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de, e da ordem. Eu me não acabo de decidir; conheço o caracter, e firmeza dos habitantes de Angola; mas sei quanto póde operar o homem inimigo para semear a zizania entre o trigo: a esta hora póde ser que os novos Botavos, que lhe descobriu Cabral, vão igualmente obrigar Angola a ceder ao seu dominio. Eu me quero lembrar que seus habitantes andarão outra vez foragidos pelo interior dos Certões, como em 1624, mas ao mesmo tempo vejo, que muitos terão degenerado daquelle espirito portuguez, que animava os habitantes de Loanda no seculo 17.º, e os descendentes desses bons Portuguezes serão compellidos pela força a seguir o partido da Demagogia. Para evitar pois os males, ou quebra-los de um só golpe, e para igualmente precaver que não succedão outra vez os mesmos males, que enlutarão já naquella cidade o dia 6 de Fevereiro do corrente anno; proponho: 1.º Que o Governo faça expedir quanto antes uma força de trezentos soldados bem aguerridos, que sirvão de defeza áquella praça: mandando estacionar no porto de Loanda um brigue, ou corveta de guerra, confiando o commando de uma e outra força a officiaes habeis, e assás reconhecidos amantes do novo systema, que felizmente abraçamos: 2.º Que se mande sair de Angola os Napolitanos que se não acharem casados, ou não quizerem ali residir dando-se a alguma occupação honesta: 3.º Que de ora em diante se não continue na impolítica medida de fazer assentar praça indistintamente a todos os degradados, que para ali forem expiar seus horrendos crimes - Paço das Cortes 12 de Setembro de 1822. - Manoel Patricio Correa de Castro.
O mesmo Sr. disse: os degradados tem sido os que causão ali todas as desordens; por isso assentar praça a um homem tal, confiar a segurança da cidade a um homem mal fazejo, he uma cousa que não se póde tolerar. Os Napolitanos tem feito todas as desordens, elles tem sido causa de muitas perturbações no soccego publico; roubão as possessões dos habitantes de Angola, em fim causão muitos males. Todas estas razões são as que me obrigárão a fazer esta indicação, porque vejo que o Governo não tem dado providencia alguma energica.
Foi declarada urgente, lida segunda vez, admittida a discussão, e se mandou com urgencia para a Commissão de guerra.
O Sr. Presidente deu para a ordem do dia o projecto n.º 222, e redacção dos artigos do projecto das relações commerciaes, offerecido nesta mesma sessão: e levantou a sessão depois de uma hora da tarde. - Francisco Xavier Soares de Azevedo, Deputado Secretario.

RESOLUÇÕES E ORDENS DAS CORTES

Para Filippe Fereira de Araujo e Castro

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinárias da Nação portugueza mandão remetter ao Governo a representação inclusa da Commissão eleita na cabeça da divisão eleitoral de Bragança, ácerca dos acontecimentos que alí occorrêrão.
Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 14 de Setembro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Redactor - Velho

SESSÃO DE 16 DE SETEMBRO

Aberta a sessão, sob a presidencia do Sr. Freire, leu-se a acta da antecedente, que foi approvada.
O Sr. secretario Felgueiras deu conta do expediente mencionado.
1.º Um officio do Ministro dos negocios do Reino, acompanhado uma representação do administrador da imprensa nacional relativa ás dificuldades, em que se acha aquella officina, para poder fazer a impressão da Constituição, e pedindo providencias sobre esta objecto. Passou á Commissão de fazenda.
2.º Um officio do Ministro da guerra, pedindo providencias para se poderem regular as promoções dos alumnos do collegio da Luz em concorrencia com os sargentos, cadetes, portaestandartes, ou portabandeiras do exercito; o qual se mandou para as Commissões de guerra, e marinha, que se achão encarregadas de proporem a este respeito.
3.º Outro officio do mesmo, participando, que ficão as ordens para fazer effectivo o offerecimento, que o juiz de fóra de Espozende fez dos emolumentos, que hajão de lhe pertencer pela prontificação dos transportes, de que as Cortes ficárão inteiradas.
4.º Um officio do Ministro da marinha, com tres partes do registo do porto de Lisboa, de que as Cortes ficárão inteiradas.
5.º Uma carta do Sr. deputado o Excellentissimo Bispo de Castello Branco, participando, que o seu estudo de saude o impossibilita de assistir ás sessões das Cortes, porém que fará o esforço para vir assignar a Constituição, de que as Cortes ficarão inteiradas.
6.º Uma do Sr. Deputado Feijó, participando a impossibilidade, em que se acha, para vir assistir ás sessões de Cortes, e declarando, que a sua consciencia lhe não permitte assignar a Constituição pelos motivos que expõe; e que sómente o fará, se for para isso obrigado, violentado, e arrastado; porque de outra maneira concorda com a indicação offerecida pelo Sr. deputado Fernandes Pinheiro. Mandou-se para a Comissão de Constituição, e que se unisse áquella indicação.
Feita a chamada, achárão-se presentes 114 Deputados, faltando com licença os Srs. Moreira, Moraes Pimentel, Canavarro, Ribeiro da Costa, Bernardo de Figueiredo, Sepulveda, Bispo de Béja, Bispo de Castello Branco, Ledo, Feijó, Borges de Barros, Bettencourt, Leite Lobo, Carneiro, Costa

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Brandão, Ferreira da Silva, Fortunato Ramos, Belfort, Faria Carvalho, Gouvea Osorio, Faria, Sousa e Almeida, Martins Basto, Luiz Monteiro, Pinto da França, Pamplona, Sande e Castro, Vergueiro, Bandeira, Magalhães e Menezes: e sem causa reconhecida os Srs. Gomes Ferrão, Ribeiro de Andrada, Arcebispo da Bahia, Aguiar Pires, Moniz Tavares, Van Zeller, Vicente da Silva, Silva Corrêa, Martiniano, Vasconcellos.
Passando-se á ordem dia, entrou em discussão o seguinte

Relatório da Commissão ecclesiastica de reforma, efferecendo ao exame do soberano Congresso o projecto do melhoramento sobre a circumcripção das paroquias, congruas dos parocos, e reducção das collegiadas.

A Commissão ecclesiastica de refórma, encarregada de examinar as informações dos ordinarios sobre os quesitos que lhes forão dirigidos acerca do estado actual das paroquias, e do seu melhoramento, tem a honra de propôr ao soberano Congresso o plano, que nas actuaes circunstancias lhe pareceu conveniente para remediar alguns abusos, que ha largo tempo offendem a justiça, e a piedade, e excitão por toda a parte os clamores dos fieis. Desde a felicíssima época da installação das Cortes Geraes, Extraordinárias, e Constituintes da Nação portugueza, os povos não tem cessado de dirigir-lhe representações, a fim de que os dízimos que pagão, sejão daqui em diante mais bem applicados. Queixão-se de que muitas das suas igrejas não parecem dignas de ser dedicadas a Deus; lamentão a injustiça com que estão privadas de paramentos necessários para a celebração dos divinos mysterios; e representão finalmente a necessidade de se estabelecerem congruas sufficientes aos párocos, que não percebem dízimos, e aos seus coadjuctores, para que nem uns nem outros hajão de distrair-se das suas rigorosas, e importantíssimas obrigações, nem lhes seja necessário comprometter a santidade do sagrado ministério com exacções odiosas, e indecentes.
As Cortes não podião ser insensíveis a tão justos requerimentos: e a Commissão, empregando todo o zelo, que lhe inspira o amor da pátria, e da religião, tem procurado todos os meios de satisfazer completamentoeaos desejos assim dos povos supplicantes, como de todos os maios deste Reino; Examinando porém o estado das igrejas, desgraçadamente encontra em muitas dellas obstáculos invencíveis nascidos da decadência em que já se achão seus rendimentos: e se em outras não apparece a impossibilidade absoluta de realizar tão santo projecto, apresenta-se com tudo um labyrinto de divisões, e subdivisões de dizimos, e um tão numeroso concurso de dizimadores, que he impraticável alliviar os povos das vexações que padecem; remir os parocos da miséria a que estão condemnados: e assignar ás igrejas consignações sufficientes para a decencia do culto divino, sem que fique absorvida nestas applicações a quasi totalidade dos dizimos, e sem que os dizimadores, ou pensionistas que até agora forão isentos de taes encargos, sejão privados de todos, ou quasi todos os rendimentos, que percebião.
Não he pois de esperar, que em quanto permanecerem os direitos, e posses actuaes sobre os rendimentos das igrejas, possão estes servir ao mesmo tempo, e completamente para a conservação dos templos e honesta sustentação dos ministros do altar: uma e outra serão precárias, em quanto fôr necessário respeitar direitos legalmente adquiridos. A Commissão porém julgou dever tomar o arbítrio, que a lei da necessidade imperiosamente determina; muito mais, estando bem persuadida, de que as differentes applicações de dízimos, feitas em diversos tempos pelo concurso dos dois poderes, nunca tiverão per fim destruir aquelle primeiro, e principal destino, que foi causa da sua existência, e com o qual a vontade, e intenção dos fieis, estiverão sempre ha mais perfeita conformidade.
Quanto as suppressões, e aniões de paroquias, a Commissão observou, que o systema das proporções ao numero de fogos, ou de almas, he praticável tão sómente nas cidades, e grandes villas, ou em algumas povoações muito próximas, e de facil communicação. O local porém da maior parte do Reino, e as grandes distancias de uns a outros povos, fazem que em algumas províncias poucas vozes se offereça aquella commodidade. Accresce, que sendo melindrosos todos os artigos de reformas ecclesiasticas, como a experiência tem mostrado, este he sem duvida bem digno de ser tratado com muito especial cuidado, pois que pelas uniões, e suppressões de paroquias do campo, os povos das supprimidas ficão necessitados a frequentes incommodos, que nunca tiverão, e que por isso mesmo se lhes tornão menos supportaveis. Além disto he também necessário ponderar os novos impedimentos, que se vão oppôr á devoção, e piedade de muitos fieis; e até mesmo não convem despresar certas antipathias, e rivalidades de tal modo exaltadas entre alguns povos, que chegão a converter as concorrencias por motivos de religião em outras tantas occasiões próximas de conflictos, e desgraças.
Pelo contrario será de grande utilidade temporal, e espiritual para muitas povoações desannexarem-se de uma igreja para se unirem a outra, que lhes fique mais próxima. Então poderá acontecer que os novos limites de algumas paroquias não concorrão com os que estão actualmente assignados para a percepção dos dízimos; e em taes circunstancias, ou estes se deverão tambem alterar, ou os freguezes de uma igreja terão de pagar dízimos a outra, que lhe não pertença nem pela administração dos sacramentos, nem pela situação dos prédios que os produzirem. Ora posto que a esta segunda hypothese se opponhão o direito commum, e o particular da igreja lusitana, ella se tem realizado em muitas igrejas deste Reino por motivos de justa conveniência: e por tanto parece a Commissão que os limites actualmente assignadas aos dizimadores, deixem conservar-se provisoriamente para se evitar uma terrível confissão no estado das commendas, abbadias, e prioradas, e não se inutilizarem os estabelecimentos de congruas, e fabricas; visto que

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todos elles hão de ser calculados sobre o estado actual dos rendimentos das igrejas.
E porque he indubitável que entre o plano da refórma ecclesiastica, e o da nossa regeneração política deve haver a possivel analogia, he igualmente da maior evidencia que se devem erigir todas aqnellas paroquias que a necessidade, e a justiça estão reclamando desde muito tempo, e que sem duvida estarião já instituidas, se o interesse dos dizimadores não tivesse prevalecido ao bem da religião, e da humanidade. Será com tudo impraticavel que possa fazer-se este beneficio a todos os povos que o tem implorado; porque os meios que a muitos se figurão sufficientes, para nas suas povoações terem uma igreja decente com o seu respectivo cura, são realmente diminutos, e insufficientes.
Finalmente os prelados do Reino conhecem muito bem que algumas das instituições formadas em outro tempo para augmento do culto divino, tem hoje inconvenientes nascidos da mudança de circunstancias que exige a sua reducção a um estado mais conforme ás idéas e disposições gerais. Nenhum delles ignora qual póde ser a conveniência da suppressão de muitos beneficios simplices, os quaes por um abuso contrario ás saudáveis providencias do Concilio de Trento, se considerão ainda como desligados de officio algum pessoal que o beneficiado eleva exercitar na igreja.
Concordão finalmente nas utilidade da união de algumas pequenas collegiadas, para que sendo maiores, ainda que em menor numero, honrem melhor a Deus, celebrando o culto publico com mais decoro, e regularidade. Persuade-se a Commissão que para se verificar esta providente refórma, não he necessário mais que indicar-se aos bispos a alteração que convem fazer-se nos inversos artigos da disciplina, ou pratica actual, e que elles hão de empregar prontamente a autoridade ecclesiastica nos que forem da sua competência, tanto reais solícitos de conseguirem os santos fins que o augusto Congresso tem em vista, quanto mais seguros de os obterem com o auxilio e protecção da soberania temporal. Conclue pois a Commissão este relatorio, reduzindo a sua matéria ao seguinte projecto, que respeitosamente offerece ao exame da augusta Assembléa.

PROJECTO.

As Cortes Geraes, etc., tomando em consideração o grande numero de representações que os povos lhes tem feito, expondo os males que resultão dos chamados direitos de estola ou pé de altar, da insuficiencia das congruas paroquiaes, e da falta de consignações competentes para as despezas do culto Divino: tendo já ouvido os bispos do Reino sobre estes e outros artigos, em que a reforma da disciplina ecclesiastica he mais urgente por causar dos gravíssimos abusos que nella se tem introduzido: e querendo em fim remedialos com as providencias próprias da soberania auxiliando ao mesmo tempo as do poder, e autoridade da Igreja; decretão o seguinte:
Art. 1. A congrua necesaria a cada um dos parocos, para que possa sustentar-se sem direitos de estola ou pé de altar, será de 200 até 600$ réis nas cidades, villas, e lugares de Portugal, Algarve, e Ilhas Adjacentes, á recepção das cidades de Lisboa e Porto, e da ilha da Madeira, a respeito das quaes se fará um regulamento particular. Para os coadjutores serão as congruas menores que as dos respectivos parocos, mas nunca inferiores á 100$ réis.
2. Estabelecer-se estas congruas proporcionadas ao serviço das paroquias, e ás differentes circunstancias que juntamente se devem contemplar para o arbitramento de maior ou menor quantia: e terá lugar esta providencia em todas as igrejas, cujos parocos ou não percebem dizimos, ou recebem uma pequena porção; com tanto porém que se não falte á despeza da fabrica, e ao guizamento necessário para a decencia do culto Divino.
3. Serão computados nas congruas os rendimentos de passaes, ou foros, se os parocos os desfractarem. Ao rosto ficarão obrigados todos os rendimentos das igrejas possuidos por commendadores, communidades, seminarios, cabidos, beneficiados, ou pensionarios, seja qual for o seu estado, condição, ou jerarquia.
4. Nas igrejas em que os bispos recebem sómente a terça parte dos dizimos, segundo a divisão primordial adoptada nas Hespanhas, ficará esta sempre salva: naquellas porém em que recebem todos os dizimos, ou maior porção que a terça parte, em concurrencia com os outros dizimadores, ou pensionarios, o excedente da terça episcopal, e as porções de todos os mais interessados, ficarão obrigados pro rala á satisfação das congruas.
5. Tratando-se de estabelecer congruas a parocos das igrejas filiaes, cujos dizimos com os da matriz formão um todo pertencente a um, ou muitos dizimadores, será deduzida a terça episcopal, se o bispo ahi a tiver; e as duas partes que restão ficarão obrigadas ao pagamento das congruas das ditas igrejas, sem attenção a que umas paguem maior, outras menor quantidade de dízimos.
6. Acontecendo porém que não haja rendimentos para se darem congruas a todos as filiaes de uma igreja matriz, na conformidade do artigo 1.º, nem possa ter lugar a união de algumas, sómente se estabelecerão as ditas congruas em beneficio daquellas paroquias que forem populosas, e pagarem maior porção de dízimos; mas sem que se diminuão as pensões que actualmente recebem pelos mesmos dizimos os parocos das outras filiaes, que houverem de ficar sem a congrua competente, a fim de que não aconteça, ou que os seus paroquianos sejão mais gravados, ou que os respectivos parocos fiquem reduzidos a maior penúria.
7. As congruas assim estabelecidas, e calculadas em dinheiro, serão satisfeitas pelos, fructos dos dizimos; a saber: pão, vinho, e azeite. O valor dos generos será estimado pelo preço medio dos tres annos antecedentes; regulando-se depois as quantidades de cada um, que hão de entrar no pagamento das congruas, com attenção á maior ou menor abundancia dos ditos generos no districto da igreja matriz, e filiaes.
8. Em todas as freguezias, a cujos parocos ti-

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verem assignado congruas sufficientes, nos termos do artigo 1.º, os curatos amovíveis serão erectos em vigairarias perpetuas; e os direitos de estola, ou pé de altar, ficarão desde logo abolidos, assim como também as collectas com que os povos respectivos estiverem contribuindo para as congruas paroquiaes.
9. Os bispos determinarão os suffragios, e honras funeraes, que os parocos das sobreditas freguesias hão de fazer gratuitamente a todos os seus paroquianos de maior e menor idade, e sem differença de condição. Igualmente ficão encarregados de regular os emolumentos, ou honorarios, com que juntamente ha de ser compensado o trabalho do paroco, e dos mais ecclesiasticos nas differentes funções religiosas que a devoção particular dos fieis lhes requerer.
10. Serão assignadas consignações de 50 até 100$ réis para o guizamento e fabrica das igrejas paroquiaes, e colegiadas, tendo-se em vista a despeza que nellas se houver de fazer regularmente em cada anno. Os sobejos, se os houver, ficarão em deposito para se apoucarem ás despezas extraordinárias. A estas consignações serão obrigados os mesmos dizimadores que o forem ao pagamento das congruas dos parocos; porém deverão satisfazelas em dinheiro por quartéis, ou semestres.
11. Haverá em cada freguezia uma junta de administração da fabrica da igreja composta de quatro paroquianos de probidade, e eleitos de dois em dois annos de entre os mais abonados. O paroco será presidente com voto; e a junta elegerá um dos vogaes para recebedor, e outro para secretario, o qual terá a seu cargo lançar em um livro a receita e despeza da fabrica para ser no fim do anno legalizada gratuitamente pelo magistrado do respectivo districto.
12. Se com estas consignações para as fabricas, e com o estabelecimento das côngruas paroquiaes, a mitra, o cabido, ou seminário de alguma diocese ficarem privados de tão considerável porção de seus rendimentos, que seja justo indemnizalos, ser-lhes-hão applicados os rendimentos de alguns benefícios simples que se tiverem supprimido, e as Cortes darão as mais providencias, que as circunstancias permittirem, á vista da necessidade que os prelados lhes representarem.
13. Se uma paroquia tiver menos de cem fogos, juntos, ou dispersos, mas todos em pequena distancia da igreja de outra freguezia, unir-se-hão as duas, supprimindo-se uma, com tanto que não obste algum motivo particular, que difficulte notavelmente a administração dos sacramentos, e o cumprimento das obrigações religiosas. O mesmo deverá praticar-se com audiência do padroeiro, relativamente ás paroquias de mais de cem fogos por motivo da rúina da igreja paroquial, falta de meios para reedificala, ou substituila, e dar ao paroco, e á fabrica, as quantias necessarias. Fica porém entendido, que estas uniões deverão produzir immediatamente o seu effeito nas igrejas, que estão vagas; e só ao tempo da primeira vacatura nas que actualmente estão providas.
14. Em Lisboa, Porto, e outras cidades muito populosas, proceder-se-ha a uma nova circunscripção de paroquias, compreendendo-se nos limites de cada uma oitocentos até mil fogos, conforme a união, ou separação, em que elles se acharem, e segundo a capacidade das igrejas paroquiaes.
15. Para estas paroquias, e para todas as mais de Portugal, Algarve, e ilhas adjacentes, que não poderem ser bem servidas pelo paroco sómente, determinar-se-ha o numero de coadjutores amovíveis, que lhes for necessario: um delles servirá também de thesoureiro; porém as collegiadas terão um ecclesiastico especialmente deputado para este officio.
16. Não se unirão por agora aquellas paroquias, em que for necessario, para ter lugar a união, que alguma igreja de collação ordinaria, ou do padroado da corôa seja supprimida, e confundida com outra de padroado particular. Quando porém se tratar da união de igrejas pertencentes a padroeiros particulares, será pelo meio de suppressão, e não por algum dos dois, que em direito se chamão de sujeição, e igualdade.
17. Instituir-se-hão novas paroquias aos lugares, em que a necessidade espiritual dos fieis, e a gravidade dos incommodos, que padecem pela distancia da igreja paroquial, exigirem esta providencia; a qual só poderá verificar-se se o rendimento da igreja matriz, e filiaes for sufficiente para o augmento da despeza. Não havendo os rendimentos necessários para se estabelecer nova paroquia, e só sim para uma capellania, empregar-se-ha este meio de minorar o incommodo dos povos, e auxiliar o cumprimento das obrigações christãs.
18. Pelo mesmo motivo se desannexarão das igrejas, a que pertencem, aquelles povos, que se poderem unir a outras mais próximas com manifesta utilidade temporal, ou espiritual. Mas nem pelas erecções de novas paroquias, nem pelas uniões das que existem, ou por effeito das desannexações, serão por ora alterados os limites, que actualmente estão fixados para a percepção dos dízimos.
19. Os benefícios simples, e os das pequenas collegiadas, que não podem desempenhar dignamente os funções do culto, e officios divinos, serão supprimidos pelo meio, e autoridade competente: porém nas cidades, e villas mais notaveis, em que existirem duas, ou mais collegiadas, e parecer conveniente a conservação de alguma, será esta formada com o numero sufficiente de ministros, cujas funções, e congruas regularão os bispos. Ficão salvos os direitos dos beneficiados que actualmente possuem benefícios nas collegiadas existentes; e bem assim os encargos pios de todas, em quanto não forem legitimamente reduzidos, ou extinctos.
20. Os rendimentos dos benefícios, e collegiadas, que se supprimirem serão desde logo applicados, para as congruas dos parocos, e coadjutores, e para as consignações das fabricas, que de outra maneira se não poderem estabelecer nos termos dos artigos 1.º, e 10.º Os que não houverem de ter esta applicação, ficão destinados para o estabelecimento de seminários naquelles bispados, que os não tem, e para substituirem a diminuição, que houver nas rendas dos cabidos, minas, e seminários, na hypothese do artigo 12.º
21. Nenhum ecclesiastico será de ora em diante

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provido em beneficio das collegiadas, sem que fique obrigado a servilo pessoalmente, e receber a ordem de presbytero, logo que tiver a idade competente. Os beneficiados, que a não receberem, seja por omissão, ou por defeito, e impedimento canónico, serão infallivelmente privados dos benefícios: e aquelles que actualmente os possuem, e não servem, receberão unicamente os fructos, que sobejarem das congruas assignadas pelos ordinários aos economos, os quaes ficarão obrigados a cumprir todos os encargos dos benefícios.
22. Os ordinários do Reino de Portugal, Algarve, e ilhas adjacente, com a cooperação dos cabidos procederão immediatamente a formar o projecto da execução de tudo o que fica disposto, e for applicavel ás suas dioceses fazendo ordenar mappas muito exactos das paroquias, que só hão de crear, das que se hão de unir, e dos povos, que se devem desannexar de umas para outras. Da mesma sorte farão ordenar mappas das congruas, que se devem assignar aos parocos, e nos coadjutores nas paroquias, em que os julgarem necessários.
23. Para que esta reforma se execute com a possivel exactidão, e justiça, todas as corporações seculares, ou regulares, e geralmente todas as pessoas, que percebem rendimentos das igrejas paroquiaes em dízimos, ou provenientes de foros, e bens de raiz, enviarão ao respectivo ordinário, no termo de dois mezes, contados da publicação deste decreto, relações exactas dos rendimentos, que tiverem recebido nos annos de 1817, 1818, e 1819; a fim de que sendo combinados com as que os mesmos ordinários poderão novamente obter por outros meios, se alcance o conhecimento do verdadeiro estado dos rendimentos das igrejas, e se evitem as vexações, e desordens, que resultarião das supposições de fundos, que realmente não existem.
24. E porque tem sido, e continuão a ser muito frequentes as representações dos povos, e dos parocos, já sobre as uniões das igreja, e annexações de lugares a diferentes freguezias, já inculcando de absoluta necessidade a erecção de algumas novas paroquias, e o estabelecimento de capellanias arguindo ao mesmo tempo os informantes dos prelados de parcialidade, ou precipitação nas informações, que lhes enviarão, deverão os mesmos prelados renovar o mais escrupuloso exame sobre este importantíssimo negocio, em que tanto interessão o bem da religião, e a tranquilidade publica.
25. Farão igualmente os ordinários o plano da execução dos artigos 19 e 20, individuando os benefícios e collegiadas, que se hão de supprimir, e o numero de ministros que hão de servir naquellas que se deverem conservar. Mas nem este plano, nem o projecto de que ficão encarregados no artigo 23, serão executados em todo ou em parte, antes de serem approvados e sanccionados pelas Cortes, para o que lhe serão apresentados no termo de seis mezes, contados da publicação do provento decreto.
26. O Governo do Reino, etc. Paço das Cortes 20 de Fevereiro de 1822. - João Bento de Medeiros Mantua; João Maria Soares de Castello Branco; Luiz Antonio Rebello da Silva; Ignacio Xavier de Macedo Caldeira; Rodrigo de Sousa Machado; José Vaz Velho; Isidoro José dos Santos.
Os Abaixo assignados, convindo em geral no plano proposto, discordão
1. No primeiro artigo; pois são de voto, que o minimo das congruas dos parocos e coadjutores seja mais pequeno, v. gr, 140 ou 150 mil réis para aquelles, e de 80 mil réis para estes; isto em attenção ao pouco que hoje valem os dízimos, e o muito que ficão gravados, e porque para ficarem de §00 mil réis pelo menos as côngruas, será preciso supprimir muitas paroquias, e deixar de erigir outras de novo, o que causa grande incommodo, e desgostos aos povos vias aldêas.
2. No 6.º artigo, quando não houver rendimentos para se darem congruas a todas as filiaes de uma igreja, em lugar da providencia do artigo, propomos o arbítrio do n.º 4 abaixo.
3. No artigo 7.º são de voto, que o pão, vinho, e azeite se ponhão exemplificativamente; e não taxativamente, e que o calculo dos fructos uma vez feito, se não possa alterar senão por uma lei.
4. No artigo 8.º são de parecer: 1.º que os parocos ate agora amovíveis fiquem perpétuos, independentemente mesmo do aumento de congrua: 2.º que a abolição do pé de altar, de que fala o artigo terá lugar não só nas Igrejas a que se aumenta a congrua, mas igualmente nas que não necessitão aumento; e que quanto ás outras igrejas em que por falta de congrua necessária os párocos precisarem ainda do pé de altar, ou outra collecta já introduzida, será isso regulado pêlos respectivos ordinários, com audiência dos povos, por um prudente regulamento, e que evite questões para o futuro.
5. No artigo 9 são de opinião que se tire a segunda parte do artigo que começa igualmente, e que em lugar disso se diga o seguinte: "E os ordinários arbitrarão aquelles suffragios que os herdeiros dos que morrem abintestado devem mandar fazer pelas almas dos taes defuntos, reduzindo a uniformidade, e um racionavel arbítrio os vários usos que ha nas diversas freguezias de cada bispado."
6. No artigo 10 se ponha muito mais baixo o mínimo da consignação para a fabrica e guisamento das igrejas, v. g. 15 mil réis.
7. No artigo 13 se diga sómente: que os ordinários unirão aquellas freguezias que admittirem commoda união.
8. O artigo 16 se supprima, e em lugar delle se diga: que nas igrejas unidas, e que forem de diversos padroeiros, ficarão os padroeiros conservando o seu direito exercitado por alternativas ou por outro qualquer modo em direito permittido.
9. No artigo 20 se deverá accrescentar: que os ordinários poderão supprimir, ou unir os benefícios das cathedraes, sem prejuízo da decência do culto.
10. No artigo 21 se deverá declarar: que poderão tambem applicar-se para cabidos nas cathedraes que os não tiverem.

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Artigos addicionaes

1. Sendo conveniente, poderão os ordinários separar o serviço do coro tanto nas cathedraes, como nas collegiadas, do cura de almas.
2. Os ordinários praticarão o que se ordena neste plano tambem nas igrejas isentas, em todo, ou em parte, da sua jurisdicção, que se acharem dentro dos limites da sua diocese. - Luiz, Bispo de Beja; José Vaz Correa de Seabra.
Lidos os primeiros sete artigos, por conterem matéria connexa, disse
O Sr. Mantua: - Sr. Presidente: eu sobre este projecto tenho de fazer algumas reflexões antes de elle entrar em discussão, tanto pelo que respeita a Portugal, como pelo que toca ás ilhas dos Açores, que são as unicas adjacentes de que elle trata, visto que a da Madeira ficou para outra occasião. Pelo preambulo vejo a grande difficuldade que a Commissão acha, de arbitrar a congrua aos parocos pela complicação em que se achão os dízimos, e vejo pelo paragrafo 4.º, e 5.º, que para applicar estas congruas se manda que tendo os bispos mais da terça parte dos dizimos da sua diocese, o resto seja applicado para as congruas; sobre isto he que he a minha reflexão. Nós temos a discutir uma indicação do Sr. Fernandes Thomaz, e eu tenho, quando lá chegar, de mostrar que á igreja forão dados estes bens para o seu culto, e para isso he que os possue, e he para que forão dados os dizimos: tenho de mostrar que o soberano Congresso, como depositário dos poderes dar Nação, pode dispôr delles como melhor convier; e tenho de mostrar, que os Srs. bispos não tem mais que um direito á sua congrua sustentação; ma* por agora acho que se deve suspender a discussão deste artigo 4.º, e 6.º, e tratar dos mais que não tiverem dependência alguma: ora isto he a minha opinião pelo que diz respeito ao projecto em geral; agora pelo que diz respeito ás ilhas dos Açores, acho que he intempestivo. Vejo no artigo 24, que isto se commete aos bispos, e ao cabido; ora he preciso lembrar que os bispos não se achão na sé de maneira que necessariamente se vêm obrigados a pedir informações aos ouvidores, e estes hão de informar como lhes convier; ao mesmo tempo que as congruas que elles tem presentemente são muito sufficientes, e como o projecto prescreve 200 até 300$ réis, elles tambem quererão isto. Eu não sou inimigo dos parocos, porém não sou de voto que elles tenhão superfluo: por tanto sou de parecer que por ora prescindamos das ilhas dos Açores, e tratemos de Portugal; e depois quando se tratar da ilha da Madeira, de que a Commissão ecclesiastica me encarregou de fazer o projecto, então se tratará das ilhas dos Açores; porque da fórma que se achão presentemente não convém.
O Sr. Borges Carneiro: - Estamos discutindo um dos projectos de maior importância, e interesse entre os que tem merecido a attenção do soberano Congresso, e um dos que a justiça mais altamente reclama a sua decisão. Offerece-nos em primeiro lugar a extincção dos direitos de estola, ou pé de altar. Sabe-se bem quanto elles são indecorosos ao sacerdócio, cujas graças devem ser administradas de graça; ao passo que agora vemos extender uma mão para administrar o matrimonio, o baptismo, a communhão pascal, a sepultura; e a outra para receber dinheiro ou cousa que o valha, ao ponto de muitas vezes se retardar a execução do officio sagrado por falta de pagamento, e por esta falta moverem-se renhidos e interminaveis pleitos. Estes direitos, erão nos bons tempos da igreja, espontâneas oblações dos fiéis, porque não havia dizimos. Todos sabem que por mais de sete séculos não houve na igreja dízimos: no fim do texto século foi a primeira vez que um concilio particular de Macon em França impoz com excommunhão o encargo de pagar dizimos: e só no seculo oitavo se generalisou esta obrigação, suffocada a resistência dos povos de uma parte pela força armada dos Reis, e da outra pelas excommunhões dos bispos, afferrsdos ás doutrinas daquelles padres que, costumados a medir o sacerdócio christão pelo sacerdócio judaico, ensinárão serem os dizimos de direito divino: porque gentes ha que se por aí vier alguma rajada de peste que traga consigo prebendas, logo a apregoão por peste de direito divino, da mesma sorte que vemos em nossos dias denominar-se santa uma alliança, que se diz posta por Deus para regular os destinos de todas as nações; porém já se sabe, sempre cuidando de se engrandecer em poder e em território. Só nas igrejas do Oriente não forão de direito divino nem nunca pegarão os dizimos, porque o Imperador Justiniano prohibiu aos bispos obrigarem com censuras aos christãos a offerecerem fructos alguns aos sacerdotes involuntariamente. Nem por outra parte eu sei com que justiça ha de a despeza publica do culto divino, quero dizer, a manutenção dos templos, e dos sacerdotes, caír sómente sobre os lavradores, e nada sobre todos os mais cidadãos que tem copiosos rendimentos em prédios urbanos, ordenados, commercio, ou industria; não sei como possão os dizimos, que não são mais que uma contribuição directa, conformar-se com as bases juradas da nossa Constituição, que decretão que taes contribuições hão de recair com igualdade sobre todas as classes dos cidadãos, e com proporção aos rendimentos de cada um. E que diremos da desigualdade com que os mesmos lavradores pagão os dizimos nas diversas terras do Reino! Mas em fim pagão-se os dizimos, e com isso estão os fiéis desonerados dos beneses ou direitos de estola, á excepção dos officios que pedirem por sua particular devoção.
Venho agora a falar da segunda parte do projecto, isto he, das congruas dos parocos, no que o projecto he excellente. Todo o beneficio ecclesiastico he um emprego publico, sem mais differença dos outros empregos sociaes que a da natureza do serviço, ou obrigações inherentes a esse officio. Muitas cousas nos ensinão os canonistas sobre benefícios ecclesiasticos, sua natureza, instituição, collação, posse, direito perpétuo de perceber fructos a certo ministerio sagrado, etc. Para que he tanta cousa? Em ultimo resultado tudo se reduz a dizer que ha na igreja officios ou ministerios sagrados, e que quem os servir deve ter por direito natural um ordenado certo e sufficiente em quanto viver, ou não for deposto por au-

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toridade competente. E eis-aqui esse decantado direito perpétuo: o mesmo direito tem o militar ao seu soldo, o empregado publico ao seu ordenado. Em uns he este direito perpétuo como nos juizes; outros são amovíveis, como os contadores. O mesmo succede na igreja onde ha parocos collados ou amovíveis. O que he pois direito divino he que os bispos e parocos que são de instituição divina, e pertencem á jerarquia da igreja tenhão uma congrua sustentação; a qual poderemos chamar congrua, ordenado, beneficio, ou, como as nossas ordenações de fazenda dizem com uma palavra geral, um mantimento. Quanto porém a consistir fale mantimento em dinheiro ou fructos, a ser maior ou menor, pago deste ou daquelle modo, pertence esse regulamento todo ao poder civil, como objecto meramente temporal.
Quando dizemos porção congrua, entendemos uma sustentação sufficiente, nem de mais nem de menos; Não de mais para não se carregar a Nação com impostos desnecessários, e para se não dar logar ao luxo, e ás paixões, que o acompanhão: não de menos porque todo o empregado publico deve ter uma sustentação mui decorosa, sem que esteja dependente dos seus subditos. Nisto pois eu disse, que acho excellente o projecto, em quanto (sem tratar de Lisboa, Porto, Ilhas, etc.) assigna a cada paroco o minimum de 200$000 réis, e o maximum de 600$000; o que junto aos emolumentos que deixa salvos o artigo 9, segura a sustentação do paroco; e se a experiência mostrar necessidade de augmento, se fará logo que a Nação esteja curada de suas feridas. Porém aqui ouço já dizer: não ha dinheiro para tanto; e eu respondo: o dinheiro he muito, os rendimentos são mui copiosos; mas a ladroeira ainda he maior. Os dízimos estão todos secularisados, e alienados dos fins para que os fieis os pagão, e dos que não estão alienados commem uns tudo, outros nada. Os Francezes estabelecérão na sua devolução a palavra nivelar, e tornarão-na odiosa, pela precipitação com que se houverão; mas em verdade ella contém uma grande regra do systema constitucional, pois quer dizer, dos bens nacionaes tirar aos que tem de mais, e dar aos que tem de menos. Grande regra, visto que até agora foi unica regra dar aos que já tem muito, é tirar aos que tem pouco o seu misero sustento. Facílima he esta Operação. Não me falem nestes casos em prudência: grande conveniencia he que eu chamo estarem as Cortes congregadas ha perto de dous annos, e tolerarem-se ainda tão injustas espoliações e desigualdades. Para mim são estas cousas mui faceis. Chegava a um bispo, que tem 200 mil cruzados, e deste tirava logo congruas para 13 bispos a razão de 15 mil cruzados; um paroco de 40 mil cruzados fornecia 26 parocos a 600 mil réis: esses cavalleiratos, o benefícios simplices, e prestimonios que não tem outro fim senão o encargo de rezar no breviario, obrigação; que todo o clerigo tem pela ordenação; abaixo com elles. Para isto são necessarias grandes meditações, e projectos? Na minha freguezia renderão os dizimos cousa de oito de mil cruzados, e o paroco talvez não perceba de todos elles 200 mil rs.: muitas vezes chove na igreja, e andão então a pedir esmolas, ou finta ao povo para comprar algumas telhas, ao passo que um fidalgo leva por uma bulla a metade dos dizimos por outra bulla mais uma quarta parte, e da quarta parte restante commem uns chamados beneficiados, que ninguém sabe quem são, e tem lá na igreja uns [...], que rezão no coro, e servem a igreja por uns mineráveis almudes de vinho verde. Porém não nos admiremos; pois em o nosso bom Portugal a regra he, ser o ganho do ocioso, e a fome do trabalhador, e estar sempre o premio na razão inversa do trabalho. Quem desfructa hoje os dizimos? Certos regalees, ou communidade inuteis. Só a fidalgos com o pretexto de pagarem seus calotes se derão ha pouco 1$377 contos de réis, consistentes nos dizimos das commendas; e o pobre povo a pagar os dizimos, e os pobres parocos a viver miseravelmente, e as pobres igrejas, e utensilios sagrados a respeitar ruinas. Em verdade faz pena ler as cartas de parocos, que se recebem das províncias, ha 20, 30, e 40 annos trabalhando, com elles se achão os fieis ao nascer, ao casar, no viver, ao morrer, depois de mortos, e estes pequenos bispos, estes successores dos 70 discipulos de Christo, estes membros da jerarchia da igreja, vivem pobremente com 30 alqueires de pão, com 8 ou 10$ rs. de congrua, dependentes dos miseros direitos de estola; ao passo que homens ociosos, regalões, communidades inuteis chupão toda a avultadissima massa dos dizimos, que os povos pagão para terem templos, e parocos! E ainda a Commissão nos dirá, respeitar direitos legalmente adquiridos? Que he direitos legalmente adquiridos? São roubos e ladroeiros, as quaes nunca podem prescrever, sejão ellas fundadas em seiscentas bullas de Papas, e em posses de muitos seculos. São obra do despotismo ecclesiastico de mãos dadas com o despotismo secular. Agora chegou o reinado da justiça, cumpre deitar já abaixo taes ladroeiras sem perda de um momento, e fazer com que todos os que commem dizimos, concorrão desde já pro rata para as congruas dos parocos, é para os concertos das igrejas, e despeza do culto publico. E ainda a taxa posta no projecto me parece pequena: eu quereria que fosse de 300 ale 600$ réis, não em dinheiro mas pago do monte dos dizimos, pelo preço que a camara tiver taxado aos fructos; a estes se paguem logo, de modo que os que demorarem o pagamento, sejão presos até pagarem. Nem pareça excessiva esta minha proposição. Ha um principio, que sendo de direito natural, não he todavia conhecido em Portugal, e vem a ser, o bom pagamento dos empregados públicos. Não se conhece a gravidade do crime que ha em faltar a este pagamento, expondo os empregados á necessidade de prevaricar; tirando-lhe os alimentos; em fim não pagando o jornal a quem trabalha, que segundo a cartilha he um dos peccados que bradão ao céo. Os Francezes nossos invascros respeitavão a santidade dos ordenados: nós não fazemos della nenhum caso. Sei de provedores, que deixavão no maior desamparo os professores públicos, sem terem motivos nem mesmo plausivel para não lhes fazer pagar. He necessaria uma lei severa. Logo que a qualquer mínimo empregado civil, ecclesiastico, ou militar se não pague um quartel, o prios-

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te, dizinheiro, thesoureiro, ou ministro, sem excepção do ministro da fazenda, devem ser presos: se com esta foi não querem servir, larguem a tempo, e não se zombe por mais tempo de um artigo tão inviolável.
Sr. Moura: - Sr. Presidente, não ha cousa mais ociosa, nem mais desarrazoada, do que reclamar contra um abuso sem ao mesmo tempo apresentar o remédio que só lhe ha de dar desde logo. Aqui não ha se não uma cousa a tratar: a questão essencial he esta: a quantos parocos, e curas havemos dar as porções congruas, e em quanto importa o capital donde ellas hão de saír. O illustre Preopinante que acaba de falar porque me não tira desta grande duvida! Vamos por tanto ao essencial, e deixemos as ostentações frívolas da sciencia canónica, a qual nada vem agora ao caso. Em quanto importa o dizimatorio geral de todo o Reino? Tire-me o illustre Preopinante, por quem he, desta incerteza para eu subscrever ás suas idéas. Se acaso a importância dos dizimos chega para pagar estas congruas a todos os parocos, eu subscrevo já. Os dízimos não são de direito divino; não ha canonista moderno, e de bom senso que desconheça este principio, que elles forão no principio offertas voluntarias, e que o fim uniu destas antigas oblatas, e destes dizimos actuaes he pagar aos ministros, que servem o aliar: são idéas triviaes, que aprendem como prolegomenos os estudantes de direito canónico; he inútil cançar nos com a demonstração destes assumptos académicos. Esta não he a dificuldade. Eu comprazo-me de ter sido o primeiro, que neste augusto Congresso propuz que se estabelessem congruas sufficientes aos parocos pobres: haverá alguém, que desconheça a necessidade de remediar os males da indigência daquelles ministros, que mais servem o altar, e que mais trabalhão na vinha do Senhor? Ninguém haverá certamente: mas a questão não he esta; a quentão he quantos são elles; quanto se lhe ha de dar; e donde ha de sair esse quanto. Eis o grande ponto; tudo o mais he divagar, e ostentar. Não posso deixar de arguir a Commissão em quanto ella propõe similhantes congruas sem ter calculado, se os dízimos chegão para estas congruas; e se não póde fazer este calculo para que ha de tomar um principio geral sem ter os dados precisos? Concluo que não ha por ora se não tres cousas a estabelecer: 1.ª que o direito de pé de altar deve cessar logo que se estabeleça o congruas: 2.ª que estas congruas devem ser proporcionadas á extensão das paroquias, e ao trabalho dos parocos: 3.ª que a quota destas congruas será estabelecida, logo que, por um trabalho a que já se deve mandar proceder, se saiba quantos são os parocos a quem se deve dar congrua, e em quanto tem importado (ao menos os 5 annos preteritos) os dizimos donde hão de sair estas congruas. Não ha cousa mais fácil do que dizer: um abbade que tem vinte mil cruzados reparta pelos parocos seus vizinhos: isso he facil; porem dar duzentos mil réis a todos indistinctamente sem primeiro averiguar se todos os dizimos ao Reino chegão para este fornecimento, he querer só prometter, e depois faltar. Srs., justiça em dar o pão a quem o merece; mas prudência para lhe não dar nem mais, nem menos do que se lhe póde dar! melhor he cumprir o que se promette, do que prometter, e depois não cumprir.
O Sr. Girão: - Sr. Presidente, peço a palavra: Esta questão vai infalivelmente levar-nos ao ponto interessante da pretendida propriedade dos ecclesiasticos, e por força havemos tratar de dízimos, e deixar decidido se elles são de direito divino ou humano; porque se são de direito divino, não podemos tocar-lhe, mas se são de direito humano, sem duvida se podem alterar, e segue-se que não são propriedade da igreja: principiarei pois o meu discurso tomando por thema as ultimas palavras do Exmo. Sr. Bispo de Beja, com que terminou os seus argumentos na sessão de um destes dias; ellas são cheias de ênfase, e por isso as retive na memória: vão as seguintes - A força não dá direito. - Quando falei nesta matéria principiei a historia dos dízimos nos tempos de Abraham, e podia principala desde os Caldeos; mas por abreviar, hoje principiarei nos primeiros dias da nascente Igreja. Christo senhor nosso podia chamar para sem discípulos os reis, e os conquistadores, mas elle com sua humildade nos quiz ensinar que a força não dá direito: declarou mesmo, que o seu reino não era deste mundo: chamou S. Pedro, que só tinha virtudes em lugar de riquezas, e pregou sempre a desapropriação dos bens: seus discípulos o imitarão, e daqui vem que os respeitáveis padres daquella venturosa idade nada tinhão, nada querião mais do que o necessário alimento, e nem se quer lhe dava cuidado o dia vindouro, por isso repartião as esmolas que lhes davão com os primeiros que as querião. Despidos de ambição, e de mundanos cuidados arrostavão os perigos, e solirião o martyrio. Andárão os séculos, e os christãos, que ao principio erão pobres, já no reinado de Constantino Magno erão ricos: os reis dão sempre a quem já tem, e fazem muito caso dos ricos, por cuja razão o dito imperador fez caso delles, e, sem ser catholico, mandou pôr o monograma de Christo nas bandeiras do exército; mais alguns favores lhes fez, e o papa Silvestre pertendeu persuadir os vindouros que Roma lhe tinha sido doada por elle. Não posso porem deixar de notar, que aquella doação foi apocryta, e uma das primeiras fraudes piedosas dos pontífices, pois que muitos annos depois erão confirmados pelos imperadores, e varias vezes o confessárão em suas santas Liras, como se póde ver em Moreri. Embora Constantino tivesse altares na igreja dos apóstolos em Constantinopla, embora passasse passasse por santo, eu observei que elle fez dons aos catholicos com as mãos ensanguentadas no sangue do Ascaric, e Rugaise, reis captivos, que lançou ás feras no meio de Roma, fez morrer seu sogro, matou Licinio, para se fazer absoluto, e deu a morte a seu filho Crispo. Se protegeu os christãos também fez o mesmo aos Arianos, e perseguiu seus bispos. Não podia a igreja ser feliz, nem rica no tempo de similhante tyranno, e sómente o rei Pepino he que dotou o altar de S. Pedro com a cidade de Roma, mandando pôr as chaves da mesma sobre elle, pelo seu capellão o abbade de S. Diniz. Se o papa teve então a triplice coroa, tambem os

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bispos de França erão riquíssimos porque tinhão parte nas heranças de todos os seus defuntos diocesanos: mas a inveja fez que os militares lhe tirassem tudo, e os deixassem pobres no tempo de Carlos Martelo. Carlos Magno para dar ordem a seu vasto imperio, e sustentar os ecclesiasticos que nada tinhão, estabeleceu os dízimos. Não se pense porém que os povos acceitárão de bom grado tão oneroso tributo; sublevárão-se, e muitos abandonarão as terras: então os padres forjárão embustes, fingirão calamidades, e Santo Eucherrimo, sonhou que via a alma do rei Pepino atormentada pelos demonios, a fim de enganarem os rusticos e ignorantes vassalos de um despota!!! Agora pergunto eu, será de direito divino aquillo que he fundado numa patranha? Certamente não. Mas os padres prégavão por esses tempos que se devião pagar os dizimes trazendo sempre os exemplares de Levitico (medirão alguns). Sim prégavão (respondo eu) e por signal que tirárão seus argumentos do Zenda-Avesta dos Persanos: os sectarios de Zoroastro dizião ao povo não basta que vós sejais justos, que tenhais boa moral, e que façais bem aos vossos similhantes, he necessario que o vosso padre vos approve as vossas acções; porque se elle as appovar, Deus as opprovará, e se elle as repprovar, Deus vos condemnará; dai-lhe pois os animos de vossos frutos, e de vossos rebanhos para que vos seja propricio. Eis-aqui as doutrinas dos Persas, e que os catholicos padres seguirão, mas nem assim se podião estabelecer perfeitamente os dízimos. O concilio turonense no 6.º seculo não se atreveu a determinar que se pagassem e só usou de razões suasorias: mas Alexandre III julgou-se com mais poder que o concilio, e fulminou a pena de excommunhão contra os que não os pagassem!!! Abusando assim da espada da igreja; porém a força não de direito: são palavras do meu thema, e por isso a igreja deve restituir aos lavradores tudo quanto lhe tem tirado deste tempo para cá; até ahi erão oblações mais ou menos voluntarias, e astuciosamente solicitadas, porém depois forão violencias muito improprias daquelles que região a barca de S. Pedro. Depois de se estabelecerem os dízimos no imperio francez, passárão-se trezentos annos sem que se adoptassem na Hespanha; e mesmo no primeiro concilio bracarense não se fala delles, como refere Fr. Joaquim de Santa Rosa de Viterbo. Daqui se vê quanto tempo se passou na Península sem ser admitido tão oneroso tributo, e mesmo depois de estabelecido não tinha regularidade, porque n'umas partes era a vintena, e n'outras a quarentena. Tenho pois provado exuberantemente, que os dízimos não são de direito divino, e por isso o poder temporal os póde tirar quando quizer; logo os ecclesiasticos não tem propriedade nelles, e só tem jus á sua congrua, e decente sustentação como diz o Apostolo - O sacerdote deve viver do altar, assim como o boi vive do trigo que tritura. Sim, senhores, devem ser sustentados, e ter congruas proporcionadas a seu alto ministerio, mas não pertence a elles imporem essas congruas, pertenço á Nação o fazelo como entender que he justo. Já lá vão os tenebrosos tempos em que se podião dizer aos povos quantos embustes lembrassem, pois a inquisição fazia calar a boca a quem dizia verdades, e abafava suas victimas nesses medonhos carceres, que hoje estão demolidos; sirvão de prova os montes de ossos de tíbias e crancos que lá se tem encontrado. Agora devemos dizer as cousas como ellas são; pois o povo portuguez não he Saturno que engula pedras envoltas em trapos. Não se segue do que eu digo que se abulão já os dízimos: isso seria grande impolitica, posto que era grande vantagem, sem a qual nunca ha de haver prosperidade; todavia não se sobe á alta torre de um salto, he necessario ir de degráo em degráo; e por tanto o primeiro que se nos offerece he este projecto das congruas que adopto; mas sómente quanto aos fins, o não quanto aos meios que elle propõe. Eu desejo, torno a dizer, que os parocos tenhão uma congrua certa, uma decente sustentação proporcionada a seu alto ministerio, a fim de que não usem delle venalmente. Ha desdouro maior para os calholicos do que o triste abandono das igrejas, e miseria de alguns auras d'almas? Ha vergonha maior, do que andar-se a pedir esmola para os altares, depois de pagarmos dízimos, offertas, e primícias; pargarmos antes de nascer, pagarmos quando nascemos, pagarmos toda a vida, e ficarem ainda a pagar os nossos herdeiros? Tudo para a igreja, e esta sempre pobre? Sim, senhores, he necessario remediar isto, e pouco a pouco, porque a obra he muito grande, e eu não quero verme rodeado de ruínas sem edificar cousa alguma. A illustre Commissão não nos dá esclarecimentos alguns, falta-nos a estatística ecclesiastica, e pertendo que votemos a esmo! He verdade que ella deixa ao cuidado dos bispos o fazer as repartições (art. 22); mas eu oppor-me-hei sempre á idéa de propriedade dos dizimos, e nenhuma ingerencia quero que tenhão nisso os padres; se vejo mui longe a época de acabar este flagello, que he peior do que a peste que extingue as gerações no embrião, esterilizando por toda a parte a terra, atando os braços aos lavradores, com tudo eu não perco as esperanças de ver ainda uma só contribuição directa, imposta segundo as faculdades, entrar junta no thesouro publico, e dali pagarem-se os ecclesiasticos todos, assim como os mais empregados publicos. Bem conheço que haverá novos abbados Maurys que me digão: quereis atacar-nos a posse de quatorze seculos? Mas eu lhe responderei, que a posse ganhada por embustes, e por força não dá direito, pois he viciosa na sua origem: só reconheço a propriedade fundada na lei, quando esta he feita pela maioria de uma nação, e os dízimos pagão-se por uso ou por abuso, porque as decretaes dos papas não são lei Concluo porque o projecto deve voltar á Commissão para que nos dê esclarecimentos, e depois votaremos com conhecimento de causa.
O Sr. Sousa Machado: - Sr. Presidente, crimina-se a Commissão de reforma de ter procedido á organização deste projecto em conhecimento de causa, e dizem que não sabendo o soberano Congresso quanto valem os dízimos do todo o Reino, e quantos são os parocos, de nenhuma sorte póde determinar as congruas que estes devem ter. He necessario portanto que eu justifique nesta parte o procedi-

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mento da Commissão. A Commissão, Sr. Presidente, não obrou ás cégas, examinou cuidadosamente, e com muito escrúpulo as respostas aos quesitos que antes da creação da mesma Commissão já o soberano Congresso tinha feito a cada um dos ordinários, e em resultado de todos elles he que dá este parecer que he feito com muito conhecimento de causa. Este exame foi distribuído pelos differentes membros da Commissão: cada um dará conta daquelles bispados que lhe forão encarregados, assim como eu vou dar a informação das igrejas do arcebispado de Braga, que foi aquelle que examinei. Desta informação enfadonha, mas muito necessaria para o soberano Congresso obrar com acerto, poderá ver-se a importância dos dízimos e mais redditos ecclesiasticos, e se chegão eu não para se estabelecerem as congruas na forma que a Commissão propõe: - o arcebispado de Braga tem 1$292 paroquias, que segundo a informação do arcebispo podem ser reduzidas a 1$195: tem 196 coadjutores, e faz tudo no presente estado 1$483 empregados ecclesiasticos: - Todas as rendas ecclesiasticas importão 810:869$ 235, das quaes recebem os parocos, e coadjutores apenas 237:904$971; e nisto mesmo ha muito que dizer; porque alguns abbades recebem porções consideraveis, e sem proporção alguma com os de mais, e a tem de arrecadar a incerta, e sempre contradictada parte que importa o pé de altar. - Consistem estes oitocentos e dez contos em 21:155$551 que rendem os passaes: em 56:497$943 que importa o pé de altar; em 677:4l4$726, que importão os dizimos e foros; em 48:243$290, que importão as congruas dos parocos que não recebem dizimos, e em 7:557$720 que importão as congruas dos 196 coadjutores, o que deve crescer aos dizimos, porque os dizimadores arrendão livre de encargos, e congruas dos parocos. Resta ver a boa distribuição a que he applicada tão enorme sorte, e de que tão pouco receitem os parocos, para cuja sustentação era primeiramente instituido um tão pesado tributo: - commendas seculares 187:534$739; - commendas regulares de um e outro sexo 103:528$507; - universidade 20:348$380; - collegio de S. Pedro de Coimbra 6:488$666; - seminário de Santarem 3:635$000; - dito de órfãos de Braga 952$000; - seminário de Braga 210$000; patriarcal 44;284$314; Villa Viçosa 1:145$$743; collegiadas 21:270$330; - abbadias sem cura e beneficios simpleces 7:939$010; prior de Guimarães 4:922$500; - fabrica da sé 350$000; - fabrica da collegiada de Freixo 366$367; mitra 31:622$984; cabido da sé 31:834$565; commendas ecclesiasticas, ou igrejas unidas a outros benefícios 11:769$615; abbadias 159:333$962; pensões que as sobrecarregão 33:727$949; - prestimonios 32:232$019; - hospital de Villar de Perdizes 2:145$000; de S. Braz de Villa Real 1:100$000; dito de Braga 360$000; - alcaide mór do Ervedido 530$000; castello de Melgaço 43$750; morgado de Sande 400$000 em S. Mamede de Traviscozo; - administrador de uma capella de Monção em S. Cipriano de Pinheiros 100$000;
camara de Caminha 354$000; dita de Viana 782$000; governo de Hespanha 220$000; morgado da Faia 2:040$000; padroeiro de Bandora 200$; o Conde de [...] em S. Paio de Ecravedra 400$, e em S. João Baptista de Vieira 500$, com bulla para reduzir a prestimonio a metade dos dizimos por morte do actual abbade; - o padroeiro de S. Clemente de Basto 800$ de prestimonio para unir in perpetumm nos seus vinculos. De tudo isto se vê que os dizimos chegão, se forem bem applicados para decente sustentação dos ministros e do culto, o que ainda póde haver sobras, para a sustentação dos estabelecimentos literarios e de beneficencia e caridade: por tanto tenho bem dissipado os receios dos illustres Preopinantes que receião não haja de que se possão dar as congruas insignificantes e mais limitadas que podia propôr a Commissão.
O Sr. Miranda: - Estão em discussão os primeiros sete artigos deste projecto. Não me demorarei como fizerão alguns illustres Preopinantes, em remontar á origem dos diximos, nem no modo porque se introduzirão os abusos que nelles se encontra; porque todos sabem que quem menos trabalha he quem come a maior porção dos dízimos, quaes os commendadores, abbades etc., porém os parocos vivem alguns na maior pobreza, tendo aliás todo o trabalho. Devemos pois decretar em primeiro lugar congrua para os parocos, e em segundo lugar quaes hão de ser essas congruas. Ha muito tempo que se nomeou uma Commissão especial á qual eu tambem pertencia, na qual a respeito da materia deste projecto se mandarão pedir informações aos diversos bispos sobre o numero de paroquias dos seus respectivos bispados, as que devião supprimir-se; aonde se deverão crear novas, quanto importarão os rendimentos década freguezia, quanto se poderia arbitrar para cada paroco etc.; nada disto chegou ainda ao Congresso, não temos dados sufficientes para discorrermos com acerto, e tomarmos em consequência uma resolução segura. Os illustres Preopinantes que falarão nesta materia não advertírão o desfalque que o estado vai ter: adoptando-se o 1.º artigo, a decima ecclesiastica talvez não possa recaír sobre os parocos assim como sobre os beneficiados. Não he isto porém o que me dá cuidado, o que eu quereria era uma inteira reforma na jerarquia ecclesiastica, que percebem os dízimos: direi o que o arcebispo de Braga dizia dos cardeaes da corte de Roma: não sei para que se precisa tanto fausto; para que servem tantos conegos, tantos abbades, tantos priores, etc. etc., julgo que as suas grossas rendas não servem se não para mostrar ao mundo o escandalo com que alguns vivem; e tal he desgraçadamente o estado ordinário do nosso clero! De que servem tantos priores, tantos encommendados: eu quereria que não houvesse outras dignidades eclesiasticas se não bispos, e parocos, e algumas autoridades intermédias indispensaveis para o bom regime da igreja, e conservação da religião santa que professamos, e temos jurado sustentar.
Quanto nos parocos, devem ter uma decente congrua; porque todo o empregado deve ter uma necessaria sustentação: mas deve ser de modo tal que nem seja muito grande, para não se promover a ociosidade, nem pequena, para o não trazer em miséria. Eu conheço muitos parocos que se lhes derem 100$ réis de congrua abençoarão eternamente o actual systema

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do governo; pois que alguns delles não tem mais de 10 a 12$ réis de congrua, e dando-lhe 100$ réis entrarão a dizer por toda a parte que esta he a melhor forma do governo. Para realizar o que propõe o projecto será necessario saber em quanto importa a massa total dos dízimos, para depois se poder fazer a divisão deforma que uns não tenhão tudo, e outros nada. Por aqui se conhece que eu sou de voto que se augmentem as congruas, mas quero notar que he preciso desopprimir o povo em certos dizimos que pagão: com que direito, por exemplo se paga o dízimo das sementes dos cereaes, e outros desta natureza que ha em diversas povoações das províncias, em que alguns até pagão dizimo da cal que fabricão. Não havendo por agora dados sufficientes devemos limitar-nos a que hajão de arbitrar congruas sufficientes aos parocos, sem que se fixe base alguma a este respeito. Se houver alguns que não tenhão uma subsistência certa, que requeirão aos bispos, para prover nisso: nós devemos olhar não só para as freguezias ricas, mas tambem para as pobres que ha; de algumas sei eu que não tem mais de 10 ou 12 moradoras, mas estão de tal sorte collocados, que he impossível unilos a outra, pela sua grande distancia: e por isso se formos a determinar congruas de 200$ réis não chegarão todos os dizimas: ha outro inconveniente muito grande que he o determinar-se de alguma forma que seja o pagas em dinheiro. Ainda ha uma grande questão a decidir, isto he, se convém mais que se pague aos parocos em dinheiro ou em géneros? He preciso decidir isto primeiro. O meu parecer he que se pague parte em especie, e parte em dinheiro. No Douro, por exemplo, onde ha vinho, ha mais facilidade de lhe pagar em dinheiro porque he um districto de mais commercio do que outras partes. Dizer-se também que terão 200, 300, 400, ou 600 mil réis fica uma cousa muito vaga. Na falta pois de dados estatísticos sobre este objecto que vai entender com a disciplina da Igreja, e com a utilidade dos povos, sendo eu por conseguinte de opinião que os parocos devem ter uma congrua sustentação, e que os bispos devem prover aos parocos que lhe representarem não terem com que passarem, sou com tudo do parecer que este negocio fique adiado até haver estes dados para então podermos dar uma providencia mais geral, e com mais madureza.
O Sr. Corrêa de Seabra: - Os illustres Preopinantes que tem falado, á excepção do Sr. Miranda, desgraçadamente nem lêrão o projecto: todos tem falado em sentido muito differente daquelle em que he concebido. Não se trata de reduzir os dízimos a uma massa commum, estabelecer congruas para todos os parocos: o projecto unicamente contem as bases segundo as quaes os ordinários devem regular na congruas aos párocos que as não tem, ou as tem insignificantes, saindo as congruas dos dizimos, e rendas de cada igreja. Ainda que já declarei os meus sentimentos por occasião da indicação do Sr. Fernandes Thomaz, para que se assignassem congruas aos bispos sobre esse projecto de reduzir os dizimos a uma massa, e dahi tirar as congruas para todos os ministros do altar, todavia por esta occasião digo duas palavras. Para se verificar este imaginário projecto era necessario reduzir, e pôr em massa commum ou as rendas e dizimos que percebe a igreja, que talvez não seja a terça parte dos dízimos, o que não digo affontamente porque ainda não pude calcular exactamente os dizimos que estão extraviados do seu destino, ou hão de entrar na massa todos os dízimos. Se entrão só os dizimos que a igreja percebe, desorganizado o actual systema de economia da igreja, ha de precisamente acontecer o mesmo que aconteceu na França; extinctos os dízimos que percebia a igreja, que se me não engano, erão calcudados em 151 milhões as congruas importavão em 153 milhões, havendo um accrescimo de despeza de 2 milhões contra a fazenda: se entrão todos, ou se hão de dividir pelos ministros do altar, e mais estabelecimentos que são muitos entre nós dependentes dos dízimos, commendas, universidade, hospitaes, etc., e a decisão seria verdadeiramente um labyrintho de Creta, ou hão de reverter os dízimos aos seus destinos, mas então de um golpe cairão todos esses estabelecimentos, e muita cousa ficaria sepultada debaixo dessas ruinas, e não sei calcular os effeitos: o que sei he, que uma e outra hypothese reduzidos os dízimos a uma massa, ou seja por provincias, ou por bispados, por exemplo, o resultado ha de ser o mesmo que se está vendo na Hespanha que adoptou o principio dos illustres Preopinantes, isto he, os dízimos reduzem-se a nada porque o povo passa a considerar os dízimos como um tributo civil, não os pagando precisa e exclusivamente para aquella igreja a que são devidos, e a que o povo julga está obrigado. Relaxado o vinculo que obriga a pagar os dízimos que move o povo muito, e muito espontaneamente á satisfação que he dizimo a Deus lá vae os dízimos. Todos sabem que assim está acontecendo era Hespanha.
Foi esta digressão por occasião do que tem dito os illustres Preopinantes. Voltando ao projecto que he o resultado das informações que os ordinários derão aos quesitos, ou a discussão ha de versar sobre a matéria do mesmo projecto, ou então convido os illustres membros da Commissão meus collegas, para que o retiremos consentindo nisso o Congresso. No supposto que a discussão ha de continuar no verdadeiro ponto de vista passo ao primeiro artigo do projecto. Como não concordo com os illustres membros da Commissão no minimo das congruas, e no voto separado com o Exmo. Sr. Bispo de Beja, sou de opinião que o mínimo seja de 130, ou de 150$ réis: cumpre dar a razão disto. O Congresso não póde duvidar de que eu tivesse pelo menos iguaes desejos aos dos illustres membros da Commissão de que se estabelecessem congruas que segurassem a honesta sustentação dos parocos que ou não percebem dizimos, ou uma insignificante porção, tendo eu declarado neste Congresso por muitas vezes que o clero deve ser independente; que a pobreza do clero de algum modo concorre para o aviltamento da religião, que para o clero ter um comportamento digno de consideração he necessário ter essa mesma consideração; que he necessario que o povo contemple o clero como seu bem-feitor, sendo certo que a autoridade e influencia paroquial he dependente da caridade com os paroquianos

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pobres. Tendo declarado estes motivos se não concordei no mínimo de 200$ réis he claro que só podia ser pelo não julgar possível: e com effeito não o he. Eu sei por conhecimento próprio, pelas respostas dos ordinarios nos quesitos que se lhes dirigírão, e por informações particulares, que tirei ate de alguns illustres Deputados que forão provedores de muitas igrejas, cujos rendimentos não chegão a 200$ réis, e que pelas circunstancias particulares não podem supprimir-se para se unirem a outros; e adoptado este mínimo de necessidade se hão de supprimir, e não estando em circunstancias de se unirem a outras, então que se ha de fazer? O mínimo de 200$ réis vai dar occasião á suppressão de muitas paroquias o que devemos evitar, porque as uniões offerecem a cada passo grandes difficuldades, de maus caminhos, grandes rios, de montes, e variedade de dizimadores etc., e principalmente he necessário altendermos a que o povo resiste decididamente á união. Os ordinários o dizem nas suas respostas, e não houve um só povo que desconfiando, ou receando a suppressão da paroquia, não requeres-se. Escuso dar as razoes da resistência do povo, porque são bem sabidas; a afeição á determinada igreja, nascida da frequência daquelle lugar, da pratica ali dos actos da religião, da associação de certas idéas religiosas, etc. entrando tambem motivos de commodidade, e não sei se lambem de vaidade em quererem ter uma igreja propria, porque lá no seu modo de pensar julgão a igreja a que se unem só própria daquelles a quem pertencia. Estes são os motivos que me determinarão, e ao meu collega á declaração do voto separado n.º 1.º Como temos também declaração ao artigo 6.º, ainda que estão em discussão os primeiros 3 artigos, seria bom que a discussão se restringisse aos primeiros 5, e que o 6.° ficasse reservado para se discutir separadamente.
O Sr. Presidente: - Não tenho duvida nisso.
O Sr. Abbade de Medrões: - Quando ha mais do um anno appareceu este projecto, eu logo aqui expuz as difficuldades que haveria para se pôr em pratica, porque elle está em opposição com o que este Augusto Congresso tem já resolvido sobre dizimos. Tem-se já resolvido que as commendas existão durante a vida dos commendadores actuaes, paga a collecta, e que por morte delles, vão para o thesouro; ou, para melhor dizer, para a divida publica. Isto mesmo se tem decretado para os benefícios; a collecta e mais encargos sempre se hão de pagar, e donde pretendem então estes senhores tirar as congruas para os parocos? Eu não falo em 200 ou 400$$ rs. o que pergunto he donde elles hão de vir? As abbadias presentemente estão com estas cousas em menos de um terço. Eu dou já um conto de réis, 300$ réis de pensão, e 200$ réis ou ainda mais de collecta; pago tudo isto, quanto fica? A minha opinião a este respeito he que este projecto fique adiado, e que se mande fazer uma espécie de concilio diocesano, para que ali se determine quanto se deve dar aos párocos pobres de congrua, não em dinheiro, mas em frutos, como pão, vinho, e azeite; os parocos com isto ficarão muito contentes, porque ha freguezias tão pobres, que os seus parocos vivem em miséria. Fação os bispos uma lista dos parocos pobres que ha no seu bispado; formem um plano sobre isto, e depois remettão-no ao Congresso, para ser approvado, ou fazer-lhe as modificações que entender são justas. Todo o mundo sabe que os dizimos são de direito ecclesiastico; e todos tem concordado em que os parocos tem direito á sua sustentação: isto he da escritura sagrada, e não só do velho, mas ate do novo testamento, porque, dignos est operarius mercede sua. Que fizerão os réis, e os concilios? Demarcárão para este fim o que lhes pareceu sufficiente; e o que era de direito temporal, passou assim de algum modo a ser de direito divino. Quer agora o Congresso tornalos ao poder temperal, mas ponha outra cousa, que he em que consiste o poder civil; tiremos os dízimos aos padres, e demos-lhe uma decente sustentação; mas de contrario devem possuilos em quanto lhes não derem outra cousa; não porque os dizimos sejão em sua origem de direito divino, mas porque d'outro modo vem a ser de direito injusto. Quanto nós aqui decretarmos em contrario, he ir pôr os póvos em má fé a este respeito. Diz-se que os dízimos são muita cousa! pois bem, façamos uma operação; tirem-se os dízimos, dê-se uma decente sustentação ao clero, e vá o resto para o thesouro. Nisto convenho eu; não querem que haja dizimos, dê-se aos parocos com que se sustentem: isto he claro. Concluo que o modo de obrar a este respeito, he que se commetta isto aos bispos paia fazerem uma espécie de concilio, examinarem as precizões paroquiaes, e formar um plano sobre isto, para ser remettido ao Congresso, e assim se deliberará com conhecimento de causa.
O Sr. Isidoro José dos Santos: - Sr. Presidente, muitos dos illustres Preopinantes tem feito observações contra este projecto, falando da matéria dos primeiros 7 artigos, que estão cm discussão. Eu não posso lembrar-me de todas as objecções que se tem offerecido: irei pois falando de cada um dos artigos, e póde ser que assim responda a algum dos argumentos, com que tem sido impugnados.
Mas primeiro que tudo, devo lembrar ao augusto Congresso, que elle mesmo resolveu se extinguisse o pé de altar, logo que se estabelecessem côngruas sufficientes aos parochos: que para este fim se formou uma commissão especial encarregada de ordenar os quesitos, sobre os quaes os bispos do reino de Portugal, e Algarve, e Ilhas adjacentes havião de dar as suas informações: e que estes quesitos, tendo sido approvados em 12 de Maio de 1821, forão os que dirigirão a Commissão nos seus trabalhos. Ella seria bera imprudente se os tivesse perdido de vista; seria uma temeridade da sua parte não se conformar com o que já estava decidido em alguns delles, e peço licença para os ler. (Leu).
Para satisfazer as vistas do augusto Congresso, a Commissão examinou com um trabalho gravíssimo as informações, mappas, relações, e discursos quedos bispos forão enviando. Já o meu illustre collega o Sr. Sousa Machado, mostrou a multidão de dizimadores que concorrem em muitos bispados com o exemplo do arcebispado de Braga: eu mostrarei agora o modo de divisões, e subdivisões, e o concurso de dizima-

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dores, que se encontra na maior parte das freguezias, pelo que acontece em um, e seja o de Alter do chão, bispado de Elvas (leu). Daqui se vê que a Commissão devia encontrar as maiores difficuldades nesta empreza; ella via muito bem, que para se darem congruas aos parocos Ho maneira, que ficassem independentes do pé de altar, o qual tem dado causa ou pretexto a tantas inquietações, e escandalos, era necessário diminuir muito as rendas de cabidos, conventos, commendas, e outros dizimadores, ou pencionarios chamando-os para esta applicação. Instada porém de muitos modos, e obrigada pelos incessantes requerimentos dos povos, e dos parocos, offereceu o projecto de que se trata, tendo examinado escrupulosamente as informações de cada um dos bispados, e o que era particular a cada uma das freguezias, para formar juizo dos meios, que poderião facilitar ou difficultar o bom serviço das paroquias.
Pelo 1.º, e 2.º artigo do projecto he claro que não se trata de dar congruas a todos os párocos, mas só sim áquelles que as não tem sufficientes para que fiquem independentes do pé de altar, e por isso são lembrados aquelles párocos, que percebem dízimos, porem em pequena porção, e os que recebem os dízimos somente de alguns géneros, e insuficientes para nina congrua sustentação. O máximo, que se assigna, não foi arbítrio da Commissão, já estava arbitrado no decreto de 28 de Junho. O mínimo de 200$ rs. pareceu a Commissão indispensável para se sustentar um pároco, fossem quaes fossem as circunstancias da terra, em que assistisse; muito mais quando este soberano Congresso, tem manifestado por muitas vezes o seu desejo, de que os parocos tenhão um tratamento decente, pois que a lei da decência he sempre attendida, e escutada pelos povos, e quando se vai contra ella atrahe-se o despreso. Aos bispos fica pertencendo arbitrar as côngruas, apropriando as quantias entre o máximo, e o mínimo ás diversas circunstancias, localidades, e trabalho maior ou menor da paroquia. Parece que tudo isto he justo, e muito claramente determinado no 1.º, e 3.º artigo.
O 3.º artigo não pode admittir duvida bem fundada. Os dizimadores de que trata recebem os dízimos radicalmente obrigados á sustentação dos parocos, e ás fabricas das igrejas; porque para este fim são pagos pelos fieis: nunca forão isentos deste encargo; e por consequência passárão com elle para quaesquer dizimadores, ou pensionarios que os possuem.
O 4.º salva as chamadas terças pontificaes dos bispos naquellas igrejas onde as tiverem; porque o bispo he sem questão alguma o primeiro no direito de sustentar-se pleos bens da igreja. A divisão que destes se fez em quatro partes, e que he bem sabida, não foi adoptada na Hespanha, mas sim a divisão em três partes, uma para o bispo, outra para o clero, e outra para a fabrica. Estabelecidos os dízimos devidírão-se do mesmo modo, mas com o mudar do tempo, vierão a unir-se as duas partes do clero e fabrica. Estas duas partes ou estejão em priores, ou abbades, ou [...] a corporações, mosteiros, cabidos, seminários, ou em com mondas são sempre obrigadas á sustentação do paroco, e ás fabricas das igrejas; e o Sr. Rei D. Sebastião declarou expressamente por um alvará de 18 de Julho de 1560, que se as commendas não rendessem mais que para a congrua dos vigarios e necessidades das igrejas, tudo se lhes applica se: por tanto nenhuma injustiça se fará aos commendadores e quaesquer outros dizimadores. Ora a terça dos bispos nunca foi sujeita a estas despezas; quando porém elles recebem mais que a terça, pois que nas creações de novos bispados, se unirão igrejas á meza episcopal, ou se applicárão aos bispos maiores porções, que a terça parte dos dizimos, então o excedente da terça he sem duvida sujeito aos ditos encargos. Assim pareceu á Commissão: e persuado-me de que teve muita razão, e guardou a justiça.
Se os dízimos de uma igreja matriz, com os das suas filiaes formão um todo destinado á sustentação dos ministros necessários a cada uma dellas para o exercício da religião, e se o rendimento he sufficiente para todas; pareceu á Commissão que todas devem ser completamente providas do necessario, sem que importe, que umas concorrão com maior, outras com menor porção. Isto he certissimamente conforme à vontade dos fieis; e mio o pude sor dar-se aos dizimog qualquer outra applicação de diversa natureza, em quanto as igrejas que concorrem para o rendimento total da igreja matriz necessitarem delles.
Como não me recordo de ouvir reflexões que impugnassem o 6.º e 7.º artigo, que me parecem muito claros, e fundados cm justiça manifesta, nada direi agora sobre elles.
O Sr. Castello Branco Manoel: - Esta materia que se está tratando, merece uma attenção muito grande; e por isso o meu voto he que cila deve ficar adiada. Tem-se dito aqui, ou está em duvida, se com effeito os dízimos chegão para pagar todas as congruas pela forma que diz o projecto: mas eu quero realmente suppôr que elles chegão para pagar tudo isto. A maior parte dos rendimentos da nação são presentemente provenientes de dízimos, como commendas, collectas de beneficio, etc. E como havemos nós supprir as despezas do thesouro, se todos os dízimos se applicarem para as congruas? Seria preciso entrar em mais miudezas: os povos he verdade que não querem continuar apagar os direitos de estola, mas comtudo não estamos ainda em circunstancias de os abolir, em quanto o thesouro está necessitado de parte desses dízimos. Voto por ora que fique adiado.
O Sr. Ferreira de Sousa: - Na parte deste projecto que está em discussão teve a Commissão duas cousas em vista: primeira, prover á decente sustentação de muitos parocos que tem congruas muito insignificantes; segunda, alliviar os freguezes do que contribuem para os parocos a titulo de benesses, pé de altar, oblatas, etc. Uma e outra cousa são dignas de remédio, e providencia; o que não necessita de demonstração. E a segunda não he menos necessária que a primeira; porque além de serem os chamados usos das igrejas assás onerosos em muitas freguezias, tem isso perturbado muito a paz entre parocos, e freguezes. Já nos princípios do reinado d'EIRei D. João V. tratou o Governo de prover nisto, e chegou a decidir-se por consulta do desembargo do paço, que to-

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das essas oblatas erão de sua natureza voluntarias, e não produzião obrigação nos povos: porém a instancias do arcebispo de Braga se revogou aquella decisão, e se mandárão conservar os usos antigos bem regulados. Depois, no reinado da rainha D. Maria I., se tornárão a mover questões a este respeito, particularmente naquelle arcebispo, que se formou uma guerra vivia entre parocos, e freguezes. A isto se accedeu pelo decreto de 1790, em que se mandárão suster estas questões, até se dar uma providencia geral a bem dos povos; mas como ella seria mui complicada, e de necessidade ia desfalcar as necessidades as commendas, e as outras massas de dizimos, nunca se chegou a dar, e he bem que agora se dê, extinguindo-se nos povos a obrigação de pagar taes oblatas, se os parocos por sua dotação as poderem dispensar. E voltando á congrua destes, eu não concordo em que o minimum das congruas seja de 200$ réis como propões a Commissão, nem ainda de 150$ réis como querem os illustres autores do voto separado: não porque eu não deseje os parocos bem dotados, e não conheça as vantagens que isso tem, mas para que possa Ter lugar o augmento de congrua sem prejuizo dos povos, e sem destruir a applicação que em grande parte tem os dizimos para bispos, cabidos, commendas, e muitos outros estabelecimentos. Por tanto no presente abatimento das rendas, discorrendo pelas freguezias, que conheço, algumas das quaes tem igreja matriz, e 5, 6, 8, 9 filiaes; bastaria que a todos os parocos destas freguezias se consignassem a 100$ réis de congrua, e alguma cousa para a fabrica das igrejas, vistos os dizimos não chegarem em muitas, e n'outras, não haver sobejo; ficando por isso frustada a applicação já feita do excedente dos dizimos, o que na verdade faria grande trastornos. E até que se seguiria para os povos quando os dizimos não chegassem para as novas congruas e fabricas das igrejas? O que naturalmente se seguia supprimirem-se muitas igrejas, e deixar-se de erigir-se outras onde ainda são necessarias. Conheço que há sitios em Portugal, que pela bondade de terreno, e bom estado de cultura como v. g. no Douro, os dizimos chegarão para boas congruas e fabricas, e ainda para as outras applicações que tem; mas tambem conheço infinitas freguezias em terrenos magros, em serras etc., em que a aspereza da terra faz mais necesaria a conservação, e creação da muitas igrejas filiaes, e cujos dizimos avultão mui pouco. Ora nessas terras há menos luxo, e os parocos podem viver com menos; e de facto por lá há muitos e muitos parocos que certamente não recebem 100$ réis da igreja. Em attenção a isto, e para que sem supprimir muitas igrejas com grave incommodo, e desgosto dos povos, possa haver os parocos necessarios, o meu voto he que o minimum seja de 100$ réis ou 120, para que entre este termo, e o de 600$ réis que propõe a Commissão, possão os ordinarios regular as congruas com attenção á importancia dos dizimos, á grandeza da freguezia, e á sua situação, e até digo que, se para essas congruas e fabricas não chegarem os dizimos, em tal ou tal freguezia se conservem algumas oblatas, fazendo-se para isso os precisos regulamentos. Assim como quero que desça o minimum quanto ás congruas, o mesmo, e pelos mesmos motivos, digos quanto ás fabricas, a fim de que o projecto seja praticavel, e não vá causar ruina em lugar de beneficio. Em lugar competente falarei de outros pontos do projecto.
O Sr. Caldeira: - O desejo da Commissão e do Congresso he dar uma reforma ao clero que seja util á Nação e á Igreja. He preciso que nós não prescindamos de uma cousa, e vem a ser, que a felicidade da Nação depende da agricultura: falou-se aqui em igrejas filiaes; estas tem o mesmo direito a serem conservadas que as outras, uma vez que assim seja necessario. Um lavrador foi para uma terra fazer a sua ceara, forão outros habitantes para lá, e como precisavão um padre que lhe administrasse os sacramentos, tem um: ora, pergunto eu, como poderão os dizimadores subtrahir-se ao dever que tem de dar uma congrua sustentação a estes parocos? Por tanto que difficuldade há em que isto assim se faça? Eu estou persuadido que em algumas partes são precisas e precisas e uteis as desmembrações das freguezias. Covilhã, por exemplo, tem 13 freguezias: ora de que serve tanta freguezia n'uma terra só? Tambem se disse, que nós agora vamos fazer um grande mal a respeito da parte das commendas que entrão para a amortização da divida publica: mas he preciso que quem assim pensa advirta, que a massa das commendas não fica desobrigada da originaria obrigaçãode pagar os seus encargos, o mesmo que succeda ao commendador, quando ella seja possuida por outrem, ou pelo Estado, o mesmo há de acontecer: nem pensemos que a fazenda nacional padeça. Para continuar a existir a agricultura, esse manancial de riquezas de uma nação, não podemos dispensar-nos de fazer uma despeza grande; faça-se um plano para estas freguezias, e demos aos parocos que lá forem habitar uma congrua sufficiente, tirada da massa geral dos dizimos. Resumindo as minhas idéas, digo que isto não deve ficar adiado como se pertende, porque até seria irrisorio depois de uma discussão viva ficar um objecto tão simples para outro dia. Devemos fazer aos sacerdotes e ao povo todo o bem que podermos, se lhe não podemos já fazer muito façamos-lhe algum. Se entrassemos agoran'um systema gerla de administração e applicação de dizimos, eu seria de opinião que entrasse nelle toda a ierarquia ecclesiastica, desde o bispo até ao mais pequeno cura. Por agora deve tratar-se de estabelecer alguma congrua aos parocos, e proceder-se á suppressão de algumas paroquias naquellas povoações em que se julguem desnecessarias. De que serve um paroco n'uma povoação que tem 2, 3, ou 4 fogos? Há algumas que distão umas das outras trinta passos. Devem tambem erigir-se algumas nos sitios em que forem indispensaveis: e accrescentarem-se as congruas áquelles parocos que as não tiverem sufficientes.
O Sr. Borges Leal: - A pouquidade do que se tem arbitrado para sustentação dos parocos, tem sido causa ou de viverem reduzidos a grande indigencia e descontentes, ou de que não podendo subsistir decentemente com tão limitadaas congruas, cobrem de seus freguezes emolumentos excessivos pela administração dos sacramentos, como tem acontecido e continua no

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Pianhy, onde todos os dízimos são arremattados, e pelo erário se lhes pagão mui pequenas congruas. No Pianhy os parocos cobrão 4$560 réis por casamento, e banhos: 4$000 réis por licença de casar: 3$200 réis por justificação: 2$320 réis por baptizado: 2$ réis por desobriga de casal: outro tanto por encommendação de defuntos etc. ele. Estes excessivos emolumentos teta motivado ódios, intrigas, e malquerenças entre alguns dos parocos e seus freguezes, e geralmente os povos do Pianhy não estão contentes com pagalos, vendo, que por esta maneira, uma freguezia se torna muito rendosa para um só paroco (umas rendem dois e tres contos de réis, e outras muito mais), e que os sacramentos se lhe não administrão com prontidão. Justando em discussão o projecto de uma matéria tão importante e urgente, ouço falar em ficar adiada, o que não me parece justo. Por tanto o meu voto he, que aos parocos se estabeleção o mais breve possivel congruas, com que possuo subsistir decentemente.
O Sr. Rebello: - (Não o pôde acompanhar o tacuygrafo.)
O Sr. Fernandes Thomaz: - Tenho ouvido falar nesta matéria, e confesso que não sei o motivo porque alguns Senhores tem considerado de uma transcendência tão grande o tomar-se uma medida que a justiça pede. Outros também assentão que isto deve ficar adiado por não haver agora bastantes informações. Confesso ingenuamente que não acho taes difficuldades, quanto aos primeiros artigos que se tem posto á discussão; e he sobre elles sómente que eu falo: verei se convém ou não tomar uma medida a este respeito, e se ella se póde ou não tomar. Que convém tomar a medida, creio que ninguém o duvida: todos nós estamos convencidos e persuadidos que uma grande parte dos parocos do Reino, são muito pobres; por isso não tem o necessário para a sua subsistencia, nem para soccorrer aos pobres da sua freguezia (um paroco não favorece todos os pobres, mas a alguns); aos parocos que nada tem, pede a justiça que alguma cousa se lhos dê. Demorar este negocio seria a maior barbaridade! Pois ha empregados públicos cujo ministério he tão importante, conhece-se que não tem meios de subsistência, e diz-se fique adiado! Não me parece que isto seja conforme á justiça. Pede a justiça que se tomem medidas a este respeito: se se não póde tomar já uma medida geral, tornem-se provisórias; soccorrào-se estes desgraçados; dê-se-lhes de comer, porque não he bem que uns morrão de fome e de miséria, e outros vivão na abundancia. Eu entendo pouco dessas cousas ecclesiasticas, mas entendo isto, que vem a ser, uns comem os dizimos daquellas terras de que elles são parocos, e outros vivem pobres porque os não comem. Algum parocos suo ricos porque comem os dizimos, e outros são pobres, porque os come o commendador, o infantado, a universidade. Parece-me que vista a operação he a mais simples, e a mais fácil do mundo. O que tem muito dê alguma cousa ao que não tem nada. Ao pé da minha terra ha um cura que tem um moio de trigo, e os cónegos tem quatro contos de réis: digo eu, quanto falta para a congrua do cura, tanto lhe devem dar os cónegos. Para mim he isto um principio eterno. O clero não tem que comer porque não cobra os dízimos, logo quem os cobra que lhe pague. Póde haver algumas partes onde os dízimos não cheguem para os parocos: mas ha outra cousa muito particular: dentro desse bispado, ou comarca, ha de haver commendadores e cónegos que recebão dízimos, congregações que também os recebão, e neste caso rateie-se por todos cita o que faltar para completar a congrua aos parocos. Nem, fazendo-se isto, se julgue que o Congresso faz cousa que se não fizesse antes de 24 de Agosto; e nesse tempo nem mesmo ElRei se embaraçava com isto. Um paroco que tinha uma congrua pequena, paga por uma commenda, requeria á meza da consciência que tinha uma congrua ténue, etc., a meza, depois de ouvido o commendador, mandava-a augmentar; eis-aqui o que se praticava sem mais ceremonia. Pois a meza da consciência podia fazer isto, e não se poderá fazer agora? Ordinariamente fazia-o porque o commendador era um homem estranho que andava lá pela campanha, mas a respeito dos bispos não era tão fácil; porem o Congresso que póde agora com elles todos, faça-o. Uma ordem aos bispos para que mandem dizer quem são os parocos pobres que ha no seu bispado, e ao mesmo tempo quem são os dizimeiros: vem isto e diz, em tal parte ha um paroco que tem tanto, e não lhe chega: o Congresso então determina o que lhe parecer justo. Isto não vem a influir nada na fazenda publica, como alguem, receia. A necessidade he grande, e he preciso dar de comer a quem tem fome.
Não sei tambem se será justo extinguir já os benesses. Os Francezes depois de terem discorrido a este respeito de outro modo, vierão depois a tornar-se aos povos. Que vale extinguirmos isto, se depois temos de onerar os povos com outros tributos? Assim paga-se com mais suavidade, tirando disso o abuso. Não custava muito pagar uma galinha, um porco quando nasce um filho, etc., o que escandalizava os povos erão os suffragios dos defuntos, o mais he nada: ao mesmo tempo revertem os dízimos para o thesouro, quando aquelles benesses cheguem para a sustentação dos parocos. Saibamos quantos padres ha no Reino, quanto deve ter cada um, e o dizimador quem he: o Congresso então tome uma medida a este respeito. Lá isso de erigir paroquias, e supprimir paroquias, não sei como os povos o olharão; mas em fim se o Congresso tomar alguma medida sobre isto, parece-me que o deve fazer com muita cautela: mas agora he preciso cuidar nisto, os parocos pobres tem fome, e o meio de lhe dar de comer he este.
O Sr. Pesanha: - Eu apoio o que diz o illustre Preopinante, devemos tomar uma medida provisória, para remediar os parocos que vivem indigentes. Pode-se estabelecer um máximo, e um mínimo; o que estabelece o projecto he excessivo, parece-me que estabelecendo o máximo em 200$ réis, e o mínimo em 100$ réis temos acertado. Igualmente me parece não se devem tirar os benesses, porque como disse o illustre Preopinante, se os dízimos não chegassem para a sustentação dos parocos, teria o thesouro de lhe pôr o resto, além de que deve advertir-se que os povos

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estao acostumados a pagar isto, e de certo he o que pagão de melhor vontade. Desta medida provisória parece-me que tiraremos um resultado excellente: estabeleção se congruas iguaes aos parocos, que não comem dizimos, e saindo estas congruas dos dizimos, dão para tudo isso, ao menos nas províncias. Eu conheço bem a minha, e podia apontar algumas terras della, aonde os dízimos não só chegão para isto, mas até para tres vezes mais: em Lisboa não poderão sair as congruas dos dízimos, mas isso providenciar-se-ha, por uma medida particular; que as congruas saião dos dízimos: he o que pede a justiça, e he do evangelho, os que trabalhão devem comer, os commendadores, abades, ou corporações devem prestar a principal subsistência aos párocos. Parece-me quede-la maneira se obra com justiça, e os parocos ficarão muito satisfeitos. Este he o meu voto.
Sendo chegada a hora da prol agação, e não se julgando ainda suficientemente discutidos os sele primeiros artigos, decidiu-se que ficassem adiados
O Sr. Secretario Felgueiras deu conta da redacção do decreto sobre o empréstimo, a qual se approvou (vai no fim da sessão).
Fez-se a leitura da seguinte

INDICAÇÃO.

Os abaixo assinados adherem á indicação ou declaração de seu illustre collega e amigo, o Sr. Fernandes Pinheiro, não só pelas razoes por elle expendidas, como também pela inferioridade irrogada ao reino do Brazil a respeito do de Portugal, deduzida dos artigos 64 e 106 n.º 2.º da Constituição, cujo reconhecimento não he consentaneo com a dignidade e caracter dos abaixo assignados, nem como representantes do Brazil, nem mesmo como indivíduos pertencentes ao dito reino. Lisboa 16 de Setembro de 1822. - José Ricardo da Costa Aguiar d'Andrada: António Carlos Ribeiro d'Andrada Machado e Silva; António Manoel da Silva Bueno.
Mandou-se remetter á Commissão de Constituição.
O Sr. Serpa Machado leu o seguinte:
A Commissão de justiça civil apresenta o artigo 4.º do projecto da lei suplementar sobre a liberdade da imprensa novamente redigido, como se determinou em sessão de 6 de Setembro, e o artigo 4.° formado em virtude da indicação do Sr. Luiz Monteiro.
Art. 4.º O impressor que faltar ao determinado ao artigo antecedente (que he remetter o impresso ao promotor) será condemnado, segundo o gráo de malícia, e a importância do impresso, apagar o valor de mil exemplares, sendo comprehendido no primeiro gráo, em dois mil no 2.°, e em três mil no 3.º, applicada esta pena a beneficio do thesouro nacional.
Art. 5.º Nem o promotor, nem qualquer outro offendido poderão accusar além de um anno contado do dia em que se commetteu o delicto. Sala das Cortes 16 de Setembro de 1822. - Manuel de Serpa Machado; Carlos Honorio de Gouvêa Durão; Pedro José Lopes de Almeida.
Ficou admittido á discussão.
O Sr. Guerreiro deu conta da nova redacção que fez do n.º 1.º do art. 2.º do seu projecto sobre os casos em que póde ser devassada a casa do cidadão, e a substituição do artigo 9.° Mandárão-se imprimir para entrarem em discussão com urgência.
Fez-se a leitura do seguinte

PARECER.

A Commissão de agricultura examinou o officio do Secretario de Estado dos negócios do Reino, em data de 13 de Setembro, participando que no terreiro publico havia pouco mais de onze mil moios detrito, e que as províncias pouco podião dar, á excepção do Alemtéjo; mas que constava que os especuladores tinhão comprado porções de trigo, que muito de propósito guardavão, esperando maior preço, confiados no calculo regulador, que apresenta terreiro: que este calculo he errado, por quanto he feito sobre trigo arruinado, beneficiado, e são: que se conta como elemento para elle o preço de 480 réis por alqueire de uns 200 moios de trigo inteiramente amimado: que o preço regulador deve sómente ser tomado dos preços dos trigos sãos, e em bom estado: e que fazendo-se a conta desta sorte (como na verdade se deve fazer) os trigos sãos tem sómente três preços, 780, 800, e 820 réis; logo o preço médio he ode 800 rs., que he o marcado na lei para a admissão do trigo estrangeiro, Julga por conseguinte o Governo de necessidade abrir a porto por 60 dias ao trigo estrangeiro, a fim de abastecer a capital até a seguinte colheita, conciliando assim a necessidade do abastecimento da capital com o favor da cultura do paiz, e occorrendo-se ao abuso do monopólio.
A Commissão reconhece que a pezar de se ter feito no presente anno uma sementeira de trigos muito superior á dos annos antecedentes, ha na verdade falta deste genero pata abastecimento da capital, a qual he com tudo augmentada pelos lavradores, ou especuladores, que o pretendem guardar, esperando melhor preço; mas ella tambem sabe que he preciso achar um methodo de segurar a subsistência da capital sem se arruinarem os lavradores das províncias; porque um reino não póde ser agricultor sem que o preço dos fructos pague as despezas do lavrador, e lhe dê a sua subsistência. - Se nos annos ferteis o pequeno preço não convida os lavradores a grandes sementeiras, e a novas rotações, e nos estéreis abrirmos indefinidamente o porto de Lisboa ao trigo estrangeiro, elles nem de suas despezas se cobrirão, e então he preciso renunciar á esperança de Portugal vir a ser um paiz agrícola em cereaes, não por culpa das terras, mas por culpa nossa. A resolução pois do problema consiste em sustentar o preço ao lavrador, facilitar-lhe a venda dos seus géneros, e segurar ao mesmo tempo a subsistência da capital.
Abrir indefinidamente o porto sem condição alguma, ainda que seja por pouco tempo, he expor-nos ao risco quasi certo de se innundar o mercado de trigo estrangeiro, o baratar excessivamente o nacional, perderem os trabalhos dos lavradores do anno passa-

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do, e o mais he as esperanças para o futuro. A Commissão, examinando profundamente este objecto, e altamente convencida do que se trata de não largar da mão a pedra fundamental, em que assenta o edificio da agricultura dos cereaes em Portugal, he do parecer que a admissão de um deposito do trigo em Lisboa, com as condições abaixo apontadas, he o meio mais decisivo de; sustentar o preço aos lavradores, e assegurar a subsistência da capital.
O deposito comprehende todas as vantagens que podemos desejar, e offerece um único inconveniente, que he a possibilidade do contrabando; mas que he um mal tão pequeno, comparado com a necessidade de ter segura a subsistência da capital? Além disso he de esperar que o Governo possa, por convenientes cautellas, embaraçar o contrabando, e punir com o rigor da lei todos os que achar envolvidos neste crime.

Condições para o deposito.

Art. 1.º Que por espaço de tres mezes seja livre a qualquer negociante importar trigo estrangeiro para Lisboa, dando entrada no terreiro publico, ficando debaixo da inspecção, e fiscalização de quem o administrar, de modo que em qualquer tempo elle negociante, ou quem suas vezes fizer, seja obrigado a dar conta do trigo com que entrou.
2.º Logo que o preço médio do trigo não chegar a 800 rs., o trigo estrangeiro será admittido á venda debaixo do seguinte regulamento.
I. Estando o preço médio do trigo nacional entre 800, e 900 réis o estrangeiro, será admittido á venda em qualidade igual, isto he, metade d'um, metade d'outro.
II. Estando o preço medio entre 900 réis, e 960, vender-se-hão duas terças partes de trigo estrangeiro.
III. Excedendo o preço médio 960 réis, toda a porção que se vender poderá ser de trigo estrangeiro.
3.º O alqueire de trigo estrangeiro, sem distinção de rijo ou molle, pagará um tostão de direitos de entrada, além dos 20 réis da vendagem.
4.º Ficará livre aos donos reexportarem os seus trigos, sem nada pagarem dos direitos estabelecidos no artigo antecedente.
Paço das Cortes em 16 de Setembro de 1822. - Francisco Soares Franco; António Lobo Gyrão; Francisco António de Almeida Pessanha; Caetano Rodrigues de Macedo.
Mandou-se imprimir para entrar cm discussão, e publicar no Diário do Governo.
O Sr. Trigoso, por parte da Commissão de Constituição, leu o seguinte

PARECER

A Commissão de Constituição foi presente uma indicação assignada por sete dos Senhores Deputados da província da Bahia, na qual fundando-se estes em um documento que dois dias antes tinhão apresentado ao Congresso, declarão: 1.º que não podem continuar a ser Representantes daquella provincia: 2 que no caso de não ser acceita esta proposição, elles se não julgão autorizados para espontaneamente assignar e jurar a Constituição. A ordem natural pede que a Commissão considere: 1.a a matéria duquelle documento; 2.ª a sua authenticidade: 3.º o argumento, de que delle pretendem tirar os Senhores Deputados.
1.º O documento de que se trata, he uma especie de manifesto, dirigido ao - Augusto e soberano Congresso - no qual se expõe summariamente o modo por que o Brazil recobrára a sua liberdade, e reassumíra a soberania: que então posto que já emancipado, e com sobejas faculdades para entrar na lista das nações independentes, preferira antes ficar unido a Portugal, esperando achar nesta nova forma de associação política igualdade de direitos, e conseguir a maior somma de felicidade publica; que depois disto se levantára uma facção, que tentára lançar as algemas coloniaes aos emancipados Brazilienses, e para este fim arrancára a Bahia da liga Braziliense: e sem o povo o saber, a fizera independente da Regência do Brazil: que o soberano Congresso fôra involuntariamente illudido por esta facção, o que dera causa aos decretos de 29 de Setembro, que pozerão em assombro e convulsão aquella província; e que o povo della, conscio da sua dignidade, e não confundindo a submissão com a escravidão, vai agora levantar a sua voz como fiel expressão da sue inalterável vontade.
Segue-se a exposição dos princípios que precedem a declaração desta vontade, a saber: 1.º que o povo bem que tenha delegado a sua soberania na pessoa de seus Representantes, não lhes dá o poder de legislarem segundo as suas opiniões particulares, e que se não firmem na vontade geral, que por elles Representantes he declarada, o que já está decretado no artigo 34 das bases. 2. O Brazil depois de elevado a Reiao, gozava de uma administração independente da de Portugal, e ambos os Reinos nada tinhão de commum senão a sujeição immediata ao poder absoluto de ElRei: agora que está dividido o exercício da soberania, e proclamada a igualdade de direitos; como ha de o Brazil abaixar-se do seu sublime assento, e sujeitar sua administração ás autoridades do Reino irmão? Depois do breve desenvolvimento destes priacipios, a província da Bahia, fiel ao juramento do dia 10 de Fevereiro de 1821, e ao que muito espontaneamente prestou ás bases da Constituição, declara que ella não quer ser senão província do Reino do Brazil unido, e nunca mais, nem de modo algum sujeita ao de Portugal; que concordando com os votos das províncias do Rio de Janeiro, S. Paulo, Rio Grande do Sul, e Minas Geraes, reclama primeiro um corpo legislativo do Reino do Brazil, com attribuições iguaes ao de Portugal, segundo uma Regência, a qual recaia na pessoa do Príncipe Real.
E por fim conclue o manifesto, que estas são as condições do contracto publico, que devem unir os dois Reinos; que a Bahia ao mesmo tempo que jura o mais implacável ódio ao império absoluto, protesta igualmente que unida ás outras províncias, resistira com todas as forças ás injuriosas pretenções do Reino irmão, preferindo nas ultimas extremidades commetter o suicídio político, do que sujeitar-se ao senhorio e dominação Europea; mas que a província confia

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na justiça da Nação portugueza, e no espirito illuminado do século que anima o Congresso, que assentando este o edifício social do Reino Unido sobre bases iguaes, previnirá os desastrosos males que estão imminentes no Brazil, e a Portugal, e dará á Monarquia Luso-Brazilica grandeza solida, e felicidade duradoura. He datado este manifesto na Bahia no 1.º de Maio de 1822.
2.º Passando já á 2.ª parte do relatório, não póde a Commissão deixar de manifestar as suas suspeitas sobre a autenticidade deste documento. Foi elle escrito em duas folhas de papel de hollanda, mettidas uma na outra, ambas as quaes se achão muito limpas, e com signal de uma só dobra, tem boa letra, e caracter francez; acaba antes do meio da pagina 8.ª e dahi até o fim da pagina está o papel em branco sem assignaturas, nem reclamo pera ellas,
Seguem-se depois varias folhas, e meias folhas de diverso papel com assignaturas escritas de alto abaixo; e as que parecem pertencer a habitantes da Bahia, contém 24 paginas; mas em nenhuma delias se encontra a letra do requerimento.
Continuão na 25.ª pagina as assignaturas comeste titulo - Assignaturas dos moradores da villa da Cachoeira, e seu termo, pelas quaes se pede a Sua Magestade a reintegração desta provincia a este Reino do Brazil, e o poder executivo na pessoa de Sua Alteza Real, e o mais que for a bom geral deste Reino, como se pede no requerimento junto.
A pagina 27 tem outro titulo por letra differente - Assignaturas da villa da Cachoeira, e seu termo, para se ajuntar á representação, que fazem os habitantes desta província a ElRei, e ás Cortes, em que pedem a reintegração da mesma ás outras províncias deste Reino do Brazil, e o centro do poder executivo na pessoa de Sua Alteza Real o Príncipe Regente, e tudo o mais que for a beneficio commum.
A pagina 37 repete-se este ultimo titulo, e seguem as assignaturas nesta pagina, e na 38 e 39; mas quasi no fim desta acha-se o titulo - Assignaturas da cidade - e continuão estas até o principio da pagina a seguinte, ficando o resto della em branco.
Na folha de papel seguinte vem mais assignaturas da villa da Cachoeira da povoação da ilha de tramaracá, e do termo da cidade; ficando em branco grande parte da pagina 44.
Seguem-se finalmente 14 paginas com as - Assignaturas da villa de Maragogip, e seu termo; e conclue-se tudo na pagina 55, ficando a do reverso inteiramente em branco.
Todas estas folhas de papel em que estão as assignaturas, achão-se mui pouco asseadas; tem todas duas dobras, e muitas estão rotas ou no signal das dobras, ou nas margens: as tintas com que forão feitas as assignaturas, são muito differentes umas das outras; e todas as folhas achão-se cozidas em appenso ao manifesto.
Segue-se de tudo isto: 1. que o dito manifesto não tem autenticidade alguma, porque nem se sabe onde fosse feito, nem está assignado: 2. que os povos, que fizerão as assignaturas, assignárão o que não virão, aliás não estaria tão asseado o papel em que está escrito o dito manifesto: 3. que elles forão illudidos para fazerem estas assignaturas, pois muitos cuidarão assignar um requerimento para ElRei, quando lhes fazião assignar um manifesto para o Congresso: 4. que os títulos de muitas das assignaturas mostrão bem que os povos nada mais fazem do que pedir a união da Bahia com as outras províncias do Brazil (que já lhe está concedida) e a continuação da Regência de Sua Alteza Real (que lhe foi negada), sem notarem cousa alguma a rei peito do novo corpo legislativo: 5. que não houve deliberação alguma popular, que precedesse estas assignaturas, sendo todas feitas separadamente, e sem que os povos se reunissem ou nas paroquias, ou nus camaras: 6. finalmente que nada ha que abane a autenticidade de tantas assignaturas, o que era absolutamente preciso, tratando-se de nomes pela maior parte desconhecidos em Portugal; e com effeito pouco tempo havia que se tinha dirigido da Bahia a este Congrego uma representação (feita em sentido bastante contrario a este manifesto) com 848 assignaturas, todas reconhecidas, a qual tem todos os sinaes de autenticidade, e se acha sellada e passada por India, e Mina: nada disto apparece no manifesto de que se trata. Na verdade poucus conhecimentos são precisos de paleografia, menos ainda da arte diplomática para se negar toda a fé a um similhante documento.
3.° E com tudo (para entrarmos já na ultima parte do relatório) neste único documento he que se fundão os Srs. Deputados da Bahia para se considerarem no estreito dever de declarar a este augusto Congresso, e ao mundo inteiro, que não podem continuar a ser representantes daquella província, nem assignar expontaneamente a Constituição! Podião elles suppor que um tão viçoso documento contenha a vontade geral bem meditada, e expendida da sua provinda, que bem comprova a nua actual dissidência? Tanto credito merecem para negocio de tamanha monta essas assignaturas, que em juizo não terião validade alguma se se tratasse de negocio de interesse particular? Mas ainda que a authenticidade do documento não fosse sujeita a tantas duvidas, provaria este tanto quanto inculcão os illustres Deputados? Assás inclinação mostra o conteúdo delle para uma futura desunião de Portugal; mas fica esta dependente ainda de resoluções deste Congrego, e talvez do melhor sizo, e prudencia com que as receberão os mesmos que escrevêrão e assignárão este manifesto: tudo se póde esperar do tempo, que amortece as paixões, e extingue as rivalidades.
Se pois os Srs. Deputados da Bahia julgão que o argumento mais forte, produzido pela Commissão de Constituição contra a supuração dos representantes das provincias dissidentes, foi o de não haver provas sufficientes de que ellas estavão separadas, bem socegado póde ficar o seu escrupulo, na certeza de que o documento, por elles apresentado, não offerece taes provas ácerca da Bahia: e se pertendêrão enredar a mesma Commissão com o fundamento de que a opinião desta no seu antecedente parecer fôra sanccionada pelo Congresso, não pode ella deixar de retorquir que muito expressamente fez dependente a manifesta-

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ção da vontade dos povos do facto de não quererem nomear Deputados para a seguinte legislatura de Portugal, combinado com o outro facto de os nomearem para as Cortes constituintes do Brazil: neste sentido he que a sua opinião foi approvada pelo Congresso, e ainda com a addição expressa, que destes factos senão concluia ficar sanccionada a separação das provincias do Reino Unido, que este Congresso não póde fazer, e que está bem longe de desejar.
Sala das Cortes 16 de Setembro de 1822. - Francisco Manuel Trigoso de Aragão Morato; José Joaquim Ferreira de Moura; Manuel Borges Carneiro; João Maria Soares de Castello Branco; Bento Pereira do Carmo.
Mandou-me imprimir este parecer, ficando sobre a meza os documentos a que elle se refere, para poderem ser examinados pelos Srs. Deputados que os quisessem ver
O Sr. Mesquita leu a seguinte

INDICAÇÃO.

No Diário do Governo de sabbado, 14 do corrente, vem o extracto de uma portaria dirigida ao juiz de fóra de Angra, em cuja exposição ha tão graves erros de imprensa, que me não he possivel formar uma exacta idéa do seu contendo: sendo certo com tudo que se trata de dar louvores áquelle infeliz magistrado, contra o qual se tem declarado a opinião publica daquella comarca, e a respeito de cujo merecimento se torna intempestiva, e imprudente toda e qualquer antecipação de juízo, em quanto pelo tribunal da relação não for pronunciada sentença, como se elle acha commettido sobre o comportamento político de todas as autoridades existentes na cidade de Angra nos infelizes dias 2, 3, e 4 de Abril do anno próximo passado, tenho por impossível que a publicação de uma tal portaria não vá excitar grande indignação naquelles povos, que já virão com muito desprazer serem despachados alguns individuos - em attenção a seus serviços feitos naquella occasião - formaes palavras dos diplomas, que se lhes entregarão: para que junto pois do veneno appareça logo o contraveneno, julgo do meu dever fazer a seguinte requisição.
Requeiro que se diga no Governo que se abstenha de continuar a dar louvores a toda e qualquer pessoa implicada nos acontecimentos políticos da cidade de Angra, durante os quatro primeiros dias do mez de Abril do anno próximo passado, em quanto pelo tribunal da relação não for declarada a natureza de taes acontecimentos, pois que de outra maneira seria prevenir a opinião dos juizes, o que não deixaria de trazer consigo as mais funestas consequências. - Roberto Luiz de Mesquita Pimentel.
Ficou para 2.ª leitura
O Sr. Abbade de Medrões apresentou a seguinte

INDICAÇÃO.

Sendo assás constante que em todos os tribunaes e secretarias se negão ás partes certidões de tudo ou parte do que contribuio para a decisão de qualquer negocio como ao informes, pareceres separados ou juntos, a fim de que se não possa vir no conhecimento de quem faltou á justiça, resultando deste segredo tão pernicioso, que os ministros e empregados justos ficão confundidos com os injustos, e a injustiça e parcialidade de uns póde triunfar surdamente da rectidão e da inteireza de outros, sem que fique lugar ás partes para poder mostrar a falsidade das informações ou a injustiça dos pareceres, o que tudo he incompatível com o systema constitucional que felizmente ternos adoptado, aonde a justiça se deve administrar com a maior franqueza e publicidade. Proponho que se decrete por lei que em todos os tribunaes, juntas e concílios, e em todas as secretarias, sem exeptuar as de Estado, se passem certidões de quaesquer informes, respostas de fiscaes, pareceras de ministros, e de outros quaesquer empregados ás partes que as requererem para bem da sua justiça; ficando revogadas nesta parte todas as leis e ordens em contrario. - O Deputado Innocencio António de Miranda.
Ficou para 2.ª leitura.
O Sr. Barão de Mollelos apresentou o seguinte

Projecto de lei sobre caudelarias.

As Cortes etc. Tomando em consideração o deplorável estado em que, no reino de Portugal e Algarve, se acina reduzida a creação do gado cavallar, e muar, em grave prejuízo da agricultura, do commercio interno, e do exército, de que tanto depende a felicidade, independência, e segurança da nação; reconhecendo que este mal tem procedido dos regimentos e leis sobre este objecto não darem a precisa liberdade, e protecção aos creadores; e das extorsões com que erão vexados, tornando-lhes assim oneroso, e odioso um manancial da sua própria utilidade. E que procedem agora do total abandono deste importante ramo de riqueza territorial, pois na decadência em que está, e na falta de meios que tem os creadores, he indispensável dar-lhes auxílios, conhecimentos, e emulação. Reflectindo que as sommas despendidas annualmente fora do reino nas compras de cavallos e muares, sendo habilmente applicadas em beneficio dos creadores, aperfeiçoarão e multiplicarão em pouco tempo as melhores raças, e tornarão activo um ramo de commercio que ha tanto tempo tem sido passivo: e ponderando finalmente que este tão interessante objecto, tendo merecido sempre a maior consideração ás nações mais civilizadas, deve merecela igualmente a Portugal, que pela fertilidade do seu terreno, e bondade do seu clima he o paiz mais próprio da Europa para produzir os melhores cavallos e muares: decretão provisoriamente o seguinte:
1. Haverá um regimento que regule o melhoramento das raças, e a creação dos cavallos e muares.
2. O regimento de Portugal e Algarve, era attenção a este objecto, será considerado como dividido em quatro districtos.
1.º Ao Norte do Douro.
2.º Entro Douro e Mondego,
3.º Entre Mondego e Tejo.
4.º Ao Sul do Tejo.

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3. A organização e direcção geral deste estabelecimento será encarregada a um inspector geral, e a quatro sub-inspectores. Serão subordinado simmediatamente á secretaria de Estado dos negócios do reino.
4. Serão propostos pelo conselho de Estado, e nomeados por ElRei.
5. O inspector geral poderá ter um ajudante, e um secretario. Serão propostos por elle, e nomeados por ElRei.
6. Os seus vencimentos serão os seguintes:

[Ver legenda na Imagem]

O inspector geral ....
Cada um dos sub-inspectores ....
Ajudante ....
Secretario ....

7. Haverá um ou mais estabelecimentos para se cruzarem e apurarem as raças, segundo os serviços para que houverem de ser applicados. A sua direcção pertencerá ao inspector geral.
8. Haverão escollas veterinárias.
9. Todos os cavallos e éguas serão classificados em duas classes.
10. Em cada um dos referidos districtos serão distribuídos, nos lugares mais convenientes, até vinte dos melhores cavallos de cobrição de 1.ª classe, fornecidos pelo Governo, para cobrirem as melhores eguas da mesma classe.
11. Serão encarregados do seu tratamento, sustento, e da direção da coberta proprietários intelligentes, zelosos, e de probidade. Aquelles que cumprirem com esta obrigação durante um anno receberão por cada cavallo 200$000 réis: e 70$000 reis sendo só durante os três mezes da coberta.
12. Haverá mais em cada um dos ditos destrictos até quarenta cavallos de cobrição, para cobrirem as outras éguas. Serão comprados e mantidos por particulares, que se convencionarão com os donos das éguas, estipulando entre st prestações voluntárias.
13. Aquelles que desempenharem bem os ajustes que fizerão, e tiverem cavallos de cobrição da 1.ª classe, e attestação passada pelo inspector geral de que são muito bons; receberão uma gratificação annual de 60$000 rs. sendo os cavallos da 1.ª classe; e não tendo attestação, ou sendo da segunda, e tendo a dita attestação, será a gratificação de 50:000 rs. sendo da segunda e não tendo attestação será de 40:000 rs.
14. A todos se darão nomeações de cavalleiros.
15. He livre a toda a pessoa ter cavallos, e jumentos de cobrição, sendo approvados pelo inspector geral, ou pelos sub-inspectores dos referidos destrictos.
16. Para animar os creadores, e assegurar-lhes a venda dos poldros, será o thesouro obrigado, por espaço de dez annos, a comprar para a remonta da cavallaria, logo que lhe sejão offerecidos, todos aquelles nascidos em Portugal, que tiverem quatro annos de idade, 56 ou mais polegadas de altura, e as qualidades necessárias para o serviço daquella arma. Serão pagos a 100:000 rs. os que se provar serem filhos de cavallo, e égua da 1.ª classe, approvados para a cobrição; os outros serão pagos a 80:000 rs.
17. Em cada um dos ditos destrictos serão destribuidos annualmente doze prémios de 60:000 rs., e outros doze de 30:000 rs. aos donos dos melhores poldros das idades de dois, de trez, e de quatro annos. Depois do anno de 1826, se destribuirão premios também aos donos dos poldros, e poldras de cinco e seis annos.
18. São isentos de todo o imposto.
1.º Os cavallos approvados para a cobrição, as éguas de creação, as crias até á idade de cinco annos e os jumentos, e jumentas.
2.º Os cavallos da primeira classe, e aquelles da 2.ª que tiverem ganhado prémio ou destinção. He preciso porém que estejão marcados na forma, que declarar o regimento.
3.º Os que forem concedidos por lei aos militares.
19. Todas as outras cavalgaduras ficão sujeitas ao imposto annual de 1:000 rs.
20. Quaesquer cavalgaduras nascidas em paiz estrangeiro que tiverem cincoenta e duas polegadas, ou mais de altura, são sujeitas ao imposto annual de 4:000 rs., casque tiverem menos ficão sujeitas aquelle de 2:000 rs. Exceptuâo-se os cavallos, e jumentos approvados para a cobrição; e as éguas de creação que serão isentas de todo o imposto.
21. Os donos que mandarem castrar poldros da primeira classe, ou que tiverem obtido prémios, sem preceder licença do inspector geral, ou dos sub-inspectores dos respectivos destrictos, pagarão por cada um, por uma vez somente 9:600 rs.
22. Os donos dos cavallos inteiros que não estiverem approvados para a cobrição, e dos poldros inteiros de mais de vinte mexes, que consentirem que elles pastem desde o 1.º de Fevereiro até o ultimo de Julho em pastagens onde houver éguas, e que não forem privamente suas, serão multados por cada um em 4:800 rs. pela 1.ª vez, e pela 2.ª perderão o cavallo, ou poldro.
23. Os donos de quaesquer cavalgaduras , que tiverem moléstias contagiosas , e forem encontrados em pastagens, que lhes não pertenção exclusivamente, serão sujeitos á mesma multa.
24. As pastagens destinadas privativamente para o gado cavallar, muar, e vacum, serão effectivamente vedadas ao gado lanar.
25. A contabilidade de toda a receita e despeza deste estabelecimento será regulada pelo thesouro, como um ramo de fazenda nacional, e impressa e publicada todos os annos. Serão também impressos e publicados os nomes dos donos dos poldros e poldras que tiverem obtido prémios, ou distinções.
26. Fica revogada qualquer disposição na parte que for opposta ao presente decreto. O Deputado - Bar no de Molellos.
Mandou-se ficar para 2.ª leitura.
Designou o Sr. Presidente para a ordem do dia a continuação do projecto sobre a congrua dos parocos; e na hora da prolongação os pareceres das Commissões.
Levantou-se a sessão depois da uma hora da tarde. - Basilio Alberto de Soma Pinto, Deputado Secretario.

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RESOLUÇÕES E ORDENS DAS CORTES

DECRETO.

As Cortes Geraes, Extraordinárias, e Constituintes da Nação portugueza, tomando em consideração o actual estado da fazenda e divida publica, decretão o seguinte.
1. Todos aquelles a quem a Nação he devedora desde o dia 24 de Agosto de 1820, em quanto não forem embolçados de seus respectivos capitães, vencerão um juro de cinco por cento ao anno, a contar desde o primeiro de Outubro de 1822.
2. Os credores por ordinárias, tenças, e pensões não vencerão juro algum; e poderão liquidar seus créditos na Commissão de liquidação da divida publica, onde receberão os competentes títulos, ficando em seu pleno vigor a disposição da ordem das Cortes de 26 de Junho de 1821, ácerca de reformados, e montes pios.
3. Todos os ordenados dos empregados publicos a cargo do thesouro, serão pagos em dia, a contar do dia primeiro de Outubro do corrente anno. Estes [...] serão feitos mensalmente, e o Governo [...] proceder ás reformas, e ás alterações de escrituração, que para esse fim julgar convenientes.
4. Serão plenamente satisfeitas, e continuarão a ser pagas em dia as ferias, e os soldos do exercito, e da armada nacional.
5. As dividas provenientes de transacções autorisadas pelas Cortes, e dos últimos armamentos, e expedições do Ultramar, serão pagas na fórma dos respectivos contractos, e o mesmo se observará com todas aquellas que para o futuro legitimamente se contrahirem. Não se entendem alteradas pelo presente decreto, as resoluções que se tem tomado em Cortes ácerca das letras, e créditos procedidos de fornecimentos feitos ao exercito regenerador.
6. O Governo fica autorisado para abrir um emprestimo até á somma de dez milhões de crusados, a proporção das necessidades, que forem occorrendo, de maneira que nunca tenha capitães accumulados; e procurará realisado com a maior economia possivel, assim ácerca dos juros, como da anuidade para a amortisação, ficando a seu arbitrio graduar, e estipular a grandeza e numero das apólices, bem como a sua fórma, e senhas.
7. Poderá o referido emprestimo ser tomado a nacionaes, ou estrangeiros, preferindo os primeiros e a igualdade de condições.
8. Fica livre ao Governo destinar para hypotheca quaesquer rendimentos publicos, os quaes poderá igualmente receber adiantados por meio de desconto, se o premio deste for inferior aos juros do emprestimo que lhe propozerem.
9. O pagamento dos juros da divida contrahida desde 24 de Agosto de 1820, até 30 de Junho de 1821 que se consolidar em virtude do artigo primeiro deste decreto, ficará a cargo da quinta caixa da junta dos juros dos novos empréstimos, creada, e dotada pelos decretos de 25 de Abril, e 28 de Junho de 1821, para amortisação da divida anterior ao dia 30 de Junho do mesmo anno.
10. Devendo porem a divida contrahida depois de 30 de Junho de 1821 ficar a cargo do Thesouro, ao qual he responsavel a quinta caixa, pela somma paga depois de 24 de Agosto de 1820 pertencente á divida que anteriormente existis, e sendo esta somma, senão superior, ao menos igual á divida contrahida desde 30 de Junho de 1821, até 30 de Setembro de 1822, ficará igualmente a cargo da quinta caixa o pagamento dos juros resultantes da consolidação desta segunda divida.
11. O Governo mandará liquidar os títulos da divida que vai ser consolidada, em virtude do presente decreto, pela fórma que mais conveniente for ao serviço publico, e determinará a grandeza das apólices, com vencimento de juros, a que devem ser reduzidos os referidos títulos.
12. Pelas disposições do presente decreto não se entendem legitimadas as ordinárias, tenças, e pensões, ou quaesquer outros vencimentos que forem irregulares, e viciosos na sua origem.
13. Ficão revogadas quaesquer disposições oppostas ás do presente decreto.
Paço das Cortes em 16 de Setembro de 1822.- Agostinho José Freire, Presidente; João Baptista Felgueiras, Deputado Secretario; Basílio Alberto de Sousa Pinto, Deputado Secretario.

Para José da Silva Carvalho.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor: - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza mandão reverter ao Governo o incluso processo sobre supplemento de consenso paterno para o casamento Thereza de Jesus Maria, filha de Bernardo José Affonso, com Matheus Antonio dos Santos Barbosa, qual processo foi transmittido ao soberano Congresso pela Secretaria de Estado dos negocios da justiça, em data de 23 de Abril proximo passado, em virtude da ordem de 19 do mesmo mez.
Deus guarde a V. Exca. Pago das Cortes em 16 de Setembro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Redactor - Galvão.

SESSÃO DE 17 DE SETEMBRO.

ABERTA a sessão, sob a presidencia do Sr. Freire leu-se a acta da antecedente, que foi approvada.
O Sr. Secretario Felgueiras deu conta do expediente, mencionando
1.° Um officio do Ministro dos negocios do Reino, concebido nestes termos: Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - Sua Magestade manda remetter as Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação a consulta inclusa do Senado da camara de 13 do corrente, expondo, que ordenado o decreto de 9 de Agosto deste anno, que hajão de servir de metricula para a eleição das camaras os alistamentos feitos

TOMO VII Mmm

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