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DIARIO DAS CORTES GERAES E EXTRAORDINARIAS DA NAÇÃO PORTUGUEZA.

NUM. 39.

Lisboa, 22 de Março de 1821.

SESSÃO DO DIA 21 DE MARÇO.

Leo-se e approvou-se a Acta da Sessão antecedente.

LEO-SE hum Officio do Ministro Secretario de Estado dos Negocios da Fazenda, enviando Mappas e Papeis que forão remettidos á Commissão de Estatistica.

Apresentárão-se varias Memorias offerecidas por duplicado peio Contador Geral Mauricio José Teixeira de Moraes, para coadjuvação do trabalho das Commissões de Commercio, e de Fazenda, a que forão remetidas.

Deo-se conta de huma Representação da Camera de Campo-Mayor, pedindo a recondução do Juiz de Fora José Joaquim Carneiro de Carvalho. Foi remettida á Regencia.

Leo-se, e mandou-se fazer menção honrosa da seguinte Carta de felicitação e prestação de homenagem ás Cortes pelo Corregedor, Juiz de Fora e Camera de Villa Real:

CARTA.

Illmo. e Exmo. Senhor. - Os Magistrados, e a Camera desta Villa Real, per si, e como primeira das Cameras de toda a Comarca , vai felicitar a Soberania Nacional, reunida no Congresso Augusto, a que V. Exa. preside com tanta dignidade, e pondo huma illimitada confiança nas suas reconhecidas virtudes, toma a liberdade de rogar a V. Exa. queira expor no mesmo Congresso os seus puros, e constantes sentimentos de intima adhesão á Causa Sagrada da Nacional independencia, que esta Villa corajosamente proclamára, no meio ainda de systema avesso, em o sempre memoravel dia de 4 de Septembro do anno passado, sendo assim a primeira desta Provincia, e huma das primeiras de todo o Reyno, que levantou o brado da independencia, cujo successo decidindo de toda a Provincia no curto espaço de quarenta e oito horas, e fazendo jurar no grande Campo desta Villa as Tropas da Província de primeira, e segunda linha, e toda ella não pouco contribuio para o espantoso progresso, que tem maravilhado o Mundo: Esta Camera tudo espera da sabedoria, e moderação, que já tanto se tem manifestado nas primeiras Sessões do Iluminado Congresso, e constante manifestará a sua sincera adhesão ás sabias Deliberações, que delle emanarem, para a desejada felicidade do Povo Portuguez, hoje por tantos títulos elevado ao cume da gloria. Deos guarde a V. Exa. em Camera de 10 de Março de 1821. - Illmo. e Exmo. Senhor Presidente das Cortes Geraes Extraordinarias e Constituintes da Nação Portugueza - O Corregedor da Comarca João Antonio Ferreira de Moura - O Juiz de Fora Thomaz Antonio Martins - O Vereador Carlos Cabral Teixeira de Moraes - O Vereador José Antonio Mourão - O Vereador Manoel Joaquim Teixeira e Mello - O Procurador Antonio Jacinto Alves Nunes - O Escrivão da Camera Ignacio Botelho Sylva Barbosa e Sousa.

Leo-se huma Representação do senhor Deputado Joaquim Navarro de Andrade, expondo a absoluta impossibilidade de ser presente ás Sessões de Cortes, e pedindo ser escusado. Foi remettida á Commissão dos Poderes.

Apresentárão-se, e remetterão-se. - A Commissão de Saude Publica huma Memoria de Luis Soares Barbosa. - E á Militar huma de Bento Maria Lobo Peçanha, e outra anonyma ácerca da acommodação dos Officiaes Reformados.

O senhor Barreto Feyo. - Senhores - Depois de este Soberano Congresso haver decretado huma geral amnistia a todos os que desde o dia 24 de Agos-

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to até á Installação das Cortes tenhão sido presos, ou perseguidos por suas opiniões politicas; houve quem, illudindo, ou despregando este Decreto, remettesse para a Relação o processo de Bernardo de Sá, para ser julgado. Isto he o procedimento mais despotico, que se tem visto, he hum attentiido contra a Soberania do Congresso, hum crime de lesa Nação. O Congresso deve tomar conhecimento deste facto, e proceder severamente contra o seu Auctor.

O senhor Brito. - Póde ser que fosse remettido para lá se julgar conforme a amnistia.

O Senhor Feyo instou que o Aviso fora expedido a 3 de Março, e que em consequencia era justo proceder-se como pedia.

O senhor Secretario notou que a data do Aviso era errada, e que por isso não tinha lugar o que dizia o senhor Feyo - O mais sobre este artigo não o entendi - diz o Tachygrapho Machado.

O senhor Miranda, por parte da Commissão de Manufacturas e Artes, leo o Relatorio ácerca do Projecto do Capitão de Eugenheiros José Joaquim Freire, opinando que deveria tomar á mesma Commissão, a fim de melhor poder lançar o seu parecer junto com o outro que tom de apresentar ácerca do Monumento na Praça do Rocio. Approvou-se.

O mesmo senhor Miranda, por parte da mesma Commissão, leo tambem o seguinte:

PARECER.

A Commissão das Artes e Manufacturas examinou o Requerimento dos Juizes do Officio de Latoeiros de Fundição em que pedem: 1.º Que se prohiba a importancia de todas as obras de Latoeiro estrangeiras, cuja introducção prejudica aos Supplicantes. 2.° Que se hajão de pôr em vigor as Leys, Regulamentares, para que aquelles que gozão de privilegios relativos a novos inventos, não abusem delles, intromettendo-se a fabricar, e vender obras proprias somente do Officio de Latoeiro.

A Commissão foi de parecer que em quanto á primeira parte do Requerimento não ha que deferir; porque a observancia dos Tractados existentes não permitte por agora a providencia que reclamão. E em quanto a segunda que devem os Supplicantes recorrer á Regencia do Reyno por ser da competencia della o fazer observar as Leys e Regulamentos a que os Supplicantes se reportão. Palacio das Cortes de Março de 1821. - João Pereira da Sylva - Thomé Rodrigues Sobral - Francisco de Paula Travassos - Francisco Antonio dos Santos - Francisco Vanzeller - Manoel Gonçalves de Miranda.

O senhor Soares Franco. - Tenho huma reflexão a favor sobre o parecer da Commissão, e he: que os Tractados externos são com a Grão-Bretanha, não com as outras Nações, e eu creio que ellas introduzem neste Reyno muitos artefactos de metal, que devem ser prohibidos; não se devendo, a troco dos 30 por cento que pagão, reduzir a miseria os nossos Artistas, e arruinar a industria Nacional, não havendo aliás Tractados que admittão essa importação.

O senhor Brito. - Se se prohibir este genero devem prohibir-se todos os mais, quero dizer, prohibir-se o Commercio Estrangeiro, o que fará de graça da Patria. Isto pede muita consideração. A sciencia da economia politica tem sido muito debatida: consultem-se esses auctores, e elles dirão que o Commercio alenta a Agricultura. A importação dos generos Estrangeiros provoca a importação dos nossos: a somma que importão os generos estrangeiros ha de ser paga coma nossa industria, elles não podem levar senão em generos hum valor igual. Dir-se-ia que pódem levar dinheiro; mas este não póde ser senão o equivalente dos generos: não podem levar este dinheiro senão por meio dos nossos productos. O lavrador he necessario que faça vinho para reduzir a dinheiro. O dinheiro he genero como todos os outros productos. O verdadeiro objecto de hum Governo he multiplicar os productos da riqueza Nacional. A Nação não he feliz senão quando produz. O augmentar as producções he que faz a felicidade da Nação; e estes productos importa pouco que sejão Ouro, Prata, ou Ferro; o que importa he que tenhão valor Commercial, porque tanto vale hum milhão em generos como em dinheiro.

O senhor Soares Franco. - Aqui trata-se de artefactos. Vem cousas de fora, como bacias de latão, etc. isto he prohibido em todas as Nações porque vai a coarctar a industria Nacional. A grande baixela que se fez para Lord Wilington os Ingleses a quizerão amaçar, para a fazer de novo. Não se falla aqui de generos, falla-se de artefactos, e a Importação he com effeito prejudicial ás classes industriosas de huma Nação. Não sei se isto mereceria mais algum exame. Pelo que pertence aos Latoeiros ele. Parece-me que a respeito das Nações estrangeiras só ha o tratado de Inglaterra.

O senhor Borges Carneiro. - Desejo que o parecer da Commissão seja mais bem declarado, quereria que se dissesse que fica prohibida toda a importação daquelles artefactos, á excepção dos que pela rigorosa letra de algum Tratado se devão conservar. Digo isto porque o fato feito não he comprehendido no Tratado de 1810.

O senhor Brito. - Acabo de ouvir dizer, que em todas as Nações he prohibida a importação de artefactos: devo lembrar que não acontece assim nas Nações mais sabias. A Suissa, que he huma Nação bem dirigida, usa de huma liberdade igual á dos Estados Unidos da America.

O senhor Borges Carneiro. - Eu não pertendo fallar sobre as restricções do Commercio em geral. Não creio em livros, creio na muita experiencia. Olhemos para Portugal, e vejamos os males da importação dos generos Coreaes, agoas-ardentes, etc., não me importão livros, importa-me a practica, e a experiencia.

O senhor Luiz Monteiro. - As Nações mais Commerciaes da Europa, em comparação das quaes nada he a Suissa, adoptão hum systema contrario. Aquella medida póde ser muito boa em outras epochas, mas

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nesta não. Inglaterra, que he huma Nação mais culta, e adopta principios liberaes, prohibe absolutamente a importação de artefactos, e se admitte alguma em alguns generos, põe direitos prohibitivos como de 100, 90, etc. Por isso entendo que se não deve admittir fato de fora: o mas só das Nações que tem Tratados, e esses mesmos são susceptíveis de muita averiguação, porque se tem abusado muito.

O senhor Miranda. - A Commissão sabe muito bem que he necessario prohibir a introducção das obras Estrangeiras, porque isto ha de concorrer para o aperfeiçoamento das artes. Entretanto a Commissão dá o seu parecer, e toma esta medida por agora, attendendo ás circunstancias da Europa.

O senhor Ferreira Borges: - O parecer da Commissão he digno de se apoyar, e eu o apoyo na maior amplitude. O que ha a respeito dos Latoeiros, he a respeito de todos os mais: e quando se tomarem as providencias geraes, deve incluir-se esta. Se vamos a tomar providencia só a respeito dos Latoeiros, teremos todos os dias Requerimentos dos outros Artistas, e estaremos a fazer Leys todos os dias. Demais: eu não sei se os nossos Latoeiros são hábeis para todas as obras desta natureza, se os ha só no Porto, e em Lisboa, e por isso se devão admittir obras de metal de outro Paiz.

O senhor Bettencourt. - Os Latoeiros são Portuguezes, e como taes tem direito á protecção deste Congresso; elles entrão na classe importante dos Officiaes que fazem sustentar a industria Nacional. A rasão porque Portugal desceo a tão grande abysmo, he porque em todos os ramos temos admittido a illimitada entrada dos sobejos Estrangeiros, não só de materias primas mas dos generos manufacturados, e arte facturados: este crasso erro tem paralysado de todo os nossos braços, tem anniquilado os talentos, e diminuidos os inventos; tem-nos feito escravos das outras Nações: os Estrangeiros tem recebido de Portugal o principal fomento dos seus estabelecimentos, recebendo o nosso dinheiro, que tanta falta nos faz hoje, para conhecermos já os bons effeitos da nossa Regeneração. E que Nação ha no Mundo bem governa da que receba generos manufacturados das outras Nações? Eu não posso admittir o principio de economia politica da chymerica liberdade de importação. Fiança e Inglaterra, duas Nações que devem servir de modelo, tem proclamado por alguns Auctores estes principios; mas he para as Nações incautas e ignorantes os seguirem, e para estas he consumirem os seus effeitos; pois vemos que Inglaterra nesta parte do seu governo economico tem leys prohibitivas, e que até os trastes de prata que os Viajantes Estrangeiros levão para os seus usos, os mandão amaçar, para lá de novo os mandarem fazer por Officiaes Inglezes. Então combinão similhantes procedimentos practicos com as theorias de economia politica Quem segue taes theorias não quer o bem da sua Nação. Porque nós não temos as cousas he que he preciso pormos os meios para as ter no nosso Paiz: porque se não tem auxiliado as classes industriosas he que precisamos tudo de fora; logo que se prohibão as de fora, nós as teremos no nosso Paiz, e a concurrencia as fará baratear. Nós temos braços, e a maior aptidão para tudo que quisermos fazer, e emprehender o que não temos tido de hum Governo promotor do que he Nacional; quando tivermos igual importação á exportação, e melhor ainda mais exportação, então realizaremos esses principios de economia politica. Isto não se póde negar sem mentir á propria consciencia. Doze Navios de trigo estavão de viagem para Portugal, mas os Carregadores sabendo que o preço, não convinha, forão para Marselha e Napoles, aonde tinhão maior preço. Os Estrangeiros só calculão o seu interesse e não a nossa necessidade. Ponhamo-nos pois a salvo com providencias que nos resgatem da dependencia servil dos Estrangeiros: sejamos Portuguezes, e teremos do nosso Paiz e da nossa industria todos os recursos. Mudemos de plano, e sigamos o que a experiencia nos realiza em utilidade, e não em theorias vans e estereis que nos abysmárão na pobreza e na desgraça.

O senhor Soares Franco. - Admitto a Proposta da Commissão, porque por agora a providencia deve ser geral.

O senhor Borges Carneiro. - Quero só responder ao que disse hum illustre Preopinante, que não devíamos cuidar neste objecto por partes, mas em grosso. Veio hoje hum Requerimento dos Latoeiros, este deve ter Despacho, mas he indeferido: he hum abuso conhecido. Diz-se que he justo o Requerimento, e indefere-se porque se ha de esperar pela reforma: não me parece bem. Por isso pertendo que se mande prohibir a importação de todos os artefactos, á excepção daquelles que são comprehendidos na rigorosa letra dos Tratados.

Discutio-se por mais hum pouco, em que se repetirão as mesmas ideas - diz o Tachygrapho.

A final não foi approvado o Parecer da Commissão, e remetteo-se á de Commercio.

O senhor Miranda, por parte da mesma Commissão, leo tambem o seguinte Parecer, que foi approvado:

PARECER.

A Commissão das Artes, e Manufacturas, tendo examinado a Representação feita por alguns Habitantes da Cidade do Porto, para que as Minas Nacionaes de Carvão de S. Pedro da Cova, se administrem por contracto, pondo-se para esse effeito em arrematação, e achando que a referida Representação recahe sobre hum objecto de grande importancia para a prosperidade da Nação, por conseguinte digno da attenção do Soberano Congresso, he de parecer,

Que não obstante o principio geralmente adoptado pela mesma Commissão, de que em materias de Fazenda devem sempre preferir-se as administrações por contracto, ás administrações de confiança, ha neste caso particular considerações especiaes, que he necessario ter em vista, e que modificação singularmente o enunciado principio. Se as Minas acima referidas não formassem bancas, ou camadas homoge-

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neas, e se a extracção do carvão se não fizesse com e devida regularidade, adiantando-se as galerias, conforme a natureza, e circunstancias das suas camadas, consultando somente, e como deve suppôr-se, o seu particular interesse, applicarião os Mineiros com preferencia aquellas camadas, e naquella direcção, que lhes offerecesse os maiores lucros. E por este modo, alterando o Systema regular da extracção, porião as Minas em tal desordem, que os trabalhos subsequentes serião mui difficeis, mais despendiosos, e de muito menos lucro, de maneira que até não seria facil achar para o futuro quem quizesse toma-las por Contracto, e o Governo se veria na necessidade, ou de abandona-las, ou de mandar trabalhar nellas com perda da Fazenda Publica. Tomando pois isto em consideração, e para proceder-se com acerto, ou por fixo conhecimento da materia, ou seja para pôr em melhor ordem a actual Administração por contracto, pareceo á Commissão que a Regencia do Reyno remetta esta Representação com o parecer appenso, ao Senado da Camera da Cidade do Porto, para que elle de sobre este objecto a sua informação com a brevidade possivel, a qual a Regencia remetterá a este Congresso, para tomar huma resolução definitiva; e que a Regencia ordene tambem ao Director das referidas Minas, que auxilie, e instrua com as suas luzes, e conhecimentos practicos, o Senado da Camera da mesma Cidade, a fim de que este possa dar hum completo informe, que alem do mais que parecer ao Senado da Camera, deverá recahir sobre os artigos seguintes.

1.º Qual he o estado presente das Minas de Carvão de S. Pedro da Cova; isto, se suo actualmente abundantes, e se ha esperança de que ellas o serão sempre? Qual he a sua direcção geral; qual a direcção, e inclinação das suas camadas; quaes as qualidades, e pureza do carvão extraindo? Finalmente todas as particularidades, que constituem a sua perfeita descripção Mineralogica.

2.° O estado da sua Administração, e cios Estabelecimentos annexos, se os houver. Os homens nellas empregados, os salários que vencem, e todas as mais despezas feitas na sua administração.

3.° O proclucto a annual das Minas, e o preço porque regularmente se costuma vencer o carvão, a fim de se determinar o valor total daquelle producto.

4.° Se, attendendo ao que fica exposto no artigo 1.°, será conveniente pôr em arrematação o contracto daquellas Minas; e sendo-o, quaes deverão ser as condições, porque deve fazer-se a sua arrematação.

5.° Julgando-se indispensavel, ou conveniente continuar-se a extracção das Minas por conta da Fazenda, quaes são as reformas, que deverão fazer-se para que, combinando os interesses do Publico, e da Fazenda, se possão tirar dellas todas as vantagens, que racionalmente devem esperar-se. Palacio das Cortes de Março de 1821. = João Pereira da Sylva = Thomé Rodrigues Sobral = Francisco de Paula Travassos = Francisco Vanzeller = Francisco Antonio dos Santos = Manoel Gonçalves de Miranda.

O senhor Guerreiro, por parte da Commissão de Legislação, leo, e foi approvado o seguinte

PARECER.

A Commissão do Legislação vio o Requerimento do Desembargador José de Carvalho Martins da Silva Ferrão, em que pede a este Soberano Congresso o exame e decisão Cameraria dos autos de hum Sequestro, que em consequencia de hum Aviso da Governo, e por ordem do Desembargo do Paço contra a disposição das Leys se lhe fizera nos prazos de vidas, em cuja posse se tinha ratificado por auctoridade judicial ao tempo da morte de sua may, e de dous Processos, hum para se reformar ou annullar a Partilha de herança paterna, e outro para acautelar-se na da materna a divisão dos prazos em que a may tinha succedido por direito singular, nos quaes todos diz que se lhe tem feito as mais escandalosas injustiças, e outras iguaes tem a esperar no gruo de revista a que os levou, e da qual passou, quanto a hum, imprevistamente o tempo.

A Commissão não pôde pelo simples enunciado do Requerimento, que he demasiadamente generico, e sem documento algum, ajuizar da rasão, ou sem rasão do Requerimento e queixa do Supplicante; parece-lhe porem que a decisão Cameraria, que se pede, nunca póde ter lugar, como monstruosa e sempre repugnante ao systema Constitucional.

Salla das Cortes 21 de Março de 1821. = Antonio Camelo Fortes de Pina. = José Antonio de Faria Carvalho. = José Homem Corrêa Telles = José Vaz Correa de Seabra. = José António Guerreiro. = José Ribeiro Saraiva.

O senhor Guerreiro, por parte da mesma Commissão, leo tambem o Relatorio ácerca de hum Requerimento, dos Moradores da Villa de Olhão, sendo de parecer que fosse remettido á Commissão de Estatistica, e assim se deliberou.

Leo mais, e forão approvados os seguintes:

PARECERES.

D. Galdina Maria Eugenia Marcelli, Viuva de Filippe Marcelli, e os legitimos Herdeiros desse, pedem a graça especialissima da concessão da revista que pela Mesa do Desembargo do Paço lhes fora negada, da Sentença da Casa da Supplicação pela qual Guilherme Frederico Marcelli, na supposta qualidade de filho natural de Guilherme Marcelli, fora julgado herdeiro deste adjudicando-se-lhe os bens da herança que os Supplicantes estavão possuindo.

Sendo porém esta supplica destituida da legal assignatura de hum procurador da Relação, requisito insupprivel pela unica assignatura não reconhecida da Supplicante, a sua admissão he expressamente vedada pela Ordenação Liv. 3.° tit. 95. §. 11.

Quando porem assim mesmo mereça, pela gravidade dar sua materia, a attenção do Augusto Congresso, a cuja decisão deve preceder a audiencia necessaria do Supplicado,

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Parece á Commissão que este Recurso se remetta á Regencia para sobre a resposta da parte e Consulta do estylo se deferir aos Supplicantes como for justiça. Lisboa 14 de Março de 1821. - José Antonio de Faria Carvalho = José Ribeiro Saraiva = Antonio Camello Fortes de Pina = José Vaz Corrêa de Seabra = Carlos Onorio de Gouvêa Durão = José Corrêa Telles = João de Figueiredo = José Antonio Guerreiro.

A Commissão de Legislação vio o Requerimento de D. Angelica Margarida de Barros da Villa de Setubal, em que com auctoridade de seu Marido pede revista por Graça Especialissima de huma Sentença contra ella proferida, em causa possessoria, em que concendeo sobre os bens vinculados de seu Pay natural José Antonio Benedicto Soares de Faria e Barros, na qual Sentença allega ter-se-lhe feito notoria injustiça, porque pertencendo-lhe a posse legitima claque os bens como a filha natural e legitimada, e habituada pelo Desembargo do Paço, não sómente se decidira contra ella na Casa da Supplicação, mas no Desembargo do Paço se concedera Carta Tecitiva Possessoria ao seu Contendor, e o Provedor Mór dos Orfãos indeferira hum Requerimento em que a Supplicante pedia providencias extraordinarias.

Achou a Commissão que o Requerimento da Supplicante labora em manifesta obrepção em quanto produz como titulo de legitimação e habilitação para succeder nos vinculos do Pay natural huma simples Provisão de tutela, e que á vista dos Documentos que acompanhão o Requerimento não resulta notoriedade de injustiça, nem outra causa sufficiente para desvanecer a força de hum Julgado proferido ha mais de oito annos; accrescendo ter ainda a Supplicante o recurso de acção ordinária que lhe foi tolhido pela causa possessora, á Commissão pareceo por tanto que este Requerimento deve ser indeferido.

Salla das Cortes 21 de Março de 1821. - Antonio Camello Forte de Pina. - José Vaz Corrêa de Seabra. - Carlos Honorario de Gouvêa Durão. - José Ribeiro Saraiva. - João de Figueiredo. - José Homem Corrêa Telles. - José Antonio Guerreiro.

O senhor Trigoso, por parte da Commissão de Instrucção Publica, leo, e forão approvados os seguintes:

José Bento Falcão pede ser empregado com ordenado na Livraria da Casa das Necessidades. Julga a Commissão de Instrucção Publica, que este Requerimento não póde por ora ser attendido, porque não vem documentado, e porque a Livraria ainda não está arranjada.

Salla das Cortes 21 de Março de 1821. = Francisco Manoel Trigoso de Aragão Morato = Joaquim Pereira Annes de Carvalho = Francisco Xavier Monteiro = João Vicente Pimentel Maldonado.

O Bacharel José Maria de Faria Azevedo Coutinho, pede a execução do Projecto de Decreto sobre a abolição das Leituras, que elle erradamente julga ter sido apresentado pela Commissão de Instrucção publica.

Julga esta Commissão que ao Congresso pertence determinar quando este assumpto deve ser discutido, e decedido.

Salla das Cortes 21 de Março de 1821. = Francisco Manoel Trigoso de Aragão Morato = Joaquim Pereira Annes de Carvalho = Francisco Xavier Monteiro = João Vicente Pimentel Maldonado.

O Doutor Antonio Fernando Leite de Sousa, Egresso da Congregação de São Jeronymo, pertende entrar no Concurso da Prebenda Magistral da Sé do Porto, que pertence á Classe dos Doutores Seculares da Faculdade de Theologia; e queixando-se dos obstaculos que tem encontrado para ser admittido ao dicto Concurso, pede que o Reformador Reytor faça sustar este, em quanto as Cortes não definirem o direito que os Doutores Secularizados tem aos Beneficios da Apresentação da Universidade.

Parece á Commissão da Instrucção Publica, que este Requerimento deve ser remettido á Regencia do Reyno, para o fazer decidir pelas Leys actualmente existentes na Universidade, as quaes parece terem providenciado o que he bastante sobre este objecto.

Salla das Cortes 21 de Março de 1821. = Francisco Manoel Trigoso de Aragão Morato = Joaquim Pereira Annes de Carvalho = Francisco Xavier Monteiro = João Vicente Pimentel Maldonado.

O Bacharel Manoel Gomes Coelho, expondo as difficuldades que tem encontrado para fazer o seu Acto de Leitura no Desembargo do Paço, pede ser admittido extraordinariamente, é com brevidade, a fim do poder embarcar para a Bahia, onde he Domiciliado; e por isto no caso em que se não extingão as Leituras, as quaes elle tem por inuteis.

Parece que este Requerimento deve ser remettido para a Regencia, a fim de lhe defirir como for justo.

Salla das Cortes 21 de Março de 1821. = Francisco Manoel Trigoso de Aragão Morato = Joaquim Pereira Annes de Carvalho = Francisco Xavier Monteiro = João Vicente Pimentel Maldonado.

Os Directores do Theatro Nacional da Rua dos Condes, expõe a este Congresso as criticas circunstancias actuaes do dito Theatro, e as difficuldades que ia para que se abrir na proxima Pascoa, as quaes consistem na alta de subsidios com que os mesmos Directores possão contar para ir amortizando a grande divida que tem contrahido, e para continuar a pôr

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na Scena espectaculos dignos da attenção do Publico; visto que não podem já contar com as pequenas Loterias, que havião sido concedidas a beneficio do Theatro, e julgão que poderá tornar-se inefficaz a concessão do premio de dous mil bilhetes em cada huma das cinco Loterias grandes que annualmente se fazem. Concluem pedindo outros soccorros mais positivos e infalliveis.

Em outra Memoria sobre o Theatro Nacional, que offerece Fernando José de Queiros, mostra elle autoridade do Theatro Portuguez; as causas da sua decadencia, e o modo porque se póde reformar.

A Commissão de instrucção Publica tendo examinado aquelle Requerimento, e esta Memoria, entendeo que hum Theatro Nacional bem dirigido he muito util nesta Capital; mas quando se podem verificar os arbitrios que parecem mais proprios para se lhe dar esta boa direcção sem que haja hum edificio e decente destinado para as representações, e onde possa concorrer commodamente o Publico illustrado. Pela mesma razão entendeo, que o actual Theatro não se deve fechar, antes se deve conservar para servir de base ao novo estabelecimento, e que por isso he necessario que se lhe dem os necessarios soccorros.

Julga pois a Commissão, que em quanto a estes soccorros se deve expedir Ordem á Regencia para fazer effectiva, a favor dos Directores, a concessão dos dous mil bilhetes em cada Loteria, ou permittir-lhes (no caso em que esta se não possa realizar) huma nova Loteria, que lhe produza o mesmo interesse, e que se a unicamente destinado para benefício da mesmo Theatro.

Em quanto ao estabelecimento da nova Casa para o Theatro, á mesma Regencia pertence authorizar, o arbitrio exposto na Memoria, ou outro qualquer, com tanto que não seja gravoso á Fazenda Nacional. E só depois de edificado o novo Theatro he que a Commissão só póde applicar os meios, porque elle se póde reformar em utilidade publica.

Salla das Cortes 21 de Março de 1821. - Francisco Manoel Trigoso de Aragão Morato = Francisco Xavier Monteiro = Joaquim Pereira Annes de Carvalho = Manoel Alves do Couto =- João Vicente Pimentel Maldonado.

O senhor Ferreira Borges propoz que se exija da Regencia para a Commissão de Commercio, remessa das Pautas das Alfandegas, e Mappa dos direitos de entrada, e sahida, com apontamento das Leys que os determinão: relação dos Empregados, com declaração de nomes, officios, e emolumentos, e das respectivas Leys, e Regimentos: e os Tratados commerciaes existentes com as outras Nações. Foi approvado.

O senhor Ribeiro da Costa apresentou huma Carta de hum Negociante de Liverpool a outro de Lisboa, participando-lhe haver-se no Pará proclamado a Constituição. - Foi lida pelo senhor Secretario Ferreira Borges, com a Proclamação que trazia por copia. - E, por ser tão plausivel noticia, posto que não official, determinou-se que fosse remettida á Regencia para se inserir no respectivo Diario.

O senhor Borges Camelo. - Consta que, ainda depois da Installação das Cortes, os Regulares continuão a admittir Noviços. Proponho pois, que se expeça, ordem á Regencia, para que pela Mesa do Melhoramento das Ordens Religiosas faça suspender a admissão dos Noviços, e que o mesmo se entenda em quanto aos Freires Conventuaes das Tres Ordens Militares. (Apoyado, apoyado.)

O senhor Annes de Carvalho. - Eu creio que a Mesa do Melhoramento não he a que dá essas licenças, e que tem vindo do Rio de Janeiro, determinando o numero: mas apoyo a proposta do senhor Borges Carneiro, que he conforme ao que nos passados Governos já por vezes se tem practicado.

O senhor Margiochi. - Procure-se o Decreto lavrado no Rio de Janeiro em 1809, ou 1810 para extincção das Ordens Religiosas. Eu não pertendo que ellas desde já sejão extinctas, posto que talvez fosse conveniente; mas bom será que se procure o tal Decreto, para constar que no Rio de Janeiro já as quizerão extinguir, quando as necessidades da guerra o exigião.

O senhor Vice-Presidente perguntou se o Congresso approvava a proposta?

O senhor Sarmento. - Peço que se faça excepção dos Collegios de Coimbra, porque lá estuda-se, e nós precisamos de Homens sabios.

O senhor Borges Carneiro. - Podem estudar como seculares: não he preciso que a Universidade de Coimbra tenha caracter Ecclesiastico.

O senhor Castello Branco. - Tenho que dizer alguma cousa a respeito de hum Collegio a que tive a honra de pertencer. O Collegio dos Militares he hum, estabelecimento Religioso por hum lado, porque o que alli entrarão professão em algumas das Ordens Militares: por outro lado deve considerar-se como huma Corporação da Universidade. Este, e os outros dous Collegios de S. Pedro, e S. Paulo entrão no Regulamento Economico da Universidade, e vem a ser por assim dizer huma ajuda de custo que se dá aos Doutores, e Oppositores, em quanto não são declarado Lentes, para os ajudar a subsistir na Universidade: muitos d'elles não poderião subsistir se não fosse a entrada nestes Collegios, e o Collegio dos Militares não poderia subsistir se lhe tirassem a natureza de Collegio Religioso. Ora deitar abaixo hum Collegio que se acha intimamente ligado com o systema economico da Universidade, não he cousa que se faça, de repente, e he necessario que a Assemblea o faça com mais decoro; por isso que elle he auctorizado por huma Ley, e tão justa qual he a da Refórma e a Universidade. Por tanta opponho-me inteiramente a isto.

O senhor Bordes Carneiro. - A questão não he, se os Collegios devem ser já deitados abaixo, segundo a phrase do Illustre Preopinante; a questão he, se convém que aquelles Collegios, sejão compostos de Frades, e Frades Professos; e digo que certamente não convem: bem bastão tantos que ha no Reyno. O que eu quero he que naquelles Collegios não haja Profissão Religiosa.

O senhor Sarmento. - Parece-me que eu não tenho interesse nenhum em exigir a excepção; eu não

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sou Freire, sou hum homem casado, e não pugno senão pela rasão.

O senhor Camelo Fortes. - E eu accrescento que o n.° dos indivíduos que entrão do Collegio dos Militares, he tão pequeno, que não póde causar damno algum a sua conservação.

O Sr. Serpa Machado. - Os Collegios das Ordens Militares em Coimbra não devem ser comprehendidos nessa ordem; porque recahihdo o provimento destas Collegiaturas em Doutores benemeritos dá Universidade, vir ao a ficar estes privados do direito accesso aos ditos Collegios, direito concedido ao premio do seu merecimento, e em beneficio das Sciencias, e dos que a elles privativamente se dedicão. A profissão religiosa que são obrigados a fazer não he violenta; antes muito livre para aquelles que a querem acceitar, porque os que não tem vocação para esta vida, já tem os Collegios de S. Pedro e S. Paulo, aonde podem ser admittidos, nestes termos me conformo com o parecer do senhor Sarmento que propõe muito discretamente que a ordem que se manda expedir não comprehenda os Collegios da Universidade tanto da Ordem de Christo como das mais Ordens Militares.

O senhor Pinheiro. - Eu, que sou interessado nesta materia, só fallarei pelo que respeita aos Membros daquelle Collegio; estes estão auctorizados para todos os Empenhes Civis, e Militares. Os Tribunaes estão cheios de Freires, as Relações do mesmo modo. Presentemente aqui está hum Militar que he Freire. Na Ilha da Madeira está hum Governador tambem Freire. No Conselho da Fazenda tambem ha hum Freire; e os Freires fazem Profissão, mas Cio hábeis para todos os Empregos Civis, e Militares,

O senhor Castello Branco. - Ha hum engano em hum dos Illustres Preopinantes, confunde Frades com Freires: estes em quanto não estão ligados ás Ordens Sacras, podem vestir huma farda, podem servir em todas as Repartições. Freires são Clerigos. Se querem prohibir que na Universidade haja Clerigos, onde necessariamente os ha de haver, porque a maior parte dos Rendimentos das Cadeiras são Canonicatos, são então he outra cousa. O Collegio dos Militares não tem propriedade, aquella renda que tem são pensões tiradas das Ordens Militares; e huma vez que deixe de ser Collegio de Individuos das Ordens, não tem rendimento algum. As Profissões dos seus Membros não inculcão mais que hum simples Clerigo; por isso, attendendo a todas estas cousas, me parece não ter lugar o que disse hum dos Illustres Preopinantes.

O senhor Travassos. - Eu fui Freire, e hoje sou Militar, e não tive Decreto de Secularização, não me foi necessaria Breve, ou Secularização alguma.

Ultimamente foi approvada a proposta por grande maioridade de votos, exceptuando-se os Collegios dos Freires de Christo, Aviz, e S. Thiago na Universidade de Coimbra.

Leo-se por segunda voz o Additamento do senhor Peçanha ao Projeto de amortização da divida publica, e mandou imprimir-se para junto de discutir.

O senhor Luiz Monteiro expoz que era prejudicial ao Commercio o retardamento da discussão do Projecto para diminuição dos Feriados.

Lido e discutido o Projecto, foi approvado em quanto ás Alfandegas e Casas fiscaes, declarando-se que só terão feriados os Domingos e dias Santos, e que nesta conformidade se expedisse Aviso á Regencia.

O senhor Mello apresentou cinco Representações: duas da Camera de Lafões, e tres do Medico da mesma Villa Joaquim Baptista, e a todos se deo o ordinario expediente.

Discutio-se, segundo a Ordem do dia o artigo 2.º do Projecto ácerca dos Bens Nacionaes e amortização da divida publica, com a emenda ao mesmo artigo proposta pelo senhor Alves do Rio, e disse:

O senhor Serpa Machado. - Neste artigo do projecto novamente refundido pelo seu Auctor se estabelece huma regra bem fundada na sua generalidade, de que todos os que bens de commendas da Coroa e Ordens que vagarem ainda mesmo em poder de Donatarios sejão applicados para a amortização da divida publica; esta regra firma-se na justiça, e justificasse pela necessidade: pede aquella que os credores do Estado sejão pagos das suas dividas, exige a Soberana Ley da necessidade que não se podendo impor aos Povos maiores imposições do que as que soffrem se applique para o pagamento das dividas das Commendas que vagarem, assim como os bens da Coroa etc.

Vou porem a ponderar motivos de justiça e de necessidade que justificão huma excepção á generalidade desta regra. As Commendas conferidas aos Professores da Universidade na Faculdade de Mathematica, Philosophia, e as Dignidades Canonicatos e Benefícios conferidos aos Professores e Doutores das Faculdades Positivas devem ser exceptuados desta applicação. Pede-o a justiça, porque sendo esta renda huma parte do seu ordenado, huma compensação dos seus trabalhos, seria huma iniquidade a sua privação, para aquelles que a merecem, e a esperão e torna-se de absoluta necessidade nas circunstancias em que se achão as rendas da Universidade, e a tenuidade deis ordenados dos Lentes.

He bem notorio que a pequena quantia de trezentos e sincoenta mil réis ou quatrocentos que percebe hum Lente de ordenado não he sufficiente para satisfazer as necessidades da vida, e menos para compensar os grandes trabalhos litterarios. Estes mesmo ordenados não poderá sustentar-se para o futuro pela diminuição que tem soffrido as rendas da Universidade. A maior parte dellas forão arrematadas no quadrienio actual com abatimento da terça parte, e de a metade, e ainda resta huma boa porção por arrematar, as quaes será forçoso mandar administrar; porem taes administrações, por experiência constante sempre damnosas, darão igual ou maior abatimento; Alem desta diminuição das rendas da Universidade effeito do baixa preço de todos os fructos, calamidades cujo termo não podemos bem calcular, ha outra causa

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não menos poderosa da diminuição das rendas da Universidade, e que vai operar muito sensivelmente no futuro: tal he a extincção dos serviços pessoaes, dos Direitos Banaes, e a proxima reforma dos Foraes, pelos quaes a Universidade percebe a maior parte dos seus reditos, que consistem principalmente em foros, Laudem os, quotas de fructos, e mil outros exorbitantes direitos, que lhe for ao transferidos dos extinctos Jesuitas, do Priorado Mór de Santa Cruz, e de outras Corporações que se achão hoje refundidas na Universidade, e que os Povos contribuintes ha tempos a esta parte já pagavão com manifesto desfalque, e á força de execuções. Se pois as rendas da Universidade, actualmente e para o futuro, ainda debaixo da mais vigilante, e escrupulosa administração, não podem pelas causas apontadas tão ponderosas como verdadeiras, supprir mesmo a esses insignificantes ordenados dos Professores da Universidade; que acontecerá se estes forem privados das suas Commendas dos seus Canonicatos, e Beneficios, ou da espectativa delles. Diminuir ou, negar os alimentos aos Empregados de huma instituição util, tirar-lhe huma parte dos seus ordenados ou das suas esperanças, he querer dar cabo do melhor dos nossos estabelecimentos, que ainda que relaxado por culpa de todos, com tudo he susceptivel de reforma, e em breve, será o centro luminoso donde dimanarão, as luzes que hão de acabar de esclarecer o nosso horizonte politico. Concluo propondo a excepção addicional deste artigo em favor das Commendas, Canonicatos, e Beneficios da Universidade; sem que já mais possa ser tachado com a leve suspeita de parcialidade em materia de Commendas, e Beneficios, porque a minha profissão Juridica me inhabilita para aquellas, só concedidas aos Professores de Scencias Naturaes, e o meu estado incompativel com o Sacerdocio me veda o accesso aos Canonicatos, e Beneficios: entretanto advogo por huns e outros em favor da conservação de huma tão necessaria Corpoção.

O Senhor Borges Carneiro. - Não se deve tratar desta excepção, mas sim da regra geral.

O senhor Moura. - Sou da opinião do senhor Serpa, mas parece-me que a excepção não deve ter lugar, porque o artigo 1.º refere-se ás Commendas que vagarem, e as da Universidade nunca vagão.

Houve mui breve discussão sobre a vacância ou não vacancia das Commendas da Universidade, e disse:

O senhor Alves do Rio. - Diz-se = todas as Commendas que vagarem= , e por isso incluo tambem as da Universidade. As razões são as mesmas a respeito de todas, que he necessario assim para o bem do Estado: eu creio que o bem do Estado geral deve preterir ao bem das Corporações particulares, a Causa Publica he a primeira de todas; assim eu exijo que as mesmas Commendas da Universidade sejão interinamente, logo que vagarem, incorporadas paia a divida Publica, e que os Lentes sejão indemnizados por outra forma, não por esta. Concedo que os Ordenados são pequenos: augmentem-se, reformem-se. As mesmas razões porque o Illustre Preopinante disse que as Commendas se devem conservar á Universidade, existem a respeito do Thesouro Nacional; temos dividas que he preciso pagar, e as despezas ordinarias são muito grandes; por isso parece que tambem as Commendas da Universidade se devem incluir na regra geral.

O senhor Borges Carneiro. - Eu queria que se tratasse da regra geral, com o direito salvo sobre a Universidade de Coimbra; como porém se quer que se trate da excepção antes da regio, geral, direi sobre ella. Eu conformo-me, com o Illustre Preopinante o senhor Alves do no. A medida he provisional para sanar a Divida Publica. Diz-se que a Universidade de Coimbra não tem dinheiro para pagar, e não o tem he verdade, ancião por pagar os Lentes; ha poucos dias que se apresentou huma Representação, cru a qual se dizia que o Depositario da Fazenda, hum fulano Couto, sómente de peças de 6:400 reis de matriculas, tinha elle devotado e extraviado 5 mil cruzados; e que isto he tão notorio que está por hum termo assignado em hum livro em que elle confessa que linha ficado com os 5 mil cruzados de peças de Matriculas; mais de 200 mil cruzados se tem gasto no jardim: o órgão dizem-me que se tem gasto com elle muitos mil cruzados, e assim se dissipa a Fazenda da Universidade. O Reytor deixa dissipar, e a boa gente que tem ao seu lado. (Foi chamado á Ordem) Se he verdadeiro o facto não sei, consta da Representação, e diz-se que a Universidade de Coimbra não tem rendas; mas he porque as extravia e dissipão. A vista disto o meu parecer he, que se devem comprehender as Commendas da Universidade que vagarem; porque estou persuadido de que a Fazenda da Universidade bem administrada chega para os Ordenados, e para os estabelecer maiores.

O senhor Moura. - A mim parece-me, Senhores, que a disposição do §. 1.° deste projecto só se restringe, como já disse, ás Commendas, e bens da Coroa, que vagarem; e as que são dadas a Corporações, como por exemplo a Universidade, ainda que variem no individuo, não varião no destino de pertencer áquella corporação, e por isso nunca se póde dizer que vagão porque nunca revertem para o doador. - Porém eu pertendo olhar este negocio por outro lado; pois que se permittido combinar este § com o do original prometo no que respeita ás Commendas de Malta. - O fim deste Decreto he amortizar a divida do Estado, e consolida o Credito publico do Thesouco com esta applicação. Fins urgentes, que a Assembléa deve trabalhar por alcançar com não interrompida deligencia - Mas se eu mostrar que outra providencia póde ter estes mesmos fins, sem ter os seus inconvenientes parece que deve preferir a sua adopção. He claro.

Ora logo mostrarei os inconvenientes de acabar com os melhoramentos das Commendas da ordem de Malta, vamos primeiro reflectir nas vantagens da outra providencia, que pertendo substituir a esta.

Se o Cavalleiro de Malta he Cidadão, está subjeito, como os outros a todas as conclusões do Pacto social, por isso que he participante das ventagens, e commodidades da associação - A primeira, e a

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mais sagrada destas condições he contribuir para ai necessidades do Estado na proporção de suas faculfades. - O Cavalleiro de Malta, que tem o Beneficio simples de huma Commenda a titulo lucrativo, e eu as rendas não são o fructo de seus suores, e de suas fadigas, dicta a justiça publica, que este Cidadão preencha de huma maneira mais pesada aquella condição do Pacto social. Não he hum pai de familias, e isto basta para que deva pagar não só o quinto, mas o terço, ou ametade do seu rendimento liquido; e fazendo-se desta forma ahi temos o crédor do Estado mais satisfeito porque vê desde logo entrar dinheiro na caixa de amortização, e não está esperando pela vacancia eventual da morte do Commendador. Não se arriscão elles tanto nas suas Caravanas para pôr muita confiança nestas contingencias. Esta mesma providencia he pois mais directa, e a que se propõe tem por inconveniente o dar huma idea de que o nosso principal objecto he destruir a ordem. Não trato a questão se a ordem está desviada, e relaxada em seu venerando instituto, nem se a applicação destes Dizimos deve continuar a ter o mesmo destino tão justificado o seu começo pelas fadigas destes Paladinos da Religião que professamos. Para mim basta que seja huma classe de recordações historicas tão respeitaveis para não dever adoptar hum meio, que indirectamente promove a sua abolição sem necessidade. - Devemos afastar das nossas decisões tudo o que póde ter hum leve indicio de vindicta. - O problema da regeneração he facil de resolver, se acaso elle consiste só em derribar; porque então não he preciso sahirmos hoje daqui sem o resolver. - A difficuldade está em reformar com o menos mal possível dos individuos, e das classes do Estado. Ora fazer contribuir a ordem de Malta para as urgencias publicas não extingue a ordem, e corresponde mas directamente aos fins do Decreto, que para mais são sagrados, e urgentissimos. - Este he o meu voto.

O senhor Peixoto. - Quando ha pouco me propunha a fallar sobre esta declaração do Projecto do Estabelecimento de Fundo para amortização, em combinação com o Artigo 3.° delle; tinha para dizer em substancia o mesmo, que melhor do que eu o faria, propoz o Illustre Preopinante senhor Moura: por isso só accrescentarei algumas reflexões ácerca da Ordem de S. João de Jerusalem em particular.

Parece-me: que a prohibição do progresso no melhoramento das Commendas aos Commendadores involve manifesta injustiça feita aos Cavalleiros, que estão a cabimento; em quanto os exclue do ingresso nas Commendas de menor lote.

Os Cavalleiros são filhos de huma Ordem approvada pela Nação desde o principio da Monarchia: despenderão com a sua entrada, com a sua manutenção; habilitárão-se competentemente, e segundo a Ley; e consequentemente, por hum novo Regulamento, que agora fazemos, não devem ser privados dos benefícios que a sua Profissão lhes promettia.

Alem disso a Ordem de Malta he huma Pessoa moral, que possue proprio: poucos dos bens que constituem a sua dotação provierão originariamente da Corôa: antes parece; que os nossos Reys não forão por ella tão desperdiçados, como pelas outras Ordens Militares. Os primeiros até ao senhor D. Affonso III fizerão-lhe varas Mercês; não por mera liberal idade, mas em remuneração de importantes Serviços, que á Ordem deverão na guerra contra os Sarracenos; e pela maior parte forão de terras, que o Cavalleiros della lhes ajudarão a conquistar; e depois lotearão, e povoarão. Já o senhor Rey D. Diniz nas excessivas doações da sua minoridade não contemplou a Ordem de Malta; e só depois das contestações, que teve com o senhor Infante D. Affonso; porque os Cavalleiros della, assim como os das outras Ordens, lhes prestarão poderoso, e fiel auxilio, principalmente no cerco de Portalegre, lhe remunerou este Serviço com a Mercê de alguns Padroados: e posteriormente, quando o Papa Clemente V no Conero de Vienna, pela condemnação, e extincção dos Templarios doou á Ordem do Hospital de S. João todos os bens, direitos, e jurisdicções, que elles possuião em qualquer parte do Mundo; resolveo os de Portugal; porque o senhor D. Diniz não lhe tenha estado pela conta. Dahi em diante não me consta, que a Ordem de Malta obtivesse mais doações Regias: e observo, que as suas Commendas, pela maior parte, procedem de fundos, e rendimentos, havidos por Doações de particulares; heranças; espolios de Freiras; e até por compras.

Em taes termos os Cavalleiros, sendo Membros daquelle Corpo moral, tem indisputavel direito da participarem da sua commum substancia. Estraião-se embora das riquezas da Ordem recursos para a imperiosa urgencia publica; mas seja pelo todo, sem injuria de alguma das suas partes. Extinga-se por huma Ordem, no que toda a Assembléa será conforme; mas por consumpsão, e não por amputações.

Por tanto o meu voto quanto ás Commendas em geral he: que não se perturbem os direitos adquiridos legitimamente, e em boa fé; e se adopte o arbítrio do Illustre Preopinante o senhor Moura.

O senhor Borges Carneiro. - Como Membro da Commissão de Fazenda he-me necessario dizer alguma cousa sobre o que reflectio o senhor Moura. Pertendeo a Commissão que se offendesse o menos possivel o direito da propriedade. Todo o Mundo sabe que os Commendadores tem soffrido grandíssimos gravames, que tem só fiel de grandes impostos; por isso quiz a Commissão da Fazenda que não continuassem os gravames de pagarem os Commenadadores hum termo da sua Commenda, e julgou mais benigno que elles as gozassem e desfructassem, em vida; mas logo que fossem vagando se applicassem á divida Publica. Isto não he querer extinguir a ordem. Os Commendadores gozão da plena fruição de suas Commendas: em tanto na necessidade publica vão-se provisionalmente applicando para este grande tem de satisfazer a divida Publica. Todo o Mundo sabe que nos princípios da Igreja até ao seculo 8.º não havia Dizimos alguns, inda não havia esto estabelecimento tão posterior ao estabelecimento da Igreja tal qual

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hoje existe. Só no seculo 8.°, depois que os Reys Francos se unirão com os Pontifices, he que se estabelecerão os dizimos. No tempo de S. João Chrisostomo dizia, elle que ha huma obra muito rara, muito digna de admirarão ouvir fallar de pagar os dizimos. Estabelecêrão-se pois os dizimos 800 annos depois do estabelecimento da Igreja: elles erão applicados ao conceito dos Templos, e a sustentação dos Ministros do Altar. Havia a celebre divisão quadripartita, e em algumas Igrejas tripartita, isto he, os dizimos erão applicados para sustentação do Clero, fabrica das Igrejas, sustentação dos pobres, etc. Com o andar do tempo as cousas se profanarão, os dizimos se desviarão dos seus santos fins, e forão applicados a fins meramente profanos: este o systema em que hoje se achão. Os Bispos, que certamente reclamarião contra estas innovações que se fazião na Igreja, e pelas quaes se tiravão os dizimos dos seus Bispados e das suas Parochias, para se applicarem ás Corporações externas contra a natureza dos meamos dizimos que não devião ser tirados daquelle lugar: os Bispos, que estavão subjugados pelos Papas por estes tempos, e nos seculos posteriores pelos Jesuitas, deixárão hir para fora dos seus Bispados os dizimos, deixárão hir aquillo que lhe pertencia. Assim ternos visto que os dizimos não são já applicados aos Parochos, muitos dos quaes nas Provincias do Reyno não tem congrua, não tem ordenados sufficientes: não são applicados aos Templos, porque huma grande parte destes se achão arruinados: estão applicados para estes Commendadores: estão applicados para sustentação de pessoas poderosas. Digo eu pois, que isto que os dizimos estão já extraviados da sua primeira instituição, estão já applicados para cousas profanas, applicados a pessoas que não fazem nada que seja para o bem da Igreja: digo que estes, gozando-os os Commendadores durante a vida, logo que vagarem sejão chamados para a divida Publica; e depois de paga ella, o Congresso lhe dará o destino que os mesmos dizimos devem ter, ou supprimindo-os, ou dando-lhe outras applicações mais conformes á sua instituição.

O senhor Soares Franco. - Sigo o mesmo parecer da Commissão. Parece melhor para os taes Commendadores o conservar-lhe esta renda total, e quando vagarem as suas Commendas servirem para amortizara da divida Publica, porque talvez pesasse muito tirar-se-lhe já hum terço ou mais. Em quanto á Necessidade do Estado póde ser que desta sorte que propoz hum preopinante se supprisse melhor, porque entrava a gozar o Erario desde já aquelles bens; mas no entretanto atacava-se a sua posse, e seria preciso generalizar a medida, e sono caso de extrema necessidade he que já poderá atacar a posse; por isso sou do parecer da Commissão. E fallando da instituição da ordem de Malta em geral, Ella foi feita no tempo das Cruzadas, e o que hoje existe não tem relação com os seus primeiros institutos; entre tanto agora não se trata se se hade acabar com a dicta ordem de Malta, esta quentão não pertence ao objecto, e não se deve tratar della. A outra emenda he relativa aos Canonicatos da Universidade: a meu ver elles não vagão rigorosamente, porque estão applicados para aquelle destino, e por isso parece que não vagando elles rigorosamente, não se deve fazer applicação neste caso. Entre tanto isto não implica, que em acaso as necessidades do Estado, e a diminuição das rendas por tal que seja necessario taxar hum terço ou metade do rendimento das Commendas (porque ellas não pagão senão huma Decima Ecclesiastica) se tome, e adopte esta medida, mas não agora, porque he muito conveniente que não se ataque a Propriedade.

O senhor Moura. - Nunca a propriedade do Cidadão he atacada quando todos contribuem para as necessidades do estado: todo o Cidadão deve concorrer rara ellas, porque esta he a condição do Pacto Social, e a condição porque elle goza das suas vantagens membro daquella Sociedade. Perguntaria eu agora: se os Commendadores que recebem as suas Commendas a titulo lucrativo, sem ser com o suor de seu rosto, não são os Cidadãos que estão em circunstancias de concorrer melhor para as necessidades do Estado! Talvez alguns dirão, que se faz com que os Commendadores concorrão para as necessidades do Estado de huma maneira mais prezada do que os outros Cidadãos. Mas como a razão que se allegou nada obsta, e como se concede que seria melhor para o bem do Estado o adoptar-se a medida que propuz, ella parece que se deverá adoptar.

O senhor Peixoto. - Não posso descobrir em que consista essa maior offensa do direito de propriedade: em quanto estou certo, que os proprios Commendadores actuaes, se fossem consultados, preferirião o sacrificio de huma porção dos rendimentos, ao das vidas, e progresso na ordem das Commendas: e não sei qual seria mais util á Fazenda Nacional para o fim propo-lo.

O senhor Pimental Maldonado. (Vinha o nome somente, e nenhuma palavra do discurso)

O senhor Miranda. - Apoyo a proposição do senhor Maldonado: he da minha opinião que todos os homens que fazem serviços á Nação, e trabalhão pelos interesses publicos, sejão sempre attendidos; por isso não direi que estes sejão privados das suas Commendas. A respeito das da Universidade de Coimbra direi, que nada ha mais justo do que serem recompensados aquelles que se applicarão. Agora a respeito dos Commendadores de Malta, que nenhum serviço fazem, não me agrada que elles são contemplados como os outros. Elles já não trabalhão nas Costas da Barbaria, nós já não temos Turcos que vencer... (O mais não ouvi - diz o Tachygrapho)

O senhor Castello Branco. - Os Illustres Preopinantes tem-se desviado da questão principal trata-se de huma medida provisoria para formar huma caixa de amortisação, e trata-se para isto mesmo de hum plano do contribuição geral. O projecto que está em discussão, não diz huma unica palavra sobro contribuições. Os Illustres Preopinantes que tem fallado sobre este artigo que julgão necessario, parece que devião formar sobre isto hum projecto differente,

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porque isto he susceptivel de grande discussão, e eu acho perigoso nas circunstancieis actuaes dar-se a melhor idea de que se trata, de contribuição; porque este he sempre o ultimo recurso de que se deve lançar mão. Restringindo-me agora ao assumpto do projecto eu digo, que me parece muito conforme com a rasão o arbitrio de que as Commendas que vagarem, por morte dos que as possuem, haja vidas ou não, entrem os seus rendimentos para a caixa da amortização, isto mesmo he mais favoravel áquelles que as possuem, porque entretanto ficão desfrutando os seus rendimentos, e não se ataca a propriedade. A respeito dos Commendadores, de Malta, que he huma instituição particular, nestas Commendas não ha vidas, e talvez que os Commandadores de boa vontade se prestassem a huma contribuição desde já, fosse qual fosse, huma vez que o Congresso lhes desse huma certeza de que a ordem ficava subsistindo para o futuro. Porem julgo que não he lugar detratar esta questão, porque nem mesmo a materia que está em discussão a admitte de maneira alguma. A respeito das Commendas da Universidade diz-se que a necessidade publica exige estas medidas. Ninguem o reconhece melhor do que eu, as Corporações particulares devem, ceder a esta necessidade geral: entretanto parece haver huma equivoca cão sobre o modo de o har a Universidade. A Universidade de Coimbra não he hum estabelecimento particular, a Universidade de Coimbra, he hum estabelecimento publico, e he neste, sentido unicamente que nós, a devemos olhar. Todos vêem que se não houvesse Universidade nós não teriamos Magistrados para os Tribunaes, nós não deriamos indivíduos para outros estabelecimentos de que depende a boa Administração publica: por consequencia a Universidade não he huma Corporação de Regulares, que como donataria da Coroa póde subjeitar-se a taes ou taes encargos, e pouco importa á Sociedade em geral que ella viva em maior ou menor abundancia, porque deve prestar-se aos sacrificios que a necessidade publica exige. Huma Universidade he hum estabelecimento publico: se os Professores, não forem pagos o estabelecimento publico acabam: por consequencia não se deve olhar aos rendimentos da Universidade que são precisos para pagamento dos seus Membros como sendo da mesma natureza dos bens publicos. E por estes motivos acho que, apesar de todas as necessidades publicas, se deve fazer huma excepção nas Commendas da Universidade.

Perguntou-se se estava discutido o artigo, e disse: O senhor Moura. - Sobre o primeiro artigo tinha huma reflexão a fazer para lhe tirar toda a ambiguidade. (Leo o artigo.) Parece dar-se a entender que se trata de vender todos estes bens, quando julgo que o parecer da Commissão he só applicar os seus rendimentos, muito mais pelo que respeita aos direitos Reaes. Por isso parece-me, que seria, bom que a Commissão exprimisse mais claramente que ficavão applicados para amortização da Divida Publica, não a essência dos bens, mas os seus rendimentos.

Julgando-se a materia bastante discutida, propoz o senhor Vice-Presidente:

1.° Se devião exceptuar-se as Commendas da Universidade? E quasi unanimemente se decidio que sim.

2.° Se desde já devião collectar-se todas as Commendas a beneficio do cofre de amortização? E por grande maioria se decidio que não.

3.° Se devião desde já ser collectadas as Commendas da Ordem de Malta? E decidio-se que não.

4.º Se assim ficava approvado o parecer da Commissão, conforme ao additamento do senhor Alves do Rio? E decidio-se que sim.

O senhor Sousa e Almeida, por parte da Commissão Militar, leo o seguinte:

RELATORIO, E PROJECTO DE DECRETO.

A Commissão da Guerra, encarregada de redigir hum Decreto, que regule o tempo de serviço dos Officiaes Inferiores, e Soldados do Exercito, a fim de terem a inalteravel certeza do dia em que deverião ter baixa: Tem a honra depor na Presença das Cortes as Considerações que fez, e servirão á redacção do Decreto.

1.° A força effectiva do Exercito he muito grande pela sua adhesão á Constituição, pela sua gloria adquirida na passada guerra, em que deo as mais decisivas provas de valor, de constancia nas privações, e de firmeza nos perigos, e mais ainda por ser elle que deo o movimento para a nossa Regeneração Politica, no que se fez credor ao reconhecimento, da geração presente, e das
futuras, e á sua admiração. Esta força porém he toda moral, e a sua força; fysica he pequena, e não susceptivel de ser diminuida, por em quanto: porem as Cortes desejão, e esperão que não esteja longe a épocha feliz de poderem diminuir o mesmo Exercito, proporcionando-o a população, e á possibilidade das Despesas do Thesouro Nacional.

2.° Que sómente depois de feita a Constituição, a Ordenança para o Exercito regulará sabiamente tudo o que pertence ao pessoal, e material do mesmo Exercito: He nesta Ordenança que será definitivamente designado o numero de annos, que os Soldados devem servir a sua Patria, com a certeza de não continuarem hum só dia mais de serviço, aquelles que quizerem a sua baixa: he nesta Ordenança que se regulará a entrada no Exercito, das novas Recrutas, que deve ser na mesma epocha, e na mesma proporção que se derem as baixas aos que tivessem servido sem nota; o que tem huma immediata relação, e dependencia da força, que em cada hum anno as Cortes Decretarem. Mas que he provavel que estas baixas, e Recrutas sejão em cada hum anno na rasão de hum decimo da força effectiva do Exercito, e que sejão as baixas concedidas aos voluntarios, e aquelles que tiverem maior numero de annos de Serviço, feito sem nota, até decorrerem o numero de annos em que todo o Exercito esteia renovado de Soldados Recrutados, pelo systema Constitucional, pela entrada de hum decimo, ou mais, se for compativel com a população, etc. vindo por este princi-

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pio a esperar-se que o maximo tempo necessario para a renovação do Exereiro, sejão dez annos; por quanto seria absurdo renova-lo por metades, ou por huma só vez.

3.° A Commissão respeitosamente se poupa a mais extensas considerações, e (ulga poder ser sufficiente aos generosos, e bemfazejos sentimentos das Cortes, o seguinte Decreto.

"As Cortes Extraordinarias, e Constituintes, etc. Considerando que e situação Politica actual destes Reynos não permitte reduzir já o Exercito áquelle pé em que ha de ficar, depois de feita a Constituição, e será regulado pela Ordenança que se fizer para o Exercito; mas não desejando demorar o conhecimento da épocha em que começarão as baixas no Exercito, e o tempo fixo, e certo, que os Soldados deverão servir para o futuro, Decretão o seguinte:

1.° Para o futuro todos os Cidadãos são obrigados a servir no Exercito: os que servirem na Infanteria, sómente servirão por oito annos; na Cavallaria, e Artilheria, sómente por dez annos; os voluntarios por menos, tantos annos quantos forem aquelles que tiverem servido, antes de serem designados pela sorte: As suas escusas lhe serão dadas immediatamente, pela maneira que determinar a Ordenança.

2.° Do 1.° de Janeiro de 183S por diante se começárão a dar as baixas, não menos que na rasão de hum decimo da força effectiva naquelle dia.

3.° Serão comprehendidos nas baixas os voluntarios que se acharem na disposição do Artigo 1.°, e a quizerem, e os que não forem voluntarios, que não forem voluntarios, que não verem maior numero de annos de serviço, sem nota de deserção.

4.° Nos anhos successivos se continuarão a dar baixas na conformidade do Artigo antecedente, e na rasão de li um decimo da força effectiva, ou outra maior rasão que as Cortes decretarem, até se renovar o Exercito, e ser possível praticar-se a regra inalteravel das babas, e recrutamento, que for determinada na Ordenança para o Exercito.

A Regencia, etc. = Sallão das Cortes 21 de Março de 1821. - Francisco de Magalhães de Araujo Pimentel. - Bernardo Corrêa de Castro e Sepulveda. - Alvaro Xavier da Fonseca Coutinho e Povoas. - José Maria de Sousa Almeida. - Antonio Maria Ozorio Cabral. - José Antonio da Rosa. - Barão de Molellos. - Manoel de Vasconcellos Pereira de Mello. - José de Mello e Castro de Abreu. - Francisco Xavier Calheiros.

O senhor Sousa e Almeida apresentou tambem os papeis remettidos á mesma Commissão com o Officio do Marechal de Campo Gabriel António Franco de Castro, declarando a Commissão que julgava não dever dar o seu parecer sobre o assumpto do mesmo Officio, ao que disse:

O senhor Xavier Monteiro. - O negocio de que se trata he a defesa de Costa, é isto pertence ao poder Executivo: nós não devemos determinar nada a este respeito senão nos casos extraordinarios, e urgentes. Compete pois á Regencia dar as ordens positivas sobre este assumpto, e no caso de se entender que não são sufficientes, deverá então tomar conhecimento o Congresso.

O senhor Ferreira Borges. - Huma cousa he a defesa da Costa, e sobre isto julgo com o Illustre Preopinante: e outra cousa he a vinda de Sua Magestade, ou alguem da sua familia: com isto não tem nada o Poder Executivo, mas sim as Cortes; e parece-me que não faríamos mal nenhum se se nomeasse huma Commissão especial, para se saber qual deve ser o nosso procedimento a este respeito.

O Senhor Borges Carneiro. - Devemos tomar medidas sobre a chegada de Sua Magestade: o silencio do Rio de Janeiro tem espantado muitos Negociantes da Praça de Lisboa: isto pede providencias muito vigilantes, e o meu parecer he que em tudo que pertence a dar instrucções aos Commandantes da Costa que se dêem, e que em quanto ao outro projecto a Commissão Militar fique encarregada de dar o seu parecer.

O senhor Povoas. - Não devemos confundir a questão. Ha Tratados que regulão a entrada dos Navios na barra de Lisboa, o os Vasos que devem entrar no caso de se apresentar numa Esquadra. Sobre isto he necessario que os Commandantes das Tortos teu hão esclarecimento do que devem fazer no caso da vinda de Sua Magestade, e sobre isto he a questão, se o Congresso julga que deve auctorizar a Regencia para tomar as medidas que julgar convenientes.

Houve diversos votos de que o assumpto fosse tratado pela Commissão Militar, pela de Legislação, e em Sessão secreta, ao que disse:

O senhor Moura. - Não posso ser de opinizio que hum assumpto de tanta gravidade se trate em Sessão secreta. Nós não estamos em circunstancias de tornar medidas offensivas e defensivas para o caso proposto: tratamos de deliberar á vista de toda a Nação qual he a contemplação que devemos ter quando S. M. chegar á barra, ou qualquer Pessoa da sua Augusta Familia; e devemos discutir este ponto com clareza, porque esta clareza fixa a opinião do Publico, e do Reyno, e marca a linha dos deveres que nos competem em tão melindrosas circunstancias, A verdade e a franqueza amão a luz: só ás tortuosas vistas da política fraudulosa he que convém a obscuridade.

O senhor Borges Carneiro. - Este Congresso que não teve duvida era mandar promulgar a Ley que liga S. M. e toda a Real Familia a certos deveres, tambem não duvidará á face de toda a Nação declarar a maneira porque S. M. deve ser recebido, e as medidas que devem tornar-se em quanto se não sabe qual lê o partido que S. M. adopta no estado actual das cousas. Porém digo que se devem dar com brevidade essas providencias, porque eu nunca serei de parecer que se espere o mal paia depois, lhe applicar o remedio.

O senhor Freire chamou a attenção do Congresso para dar instrucções relativas á entrada das Embarcações de Guerra que podem acompanhar S. M., dizendo: que S. M. poderia apresentar-se com huma Esquadra Portugueza, combinada com outra Ingleza, etc., etc.

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O senhor Xavier Monteiro. - Não he a força armada que nós devemos temer, visto que a Esquadra Portugueza, como todos sabem, tem apodrecido fundeada no Rio de Janeiro. Se alguma cousa ha para recear he da influencia moral, que se funda em abusos de educação, e em interesses particulares. Posto que por gloria da Nação Portugueza eu deva dizer , que os homens de differentes opiniões politicas ora parte alguma tem vivido juntos com maior tolerancia do que em Portugal, depois que a nossa Regeneração teve principio.

O senhor Soares Franco foi do mesmo parecer, e a final resolveo-se;

Que em quanto á defesa do Porto de Lisboa, e suas Fortalezas, á Regencia competia o dar as necessarias providencias. - E que em quanto ás instrucções para os Commandantes, e Auctoridades no caso da chegada improvisa de S. M., do Principe Real, ou de outra alguma Pessoa da Familia Real, ficassem encarregadas á Commissão da Constituição, ajuntando-se-lhe outros dous Membros, os senhores Povoas, e Vasconcellos.

A Commissão Ecclesiastica representou que lhe falta vão tres dos seus Membros, e resolveo-se que fossem chamados os seus immediatos em votos.

Determinou-se para a Orcem do dia da Sessão seguinte o progresso da discussão do Projecto sobre os Bens Nacionaes, e amortização da Divida Publica, com o Additamento.

Levantou o senhor Vice-Presidente a Sessão á hora do costume. - Francisco Barroso Pereira, no impedimento do Primeiro Secretario.

AVISOS.

Para o Conde de Sampayo.

Illmo. e Exmo. Senhor. = As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação Portugueza, Tendo de declarar os nomes, graduar e remunerar os serviços dos insignes Varões que prepararão, realizarão, e desenvolverão os memoráveis feitos de 24 de Agosto, e 15 de Septembro de 1820, Ordenão, que a Regencia do Reyno remetta a este Soberano Congresso todas as informações e documentos que possão obter-se sobre este importante objecto. O que V. Exa. fará presente na Regencia, para que assim se execute.

Deos guarde a V. Exa. Paço das Cortes em 21 de Março de 1821. - João Baptista Felgueiras.

Para o Conde de Sampayo.

Illmo. e Exmo. Senhor. = As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação Portugueza, Determinão que a Regência do Reyno remetta a este Soberano Congresso huma Relação de todos os Officiaes Inferiores, e Soldados do Exercito, que tiverem trinta e oito annos de idade, e dahi para cima, e outra dos que tiverem vinte annos do serviço, e dahi para cima. O que V. Exa. fará presente na Regencia para sua intelligencia, e execução.

Deos guarde a V. Exa. Paço das Cortes em 21 de Março de 1821. = João Baptista Felgueiras.

Para o Conde de Sampayo.

Illmo. e Exmo. Senhor. = As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação Portugueza, Attendendo á Representação de alguns habitantes da Cidade do Porto, na qual propõe que as Minas Nacionaes de S. Pedro da Cova se administrem por contracto; conhecendo que geralmente se deve adoptar esta practica com preferencia á das Administrações por conta da Fazenda Pubica, mas que isto não póde ser applicavel ao caso presente, sem se obterem averiguações que precisa, e pede a Commissão de Artes, e Manufacturas: approvando as Cortes a seu relataria, e opinião constantes da copia inclusa: Determinão que a Regencia do Reyno Ordene, que o Senado da Camera do Porto de sobre este objecto as mais exactas informações, e responda a todos os artigos inseridos no mesmo relatorio; e que o Director das referidas Minas seja tambem encarregado de auxiliar o Senado com a sua instrucção e conhecimentos, a fim de se alcançarem com a maior brevidade os necessarios esclarecimentos, os quaes serão enviados a este Soberano Congresso, para se darem as providencias que forem convenientes sobre hum ramo tão util, e interessante á prosperidade Nacional. O que V. Exa. fará presente na Regencia, para que assim se execute.

Deos guarde a V. Exa. Paço das Cortes em 21 de Março de 1821. - Agostinho José Freire.

Para o Conde de Sampayo.

Illmo. e Exmo. Senhor. = As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação Portugueza, Ordenão que a Regencia do Reyno remetta a este Soberano Congresso as Pautas das Alfandegas, e Mappa de direitos por entrada e sahida com apontamento das Leys, de que procedem; huma relação dos Empregados das mesmas Alfandegas, seus nomes, Officios, emolumentos, Leys, e Regimentos respectivos; e finalmente os Tratados existentes. O que V. Exa. fará presente na Regencia, para que assim se execute.

Deos guarde a V. Exa. Paço das Cortes em 21 de Março de 1821. - João Baptista Felgueiras.

Para o Conde de Sampayo.

Illmo. e Exmo. Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação Portugueza, Ordenão que a Regencia do Reyno faça logo suspender as admissões e entradas de Noviços para as Ordens Religio-

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sas, e Militares, exceptuando unicamente os Conventos dos Freires de Christo, Santiago, e Ayis, estabelecidos em Coimbra. O que V. Exa. fará presente na Regencia, para que assim se execute.

Deos guarde a V. Exa. Paço das Cortes em 21 de Março de 1821 - João Baptista Felgueiras.

Para o Conde de Sampayo.

Illmo. e Exmo. Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação Portugueza, Ordenão que nas Alfandegas e Casas Fiscaes sómente sejão feriados os Domingos e Dias Santos de Guarda. O que V. Exa. fará premente na Regência do Reyno, para que assim se faça executar.

Deos guarde a V. Exa. Paço das Cortes em 21 de Março de 1821. = João Baptista Felgueiras.

Para Antonio Rebello Palhares.

Illmo. Senhor. = As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação Portugueza tem determinado receber ámanhã ás onze horas para o moio dia os cumprimentos de despedida para que V V. SSas. rogarão ser admittidos, por occasião da sua partida para a Ilha da Madeira: O que V. Sa. fará constar aos outros dous Deputados encarregados desta honrosa Commissão pelos Moradores da mesma Ilha.

Deos guarde a V. Sa. Paço das Cortes em 21 de Março de 1821. = Agostinho José Freire. = Senhor Antonio Rebello Palhares.

LISBOA: NA IMPRESSÃO NACIONAL.

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