O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 141

[141]

do-se ainda detidos nas cadêas da relação do Porto; ponderadas mui plena é maduramente todas as circunstancias do caso; e attendendo a que a entrega na falta de obrigação especial proveniente de tratados não póde verificar-se, segundo os genuinos e depurados principios dos direitos politico é das gentes: declárão insubsistente a citada portaria, e resolvem, que os recorrentes sejão postos em liberdade; mas que em attenção á boa paz, e amizade que felismente reina entre as duas Nações portugueza e hespanhola, sejão os mesmos recorrentes obrigados a sair do territorio de Portugal e Algarves no termo mais curto possivel, que lhes será assignado pelo Governo. O que V. Exc. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exc. Paço nas Côrtes em 9 de Fevereiro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza ordenão que lhes seja transmittida a consulta a que se mandou, proceder pela meza do Desembargo do Paço a respeito dos requerimentos e questões que pendião entre a collegiada de Coruche, e Fr. Francisco Annes de Carvalho, com todos os papeis originaes desta controversia, ou estejão naquelle tribunal, ou passassem já para a meza da Consciencia e Ordens. O que V. Exc. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 9 de Fevereiro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor: - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza mandão reverter ao Governo, a fim de se instruirem, o processo a que se mandou proceder pela ordem de 18 de Junho de 1821, os tres officios que forão transmittidas pela Secretaria de Estado dos negocios da marinha em data de 7 do corrente mez, do tenente general Francisco de Borja, Garção Stockler, vindos do Rio de Janeiro, um por segunda via com data de 2 de Janeiro, e os dois, com data de 7 é 26 de Abril, tudo do anno proximo passado, e dirigidos ao ministro que então era da marinha naquella cidade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 9 de Fevereiro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para José Ignacio da Costa

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza ordenão que lhes seja transmittida uma relação circunstanciada dos arrendamentos feitos nos almoxarifados nacionaes, que estão debaixo da administração do provedor das Lesirias do Riba-Tejo, com declaração dos arrendamentos que por aviso ou decreto se tem feito a pessoas que não são lavradores, nem tem gados, nem aviamentos d'abogaria, e que com alças as arrendão a terceiros, ou vendam ao pastagens, seus nomes, e quantidade de moios de terra, bem como daquelles arrendamentos que tem sido celebrados sem aviso ou decreto mas cujos arrendatarios, não tendo gados igualmente deixão de fabricar as terras, e as passão a terceiros com alças. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exc. Paço das Cortes em 9 de Fevereiro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza mandão remetter ao Governo, a fim de ser competentemente verificado, o incluso offerecimento, que a beneficio da divida publica dirigirão ao soberano Congresso Miguel Xavier de Pomes Corrêa da Silva, Coronel reformado do regimento de infanteria n.º 13, do que tem vencido, e de futuro vencer, das tenças de 18:000 réis, e de 12:000 réis, que se lhe pagão na alfandega do Porto, e sua irmã D. Ignez Barbara de Santa Anna Xavier de Pontes, do que igualmente tem vencido, e de futuro vencer, da tença de 8:000 reis que percebe pela folha da casa de Ceuta.

Deus guarde a V. Exc. Paço das Cortes em 9 de Fevereiro de 1822.- João baptista Felgueiras.

Para Candido José Xavier

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza, ordenão que lhes seja transmitida pela Secretaria do Estado dos negocios da guerra uma relação nominal por antiguidades, dos individuos que no regimento de infanteria n.º 20, forão promovidos a alferes por portaria de 5 de Janeiro de 1809. O que V. Exa. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exc. Paço das Cortes em 9 de Fevereiro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Redactor - Velho.

SESSÃO DE 11 DE FEVEREIRO.

ABERTA a Sessão, sob a presidencia do Sr. Serpa Machado, leu-se a acta da sessão antecedente, que foi approvada.

O Sr. Secretario Felgueiras mencionou os seguintes officios :

1.° Do Ministro dos negocios do Reino, enviando ás Cortes uma conta, e projecto da Commissão para é melhoramento do commercio da cidade de Lamego. Mandou-se para a Commissão de commercio.

2.° Do mesmo Ministro, remettendo ás Cortes, em conformidade do officio de 7 do corrente, o requerimento de D. João Manoel de Vilhena, e seu irmão, a informação que sobre elle se houve do re-

Página 142

[142]

formador reitor da universidade, e a copia da portaria, pela qual se lhes concedeu dispensa de lapso de tempo. Remetteu-se á Commissão de instrucção publica.

3.º Do Ministro dos negocios da justiça, sujeitando á deliberação das Cortes um officio do chanceller, que serve de regedor da casa da supplicação, sobre a necessidade de derogar o § 2.º do alvará de 13 de Maio de 1813, que supprimiu as duas varas do corregedor do civel da corte. Dirigiu-se á Commissão de justiça civil.

4.° Do Ministro dos negocios da guerra, transmittindo o requerimento de D. Anna Ascoff, e a informação sobre ela dada pelo official, que serve de contador fiscal da thesouraria geral das tropas. Mandou-se á Commissão de fazenda.

5.º Do Ministro dos negocios da marinha, enviando inclusos tres officios, dois do ex-governador do Siará, e um do governo provisorio do Piauhy. Mandou-se á Commissão de Ultramar.

6.º Do mesmo Ministro, remettendo a parte do legislo do parto desta capital, e um officio dirigido ás Cortes, vindo na escuna Nynfo, recentemente chegada dos Açores. Ficárão as Cortes inteiradas

7.º Do mesmo Ministro, enviando a parte do registo, e um officio do marechal Bernardo da Silveira Pinto, remettido pela escuna Maria, ultimamente chegada. Foi á Commissão de Constituição.

8.° Do Ministro dos negocios da fazenda, transmittindo a resposta do provedor serventuario da casa da moeda, e as reflexões do mesmo Ministro sobre o valor legal das nossas moedas de ouro. Mandárão-se imprimir tanto estas, como aquella, para se distribuirem pelos Membros do Congresso.

Ficárão as Cortes inteirados dos agradecimentos, que lhes enviárão os membros do governo provisorio do Fayal e Pico, a camara de Villa Franca do Campo, e a de Ponta Delgada da ilha de S. Miguel, pela decretada separação do governo de Angra. Mandou-se fazer menção honrosa de uma felicitação dirigida ás Cortes pela camara da nova villa de Caxias das Aldeias Altas da provincia do Maranhão.

Foi ouvida com agrado uma felicitação ás Cortes, com protestos de obediencia e adhesão, de Francisco Alberto Rubim, ex-governador do Siará.

Foi mandada á Commissão de fazenda do Ultramar uma representação, em que Joaquim Jgnacio Lopes de Andrade, contador da fazenda na villa da Fortaleza do Siará, offerece as suas observações sobre a arrecadação e administração das rendas publicas naquella provincia.

Remetteu-se á Commissão de Constituição um requerimento com sessenta e nove assignaturas dos habitantes do districto do Miarim, na provincia do Maranhão, pedindo a conservação do governador Bernardo da Silveira Pinto.

Mandou-se passar á Commissão de agricultura um officio da commissão do terreiro publico, incluindo os mappas demonstrativos do mez de Janeiro proximo passado, por onde se conhece o estado daquella repartição.

Remetteu-se ao Governo, para tomar as convenientes providencias, uma conta do juiz de fora de Angra, expondo que uns trinta individuos quizerão fazer um motim naquella cidade na noite de 11 de Janeiro ultimo, levantando vozes sediciosas, de que passára logo a devassar; e que o governador procedera á prizão de dois militares, por constar da sua publicidade naquelle acontecimento.

Dirigiu-se á Commissão de fazenda a primeira parte da obra Elementos de riqueza publica, compostos por João Linneu Jordão, e por elle offerecida ás Cortes.

Remetteu-se á Commissão das artes umia memoria de João Antonio Paes do Amaral, sobre a reforma da fabrica nacional das cartas de jogar.

Concedeu-se ao Sr. Almeida e Castro, Deputado pela provincia de Pernambuco, a dispensa que mandou pedir ao Congresso, de assistir ás Sessões pelo tempo necessario para restabelecer a sua saude.

Fez-se a chamada, e achárão-se presentes 111 Deputados, faltando 22, a saber: os Srs. Gyrão, Osorio Cabral, Canavarro, Ribeiro Costa, Sepulveda, Durão, Lyra, Agostinho Gomes, Van Zeller, Jeronymo José Carneiro, Almeida e Castro, Innocencio Antonio de Miranda, Queiroga, Mantua, João de Figueiredo, Faria, Affonso Freire, Sousa e Almeida, Rebello, Zefyrino, Franzini, Ribeiro Telles.

O Sr. Rodrigo Ferreira, por parte da Commissão de poderes, leu o seguinte

PARECER.

A Commissão dos poderes viu na acta da junta eleitoral da provincia de S. Paulo terem sido eleitos na cidade deste nome em os dias 6 e 7 de Agosto de 1821, para Deputados de Cortes pela mesma provinda os Srs. Antonio Carlos Ribeiro de Andrada Machado; Nicoláo Pereira de Campos; Vergueiro; José Ricardo da Costa Aguiar; Francisco de Paula Sousa e Mello; José Feliciano Fernandes Pinheiro: e Diogo Antonio Feijó: e para Deputados substitutos, os Srs. Antonio Manoel da Silva Beino, e Antonio Paes de Barros.

Tendo chegado a esta capital os tres Deputados, Antonio Carlos Ribeiro de Andrada Machado, Nicoláo de Campos Vergueiro, e Diogo Antonio Feijó, com os dois substitutos, remettêrão todos á Commissão os seus diplomas.

A Commissão, combinando os dos tres Deputados proprietarios com a acta respectiva, o examinando os poderes de que vem revestidos, acha-os legaes e amplos, como convem: e he de parecer que os mesmos tres Deputados estão nas circunstancias de serem recebidos no soberano Congresso. Porém a Commissão mandou restituir aos dois substitutos os seus diplomas para que hajão de apresentalos quando sejão chamados ás Cortes, e he de parecer que se espere pela vinda dos outros tres Deputados, que não consta tenhão impedimento legal para com parecerem. Paço das Cortes em 11 de Fevereiro de 1822. - Rodrigo Ferreira da Costa; Antonio Pereira; João Vicente Pimentel Maldonade.

Foi approvado.

Página 143

[143]

Passando-se á ordem do dia, entrou em discussão o additamento do Sr. Borges Carneiro ao artigo 166 da Constituição, apresentado na sessão de 9 do corrente. Em apoio delle disse o seu illustre autor.

O Sr. Borges Carneiro: - Nós temos sanccionado um grande principio no §. 164 estabelecendo a responsabilidade dos ministros; mas este principio será vão, se ao mesmo passo não estabelecermos meios adequados para se verificar esta responsabilidade. E pois quaes são os meios que temos estabelecido para este fim? São todos insufficientes, e senão percorramo-los rapidamente. O primeiro meio he o da residencia de que se falou no 148, e se assentou que não se tratasse deste na Constituição; porém ainda mesmo quando venha a admittir-se n'uma lei regulamentar, he um remedio insufficiente 1.° porque só se encaminha a punir erros passados, e não a prevenir os que o juiz possa commetter: 2.º porque he um meio tardio, que não da á parte a satisfação do seu damno, ou injuria, senão passados, tres annos quando ella talvez já não tenha promptas as testemunhas e mais provas: 3.° porque só comprehende os magistrados temporarios, e não os desembargadores. O outro meio de realizar a responsabilidade, do qual se tratou no §. 158, he o das revistas, quando chega o processo á relação que as ha de julgar; meio tambem insufficiente: 1.° porque a revisa só tem lugar e o devo ser em casos rarissimos: 2.º porque só comprehende as sentenças dos desembargadores, e não as dos juizes subalternos: 3.° porque só abrange os casos de nulidade ou injustiça notoria, constante dos autos, e deixa de fora todos os outros erros e delictos que não constarem dos autos. O outro meio he o da acção popular de que trata o artigo 164, tambem insufficiente: 1.º porque ella não póde ter lugar se não nos casos de peita ou suborno, casos difficillimos de se provarem; porque o juiz que recebe dinheiro, não chama testemunhas para o receber, e se a peita consiste em generos os recebe por interposta pessoa: 2.° porque esta acção competirá sómente aos litigantes ricos, e não aos pobres, que não poderão sustentar uma demanda contra um juiz poderoso e rico; se pobre, ninguem quererá a riscar uma acção em que he necessario provar requisitos tão improvaveis contra um ministro que hade ser julgado pelos seus collegas, que provavelmente hãode pôlo a elle por um santo, e ao seu accusador por um calumniador. Outro meio finalmente he o do art. 167 quando sobe á relação algum processo, em que se deprehende infracção de lei; meio tambem insuficiente, 1.° porque só comprebende os juizes inferiores, e não os desembargadores: 2.° porque só abrange os erros do processo, e não os infinitos abusos de autoridade que se podem commetter fóra delle: 3.º porque só tende á irrogação de correcções e penas leves.

Um só meio ha por tanto que seja prompto, facil, e universal para fazer effectiva a responsabilidade de todos os ministros e em todos os casos, e he o que se propõe em e nosso art. 166. isto he, o ter a parte offendida o direito de dar uma conta ao Rei, e este depois de havidas as informações necessarias e de ouvir o conselho d'Estado mandar suspender o ministro e remetter a sua culpa ao tribunal competente para o julgar. Ora este meio prompto, facil, e universal, e inutil aos habitantes do Ultramar, a não admittir-se o meu additamento. Supponhamos uma queixa enviada ao throno de um lugar donde possa chegar em tres mezes, por não falar agora em Moçambique, Góa, ou Macáo: vinda da queixa, ida para tomar informações, vinda destas, ida da resolução tornada, intervallos para achar navios e proceder ás diligencias; aqui temos passados 15 a 18 mezes, só para poder a parte offendida conseguir a suspensão do juiz seu oppressor, que nesses 18 mezes a continuará a opprimir mais que dantes. E será justo que um cidadão que por ser ultramarino hão he menos cidadão, espere e soffra tanto tempo para poder fazer suspender e metter em processo o seu oppressor? Em tão longo tempo não perecerão suas provas? Não morrerão algumas das suas testemunhas, não se ausentarão outras? Srs., na regulação das nossas relações seja commerciaes seja politicas com o Brazil e mais povos ultramarinos, não mostremos espirito de minuciosa dominação: apertar muito os vinculos he fazelos estallar: o melhor vinculo he o que prender a todos no gozo de uma justiça facil e de bens reciprocos. Salvas as grandes attribuições do poder legislativo e executivo, façamos quanto poder ser, que os povos ultramarinos tenhão dentro do seu seio todo o remedio de seus mares, todos os meios do seu bem: façamos com que no exercicio do poder judicial, bem como no do administrativo e economico elles não precisem vir áquem, do mar indico ou atlantico buscar o seu bem ou remover o seu mal. Sejamos caherentes. Porque razão haverá no Brazil uma autoridade para castigar os desembargadores por meio do processo da revista, como já se sanccionou, e não a haverá a respeito dos mais juizes, e dos mais casos?

Por tanto he necessario constituir no Brazil uma autoridade que possa suspender preparatoriamente os magistrados, em consequencia das queixas que se lhe dirigirem, como em Portugal os póde suspender o Rei. Qual deva ser esta autoridade, ou não se declare na Constituição; ou discutamos qual possa ser. Eu já opinei que a mesma relação que for autorizada para conceder revista no Brazil, póde ter aquella faculdade, no que ha bastante analogia; porque como o Piei, ou para falar mais exactamente, o seu ministro, pois o Rei não está a examinar papeis, como o ministro do Rei, digo, quando se lhe apresenta uma queixa, depois de examinar papeis, e a informação, e ser ouvido o conselho de estado, decide sobre a suspensão preparatoria do juiz arguido; assim tambem porque não confiaremos nós do governador daquella mais autorizada relação poder fazer em meza grande o mesmo que faz o secretario de estado? Sustento por tanto constantemente o seu actual additamento.

O Sr. Freire: - Estou maravilhado de vêr a confusão de ideas que ha no illustre Preopinante, e por maior que seja a minha prevenção em favor dos seus altos conhecimentos, e idéas constitucionaes que o caracterizão, elle acaba o seu discurso confundido o Rei com a relação provincial: querendo attribuir a

Página 144

[144]

esta o poder daquelle, e isto só bataria para servir de resposta ao que elle acaba de dizer, entre tanto hoje insistirei nas ideas que pronunciei na sessão passada contra esta indicação. Trata-se de poderes constitucionaes, trata-se do Poder Real, e tudo isto vai ligar-se com o que já está sanccionado em a nossa Constituição, e como systema adoptado. Na ultima sessão disse eu que não poderia convir de maneira nenhuma que houvesse de delegar-se a pessoa alguma o poder que tinhamos dado ao Rei de suspender os magistrados. 1.º Porque este poder sendo real não póde delegar-se. 2.° Porque os povos, e os magistrados do Brazil vinhão a ficar de uma condição inteiramente differente do que ficavão os povos de Portugal. 3.° Porque estas ideas se fundavão na falsa persuação de que era possivel que todos os povos tivessem todos os recursos do mesmo modo, que os tem os que estão juntos do monarca; cousa que não se verifica mesmo em Portugal. Diz-se que todas as commodidades que ha de ter uma sociedade, devem ter todos os habitantes dessa sociedade, isto não he assim; todos os direitos dos habitantes de uma sociedade são iguaes, mas não podem ter todos as mesmas commodidades pois estas dependem da brevidade: ora esta igualdade de direitos, a qual sem duvida pertence tanto aos habitastes de Portugal como os do Brazil, está já concedida sem alguma differença, pois todo o homem a quem um magistrado faz uma injuria, tem direito de fazer punir essa injuria, fazendo responsavel os juizes perante os tribunaes; todo o homem a quem se deu uma sentença, com falsidade e injustiça notoria, tem direito a uma revista, todos aquelles a quem ainda não são bastantes todos estes recursos ordinarios, tem um recurso ao Rei, e isto tanto os cidadãos de Portugal, como os da America. Em consequencia está perfeitamente nivelada na Constituição a condição de todos os individuos da monarquia. Mas replica-se: São iguaes os direitos, mas não são os commodos, e por tanto he necessario que este poder de suspender os magistrados se delegue. A Constituição disse que o Rei poderia ter o poder de suspender os magistrados, mas reparemos que disse, só o Rei, ninguem mais: reflictamos bem na razão porque este poder se concede ao Rei; he porque elle só he inviolavel, e indepente; he elle só, perante quem estão niveladas as fortunas e condições de seus subditos, he elle só, que constitucionahnente falando não póde ser atacado, de paixões nem de amor, nem de odio, e he pois nesta qualidade que se dá ao Rei o poder de suspender os ministros; he nesta qualidade que se lhe concede o veto suspensivo, o poder de agraciar etc., e fazemos disto uma prerogaliva propriamente real. Poderá por ventura delegar-se o veto suspensivo? Poderá delegar-se o poder de agraciar? Poderá delegar-se o poder de fazer a paz, e fazer a guerra? Poderá por ventura uma relação, uma junta administractiva, um chefe politico das provincias do Ultramar, arrogar a si uma parte deste poder real simples, e unico, que existe em pessoa do Rei, e que não existe na pessoa delle, sdaão (torno a dizer) porque elle tem a presumpção ne ser justo, e independente; porque perante elle são iguaes as fortunas de todos os cidadãos; tudo que não for isto, he estabelecer o arbitrio, he deitar por terra o systema constitucional. Que se seguiria, se em uma junta, se em um governador de uma provincia, houvesse esta autoridade de suspender os magistrados; aonde estava a independencia do poder judicial, ficando exposto aos caprichos de taes autoridades? Não he por tanto possivel, delegar-se este poder real. Mas supponhamos por um pouco que o he, e que se delegava em um individuo, ou em uma junta, ou relação. Mas pergunto eu, delegava-se em todo, ou em parte? Se em todo o que aconteceria? Que este delegado, que tinha tal poder, era sujeito a todos os defeitos, sujeito á responsabilidade como outro qualquer homem, porque só um homem unico he que não he responsavel, e ficavão de boa sorte os individuos, que tivessem uma tal autoridade em lugar d'ElRei, e como he possivel o combinar poderes delegados in totum com a responsabilidade? como he possivel que havendo uma autoridade no Brazil não independente, nem inviolavel torno o Rei, não estivesse sujeita a responsabilidade? alem desta contradicção, quem havia de verificar a responsabilidade desta autoridade, ou individuo? o Rei: eis-ahi os povos do Brazil, com mais outro recurso, o que he absolutamente impraticavel. Mas vamos a ver o outro argumento, de que os povos devem ter as mesmas commodidades: suppunhamos que se deve estabelecer uma junta provisoria, ou uma relação, a quem se delegue este poder real, sobre que disputemos, e examinarei se assim mesmo se resolve este problema: para isto eu sou obrigado a fazer uma viagem, pelos vastos dominios portuguezes.

Principiarei por Portugal, e he claro que ha da haver pelo menos em cada provincia um delegado; porque bem facil he de ver, que em Portugal nem todos tem agora as mesmas commodidades. Vamos ás ilhas: dirá alguem que ha de haver em cada uma das ilhas uma autoridade, como se pretende estabelecer no Brazil; parece que pelas mesmas razões a deveria haver. Vamos á costa d'Africa, ha de haver na costa d'Africa uma autoridade a quem seja delegado este poder? talvez me digão que não. Vamos á India, ahi não póde deixar de haver uma autoridade delegada, e aqui entramos já em duvida se esta autoridade se ha de estabelecer em Goa se ha de ser em Bengalla, ou aonde. Vamos ao Brazil: he necessario estabelecer ali uma autoridade para suspender os magistrados, mas em que parte do Brazil se ha de estabelecer; dir-me-hão talvez que em todas as provincias, das isto não póde ser, porque já está determinado que nem em todas provincias houvesse relações superiores, e então não deve haver autoridade alguma de quem haja recurso das relações. Supponhamos que se estabelece em o Maranhão, em Pernambuco, na Bahia, e no Rio de Janeiro; pergunto eu agora, gozão assim todos os povos do Brazil de iguaes commodidades? Certamente não.

Os povos do certão hão de ter necessariamente mais incommodos que os outros povos. Por tanto se he impossivel que os povos todos tenhão igual commodidade, he muito necessario que conservemos a

Página 145

[145]

indivisibilidade e unidade da monarquia; não ha duvida nenhuma que todos os povos da monarquia devem ter, e tem os mesmos direitos politicos e individuaes. Eu desejaria muito que na Constituição nunca apparecesse Portugal, e Ultramar; mas sim que se falasse de uma só, e a mesma familia portuguesa, tendo-se como principio certo que os representantes do Brazil são representantes em solido da nação. Por tanto votando pela união indispensavel dos povos do Ultramar e Portugal, voto contra o additamento.

Interrompeu-se a discussão para entrarem a dar juramento, e tomar assento no Congresso, os Srs. Andrada Vergueiro, e Feijó, Deputados pela provincia de S. Paulo.

O Sr. Trigoso: - Eu tinha pedido a palavra para explica a mesma opinião, que acaba de defender victoriosamente o Sr. Freire, mas eu fazia tenção de começar o meu parecer por mostrar que a questão presente he inteiramente alheia do §, porque não sé trata agora de fazer effectiva a responsabilidade dos ministros; e para conhecer isto, basta lançar os olhos sobre todo este capitulo 2.° De todo elle vêmos, que os ministros são responsaveis, que não podem ser depostos senão por sentença, e que não podem ser suspensos senão temporariamente pelo Rei, e nas relações quando se conhecer pelo processo serem os magistrados incursos em algum dos crimes do artigo 164. Em quanto porém ao modo porque se ha de fazer effectiva a responsabilidade dos ministros, isto he o que nós ficamos sem saber pela Constituição, e que ha de ser determinado pelas leis posteriores. Por tanto, qual he a razão porque vem aqui uma tal questão? Que se concede aqui de unidade aos povos do Brazil? eu que se lhes tira? Eu vejo que ainda que se conceda ao poder rea a prerogativa de suspender interinamente os magistrados, não se faz com isso mais do que prevenir o procésso.

Não tem nada pois a suspensão interina dos magistrados feita pelo Rei, com a vingança que a justiça pede que se tire dos delidos dos magistrados, e por tanto poderia o artigo 166 estar, ou não estar na Constituição, sem que isto influísse na effectiva responsabilidade dos ministros. Se pois he uma prerogativa inteiramente rea o poder suspender os magistrados, e uma prerogativa extraordinaria que não tira o conhecimento ordenado dos seus delictos, segue-se que só o Rei o póde exercitar. Mas o Rei não o pode exercitar tão promptamente nas outras parles da monarquia, como o póde exercitar em Portugal: convenho; porém o que d'aqui se segue he, que os povos do Brazil não podem ter logo os effeitos desta suspensão extraordinaria, mas que sempre lhe ficão salvos todos os me os para fazer effectiva a responsabilidade dos magistrados; e por isso ainda que não gozem este beneficio em toda a sua extensão, elles não perdem nada, nem podem sentir prejuizo algum. Ora isto que tenho mostrado relativamente á suspensão dos magistrados, he o que se verificaria de uma maneira diversa a respeito dos outros poderes, com os quaes os povos do Brazil ficão deteriorados. Do direito de agraciar, só podem sentir utilidade immediata os povos que estão em Portugal: entre tanto não se póde delegar este poder. Convierão todos que era uma, prorogativa verdadeiramente real; e os vos do Brazil, Africa, e Asia não hão de poder gozar dos effeitos deste direito? Diz-se que não tem isto inconveniente, porque o direito de agraciar he um direito extraordinario, pois a justiça o que quer he que se premeiem os benemeritos, e castiguem os culpados; assim ainda que todos não recebão o seu beneficio, não importa. Ora o mesmo succede a respeito da suspensão dos magistrados; este beneficio o não podem todos gozar promptamente; e por isso que nem todos o podem gozar promptamente, dever-se-ha delegar? Mas supponhamos que he de absoluta necessidade o delegar-se este poder: para quem se ha de delegar? Um honrado membro diz: para as relações. Diz outro: para, quem, tiver o poder politico. Consideremos a primeira hypothese: delega-se para as relações, isto he, concede-se ás relações o direito de julgar as causas depois de processadas na forma da lei, a qual ellas nunca podem alterar, e ao mesmo tempo concede-se-lhe o poder extraordinario de saltar as disposições das leis. Estes tão diversos poderes exercitados pela mesma pessoa fysica ou moral hão de produzir inconvenientes gravissimos, ha de verificar-se o arbitrio, e o despotismo. Entre nós não ha este perigo, porque o Rei tem obrigação, antes de suspender um magistrado, de se informar, e de ouvir o seu conselho d'Estado; e que concelho hão de ouvir as relações do Brazil? Em segundo lugar são as relações, as que hão de conhecer dos casos de revista das sentenças proferidas pelas mesmas relações, e então que inconvenientes não produzirá isto? Como poderá dar-se ao mesmo corpo o poder exercer funcções diversas, suspender extraordinasiamente os magistrados, julgar em grau de revista, e fazer effectiva a sua responsabilidade? Consideremos a segunda hypothese: como he possivel conceder aos governos politicos a faculdade de suspender os magistrados? Eu não o sei. Nós viríamos a caír nos inconvenientes, que temos experimentado. Até agora os governadores do Ultramar tendo muitos poderes vinhão a caír no despotismo, e arbitrariedade; e para o futuro nós teremos sem duvida tantos despotas, quantas forem as juntas politicas, que governarem o Brazil. Não se póde consentir que as juntas declarem a guerra, e perdoem os delictos; como se lhes ha de conceder esta faculdade de suspender os magistrados?

O Sr. Castello Branco: - He preciso antes de tudo reduzir a questão aos termos mais simples que for possivel. Trata-se de estabelecer uma medida extraordinaria, qual he o conceder ao Rei a faculdade em casos extraordinarios (porque em outros não póde ter lugar) de suspender temporariamente os magistrados; isto está decidido, e uma vez que o Congresso decidiu fortes razões devia ter para, assim sanccionar uma medida tão extraordinaria. Ora estas fortes razões que tem lugar para os Portuguezes europeos devem ter lugar para os Portuguezes americanos, africanos, e asiaticos; reduz-se pois toda a questão a saber se a medida extraordinaria, adoptada no § 166, deve ter lugar igualmente para os povos do Ultramar, e não podendo verificar-se de facto nos termos em que se acha concebida, se deve fazer-se uma ampliação,

T

Página 146

[146]

e se deve dar-se outra providencia que faça proficua no Ultramar esta medida. O primeiro Preopinante apoiou a utilidade desta medida para o ultramar medida que eu tinha tambem apoiado na sessão antecedente. Ouvi responder a este Preopinante que elle tinha confundido todas as ideas; por consequencia isto tambem se refere a mim, que havia adoptado a mesma opinião. O que eu propriamente não entendo, nem posso comprehender, he como se combinão principios de um systema, com principios que não correspondem ao fim que procura o mesmo systema; isto he que he exactamente barulho de principios. Trata-se do systema constitucional, do systema de monarquia representativa; por consequencia he preciso que procedamos dos principios deste systema. Mas este systema o que he que tem em vista. Tem em vista a felicidade dos povos da Monarquia portugueza, estabelecer as garantias para o livre exercicio e conservação dos direitos que a natureza tem dado ao homem. Ninguem póde duvidar deste principio, jogo vem a ser necessaria uma consequencia. Todas as vezes que os principios que nós pozemos neste systema não corresponderem ao fim do mesmo systema. Segue-se que elles devem ser falsos; ora pertende-se elevar a unidade do governo constitucional a um alto ponto, e diz-se que esta unidade principalmente he a do Poder executivo, que está na pessoa do Rei, que deve immediatamente dar todas as providencias no lugar aonde reside: logo aqui vemos que os que estuo perto do Rei, e os que estão longe do Rei, não são favorecidos igualmente. Se era um mal, não se dar a providencia do § 166, segue-se que está remediado este mal para os Portuguezes europeos, mas elle não está remediado para os Portuguezes do Ultramar, porque todos vem que esta providencia vem a ser inutil; mas digo eu que os portuguezes da Europa, e os Portuguezes do ultramar, são aquelles que constituem parte da Monarquia Portugueza: se todos elles são representados em um unico Congresso; se o systema constitucional deve abranges todos os individuos da Monarquia portugueza, logo um principio que se estabelece, e do qual não podem resultar estes fins, he falso, ou indecoroso; logo o unidade do governo constitucional, não póde ser concebida nos termos a que a quiz reduzir o nobre Preopinante. Diz-se que não he possivel remediar os males que vem da natureza os quaes nós não podemos vencer, não podendo vencer as distancias. Convenho que nós não possamos absolutamente remediar, mas o honrado membro não reflectiu que se este principio podesse passar em toda a sua generalidade, senão era possivel absolutamente que os portugueses do ultramar houvessem de gozar em estes termos dos mesmos bens que gozão os da Europa, se este principio podesse passar em toda a sua generalidade, nem o honrado membro que falou, nem eu mesmo me atrevei ia a correr o veo que cobre a consequencia necessaria que desse principio se deveria fixar. Elle seria fatal a nós, seria fatal á Monarquia portngue4a quando se mostrasse que a communicação dos beneficios uao poderia verificar-se entre as partes remotas da Monarquia portugueza. Eu estou bem longe de conceber similhante idea; todos os cidadãos portugueses tem jurado uma perfeita união, e tem jurado esta perfeita união, mantida a fruição e segurança dos direitos naturaes do homem, que são geraes para todos; porque se elles não estivessem persuadidos desta verdade, não serião tão exactos em adoptar este systema com tanta franqueza decoração; não publicarião estes desejos de união fraternal entre todas as partes da Monarquia: e por nenhum principio devemos fazer illusoria esta persuasão em que elles estão...... Não se rompe a unidade do Poder executivo por se estabelecer no Brazil a autoridade que se pretende para suspender os magistrado? Póde muito bem conceder-se isto ás juntas administrativas ou a outra autoridade com tanto que ella possa exercer esta mesma attribuição. Mas donde nascerá a difficuldade que eu vejo de estabelecer-se o que eu julgo e todos conhecem que será porficuo aos portuguezes do ultramar. Por ventura o Congresso não sanccionou esta faculdade concedida ás juntas governativas para com os magistrados inferiores? Que encanto tem a ordem dos desembargadores para se querer propor a favor della uma isenção sobre todos os empregados publicos? He preciso que nos lembremos que no tempo do despotismo não havia o escrupulo que vejo agora nesta assemblea, quando se trata de outros fins muito diversos. Por ventura os capitães generaes, no systema do governo colonial não tinhão estas attribuições? Não era uma faculdade geral concedida a todos os capitães generaes para suspender era casos extraordinarios todas as autoridades, e até a primeira autoridade ecclesiastica como erão os bispos? Quantos bispos vierão aqui por abusos dos capitães generaes remettidos a esta capital? Ora se no antigo systema em que deveria ser um só o Governo, elle delegava a sua faculdade nos capitães generaes porque assim se julgava necessario para os casos extraordinarios, como poderemos nós recear de uma junta de governo que não he composta de um só individuo, que he composta de uns poucos de individuos, que depois de serem escolhidos devem ser as pessoas mais acreditadas, e que são estrictamente sujeitos a toda a responsabilidade? Por tanto não acho difficuldade em que a providencia dada ao Rei para poder suspender os magistrados seja concedida ás provincias ultramarinas não a exercitando immediatamente o Rei, obrigando-se assim os povos a virem requerer aqui, porque esta providencia seria irrisoria, e não poderia por-se em pratica.

O Sr. Villela: - Desgraçada he a sorte dos povos do Ultramar, porque a natureza os arredou de Portugal milhares de leguas! Póde um cidadão condem nado á morte em Portugal ser agraciado pelo Rei; o condemnado no Brazil ha de morrer infallivelmente. Póde um cidadão em Portugal queixar-se ao Rei de qualquer magistrado, e ser attendida a sua queixa: no Brazil o cidadão ha de soffrer em silencio senão tiver meios de vir a Portugal. Desenganemo-nos, Srs., he preciso que os que temos o mesmo sangue, a mesma linguagem, o mesmo governo, tenhamos as mesmas commodidades. Não basta que a lei seja igual para todos; he necessario, como disse um illustre De-

Página 147

[147]

putado na Assembléa constituinte de França, que para a sua influencia ser benefica, todos possão recorrer a ella com a mesma facilidade. He até antipolitico deixar aos povos que desejar com razão. Quando se determinou que houvesse em Lisboa um supremo tribunal de justiça para conceder as revistas, e fazer effectiva a responsabilidade dos magistrados por culpa de injustiça notoria, assentou-se que no Ultramar tambem as relações podessem conceder revistas, e que haveria uma autoridade para fazer effectiva a dita responsabilidade, suspendendo os magistrados. Agora que se estabelece que o Rei, queixando-se-lhe algum cidadão de qualquer magistrado, poderá depois de ouvir este, e de haver as convenientes informações, suspendelo, etc., duvida-se em se delegar este poder a alguma autoridade no ultramar, onde uma tal providencia se torna mais necessaria. He preciso que advirtamos que os magistrados, quanto mais longe estiverem das Cortes e do Rei, mais perigosos serão, e os povos menos favorecidos. Por tanto voto para que as juntas, ou o governo politico daquellas provincias, possão exercer este poder em nome do Rei, suspendendo os magistrados.

O Sr. Andrada: - Ouvi com admiração a um nobre membro deste Congresso proferir que o artigo 166 não he adoptado para fazer effectiva a responsabilidade dos magistrados; não sei que isto se possa dizer senão por falta de logica. Os crimes que os magistrados podem commetter, ou constão de tantos, e então ha o remedio da revista; ou não constão de autos, e resta outro remedio que he a acção popular; mas este remedio he pouco efficaz. Por tanto resta outro, que he o recurso ao soberano para fazer effectiva esta responsabilidade, e que seja o complemento della, e justamente he este o lugar de tratar deste objecto. Ouvi avançar outras proposições, que não me parecerão grande cousa, como que o poder real não podia ser delegado. Pois então o Rei da Suecia não denegava o poder de sanccionar as leis? Em Escocia, e Irlanda não acontece o mesmo? Não se lembra o illustre Preopinante o Sr. Trigoso, que na America Ingleza os governadores respectivos tem o poder de sanccionar as leis por todas as Assembléas? Por tanto a posteriori se vê que o poder real póde ser delegado. Admiro-me tambem que o mesmo illustre Preopinante confunda o poder de agraciar com o poder de suspender os magistrados; porque são duas cousas bem distinctas, justiça exacta, ou graça plena. Por tanto são cousas muito differentes. Eu quererei que as juntas governativas serão aquellas a quem se conceda o poder de suspender os magistrados. A respeito de dizer-se, que os povos a pezar de gozarem os mesmos direitos não hão de ter todos as mesmas commodidades, digo, que se isto assim fosse, a nossa união não durava um mez; os povos do Brazil são tão portuguezes, como os povos de Portugal, e por isso são de ter iguaes direitos. Em quanto a força dura, dura a obrigarão de obedecer. A força de Portugal ha de durar muito pouco; e cada dia ha da ser menor, uma vez que se não adoptem medicas proficuas, e os Brasileiros tenhão iguaes commodidades. Voto por tanto pelo additamento.

O Sr. Borges Carneiro: - Procurarei responder aos argumentos que ha produzido o Sr. Trigoso. Diz elle que aqui não tratamos do modo de fazer effectiva a responsabilidade dos ministros, mas sómente da pena de suspensão. Eu pelo contrario direi, que precisamente se trata de assignar na Constituição todos os meios de fazer effectiva a responsabilidade dos ministros, pois que vã cousa seria tela proclamado se não se indicasse como ella se havia de realizar, e havendo já enumerado alguns meios, mais vão e imperfeito seria não os numerar todos. E pois já mostrei que os meios até agora indicados, são todos insufficientes, ou porque irão abrangem a todos os casos, ou a todos os ministros: logo he necessario estabelecer-se aquelle que está em questão, como aquelle que satisfaz a todas as indicações.

O outro argumento opposto pelo Sr. Trigoso, e a que deu mais força, vem a ser que o direito de suspender os ministros he attribuição do Rei, e as attribuições de lei não devem delegar-se. Decidir-se a faculdade de suspender ministros he uma attribuição exclusiva do Rei e indelegavel, essa he precisamente a nossa questão: não alleguemos pura razão de decidir a questão aquillo mesmo que está em questão. Eu percorro as attribuições do Rei, sanccionadas no art. 105, e não acho entre ellas a de suspender magistrados: se lá a achasse estava acabada a questão. Não quero agora recordar que dantes os vice-reis da India e não sei se os capitães generaes do Brasil levavão facilidade ate de conceder habitos de Christo, e de suspender em algum caso os magistrados, limito-me sómente a dizer que percorro no art. 105 todas as attribuições do poder executivo, sanccionar e publicar as leis, conceder mercês, agraciar culpados, etc., não acho lá o suspender os ministros: antes observo que muito de proposito se reservou esta materia para o artigo 107, que trata das cousas que o Rei não póde fazer, e diz que o Rei não poderá suspendelos se não em tal caso, e com taes formalidades. Ora quem diz que o Rei não póde suspender se não debaixo de certas regras, não diz que outra autoridade o não poderá tambem fazer, uma vez que a Constituição lhe dê essa faculdade. Se essa a attribuição fosse exclusiva do Rei ella teria entrado com as outras que formão o catalogo de que trata o artigo 105.

Eu já disse, e nunca será demasiado repetilo, he necessario manter o vinculo de todo o Reino unido: este vinculo he mantido quando ha em todo elle um só poder legislativo e um só poder executivo: no mais cumpre não apertar muito, antes ser generoso e liberal, e affastar toda a montra do antigo minucioso espirito de dominar, que tanto tem consternado os Brasileiros.

Vou agora a outra questão; a quem deva dar-se este poder, se a algumas relações, se ás juntas governativas. Parece que em nenhuma dellas ha inconveniente ou implicancia alguma. Nem digão que com isto se previne a sentença para absolver ou condemnar. Nada se previne; o juiz he sempre livre, antes o nosso direito dá o poder de sentenciar ao mesmo juiz que pronunciou. Para um empregado da alfandega ou da meza de inspecção ser suspenso do seu emprego, será

T 2

Página 148

[148]

preciso vir a Lisboa? Certamente não. Porque razão pois não succederá o mesmo a respeito dos juizes? Consultemos o melhor bem dos nossos irmãos ao Brasil: he esta a verdadeira irmandade.

O Sr. Lino Coutinho: - O meu honrado collega, o Sr. Freire, acostumado ás sciencias exactas porque elle he mathematico, quiz chamar os seus principios para as scienctas politicas, quiz chamar torno a dizer para a politica os principios abstractos do calculo, e por tanto não admira que os seus resultados sejão falsos. Diz o Sr. Freire: a sciencia do systema representativo, he tal que nella os tres poderes são exactamente divididos sem se poderem ingerir um no outro, vindo assim a serem de uma vez indivisiveis, separados, e distinctos. Mas voamos se neste mesmo Congresso se tem levado á risoa este abstrato mathematico salema. Nós vemos que em uma sessão, tratando-se da accusação dos Deputados, o Congresso sanccionou que elle não deveria ser prezo ainda mesmo depois da pronuncia sem que subisse primeiro todo o processo competente para que depois de bem examinado e oitentas as circunstancias do tempo o mesmo Congresso declare estar o dito Deputado em lermos de ser prezo, E que quer dizer pois isto? Não he uma ingerencia do poder legislativo no judicial? Não he uma excepção á regia geral de que os 3 poderes primitivos são distinctos e separados? Analizemos mais um pouco: dizem os systematicos que no plano representativo os poderes devem ser independentes e não responsaveis: de facto assim succede para com os 2 legislativo e executivo, mas para com o judiciario se pratica a mesma coisa? Não decerto porque este ultimo tem de responder pela sua conducta ao poder executivo. Eis-aqui algumas excepções a uma semelhante theoria. Desenganemos-nos Srs. que em poltica não se theorizada mesma sorte que em mathematica: o illustre Preopinante deveria reflectir que em outros muitos systemas constitucionaes o poder do Rei e seus attributos se achão subdelegados a diversos agentes segundo as circunstancias peculiares dos diversos paizes sobre que se estendem os dos systemas, e he assim que o governador de Bengala tom o poder de fazer a guerra e a paz com os povos do Idostan, e vizinhos de Calcutá. O Sr. Ribeiro de Andrada acabou de mostrar que isto mesmo podia succeder com o corpo legislativo pois que se vê a Noruega sujeita á Suecia com suas leis, sua Constituição particular, e seu corpo legislativo, não obstante aquelle do Reino a que pertence.

Passou depois o illustre Preopinante a fazer uma viagem em poucos momentos por todo o mundo e parou por fim no Brasil, dizendo, o Brasil he extensissimo; esta autoridade não póde constituir-se em todos os seus lugares: como hão de vir os habitantes de Matto grosso ao Rio de Janeiro, dado que ahi se estabeleça uma destas autoridades? Como hão de fazer uma viagem tal? Que estranho modo de discorrer! E como virão a Lisboa distante mais de 2$000 leguas? Se não podem vir a 400 leguas de distancia podem vir a Lisboa a 2 mil? A Constituição (diz o mesmo Preopinante) estabelece que o Rei possa suspender os magistrados, e por isso tanto os Brasileiros como Europeos tem e gozão do mesmo direito.

Comparo isto á fabula da rapoza com a cegonha. Esta apresentou áquella o seu jantar dentro uma garrafa, e como a rapoza não podesse introduzir a cabeça no estreito gargalo da garrafa, cornou a cegonha tudo e a outra morreu de fome. Desenganemo-nos, Srs., a lei não he boa porque se faz geral a todos os povos; a lei he boa quando todos os povos della, se podem aproveitar. Os sabios legislão conforme o caracter e os costumes dos povos, e conforme mesmo a sua localidade na superficie do globo, e por isso as leis não devem e não podem ser sempre umas e as mesmas. Dia o Sr. Trigoso: a forma do processo e aggravos dão remedio para que o magistrada possa ser suspenso, e deposto: supponhamos isto; mas chegando ao ponto dado, quem ha de fazer responsaveis os magistrados que em ultima instancia conhecerem da revista? Quem ha de de novo conhecer do final processo se elle deve ahi acabar sem mais recurso? Como ficarão responsaveis a não ser por meio de uma queixa? Mas estes desembargadores que decidirão o processo em ultima instancia podem ter decidido contra justiça. Pergunto eu como he que do processo se póde conhecer á injustiça deste ultimo tribunal? Não póde ser se não por uma queixa levada a uma autoridade seja ella qual for: de mais no processo não vão todos os crimes que o ministro póde fazer; vem unicamente aquelle de ter obrado contra lei: mas quande elle despoticamente praticar actos de prepotencia como poderá isto conhecer-se do processo? He necessario pois que haja um quid que olhe sobre o procedimento dos magistrados tanto das classes inferiores como superiores, o por isso apoio o parecer do Sr. Villela.

O SR. Trigoso: - O Sr. Deputado da provincia de S. Paulo atacou um por um os meus argumentos, e por isso pertence-me dar resposta ás razões em que elle se fundou, tanto quanto a minha memoria nãos permittiu conservar. O seu primeiro argumento, e o mais forte he contrario á propozição primeira que eu estabeleci, a saber, que no artigo 166 nada menos se trata do que do modo porque se póde fazer effectiva a responsabilidade dos ministros. O honrado membro para contestar esta minha opinião, argue-me de inteira falta de logica, mas eu não sei se estarei em o caso de ser arguido de falta de logica, ou se no honrado Membro haverá a de hermeneutica. Nós não tratamos agora da arte de raciocinar, mas sim da arte de interpretar um projecto de lei. Por tanto as regras do hermeneutica he que nos devem dirigir. Diz o honrado Membro que se trata de fazer effectiva a responsabilidade dos magistrados; por quanto, ou os crimes desses andão em um processo, ou não. Se os crimes dou magistrados andão em processo, então o modo de conhecer, e fazer effectiva a sua responsabilidade, he a revista; senão andão em processo, então he por uma queixa. Parece com effeito não serem estas as regras que ensina a hermeneutica, para interpretar este paragrafo. Não se trata aqui da queixa feita sobre delictos de magistrados não processados; trata-se de suspender os magistrados por queixa feita antes do processo; de maneira que esta queixa não suppõe que não póde haver processo; suppõe que necessariamente

Página 149

[149]

o ha de haver, e não faz mais que prevenilo; porque he um principio de justiça em todos os governos, que o crime de que não póde fazer-se processo, não póde ser punido. Em consequencia he o paragrafo o mesmo que diz que o effeito desta queixa não póde ser senão a suspensão extraordinaria, e a remessa das informações, que a precederão, para o tribunal competente. Se pois a suspensão ha de ter após si o processo feito no tribunal competente, segue-se que se enganou o honrado Membro quando suppõe que esta queixa só tem lugar quando não ha processo. Mas o mais notavel he, quando elle suppõe que só póde ter lugar a suspensão, quando o crime não for processado, outro honrado Membro suppõe ainda outra cousa contradictoria, e vem a ser, que a queixa só póde ter lugar depois de findo o processo; isto he contrario a todos os principios. Quando se julga ama causa a finai, que recurso ha inda? Uma revista. Mas como se póde fazer esta revista senão por meio de uma queixa? Logo he necessario queixa, e depois suspensão, e depois revista. (O Sr. Lino quiz explicar a sua opinião). Seja o que for (continuou o Sr. Trigoso); suppõe o honrado Membro que isto tem conexão com a revista. Engano manifesto. Não sabe o modo como se póde fazer effectiva a responsabilidade dos magistrados depois da revista? He o artigo 158, quando as relações declararem nullidade, ou injustiça notoria (Leu o artigo). Logo temos sentença definitiva em gráo de revista, e não são os juizes que derão á sentença os que fazem effectiva a responsabilidade, mas são elles os que tem obrigação ou officio de darem conta desta sentença de revista. Esta conta que em Portugal deve ser remettida ao tribunal de justiça, no Brazil eleve ser remettida ás relações que a lei determinar; mas por isso mesmo que estas relações fazem effectiva a responsabilidade dos ministros em virtude da conta que lhes foi dada pelos que julgarão a causa definitivamente em gráo de revista, não se torna cá precisa a providencia geral da suspensão. Logo tanto se enganou o honrado Membro quando julga a suspensão necessaria para os casos não processados, como o outro quando julga que a suspensão he necessaria para julgar as causas de revista. E aqui temos outro engano do Sr. Borges Carneiro, quando diz que se fosse prerogativa real este direito de que se trata, elle não insistiria em que se communicasse a alguma autoridade na Brazil. O honrado Membro não se lembra do paragrafo 107, e não viu o numero terceiro, onde expressamente se estabelece que ElRei não póde suspender os magistrados senão nos casos ali declarados? Ora inverta esta propozição, e ahi a póde pôr já no artigo 105 entre os direitos concedidos ao Rei, uma vez que diga que este em tal e tal caso póde suspender os magistrados. Ahi tem pois como he uma prerogativa real este direito de suspender os magistrados (apoiado, apoiado. Se pois o honrado Membro só insiste na sua opinião por não estar persuadido que o direito de que se trata he uma prerogativa real, póde omito bem desistir della; e convir comigo neste parecer.

Vamos agora Doutro argumento. O honrado Membro da provincia de S. Paulo diz, que uma das razões em que se funda, vem a ser, que na Escocia, na Suecia, e nas provincias da America ingleza ha certas delegações do poder real; que este pertence a taes e taes autoridades, e que por isso não he tão unico o poder real, que não possa separar-se, e delegar-se em outras pessoas; e donde julga o honrado Membro que da minha parte ha ignorancia em suppor que o poder real não póde delegar-se. Notavel he a minha ignorancia neste ponto; mas não foi ignorancia minha, antes sim esquecimento do honrado Membro, que confunde paizes inteiramente differentes do nosso paiz. De quaes trata elle? Trata de paizes que tinhão posto estabelecido antes de serem unidos: trata de paizes, que estabelecem um novo pacto para o fim de se unirem; trata de paizes que se confederam para fazer um estado. E qual he o nosso paiz? O nosso paiz he aquelle que esteve unido com o Brazil desde o descobrimento do Brazil: he aquelle que esteve unido com todas as provincias ultramarinas desde o seu descobrimento; que formou o Reino Unido antes mesmo de ter este nome; que muito antes da regeneração politica estava unido a Portugal; e que veio a fazer a sua regeneração quasi no mesmo momento era que Portugal a fez; por isso he um Reino inteiramente unido, que não estava desmembrado que não se formava de provincias isoladas. Como póde por tanto argumentar dos outros reinos para o nosso? Alem disto o honrado Membro deve observar que nós não estamos a tratar uma proposição separada, estamos fazendo um systema de legislação, é como? Estamos no pargrafo 166. O paragrafo 165, e todos os antecedentes já estão sanccionados: os seguintes devem ter analogia com elles. Que sanccionámos mo artigo 105? Sanccionámos que todas as faculdades do Rei fossem privativas do Rei. Que sanccionámos quando tratámos do poder legislativo? Que todas as autoridades do poder legislativo ficassem no Congresso. Logo, ainda que nos outros paizes se podessem delegar faculdades do poder executivo, bastava ter diante dos olhos todos os artigos da Constituição, que temos sanccionada para affastar para longe de nós a idéa de delegação. (Apoiado, apoiada.) Por isso de maneira alguma, segundo me parece, se me poderá attribuir a ignorancia que o honrado Membro me suppõe. Admira-se o honrado Membro de eu confundir o direito de agraciar com o direito de suspender os magistrados: e na verdade eu ainda que pouco instruido sou nos principios de direito, (e quem ha que possa dizer-se que he verdadeiramente sabio!) com tudo não sou tão idiota que confunda o direito de agraciar com o direito de suspender e remover interinamente os magistrados. Sei muito bem que o direito de agraciar perdoa o crime; o de suspender remove inteiramente os magistrados. Quando eu disse que estes dois direitos tinhão muita analogia, não foi suppondo o que o honrado Membro me attribue; mas sim persuadido que estes dois direitos se combinavão perfeitamente em serem remedios extraordinarios, e eis o ponto de contado que tem entre si. O direito de agraciar he extraordinario, porque faz que não seja executada a sentença a um réo, depois que a sentença foi mandada executar; do mesmo modo e di-

Página 150

[150]

reito de suspender os magistrados he extraordinario, porque elle previne o juizo dos magistrados, e ainda que não houvesse este remedio, o magistrado prevaricador estava sujeito a ser processado, e então a força do meu argumento consistia, ainda em outra cousa, e vem a ser, que tirado o direito de agraciar não ternos cousa que o substitua, pelo contrario se tirarmos o direito de suspender os magistrados, não ha inconveniente algum, porque os magistrados hão de ser processados pelos crimes que commettêrão. O honrado membro diz que as relações não devem usar deste direito; mas sim as juntas. Mas qual he a razão por que não hão de ser as relações, e hão de ser as juntas? Eu não o sei. São gravissimos os inconvenientes de uma parte, e outra. Se querem que sejão as relações, porque o poder judicial não deve ser despotico, eu lhe mostrarei que uma vez que se entregue ás relações este poder, o poder judicial he logo despotico. (Apoiado, apoiado).

Quem ha de usar da faculdade de suspender os magistrados? São as relações que hão de fazer effectiva a responsabilidade, depois de dada sentença em gráo de revista; isto he, as relações que já tinhão conhecido extraordinariamente, suspendendo, conhecem depois ordinariamente julgando: e quem ha de fazer effectiva a sua responsabilidade? Ellas mesmas previnirão o seu juizo, suspendendo; e farão ellas effectiva a sua propria responsabilidade? Mas sejão as juntas provinciaes: ellas são nomeadas pelo povo; o povo tem posto nellas toda a sua confiança, e por isso nada mais natural do que serem ellas as que facão suspender os magistrados. Eu appello para os povos da Bahia, os quaes constituírão uma junta provincial, fizerão a eleição desta junta, e são os mesmos que se queixão della; e o Congresso já está cançado de ouvir queixas contra os membros que a compõem. Seguir-se-hião gravissimos absurdos se concedessemos a um corpo moral uma tal faculdade. Diz o honrado Membro, que he um absurdo o querer que as provincias do mesmo imperio hão tenhão as mesmas commodidades; e confundiu commodidades com direitos. Aqui he que bem se póde notar a falta de logica, e náo a de hermeneutica. Com effeito he certo que todas as provincias e cidadãos devem ter os mesmos direitos, mas não se segue d'ahí que devão nem possão ter as mesmas commodidades, porque para isto seria necessario reduzir todo o mundo a pequenas republicas como a de Ragusa. E nada dos sustos com que o honrado Membro acaba o seu discurso, pretendendo atterrar-nos com a desunião do Brazil, dizendo que tão sómente se concilia em quanto subsistir uma força no Brazil que faça com que os povos senão apartem do Governo da Metropole. Não tenhamos receio algum a este respeito (Apoiado, apoiado). A pezar dos sustos que nos pretende incutir o honrado Membro, o Brasil ha de continuar unido a Portugal, porque os desejos e interesses, reaes do Brazil pedem essa união (Apoiado, apoiado). O mesmo digo de Portugal: os Portuguezes hão de conservar a união com o Brazil, porque isto he uma consequencia necessaria dos seus interesses. A união das provincias deste vasto imperio tem um sólido apoio: desejos reciprocos, necessidades reciprocas.

Findo e periodo destinado á Constituição, e estando ainda muito empenhada a discussão do additamento, se suspendeu para ser continuada na sessão do dia 13.

Foi ouvido com agrado, e mandado remetter ao Governo para se verificar, um offerecimento dos officiaes e soldados do regimento de milicias de Basto, da quantia de oito contos quinhentos setenta mil quatrocentos e tres e um terço, de que são credores á fazenda nacional.

Approvou-se o seguinte

PARECER.

A Commissão de Constituição viu a representação que por parte dos habitantes de Angola sua pátria faz, Francisco Alexandrino Portella, em que expõe que sendo já conhecidas do Governo as violencias que o actual governador do dito Reino faz aos que mostrão adherir ao systema Constitucional, e a directa desobediencia com que se oppõe ás ordens actuaes, trata o mesmo Governo de dimittir aquelle governador, e para esse fim solicitára do soberano Congresso dicisão sobre as attribuições que de hoje em diante e devão ter os governadores daquelle Reino: e por quanto a demora he mui prejudicial, pede prompta providencia.

A Commissão está formando o projecto de decreto que deve regular a autoridade dos governadores de Africa; como porem a sua discussão deve levar algum tempo, e por diversas noticias consta que o dito actual governador está comprimindo o bom espirito daquelles povos, parece á mesma Commissão se responda já ao Governo para que haja de provêr neste caso como fôr justo, declarando-lhe que em quanto não se lhe remetter o decreto sobre as novas attribuições dos governadores d'Africa, devem elles continuar a exercer as que até agora tinhão.

Sala das Cortes 6 de Fevereiro de 1822. - José Antonio de Faria Carvalho, Bento Pereira do Carmo, José Joaquim Ferreira de Moura, Manoel Borges Carneiro, Manoel Fernandes Thomaz.

O Sr. Borges de Barros apresentou a seguinte

INDICAÇÃO.

Requeiro ao soberano Congresso, que attendendo ao desarranjo em que, pela precipitada partida vierão os 16 presos da Bahia, e bem assim os dois ultimamente dalí chegados, com escala pelo Pará, e ora todos no castello de S. Jorge desta cidade, autorise no Governo para que dê a cada um delles 1$200 réis diariamente, e que o total dessa despeza seja pago pela provincia da Bahia. - Domingos Borges de Barros.

Dirigiu-se com urgencia á Commissão de justiça criminal.

Fez-se 1.ª leitura dos seguintes artigos addicionaes ao cap. VI do tit. IV do projecto e Constituição:

Os militares só poderão ser privados da seus postos por sentença proferida em conselho de guerra, e confirmada no tribunal competente.

Página 151

[151]

Todos os militares serão sujeitos a leis particulares, tanto para manter a disciplina, base fundamental do exercito, e da armada, como para regular a fórma do juizo em que devem ser julgadas, a qualidade das recompensas pelos seus serviços, e das penas nos delictos militares pelos lermos prescriptos nos regulamentos actuaes, e que para o futuro se estabelecerem. - O Deputado Barão de Mollelos.

Chegada a hora da prolongação entrou em discussão o artigo 23 do projecto da reforma da companhia do Alto Douro (v. a sessão de 30 de Janeiro.)

Depois de algumas observações propõe-se á votação a 1.ª parte do art., e ficou approvada: propoz-se a 2.ª parte, e decidiu-se não haver lugar a votar por estar antecedentemente approvada a sua doutrina.

Passou-se ao artigo 23, e depois de alguma discussão foi proposto á votação até á palavra carrega-los, e foi approvado.

Entrou então em discussão e foi approvada a seguinte emenda do Sr. Deputado Soares de Azevedo para subsistituir as ultimas palavras do artigo, sem dependencia de qualidade alguma:

As aguas ardentes, que forem conduzidas ao Porto para serem exportadas, entrarão por deposito nos armazens da companhia, como até agora se praticava; e a companhia dará as competentes guias para o embarque dentro de 24 horas depois que lhe forem pedidas.

Passando-se ao artigo 24, propoz o Sr. Braamcamp a suppressão delle, e foi approvada.

Tambem se propoz e foi approvada a suppressão do artigo 25.

Quanto ao artigo 26, resolveu-se não haver lugar a votar por estar já vencida a sua doutrina.

Approvou-se o artigo 27.

Entrou em discussão o seguinte additamento ao projecto de reforma da companhia:

Proponho como additamento ao projecto de decreto para a reforma da companhia dos vinhos do Alto Douro, que se declare expressamente, que ficão cessando quaesquer obstaculos, ou duvidas que possão empecer a livre navegação do Rio Douro, podendo os habitantes das provincias da Beira, e Trás os Montes, cujas propriedades de vinhas não estão dentro do districto da demarcação do Alto Douro, exportarem ou venderem os seus vinhos, para serem exportados pelo Rio Douro, e barra do Porto, pagando os mesmos direitos, que pagarem os vinhos até o presente exportados pelo Porto. - Sarmento; Pessanha.

Em apoio deste additamento disse

O Sr. Sarmento: - A materia que offerece o meu additamento parece-me tão justa, que eu receio ser taxado de importuno, querendo tomar o tempo com a exposição delle. Tive alem disso a fortuna do illustre Deputado o Sr. Pessanha apoiar o mesmo additamento, autorizando com a sua assinatura a doutrina do additamento que eu propuz. Elle pela sua experiencia, e conhecimentos melhor poderá advogar a causa dos lavradores de Traz-os-Montes, e eu o interesse da Beira. Muita gente suppõem que o paiz conhecido pela denominação do Douro he o unico, que produz vinho precioso; isto he um engano, e não admira pela desgraça da pouca informação que nós temos da nossa patria. A provincia de Tras-os-Montes, e a da Beira tem mesmo junto ao Douro, terrenos proprios para a producção de excellentes vinhos, apezar desses terrenos estarem fora da demarcação chamada das vinhas do Alto Douro. Muitos districtos da provincia, de Tras-os-Montes cultivão presentemente muito vinho, e este teria muito consumo se a navegação do Douro fosse livre para esses vinhos se exportarem para reinos estrangeiros. Eu não posso conceber como se tire aos lavradores da Beira, e Tras-os-Montes, o direito, que tem os lavradores de todos os mais districtos de Portugal, e do Algarve! Os lavradores das margens do Tejo, os do Mondego, e os que tem á, sua disposição os portos do Reino he-lhes permittido exportarem os seus vinhos, em quanto os de Tras-os-Montes e os daquella parte da Beira, que poderião aproveitar-se da navegação do Douro, são condemnados a renunciar a um beneficio, da natureza! Nunca foi mais necessario destruir estes estorvos, do que presentemente, a fim de nos aproveitarmos das vantagens, que as circunstancias politicas da America hespanhola vão offerecer ao nosso commercio; porque ou aquellas provincias se separem da metropole, ou continuem ligadas com ella, os seus portos naturalmente se vão abrir ao commercio estrangeiro, e nenhum estado da Europa está em circunstancias de fazer um commercio tão vantajoso como Portugal tanto pela sua posição, com particularidade os portos do Reino, como pela similhança de costumes das duas nações, e generos do nosso paiz. Anima-se alem disso a navegação do Douro, e não se prejudica aos vinhos chamados de feitoria; porque se elles são superiores aos dos terrenos de fora da demarcação, estes não poderão competir com elles, nem desviarão os compradores, os quaes sempre comprão a melhor qualidade degenero; e por tanto não se devem assustar os lavradores da demarcação da Feitoria com a concurrencia dos vinhos dos districtos de fora, uma vez que elles considerão estes vinhos como inferiores em qualidade; porem se elles forem de excellente qualidade, como na realidade são, então he uma injustiça clara o impedir o progresso da lavoura, e do commercio daquelles districtos, aos quaes se refere o meu additamento.

O Sr. Ferreira Borges: - Eu não tenho duvida em que o vinho, producto de uma e outra parte do Domo, venha pelo rio Douro abaixo, e seja vendido no Porto aquartilhado, isto está decidido, porque está abolido o privilegio da companhia a respeito do ramo. Mas que este vinho se venda em grosso aos negociantes do Porto, e que possa entrar em armazens, e que tenha qualidades especificas para embarque; que isto chegue ao contracto dos armazens em que o vinho de feitoria se acha, e que possa ser introduzido, a isto me opponho eu. Por tanto pelo que respeita ao vinho miudo sou de parecer que possão vender, e pelo que respeita ao vinho em grosso quererei que não possa vir vinho de cima, e ser levado a armazens sem que haja uma ficalização, uma guia para que não possa ser confundido com o vinho legal de embarque.

Página 152

[152]

O Sr. Sarmento: - Convirei na emenda, no entretanto sempre me persuado de que o receio das adulterações dos vinhos do Douro era uma força, e pretexto da companhia; porém eu nunca tive em vista; que os vinhos de fora fossem introduzidos para misturas. O fim do meu additamento he facilitar a exportação dos vinhos, conseguindo que pelo Porto (por ser o canal mais proximo) tivesse lugar o poderem ser levados para todos os reinos, e regiões estrangeiras. Convenho em que elles sejão guardados em armazéns separados, e que mesmo se estabeleça no Porto um lazareto, a fim desses vinhos não empestarem os outros, visto o receio que ha da sua má qualidade, pórem que elles possão sair para toda a parte, sem estorvo algum; e este he o fim do meu additamento.

Propoz o Sr. Presidente á votação o additamento, e foi rejeitado.

Propoz-se então com o additamento do Sr. Ferreira Borges concebido nestes termos: Este vinho será conduzido com guia, manifestado e recolhido debaixo da fiscalização da autoridade que vigiar sobre os direitos: e foi assim approvado, dando-se por concluida a discussão do projecto, parar este passar para a Commissão de redacção.

Designou o Sr. Presidente para a ordem do dia os pareceres das Commissões; e na hora da prolongação alguns mais urgentes da Commissão de fazenda.

Levantou-se a sessão ás duas horas da tarde. João de Sousa Pinto de Magalhães, Deputado Secretario.

RESOLUÇÕES E ORDENS DAS CORTES.

Para Filippe Ferreira d'Araujo e Castro.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza ordenão que lhes seja transmittida a consulta da meza da consciencia e ordens, que foi exigida pela ordem das Cortes de 24 de Novembro de 1821, sobre o requerimento do doutor Manoel Martins Bandeira, queixando-se de serem obrigados os naturaes das provincias de Ultramar a fazer no juizo d'India e Mina a mesma justificação, que o regimento e as leis só determinão para os naturaes do Reino de Portugal, que tem a receber herança dos fallecidos no Ultramar, accrescentando V. Exca. qual tem sido a razão da demora. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 11 de Fevereiro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para José da Silva Carvalho.

Illustrissimo e excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza mandão remetter ao Governo o incluso officio do juiz de fora de Angra, Eugenio Dionisio Mascarenhas Grade datado em 31 Janeiro proximo passado, dando conta do motim que uns trinta individuos quizerão fazer naquella cidade das sete pata as oito da noite de onze do dito mez, a fim de que se temem a este respeito as providencias que parecerem necessarias.

O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exc. Paço das Cortes em 11 de Fevereiro de 1821. - João Baptista Felgueiras.

Para Candido José Xavier.

Illustrissimo e Excellentivsimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza mandão remetter ao Governo a fim de ser competentemente verificado, o incluso offerecimento, que fazem ao soberano Congresso, a beneficio da divida publica, os officiaes, officiaes inferiores, e soldados do regimento de mil das de Basto, da quantia de 8:570$403 1/3 réis, proveniente de prets, e soldos vencidos; que se lhos estão devendo, alem das etapes, de que se acha por liquidar a maior parte da conta. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 11 de Fevereiro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza, sendo-lhes presente a inclusa representação que por parte dos habitamos de Angola, sua patria, faz Francisco Alexandrino Portella, expondo as violencias do actual governador daquelle Reino contra os que mostrão adherir ao systema constitucional e a directa desobediencia com que se oppõe as ordens actuaes; mandão remetter ao Governo a mesma representação; para que haja de prover neste coso como for justo, na intelligencia de que em quanto não se expedir o decreto das Cortes sobre as novas attribuições dos governadores de Africa, devem estes continuar a exercer as que até agora tinhão. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 11 de Fevereiro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para Ignacio Pinto de Almeida e Castro.

As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza concedem a V. Sa. licença portanto tempo quanto seja necessario para tratar do restabelecimento da sua saude, esporando do seu conhecido zelo, e amor da patria, que apenas seja possivel V. Sa. não deixará devir logo continuar a este soberano Congresso as funcções de que dignamente se acha encarregado. O que participo a V. Sa. para sua intelligencia.

Deus guarde a V. Sa. Paço das Cortes em 11 de Fevereiro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

N. B. Na mesma data, e conformidade se passou igual licença ao Deputado Rodrigo Ribeiro Telles; e na data de 12 ao Deputado Ignacio da Costa Brandão.

Redactor Galvão

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×