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DIARIO DAS CORTES GERAES E EXTRAORDINARIAS DA NAÇÃO PORTUGUEZA.

NUM. 19.

Lisboa, 21 de Fevereiro de 1821.

SESSÃO DO DIA 21 DE FEVEREIRO.

Leo-se e approvou-se a Acta da Sessão antecedente.

LERÃO-SE E diversas correspondencias dos Secretarios dos Negocios do Reyno, Fazenda, e Guerra, com varios Documentos, que forão remettidos ás respectivas Commissões.

Lerão-se muitos Requerimentos, e Representações, que tambem forão remettidos ás respectivas Commissões.

A Commissão dos Poderes verificou os do senhor Manoel Paes de Sande e Castro, Deputado pela Provincia da Beira, o qual prestou o determinado juramento.

O senhor Castello Branco disse: Requeiro que outra vez se loa o protesto de alguns dos senhores Deputados. Leo-se.

O senhor Pimentel Maldonado. Leão-se os nomes dos senhores que assignarão. Lerão-se.

O senhor Castello Branco. - Tenho duvida se este protesto lançado na Acta deverá hir no Diario das Cortes. Hontem sobre objectos de muito menos importancia a Assemblea tratou do modo, e do arbitrio que deveria tornar-se para evitar os resultados da má intelligencia dos povos sobre os projectos, julgando leys effectivas o que verdadeiramente não passava de ser projecto. Se isto se julgava capaz de merecer a discussão da Assembléa, parece muito mais importante o objecto deste protesto. Pelo modo porque elle he concebido, parecerá á Nação, que a maior parte desta Assemblea tende a determinar, que os Portugueses podem igualmente professar outra qualquer Religião que não seja a Catholica Apostolica Romana. He claro que se póde tirar esta consequencia, e que póde ser tirada principalmente por homens pouco instruidos: ambas as cousas terriveis para o fim a que a Assemblea se propõe. Primeiramente põe em desconfiança a Nação com as Cortes; em segundo lugar espalha huma somente do divisão entre nós mesmos. Por consequencia huma das duas, ou o protesto se não ha de admittir, ou os Senhores que assignão nelle o devem reduzir a outra fórma, que inculque clara, e especificamente os termos da discussão. O objecto de discussão era, se nas Bases da Constituição se devia accrescentar, ou tratar de outra cousa, que não fosse a simples declararão, de que a Religião dos Portugueses era a Catholica Apostolica Romana. Eu fallei segunda vez sobre este objecto. Protestei que queria ser entendido da Assemblea, e da Nação inteira. Assentei que se ficava nisto, e que o art. das Bases ficava tal qual estava. Agora vejo hum protesto concebido em termos que se podem tirar sinistras conclusões. Por tanto protesto contra o mesmo protesto, e proponho á Assembléa, que ou elle não hade ser admittido, ou sejão obrigados os que o fizerão a dar-lhe outra fórma, que de a entender qual foi absolutamente a questão.

O senhor Bispo de Beja. - Eu julgo que este protesto não se oppõe a cousa alguma: o que se diz de huma pessoa physica, se deve dizer de huma pessoa moral... sem religião não póde existir huma sociedade civil... (Foi chamado á ordem.)

O senhor Castello Branco. - O objecto da discussão da Sessão a que o protesto se refere, foi unicamente que não era lugar nas Bates da Constituição para tratar, e discutir esta materia. Ou o protesto se ha de referir a isto, ou então eu estou prompto a discutir a questão, se a Assemblea julga que ha lugar. Assentou-se que não era lugar, e nestes termos o artigo devia passar tal qual está.

O senhor Trigoso. - Acho que o protesto deve-se reduzir só aos termos que diz o senhor Castello Branco.

O senhor Soares Franco. - A questão não era a que parece inculcar o protesto: nós dissemos que a Religião dos Portuguezes, era a Catholica Apostolica Romana: mas que accrescentando a palavra = unica = se fazia huma exclusão dos estrangeiros, e que este assumpto se reservou para a Constituição.

O senhor Borges Carneiro. - Quando dez, ou doze pessoas dizem que elles querem que a Religião Catholica Apostolica Romana seja a unica, parece supporem que os mais não querem isto; quando o que sim se estabeleceo foi, que para o Estado era a unica; mas que, podia admittir modificações para os estrangeiros, e se assentou que por agora não se pudesse dis-

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cutir. Por conseguinte, eu digo, que se devião fazer estas declarações no protesto: porque se não se admittio a palavra = unica = foi por evitar as interpretações que a isto se poderia dar.

O senhor Xavier Monteiro. - Não ha quatro dias que, presidindo o senhor Manoel Fernandes Thomaz, apresentou o senhor Borges Carneiro hum protesto, e a Assemblea decidio que não se podião fazer protestos, senão declarar cada hum e seu voto na Acta. Agora parece que se diz outra cousa, assim eu peço que se obsorve o que então se resolveo.

O senhor Soares Franco. - O protesto sahe fora da questão; a questão era, se se podia fazer alguma excepção a favor dos estrangeiros, e isto se deixou para quando se discutisse a Constituição. Assim, ainda que a causa do protesto seja verdadeira em si, he facil não o ser na essencia: e de mais póde trazer más consequencias. Deve-se declarar o motivo porque se questionou sobre isto, porque só não cada hum poderá fazer as interpretações que queira. O protesto não esta em regra.

O senhor Brito. - A palavra protesto quer dizer que se vai contra a decisão que o motiva. Nenhum Deputado tem direito de hir contra as decisões da Assembléa; o que póde fazer he declarar que asna opinião não he a que se adoptou, porem não practicar hum acto que indica sentimentos contrarios á totalidade da Assemblea.

O senhor Bordes Carneiro. - Senhor Presidente eu tambem opinei que se puzesse a palavra = unica = com tanto que se fizessem as declarações que a restringião. Por tanto desse modo he como devem expressar sua vontade os senhores Deputados que fazem o protesto. (Apoyado, apoyado.) Que não se faça entender á Nação cousas diversas das que nós queremos.

O senhor Trigoso. - Não se segue de que se julgasse, que a palavra = unica = não devia entrar nas Bases que a Religião Catholica Apostolica Romana não fosse a unica para o povo Portuguez, senão que se deixava a liberdade de poder fazer declarações depois.

O senhor Freire. - Eu approvo a opinião do senhor Xavier Monteiro. Não se devem fazer protestos, senão declarar na Acta simplesmente que se não foi daquella opinião; mas sem dizer os motivos, porque ninguem tem direito de dizer senão que não foi de certa opinião. Quando se apresenta hum protesto por escripto, não he senão para que os senhores Secretarios saibão os nomes dos senhores que protestão; mas não para que appareção os motivos na Acta, pois estes já se expenderão largamente ha discussão; logo estes senhores tem todo o direito de dizer que forão de contraria opinião ao que se decidio, e não as causas que os decidirão; e isto mesmo já foi determinado ha poucos dias.

O senhor Travassos. - Deste modo, protestando simplesmente contra a decisão do Congresso, se protestaria contra a Religião Catholica, que he justamente o contrario do que estes Senhores querem; porque o Congresso decidio, que a Religião Catholica Apostolica Romana seria a Religião da Nação Portugueza, e protestando contra isto era protestar contra a Religião. Assim parece-me que se deve fazer o protesto com as declarações indicadas.

O senhor Castello Branco. - Vou fazer huma nova moção sobre este objecto. Nós somos constituidos pela Nação, esta nos entregou os seus poderes, e confia em nossos cuidados. Entre tanto as decisões desta Assembléa Soberana tem huma regra que em tudo deve haver: entre as diversas opiniões deve sempre prevalecer a da maior parte, e a menor subjeitar-se a esta. Isto he huma regra que não merece discussão, porque tambem não he de esperar que a maioria de huma Assemblea composta de homens instruidos, em quem a Nação confia, haja de determinar cousas prejudiciaes á Nação. Por consequencia, eu faço a moção de que ninguem deve ter direito para protestar; que a palavra protesto deve ser banida dentre nós; e que em todos os casos importantes se deem os votos nominalmente; porque hão de hir ao Diario, e nelle constará qual foi o voto de cada hum dos senhores Deputados. Por tanto que não haja protestos.

O senhor Fernandes Thomaz. - Senhor Presidente, peço palavra. Eu opponho-me perfeitamente, aos protestos, sou pelo voto do senhor Castello Branco. Aqui não ha divisão, nem deve havella. Os Deputados das Provinciais, são Deputados dellas só em tanto que chegão a este Congresso, depois já não são senão Deputados da Nação. Aqui não deve haver interesses particulares de Provincias. Manter isto he dar causa á discordia, e talvez a huma guerra civil. Dous homens não podem ter vergonha de ceder a dez, nem dez de ceder a quarenta ou cincoenta. Quem quer fallar, falle, e expresse o seu voto, ninguem o constrange. Que quer dizer fazer protestos contra qualquer cousa que se faz? Por ventura o que só decidio huma vez não foi como maior senso, e circunspecção? Por ventura, até pela Logica mais trivial, não se julga bem decidido o que o foi pela pluralidade? Ha de querer (perdoe-me a expressão) ha de querer o amor proprio de seis, prevalecer contra quarenta? Eu apoyo o voto do senhor Castello Branco: que não se admittão mais protestos, quem quer fallar, falle: mas huma vez que votou, deve-se accommodar ao voto da Assemblea. (Apoyado, e applaudido.)

O senhor Castello Branco. - A votos.

O senhor Pinheiro. - Eu estou pela votação nominal; mas não pela proposição do senhor Fernandes Thomaz; porque cada Provincia póde dizer, por honra, e brio sou, o que julgar conveniente.

O senhor Castello Branco. - A ordem. Quanto se diz pela maioridade suppõe-se que tem esse brio, e honra.

O senhor Fernandes Thomaz. - Nós dentro deste recinto somos huma só cousa. Não somos partes individuaes de 6 Provincias. Cada hum tem o direito de fallar; quem quer que a Nação saiba o que diz, falle, que os Tachygraphos o escreverão, e apparecerá no Diario das Cortes; e se elles não podem escrever tudo, dê-se o voto por escripto, que ninguem se oppõe a isso. Mas dizer a cada passo, protesto, e desejar que se conheça que foi devoto contrario, quando não fallou, para, que? Quem quer isto falla, e escreve-se o que diz. Mas porque se ha de expressar o que dizem collectivamente oito, e não se ha de expressar o que cada hum diz do per si: Que mais direito tem huma pessoa que outra? Se não fallou, porque não fallou? Qual he a rasão porque não tendo fallado aqui, quer que saiba a Nação o que elle diz? Porque não fallou á sua Nação? Se elle quizer fallar á Nação, falle. Que são protestos nesta As-

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semblea? Se se permittem, não haverá decisão sobre a qual não se possão fazer protestos. Ou se tem direito, ou não se tem. Se não se tem direito, o protesto não o ha do dar; se se tem, o protesto não o tira. Isto he para fazer ver que ha unidade entre nós; e são ainda mais interessados nesta unidade aquelles que mais mostrão, que não querem ser de nossos sentimentos.

Ratificou-se a deliberativo de não se admittirem protestos, mas sim declarações de voto; e neste sentido os senhores Antonio José Ferreira de Sousa, Antonio Camelo Forte de Pina, Antonio Pereira, José Joaquim de Faria, Joaquim José dos Santos Pinheiro, Agostinho Teixeira Pereira de Magalhães, Francisco Manoel Trigoso, Thomé Rodrigues Sobral, José Pedro da Costa, José Peixoto Sarmento de Queiroz, José Vaz Corrêa de Seabra, José Homem Corrêa Telles, Manoel Agostinho Mareira Torres, João de Figueiredo, Francisco Vanzeller, Antonio Pinheiro de Azevedo e Sylva, José de Moura Coutinho, Antonio Maria Osorio Cabral, Francisco de Magalhães de Araujo Pimentel, Isidoro José dos Santos, José de Gouvêa Osorio, e Bernardo Antonio de Figueiredo, pedirão que se fizesse a declaração - de que elles, quando se discutio o artigo 15 do Projecto das Bases da Constituição, votarão que á palavra = Religião = se ajuntasse o epitheto de = Unica = o que pela maioria do Congresso foi julgado superfluo em quanto á Religião da Nação, por estar o artigo, sem carecer de emenda, lavrado com sufficiente clareza; e outro um improprio das Bases da Constituição, attentas outras relações, que tem de contemplar-se, esclarecer-se, e definir-se mo grande edificio da Constituição.

O senhor Castello Branco apresentou para se discutir, e leo o seguinte:

PROJECTO DE DECRETO.

1.° Todos os Bispos do Reyno publicarão Cartas Pastoraes, dirigidas aos Fieis de suas respectivas Dioceses, tendo por objecto recommendar-lhes a união reciproca, a subjeitão ao Governo estabelecido, e provar-lhes que as reformas introduzidas na Administração Publica, de maneira nenhuma offendem a substancia da Religião Catholica Apostolica Romana.

2.° Farão expedir ordens circulares aos Parochos de suas Dioceses, para que alem da publicação das dictas Pastoraes, procurem nas Practicas que fizerem a seus Freguezes, instruillos sobre os referidos objectos.

3.° Os Prelados Regulares escolherão Pregadores habeis, que hajão de preencher o mesmo fim nas Igrejas dos seus respectivos Mosteiros e Conventos.

O senhor Ferrão. - Já eu me queixei nesta Assemblea do fatal silencio dos Senhores Bispos Portuguezes, e tambem dos Parochos, porque recebi carta da Provincia participando-me, que alguns malvados com sinistras intenções tinhão publicado, que já em Lisboa não havia Religião, e que as crianças não se baptisavão. Requeri por tanto que os Senhores Bispos fizessem Pastoraes, e que pregassem os Parochos, que a Regeneração politica de Portugal em nada ataca a Religião Santa, que todos amamos, e antes pelo contrario ella poderia contribuir a que se acommodasse com a simplicidade do Evangelho, e com o espirito de seu Divino Fundador. He vergonhoso isto quando nos lembramos, que no tempo dos Francezes nenhum Bispo deixou de recommendar aos Parochos que prégassem a legitimidade da auctoridade que nos Regia, para que não houvesse sedições: tanto que até o Inquisidor Geral se declarou chefe da Igreja Lusitana e nesta qualidade, que não tinha, fez huma Pastoral á Nação, recommendando obediencia aos Francezes, Pastoral que ainda existe; e agora ainda não se lembrou de fazer o mesmo. Isto me pareceo reprehensivel, e eu me queixei, hontem recebi huma carta de hum digno Parodio do Bispado de Béja, que se queixa disto mesmo, que não ha Pastoraes; e mesmo que precisaria se fizessem Practicas, e se mandassem imprimir, para as fazer circular a todos os Parochos. Eu lhe mandei dizer que fizesse elle essas Practicas, por que terá mais lugar, e que eu as apresentaria á Assemblea para as mandar imprimir, e para que ellas se espalhassem pelo Reyno. Eu por tanto apoyo a moção do senhor Castello Branco. He necessario que os Parochos fação isto, porque o Povo está dividido pela malicia dos que o pertendam enganar com ruins informações.

O senhor Manoel Antonio de Carvalho. = Não tenha medo, que a Nação deixe de seguir a grande causa em que estamos empenhados. A luta não he contra o Povo. O Povo conhece quaes são os seus interesses, e conhece que cada hum de nós dará a vida por lhos conservar. Eu me horrorizo de que aquelles que devião promover estas idéas, sejão aquelles que por seus interesses, e convergencias particulares, queirão pôr estorvos a esta marcha regular; contra a felicidade da Nação, e contra a bem entendida felicidade delles mesmo. Aquelles que enchem melhor os interesses do Povo, são os que querem pôr estorvos á sua felicidade.

Mas Senhores estai firmes, que o Povo conhece os seus interesses: he verdade que algumas vezes poderá titubiar, porque não está bem dirigido; mas seus corações anhelão pela felicidade, e nós tambem anhelamos por ella, e a conseguiremos. Huns poucos interessados em que se conservem os antigos abusos hão de emmudecer á voz da rasão, mais poderosa do que a voz do interesse. Aquelles que, se levão de interesses, e que tem hum coração bem formado, são os que melhor conhecem a causa honrosa que estamos defendendo, e temos de defender, a pesar de tudo, com a evidencia dos raciocinios, contra aquelles que ainda porfião, não querendo convir nas grandes vantagens que della devem resultar. Nestas circunstancias, apoyo o que acaba de dizer tão eloquentemente o senhor Preopinante Fernandes Thomaz, e o que assim mesmo disse o senhor Castello Branco. São verdades que sahem dos seus corações: nós nos devemos empenhar para a felicidade do Povo. Quem quizer fallar falle, que para isso tem liberdade. Se pudermos, convenceremos esses malvados que tractão de semear discordias: se porem quizerem oppôr-se á força da evidencia, pouco importa; a

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Nação julgará, e ella que nos julga, conhecerá a intenção de todos, e a minha.

O senhor Borges Carneiro. - Alguns Senhores Deputados levados do interesse patriotico, talvez excessivo, hão pintado mais desordem, e desunião da que effectivamente ha. Eu acho de necessidade a moderação, e julgo que o mesmo Rey será o primeiro em annuir a este mesmo acto que se pertende. Eu Julgo que não ha esse espirito de partido: no espirito de Regeneração todos estão conformes, e julgo que se os Senhores Bispos não tem feito essas Pastoraes, será por outros motivos. Com que parece-me que bastará mandar o Governo que se expeção estás cartas, como se teor feito em outras occasiões plausiveis.

O senhor Castello Branco. - Eu não disse que a Nação estava desunida: se a Nação estivesse desunida, nós não estariamos exercitando as augustas funcções que estamos exercitando. O que disse he que tende a desunir, o não fazer ver as utilidades que do estado actual das cousas se podem seguir. Quando os povos se persuadem da sua utilidade, elles são os primeiros a promover estas variações; quando não elles mesmos as destruem. Taes são ás circunstancias em que nos achamos. Eu conheço a boa vontade da Nação em geral: sei dar valor aos heróicos esforços que se tem feito; mas se os Povos não comecessem, por ignorancia a sua utilidade, elles serião os mesmos que destruirião o que acabão de fazer. Eu não trato do presente senão do futuro, e o futuro para quem discorre he bem facil de prever, huma vez que continuem as mesmas causas.

O senhor Braancamp. - Peço que este Projecto, juntamente com outro que sé apresentou relativamente ao mesmo objecto, se declarem urgentes para se discutirem.

O senhor Castello Branco. - Senhor Presidente, requeiro que V. Exa. mande votar sobre a urgencia do meu Projecto: que se declare se he urgente, ou não; e se deve tratar-se antes, ou depois das Bases da Constituição.

Foi declarado urgente, é mandou-se cumprir por Aviso á Regencia.

O senhor Presidente participou que o Cabido da Cidade do Porto pedia licença para enviar huma Deputação a prestar sua homenagem ás Cortes. Deliberou-se que se receberia por escripto, sem Deputação, e que assim fosse na Acta honrosamente mencionado.

O senhor Secretario de novo eleito para os Negocios do Reyno prestou o determinado juramento, sendo recebido, e despedido com as prescriptas formalidades.

A Commissão das Bases da Constituição foi remettido hum Projecto de Constituição, offerecido por Manoel Gomes Quaresma de Sequeira d'Aguieira.

A de Agricultura, huma Memoria sobre Agricultura, e huma Relação Chronologica de Foraes, dirigida ás Cortes pelo senhor Frey Francisco de S. Luiz, Membro da Regencia.

Proseguio-se em discutir as Bases da Constituição, e ácerca do artigo 17.° disse:

O senhor Alves do Rio. - Approvo-o, sómente accrescentando, que se declare a successão de femea na falta de varão.

O senhor Ferrão. - Parece-me que, accrescentando-se o que se acha determinado em Cortes, podera passar o artigo.

O senhor Castello Branco. - Eu não sei se na Constituição se deverá estabelecer, que fique á escolha da Nação o chamar á successão o transversal ou, o mais proximo.

O senhor Borges Carneiro. - Parece-me ser preciso dizer-se a ordem regular de primogenitura, ficando admittidas as femeas. Todos sabem que entrando-se na linha, a primeira precede ás posteriores, na mesma linha prefere o gráo, no mesmo gráo o sexo, no gráo a idade: por isso dizendo, segundo a ordem; regular, ficando admittidas as femeas, fica tudo salvo. Quanto aos transversaes julgo ser necessario accrescentar-se.

O senhor Camelo Fortes. - He necessario fazer alguma declaração sobre a linha, porque a linha he Cognatica, ou agnatica, e mixta. Entre nós tem estado em vigor a Cognatica ou Hispanica.

O senhor Ribeiro Saraiva. - Em Portugal he bem sabida, a ordem da successão, e por isso parece que bastaria accrescentar, segundo a ordem de Primogenitura estabelecida, nas Cortes, e costumes antigos deste Reyno.

O senhor Pereira do Carmo. - Eu julgo que estão decididas todas as questões, huma vez admittida, a emenda do senhor Saraiva, porque a respeito dos, transversaes está decidido nas Cortes de 1697. Dizendo-se pois, pelas Leys estabelecidas, tem todas as hypotheses.

A final do debate, ficou o artigo plenamente approvado.

Discutio-se o artigo 18.°, e disse:

O Senhor Trigoso. - Este artigo contem duas partes: a primeira he = A Soberania reside em a Nação - a segunda he - Esta he livre, e independente, e não póde ser Patrimonio de ninguem. = Em primeiro lugar apoyo a moção do senhor Borges Carneiro, mas considero a primeira parte do artigo. Este principio - A Soberania reside em a Nação, não sei se está concebido com toda a clareza possivel: ha huma cousa certissima nesta materia, e ha cousas, que nem por isso são muito certas. A Soberania reside em a Nação, na sua origem; isto he, he livre a todos os Povos juntarem-se, escolher a fórma do Governo, e delegar a huma, ou em mais pessoas a Soberania; isto he incontestavel; com tudo não tem a mesma certeza se a Nação huma vez que em lugar da Democracia prefere a Monarchia pura ou temperada, ou a Aristocracia, conserva actualmente a Soberania. Eu faço differença de Soberania ordinaria, radical, e habitual; ou Soberania actual, a qual a Nação parece que não póde ter huma vez que delega os seus poderes. a Constituição de Hespanha definio com mais exacção este principio, e diz - A Soberania reside essencial mente em a Nação; e deduz por consequencia, logo a Nação he a unica que tem Direito de fazer as Leys Constitucionaes, e Fundamentaes. - Depois trata das pessoas a quem a Nação terá delegado os seus poderes; e por isso, segundo o espirito da Constituição de Hespanha, a Soberania que reside em a Nação he a Soberania radical, habitual, mas não a actual, depois que a Nação delegou seus poderes. A Constituição Franceza decretada pela Assemblea da Nação, e acceita pelo Rey diz = que o principio de toda a Soberania,

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e sua origem reside em a Nação, é por isso nenhum corpo moral, nenhum individuo póde exercer auctoridade que não emane expressamente della. Applicando agora estes principios geraes, que parecem hum pouco exactos, digo: que de qualquer dos modos que se considere a nossa Constituição antiga, e passagem para a Constituição seguinte, ou nós consideremos que a Monarchia Portugueza, atégora era Monarchia pura, e illimitada, ou temperada, é Constitucional; sempre vem a ser verdadeiro o principio de que a Soberania reside originaria ou radicalmente em a Nação. Os que julgão que a Monarchia Portugueza, atégora era hum a Monarchia pura, é absoluta, e agora deve deixar de o ser, parece que devem dizer, que a Soberania essencialmente residia em a Nação, que delegou, na pessoa do Soberano os seus poderes; que algumas vezes a reassumio, quando o interesse da Causa Publica assim o exigia; o que succedeo na Acclamação do senhor D. João I, e na Acçlamação do senhor D. João IV, e que agora a torna a reassumir para a depositar nas mãos das Cortes, e juntamente do Rey; por isso que ambos elles exercitão as duas partes do Summo Imperio, a saber os Poderes Legislativo, e Executivo. Os que pelo contrario entenderão que a Monarchia Portugueza foi sempre temperada, que suppõe que a Nação depositou os seus poderes nas Cortes, e juntamente no Rey, que depois os Reys pelo Seculo 15.° começárão a tender para huma Soberania pura, e illimitada, como começárão todos os Reys, devem dizer, que a Nação, delegando desde o principio os seus poderes no Rey e, nas Cortes, transferio para elles a Soberania; porém vendo que a tendencia dos Reys para os Governos absolutos era muito perigosa á Sociedade Civil, e que as Cortes estavão em desuso, julgou conveniente reassumir a Soberania, e agora a reassume para a delegar, em termos mais explicitos do que ao principio o fizera, no Rey, e mais nas Cortes. Não decido, nem entro na questão de, se foi pura, ou moderada a Soberania; o que digo he, que em ambas as hypotheses he verdade que a Soberania reside originariamente em a Nação, e por consequencia que o artigo se deverá formar, assim. = A Soberania reside originariamente em a Nação, e esta Nação tem delegado os seus poderes no Soberano actual, ou no Rey.

O senhor Moura. - Se o senhor Trigoso reflectisse bem no artigo 19.°, estava tirado o motivo da emenda do artigo 18.°, porque no artigo 19.° se diz = Sómente á Nação pertence fazer a sua Constituição, ou Ley fundamental = e depois quando distribue, e divide os poderes, diz, que a Ley he a vontade dos Cidadãos, declarada pelos seus Representantes juntos em Cortes. Em consequencia nas Bases considera-se sempre a Soberania existente em a Nação. As palavras do artigo 19.° e 22.° combinadas, com o paragrapho 18.° dão incontestavelmente á Nação toda hum exercicio de Soberania actual, e por isso não será necessario que se faça a emenda, e accrescentamento do Illustre Deputado.

O senhor Trigoso. - Eu explico o meu dicto;. Não duvidava do principio geral de que a Soberania reside em a Nação, mas então desejara que este artigo em lugar de ser o l8.° fosse o 14.°; que se reconhecesse o principio de que a Soberania reside em a Nação, e depois se tratasse das pessoas em que ella delegou os seus poderes; mas, depois de estabelecer que a Monarchia Constitucional he o Governo da Nação, que a sua Dynastia he a da Serenissima Casa de Bragança, que o seu Rey actual he o senhor D. João VI., estabelecer o principio de que a Soberania reside em a Nação, parece dar a entender que, depois de feito hum Monarcha, a Soberania actual reside na Nação.

O senhor Borges Carneiro. - A Soberania reside em a Nação, eu sempre segui este principio; e sé o Illustre Preopinante reflectisse bem, diria que a palavra essencialmente nada accrescenta. Parece confundir a potencia com o exercicio da Soberania. A Soberania subdivide-se, parte nas Cortes, parte do Poder Executivo, parte no Judiciario: estes poderes nunca podem estar em huma só pessoa, estão repartidos, a potencia está na Nação, o exercicio nas differentes Auctoridades.

O senhor Brandão. - Ainda que seja verdadeira, á proposição ennunciada no artigo 18.°, com tudo parece que se lhe deve fazer a addição do senhor Trigoso, para fixar, o sentido della, e evitar a contradicção que poderia haver entre o art. 18.° e 21.° se este fosse mal entendido. He evidente que no estado anterior ao estabelecimento do Governo, a Soberania reside, em toda a Nação, porque neste estado ainda. ella não transferio os poderes; mas parece que no artigo 18.° se não considera a Nação neste estado, mas n'hum estado subsequente ao estabelecimento do Governo, pois que nos artigos 17.° e 16.° se diz qual he o Governo que he a Monarchia Constitucional; qual he a Dynastia reynante, e qual he o Rey da Nação Portugueza. Neste estado não tem a Nação a Soberania, que tinha antes de constituiu o Governo para que transferio os poderes constitutivos da Soberania. Ficou, porem com é direito essencial de reassumir estes mesmos poderes quando lhe forem necessarios; e, este direito, que a auctoriza para entrar na Soberania, constitue huma Soberania, a que a Juris-Consultos de seculo 17.° chamão habitual, a qual reside sempre em a Nação; não porém actual, se não ha a Administração do Summo Imperio. Como se não póde dizer, constituido o Governo, que reside em o Governo; a Administração do Imperio, tambem se não póde dizer, que resida nella a Soberania actual, nem desta Soberania falla o artigo 18.°, porque se d'ella fallasse estava o artigo 18.° em contradicção com o artigo 21.°; porque neste se diz poder, e não exercicio de poder, que toca aos tres poderes Legislativos e Executivo, e Judiciario, os quaes constituem o Summo poder. O Legislativo reside nas Cortes com dependencia da sancção do Rey, o Executivo reside no Rey, e seus Ministros, e o Judiciario reside nos Juizes. Se estes poderes constituem a Soberania, se elles residem nas Cortes, no Rey, e nos Juizes, esta claro que vem a dizer, que a Soberania actual não póde ao mesmo tempo residir na Nação; e isto he o que diria o artigo 18.° se fallasse da Soberania actual. Para que o artigo 18.° não se entenda pois desta Soberania, e não se affirme o que seria absurdo, que estando no Governo, o direito de dirigir, ao qual corresponde em a Nação obrigação de obedecer, reside ao mesmo, tempo nesta a Soberania; parece necessario, ou declarar que a Soberania de que falla o artigo 18.° he a habitual, ou que a Soberania actual só reside em a Nação originariamente, enunciando a proposi-

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ção deste modo. A Soberania reside originariamente em a Nação.

O senhor Camelo Fortes. - Eu julgava que deveria pôr-se como se acha na Constituição Franceza. A Soberania reside em a Nação originariamente, porque ella póde mudar a fórma do Governo. He sem duvida, que haverá casos em que possa reassumir a Nação os poderes que delegou em huma, ou mais pessoas ou que haverá casos em que possa haver o Direito de reversão: he pois melhor dizer como se diz na Constituição Franceza = que o principio, é a origem da Soberania reside na Nação.

O senhor Soares Franco. - Quando se diz Soberania somente, entende-se já a primitiva; porem em quanto a declarar o exercicio, e o modo, tambem approvava que se puzesse a palavra essencialmente da Constituição Hespanhola; e parece-me que nisto mesmo todos estão concordes, olhando o art. por este lado: mas em quanto á outra parte do art. = he livre, e independente, e não póde ser Patrimonio de ninguem = parece-me que seria melhor dizer, não póde ser Patrimonio de alguma familia, casa, ou pessoa.

Votou-se, e foi approvado o artigo, accrescentando-se-lhe o adverbio - essencialmente - e devendo ler-se = A Soberania reside essencialmente em a Nação etc.

Discutírão-se os artigos 19.°, e 20.°,e disse:

O senhor Camelo Fortes. - He hum axioma de Direito, que a Soberania está em a Nação, e ninguem póde tirar-lha. A Nação junta em Cortes he a Soberania, assim como he antes de representada. Sendo assim, nella reside a Soberania, em todas as suas partes, e por consequencia não poderá ella ligar as mãos a si mesma, porque ninguem póde ser superior, e inferior ao mesmo tempo; por isso, se a Nação actual he Soberana, e Soberana ha de ser sempre, não póde ligar as mãos ás Cortes futuras, que são Soberanas, e per isso parece que nada se lhe devia prescrever.

O senhor Borges Carneiro. - As presentes Cortes não tratão de estabelecer Leys pata approvar, ou derogar daqui a pouco; são Cortes Extraordinarias, que querem fazer hum edificio, que as Cortes seguintes não possão derribar; debalde seria estar a estabelecer Leys Constitucionaes, e vir hum anno em que os Aulicos tivessem tanta influencia nos Representantes que fizessem com que elles derribassem todo o edificio Constitucional. Estas Cortes são de outra natureza; alem de remediar os abusos, são tambem para fundar o edificio Politico, e fazer huma Constituição que dure até á consummação dos Seculos se possivel fosse. As Leys que se fizerem daqui em diante são Leys de hum anno, ou mais; porem as Leys, e o alicerce deste edificio deve conservar-se trezentos, quatrocentos annos, e o mais que for possivel; por isso eu julgo pelo contrario, que se deve oppor huma barreira á Constituição, de modo que ella não fique dependente da Legislatura seguinte, e por isso peço que se adie a alteração das Leys fundamentaes até ao oitavo anno. Os Hespanhoes contão do tempo em que tiver sido executada em todas as partes, mas isso he indeterminado, e póde dar estorvos na practica; por isso digo, que os annos se contem desde o tempo da publicação da Constituição, digo tambem convindo as duas terças partes da totalidade dos Deputados de Cortes, isto he, convindo duas terças partes de 100. Digo mais, que he necessario, e conveniente que os Deputados tragão hum a Procuração especial para alienar este, ou aquelle art. da Constituição; porque póde muito bem ser, que humas Provincias queirão alterar hum art. e outras não; por isso he necessario poder especial das Provincias, que todos queirão a alteração, e no caso de empate se decida em Congresso.

O senhor Trigoso. - Parece que este art. foi mui sabiamente escripto pela Commissão. He verdade que numa Constituição feita deve determinar que se não altere a cada passo, porque teria muitos inconvenientes. Se a Nação Portugueza, se o Reyno Unido estivesse já representado todo, seria muito conveniente estabelecer como base, que não se póde reformar: mas como o Reyno não está todo unido, o que he de desejar, e tambem he de esperar que do Rey venha o Regio assenso; e como nas Bases, e Constituição póde haver artigos que não sejão inteiramente applicaveis a todo o Reyno, o qual tem direito de pedir modificações, por isso relativamente a todo o territorio parece conveniente estabelecer o Prazo dos 4 annos; e isto a respeito de certos artigos que dependem de circunstancias locaes, porque não podem ser applicaveis os artigos que se estabelecerão para o Reyno de Portugal e Algarves para as Provincias Ultramarinas; por isso parece-me se devem estabelecer sómente os 4 annos.

O senhor Baeta. - Duas cousas se devem considerar sobre este objecto; primeiros principios Constitucionaes e universaes: segundo principios, de ordem, e particulares: os primeiros nunca elevem soffrer mudança, e não se deve marcar Prazo em que elles possão ser revogados; os outros porem podem soffrer mudança, e por isso he preciso restringir o modo porque se deve fazer. Por exemplo a inviolabilidade do Rey he hum artigo que nunca deve soffrer mudança: a separação dos poderes, a Soberania da Nação, a responsabilidade dos Ministros, a Organização dos poderes intermediarios, o methodo da eleição; isso são disposições que não se podem alterar, e modificar: em consequencia não se devem medir pela mesma bitola os principies essenciaes, e os que são d'ordem.

O senhor Soares Franco. - Foi parecer de hum Deputado, que não poderia dar-se Prazo algum, para alterar a Constituição, porque as Cortes estavão Soberanas; que para se alterar cumpria que os Representantes trouxessem huma Procuração especial para poderem alterar, ou diminuir, que aliás as Cortes, a não estarem munidas deste poder, não poderião altera-las. Eu digo que he necessario alterarem-se alguns artigos, e que para as seguintes Cortes, o poderem fazer, devem vir munidas de poderes especiaes, porque já dissemos no artigo 18.° que a Soberania reside essencialmente em a Nação; por isso quando a Nação retoma o poder que tinha de fazer huma Constituição, ou de a alterar, e o delega especialmente em seus Representantes, então he que póde verificar-se a alteração; porque nem todas as Cortes podem, ou tem direito de alterar a Constituição. Em quanto ao Prazo, parece-me que de 4 annos he sufficiente. Em quanto á totalidade dos Deputados, parece-me que só dos que estiverem presentes, e desses o maior numero.

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O Senhor Fernandes Thomaz. - A Nação fez-nos Procuradores para fazer-lhe à uma Constituição conforme aos seus interesses; se achar que desde hoje a Constituição não he conforme aos seus interesses, ou achar que pela mudança de circunstancias o não vem a ser para o futuro, creio que a Nação póde fazer outra Constituição, porque aliás não he ella Soberana. Estamos para fazer huma Constituição, parece que estabelecidas huma vez as bases della, e estabelecida a Constituição, a regra he que deverá ser sempre observada em quanto não for derogada por outra; porque logo que a Nação constituir novos Procuradores, e constituir Leys, pouco importa que nós digamos que se não mude porque nós não podemos prescrever tempo, dentro do qual ella se não possa alterar. Nós podemos dizer agora pelo nosso entender que estas bases são boas; nós julgamos que ellas são para felicidade, e utilidade dos Portugueses; mas se a não fizer, não podemos ligar as mãos aos Portuguezes para fazerem outra pelo modo com que tem feito esta. He muito bom que a Constituição se não possa mudar todos os annos, porque traria males infinitos; convenho por isso em que se determine hum prazo, e me parece que seria necessario marcallo, porem nós nunca tivemos isto em Portugal pelo modo que vai a fazer-se; a nossa intenção he fazer huma cousa boa em utilidade da Nação, mas não sabemos se os resultados corresponderão aos nossos desejos: quatro annos será muito, se nós em vez de fazermos a felicidade dos Portuguezes formos fazer a sua desgraça; e por isso parece que seria melhor diminuir esse prazo, antes de que allongallo. Se os Hespanhoes estabelecêrão oito annos, tinhão motivos para isso; e quem sabe se isto lhe será mais mal do que bem? Por isso pouco importa que nós marquemos prazo ás Cortes futuras se ellas trouxerem, o poder para alterar a Constituição. Agora em quanto ao numero dos Deputados, que a podem alterar, deve-se entender os dous terços dos Deputados presentes; isto he o que sempre se tem observado. Em consequencia parece que para evitar os males que podião nascer de dar á Nação a idéa de que ella póde mudar todos os annos de Constituição; e ao mesmo tempo porque não temos a certeza de que esta ha de poder ser sempre a mesma, e sempre util, he necessario o prazo dos quatro annos; porque se a Nação vir que alguns artigos não convém, ella declarará aos seus Constituintes a sua vontade para os alterar. E por isso o artigo deve passar no estado em que se acha.

O senhor Borges Carneiro. - Julgo inteiramente necessarias, e indispensaveis as Procurações especiaes, porque sem ellas ninguem póde revogar a Constituição. Os nossos Constituintes puzerão nas suas Procurações esta clausula = que nos mandavão aqui para fazermos huma Constituição = e por isso estas Cortes se chamárão Extraordinarias. A Nação deo Procurações especiaes para fazer o edificio especial, que não póde derribar sem dar Procurações especiaes, e por isso estas são sempre necessarias.

O senhor Castello Branco. - Apoyo as ponderosas rasões do senhor Fernandes Thomaz. Eu não sei fazer differença em quanto á Soberania das Cortes Extraordinarias, e Constituintes, de Cortes Ordinarias, e Legislativas. He hum principio que a Soberania reside essencialmente em a Nação; as Cortes não exercitão esta Soberania senão por huma Procuração da Nação, por isso todas ellas exercitão a Soberania. Nós não podemos pôr alguma barreira, atendendo á vicissitude das cousas humanas, as quaes todas estão subjeitas a alterações, e mudanças; e por isso eu digo, que antes deve restringir-se o prazo dos quatro annos do que ampliar-se.

O senhor Baeta. - Sou de parecer que a Constituição só possa alterar-se quatro annos depois da sua publicação, sendo na 1.ª Legislatura propostos á seguinte os artigos que convém alterar, e que a alteração não possa ser feita senão pela unanimidade da Assemblea.

O senhor Vaz Velho. - Sou de parecer que este artigo não deve passar do modo porque está concebido. Este artigo he muito vago. Nós estamos aqui para evitar e obviar as arbitrariedades em qualquer dos corpos onde ellas poderem existir, seja no Legislativo, Executivo, ou Judicial. Se as Cortes Ordinarias de que aqui se falla tem o poder de mudar a Constituição quando convenhão as duas terças partes, então ou todas são Constituintes e Extraordinarias, o que he falso, ou se deixa á vontade e juiso das Cortes Ordinarias a mudança de Constituição; e então induz a arbitrariedade, por isso que os Constituintes só lhes derão os poderes ordinarios, e não os de fazerem. Constituição, para o que devem os Povos conferir aos seus Procuradores poderes extraordinarios com conhecimento de causa. A arbitrariedade he contra a vontade da Nação, logo deve evitar-se. Se me perguntão como se deve evitar, respondo: que me parece muito bem o arbitrio já indicado, a saber que em humas Cortes Ordinarias se examine, se he necessaria a mudança na Constituição; e, convindo as duas terças partes na necessidade, se faça saber á Nação, para que nas futuras Cortes confira os poderes especiaes e necessarios aos seus Procuradores para esse fim, e então passarão a ter a natureza de Cortes Extraordinarias.

Foi apoyado, e terminou o debate approvando-se o artigo 19.° tal como estava redigido, e ficando o artigo 20.° adiado para a Sessão seguinte.

Levantou o senhor Presidente a Sessão á hora do costume - João Baptista Felgueiras, Secretario.

LISBOA: NA IMPRESSÃO NACIONAL.

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