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Deus guarde a V. Exc.ª Paço das Cortes em 10 de Junho de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes geraes e Extraordinarias da Nação portugueza, tomando em consideração o que lhes foi representado por thomaz Murphy, sacerdote irlandez, o qual, com a permissão do seu proprio diocesario, prettende entrar na congregação do Oratorio da cidade do Porto, pelo tempo necessario para se instruir nas sciencias ecclesisticas, e não para fazer profissão religiosa, e ficar perpetuamente pertencendo áquella corporação: attendendo a que nestes termos a pertenção do supplicante não he contraria á resolução das Cortes de 21 de Março de 1821, que suspendeu as admissões e entradas de noviços para as ordens religiosas: resolvem, que o supplicante Thomaz Murphy, não obstante a citada ordem, póde ser admittido temporariamente, e para o referido fim na mencionada congregação. O que V. Exc.ª levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exc.ª Paço das Cortes em 19 de Junho de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para Candido José Xavier.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza, tomando em consideração o que lhes foi representado pelo doutor Antonio de Almeida Caldas, ex-deputado do fisico mór do exercito, nácerca de Ter sido excluido por ser lente da Universidade, da percepção da Quarta parte do seu soldo, que pelo artigo 7.º do decreto das Cortes de 14 de Dezembro de 1821 se arbitrou os afficiaes de saude, nos termos nelle declarados, ao mesmo passo, que há tres annos não recebe algum ordenado da Universidade, e há mais de um anno se acha gravemente enfermo: attendendo a que o supplicante não deve ser privado da mencionada gratificação, uma vez que esteja nas circunstancias de citado decreto, não se verificando a condição de receber outro ordenado, principalmente quando elle se vê destruido de algum meio de subsistencia: mandão dizer ao Governo, que passe as ordens mais positivas, para que pelo cofre da Universidade se pague ao supplicante o seu ordenado, se a elle tiver direito; e não o tendo; que se lhe abra novo assento na thesouraria geral das tropas, para ser pago regularmente, e indemnizado do que se lhe estiver devendo, fazendo-se a precisas verbas, e declarações, para que não receba por duas partes, mas nunca deixe de receber por uma o ordenado, ou gratificação que lhe pertence. O que V. Exc.ª levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exc. Paço das Cortes em 19 de Junho de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza, tomando em consideração o que lhes foi representado pelo ex-deputado do cirurgião mór do exercito. Manoel José da Rocha, o qual expõe que foi contemplado na fórma da disposição do decreto das Cortes de 14 de Dezembro de 1821; mas que havendo servido desde 1793 na qualidade de cirurgião da armada, e do exercito, e tendo feito as campanhas de 1804, e as da ultima guerra, por espaço de 29 annos, pretendia ser reformado, segundo a lei de 16 de Dezembro de 1790, por se achar velho, e falto de saude: attendendo a que o citado decreto de 14 de Dezembro teve em vista beneficiar extraordinariamente os officiaes de saude do exercito, e de nenhuma maneira privalos de qualquer direito, que houvessem adquirido: resolvem, que não obstante aquelle decreto, o Governo está autorisado para conceder ao supplicante a refórma requerida, uma vez que a ella tenha direito, na conformidade das leis. O que V. Exc.ª levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exc.ª Paço das Cortes em 19 de Junho de 1822. - João Baptista Felgueiras.
Redactor - Velho.

SESSÃO DE 20 DE JUNHO

ABERTA a sessão, sob a previdencia do Sr. Gouvêa Durão, leu-se a acta da antecedente, que foi approvada.
O Sr. Secretario Felgueiras deu conta do expediente, mencionando os seguintes officios.
1.º Do Ministro dos negocios do Reino transmittindo o resultado dos trabalhos apresentados pela Commissão estabelecida em Santarem para apontar os estorvos do commercio, e meios de o melhorar. Passou á Commissão de commercio.
2.º Do Ministro da fazenda, remettendo a relação axigida da junta dos novos emprestimos por ordem das Cortes de 8 do corrente. Passou á Commissão de fazenda.
3~.º Do Ministro da guerra servindo pelo da marinha, remettendo a parte de registo do porto tomado no dia de ontem á corveta portugueza Princeza Real, galera portugueza Bella Maria, e bergantim portuguez Tejo, vindos os primeiros dois do Pará, e o ultimo da Bahia, de que as Cortes ficárão inteiradas: e bem assim remettendo um officio do brigadeiro José Maria de Moura, em que participa ter no exercito do governo das armas da provincia do Grane Pará no dia 9 de Abril, e que pela repartição competente envia as noções, que tem formado o estado daquella provincia; de que as Cortes ficárão inteiradas.
4.º Do mesmo Ministro, remettendo um officio do capitão tenente, commandante do registo do porto, em que participa Ter-se incendiado a galera mercante portugueza Viaconde de Monte Alegre, de que ficárão as Cortes inteiradas.

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5.º Do brigadeiro Cabreira, governador das armas do Algarve, em que, participando em seu nome, e da tropa daquelle Reino, a indignação, com que ouvírão a noticia da conspiração descoberta protestava a inviolabilidade do juramento, que prestara, de defender a Religião, as Cortes, a Constituição, e a ElRei Constitucional; de que se fez menção honrosa.
6.° Do tenente general Jorge da Avilez Juzarte de Sousa Tavares, em que põe na presença do Congresso a copia impressa de uma participação, que dirigiu do Rio de Janeiro ao mesmo Congresso por mão do capitão tenente Joaquim Bento, commandante do correio marítimo Princeza Real, o que prova ter sido aberto o dito officio em desacato da suprema autoridade que foi mandado á Commissão de Constituição
7.º Do governador das armas da província da Bahia, em data de 7 de Março, de que já se recebeu a 2.ª via, e dá qual se deu conta em sessão de 29 de Maio. Mandou-se ficar na secretaria.
8.° Do Sr. Lino Coutinho, Deputado pela provincia da Bahia, participando a impossibilidade de assistir ás sessões de Cortes, por cujo motivo se lhe concedêrão 30 dias de licença.
Ouviu-se- com agrado uma felicitação feita ás Cortes pelo tenente coronel do corpo de engenheiros, Manoel Joaquim Brandão de Sousa em consequencia do feliz descobrimento da conspiração nesta cidade.
Tambem se ouviu com agrado outra felicitação feita: às Cortes, e protestos de respeito, e obediência ás mesmas, e adhesão ao systema constitucional, pelo brigadeiro Francisco Saraiva da Costa efoias, chegado do Rio de Janeiro.
Foi presente um oferecimento feito por Antonio Nicoláo de Moura Stokler, de varios exemplares de um escrito por elle publicado em abono, de seu pai, e juntamente de uma ode dedicada ao fausto dia do anniversario da installação das Cortes, composta por José Augusto Cabral de Melia, da cidade de Angra, e em nome delle offerecida, para tudo ser distribuído pelos Srs. Deputados; o que se verificou.
Passou á Commissão de Constituição uma memoria que fôra remettida á junta preparatoria de Cortes em 24 de Outubro de 1820, e oferecida de novo ao soberano Congresso por José Ferreira, exadministrador das fabricas nacionaes de lanificios de Portalegre.
Feita a chamada, achárão-se presentes 118 Deputados, faltando com licença os Srs. Falcão, Quental da Camara, Camello Fortes, Moraes Pimentel, Ribeiro da Costa, Sepulveda, Bispo do Pará, Borges de Barros, Aguiar Pires, Vicente da Silva, Segurado, Faria, Lino Coutinho, Sousa Almeida, Borges Carneiro, Marcos Antonio, Araujo Lima, Ribeiro Telles, Silva Correia; e sem causa reconhecida os Srs. Andrada, Bueno, Ferreira Cabral, Agostinho Gomes, Baeta, Castro e Abreu, Pinto de França, Arriada, Grangeiro.
Passando-se á ordem do dia, entrou em discussão o additamnto offerecido pelo Sr. Serpa Machado ao artigo 2.° do projecto sobre a extincção dos privilegios do foro, em que propunha, se exceptuassem desta extincção os juizos do crime e orfãos que ficarião substituido até á conclusão do codigo civil; e bem assim os juizes, que segundo os artigos da Constituição se houverem de installar para os diplomaticos, e, outros empregados.
Em apoio deste additamento, disse o seu illustre autor: - Entre as excepções que se devem, fazer á regra geral estabelecida no artigo primeiro, deve ser uma esta que proponho em favor dos orfãos, e pessoas miseraveis. Em vão se disse, quando ella começou a ser discutida, na sessão passada, que a continuação de tal privilegio de foro, e juizo privativo em favor dos orfãos he contraria ao disposto nas bases da Constituição, quando abolirão todos os privilegios pessoaes de foro; por quanto o artigo 11.º das mesmas se acha suspenso, e excepção que eu proponho he temporaria, até que se faça o codigo civil, o qual dando providencias para que se administre prontamente a justiça nos juizos ordinarios, offereça alguma protecção aos bens, direitos, e pessoas dos desvalidos orfãos, os quaes agora privados do seu juizo, ficarião abandonados, á capacidade dos seus tutores, e curadores, e á cobiça, de todos quantos interessão em defraudalos. Nem se diga, que reservando-se aos actuaes juizes dos orfãos a juridiscção voluntaria sobre os mesmos, fica tudo providenciado; por quanto ninguem dirá que nesta jurisdicção voluntaria se comprehendem, as causas dos inventarios, e mil outras questões, accidentaes, quando nascem da administração das tutelas, das contas, dos arrendamentos, os quaes saindo daquelle juizo privativo, irião lançar, a confusão, e a desordem na administração dos bens dos orfãos, e na sua fortuna.
Disse outro, honrado Membro, que se admirava que em um seculo de luzes se pretendesse sustentar um privilegio odioso contra, o sagrado principio adoptado nas bases de que a lei he igual para todos. Eu porém em resposta digo que muito me maravilho de que em um seculo de luzes ainda haja quem confunda a igualdade de direito: os homens todos são iguaes em direitos quando se achão em as mesmas circunstancias, porém são desiguaes de facto. He por isso que o mesmo direito que se estabelece para os pais de famílias, he differente do que rege os filhos, a mesma differença ha entre o militar, e o que o não he; entre o que manda, e o que obedece. Se pois a situação dos menores he desigual á dos mais cidadãos, porque razão se lhes não hão de conceder direitos mais favoraveis? Por ventura não tem seguido esta marcha todas as legislações do mundo? Não se lhes tem em todo o tempo concedido o beneficio da restituição, e mil outras prerogativas que equivalem a um verdadeiro privilegio? De mais, Sr. Presidente, reparemos bem que o regimento dos orfãos trata tão colligadamente da causa, e pessoa dos orfãos, que he bem difícil deixar substituir uma parte delle, abolida a outra. Nem nos illudamos com as regras e principios geraes, quando as mais das vezes exigem modificações accommodadas às circunstancias; estabelecidas repentinamente, e sem preparação, lanção a confusão na sociedade, deixão um vacuo que a providente sabedoria deveria ter preenchido. Muito ac-

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ceita foi a lei que aboliu os lugares se capitão mór, e mais officiaes de ordenanças, quando por muito tempo tinhão abusado dos seus officios, porém para que esta medida fosse verdadeiramente providente, deveria vir acompanhada de um bom regimento para o recrutamento, e não se confiar este importante objecto ás camaras, que por sua natureza são incapazes de o desempenhar, o que a experiencia tem mostrado pelos clamores que se tem levantado contra o methodo por ellas adoptado; e nesta capital não tem sido possível levalo ao fim, o que seria de um damno irreparavel na presença de uma guerra, e de uma defesa. O mesmo direi das candelarias abolidas sem substituição; do regimento do fysico mór, e seus subalternos supprimidos sem se lhes substituir quem olhe pela saude publica, e pelos abusos dos charlatães dos boticarios. Simithantes providencias, quando são incompletas, semeião a confusão na sociedade, como a sabedoria deste Congresso tem reconhecido ha reforma das camaras, e em outros objectos posteriormente alterados. Faça-se pois novo regimento para os orfãos, ou espere-se que o codigo o faça, e então aboliremos tem risco o privilegio pessoal dos orfãos. O mesmo digo do foro criminal ordinario e territorial, e ainda mesmo do militar. Em poucos mezes um e outro destes codigos se hão de concluir, nelles se hão de introduzir os jurados; para que serve pois fazer agora mudanças quando só podem durar até á factura dos codigos criminal, e militar, que necessariamente hão de alterar todos estes objectos? As outras excepções são aquellas já approvadas na Constituição em favor dos diplomaticos, ministros, e conselheiros de Estado. Nem se clame tanto em favor da generalidade de uma regra de abolição de privilegios pessoaes de foro em o mesmo momento em que se acaba de adoptar uma excepção em favor dos Deputados, que importa um foro, e manifesto privilegio pessoal, talvez mais odioso que os que eu proponho.
O Sr. Guerreiro: - Apezar das razões que o illustre Preopinante acaba de expor, parece que nenhuma das excepções propostas deve ter lugar nesta lei: quanto á dos juízos, não póde ter lugar algum, porque todas as razões que manifesta o illustre Preopinante que agora se verificarião, hão de sempre verificar-se quando se extingão; e as consequencias hão de ser as mesmas. Pelo que respeita aos militares, no sou foro privativo, são julgados por leis muito mais rigorosas e mais duras, e que deixão menos arbítrio á equidade que as leis civis, tanto assim que a experiencia mostra que os militares, pelos crimes civis, procurão antes ser julgados nos tribunaes civis do que dos conselhos de guerra; além de que uma vez que estão reconhecidos os inconvenientes que resultão destes privilegios, he necessario abolilos quanto antes, para que se comece a gozar dos benefícios que possão resultar de sua abolição. Tambem não vejo que seja exacto o que diz o Preopinante ácerca dos orfãos, e por conseguinte nenhuma destas excepções deve prevalecer, muito mais quando se estas se admittissem, nós acharíamos igual razão para admittir outras; e desta maneira iríamos lançar por terra a regra geral: se se exceptuão os militares, porque não os estudantes? Se os orfãos, porque não as viuvas? Se os estudantes, porque não os ecclesiasticos? E assim iríamos conceder tantos privilegios como antes havia. Por tanto, no meu entender não deve ser a indicação admittida. (Apoiado, apoiado).
O Sr. Caldeira: - Eu tambem sou de voto que não póde admittir-se a indicação, porque se se admittisse, viria, a destruir o que com tanta reflexão e madureza foi decretado pelo soberano Congresso.
O Sr. Franzíni: - Eu sou de opinião contraria á que tem manifestado os illustres Preopinantes: julgo que deveríão ser exceptuados os militares não como privilegio, mas pela razão de que devem considerar-se os conselhos de guerra como um verdadeiro jury. Ora agora tendo nós sempre considerado esta instituição como uma das melhores que offerece o novo systema, não vejo a razão porque a quereremos tirar aos militares. Eis-aqui pois o motivo porque eu digo que devem ser exceptuados.
O Sr. Barão de Molellos: - Sr. Previdente, já ontem apoiei, e novamente o faço, a opinião do Sr. Serpa na parte que diz respeito aos militares. Chamem-lhe privilegios pessoaes ou de causa; ao que eu me opponho, e me oppuz ontem, he que se tirem ou alterem os privilegios que presentemente tem os militares; até porque isto mesmo sanccionarmos nas bases da Constituição, quando diremos: Esta disposição não comprehende as causas que pela sua natureza pertencem a juizos particulares, na conformidade, das leis que se fizerem. Não só por esta expressão se assegurou ao exercito bem claramente a continuação dos seus privilegios de foro, mas até por uma ordem do dia que teve lugar pouco depois da discussão sobre esta materia, e he preciso cumprir-se o que se promette e sancciona. Fundárão alguns dos Srs. Preopinantes a sua opinião, em dizerem que os militares melhorão de fôro, que se lhes faz muito favor, que na província do Além-Téjo declinão e preferem o foro civil; respondo que se isto acontece na província do Além-Téjo não se segue que aconteça em todo o Reino, e assevero que realmente não acontece; além de que não se lhes tira o direito da escolha; e repito que a maior parte preferem o foro militar. Mas a causa principal porque me levantei foi para dizer que a questão não deve encarar-se só pelo lado que a olhão os illustres Opinantes, pois que todos os cidadãos devem sujeitar-se ao bem geral. Levantei-me para repetir o que por vezes tenho dito, que similhante decisão se oppõe á disciplina militar, e que sem ella não existe exercito, ou he melhor que não exista. Sobre tão importante objecto reclamo a attenção do soberano Congresso, e advirto o desgosto que isto póde causar á tropa da primeira e segunda linha, a quem se prometteeu o que já disse.
O Sr. Freire: - Eu julgo que se está perdendo o tempo nesta discussão. Pois temos sanccionado o principio, de que ficão abolidos todos os privilegios de fôro, e agora se querem excepções? Se na Constituição se fez alguma excepção, isso mesmo prova, que as que se fizerão se julgárão tão essenciaes, que se declararão expressamente, para não dar lugar a que outras se introduzissem. Póde agora admittir-se

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duvida alguma a este respeito.º A üUlincçuo sobre os orfãos foi feita ontem com tal clareza que só a não querer, he que poderia deixar de se entender; não se entrou na discussão sobre a administração dos orfãos, actual regulamento dos juizes dos orfãos, mas sobre o privilegio que estes tinhão de chamar os outros ao seu juizo. Eu não sou de parecer que se conserve nenhum destes privilegios, que menciona a indicação, porque se se conservão a respeito de uns, devem-se conservar a respeito de todos, e então ao pé dos orfãos collocaremos as viuvas, ao pé das viuvas as donzelas, ao pé das donzela: os desembargadores, e assim successivamente iremos fazendo tantas excepções que se destrua inteiramente a regra geral (apoiado, apoiado).
O Sr. Serpa Machado: - Que se rejeite o additamento, porque as razões em que se funda, não sejão justas, acho muito bom; mas não se diga que senão approva por estar já prevenido, pois se se estabeleceu uma regra geral, disse-se ao mesmo tempo, que se farião excepções. As que eu proponho, não são excepções absolutas, senão temporarias e em quanto se faz o codigo criminal; portanto digo que se tem fugido muito da questão.
O Sr. Moura: - O illustre Preopinante não tem razão nenhuma em dizer que este negocio não esteja já prevenido por decisões anteriores: eu digo pelo contrario que o negocio está prevenido, e não por lei secundaria, mas por lei fundamental; e ainda mais que estar prevenido por lei fundamental, porque temos conseguido o mais que se podia conseguir em materia de legislação, que he reformar o iniquo systema de privilegios; mal que minava nossas leis. Digo que está prevenido por uma lei fundamental, porque nas bases está consignado que ficão abolidos todos os privilegios de foro; logo não se podem admittir excepções, pois até para evitar que se fação excepções, diz-se nas mesmas bases claramente: excepto só aquelles privilegios de causas; logo quando se faz uma só excepção á regra geral, que he o que se segue dahi? Prohibe-se que seja admittida outra excepção, e muito menos numa lei secundaria. Ora dir-me-ha o Preopinante, e os que seguem a sua opinião: mas nesse mesmo projecto foi admittida uma excepção, que he o privilegio de foro dos estrangeiros? Respondo que admittimos aquelle privilegio porque resulta, não de uma lei, mas de um contracto que a nação está obrigada a observar: além de estar isso prevenido pelas bases, está tambem prevenido pela decisão que ontem se tomou; e portanto nenhuma excepção se póde augmentar, sem sair da lei fundamental, que he clara, e não admitte senão os privilegios de causa.
O Sr. Fernandes Thomaz. - Como não assisti ontem á discussão, nem às resoluções que se tomárão, não posso saber se os juizes dos orfãos ficão ou não com alguma jurisdicção, e desejava que V. Ex.ª me desse alguma informação a este respeito.
O Sr. Presidente: - Isso não he o que esta em discussão: o honrado Membro deve cingir-se á indicação do Sr. Serpa Machado.
O Sr. Fernandes Thomaz: - Pois em quanto á indicação do Sr. Serpa Machado não me parece justo que passe, nem he attendivel, porque a excepção dos juizes criminaes estava admittida em Portugal póde-se dizer por economia, na maior parte onde não havia os juízos privilegiados. Em quanto ao mais que diz respeito a privilegios de pessoa, tambem não me parece que possa sustentar-se. Como se poderá conservar a um dezembargador ou a outros os privilegios de foro? Seria uma iniquidade, agora que tratamos de pôr em execução o artigo das bases: he preciso que entendamos que o que agora se trata, he ver o modo porque se ha de fazer exequível o artigo das bases que destruiu os privilegios de foro. Não me parece per tanto que haja razões attendiveis para se admittir a indicação, nem as razões do Sr. Serpa Machado são de grande pezo, para que o Congresso deixe de por em execução o decreto das bases: mas pelo que pertence aos orfãos acho que tem muita razão; he necessario, ou acabar com o juizo dos orfãos, substituindo-lhe outra cousa, ou conservalo no estado em que se acha em quanto se não dão outras providencias no codigo civil, porque ou se conserva esse juizo (que era a pergunta que eu fazia) com alguma jurisdicção, ou sem nenhuma: ou com alguma he necessario declarar em que consiste, se sem nenhuma, he uma quimera, porque não sei o que he ser juiz sem jurisdicção; então basta-lhe ser administrador, mas juiz de orfãos sem jurisdicção, he cousa que não entendo. He certo que todo o privilegio he odioso, e depois de terem sido extinctos nas bases os privilegios, he necessario buscar os meios porque este artigo tenha sua execução: com tudo a respeito dos orfãos, parece que exige a justiça que se dê alguma providencia, ou que se deixem as cousas no estado em que estão, até que o codigo civil marque o modo porque isto deve regular-se. Pelo que pertence ao inventario he tambem necessario declarar quem ha de ser nelle juiz, porque ou ha de ser o juiz territorial, ou o dos orfãos: seja um ou outro, he necessario que elle só seja juiz daquella causa, e de todos os negocios dependentes do inventario.
O Sr. Manoel Antonio de Carvalho: - Sr. Presidente eu sou de opinião, que depois de se ter estabelecido na Constituição, já mais haja privilegios de pessoas, e que todos os que pertenção a sociedade sejão sujeitos ás mesmas leis, esta regra deve ser invariavel, e impreterivel: e este beneficio que a Constituição nos porporcionou deve ser quanto antes abraçado. Não sou pois da opinião do illustre Preopinante autor desta indicação. Elle mesmo está convencido que o privilegio pessoal de foro não deve existir, e sómente quer retardar este beneficio, até á conclusão dos codigos, imaginando que cita poderá ter locar daqui a tres ou quatro mezes: Se realmente assim fosse, como elle anhela e deseja (e tambem eu), então não duvidaria que por quatro mezes se espaçasse esse beneficio; porém como eu penso, que não só serão necessarios quatro mezes, mas muito mais tempo, por isso julgo que se não deve retardar a execução. Pelo que pertence aos orfãos, o juiz ordinaria será assás habil e capaz, para por em pratica o regulamento, que para os orfãos he dado. Devemos por consequencia extinguir até este privilegio exclusive

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que em certo modo póde deslembrar aquelles que virem, que selem sanccionado na Constituição, que he util a extincção de todos estes privilegios; se he util para iodos, seja-o para os orfãos, e de hoje em diante não vejão mais em lugar de um pai, um padrasto; porque a experiencia tem mostrado, que até aqui os que devião ser os pais dos orfãos, tem sido os mesmos que tem consumido os seus bens, e mais lhes tem prejudicado. Por isso assento que o remedio que o illustre autor da indicação quer dar aos orfãos, excitado por seu bemfazejo coração, vai-lhes occasionar um mal: e assim não julgo util a dita indicação.
O Sr. Moura: - O meu collega e amigo, o Sr. Fernandes Thomaz, parece que se acha embaraçado na execução da lei geral das bases, pelo que diz respeito á manutenção do privilegio dos orfãos, que he concedido por nossas leis; mas eu, sem mesmo fazer differença entre juiz de administração, ou juiz de jurisdicção contenciosa, sem fazer esta differença, que se podia fazer muito bem, acho que não nos podemos ver embaraçados com a excepção das bases a este respeito; porque quem he que trata das causas dos orfãos? Não são os juizes territoriais? Pois porque o não hão de poder fazer, tanto relativamente às partilhas, como pelo que diz respeito às contendas que tem com os cidadãos? Acho pois que não ha inconveniente em abolir aquelle juizo. Na maior parte das terras os juizes de fóra são os que conhecem das causas dos orfãos, porque são igualmente juizes dos orfãos: logo se isto se acha estabelecido na maior parte do Reino, porque não se ha de poder estabelecer era todo elle? Se tem maior trabalho tenhão paciencia, não deve durar muito; e entretanto tambem tem maiores rendimentos; mas só por esse inconveniente que não ha de durar muito, não deve existir uma excepção, que he diametralmente opposta às Bases. De nenhum medo se deve admittir o juizo dos orfãos, porque não ha inconveniente algum no contrario; e se houvesse, seria facil remedialo. O termo de Barcellos, por exemplo, he muito grande, e he necessario dividilo; divida-se: antes dividilo, do que infringiras Bases: além de que não ha nenhum inconveniente em que se dê aos juizes locaes as mesmas attribuições, para que executem o regimento que os juizes dos orfãos executavão até aqui. Quem em todas as partes faz isso, não he o juiz de fóra? Pois só porque em Lisboa, e em uma, ou outra terra ha juizes dos orfãos, ha de se quebrantar a lei das Bases, tendo outro remedio melhor? Não me parece justo.
O Sr. Ferreira Borges: - Eu já falei ontem nesta materia, pelo que tratarei de não repetir o que já disse; e direi muito menos, por isso mesma que já fica previnido em parte pelo illustre Membro, que acabou de falar. Nós não tratamos senão de pôr em pratica aquella base geral, que na Constituição se estabeleceu. Está demonstrado por um illustre Preopinante, e já ontem se tinha tocado esta materia, que não convinha que houvesse uma só excepção, porque igualmente pareceria justo fazer-se excepção para as viuvas, donzellas, mentecaptos, e prodigos. Está tambem demonstrado, que a respeito dos orfãos ia cair essa excepção sobre 3 ou 4 cidadãos de Portugal, por isso que só em Lisboa, Porto, Barcellos e alguma outra parte, he que ha um juizo particular, estando nas mais do Reino confundido no juizo geral; logo não parece que isto seja sustentavel. Mas tocou-se uma circunstancia, que quanto a mim merece resposta: disse um dos illustres Preopinantes, que não sabia para que ficava existindo o juiz dos orfãos senão ficava existindo a jurisdicção contenciosa. Abrindo a ordenação, livro 1.°, acho o regimento dos orfãos, e vejo por uma parte inventario, e por outra, causas; pelo que toca á primeira cousa que eu nego, he que o inventario seja causa. Vou demonstrar isto, e não o posso fazer de outra maneira melhor do que fazendo aqui um inventario do melhor modo, e o mais depressa que pudor. (O Orador mostrou o que se costumava fazer no inventario). Por tanto dentro do inventario não vejo que haja cousa contenciosa; e não ha razão nenhuma para haver um juizo privativo, uma vez que já pelas Bases se tem determinado o contrario.
O Sr. Freire: - Eu tenho pouco a dizer sobre esta materia: um illustre Preopinante tem mostrado com toda a extensão, que já está prevenido, que era o que eu tinha desde o principio indicado, e direi mais que não só está prevenido pela decisão das bases que extinguem os privilegios pessoaes de foro, mas tãobem a mesma razão indica que não deve haver taes privilegios, uma vez que tambem está sancionado que todos são iguaes ante a lei. Pelo que pertence às duas excepções que se fizerão da regra geral, a primeira que he a dos ministros de estado, em rigor não he privilegio de pessoa, se não de causa: um secretario de Estado, no momento que o deixa de ser, he julgado como outro qualquer cidadão, e ha de ser tambem julgado do mesmo modo, no entanto que seja secretario de Estado em tudo o que não for pertencente ao seu officio. Consequentemente he excepção de causa, e não de pessoa. A Segunda, que he relativa aos estrangeiros, he em consequencia de tratados, que em quanto existirem, não podem deixar de ser observados. Porém eu levantei-me mais particularmente para dizer, que no caso de se admittir mais alguma excepção além das indicadas, quero reservar-me o direito de propor outra a favor dos militares, e talvez a favor de alguma outra classe, pois nada seria mais impolitico, que fazendo-se uma regra geral, concederem-se excepções, a favor de uma daquellas classes que erão privilegiadas, e não se conceder às outras (Apoiado, apoiado).
O Sr. Fernandes Thomaz: - Se o Congresso adoptar a opinião do Sr. Moura, a questão muda de figura, passa para os juizes ordinarios a jurisdicção dos juizes dos orfãos: passe, não tenho nada com isso, mas essa não he a questão; a questão he, se ha de existir o regimento com os privilegios que antes tinha. O que eu disse, digo, e direi sempre he que me parece injusto e iníquo, tirar-lhes aquelles meios, por que conservavão suas pessoas e bens, sem se substituir outros. Seremos nós os primeiros que havemos de olhar com indifferença para os orfãos, que em todas as partes são considerados com indulgencia? Por ventura achão-se elles nas mesmas circunstancias

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os mais cidadãos? Não se lhes dê o privilegio, mas he necessario substituir alguma cousa ao antigo. Um illustre Preopinante fez um inventario muito depressa; quizesse Deus que assim se fizesse no foro; mas a experiencia mostra o contrario, e muitas vezes vemos originarem-se demandas. Fez-se um inventario a um minuto; mas ha inventarios que podem durar vinte annos; a lei o diz: e ha muitos que durão cincoenta annos. E então havemos de deixar os orfãos neste estudo? Em uma palavra não se substitua nada, mas fale-se com clareza a este respeito. Eu não digo que se conservem os privilegios dos orfãos; falo bem claro, mas digo que he necessario se substitua alguma cousa, porque elles merecem contemplação.
O Sr. Castello Branco Manoel: - Sr. Presidente, para ser coherente comigo mesmo não posso approvar a indicação do Sr. Serpa Machado, que serve de objecto á presente discussão. Logo que eu tive a honra de sentar-me neste recinto, para satisfazer os desejos dos povos da Madeira que represento, offereci um projecto de decreto para se extinguir a jurisdicção de tres unicos juizes de orfãos, que ha naquella província. E tendo-o eu assim proposto he porque tambem pretendia ver extincto o privilegio do foro concedido nos mesmos orfãos. Quer o illustre autor da indicação que subsista este privilegio em quanto senão organizar, e sancciosar o novo codigo civil, persuadido que só dahi podem resultar as providencias, que hajão de promover a felicidade dos mesmos orfãos, os quaes na nossa legislação, e em a de todas as Nações, sempre merecerão contemplação especial, e o cuidado dos legisladores; porem elle quer uma cousa contra aquillo mesmo que jurou no artigo 11 das bases. Logo que estas se publicarão e jurarão, ficou extincto este privilegio, e como quer agora o respeitavel autor da indicação, que elle progrida até á publicação do novo codigo civil, que prudentemente não podemos esperar antes de quatro annos? He certo que este artigo 11 ficou suspenso por depender de nova lei, que he a presente, em que se tratasse do seu desenvolvimento, mas accresentão os mesmas bases: que terá feita immediatamente. Para dar cumprimento a esta sancção ha muito tempo que esta lei devia estar feita, e que o privilegio em questão se devia mandar pôr em execução; e havemos ainda de esperar quatro, ou mais annos? A espera desse prazo será conforme com aquella determinação, que diz: a lei será feita immediatamente? Estou persuadido que a materia da indicação de fórma nenhuma póde ser votada, porque se fosse approvada, seria uma decisão contraria ao que se acha sanccionado nas bases.
Ainda mesmo que não estivesse previnida a votação, ella sem duvida não sendo conforme às regras da justiça e igualdade, devia ser reprovada. Por ventura haverá uma cousa mais injusta do que o orfão, ou mesmo qualquer pessoa miseravel poder chamar ao seu foro, seja autor, ou réo, o seu adversario que muitas vezes reside em outros districtos, e até em differentes províncias, causando-lhe o maior incommodo? Onde está aqui a igualdade da lei tão proclamada? He, ou foi nunca justo dar a um indivíduo direitos com prejuizo de terreiro? Póde dizer-se que por ser órfão incapaz de defender-se, he motivo bastante para o auxiliarmos com detrimento dos outros cidadãos? Não: elles são representados pelos seus tutores ou curadores, que devem promover os seus intendes: e não ficão elles responsaveis de os não zelarem? Pois para que havemos de ir prejudicar os outros cidadãos com este privilegio que muitas vezes só pode servir para cevar o odio dos tutores, quando estes para se vingarem de seus inimigos os chamarem em nome dos orfãos de lugares remotos só para os vexarem? Eu estou persuadido que os orfãos são dignos de toda a contemplação; mas vejo que principalmente naquella província da Madeira lhe faríamos maior beneficio ainda extinguindo este privilegio que realmente se lhe torna um mal; mais util lhes seria que os ordinarios curassem dos seus bens, dos seus direitos, e das suas pessoas. Os orfãos, as viuvas, e mais pessoas miseraveis são mitas vezes obrigados a irem allegar a sua justiça perante o juiz de orfãos, que muitas vezes reside 15, 20, e mais leguas distante da habitação destes miseraveis, de forma que isto he prejudicialissimo não só aos contendores, que em consequencia deste privilegio são obrigados a irem muito longe de suas casas a responder áquelle juízo, mas nos mesmos orfãos, a quem se podia administrar a justiça no lugar do seu domicilio. Se assim não fosse, o juiz do lugar da sua residencia seria capaz de lhe dar a mesma protecção que poderião encontrar no juízo dos orfãos. Acaso os homens que occupão este emprego serão de natureza differente da dos outros juizes do civel? Serão alguns anjos em quem os orfãos possão achar alguma protecção? Não: elles são homens como os outros. Quando quero a extincção não só do privilegio do foro, mas do mesmo officio de juiz de orfãos, não quero com isso dizer que esses miseraveis não sejão protegidos como até agora, conforme manda o regimento. Cesse o privilegio que he nocivo aos mais cidadãos, e continuem esses juizes ordinarios a cumprir a respeito dos orfãos o que o regimento muito lhes recommenda; nem aqui se trata de abolir aquelle regimento, mas sim a parte della que he odiosa, isto he, o privilegio do foro, ganhando-se além disto com a extincção do juízo, e fazendo-se grande economia com a extincção dos empregados públicos. Nunca se julgou necessaria a existencia dos juizes de orfãos: na maior parte do Reino os não ha, e ainda naquelles lugares onde existem, a lei não achou inconveniente algum em passar a sua jurisdicção para os ordinarios, quando acontece vacancia. He verdade o que dizem alguns illustres Membros, que accumulando-se a jurisdicção dos juizes dos orfãos aos ordinarios em alguns lugares do Reino, não poderião estes, pela affluencia dos negocios satisfazer ao despacho de todos elles; mas como no Reino não haverá mais de uma duzia de districtos, que se achem em iguaes circunstancias, dividão-se estes districtos, e será este incommodo muito menor ao mal que resulta da existencia daquelles magistrados. Tem havido tambem alguns Srs. Deputados, que querem haja sempre juizes de orfãos, mas que seja unicamente para terem a jurisdicção voluntaria, e a administração da pessoa, e bens dos orfãos. Dem-se-lhes tutores (di-
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zem elles); fação os inventarios; cuidem na administração dos bens; vigiem sobre a educação da pessoa; mas quando se tratar de jurisdicção contenciosa, passe esta para o juizo geral, e ordinario. Parece á primeira vista muito razoavel esta opinião; mas eu a não posso admittir. Estou intimamente persuadido (apezar do que se tem dito) que nos inventarios, e na administração dos bens, se acha muitas vezes envolvida a questão contenciosa, e de tal fórma connexa, que aos mesmos orfãos com esta separação, e divisão, se seguirião grandes males. Que multidão de questões não irião suscitar-se? Que conflictos de jurisdicção não haveria entre o juiz que exercitasse a jurisdicção contenciosa, e o dos orfãos, que linha a voluntaria, e administrativa? Quando essas questões se suscitassem, qual seria o juizo que as havia de decidir? Desta fórma criaríamos um seminario de discordias, e abismaríamos os orfãos em um pélago de pleitos, em lugar de favorecelos. Extingão-se os juizes de orfãos, annulle-se o privilegio do foro, e entregue-se o cuidado da pessoa, e dos negocios aos ordinarios do domicilio dos mesmos. Isto não he uma cousa nova: he quasi geral em todo o Reino. A experiencia nos tem mostrado que nenhum mal experimentão: quando forem réos, respondão no seu domicilio; sendo autores vão os seus tutores seguir o foro do outro réo. Assim haverá uma perfeita igualdade entre os cidadãos. Este he o meu parecer.
O Sr. Macedo, depois de ter falado algum tempo sobre a materia, concluiu dizendo: Se acaso nós não queremos que exista o regimento dos juizes dos orfãos, he necessario que se lhe substitua outra cousa, porque deixarmos isto á discrição, sem dar-mos alguma providencia sobre tão importante materia, seria um descuido indesculpavel. Devo fazer uma reflexão, mas convém a saber, que em algumas terras havia um grande numero de juizes, e todos elles tinhão que fazer. Em Coimbra, só de primeira instancia, havia seis, ou talvez mais, não falando nos de segunda instancia. Ora claro está, que abolido o privilegio de foro, não haverá senão um juizo de primeira instancia. Não sei como um só homem poderá então supprir o trabalho de tantos; por conseguinte parece-me que he necessario que se subdivida aquelle territorio, a fim de haver por este modo mais alguns juizes: porque de outra sorte, em vez de irmos fazer um bem aos povos, vamos fazer-lhes grande mal; pois que um só juizo não he possível que possa dar pronta expedição ás causas que até agora corrião em muitos. O que digo a respeito do districto de Coimbra, estendo igualmente a todos os mais que estiverem em circunstancias analogas.
O Sr. Soares de Azevedo: - Sr. Presidente talvez eu não devesse falar sobre o objecto em questão, depois que sobre elle tem falado tantos illustres, como sabios Deputados: observo porem que a questão vai progredindo, e me persuado que talvez seja a causa o não se ter acclarado bem o estado da questão, o que vou fazer, e a final darei tambem a minha opinião.
Todos sabem que no artigo 11 das Bases estão abolidos todos os previlegios pessoaes de foro, e que a doutrina deste artigo se guardou tão religiosamente neste projecto, que nem se quer consentimos houvesse sobre esse objecto nova votação, sanccionando-se como regra geral, que ficavão abolidos todos os privilegios pessoaes de foro, á excepção dos que erão firmados em tratados, que ficarião subsistindo em quanto durarem os mesmos tratados, por isso que não estava na nossa mão o resilirmos os tratados em quanto elles durassem. O Sr. Serpa Machado autor da indicação em questão, propõe uma excepção a favor dos orfãos, e para a sustentar tem pretendido mostrar o grande prejuízo que resultaria aos orfãos na factura de seus inventarios, e administração de seus bens, se acaso os privassem do seu juizo privativo dos orfãos; a grande consideração, e favor, que os orfãos sempre tem merecido a todos os legisladores, e em todos os tempos, razões estas, que tem parecido de grande pezo a alguns illustres Deputados, e em particular ao Sr. Fernandes Thomaz, pretendendo a conservação deste privilegio, até a factura do novo codigo, em que se estabeleça um regimento para a factura dos inventarios, e outros negocios relativos nos orfãos; pretendendo outros que fique subsistindo o juizo dos orfãos, por tratar unicamente da factura e descripção de inventarios, conta de tutores, administrações de bens, e tudo o mais que for de jurisdicção voluntaria, passando tudo o que for contencioso para o juizo do geral. Para se resolver pois esta questão, no meu entender, com facilidade, parecia-me bastante o notarmos que ha privilegio de causas, e privilegio de pessoas; que neste projecto tratamos unicamente de privilegio de pessoas, e não das causas, porque estas fazem o objecto de outro projecto, offerecido pelo Sr. Barroso: tratando-se pois aqui unica e simplesmente do privilegio de pessoas, e não de causas, não devemos confundir a causa de inventario dos orfãos, com o privilegio que tem um orfão de chamar ao seu juiz privativo um seu contendor, ainda que elle tenha o seu domicilio distante 50, ou 100 legoas: ah! Senhores, e poderemos nós, depois de jurado o dito artigo 11 das Bases, que aboliu todos os privilegios pessoaes de foro, admittirmos este? Poderemos nós depois de jurado o outro artigo das Bases, que a lei he igual para todos, fazermos uma excepção neste caso? Que prejuízo póde resultar a um orfão em demandar, e ser demandado perante o mesmo juizo em que demandão, e são demandados todos os cidadãos? Acaso um juiz por se denominar dos orfãos, será mais sabio, mais recto, ou mais responsavel, do que o do geral? Ou haverá alguma incompatibilidade em que a justiça dos orfãos seja tambem administrada pelo juizo do geral, como por um privativo, e privilegiado! Certamente não, e eis-aqui as razões porque voto contra a excepção, ou indicação do Sr. Serpa.
Em quanto agora á causa do inventario dos orfãos, e administrações dos seus bens, supposto este objecto não pertença a este lugar, por não se poder classificar em privilegios pessoaes, de que unicamente tratamos, todavia devo dizer que quem sabe alguma cousa praticamente de inventarios, ha de reconhecer comigo: 1.º que o inventario he uma cousa, e pro-

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cesso, ainda que summarissimo, contencioso a maior parte das vezes, e talvez dos mais contenciosos e complicados; e os largos annos que muitos tem durado, o comprova; e supposto o Sr. Ferreira Borges nos descrevesse agora em menor de dois minutos um inventario, entre o dizelo, e fazelo, todos conhecem a differença: 2.º que supposto seja regra geral, que todas as questões de mais alta indagem, isto he, que necessitão ser tratadas, e discutidas ordinariamente, se devem separar da questão de inventario, todos sabem que ha certas questões, que tem uma connexão e ligação tão intima com a factura do inventario, que isto não póde progredir, sem que ellas preliminarmente se decidão; todos sabem, que para o inventario he necessario preceder citação dos interessados, que he necessario muitas vezes proceder a sequestro; que se admittem embargos, que ha sentença e execução, etc., etc.: e quem poderá em tal caso sustentar que o inventario não he causa, nem envolve jurisdicção contenciosa, quando elle he contado entre os juízos devisorios, e entre as causas summarissimas? Quem não sabe as grandes e espinhosas questões, que nos inventarios se suscitão sobre collações? É que sem collação não ha inventario? Em consequencia ainda que aqui fosse o lugar proprio para se tratar desta materia, eu nunca poderia convir com aquelles illustres Deputados, que pretendem, que no inventario se separe o que he voluntario do que he contencioso, e que o juízo dos orfãos fique subsistindo tão sómente para o que for voluntario, porque eu confesso não sei fazer differença do que he voluntario na factura de um inventario, ao que he contecioso, excepto se os illustres Deputados, que sustentão esta opinião, querem que a factura de inventario seja uma simples descripção de bens e partilha, sem sentença nem execução, que no meu modo de pensar he uma cousa illusoria. Resumindo portanto as minhas idéas, voto contra a indicação do Sr. Serpa, em quanto pretende que fique subsistindo o privilegio pessoal de foro dos orfãos, e peço não se tome agora em consideração as causas de inventarios dos orfãos, porque não he agora que tem lugar o tratar-se desse objecto, nem he implicancia em ficar subsistindo no entretanto o juízo dos orfãos, sem ficar subsistindo o privilegio pessoal de foro dos orfãos.
O Sr. Ferreira Borges: - Sou obrigado a falar segunda vez, por isso que se atacárão os princípios em que fundei a minha opinião, e com os quaes me parecia haver respondido a alguns dos illustres Membros. O ultimo Preopinante repetiu o que já outro havia dito, que eu fiz muito depressa o inventario, e torna a agitar a questão se o inventario he ou não causa. Eu fiz depressa o inventario, por não têlo querido fazer de vagar, e a fim de não incommodar o Congresso; alem disso, não o fiz mais depressa do que a lei o faz, pois se alguns se fazem de vagar, não he a lei, he a trapaça dos homens quem o prolonga. Em quanto ao chamar-lhe causa, não posso deixar do abrir a ordenação, a qual diz (leu). Não ha no inventario accusador, nem réo, conseguintemente não vejo como possa julgar-se causa... Quanto ao mais, a questão he, se por ventura o privilegio que tem um menor, um mentecapto, um prodigo, de chamar seu devedor a um juízo particular, ou de resistir ao chamamento do seu credor deve ou não ser abolido; e se isto he privilegio de pessoas ou de causa: a questão he, se sendo privilegio de pessoa, póde ainda conservar-se, depois do que já está sanccionado.
O Sr. Castello Branco: - Quando o Congresso sanccionou o que lhe pareceu justo, ácerca dos privilegios de foro, uma unica clareza se fez a este artigo, e foi que sua execução ficaria suspensa até que se fizessem as leis respectivas; he essa lei aquella que nós tratamos actualmente de fazer, para pôr em pratica este artigo; logo parece que uma vez que o artigo não tem excepções, nem as admitte, a lei de que depende sua execução, e que nós tratamos de fazer, não deve ter excepção alguma, nem nós a podemos admittir, depois do que está sanccionado. Sobre isto tem-se dito bastante; e entretanto um escrupulo obrigou a um illustre Membro a offerecer uma indicação relativamente às causas dos orfãos. Alguns honrados Membros tem apoiado esta indicação, e a maior parte das razões estão repetidas. Eu não me levanto pois senão para falar sobre o que dois honrados Membros insistirão, que vem a ser, sobre a necessidade de existir o regimento dos orfãos, mostrando os grandes prejuízos que da extincção ou do transtorno desse regimento poderião provir á fazenda dos orfãos; cousa que a legislação de todas as nações cultas, tanto nos tempos antigos como nos modernos, tem tido em muita consideração, e que eu sou o primeiro que convenho que deve merecer toda a consideração possivel. Mas para mim he raro que os honrados Membros possão deduzir da extincção do privilegio do foro o transtorno desse juízo; isso he o que eu não posso conceber. Em quanto a mim, tem havido alguma confusão de princípios, e dahi he que vem á dificuldade de chegar ao ponto a que nós queremos chegar. De que trata o artigo correspondente da Constituição? de privilegios de foro. De que trata a lei que queremos fazer, senão dos previlegios pessoaes de fóro? Agora que vem a ser privilegios pessoaos de fôro? He por tanto disto unicamente de que se trata; é que tem isto com o regimento dos orfãos? Extinguindo nós este privilegio especial não vamos destruir senão uma pequena parte desse regimento dos orfãos; vamos extinguir uma pequena parte desse regimento que não he de utilidade para os orfãos, e que he de grande prejuízo para todos os outros que tem que contender com elles. Apezar de se abolir este privilegio de fóro, fica subsistindo tudo o mais de favor e protecção que nesse regimento se dá á cousa dos orfãos. Os inventarios dos orfãos devera ser feitos summariamente. Que tem os privilegios de fôro com esse favor que se lhes concede? Em quanto a ter um juízo distincto e separado, nenhum beneficio se lhes faz; só se causa um prejuízo aos outros. Não ha duvida conceder tudo o que for favoravel aos orfãos; mas não se seguindo deste privilegio especiallissimo alguma utilidade real aos orfãos, sendo pelo contrario prejudicial a todos os outros cidadãos, e não podendo por consequencia prescindir-se da regra geral, sustentada nas bases da Constituição, segue-se que a indicação não deve ser approvada.
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O Sr. Guerreiro: - Apezar da grande extensão desta discussão, eu não vi razão alguma para variar de opinião: quando se fez o artigo das Bases da Constituição, logo se teve em vista este e outros privilegios de foro; e esta augusta Assemblea decidiu que todos os privilegios erão intoleraveis. O illustre autor da indicação diz que agora teria inconvenientes... Eu digo que em toda a occasião ha inconvenientes: a legislação portugueza he como um edifício velho, que precisa todo ser demolido, mas tendo o proprietario que viver nelle, he maior inconveniente derribalo todo, que derribar uma só parte; e no entanto que se reedifica, mudar-se para outra, ainda que tenha que passar pelo incommodo de ter uma parede aberta. Não sendo possível fazer todas as reformas num dia, porque isto causaria um grande abalo, he necessario que as reformas se fação pouco a pouco, sendo então menos graves esses inconvenientes, que por outra parte são inevitaveis. A respeito do juizes dos orfãos, sobre que tem versado particularmente a questão, parece-me inconceptivel, como se diz, que tirada a jurisdicção contenciosa fique; inutil o seu regimento; ou que seja necessario fazer um regulamento para o juiz de fóra. He necessario distinguir a parte administrativa, e a contenciosa: a ordenação do Reino o distingue tanto, que até põe por epígrafes separadas, quaes são os deveres dos juizes dos orfãos a respeito de administração, e quaes a respeito das causas (leu). Não ha uma razão verdadeira para fazer esta excepção que se pretende; para sempre não, porque he contra o que se tem decidido; e temporariamente tambem não, porque sempre havião de resultar os mesmos inconvenientes. Em quanto ao que se propõe, que os juizes criminaes subsistão ainda de certa maneira, me envergonho, por assim dizer, de falar sobre isto. Quando está, decretado que todo o cidadão he igual ante a lei, querer que se conserve o privilegio criminal dos archeiros, que não pódem ser julgados, senão pelo capitão da guarda real; o privilegio dos desembargadores, e outros muitos, he uma contradicção. He possivel que quando proclamámos a igualdade ante a lei quizessemos conservar milhares de cousas, que são contra esta igualdade? Seguramente não. Voto pois contra a indicação em todas as suas partes.
O Sr. Bastos: - Eu não teria pedido a palavra, se previnisse que ella se me não viria a conceder, senão tão tarde, e depois de esgotada quasi inteiramente a maioria. Na esterilidade pois, a que os illustres Preopinantes me reduzirão, começarei pela leitura do artigo 11, secção 1.ª das Bases da Constituição (leu): depois passarei ao artigo addicional às mesmas (leu). Combinando um com outro, a quem poderá ainda restar alguma duvida sobre a presente questão? O artigo 11 declarou ser a lei igual para todos, e intoleraveis todos os privilegios pessoaes de foro; e o artigo addicional declarou que a execução daquelle ficaria suspensa até á publicação de uma lei, que immediatamenle se faria: esta lei porém será a de que tratamos, ou serão os tardios codigos, de que tem falado o autor da indicação? Note-se a palavra immediatamente: veja-se a sua significação, a sua força, a que mal já até aqui se tem conformado o curso dos nossos trabalhos, e destorrem-se vãs e cerebrinas interpretações. Oh, diz o Sr. Serpa, em poucos mezes se hão de concluir os codigos! Concluirem-se em poucos mezes os codigos! Só se alguma força magica presidir á sua factura! Depois que as Com missões encarregadas destes ou os indivíduos apresentarem os resultados de seus trabalhos, o que talvez nem ellas nem elles ainda saberão quando será, deverão convocar-se Cortes extraordinarias para a sua discussão: a quem ha que não ignore o tempo que nesta discussão se gastará, bem como o resultado della? A época pois de termos os tão desejados, e tão precisos codigos, não está distante de nós alguns mezes sómente, está distante alguns annos, por mais acertadas que sejão as providencias dadas, ou que de futuro se derem a este respeito. E não he dos codigos, mas de uma lei separada e immediata, que ficou dependendo a execução do citado artigo 11, como he expresso no addicional.
Appellar para os codigos contra a letra, e contra o espirito das bases da Constituição, seria para mim uma cousa incrivel senão a presenciasse. Quando se deliberou se devião jurar-se as bases, eu votei que não, porque jurar a Constituição que as Cortes houvessem de fazer, jurar depois as bases della, e a final a mesma Constituição depois de condoída, me pareceu uma excessiva accumulação de juramentos. Venceu-se porém o contrario, nós jurámos e fizemos jurar as bases, e desde então eu me considero ligado a ellas, de sorte que forças nenhumas humanas poderão conseguir de mim que eu vote contra as suas disposições, e que eu as quebrante ou infranja. Se o Congresso approvasse a indicação controvertida, elle não commetteria menos que um perjurio; e como se attreveria o Congresso a fazer leis contra os perjuros ou a vigiar sobre a sua execução, sendo perjuro elle mesmo?
Os unicos privilegios pessoaes de foro, a cujo respeito o artigo mencionado não he já exequível, são os que assentão em tratados; e porque? Se nós infringíssemos estes para deixarem de se observar aquelles, talvez attrahiriamos guerras e calamidades sobre os povos, e nada ha mais obvio que a regra, Salus populi suprema lex esto. Mas a verdadeira, e incontestavel razão, he a da impossibilidade moral em que estamos de destruir como legisladores aquelles tratados, e o não ser alguem obrigado a impossíveis. Os tratados, assim como se não fazem sem o reciproco consentimento das partes contratantes, assim se não podem pacificamente desfazer sem o consentimento reciproco das mesmas partes. Que comparação porem tem com estes os privilegios dos orfãos? A que guerras exporemos os povos fazendo-os cessar immediatamente? Onde está, ou donde nasce a impossibilidade moral da sua pronta abolição? Estes privilegios no actual estado das cousas, não tem a seu favor uma só razão plausível, e tem-nas todas contra si. Mesmo olhando ao preterito, se elles algumas vezes foram uteis aos orfãos, forão-lhes muitas vezes prejudicaes. Tendo os orfãos á sua escolha o juízo do seu domicilio, ou das acções novas da relação do districto, seus tutores e curadores, para opprimirem e vexarem os seus inimigos, a cada passo ião propor acções juízo das acções novas, na distancia de muitas leguas,

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preterindo o do domicilio, causando assim maiores despezas aos seus contrarios, e fazendo-as soffrer aos desgraçados orfãos, sacrificado assim paixões estranhas. O que convém aos orfãos, he o que convém nos outros cidadãos, he que se lhes administre justiça, e eu não sei que esta se administre melhor em juízos privilegiados. Mas ainda que de alguma utilidade se possa considerar para os orfãos a conservação de um tal privilegio, que direito tem elles ao sacrifício dos outros membros da sociedades? Ou conservado aos orfãos similhante privilegio, como o poderíamos negar a outras muitas pessoas? E então ainda que a regra estabelecida nas bases não fosse tão absoluta que não excluísse excepções, a que absurdo nos não conduziria a pertendida excepção? Ella seria um passo infallivel para outras, cuja multiplicação viria por fim a destruir a regra. Um illustre Preopinante que tocou este ponto, foi tratado pelo autor da indicação de falto de dialectica: mas com muita injustiça. Se nós conservarmos o privilegio pessoal de foro aos orfãos, porque o não havemos de conservar às viuvas? Se o conservarmos aos orfãos, e ás viuvas, porque o não conservaremos aos mentecaptos, aos mendigos, e a outras pessoas miseraveis? Até os religiosos franciscanos que as nossas leis classificão como taes, dirão que devem continuar a ser privilegiados. Após destes não deixará de ver a universidade e outros corpos...
Um argumento que talvez não teve até agora sufficiente resposta, he o da accumulação do trabalho nos juizes do geral, uma vez que se extinção os privilegios de que nos occupamos. E um dos Preopinantes referiu-se a Coimbra, e outro a Barcellos. O primeiro disse que Coimbra tinha muitos juízos privilegiados, e que se se extinguissem todos os privilegios, seria tal o pezo de negocios que cairia no juízo do geral, que ministro nenhum teria as forças e o tempo necessario para os decidir. Se este argumento procedesse, seguir-se-hia o absurdo de deverem permanecer, não só os privilegios dos orfãos, mas outros muitos, pois realmente um só homem não he bastante para decidir com a promptidão necessaria metade das causas que correm em todos esses juízos privilegiados de Coimbra; porém labora-se n'uma notavel equivocação. Essas causas, esses negocios, saindo dos juízos privilegiados de Coimbra, não vão cair como uma nuvem no juízo do geral da mesma cidade, diffundem-se, espalhão-se pelos juízos da maior parte do Reino, por serem ahi os domicílios da maior pare dos litigantes; e a divisão dos negocios excluem a accumulação do trabalho. E em quanto a Barcellos, o termo he tão grande, que nem o juiz de fora do civel e crime, póde ter forças e tempo para o seu expediente actual, e como o terá elle para o accrescimo que lhe póde provir da abolição dos privilegios dos orfãos? Note-se porém que se algumas causas de orfãos passarem para o dito juízo de fora em consequencia daquella abolição, não serão poucas as que delle passarão para outros juízos por uma igual razão, pois o dos direitos Renes, que lhe anda annexo, he uma Commissão, ou um juizo priviligiado. Note-se, em segundo lugar, que o remedio ao excesso de trabalho do referido lugar não está na conservação de privilegios, mas na desannexação do grande julgado de Vermoim que dista da Barcellos de 4 a 7 leguas, a cujo fim se achão dois requerimentos na Commissão estatística, aos quaes ou tarde ou cedo se hade deferir. Com tudo se eu tenho por indispensavel a execução da abolição dos privilegios em disputa, eu não tenho por igualmente indispensavel a extincção dos juízos dos orfãos. Os privilegios pessoaes de foro nunca constituirão a sua base, nem forão da sua essencia. E se o autor da indicação propozesse a sua conservação, assim como a de outros quaesquer juizes existentes, sem pretenções algumas á odiosa conservação daquelles privilegios, ou não encontraria embaraço algum, ou sómente seria repellida como ociosa, ou como extemporanea a dita indicação. Extinctos os pessoaes, os previlegios de causa ficão existindo, e bastante ha que fazer no juízo dos orfãos, ou elles estejão unidos, ou separados dos ordinarios, tratando-se ahi sómente daquillo que ahi se deve tratar.
Concluo por tanto que por hora, nenhuma necessidade ha de se decidir se devem ou não continuar a existir juizes de crime, ou juizes de orfãos, unidos ou separados. Esta questão pertence a outro lugar, e mui indevidamente veio complicar a dos privilegios pessoaes de foro que se achão abolidos por um artigo constitucional, e que nós não podemos conservar sem sermos perjuros.
O Sr. Macedo: - O illustre Preopinante certamente me não percebeu, pois deu a entender no seu discurso, que eu havia tirado argumento da multiplicidade de juizos que havia em Coimbra contra a extinção dos juizos privilegiados. Cumpre-mo por tanto declarar, que eu não falei em tal sentido, e que se eu fiz menção de tal multiplicidade de juízos, e do mal que resultava da accumulação de tantas causas em um só juízo, de que falei, foi para mostrar a necessidade que havia de dividir aquelle districto, e outros que estivessem em iguaes circunstancias; ou de dar outra providencia tendente á pronta administração da justiça, para que não aconteça que o encommodo dos povos aumente, em vez de diminuir.
O Sr. Bastos: - O Sr. Macedo foi que me não comprehendeu bem: pensa que eu affirmei que elle dissera que não devia abolir-se privilegio algum, pela affluencia de negocios que em Coimbra passarião dos juizos privilegiados, para o do geral: o que eu porém disse foi que do principio que elle a similhante respeito estabeleceu, vinha a seguir-se aquelle absurdo, o isto he muito differente; e além disso produzi uma segunda e muito mais forte razão, a que elle nem ao menos tenta responder.
Tendo o Sr. Bastos respondido ao Sr. Macedo, sem que o Sr. Presidente expressamente lhe tivesse concedido a palavra, disse
O Sr. Presidente: - Pergunto ao Congresso se algum Deputado póde falar, sem que lhe seja concedida a palavra pelo Presidente?
O Sr. Bastos: - Sr. Presidente: se eu falei sem expressamente se me conceder a palavra, foi porque o Sr. Macedo acabava de fazer o mesmo. Quando se deixa falar a um Deputado, increpando a outro por algum principio, necessariamente se deve deixar tam-

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bem que o outro fale, se não tiver já feito segunda vez. O contrario seria parcialidade; e a lei he igual para todos.
O Sr. Leite Lobo: - Não se trata do juizo dos orfãos, tratu-se de abolir o privilegio de foro, que consiste em demandar, e ser demandado: isto está extincto pelas bazes, a isto se oppõe a indicação do Sr. Serpa Machado, por isso me opponho a ella.
O Sr. Barroso: - Apezar da dificuldade que tenho de exprimir-me em publico, não posso deixar de dar o meu parecer, vendo que depois de uma tão longa discussão a assembléa vai achar-se na maior perplexidade quando te lhe propozer o approvar, ou rejeitar a indicação. Não se tem feito a devida differença entre privilegios de foro de pessoas, e privilegios de foro de causa. Os primeiros estão inteiramente destruidos nas Bases da Constituição, de maneira que a regra geral aí estabelecida nem admitte nem póde admittir excepção alguma. Nem se diga que se póde fazer uma excepção a favor dos privilegios de foro dos orfãos, na fórma proposta na indicação, assim como já se fez, sobre a sustentação dos tratados existentes. Isto não foi uma excepção, foi uma suspensão de execução da lei das Bases, em quanto durarem os mesmos tratados. Partindo pois deste principio approvo a indicação em quanto se dirige á conservação do privilegio de causa de que gozão os orfãos, e menores, na forma do regimento dos juizes de orfãos, principalmente no § 36; mas não possa approvala em quanto na sua generalidade parece igualmente comprehender a conservação do foro de pessoa de que gozavão os orfãos, menores, prodigos, e desmemoriados, na fórma do § 35 da Ord. liv. 1.º lit. 88, e do § 3 til. 5. Nesta parte nem ha razão justa para que taes privilegios de foro se lhes conservem, porque mesmo, como já tem reflectido alguns dos illustres Preopinantes, elle lhe tem sido mais prejudiciaes que uteis; nem mesmo este augusto Congresso póde decretalo, pois que isso se oppõe formalmente ao decidido e jurado nas Bases: nestas se prometteu sómente a conservação de certos privilegios de causa, que por leis se designassem: e em quanto se não prolongar o novo codigo civil, faz absolutamente necessaria a conservação do privilegio de causa de que gozão os orfãos para os inventarios e partilhas, devidas e demandas, que se suscitarem, ou por esse motivo, ou por causa de administração de pessoa e bens dos mesmos menores. Não he porém a minha opinião que no futuro os orfãos, e menores tenhão o mesmo privilegio de causa. No meu projecto que tem de entrar em discussão depois desta indicação, direi os motivos porque os não comprehendi. Entretanto convem à sua conservação. E he por isso que approvo se faça uma declaração, a fim de que pela generalidade decretada que ficão extinctos todos os privilegios pessoaes de foro, se não entenda acabada a jurisdicção dos juizes do orfãos, mas sómente o § 35.
O Sr. Ferreira de Souza: - A assemblea quer que se extinga o privilegio dos orfãos nas causas ordinarias; principalmente quando obrigão a vir de concelhos distantes a responder aos seus. Este privilegio alguma utilidade dava aos orfãos porque elles tinhão todos os documentos á mão, a podião dar melhor as suas provas, e seguir a demanda; porem era incommodo aos réos, que talvez de grande distancia erãào trazidos ao juizo dos autores. Extinga-se pois este privilegio muito embora, mas não se pode extinguir o juizo dos orfãos quanto à factura do inventario, nomeação de tutores ou curadores, e administrações de bens, contas etc., em quanto se lhe não substituir outra cousa. Nem julgue o Congresso que a sorte dos orfãos melhora em se unir tudo isto ás varas do geral, como pertendeu ir fazendo a lei de 1814. Se um juizo só, occupado com estes objectos, tem pouco cuidado nos interesses dos orfãos, e ha grandes abusos, que fará unido isto a uma vara carregada de infinitas demandas? E com effeito mostra a experiencia que nos grandes concelhos, o juiz de fóra nem pode assistir a inventarios, nem a contas, ficando tudo no arbítrio do escrivão, que leva ao ministro massos, e massos de inventarios, e contas, que elle assigna sem nada examinar: e eisaqui a sorte dos pobres orfãos em grande parte das terras. Não havendo pois vantagem em se extinguirem já os juizes dos orfãos, e até querendo a Constituição, que aos juizes de fóra se tire quanto he administrativo; he forçoso, que se conserve por ora a jurisdicção dos juizes de orfãos quanto aos inventarios, e adminitração das pessoas e bens de orfãos, e dos mais que estão na curadoria. Mas uma vez estabelecida a regra geral da extincção de todos os privilegios pessoaes em negocios civis e criminaes, ficava inteiramente cessando a jurisdicção dos juizes dos orfãos, a respeito de inventarios e contas. Pelo que offereço aqui uma indicação a este respeito (leu-a). Digo pois que se conserve aos juizes dos orfãos a jurisdicção voluntaria que tem por seu regimento, porque he indispensavel, como por exemplo, o conceder licença para os orfãos casarem, para se emanciparem quando chegão á idade, etc. Igualmente digo, que deve ficar a jurisdicção contenciosa, que têm sobre inventarios, nomeação de tutores, arrendamentos, contas, e cobrança dos alcances, etc. Nem se diga, como já aqui ouvi affirmar, que os inventarios não são causas, por irão haver autor, nem réo, contestação da lide, e outras formalidades dos processos ordinarios, para deixarem por isso de ser objecto da jurisdicção contenciosa, que se exercita eliam inter molentes, pois todos sabem que os juízos divisorios se chamão mistos, porque qualquer dos interessados se póde considerar autor e réo, ainda que de ordinário he a cabeça de casal quem figura de réo: e tem os inventarios desde o principio até ao fim infinitas controversias, que se hão de decidir, e que admittem recursos, v. g. a questão sobre quem ha de ser cabeça de casal, sobre escolha de louvados, e partidores, sobre a louvação, licitações, collações, partilha, etc., que, por mais sumarios que sejão os inventarios, se podem mover, e necessitão decisão. O mesmo digo sobre embargos ao inventario, ou á posse sobre liquidação de contas, nomeação de tutores, etc., etc. Desta maneira podemos deixar em pé a regra estabelecida neste projecto sobre a extincção do privilegio do foro quanto às causas que os orfãos movem a qualquer outra pessoa, e comprovar-

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lhe o juizo privativo quanto aos objectos mencionados, em quanto se lhe não substituir outro melhor arbitrio. E por tanto ahi mando á meza a minha indicação.
Declarada a materia sufficientemente discutida propôs o Sr. Presidente á votação 1.º se havia lugar a votar sobre a parte da indicação, em que se propunha ficassem conservados os juizos criminaes? - E se decidiu que não, em razão de não a tratar aqui da extincção dos juizos, mas unicamente do privilegio pessoal do foro. Propoz em 2.º lugar, se o privilegio pessoal do foro concedido aos orfãos deve ser extincto. - E venceu-se que sim.
Em consequencia desta votação retirou o Sr. Barroso a indicação que havia offerecido, propondo que ficassem unicamente subsistindo os privilegios dos orfãos que fossem de causa, e que constituem jurisdicção improrogavel dos juízos dos orfãos.
O Sr. Fernandes Thomaz havia feito durante a discussão, uma indicação, propondo se declarasse, se ficava extincta totalmente, ou em parte, a jurisdicção do juízo dos orfãos; e que em qualquer dos casos se substituísse um modo claro de administrar as pessoas e bens dos orfãos. Ficou para se tornar em consideração, quando se tratasse da projecto do Sr. Deputado Barroso sobre o privilegio das causas.
O mesmo se decidiu quanto á ultima parte da sobredita indicação do Sr. Serpa Machado, e a respeito da indicação que offereceu o Sr. Ferreira de Sousa, propondo que ficasse em pé a jurisdicção voluntaria dos juizes dos orfãos nos casos em que lhes compete por seu regimento; e bem assim a jurisdicção contenciosa necessaria para a factura de inventarios, entregas aos coherdeiros dos curadores, e tutores, o fazer tudo o mais na forma do seu regimento, que igualmente ficou para se tomar em consideração quando se trataste do sobredito projecto do Sr. Barroso.
O Sr. Serpa Machado, por parte da Commissão do regimento interior das Cortes, leu o seguinte

PARECER.

A Commissão do regulamento interior das Cortes foi incumbida por este Congresso de dar o seu parecer sobre o modo como se devia installar o tribunal especial, que conhecesse das causas criminaes dos Deputados: ordenado no paragrafo 14 do titulo 4.° do regimento interior das Cortes, e sobre o numero de vogaes de que devia ser composto. A Commissão he de parecer que este tribunal seja composto de nove membros, e um fiscal, escolhidos por pluralidade absoluta de votos deste Congresso, e em escrutínio secreto.
Sala das Cortes 19 de Junho de 1822. - Manoel de Serpa Machado; Antonio Pinheiro de Azevedo e Silva; Bento Pereira do Carmo.
Lido segunda vez este parecer, disse
O Sr. Girão: - Eu approvo o parecer da Commissão, menos em quanto a serem os membros do tribunal e eleitos á pluralidade absoluta, porque se tal cousa passasse, consumiriamos talvez mais de nove dias na eleição. Parece-me por tanto que será bastante a pluralidade relativa.
O Sr. Guerreiro: - Julgo que seria necessario declarar qual o motivo por que foi encarregada a Commissão de dar este parecer.
O Sr. Xavier Monteiro: - Eu não sou de opinião de que a eleição seja feita á pluralidade relativa, porque a absoluta não leva o tempo que se diz; e não precisa para o provar recorrer a argumentos theoricos, ha um facto recente, que demonstra esta verdade: apenas se gastárão tres dias em eleger á pluralidade absoluta a vinte e quatro conselheiros de Estado, e receia-se agora que nove membros consummão na eleição nove dias? Entre tanto he muito melhor que seja o eleitos á pluralidade absoluta para que não possa sair eleito um membro do tribunal com 10, ou 12 votos. Isso faz-se, quando muito em 3, ou 4 horas, e em beneficio da perfeição não devemos deixar de fazer esse sacrifício de nosso commodo. (apoiado).
O Sr. Fernandes Thomaz: - Opponho-me a que haja escrutínio, todos nós somos capazes de ser juizes, a sorte deve decidir, (apoiado, apoiado).
O Sr. Ferreira Borges: - Como a questão ha criminal, seria necessario excluir os Srs. Deputados eclesiasticos (nada, nada: disserão algum Srs. Deputados). Pois tambem os clerigos hão de votar em materias crimes? Não sei se temos uma bulla para alterar o que está estabelecido pelos codigos ecclesiasticos.
O Sr. Serpa Machado: - Não lembrou á Commissão a sorte, porque não se tratava de escolher um juízo dos jurados. A falar a verdade, quando se trata de formar um corpo que ha de julgar, parece necessario fazer escolha, porque a sorte he cega, e são precisos conhecimentos não só de facto, mas tambem, de direito.
O Sr. Castello Branco: - Eu apoio a lembrança do honrado Membro e Sr. Fernandes Thomaz, por isso mesmo que sou muito contrario á instituição deste tribunal, que em tempo conveniente requererei que nunca seja permanente (apoiado, apoiado). Sendo eu desta opinião, e de que seja só particular, quando occorrem casos para que seja necessario, não posso deixar de apoiar a sorte. Opponho-me a que o tribunal seja permanente pelos terríveis resultados que dahi podem vir.
O Sr. Presidente: - Por ora não se trata disso: trata-se sómente de quantos hão de ser os membros do tribunal, e o modo de os escolher.
O Sr. Castello Branco: - Disse eu que me oppunba a que o tribunal fosse permanente pela terrível influencia que póde ter, porque póde ser instrumento de facções que felizmente não ha entre nós, mas que póde vir a haver, porque em fim somos homens. Se suppomos que as facções são possíveis, devemos tambem suppôr que uma facção póde nomear membros á sua vontade. Tudo isto se acautela pela sorte: voto por tanto por ella.
O Sr. Macedo: - Se o tribunal ha de ser ou não eleito á sorte, depende de saber-se primeiro se ha de ser nomeado para cada caso em particular, ou se ha de ser permanente. Eu desde já me declaro contra tal permanencia, por julgar que ella viria estabelecer uma aristocracia neste Congresso. Entretanto

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se acaso se decidir contra a minha opinião, que o tribunal haja de ser permanente, eu voto porque seja eleito por escrutinio secreto; mas na hypothese contraria sou de parecer que seja eleito á sorte. Eu pela minha parte teria grande repugnancia em escolher juizes para conhecerem de um caso determinado, e julgo que aos mais Srs. aconteceria outro tanto; e até por esta razão me parece melhor a sorte.
O Sr. Sarmento: - O Sr. Deputado Castello Branco falou segundo a ordem: o parecer da Commissão não he que o tribunal seja só para um caso; fala do tribunal que o regulamento dos Cortes manda que exista. Diz o parecer (leu-o); por consequencia o illustre Deputado o Sr. Castello Branco falou muito na ordem.
O Sr. Bispo de Castello Branco: - Por minha parte peço ser excluído, porque não acceitarei de modo algum ser juiz em causa criminal.
O Sr. Caldeira: - Quando se tratou desta questão, votei pelo tribunal; mas não votaria pela sua permanencia, porque sempre me hei de oppôr a que elle seja permanente.
O Sr. Serpa Machado: - A mente da Commissão foi que o tribunal fosse permanente, porque assim o determina o regulamento, e por isso propuz que seus Membros fossem eleitos á pluralidade de votos, pois nesse caso não poderia ser de outro modo. Com muita razão se persuadiu disso a Commissão, pois não julgou provavel que o Congresso quizesse estabelecer uma Commissão especial, que tanto vale como um tribunal para julgar de um caso determinado. De mais esta materia não merece grande discussão, pois já está decidido na Constituição, que não haja esse tribunal, e o que vai installar-se não póde ser mais, que para o pouco tempo que falta desta legislatura.
O Sr. Barreto Feio: - Está vencido que se crie um tribunal dentro das Cortes para julgar dos delictos dos Deputados, e está determinado n'um artigo da Constituição que tal tribunal não se estabeleça: uma decisão he contraria a outra; qual deve agora prevalecer? he o que deve ser objecto da presente discussão (á ordem, á ordem!). Eu vou manifestar a minha opinião; se alguem me arguir de falar contra o que está vencido, eu o arguirei tambem da mesma culpa; porque neste caso extraordinario, ou se seja de uma, ou de outra opinião, sempre se vai contra o que está vencido.
O Sr. Guerreiro: - Ordem! Essa não he a questão.
O Sr. Barreto Feio: - Julgando-me em plena liberdade de emittir a minha opinião sobre este objecto, digo que, se este tribunal he um bem, nós não deviamos privar delle as seguintes legislaturas, e se he um mal, não o devemos querer para nós. Mas como poderá chamar-se um bem a um estabelecimento que destroe a igualdade entre os Membros do corpo legislativo, a quem os povos confiarão iguaes poderes, introduzindo entre elles a dependencia, e coarctando-lhes a liberdade de votar? Porque ninguem poderá negar-me que ainda o homem mais virtuoso, e mais seguro de si mesmo, quando se vê na presença de um juiz não póde deixar de penetrar-se de um certo respeito, de um certo temor de que por um caso imprevisto lhe venha ainda a cair nas mãos. Em fim um tribunal composto de magistrados legisladores, he um monstro que não póde deixar de escandalizar ainda aquelles, que são menos versados em polilica. E por isso eu voto que elle se não estabeleça permanente, ou então peço que os seus membros deixem de ter assento no Congresso, desde o dia em que forem eleitos.
O Sr. Vasconcellos: - Póde ser a questão, se o tribunal ha de ser ou não permanente, e se os seus membros hão de ser ou não amoviveis.
O Sr. Macedo: - Uma questão depende da outra; e eu não posso votar sobre o modo da eleição sem que antes se decida se o tribunal ha de ser ou não permanente.
O Sr. Soares Franco: - Mas isso não he necessario, visto ser para 3 ou 4 mezes sómente.
O Sr. Villela: - O que diz o Sr. Macedo he exacto; sem saber-se, se o tribunal ha de ou não ser permanente, não póde votar-se, porque segundo se decidir, então direi se os seus Membros devem ser eleitos por escrutínio, ou á sorte.
O Sr. Bastos: - Eu apoio o illustre Preopinante que acabou de falar. Na sessão em que se determinou que se crearia um tribunal, ouvindo falar na permanencia de seus membros, levantei-me e commecei a falar contra ella. Fui interrompido, e se assentou que não era ainda tempo de se tratar disso. Não o sendo ainda hoje, quando o virá a ser? Essa questão he essencialmente preliminar. Se os membros do dito tribunal houverem de ser permanentes, será um o meu voto, relativamente á sua eleição, será porém outro, se não tiverem de ser permanentes. Eu se me he licito expor já a minha opinião, direi que quererei ver nos meus collegas os meus iguaes, padeliberar com elles livremente sobre os negocios da Nação; mas como poderei eu ver os meus iguaes nos meus juizes?
O Sr. Castello Branco: - Nós recebemos a lei do Soberano Congresso, e por tanto eu desejaria que o mesmo Soberano Congresso decidisse, se se póde discorrer ou não sobre esta materia. Requeiro pois a V. Exc.ª consulte o Congresso, se se póde ou não discorrer, sobre a permanencia do tribunal.
O Sr. Fernanda Thomaz: - Sobre aquillo mesmo vou falar; parece-me que se tem estado a discutir desnecessariamente um objecto que nos não deve embaraçar. Os Preopinantes querem se trate a questão de se o tribunal ha de ser ou não permanente, e dizem: se o tribunal for permanente, votamos pelo escrutinio; se não, pela sorte. Digo eu pois: vote-se sempre pela sorte, e acabou-se a questão; porque o tribunal he permanente na lei, mas não são permanentes os juizes: está acabada a questão. A lei diz que haja este tribunal: em quanto não estiver revogada, existe: o modo he nomear os membros pela sorte para cada caso que seja necessario; e acabou-se tudo, acabárão-se os receios de facção, e de pouca liberdade nas discussões etc. Isto he pelo que pertence a essa parte: pelo que pertence aos Srs. ecclesiasticos que dizem que não querem entrar no escrutinio,

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parece-me que he sem razão. Até agora tem elles entrado nos votos de todos quantos casos criminaes se vem tratado, e não saírão do Congresso. Por ventura não votarão sobre a lei da liberdade da imprensa, em que ha penas, e penas graves estabelecidas? Por outra parte os ecclesiasticos, nas relações, não estão a votar até nos summarios de mortes? Pois ha de ser permittido a um clerigo desembargador fazer aquillo que não ha de ser permittido a um clerigo Deputado? Não posso saber d'onde nasce esta differença. Um clerigo, na casa da supplicação, vota n'um summario, e condemna um réo a ter a cabeça cortada: na inquisição condemnavão ainda melhor, pois mandavão queimar vivos os desgraçados que lhe caíão nas mãos. E não poderão votar aqui em causas criminaes? Não sei que se concedesse a clerigo algum uma bulha particular para votar naquelles casos, nas relações: creio que não; creio que a bulla ha de ser geral; se podem votar alli, tambem hão de poder votar aqui. Quero que me julguem os ecclesisticos, porque quero tambem julgalos, quando me couber a sorte. Os ecclesiasticos são Deputados em tudo e por tudo, porque na Constituição, nem nas instrucções está declarado que um Deputado ecclesiastico não seja o mesmo que um secular.
O Sr. Castello Branco: - Eu agradeço muito no honrado membro, que anticipasse o que eu queria dizer, porque muitos Srs. ecclesiasticos tem julgado deverem-se excluir; mas eu não penso assim. Eu neste Congresso não sou clerigo, não sou ecclesiastico, sou Deputado da Nação; quando ella me escolheu assentou que escolhia um homem habilitado para exercer quanto correspondesse ao cargo de legislador. E por tanto não tenho esse escrupulo que alguns Srs. tem mostrado, e acho-me habilitado para todas as cousas pertencentes a meu cargo. Esta excepção teria lugar, se se tratasse de impôr a alguem a pena ultima; disto não se trata felizmente, nem creio que neste Augusto recinto teremos nunca adelgaça de ter que dar tão terrível sentença; e para todas as outras estão habilitados os ecclesiasticos.
Propondo o Sr. Presidente, se havia de tratar-se primeiro da permanencia do tribunal; e resolvendo-se que sim, leu o Sr. Secretario Sarmento a seguinte indicação offerecida pelo Sr. Barreto Feio: Proponho que o tribunal que se vai estabelecer não seja permanente; mas que os seus membros sejão nomeados privativamente para cada caso que occorra. Sendo posta, o votos esta indicação, foi approvada.
Seguindo-se tratar do numero dos membros que devião compôr o tribunal, disse
O Sr. Fernandes Thomaz: - Não sei porque ha de ter um Deputado nove juizes, quando nas causas de maior consideração bastão seis.
O Sr. Sarmento: - Se eu tivesse alguma duvida, seria ácerca de se deverião ser doze em lugar de nove. Nós estamos aqui figurando como entre tantos jurados, e olhando para essa consideração, he por onde não parece odioso o tribunal. Segundo pois esses princípios, e as bases estabelecidas geralmente em outras nações, he que eu julgo, que o numero de doze seria melhor: não porque este numero seja apostolico, nem por ter nenhuma vista symbolica; tambem hão sei como o mais habil mathematico nos poderia aconselhar o numero, que deveria marcar-se; mas por seguir a pratica.
O Sr. Fernandes Thomaz: - Como n'outra occasião se disse, que para ter nome este tribunal, seria conveniente que se lhe desse o de relação; parece que, a fim de irmos coherentes neste caso, deveria o tribunal ser composto de seis membros; porém se querem que sejão mais, sejão.
O Sr. Serpa Machado: - A Commissão julgou que devião ser nove os membros, porque he uma só instancia, e não ha aqui recurso algum: este foi o motivo porque se estabeleceu maior numero.
O Sr. Brito: - Um tribunal judiciario no seio do corpo legislativo, he um monstro em política constitucional; he um cancro que cedo ou tarde ha de roer as entranhas da liberdade, servindo às Cortes, ou ao partido que nellas influir, de instrumento de tyrannia, como não ha muito acabámos de ver em França, onde Robespierre e sua facção se servirão de um tribunal similhante com o titulo de tribunal de segurança publica, para alagar de sangue aquelle bello paiz, e dominar pelo terror. Elle he contrario ás bases jurados na nossa Constituição, que proscrevêrão os privilegios pessoaes do foro: contra aquelle primeiro, principio constitucional, reconhecido nas mesmas, que estabelecendo a separação dos tres poderes políticos, não permitte que o legislativo possa em caso algum usurpar as attribuições do judiciario. He contra os principios da justiça natural, que não consente sejão os delinquentes julgados pelos seus collegas, amigos, ou inimigos, sendo bem sabido que em similhantes corporações costuma haver partidos interessados em afastar do seu seio os do partido opposto, e sustentar a torto e a direito os que lhe estão unidos. E he finalmente um similhante tribunal já reprovado pela Constituição, que temos decretado em conformidade das mencionadas bases. E a despeito de tudo isto havemos de succumbir á tentativa tantas vezes repetida, e rejeitada, de erigir sobre nossas cabeças um tribunal, que para ser terrível basta ser irresponsavel, e do qual não póde haver recurso? Sim, Senhores, torno a dizelo, do qual não póde haver recurso razoavel. Para quem se dará esse recurso? Se para o Rei, ficará o Poder legislativo á mercê do executivo: se para a assembléa geral das Cortes teremos para julgar as espinhosas questões contenciosas, homens que nem são jurisconsultos, nem podem examinar os autos cada um de per si; e o resultado serião sentenças tão perfeitas como senão fechaduras feitas por um marconeiro, e carteiras por um serralheiro. Não, Senhores, não desprezemos o grande principio da divisão do trabalho, desenvolvido por Smith. Faça cada qual o que aprendeu, limitando-se nas raias do seu officio; o legislador, leis; e sentenças, o julgador. Deixemos nos nossos companheiros a liberdade de se aproveitarem do beneficio do juizo do jury, como gozão os outros cidadãos. Este os porá a coberto de quaesquer tramas que lhes possão urdir seus inimigos, este os corrigirá , quando elles o merecerem; e não multipliquemos entidades superfluas, não compliquemos a ma-
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quina política, que bem similhante às mecanicas ganhará mais solidez e regularidade de movimento, quanto menos complicada ella for. Deixemos pois a questão aos juizes naturaes, a quem compete por direito.
O Sr. Vasconcellos: - Eu ouvi dizer a um Preopinante que não havia recurso nenhum desse tribunal. Creio que não deve ter menos um Deputado que outro qualquer cidadão, e pois todos tem recurso, o recurso do Deputado deve ser o soberano Congresso, que he o que tenho visto em Inglaterra.
O Sr. Xavier Monteiro: - Esta hypothese he attendivel, e uma vez que não haja recurso, deve dar-se a maior latitude ao réo accusado na escolha dos juizes. Nesta supposição poderia seguir-se o seguinte mettodo.
O Sr. Guerreiro: - Trata-se de organizar um tribunal, e não uma Commissão. Eu julgo que o soberano Congresso não deve estabelecer, nem causa, nem maneira de suspensão que não esteja estabelecida no reino; por conseguinte opponho-me a que... e voto pelo numero que propõe a Commissão que são nove.
O Sr. Vasconcellos: - Eu julgo que he muito perigoso que um ou dous Membros possão expellir um Deputado: só a maioria da Nação he quem o póde fazer, e esta maioria he expressada pela maioria do Congresso.
O Sr. Moura: - O caso verdadeiramente importante he, se a pena que o tribunal impuzer ao Deputado traz comsigo a expulsão do Congresso, como póde ser se a esse tribunal se dá toda a autoridade: supponhamos que o condemna a degredo: nesse caso ha expulsão. He negocio que creio que se não ha de decidr de repente. Todas as assembléas tem indubitavelmente autoridade de expellir os seus membros: no parlamento de Inglaterra, houve uma questão muito seria a respeito de Wilkes, mas nunca se duvidou que o parlamento o podesse expulsar de si; o que se duvidou foi somente, se tinha autoridade a obstar que tornasse a ser eleito. Julgo por tanto que este caso he digno de meditação,
O Sr. Sarmento: - Eu tambem sou da opinião do honrado Membro, em quanto quer que isso seja tomado em consideração: realmente não convém que passe a idea de que o Congresso não póde expellir um de seus Membros. Mas não deve tambem passar a idea de que seus Representantes se quizerem não o podem tornar a eleger: he preciso dar a César o que he de César: o caso referido pelo Sr. Moura deu lugar a se tratar com a maior seriedade este ponto.
O Sr. Freire: - Deve-se tambem attender á questão, se ha de haver recurso deste tribunal, e se o recurso ha de ser em geral, ou de determinadas penas. A minha opinião á cerca disto, seria que o tribunal desse a sua sentença, e que em todos os casos, ou pelo menos quando a sentença for de expulsão ou degredo, houvesse recurso ao Congresso; porque ser um Deputado por tão pequeno numero, lançado fora daquelle lugar para que a Nação o nomeou, he cousa imprópria, e que não deve ser.
O Sr. Serpa Machado: - Sr. Presidente, parece-me que a questão vai divergindo; não se trata se não do numero dos membros, mas já que se tem passado a examinar se deve ou não haver recurso o meu parecer he que não se dê execução á sentença sem que o Congresso intervenha. Isto porém he o objecto de um regulamento; o que por agora se deve tratar he, se o numero que propõe a Commissão he suficiente.
O Sr. Freire: - Eu entendo muito pouco destes subterfúgios jurídicos. Chame-se appellação, aggravo, recurso, ou o que se quizer: o que eu desejo he que a sentença não se execute sem que o Congresso approve, quando importe expulsão do Deputado.
O Sr. Moura: - Diga-se: não haverá recurso da sentença do tribunal, excepto quando a pena for de degredo, ou expulsão do Congresso.
Propôs o Sr. Presidente, se as sentenças que se proferirem neste tribunal, sendo condemnatorias, não podem ser executadas, sem serem primeiro confirmadas pelo Congresso? - E se venceu que sim.
Propoz mais, se o numero dos membros do tribunal devia ser de nove, e um promotor, - e venceu-se igualmente que sim.
Propondo o Sr. Guerreiro que só accrescentasse um secretario para servir de escrivão, disse
O Sr. Sarmento: - Nesse caso he melhor dizer-se desde logo um escrivão.
Propoz o Sr. Presidente, se se nomearia um escrivão para ordenar o processo? - e resolveu-se que sim.
O Sr. Xavier Monteiro: - Lembra-me que a proposta seja feita pelo tribunal, em vez de ser escolhido por sorte, porque póde recaír em quem não tenha a pratica sufficiente.
O Sr. Soares de Azevedo: - Não posso convir nem he decoroso que seja escrivão um Deputado tirado do Congresso. Que figura representará um Deputado servindo de escrivão, sem ser membro do tribunal, nem ter nelle voto? he um criado do tribunal, para fazer quanto elle lhe mandar: por tanto ou o escrivão seja tirado dos membros do tribunal, ou venha de fora das Cortes.
O Sr. Bastos: - A reflexão do Sr. Azevedo parece-me exacta. Se se nomear um Deputado para escrivão, elle terá de interromper mui considerávelmente as funcções de legislador, e terá mesmo de descer a ministérios mui impróprios de um Representante da Nação, como são citações, intimações, ele.
O Sr. Castello Branco: - Na inconfidência um desembargador fazia de escrivão; não sei porque aqui não possa fazer de escrivão um Deputado.
O Sr. Beatos: - A paridade he odiosa; e quando o não fosse, nada tinha de exacta para se julgar procedente.
O Sr. Faria Carvalho: - Um auditor não perde nada da sua dignidade por fazer de escrivão. Pois ha de vir official de justiça de fóra para ser escrivão num tribunal de Cortes?
O Sr. Sarmento: - Parecia-me melhor que a Commissão apresentasse um regulamento, porque nesta discussão temos andado às esmolas, a pedir uma lembrança a um Sr. Deputado, e outra a outro, para o que até agora se tem decidido.

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O Sr. Faria Carvalho: - Lembra-me em apoio da minha opinião, que quando um auditor quer saber alguma cousa de alguma repartição civil, escreve officios, e se acha instruído, sem necessidade de ter que metter um escrivão no meio de um conselho de guerra.
O Sr. Bustos: - Um auditor he despachado positivamente para o fim de que acaba de falar o ilustre Preopinante. Um Deputado he nomeado para legislar, e não para exercitar funcções de escrivão.
O Sr. Faria Carvalho: - Pois então tambem o Deputado não foi nomeado para ser juiz.
O Sr. Bastos: - Está decidido que um Deputado não seja julgado senão pelos seus pares, pelo grande perigo que haveria em o ser por juizes de fora do Congresso; mas o perigo não se estende ao escrivão, que póde chamar-se de fora sem inconveniente, assim como se chamão os diversos officiaes para o serviço das Cortes.
Propoz o Sr. Presidente se o escrivão devia ser tirado de algum dos membros que compozessem o mesmo tribunal, e quem elles escolhessem! - e decidiu-se que sim.
Propoz mais se os ditos membros e promotor devião ser tirados do Congresso, e por sorte? - e se venceu que sim.
Agitando-se finalmente a questão se devião ser excluidos da urna os nomes dos Deputados ecclesiasticos, disse
O Sr. Bispo de Castello Branco: - Ainda que ouvi ha pouco dizer que um eclesiástico neste lugar era Deputado da Nação, e não ecclesiasrico; declaro que não deixo de ser o que era dantes, por hoje ser Deputado. Tenho leis que me ptohibem decidir em causas crimes. Se nos tribunaes se achão ainda ecclesiasticos, espero que para o futuro os não haja, porque se hão de fazer leis para isso, o que será muito digno deste Congresso. (Apoiado).
O Sr. Arcebispo da Béja: - Apoio em tudo os sentimentos do Sr. Bispo de Castello Branco.
O Sr. Bispo de Béja: - Eu não sigo aquella opinião; e até mesmo ha uma bulla de Clemente III para que os ecclesiasticos possão ser desembargadores nas relações; e como eu estou persuadido que o condemnar um réo he praticar uma acção de justiça, não sei qual seja o motivo porque os ecclesiasticos não poderão ser juizes em causas crimes.
O Sr. Bispo de Castello Branco: - Pois eu não tenho bulla, nem a quero. Essas de que fala o illustre Preopinante forão concedidas porque nesses tempos havia falta de ministros, e de sciências; e como nós não estamos agora nestas circunstancias, não penso que as posso acceitar.
Procedendo-se á votação, decidiu-se que fossem excluídos na urna os nomes de todos os Srs. Deputados ecclesiaticos.
O Sr. Barão de Molellos fez a seguinte declaração de voto: - Declaro que na sessão de ontem votei contra o artigo 1.º e 7.° do projecto sobre a abolição dos privilégios pessoaes do fôro, pelo que diz respeito aos militares.

ndo-se dar a ordem do dia, disse
O Sr. Bastos: - Sr. Presidente, a Constituição he o nosso primeiro dever. A maior parte da presente semana vai-se passando sem se tratar della; isso he contrario ao que se acha determinado. Nem se diga que não ha trabalhos prontos; pois se achão impre0ssos e distribuídos os artigos addicionaes relativamente ao Brazil.
O Sr. Freire: - Eu rogo a V. Exc.ª, Sr. Presidente, que dê para ordem do dia o parecer pertencente aos negócios políticos do Brazil: he fácil de ver a incerteza em que devem estar os habitantes do Brazil, e mesmo os de Portugal; sem saberem os primeiros a quem devem obedecer; e por isso cumpre tomar uma resolução a este respeito, pois não póde continuar por mais tempo a posição em que estamos a respeito do Brazil.
Designou o Sr. Presidente para a ordem do dia o projecto sobre o privilegio do foro procedido da causa; a leitura de indicações na sua hora competente; e os pareceres das Commissões.
Levantou-se a sessão depois da uma hora da tarde. - Francisco Xavier Soares de Azevedo, Deputado Secretario.

Redactor - Galvão.

SESSÃO DE 21 DE JUNHO.

ABERTA a Sessão, sob a presidência do Sr. Gouvêa Durão, leu-se a acta da antecedente, que foi approvada.
Mandou-se lançar na acta a seguinte declaração de voto: na sessão de ontem fui de voto contrario a que as Cortes por modo algum se intromettessem na decisão das sentenças do tribunal dellas. - João de Sousa Pinto de Magalhães; Bento Pereira do Carmo; Basilio Alberto de Sousa Pinto, Hermano José Braamcamp do Sobral; Serpa Machado; Caetano Rodrigues de Macedo; Joaquim José dos Santos Pinheiro; Peixoto.
O Sr. Secretario Felgueiras deu conta do expediente, mencionando os seguintes officios.
1.º Do Ministro dos negócios do Reino, remettendo cinco officios da junta provisoria do governo civil da província do Gram Pará, contendo 1.º a parte da sua installação, autos do seu juramento, e posse, com os protestos da sua adhesão ao systema Constitucional, e Governo de Sua Magestade, e da unidade de sentimentos dos povos da província; de que as Cortes ficarão inteiradas: 2.º aparte de haver nomeado designadamente, por concurso, dois correios Interinos para o expediente da secretaria externo com o ordenado annual cada um de 150$00, réis, por consulta da junta da fazenda nacional; que se mandou á Commissão de fazenda do Ultramar: 3.º a participação de se embarcarem naquelle porto para o desta capital alguns Deputados às Cortes pela mesma província do Pará, e uma pela de S. Paulo; de que ás Cortes, ficarão inteiradas: 4.° a participação de te-

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