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o Véto absoluto. A terceira, que se não devião formar as duas Cameras, nem conceder ao Rey qualidade alguma de Véto. Direi o que me occorre sobre cada huma destas opiniões, e pela mesma, ordem com que forão enunciadas.

E em quanto á primeira, os senhores Deputados que produzirão esta opinião, sobre a inculcarem como mais liberal, a fundamentarão nos perigos, que podião resultar de não haver hum corpo intermediario, que servisse de medianeiro entre o Rey, e a Nação; pois que dando-se huma só Camera legislativa, e subjeita a facções, e a partidos, era muito de recear, que ré precipitasse sobre o poder ficar, fazendo então degenerar a Monarchia Constitucional (o só Governo que eu desejo, e todos nós desejamos) em Republica, e por consequencia em Anarchia. Em huma palavra adoptarão aquella mesma opinião, que nestes ultimos tempos ha sido a dos celebres Publicistas Beijamin Constant, Lanjuinais, e do benemerito auctor do Campeão Portuguez.

Eu respondo em primeiro lugar, que a machina politica he já de se mesmo muito complicada; e que os Legisladores previdentes, longe de augmentar-lhe as rodas, devem muito principalmente esmerar-se em simplifica-la quanto seja possoivel, e desviar todos os tropeços, que podem embaraçar, e empecer ao seu gyro. Ora, sendo este principio de eterna verdade, julgo eu que muito vamos complicar o nosso pacto social com a creação de huma segunda Camera; mormente quando me lembro que a Nação he huma, e que por analogia a Representação Nacional deve ser huma.

Respondo em segundo lugar, que só respeito por melhor aquella Constituição, que une parece mais accommodada aos costumes, e differentes circunstancias do paiz a que se destina: e levado deste principio he que procuro, quanto o permittem as luzes do seculo em que vivemos, conciliar as nossas novas instituições com os nossos bons, e antigos usos, e costumes. Ora, correndo eu os settecentos annos da vida politica desta Monarchia, nada vejo em sua Historia que se assemelhe com o estabelecimento de duas Cameras, que nos propõe o Senhor Pinheiro: eu não vejo senão Cortes e Rey, Rey e Cortes. Talvez que alguem diga, que nessas mesmas Cortes se contrabalançarão os Poderes, e equilibravão as pertenções dos Tres Estados do Reyno, Clero, Nobreza, e Povo; porque deliberavão em Cameras separadas: mas observo, (sobre não ser exacta a comparação), que não foi esse o nosso bom, e antigo uso e costume desde o berço da Monarchia, e que só na sua velhice, isto he, no fraco reynado do decrepito Cardeal Rey he que pela primeira vez se introduzio nas Cortes de Lisboa de 1579. Os mesmos Filippes, que forão tachados, e com rasão, de usurpadores, se conformarão sempre ao costume antigo, assim nas Cortes de Thomar de 1581, como nas de Lisboa de 1583, e 1619, e só deixou de se pôr em effeito desde a Acclamalção do Senhor D. João IV. em 1641, porque desde então começou a prevalecer o principio de dividir para reynar.

Respondo em terceiro lugar, que a segunda Camera proposta como mediadora entre o Rey, e a Nação, para sustentar o equilibrio da Monarchia Constitucional entre a anarchia, e o despotismo, não póde desempenhar os altos fins a que a destinão seus Auctores, e isto por huma rasão bem simples, e he, porque não póde guardar entre hum, e outro Poder, a mais exacta e rigorosa imparcialidade; e por consequencia falta-lhe o requisito essencial para ser medianeira entre o Rey e a Nação. Prova-se: esta segunda Camera, ou ha de sahir da massa da Nação, ou da classe privilegiada dos Nobres. Se da primeira, não se póde reputar imparcial, porque naturalmente hade inclinar-se a favor de seus Constituintes, de quem recebe poderes, e consideração. Se da segunda, alem de não admitirmos já Classes na formação da Representação Nacional, aonde só figurão individuos: he claro que tambem se hade bandear a favor do Poder Arbitrario, de quem está na posse de receber honras, e mercês, com que tem medrado á custa das outras classes. O illustre Preopinante lançou mão da antiga Historia das Republicas Grega, e Romana, e bem assim da Historia das Republicas da Itália na idade media, para fundamentar a sua opinião, sem se lembrar que os tempos são mui outros do que dantes erão: pelo contrario eu lançarei mão da Historia de nossos dias para defender a minha. Nos derradeiros annos do seculo passado huma grande Nação formou duas Cameras do Poder Legislativo, huma a que deo o nome de Conselho dos Quinhentos, e outra dos Anciãos: que resultou desta defeituosa organização social? A continuação das desgraças da França.

Respondo em quarto, e ultimo lugar, que detesto mais o despotismo de cem, ou duzentos, de que o despotismo de hum só, como sabiamente ponderou o Senhor Trigoso: mas digo, que o despotismo anda quasi sempre annexo a perpetuidade do cargo, e por isso he mais de recear do Poder Executivo, (que alem da perpetuidade, tem na sua mão as graças, e a força) do que de huma só Camera Legislativa, que dura tres mezes; que se renova todos os annos, ou de dous em dous, e dos homens mais sabios e seguros da força), que tem muito a perder em qualquer onda revolucionaria, que o mar agitado das paixões póde mui bem lançar sobre elles mesmos. Não he natural que os que tem a perder, folguem com as revoluções, e gostem da anarchia, que ellas trazem comsigo: os Sans-Cullotes de todos os paizes são os que muito se comprazem com as aguas turvas, porque nellas he que esperão fazer vantagem.

Mas se não ha duas Cameras, dizem outros Illustres Deputados, deve conceder-se ao Rey hum Véto absoluto. Eu reputo o Véto absoluto huma monstruosidade politica, porque o Rey vem, por via desta prerogativa, a embaraçar a acção do Poder Legislativo, e então rompe-se inteiramente o equilibrio dos tres Poderes: de maneira que lidando nós por nos afastarmos da anarchia vimos por meio daquella concessão, a cahir nas mãos do despotismo. Para salvar todos estes embaraços, he que o Projecto concede ao Rey o Véto não absoluto, como unico meio de conciliar todas as collisões: e he por isso; que julgo muito exagerada a terceira opinião; pois he bem sabido que competindo ao Rey a execução das Leis, muito melhor desempenhará este dever, se tiver alguma parte na sua formação. Opponho-me portanto ás duas Ca-