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DIARIO DAS CORTES GERAES E EXTRAORDINARIAS DA NAÇÃO PORTUGUEZA.

NUM. 26.

Lisboa, 3 de Março de 1821.

SESSÃO DO DIA 2 DE MARÇO.

Leo-se e approvou-se a Acta da Sessão antecedente.

LERÃO-SE varios Requerimentos, que forão remettidos ás competentes Repartições.

A Commissão de Fazenda apresentou o seu Parecer ácerca dos Requerimentos de D. Carlota Augusta Margarida de Oliveira, e de Maria Ignacia de Carvalho: este foi remettido á Regencia, e em ambos os casos approvado o Parecer da Commissão.

O senhor Xavier Monteiro em nome da mesma Commissão, apresentou o seu Parecer, que em pouco dififeria do da Commissão Militar, ácerca do Requerimento da Viuva e Filhos do Tenente General Mathias José Dias Azedo; e, approvado o Parecer da Commissão, deliberou-se, que a titulo de pensão, e como parte da remuneração dos seus serviços, se dessem á sua familia settecentos e vinte mil reis por anno, afóra o Monte Pio.

A Commissão de Legislação fez o seu Relatorio ácerca dos Requerimentos dos Bachareis, que pertendião a abolição da Leitura no Desembargo do Paço; e de Luiz Joaquim de Sousa: este foi remettido á Regencia, e em ambos os casos approvado o Parecer da Commissão.

A' mesma Commissão pareceo que, em quanto ao Requerimento das Viuvas e Parentes dos processados e justiçados em Outubro de 1817, o Decreto de 9 de Fevereiro proximo passado auctorizava a Revista: = o Soberano Congresso, conformando-se com o Parecer da Commissão, declarou que no espirito daquelle Decreto se comprehendia o caso presente, e ordenou que com esta declaração fosse remettido á Regencia.

Leo-se o Projecto de Decreto redigido pela mesma Commissão, ácerca da commutação dos degredos, e mandou imprimir-se para se discutir.

Lerão-se por segunda vez os artigos addicionaes ás Bases da Constituição, propostos pelo senhor Borges Carneiro.

Discutirão-se as emendas ás Bases da Constituição redigidas pela Commissão, e concordou-se em que ao artigo 21 (agora 23 ) depois do adverbio = exclusivamente - se ajuntasse - pelas Cortes - em vez de - por Ley das Cortes, como estava.

Discutio-se o artigo 30 (agora 32) sobre devei ou não crear-se hum Conselho de Estado, e

O senhor Madeira Torres sustentou a opinião que já tinha dado.

O senhor Vaz Velho - Tres são as questões que aqui se tem tratado: 1.° se hum Conselho de Estado he necessario, e para que fim: 2.° se não sendo essencialmente necessario, he muito util: 3.° se póde servir de barreira para os poderes se conservarem, sem que algum delles possa arrogar as attribuições do outro. Eu considero o homem hum aggregado ou composto de habitos e de paixões. O homem he o mesmo em iguaes circunstancias, ou todo o homem em iguaes circunstancias obra do mesmo modo. Eu não conto com o homem segundo o que póde ou deve ser, mas sim segundo o que tem sido em taes, ou quaes circunstancias. Dados estes principios, digo 1.° que ambicionando o homem sempre o ter maior poder, e mais auctoridade do que tem; elle não perderá a occasiao, e lançará mão della logo que se lhe offereça para a obter. 2.° que o homem desejando ter sempre mais liberdade do que tem, elle appetece a occasião de a poder alcançar. 3.º que o homem assim considerado está em perpetua resistencia contra os obstaculos que se lhe oppõe. Esta resistencia será em hum corpo moral tanto maior, quanto a somma dos individuos que o compõe. Dada esta doutrina: segue-se que os tres corpos em que residem os tres poderes Legislativo, Executivo, e Judiciario, apesar de se prescreverem os limites de cada hum, e o circulo de sua jurisdicção, elles não só ambicionarão sempre, mas positivamente forcejarão por terem mais auctoridade, mais liberdade, na ar-

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rogação das attribuições alhêas. Para obviar este inconveniente sempre desastroso provenha elle de qualquer dos dictos poderes, inventarão e levantarão os Inglezes como barreira huma segunda Camara. Os Hespanhoes huma Junta permanente, com os quaes nos conformámos. Ambos estes inventos tendo, segundo me parece, muito boas cousas, não deixão tambem de ter muitos inconvenientes. Ambos elles, ou são para o fim igualmente bons, ou não servem para nada. Parecerá hum paradoxo; mas eu provo o que digo. Ambos os dictos inventes: segunda Camara, e Junta permanente são igualmente bons, se acaso a elles se juntar o enthusiamo Nacional. Ambos de nada valem, se faltar o dicto enthusiasmo. Quem tem servido de salva guarda da Constituirão de Inglaterra he sem duvida o enthusiasmo Nacional. - Isto supposto, será o Conselho de Estado huma segunda barreira, que auxilie a Junta permanente para evitar a arrogação dos poderes? Nesta consideração não o julgo necessario, pois segundo o que tenho dicto, ou basta a Junta permanente, ou se não basta, então o Conselho de Estado de nada vale. Agora porem se se trata de utilidade, parece-me que o Conselho não deixa de ter grandes utilidades: he hum corpo escolhido pela Nação e de sua confiança, he hum corpo que deve estar ao alcance de todos os negocios, e de todos os individuos; e que nestas circunstancias melhor que ninguem póde aconselhar ao Rey em todos os negocios internos e externos, porque para isso se prepara, e propor-lhe os individuos mais aptos para o bom desempenho de todos os deveres relativos, dos quaes individuos com antecipação deve haver as competentes informações. Parece-me logo preferivel o parecer de hum tal Conselho de Estado ao de homens avulsos, póde ser que interessados; ao de validos, ou ao menos de homens que não comprometem o seu credito, como os do Conselho de Estado. Pelo que he o meu parecer que seja admittido, pela utilidade que delle resulta.

O senhor Castello Branco. - Pelas mesmas rasões poque se tem declamado contra a necessidade de hum Conselho d'Estado, pertendo eu mostrar que elle he necessario. Eu quereria, tratando de organizar huma Constituição, estabelecer hum corpo moral de maneira que nelle se verifica-se exactamente o que se passa no homem individual. Todos nós vemos na marcha diaria das nossas acções que continuamente nos he preciso oppôr paixões a paixões, e que quando huma paixão pertende levar-nos para hum lado, se a nossa rasão nos mostra que não devemos caminhar para aquelle lado, não temos outro meio de desviar-nos senão oppondo a essa paixão outra contraria. Por exemplo, a ambição, ou desejo de ter maiores meios dos que são necessarios para satisfazer as minhas paixões, para ter maiores commodidades de vida, póde abusar da melhor acquisição que eu tenho n'hum momento, offerecendo-me hum meio de apoderar-me dos bens alheios, quando vejo que o posso fazer impunemente; mas se eu tenho hum coração bem formado, huma boa educação, no mesmo momento se me oppõe huma paixão contraria áquella, qual he o amor da gloria, e do bom nome; e muitas vezes o meu Patriotismo, que mostra que a situação daquella, primeira paixão poderia ser util absolutamente, mas que eu seguiria mil males, se não houvesse quem contrabalançasse áquella paixão, e não puzesse obstaculos, a ella se verificar. Daqui vem que os homens mais educados seguem as impressões primeiras, sem attender aos resultados; por isso que não lhe em dado importancia por falta de educação; isto porem de contrario apparece no homem bem educado. Se he preciso pois que o homem em si mesmo opponha paixões a paixões, tambem he preciso que assim appareça nos Corpos moraes. O Rey tem paixões que o levão necessariamente a ser Despota; he tal a força desta paixão que será preciso hum homem extraordinario para se vencer. He preciso pois o Conselho de Estado para lhe obstar a esta paixão. He preciso pois propormos este meio artificial. Já repetimos muitas vezes, se ao Poder Executivo não puzermos fortes barreiras, tarde ou cedo elle supplantará, e destruirá o Poder Legislativo, e por consequencia a Liberdade da Nação. Os Ministros de Estado não os acho sufficientes, porque são creaturas com quem o Rey trabalha intimamente; por isso he preciso pôr-lhe hum outro Corpo que não seja dependente delle, hum Corpo que tenha paixões diversas, e que finalmente faça verificar no Corpo moral o que se verifica no homem individual: e este he o unico ponto porque acho absolutamente necessaria a existencia do Conselho de Estado. Para que este Conselho não venha a ser de facto dependente do Rey, e por consequencia nullo, eu pertenderei sempre que atua Proposta seja do Corpo Legislativo. Dizem que he indecente do Corpo Legislativo, como superior, o propor por Listas triplicadas ao Poder Executivo os Membros de que se ha de compôr o Conselho. Eu não o entendo assim, eu acho que a Soberania consiste no Poder Legislativo, no poder Judiciario, e no poder Executivo. Estes tres poderes juntos, he que constituem a Soberania absoluta. He certo que o Legislativo he o principal, mas os outros não deixão por isso de ser partes constitutivas da Soberania; por consequencia o Poder Legislativo não he a meu ver nem inferior nem superior ao Poder Executivo, porque nós consideramos a Pessoa do Rey como primeiro Magistrado, a quem he confiado o Poder Executivo. Nós consideramos a Pessoa do Rey como huma parte da Soberania, que elle exercita; e as Cortes, exercitão a outra parte essencial da Soberania, que he o Poder Legislativo. Nestes termos haverá indecencia para o Corpo Legislativo em propor ao Rey as Listas triplicadas para a nomeação de hum Conselho? Limitar-se-ha a outra parte da Soberania, não deixando ao Rey a escolha arbitraria, mas propondo tres, dos quaes deve escolher hum? Acho que não ha indecencia alguma. Alem de que, o Corpo Legislativo quando propõe as Listas, não exercita aparte da Soberania a que he reservada a nomeação dos Empregados. Esta nomeação não tem nada com o Corpo Legislativo, he huma parte do Poder Executivo, que elle arroga a si, e que he impropria do Poder Legislativo; mas que arroga com rasões justissimas, e por necessidade; porque o Corpo Legislativo.

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está encarregado de vigiar sobre a Liberdade da Nação, e ella exige que o Legislativo se aproprie o direito de fazer estas propostas, porque quando as faz elle exercita esta funcção não sobre huma parte da Soberania que lhe he propria, mas sim sobre parte da Soberania que lhe he alheia. Assim eu acho absolutamente necessario que se nomeie o Conselho de Estado, para ser composto de homens que sigão a nossa causa, que pensem do mesmo modo; e de homens finalmente que devem sempre seguir a melhor parte. Estas as rasões que influem não só para a necessidade do Conselho de Estado, mas para que seja nomeado por proposta.

O Senhor Gyrão. - Trata-se de votar sobre o Conselho de Estado, sem sabermos quaes devem ser as suas attribuições, e a sua nomeação. E só porque este artigo he huma imitação da Constituição Hespanhola, será motivo para nós o adoptarmos sem reflexão? Venero a obra dos Sabios Legisladores de Cadiz, mas não a tenho por hum ponto de fé. O Conselho de Estado, por qualquer forma que seja créado, sempre será, ou inutil, ou prejudicial: se for nomeado pelas Cortes, e ElRey obrigado a seguir os seus dictames, que poder lhe fica? Se ElRey não tem obrigação de seguir o Conselho, então de que serve? Diz-se-nos que he hum corpo inerte: a inercia não serve para o Governo: vida, actividade, e prompta execução fazem os principaes attributos do Poder Executivo. Dizem-nos que para formar as listas triplicadas, das quaes ElRey deverá escolher os Empregados? então como serão depois responsaveiss os Ministros? Elles e ElRey se capeaão sempre com o Conselho de estado, e como não tem responsabilidade, e delibera em segredo, apparecerão taes cousas no futuro que ninguem poderá remediar. Nada de Conselho de Estado, os Ministros bastão para aconselhar a ElRey; eu temo, e temerei sempre os Palacianos, porque se podem fascinar com o esplendor da Magestade, amollecer com as delicias da Corte, tornar-se Cortezãos, e perder a Patria. O meu voto he pois que não haja Conselho de Estado.

O senhor Margiochi. - Os senhores Preopinantes deduzirão dos seus principios consequencias contrarias; hum que não devia existir Conselho de Estado, outro que deverá existir. Será perigoso o nós introduzir-mos huma cousa tão duvidosa nas Bases da Constituição, huma cousa tão duvidosa, digo, que até os Auctores das mesmas Bases não sabem as suas atribuições; humas vezes dão humas, outras vezes, dão outras; isto faz persuadir-nos de que he prudente que se reserve esta materia. Eu não vejo que a salvação do Estado perca em não haver este Conselho de Estado, porque, ou elle tem alguma preponderancia, ou he nullo; se he nullo dever ser tratado com desprezo, como eu o tratei outro dia; e se he preponderante, então deve ser tratado, como huma cousa capaz de destruir a Liberdade dos Portuguezes, he hum disfarce de segunda Camera; altamente se declamou contra esta segunda Camera, altamente declamarei contra o Conselho de Estado. Dizem que he preciso pôr muitos estorvos ao Executivo, e que este he num delles; e eu digo que o unico estorvo he a Nação, são as Cortes todos os annos; isto he que he hum estorvo grande do Despotismo, isto he que he o Conselho; Cortes todos os annos, aqui está o estorvo da tyrannia: huma Deputação permanente, e o Conselho de Estado estabelecidos para estorvar o Poder Executivo, póde acontecer que o não estorvem. A experiencia tem, mostrado que quando ha dous corpos de sentinella a hum terceiro, estes trabalhão á porfia por ver quem ha de incensar mais aquelle. Para estorvar o poder dos Consules, e o poder de Napoleão, forão creados hum Tribunal, hum Conselho de Estado, e hum Corpo Legislativo: mas o Tribunal desmanchou-o elle logo, porque lhe parecia mais popular; e o Conselho de Estado, e o Corpo Legislativo porfiavão a qual havia de ser mais amado. O Conselho de Estado dizia para agradar. "A guerra de Hespanha he justíssima, he necessaria" a politica dizia destes absurdos! O Corpo Legislativo dizia. "Todas essas conquistas são justas" o que causou grandes males. Eis-aqui o para que servem taes Corpos. He maxima fundada por Machiavello. Divide et impera. Divide os poderes, e serás desperta. A Deputação das Cortes he o melhor estorvo para o Despotismo. O Conselho de Estado talvez haja de vender mais depressa a Liberdade dos Povos. A Liberdade dos Povos está muito segura com a Deputação permanente, e com as Cortes todos os annos.

O senhor Miranda. - Eu não posso considerar o Conselho de Estado, nem como util, nem como necessario; porque elle não tem influencia, ao menos legal, no Poder Executivo; pois que os Decretos são simplesmente assignados pelo Rey, e Ministros. O Conselho de Estado deve reputar-se nullo, porque elle não tem responsabilidade effectiva: este Conselho trata com o Rey os Negocios do Estado secretamente se póde produzir immensos males influindo o mal ao Rey, e não se sabendo deste mal. Em ultima analyse, sendo os Ministros responsaveis, para que he crear hum corpo que póde paralysar as suas decisões? Porque em quasi todos os Governos ha hum Conselho de Estado, porque elle se acha na Constituição Hespanhola segue-se que elle seja indispensavel entre nós! Eu não o creio. Não quererei que se diga deste Congresso o que se dizia dos Legisladores de Cadiz, que elles creavão hum corpo no qual, pela sua influencia, esperavão hir occupar hum distincto lugar junto ao Throno. Diz-se que o Conselho de Estado he necessario para aconselhar e illustrar o Rey, e propor-lhe pessoas capazes para os Empregos Publicos. Eu não o julgo assim, porque ou os Membros do Conselho são amoviveis, e então elles não poderão ter conhecimento das pessoas habeis para os empregos, quando de contrario para isto serão mais proprios os ministros encarregados dos negocios das suas Repartições; ou então o Conselho he hum corpo permanente que ha de contrabalançar o Poder Legislativo, e a Nação; porque collocado entre o Rey, e os Ministros, ha de seguir provavelmente o partido do Rey, e como não, tem responsabilidade alguma, nem sempre hão de nomear para os Empregos Publicos as pessoas dignas, mas sim segundo a

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experiencia mostra, os seus parentes, afilhados, e amigos. Póde dizer-se que os Ministros podem fazer o mesmo; assim he, mas desse inconveniente nos não salva a existencia de hum (Conselho de Estado: e de mais, não havendo Conselho, mas só Ministios, teremos só os protegidos por estes; mas com a differença de que os Ministros, por isso mesmo que são responsaveis, não se arriscando a propôr para os Empregos pesspas que os comprometido, o que não acontece com os Conselheiros que não tem a menor responsabilidade. Dizem alguns dos senhores Preopinantes, que os Conselheiros nomeados pelas Cortes serão homens de luxos, e amor da Patria, e que collocados ao lado do Rey servirão de contrapeso ao Despotismo. Mas que contrapeso poderá faser hum Corpo que o Rey não he obrigado a consultar? Que certeza teremos nós de que estes homens, em cuja escolha as Cortas mesmas podem enganar-se, serão dotados das virtudes que tornão o homem capaz de resistir á seducção do poder e esplendor do Throno? Se houvesse muitos destes homens não seria tão desarrascada a creação de huma segunda Camera: esta com justissimas rabões foi rejeitada, e justissimas rasões fazem tambem rejeitar o Conselho. Diz-se que he melhor que o Rey tome antes os conselhos daquelles homens que para isso as Cortes lhe apresentarem, que os dos Aulicos ou Cortezãos. Melhor seria que assim acontecesse. Porem o caso he que se o Rey tiver más intenções, ha de sempre gostar de ouvir com preferencia os que mais o lisongearem. Se elle quizer ouvir os Aulicos, ha de ouvillos, haja ou não Conselho de Estado, e eu receio muito que o mesmo Conselho se bandeie com elles para ganhar a benevolencia do Rey: e quando assim não aconteça, se os Membros do Conselho forem oppostos ás intenções do Rey, elles perderão a sua confiança, e elle não quererá ouvillos, porque ninguem procura conselhos daquelles em quem espera opposição. Tudo isto pois prova a inutilidade do Concelho, e que elle não vale a pena dag despesas que devem fazer-se com os ordenados de seus membros. Demais, elle vem a complicar a machina politica, e a pôr embaraços á marcha prompta e regular, essencialmente necessaria ao Poder Executivo. O inconveniente dos Governos Democraticos he o vagar, e indecisão. Neste governo delibera-se muito, obra-se pouco, e raras vezes atempo; perde-se a occasião oppor uma, e quasi sempre as medidas extraordinarias são fora de tempo. Pelo contrario no Governo arbitrario delibera-se pouco, as providencias são rapidas, e muitas vezes acceleradas, inconsideradas, e pouco a proposito. Estes os dous defeitos que póde ter hum Governo, dos quaes devemos aproveitar o bom, e rejeitar o que tem de máo. Na Assemblea Legislativa temos todas as vantagens de hum Governo Democratico; nella se discutem e esclarecem as materias que formão os objectos das Leys e Decretos, cuja execução fica encarregada ao Poder Executivo. Este deve proceder sem embaraços, não deve hesitar na sua marcha, e a responsabilidade dos Ministros he o que basta para que ella seja prompta, sem comtudo ser irreflectida. O Conselho de Estado só serviria de retardar a regularidade ao Poder Executivo, sem produzir bem algum pelas rasões já dadas, e por isso sou de parecer que não haja Conselho de Estado.

O senhor Moura. - Admiro-me muito de que os maiores fautores da Liberdade e do Liberalismo se opponhão á existencia do Conselho de Estado, quando eu suppunha que a sua existencia se oppõe aos principios dos que favorecem o despotismo. O objecto mais principal dos Governos Representativos he a divisão dos poderes; porque da acumulação dos mesmos poderes, quer seja na parte legislativa quer seja na executiva, he que resulta o despotismo. Se o Poder Legislativo usurpa parte do Executivo, ou se o Executivo usurpa parte do Legislativo, resulta que essa perigosa acumulação dos poderes he a base e principio do despotismo. Tem-se observado que o equilibrio politico he muito necessario entre os tres poderes. Se pois o objecto principal he estabelecer o equilibrio politico, que se reduz a prevenir todo e qualquer abuso, ou do Poder Executivo, ou do Poder Legislativo; se todos os dias se tem clamado, que o Poder Executivo he o mais capaz, de se deslizar dos principios em que se acha estabelecido, então pergunto: se este risco tão eminente se não poderá evitar e prevenir, estabelecendo as Cortes hum Conselho de vigilancia ao pé do Rey, para que o avise e o aconselhe no exercicio de suas funcções? Diz-se que he huma segunda Camera, e eu digo que isso he hum erro de politica; porque huma segunda Camera tem parte no Poder Legislativo, e o Conselho de Estado não tem parte nenhuma em similhante poder. Diz-se que elle póde produzir grandes perigos: mas que perigo se póde seguir de pessoas escolhidas do Corpo Legislativo rodearem o Rey, e o advertirem todos os dias que deste ou daquelle modo he que deve obrar? Ouvi ha pouco dizer que dividir para imperar he o principio dos Governos despoticos, mas não tem aqui applicação a maxima de Machiavello: aqui divide-se o poder para que nenhum dos que recebem esta delegação da Soberania possa arrogar-se as attribuições do outro. Conseguintemente parece-me que não deve haver perigo em estabelecer similhante Conselho de Estado, e que por isso que elle não póde fazer mal, e póde fazer bem, se deve estabelecer como Ley Constitucional.

O senhor Alves do Rio. - Não posso combinar com os Illustres Preopinantes que julgão necessario o Conselho de Estado, porque o Rey tem os Conselheiros natos, que são os seus Ministros; tem alem disto a liberdade de chamar quem elle quizer, e quando se quizer aconselhar não he necessario que haja Conselho. Como o Rey não tem obrigação de seguir o parecer do Conselho, he elle inutil, e para que he crearmos huma cousa inutil? Os Conselheiros não tem responsabilidade, podem aconselhar huma cousa má, o Rey accede a ella, os Ministros passão, e expedem a ordem, e a decisão vem a ser má para o Estado: quem ha de responder por similhante cousa? o Conselho não, porque não he responsavel, são os Ministros; logo só estes, como Conselheiros natos, he que devem existir, e nada de Conselho de Estado. Diz-se que he huma barreira ao

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Poder Executivo; mas eu não a vejo quando lhe não considero responsabilidade, e quando vejo que o Rey não he obrigado a seguir o que o Conselho disser. A Barreira forte são as Cortes. Quando o Rey tiver duvidas consulte as Cortes, se estiverem reunidas, e PC não estiverem reunidas, tem a Deputação permanente a quem ouvir, e nada de Conselho, que augmenta a machina, e esta quanto mais se augmenta, mais difficil se torna.

O senhor Borges Carneiro. - Para se julgar util, e necessaria a creação do Conselho de Estado, baslava a attribuição de propôr ao Rey por estas triplicadas as pessoas habeis para os empregos civis, etc. ainda que não tivesse mais attribuições. Todo o Mundo sabe que a felicidade da Nação consiste em ter bons empregados publicos: supponhamos que não existe Conselho que proponha ao Rey por listas triplicadas, etc. acontecerá, segundo o pensar commum dos homens, que se escolherão para os empregos Ecclesiasticos, e Civis, pessoas do seu partido, pessoas inconstitucionaes, e que propugnem pelos principios oppostos aos que agora estabelecemos, e dentro de poucos annos teremos inimigos innumeraveis da Constituição. Feito isto, haverá o Corpo Legislativo, faia leys, dará determinações; mas como ellas vão para o Poder Executivo, e para homens inimigos da Constituição, ficarão nenhuma a actividade do Corpo Legislativo, ficarão paralysadas as suas funcções, porque supponho que hão de passar por canaes inimigos do que nós agora estamos fazendo. Para prevenir pois este mal, he que se estabelece hum Conselho nomeado pelas Cortes, composto de homens liberaes, amigos da Nação, e da Constituição. Estes homens, estando ao lado do Rey, hão de aconselhar-lhe a causa da Patria; sendo das Cortes hão de ser liberaes, e outras tantas vozes que facão apparecer o bem, e fugir o mal. Na Russia se desde Pedro 1.° tem havido huma serie de Heroes, he porque lá havia hum Conselho; e diz o Dictado: cum sancto sanctus eris, cum perverso perverteria. He pois necessario que haja Conselho, e nomeado pelas Cortes. Diz porem o Illustre Preopinante que não he analogo que as Cortes nomeem o Conselho, porque he huma arrogação do Poder Executivo: sobre isto tenho a dizer. Quando chamarmos ás Cortes Corpo Legislativo, usamos de huma terminarão mais restricta. As Cortes tem muitas outras attribuições: a ellas pertence repartir os tributos, fiscalizar as Contas, determinar as Tropas, fazer Tractados, e outras muitas cousas, nomear a Regencia, etc. Ora pois, se huma attribuição das Cortes he fazer tudo isto que não são Leys; tambem huma attribuição dellas he o nomear hum Conselho de Estado para o lado do Rey, pessoas capazes de bom conselho pelo que toca á parte economica: não he preciso constituir hum Conselho de quarenta Membros, bastarão dez homens amigos da Constituição e liberaes; e talvez que nem dez sejão necessarios. Tambem não julgo que da nomeação deste Conselho se siga mal ao Estado, huma vez que não seja vitalicio: basta que seja nomeado por hum anno ou dous. Em quanto a dizer-se que he huma Camera disfarçada, não he assim: este Corpo não tem nada de auctoridade, não tem parte na Sancção das Leys, he só para aconselhar, e vigiar.

O Senhor Soares Franco. - Votou pela creação do Conselho de Estado, apoyando o Senhor Borges Carneiro, mas querendo que em lugar da palavra = nomeado = se use a palavra = proposto.

O senhor Pereira do Carmo. - Desejo contrahir a minha opinião em tão poucas palavras, quantas bastem para simplificar a questão, e colloca-la debaixo de hum ponto de vista assas luminoso. Pergunto eu: na hypothese de não passar este artigo das bases, será permittido ao Rey escolher a seu arbitrio Conselheiros de Estado para o ajudarem com seus pareceres no desempenho das importantissimas funcções que a Constituição lhe confia? O senhor Alves do Rio acaba de dizer que sim. Logo a questão vera a reduzir-se a estes precisos termos = Qual será mais vantajoso ao interesse, e Liberdade Nacional, escolher ElRey os de seu Conselho só pelo seu moto proprio, certa sciencia, poder Real e absoluto, ou escolhe-los daquelles que lhe propuser a Nação, por via de seus Representantes em Cortes? O problema he, a meu ver, bem facil de resolver-se: eu voto pelo Conselho de Estado, tal qual o vejo delineado no artigo das Bases.

O Senhor Gyrão. - Creio que esta Assemblea não pertende prohibir que o Rey possa aconselhar-se com quem quizer, e ter o Conselho que quizer; por isso parece-me desnecessario o Conselho de Estado. Os Conselheiros natos do Rey são as Cortes.

O Senhor Castello Branco. - Diz-se que o Rey póde aconselhar-se com quem quizer, e que não he obrigado a seguir o Conselho de Estado, mas he preciso entendermo-nos sobre o contrapeso que se pertende pôr ao Poder Executivo. Quando o Rey se aconselha com pessoas particulares que chama arbitrariamente, e não segue só seus conselhos, estas pessoas particulares não formão hum Corpo, não tem meios de denunciar á Nação que o Rey deixou de fazer aquillo que elles lhe aconselharão; mas não succede assim estabelecendo-se o Conselho de Estado, porque elle será o primeiro que denuncie ás Cortes que o Rey não quiz estar pelos seus conselhos, sendo elles bons; e se o Rey não for do mesmo parecer, e quizer decidir per si só, o Conselho de Estado desejará mostrar á Nação quaes são os seus sentimentos. Em consequencia eu acho o Conselho de Estado muito justo.

O Senhor Miranda. - Diz o Illustre Preopinante que o Conselho de Estado denunciará á Nação quando o Rey não quizer estar pelos seus conselhos. Eu não supponho similhante cousa: o Rey he inviolavel, de que serve esta denuncia de Conselho de Estado? a responsabilidade está nos Ministros.

O senhor Guerreiro. - Eu opinei contra a existencia de Conselho de Estado, e as rasões que se tem apontado não me fizerão mudar de sentimentos. O Conselho não póde ser barreira contra o despotismo, porque não tem resistencia, pois que o Rey não tem obrigação de se conformar com o seu parecer. Se não tem pois resistencia propria, se o Rey não tem obri

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gação de se conformar com o seu parecer, he claro que elle não póde servir de barreira á arbitrariedade. Hum Conselho de Estado creado pelas Cortes, e offerecido ao Rey, de nada serve, porque ninguem se póde aconselhar senão com pessoas da sua confiança, e raras vezes succederá que o Rey tenha confiança em huma de tres pessoas que pelas Cortes lhe forão offerecidas: por isso querer obrigar o Rey a tomar pessoas que não forão escolhidas pelo Rey, mas por outrem, parece que não he conforme á Justiça. O Rey que está encarregado da Administração publica, e Poder Executivo, he que deve decidir sobre as pessoas do seu Conselho, eescolhellas como lhe convier, sem que isto deva entrar em Ley Constitucional, deve deixar-se á sua liberdade; nem me parece que o Conselho de Estado seja necessario para essas nomeações. Bem sei que o Systema Constitucional depende de que todos os Empregados Publicos sejão amantes deste systema, mas não posso conceber como, sendo a nomeação feita pelo Conselho, os Empregados Publicos sejão todos amantes do Systema Constitucional. Demais os Conselheiros hão de ter num ordenado certo, capaz de manter o esplendor da sua dignidade; devem ser revestidos de maiores honras, porque estando sempre ao lado do Rey, fazem quasi hum Corpo numeral com elle; delle recebem todas as graças, e recebem parte da sua consideração. Como póde dizer-se pois que este Corpo está dependente do Poder Legislativo? do maneira nenhuma: está antes identificado com o Poder Executivo, e certo que os Ministros hão de nomear os amidos do Rey, e que estes hão de dirigir-se por principios por talvez subversivos da ordem publica, sendo que pelo contrario se não poderião esperar máos Empregados, quando o poder de nomear estivesse dividido pelos differentes Chefes das differentes Repartições. Ultimamnete o Conselho de Estado he de nenhum momento, por isso mesmo que ao Rey sempre lhe fica livre o aconselhar-se com quem quizer, e muito mais não tendo os Conselheiros responsabilidade alguma.

O senhor Carvalho. - Sou em tudo conforme com a opinião do Illustre Preopinante, e do senhor Margiochi. Eu não vejo necessidade de Conselho de Estado: as rasões estão excellentemente ponderadas, a meu ver, por aquellas pessoas que tem seguido esse parecer. Tem-se-lhe querido achar utilidades, e tem-se reduzido todas estas utilidades ao que se acha allegado: eu não vejo necessidade delle em cousa alguma; porque primeiro já se disse, que o Conselho de Estado havia de ser eleito pelos Deputados em Cortes, e se quizerão modificar os inconvenientes, que poderião nascer de este Conselho ser nomeado pelo proprio Rey; que para os conhecer bastão as rasões que tenho ouvido ponderar, de que succede nos corpos moraes o mesmo que nos corpos physicos: o Homem de melhor, opinião quando se vê instado a propugnar pelos teus interesses, he necessario que seja hum Heróe para se não deixar soçobrar na prepotencia; e tal he o perigo que hade resultar aos que se virem obrigados a dar o seu voto, e a sua opinião áquelle que não precisa escutar para fazer a sua vontade. Depois disto, eu não vejo que esta Corporação possa ser de utilidade alguma quando aliás para essa utilidade vejo meios superabundantes na illustração das Cortes. Se hum Rey quer ser absoluto, se não quer dirigir-se pela Opinião Publica, então estou com o Philosopho: Naturam expellas furca, tamen usque recurrrt. A natureza, se o Rey a tem má, se os seus Educadores não puderão adoçar os seus costumes, se a educação o não póde fazer Constitucional, por mais que digão os Ministros, por mais que aconselhem Secretarios, e a Opinião Publica persuada, elle relutará sempre, e não fará mas do que a sua vontade. Logo porque rasão se ha de embaraçar a marcha política com este estorvo? Para que he querer hum Corpo que não póde certamente attrahir a Opinião Nacional, sendo que para haver de a proferir se vê embaraçado e impedido com a opinião do Rey? O Rey distribue as Graças, e indispensavelmente ha de fazer que essas Graças recáhião naquelles que mais com elle concordarem e mais lhe fizerem a vontade. Portanto, assim como votei contra as duas Cameras, assim tambem voto contra o Conselho de Estado, que se não deve admittir.

O senhor Xavier Monteiro. - Tem-se dado rasões muito fortes pró e contra o Conselho de Estado. Aquelles que pugnão pela sua existencia assentão os seus fundamentos e attribuições na necessidade de dar conselhos ao Rey: eu vejo porém que os Conselheiros de Estado tem de deliberar na presença do Rey, e como he possivel que elles tenhão a coragem, sufficiente para resistir á influencia do Rey? Esta Assemblea tambem parece sentir desta maneira, quando não permittio ao Rey assistir às deliberações das Cortes. Se pois se não julga coragem nestas para deliberar na presença do Rey, como he que se há de julgar que o conselho tenha coragem? Se elle a não tem, a vontade do Rey, e dos Ministros serão a norma para a decisão dos negocios porque ainda que o Rey chame o Conselho, como este se não póde oppôr, e resistir, de nada serve, e por isso claro he que he nullo. Para a nomeação dos Empregados tambem o julgo desnecessario: porém, no caso de o haver, acho inconveniente em que seja proposto por listas triplicadas, porque sendo vinte he necessario propor sessenta Homens, etc. Ora como podem achar qualquer sessenta Homens capazes de contrariar ElRey na sua presença? Por tanto, no caso de existir tal Conselho de Estado, digo que seja nomeado, e não proposto.

O senhor residente perguntou se era preciso mais discussão? E querendo motivar o seu voto, duvidou-se se o poderia motivar; ao que disse

O senhor Bettencourt. - A nomeação de Presidente he sem duvida hum dos resultados do bom conceito que a Assemblea faz sempre, das virtudes, dos talentos, e luzes do Deputado que escolheo. Daqui vem pois que, no caso de se negar ao senhor Presidente o seu voto, nós viríamos a dar hum castigo em lugar de recompensa, seria huma especie de opprobrio. Se as suas rasõee hão de servir de illustrar a Assemblea, qual ha de ser a rasão porque se ha de querer privar das luzes e conhecimentos de hum homem que a póde illustrar? Parece pois que não tem justiça alguma o negar-se ao Illustre senhor Presi-

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dente o motivar o seu voto. Como a Assembléa ainda não decidio, o meu voto he, que o senhor Presidente e Secretarios tem direito a motivar o seu voto. Póde muito bem acontecer que o senhor Presidente tenha huma lembrança, huma rasão nova que possa illucidar mais os pontos que inda não estão bem claros. Póde acontecer que tenha huma nova rasão, mas tão forte que venha a destruir muitas das que se produzirão em favor ou contra qualquer objecto. Eu como Membro do Regulamento, sou obrigado a sustentar, que não deve o Illustre senhor Presidente deixar de votar. Em muitas Assembleas o voto do senhor Presidente não he logo no principio da discussão, por isto mesmo que tem grande ascendencia, e póde arrastar a opinião de muitos individuos. Em consequencia, julgo que o senhor Presidente deve dar o seu voto, mas, no fim da discussão.

O senhor Borges Carneiro. - Eu julgo que onde os Presidentes são vitalicios, ou de muitos annos, he muito bem estabelecida a regra de que o senhor Presidente não vote; mas nas Assembleas em que se elege para Presidente hum Deputado que não tem mais que o direito preparatorio, que não tem voto de desempate, mas sómente o de propôr a marcha dos negocios, durando a sua Presidencia hum só mez, parece-me dever-se-lhe conceder o motivar o seu voto.

O senhor Xavier Monteiro. - Ao senhor Presidente não se lhe deve negar o seu voto no fim da discussão, porque já não póde ter iminencia nenhuma na Assemblea; e se não póde ter influencia porque o objecto está discutido, he claro, que se lhe deve conceder o seu voto, e motivallo.

O senhor Bettencourt. - Eu sendo tambem membro de outra Junta Preparatoria, quando se fez este Regulamento, VI esta mesma questão de que o Presidente, sendo tirado da Assemblea, devia ter direito de votar ultimamente, e ao mesmo tempo dizer os motivos; porque, não o admittindo, vamos a privar-nos na discussão de hum voto que existe entre nós, e fazer com que sendo a Assemblea composta de 100 votantes, venhão a reduzir-se a 99. Nem he possivel que a Assemblea se mova pelo voto de hum só Homem, a não ser pela força das razoes, e documentos que elle allega. Se algum Deputado obrasse o contrario, faltaria aos fins para que aqui vimos. Já disse que huma lembrança, que a producção de hum Documento serve muitas vezes para destruir hum systema que se julga bem estabelecido. Porque rasão pois hum Presidente hade ser privado de os subministrar huma lembrança que póde utilizar-nos? Então venha Presidente de fora, e não se priva a Assemblea de hum voto.

O senhor Annes de Carvalho. - Bentham he hum dos Auctores regulamentarios que propõe argumentos, pelos quaes pertende mostrar, que os Senhores Presidentes não podem discutir. Os argumentos que elle propôz, são os seguintes: primeiramente o dizerem que os Senhores Presidentes são Fiscaes, e Juizes, que he necessario que tenhão toda a imparcialidade, e que discutindo se chegarão a bandear para huma ou outra parte, e perderão a imparcialidade.

Este argumento não me parece muito forte. O segundo argumento que elle produz, vem a ser, porque tem obrigação de attender á Ordem, e que attendendo a ella, não podem attender ás discussões, nem resolver com tanta promptidão. Mas eu não sei que attenção seja precisa para a Ordem, que não possa attender-se ás discussões. Ultimamente he o dizer que o seu voto podia ser preponderante, e arrastar hum grande partido. Bentham tirou esta conclusão em consequencia do systema que elle adopta, de que os Presidentes sejão perpetuos, e então elles necessariamente adquirem huma grande ascendencia. Ora no nosso systema os Presidentes, não hão de ser perpetuos, mas mensaes, e escolhidos de entre nós. Não o sendo, não me persuado, que elles possão ter influencia, que arraste os votos; por isso, não sendo os outros fundamentos de Bentham fortes, e não tendo applicação entre nós, parece-me não haver inconveniente em dar o voto ao senhor Presidente.

O senhor Magalhães. - Ninguem nega ao senhor Presidente a faculdade de votar, mas sim a de motivar o seu voto. Ainda que elle, de o seu voto em ultimo lugar, com tudo ainda póde haver hum grande perigo; porque, discutido hum ponto, e apparecendo novas rasões, ternos nova discussão aberta, pois todos os outros senhores Deputados tem direito de novamente discutir.

O senhor Annes de Carvalho. - Para mostrar quão pouca força tem o argumento da ascendencia do = senhor Presidente, basta ver que o Congresso está dividido para huma e outra parte: eis-ahi a influencia do senhor Presidente.

A final do debate o senhor Presidente pedio licença para retirar a proposta, e foi-lhe concedida.

Tomarão-se votos, e por 42 contra 41 se resolveo que haja Conselho de Estado.

Determinou-se para a Ordem do dia a discussão da Ley sobre a Liberdade da Imprensa.

Levantou o senhor Presidente a Sessão á hora do costume. = José Ferreira Borges, Secretario.

AVISOS.

Para o Conde de Sampayo.

Illmo. e Exmo. Senhor. = As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação Portugueza, tendo tomado em consideração o Requerimento junto, da Viuva do Tenente General Mathias José Dias Azedo, pedindo para seu filho a Commenda de S. Pedro na Aldoa de Joannes, e para si, com sobrevivencia para suas duas filhas, a titulo de Monte-Pio, os vencimentos de que gozava seu defunto Marido: attendendo a que, nem a justiça, nem o bem regulado systema de administração publica admittem remuneração de serviços por forma diversa daquella que as respectivas Leys determinão: Ordenão que (alem do Monte-Pio que lhe competir) se abone á Supplicante pela Thesouraria Geral das Tropas a quantia de sette centos e vinte mil reis, pagos em mezadas, no mesmo tempo, e do

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mesmo modo que se paga aos Officiaes effectivos do Exercito; sendo esta quantia considerada como parte do pagamento dos serviços daquelle General, em quanto não forem legalmente decretados, e remunerados. O que V. Exa. fará presente na Regencia do Reyno para que assim se execute.

"Deos guarde a V. Exa. Paço das Cortes, em 2 de Março de 1821. = João Baptista Felgueiras.

Para o Conde de Sampayo.

Illmo. e Exmo. Senhor. = As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação Portuguesa Mandão remetter á Regencia do Reyno o Requerimento incluso dos Bachareis residentes nesta Capital relativamente às Leituras na Mesa do Desembargo do Paço. E ordenão que se dêem providencias efficazes para se verificarem as mesmas Leituras sem as delongas e inconvenientes ponderados pelos Representantes, em quanto o permittirem as disposições e que actualmente regulão esta materia. O que V. Exa. fará presente na Regencia para que assim se execute.

Deos guarde a V. Exa. Paço das Cortes em 2 de Março de 1881. = João Baptista Felgueiras.

Para o Conde de Sampayo.

Illmo. e Exmo. Senhor, = As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação Portugueza, Mandão remetter á Regencia do Reyno o Requerimento de Luiz Joaquim de Sousa, Negociante da Ilha da Madeira, allegando que fôra injustamente condemnado em degredo perpetuo para Angola, e pedindo que o processo seja revisto por huma Commissão, e por esta absolvido, quando assim se mostre dos Autos: E Determinão que a mesma Regencia faça proceder ao conhecimento competente, e quando considere indispensavel alguma providencia extraordinaria assim o represente á este Soberano Congresso. O que V. Exa. fará presente na Regencia do Reyno para que assim se execute.

Deos guarde a V. Exa. Paço das Cortes em 2 de Março de 1821. = João Baptista Felgueiras.

Para o Conde de Sampayo.

Illmo. e Exmo. Senhor. = As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação Portugueza Determinão que a Regencia do Reyno informe se existe alguma Disposição geral que conceda às Mulheres ou Filhas dos Officiaes, e Correios das Secretarias de Estado ametade dos Ordenados de seus defuntos Maridos; e que juntamente remetta a este Soberano Congresso huma relação de todos os Officiaes das diversas Secretarias de Estado com seus vencimentos, e outra das Viuvas e Filhas dos referidos Officiaes, e Correios fallecidos, que venção aquellas pensões pagas por quaesquer Folhas com declaração do titulo pelo qual as percebem. O que V. Exa. fará presente na mesma Regencia para sua intelligencia e execução.

Deos guarde a V. Exa. Paço das Cortes em 2 de Março do 1821. = João Baptista Felgueiras.

Para o Conde de Sampayo.

Illmo e Exmo. Senhor. = Havendo sido presente às Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação Portugueza a Representação junta das Viuvas e Filhos dos que forão sentenciados e executados em Outubro de 1817, pedindo revista dos procéssos, e separação de damnos e injurias: Mandão as Cortes remetter a mesma Representação á Regencia do Reyno para competente applicação do Decreto de 9 de Fevereiro proximo passado, em cuja disposição se acha comprehendida a materia de que se trata. O que V. Exa. fará presente na mesma Regencia para sua intelligencia e execução.

Deos guarde a V. Exa. Paço das Cortes em 2 de Março de 1821. = João Baptista Felgueiras.

Erratas.

No Diario N.º 22, pag. 159, columna 2.ª onde se lê = de modo que se possa arrogar - lêa-se - de modo nenhum se possa arrogar = e onde se lê - observancia Ley Constitucional - lêa-se - observancia, da Ley Constitucional. Na pag. 160, columna 1.ª, onde se lê = germen de abusar - lèa-se - germen de abuso = e onde se lê - huma electiva - lèa-se - huma Camera electiva etc.

No Diario N.º 23, pag. 173 columna 2.ª onde se lê = comprehende-se no artigo antecedente - lèa-se - no antecedente. E neste mesmo N.° pag. 1.ª columna 2.ª, a falla do Senhor Annes de Carvalho vem muito alterada e chea de erros substanciaes, v. g. eleitos pelo Parochos - em vez de - pelos Pares, etc. etc.

No Diario N.º 24, pag. 176, fim da 1.ª e principio da 2.ª columna, onde se lê = na conformidade do artigo, não póde ter lugar - lèa-se - na conformidade do artigo, devendo ser todos os Beneficios providos por concurso, não póde ter lugar.

LISBOA: NA IMPRESSÃO NACIONAL,

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