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DIARIO DAS CORTES GERAES E EXTRAORDINARIAS DA NAÇÃO PORTUGUEZA.

NUM. 24.

Lisboa, 1.º de Março de 1821.

SESSÃO DO DIA 28 DE FEVEREIRO.

Leo-se e approvou-se a Acta da Sessão antecedente.

LERÃO-SE, e remettêrão-se onde competia diversos Requerimentos, e Memorias; entre estas huma ácerca da necessidade e maneira de reformar a ordem dos Processos Civis.

Leu-se hum Officio do Visconde de Souse, em seu nome, e da Provincia d'Alem- Tejo, donde he Governador, prestando obediencia e homenagem ás Cortes; e outros similhantes da Camera de Thomar, e do Governador interino das Armas da Provincia de Traz-os-Montes, Amaro Vicente Pavão de Sousa. De todos se mandou fazer na Acta honrosa menção.

A Commissão Militar apresentou o seu Relatorio ácerca do Requerimento da Viuva e Filhos do Tenente General Mathias José Dias Azedo. Leo-se, e foi remettido á Commissão de Fazenda.

Discutio-se o artigo 30 das Bases da Constituição, e disse:

O senhor Soares Franco. - Duas questões se podem propor sobre este artigo: primeira, se deve existir Conselho de Estado: segunda, se deve ter as attribuições que aqui se enumerão. Em quanto á primeira sou do parecer que haja hum Conselho de Estado, mas com attribuições differentes das que aqui se lhe dão. Quando se discutio o paragrapho 21.º das Bases, sobre a distribuição dos poderes, julgou-se que huma só Camera poderia formar as Leys com precipitação, e era por isso necessario que o Poder Executivo, tivesse a faculdade de observar e propôr ao Congresso Legislativo os inconvenientes dessas mesmas Leys. Em consequencia a primeira, e huma das principaes attribuições do Conselho de Estado, deverá ser a de consultar com o Rey sobre as difficuldades que podem ter na practica os projectos de Ley: 2.ª examinar as relações com as Potencias estrangeiras, e os Tractados de paz, de guerra, ou de alliança: 3.ª o que pertence em geral ao governo do Reyno, por exemplo, formação de estradas, pontes, projectos de Agricultura, etc. Marcadas estas attribuições, devo dizer o que me parece a respeito dos empregos. O artigo diz = Este Conselho proporá ao Rey, etc., (lêo o artigo,) Eu só admittiria listas triplicadas para os empregos Civis, para os que querem ser Magistrados, porque ao Conselho póde ser presente a capacidade dos que se querem habilitar para a Magistratura. A respeito dos Ecclesiasticos, como a boa ou má conducta do Povo depende da conducta do Clero,
e he de absoluta necessidade que elle seja bom, não me parece que o Conselho de Estado proponha ao Rey os que hão de possuir empregos Ecclesiasticos: desejára que os lugares da Igreja fossem dados por Concurso na presença dos Bispos, porque estes he que conhecem da sciencia e costumes do Clero; só me parecia que o Conselho de Estado propusesse estes ao Rey, e de maneira nenhuma os outros Ecclesiasticos, porque a respeito destes deve preceder despacho ou informação dos Bispos, procedendo-se a Concurso nas Cabeças de Bispado. Os accessos Militares devem ser determinados por huma Ordenança, ou, por hum Regulamento. Pelo que parecia-me que o artigo tornasse á Commissão, para de novo o redigir, marcando as tres mencionadas attribuições.

O senhor Borges Carneiro. - As attribuições pertencentes ao Conselho de Estado parecem-me boas e alem de outras muitas deve-se incluir a de dirigir a educação do Principe e Successor da Coroa. Quanto á nomeação dos empregos Ecclesiasticos, isso depende de se saber se ha de conservar-se o Padroado Real ou não, e ha outros officios em que entra duvida se deve ou não o Rey fazer a nomeação. Para se salvar tudo isto digo, que se faça o accrescentamento desta maneira = O Conselho de Estado proporá ao Rey, etc., em conformidade do que determinar a Constituição.

O senhor Bispo de Beja. - Não posso deixar de fazer algumas reflexões sobre aparte do artigo que tra-

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ta do modo, pelo qual deve ser feita a nomeação pelo Rey, para os empregos ecclesiasticos: ordenando que o Rey nomeará hum dos tres, que forem propostos pelo Conselho de Estado.

O direito de nomear para Beneficios, ou Dignidades Ecclesiastica, não he hum direito Magestalico, não tem a sua rasão sufficiente na essencia do Imperio Civil. Compete ao Rey pelo mesmo principio, porque compete a mintas pessoas particulares. Este principio he a Concessão, que a Igreja tem feito, e faz deste direito a certas pessoas que fundárão, e dotárão algumas Igrejas, ou por algum outro justo motivo, v. gr. em remuneração de serviços feitos em favor da Igreja.

Desde que o mundo he mundo sempre tem havido Collegios Religiosos, sempre houverão Pontifices, Sacerdotes, para exercitarem as sagradas funcções, os quaes tinhão o cuidado, e inspecção em todos os negocios relativos á Religião; e sempre foi hum direito privativo do Collegio Religioso a eleição dos Ministros Sagrados. Desta verdade ninguem póde duvidar, senão quem não tiver lido a historia Antiga de todos os povos: Ora a Religião Catholica que felizmente professámos e jurámos manter, fórma hum Collegio Religioso approva-lo pelo Governo; logo compete-lhe o mesmo direito, que sempre competio a todos os Collegios Religiosos.

He verdade que a Igreja como está no Estado, e pela sua economia exterior póde algumas vezes causar algum prejuizo á Sociedade, por isso deve estar debaixo da inspecção do Governo Civil, e este tem todo o direito de repellir o damno, que lhe possa causar. Por esta rasão ninguem duvida, que o Governo Civil póde fazer regulamentos sobre o subsistencia do Clero, reducção do seu numero, secularização dos Regulares. Pode determinar, que os eleitos, ou nomeados não seja o instituidos, ou providos, sem que preceda o Placet; porque póde muitas vezes recahir a eleição sobro algum subjeito, que facilmente possa abusar de grande influencia que a Religião sempre teve no espirito dos povos; mas não póde o Governo Civil tirar á Igreja a faculdade, que lhe he inherente de eleger os seus Ministros: e por tanto todo o direito do Poder Civil, pelo que respeita á eleição, ou nomeação dos Ministros da Igreja, limita-se ao Placet.

He hum principio certo, que qualquer, em regra, póde ceder o seu direito a favor d'outrem: ora isto he o que a Igreja practicou desde o principio do seculo 7.º O Concilio Toletano IX. em 655 foi o primeiro que concedeo aos Fundadores das Igrejas a faculdade de nomear ou assentar hum Clerigo idoneo ao Bispo para este o instituir na Igreja. Pelo decurso do tempo passarão os Pontifices Romanos a conceder o mesmo direito aos Principes, e pessoas poderosas, em attenção aos grandes favores, e beneficios, que tinhão feito á Igreja. Logo á Igreja he que compete regular este direito, e estabelecei aquellas restricções que julgar convenientes; visto que se trata de hum direito, que della dimanou, e de que foi Auctora. O que o Illustre Deputado acabou de ponderar, sustentando, que não devia ser feita a nomeação pelo Rey para os empregos ecclesiasticos na conformidade do artigo, não póde ter lugar; porque isto era destruir o direito do Padroado, e as Cortes que estamos celebrando não tem esta auctoridade. Não devemos comparar estas Cortes com aquellas que antigamente se celebravão nas Hospanhas, e Allemanha, Por quanto aquellas erão huns verdadeiros Concilios Nacionaes: assistião a ellas os Grandes do Reyno, os Bispos, e Abbades. Quando se tratava de materias disciplinares deliberavão os Bispos, quando se tratava da disciplina Monástica deliberavão os Abbades, e quando se tratava de negocios Civis, e politicos deliberavão os Representantes da Nação. Porem estas Cortes que estamos celebrando representão a Nação unicamente no que diz respeito ao Governo, e consequentemente não podem legislar em pontos meramente ecclesiasticos, e que são do direito privativo da Igreja.

Em segundo lugar observo que no dicto artigo não se faz differença entre Beneficios fundados em bens da Coroa, e Beneficios fundados em bens Patrimoniaes. Esta differença não se devia omittir. Por quanto, a respeito dos segundos os Senhores Reys deste Rey no estão na mesma rasão de qualquer Padroeiro particular: ora assina como qualquer Padroeiro tem huma faculdade illimitada de apresentar o Beneficio em qualquer Clerigo idoneo, que lhe agradar; porque rasão os Senhores Reys deste Reyno hão de ser de peior condição, e não hão de poder gosar do mesmo direito, de que gosão os outros Padroeiros?

A' vista pois das rasões ponderadas concluo que, exceptuando o Placet, o Governo Civil não póde restringir a faculdade que a Igreja concedeo aos Padroeiros; é julgando que he conveniente fazer alguma innovação, se deve recorrer a concertallas com a Sé Apostolica, ou esperar pela celebração de hum Concilio Nacional.

O senhor Arcebispo da Bahia apoyou o voto do senhor Bispo de Beja.

O senhor Gouvea Osorio. - Não estou em nada sobre a opinião dos senhores Preopinantes. O direito de Padroado foi hum anzol com que os Ecclesiastieos quizerão fazer sua propria huma cousa que o não era: foi levantado no seculo 6.°, abusarão delle no seculo 12.°, e he hum ponto de disciplina que deve ser reformado neste Congresso.

O senhor Pimentel Maldonado. - (Leo o artigo) Parece-me que o senhor Bispo de Beja não se opporá a este artigo, entrando na verdadeira intelligencia delle: aqui não se decide quaes são os Empregos que o Rey ha de nomear: a Constituição he que ha de determinar isto; ninguem fica esbulhado dos seus direitos, segundo o que está determinado neste lugar, nem he de temer que o fique na Constituição que se vai a fazer. - Haja de nomear = diz o artigo: estas palavras patenteão com toda a evidencia que por ora não se decide cousa alguma sobre a qualidade dos empregos Civis, Ecdesiasticos, e Militares, cuja nomeação o Conselho de Estado deve propor ao Rey.

O senhor Ferreira Borges. - Este artigo, Senhores, parece-me concebido mui vagamente, deixando-se a composição do Conselho de Estado ao modo, que a Constituição determinar; quando eu opino que a

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base deve conter os elementos, e attribuições desse Conselho.

A essencia do Governo Representativo consiste na representação, e separarão dos poderes: na primeira, porque he impossivel a hum Povo inteiro o exercer a Soberania: na 2.ª porque accumulados os poderes destruir-se-hia a Liberdade.-Daqui nasce a necessidade de hum Corpo intermedio Conservador, - e chamo a este Corpo Conselho de Estado. Este deve ser popular na proporia, - eminente nos elementos, e real na nomearão. - Os seus caracteres devem ser a independencia, a inercia, e a perpetuidade.- Independente, para te não encostar ao poder de que dependesse. - Incite, para não obrar com movimento proprio, donde exultaria a tyrannia.- Perpetuo não em bens ou dignidade na mesma familia, mas em virtudes, merecimento, e espirito patriotico.- Designo estes caracteres para distinguir este Corpo, que julgo necessario, daquelloutra Camera alta repellida na discussão do artigo 21, a cuja existencia não acquiesci. Considero no Conselho de listado huma Magistratura moderada, vitalicia, creada por Ley Constitucional para evitar os abusos, e restabelecer a harmonia dos poderes publicos, isto he, os recursos do Poder Executivo, e as pertenções democraticas.

Considero que elle deve ser consultado em todas as materias graves proprias do Poder Executivo. - E que se não deve temer, que algum dos dons poderes se attribua direitos ou influencia sobre este Corpo; porque separa ser formado carece de ambos, para ser conservado não carece de nenhum. - Eu diria pois que no artigo se declarasse que o Conselho de Estado seria vitalicio, composto de homens os mais eminentes em virtudes, talentos, e patriotismo. - Que a sua proposição será das Cortes, em listas triplicadas, e que a escolha pertencerá ao Rey.

O senhor Moura. - Eu acho que são de muita importancia as attribuições mencionadas pelo illustre Preopinante, mas como no fim do paragrapho se declarou que ellas deverião ser marcadas na Constituição, parecia bastante indicar assim nas Bases que haverá hum Concelho de Estado pelo modo que determinar a Constituição. Se na determinação destas attribuições não houver a independencia, inercia, e perpetuidade que marcou o senhor Ferreira Borges, então he que competiu! objectar á formação deste Concilio; mas huma vez que se indicou que haveria hum Conselho de Estado, nas bases, que são os primeiros elementos do edificio, bailava dizer o que se acha dicto no artigo. - Este Conselho proporá ao Rey - diz o artigo: este Conselho he o Conselho do Rey: rota indicado que elle, como Conselho, não deve assumir mais poderes do que hão de competir ao Rey: ao Rey compelem todas as attribuições do Poder Executivo; logo, a elle só lhe compete o aconselhar o Rey no exercicio destas attribuições: huma vez que he Conselho do Rey ha de ter necessariamente a inercia, e não ha do obrar per si: o Rey pede Conselho nos casos determinados pela Constituição, e o Conselho dá o seu parecer. Assim, huma vez designadas estas attribuições, parece que não he preciso dizer-se mais nada.

O senhor Borges Carneiro. - Julgo inteiramente necessario que se declarem nas Bases as attribuições marcadas: não sejamos mesquinhos em palavras que podem dai-nos argumentos. Se o Conselho de Estado for nomeado pelo Rey, podem seguir-se glandes inconvenientes. Os Hespanhoes forão mais acautelados, e disserão. Haverá hum Conselho, que será composto dos Membros das Cortes: nelle entrarão quatro Ecclesiasticos, e não mais; entrarão quatro Grandes do Reyno, e não mais; e os outros devem ser escolhidos pelas suas letras, ou serviços. Se isto passar até á Constituição, poder-nos-hão fazer argumento com esta falta de palavras: que custa a dizer. = Nomeados pelas Cortes? = Estas duas palavras removem tristissimas consequencias. Se o artigo passar como está, poderão dizer que todos os Empregos hão de ser nomeados pelo Rey: que custa a dizer. = Segundo nomear a Constituição? = Não sejamos mesquinhos em palavras, e peço que torne o artigo á Commissão, para se desenvolver mais.

O senhor Madeira Torres. - Quer o senhor Borges Carneiro huma circunstancia que eu me recordo ser impugnada por hum dos nossos Periodistas, dos que escrevem em Londres. Querendo o Illustre Preopinante que o Conselho seja nomeado pelas Cortes, como elle ha de ser responsavel as mesmas Cortes, parece incoherente que nisto tenha influencia o Congresso; por isso, em quanto á clausula de ser o Conselho nomeado pelas Cortes, eu não me conformo; e antes lhe substituo a de ser escolhido pelo Rey, a quem ha de coadjuvar, e de alguma sorte dirigir no exercicio do Poder Executivo; concorrendo nos Membros de que for composto, e nas attribuições do seu cargo, as clausulas que estabelecer a Constituição.

O senhor Castello Branco - A meu ver a questão reduz-se a isto: se hade entrar nas Bases a organização clara, e explicita do Conselho de Estado, ou se ha de ficar para a Constituição? A Assemblea deve decidir sobre isto, quero dizer, se neste artigo se deve organizar completamente o Conselho de Estado, e por consequencia antecipar-se huma parte da Constituição; então deve tornar á Commissão, para anticipar-se esta mesma parte da Constituição: mas parecia-me que nas Bases bastaria o indicar-se, que no systema do exercicio do Poder Executivo havia entrar o Conselho de Estado como contrapeso, e depois pertencer á Constituição o organizallo, assim como outros corpos intermedios, que entrão no systema do Poder Executivo; por isso a questão reduz-se a saber, se hade entrar nas Bases a organização do Concelho de Estado, ou se o artigo hade pasmar tal qual como está, e se hade reservar para a Constituição.

O senhor Gyrão. - Eu apoyo o senhor Borges Carneiro.

O senhor Margiochi. - Parece-me que a primeira questão, que se devia a alar era, se deve existir este Conselho de Estado. Os Legisladores de Cadiz terião feito huma obra sobrenatural, quando fizerão a sua Constituição, senão tivessem o Capitulo 7, e Titulo 4 da mesma Constituição. Na verdade que cousa mais nobre do que estes Legisladores, depois de hum pequeno intervallo da sua Deputação, entrarem

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a massa dos Cidadãos, sem esperança de remuneração alguma, ficando sómente com o gozo da Opinião Publica, e com os merecimentos ou descredito que tivessem merecido? Porém este principio tão nobre, estão desinteressado, já desmanceado com aquelle grande Conselho, que estabelecêrão para procurar alli a remuneração de seus serviços. Eu tenho lido por algumas vezes a dicta Constituição, e sempre que se falla em Conselho de Estado me esquece o para que elle serve. Agora que vejo formar entre nós hum Conselho de Estado, e darem-se-lhe certas attribuições, digo que me parece que elle se poderá dispensar. Para que se constitue este Conselho de Estado? he para formar listas triplicadas a fim de o Rey nomear? (leo o artigo). Para isto parece-me que muito bem se póde deixar de formar Conselho. Pelo que toca aos Ministros, parece que estes, visto serem responsaveis (se he que he effectiva a sua responsabilidade, porque muito poucos Ministros tem sido accusados e quasi nenhuns punidos) parece que elles devem escolher sujeitos de sua confiança, e capacidade; tem para isso optimos meios, tem concursos, tem informes das Repartições, onde se conhece perfeitamente os que são uteis para os Empregos; porque geralmente os Camaradas he que se conhecem huns aos outros; pede-se huma lista, pergunta-se quaes são os bons Officiaes, e marca-se logo ha a certo numero delles. Os Ministros he que deve, procurar estes homens para poder ter lugar a sua responsabilidade; querer hum Conselho de Estado só para isto, he conservar o foco de intrigas que ardente existia; he conservar esta mesma clientella desta sua parte, e patronagem da outra; he augmentar a difficuldade dos pertendentes. Atégora só fazião humiliações aos Ministros de Estado para elles os lembrarem ao Rey, agora terão que procurar todos os Conselheiros de Estado; terão de se acostumar a inclinar-se, e ficarão inclinados para sempre: que he o mesmo que acontece aos Bachareis, com os Ministros do Desembargo. Em consequencia ficava isto sendo origem de grande Servilismo; por isso não sou de opinião, que este Conselho se forme só com estas attribuições. Agora se lhe quizerem dar attribuições politicas peior será ainda; porque tendo alguma influencia no Poder Executivo, elle não póde servir senão de paralysar o seu movimento que deve ser muito accelerado. Se he para suspender o Poder Legislativo, tambem não lhe acho utilidade alguma; de maneira que este Corpo não póde servir senão para ser origem muitas vezes da desordem do Estado. não sei pois para que elle seja necessario. Só se fôr para substituir o Tribunal da Inconfidencia, ou Inquisição. Que he o que eu vejo? Andar procurando os homens mais agradraveis, que são tambem de ordinario os mais inhabeis, e dizer-se logo delles - He hum homem prudente, tem muita madureza, he hum homem e paz, serve para tudo. Estes he os que são julgados habeis para formar hum Conselho de Estado, que ha de ser vitalicio; e até não de chegar a huma idade prevecta, acertar com a Medicina de Paracelso, e ser eternos, ou huma especie de Nestores. S. Magestade escolhe hum Conselho composto de alguns 16 Membros: esses tem morrido todos mas não vemos que S. Magestade tivesse muita saudade delles, porque não tornou a escolher; pois se S. Magestade não tem saudade delles, eu pela minha parte tambem não.

O senhor Guerreiro foi de parecer que não houvesse Conselho de Estado.

O senhor Borges Carneiro. - Deve haver Conselho de Estado. Bastava só que elle tivesse a seu cargo a educação do Principe Successor da Coroa, para elle dever existir. De mais, elle serve para a nomeação dos Empregados publicos, porque não se deve fiar a hum só homem esta nomeação. Se o Rey tiver direito de nomear as pessoas que hão de servir os Empregados publicos, nomeará geralmente fallando aquelles que tiverem mais empenhos, e todo o Mundo sabe que a felicidade da Republica depende dos Espregados publicos: quando são rectos, são os Povos felizes; quando não tudo he transformado. A mola real do Estado he ter bons Empregados, e sendo a sua responsabilidade effectiva, logo se dá felicidade publica. Não se deve confiar a sua nomeação a hum só homem, mas sim a hum Conselho de Estado: os que chegarem á idade de 80 annos devem ser aposentados com honra, e ordenados: não devem ter cuidado nos negocios, porque já não tem energia; a nossa Ordenação diz, que os que tem 50 annos de idade devem ser aposentados. Eu supponho hum Conselho de Estado na qual o dos Hespenhoes, em que entrem quatro Prelados e mais não, quatro Fidalgos e mais não, o resto deve ser nomeado pelas Cortes, segundo as suas virtudes e talentos. Não digo que sejão vitalicios porque isto dará a Constituição; digo que sejão nomeados pelas Cortes, porque se forem nomeados pelo Rey, termos huma segunda Camera.

O senhor Castello Branco. - Quero fallar sobre a questão, se deve haver, se deve existir hum Conselho de Estado ou não. Tenho ouvido alguns dos Illustres Preopinantes votarem contra a existencia deste Conselho dizendo, que elle he hum Corpo improprio para sustentar a Liberdade, e por consequencia, que a idéa da creação, e hum Conselho de Estado não devo existir entre nós. Eu olho isto por hum lado de muito differente, e considero a creação de hum Conselho de Estado como huma idéa a mais liberal, e como tal assento que a sim a adoptárão os Redactores da Constituição Hespanhola. As paixões levão o homem a ser despotico: partindo deste principio pois, que existe na Natureza humana, o Poder Executivo o concedido ao Rey he de huma tal extensão, de huma tal extensão, de huma influencia tão desmedida na sociedade, que aquelles que tratão de estabelecer huma Constituição, por maiores que sejão os seus cuidados por as mais fortes barreiras ao Poder Executivo, nunca serião nisto demasiados. Eu conformo-me inteiramente com o systema de hum tão grande Publicista como Mably. Mably, tratando esta materia, e o modo, para assim dizer, de neutralizar o Poder Executivo, ou de reduzir aos termos em que convem á sociedade que elle seja executado, não achou meio nenhum senão dividillo por muitos corpos: necessariamente esta divisão ha de produzir os melhores effeitos, porque em vez de se deixarem livres as paixões

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de hum ou cinco homens, se expõe ás paixões de mais individuos: por consequencia complicando-se mais isto, virá a servir de embaraço e de barreiras ao despotismo; e he neste sentido que eu adopto o Conselho de Estado, como hum contrapeso que se põe ao Poder Executivo confiado ao Rey. Dizem que para isto bastão os Ministros, eu não acho que o voto de cinco individuos seja sufficiente para contrabalançar o Poder do Rey; estes homens pelos seus officios trabalhão immediatamente com o Rey, são unidos á pessoa do Rey no exercicio dos seus empregos; isto laz que o Rey tenha constantemente a toda a hora hum meio de chamar os estes homens, e dentificallos com as suas proprias propensões, e vontades. As propensões, e vontades do Ministro de Espado, por meios indirectos, que a ninguem são occultos, muitas vezes causão muitos damnos. Ora senhores vamos a pôr hum Conselho de Estado, não como atequi era composto, mas hum Conselho de Estado em que as Cortes influão, ou na sua nomeação, ou nas attribuições que lhe hajão de dar. Hum Conselho de Estado composto de homens liberaes, que tenhão em vista o bem, e felicidade da sua Patria. Necessariamente este contrapeso que vamos a pôr ao Poder Executivo do Rey, e seus Ministros, ha de produsir em favor da Liberdade o melhor effeito possivel.

O senhor Moura. Eu convenho com as idéas do senhor, Castello Branco. Imaginava, e imaginei, que nos Governos Representativos todo o segredo estava em prevenir a acummulação do Poderes: da acummulação resulta o despotismo, da divisão resulta a sabedoria; logo que estejão bem divididos os poderes, segue-se a boa organização do systema Constitucional. Fundado nestes principios imaginei que o Conselho de Estado servia de contrapesar o Poder Executivo. Tem-se observado, que elle he que tem o maior poder e que podia abusar delle, e que por consequencia se lhe deveria pôr huma barreira. Imaginava que a unica barreira para o conter nos seus limites, era o estabelecimento do Conselho de Estado, que punha o Rey na dependencia deste Conselho para o ouvir nas materias arduas d'Administração Publica, e o punha nas circunstancias de não abusar tanto do Poder Executivo. A nullidade que lhe encontra o senhor Margiochi he mais jocosa que bem fundada; porque realmente, se he só para prevenir a clientella e patronagem, ou adio que tirar a clientella e patronagem das mãos do Conselho, e pô-la nas mãos dos Ministros, ou do Rey, he fazer dependente, de hum, o que póde estar na dependencia de 3, ou 4; e por isso mais se póde abusar desta clientella estando o poder absoluto, e arbitrario nas mãos do Rey, e seus Ministros, e o que no Conselho de Estado. Em quanto á outra inulidade, o Conselho de Estado, não evita a responsabilidade, esta existe sempre; o Conselho não he para aconselhar os Ministros, e para que estes hajão do ceder absolutamente a tudo, he só para o Rey, e para aconselhar este a que não abuse do seu poder, e não se entregue arbitrariamente aos abusos de suas paixões:

O Senhor Margiorchi. - O honrado Preopinante esqueceo-se do que eu disse, escondeo o principal fez que não ouvio; eu disse que os Ministros de Estado tinhão meios legitimos, tinhão concursos, informações de Repartições; supprimio tudo isto. A cousa não he jocosa, he mui séria; dizer que he para pôr embaraço ao Poder Executivo he hum engano; dizer que he o Conselho do Rey, o Rey nunca se se servirá delle: de que serve pois o Conselho? não serve de nada. O Rey sempre hirá buscar para os Empregos aquellas pessoas que lhe parecer. Não trato pois isto de huma maneira jocosa, a cousa he muito seria, mas eu quiz misturar o serio com o jocoso.

O senhor Castello Branco: - Eu quando defiro á existencia do Conselho de Estado, proponho-me ser coherente nas minhas idéas; quando o considero como contrapeso grande ao Poder Executivo, já se vê, que necessariamente quando for a dar o meu voto para a redacção da Constituição, heide exigir que se declarem os casos, e não poucos, em que o Rey não possa nada obrar sem concurso do Conselho de Estado. Porque ficando ao arbitrio do Rey servir-se ou não delle, estava claro, que o vinculo vinha-a ser nenhum. Em quanto a dizer-se que havia outros meios pára a nomeação dos Empregados, sem ser preciso recorrer a hum Corpo, que não fosse estabelecido para isto, e que vem a ser a informação das Repartições competenses, direi que primeiramente; o Conselho de Estado não póde conhecer todos os individuos, que ha nas Provincias, necessariamente se ha de servir das mesmas informações; mas eu conheço perfeitamente o espirito de partido, que existe em todas as Corporações, mesmo o conheço pela practica; em consequencia disto póde haver grande perigo, senão houver hum Corpo, hum Subjeito que examine estas informações, e que tire o perigo do espirito de partido, commum a todas as Corporações. Quando se trata n'hum Corpo de Desembargadores? de escolher hum individuo para hum Emprego, não lembra senão hum Desembargador; quando se trata entre eclesiasticos de nomear hum individuo para hum Emprego, não lembra senão hum Ecclesiastico; quando se trata entre Militares, não lembra senão hum Militar; porque de ordinario não lembrão senão aquellas pessoas com quem estamos costumados a viver, e com quem temos de relações; por isso reprovo, que a escolha seja dependente só da informação das Corporações. Quero que haja hum Corpo que escolha, e separe o verdadeiro do falso, porque creio, e todos sabem quanto a segurança da Liberdade depende, da escolha dos individuos que entrão nos lugares Publicos.

O Senhor Ferrão. - Não he necessario Conselho de Estado, e sigo a opinião do senhor Magiorchi. Ou o Rey ha de ser obrigado a seguir o seu voto, e então diminuir-se a responsabilidade dos Ministros, ou então ha de ouvir o Conselho dê Estado, como póde; ouvir outros quaesquer Conselhos. Se não está obrigado
a seguir o Conselho de Estado, então o que os Conselheiros lhe disserem será vox clomantis in deserto. Para que he necessario Conselho de Estado? Conselhos póde o Rey toma-los com os seus Ministro

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Quanto ás listas, triplicadas que deve apresentar para escolha dos Empregados publicos, estou certo que nas Repartições correspondentes, como disse o senhor Margiorhi, he que se conhece os que são verdadeiramente benemeritos. Eu com os meus Condiscipulos em Coimbra sabiamos quaes erão os melhores Mestres, e os melhores Estudantes: o mesmo acontece em todas as Repartições. Na Contadoria do Thesouro Publico conhece-se qual he o mais habil Contador, nos Militares o mais distincto pelos seus talentos e valor, nas Corporações Ecelesiasticas eu conheço qual he o melhor Bispo, qual o melhor Sacerdote, qual o melhor Parocho. Por tanto não he preciso recorrer a Conselho, não he necessario que elle exista para conhecer as qualidades de que devem ser revestidos os Empregados: basta que os Ministros o conheção. Quanto ás listas triplicadas parece-me que a Constituição ha de dar numa fórma a cotas Commissões. Em quanto aos Empregos Ecdesiasticos eu persuado-me, e desejarei muito que a Religião Christan seja levada á simplicidade dos primeiros seculos em que não havia Padroado, os Povos nomeavão os Bispos, elegião-se os que tinhão melhor testimunho para serem admittidos ao Estado Ecclesiastico, e por isso acho que o Conselho de Estado não se precisa por nenhum principio.

O Senhor Castello Branco. - Fallo terceira vez sobre esta materia. Eu mostrei com razões sobre o artigo correspondente quanto me oppunha á segunda Camera: agora não se pense que eu quero subtituir a ella o Conselho de Estado: eu não lhe dei a minima influencia sobre o Poder Legislativo, o que disse foi que o Poder Legislativo não precisava de contrapeso, antes pelo contrario que elle era muito fraco, e precisaria mais algumas attribuições para se contrabalançar melhor como Executivo. Agora declaro solemnemente, que não he minha attenção dar influencia alguma a este Conselho de Estado: eu o considero como contrapeso do Poder Executivo, e sem relação com o Poder Legislativo.

O senhor Travassos. = Não pertendo que o Conselho de Estado tenha influencia nos Poderes; sómente recordo que, para impugnar a secunda Camera se disse, que o Concelho de Estado havia de ser o Corpo intermedio entre o Poder Legislativo, e o Executivo.

O senhor Miranda. - Parece-me desnecessario o Concelho de Estado: porem julgo conveniente que os negocios politicos se distribuuo, que as Repartições se dividão, e que á testa de cada huma esteja hum Ministro, hum Secretario de Estado, o qual conheça das pessoas habeis para os empregos, e as apresente a ElRey.

O senhor Soares Franco. - A questão tem mudado de face. Tem-se examinado se he necessario hum Concelho de Estado, e a mim parece-me que não póde deixar de o haver, he necessario sim saber as suas attribuições. Tem-se dicto que pile não póde existir, que teria grande influencia no Poder Executivo; mas a meu ver o Conselho ha de ser nomeado pelas Cortes. Tem-se dicto que hc necessario grande actividade no Poder Executivo, e que esta poderá ser estorvada pelo Conselho; mas ha algumas cousas em que o Poder Executivo necessita deliberar: por exemplo, nos Tractados com as Potencias Estrangeiras, sejão de Paz, de Guerra, ou de Allianças, etc. Não hade deliberar só o Rey, he necessario que haja hum Corpo com quem este delibere, com quem tome Conselho; e eu digo, que todas as vezes que ha necessidade de haver deliberações, ha necessidade de Conselho de Estado. Quanto ás Listas triplicadas, não convenho nisto a respeito dos Ecclesiasticos: parece-me que se poderá dizer: = Este Conselho proporá ao Rey, etc. = conforme o modo que na Constituição se determinar. Este Conselho huma das suas attribuições he a de consultar com o Rey sobre os projectos de Ley. Nas Cortes tractamos de reformar huma Ley: he necessario que alguem examine se a Ley tem difficuldades na practica, e para isto deve ser hum Corpo nomeado pelas mesmas Cortes, hum Conselho de Estudo. Assim he o meu parecer, que haja hum Conselho com as attribuições que elle, o pelo modo que expuz.

O senhor Alves do Rio. - Temos duas questões sobre este artigo: a primeira he, se convem a existencia do Concelho de Estado: a secunda quaes as suas attribuições. Eu assento que não deve haver Conselho de Estado; seria melhor que houvesse hum Conselho de Ministros, e hum Chefe de Ministros; e que o Rey não despachasse sem Ministros com responsabilidade. Eu não posso considerar Corpo algum junto do Poder Executivo que tenha influencia nos Magistrados, porque o Rey tem sempre a liberdade de chamar quem quer: se elle he de boa fé, tem todos os Empregados publicos, tem toda a Nação para o aconselhar; e se elle he de má fé, então de nada serve o Conselho de Estado; por isso ou quereria que não houvesse similhante Conselho: a questão tem sido se o deve haver, e eu quereria que se questionasse, se deverá haver Conselho de Estado sem responsabilidade.

O senhor Borges Carneiro. - Senhor Presidente, parece-me que deve ficar adiada esta questão.

O senhor Presidente. - Parece- me que se tem questionado huma cousa, sem saber o que ella he: ainda te não sabe quaes são as attribuições do Conselho de Estado, e já se distingue se elle he util ou não. Por isso parecia-me bom o que propõe o senhor Borges Carneiro, fique este objecto adiado para depois se discutir, e tratar das attribuições.

O senhor Moura. - Parece-me melhor que torne á Commissão, para dizer quaes sejão essas attribuições.

O senhor Presidente. - Então não he de pouco momento o ter em consideração as reflexões do senhor Bispo de Beja a respeito ao Padioado: não seria talvez máo que a Comungo individuar-se o modo porque devia ficar para o futuro, porque deverá individuar-se tudo quanto ha de fazer o Conselho de Estado.

Foi apoyado, e decidio-se que o artigo tornaste á Commissão para especificar as attribuições do Conselho de Estado.

Discutio-se o artigo 31.°, e disse:

O senhor Gyrão. - Parece-me que a este arti-

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go se deve fazer hum additamento, e he á palavra = detrminada - ajuntar - exclusivamente = não ficando subjeito a tributos nenhum genero superabundante.

O senhor Soares Franco. - O artigo está muito bom: trata da Ley geral, e não póde ser se não esta. = Será determinada (accrescentaria eu) annualmente por Ley das Cortes = porque de anno em anno a necessidade do Estado he o typo o certo porque se poderá conhecer o modo de constituir os tributos.

O senhor Gyrão. - Parece-me com tudo necessario o meu additamento.

O senhor Moura. - Isso he mais proprio da Constituição do que das Bases: a Constituição he o edificio, e nós estamos a lançar os fundamentos do edificio.

O senhor Macedo. - Como o artigo diz = Será determinado por Ley das Cortes = parece inculcar que ha Ley sem ser das Cortes: por isso parece melhor dizer = Será determinado por Ley = e se por esta expressão se tinha em vista o constituir a imposição das tributas impedimento da Sancção Real, isso então será necessario expressala.

Julgada a materia bastante discutida, ficou approvado o artigo, deliberando-se que depois da palavra = determinada = se inserisse o adverbio = exclusivamente = devendo lêr-se. = A imposição dos tributos será determinada exclusivamente por Ley das Cortes.

Discutio-se o artigo 32.º, e disse:

O senhor Soares Franco. - Tenho alguma cousa a dizer sobre este artigo: nós não podemos estabelecer decisão a respeito da divida Publica, sem se saber qual ella he: huns dizem 60 milhões, outros 80, outros 100; por isso he bom que se saiba, para se estabelecerem bens nacionaes, ou encontros, ou alguns tributos, etc. he necessario que se sabia o alcance se tomarem todas as medidas.

O senhor Xavier Monteiro. - O artigo deve passar tal e qual está, porque para se tratar de pagar, e procurar mais para isso, não he necessario saber quanto se deve, basta saber que se deve: por isso para o Estudo tratar do pagamento dos seus Crédores, basta saber que sem divida, e que he muito grande: e não deva esperar para a Equidação total, porque isso seria alterar o pagamento, e desanimar os Crédores. Por outro o artigo como está, está bom: vai-se liquidando a divida, he hum, ou dous, ou quatro militares, prepara-se de ante mão esta quantia, e vai-se satisfazendo, sem ser necessario esperar pela liquidação total.

O senhor Borges Carneiro. - Não só digo que he conveniente, mas que he urgentissima a necessidade de determinar hum dia na semana para se tratar dos objectos da Fazenda Publica, pois que he indispensaveis pela rasões já ponderadas que se tirem os melhoramentos das Commendas, nem se provão os Beneficios Ecclesiasticos, e isto não se deve deixar para quando estiver liquidada a divida Publica.

O senhor Braancamp. - Não sei se ha bastante claresa na enunciação deste artigo: desejava que se dissesse que a Nação pela divida Publica.

O senhor Soares Franco. - Ao passo que ella se for liquidando - parece não ser exacto, porque a divida conciliada deve já dar-se por liquida, e a Nação tanto reconhece huma como outra: huma está liquida e outra não, e por isso parecia melhor dizer - A Nação reconhece a divida Publica.

O senhor Moura. - Não me parece bem que á palavra Constituição se substitua a palavra Nação, porque a Constituição he hum Codigo de hoje em que se comprehende a vontade da Nação.

O senhor Borges Carneiro apoyou o parecer do senhor Moura, e por 75 contra 8 votos se decidio que o artigo ficasse pelo mesmo theor.

Discutio-se o artigo 33.º de disse:

O senhor Pimentel Maldonado. - Quizera que a palavra = população = se accrescentasse a palavra = necessidade = e se dissesse. - Haverá hum Exercito proporcionado á população e necessidade do Reyno; porque a força Militar precisa muitas vezes ser maior do que o pede a população do Reyno, outras vezes basta que seja proporcionada, e póde acontecer que por felizes circunstancias deva ser muito menor do que a supposta proporção. Se os Reys fizessem huma verdadeira Santa Alliança, certamente era escusada huma força proporcionada á população, e talvez que nem houvesse necessidade desta força. Continuando os Reys a não fazer estas verdadeiras Santas Allianças, e deixando os Povos em algum receio, bastará que a força seja proporcionada á população. Se porém a este receio accrecerem perigos grandes, então será preciso que a força seja maior que a população. Por ventura póde dizer-se que o Exercito Portuguez he proporcionado á população do Reyno? Todavia justamente se deve conservar no pé em que está, em quanto ao numero, pelos perigos em que nos achamos. Continua o artigo. = O seu destino he manter a segurança interna e externa do mesmo Reyno = quizera que se tirassem as palavras - do mesmo Reyno - pois que o destino da força armada não póde ser senão este. Acaba o artigo. = O soldado he Cidadão etc. = tambem me parece que não se devia fazer: tal declaração; quizera que se tirassem estas palavras, porque he hum axioma tão claro, que julgo desnecessario o fazer menção delle. Acaso póde duvidar-se de que esses que expõe por nós a sua vida, e empregão todas as suas forças em nossa defeza, sejão Cidadãos, e que deverão participar com os demais Cidadãos de todos os direitos civicos? certamente não: para que he pois dizello? poderá com isso lembrar que havia alguma duvida sobre cousa incontestavel. Julgo por tanto que se emitta a declaração de tão conhecida verdade.

O senhor Moura. - Parece-me desnecessario accrescentar a palavra - necessidade - porque aqui falla-se de huma força Militar permanete, a qual deve ser proporcionada á população do Reyno. Em quanto á ultima parte do artigo, parece-me que se deve conservar a declaração; porque, ainda que se reduz a axioma, acho que todos os mais principios estão reduzidos á mesma classe, e escusando hum, escusariamos todos. Por consequencia não deve excluir-se o final do artigo.

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O senhor Pimentel Maldonado. - Admiro-me de que o senhor Moura compare o axioma com que remata este artido 33.° aos principios atégora estabelecido. Este nem meio minuto e contestaria, alguns dos outros levárão tres dias de discussão.

O senhor Miranda. - (Leo o artigo) Esta proposição he muito vaga: a força Militar não deve dizer-se proporcionada, á população do Reyno, as circunstancias politicas he que decidem da força Militar, e nisto só as Cortes podem determinar: por isso parecia-me bom dizer-se - força Militar determinada pelas Cortes, proporcionada ás urgencias politicas da Nação - Em quanto ao final do artigo, he hum axioma, e por isso parece ser desnecessario o declara-lo; porque a Nação póde suppôr que se admittio duvida, e esta ha do algum modo odiosa.

O senhor Borges Carneiro. - Quanto ás palavras - proporcionada á população, etc. - o meu parecer he que se tirem de todo, ou então que se diga - haverá huma força Militar proporcionada á população, meios de fazenda, e urgencia do perigo - Em quanto ao ultimo periodo approvo que se omitta: porém como aqui se trata de força Militar, e não se falla de Milicias; quereria que se dissesse - Haverá hum Corpo de Milicias, que não hajão de sahir fóra das suas Provincias.

O senhor Soares Franco. - Parece-me que, em vez de dizer - proporciona-la; população do Reyno - seria melhor dizer-se - determinada cada anno conforme a necessidade, e os meios.

O senhor Alves do Rio. - Parece-me que á palavra - destino - deve ajuntar-se - unico - nem será isso inutil, e muito meãos prejudicial, segundo o principio quod abundat una nocet.

O senhor Arcebispo da Bahia. - Apoyo o senhor Maldonado, a respeito da ultima parte do artigo: he hum principio de eterna verdade que os Soldados são Cidadãos, por isso tal declaração feita nas Bases da Constituição parece dar a entender, que em Portugal não existia a idea de que o Soldado he Cidadão.

A final do debate concordou-se em omittir as palavras - e proporcionada á população do Reyno - e as outras - O Soldado he Cidadão para dever participar como os mais de todos os direitos civicos - quanto ao mais conservando-se o artigo.

Discutio-se o ultimo artigo 34.º, e

O senhor Vanzeller foi de parecer que devia neste artigo fazer-se menção dos Marinheiros invalidos.

O senhor Miranda. - Aqui trata-se do que devem fazer as Cortes. - As Cortes farão e dotarão - (leo o Artigo) Ora ha outros muitas cousas essenciaes, que as Cortes hão de fazer; parece-me por este Artigo improprio das Bases, principalmente porque nelle se prescrevem Leys ás Cortes.

O senhor Presidente. - Eu quando collaborei nas Bases, convim em fazer entrar estes objectos neste Artigo, para dar a entender aos Povos, que com effeito as Cortes vinhão encarregadas destes objectos, de que atégora parece que ninguem cuidava.

O senhor Miranda. - Insisto em que o artigo he improprio das Bases: porque se he para fazer conhecer á Nação, que se vai a cuidar do que atéqui se não tinha cuidado, então parece que só devião indicar com preferencia os objectos que influem mais na desgraça dos Povos; por exemplo, que se castigarão os Ministros que os atropellarem, etc. etc.

O senhor Borges Carneiro. - As Bases não tem só por objecto os Povos, mas os Legisladores; tem por objecto indicar aos Legisladores da Geração futura as obrigações futuras, tem em vista os Regulamentos Publicos, a Instrucção Publica, etc.

O senhor Freire. - A respeito dos Marinheiros invalidos, olhado o objecto pelo lado da beneficencia, parece-me bem, porque he louvavel que esta classe seja contemplada: olhado porem peio lado via Justiça parece-me que não devem os Marinheiros invalidos ser contemplados como os Soldados invalidos.

O senhor Soares Franco. - Eu desejava que erre artigo fosse concebido em dous: hum relativo á Instrucção Publica; e outro aos objectos de Chaudade: assim poder-se-hia dizer em hum 2.° artigo. - As Cortes proverão na Instrucção Publica, e haverá Escholas de Primeiras Letras em todas as Freguezias do Reyno. - Isto he de muita importancia, e depois de feita a divisão do Territorio, se estabelecerá melhor este artigo da Instrucção Publica; sobre estabelecerem-se Escholas, ou nas Freguezias, ou nos Concelhos, etc.

O senhor Borges Carneiro. - Apoyo em tudo o que diz o senhor Franco; e em quanto ao 2.º artigo eu diria. - Em todos os lugares do Reyno se estabelecerão Escholas de Primeiras Letras, onde se ensinará, alem do Cathecismo Religioso, as Instituições Civis.

O senhor Pereira da Sylva apoyou o voto do senhor Miranda, sobre ser improprio o prescrever Leys ás Cortes.

Os senhores Ferreira Borges, e Margiochi apoyárão o voto do senhor Vanzeller, a respeito dos Marinheiros invalidos.

O senhor Manoel Antonio de Carvalho. - A mim parece-me que os Marinheiros, devem ter huma consideração particular: a Marinha todos sabem que nos deo gloria pelos nossos descobrimentos, e pelo Commercio que nos grangeou: todos sabem a difficuldade de fazer bons Marinheiros, e sendo nós Nação Maritima, e tendo pelas nossas Conquistas, grangeado huma gloria que nos fez celebres, e nos deo huma grande representação na Europa, devemos por isso mesmo animar a nossa Marinha; e pois que ella levou o nosso nome a todas as Nações, bem merece o ser por nós contemplada. Todas as vezes que se pertendem bons Marinheiros he immensa a difficuldade de os obter, e por consequencia he necessario que haja hum incentivo que obrigue os Homens a que terem tomar huma tal vida como he a de Marinheiro; poreja rasão assento eu, que se admittão os Marinheiros com a mesma contemplação com que se admittem os Soldados invalidos.

Votou-se, e decidio-se que o artigo fosse concebido nos termo seguintes. - As Cortes ficão e dota-

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rão Estabelecimentos de Charidade, e de Instrucção Publica.

Determinou-se para a Ordem do dia da Sessão seguinte:

1.° O Projecto da Commissão de Legislação ácerca dos Officiaes Inglezes:.

2.° O artigo 13.° das Bases da Constituição ácerca dos privilegios de foro:

3.° Os artigos addicionaes das mesmas Bases.

Concordou-se em designar pelo menos hum dia por semana para tratar assumptos de Fazenda Publica.

Levantou o senhor Presidente a Sessão ás horas do costume. - José Ferreira Borges, Secretario.

AVISOS.

Para o Bispo de Castello Branco.

Exmo. e Rmo. Senhor. = As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação Portugueza Mandão participar a V. Exa. que em virtude da sua representação em data de hontem, ficão inteiradas de que V. Exa. se acha actualmente impossibilitado para assistir ás Sessões, aonde esperão a concurrencia de V. Exa. o mais breve, que for possivel.

Deos guarde a V. Exa. Paço das Cortes em 28 de Fevereiro de 1821. = João Baptista Felgueiras.

Para o Bispo de Aveiro.

Exmo. e Rmo. Senhor. = Havendo V. Exa. verificado perante as Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação Portugueza a impossibilidade absoluta em que se acha de satisfazer as obrigações de Deputado neste Soberano Congresso: Mandão as Cortes participar a V. Exa. que acceitão com pezar a sua legitima escusa.

Deos guarde a V. Exa. Paço das Cortes em 28 de Fevereiro de 1821. = João Baptista Felgueiras.

Para Manoel de Vasconcellos Pereira de Mello,.

As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação Portugueza Mandão participar a V. Sa. que deve apresentar-se com a brevidade possivel neste Soberano Congresso, para tomar o exercicio de Deputado Substituto pela Provincia da Beira.

Deos guarde a V. Sa. Paço das Cortes, em 28 de Fevereiro de 1821. = João Baptista Felgueiras.

Para o Conde de Sampayo.

Illmo. e Exmo. Senhor. = Havendo sido presente ás Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação Portugueza a inclusa Representação de varios Cidadãos e Pays de familia, queixando-se da tolerancia de jogos defesos, já nos Theatros, já em diversas das desta Capital: Mandão remetter a mesma Representação á Regencia do Reyno para que sobre o seu objecto faça observar as Leys estabelecidas, e ordene as providencias competentes. O que V. Exa. fará presente na mesma Regencia para sua intelligencia e execução.

Deos guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 28 de Fevereiro de 1821. = João Baptista Felgueiras.

OFFICIO.

Illmo. e Exmo. Senhor. = A Regencia do Reyno? em execução do que as Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação Portugueza determinão, pelo Aviso expedido por V. Exa. na data de 26 do corrente manda remetter a V. Exa. as Ordens do Dia do Exercito, o Regulamento Militar, dicto de Milicias, dicto de Ordenanças, e as Cartas Militares, que existião na Commissão Militar, e que exigia o Deferido Aviso; remettendo tambem a Regencia, além dos papeis pedidos, hum mappa do armamento, boccas de logo, e projectís que existem no Arsenal do Exercito, e da polvora, e cartuxame, que existe no Armazem, de Beirollas, e Val Formoso, para tudo ser presente ás mesmas Cortes.

Deos guarde a V. Exa. Palacio da Regencia, em 28 de Fevereiro de 1821. = Senhor João Baptista Felgueiras = Antonio Teixeira Rebello.

Errata.

No Diario N.° 22, pag. 166 columna 1.ª onde se lê = habilitadas para no presente anno fazerem acto a que se sega o gráo de Bacharel, o qual tornarão sem prejuizo da antiguidade dos que segundo a legislação Academica, a tirião melhor. - lea-se - habilitados para no presente anno fazerem acto o a que se siga o gráo de Bacharel, o qual tomaráo sem prejuiso da antiguidade dos que, segundo a legislação Academica a terião = e onde se lê = torne as mais energicas lea-se -- tome as mais energicas etc.

LISBOA: NA IMPRESSÃO NACIONAL.

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