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união? Também será suspeito? Aquella lei poz em agitação só a Pernambuco? Não: nós sabemos que os sentimentos tem sido geraes no Brazil. Logo tem havido causas geraes de descontentamento em todo o Brazil; entre lauto devo dizer que elle não chega ao ponto de querer a desunião: isto são calumnias. O Brazil quer estar unido, roas o Brazil está por ora nas desconfia ucas nascidas das causas que tenho apontado, o he isto que he preciso remediar. Ora pergunto, será, mandando-se tropa, que se hão de desvanecer temores? Se esta medida he tão perigosa para a causa da Nação, não será ella da competencia do Congresso, não deverá elle ingirir-se em um negocio de tão alta importancia? Finalmente diz o mesmo honrado Membro, que he preciso mandar um corpo de tropas, que soja estranho aos partidos: como he possível conceber que esta tropa não siga um delles que será o dos Europeos, o qual entra em o numero delles? Pertender esta imparcialidade, he pertender um impossivel, he querer desconhecer o coração humano. Concluo pois que sendo tão perniciosa esta remessa de tropas, indo ella contra a vontade dos povos , com a qual diz o honrado Membro que se quer confirmar, levando ellas comsigo um gérmen de dissensão, como nós aqui observamos, e sendo lá recebidas não como pacificadoras, roas como sustentaculos da rotina antiga, porque, como já disse, não basta que se professem bons artigos de fé, mas he necessario que sejão acreditados, e sendo finalmente este negocio de tão alta importância: concluo, digo, que se deve approvar a indicação.
Talvez que seja eu o primeiro em pedir, daqui a bem poucos dias, aquillo mesmo que agora reprovo; mas ou quero que os povos estejão convencidos desta necessidade, eu quero que elles mesmos a peção, e então nenhuma duvida terei de votar para que se mande tropa; agora porem he injusto, he impolitico, que se tomem taes medidas.
Tendo passado a hora de levantar a sessão, se resolveu , ficasse adiada a continuação da discussão para a sessão seguinte.
Deu o Sr. Presidente mais para ordem do dia na hora de prolongação, pareceres de Commissões: e levantou a estão, sendo duas horas da tarde. - Francisco Barroso Pereira, Deputado Secretario.

RESOLUÇÕES E ORDENS DAS CORTES.

Para António Pinheiro de Azevedo e Silva.

As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza concedem a V. S.ª um mez de licença para tratar da sua saude. O que partecipo a V. S.ª para sua intelligencias.
Deus guarde a V. Sa. Paço das Cortes em 21 de Maio de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para José da Silva Carvalho.

lllustrissimo e Excellentissimo Senhor. - Ás Cortes Geraes e Extraordinárias da Nação portugueza ordenão que o collegio patriarcal da santa igreja de
Lisboa, remetta ao Governo com a possível brevidade, a fim de ser transmitida ao soberano Congresso, uma relação dos Deputados, e secretarios, de que actualmente se compõem a congregação camararia, e outra de todos os mais empregados sua administração, fiscalização, e arrecadação da fazenda da mesma patriarcal ; declarando os ordenados, propinas, e mais vencimentos que a cada um dos sobreditos empregados competem por esta repartição, e indicando finalmente os ordenados, e vencimentos, que os mesmos empregados percebem por qualquer beneficio, officio, ou emprego publico. O que V. Exc.ª levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 21 de Maio de 1322. - João Baptista Felgueiras.
Redactor - Velho.

SESSÃO DE 22 DE MAIO.

Aberta a Sessão, sob a presidencia do Sr. Camelo Fortes leu-se a acta da antecedente, que foi approvada.
O Sr. Secretario Felgueiras mencionou os seguintes officios:
1.º Do Ministro da marinha , remettendo uma parte do registo do porto, tomado no dia 24 do corrente á galera portugueza Tres Corações, vinda do Rio de Janeiro; de que as Cortes ficarão inteiradas.
2.º Do Ministro da fazenda, remettendo a relação do que tem rendido o subsidio literário da provedoria de Vianna em cada um dos annos de 1790 até 1851, em cumprimento da ordem das Cortes de 29 do mez passado; que foi mandado remetter á Commissão de fazenda.
3.º Do Ministro da guerra, em que participa ter-se expedido as ordens necessárias para se cumprirem as determinações das Cortes sobre a offerta feita por António de Sousa Dias, boticário dos hospitaes regimentaes da cidade do Porto; de que as Cortes ficarão inteiradas.
4.º Do mesmo Ministro, remettendo um officio do brigadeiro encarregado interinamente do governo das armas da corte, e Estremadura, pedindo providencias sobre o prejuízo que soffre a tropa vinda do Rio de Janeiro, em não lhe acceitarem aqui pelo mesmo valor o dinheiro que lá receberão em pagamento; que foi mandado remetter á Commissão de fazenda com urgência.
5.º Do mesmo Ministro, transmittindo a exposição feita pelo general Jorge de Avellez, dos factos acontecidos no Rio de Janeiro, e que derão motivo ao embarque das tropas; que foi mandado remetter a Commissão especial de negócios políticos do Brazil, publicando-se pela imprensa na forma determinada a respeito da corresponcia do príncipe Real.
6.° Da junta temporaria do governo do Rio Grande do Norte, datado a cidade do Natal em 12 de Fevereiro e que participa ter sido nomeado pela camara daquella cidade, e tomado posse do governo

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daquella provincia temporariamente, em quanto se não dava cumprimento ao decreto de 29 de Setembro do anno passado; que foi mandado remetter á mesma Commissão de negocios politicos.
7.º Da mesma junta, datado de 14 de Fevereiro, em que participava as razões, pelas quaes mandou soltar ao corregedor da comarca Marianno José de Brito Lima, que se achava prezo por ordem da junta extincta. Passou á mesma Commissão de negocios politicos.
8.º Da junta provisoria da mesma provincia datado de 20 de Março, em que participa ter-se executado a disposição do decreto de 29 de Setembro sobre a installação das juntas dos governos provisorios das provincias do Brazil. Passou á mesma Commissão.
9.º Da camara da villa de Estremoz do Rio Grande do Norte, em data de 2 de Março, em que representa não só a illegalidade, mas os despotismos feitos pela junta temporaria do governo. Passou á mesma Commissão de negocios politicos.
10.° Da camara da Paraiba, datado de 23 de Fevereiro, em que participa a installação do governo provisorio daquella provincia, expondo ao mesmo tempo a razão porque foi nomeado governador das armas daquella provincia o major graduado Trajano Antonio Gonsalves, com preferencia ao tenente coronel Antonio Bernardo Mascarenhas; de que pede confirmação. Passou á Commissão de Constituição.
Remetteu-se á Commissão de negocios politicos uma conta assignada por Manoel Antonio Moreira, membro que foi da primeira junta do governo do Rio Grande do Norte, em que representa as arbitrariedades e despotismo que os outros membros da dita junta havião praticado contra o seu voto.
Leu o mesmo Sr. Secretario Felgueiras uma felicitação feita ás Cortes pelo general Jorge de Avillez, chegada do Rio de Janeiro; sobre a qual propondo o Sr. Presidente se devia declarar-se ter sido recebida com agrado, ou suspender-se por ora toda a resolução. A este respeito disse
O Sr. Freire: - Deve declarar-se que foi ouvida com agrado.
O Sr. Guerreiro: - Parece que não tem lugar o receber-se com agrado similhante felicitação. Este general he accusado na sua conducta militar pelo Principe Real; elle justifica-se nos officios que apresenta no Congresso; porem em quanto não houver uma sentença sobre o seu comportamento, parece que não deve ter lugar o receber-se no Congresso as suas felicitações. Estou bem certo que elle não se demorará a requerer este juizo, e por isso proponho que por agora se suspenda toda a consideração a este respeito.
O Sr. Miranda - Pois não se hade receber com agrado a felicitação de um general, cuja conducta não tem sido nada equivoca em manter o systema constitucional no Rio de Janeiro, arrostando perigos? Uma vez que se conhecem todas as intrigas, e que não ha accusação bem fundada contra este homem, deve-se ouvir com agrado a sua felicitação. Eu não lhe vejo crimes, vejo uma conducta leal e franca;
uma conducta digna do maior elogio; por tanto voto que a sua felicitação seja recebida com agrado.
O Sr. Gyrao: - Apoio o que diz o illustre Preopinante: neste Congresso já foi elogiado este benemerito general; seria incoherencia muito grande, não fazer menção honrosa do seu officio. Nós estamos ao facto do seu comportamento, que foi de certo o mais honrado e brioso que póde considerar-se: aponto que eu digo, que cada vez faço mais gosto de ser Portuguez, quando vejo que Portuguezes em paizes tão remotos sabem manter a gloria da patria.
O Sr. Caldeira: - Este general não he accusado de outra cousa mais do que de ter cumprido as ordens deste soberano Congresso; se isto he objecto de reprehenção, ou de elogio, o Congresso que o decida,
O Sr. Freire: - Eu perguntaria ao illustre Membro, o Sr. Guerreiro, qual he aaccusação legal que ha contra este homem. Ha um delegado da autoridade, que diz que este individuo não se comportou bem; não temos nós tido delegados da autoridade, que se dizião não se ter conduzido bem, e não temos nós reconhecido o contrario, e recebido com agrado as felicitações que tem vindo a este Congresso? Seria pois uma incoherencia, que ouvindo nós com agrado muitas felicitações de commandantes de corpos, deixassemos de ouvir esta.
O Sr. Villela: - Foi em caso muito differente, que se receberão com agrado as felicitações dos commandantes dos corpos. Elles estavão debaixo das ordens do general Avillez: e por tanto só deve recair sobre este general a responsabilidade dos acontecimentos do Rio de Janeiro. Ha uma representação do Principe Regente, em que o accusa de insubordinado. (Houve sussurro nas galerias). Sr. Presidente, peço a V. Exca. que chame as galerias á ordem. Ellas não devem dar aqui o menor sinal de approvação, ou de reprovação sobre o que diz um Deputado. Eu já ontem observei que ao pronunciar-se o nome de Principe Real, havia algum sussurro. Isto não me parece bem; eu hei de dizer o que entendo. Torno pois a declarar que me opponho, a que se receba com agrado a felicitação de Jorge de Avillez em quanto elle se não justificar: não ha razão para que se faça a seu respeito, o que senão fez a respeito de Luiz do Rego. O seu comportamento no Rio de Janeiro está duvidoso pelo menos.
O Sr. Castello Branco: - A mesma prohibição que nós temos, para que em as discussões se traga á memoria a pessoa do Rei, nomeando-se expressamente, parece que se deve estender actualmente á pessoa do Principe Real. (Nada, nada; diserão alguns dos Srs. Deputados). Pois eu por ora jámais falarei na pessoa do principe Real; e só falarei no Governo do Rio de Janeiro. Se acaso Jorge de Avillez fosse um empregado publico de alta gerarquia, e influisse no governo politico do Rio de Janeiro, como eu não estou ainda bem ao facto dos males que se tem seguido aos acontecimentos extraordinarios, que nos conta haver naquella provincia, ou seria certamente obrigado a suspender o meu juizo; mas Jorge de Avillez apresenta-se como um militar, como um chefr da força armada da divisão auxiliadora, que se achava no

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Rio de Janeiro; he sem duvida que nesta qualidade, elle devia obedecer ao chefe do governo político, que ali se acha; mas, pergunto eu, deveria elle obedecer-lhe cegamente, e em tudo quanto esse governo ultra passasse as suas attribuições, mandando-lhe uma coisa, que era contraria ás ordens deste soberano Congresso, ás ordens do poder executivo, e ao fim para que directamente tinha sido mandada a força de que elle era commandante? Por ventura poderá isto sustentar-se? Para que foi mandada aquella força para ali? Para manter a tranquilidade naquella provincia; para cuidar na sua defeza. Este era o único fim para que esta força ali se achava, e todos vêm que a medida de a fazer sair do paiz, era uma medida inteiramente opposta ao fim para que ella para ali tinha ido: opposta ás ordens expressas do Congresso. Se nós queremos considerar este general como suspeito de crime, que he que nos pode induzir a isto? Que vemos nós de uma, e outra parte? Vemos de uma parle a desobediencia ás ordens expressas do Congresso; vemos de outra parte este general combatendo para executar estas mesmas ordens. Se não as executou á risca, se não empregou força para a sua execução, e para evitar a desobediencia ás ordens do mesmo Congresso, nus o devemos louvar, porque não se quiz metter em uma crise, cujos resultados poderião ser duvidosos, como o estabelecer n'uma província do Reino do Brazil a guerra civil, o que poderia excitar todas as outras províncias; tomou um partido, que um homem de juízo prudente deveria tomar, que um general de uma divisão auxiliadora deveria seguir cm circunstancias taes; por ultimo cedeu a força, para salvar o Brazil de males terríveis. Por consequência não vejo motivo algum para que a conducta e procedimento deste homem possa ser suspeita; opor isso sou firme na opinião que declarei ao ouvir os primeiros officios deste general, cuja leitura eu pedi, isto he, que se decretassem louvores ao general, e á tropa.
O Sr. Moura : - Duas palavras, Sr. Presidente, e em duas palavras se termina a questão. Não ha para que trazer a pessoa do Príncipe Regente do Brazil: de que se trata, he do seu ministério: he dos que o rodei ao; trata-se de examinar isto. O ministério não queria executar uma ordem das Cortes ; o general queria executar esta ordem. Não se sabe ainda, nem ainda se decidiu quem tem razão, se o ministério do Rio de Janeiro, se o general da força armada. Em quanto pois se não cabe quem tem razão, se o general da força, se o ministério, como havemos de rejeitar as felicitações que nos manda este general? Ainda e não decidiu te elle he culpado: algum dia ha de ser chamado ajuizo ceie commandante; o ministério do Príncipe (não falo do Principe) ha de tambem ser chamado a juízo; mas antes de se decidir qual delles tem razão, como se hão de rejeitar as felicitações do general.
O Sr. Andrada: - Duas palavras tambem, Sr. Presidente. A doutrina anti-constitucional que acaba de proferir me obriga a falar: o Principe Real não he inviolável, não ha de ser só o ministério quem ha de responder; ha de ser elle tambem: a Constituição só reconhece inviolavel a pessoa do Rei. Então para que chamou o illustre Preopinante só o ministerio a juízo ? (O Sr. Moura o interrompeu, dizendo que não havia dito que o Príncipe era inviolável; que foste m todos responsáveis). Pois bem (continuou o Orador) , vamos á questão; mas antes cumpre-me dizer que a minha opinião política seria que o herdeiro do trono, todas as vezes que circunstancias imperiosas forçassem dar-se-lhe parte da execução, fosse rodeado da mesma inviolabilidade que cerca a pessoa de seu augusto Pai; mas a minha opinião não he o que entra em conta, he a Constituição, e esta não lhe concede inviolabilidade alguma. O official de que se trata he um militar honrado, e brioso, não lho disputo; eu honro o merecimento; mas a conducta deste official está inteiramente clara? Os illustres Deputados que me precederão, não querem que se rejeite a sua felicitação, porque seria fazer-lhe uma injustiça, e pretendem que se receba com agrado. Eu também não quero que se rejeite a felicitação; mas sim que se suspenda toda a resolução sobre ella. Suspender não he rejeitar; talvez que depois de mais pleno conhecimento as suas obras mereção a nossa approvação; mas a questão agora he se elte a mereço, e então responderei ao sofisma de um illustre Preopinante. O general Avillez se he culpado, não he por ter cedido; he por se ter ingerido em executar ordens que lhe não tinhão sido emittidas. Este Congresso não commetteu a execução das suas ordens ao general Avillez, commetteu-a ao Governo, e este ao seu delegado; se o delegado obrou mal, ao delegado cumpre responder, e não ao general tomar contas ao delegado ; alias adeus Governo : ás duas por três estava tudo perdido. O Príncipe Regente ha de responder, ha de pedir-se-lhe conta da sua conducta; então talvez elle mostre que lhe era licito o que fez: uma cousa he resistir ás ordens do Congresso, outra cousa he não executar logo prontamente cm razão dos inconvenientes que póde ter similhante execução. Este direito não foi tirado a ninguem; o roais rediculo empregado publico o gozou no tempo do governo antigo ; porque o não podia fazer um delegado do governo do Brazil? Sem duvida podia; e com tanta razão, quanto a distancia do Brazil obriga a considerações muito differentes, do que obrigaria se estivesse muito perto; a conducta de S. A. , e do seu ministério ainda não he conhecida; só deste conhecimento depende o do comportamento do general Adllei. Mas o Príncipe Regente não só quiz obedecer, que até não retirou logo estas forças; o Príncipe Regente não tratou de fazer embarcar as tropas auxiliares senão depois que ellas, ou por sua imprudência, ou por seu. zelo demasiado, suscitarão disputas no paiz, e derão nascimento a dissensões perigosas. Então poderia errar o Príncipe; mas julgou que era o meio de apagar as centelhas do grande incêndio, obrando por esta maneira; entretanto o juízo final ha de decidir esta questão: antes delle porém voto que se suspenda, não que se rejeite a felicitação deste general. Póde ser que elle tenha obrado o melhor possível; mas antes de se conhecer asna conducta, deve-se suspender toda e qualquer decisão.

TOMO VI. Ee

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O Sr. Miranda: - He singular o extravio da Opinião do illustre Preopinante; está falando como se aqui se estivesse a approvar a conducta do general Avillez. Trata-se de receber com agrado a expressão dos seus sentimentos patrioticos; e não deverão receber-se com agrado os sentimentos patrioticos de um general? Ainda não chegou o ponto de approvar, ou reprovar a sua conducta; quando chegar esse tempo, então apparecerá a conducta do ministerio do Rio de Janeiro, conducta rebelde, e indigna. Os illustres Preopinantes, quando se tratou do procedimento da junta de Goiana, disserão que elle era desculpavel, quizerão desculpar a conducta de Manoel Pedro, e agora tanto se crimina este! não entendo. Elle deu provas sobejas da disciplina da tropa, chegando até por sua obediencia a passar por baixo de forças caudinas, e a soffrer immenso. Por tanto sendo a conducta do general Avillez irreprehensivel, devem-se receber com agrado os seus sentimentos patrioticos.
O Sr. Soares Franco: - Agora não se trata de julgar, nem o Principe Real, nem o ministerio, nem a conducta do general Avillez; trata-se de receber ou não receber com agrado a expressão dos seus sentimentos patrioticos; eu assento que se deve receber.
O Sr. Andrada: - Não sei se he estilo, que se recebão com agrado as protestações de pessoas, cujo comportamento está equivoco; e portanto torno ainda a dizer que senão ha este estilo não se deve acceitar esta felicitação. Não he porem este o principal motivo por que me levantei; levantei-me porque não devo deixar passar contas que proferiu o Sr. Miranda; erros conhecidos, e calumnias. Não houve neste Congresso um só Deputado que approvasse a conducta do brigadeiro Manoel Pedro; não houve um só Deputado que justificasse a conducta da junta de Goyana: que a escusasse, he diferente; he necessario ser rigoroso nos termos, quando se ousa accusar. Creio que isto depende de não ter o illustre Preopinante dado pezo a estes factos; mas he muito serio usar de um termo, em vez do proprio, quando este termo de que impropriamente se usa, póde suppôr intenções sinistras em quem falou.
O Sr. Villela: - Eu trago á lembrança do Congresso, qual foi o procedimento que o Congresso teve com Luiz do Rego. Qual foi a razão porque o Congresso, a respeito de Luiz do Rego, se portou com um silencio profundo? Porque se ha de fazer differença entre um e outro?
O Sr. Gyrão: - Esta questão deve decidir-se por votos, não deve progredir; faz muita differença o receber com agrado a felicitação de um homem, ou examinar se elle está criminoso, ou innocente: criminoso está Slockler, e no entanto tem-se recebido com agrado as suas felicitações.
O Sr. Pessanha: - A respeito de Luiz do Rego, digo que se elle apparecesse neste momento no Congresso, deveria ser recebido com muito agrado.
O Sr. Andrada: - Peço que se verifique o que se diz na acta, a respeito de Stockler. (Alguns Srs. Deputados disserão que isto era fóra da ordem}.
O Sr. Guerreiro: - Acho que com toda a razão um illustre Preopinante requereu que se lesse a acta, respectivamente ao general Stockler: he sem razão alguma que se diz que isto he fóra da ordem. O caso que se deve fazer desta felicitação he ordem, e tudo que vier para o comprovar, he tambem muito conforme á ordem. Eu estou muito sentido de que com a minha indicação desse occasião a uma discussão desagradavel. Eu não accuso, nem defendo a conducta militar do general Avillez; sei que elle he accusado de insubordinação; sei que elle he accusado de todos os acontecimentos do Rio de Janeiro: em quanto se não justificar sempre negarei o meu voto para que sejão recebidas com agrado as suas felicitações.
O Sr. Freire: - Não provão nada os exemplos que tenho ouvido a respeito de Luiz do Rego, nem a respeito de Stockler, pois não se receberão com agrado as felicitações deste. Agora o que o Congresso decidiu, quando se tratou a respeito de Bernardo da Silveira, foi que para o futuro, aos governadores que viessem do ultramar, fossem recebidas com agrado as suas felicitações, e que um dos Srs. Secretarios lhes fosse agradecer: não faço agora menção do juizo criminoso que alguem tenha formado deste general, senão para o comparar com o general Avillez, a respeito do qual pergunto, onde está elle indiciado de crime a não ser na opinião do delegado do poder executivo do Rio? As juntas administrativas, são delegadas do poder executivo, fizerão accusações contra aquelle general, pergunto agora porque não hão de ser recebidas com agrado as felicitações do general Avillez, quando com muita razão o forão as daquelle? Quem duvida da intriga que tem devorado as provincias do Rio de Janeiro e Brazil? Se acaso por uma simples accusação, nós fossemos a decidir da conducta de um homem, não haveria um só innocente vindo das provincias do ultramar. Que acabamos nós de ver sobre a meza senão um officio dando parte de se prender um ouvidor por uns, de se julgar innocente por outros; por ventura nos por uma simples accusação de autoridade delegada, sem devassa, sem pronuncia, havemos de dizer que este homem de criminoso? Qual he a legislação que dá credito a um homem, que diz que outro he criminoso, sem mais averiguação, nem mais prova? Á vista pois do exposto, fica claro que a felicitação se deve receber com agrado.
O Sr. Vergueiro: - Levanto-me para esclarecer um facto, em que o illustre Preopinante se equivocou; disse elle que a junta do Maranhão tinha representado contra o Governador. Nesse tempo não havia junta no Maranhão. Quanto a receberem-se com agrado as felicitações do general Avillez, eu não me opporei a que se recebão de maneira nenhuma, uma vez que se assente, que se hão de receber com agrado as felicitações de todos aquelles, cuja conducta for equivoca.
O Sr. Povoas: - Este general fez parte da divisão expedicionaria que está em Monte Video; quando depois voltou ao Rio do Janeiro, por uma autoridade competente, foi nomeado general da provincia: depois pediu a sua demissão; e tendo pedido a sua demissão; foi então nomeado por esta tropa seu general. Não posso deixar passar neste Congresso, e de reprovar muito, que uma autoridade militar seja col-

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locada no commando por aquelles mesmos que hão de obedecer; se este principio passar, ninguem estará seguro, nem mesmo este Congresso. Eu considero nelle virtudes, e grandes serviços feitos ás provincias do Brazil, porque pode ser que delle ter embarcado com a divisão, se seguisse não haver derramamento de sangue, como se deveria suppor: no entanto isto he um effeilo que não justifica, nem o principio, nem a causa; porque este general he nenhum modo devia aceitar o commando da tropa. Por consequencia acho razão no que a autoridade competente diz, que fora insubordinado. He necessario que n'um juizo competente appareça a conducta deste general, e dos outros commandantes; porque elle tanto não foi reconhecido com mandante, que nunca se lhe dirigirão officios; he necessario que passem estes principios, sem attenção a servilismo: eu chamo servilismo o estar a dar louvores á tropa, o estar a contemplar a tropa, sem ser debaixo de principios de equidade; este servilismo he tão criminoso, como he o servilismo feito ao Rei, e ao ministerio; por isso sou de opinião que a respeito de taes felicitações, deve o Congresso dizer que os Cortes ficão inteiradas; e quanto a este general nenhuma outra resposta se deve dar por ora. Em juizo competente se decidirá da sua conducta; se elle apparecer digno, então dêm-se-lhe todos os elogios, mas agora he intempestivo; assim o diga, e digo altamente no Congresso (Apoiado, apoiado). Eu sou militar, amo a minha classe, e com muita particularidade amo a justiça; por isso digo, que acabe hoje este servilismo á tropa. Se este general fez uma acção justa, seja declarada justa; se criminosa, seja declarada criminosa; manem quanto isto se não decide, só por ser militar não se deve ter com elle contemplação alguma, faltando ao que pede a justiça, e o decoro do Congresso.
O Sr. Barão de Molellos: - Eu tambem amo muito a classe dos generaes, mas amo incomparavelmente mais a justiça, e se fosse possivel amaria ainda muito mais a conservação da disciplina do exercito, porque estou convencido que só ella he capaz de conservar a ordem interna e a segurança externa, assim como a nossa representação politica, e o nosso systema constitucional. Por muitas vezes o tenho dito; um exercito bem disciplinado, he o maior bem que póde ter uma nação; e o contrario digo quando lhe falta a disciplina. Evitemos pois por uma vez abalar nem levemente a base mais essencial da nossa felicidade, o mais firme apoio do imperio da lei, da segurança individual, do direito de propriedade, em fim de um governo liberal. Mas estou admirado em extremo de ver que aquelles mesmos que tanto se exforçárão, e conseguirão que na Constituição se declarasse que o exercito he essencialmente obediente, que a esta unica proposição se reduzisse todo o tratado da força armada, sejão agora aquelles que querem approvar um facto sobre esse mesmo assumpto; facto que não deve, nem póde entrar na presente discussão, de que não temos os precisos conhecimentos; e que he tão melindroso, e de tanta importancia.
Voltando pois á questão digo, que não se trata, nem se póde tratar agora da conducta da tropa do Rio de Janeiro, e só sim das felicitações, e homenagens do general Avillez, por quem tenho, e tive sempre a maior veneração, e respeito; mas já disse que tenho muito mais pela boa ordem, e pela justiça. Se a aceitação das suas felicitações nada tem com a approvação do seu comportamento militar, voto a favor della; mas se se trata já de approvar, voto que o soberano Congresso suspenda o seu juizo, até delle ter o preciso conhecimento. E no primeiro caso, proponho que a mesma aceitação de felicitações se faça ás que dirigiu o general Rego, e os que estiverem nas mesmas circunstancias: o contrario he uma escandalosa injustiça. Com muita estranheza acabo de ouvir dizer que, só a felicitação do general Rego apparecesse agora seria tambem recebida com espacial agrado. Esta proposição, a mais injusta, e a mais subversiva de toda a ordem, não deve consentir se em parte alguma, quanto mais no corpo legislativo dos Portuguezes! Apartemos por tanto por uma vez, e para sempre da assemblea representativa da Nação portugueza, não só a falsa idéa, mas até a discussão, se a justiça dos cidadãos póde variar segundo as circunstancias que depois occorrem. A justiça he e será sempre util, e a mesma no meio dos mais extraordinarios e transcendentes acontecimentos. He esta a verdadeira idéa da justiça, e he este o unico, e verdadeiro systema que nos ha de acreditar, e que fará respeitar as nossas deliberações; he este o rumo que hão de seguir sempre os Portuguezes. A lei he igual para todos.
O Sr. Moura: - Os illustres generaes que acabão de falar tem toda a razão; ninguem he servil para com a tropa, ainda aqui não ouvi servilismo á tropa, pelo menos da minha parte; se fosse occasião de recriminar, eu poderia fazer bastantes recriminações neste sentido. Ninguem quer ser servil. Reconheço que os illustres generaes tem toda a razão em tudo quanto dizem, mas havião primeiro mostrar-me uma cousa, e era porque conducto, porque modo, veio ao seu conhecimento que o general Avillez foi nomeado pela tropa?
O Sr. Freire: - O illustre Preopinante o Sr. Povoas, accusou-me de servil; glorio-me de que não haverá quem ame tanto as instituições liberaes do meu paiz: o nobre Membro tratou do que não podia, nem devia tratar; avançou idéas (permitta-se-me a expressão) as mais atrevidas, que nunca se avançarão no Congresso; tratou de sentenciar um homem, quando não he ainda chegada essa occasião. O illustre Preopinante lembrou-se do seu eminente gráo militar: elevou-se ao alto gráo de julgador; julgou e tar n'um conselho de guerra a sentenciar o general Avillez, quando ainda se não trata de semelhante juizo. Peço satisfação da imputação de servil, feita aos que forão da opinião contraria. Não se trata agora de sentenciar o general Avillez: trata-se de saber se no Congresso existe prova alguma, para que não seja recebida com agrado uma sua felicitação. O general Avillez diz que fez bem, outros dizem que fez mal; e estão encarreirados os nobres Membros de o sentenciarem, não tendo mais provas do que aquellas que existem na sua imaginação? Em consequencia os nobres Membros apartárão-se da questão: não se trata, Senhores,

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de outra cousa, senão de saber-se hoje, no momento actual, se existem crimes que se possão imputar ao general Avillez: attrevo-me a dizer que não existe um só, e que portando devendo-se julgar innocente, deve-se receber com agrado a sua felicitação.
O Sr. Povoas: - Declaro que não tive em vista fazer allusão alguma ao illustre Preopinante, nem os raciocinios que fiz, nem as proposições que enunciei lhe forão dirigidas: abertamente declaro. Pelo que pertence á sua primeira proposição, não quero de proposito tomala em consideração, porque eu poderia dizer ao illustre Preopinante outro tanto, já que a sua primeira proposição foi enunciando a innocencia, ou a falta de crime do general. Eu não disse que o servilismo era do illustre Preopinante; eu falei em geral. Se sanccionarmos o receber com agrado uma tal felicitação, em um tempo em que a tropa nomeia um general, talvez resultem tristes consequencias. Mostra-se que este general foi nomeado pela tropa porque não teve commando, nem teve esta tropa, senão cessando de ser general da provincia; elle serviu no exercito, apresentou-se á testa da tropa, commandando-a: não foi nomeado pelo Principe. Logo por quem foi nomeado? Foi pela tropa, ou pelos seus commandantes. Eu não crimino o general Avillez; se falei em conselho de guerra, accrescentei tambem, ou pelo tribunal que o Congresso mandar julgar. Por tanto não crimino, nem justifico o general Avillez, digo que he incompetente receber-se por ora com agrado as suas felicitações; póde ser que elle mereça muitos elogios, mas a seu tempo, e quando estiver manifesta a sua conducta.
Propoz o Sr. Presidente a votos se devia receber-se com agrado a felicitação do general Jorge de Avillez, e venceu-se que não.
O Sr. Arriaga: - Peço que se declare que tão sómente se suspende o juizo do Congresso sobre esta felicitação e que não se rejeita.
O Sr. Andrada: - Essa foi a minha opinião e a mente com que dei o meu voto.
O Sr. Freire - Está rejeitada, e não suspensa.
O Sr. Guerreiro: - Sr. Presidente: um dos Srs. Secretarios acaba de enunciar a sua decisão sobre este objecto; e diz que foi o rejeitar-se a felicitação. Parece-me que isto não he conforme, nem com os palavras, nem com o espirito dos que a opprovárão, nem com a proposta de V. Exa. A proposta de V. Exa. foi sómente, para que a felicitação se não recebesse com agrado, e não que se rejeitasse: querer agora dar-lhe outra interpretação, he querer levar as cousas a excesso; he querer alterar as cousas. Se he necessario nova votação, peço que se proponha a questão a votos; julgo porem que não he necessario, mas não consentirei que debaixo do meu voto, e do voto dos meus collegas se diga que se venceu uma cousa que não se venceu.
O Sr. Freire: - Nunca foi admittida á votação no Congresso, uma cousa condicionalmente: ou se approva, ou se reprova. São mandadas as felicitações ao Congresso; ou se acceitão, ou se rejeitão. Se se pudesse chamar servilismo a alguma cousa, ou opinião, o que de certo não póde dizer-se dos Membros
do Congresso, seria certamente a isto. Pois não ha servilismo o querer dar-se uma interpetração differente a uma felicitação, só porque he do general Avillez. Sem duvida isto he servilismo. Eu propino pela ordem do Congresso, e a ordem do Congresso pede que se julgue rejeitada a felicitação, porque o regulamento não permitte votações condicionaes ou alternativas.
O Sr. Ferreira Borges: - Este Congresso acaba de votar sobre uma proposição feita pelo Sr. Guerreiro; ella foi concebida nestes termos: que por ora se não receasse com agrado aquella felicitação do general Avillez. Eu votei para que se recebesse com agrado a felicitação: sem embarco disto, como concebi a indicação do Sr. Guerreiro, e V. Exa. o pro-poz, devo declarar que o Congresso não rejeitou absolutamente, mas só por ora. Assim he que eu entendo a votação; e este foi o sentido de todos quantos falarão.
O Sr. Guerreiro:- Acaba de commetter contra mim o Sr. Freire o mesmo excesso que elle disse ter-se commettido contra elle, e de que pediu uma satisfação ... (Foi interrompido o Orador por alguns Srs. Deputados que clamarão votos! Votos!) Decida, V. Exc. (continuou elle), se posso ou não falar! Se não me hei de defender dos ataques que contra mim se dirigem!... (votos! votos! disserão outra vez; e depois de uma pequena pausa proseguiu o Orador) Isto he a maior intolerancia que se póde imaginar! Onde vai a ordem, onde está a harmonia que nos deve regular? Estou pasmado, Sr. Presidente! O Sr. Deputado Freire acaba de imputar-me o mesmo porque pediu tão altamente a satisfação de um Sr. Deputado, quando este empregou as mesmas palavras que elle acaba de empregar, não tendo este nomeado ninguem em particular. Peço portanto a mesma satisfação que elle pediu.
O Sr. Freire: - O que eu disse foi, que se fosse possivel entrar servilismo em algum dos Membros deste Congresso, era neste objecto que se podaria dizer ter entrado; mas como não he possivel entrar servilismo, por isso tambem me parece não teria satisfação nenhuma a dar; entre tanto, eu lhe dou todas quantas satisfações quizer. Não será facil, e ha de custar muito capitular-me de servil; assim como tambem estou persuadido que o servilismo hão póde entrar em nenhum dos Membros desta Assemblea.
O Sr. Povoas: - A maneira porque eu votei, foi que podia este general justificar-se, e que se suspendesse até esse tempo a declaração de que se recebião com agrado as suas felicitações. Faltar-se-hia á justiça, declarando o Congresso que as rejeitava; não se falta porém á justiça, suspendendo o Congresso o seu juizo a este respeito. Eu anteponho a justiça a tudo quanto ha; e por isso fui desta opinião, e assento ter sido ella a da maioria do Congresso.
Propondo o Sr. Presidente a votos a duvida suscitada, decidiu-se que o que se tinha vencido na primeira votação, era que se suspendesse por ora a resolução do Congresso sobre este assumpto.
Feita a chamada, achárão-se presentes 131 Deputados, faltando 14 com licença, e 2 sem ella: sendo

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dos primeiros os Srs. Falcão, Moraes Pimentel, Pinheiro de Azevedo, Sepulveda,
Barata, Malaquias, Bettencourt, Corrêa Telles, Faria, Sousa e Almeida, Moura Coutinho, Fernandes Thomaz, Pamplona, Ribeiro Telles; e dos segundos os Srs.
Annes de Carvalho, e Barreto Feio.
Passando-se á ordem do dia, continuou a discussão sobre a parte da indicação offerecida por varios Deputados do Brazil, em que propunhão se mandasse ao Governo que suspendesse o ajuste, e fretamento de vasos para transporte de tropas para a Bahia. Sobre esta matéria disse
O Sr. Borges Carneiro: - Continua a discussão precisamente sobre o ponto, se deve ou não o Governo mandar para a Bahia um pequeno reforço de tropa que pede o general Madeira, para auxiliar a que lá tem, depois do tristissimo combate, cuja noticia, com magoa nossa, chegou aos nossos ouvidos; tropa que o Governo intenta mandar, e cujo intento he contrariado por todos os Srs. Deputados da Bahia, e por muitos do Brazil. A opinião que já emitti nesta Assembléa, e hoje emitto, he, que esta materia he da exclusiva competencia do Governo, conforme o artigo 36 das bases da Constituição, que põe á sua disposição o livre emprego da tropa existente; conforme a particular decisão que as Cortes tomarão quando mandarão reverter ao mesmo Governo as participações e officios do general Madeira; e em fim conforme a pratica de todas as nações.
Em verdade não vejo que possa haver systema mais absurdo de Governo, do que aquelle que para tomar as medidas necessarias para a segurança e defeza do territorio nacional tivesse de solicitar o consentimento e decisão das Cortes, principalmente quando isto poderia acontecer nos nove mezes em que ellas não estivessem reunidas. Que diriamos nós se a Inglaterra, por exemplo, precisasse do consentimento do seu parlamento para ter tropas na Irlanda, nas Ilhas Jonias, ou no estreito do Ganges; a Suécia em a Norwega, etc. Se o mandar as tropas existentes (pois não falo de as levantar de novo) onde a necessidade publica o pedir, não he uma attribuição do Poder executivo, não sei qual poderá ser classificada nessa denominação.
Tenho insistido nesta opinião, porque da opinião contraria não vejo por todos os lados senão inconvenientes: supponhamos que os Srs. Deputados do Brazil, que não obstante o serem de toda a Nação, com tudo he da natureza humana terem particular affeição aos interesses de seu paiz (pois hei de falar sempre com franqueza), supponhamos, digo, que entendem, como vemos, não convir mandar-se tropa europea para o Brazil; que por alguns motivos julgão tambem não convir aos interesses daquelle Reino, que se enviem tropas europeas ao nosso continente, ou ilhas da Africa oriental ou occidental; que outro tanto se persuadem dever fazer-se com as Ilhas Adjacentes, onde, se he verdade o que se lê em alguns periodicos, tem já o Principe Real estendido sua autoridade, enviando ministros ecclesiasticos despachados ás cathedraes de Angra e Funchal, e do qual Principe Real vimos ontem aqui encarecer-se a autoridade como a daquelle que impera em todo o Brazil, até ao ponto de podermos crer que aquelle Reino não jurou obediencia ás Cortes, e ao Sr. D. João VI, mas ao Principe, como se pelo contrario as Cortes, e o Sr. D. João VI pela carta de lei do 1.º de Outubro do anno passado, não tivessem aquella autoridade, e quasi todas as provincias do Brazil declarado, que nada querem do governo do Rio de Janeiro; supponhamos, digo eu, que os Srs. Deputados do Brazil se persuadem não convir aquelle Reino que residão tropas europeas nelle, nas nossas possessões Africanas, e mesmo nas Ilhas Adjacentes, e que em crescendo nesta Assembléa o numero dos mesmos Deputados, os seus votos juntos aos de alguns Europeos, que por ventura se unão a elles na mesma opinião, fazem com que ella prevaleça, qual será o resultado, senão que hão de ficar indefezas todas as ditas possessões, e que he Portugal o mesmo que se deva dilacerar a si, e sem que o Governo possa cumprir a mais importante de suas obrigações que he manter a Integridade da monarquia?
Uma vez porém que o Congresso admittiu à indicação dos Srs. Deputados Brazileiros, talvez pela razão de que tratando-se de uma materia tão interessante, qual a união dos dois Reinos, e os meios de a conservar, queria ouvir o parecer dos ditos Srs. Deputados, para depois proceder com mais acerto; depois que eu ouvi na sessão passada as razões que só produzirão contra a projectada medida do Governo, procurarei dizer também o que entendo haver por uma parte e outra, com a franqueza com que sempre desejo falar. Parto pois do principio e hypothese de que os Srs. Deputados do Brazil, e os povos que os mandárão, querem em geral a união de Portugal com o Brazil. Ella convém a um e outro; como a que constitue de Portugal e Brazil uma Nação de primeira ordem pela ligação de suas relações politicas e commerciaes. Aquelles povos convencidos desta verdade, jurarão por occasião da nova ordem de cousas esta união em transportes de alegria, desde o Amazonas até ao Prata; jurarão a mesma Constituição, as mesmas bases della, a mesma dinastia, a mesma religião, a mesma obediencia ás Cortes de Lisboa, e jurarão as ditas bases da Constituição, não como meros principios de direito publico universal (pois nunca ninguém jurou os principios do Watel ou de Grocio); mas como leis particulares de uma sociedade já organizada, e constituida; e debaixo destas vistas se apressarão mui espontaneamente a mandar a este soberano Congresso os seus representantes, os quaes aqui tem constantemente annunciado os mesmos sentimentos. Todas as cartas, documentos e tradições que vem daquelle vasto continente, attestão que esta he a verdade, e o desejo dos pacificos negociantes, proprietarios, e capitalistas das cidades, e dos campos.
Dado pois como certo este principio do desejo reciproco da União, versa toda a questão sobre os meios da a conservar, e segurar, e ver se a missão de tropas para alguma parte do Brasil, será um destes meios. Negão isso fortemente os Srs. Deputados do Brazil, que até agora tem preopinado, e allegão uma razão bem ponderosa, convém saber, a desconfiança daquelles povos, o receio em que entrão pela sua liberdade, a

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irritação dos animos, e reacção que vai produzir como se viu no Rio de Janeiro, e em Pernambuco. Esta desconfiança he injustissima; com tudo existe especialmente nas provincias meridionaes do Brazil. Todos nós que estamos no Congresso, e vemos quaes são as suas palavras, e intenções, e as do Governo, não podemos deixar de conhecer a injustiça de semelhante desconfiança; entre tanto o que nos temos gravado em nossas cabeças, não he o que o está nas dos Brazileiros. O Brazil recorda sempre com horror os dias da sua escravidão passada; teme perder a sua liberdade apenas nascente; receia tornar a ser opprimido por quem outrora o opprimiu; vê na missão de tropas europeas o caminho aberto, para se renovarem os castigos arbitrarios, e deshumanos que se davão facilmente pelos capitães generaes, para alguns Europeos insolentes, e descomedidos continuarem impunemente a insultar os Brasileiros; para se estabelecer em fim no Brazil uma dependencia de Portugal maior do que pede uma bem entendida união, dependencia que só tenda a nutrir a ambição da antiga metropole. Por outra parte não tem faltado pessoas ou tão bem desconfiadas, ou mal intencionadas, que digão aos povos que o decreto do 1.º de Outubro, em quanto manda crear juntas provisorias, e governadores das armas independentes dellas, tendia a desunir as provincias do Brazil entre si, e a desarmalo para o escravizar, avassallar, e o reger duramente; que o determinado regresso do Principe, tendia a aplanar este caminho; que a extincção dos tribunaes tendia a fazer os povos dependentes de Portugal, vindo a Lisboa buscar recurso no expediente dos negocios ordinarios; e que finalmente he com estas intenções que nas Cortes começarão os negocios do Brazil sem a presença da maior parte de seus representates.
Estas accusações, torno a dizer, são injustissimas: a mesma camara do Rio de Janeiro na sua fala ao Principe Real o reconhece «Façamos justiça, diz ella, á boa fé das Cortes e veremos que as cartas de lei do 1.º de Outubro de 182l, que a tantas desconfianças tem dado causa forão dictadas sobre o estado da opinião, que a esse tempo dominava em Portugal. Quasi todas as provincias declararão muito positivamente que nada querião do Governo do Rio de Janeiro, e que reconhecião o de Lisboa. V. Alteza Real mesmo foi obrigado a escrever para lá que não podia conservar-se aqui; corrêrão mesmo vozes envenenadoras, que nem perdoárdo á conducta de Vossa Alteza, a todas as luzes conhecida por constitucional» Digo pois que as desconfianças são injustissimas; mas existem de facto, e he necessario curallas quanto antes, e mostrar por obras áquelles povos, quaes sejão as intenções das Cortes e do Governo: as Cortes tem conhecido esta necessidade e por isso mandárão que a Commissão dos negocios do Brazil, desencarregando-se até de assistir ás sessões, trabalhasse para dar sem perda de tempo o seu parecer. A Commissão o apresentou, e não sei porque fatalidade elle se não tem discutido, mas tem estado sepultado em tanta demora.
Logo direi o resultado pratico que pretendo tirar desta exposição: agora passo a considerar se este receio de aumentar as desconfianças de que acabo de
falar he razão tão forte que deva fazer suspender a missão de tropas para alguma parte do Brazil.
Um partido republicano (diz a mesma camara do Rio) mais ou menos forte, existe aqui e ali, semeado em muitas provincias do Brazil, por não dizerem todas ellas. Acaso os cabeças que intervierão na explosão de 1817 expirarão já? E não diz uma fama publica que nesta mesma cidade um ramo deste partido reverdesceu com a esperança da sahida de V. A., e fez tentativas para crescer e ganhar forças? Todas as cartas e noticias confirmão esta verdade. Em Pernambuco as prematuras sementes da independencia estão comprimidas, e não extinctas. De S. Paulo não falarei pois todos sabem os sentimentos da sua junta rebeldissima. Em Minas Geraes, alguns homens ousados começarão por exercer uma parte do poder legislativo para examinar os decretos das Cortes, e não obedecer, se não áquelles que lhe fizessem conta, e entrarão no projecto de cunhar moeda: no Rio de Janeiro parece que os directores das operações politicas querem fazer crer que o Brazil não jurou obediencia ás Cortes e no Rei, mas ao Principe, no redor de quem estão trabalhando por formarem essas pequenas Cortes, ou Corticulas, e crearem á roda, torno a dizer, do illudido, e hoje assás lisongeado Principe Real, um governo de aulicos, commendadores, e aristocratas, de quem os povos virão brevemente a ser escravos, como o forão do antigo despotismo.
Agora pergunto eu, quando facções assim procurão desencaminhar a opinião publica, que no Brazil se manifestára tão claramente, perverter o juramento dado pelos povos, comprometter os interesses dos capitalistas, proprietarios, e negociantes europeus ali estabelecidos, expondo-os ás convulsões populares, deixalos-he-mos nós nesse risco, no perigo de seus devedores os assassinarem, e se levantarem contra elles, pois he esse o melhor meio de se desquitarem de suas dividas? Deixaremos como á discrição aquella pouca tropa que temos na Bahia? Comprometteremos o decoro e honra das Cortes, fazendo ver a todo o mundo, que deixamos ir o Brazil, por assim dizer, pela agoa abaixo? O Brazil com quem por tantos seculos temos consumido tanta gente e dinheiro para a sua cultura e civilização?
Mas concedamos aos Srs. Deputados do Brazil que nada disto alli ha, nenhum espirito de independencia, nenhumas sementes de rebelião; como nos provarão elles que só por isto não deve haver lá tropa europea. Logo tambem a não deve haver em Goa, no continente e ilhas de África, pois até agora não temos ouvido falar em que haja nestas partes espirito de rebelião, e independencia. Não deve a Inglaterra ter tropas inglezas na Irlanda, ilhas Jonias, e Madrasta. A ilha da Madeira lá se defenderá com tropas do paiz, e nos dirá que nos fica agradecida pelo cuidado que temos delles, porém que lá cuidarão de si. Não se governa, nem jamais se governou assim o mundo, e seja-me licito dizer que quando algum do Brazil nos mostrar tão afincada insistencia contra a estada da tropa europea muita causa nos dão a desconfianças.
Por minha opinião he que deve ir tropa

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para a Bahia: mas o que agora desejo saber he se os grandes fins de que tenho falado se podem preencher com 600 homens? A alegria geral que se manifestou nesta cidade de Lisboa quando no sabbado passado se viu o Edital mandado afixar pela junta da fazenda da marinha para afretamento de navios, quão depressa murchou ao saber-se logo no dia seguinte, que o fretamento era só para 600 homens! O espirito publico quasi sempre ajuiza bem: vox populi vox Dei. He pois da minha opinião que se enviem á Bahia a 2$600 praças, as quaes unidas a 1$400 que lá estão, perfação 4$000 homens; força sem duvida bastante para apoiar a vontade da junta provisoria, e dos proprietarios, capitalistas, e negociantes, contra as maquinações das facções, e para conter o fogo devorador da aristocracia, ou despotismo, que vem lavrando do Rio de Janeiro para cá: o emprego desta força não nos he presentemente pezado; antes occupamos utilmente a tropa que está regressando do Rio, e Pernambuco. Esta força deve ser commandada por um general, que além de habil seja bem visto e reputado no Brazil, qual o prudente Bernardo da Silveira, e mandar-se retirar o governador Madeira, e Manoel Pedro, cujas antigas rivalidades e opiniões diversas podem continuar a ser funestas á Bahia. O general commandante deve levar amplissimas instrucções para obrar segundo a exigencia dos casos, aponto de que não dependa do governo, ou da vontade daquelles povos, fazer com que regresse a Portugal; mas que se se lhe apresentarem alguns facciosos, elle lhes diga «alto lá, nós vimos mandados pelo Sr. D. João VI. Rei altissimo e poderoso, que governa e domina em as quatro partes do mundo.» Em verdade chegão ás vezes as cousas ao ponto que a justiça branda faz o povo rijo. Dizem que a tropa vai produzir espirito de reacção. Assim poderá succeder se for mui pouca: não assim se for tanta que se possa fazer respeitar. Aqui andava agora por Lisboa uma chiadeira desenfreada, com que se illudião algumas pessoas incautas: com a pancadinha que se lhe deu, está agora tudo socegado. Por ventura a tropa portugueza, que tanto floreceu em Portugal, Hespanha, e França, irá agora murchar no Brazil? Mostre-se ao Brazil que o não queremos avassallar, como os antigos déspotas; porém contra os facciosos, e rebeldes, mostre-se que ainda temos um cão de fila, ou leão tal, que se o soltarmos, ha de trazelos a obedecer ás Cortes, ao Rei, e ás autoridades constituidas no Brazil por aquellas e por este.
Porém he preciso (e para aqui trago agora a exposição que fiz acima, e peço que o Augusto Congresso continue por mais um momento a honrar-me com a sua attenção), he necessário, digo, que esta tropa não vá só, he necessário, que vá precedida, ou ao menos acompanhada de decretos das Cortes, que facão bem conhecer as suas intenções, e remover todas as desconfianças de que acima falei. Decretos que estabeleção as condições da união e os principios de uma dependencia racionavel; que lhes dê a certeza de uma ou duas delegações do Poder executivo que haverá no Brazil, com autoridade bastante para que os Brazileiros no expediente dos seus negocios administrativos ou judiciaes, não dependão de vir duas mil leguas áquem do Atlantico: decretos que os segure de que aos generaes não será jamais permittido infligir castigos arbitrarios, mas somente em virtude de sentenças; e que finalmente os europeos insolentes ou altivos não poderão insultar jámais impunemente aos brazileiros. Curadas assim as desconfianças dos brazileiros vá a tropa e se alguns facciosos ou rebeldes se quizerem manifestar contra a união, e a boa ordem, então a tropa mostrará que he portuguesa.
Resumindo o meu discurso, digo, que se devem mandar 2$600 praças, as quaes unidas ás que existem na Bahia perfação 4$000, e que vão commandadas por um general habil, e bem visto no Brazil, com instrucções amplissimas para obrar segundo os casos; devendo discutir-se desde já o parecer da Commissão especial para se publicar quanto antes no Brazil a forma de regimen liberal que se lhe ha de dar.
O Sr. Soares de Azevedo: - Srs., o que faz objecto da discussão de hoje he a indicação dos Srs. Deputados da Bahia, sobre se devemos ou não impedir ao Governo uma resolução, que dizem tem tornado de mandar 600 homens de tropa para a Bahia. Confesso ingenuamente que nunca me persuadi que podesse ser isto objecto de questão, e menos de questão em duas sessões, porque estou persuadido que tudo aquillo que está decidido pelas Bases da Constituição; jamais poderia fazer objecto de questão: não está decidido no artigo 33 das Bases, que o poder legislativo reside nas Cortes, o executivo no Governo, e o judicial nos juizes? Não dizem ellas que cada um destes poderes se conservarão de tal sorte separados, que nenhum arrogará a si as attribuições do outro? Não temos nós sanccionado que uma das attribuições do Governo he prover a tudo o que for concernente á segurança interna e externa da Nação e do Estado? Como queremos pois hoje ingerir-nos em uma cousa que he privativa do Governo; e arrogar-nos uma das suas principaes attribuições? Como pretendemos hoje calçar aos pés a principal base de um governo representativo constitucional, que consiste essencialmente na separação dos poderes? Um tal exemplo, Srs., póde ser pernicioso... Além disto não está determinado no artigo 36 das Bases que sómente do Governo compete o empregar a força militar de terra e mar como lhe parecer mais conveniente? Sómente ao Governo, diz o artigo, Srs., como queremos pois impedir ao Governo o exercicio de uma attribuição que exclusivamente lhe dão as bases juradas da Constituição? Não acabamos nós ha pouco de sanccionar que o Governo só não poderia usar desta falculdade no unico caso em que estivesse em perigo o systema constitucional? Acaso está em perigo o systema constitucional? Ha alguem que se atreva a affirmalo? Não reconhecemos nós, e decidimos ainda antes de ontem que o Governo está em plena liberdade para prover sobre a segurança das provincias ultramarinas segundo bem lhe parecer? E como quereremos nós hoje negar-lhe já essa liberdade que antes de ontem lhe reconhecemos? Respeitemos, Srs., as bases que jurámos, e sejamos coherentes: o contrario, torno a repetir, póde ser pernicioso. Lembremo-nos que o corpo legislativo não tem outra força que

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o sustente, se não a força moral da opinião publica; perdida esta, elle caíu infallivelmente; e que cousa póde contribuir mais facil e directamente para elle perder esta força moral da opinião publica, do que o confundirmos os poderes, arrogando attribuições que não nos compete, postergarmos as bases, e o juramento de as guardar, sermos incoherentes, decidindo hoje uma cousa, e amanhã outra; e mais que tudo o intromettermos em cousas estranhas ás nossas altribuições, e cujos resultados nos podem tornar responsaveis á Nação? Para que queremos nós tomar sobre nossos hombros a responsabilidade de um acontecimento que peza, e deve pezar sobre outros hombros? Além de sermos despotas arrogando-nos o que não nos compete, seriamos imprudentes, e cavariamos com nossa propria mão a sepultura da nossa força moral. Dizem os illustres Deputados que a remessa desta tropa vai de certo exaltar os animos dos Brasileiros, e polos na justa desconfiança de que as nossas vilas vão escravisalos e reduzilos outra vez a colonias, por meio da força; eu não quero fazer tão grande injuria aos Brasileiros, suppondo que haja um só entre elles tão falto de critica, e de zelo que se persuada serem 600 homens capazes de os escravisar; sendo por outra parte tão publicas e notorias as causas que determinão o Governo e uma tal expedição. De proposito não me quero hoje intrometter a interpor a minha opinião e o meu juizo sobre taes cousas, nem se o Governo faz bem ou mal em mandar aquella tropa, ou se ella he muita, pouca, ou sufficiente; além de que eu seria contradictorio comigo mesmo intromettendo-me em objectos proprios do Governo, contra os principios que acabo de proclamar. Accresce que o Governo, por isso que está em contacto directo e immediato com as provincias do Brazil, por meio das correspondencias que tem, está ao alcance do que deve fazer, e dos motivos por que o faz; e até creio póde ser em objectos tão delicados muito prejudicial o interpormos o nosso juizo a esse respeito, que poderá talvez prevenir ou paralizar as operações do Governo. Não acanhemos o Governo, desatemos-lhe os braços, deixemo-lo obrar livremente. Nós nem somos consultados, nem seus conselheiros; as nossas attribuições são diversas, elle lá tem o seu conselho de Estado, que não foi creado para outra cousa, senão para o aconselhar em negocios de tal natureza; não tomemos tão precipitada como imprudentemente sobre nossos hombros a responsabilidade de um objecto, cujo resultado não será talvez indifferente; lembremo-nos que he este um objecto que póde trazer após de si uma grande responsabilidade; e he conveniente seja praticado por quem se possa tornar responsavel: tempo virá, se for necessario, em que se tomem essas contas ao Governo, e a razão porque vão esses 600 homens, ou só 600 homens; mas no entretanto penso que devemos não só suspender o nosso juizo a esse respeito, mas rejeitar a indicação: e he este o meu voto.
O Sr. Pereira do Carmo: - No meu conceito, até falar o Sr. Soares de Azevedo, em vez de se esclarecer, muito se havia confundido a questão proposta. Em verdade não se trata agora de formar planos de campanha no continente americano, nem de facções, nem de partidos, nem da conveniencia, ou desconveniencia da remessa de tropas ao Brazil. A questão contrahida aos seus precisos termos, se reduz ao seguinte: devem por ventura as Cortes approvar uma indicação para que o Governo suspenda os seiscentos homens, que pretende mandar á Bahia? Eu resolvo o problema pela negativa, isto he, reprovo a indicação: primeiro, porque he anti-constitucional: segundo, porque he impolitica. He anti-constitucional a indicação, porque se encaminha directamente a usurpar uma das principaes attribuições do Governo, a quem cumpre vigiar sobre a tranquilidade publica, e empregar a força armada, como melhor convier á segurança tanto externa, como interna da Monarquia. He impolitica a indicação, porque tira ao Governo a responsabilidade, e faz presente della ás Cortes. Pela minha parte digo, que não aceito este funesto presente, e declaro perante a Nação, que só respondo pelo que me toca como Deputado, tendo hombros mui fracos para sustentar o pezo dos encargos proprios, quanto mais dos alheios. Duas duvidas se oppozerão a esta doutrina na sessão antecedente: primeira, deduzida da definição arbitraria, que do systema representativo deu um illustre Deputado, pretendendo concluir dahi que as Cortes se devião ingerir nas attribuições do Governo. A esta duvida respondo que não cabe no poder do Congresso entender desta, ou daquella maneira o systema que adoptámos, pois que este systema já está consignado nas bases da Constituição, que todos jurámos, onde vem sanccionados de tal sorte independentes os tres poderes politicos do Estado, que um não póde arrogar-se as attribuições do outro. A segunda duvida consiste em uma comparação pouco exacta, com que outro illustre Deputado quiz provar, que assim como um navio prestes a dar á costa, póde ser salvo pela tripulação, quando o piloto não sabe, ou não póde salvalo; da mesma sorte o Congresso deve prestar os convenientes auxilios ao Governo para lhe dirigir o seu andamento. Respondo que os argumentos de analogia são quasi sempre falhos: eis como em outra sessão já ponderou o mesmo autor da duvida, porque as circunstancias de um caso quasi sempre se não ajustão ás circunstancias de outro. Quanto mais que para se salvar a náo do Estado não se ha mister violar as suas leis fundamentam, quando se otferece um remedio legal na pronta e effectiva responsabilidade dos ministros. Tendo pois mostrado que a indicação não só he anticonstitucional, mas impolitica, tenho direito a concluir que merece ser rejeitada. Devia parar aqui, se os illustres Deputados que me precederão, se não adiantassem a falar da materia da indicação. Cumpre-me por tanto dizer muito franca, e lealmente, que os meus principios politicos sobre o Brasil, são os seguintes: - Primeiro, não devemos abandonar o Brazil, porque não merece abandono, antes he digno do maior apreço, e estimação: segundo, não devemos constranger o Brazil a que se una a Portugal, porque união forçada não he união, e só dura em quanto dura a força que a comprime. Sei mui bem, que ao meu segundo principio oppozerão alguns illustres Preopinantes, que o Brazil jurou a Constitui-

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ção que fizessem as Cortes de Portugal; que jurou depois as bases dessa Constituição, e que mandou para este recinto os seus Deputados, os quaes legislão comnosco para Portugal: entretanto que nós não legislamos com elles para a America Portugueza, porque lá se não executão bem fielmente os decretos das Cortes; mas estes argumentos, qualquer que seja a sua força, não devem entrar agora em linha de conta, quando se trata dos grandes interesses nacionaes. Volto pois aos meus principios, e farei delles applicação ao caso de que se trata. De quantas praças se compõe a expedição projectada? De 600. E 600 homens bastão para violentar, ou conquistar o Brazil? Não. Para onde navega a expedição? Para a Bahia. E porque? Porque na Bahia uns poucos de facciosos seduzirão a tropa da terra, e forão atacar vil, e atraiçoadamente um punhado de soldados europeos, que descançãvão tranquillos, como em paiz irmão, e amigo. E a tropa européa foi mandada contra a vontade da provincia? Não; foi porque o seu governo a requereu á mãi patria, que a despeito dos maiores sacrificios, não tardou em acudir a seus filhos com o soccorro pedido. Parece pois que a indicação proposta, traduzida em linguagem vulgar, quer dizer, (não certamente no sentido que lhe dão os illustres Membros que a assignárão, e cuja probidade reconheço, e affianço) que retardemos a expedição da Bahia, para que os soldados europeos, que lá se achão destacados, caião mais facilmente debaixo do ferro dos assassinos. He por ventura supportavel esta ideia? Eu sou justo: não quero, nem desejo que se dispare um tiro na America contra um Portuguez brazileiro (e esta declaração sáe do fundo da minha alma): mas não quero, nem desejo que se offenda um cabello de um Europeo, ou militar, ou paizano, que reside naquelle paiz: e se para os salvar fôr preciso fazer sacrificios, faça-os a Nação, e dê-lhe exemplo este Congresso. Pelo que me toca, devo declarar com franqueza, que não sou, nem rico, nem pobre, e que na qualidade de pai de familias tenho deveres sagrados a preencher; mas se a minha Patria exigir estes sacrificios, eu serei o primeiro que deposite no altar da Patria, ou parte, ou toda a gratificação que ella me dá como Deputado: se não poder vir de sege para o Congresso, virei a pé, ou virei n'um bote. He necessario, Srs., recobrarmos a nossa antiga energia, não para atacar (quero ser bom entendido para que se não lance fel nas minhas palavras), mas para nos defendermos, e sobre tudo para aproveitarmos o que nos fica de rica herança, que nos transmittírão nossos maiores. Não foi a esmo que eu disse neste Congresso na sessão de 20 de Abril, quando propuz que se tornassem resgataveis os foros e pensões particulares, que era necessario cuidarmos do nosso velho, e cançado Portugal, agora mais do que nunca. Eu já então presentia que os meus esforços publicos, e particulares, de envolta com os esforços de alguns Srs. Deputados do Brazil, e Portugal, para conservarmos e estreitarmos cada vez mais a união dos dois reinos, podião ser supplantados por esses perversos intrigantes, que cravando um punhal no seio da mãi patria, lhe chamão desprezivel provincia da Europa. Desculpe o Congresso esta digressão filha do ardente amor que tenho ao meu paiz, e que só acabará comigo. Voto contra a indicação.
O Sr. Pessanha: - Pelo que ouvi na discussão de ontem, relativamente á remessa das tropas para a Bahia, conheci que não se concorda nem nos principios de direito politico, pelos quaes deve ser decido este negocio, nem mesmo na significação das palavras que designão as relações do Governo com os governados: por isso não me maravilha que a questão se tenha tão notavelmente complicado. Colligi pelos discursos de alguns Srs. Deputados, que a cada uma das provincias erão licitas as restricções mentaes; que ellas podião reservar o direito do veto sobre os decretos da autoridade legislativa, executando só aquelles, que melhor lhe parecesse; eu pelo contrario pensava que o pacto social envolvia a abnegação de todos os direitos das partes componentes da nação, e que a fruição desces direitos dependia da vontade geral, a qual nunca podia ser tyrannica, por isso mesmo que tinha por fim o bem de todos. Nem se allegue que a peior tyrannia he a dos povos livres, sobre os que lhe estão sujeitos; isto verificou-se da parte dos Athenienses para com os seus alliados; da de Roma para com as suas provincias; mas tambem he verdade, que nem os aluados de Athenas, nem as provincias sujeitas ao povo romano tinhão parte nas legislaturas daquellas duas tão famigeradas republicas; e são estas as circunstancias do Brazil com Portugal, quando este concede áquelle a mesma base de representação nacional? Se admittirmos que uma parte da Nação póde obstar ás resoluções do todo, força será que concedamos esse mesmo direito a cada um dos individuos; e nesse caso, quantos forem os individuos, tantas serão as autoridades; teremos a anarquia, isto he, a dissolução da sociedade. Observei tambem que a palavra união politica pode adaptar-se ás provincias, que não tomavão as suas resoluções em commum, por meio dos seus representantes e que os Srs. Deputados do Brazil a este augusto Congreso devem ser considerados antes como enviados de differentes potencias, que vem negociar tratados, do que membros collectivos de uma mesma sociedade. Notei mais que a palavra independencia não se referia a provincias, que deixavão de obedecer a um mesmo Governo, cujas ordens calcavão aos pés; e assim vejo que no vocabulário de muitos Srs., união politica, e independencia, são palavras synonimas, em cujos termos he impossivel entendermo-nos. He forçoso pois que examinemos os factos. Quando neste augusto Congresso soou a noticia da revolta de Goiana, e se soube que um punhado de facciosos daquella villa levara o ferro e o fogo contra os seus irmãos do Recife, um illustre Deputado disse que elle respondia pela sua cabaça, que a tranquilidade, e a ordem se restabelecerião em Pernambuco, logo que dali saisse Luiz do Rego, e o batalhão do Algarve; um e outro sairão de Pernambuco: mas que seria da cabeça do illustre Deputado, se se lhe tomasse conta da sua palavra? O governo provisorio de Pernambuco ousa reembarcar as tropas que tinham sido mandadas para aquella provincia, por autoridade mesmo das Cortes; os Europeos são

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horrivelmente perseguidos, muitos assassinados, outros fogem perdendo suas propriedades: parece que se votou a destruição do nome portuguez, e entretanto o hypocrita de Gervasio Pires Ferreira não pronuncia o nome de Cortes, e mesmo o de qualquer Deputado, sem manifestar signaes do mais profundo respeito. Em o Rio de Janeiro, e S. Paulo, desobedece-se formalmente ás ordens das Cortes; obriga-se a tropa ali estacionada a embarcar por força; as autoridades daquellas provincias erigindo-se interpretes da vontade dos povos, quando estes tinhão aqui os seus representantes, investem o Principe Real de um poder dictatorio; ouço ate dizer que se convocão ali uma especie de Cortes. Ora agora caracterise quem poder similhantes actos. Na Bahia, certos individuos, dizendo que lhes não agrada o governador nomeado por ElRei, atacão com mão armada a tropa de Portugal, que sustentava a nomeação do poder legitimo, e que scenas se não terião seguido sem a energia do governador, e da tropa? Quando aqui se receberão estas noticias, o Congresso pronunciou a formula: caveant consules ne republica a liquid detrimenti capiat; formula que implicitamente continha a ordem de fazer partir tropas. O Governo dispõe-se a mandalas para a Bahia; e a isto pretendem obstar alguns Srs. Deputados. Mas que certeza nos dão elles, que não se reforçando os corpos estacionados na Bahia, a autoridade legitima deixará de ser ali transtornada, como nas mais partes? Que certeza nos dão elles, que ali se não levante outro Gervasio Pires Ferreira, o qual com a união na boca, e a independencia no coração, não trate de exterminar os Europeos, e todos os bons cidadãos? Que a anarquia, a revolta dos escravos... Falemos claro, Srs., no Brazil, o desejo da união he o da grande maioria; mas por toda a parte ha um plano combinado para a independencia: a occupação do ponto da Bahia he o unico meio de transtornar esse plano, de poupar o sangue europeu, e dos Brazileiros honrados. Eu sou Portuguez trasmontano, sou compatriota do immortal Sepulveda, cujo pai, para levantar primeiro o grito da independencia da nação, não calculou as forças de Napoleão, quando este tinha occupado Portugal: se eu previsse que o Brazil se podia constituir em nação separada de Portugal, sem passar pelos horrores da anarquia, talvez que eu dissesse: deixemos o Brazil entregue a si mesmo; limitemo-nos para com elle a relações commerciaes; mas considerando-o, se lhe dermos de mão, perdido para nós, e para si mesmo, não calculo os sacrificios que nos custará a manter a união; a Nação que me ouve tambem os não calcula, porque a honra da Nação clama altamente que seja mantida esta união, custe o que custar: eu só criminarei o Governo, se elle não mandar para a Bahia forças sufficientes para sustentar esse ponto, e para ameaçar a rebeldia, onde quer que ella apparecer. Voto por tanto contra a indicação.
O Sr. Moniz Tavares: - Sr. Presidente, primeiro que tudo julgo ser muito do meu dever por motivos particulares declarar altamente, que quando sahi do meu pais, para vir tomar assento neste augusto Congresso, vim disposto a sacrificar-me, e firmissimo nesta resolução não vejo sobre a terra poder nenhum capaz de obrigar-me a votar contra os dictames da minha consciencia; com franqueza direi sempre tudo o que entendo. (Apoiado, apoiado). A indicação he justissima, sem hesitação alguma deve passar. De qualquer forma que eu considere a deliberação ha pouco tomada pelo Governo, respectivamente a provincia da Bahia, não posso deixar de considerala intempestiva, impolitica, e tyrannica. Intempestiva, porque nada se sabendo do estado actual daquella provincia, não se sabendo mesmo se a tropa de Portugal ali existente, continua, ou não a gozar os fructos do seu bello triunfo, ou se obrigada por circunstancias imperiosas terá embarcado: enviar-se tropa he querer sacrificala, he acarretar despezas ao desfalcado thesouro, e despeças em nenhum proveito. Sr. Presidente, os amigos da ordem, os verdadeiros amigos da união não podem deixar de lamentar um passo tão desacertado, e elle vai produzir effeitos que se não podem calcular. O edital fixo na praça para fretamento de vasos que hão de conduzir a expedição, esse edital levado já pelo paquete á Inglaterra, foi dar um completo rebate a todas as provincias do Brazil, todas ellas se armarão como para uma vigorosa campanha; e se persisistirmos no projecto, se favorecermos a inconsiderada deliberação do Governo, a separação está concluida. E seré ella desejavel? Ah! longe de nós similhantes ideas. O nosso dever he unir estreitamente o Brazil, e para o unirmos he preciso que a indicação passe. He impolitica a deliberação, disse eu, porque não havendo já hoje uma só pessoa que ignore o exaltado ódio, que os habitantes do Brazil consagrão á tropa de Portugal, estando persuadidos os Brazileiros que essa tropa em vez de plantar a ordem, promove continuamente a desordem, tendo elles feito todos os esforços possiveis para a repellirem; remetter-se mais tropa, não he accender mais o ódio? E accender-se o ódio entre povos irmãos, não he uma medida impolitica? Está claro. Mas grita-se por toda a parte: se se não envião tropas ao Brazil, as vidas, as propriedades dos Europeos ali residentes ficão á discrição, ficão sem segurança. Ah! Sr. Presidente: eu desejava que por uma vez se desenganassem todos os Srs. Europeos de que as suas vidas, as suas propriedades são tão somente conservadas no Brazil pela amizade, amor, e sobre tudo generosidade dos Brazileiros: eu desejava que elles se lembrassem de que com essas medidas de força vão exasperando os animos a ponto de que pode chegar um dia fatal em que os innocentes sejão envolvidos em uma catastrofe terrivel (rumor nas galerias). He tyrannica a deliberação. A experiencia tem mostrado, que a tropa de Portugal, passando a equinoccial, perde a devida disciplina que aqui a mantem, e desenfreada commette os maiores excessos. Não necessito enumerar factos: falem por mim os arrabaldes de Olinda, e a povoação dos Afogados: as portas da casa do commercio do Rio de Janeiro estão tintas de sangue humano, as ruas da Bahia achão-se alagadas no mesmo sangue; mas para que he recordar idéas tão tristes, e diante de quem as tem sempre presentes! Sendo certissimo o que acabo de avançar, pretender reforçar o numero dessa tropa, não

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he querer augmentar o numero dos tyrannos? E não he isto uma verdadeira tyrannia? Resta ainda refutar as objecções apresentadas por alguns illustres Preopinantes. Dizem elles: ao poder executivo compete dispor da força armada; nós não nos devemos intrometter em suas deliberações. Grande escrupulo mostrão agora os honrados Membros; lembrem-se quantas vezes nos temos intromettido, e em cousas bem insignificantes. Ninguem hoje ignora que o Governo só póde dispor da força armada para fins justos, e pelas razões expendidas, tendo eu mostrado o contrario, o argumento cáe por terra. Disse outro: jurámos as bases, as bases reconhecem essa attribuição do poder executivo, e nós sem incorrermos na nota de perjuros não podemos suspender o acto de que se trata. Em verdade he admirável este raciocinio. Houve já quem dissesse que suspender, e anniquilar era uma, e a mesma cousa? Suspender um acto do poder executivo, quando se julga contrario ao bem da sociedade, he destruir esse poder? Não tem resposta. Lisongea-se-nos com os epitetos de protecção, repetem muitas vezes alguns illustres Membros que essa tropa não vai conquistar: vai defender, vai proteger os cidadãos pacificos. Este termo protecção tem as ideas que nós lhe queremos dar. A Austria introduzindo o exercito em Napoles, não se tem servido de outra linguagem: protecção, e mais protecção. Nós não a queremos agora; quando for preciso, quando tivermos inimigos externos a combater, então a pediremos, então Portugal no la remetterá, pois he este um dos effeitos da união. Pretende-se aterrar-nos com novellas de facções, espirito de anarquia, espirito de independencia. Eu respondo: ou estas facções são parciaes, ou são universaes: se parciaes, he fazer uma idea muito pequena do estado do Brazil, o crer que elle não tem em si força sobeja para suffocar essas facções: se universaes, então digo que não vejo força em Portugal capaz de produzir o effeito desejado (rumor nas galerias). O mais está respondido. Tendo eu pois mostrado que a deliberação do Governo he intempestiva, impolitica, e tyrannica; tendo refutado as razões em contrario, voto em favor da indicação: ella deve passar.
O Sr. Moura: - Sr. Presidente: alguns dos illustres Preopinantes que me precederão a falar, discorrerão com rigor, e exactidão de principios, quando concluirão, que a resolução deste negocio não dependia senão de reflectir bem nas attribuições do poder executivo, e já não era necessário passar daqui, sendo bastante o trazer á lembrança, que o poder executivo, a quem está encarregada a segurança publica, e a direcção da força armada, devia tratar daquella segurança, e dar direcção a esta força como assentasse que era necessario aos fins a que he destinado o seu poder: parece-me tambem a mim, que se nos devessemos limitar ao rigor de principios, aqui deveriamos parar; porém quando eu vejo uma indicação assignada por todos, ou pela maior parte dos representantes da America, dizendo-nos que o desenvolvimento da legal autoridade do poder executivo, mandando uma força europea para a America, era uma causa de desunião destes dois hemisferios, então assento que devemos caminhar um pouco mais adiante, e que devemos examinar a medida do Governo, ou para nos oppormos a ella, ou para vermos se ella se combina com os bons principios da justiça, e da utilidade publica. He demasiadamente importante o negocio da união deste paiz com aquelle continente; e quando os representantes daquellas provincias dizem, que uma tal medida da Governo seria a causa da desunião daquelle paiz, confesso que tremo pela minha responsabilidade. Senhores, a Europa toda tem os olhos fitos em nós; trata-se de ligar um mundo com o outro; temos de ser julgados pelo mundo inteiro, e pela nação toda; seja-me por tanto permittido fazer declarações francas a este respeito, e dar resposta a todos os argumentos quantos se offerecêrão contra os que expuz na sessão passada; porque a verdadeira discussão consiste na comparação dos argumentos; só assim se póde achar a estrella polar de sabedoria, e de prudencia, que as Cortes, e o Governo devem seguir neste melindroso assumpto. Eu já ontem falei assas francamente; hoje me proponho falar com a mesma franqueza; saiba todo o mundo porém, que eu falo segundo o estado actual da America, e que á proporção das noticias que de lá vierem chegando, maior será minha franqueza; porque sei as verdades que devo dizer, e as que por ora se devem calar: portanto devo falar segundo o que actualmente sabemos daquelle continente, e hei de falar com franqueza (eu o repito, com o testemunho de toda a minha consciencia). Nenhum dos illustres Deputados do Brazil (seja-me licito ter esta ousadia), nenhum, dos illustres Deputados do Brazil me excede em ideas liberaes, e sentimentos patrioticos, a respeito das leis e do regime que se deve adoptar naquelle continentes eu concedo-lhe a mesma Constituição, a mesma liberdade, as mesmas garantias, e todas as excepções quantas nos subministrar a prudencia, e nós todos assentarmos que he necessario fazer no sentido de promover a prosperidade, e de assegurar a liberdade civil e politica do povo brazilico; tudo lhe concedo, uma só cousa não posso admittir, nem conceder, e he, que o Brazil diga com uma voz unanime e universal, queremos a união de Portugal, queremos a mesma Constituição, uma só autoridade legislativa, e executiva ha de reger o imperio dos dois mundos; e que ao mesmo tempo, e a par deste grito universal, haja ora aqui, ora acolá, uma parcella, uma fracção indigna (assim lhe posso chamar) que diga «havemos de obedecer, quando nós quizermos; havemos de obedecer hoje, e não havemos de obedecer amanhã.» (Apoiado, apoiado). Que uma junta de S. Paulo, que uma junta ao norte, e outra junta ao sul diga «a esta lei, que he do Congresso, obedecemos; a esta porém não obedecemos», isto he uma cousa a mais intoleravel que póde imaginar-se; he resistencia formal á autoridade publica; he o fermento eterno da desunião; he o perpetuo embrião da anarquia, e o toleralo he cousa não só indigna, mas que nós enche de vergonha, e de descredito á face do mundo todo. As provincias que tem representantes neste Congresso jurarão-lhe obediencia; se acaso ha leis que offendão os seus interesses, representalo, he o seu direito. Para que hão de portanto

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ser refractarias, só ellas tem o direito de petição? O direito de petição compete a todo o individuo, e a toda e qualquer corporação, compete-vos tambem a vós; mas dizerem autoridades refractarias: Nós não obedecemos ás leis do Congresso, não obedecemos a vós nossos representantes, porque o que vós mandais não he justo! Qual he o Governo aonde isto se póde admittir? Se esta voz póde ser escutada, he quando sae da boca de uma nação inteira; mas se he só a expressão de uma parte della, he a rebelião quem falla e a rebelião he o maior dos delidos politicos.
Esta he a prefacção do meu discurso. As provincias representadas, torno a dizer, jurarão obediencia a este Congresso, hão de prestar obediencia a todos os seus decretos; se tiverem que representar, fação-no; mas não arvorem a inobediencia em principio, nem ponhão a desorganização em systema. Se não for com esta condição, não ha união, nem governo, nem sociedade; porque, desenganemo-nos, senhores, em que consiste a união de Portugal com o Brazil? A união he um vinculo politico, que prende aquelle paiz a este, e este áquelle; as Cortes estão congregadas, e os Representantes de ambos os paizes juntos nelles; em que consiste pois a união, a não ser na indistincta obediencia aos decretos? Se as provincias do Brazil disserem todas, n'uma voz unanime: não vos obedecemos, ha união? Certamente que não. E acaso dizem todas isto! Se o dissesem escusado era agasalharmos os seus Representantes neste recinto. Pois se o não dizem todas, mas só uma parte, concitemos todas as nossas forças para reprimir este faccioso grilo de rebellião, porque, não he a vontade de todos, he a vontade de uma fracção deste todo. Esta he a idéa primaria, e fundamental, que nunca elevemos perder de vista em todas as discussões sobre a America. Agora vamos ao assumpto. Como pois assento que nós devemos considerar com mais amplitude esta medida do Governo de mandar força militar para a Bahia, seja-me permittido responder a algumas das reflexões, que sobre os meus principios, aqui ontem desenvolvidos, fez um illustre Deputado da provincia de S. Paulo; mas para responder com mais exactidão he preciso que eu compare a força dos seus argumentos com a força das suas respostas; porque havemos de persuadir-nos que só de discussões francas e tranquilas he que podem resultar decisões acertadas. Preciso para isto de uma attenção benevola. Na sessão passada comecei eu por estabelecer como primeiro principio de justiça politica, que neste Congresso nunca se adoptou medida que tendesse á continuação do systema colonial na America; nem me parece ter já mais ouvido approvar semelhante idéa a nenhum dos sabios legisladoras, que me escutão. E a quem póde lembrar que possa ser adoptada similhante idéa de colonização do Brazil, ao menos desde o dia 24 de Agosto de 1820 para cá? Que quimeras excogitão os preversos!... O illustre Deputado de S. Paulo, respondendo ontem aod meus argumentos, disse "Reconheço que sim, eu mesmo sou o que confesso que as medidas adoptadas pelo Congresso não tem sido tendentes a fundar o systema de colonização; porém como póde evitar-se que algumas pessoas no Brazil pensem o contrario? Realmente ha no Brazil suspeitas de se querer colonizar a America? E como havemos de evitar a influencia que tem esta persuasão?" Entranho modo de raciocinar! O illustre Deputado responde com um facto, quando diz que ha pessoas que suspeitão que queremos colonizar a America. A primeira resposta será que duvido do facto. Que haja uma ou outra pessoa que assim pense, ou que assim queira pensar, não me opponho; porém que o grosso da America seja desta opinião, he fazer um juizo muito miseravel do bom senso dos habitantes daquelle vasto continente. Nós mandamos-lhes as bases da Constituição; ellas forão applaudidas e festejadas por toda a parte; forão juradas; e não são ellas um sufficiente argumento para acabar de convencer que não queremos colonizar a America? Se as bases da Constituição não são sufficientes para desfazer uma tão miseravel equivocação, nesse caso está perdida a America, está a união quebrada; não ha nada que convença aquelles povos dos principios de liberalismo que temos adoptado, e adoptaremos sempre a respeito da America. He por tanto uma verdadeira preocupação do illustre Deputado o dizer, que tão infundadas suspeitas abrangem a todos os espiritos americanos: se ha um ou outro individuo, que no meio do frenezi, e da agitação de paixões ambiciosas, assim o pensa, isto não tem influencia nenhuma no todo; certissimamente a sua influencia he como uma gola de agua que se perde no Oceano.
Disse eu mais na sessão de ontem, que se a união do Brazil não estivesse proclamada, e mantida por todos os povos da America, eu reputaria como cousa impolitica, que se empregasse força para querer estabelecer esta união contra a vontade de seus habitantes. O illustre Deputado disse a isto: que a união está proclamada, a união está jurada; mas o juramento não he sem condições, e as condições do juramento são as de bem governar; e quando o Governo governa mal, os governados são juizes de se levanta em contra o Governo: isto disse o illustre Deputado, e disse-o com esta mesma indistincção; e dito assim, quem duvidará que he este o mais extravagante absurdo, que se póde dizer em politica, ao mesmo passo que he um principio verdadeiro quando se explica com a distincção com que se deve explicar? O Governo governa só debaixo da condição de bem governar: quem o duvida? Mas a quem compete o decidir se elle governa bem, ou se governa mal? He a um governado, a dois governados, a uma cidade, a uma povoação, a um individuo? Quem tal dirá? Não; he a todos os governados juntos: he quando os governados todos se levantão, e recorrem ao sagrado direito de insurreição para se libertarem da oppressão do Governo; he quando, por exemplo, o éco da insurreição se levanta a 24 de Agonio no Porto, e quando como fogo electrico se communica a todos os cantos de Portugal. Quando assim se publicão os votos publicos de uma Nação inteira; quando uma indignação geral, e notoria, se produz contra um Governo oppressor, então ha juiz competente, e nasce legitimamente o sagrado direito da insurreição, porque então fala a Nação toda: mas competira por ventura este direito a um individuo sómente? Quem

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póde provar similhante absurdo? Competirá á junta de S. Paulo, competirá a outra qualquer junta da America? Terá por ventura uma similhante autoridade o arrojo de dizer, eu não obedeço porque a lei de injusta, sem que seja marcada e estigmatizada com o indelevel ferrete de rebelião? Eu faço honra á capacidade do illustre Deputado, e desde já espero, ou que se desdiga quando falar, ou que estabeleça a sua doutrina com a distincção mencionada, que he a de todos os publicistas. O terceiro principio a que ontem recorri, foi aquelle que estabeleceu a necessidade da união de cá e de lá do Atlantico, fundada nos reciprocos interesses de uma e de outra banda. Conveio nisto o illustre Deputado que me respondeu, e eu lhe dou os parabens de convir com tão boa fé comigo: iguaes vantagens sem duvida recommendão a união de Portugal, e do Brazil; nisto convêm todos os illustres Deputados: a razão, e a experiencia o mostrão. Disse eu no quarto principio, que nós tinhamos procedido com muita justiça com os povos da America, porque lhe tinhamos dado a mesma Constituição, os ultimos direitos, os mesmos gráos de liberdade, as mesmas garantias: a isto disse o illustre Deputado "Tudo assim he, mas houve alguns descuidos" Não duvido; mas descuidos não são faltas essenciais: os descuidos faria o objecto de representação; mas hão de ser objecto de protestos, e de desobediencia? Que injustiça! Que má fé! Ah! Que te todo o povo americano assim pensa-se podiamos desesperar da união! Vamos são poucos, e impotentes! ... Vamos aos descuidos. Não concedemos a revista na America; mas não foi isto determinado por um decreto provisorio? No projecto de Constituição não está remediado este defeito? E um similhante descuido era sufficiente causa para se romper um laço que toda a America aprecia, e deseja tornar mais forte? Desenganemo nos, Srs., não he a America que se levanta, sob tão futil pretexto; os que procurão reger a America hão os que augmentão a importancia destes descuidos, e os que instão com estes miserabilissimos pretextos ou ninharias, que não valem nada, são os perturbadores do paiz. Mas vós tirastes da America os tribunaes antes de os extinguirdes em Portugal (disse o Sr. Deputado de S. Paulo). Supponho que o illustre Deputado não quererá insultar o bom tenso do povo americano, suppondo que elle póde concordar tribunaes consultivos, que são o apoio da monarquia absoluta, com o systema de governo representativo, e monarquia temperada.
Os tribunaes aconselhavão o Rei, quando elle legislava; hoje não legisla; que conselho tem elles de lhe prestar? Gastar mais tempo em desfazer as illustres deste pretexto, he suppôr que não he conhecida a época, em que nos achamos. Ah! povos illusos, como os perversos abusão da vossa credula singeleza! Mas vós mandastes retirar o Principe Real. (Este he o grande pretexto; este he o conditio sine qua nom dos sátrapas de S. Paulo). Miseraveis cortezãos. Eu de bom grado condirei que se demore alí o Principe, até que a Constituição for plantada naquelle hemisferio; mas se da sua perpetua existencia naquelle continente, he que depende a união da America; se fraudulosamente se pretende que o Principe Real, D. Pedro de Alcantara, herdeiro presumptivo, e successor da corôa de Portugal, fique para sempre na America, para que na eventualidade na morte de ElRei seu pai (cujos dias Deus prolongue, abençoe, e prospere, até que para bem dos Portuguezes crie raizes neste paiz o systema constitucional (*)), para que nesta eventualidade, digo, se o Principe Real estiver na America, digão então os aulicos do palacio de S. Christovão, fique o Principe, e mude-se a Corte, mude-se a séde da monarquia; eu com tal condição não quero similhante união. A séde da monarquia he Lisboa, a nobre fundarão de Ulysses ha de ser perpetuamente a séde da monarquia portugueza; mudar a séde do imperio he condição em que nunca hei do convir; já está sanccionado nas Bases, e approvado no projecto da Constituição. Faço esta declaração franca a todo o mundo, e á proporção, como disse, que vierem noticias da America, tenho outras analogas a esta, que agora julgo inopportuno produzir. Nisto tenho por ora dito assás; vamos á segunda parte do meu discurso. Disse ontem que o meu primeiro objecto era apoiar a medida do Governo em bons principios, e justificala pelos urgentes motivos que a tornavão necessaria: disse mais, que os meios que a tornavão necessaria, erão: primeiro a existencia de um partido que queria a independencia: segundo, a existencia de outro partido rebelde, que se oppunha ás ordens do Congresso, e deprimia sua legal autoridade: terceiro, o desenvolvimento de um espirito de anarquia, e de convulsão popular, que ameaçava aquella continente. O illustre Deputado, a quem hoje contesto, negou estes factos, e disse "que não existia nem o espirito da independencia, nem o da rebeldia, nem o da anarquia." Ora quando um argumento repousa sobre verdades de facto, abertamente negadas por um tão illustre contendor, parece que não ha outro recurso senão recorrer ás provas desse facto. Eu não tenho á mão nem a prova de testemunhas, nem a de documentos, que em rigor seria necessaria; mas tenho uma prova superior, e he o sentimento de todos os Senhores que me ouvem; não ha nenhum dos illustres Deputados que me ouvem, que hão tenha visto milhões de cartas, que dizem: em Pernambuco ha um partido de independencia, na Bahia ha um partido de independencia, no Rio de Janeiro ha um partido de independencia, em S. Paulo ha um partido de independencia; todos o dizem: e agora digo mais, que se me fosse licito trazer para aqui uma testemunha (e he das que pertencem á representação daquelle paiz), eu poderia com ella asseverar, que no Brazil existe este partido, que quer a independencia; e como o havemos de negar, se a mesma camara do Rio de Janeiro diz isto mesmo n'uma representação dirigida ao Principe Regente?

(*) O Orador foi aqui geralmente apoiado: é todo o Congresso, assim como o povo das galerias, se mostrárão sensiveis, dando manifestos signaes de grande interesse que tomavão na vida d'ElRei.

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Em segundo lugar, o espirito de rebeldia ninguem póde negar que existe, ou elle se considere nos individuos, ou nas autoridades, ou nas corporações.
São patentes os documentos donde consta que individuos, e autoridades tem daquellas partes declarado em muito expressos termos, que não obedecem, nem hão de obedecer, posto que tenhão jurado obediencia. Se isto he o que diz a junta de S. Paulo, não haverá rebeldia na junta de S. Paulo? Se isto he o que diz a facção do Rio de Janeiro, que illude e rodeia o Principe Real, não haverá rebeldia do Rio de Janeiro? Da junta da Bahia não tenho se não muitos louvores para lhe dar: esta junta he composta de cidadãos probos, rectos, virtuosos, e patriotas; houve ali uma dissenção entre dous chefes militares, a junta tratou de acalmar a agitação publica, mas nenhum dos seus actos he rebelde. Em Pernambuco porém não tem havido actos de rebellião a mais manifesta? Falo só da junta de Goyana; acredito os motivos que tiverão os insurgentes de Goyana para se poder desculpar a sua insurgencia, os quaes só considero n'uma publica illusão; mas os motivos que tiverão os insurgentes de Goyana para se levantarem justificão a legalidade do acto? Principio perigoso, que os povos aprendem muito depressa, sem ser preciso que a demagogia, o proclame: principio perigoso se uma prudente legislação o não combatesse, e foragisse como agente o mais efficaz da desorganisação social. Disse tambem o illustre Deputado que eu não tinha provado que houvesse anarquia no Brazil; porque tinha concluido que a poderia haver, em razão da heterogeneidade da população daquelle paiz. Eu não disse isto assim; o que eu disse foi, que havia effectivamente no Brazil um decidido espirito de anarquia: Sr., não poderei eu dizer que ha espirito de anarquia quando em Pernambuco se levantão mulatos e negros, vão ás portas do trem, arrombão-nas, e se armão, e se conservão armados? Não hei de considerar espirito anarquico na Bahia, quando uns poucos de soldados, e de paizanos dizem: não ha de ter governador aquelle, que as Cortes querem: mas sim aquelle que nós queremos? Não hei de considerar anarquia na infutação que tem feito a toda a justiça, e a toda a verdade os incendiarios papeis do Rio de Janeiro sem que a autoridade publica os possa cohibir? Quando a infame Malagueta, quando o estupido e fatuo Despertador; quando mil outras papeletas tão magras de merito literario, como fartas em calumnias, e em infamias, dizem a todo o mundo que as Cortes querem reduzir o Brazil a colonia, e que o querem tyranizar; não hei de chamar a isto espirito de anarquia, principalmente quando não vejo da parte do Governo uma acção capaz de conter, e de comprimir? Ha por tanto no Brazil espirito de independencia, espirito de rebelião, e espirito de anarquia; tudo isto he verdade, Srs.; e aos vossos ouvidos tudo isto terá chegado por mil diversos canaes, e por mil vias differentes; tudo isto justifica por tanto a medida, que o Governo quer tomar, de reforçar a guarnição na provincia da Bahia. A tropa não he mandada para aquelle continente, se não para cumprimir aquella facção, e não para comprimir o todo; porque o todo está unido comnosco, e nós com elle. Supposto isto, só não me resta se não responder a um argumento bastante especioso mas muito valido, a que se acolhem os Srs. representantes do Brazil, que seguem a opinião contraria. Dizem os illustres Deputados: nós temos tropa sufficiente para cumprimir todas as facções, e todos os partidos. Respondo: em primeiro lugar começo por negar a verdade deste facto; na Bahia, em Pernambuco, no Rio de Janeiro não ha tropa sufficiente para comprimir os anarquistas; notoria he esta verdade, pois que tendo-se desenvolvido o anarquismo em Pernambuco e na Bahia, não foi a tropa do paiz quem o comprimiu. Depois disto; ou seja pela falta de disciplina, ou seja pela heterogeneidade dos elementos, de que se compõe a tropa brazileira, o certo he, que ainda n'outro dia n'uma convulsão popular da Bahia, duas companhias de tropa europea desarmárão um regimento; não foi isto por falta de valor; porque em fim os brazileiros são portuguezes, mas o facto he mais que notorio, e ou o regimento estava diminuto de praças, ou todo era de galuchos, e de gente imbelle. He por tanto indispensavel que vá força de Portugal; ella não vai fazer derramar o sangue dos brazileiros, nem plantar leis tyranicas, tem um fim muito proficuo, e he conservar a nossa união; ella vai obedecer a um chefe militar, e ás juntas administrativas, que estão naquelle paiz; se os toldados commetterem algum desaguisado contra a ordem, elles serão castigados. Outro illustre Deputado do Brazil disse, que o mesmo Principe Real, delegado de S. Magestade na America, diz, que a tropa longe de promover a união, fundava a desunião. Em primeiro lugar eu respeito muito a autoridade do Principe Real; mas não a reputo infallivel. Alem disto, considerando-o cercado de pessoas, que não são capazes neste ponto se não de lhe dizer o que o espirito de facção e de desordem lhe dicta, não tenho que nesta parte seja a opinião do Principe attendivel, tanto mais que elle já disse o contrario em carta escrita a ElRei seu pai, que foi premente a este Congresso. Concluo por tanto, que a indicação deve ser rejeitada; que deve mandar-se para a America a tropa que o Governo julgar necessaria para conter este espirito de facção, de insubordinação, e de desordem; mas considero tambem necessario (supposto deva ser objecto de uma indicação á parte) que se declare francamente aos povos da America, por meio de uma proclamação, não se as firmes tenções que tem o Congresso de adoptar no regimen daquelle paiz o maior liberalismo, em quanto elle quizer estar unido comnosco, mas tambem que se lhes explique com muita franqueza, quaes são os verdadeiros motivos porque lhe mandamos tropa, apesar dos seus representantes se opporem a esta medida. Esta força vai com o destino de auxiliar a ordem, e de manter a união, pois ha espiritos inquietos, e autoridades refractarias, que, contra o sentimento geral dos povos do Brazil, querem a desordem, e proclamão a inobediencia. As Cortes não querem governar o Brazil por um systema diverso daquelle porque querem governar Portugal; querem igualdade de direitos, e igualdade de representação; as Cortes de bom grado convirão não

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só em conceder á America um centro de poder executivo, mas tambem convirão em fazer todas as excepções, que a diferença das localidades exigir. Se ainda assim mesmo o Brazil quer governar-se independente, falo claro, e desenganemo-nos; nunca serei dê opinião que se empregue força para prender essa união: quero que seja espontânea, e não forçada. Declarações tão francas não são só palavras; porque nem até aqui nós temos mandado só palavras, nem daqui em diante deixaremos ir as palavras sem irem acompanhadas de boas leis, capazes de manter a paz, a seguridade, a independencia, e a prosperidade daquelle paiz. Eu fio que um modo de falar tão claro, é um proceder analogo, será capaz de convencer os incrédulos de boa fé; não falo com os desorganisadores, com os ambiciosos, com os falsos patriotas; porque para esses não tenho razões que bastem. O Governo que lhe opponha umas vezes á espada da justiça, e outras vezes o estrondo das armas. Para isso vão tropas, e para nada mais. O meu voto he, que se rejeite a indicação, e que se fale á America com muita clareza , e nunca adoptarei que tenhamos com ella a mesma linguagem, que tiverão os Ingleses, e os Hespanhoes com as suas colónias. (Apoiado, apoiado).
O Sr. Villela: Os meus illustres collegas e amigos, os Srs. Deputados do Brazil, que falárão na discussão de ontem, sustentando a indicação, já expenderão razões, a que no meu entender ainda se não tem satisfeito cabalmente. Não obstante isto direi tambem alguma cousa, unicamente para expressar o meu sentimento em matéria tão importante, ainda que reproduzindo alguns dos mesmos argumentos. E sem me fazer cargo de refutar cousas sobre que te tem divagado fora de propósito, limitar-me-hei sómente á matéria , e ao que com ella tiver connexão: e começarei respondendo ao illustre Deputado o Sr. Moura, que a conclusão que elle tira para affirmar que o Brazil está em anarquia, de se imprimirem ali alguns periódicos incendiários no seu conceito, e de andarem alguns homens de cor fazendo desordens, he tão frívola como a illação que eu poderia tirar dos escriptos de Sandoval, e das desordens ha poucos dias praticadas por alguns bandos de miseráveis contra as companhias de gallegos, para dizer que Portugal está em anarquia. E porém não lhe responderei ácerca do máo conceito que elle faz das tropas do Brazil para pedir que se mandem de Portugal, affirmando que aquellas nem são boas, nem sufficientes a manter alí a ordem, visto uma só companhia de soldados europêos haver desarmado agora na Bahia um regimento inteiro do paiz. Sobre isto informem ao illustre Deputado os batalhões que vierão de Pernambuco, e os que acabão de chegar do Rio de Janeiro. - Em verdade, Senhores, he para admirar, que nem a experiência dos successos de Hespanha na America, nem as noticias do socego em que está a província de Pernambuco depois da saída das tropas europeas, nem o officio do Príncipe Real, mais interessado do que ninguém na união dos dois Reinos, que deverá um dia reger, no qual propõe para socego daquellas províncias, que se não mandem mais tropas, seja tudo isto bastante para se não insistir tanto em remetelas. E que pódem fazer mais seiscentos homens contra a Bahia? Que resultado se tirou dos que forão para Pornambuco? Que se conseguiu com os que se mandárão para o Rio de Janeiro ? Todo o mundo o sabe, e nós o devíamos prever. Mas não, diz o Sr. Borges Carneiro, não bastão só seiscentos homens; devem ir seis mil com um general bravo e rijo, o qual leve as leis das Cortes, e as faça alí receber á força ; e quando isto não baste, ainda ha cá um cão de fila para lhes soltarmos. Ora he até onde póde chegar o desprezo que se faz do Brazil! Com effeito não pôde haver linguagem mais liberal!! Pois advirta o illustre Deputado, que alí também se sabem açaimar cães; que nas veias dos Brazileiros também gira sangue portuguez; e que já boje ali se não hão de receber leis com o arcabuz no rosto. Passemos agora ao grande argumento de que se tem valido alguns outros Senhores Deputados, consistindo em que as Bases da Constituição autorizão o Governo para empregar e dispor da força armada, onde e como melhor convier, e que por conseguinte não nos devemos ingerir nas cousas da competência do poder executivo. Em verdade não sei quem contestasse jámais este principio, ou negasse ao Governo esta autoridade : porém quizera também que os illustres Preopinantes me respondessem, se constando que o Governo tenta abusar da força armada, ou que do emprego della em alguma parte pode resultar prejuízo á Nação, não cumpre ao Congresso obstar ao mal antes de acontecer ? Demais, se este artigo das Bases he tão extensivo como se pretende, porque o restringimos já nós na Constituição, quando sanccionámos que o Governo não possa empregar os corpos de milícias fóra das suas respectivas províncias? E então porque não poderá o Congresso igualmente determinar que se não hajão de destacar tropas de Portugal para o Brazil, e reciprocamente, excepto no caso de serem requeridas, ou por occasião de guerra estrangeira ? Sr. Presidente, esta deliberação he muito arriscada: um pai vê dois filhos em discórdia, separa-os por algum tempo, se os não póde conciliar. Com effeito, quando eu esperava que o Governo tomasse neste negocio medidas de moderação e brandura, mandando pelo menos retirar dali os dois brigadeiros, causa da desordem, e nomeando outro commandante capaz, e prudente, vejo pelo contrario que a decisão he mandar mais tropas para auxiliar Madeira e seus soldados, e isto só porque as pede Madeira, e pelo que diz Madeira, sem se esperarem noticias e participações da junta do governo da província, e como só as desordens entre os dois brigadeiros fossem acaso do povo. Mas ha dois partidos, disse o illustre Deputado o Sr. Moura na passada sessão, uma favor de Manoel Pedro, e outro a favor de Madeira; e por tanto he necessário mandarem-se tropas heterogéneas para accommodar as dissensões. Mas que tropas são essas ? São acaso de Chins ? Não são europeas ? Não he natural que tomem a parte dos europeos? Não seria antes melhor o remover aquellas que ali se achão ? Parece que a prudencia assim o recommenda. Sr. Presidente, torno a dizer, esta medida póde ser funestissima: só a noticia della vai dar reba-

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te a todas aquellas provincias: zelosas da sua liberdade não podem ouvir já, sem sobresalto, o mais innocente tinir de ferros. Eu pois, eu que desejo cordialmente a união de toda a familia portugueza, altamente declaro, que me opponho, e me opporei sempre a que se mandem tropas, pois receio que pela voz da desesperação sôe o grito do maior de todos os malas, mal funestissimo para o Brazil, mal terribilissimo para Portugal, o da guerra, o da separação.
O Sr. Serpa Machado:- A gravidade da materia exige que eu faça algumas reflexões sobre ella, para enunciar a minha opinião, mas antes de mais nada, será preciso contrahir a questão aos seus devidos termos. A questão principal reduz-se a paralizar a acção do Governo, que trata de dar providencias sobre a segurança das provincias do Ultramar. A indicação não nega ao Governo a sua autoridade, só sim se trata de que o corpo legislativo a paralise, intromettendo-se a cohibir esta acção do Governo. Falarei pois pela primeira vez sobre esta materia tão grave; receio porém enfraquecer os argumentos, que se tem produzido em favor da minha mesma opinião, repetindo-os com menos elegancia. Limitar-me-hei a breves observações. Os ultimos acontecimentos da Bahia, de Pernambuco, e do Rio, tem excitado a indignação de muitos; porém em mim tem produzido um sentimento contrario, e he o da compaixão. Ha muito que eu me condôo da arriscada situação do Brazil, e de seus habitantes; elles se achão pendentes sobre dais espantosos abismos; e toda a questão se reduz a decidir, se devemos ser indifferentes, e frios espectadores das suas desgraças, e do seu perigo, ou se lhe devemos offerecer um pronto soccorro, e uma bemfazeja mão, que os salve dos desastres que os ameação. Porém este auxilio deverá ser empregado com tanta habilidade, que os allucinados Americanos se não assustem com elle, e se não pricipitem anticipadamente nesses horriveis abismos, de que os queremos livrar. O primeiro, e o mais proximo, se acha dolosamente coberto com ramos de flores, que são os da sonhada, e muito verde independencia; porém se lhe tiramos estas apparentes flores, encontramos dentro deste abismo os horrores da anarquia, e da discordia civil; lá apparece o pacifico habitante da Bahia, cravando o punhal no seu irmão de Pernambuco, ou do Rio; o escravo esquecido dos beneficios que deveu ao seu senhor, que o educou, que o alimenta, mancha nelle suas mãos homicidas; não
se ouvem nesta horrosa confuzão mais que gemidos de mil victimas innocentes, que mutuamente se vão sacrificando á ambição, á vingança, e ás mais baixas paixões de poucos. As entranhas ainda palpitantes, e o sangue ainda quente de tantos infelizes exala um fumo tão espesso destas terriveis cavernas, que não nos deixa mais ver todas as crueldades, todos os horrores de que he capaz o coração humano na agitação da desconfiança, do temor, e dos perigos. Não muito distante está outro abismo, e não menos horroso, e nelle se occulta a cobiçosa ambição das nações europeas, que cada uma conta ter nas ricas possessões do Brazil uma quinta, que lhe sirva de utilidade e de recreio. Lembra-me applicar ao vasto
Reino do Brazil, quando for dilacerado pela guerra civil, o que um sabio escriptor disse do imperio romano, quando foi invadido pelos barbaros do Norte: era um cadaver, cujos membros corrompidos, se achavão espalhados pelas vastas regiões do mundo, e com seus putridos miasmas attraíão a ferocidade dos abutres, que cruelmente se lançárão sobre elles para destruilos. Esta será a fatal sorte, que espera o Brazil, se lhe não acudir-mos com uma força respeitavel, não para a conquista, porque os irmãos auxilião-se, e não se vexão; mas para se manter a ordem, e a tranquilidade; para se respeitarem as autoridades constituidas, e para em apoio destas se fazerem observar as leis: sem o que se não póde manter qualquer sociedade. He para admirar, que o vulgo de Portugal, que detido em apparencias, deveria como queixar-se de nós despovoarmos o Reino, assás sangrado na passada, e devastadora guerra, mandando tropas para o Ultramar, diminuindo a um tempo a nossa força, a nossa população, e a nossa riqueza com taes expedições, e levando a flor da mocidade portugueza além dos tropicos, a despeito dos pais, das mãis, e das espozas lacrimosas, que este vulgo aliàs pouco illustrado, se convencesse da necessidade deste sacrificio a bem da união, e da tranquilidade; e pelo contrario o vulgo do Brazil, que recebe nestas expedições, augmento de força, e de população, pois que estes soldados por lá ficão em grande parte, e lá desenvolvem sua industria e contrahem alianças; este vulgo, digo, que tudo lucra, e interessa, he tão exagerado em nos desviar de tão beneficas intenções, a desejos, chegando ao excesso de lançar veneno nestes mesmos auxilios. Por ventura mandamos nós ao Brazil tropas, que não estejão endurecidas na guerra, que não guardem a mais exacta disciplina. Não tem ellas obedecido aos seus commandantes, que digo, aos seus mais inferiores officiaes? Que ha a temer de uma tropa passiva, e obediente, de commandantes que não levão outras instrucções, que de manterem a tranquilidade, e fazerem respeitar as autoridades, e as leis? Concluo que a indicação deve ser rejeitada: primeiro porque tende a embaraçar o Governo nas suas operações: segundo porque não he conveniente embaraçalo quando vão tropas para o Brazil, a fim de manter ali a tranquilidade de que tanto se carece.
O Sr. Corrêa de Seabra: - A materia está assás discutida, e de mais; levanto-me porém para declarar a minha opinião. A minha opinião he que se suspenda a remessa da tropa até que se discuta o projecto das relações politicas; os motivos são: 1.º tratar-se nesse projecto essa materia: 2.° o estar persuadido que esta tropa que se quer mandar para a Bahia, que pelo seu pequeno numero não sei para que sirva, vai dar corpo ao ciume, e desconfiança que os Brazileiros tem de que o Congresso despoje o Brazil da cathegoria de Reino, e de que ali não haja uma delegação do Poder executivo, de que os facciosos habilmente se podem servir para pôr em convulsão todo o Brazil. Discuta-se o projecto, dê-se aos Brazileiros a certeza de que o Brazil ha de conservar a cathegoria de

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Reino, e o Brazil ficará perfeitamente tranquillo, e unido com Portugal. Antes de para aqui vir, procurei saber a opinião dos estudantes Americanos, sendo muitos os que agora frequentão a Universidade, e achei-os conformes nestas ideas: e na verdade era necessario que os Brazileiros fossem doidos varridos, para que tivessem vistas de se separarem de Portugal; porque o Brazil unido com Portugal, pôde ser a primeira Nação do mundo, e tem os elementos para isso; e separado e desunido actualmente o que he? Todavia no estado de desconfiança em que estão os Brazileiros, uma pequena coisa pôde produzir grandes e incalculáveis effeitos. Eu comparo o Brazil ás províncias unidas que não pretendião separar-se da Hespanha, mas a imprudência de Fillipe II lembrou, e deu occasião á separação. Evitemos que nos aconteça o mesmo: discuta-se o projecto, estabeleção-se as relações politicas, e então o Governo melhor tomará em consideração se convém para a segurança interna e externa que em algum ponto ou pontos haja alguma força, e se esta deve ser marítima ou terrestre; e estou certo que os mesmos Brazileiros em não tendo motivos de ciúme hão de pedir tropa se for necessaria. Concluo este discurso com um dito de um homem cêlebre; o Brasil está na razão de um moço robusto, vigoroso, forte, na idade da adolescencia em que a direcção com força física póde ser perigosa, e a de força moral he sempre util e proveitosa. Resta-me ainda fazer uma breve reflexão sobre o que se tem dito, que este negocio he inteiramente da competencia do Governo, e não pertence ás Cortes. He verdade que a distribuição da força militar pertence ao Governo, mas este negocio não pode deixar de se olhar como politico, porque pode trazer com sigo a separação, ou desunião do Brazil, ou de algumas provincias; e por consequencia he da competência das Cortes.
O Sr. Ferreira da Silva: - Pelas bases da Constituição he verdade pertence ao Governo a disposição da força armada. Porem vi neste Congresso que em 10 de Outubro o Sr. Borges Carneiro foi o mesmo que fez uma indicação para que fosse tropa para Pernambuco. Parece que neste tempo devião estar mais recentes as idéas das bases. Quando cheguei aqui vi que estas altribuições forão entendidas de um modo tal que considerava que o Congresso se achava com autoridade de determinar a força armada para o Brazil; por isso se naquelle tempo as bases da Constituição estavão ainda tão recentes na memória, e se tomou uma medida desta natureza, parece-me que hoje devem militar as mesmas razões. Os meus illustres collegas já ontem apresentarão bastantes razões sobre a necessidade da presente indicação, he escusado eu dizer mais. Agora só reflectirei sobre um ponto. Vamos a ver as causas das desordens, intrigas, e perturbações que tem havido no Brazil. Desde o Amazonas até ao Rio da Prata vamos a ver quaes são as provincias onde tem havido desordens. Principiemos pelo Pará. Ella foi a primeira província do Brazil que adheriu ao systema constitucional, ella por si participou ao Congresso que queria adaptar o systema constituicional; depois que o adoptou não não tem apparecido estas intrigas; e pergunto: tem lá estado tropa de Portugal? Vamos ao Maranhão. O Maranhão adoptou a Constituição de Portugal, não tem havido lá estas desordens; e tem lá havido tropa de Portugal? Não. No Ceará não he o mesmo ? Vamos ao Rio Grande do Sul. Vamos a Pernambuco. Que he que tem havido! Rivalidades, desordens, e mortes. Eu quando cheguei aqui a 29 de Agosto, a primeira coisa que disse foi que se retirasse a tropa. Eu não digo que a tropa de Portugal seja despótica e arbitraria, mas o que digo he, que no Brazil existem as mesmas facções contra a Constituição que existem em Portugal. Ha interesse que excita o despotismo: removeu-se a tropa de Portugal que estava em Pernambuco, foi removido o general que a commandava, o que se viu em Pernambuco desde Outubro ate 24 de Dezembro? A maior tranquillidade possivel. Chegou em 24 de Dezembro nova tropa, começarão novas perturbações , desordens, mortes, choques do povo contra povo, tropa contra tropa. Saíu esta tropa, desde o dia 8 para cá tem existido tranquillidade. Vamos á Bahia. A Bahia pediu tropas, mas porque? Porque temeu que os de Pernambuco fossem contra a Bahia. No Rio de Janeiro tem havido tropa, e porque lá a tem havido, he que tem havido estas desordens. O vulgo de Portugal alegrasse com a ida da tropa, julga que ella he necessária, eu lhe dou os parabens de ter mais conhecimentos do que todos os Deputados do Brazil. Faço só estas reflexões ao soberano Congresso, para que elle veja que em toda a parte onde tem havido tropa, tem havido estas desordens.
O Sr. Soares Franco: - Parece que não havia hoje aqui senào uma questão, que era o saber o destino da indicação, isto he, te devia impedir-se o Governo de mandar tropas para a Bahia. Mas tem se abusado disto, e tem-se tratado já se se deve mandar ou não esta tropa. Tratarei de ambas estas cousas , e antes disso sou de parecer que se trate de declarar ao Brazil os seus direitos. Isso pôde dizer-se ao mesmo tempo que se decidir este negocio. Trata-se pois de ver se compete ou não ao Governo o mandar esta tropa; creio que isto não póde entrar em duvida não só pelas bases da Constituição, mas por todos os princípios que já estão jurados no artigo 36 que ao Governo pertence a disposição da força armada: e até mesmo a tropa do Rio de Janeiro foi mandada sair, e o Príncipe autorisou-se para este fim com as bases da Constituição. E então um delegado do poder executivo tem autoridade de mandar sair a tropa, e havemos negar esta mesma autoridade ao poder executivo ? As tropas sairão, porque assim o mandou uma autoridade legitima , e sairão , porque não tinhão outras ordens; mas nunca se diga que sairão de lá com medo, ou receio. A justiça pede que se dê obediência ás autoridades. Este artigo das bases regulou sempre para cá, e para lá. Diz-se que em Outubro se fez uma indicação para irem tropas para Pernambuco: he verdade; mas esta indicação foi rejeitada. Em consequência nada ha que tire ao Governo a plenitude do seu poder, e a este respeito nada mais tenho a dizer. Mas se o Governo tem autoridade para mandar tropas para o Brazil, será necessario que el

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le as mande? Qual he a razão por que um governo manda tropas para um paiz qualquer? Não he para a sua segurança! Sem duvida. Mas diz-se: ha receio que esta tropa faça mal. Pois o governo chamou para Lisboa alguns cinco batalhões das provincias, o povo não se queixou; e ha de queixar-se a Bahia? Que importa ao povo um batalhão, ou dois, ou tres, que estão nos seus quarteis, que não dão leis, e que são governados por uma autoridade? Pois a tropa não he um corpo pacifico? Que mal póde ella fazer? Mandou o Governo dois batalhões para o Porto, o Porto não se queixou, e então, torno a dizer, ha de agora queixar-se a Bahia? Que mal faz ao povo da Bahia que vá para ali tropa? Allega-se que o povo do Brazil aborrece tropas de Portugal; he necessario examinar se isto provém dos povos, ou do algum principio dominante. Ao povo não lhe importa que para alí vá um batalhão, ou dois, porque, como disse, não tem nada a temer de um corpo passivo, que não póde fazer mais do que aquillo que a autoridade civil e popular lhe ordenar. Logo a opposição ás tropas de Portugal deve ter outro principio. São infinitas as cartas que attestão que os homem ricos, os lavradores, e negociantes querem a Constituirão, e união com Portugal; mas que ha um principio de ambição e exaltação pela independencia. A camara do Rio de Janeiro disse ao Principe, que se elle viesse para cá, teria lugar a independencia. Um navio francez disse, que os Portugueses não poderião alí desembarcar, porque se desembarcassem serião insultados. Muitos negociantes tem vindo de Pernambuco, e tem dito, que vierão de lá, porque de lá estivessem serião assassinados; e deixaremos que isto assim prosiga até que não seja possivel remedialo? Ha de a Nação portugueza soffrer tudo isto com a cabeça reclinada? Homens que tem levado as suas armas ate ás margens do Garona, hão de soffrer tudo isto? Certamente não. O Congresso tem mostrado ao Brazil os maiores principios de liberalidade, e já se disse que os Srs. Deputados do Brazil fizessem um plano do que querião, para curar as desconfianças que os povos do Brazil tem do Congresso; Pará, Maranhão, ficão muito ao Norte, e os seus interesses ligão-se muito com os de Portugal. Já não he assim do Rio de Janeiro. Nós devemos usar de todos os meios doces e suaves para apertar com vinculos fortes o Brazil; mas o Brazil deve sujeitar-se ao que nós mandarmos, aliàs não teremos união senão em palavras. A tropa não vai para sujeitar o Brazil; vai para segurar os fundos dos negociantes honrados, segurar os cidadãos pacificos, que ali tem os seus fundos para que os não possão perder. Qual he a marcha do Governo representativo? He o ter um Monarca a que se chama Governo executivo, a fim de executar as determinações do corpo legislativo. Qual he o vinculo que liga estes dois poderes? He quando um executa o melhor, e o outro legisla o melhor. Lembrou-se aqui ontem a expedição de Walcherne. Que fizerão os ministros de Inglaterra? Determinárão uma expedição. Fez-se ella, ou não se fez? Fez-se sem duvida. O máo tempo fez que morresse uma grande; parte da expedição ingleza; mas a expedição fez-se, e a conta pediu-se aos ministros depois de a haverem executado. E então quer o poder legislativo embaraçar as medidas do Governo antes de elle acabar o que pretende começar? Isto he querer tomar sobre si a responsabilidade do acontecimento. Mas, diz-se: a cousa está em duvida; uns dizem que sim; outros que não: obra-se melhor, decidindo o Governo e as Cortes; mas eu não quero sobre mim esta responsabilidade, ainda que isto seja uma cousa tão pequena, que de sua natureza não póde resultar nada. Na Bahia está arreigado o systema constitucional, o Governo manda para ali as tropas por fins que a elle lhe não serão occultos; por isso digo, que não nos devemos oppor, que a cousa deve marchar como está, e que se estas medidas tiverem más consequencias, se poderá pedir ao Governo a razão por que assim procedeu. Não se tolha por tanto ao Governo esta marcha: o contrario será tomarmos sobre nós a responsabilidade que deve recair sobre o ministerio.
O Sr. Trigoso: - Sr. Presidente: ainda agora, depois de ter continuado a discussão que ontem havia começado, dois honrados Membros quizerão chamala ao verdadeiro estado da questão, e disserão que não se tratava aqui de maneira alguma da conveniencia, ou desconveniencia de se mandarem tropas para o Brazil, mas que se tratava unicamente de decidir, se a indicação dos honrados Membros, devia ou não passar: e esta indicação reduz-se a saber, se deve obstar-se a que o Governo mande seiscentos homens para a Bahia. Depois disto approvado, outros honrados Membros continuárão a metter-se na questão geral de politica, se devião ou não mandar-se tropas para o Brazil; em consequencia tinha eu pedido a palavra para ver se chamava outra vez a questão aos seus verdadeiros limites. Não tratamos, nem podemos tratar no presente lugar, da questão, se devem ou não remetter-se tropas para o Brazil. Esta questão depende de conhecimentos particulares das differentes provincias para onde sequer mandar tropa, e da differente quantidade de tropa que se quer mandar; esta questão depende de conhecimentos locaes que pela variedade do tempo tem sido muito varios, e muito inconstantes. Eu como Deputado, e como Membro da Commissão especial, que trata dos negocios do Brazil, tenho seguido opiniões muito differentes a este respeito; e ainda não me atrevo a dizer, que a opinião em que estou, seja aquella que eu hei de seguir para o futuro. Não temos pois um thema sobre que discorramos, porque o unico thema que poderiamos ter, que erão os trabalhos preparados pela Commissão dos negocios politicos do Brazil, estes não estão postos em discussão; e em consequencia não posso deffender os pareceres da Commissão, senão reduzindo-os ás mesmas hypotheses em que a Commissão os apresentou, e nunca considerando-os em these: eis pois a razão pela qual cuido, que seria cousa perigosa e inutil suscitar a questão, se deve remetter-se tropa para o Brasil. Passo pois á segunda parte da questão, que cuido que he a unica, sobre se deve passar a indicação, no qual os illustres Deputados da Bahia são de opinião, que se obste a que o Governo mande tropa para e Bahia. Tratando desta questão primeira, isolada de todas as outras questões, tento da remessa de tropa para o Bra-

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zil em geral, como da remessa de tropas para uma das provincias em particular, voto contra o indicação, e para o fazer funde-me nos seguintes razões. 1.ª Que não posso obstar a uma medida do Governo, senão quando vejo, que ella, ou he contraria ao systema constitucional que temos adoptado, ou quando vejo que ella he evidentemente opposta ao bem e felicidade publica. Esta medida não he contra o systema constitucional que temos adoptado, nem o Governo obra directamente contra as leis sanccionadas neste Congresso; em segundo lugar não vejo que esta medida seja opposta a utilidade publica. Que ella não he contraria ao systema e leis deste Congresso, parece facil de provar. Quando o Governo quiz mandar pela primeira vez tropas para o Rio de Janeiro, pediu a autorização deste Congresso, então sé disputou aqui muito esta questão, e por fim sé resolveu que fossem as tropas. Quando depois apparecêrâo sublevações particulares na provincia de Pernambuco, já sem iniciativa do Governo, suscitou-se aqui a questão se se devião mandar tropas para Pernambuco, e depois de se discutir muito tempo, decidiu-se que ao Governo pertencia manter a sua autoridade, e o socego publico nas diversas provincias, e que em consequencia estava autorizado para mandar para ali, não todas as tropas que quizesse, mas aquelles destacamentos necessarios unicamente para manter o socego, e obediencia. He verdade que passado tempo, a Commissão especial dos negocios politicos do Brazil, ainda que não diz claramente uma opinião contraria, deixou prever os grandes perigos e inconvenientes que havia em a remessa indiscreta de tropas para o Brazil, mas estes pareceres da Commissão especial, que não erão applicaveis, como logo mostrarei, no estado da presente questão, são puramente pareceres de uma Commissão, elles não forão discutidos, nem sanccionados pelo Congresso, e por isso não póde o Governo ser obrigado a decidir em conformidade delles; obra pois o Governo em consequencia das bases da Constituição, e em virtude de uma decisão particular do Congresso, que mandou remetter mais tropas para o Brazil, decisão que não foi revogada, apesar do parecer que tem dado a Commissão especial; e por tanto não excede nisto as raias do systema constitucional, nem vai em opposição ás ordens das Cortes, e eu como Deputado de Cortes, não posso obstar a que o Governo use das suas faculdades, e dos directos, e obrigações que lhe são impostas.
Não duvido que algumas vezes, o Congresso tenha querido obstar a uma ordem do Governo nas cousas da sua competencia, mas nestes casos não me lembra que tenha adoptado a minha opinião, e talvez mesmo se o fez, não tem feito bem, mas nesta
Questão de que depende a união dos dois mundos, nesta questão que vai a ser importantissima, não desejo offender os direitos de um corpo constituido no Estado, nem me julgo autorisado para obstar ás suas decisões quando julgo que ellas são justas, e legitimas. Mas eu seria obrigado a obstar a que o Governo mando esta tropa, quando elle a pezar de obrar legalmente, obrasse contra a utilidade publica; porém esta evidencia não tenho eu. Eu tenho visto segundo o exame de papeis remettidos das provincias do Brazil que era muito perigoso conservar tropas nestas differentes provincias, mas eu não disse, nem a Commissão diz, que o Governo fosse inhibido de conservar estas tropas. Estão impressos, e falão por mim os relatorios da Commissão, sobre as provincias de Pernambuco, e Rio de Janeiro; em consequencia não me parece evidente que a estada de tropas na Bahia seja contraria á utilidade publica. Tenho ainda outro argumento, e vem a ser, que quando julguei que não era conveniente a estada de tropas em Pernambuco, tinha examinado todas as razões, pro, e contra a estada destas tropas. Isto he o que não acontece a respeito da Bahia. Estes papeis forão remettidos, ao Governo, e ainda que aqui ficassem copias, a Commissão não prevendo estas discussões não tem visto citei papeis, e eu como Deputado não posso arriscar a minha opinião sobre este objecto: por isso não sabendo quaes as razões particulares que póde haver para mandar, ou não mandar tropa, e não tendo visto as razões em contrario, não posso suppor que seja contra a utilidade publica a remessa de tropas. Segue-se que não posso obstar á operação do Governo, que quer remetter esta tropa. Resta agora uma questão de prudencia, e vem a ser, se suppostos as circunstancias particulares da provincia da Bahia, e os funestos acontecimentos que occorrêrão entre o exercito de Portugal, e o do Brazil, será conveniente remetter tropa para á provincia da Bahia: as razões que ha a favor, não sei eu; o Governo he que sabe as razões pro e contra; o Governo he que sabe o que vem a ser a indisposição das tropas do Brazil contra as de Portugal, indisposição que tem produzido funestos effeitos. Pertence pois á prudencia do Governo examinar e pezar estas razões, e examinar sé he conveniente mandar tropas para o Brazil, e gozar nesta occasião e para aquella provincia em particular, da faculdade geral que lhe compete pelas bases, e por um decreto deste Congresso. Não direi por tanto, qual a minha opinião, nem a posso dizer, porque confesso que não examinei com attenção as circunstancias particulares da Bahia, e ainda quando o soubesse, eu me absteria de dar o meu voto. Eu não dou conselhos ao Governo, eu não estou em contacto com pessoa alguma do Poder executivo; em quanto este marchar pelos caminhos constitucionaes, não posso oppor-me de maneira alguma ás suas determinações. Concluo este meu discurso com duas reflexões; uma relativa a este Congresso, outra que eu desejaria chegasse aos ouvidos do Governo. Se elle julga na sua sabedoria que devem remetter-se tropas para a Bahia, auxilie o Congresso esta operação do Governo, e vem a ser este auxilio, o approvar os artigos que a Commissão especial tem proposto, se o Congresso os julgar convenientes para tirar todo o genero de desconfiança aos brazileiros; para que se não diga que o Congresso não sómente não obstou á remessa da tropa, mas que tendo reconhecido por uma commissão, que havia agravamentos das provincias do Brazil, e tendo-se-lhe proposto os meios de os remediar, não quer discutir os artigos propostos. A segunda cousa que eu queria fosse aos ouvidos do Governo, he o seguinte: que o Com-

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gresso deseja ter uma certeza da prudencia com que o Governo procedeu, em um passe tão importante, e complicado; e por isso desejaria saber qual he o ministro que toma a si esta responsabilidade; e se o Governo ouviu ou não o conselho de Estado. Deste modo vinha eu a ter maior certeza moral do que tenho actualmente, de que elle procedeu com circunspecção, e vinha a fazer com que o Congresso auxilie esta operação do Governo.
O Sr. Andrada: - Sr. Presidente: os exemplos bons ou máos são contagiosos. Um nobre Deputado introduziu as prefações; tambem farei a minha, na qual consigne algumas declarações, que julgo precisas. 1.° Declaro á face da nação inteira, que ouviu este nobre Deputado arrogar-se superioridade em liberalismo, aos Deputados do Brazil, que eu Deputado do Brazil contesto-lhe similhante superioridade em liberalismo aos Deputados do Brazil, e como he licito a cada um dizer de si o que lhe bem parece, affirmo que em amor da patria e da liberdade sou, se não superior, ao menos igual ao nobre Deputado, e creio que todos os mais Srs. Deputados do Brazil lhe não cedem o passo a este respeito. Por nossas obras, e não por nossas palavras he que havemos de ser julgados pela posteridade. 2.º Declaro em nome do Brazil inteiro, que renunciamos a desdenhosa honra, que nos fez o nobre Deputado acreditando-nos em valor e coragem pela qualidade da origem. O nobre Deputado não póde certamente honrar-nos, nem fazer-nos que sejamos o que não formos: a historia, esse archivo dos nossos feitos he que nos apresenta ao mundo como filhos verdadeiros dos Portuguezes; e a opinião particular do nobre Deputado não entra em conta para decidir o juizo publico, menos ainda como favor, de que não precisamos, e que dignamente desprezamos. 3.º Declaro que o Brasil não está em estado de temer as fatuas ameaças, com que pretendeu intimidalo o Sr. Borges Carneiro; para cães de fila, ha lá em abundancia pão, ferro, e bala; nem podem assustar-nos cães de fila, a quem fizerão fugir dentadas de simples cães gozos.... (O Orador foi interrompido um momento pelo sussurro das gallerias, e depois proseguiu dizendo) Eu não sei quem tenha pela lei a ousadia de perturbar-me. Os cidadãos das tribunas devem saber, que Reis quando elegem os seus representantes, suo neste lugar subditos: aqui cumpre-lhes todo o socego: escutar, e calar.
Tornando á questão, declaro que trato com todo o devido desprezo a maliciosa asserção que podia caír sobre os Deputados do Brazil, attendendo-se ás palavras de outro nobre Deputado, que parecião implica-los como agentes de facciosos; similhantes injurias podião retorquir-se com vantagem; mas eu creio, que o que ha de equivoco nas expressões não provem de intenção, mas antes da impropriedade na escolha dos termos, e da falta de exactidão na classificação das idéas e dos seus sinaes. Tendo acabado as minhas declarações entrarei em materia, seguindo passo a passo o Sr. Moura na sua profissão de fé politica, que já debati em outra sessão, e no exame dos factos, em que fundou a necessidade da remessa de tropas. Vamos aos 4 pontos de fé do dito illustre Deputado. Quanto ao 1.° confessei que os que cá estavamos não podiamos duvidar da boa fé do Congresso, nem crer que elle tivesse a sinistra lembrança de restabelecer no Brazil o systema colonial: o Congresso tem muito atilamento para não perceber a impossibilidade de similhante projecto. Mas o povo do Brazil distante do centro de acção, desconfiado, como he todo o povo novamente resgatado, e pouco illustrado para conceber, que a impolitica da medida, bastava para seu abandono perante uma assembléa illuminada, teme e desconfia que a utilidade apparente illuda o Congresso, e sobjugue as razões de honestidade que a desaconselhão. Não tem o Brazil razão; mas como capacitalo das injustiças das suas desconfianças? Certo com obras de pura e leal reciprocidade, de perfeita igualdade e de amorosa fraternidade. E tem feito isto o Congresso? He desgraçadamente o que me não parece. Mas como duvidar das intenções do Congresso, diz o Sr. Moura, ávista das bases da Constituição? Muito bem, respondo eu: o illustre Deputado bem conhece, que principios solemnemente proclamados são muitas vezes abandonados ávista de interesses desvairados; e que muitas vezes não são esses principios os que regem a conducta dos povos. E se factos posteriores parecem desmentilos, maior deve ser o azedume naquelles, que presenciárão a solemnidade das protestações assim falseadas. Infelizmente os decretos da organização das juntas provisorias do Brazil, da remoção do Principe Regente daquelle reino, e da abolição de todos os tribunaes, instaurando de alguma maneira, e ainda com mais rigor o antigo systema de dependencia colonial, antolhárão-se aos povos do Brazil, como formal renuncia aos principios exarados nas bases; e tanto mais odiosa se reputou a sua quebra, quanto mais solemne foi a sua proclamação. Não he pois inconsequencia naquelle reino o desgosto, que ora mostra: elle he nascido da sua situação peculiar, que lhe não permitte ver-nos taes, quaes realmente somos. 2.º Atacou o nobre Preopinante a minha opinião em quanto ao direito de insurreição, que reconheci no povo, circunscrevendo-o o nobre Preopinante sómente á maioria, e negando-o á minoridade e ao individuo; bem que elle o repute absurdo, sou por desgraça minha tão difficil de convencer, que ainda teimo pertinazmente no que disse. Creio, e até agora não tive razão alguma para duvidar, que a todo o individuo compete o direito de resistir ás ordens emittidas contra a prohibição da lei; isto he o que reconhecem todas as nações livres; isto he o que reconheceu a Inglaterra na sua posição de direitos; e esta he a doutrina constante dos Delolmes, e Blackstones, e outros politicos: isto he o que praticou um Hambden, e outros cidadãos livres nos tempos de Carlos I. Mas da resistencia á conspiração para derribar o Governo vai muito grande intervallo. O individuo póde resistir, mas não tem direito de derribar o Governo, que determina injustamente porque não depende delle só a erecção deste Governo: á nação inteira ou ao menos á maioridade he que cumpro destruir a feitura de suas mãos. Estos principios parecem-me ainda inabalaveis apezar da opinião do illus-

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tre Preopinante. 3.º Concordei, que a união dos dous reinos lhes he mutuamente útil. Confesso, que não he preciso pezar ouro e fio as vantagens de cada um; creio que se o fizéssemos, ver-se-hia claramente quanto são pezados os sacraficios que faz o Brazil, e quanto inferiores são em retorno as vantagens, que dahi lhe vem. 4.° Confessei já que o Congresso senão tinha arredado das máximas que apregoara, em tudo que para o Brazil legislara; mas deve entender-se tão somente quanto ás suas intenções, pois que quanto aos effeitos he impossível negar-se que a formação das junta» provisórias, não podesse produzir como produziu já, dissensões nas províncias, e que similhante legislação não seja um desvio da justiça, que aconselha inteira igualdade entre os dous reinos, e repelle ainda as ciais remotas desconfianças de divisão para dominar. Igual censura pôde cair sobre a remoção do Príncipe Real, e abolição dos tribunaes, instaurando-se a aborrecida dependência de Portugal rio exercício da justiça distributiva, e attributiva. Estes actos legislativos, e a remessa de tropas, não erão feitos para roborar no Brazil a crença na boa fé do Congresso , antes para firmar a opinião em contrario. E como agora será prudente repelir o que já vemos Linha azedado o Brazil inteiro? He, diz o illustre Preopinante o Sr. Moura, porque existião ali: 1.º espirito de independência: 2.º rebellião: 3.º anarquia. Quanto á independencia, no meu anterior discurso mostrei que só podia existir em uma ou outra cabeça exaltada, e que por isso não se exigião forças, que a reprimissem; que não havia partido apparente, chefes, e sequazes. Diz-se porém que as cartas do Brazil o affianção; mas de quem são essas cartas ï São dos portuguezes europeos, em quem o temor erige em realidades fantasmas, puras creaturas da sua imaginação; são dos portuguezes europeos, a quem a inimizade impeliu a macular com o ferrete de independentes aos seus irmãos do Brazil, só porque não querem mansamente acquiescer á sua injusta superioridade. E vindo de l ao impuras fontes, como o ódio, e o temor, merecem credito algum asserções tão gratuitas? Mas, replica o nobre Deputado, o senado da camará do Rio de Janeiro, e S. A. R. também o affirmão. Respondo: affirmão sem exporem os motivos da sua asserção, e tanto basta para valerem pouco as suas affirmações. Demais, o senado tinha de mover o Príncipe Real a ficar no Brazil, e para isto podia julgar toda a astúcia permittida; engrandecer o perigo da retirada pela existência de um systema de independência, em que talvez ninguém seriamente cuidava, podia contribuir muito para a resolução de S. A. R, Que espanto pois que quizessem coadjuvar a força das suas razoes com o natural susto em taes occasiões? S. A. R. tom a melhor fé domundo, podia capacitar-se daquillo que não existia; não são os Príncipes, em regra, os melhores críticos. A questão resolve-se a isto. São sufficientes provas de um espirito de independência no Brazil meras asserções destituídas do abono de um só facto, de que se elle possa deduzir? Teimo que não. A respeito da rebellião ficou em todo o seu vigor o meu argumento no precedente discurso dos actos da junta de S. Paulo, e dos dá junta de Goyanna, não se deprehende rebellião, visto o seu reconhecimento dá legitimidade do poder do Congresso; ninguém nos disputa o poder, nega-se somente a justiça, e prudência das medidas tomadas por nós, e por isso se não executão, em quanto melhor informados não as revogamos, attenta a sua tendencia perigosa, e os males, que resullarião da sua pontual execução. He verdade que a opposição exprime-se indecorosa mente, e arreda-se dos caminhos constitucionaes; mas deve reflectir-se que na fermentação das paixões, na passagem perigosa da escravidão á liberdade, he descupavel a exageração, quando ella mira aos grande objecto da liberdade dos povos, e vem somente da má direcção de uma louvável energia; nem pôde quadrar o epitheto de infame a Uma junta, que mesmo violando a lei não o faz com baixeza e cobardia; os crimes cuja commissão exige força d'alma, jamais forão qualificados de infames. Se não ha rebellião no Brazil, menos ha anarquia; a maquina do Governo move-se regularmente, acontecem alguns factos, que violão a paz de alguns individuos, porem isto jamais teve o nome de anarquia. Se qualquer ataque feito a um ou outro indivíduo provasse convulsão anárquica, também estaria anárquico Portugal, onde se repelem actos desta natureza. Eu hão concebo anarquia senão quando a força publica não basta para cohibir as violências particulares, isto he o que não succede no Brazil, e o que ninguém dirá com sinceridade. Pouco importa que os periódicos impressos no Rio de Janeiro tenhão seu ressaibo á licença, não são por isso anárquicos; mas demos que o fossem, nem por isso segue-se que lá falta força para cohibir-lhes a licença , o que falta He lei, que regule a força. Os culpados somos nós, que não temos ainda creado no Brazil o tribunal que vigie sobre os abusos da liberdade da imprensa. Se o Governo procedesse sem lei, contra os livros sediciosos, taxalo-hião de certo de arbitrário e inconstitucional. Se pois não existe nenhum dos males, que se quer que as tropas vão cohibir ao Brazil, que deve pensar-se do motivo verdadeiro de semelhante remessa ? Não he natural, que os Brazileiros a encarem como principio do desenvolvimento de um systema oppressivo, mascarado com palavras assucuradas de amor e união ? Os motivos adegados desapparecem, e como se não obra sem razão, algum outro he mister que exista; e qual elle seja, a natureza das medidas o apregoa. Assim arrazoão os Brazileiros: enganão-se, mas para desenganalos he máo expediente teimar no mesmo que produziu o mal. Mas, diz outro illustre Deputado o Sr. Serpa, o Brazil está entre dois abysmos, se lhe não valemos, elle precipita-se na independência, que embora lhe a p pareça coberta de flores na superfície, tem no fundo lagrimas e gemidos; louvo a ternura de Portugal, mas custa-me a conhecela, quando rodeada de bayonetas; confesso que o Brazil está por desdita nossa e injustiça alheia entre dois abysmos, a independência, na escravidão, e que lhe não parece possível a escapula de um sem cair no outro; mas he caridade do irmão empurralo nós mesmos n'um destes abysmos? Deixemo-lo ás suas proprios forres, e fico que vingará de um salto um e outro. Pará que por nossas impruden-

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tes medidas persuadilo, que só em uma arriscada independencia póde achar a segura isempção da temida escravidão, que presume lhe destinamos? Que? Clama o Sr. Serpa, deixaremos, que como outrora os Barbaros vierão cevar-se no cadaver do imperio romano, venhão tambem agora os estrangeiros dilacerar a integridade do Brazil enfraquecido por suas divisões? Misera comparação! Que ha de commum entre um estado adolescente, que ha pouco saíu da infancia, e que brilha de saude, com outro decrepito, enregelado pelo frio da idade, enervado pelos vicios, e que se esmigalharia ao menor toque? Se comparações não são argumentos valiosos, muito menos o são quando não ha a menor analogia entre os objectos comparados. Não he de um bom pai de familias, diz o Sr. Serpa, deixar entregue a si um filho, que certo arruinar-se-ha sem o soccorro paternal. Convenho, mas póde dizer-se pai de familias aquelle, cujas obras e feitos patenteão antes um duro oppressor! He de pai forçar por seu desamor o filho a desesperar, e aproveitar-se da desesperação que causou, para tornar mais pezado o jugo, que já custava a tolerar? Se a affeição parental de Portugal não tem outros orgãos, que soldadesca insolente, he bem dispensavel a sua solicitude! Antes do seu importuno intromettimento, viria o Brazil tranquillo; antes da chegada das tropas auxiliadoras de Portugal, não havia uma só provuncia do Brazil, que estivesse inquieta; as desordens e os crimes são fructos que lhe trouxerão as hostes lusitanas. Dizem porém os nobres Deputados de Portugal, não vão senão manter as leis, são disciplinadas, e não podem pertubar a paz dos Brazileiros seus irmãos. Doces e sonoras palavras são as de amizade, e fraternidade, mas não passão quasi sempre de meros sons: soldados são inimigos do cidadão pacifico, e muito mais quando o cidadão se lhe tem tornado odioso pela desconfiança que os domina. Que devem esperar pois os Brazileiros de tropas, que nascidas n'outro hemisferio não tem entranhas; que se movão aos seus queixumes, e que antes illudidos por seducções perversas não vêm nelles senão inimigos encarniçados na sua perdição? Admira-se porém um illustre Deputado, que não pensem do mesmo modo as provincias de Portugal, como exempli gratia o Porto, para onde se tem enviado tropas, e não tem havido queixas. Rogo ao nobre Deputado queira reflectir, que uns são naturaes e parentes chegados, e outros mui remotos, e só ligados por laços muito mais frôxos; que uns não tem tido desavenças com a soldadesca, que se lhe envia, e que os outros achão-se em perfeita discordia com ella; em fim que uns tem os mesmos interesses, que os soldados, e os outros muito differentes. Mas se o povo de Lisboa, disse o Sr. Serpa, leva a bem a remessa das tropas, porque a ha de levar a mal o do Brazil? Porque ambos são coherentes, ambos vêm nas tropas instrumentos de vingança; aquelle a quem ellas servem nas suas paixões malevolas approva a medida; e o que soffre com dia, queixa-se. Mas supponho que se queixão sem razão os Brazileiros, não merece a attenção do medico prudente o estado de morbida sensibilidade em que se acha um doente? Só
um ignorante empyrico não attende a ella, e prescreve os mesmos remedios, que devem irritalo mais. Tenho mostrado que he impolitica a remessa de tropas para o Brazil, a qual além de tudo o que fica dito he contra o espirito de um Governo constitucional por substituir a violencia á persuasão, a qual deva proceder da boa opinião da justiça do dito Governo e não da força fysica, que esteja á sua disposição. Suscitou-se porém de novo a questão, se competia a este Congresso o ingerir-se em materias, que são attribuições do poder executivo. Já no meu anterior discurso respondi, que a autoridade concedida ao poder executivo, assim como todo o poder humano, levava comsigo inherente a condição de se pôr em uso para utilidade de quem a concedeu, e não para damno seu; isto reconheceu um illustre Deputado apezar das tergiversações em que embrulhou os seus raciocinios; e só escudou-se na ignorancia de se era ou não era util a dita remessa a Portugal; apezar de confessar-se ignorante todavia decidiu-se como se estivesse convencido da sua utilidade. Eu porém, que tenho convicção contraria, e a quem a consciencia diz, que a dita remessa he injusta e inconstitucional, não posso deixar de votar contra ella. Demais, não comprehendo como se perca de vista, que as presentes Cortes não são ordinarias, mas extraordinarias e constituintes, e que ellas podem e devem por necessidade fazer o que as outras não devem; e que da facto temo-nos ingerido em similhantes attribuições de pura execução; e que se agora o recusamos, faremos nascer suspeitas, que não a illegalidade da ingerencia, mas o nosso interesse mesquinho he quem nos torna assim circunspectos, e faz-nos recuar da inspecção em tudo igual a muitas outras que não temos temido tratar. Resta-me por fim reflectir sobre o indecente parallelo que fez o Sr. Pereira do Carmo entre a vida de um Brazileiro e o toque da ponta de um cabello de um Portuguez europeu; o nobre Deputado não pensou nas consequencias que se podem tirar das suas inconsideradas expressões, e quanto ellass são proprias para fazer germinar nas almas brazileiras iguaes sentimentos de injustiça, prezando tão pouco o sangue de um Portuguez europeu, como o mais leve toque do cabello de um Brazileiro; certo he este o meio de promover a amizade entre os naturaes dos dois reinos irmãos, vistas de que o nobre Deputado tanto alardeava, e que havia pessoas tão simples, que accreditavão! O que porém he mui louvavel he o patriotismo, com que o nobre Deputado sacrifica e offerece os seus bens para assolar o Brazil. Os seus nobres sentimentos tambem me aquecêrão, e seguro ao mundo, que quanto possuo, e quanto valho, estar prompto para repellir a injusta agressão contra o Brazil, de qualquer parte que ella venha.
O Sr. Freire: - Procurarei, quanto me for possivel, tocar o ponto da questão: não o poderei com tudo fazer com tanta brevidade quanto desejava, porque tenho ouvido argumentos, que apezar de respondidos, sempre farei algumas reflexões sobre elles, ainda que não venhão muito para a questão. Ha uma indicação dos Srs. Deputados da Bahia, em a qual se diz, que constando-lhes geralmente, que o Gover-

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no intenta mandar tropas para a Bahia, e parecendo aos Srs. Deputados que ha inconveniencia, e injustiça nesta medida, propõem que se diga ao Governo que sobreesteja em uma tal decisão. A questão pois unica e simples, que se offerecia, era approvar, ou reprovar esta indicação; entre tanto para que se approve, ou reprove, he preciso primeiramente tela debaixo de differentes pontos de vista, e que se examine: primeiro, se a deliberação, que o Governo tomou, está circunscripta na sua autoridade legitima: segundo, se existem circunstancias em que o corpo legislativo póde paralysar as operações do corpo executivo: terceiro, se he este um dos casos em que o poder legislativo póde paralysar a acção do corpo executivo. Na primeira questão direi a minha opinião, e he que o poder executivo, está plenamente autorisado para dispôr da força armada: he um principio reconhecido, e que não póde ser refutado, por nenhum dos iilustres Preopinantes. O Governo executivo, não só pelas bases da Constituição está autorizado para dispôr da força armada, mas de mais a mais porque houve uma ordem expressa deste Congresso, onde se determinou que á sua disposição ficava o poder empregar para o Ultramar a força que lhe parecesse; e de mais a mais ha aqui uma cousa muito particular, e mui notavel, que vem a ser, que a força que o Governo pretende mandar para a Bahia, he a mesma força, que já lhe foi permittido usar della como parecesse, he parte da expedição que sendo mandada para o Ultramar, voltou por um acaso; por isso pois que o Governo está autorisado a mandar esta força, por isso mesmo he que eu me opponho, a que passe a indicação. Eu não quero tomar sobre mim a responsabilidade que tem o Governo, e não sei, nem quero saber, o que pretende fazer com a expedição: mas se usar mal della, responda todas as vezes que for perguntado; assento que o Governo ha de ter tomado todos os conhecimentos necessarios sobre esta materia; e se o não fez, elle será responsavel pelo que obrar, sem que posta desculpar-se com ordens do Congresso. Postos estes principios, resta uma consideração, e he se não ha casos em que o poder legislativo, e principalmente as Cortes Extraordinarias, e Constituintes, possão ingerir-se nas attribuições do poder executivo? Sem duvida ha. Todos aquelles em que o Governo quizer attentar contra os principios constitucionaes, e ordem, e segurança publica; por exemplo, se o Governo fizesse ajuntar uma força armada junto das Cortes, sem ordem expressa, e proclamasse principios subversivos, esc., ou praticasse outra alguma acção, contra esta mesma segurança publica; mas por ventura, he este um dos casos em questão? He este um dos casos, em que a segurança publica exige que nos intromettamos em similhante medida? Eis-aqui a terceira parte do meu discurso, em que eu poderia deixar de falar, senão fosse preciso mostrar que a expedição tende a consolidar a união do Brazil a Portugal, e para isso não posso deixar de fazer profissão de meus principios politicos a respeito do Brazil, e de dar francamente a minha opinião com o intento de que ella he mais conveniente ao mesmo Brazil, embora a ignorancia, e a perversidade tenha querido fazer acreditar, que alguem pretende obrar directamente contra o Brasil, para promover a separação, e tornar impossivel em consequencia della a independencia de Portugal; pois eu protesto altamente que nunca consentirei que se diga que nós temos obrado em contraposição á felicidade do Brasil, e quando assim fosse, haveria erros de entendimento em algumas opiniões, e talvez nas minhas, mas não de coração, ou vontade: debalde se canção, torno a dizer, os perversos, ou ignorantes, que inclusão taes doutrinas. Fiz esta protestação politica, que eu julgo ser de absoluta necessidade, não porque me persuada que Portugal não seja um reino capaz de conservar a sua independencia, pois eu estou convencido que a sua ruina data do tempo de suas conquistas; enganão-se os que pensão de outra maneira, porque para assim pensar, he preciso hão terem lido a nossa historia. Portugal ha de ser independente, apesar de separado do Brazil; deixará embora de ser potencia de alta consideração, perderá grande parte da sua representação politica; mas tambem o Brazil ha de perder muito desta consideração. Que Portugal póde existir sem o Brazil, prova-se pelos reinados de muitos Affonsos, dos Sanchos, Diniz, João I., e II., e a experiencia montra tambem que uma colonia custa muito tornar-se independente, apezar dos grandes esforços que possa fazer; em consequencia he de utilidade geral que Portugal esteja unido ao Brazil, e de que tratamos he dos meios porque deve estreitasse esta união. Se estes meios são os de conservar sempre alí força armada, hão sei; por agora o que consta he que no Brazil existem alguns partidos tendentes na rebellião, anarquia, e independencia; não entrarei na analyse particular de cada um, para sustentar, ou defender esta opinião; todavia não podemos deixar da acreditar, não digo já, por cartas particulares, que em grande numero tem sido enviadas para Portugal, mas pelas participações de muitos commandantes, e muitas autoridades, entrando neste numero o mesmo Principe Regente, o qual n'uma de suas cartas, diz: ha um partido, que tende para a independencia, e o unico modo de suffocar este partido, he por meio de tropa, e para isso tem servido a divisão auxiliadora, divisão que achando-se bastantemente forte, era só capaz de conservar a ordem no Brazil; e diz mais alguma cousa. Por tanto para evitar estes partidos, e dar aos povos a liberdade de declarar a sua vontade, julgo que a tropa he necessaria; e duvidará alguem ainda que de facto existe este partido? Poderá duvidar-se que existem estas facções nó Brazil? Não he o Principe, que o disse antes de seduzido pelos cortezãos? Os mesmos nobres Membros, que dizem que estas tropas irão augmentar os partidos, são aquelles que reconhecem, pela sua mesma confissão, que com effeito existem partidos; quem he que póde duvidar, que no Brazil existe anarquia, ou em maior, ou menor extensão, quando vemos as convulsões da Bahia, e de outras provincias? De mais, o Governo sabe mui bem os motivos porque deve mandar a tropa: o que eu duvido he que esta basta; mas se o Governo reconhecer que se necessita mais, elle apresentará a sua opinião ao Congresso, só para este approvar [...]

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pezas que se houverem de fazer; he por tanto precisa a tropa, como único meio, não de escravisar, mas de livrar de dissensões o Brazil, e de comprimir qualquer partido. Como he possível que o Governo queira obrar de má fé, ou que na America alguém o acredite, quando isto se trata em publico? E será possivel que nós estejamos fazendo leis á face do mundo todo, para povos que não obedecem, he possível que os delegados do poder executivo, não executem as ordens que lhe são enviadas, e que nenhumas providencias tome o Governo, para se fazer respeitar ? Sem duvida he ponivel, o facto existe, e poderemos nós persuadir-nos que o povo do Brazil não quer obedecer a estas ordens, depois de tantas provas de adhesão ás Cortes, e ao Governo, e não será mais provavel que isto seja obra de um partido de que he victima a maior parte do povo? O Governo estará ao facto e conhecimento deste importante negocio, por tanto se elle julga necessario mandar tropas para o Brazil, autorizemo-lo para este um, se preciso for.
O Sr. Lino Coutinho: - O meu discurso dividir-se-ha em duas partes: a primeira he relativa á indicação, a segunda he sobre a generalidade dos motivos que apontei, e que, como bem disse o Sr. Moura, he preciso attender e explanar porque o negocio he assas melindroso de sua natureza: e visto que o mundo inteiro tem de ser nosso juiz, deve estar ao alcance de todas as razões que nos assistem pró e contra: he preciso que falemos, para que lhe conheça nossa conducta a fim de nos fazer justiça, imparcial como costuma; e he por isso que além de refutar os mais salientei argumentos dos honrados Membros que me precederão a falar, eu tocarei também nestas necessárias generalidades. Em quanto á primeira parle, tem-se proposto argumentos geraes e particulares, eu passarei a responder a elles. Pelo que toca aos primeiros digo que não excluem o admittir-se a minha indicação: dizem as bases, que a força armada fica á disposição do poder executivo, para a dirigir como bem lhe parecer. He verdade que isto se acha nellas determinado; luas he isto determinado, para o momento em que a Nação portugueza, truta de regenerar-se, trata de pôr tudo nos seu à eixos políticos, ou para quando estiver já regenerada? Por ventura poderá pertencer a uma legislatura ordinária, o conhecer do direito de petição que he do alcance do poder judiciário? Poderá intrometter-se nas cousas puramente do Governo? Ninguém me dirá que sim. E não acontece isto agora? Acaso nas primeiras cousas mesmo, não temos nós procurado do Governo, saber os motivos porque elle tem obrado, não temos até chegado a perguntar-lhe, para que despachou este, ou aquelle ministro? E então em uma cousa tão melindrosa, como seja o de enviar tropas para o Brazil, donde podem resultar consequências funestas, não podem as Cortes intrometter-se? He cousa em verdade muito estranha. Para que fim se creou a Com missão de Constituição? Desde que tenho assento neste augusto recinto, vejo que todos os negócios do Brazil tem sido enviados a esta Commissão. Porque não se tem mandado pois ao Governo todos estes officios, para elle dar as providencias, para que se tem creado dentro deste Congresso demais a mais uma Commissão especial para as cousas do Brazil! Pois este caso de que tratamos, não he um caso que deve pertencer a esta Commissão extraordinária? Creio que sim e não se deve de modo algum ex-abrupto enviar ao Poder executivo para providenciar. Diz-se: o Poder executivo deve obrar com toda a prudência e Pergunto eu, o Poder executivo obra acaso com prudência, ou com força, no que deve executar? A prudência, a madureza, e a discussão são attributos e regalias do Poder legislativo, e este negocio exige toda a ponderação, e toda a circunspecção e debate. Quem devemos esperar que obre com mais prudência, um concelho de quatro membros, ou este Congresso composto de cento e quarenta legisladores? Creio que aqui haverá mais juizo prudencial, e no Governo mais força para executar. He muito bom de dizer gratuitamente: o Governo obra com prudência, os chefes militares com madureza, e os soldados com subordinação; mas desgraçadamente que temos nós visto? O governador das armas, o Sr. Moura, mandado para Pernambuco, depondo immediatamente todos os com m andantes que erão Brazileiros, ingerindo-se no poder judicial, propondo novos magistrados, e intromettende-se na administração da província. Por ventura hedos attributos do governador das armas ingerir-se no poder judicial? Entre tanto elle o tem feito, apesar de não ser assim expresso nas suas cartas de ordens? Por ventura os soldados insubordinados na Bahia não assasinárão a abbadeça da Lopa, não saquearão as casas, e não fizerão mil profanações? Eis-aqui os chefes e soldados escolhidos com prudência, obrando com madureza, e disciplina! Diz-se que não devemos receiar cousa alguma, porque o Governo nada maii faz do que aprontar-se para dar providencias no caso de sorem necessárias, entre tanto os editaes estão affixados na praça, por ordem do Governo para se afretarem navios, e para conduzir soldados á Bahia. Senhores, desenganemo-nos: ou a desordem está na Bahia, ou não; senão está, a junta governativa tem assumido os seus poderes, as suas regalias, e a cousa vai bem; senão tem sido assim, então a fermentação está em seu auge, e seiscentos homens não vão lá fazer cousa alguma. Falou o Sr. Soares Franco na expedição de Walcherne, e admira-me muito que o honrado Membro traga um similhante argumento , quando o nosso caso he pendente entre duas porções de uma mesma monarquia, e o que elle aponta he uma expedição da Inglaterra enviada contra os Francezes na Holanda. Que analogia pois acha o Sr. Soarei Franco entre elles? Se o nosso ministério armasse uma expedição, e mandasse attacar os bárbaros da costa d'África, o Congresso não deveria embaraçar-se com isto, porque não entrava na ordem de consolidar a união das províncias, e nem era matéria constitucional, e nesse caso sendo mal succedida, o Congresso lhe poderia com toda a justiça pedir exactas contas. Diz o Sr. Trigoso que deixemos obrar o Governo, e depois se a cousa for mal succedida, pediremos contas. Oh, senhores! Quando havemos de pedir contas ao Governo? Quando o Brazil depois de dilacerado tiver proclamado a sua independência? Então he que se hão pedir estas con-

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tas! Por ventura he isto da prudência de homens legisladores: he de humanidade que se deixem degolar os irmãos, só a fim de se exigir ao depois a responsabilidade do ministério? Eu me horroriso de similhante modo de pensar. Admira-me que um dos honrados Membros que ha mezes atraz se tinha opposto a todas as medidas violentas contra o Brazil, que tinha dito que o vinculo mais forte havia de ser formado pela confraternidade e relações amigáveis, seja agora o mesmo que se mostra mais encarniçado contra nós, vociferando que a união deve ser feita por via da força, chegando a tanto o seu furor que nos ameaçou com cães de filas! Pensa por ventura o Sr. Borges Carneiro que estamos nos desgraçados tempos dos Cortezes, Pissarros, e Davillas, em que os miseros Americanos forão devorados por esses esfaimados animaes que para labéo da Europa elles conduzirão da Hespanha? Para nos despicarmos saiba o mundo tambem que temos onças, temos tigres, e que o Brazil não será mais conquistado nem com armas, nem com cães de filas: só a justiça o poderá prender em fraternal união. Disserão os Srs. Girão e Pessanho, falando da indicação, que mais farião os insurgentes, e revolucionários se estivessem aqui sentados entre nós? Oh Sr. Presidente, pois no sagrado recinto deste Congresso, avanção-se proposições de tal natureza! Pois não, podemos ser comparados com os representantes de independentes e facciosos! Bem amarga para mim, o para todos os Brazileiros fui semelhante asserção, e creio que se elles houvessem reflectido com algum siso não haverião de certo proferido um tão venenoso como offensivo discurso. Basta pois de argumentos particulares, e passemos aos princípios geraes porque he preciso, como já disse que o mundo inteiro os conheça; e porque eu, como
Deputado do Brazil, para elle apello. Disse o honrado Membro o Sr. Moura, e protestou diante do Congresso, a do mundo inteiro que nunca as vistas do Congresso forão colonizar o Brazil Confesso que as idéas e vistas deste Congresso forão sempre a fraternidade e amizade; mas pergunto: o que se imagina em theorta, e o que se conserva em idéa desempenha-se sempre na prática? Para se fazer crer aos povos o que aqui se proclama he preciso obras e não palavras, principalmente para o Brazil aquém neste mesmo Congresso já se deu o epíteto de mulher caprichosa: assim o será; mas Deus me livre do quem não tem capricho, e pundonor. Além disto, nós todos devemos saber que os caprichosos não são vencidos pela força, porém sim com mimo boas maneiras, e boas obras. As theorias pois não bastão: he preciso que apoz delias se siga logo a prática, e no desgraçadamente o que não tenho visto, porque a primeira tem avançado muito neste Congrego, e a segunda tem ficado muito atraz.
He um facto, senhores, que todo o Brazil se regozijou com a proclamação das bases da Constituição; não ha nada mais justo: são princípios naturais, são princípios políticos os que ali se achão. Eu fui testemunha da alegria e festejos que houve em algumas partes: mas depois appareceu um projecto impresso da Constituição, onde se há que só serião cidadão portugueses os que nascecem directamente das duas linhas portugueses. Uma similhante asserção começou a fazer grande desconfiança e fermentação nos homens de cores, e eis o primeiro passo que muito mal nos fez. Nas bases da Constituição se dizia: descançai, todos os vossos direitos, tudo quanto for conveniente ao nosso paiz, será discutido pelos vossos representantes e as leis que se fizerem, não regularão para o Brazil em quanto elles aqui não estiverem. Fiados neste principio sagrado, os brasileiros se alegrarão, e ficárão tranquilos; mas que se seguiu, depois de similhante manifesto? Leis provisórias decretadas quando não havia representantes Brazileiros no Congresso, as quaes punhão os povos do Brazil em peior condição do que estavão com o antigo systema. Entrou logo a desconfiança de que se dizia uma cousa e se praticava outra. Em outro tempo as promoções se fazião na previncia até á patente de major, sem intervenção do ministerio, hoje ha um decreto que manda fazer toda a promoção pelo ministro da guerra. O capitão general com a junta da fazenda podia preencher os lugares civis e de fazenda: hoje se tira à junta governativa similhante regalia, obrigando-se desta sorte os tristes pertendentes a virem a concurso em em Lisboa, perante o conselho d'Estado mendigar um pequeno arranjo. Antigamente, o bispo por via de uma commissão examinadora, podia fazer os vigários o parocos: hoje porém apenas fará um sacristão porque similhantes lugares devem ser dados tambem por via de um concurso ecclesiastico. D'antes tudo era sujeito a um governo único que tudo dirigia: hoje não he assim, porque tudo se acha dividido sem harmonia , sem ordem o sem fim; como um similhante erro politico tem podido entrar na cabeça de tantos legisladores! He por tanto fora de toda a duvida que este Congresso por alguns dos seus decrectos provisórios prejudiciaes aos Brazileiros, e mais ainda pela falta da sua palavra, tem introduzido naquelle paiz a desconfiança e fermentação intestina patenteada com tudo em algumas provincias pelo máo proceder das tropas europeus, e que progredirá decerto o más, senão se derem prontas providencias. E isto he tanto verdade, que o mesmo Congresso conhecendo os erros commettidos acerca do Brazil, erros que não tendo sua origem no coração e vontade, dependião com tudo do diverso pensar dos homens, tem emendado a mão em muitas cousas, porem ainda não em todas. Embora se diga que os decretos para o Brazil são provisórios, e que haverá ainda mudanças por Íeis Citáveis e permanentes; mas, pergunto eu, como muitas vezes lenho perguntado, os males que esses decretos produzem são provisórios? E deixarão elles, pela causa ser provisória, do terem menos reaes? He tempo, senhores, de olharmos seriamente para o Brazil, e mui principalmente hoje para as desordens e negócios da Bahia: a tropa que se quer caviar vai aumentar o mal que não pode ser cuiado senão com a evacuação de toda a tropa europeu do território braziliense; bastão já tantas desgraças, e mais vale conseguirmos o bem ainda que tarde, do que nunca. Eis-aqui os motivos que nos assistirão quando fizemos a indicação de que se trata, e os que o manda inteiro deve saber para bem avaliar a boa fé do Brasil no momento da sua regeneração, e hoje a

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justiça de suas desconfianças quando se tem começado a violar os seus direitos sagrados. A posteridade julgadora imparcial das nações e dos homens, decidirá um dia qual de nós teve razão; se o Brazil, se Portugal.
O Sr. Marcos Antonio: - Estou de muito boa fé neste soberano Congresso, persuadido que os povos da minha província querem a união; assim como estou persuadido de que, secundo a base 21 da Constituição, he permittido aos mesmos povos declarar a sua vontade pela voz dos seus representantes. Esta he a prefacção do meu discurso. No dia antecedente, cumprindo os deveres mais sagrados da minha missão, disse que aos Deputados competia exprimir os sentimentos, e vontade dos seus commitentes, c que não tinhão aquelles commisssarios declarado cousa alguma a respeito das tropas, que se pretendia enviar para o Brazil. Hoje mais que trez Deputados marecião mais fé do que cartas anonymas , e noticias espalhadas por vozes de intriguistas, e rumores de anarquistas. Hoje porem declaro muito positivamente, ou antes o declarão perto de quatro milhões de habitantes portuguezes brazilenses, pela voz dos seus representantes: Não queremos; não precisamos; he nociva a tropa.
- Não queremos, porque temos a fortuna de viver em um governo livre, no qual se obedece ao império das leis, e não a uma força permanente, e ameaçadora. Assim nos convém declarar, porque somos irmãos, e cidadãos livres sujeitos ás leis feitas no Congresso de Lisboa pelos nossos Representantes unidos aos de toda a Nação; e não plantadores de algodão, e tabaco, nem aviltados colonisadores subordinados à arbitrariedade das autoridades enviadas da Metrópole para nos suffocar debaixo de suas ordens prepotentes, ato que depois de ter amontoado uma fortuna consideravel á custa das nossas fadigas, e suores, possão ir viver considerados, e com o explendor do luxo na mái patria. Ainda que muito obrigados a nossos irmãos de Portugal, que com tantos sacrifícios concorrerão para nossa liberdade civil; e que logo no principio da feliz regenerão proclamarão que querião que tambem fossemos livres, e participantes dos liberaes effeitos de uma Constituição, que seria a magna carta da nossa liberdade, o direito publico que nos havia de reger; nós o diremos mui francamente, porque temos a fortuna de falar neste templo da concórdia, junto aos altares da fraternidade, da amisade, e da paz. - Não precisamos tropas, porque não temos inimigos externos que combater. Para refrear poucos sediciosos bastão nossas próprias forças. Desgraçado pai de familias aquelle que convida seus visinhos, e amigos para castigar seus domésticos. Nós pediremos tropas quando uma necessidade imperiosa exigir medidas repulsivas. O reconhecimento da independência dos calados limítrofes, reconhecimento que Sua Magestade fez antes de regressar para Portugal, como consta da carta escrita pelo nosso encarregado em Buenos Ayres, João Manoel de Figueiredo, datada de 11 de Agosto de 1821, nos assegura que viviremos em harmonia com nossos visinhos. Se alguma nação européa intentar invadir-nos, então esperamos que nossos irmãos e amigos de Portugal, nos enviem
soccorros , e forças, quanto for compatível com a sua própria segurança, he nociva otropu, porque, o thesouro da Bahia não pode pagar a tão grande numero de soldados. Já existem ali mais de tres mil homens de tropa de linha, e com soldos accrescentados. Os soldados como celibatários concorrem muito para a desmoralisação dos povos, como escrevem filósofos, e publicistas: veja-se o eloquente Filangieri. Póde ser ainda muito prejudicial aos interesses do commercio desta Capital, porque só houver alguma agitação, se os espíritos se exaltarem, è os povos por vingança, ou mal entendida defeza queimarem as plantações, incendiarem os edifícios da cidade, e villas, não lerão certamente os negociantes desta capital assucar, nem tabaco para ganhar suas commissões, e tirar outros avultadissimos proveitos. Estamos comtudo prontos a receber todas as famílias pacificas, e industriosas, que pretenderem emigrar para o Brazil , onde muito felizmente podem ser proprietárias. Nós as receberemos com os braços abertos em o nosso paiz hospitaleiro, ainda a família do nosso reinante, bem como aconteceu em 1808; e daremos as mais convenientes provas da nossa fiel, e sincera amizade. Tendo sido discutido nesta soberana Assembleia a remessa de tropas para Pernambuco, não descubro agora razão sufficiente, porque se repete e argumenta, que ao governo pertence à disposição das tropas. He inconsequente essa evasiva. O honrado, e illustre Membro, o Sr. Trigoso, votando contra a indicação, produziu razões contra producentem, porque affirmando que ao corpo legislativo pertencia conter o executivo, quando conhecesse que este obrava cousas contrarias ao liem commum, deduziu consequências, que te seguião dos seus princípios; tanto mais porque confessa ser claro haver inconvenientes na remessa da tropa, e que não sabe os motivos por que o Governo intenta remetter força armada para a Bahia. Porem parece ter corregido seu raciocínio, dizendo, que seria conveniente perguntar se o poder executivo tinha consultado o conselho de Estado. Pelo menos se demorasse a decisão em quanto se averiguava se tinhão sido ouvidos os conselheiros de Estado. Accresce mais que os governos constitucionaes se conservão pela força moral, e por isso muito cumpre á dignidade do Congresso que não sejão enviadas tropas para o Brazil sem muita consideração, e sábio vagar. Já forão reenviadas de Pernambuco por uma resolução do conselho congregado segundo a norma das leis existentes naquella província. O Príncipe regente tambem fez embarcar a divisão auxiliadora, porque entendeu que não convinha a sua conservação no Rio de Janeiro. E quanto mais será desfavorável a opinião publica se ter expulsa de outros pontos do Brazil? He incontestável em política que todo o governo deve procurar quanto for possível, conservar o respeito, e consideração. Estas vozes são ditadas pelo amor da verdade, e da justiça.
O Sr. Miranda: - Pouco se póde dizer depois, do que se tem dito a favor da indicação; e pouco também se póde dizer a favor delia. Nem uma indicação tão simples merecia uma discussão ião longa. Tem ido por mais vezes expedições para o Brazil,

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minca se tomou calor tão grande como hoje; isto he que me admira. O Brazil não lie uma parte da Nação portugueza? He; ninguém o póde duvidar; não se trata de estabelecer a união com o Brazil: a união está feita. Dizer-se que se trata de estabelecer a união, he uma expressão anti-constitucional. Póde negar-se que o Brazil seja uma parte integrante da Nação portugueza, que está sujeita ao mesmo Governo executivo, e obrigada a obedecer ás leis desta Assemblea augusta? Se isto he assim, qual he a obrigação do Governo? He manter a segurança, a integridade da Nação, tornando as medidas necessárias, tanto a respeito do Brazil, como da Ásia, África, e Portugal, a fim de manter e conservar a integridade da Monarquia. Este principio ninguém o pode contradizer. Disse um illustre Preopinante que qualquer cidadão, qualquer fracção da Nação portugueza, quando visse uma lei injuria tinha direito a resistir-lhe! He uma proposição inaudita. Fala-se muito da boa disposição dos habitantes do Brazil eu sou o primeiro que convenho nisto; gosto muito de ouvir os mesmos Deputados daquelle paiz, dizendo que ha uma perfeita união, que são os mesmos os sentimentos de concórdia; estou disto plenamente capacitado, e desde já digo que foi de pugnar pelos direitos do Brazil, como outro qualquer representante da Nação enviado por alguma das provindas do Brazil. Não farei profissão de fé porque he desnecessária. Concedo que póde haver discrepância nos moios, mas não nos fins. Todos obramos no mesmo sentido; porém não he este o caso de que se tracta. No Brazil ha adhesão ao systema constitucional, ha cidadãos zelosos que desejão conservar a união de Portugal com aquelle paiz, mas quem poderá negar que ha um partido faccioso que tende á independência? Não he isto mais claro que a luz do meio dia? Ha, e não qualquer facção, mas facção que principia a lançar planos systematicos. Esta facção não está na Bahia: Voltemos os olhos para o sul do Brazil; está no Rio de Janeiro: ali he que está a facção lisonjeando um Príncipe que leni propagado o systema da independência; ali he que existe esta facção, que este Congresso devia ter declarado como rebelde. Que quer dizer Príncipe Regente? Quem lhe conferiu similhante titulo depois do decreto das Cortes? Mas em fim, Srs. eu não criminarei o Principe, mas não poderei deixar de clamar altamente contra os que o rodeião. Desobedece-se a um decrecreto das Cortes, e diz um iilustre Preopinante que os motivos que se allegárão erão para conseguir que se não cumprisse este decreto. E que me dirá o illustre Preopinante se eu lhe disser que no mesmo Rio de Janeiro se desapprovão aquellas medidas, e que o governo não viesse para Portugal? Que diremos nós dessas pequenas cortes, desse embrião de cortes? He necessário falarmos claro, Srs. Na Bahia ha cidadãos constitucionaes. Nas scenas que se tem apresentado nunca o povo tomou parte; nem toma parte nas facções. Mas qual he a razão porque apparece entre elles uma facção insolente e atrevida, opposta ao partido constitucional? Eu digo aos Illustres Preopinantes, que quando o Brazil quizer separar-se approvarei a separação, mas tomem-se todas as medidas para que se não diga que nós abandonamos o Brazil. Os cidadãos honrados do Brazil tem direito a que Portugal mantenha a sua propriedade e as suas pessoas; e por consequência ou seja para rebater uma facção já desenvolvida, o que he escusado querer occultar, ou para apoiar os verdadeiros constitucionaes do Brazil e Portugal, os negociantes estabelecidos, he necessário ir força armada; e por isso não devemos tolher o Governo a esto respeito. Se os 600 homens não são bastantes, vão mais. Eu não sei qual he o fim porque o Governo pertende mandar esta tropa; mas o que sei he que o Governo fará muito mal senão tiver no centro do Brazil urna força. Não ha depois de brotar uma rebellião que devem applicar-se os meios para a suffocar. E plano dos faciosos he conhecido; e por tanto o Governo deve desde logo suffocalo. Quero que me digão os Illustres Preopinantes, se eu perguntasse ao Governo a razão porque preparava aquella expedição, e elle me respondesse: eu posso dispor da força armada segundo exige os interesses da Nação, e não posso revelar os motivos porque quero mandar esta força; quero que me digão que se lhe havia de replicar? Mas que contraste terrível nos não apresenta esta discussão! Não he só no Brazil que ha facciosos; facciosos temos entre nós. Os princípios que calumnião as Cortes no Brazil são os mesmos que existem em Portugal; e quando ha pouco o ministro da justiça apresentou uma medida enérgica a respeito dos facciosos, logo que se leu o officio hesitou-se um só momento em conceder o que o ministro pedia? Os illustre Preopinantes não approvárão todos esta medida? Quando em Portugal por uma simples representação do ministro se publica uma lei de tal natureza, quer-se embaraçar a autoridade do Governo no seu modo de obrar relativamente ao Brazil, havendo motivos muito mais potentes? Não he aos facciosos a quem devemos dar satisfação; as medidas que os contiVerão em Portugal, são precisamente as mesmas que se devem tomar. Por isso o meu voto he que vá a expedição, e que se deixe ao Governo toda a liberdade a este respeito.
O Sr. Andrada: - O nobre preopinante diz que não he aos facciosos que se devem dar satisfações; que as medidas que os contiverão, e forão approvadas; são as mesmas que hoje se devem seguir. Peço que se explique, porque desejo saber se acaso he isto um ataque dirigido a nós, Deputados do Brazil.
O Sr. Miranda: - Não he ataque. Eu falo dos facciosos do Brazil, os quaes por todos os meios, e principalmente com periodicos assalariados procurão desacreditar as Cortes; e tão longe estava eu de me lembrar de outra cousa, que fui o mesmo que disse que ao mesmo passo que havia facciosos no Brazil, os havia tombem em Portugal.
O Sr. Vergueiro: - Depois de tão longa discussão parece que nada haverá a accrescentar para esclarecer este negocio. Com tudo o amor que consagro a integridade da Monarquia, integridade que vejo abalada pelas medidas do Governo, me obriga a não guardar silencio. Impugnarei n medi ia do Governo com a mesma franqueza com que votei que os officios do governador Madeira fossem para a Commissão especial, o fossem para o Governo. Quando assim vo-

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lei não poderia passar-me pela imaginação que o Governo houvesse de tomar uma medida tão alheia da objecto, como me parece esta de mandar tropa para a Bahia. Quando se pretende atacar um fenómeno, exuminão-se as causas delle, e contra ellas se dirigem as operações. Nunca se ataca um fenómeno ignorando as mesmas causas. Com tudo, isto he o que vejo na medida do Governo. O facto he muito simples. Foi nomeado para governador das armas o governador Madeira; logo no principio os Deputados da Bahia reclamarão contra a nomeação, prognosticarão as desordens da Bahia. Posteriormente, acontecendo concorrerem dois ministros d'Estado a conferenciar na Commissão de negócios políticos, alguns illustres membros daquella Commissão lhes fizera o ver as consequências que podião resultar daquelle governador das armas. Ora com effeito os Deputados da Bahia não forão accreditados; parece que o deverião ser agora. Remetteu-se a patente ao brigadeiro Madeira; devião seguir-se os termos estabelecidos pela lei, fazendo-a cumprir pela camará, isto he o que se usa em todas as capitães do Brazil, e he o que se usou sempre no tempo do despotismo. Autoridade nenhuma da província entrou no exercício das suas funcções, sem que fizesse juntar a camara, e cumprir a sua patente, para depois disto entrar no exercicicio das suas funções. Entretanto o brigadeiro Madeira não faz isto; apresenta-se a um procurador, e vereador, pessoas do seu partido, e estes mandão pôr o cumpra-se. Porém reconhecendo-se a illegalidade do procedimento, se lhe diz que haverá reunido da camara, e que espere para o dia 20, em que ella terá lugar. Madeira porem, não espera por isto; prescinde de todas as solennidades, e chamando a sua casa todos os commandantes de corpos, declara-se general das armas, e pede que o reconheção por tal. Apresenta-se então o antigo governador querendo sustentar o commando das armas contra o seu dever, e o novo governador nomeado querendo tomar á força o governo das armas. Eu creio, e á primeira, vista parece, que tão criminoso he Manoel Pedro em resistir a dar o commando, como o outro em o querer arrogar a si, sem as solemnidades da lei. Ora neste caso quaes erão as providencias que se deverão tomar! O que parece, muito obvio, he que nem um, nem outro governador deveria continuar no exercício das armas, sem se purificar n'um conselho de guerra; e que se deveria nomear outro general. Porem em lugar de se tomar uma providencia tão simples manda-se força armada, manda-se um exercito. Ora não sei como força armada possa convir para acabar uma duvida simples entre dois homens. Sabe-se muito bem que ha descontentamento geral; que o, receio que tem o Brazil, he que Portugal queira dominalo. Eu não entrarei no exame sobre a justiça mas he uma opinião; mas he uma opinião que desgraçadamente existe no Brazil, e que a política pede que não confirmemos. Eis aqui porem o que ha de suceder mandando tropa para o Brazil. A tropa de instrumento da denominação. Dirão pois os Brazileiros: ahi vem tropa dominar-nos! Parecem-me por tanto que devia suspender-se uma medida, que alias he tão curta e acanhada, que não póde
produzir senão desordens. Era mais conveniente que se tomassem mediadas geraes e então saberemos a regra que devemos seguir. Outras medidas fazem mal à causa da união, aumentão a rivalidade, gerão o ódio, assim temos desunião. Muitos Ilustres Deputados tem reconhecido, e com verdade e exactidão, que a massa geral do Brazil he constitucional, e quer a união com Portugal. Nisto creio que não póde haver duvida. Entretanto alguns Membros tem acrescentado, que a pezar disto ha facção, ha partidos, já pela independência, já pela rebeldia, já pela anarquia. Eu sou obrigado a dizer pelo conhecimento que tenho das provindas do Sul, que não existe parte de independência, existiu com effeito um partido independentes, que he o partido do patriotismo; isto existirá em toda a parte onde houver despotismo, por que onde houver despotismo, ha de haver partidos. que forcejem por deitalo fora. Por isso não ha duvida que havia uma tendência para este fim, cm quanto o Brazil eslava debaixo dos ferros do despotismo; mas depois que se quebrarão as cadêas, este partido , esta tendência natural do coração humano acabou, e tomou outra direcção, por isso que se lhe apresentou um caminho mais largo e amplo, para chegar aos seus fins, que era recobrar a sua liberdade. Acabou este partido, e ao mesmo tempo eu vi acabar a grande rivalidade que havia entre os Brasileiros, e Europeus ella se extinguiu inteiramente. Tendo eu nascido na Europa, parece que devo estar ao facto disto, e que mereço ser acreditado nas minhas asserções a este respeito. Eu ouvi declarar a muitos, que elles renunciavão todas as idéas de rivalidade a respeito dos Europeos, considerando-se todos como irmãos, corno se tivessem nascido no mesmo lar. Porem ao depois, algumas disposições posteriores deste Congresso, talvez mal interpretadas, e até mesmo o projecto da Constituição, que sendo muito próprio para Portugal, devia ser modificado para o Brazil, derão
occasião a pensar-se que o Congresso pretendia reduzir o Brazil ao antigo estado de colónia; e eis-aqui o que poderia fazer lembrar o partido da independencia, por que logo que se renovou a mesma causa, originou-se o mesmo effeito. Toda a missão de tropas para o Brazil tende a isto; tende a persuadir os Brazileiros, que Portugal quer dominalo; e esta persuasão produz a idéa de independência. Por isso voto contra a remessa das tropas, principalmente em quanto se não discutir o projecto das relações que devem estabelecer-se entre Portugal, e o Brazil. Acho indecoroso rejeitar-se o que pede uma Deputação do Brazil. Pois
reconhece-se que a massa geral do Brasil he constitucional, e quer unir-se a Portugal, e quando os órgãos desta massa geral clamão contra as medidas, que se pretendem tomar, não hão de, ser attendidos. Se a torça não he para sujeitar o Brasil, como se diz mas para reprimir os partidos, que na verdade são, cousa nenhuma, parece que devem ser attendidas as representações feitas pelo legitimo orgão dessa massa geral: porque se ella entendesse que era necessario um auxilio de força, então pediria mas não o pede antes reconhece declara e protesta que toda a missão de tropas para o Brazil, serve para augmentar

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descontentamento, não sendo necessaria para conciliar, e manter a ordem. Diz-se que não he da competencia deste Congresso limitar o Governo sobre esta medida, por isso mesmo que era da sua exclusiva attribuição. Eu não sei comoda quem possa sustentar isto: para o contrariar, restringir-me-hei o um exemplo entre uma grande multidão dos que poderia apontar. Não ha muito tempo que se disse ao Governo que não mandasse um corregedor para Lamego, sem informar o Congresso se a nomeação feita pelo conselho de Estado tinha sido bem, ou mal feita; e no entretanto quem fez esta indicação, disse que a fazia, por que não queria que para a sua patria fosse um ladrão. Ora pergunto eu, que males poderião resultar disto? Pois, Srs., julgou-se mais importante a comarca de Lamego, do que o Reino do Brazil? Mais attendivel a indicação de um só Membro, do que a indicação da maior parte dos Representantes, e Deputados daquelle continente? Toda a missão das tropas para o Brazil he perniciosa, principalmente em quanto se não estabelecerem as bases da união, que devem reger ambos os reinos; e por tanto voto a favor da indicação.
O Sr. Girão: - Sr. Presidente, peço a palavra. Esta questão, que era de sua natureza mui simples, acha-se já em tal estado, que me he necessario divagar e saír della, para poder responder aos argumentos que ontem, e hoje tenho ouvido fazer. A questão era sómente, se o Governo podia ou não mandar a expedição, sem dependencia das Cortes: insensivelmente porém nos achamos discutindo os negocios mais importantes do Brazil, e investigando quaes sejão os melhores meios de conservar a união desejada por todos os Portugueses de ambos os hemisferios. Tenho por tanto de ser mais extenso do que costumo, e dividirei o meu discurso em quatro pontos; a saber: 1.º qual tem sido nossa conducta para com o Brazil: 2.° qual a daquelle Reino para com nosco: 3.° quem he que pertende desunir-nos; 4.º que devemos fazer.
Tratando do primeiro ponto digo, que me encho de nobre orgulho por ver a conducta fiança, leal, e generosa que temos seguido; revolvão-se as paginas da moderna historia; vejão-se as actas de nossas sessões; consultem-se os Diarios, pois que tudo chamo em meu soccorro, e conhecer-se-ha que nós sempre generosos, nunca expressamos se não os mais puros sentimentos de fraternidade. Ainda aqui não estavão os illustres Deputados do Brazil, e seus interesses erão maduramente pesados na balança da igualdade: respeito e amor erão nossas polares estrellas. Nós eramos os descendentes daquelles, que, a travez do mares e naufragios, levárão ás terras de Cabral a civilisação, a povoação, e a industria; mas nós esquecemo-nos de direitos ganhados com tantos sacrificios, e só nos lembrámos de partilhar e repartir com nossos irmãos o melhor dos bens, a nossa Constituição.
Vejamos agora como fomos correspondidas. Em verdade me glorio de ter visto que o grito da liberdade soou nas praias americanas, e o fogo electrico saído de nossos peitos lavrou nos Portugueses trans-atlanticos com pasmosa rapidez. Elles jurárão a Constituição que fizessemos, jurárão o mesmo Rei, a mesma religião; enviárão a este augusto recinto os seus representantes, e quasi temos concluido o edificio magestoso que nos foi mandado fazer pela Nação.
Grandes cousas, por certo, são estas, que fazem trasbordar de jubilo o coração humano; mas infelizmente (com quanta magoa, com quanto pezar o não digo!) surgiu das trovas o genio malfazejo; o demonio da discordia agitou as serpes, e tem já derramado seu veneno pestefero sobre tudo quanto fazemos, e quanto temos feito; e eisaqui a materia do terceiro ponto. Se lanço os olhos ao caro Brazil, eu vejo as furias infernaes aninhadas no peito dos poucos malvados que compõem o bando infame dos dissidentes e rebeldes. Elles espalhão calumnias, e vomitão improperios e blasfemias nas negras paginas dos incendiarios escritos de Pernambuco: venaveis penas deixão correr, de mistura com a tinta, o fel da calumnia, no infame Despertador e na Malagueta do Rio de Janeiro: transporta-se a Londres o oiro para um Portuguez envergonhar os Portuguezes com seus vendidos trabalhos literarios. Eis o fogo pegado á Monarquia. E que faremos nós? He o objecto do 4.° ponto. Haverá um só Deputado que não saiba as verdades que acabo de referir? Haverá quem não saiba, que o sangue correu já em Pernambuco, e na Bahia? Mão por certo; mas eu pasmo, eu me admiro, quando vejo que se quer erguer uma barreira anti-constitucional diante dos braços do poder executivo, para o tolher de soffocar no berço a hydra nascente que ameaça tragar a todos! Tem se esgotado a arte de Protagoras para nos illudir; tem-se pintado o Brazil agitado, ao mais leve rumor de uma expedição. Ah, Srs., não confundamos a parte sã daquelle paiz, com a parte infectada. Esta treme, sim, ao nome de tropas; mas aquella exulta, porque não quer perecer nas garras da anarquia. Por ventura irão as nossas tropas derribar a Constituição? Ninguem se atreverá a dizelo; vão firmala, vão guardula dos perversos demagógos, que sobre seu cadaver querem erguer o estendarte da solhada independencia. Nada de illusões, estamos chegados ao dia de dizer verdades, quer ellas amarguem quer não. A brandura tem seus limites; a moderação os tem igualmente; he preciso confessar que o Brazil entregue a si mesmo corre á sua dissolução total; vai ser lacerado por mil facções, e só a força póde obstar á sua total ruina; quem quer o bem geral, livre do mais pequeno interesse particular, deve desejar que se corte pela raiz o germen nascente do mal; e só os perversos he que estimarão ver ligadas as mãos do Governo para impunes cravarem os punhaes no seio da Patria. Eu não sei os segredos do ministerio; mas sei que geralmente se conta que Lord Cachrane intenta vir aos mares do Brazil fazer o mesmo que tem feito no mar pacifico; e que pertende assenhorar-se de algum ponto importante. Ora agora será justo que não nos previnamos contra elle? Será justo que não se conserve um ponto naquella immensa costa para a bandeira portugueza, que d'antes os tinha todos sujeitos, o agora os acha inhospitos?
Vemos arder a nossa casa, grande parte de nossos amigos, do nossos amigos pedem soccorro, e ainda se

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ousa dizer: esperemos; moderação; basta o poder moral; temporizemos!!! Mas, pergunto eu, a espera, a moderação, o poder moral apagão incendios? Dá-se maior impolitica do que esperar a 2$000 legoas de distancia, que as chaminas saião no cume dos edificios, para então tocar a rebote? A boas horas iriamos acudir-lhe!
Lamento as circunstancias em que se acha o Governo; elle he responsável, elle quer acudir da forma que pôde sem exceder os seus poderes, sem depender mesmo das Cortes; mas vejo que lhe querem atar as mãos! Srs., sejamos fieis a nossos juramentos: he necessário que quando as nações extrangeiras falarem nas Cortes portuguezes, e disserem que somos noviços, não accrescentem que somos crianças, e que um dia fazemos uma cousa para no outro a desmancharmos.He das attribuições do Governo dispor da força armada; não o estorvemos, para não sermos perjuros. Digo com toda a franqueza, que se fosse ministro , e visse que o corpo legislativo e depois da me fazer responsável, me tolhia os meio», eu daria a ministro demissão no mesmo instante, e diria: legisladores, já que fazeis uma Babel confusa governai vós e vosso gosto , respondei vós á Nação pelas perdas que vai soffrer; caído sobre vós as queixas das presentes; e das futuras gerações. Eu diria isto; mas como estou neste lugar, digo e voto, que se não embaracê o poder executivo de fazer uma cousa tão acertada ; antes se ponha em estado de conservar os fracos laços, que ainda nos unem ao Brazil.
O Sr. Xavier Monteiro: - Pertencendo a presente questão por sua natureza ás attribuições do Poder executivo, como o Congresso entretanto tem julgado próprio occupar-se da tua decisão, discutindo profundamente a matéria, cumpre aos Deputados que sobre tal assumpto querem expor o seu voto abstrair da qualidade de legisladores, e discorrer, e expressar-se como conselheiros ou ministros de Estado. Tratando nesta hypothese das conveniências, e inconvenientes que ha em remetter actualmente tropas para as províncias do Brazil, e considerando o que estas províncias forão, são, e aspirão ser; o que ha de com m um entre ellas, e o que na de diverso: sendo, como deixo dito, membro do Poder executivo, diria: as provincincías do Brazil forão em geral ale 1807 governadas com dureza e despotismo, como colónias pertencentes a uma distante metrópole, onde as iddas íiberaes rrâo do Governo ou desconhecidas ou desprezadas. Mudada a séde da Monarquia para o Brazil perdeu este a natureza de colónia; cresceu em agricultura melhorou do commercio, e passou a ser governado com dureza menor; mas com igual despotismo. Das vantagens que resultarão ao Brazil desta mudança nasceu o desejo de emprehender mais amplo melhoramento: vimos por tanto em 1817 uma província quebrar todos os laços que a união ao Governo, crear formas republicanas, e erigir-se independente. Bem que a força militar empregada instantaneamente tornasse inútil esta imatura, e inconsiderada empresa, como o procedimento de Pernambuco era tacitamente approvado por grande parte das outras províncias, estas não desistindo do projecto, só diversificação nos meios de o conduzir á execução. Assim logo que Portugal se declarou pela Monarquia constitucional, todos os habitantes do Brazil abraçarão sem resttricção a sua causa: os mais sinceros para melhorar simplesmente de forma de governo, e os outros porque descubrião nesta mudança um grão seguro pato subir á suspirada independência. Logo porem que passou o receio de reacção da parle do governa tio Rio de Janeiro, e arrefeceu o enthusiasmo produzido pela nova ordem de cousas, começarão a luzir cm differentes partes signaes de descontentamento, todos filhos da mesma origem, que he aversão á influencia europa, cobrindo-se porem com pretextos diversos, segundo as circunstancias locaes. Ha pois no Brazil três regiões sensivelmente distinctas: a 1.a comprehende as províncias situadas entre o rio das Amazonas, e o cabo de S. Roque, onde o descontentamento político se não tem ainda manifestamante declarado; conde o desgosto de alguns habitantes resulta por ora do mão estado de administração interior destas províncias. A 2.a divisão encerra as províncias do centro, entre as quaes figurão principalmente Bahia e Pernambuco, que tendem visivelmente para a independência republicana: 1.a toma as armas contra o governador só porque he europeu; e a 2.a não admitte um batalhão portuguez, ignorando ainda o seu comportamento, só pelo defeito da origem. Deve com tudo observar-se que nestas províncias manobrão os partidos em tal arte, que existindo de facto alertas as hostilidades contra Europeus, nenhum escrito descomedido appareceu contra Portugal; antes se protesta toda a obediência, e se patenteião de palavra todos os desejos de união, lhe muito diverso o espirito das provincias do sul que constituem a terceira divino. Aqui, bem que se concorde com o centro cm não obedecer a Portugal, como os indivíduos que tem influencia vivião pela maior parte dos monstruosos abusos da antiga corte do Rio de Janeiro, trata-se de formar um governo independente o mais próximo em attribuições a monarquia absoluta. Por esta razão os decreto à de 29 de Setembro que creavão as juntas provisórias, e ordenavão a retirada do Príncipe Real, e que nenhum abalo produzírão nas outras províncias, provocarão no sul os maiores insultos e blasfémias contra as Cortes, rebellião notória, e os mais declarados signaes de independencia e separação de Portugal. Não he necessario consultar as cartas dos Europeus ali residentes, quê podem ser tomados como suspeitos, para conhecer a verdade do que se passa naquellas províncias nos documentos officiaes, em que representa o as corporações brazileiras, com evidencia demonstrão o espirito de que o partido agora preponderante n'aquelle paiz MJ acha animado. O povo do Rio de Janeiro quando se dirige ao senado da camará para que esta rogue ao Príncipe que não desampare o Brazil, diz: As provincias do Brazil, apparecendo nas pessoas dos seus deputados em roda do throno do Príncipe Regente, formação ma liga de interesses communs, dirigindo sempre a marcha das suas providencias segundo a perspectiva das circunstancias: sendo um dos seus objectos dê empenho estreitar mais e mais os vínculos de nossa fraternidade nacional (poucos

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paragrafos mais adiante, torna o mesmo povo a falar desta maneira). Ha uma distancia mui consideravel entre o meio dia da Europa, e o meio dia da America: a natureza humana aqui experimenta uma mudança sensível, um novo ceo, e por isso mesmo uma nova influencia sobre o caracter dos M seus indivíduos; he impossível que povos classificados cm opposição fysica se possuo reunir debaixo do mesmo systema de governo, n Ora este povo he sincero: creio que ninguém se poderá illudir com a vontade delle. Quer Deputados do Brazil cm torno do Príncipe, e quer um systema de governo differente do nosso. E ainda haverá quem diga que elle deseja união com a Europa? Se escutarmos a camará de S. Paulo veremos que ella concorda com a opinião do povo do Rio de Janeiro quando diz: » Era impossivel pois, Real Sr., que os Brazileiros de hoje, herdeiros dos nobres sentimentos e valor dos seus antepassados, e illustrados pelas luzes do século, não vivessem possuidor do amor da gloria, e cada vez mais inflamados no desejo de ver livre e independente o seu paiz natal. Esta camará affirma que os Brazileiros desejão ver livre e independente o seu paiz natal: isto penso que bem claro he; nem carece de commentarios ou interpretações. O clero de S. Paulo representa ao Príncipe, dizendo: Siga V. A. R. o dito de César, que dizia que valia mais ser o primeiro em uma aldeã, que o segundo em Roma. E pouco depois: Governe V. A. R. este Reino do Brazil com aquella mesma caridade, prudência, e sabedoria com que ate agora tem governado, e attraido os corações deste povo braziliense: e o povo de Portugal te contente com a presença de S. M. Fidelíssima, que he der superabundancia. Este clero não parece demasiadamente apaixonado de novidades em política; deseja a mesma forma de governo que ate agora tem desfructado; com tanto que seja separado de Portugal. A deputação porem do governo, camará, clero, e povo de S. Paulo passa com mais individuação a aconselhar o methodo de pôr em effeito esta separação quando fecha o seu discurso ao Príncipe, dizendo: Digne se pois V. A. R., acolhendo benigno as supplicas dos seus fieis Paulistas, declarar francamente á face do universo, que não lhe he licito obedecer aos decretos últimos, para felicidade não só do Reino do Brazil, mas de todo o Reino Unido; quê vai logo castigar os rebeldes, e perturbadores da ordem e do socego publico; que para reunir todas as provincias deste Reino em um centro commum de união, e de interesses recíprocos, convocará uma junta de procuradores geraes, ou representantes, legalmente nomeados pêlos eleitores de paroquia, juntos em cada comarca; para que nesta corte, e perante V. A. R. o aconselhem, e advoguem a causa das suas respectivas províncias; podendo ser revogados seus poderes, e nomeados outros, se se não comportarem conforme as vistas, e desejos das mesmas províncias; e parece-nos, Augusto Senhor, que bastará por ora que as províncias grandes do Brazil enviem dois deputados, e as pequenos um. Peste modo, alem dos Representantes nas Cortei Geraes, que advoguem e defendão os direitos da Nação em geral, haverá no Rio de Janeiro uma deputação brazilica, que aconselhe e faça tomar aquellas medidas urgentes, e necessárias a bem do Brazil, e década uma das suas províncias, que não podem esperar por decisões longiquas e demoradas. Eis, segundo este plano, estabelecida a duplicidade da soberania do povo do Brazil: a saber, uma representação no seu território para legular segundo lhe convier, e outra em Portugal para figurar a quimérica união. Poderão dizer que este plano está muito longe de ser executado; mas eu replicarei, que sendo elle apresentado pela deputação da S. Paulo, da qual o Principe escolheu um dos se as novos ministros, he mais que provável que o plano actualmente esteja adoptado. Para evitar pois que elle sem obstaculos se estabeleça cm todo o Brazil, e que o espirito de insubordinação o independência que agita as províncias do sul, augmente as commoções, que já se deixão conhecer no centro, e as faça communicar ao norte, he que como membro do Poder executivo seria de opinião que para a Bahia se remettesse uma força tal, que mantivesse em respeito as províncias ao norte deste ponto: abandonando por ora o sul onda a presença de qualquer força europea pôde nas circunstancias actuaes ser mais nociva do que útil. Falando agora como legislador não approvo por em tanto, nem condemno a remessa das tropas; visto que aos corpos legislativos não cabe o censurar as medidas dó Poder executivo, em quanto elle as não tem conduzido a plena execução, e pôde exibir em publico a razão do seu procedimento: o que não tem lugar no começo das operações. Se me coubesse em sorte ser Deputado por alguma província do Brazil, talvez julgando que nisto agradava aos meus constituintes imaginaria algum projecto de lei, em virtude do qual ficasse Interinamente o Brazil independente, è desta arte subtraído ao mando do Governo de Portugal; mas reconhecendo e confessendo, como aqui se prática, à existência da união do Brasil a Portugal, eu por não sei incoherente, jamais recusaria de facto ao Governo o exercício daquella faculdade que eu dê direito não duvidava conceder-lhe.
O Sr. Andrada: - A illustre preopinante commetteu um equivoco quando disse que Pernambuco approvava o decreto de 28 de Setembro. Eu era membro da Commissão dos negócios políticos do Brazil, e vi que se queixavão disto. Admiro-me muito de que o honrado membro, para fazer constar a vontade do povo braziliense, trouxesse passagens destacadas , dando-lhes um sentido tão restricto. Desta arte podemos fazer dizer aos outros o que queremos que elles digão. Também me admiro de que no Brazil se creasse um conselho; aias cumpre advertir que este conselho Afio são Cortes geraes, não são representantes da Nação; e se o são, então nós Mão somos mais representantes. Se acaso elles são lá representantes, e se não ha similhante união, como o nobre membro quiz inculcar, então diga-se-nos isto claramente, porque cada um de nós irá caminhando, ou para a sua província, ou, se não se achar lá seguro, para um paiz estrangeiro, Eu não o concebo porém assim; um

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conselho puramente consultivo nada tem com as attribuições das Cortes.
Declrada a materia sufficientemente discutida, poz o Sr. Presidente a votos a indicação, e foi rejeitada.
Concluida a votação, pediu a palavra, e disse
O Sr. Borges de Barros:- Decidiu-se contra a nossa indicação. Eu me submetto a esta decisão; mas seja-me licito dizer que o estado actual da agitação que existe no Brazil, qualquer deliberação arrebitada he perigosa; que esta me faz prever males, aos quaes não podendo eu obstar, de hoje em diante a minha presença no congresso he forçoso effeito de obediencia ao que está sanccionado he um sacrificio feito ao triste e muito penoso cergo de Deputado, que infelizmente me foi imposto.
Designou o Sr. Presidente para a ordem do dia a continuação do projecto n.º 244 sobre a jurisdicção dos juizes lectivos nas causas civeis e crimes ; a nova redacção do artigo 63 do projecto sobre a eleição dos Deputados; o os pareceres das Commissões.
Levantou-se a sessão ás quatro horas da tarde.- Francisco Xavier Soares de Azevedo, Deputado Secretario.

RESOLUÇÕES E ORDENS DAS CORTES.

Para Filippe Ferreira d'Araujo e Castro.

Illustrissimo e Excelentíssimo Senhor. - A s Cortes Geraes e Extraordinárias da Nação portuguesa mandão devolver ao Governo para terem o destino que lhes competir segundo o que te acha disposto na resolução tomada em Cortes a 10 do corrente mez, a consulta inclusa da mexa da consciência e ordens datada em 9,9 de Novembro de 1821, e transmittida ás Cortes pela Secretaria de Estado dos negócios do Reino em 19 de Dezembro do mesmo anno, sobre a expedição do titulo que pede José Licio Possidonio Massa, de uma tença que lhe fora concedida, e bem assim o requerimento junto de Pedro Buys igualmente transmittido pela dita Secretaria de Estado em 22 do mesmo mez de Dezembro, com as portarias da mercê que lhe fora conferida do habito da ordem de Christo com cem mil réis de tença. O que V. Exc.a levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exc.a Paço das Cortes em 22 de Maio de 1822. - João Baptista Felgueira.

Para José da Silva Carvalho.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. As Cortes Gerais e Extraordinárias da Nação portugueza mandão devolver ao do ver no a intima conta do chanceller da casa cia supplicação, que serve de regedor , transmittida ás Curtes pela Secretaria de Estado dos negócios da justiça em 30 de Abril próximo pasta passado, com o decreto de 12 de Junho de 1820, que manda pagar pela forma da casa da supplicação de Lisboa, o ordenado do dezembargador Joaquim Rodrigues Rodrigues a fim de se dar o destino que lhe competir, segundo o que se acha disposto na resolução tomada em Cortes a 10 do corrente mez. O quê V. Exc.a levará ao conhecimento de Sua Magestade. Deus guarde a V. Exc.a Paço das Cortes em 22 de Maio de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para Cândido José Xavier.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. -As Cortes Geraes e Extraordinárias da Nação portuguesa mandão remeller ao Governo para ter o destino que lhe competir, segundo o que se acha disposto na resolução tomada em Cortes a 10 do corrente mez, o requerimento incluso, e documentos juntos de Maria Benedita do Carmo Nobre, viuva de Leão José de Nepomuceno, sobre a continuação da pensão que percebia no Rio de Janeiro. O que V. Exc.a levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exc.a Paço das Cortes em 18 de Maio de 1838. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo

Illustrissima e Excelentíssimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinárias da Nação portuguesa mandão remei ter ao Governo para ter o destino que lhe competir seguido o que sé acha disposto na resolução tornada em Cortes a 10 do corrente mez, o incluso requerimento, e documento junto de D. Maria da Maternidade d'Abreu e Oliveira, viuva de Manoel do Espirito Santo Limpo, tenente coronel engenheiro, sobre a continuação do seu monte pio, ou pulo Rio de Janeiro, ou em Lisboa. O que V. Exc.a levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exc.a Paço das Cortes em 29 de Maio de 1812 - João Baptista Felgueiras.

Para Ignacio da Costa Quintella.

lllustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinárias da Nação portugueza; mandão remetter ao Governo para terem o destino, que lhes competir, segundo o que se acha disposto na resolução tomada em Cortes a 10 do corrente mez, os requerimentos inclusos de José Morta Bomtempo, e de D. Maria Silveria de Carvalho Pinto, viuva de José Pinto de Carvalho, sobra a continuação das pensões que recebião no Rio de Janeiro. O que V. Exc.a levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exc.a Paço rias Cortes em 32 de Maio de 1825. - João Baptista Felgueiras.

Para Sebastião José de Carvalho.

Illustrissimo e Excelentíssimo Senhor.- As Cortes Geraes e Extraordinárias da Nação portugueza mandão remetter ao Governo para terem o destino, que lhes competir, secundo o que se acha disposto na resolução tomada em Cortes a 10 do corrente mez os requerimentos inclusos dos indivíduos que constão da relação junta, assignada por Joaquim Guilherme da Costa Posser, official maior da Secretaria de Estaco do negócios do Reino, com exercício deste lugar na

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Secretaria das Cortes, sobre a continuação das pensões que percebião pelo erario do Rio de Janeiro. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus Guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 22 de Maio de 1822 - João Baptista Felgueiras.

Relação dos individuos, cujos requerimentos forão remettidos ao Governo com a ordem supra.
João António Pussich capitão tenente da armada portugueza.
Joaquim José Leite de Carvalho.
D. Joanna Rita de Lacerda Castello Branco.
D. Maria Anastácia Pereira Franco.
D. Josefa Rosa, viuva de Gonçalo José, segundo tenente da armada portugueza.
D. Maria Luiza Verqueim de Barbosa.
D. Rosa Joaquina da Silva Valente, viuva de Thomaz António Gomes de Brito, primeiro tenente da brigada da marinha.
José Carneiro Pizarro, major de infantaria.
Monsenhor Francisco Xavier de Mendonça, e seu irmão António Pedro de Mello e Mendonça.
D. Thereza de Saura Thompson, viuva do capitão de fragata José Thompson.
D. Cazemira José Estrite de Araújo.
Elias José da Fonseca, capitão de mar e guerra reformado da armada portugueza.
António das Povoas de Brito Coutinho, coronel de cavallaria do exercito, cujo requerimento foi remettido pela Secretaria de Estado dos negocios do Reino em 7 de Setembro de 1821, sobre a verificação da tença, que lhe fora conferida, pelo cofre das commendas vagas.
Anna Vicencia de Oliveira, Maria do Carmo Xavier, e Joanna Perpetua, cujo requerimento foi transmittido ás Cortes pela Secretaria de Estado dos negócios da fazenda em 4 de Setembro de 1821, sobre a verificação da ordinária de oitenta réis diarios, que lhes fora concedida por portaria de 13 de Julho de 1818. - Secretaria das Cortes, em 22 de Maio de 1822. - Joaquim Guilherme da Costa Posser.
Redactor - Galvão

SESSÃO DE 23 DE MAIO.

A hora determinada disse o Sr. Camello Fortes, Presidente, que se abria a sessão, e lida a acta da sessão precedente pelo Sr. Deputado Secretario Soares de Azevedo, foi approvada.
O mesmo Sr. Deputado Secretario leu os votos em separado, assignado pelos Srs. Freire, Barroso, Rebello da Silva, Vaz Velho, Queiroga, Sousa Machado, Pereira de Magalhães, Castello Branco Manoel, Soares de Azevedo, Xavier Araújo, Ferreira Cabral, e pelos Srs. Macedo, Moura, Soares Franco , Baeta, Travassos, Gyrão, Pessanha, António dos Santos, Ferrão de Mendonça, Bispo do Pará, Beckman Caldas, Alves do Rio, Lopes de Almeida, Camello Fortes, Borges Carneiro, Castello Branco, Leite Lobo , Miranda, e Caldeira, dizendo - Na sessão de ontem fomos de voto, que se recebessem com agrado as felicitações do general Jorge d'Avilez.
É igualmente leu o voto em separado, assignado pelos Srs. Martins Basto, Varella, Borges de Barros, Gomes Ferrão, Bueno, Feijó, Ozorio Cabral Villela, Ribeiro de Andrada, Pinto da França, Bandeira, Fernandes Pinheiro, Vergueiro, Ledo, Tavares Lyra, Almeida e Castro, Moreira, Lino Coutinho, Martins Ramos, Ferreira de Sousa, Corrêa Seabra, Peixoto, Fortunato Ramos, Grangêo, Assis Barbosa, Martiniano de Alencar, Moniz Tavares, Zefyrino dos Santos, terreiro da Silva, Castro e Silva, Marcos Antonio, Filippe Gonsalves, Monteiro da França, Rodrigues de Andrade, dizendo - Declaramos , que na sessão de ontem votámos, que se fizesse suspender a expedição de tropas para a província da Bahia.
O Sr. Deputado Secretario Felgueiras deu conta da correspondência, e expediente seguinte.
De um officio do Ministro dos negócios da guerra, participando haverem-se expedido as convenientes ordens para se verificar o offerecimento de António José Gomes Chaves, de que as Cortes ficarão inteiradas.
De uma representação do corregedor da comarca da Guarda José Cupertino da Fonseca e Brito, com as suas felicitações, e fieis protestos de firme adhesão ao systema constitucional, em razão de haver tomado posse daquelle lugar: foi ouvida com agrado.
De outra do juiz de fora de Monsarás João de Magalhães Coutinho da Motta, offerecendo para as urgencias do Estado a quota parte, que lhe pertencer das prezas da bathalha de Victoria, á qual assistiu em portabandeira do regimento de infantaria n.º 24, e igualmente todos, os emolumentos, que lhe pertencerem pela prontificação de transportes em todo o tempo da sua magistratura: foi ouvida com agrado, e que se remettesse ao Governo para se realizar.
De outra do juiz de fora de Elvas Francisco Theodoro Infante da Cunha, com a expressão dos seus sentimentos cívicos, e uma solemne profissão da sua fé política, e juntamente offerecendo a favor das necessidades do Estado todos os emolumentos, que lhe pertencem pela prontificação de transportes: foi ouvida com agrado, e que se remettesse ao Governo para fazer realizar o donativo.
Do offerecimento, que faz o Sr. Deputado Bispo do Pará de 150 exemplares da sua pastoral, e outros tantos de um discurso por elle pronunciado, para serem distribuídos pelos Srs. Deputados: foi recebido com agrado.
De uma carta do Sr. Deputado Agostinho de Mendonça Falcão , participando a continuação da sua moléstia, e pedindo reforma de licença: foi-lhe concedido um mez.
De outra do Sr. Deputado Joaquim Theotonio Segurado, pedindo licença por quinze dias, pelos justos motivos que expõe: forão-lhe concedidos.

TOMO VI. Ii

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