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Procedeo-se a discutir as Bases da Constituição, e logo tomando a palavra, disse:

O senhor Pereira do Carmo. - Senhores: os Membros da Commissão, bem longe de se entranharem no lahyrintho das theorias dos Publicistas modernos, foi ao buscar as principaes ha sés para a nova Constituirão ao nosso antigo direito Publico, posto acintemente em desuso pelos Ministros despoticos, que lisongeavão os Reys á custa do Povo. Assim, Senhores, quando proclamarão no Artigo 18, Sessão 2.ª, o principio fundamental na soberania, e independencia da Nação, nada mais fizerão do que renovar o que já por muitas vezes se havia proclamado nas epochas mais assignaturas da nossa Historia. Proclamou-se em Lamego a soberania e independencia da Nação, quando os Portuguezes puzerão a corôa na cabeça do Vencedor de Ourique, o Senhor D. Affonso Henriques. Proclamou-se a soberania e independa da Nação, quando as Cortes do Reyno fizerão Rey, na Cidade de Coimbra, (1) ao Senhor D. João 1.°, Tronco da Serenissima Casa de Bragança. São notaveis, Senhores, as palavras da Acta deste Congresso para sempre memoravel: eis-aqui como se explicárão os Deputados do Cortes. - Nomeamos, escolhemos, tomamos, e ouvimos, recebemos em aquella melhor e mais comprida guiza que nos podemos a dito D. João Mestre d'Avis, em Rey, e por Rey e Senhor nosso, e dos ditos Reynos de Portugal e do Algarve, e outrogamos-lhe que se chamasse Rey. (2) Proclamou-se a soberania e independencia da Nação, quando em 1640 esmigalhamos os ferros, com que no agrilhoarão os Filippes, e collocamos no Throno Portuguez o Senhor D. João 4.° de saudosa memoria. Proclamou-se a soberania e independencia da Nação, quando em 1668 as Cortes de Lisboa deposerão por incapaz de reynar, ao Senhor D. Affonso 6.°, e chamarão para a Regencia do Reyno ao Senhor Infante D. Pedro. Proclamou-se em fira a soberania e independencia da Nação nas Cortes de 1679, e 1697, em que se dispensarão, e derogárão alguns capitulos das de Lamego ácerca da successão da coroa; porque, reconhecendo o Senhor D. Pedro 2.º, que o não podia derogar, nem dispensar, salvo em Cortes, confessou á face do Mundo inteiro, que a Nação era soberana, e que só a Nação competia tocar nas Leys fundamentaes do Estado. Eis-aqui, Senhores, como este principio do nosso Evangelho politico, que tanto assusta hoje os Monarchas da Europa, era reconhecido, e practicado em Portugal, havia bem perto de seiscentos annos. Mas taes doutrinas não servião nestes ultimos tempos; e em seu lugar se deixou livremente correr, ou, para me explicar melhor, mandarão que se acreditasse, que o poder dos Reys vinha immediatamente de Deos: idéa sacrilega, e absurda, que marca pontualmente até onde havia chegado a nossa degradação! Porem hoje, Senhores, os Portuguezes, reassumindo os seus imprescriptiveis direitos, proclamão de novo este principio fundamental do seu pado social; e a Europa, espantada ao brado da nossa regeneração politica, ficará convencida de que nem os partidos, nem as facções tiverão a mais escassa influencia em nossos esforços, tão gloriosos como affortunados; mas unicamente o desejo de reconquistarmos nossa bem entendida liberdade, isto he, aquella que tanto se affasta do despotismo, como da anarchia.

Talvez, Senhores, que o Artigo 27 da Sessão 2.ª pareça coarctar em demasia o poder Real, em quanto determina, que só ás Cortes pertença opprovar os Tratados de alliança offensiva, e defensiva. Todavia, sobrestando por agora nas rasões intrinsecas, em que assenta o artigo, e que a olhos vistos se conhecem; eu me limito a mostrar, que neste sentido já se havião estipulado outras condições, que devião formar parte do nosso direito publico interno. Vejamos o que disserão os Povos ao Senhor D. João 1.° nas Cortes de Coimbra. (3) = Pedirão-lhe entre outras cousas, que não fizesse guerra nem paz... sem consentimento de todos, pois erão cousas que a todos tocavão, porque assim o costumavão sempre os outros Reys: e que por ElRey D. Fernando seu Irmão sahir deste costume, succederão tantos males no Reyno. A resposta do Rey foi = que fazer guerra e paz seria sempre com o parecer de seta Povos. (4)

O Artigo 31, da mesma Secção, falla da imposição dos tributos, e diz o mesmo que sempre se observou em Portugal, em quanto fomos Nação. Foi em Cortes que o Senhor D. João 1.º pedio as Sisas geraes (5): foi em Cortes que o mesmo Senhor as obteve dobradas (6): foi em Cortes que o Senhor D. João 2.° pedio o que havia mister para casamento de seu Filho, o Principe D. Affonso (7): foi em Cortes que se estabelecerão as Dizimas, e os mais tributos, que se julgarão necessarios para sustentar a guerra de Acclamação (8). Mas agora, Senhores, he que eu rogo aposticulosa attenção do Congresso, para que observe o artificio com que os Cortezãos solapadamente derão cabo de nossas franquezas, isempções, e privilegios, até ao ponto de lançarem tributos por huma simples Portaria. Durante a guerra da Successão se renovou a Decima, cobrou Sisa dobrada, e outros mais tributos, sem que as Cortes dessem o seu

(1) Anno de 1385. (2) Real Archivo da Torre do Tombo Liv. 1. dos Reys pag. 4. (3) Anno de 1385. (4) Leão, Chronica de D. João 1.° Cap. 48. pag. 194. (5) Cortes de Coimbra, Anno de 1387. (6) Cortes de Braga de 1387. (7) Cortes d'Evora de 1490. (8) Cortes de Lisboa de 1641, 1645, e 1646.

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