuidas pelo grão mestre em recompensa de serviços prestados á Nação.
3.º As commendas das mesmas ordens serão reduzidas a pensões, em numero, e rendimento competente, para serem conferidas aos que por serviços adquirirem a referida dignidade.
4.° As igrejas privativas das ordens militares ficarão pertencendo ao padroado da coroa, para serem providas como as outras, em tudo sugeitas aos Ordinarios respectivos, e servidas por clerigos seculares.
5.° Ficão extinctos todos os empregos, autoridades, e jurisdicção das mesmas ordens em quanto consideradas como corporações ecclesiasticas. - Castello Branco.
Ficou para 2.ª leitura em lugar competente. E ficou igualmente reservada para se discutir no seu competente lugar outra indicação do Sr. Deputado Barata, propondo a extincção de todos os conventos regulares de ambos os sexos no Reino do Brazil. Continuou o Sr. Presidente, entregando a votação a 2.ª parte do mesmo artigo, que declara a desannexação dos collegios militares em Coimbra: e foi approvada; assim como a 3.ª parte até ás palavras - os ditos dois collegios. - A 4.ª parte do artigo até ás palavras - estatuto particular - foi approvada; assim como a 5.ª e ultima parte.
Passou-se ao artigo 6.°: e o Sr. Presidente interrompeu a discussão, para informar o Congresso, de que á porta da sala se achava o visconde de Magé que vinha felicitar este augusto e soberano Congresso e protestar a sua firme adhesão ao systema constitucional. E igualmente o commandante militar Manoel Leite Pereira, nomeado para a comarca de Angra, que vem apresentar ao augusto Congresso Nacional os seus sinceros votos de respeito, e obediencia. Resolveu-se, que se tivesse com um e outro a consideração do costume. Proseguiu a discussão do artigo.
O Sr. Borges Carneiro: - Eu já disse aqui, que como me parecia bem a primeira parte do presente projecto relativa á reforma dos freires conventuaes; assim me parecia mal a segunda, relativa á refórma dos frades. Em verdade parece-me que se tratão os frades peior do que deve ser. Aos freires dá-se-lhes uma ração vitalicia pelas rendas do convento, e como ella vaga pela morte ou pela promoção do freire, accresce para o thesouro nacional. Porque se não adoptará esta mesma base para a refórma dos frades pertencentes a ordens patrimoniadas? Prohibiu-se o ingresso dos freires, com o que se verificará a sua progressiva extincção sem incommodo dos actuaes: porque se não adoptará esta mesma base para a refórma

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dos frades? Pois eu estou mui longe de approvar a sua extincção repentina, a gradual sim: prohibido o ingresso, seja bem tratada esta classe de cidadãos, chamados frades e freiras; e a extincção o tempo a trará. Para que pois nos propõe o projecto um certo numero de conventos que hajão de ser conservados? O Governo lá os irá reduzindo, como convier, segundo o numero dos frades de cada um, tendo ouvido os respectivos prelados.
Consideremos pois os conventos ou ordens regulares divididos em duas classes, patrimoniados, e não patrimoniados. Aos frades e freiras pertencentes aos conventos patrimoniados, que se quizerem secularizar, deve-se dar pelas rendas do convento, uma pensão annual em quanto não tiverem um officio publico ou beneficio ecclesiastico, que os sustente, no qual caso accresce a pensão para o thesouro nacional, bem como se elles morrerem. Esta pensão deve ser paga pelo convento da filiação ou da habitação do secularizado, e consistir em uma quota parte, por exemplo, em dois terços do que presentemente lhe cabe na distribuição do gasto geral, a qual pensão lhe fique servindo de patrimonio: devendo elles ficar obrigados á satisfação dos encargos pios que lhe tocavão na ordem por distribuição. Nada ha mais justo que isto; pois ainda que os bens das ordens sejão nacionaes, os frades e freiras tem comtudo o uso fructo e administração delles, e direito a continuarem em quanto vivos nesta fruição, ou na communidade ou fóra della por meio de pensões annuaes. São cidadãos: não deve caír sobre elles o pezo de uma durissima refórma, tornar-se-lhes odiosa a regeneração, nem cair todo o peso desta sobre a geração presente, para unico alivio das gerações futuras.
Quanto aos frades e freiras de conventos não patrimoniados ou mendicantes, já se vê que a esses não se pode assignar pensão alguma, porque os conventos a que pertencem nada tem, e as rendas dos que as tem, não podem pertencer a estes por direito algum, nem por tanto tem elles de que se queixar da sua sorte, pois assim a professárão: o que sómente resta he dar-se-lhes a preferencia nos concursos dos beneficios ecclesiasticos, e nos empregos para que forem habeis,
a fim de se facilitar o egresso aos que quizerem secularizar-se. Pois geralmente devem considerar-se os frades e freiras divididos em duas classes: uma dos que querem despir a roupeta, e ressuscitar para a sociedade com os dotes gloriosos de cidadão: e outra dos que preferem ficar involvidos vivos na mortalha do sepulcro; se degere in monasterio tanquam in sepulcro.
A reforma deve ser tal que os primeiros achem aberto o caminho e facilitados os meios de viver no seculo; e que os segundos não venhão a ficar pior do que
agora estão, antes melhor, se for possivel. Eisaqui o que demanda a natureza de cidadãos, a justiça e generosidade da regeneração, e (se posso usar de um
nome que tanto odío) uma razão de politica. Sim os frades falão aos povos por toda a parte nos confessionarios, nos pulpitos, nas praças, nos campos, e em
nome de Deus, e convém que falem bem da Constituição: porém cada um fala na festa como lhe vai nella: se forem maltratados com a regeneração teremos a combater um exercito de inimigos, como accontece ao governo Hespanhol, que acaso os tratou menos bem que convinha. Decretar-se que possão sair os que quizerem tirando breves, e fazendo patrimonio, ou tendo beneficio que lhe sirva de tal, onde está aqui reforma e melhoramento? Isso he velho. Percurramos a patriarcal e as igrejas provinciaes, e lá acharemos alguns fradres secularizados por esses meios. Mas quantos são os que os podem ter á mão? Mui poucos. Pelo contrario pelo meio que eu proponho ganha a sociedade muitos homens uteis, que trabalhem na igreja e no Estado confessando, ajudando os parocos; pregando, paroquiando; e como a pensão de 40$ ou 50$ réis não lhe chega para a sustentação elles buscárão empregar-se em officio ou beneficio, e tirar-se do reprehensivel ocio e inutilidade em que agora vivem, e com isso cessará de mais a mais a pensão para o thesouro, por maneira que em o Governo despachando um frade ganha a nação dois despachos, isto he, um operario e uma pensão.
Objectar-se-ha que assim se dá ansa a encherem-se de frades as praças e os tribunaes de Lisboa á pesca de beneficios. Respondo que os concursos hão de ser feitos perante os bispos, e eu seria de opinião que se decrete que os frades secularisados vão buscar as suas naturalidades, e que os bispos deltas os acceitem e empreguem segundo o prestimo de cada um.
A promessa de serem os frades empregados no seculo, conservando seus habitos he illusoria. Não he facil que a corte de Roma faça um breve geral de dispensa ou secularisação, de sorte que cá em Lisboa não haja mais a fazer do que pôr os nomes dos que se queira prover em algum beneficio. São mui varias as causas ou premissas que a respeito de cada um se costumão e devem allegar.
Resumindo minhas idéas , digo que o presente projecto constrange os frades e freiras a permanecer nas suas sepulturas, por isso mesmo que não lhes segura uma subsistencia no seculo. A grande base deve ser, que o convento respectivo fique obrigado a dar ao egresso uma quota v. gr. as duas terças partes do que agora lhe toca na distribuição do gasto geral em quanto elle não morrer, ou não obtiver officio ou beneficio, nos quaes casos a pensão vagará para o estado. Por este meio abriremos as portas da felicidade a tantas victimas, que seus pais encerrárão nos conventos, empurando-os ao sepulcro por avareza e vaidosos interesses de familia, compellindo-os em idades inexpertas a professar uma vida contraria á liberdade do homem, ás luzes do presente seculo, ao regime constitucional, a uma lei aviltadora da dignidade da natureza humana, inventada em seculos dc perseguição e de violencia para converter homens em autómatos, e sacrificar victimas ao despotismo paternal, á segueira e illusão, ao fanatismo, á superstição, em fim á desesperação, e ousarei dizer, á intriga e á immoralidade. Quebremos tão crueis grilhões, e demos a ditosa liberdade civil a tantos escravos e escravas dos desvarios religiosos.
O Sr. Guerreiro: - Neste artigo 1.º propõe a Commissão o numero de conventos que devem ser conservados: he impossivel fazer alguma cousa sobre

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esta materia uma vez que se ignorão os principios em que a Commissão se fundou. No relatorio que precede ao projecto diz ella, logo na primeira pagina (leu) parece-me que a illustre Commissão não propõe aqui se não o numero de conventos sufficientes para acommodar os membros das ordens religiosas, que actualmente existem: não tenho a este respeito outras informações estadisticas senão o mappa que acompanha o projecto; elle não he sufficiente para eu formar o meu juizo. Seria melhor que para esta redacção fixassemos regras, e que a pratica dellas fosse commettida ao Governo. A Commissão da refórma fez tudo quanto estava da sua parte, mas ja tenho ouvido que as informações que recebeu não forão todas exactas, este soberano Congresso não tem tempo nem póde verificar isto, e he melhor deixalo á providencia do Governo. Os artigos 6.° e 7.° não se podem conciliar: no ultimo delles diz o Governo designará estes mosteiros ou conventos conciliando as justas commodidades dos religiosos com o serviço da religião e do Estado, o que do certo não póde deixar de approvar-se, mais abaixo, e preferindo os das aldéas e campos aos das cidades e villas, tambem havendo igualdade de circunstancias não póde deixar de approvar-se pela utilidade, que disso se tira para a administração dos sacramentos; porém no fim diz, não podendo porém subsistir duas casas religiosas da mesma ordem em uma cidade, villa, ou districto: com effeito quando se trata de uma refórma estabelecer como regra que não deve haver duas casas religiosas em uma mesma cidade não me parece de razão: primo pelo direito que se suppõe que tem cada um dos seus membros a escolher o seu modo de vida segundo as leis: e em segundo lugar porque não podem propôr a venda dos seus bens. Quanto á primeira parte, que aqui traz uma regra mui obvia que he o numero dos conventos; eu proporia a seguinte regra: nenhuma ordem terá maior numero de conventos do que aquelles que forem necessarios para accommodação dos religiosos que tiver. Uma vez que os conventos não sejão precisos para habitação dos frades, ou se hão de arruinai não tendo ninguem, ou ha de ser tão pequeno o numero dos religiosos em cada um delles, que nada seja util, nem possão celebrar as funções divinas como devem. O outro lado porque isto se olha, he quanto á administração dos sacramentos; he preciso que o numero dos conventos seja proporcionado como preciso for para este fim, e para que não succeda, que os fieis vão a um convento para se confessarem, e voltem sem o serem: sendo entre nós tão grande o numero de ordens religiosas, segue-se que com as reformas muitos conventos virão a ser desnecessarios; a respeito disto eu proporia uma regra: em nenhuma didade ou villa, haverá mais de dois conventos, excepto em Lisboa, Porto, e Coimbra. Observa-se que ha muitos conventos das ordens monacaes, tendo um pequeno numero de religiosos que servem mais para habitar as casas do que para outra cousa, de que se segue nem
haver disciplina, nem guardarem a clausura monastica: isto me sugerio outra regra e he: todos os conventos em que se não guardar a competente regra, ficão supprimidos. Parece-me que fundando este artigo nestas tres regras, e deixando a execução delle ao Governo, teremos satisfeito nesta parte, sem entrar-mos em indagações vagas. Voto que assim se substituão os artigos 6.° e 7.°, voltando para esse fim á Commissão.
O Sr. Rebello: - Dois illustres Deputados attacão o artigo 6.° do projecto, e este attaque offende essensialmente o plano que a Commissão propõe para a reforma das corporações patrimoniadas. Tenho pezar de que o primeiro dos dois illustres membros não lesse todo o projecto no que diz respeito ás corporações patrimoniadas, aonde acharia todas quantas providencias aponta como omissas; e que entreveja a discussão dos artigos deste projecto, ou que se trata das secularisações dos regulares aonde poderão ter logar as reflexões, que fez sobre a consignação dos rendimentos dos conventos e ordens religiosas patrimoniadas para mais facil secularisação dos frades destas ordens. Poderia ainda o mesmo illustre Membro, uma vez que se propoz antecipar aquella discussão, tornar a materia mais ao fundo, e refutar as rasões que a Commissão apresenta no preambulo para não adoptar similhante arbitrio; entre tanto he sempre mais facil desaprovar vagamente, do quo refutar com analise, e emmendar com politica legislativa. Eu prescindo pois de responder ao illustre primeiro Preopinante naquillo a que lhe responde o projecto, e não me encarrego de mostrar os inconvenientes que resultão do arbitrio das secularisações vagas que propõe 1.° em quanto o illustre membro não refutar o que a este respeito pondera a Commissão no preambulo do projecto; 2.º em quanto o soberano Congresso não determinar, que essa questão, se quizerem que o seja, se antecipe ao sen lugar proprio, e que he aquelle em que se trata das secularisações dos regurares.
Quanto ao segundo Preopinante eu não colho do discurso os fados fracos porque ataca este artigo, e os seguintes. Eu esperava, que em lugar de desapprovar vagamente o artigo, por não saber as bases em que se funda; pedisse á Commissão os precisos esclarecimentos, porque só depois delles he que poderia desapprovar o artigo com conhecimento de causa, para não cair na contradicção de desapprovar esta doutrina meramente por não estar ao facto dos esclarecimentos, que a devem ligitimar. O illustre Deputado recebeu um mappa estatistico das corporações religiosas, a Commissão não o apresenta como uma peça infallivel, mas apresenta-o como documento sufficiente para fundamentar o plano de reforma, e segurar os seus resultados, na certeza de que as inexactidões, que elle possa ter, nada influem para os bens em grande, que o projecto adopta. Assim mesmo eu vinha preparado com as taboas estatisticas das corporações religiosas, cujas casas regulares se fixão neste artigo para mostrar os fundamentos que a Commissão respeitou. Quanto mais o illustre membro se esmera em desapprovar o artigo, tanto mais demonstra sem o pensar a necessidade delle. Sabemos o numero de religiosos, e de conventos, que tem as corporações religiosas patrimoniadas, e sabemos quaes são em geral as suas rendas; então que falta ao soberano Con-

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gresso para fixar o numero de casas a que desde já se devem reduzir? Deixaremos ao Governo este arbítrio, e quaes serião as regram, que se lhe poderião dar para regular este arbítrio? Marcar o numero certo dos religiosos para cada convento suppõe igual capacidade, e rendimento em todos os conventos; designar numeros disiguaes seria uma puerilidade, não fazendo logo as appliçações aos respectivos conventos; não designar numero seria não fazer nada, e deixar a reforma ao Governo, em lugar de encarregar ao Governo a sua execução. Aquillo, a que o illustre Deputado chama regras não o são, umas por demasiadamente vagas, outras por nimiamente restrictas, e até impraticaveis. O illustre Deputado suppoz a reforma mais facil, e mais simples, do que na verdade he. Pouco teria sido o trabalho da Commissão, se com tão pouco se podesse fazer a reforma das ordens regulares. He preciso convir, em que segundo as duas classificações mais geraes de corporações patrimoniadas, ou mendicantes assim deve marchar o plano de reforma; das primeiras porque tem subsistencia certa devem marcar-se os conventos, com que devem ficar na proporção dos frades que actualmente tem; das segundas, porque vivem da caridade dos povos, devem tão sómente extinguir-se os hospícios por não admittirem vida claustral, e as casas duplicadas nas mesmas cidades e villas, porque de um só convento podem sair a buscar a caridade de todos os moradores dessas cidades, ou villas, e quanto ao mais contentar com as regras geraes, que o projecto offerece, ou com outras, que pareção ainda melhor. Tudo, quanto for exorbitar vagamente fóra destes caminhos, he complicar a materia já de si complicada, e difficil; e desapprovar aquillo, que a Commissão organizou com muito trabalho para lhe não substituir cousa melhor, he intorpecer as operações do soberano Congresso em um objecto summamente importante.
Parece-me ter ouvido ao illustre Preopinante, que o projecto deve voltar á Commissão, e para que, se o illuslre Deputado não confia, nas informações estatísticas que teve a Commissão naquella parte em que, a Commissão as julgou suffcientes para lançar o artigo 6.°, como he que o illustre Deputado entende que a Commissão ha de fazer ou mais ou menos do que aquillo que fez na presumpção dos mesmos dados que ainda hoje existem? Agora se o nobre membro requer, que o projecto se lhe remetta a elle para o substituir pelas regras que propõe, ou por outros quaesquer, eu pela minha parte digo que sim, porque a pezar de que não mudei ainda de opinião, porque ainda não ouvi rasões que a isso me possão mover, todavia nunca entenderei, que a minha opinião vale mais do que as dos outros para que lhes deva preferir. Como porém observo, que deu a hora, e não he justo abuzar da paciencia do augusto Congresso em materia que ha de ficar adiada, por isso concluo, rogando aos dois illustres membros que meditem o projecto, e pessão á Commissão os esclarecimentos precisos para o poderem verificar.
Tendo chegado a hora de findar a sessão, ficou adiado o artigo
Deu o Sr. Presidente para a ordem do dia a Constituição, e para a hora da prolongação parecera adiados das Commissões: e levantou a sessão, sendo meio dia. - Francisco Barrozo Partira, Deputado Secretario.

RESOLUÇÕES E ORDENS DAS CORTES.

Para Filippe Ferreira de Araujo e Castro.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza mandão voltar ao Governo o officio incluso, e documentos que o acompanhavão da junta provisional do governo de Pernambuco, datado em 10 de Junho proximo passado, e transmittido às Cortes pele Secretaria de Estado dos negocios do Reino na data de 8 do corrente.
Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 10 de Agosto de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para José da Silva Carvalho.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza mandão voltar ao Governo para ser resolvida nos termos do decreto de 8 do corrente mez, a consulta inclusa da meza do desembargo do paço de 17 de Janeiro deste anno, e mais papeis que com ella forão transmittidos às Cortes pela Secretaria de Estado dos negocios da justiça em 19 do dito mez de Janeiro pertencentes ao desembargador da relação da Bahia Antonio Maria Carneiro e Sá, ácerca da dispensa que requer, da residencia do lugar que serviu de ouvidor geral da comarca do Pará. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 10 de Agosto de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Redactor - Velho

SESSÃO DE 12 DE AGOSTO.

ABERTA a sessão, sob a presidencia do Sr. Freire, leu-se a acta da antecedente, que foi approvada.
O Sr. Secretario Felgueiras mencionou os seguintes officios.
1.º Do Ministro dos negocios do Reino, participando o conteudo de um officio, que recebêra da junta do governo da Paraiba em data de 25 de Maio do corrente, pedindo instrucções para se regular a respeito do decreto do Príncipe Real de 16 de Fevereiro; participação esta, que, diz o Ministro, Sua Magestade mandára fazer, apezar de se terem dado todas as providencias a similhante respeito, e de que, as Cortes ficárão inteiradas.
3.° Do mesmo, acompanhando uma consulta do senado da camara de Lisboa sobre a duvida, que se offerecia, a serem admittidos a votar nas eleições pa-

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