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nhão as qualidades necessarias: 2.° que em quanto ao gado muar se venda em hasta publica, como já se praticou no anuo passado: 3.° que seja transmitida ás Cortes uma conta circunstanciada da administração das sobreditas manadas, declarando qual he o numero e ordenado de seus empregados, quantas são as cabeças de gado que actualmente existem, as herdades e terras que se occupão para as suas pastagens, e qual o regimento por que a mesma administração se regula. O que V. Exa. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exa. Paço das Cortes em 4 de Outubro de 1822. -. João Baptista Felgueiras.

Para Francisco Moniz Tavares.

As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza concedem a V. Sa. quinze dias de licença para tratar da sua saude. O que participo a V. Sa. para sua inteligência.

Deus guarde a V. Sa. Paço das Cortes em 4 de Outubro de 1823. - João Baptista Felgueiras.

Redactor - Galvão.

SESSÃO DE 5 DE OUTUBRO

ABERTA a sessão, sob a presidência do Sr. Trigoso, leu-se a acta da antecedente, que foi approvada.

O Sr. Secretario Felgueiras deu conta do expediente mencionando o seguinte:

1.° Um officio do Ministro dos negocios do Reino, remettendo uma representação de Antonio Soares Lobo, acompanhada das informações da camará do Monte Mor o Novo, mesa da misericórdia, e do prior administrador do hospital da dita villa, sobre a não da administração deste á da dita misericórdia. Passou á Commissão de saúde publica.

2.° Outro officio de mesmo Ministro, remettendo os autos da devassa a que se procedeu, acerca dos abusos e prevaricações, que se dizião commetidas na administração da fabrica nacional das sedas: e bem assim todas as consultas, que do um anno a esta parte tem sido dirigida. no Governo, e que se achão findas. Passou a Commissão das artes.

3.° Outro officio do Ministro dos negócios da justiça, remettendo a relação dos vasos sagrados, paramentos, thesouro, e mais alfaias pertencentes á igreja patriarcal. Passou á Commissão ecclesiastica de forma.

4.° Outro officio do mesmo Ministro, remettendo uma consulta da junta do commercio sobre o requerimento de João fieira Caldas, em consequencia da ordem das Curtes de 19 de Abril próximo passado. Passou a Commissão do commercio.

5.º As felicitações dirigidas pelas camaras das villas de Palmella, Barços, Alcácer do Sal; e pelo brigadeiro graduado chefe do regimento de artilheria n.°2 Diocleciano Leão Cabreira, em seu nome e dos officiaes e mais praças do dito regimento. Mandou-se fazer menção honrosa.

6.° Outra felicitação do juiz de fora de Espozende João de Brito Osório. Foi ouvida com agrada.

7.° Outra felicitação do reitor da freguezia da Honrade Escalhão Luiz José Ferreira de Carvalho. pelo o aumento das côngruas do párocos. Ficarão as Cortes inteiradas.

8.º Outra felicitação assignada por vários cidadãos da villa de Alvilo, pelos beneficios recebidos em consequência de varias disposições do soberano Congresso. Ficarão as Cortes inteiradas.

9.° Um offerecimento feito pelo prior de Palmella Caetano José Lucas e Silva, de uma projecto de código do culto para o Reino Unido. Mandou-se remetter á Commissão ecclesiastica de reforma.

10.° Uma caria do Sr. Deputado Manuel Paes de Sande e Castro, datada de S. João da Pesqueira em 28 do passado, em que, acusado a recepção da ordem das Cortes que o chamava para assignar e jurar a Constituição, participa tela recebido fora do tempo necessário para chegar no dia marcado, e que mesmo o seu estado de saúde não permittia, nem permitte, o poder partir com a brevidade exigida. Ficarão as Cortes inteiradas.

11.° Outra carta do Sr. Barão de Molellos, em que pede um mez de licença para tratar da sua saude. Forão-lhe concedidos quinze dias.

13.° Outra carta do Sr. Deputado Malaquias pedindo vinte dias pelo mesmo motivo. Forão-lhe concedido quinze dias.

O Sr. Secretario Basilio Alberto apresentou uma felicitação do juiz de fóra de Lamega, José de Abreu Carneiro e Vasconcellos, que foi ouvida com agrado: e mais uma representação do juiz ordinário de Outil, que foi rematada á Commissão de petições.

Mandou-se lançar na acta uma declaração de voto do Sr. Castro e Silva, concebida nestes termos «Declaro que na sessão de ontem votei contra a suppressão total do resto do artigo 6 º, e igualmente votei contra a segunda parte do parecer das Commissões reunidas, quanto á venda das vinte e três bestas muares.

Feita a chamada, acharão-se presentes 112 Deputados, faltando com licença os Srs. Sepulveda Canavarro, Perreira do Carmo, Feijó, Aguiar Pires, Villela, Leite Lobo, Baeta, Fortunato Ramos, Cirne, Faria, Moura, Sousa e Almeida, Alencar, Rebello da Silva, Martins Basto, Luiz Monteiro, Pinto da França, Bandeira: e sem causa reconhecida os Srs. Gomes Ferrão, Quental da Camara, Ribeiro de Andrade, Bueno, Barata, Lyra, Agostinho Gomes, Bettencourt, Araujo Pimentel, Moniz Tavares, Almeida e Castro, Lopes da Cunha, Vicente da Silva, Belford. Rosa, Lino Coutinho, Melo e Castro, Moura Coutinho, Costa Aguiar, Isidoro dos Santos, Sande e Castro, Zefyrino dos Santos, Castello Branco Manuel, Vergueiro.

Representando o Sr. Secretario Soares de Azevedo o embaraço em que se acha de não saber, se devia contar como sem causa motivada a falta daquelles Srs.

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Deputados, que tendo sido chamados, não havião comparecido, mas tinhão exposto as razões das suas faltas,- disse

O Sr. Felqueiras: - Assento que todos aquelles que tem dado parte da sua impossibilidade estão legitimamente impedidos, e devem entrar no numero dos que faltão com causa, ainda que não tenhão pedido licença.

O Sr. Fernandes Thomaz:- Sr. Presidente, he necessario tomar medidas a este respeito: o Sr. Deputado Faria ha um anno que não comparece no Congresso, tendo saido de Lisboa para Coimbra sem licença das Cortes. Este procedimento não he coherente com as funções de um Deputado; se tem razoes pura não poder servir, proponhas, para se tornarem em consideração. Foi assim que louvavelmente praticou o Sr. Brotero: veio ao Congresso, serviu alguns dias, e mostrando que a sua moléstia lhe vedava a continuação dos trabalhos, as Cortes não lhe derão adimissão, mas concedêrão-lhe algum tempo de licença: fez todos os esforços para exercer o cargo de que a Nação o encarregada, porém conhecendo a final que as suas moléstias se aggravavão demasiadamente, fez nova proposta, pedindo a sua demissão. Isto entendo eu que he regular, porque assim ficou vago o lugar daquelle Deputado, e chamou-se o seu Substituto; mas que quer dizer estar a nação pagando uma gratificação a quem a não serve? Isto até lie faltar á decência publica.

O Sr. Presidente convidou o Sr. Fernandes Thomaz a fazer uma indicação por escrito a este respeito.

Passando-se á ordem do dia continuou a discussão dó projecto sobre a organização das relações provinciaes que ficara adiado na sessão antecedente; e feita a leitura do artigo 27, disse

O Sr. Gyrão: - Sr. Presidente, muitas vezes lenho ouvido dizer neste augusto recinto, que quando a necessidade bate á porta, a honra foge pela janella; e quererá o soberano Congresso pôr os desembargadores nestas circunstancias? Certamente não. O poder judiciário está em immediato contacto com o povo; se executar as leis com inteireza , se for affavel para as partes, livre de toda a qualidade do soborno, e desempenhar perfeitamente suas importantes funções, o povo dirá, quanto he bom o systema liberal! já temos justiça! Mas se nós taxarmos ordenados tão mesquinhos, como estabelece o projecto em questão, que acontecerá? Um geral desgosto, uma impossibilidade de ser honrado; porque a necessidade bate á porta, e finalmente veremos o que dantes víamos. Permitia-me V. Exca., que eu leia o preambulo da lei de 13 de Maio de 1814, porque elle vale um bom discurso, melhor do que eu posso fazer (leu). Eis aqui razões bom solidas, razões mui fortes, que muita attenção merecerá. Nós devemos considerar, que os desembargadores tinhão dantes grandes emolumentos, servião (alguns) as casas de aggravos, e podião ter outros empregos; alem disto gozavão de muitos privilegios, cestavão na estrada, que conduzia ás honras de alcaidarias móres, commendas, etc.; agora tira-se-lhes muito destas cousas, e ainda em cima se hão de deixar nas tristes circunstancias de não poderem sustentar uma família, de serem talvez celibatários para poderem passar! Senhores, nós todos sabemos o que são 4 mil cruzados, se um desembargador não tiver mais nada, elle se vera obrigado a arrastar a beca pelo chão, indo a pé á relação; e se for de sege, então não terá que comer, nem que vestir. Eu não sou suspeito; porque nem sou desembargador, riem o posso ser; falo só pelo bem publico, e até não faria este argumento, se ontem não ouvisse outros similhantes. Gosto que se fação economias, mas hão de ser aquellas que mais podem aproveitar á nação; por exemplo, está ahi a preza da Heroina apodrecendo no Tejo, e os requerentes perdendo a paciência, e o tempo; desejava que as cousas se reformassem de modo que os ministros não estivessem a zombar, e a chicanar com os interessados naquella preza, que economizassem o que já se tem lançado ao mar por estar corrupto, e que se poupasse o escandalo geral desta cidade. Mandou este soberano Congresso rever uma sentença d'um desgraçado, falsamente accusado por crime de contrabando de tabaco, e já lá vão 6 mezes que a triste víctima d'um déspota togado geme na prizão; pois eu desejava, que se lhe poupassem as lagrimas e as afflicções que elle tem soffrido, e que se economizassem essas contemplações de classe, e corporação, filhas do antigo despotismo, e que ião mal sabem agora nos tempos constitucionaes. Destes exemplos podia eu mencionar milhões: estas economias he que são boas, e não 50, ou 60 mil cruzados, que o projecto pertende forrar. Não deve haver em uma nação maior numero de empregados publicos do que aquelles que são precisos, mas estes devem ser bons, e ter uma decente sustentação. Da nossa parte está prover a esta sustentação sem mesquinhez, e do Governo espero eu a melhor escolha; porque não se pode negar, que a respeitável classe dos desembargadores tem entre si muitos que a deshonrão, e que agora são similhantes aos israelitas; livres do captiveiro, e marchando para a terra da promissão, chorão ainda pelas cebolas do Egipto; voto pois que os desembargadores de Lisboa tenhão 6 mil cruzados, os do Porto 5, e os das mais províncias 4.

O Sr. Borges Carneiro: - Parece que nós todos estamos conformes sobre o principio, que deve regular esta materia, e vem a ser, que os empregados públicos nem tenhão de mais, nem de menos; tenhão ordenado sufficiente para uma sustentação decorosa, e não para luxo e vaidade. A sustentação decorosa he o meio de poderem trabalhar no serviço da pátria, com inteireza, e sem dependerem dos seus súbditos e litigantes: he gratidão dessa pátria a quem servem. Ordenados excessivos gravão o thesouro nacional, e alimenta as paixões e vícios dos empregados, e os distrahem de seu serviço e obrigação. Dos bispos mandava o concilio cartaginense 4.º. que tenhão uma mesa, e alfaias pobres, e que a autoridade do seu lugar a adquirão pelas suas virtudes: mensam pauperem ac vilem suppellectilem habeat, et dignitatis suae auctoritalem vitac meritis quacrat. Assim os desembargadores hão de manter a autoridade dos seus cargos pela inteireza no julgar, e na administração da justiço,

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vitas meritis, e não por viver em palácios, dar visitas, e manter partidas. Ellas lhe estão prohibidas sabiamente pela ordenação: que seria bem bom copiar-se na presente lei, porque lhe tirão o tempo, e dão lugar a amisades nocivas á imparcial justiça. "Não acceitem visitas, diz a ordenação, senão de seus ascendentes e descendentes ou irmãos: nos mais digão-lhe da parte d'ElRei que se vão embora." Suppondo pois que a vida dos desembargadores deva ser frugal, e livre de visitas, partidas, e sociedades, e que por consequência lhes bastão ordenados para uma sustentação decorosa, resta-nos tratar agora de qual hade ser precisamente a quantidade desses ordenados. Segundo os tempos presentes julgo, que para um desembargador passar na dita forma, isto he, segundo o concilio cartaginense 4.º lhe basta 1:600$000 rs. Em Lisboa, e 1:200$000 nas mais relações provinciaes. Isto porém com duas declarações: 1.ª que quando eu digo 1:600$000 entendo 1:600$000 rs. 2.ª que esta quantia se hade pagar indefectivelmente nos prazos legaes. Não se hade estabelecer 1:600$000, e começar logo a rapar ao empregado a 4.ª parte parte de novos direitos; mais 160$000 rs. De decima, rebates de papel, exorbitantes despezas de carta, etc. etc., de sorte que por boa conta os taes 1:600$000 não são nem 1:000$000. Fora com taes embustes e cavillações; dou-to e rapto; nada de enganar o mundo. E para que? Para multiplicar escriturações, e empregos na repartição dos novos direitos e das decimas. A 2.ª cousa he que o desembargador conte certo com o pagamento no dia do vencimento; e não ande mais a rebatar por 60 o que vale 100. Os ordenados são os alimentos do empregado publico: tira-lhe estes alimentos, he matalo. Quando o ministro ou outro official de fazenda não paga um ordenado, commette um homicidio, ou segundo a nossa cartilha, um pecado que brada ao Céo. E com razão se lhes tem chamado necatores hominum. Como porém a santidade deste principio não he conhecida em Portugal, convem agora uma lei severa, e vem a ser, que o ministro ou outro official de fazenda uma vez que não pague um ordenado no dia do vencimento seja logo preso em cadeia fechada, sem se lhe admittir a escusa de não haver dinheiro; pois se o não houver, desfaça-se nele, ou tivesse largado o officio a tempo e a horas, que não faltará quem pegue. Pois como estão fartos e cheios, importa-lhes pouco quem geme na necessidade. Servi em uma provedoria onde os professores publicos andavão há muitos annos por pagar, e muitos havião abandonado as cadeiras; ao passo que o dinheiro ou estava amortizado nos cofres, ou não tratavão de o cobrar, ou o remettião para o thesouro, sem primeiro deduzir aquelles ordenados. A causa era por não terem os provedores o trabalho de mandar abrir o cofre, ou de fazer escrever as sahidas: como tinhão que comer, não lhe importava quem o não tinha. Que remedio pois neste caso? Cadeia com o provedor, donde não sairá sem pagar todas as perdas e damnos. Ora os desembargadores e mais empregados publicos se fossem assás honrados farião como o juiz de fora que ontem escreveu ás Cortes dizendo que, como não se lhe dava ordenado, e se lhe não pagava, deixava o lugar. Eu não conheço este ministro mas se, como presumo, falou de coração he justo e honrado. Supponhamos que todos os desembargadores, e ministros erão igualmente honrados, punhão os pés á parede e dizião, como me não dão ordenado sufficiente, e esse mo não pagão, não vou á relação, nem quero despachar. O Governo dizia, pois hão de ser suspensos e presos. Sim, senhor, replicavão todos elles, seremos suspensos e presos, mas não servimos em quanto não se nos pagar. Juro que logo havia de haver dinheiro; havia o que há de poupar-se melhor, e applicar-se melhor.
Por tanto pague-se pronta e indefectivelmente os ordenados, e (torno a dizer) paguem-se por inteiro. Se se assenta que para um ministro se sustentar lhe são necessários 600$000 réis, não comecem logo a dizer-lhe: dá cá a quarta parte desses 600$000 réis, e no fim do anno dá cá 60$000 réis de decima. Quando vier uma guerra, então entendo eu que contribuão todos extraordinariamente com uma, duas, ou três decimas; porém em tempos ordinarios nada de desfalcar o que uma vez se julgou ser necessario.
Outra declaração farei ainda sobre estes ordenados, e he que entendo serem além dos emolumentos ou braçagem, que devem recolher-se em um cofre, e no fim de cada mez serem distribuidos por todos os desembargadores. As propinas porém essas pelo meu voto devem-se extinguir, assim as ordinarias como as extraordinarias. Que quer dizer 4$000 réis para oculos, tanto para barbeiro, mais tanto para consuada e amendoas da semana etc. Pois que, o ordenado não he para todas essas cousas? Além de que ellas estão estabelecidas por assentos illegaes e incompetentes, e reprovadas na lei novissima. O mesmo digo das extraordinarias, 80$000 réis para um vestido pelo nascimento e falecimento de uma pessoa real, para celebração de um casamento etc. Para isso tudo he o ordenado. Os desembargadores sejão como a formiga. Poupem do verão para o inverno: contem d'antemão com estas despezas que alguns dias lhe dão de sobrevir. Por tanto voto que se abulão as propinas; que se conservem os emolumentos; e que o ordenado seja 1:600$000 réis para Lisboa, e 1:200$000 réis para todas as outras terras sem differença, por não multiplicar entidades.
O sr. Peixoto: - reconheço que aos empregados publicos nenhuma qualidade he mais necessaria, do que a independencia; e que jámais serão independentes, sem que do officio que exercitarem tirem licitamente a commoda subsistencia: he por isso indispensavel, que alimentos sufficientes para se haverem de tratar com a decencia que o seu estado pede. Não acho excessivas as quantias apontadas no artigo, e facilmente concordaria no seu argumento se não julgasse que convinha attender a outras considerações. O systema adoptado para uma classe da sociedade, não lhe deve ser exclusivo; precisa pôr-se em harmonia com as outras classes, de quem os direitos respectivos são iguaes: e as diversas partes de uma lei devem ter entre si coherencia. Do primeiro destes principios deduzo, que se agora elevassemos demaziada-

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mente os ordenados dos desembargadores, teria necessario que elevassemos proporcionalmente, não só os dos outros magistrados, mas os de todos os officiaes publicos, o que nos induziria a novos embaraços, visto o decadente estado do nosso thesouro. Do segundo principio deduzo que não póde deixar de adoptar-se a gradação do artigo, depois de haver-se adoptado no artigo 7. a respeito dos presidentes, visto que no presente caso militão as mesmas razões que em caso similhante determinarão a deliberação do Congresso. Pelo mesmo motivo de coherencia não poderiamos estabelecer aos desembargadores ordenados superiores aos do artigo para que com as assignaturas, que, segundo o projecto conservarão, não viessem a perceber maior rendimento do que o dos presidentes.
Bom seria que a Nação pode-se ser mais generosa com todos os empregados, mas não está em estado disso; nem tambem as despesas entre nós são comparáveis ás da Inglaterra; assim como as fortunas dos particulares são tambem geralmente mais diminutas; e por isso com estes ordenados já poderão ir passando, sem queixar-se. Sou finalmente do voto do illustre Preopinante e Sr. Borges Carneiro, quanto ás propinas que deverão cessar; e que as condem nações para as despesas de que são tiradas, sigão o destino das outras multas pecuniarias.
O Sr. Freire: - Eu conformo-me em parte com o artigo, e ainda acho diminutos em alguns casos os arbitrios que elle apresenta; mas não me conformo com a maneira com que aqui se applicão os ordenados nas differentes terras do Reino. Em geral assento que os empregados devem ter ordenados com que subsistão bem e commodamente; porque todas as vezes que elles são mesquinhos, os que recebem não cumprem bem as suas obrigações, e isto mui principalmente aquelles empregados em que o seu exercicio he todo de espirito, e exige applicações literarias; porque um espirito apoquentado não está para grandes meditações e discursos; além disto debalde pretenderiamos que os juizes fossem independentes, e os emolumentos de que fala o projecto, não satisfazem a meu ver. Nas differentes partes do reino deve haver differentes rendimentos, por isso que as terras umas são mais caras que outras, mas nem por isso acho que tenhão differentes ordenados os desembargadores. Parecerá isto um paradoxo, mas não o he. Os desembargadores tem a mesma consideração por este projecto, que torna as relações iguaes, por isso desejo que tenhão o mesmo ordenado. Não me opporei minha opinião em todos os ordenados, porque isto he uma especie de cavilação. Debaixo deste ponto de vista não pagando decima, voto por um conto de réis de ordenado para todos os desembargadores, mas além disto desejo que tenhão todos mais de um conto de réis, isto he, que tenhão uma ajuda de custo proporcionada ás differentes terras; mas esta ajuda de custo desligada dos ordenados. Daqui tirão-se muitas vantagens; uma dellas vem a ser, que tendo todos os desembargadores um igual ordenado, ao depois deixando de servir, e tendo as mesmas despesas, e incommodos, vem a ter tambem a mesma recompensa, o que facilitará muito a regulação das aposentadorias: a ajuda de custo de que falei, deve ser de 600$ réis para o Porto e Lisboa, e 400$ réis, ou pouco menos, para a s outras terras; e quando eu quero que os desembargadores tenhão uma ajuda de custo, não quero que tenhão propina e emolumentos proprios, sendo agora extemporanea a questão de deverem ou não conservalas. Continuem embora a haver estas propinas, e emolumentos, mas vão para uma caixa geral donde deva sair essa ajuda de custo, e pelo resto fique sempreresponsavel o thesouro, feito isto assento que tenho segurado a subsistencia aos desembargadores por uma maneira mais solida, e em favor da fazenda.
O Sr. Caldeira: - Eu sempre pretenderei que se examine se a nação está em estado de satisfazer, ou não, estes ordenados; he certamente o que primeiro devemos ter em consideração, o mais he fazer leis que não se poderão cumprir. A decencia que devem ter estes empregados, he a mesma que deverão ter todos os msis empregados. disse-se aqui que os mais empregados não podem prevaricar tanto como os magistrados; todos podem prevaricar: a falta de meios da-lhes occasião, como a estes de o fazerem. Por tanto he necessario se tome isto em vista, combinando com lei. Dizer-se que 1:400$000 réis não he sifficiente he certamente abrir a porta a todos os mais empregados, que dirão: "não temos ordenados sufficientes, e pertendemos ser augmentados." Aqui está uma razão que deveremos ter em consideração. Ora em quanto a idéa que seja livre de decima, não concordo, porque decerto isto há de causar algum transtorno naquelles rendimento, porém estou pelo parecer que a Commissão offereceu. Relativamente aos emolumentos, a minha opinião he que se tirem, porque iriamos abrir o caminho ás demandas, e os magistrados não farião outra cousa senão trabalhar em similhante objecto. Finalmente, Srs. he necessario que todos fação algum sacrificio, quando as circunstancias o exigem, e nós se virmos os rendimentos que tem os parocos, notaremos, que entre estes, e os magistrados não há comparação alguma em interesses, e com tudo tambem trabalhão. Estas são as reflexões que se me offerecem fazer.
O Sr. Barreto Feito: - Há duas classes de homens; homens bons, e homens máos: os bons tenho eu visto sempre proceder bem em todas as circunstancias, qualquer que fosse o seu ordenado; os máos sempre procedem mal, por maior que seja o seu ordenado. Por tanto não he o ordenado o que faz a honra do empregado; a honra deve elle trazer de sua casa, quando vem para serviço publico. O que nós devemos fazer he estabelecer aos magistrados um ordenado com que elles possão passar decentemente. Aquelle que a commissão lhe determina, parece-me decentissimo. Por tanto approvo o artigo. Há outra razão que se oppõe ao augmento do ordenado, que he não haver dinheiro; e diante desta razão devem ceder todas as outras.
O Sr. Serpa Machado: - Eu não acho ainda sufficiente o ordenado que a Commissão offerece; porém voto por elle por uma simples razão, e he por

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ver o estado do thesouro. E não entrando na discussão de quanto deverá ser, digo que não o pretendo elevar ao que tem o ministério, mas digo que aquelles que trabalhão, deverão ser pagos, e ter maiores ordenados do que os que não trabalhão: e isto está prevenido nos emolumentos que a Commissão estabelece; isto he, de um ordenado fazem-se dois, e desta maneira não fica existindo a duvida ponderada por alguns illustres Preopinantes, de que os que não trabalhassem ficarião tendo os mesmos ordenados que aquelles que trabalhassem, por isso que se arbitrou esta tal ou qual desigualdade dos emolumentos: quanto mais que os desembargadores que não vão trabalhar á relação, hão de trabalhar em objectos de summa consequência.
O Sr. Castello Branco: - Eu votaria sem duvida pelo paragrafo, se acaso o honrado Membro o Sr. Freire, não tivesse suscitado sobre esta materia idéas que acho que devem adoptar-se, e principalmente adopto estas idéas porque ellas cortão uma difficuldade que eu me havia proposto a mim mesmo. Marcão-se differentes ordenados para cada uma das differentes relações de Lisboa, Porto, etc.; e diz-se e na outra parte que as relações são iguaes; que os desembargadores das diferentes relações estão entre si em perfeita igualdade, a lei póde dizelo assim, mas de facto he bem difficil que assim se repute, apezar da lei o dizer, uma vez que se estabeleção maiores ordenados para uma relação de que para outra, e necessariamente deve ser mais appetecido o serviço em uma relação que tem maior ordenado do que em outra; e daqui resultarão deligencias e perseguições ao Governo para despachar um individuo antes para Lisboa e Porto que tem maiores ordenados, do que para outra qualquer relação. Dir-se-ha que elles vinhão a ficar iguaes porque em Lisboa, apesar da haver maiores ordenados, havia tambem maiores despezas; e assim ficava compensada uma cousa com a outra, estabelecendo por este meio a igualdade entre todas; mas por outra parte advirtirei que o homem trabalha ordinariamente com a idéa em um futuro em que elle póde impossibilitar-se para trabalhar. Logo todos naturalmente hão de trabalhar mais por servir um emprego, o qual quando elle viesse a impossibilitar-se lhe havia de dar maior ordenado. Esta difficuldade que já me havia proposto a mim mesmo, e que via ser contraria á igualdade que a lei pretende inculcar entre os desembargadores da relação, desapparece absolutamente, uma vez que se adopte o plano do Sr. Freire. He por isto que me parece muito bem que se adopte um ordenado geral e uniforme para todos os desembargadores; e que, attendendo então ás despezas que cada um ha de fazer mais em uma terra do que em outra, em quanto pelo serviço effectivo são adstrictos a servir naquella terra, se lhe marque o titulo de ajuda de custo, que póde ser a que lembrou o Sr. Freire. Por esta razão eu não posso approvar o § tal qual está, e approvo a idéa do Sr. Freire.
O Sr. Miranda: - Não a posso eu porém admittir. Esta idéa, como observou um illustre Preopinante, não he bem transplantada da tropa para os desembargadores. Na tropa dá-se uma gratificação ao exercicio de uma patente. Aqui dá-se não ao exercicio do lugar, mas em razão do lugar em que se acha o empregado. Quando se trata de militares, he em respeito ao individuo, este uma vez tem o exercicio de coronel, outra vez deixa de o ter. O desembargador não he assim, não ha nada disto. A gratificarão não seda ao exercicio de desembargador, mas ao lugar onde está a relação, e como o lugar he permanente, não ha necessidade de similhante cousa, nem de similhante gratificação. Por tanto voto pelo artigo, e approvo os ordenados que o projecto determina, uma vez que não paguem decima, nem novos direitos.
O Sr. Arriaga: - Tem-se combalido os fundamentos pelos quaes a Commissão pretende estabelecer ordenados sufficientes aos empregados publicos. Derão-se as razões no preambulo, e nelle se vêm tantas quantas ha para justificar que os empregados públicos tenhão aquelles ordenados necessários para a sua decente subsistencia; estes objectos devem sor sempre olhados em proporção da unidade do officio; não se póde duvidar que o exercicio das funcções de um magistrado he certamente de muito interesse á Nação, pois que impor tão nada menos do que a conservação do direito de cada um, e em fim de julgar das vidas, honras, e fazendas dos seus concidadãos. Homens encarregados de objectos de tanta monta, he necessário que sejão homens de conhecida capacidade, e que tenhão um ordenado sufficiente que os ponha a coberto das seducções e compras dos mais poderosos; he mui penoso o officio de julgar, e se os militares arriscão a sua vida com inimigos, os magistrados que querem ser honrados, e fazer justiça, tem immensos inimigos que combater, tem o dinheiro, tem os empenhos, e mil outros não menos poderosos, e he necessário ter um escudo com que se defendão. Disse-se aqui seja virtuoso. He muito bom de dizer, mas mão de executar: he necessário que aquelle homem que pratique a virtude tenha um prémio, e he necessário igualmente pôlo a coberto das trainas de seus inimigos: e por tanto acho que quando se tratar destes principios se note que para o homem desempenhar suas funcções he necessário que seja acompanhado de um prémio para que possa com mais vigor exercer, e marchar pelo caminho da virtude. Consequentemente, vista a necessidade que ha de estabelecer bons ordenados aos desembargadores das relações que se vão estabelecer, não voto pelo parecer da Commissão. Disse-se aqui que não ha necessidade de se estabelecer si militantes ordenados, a primeira razão que se apontou foi a de o thesouro não ter, e a segunda foi que os párocos tambem tem pequenas côngruas. A primeira não existe, pela razão de que he necessário que a Nação tenha bons empregados, e se fosse necessário que ella fosse colectada para a decente subsistência destes homens, ella devêra de boa vontade prestar-se a isso, por isto mesmo que devem ter um ordenado sufficiente, segundo o lugar que exercem na sociedade. O segundo he uma paridade mui desigual, pois pretende-se comparar as obrigações de um paroco com as de um magistrado; os parocos não tem familias, e outros encargos mais que os magistrados tem; consequentemente

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não posso comparar uns com os outros, e depois as terras que occupão a maior parte não os põe na necessidade de viverem com muita ostentação, o que não acontece aos magistrados que vão para as principaes cidades. Devem-se aumentar os ordenados aos desembargadores para com decencia exercerem as suas funções; o projecto lembra 1:600$ réis em Lisboa, 1:200$ réis em o Porto, e 1:000 réis em os mais lugares. Eu acho, pela experiencia que tenho, ainda muito pouco. Tem vivido até agora com isso, he verdade, porém valendo-se do pouco ou muito que tem, empenhando-se, etc., etc. Em Lisboa he necessario ter incommodos, se tem familia, se tem filhos, a educação delles, etc.; e para isto basta 1:600$ réis? Não de certo. Eu persuado-me que menos de 2:000$ réis não poderá chegar para poderem passar em Lisboa: adopto a opinião do Sr. Guerreiro, que se estabelece tambem uma ajuda de custo para suprir as despezas conforme as necessidades das diversas terras, ficando sendo o ordenado então de cada um de 1:000$ réis. Em quanto as propinas, e emolumentos julgo deverem-se continuar a pagar, e entrarem para uma caixa; e não se adoptando a idéa proposta, então o meu voto he que os desembargadores de Lisboa tenhão 2:000$ réis; os do porto pela experiencia que tenho daquella cidade, parece-me que devem ter pelo menos 1:600$ réis; e para as mais provincias 1:200$ réis. Este he o meu voto.
O Sr. Xavier Monteiro: - A questão dos ordenados e despezas das novas relações tem sido tratada a meu ver, muito sinthaticamente, isto he, suppondo a fazenda da nação em muito boa ordem, e que havendo uma avultada receita para fazer face ás despesas publicas, de nada mais se trata do que de proporcionar aos desembargadores uma farta e decente subsistencia. O Sr. Borges Carneiro estabeleceu como principio tacito e inquestionavel, que o dinheiro da nação he infinito, e que ao ministro da fazenda não tem as Cortes mais do que ordenar que pague sem mais averiguações, ou exame, e em não pagando, seja preso. Ora este methodo de tratar as questões de fazenda, he a meu ver, o mais simples, e tambem o mais absurdo. Todos sabem, que as vezes que se tem pretendido discutir, e apurar o orçamento da despesa e receita, por falta de methodo, que ainda existe na escrituração, e administração, não se tem podido alcançar ideas claras a este respeito. Sabe-se porém que a despesa tem augmentado; que havendo por aproximação um deficit de oitocentos contos em 1821, este se tornou em mil e seiscentos contos para 1822, e sabe-se tambem, que o remedio que temos adoptado para encher este deficit na despeza corrente he ineficaz.
Apresenta-se-nos um plano de stenta contos para as despesas das novas relações, mas não se pondera que das antigas havemos de ficar ainda, em razão dos muitos empregados a cargo da nação, com metade das despesas pelo menos. Este o primeiro objecto que deveriamos ter em vista para legislar sobre esta materia. Mas diz-se que os desembargadores devem ter uma subsistencia segura: he verdade? E são elles os unicos que tem este direito? Entretanto eu vejo, segundo o plano, que alguns dos ordenados duplicão, outros sobem a um aumento muito consideravel, e ainda são julgados escassos por alguns Srs., aos quaes eu perguntaria se intentão igual accrescimo para todos os empregados publicos, e neste caso donde pretendem deduzir os recursos necessarios para satisfazer ao seu plano? Diz-se que as propinas desapparecem, e que os emolumentos devem conservar-se. Quanto aos emolumentos sou de opinião, que uma vez que o rendimento certo seja sufficiente, escusado he dar aos desembargadores uma quota incerta, qual he a dos emolumentos. Pelo que diz respeito a não pagarem decima, devo lembrar, que quando aqui se tratou da refórma das secretarias de estado, a minha opinião foi que não pagassem decimas, mas o Congresso decidiu o contrario, e agora seria uma injustiça, que conservando-se para uma repartições, isentassemos della outras, que se dizem igualmente reformadas. Lembremo-nos pois que esta he a primeira repartição, a quem nos propomos a aumentar os ordenados, e que devendo, para ser justos, fazer o mesmo em muitas outras, nos deve resultar necessariamente um espantoso aumento de despesa; para occorrer á qual he forçoso aumentar a receita, a para obter este fim será necessario aumentar os tributos, porque o plano que tem adoptado estas Cortes, de abrir um emprestimo, não he applicavel para supprir despesas constantes no futuro. Empenhemos tem limites, e se os fizermos todos os annos, a banca rota he infallivel.
Quando se discutir o orçamento, he necessario pôr um tributo equivalente ao deficit, porque não deve ficar a receita atrazada da despesa. Os empenhos costumão decretar-se para acudir a despesas extraordinarias, decretos para as ordinarias, he cousa estranha. Logo que se aumentarem os ordenados, o que se segue he que a receita há de ser aumentada por meio de contribuições; estas directa, ou indirectamente hão de recair sobre os empregados, e assim o que se lhe dá por um lado, vem a tirar-se-lhe por outro, antigamente erão poucos os empregados, pequenos os ordenados, pequenos os tributos, e os generos baratos, aumentarão-se os empregados, aumentou-se-lhe o ordenado, aumentárão-se os tributos, e o preço de todas as cousas subiu consideravelmente. Aumentem os ordenados dos empregados á quantia que quizerem, tem de aumentar a receita publica na mesma razão: operação pelo menos nulla, excepto se unicamente tiver lugar o aumento na classe desembargatoria, porque então he injusta. Por isso voto pelo menor ordenado possivel em quanto se não regulavam os ordenados de todos os empregados publicos. Entretanto o arbitrio mais racionavel que se tem apresentado, he o da ajuda de custo variada segundo os lugares; mas então não quererei que os ordenados constantes, e geraes sejão um conto, mas sim oitocentos mil réis, e que sobre a ajuda de custo nada se decida por ora em quanto se não estabelecerem os locaes das relações.
Em ultimo lugar, como em virtude da Constituição se devem estabelecer juizes facto nas causas tanto se devem estabelecer juizes de facto nas causas tanto civeis como crimes, e neste caso as relações vindo só a conhecer em Segunda instancia nos pontos de direito vem a ter para o futuro muito menos trabalho, e hão de necessariamente ser reduzidas; segue-se que

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quanto maiores forem os ordenados, tanto mais a Nação tem de pagar áquelles que tiver de aposentar por desnecessarios. Tenha-se por tanto isto em lista na creação de novos ordenados visto que este plano não póde ser permanente. Logo que tenha lugar o estabelecimento dos jurados, este apparato desembargatorio ha de soffrer uma reducção extraordinaria. Approvando pois a ajuda de custo, voto, como disse, por pequenos ordenados.
O Sr. Fernandes Thomaz: - O illustre Preopinante discorreu sobre este artigo, debaixo de um ponto de vista muito plausível, que he a diminuição da despesa para a fazenda nacional. Mas pergunto, he a isto só que devemos attender? E a justiça onde fica? He preciso saber que um desembargador da casa da supplicação tinha o que se vê aqui neste mappa; (leu o mappa annexo ao projecto) os que agora vão occupar os lugares das relações, são todos desta graduação, e quererá o illustre Preopinante dar menos a estes, do que tinirão aquelles? Estabelecido o principio de que o juiz deve ser independente, como combina elle a administração da justiça com a mesquinhez de ordenados que quer dar a um juiz? Diz-se "A Nação não póde" Se ella não póde sustentar a magistratura, não póde ser Nação. He preciso olhar para isto. Os empregados públicos devem ter que comer, os magistrados devem ter que comer proporcionalmente ao seu estado, e em abundancia. E para que? Para serem independentes como quaesquer outros funccionarios públicos. Pois agradão tanto ao illustre Preopinante, e aos que pensão bem, os costumes das outras nações, e não os querem imitar nisto? Os Inglezes dão mais a um seu magistrado, do que nós damos a 30 dos nossos. E para que? Para que sejão independentes. Um desembargador do Porto até aqui tinha o seu ordenado de 600$000 réis, tinha as suas propinas, tinha mais de bracagens cinco moedas por mez, se ía para aggravos tinha mais 500$000 réis, agora perde tudo isto, e não se lhe hão de aumentar os ordenados? Como he que vivia um desembargador antigamente! Tinha mil cousas. Um corregedor do crime tinha um conto e seiscentos mil réis, unia-se-lhe o lugar na junta do tabaco, de 400$000 reis, na casa de Bragança 400$000 réis, um lugar no Infantado 400$000 réis. Eis-aqui como vivia um desembargador. Querem que os magistrados seja o limpos de mãos com similhante mesquinhez de ordenados? Eu perguntarei ao illustre Preopinante, quando chegar a hora de comer para si, e seus filhos, que he de elle fazer? O que faz todo o homem que não tem que comer? Furta. Pois eu vejo os meus filhos com os pés no chão, não tenho real que lhe dar, sou um official publico, a barriga a dar-me horas, os filhos a chorarem: e por outra parte a dizer-se não torças a justiça! Pois que hei de fazer? Tire-se aos que tem de mais, e dê-se aos que tem de menos. A casa da supplicação fazia de despesa 71 contos e meios, agora todas as relações fazem pouco mais desta despesa. E então diz-se que se vai aumentar a despeza? Pois se a supplicação fazia de despesa 71 contos e meio, a do porto 44, o que faz 128, entrando as despesas dos outros officiaes, como he que se aumentarão as despesas, se agora a das relações todas anda por 71 contos e meio? Mas que destino se ha de dar a tantos desembargadores, estabelecidos os jurados? Aposentão-se, e com meio ordenado: e esta despesa por ventura he permanente? Não. Em quanto elles vão para os tribunaes, não ha morte que lhes chegue; mas quando se aposentão, morrem todos os dias. Diz o illustre Preopinante que quando houver jurados, ha de cessar este apparato desembargatorio; pois não ha de ser só este apparato, hão de cessar outros muitos. Ma apparatos no exercito, ha apparatos nos regulares; e os apparatos hão de vir todos abaixo. Pois as reformas hão de chegar só aos desembargadores? Hão de chegar a todas as classes; e desenganemo-nos todos, a Nação não estava arruinada somente pelos males que fazião os ministros, mas pelos males de todas as classes; senão venhão os militares, venhão os ecclesiasticos, o commercio, e a agricultura, e digão "a nós nunca chegou a prevaricação! Em todas as classes havia desordens, e por isso todas merecem ser reformadas. Os ordenados dos desembargadores não influem sobre o deficit da fazenda, porque está demonstrado, que em vez de aumentarem, diminuem. Supponhamos que aumentão dois contos de réis? Seria necessário um tributo? Eu mostrarei aos illustres Preopinantes muitos lugares donde esses contos se podião tirar. Feitas bem as contas, muitos desembargadores vem a ficar de peor partido. Eu o declaro muito authenticamente, que não quero ser desembargador, nem de Lisboa; hei de pedir que me aposentem, porque estou persuadido que he impossível viver com similhante ordenado. Deve-se attender que um desembargador antigamente via no fim da sua carreira algumas vantagens, uma alcaidaria mor, um senhorio de terras, os filhos despachados para lugares de primeiro banco, ou desembargadores do Porto; e agora o que vê elle? nada. Eu declaro que tenho dois filhos; já lhes disse "nenhum de vossas ha de seguir similhante vida. Pois que offerece a vida de magistrado em Portugal? nada. Entretanto eu fui o primeiro que votei por isto. E porque? Porque me pareceu que nas apertadas circunstancias da Nação, não era possível passar daqui. Agora pelo que pertence ao Sr. Freire, estou por aquella opinião, he uma feliz lembrança estabelecer a todos os desembargadores um ordenado igual, porque ao depois quando he a sua aposentadoria, tambem he igual o seu ordenado.
O Sr. Ferreira Borges: - Quasi que está dito o que eu tencionava dizer. Todavia apresentarei sempre a minha opinião. Voto em geral pelo artigo, em quanto nelle vejo que se arbitra aos nossos desembargadores a mesma quantidade de ordenados que actualmente tinhão. Não era menor o ordenado que percebião: logo o mostrarei. Todas as vezes que aqui se tem falado em ordenados a minha opinião constante tem sido, que os funccionarios publicos devem viver n'uma independência, e com a decencia propria da jerarquia que occupão na sociedade. Isto que digo a respeito dos funccionarios publicos em geral, deve dar-se muito principalmente a respeito dos magistrados, que tem de administrar justiça ás partes. Esta independência he tanto mais necessária quanto

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maior he o perigo da sua independência. Oppõe-se contra o artigo o estado das rendas publicas, e as vistas que se devião ter no futuro sobre a sorte das relações, quando houvessem de diminuir-se, notando-se que ficaria a cargo do Estado uma grande despeza, e em consequência se disse tambem, que estas Cortes, não tendo podido olhar pela fazenda, tratavão de augmentar a sua despeza, e não a receita; e que em consequencia a sua fallencia era necessaria, pois que havia um termo. Já disse, que a minha opinião era a independência dos magistrados. E de duas uma: ou he necessario que haja magistrados, que administrem a justiça, ou não. Se não, he necessario que todos os desembargadores se risquem do plano, e se he necessário que haja funccionarios desta casta, a Nação tem obrigação de os sustentar. Se a Nação tem obrigação de os sustentar tem obrigação de quotizar-se, se tem obrigação de quotizar-se qual será melhor, que toda a Nação pague para que seja bem servida, ou que a Nação pague só mesquinha parte, e consinta por tanto que cada uma das partes tendo de recorrer ante os magistrados lhes compre a injustiça, e exponha á prevaricação esses magistrados? Certamente he muito melhor que a Nação lhe pague bem para ser bem servida. Até agora os ordenados dos desembargadores não erão grandes ordenados, pelo contrario, estando elles por tantos annos mingoados, vimos que ha nove annos se estabelecerão novos ordenados. Havia duas relações, e tinha por base a primeira, de ordenados, novecentos mil réis, e a segunda, seiscentos mil réis. Mas era isto só o que percebia um desembargador? não. Os illustres Preopinantes disserão que não, e eu direi de novo que não. Em cada uma destas relações os seus desembargadores percebão muito mais, do que pela nova tarifa se lhe estabelece. Na relação do porto direi, que não havia nenhum que, tendo casa, recebesse menos desta totalidade descripta no artigo; porque tinha 600$ réis ordenado, tinha as propinas de que se lembrárão os honrados membros, tinhão as braçagens que rendião muito, e além disto tinhão as assignaturas. Pense-se bem quando estas poderião render no estado actual das cousas, e quanto vão agora a ser para cada um destes novos desembargadores: já se vê que muito menos do que era d'antes; porque as assignaturas de duas relações vão devidir-se por cinco. No artigo 107, se vê que as assignaturas na casa dos aggravos erão incertas, mas por este mappa que aqui está se póde calcular, que no Porto era o numero das causas maior que na supplicação; e por consequencia mais assignaturas. E se mais assignaturas mais rendimentos, que sem duvida não desceria de 600$ réis. Dir-se-há, mas isso agora diminue. Já disse, que diminuia, ainda que ficando o Minho pertencendo á relação do porto há desigualdade; porque este dá mais causas que a beira e Tras-os-Montes: quem lá esteve observou. Só o districto de Barcellos dará talvez tantas causas; como as outras provincias dão á relação de Lisboa. Mas deixando isto e tornando ao fim do discurso digo, que os 600$ réis de ordenado com mais 600$ réis que podem orçar as assignaturas, propinas, etc., davão um ordenado muito maior do que qualquer destes ordenados, que aqui se marcão. Sou amigo da economia; mas a verdadeira economia a respeito dos magistrados de dar-lhe tanto que se tornem independentes de cederem a subornos, e de serem comprados pelas partes. Conseguintemente adopto o artigo para que o ordenado seja o maior do que aqui se mencionão; além disto adopto a gratificação lembrada pelo Sr. Freire; porque não reputo que este ordenado seja sufficiente somente para que o homem na qualidade de julgador se haja de conservar na sua dignidade, e independencia. A respeito da decima eu seria de opinião que acabasse de haver decimas dos ordenados. Fixem-se os ordenados em porporção com o abatimento da decima: o contrario he prometter aos funccionarios públicos o que se lhe não dá. Como porém o Congresso já decidiu o contrario a respeito dos officiaes de secretaria, voto por ora pela opinião do Sr. Xavier Monteiro.
O Sr. Soares de Azevedo: - (Não o ouviu o taquygrafo Leiria).
Declarada a matéria sufficientemente discutida, propoz o Sr. Presidente o artigo á votação, e não foi approvado.
Propoz então se todos os desembargadores devião ter um ordenado igual, e além deste uma gratificação proporcionada segundo a localidade da relação: e posto á votação, foi approvado. Propoz mais se este ordenado devia ser de um conto de réis: e venceu-se que sim. Propoz depois disto se devia voltar á Commissão, paia esta propor a quantidade das gratificações: e decidiu-se que sim. Propoz mais se o ordenado estabelecido devia ser pago sem desconto de decima: venceu-se que não. Propoz finalmente se os desembargadores devião vencer propinas ordinárias, ou extraordinárias: e venceu-se que não.
Participou o Sr. Presidente, se achava á porta da sala Joaquim José de Oliveira, sargento mor de cavallaria addido ao estado maior do exercito do Brazil, que havia chegado do Rio de Janeiro, e vinha pessoalmente felicitar o soberano Congresso, e protestar sua adhesão ao systema constitucional. Mandou-se-lhe dar a consideração costumada.
Entrou em discussão o artigo 28, e foi approvado.
O artigo 29 não foi approvado. Propoz então o Sr. Presidente: se acaso os desembargadores deverião só prestar o juramento do acto da posse: e venceu-se que sim.
O artigo 30 foi approvado.
O artigo 31 decidiu-se que voltasse á Commissão, para entrar na lei das promoções da magistratura.
O artigo 32 foi approvado, supprimindo-se-lhe a palavra mensalmente.
O artigo 33 sendo posto a votos decidiu-se que a sua doutrina ficasse igualmente reservada para adita lei das promoções da magistratura.
O artigo 34 foi approvado.
Passando-se ao arte 35, disse
O Sr. Borges Carneiro: - Este art. diz = sendo dia santo, ou feriado no antecedente = assento será melhor dizer no primeiro não feriado, porque muitas
Vezes não se repara, etc.
O Sr. Ferreira Borges: - Approvo o art. com

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uma addição, e vem a ser, que se facão ferias geraes, o mez de Setembro e Outubro, e que então se observe o determinado na ordenação. As ferias são para bem dos povos, os quaes occupados com as colheitas nestes mezes não podem advogar os seus interesses. - He pois a minha opinião, que se não altere a lei.

O Sr. Soares de Azevedo: - Eu não queria que houvesse estas ferias, são desnecessarias. As ferias são a bem dos povos, estes não vão ás relações, vão os seus procuradores; e ainda que fossem o tempo da acolheita não he sempre o mesmo, e he diverso em differentes partes.

O Sr. Brito: - O honrado Propinaste em quanto quer que haja muitos dias de relação, e que os ministros trabalhem sem o descanço das ferias, não adverte, que este projecto altera o systema actual da administração da justiça. D'agora por diante não tem de processar-se os feitos nas relações. Hão de ser processados na inferior instancia pelos juizes letrados: as relações ficão sendo meros tribunais de appellação, cujos desembargadores despachão os feitos em suas casas por tenções, e só vão á relação para os passarem aos seus immediatos na ordem das casas que occupão, assistirem á distribuição, e conferirem sobre alguns incidentes para o que um dia em cada semana he sufficiente: devendo nós estar certos, que quantos mais dias perde um aggravista a sair de sua casa menos feitos pôde despachar, o que sabem todos os que tem servido estes lugares. O interesse das partes, he que as causas sejão breves, e bem julgadas, mas não que haja muitos dias de relação; por consequencia quanto a este artigo sou de voto que haja uma unica relação cada semana, uma vez que se adopte este systema, de se despacharem os feitos [...]; systema contrario ao que eu tive a honra de apresentar a este soberano Congresso na ultima [...] do mez de Novembro, que a meu ver [...], que podia restabelecer o imperio d'Astrea, porque evitava toda a influencia das paixões dos juizes constituindo-os na precisão de tencionar os feitos logo que a sorte os designasse para juizes sem que podessem ter communicações com pessoa alguma antes de ultimarem o despecho. Fóra deste principio não he possivel esperar exata justiça; visto que os juizes são homens, isto he, entes sensiveis ás paixões do amor, do interesse, da amizade, do temor, sensiveis á illusão, e seducções, até o amor da fama, a compaixão, a condescendencia influem na balança da justiça, quando a franquea a entrada destes affectos no coração do julgador. Quanto á 2.ª parte do artigo não approvo o que disse o Sr. Ferreira Borges. Não póde haver senão [...] fechadas neste systema, porque não temos se não 8 ou 19 desembargos, e por isso não ha quem fique servindo no tempo de ferias. Até agora havia ferias fechadas, porque estes dous mezes davão-se aos que tinhão officio na casa e no lugar destes servião os extravagantes. Como porém por este projecto não temos extravagantes, não temos tambem quem substitua o lugar dos juizes; e por isso não póde haver ferias, se não fechadas; porém não ha razão para que esteja a relação fechada o longo espaço de dous mezes. He pois a minha opinião, que estas ferias geraes, que a ordenação destina para colhimento de pão, e vinho, se reduzão a um mez somente, e que este mez seja fechado, porque de outra sorte sei hão ferias illusorias.

O Sr. Alves do Rio: - Sou devo o que não haja nem um mez de ferias. Nós temos cada semana uma relação, vem a ser 52 por anno; se se tirão as das ferias, e querem dar um ordenado tal por 44 vezes, que os desembargadores hão de ir á relação, então he cousa differente; portanto voto, que não haja ferias fechadas, se não á vontade das partes. Agora tenho eu experiência de uma parte, que estando fora da sua terra, aqui em Lisboa, fazendo immensos gastos, se viu obrigada a sair para fora por causa das ferias.

O Sr. Fernandes Thomaz: - Sr. Presidente, desde estudante de grammatica fui sempre creado com este mez de ferias, até os mestres de escolas de primeiras letras as tem. Pois um desembargador não ha de ter o desafogo de ir á sua terra, ao menos um mez? Os lentes da Universidade tem dous mezes, em todos os tribunaes sempre tem havido estas ferias: querer agora cortar as unhas tão rentes não me parece bem; mas em fim o Congresso faça o que quizer.

O Sr. Ribeiro Saraiva: - As ferias não fazem mal algum ao Estado, posto que prejudiquem a um, ou outro litigante, e isto não he motivo bastante para se alterar o tempo dellas; e em quanto ao numero das relações que aqui se disse, isto he, de haver uma só relação cada semana, pois que não haveria muito que fazer, respondo: que elles consumirão tanto tempo como consumião até agora; elles deverão observar a lei, a respeito destas conferencias; fazer o seu parecer em portuguez (para lhes custar menos), entregando depois os autos aos companheiros, que deverem tencionar, e conservando em seu poder a sua tenção, para as apresentarem todas em conferencia depois de todos os competentes dizerem; e então discordando em alguma cousa, se poderem ajustar em um parecer na mesma conferencia, ou aliás passarem então os autos ao seguinte até seu vencimento: este o processo, que parece ser a mente da nossa ordenação. Eu observei quando estive no Porto que três partes das demandas são da província do Minho, e uma não: por tanto digo que, além de ser necessário conservar-se como até agora, declaro que o numero de desembargadores da relação do Porto deverá ser maior do que o das outras relações do seu districto em attenção á sobredita differença do numero de causas.

Declarada a matéria sufficientemente discutida, o Sr. Presidente propoz o artigo á votação, e foi approvado, com as duas alterações seguintes: 1.°, que em lugar das palavras no antecedente, se diga, no primeiro seguinte, que o não for: 2.°, que se supprimão as ultimas palavras do artigo sendo fechados os primeiros quinze dias sómente.

Passando se ao artigo 36, disse

O Sr. Borges Carneiro: - Não impugno a 1.ª parte deste artigo, isto he, que haja capellão, e missa na relação entre de ella principiar, antes está isso já sanccionado no artigo 16; impugno porém á 2.ª parte, isto he, que se imponha ao presidente, e desembargadores obrigação de ouvir a missa. Só a igre-

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já tem direito de pôr preceito de missa: ella o tem feito, e não com escassez: tem determinado os dias em que os fieis a devem ouvir; além desses dias, he um acto de mera devoção, e não deve o legislador impor a ninguem essa obrigação. Haja a missa; ouça-a quem tiver devoção; mas não mande a lei que os ministros a oução. Quanto a mim, não duvido declarar aqui em publico, quererei sempre mui solicito em não fatiar a ouvir missa nos dias de preceito da igreja; porém quanto aos mais dias, se estiver na relação que nenhuma devoção terei de a ouvir, e quererei gastar esse tempo antes em examinar os feitos, e despachar. O Rei e as partes querem desembargadores para despachar prontamente, e não para gastar tempo em devoções que a igreja não manda. Dahi vem que em os novos tribunaes, como o almirantado, etc. já não se poz a obrigação de missa nos dias em que a igreja a não impõe. No tempo em que estas cousas se fizerão, governavão os ecclesiásticos o reino, e o temporal. Hoje vemos que a hypocrita Alliança que se denomina santa, havendo invadido Nápoles com força armada, obriga a praticar novenas e exercícios chamados espirituaes nas universidades e outras repartições publicas. Deixemos essas baboseiras áquella alliança; pois he santa; nós contentamo-nos de ser justos, sem nos desvanecermos de ser santos.
O Sr. Ribeiro Saraiva: - Nunca me persuadi que este artigo fosse impugnado neste Congresso, estando por elle consagrado o antigo, e muito louvável costume de proceder ao despacho das relações o augusto sacrifício da missa, para, por este meio, obterem os magistrados as luzes de que necessitão para o acerto das suas decisões, quando a máxima a Deo principium foi sempre seguida na pratica de todas as nações mais cultas da antiguidade, ainda gentilica em todo o mundo conhecido; começando sempre as suas obras literárias com expressa relação á divindade, e até pela sua invocação, como nos attestão muitas e muito estimáveis obras históricas, poéticas, e didaticas, que pela sua excellencia reconhecida por milhares de annos e revoluções, passarão dos Gregos e Romanos e até dos Orientaes, até nós, por meio de dificultosas e dispendiosas copias o que talvez não succeda ás producções da maior parte dos escritores do nosso tempo apesar da maravilhosa invenção da imprensa, verificando-se a judiciosa, e enérgica observação de J. J. Rousseau quando escreve que muito se hão de admirar nossos vindouros do pouco que neste nosso tempo se tinha escrito. Deve por tanto conservar-se um tão santo costume, e religioso acto, ao qual he de esperar assistão os magistrados dignos deste respeitável nome.
Não posso porém deixar passar em silencio a pasmosa admiração, que me causou uma escandalosa, e Blasfema expressão de que o Sr. Borges Carneiro (depois de muitas outras da maior indecencia para o objecto, e lugar augusto deste recinto) se serviu, designando com a palavra baboseira o pio e santo instituto de nossos maiores a este respeito. Só a sua costumada inconsideração em declamar nesta assemblea póde desculpar tamanho excesso!
Procedendo-se á votação foi approvado o artigo como estava.
O artigo 37 foi igualmente approvado.
Passando-se ao artigo 38, disse
O Sr. Ferreira Borges: - Quando vão os processos para a relação apresentão-se a alguém, he necessário por tanto que alguem tome conta delles; não sei agora a quem se hão de apresentar, e quem ha de tomar esta conta. Até aqui sabia eu como isto era agora não vejo aqui que se dê forma alguma, vejo os autos, já na relação, e nada mais. Por tanto he necessário designar a quem se hão de apresentar.
O Sr. Fernandes Thomaz: - A Commissão não alterou nada da forma antiga, se não fazer publica a destribuição dos feitos para evitar as falsidades e ladroeiras que se fazião até aqui. A' objecção que propõe o illustre preopinante, quando diz que não sabe que ha de ser feito do processo, responde o artigo 57. Ahi se diz, que a causa, chegando á relação, se leve a casa do escrivão; e em outra parte se diz, que elle ha de passar um recibo da entrega.
O Sr. Ribeiro Saraiva: - He necessário que haja um livro para o escrivão, separado, aonde deverão registar os autos que hão de ser distribuídos; então he que elles deverão ir á mesa para serem distribuídos como diz o artigo, e ate para se manter a boa ordem.
Sendo chegada a hora de prolongação ficou adiado este artigo.
O Sr. Fernandes Thomaz offereceu a seguinte

INDICAÇÃO.

Constando que o Sr. Deputado José Joaquim de Paria não vem ás Cortes ha um anno, e que se acha em Coimbra, para onde fôra sem licença, proponho, que ou seja chamado para vir já exercitar o seu officio, ou, no caso de se achar impossibilitado, seja demittido.
Passou com urgência á Commissão de poderes.
Fez-se a leitura dos seguintes

PARECERES.

1.° O Sr. Deputado pelo reino de Angola Manuel Patricio Corrêa de Castro, pede que se lhe tome extensiva a providencia que o augusto Congresso deu a favor de alguns Deputados do Ultramar não soccorridos pelas suas respectivas províncias, pois que se acha distituido de meios de subsistencia.
Parece á Commissão de fazenda, o mesmo que já expoz a este respeito, e foi approvado em sessão de 3 de Maio.
Paço das Cortas 5 do Outubro de 1822. - Francisco Barroso Pereira; José Ferreira Borges; Francisco de Paula Travassos; Manuel Alves do Rio; Francisco Xavier Monteiro; Francisco João Moniz».
Foi approvado.
8.° A Commissão de fazenda encarregada na sessão de 30 de Junho de 1821 de apresentar a este soberano Congresso o seu arbitrio sobre a quantia que deve fixar-se e applicar-se para concertos e reparos dos palacios nacionaes: procedeu ás necessárias informações,

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e se persuade que a quantia de oito contos de réis he sufficiente; e deve ser annualmente entregue ao inspector das obras publicas para a empregar naquellas obras que por EIRei lhe for determinado, conformo ao que a este respeito se venceu na mesma sessão.
Paço das Cortes em 13 do Agosto de 1822. - Francisco Barroso Pereira; Francisco Xavier Monteiro; Francisco de Paula Travassos; Manoel Alves do Rio; José Ferreira Borges.
Foi approvado.
3.º O Ministro dos negocios do Reino, remetteu a consulta da Commissão encarregada de organizar a norma do lançamento, e arrecadação da collecta destinada á amortização da divida publica, pedindo uma remuneração a favor dos dois officiaes da junta dos juros, que tem sido empregados na correspondencia e expediente da mesma Commissão, e que carecem de alguma ajuda de custo pelo excesso de trabalho a que se tem sacrificado.
Parece á Commissão de fazenda que aquelles dois officiaes se fazem credores de alguma remuneração em proporção ao seu bom serviço, como attesta a Commissão da collecta ecclesiastica, mas não tem dados suficientes para poder dar um positivo arbítrio; e por isso julga que deverá determinar-se, que a mesma Commissão da collecta ecclesiastica consulte o que julgar justo que deverá dar-se-lhe em attenção ao excesso e accressimo de trabalho, e ao que vencem já, como pertencentes á contadoria da junta dos juros.
Paço das Cortes 20 de Julho de 1822. - Francisco Barroto Pereira; Francisco Xavier Monteiro; José ferreira Borges; Francisco de Paula Travassos; Manoel Alves do Rio.
Foi approvado.
4.° O Ministro dos negócios do Reino remetteu a consulta da Commissão encarrgada da inspecção e direcção da fabrica das sedas, com o requerimento de Antonio Lopes Pastor, pretendendo arrematar a preço de títulos de divida publica a porção de sedas vê-lhas e antigas que quizer apartar; e insta pela resolução da outra anterior consulta que remettêra em 9 de Novembro do anno passado, em a qual se propunha uma segunda arremattação daquellas sedas velhas e avariadas.
A Commissão de fazenda vê que nem o Ministro nem a Commissão attendem ao que as Cortes já determinarão pela ordem de 11 de Dezembro do anno passado. Nella se declarou que todos os bens nacionaes de qualquer natureza que fossem se arremattassem sempre que a sua conservação ou administração for prejudicial, e se tornar mais útil a sua alienação. E assim ficou satisfeito ao que se ponderava naquella consulta a que o Ministro se refere, e que a Commissão de fazenda teve muito particularmente em vista quando propoz o projecto e parecer, conforme o qual se expediu a ordem de 11 de Dezembro. Assim a Commissão pensa que bastará recommendar ao Ministro da fazenda que communique aos das outras secretarias aquella ordem, sendo provável que por esta falta se tenha seguido as irregularidades que a este respeito se notão no proceder da Commissão da fabrica das sedas.
Poço das Cortes 14 de Setembro de 1822. - Francisco Barroso Pereira; Francisco de paula Travassos; Manoel Alves do rio; Francisco Xavier Monteiro; José Ferreira Borges.
Foi approvado.
5.° O Ministro dos negócios da fazenda participa as diligencias que tem praticado para a effectiva installação da Commissão creada para o thesouro pela carta de lei de 21 de Agosto; e pede providencias, em razão da difficuldade de se haverem sómente reunido cinco membros, e não se haver por isso podido proceder á eleição de presidente, e de secretario.
Parece á Commissão de fazenda que procedendo aquella falta do justo impedimento de alguns membros, tres dos quaes já tem requerido a sua escusa, se deve autorizar a mesma Commissão a que possa installar-se com o maior numero de membros que for possivel reunir, chamando-se os substitutos, e procedendo nos seus trabalhos sempre que se juntem pelo menos cinco membros.
E como dois dos substitutos devem já passar a effectivos pela escusa concedida a dois membros da Commissão, e o outro tem tambem obtido escusa: julga a Commissão de fazenda preciso que se proceda a nova eleição, de outros três substitutos: assim como á eleição de um novo membro para o lugar de João António da Costa, que o Ministro da fazenda participou achar-se inhabilitado.
Paço das Cortes 18 de Setembro de 1822. - Francisco Barroso Pereira; Francisco Xavier Monteiro; José Ferreira Borges; Francisco de Paula Travassos; Manoel Alves do Rio.
Terminada a leitura deste ultimo parecer, disse O Sr. Borges Carneiro: - O meu parecer sobre este officio he, que este negocio se remetia ao Governo para elle nomear os membros desta Commissão, e consignar-lhe algum ordenado, julgando-o assim. Todos sabem a importancia desta Commissão, quanto a nação tem perdido em se não crear logo na installação das Cortes, e por isso não queiramos perder mais.
O Sr. Ferreira Borges: - Esta Com missão foi mal fadada desde a sua instituição. Ou ella se deve considerar independente do governo ou não. Se se quer considerar dependente do governo, então a elle he que compete nomear os membros, que lhe faltão; mas isto he que eu não julgo que se quer. Ou se quer acabada ou não. Se se quer acabada, he necessário que sejão nomeados o resto dos membros que faltão, por quem furão nomeados os primeiros: por isso parece, que a Commissão de fazenda apresentando a sua opinião vai coherente com a lei, e com o fim, e organisação especial daquella Commissão Concedo que hade vir a servir tarde: que esta Commissão hade ser sempre contrariada pelo governo; entretanto está lá gente muito boa, que quer muito servir, e com muito préstimo e patriotismo, e então não posso abraçar o systema de dar dinheiro a uns, e não a outros. Por tanto não augurando bem do resultado dos trabalhos daquella Commissão, como o Congresso principiou a nomear, acabe tambem de
nomear os que faltão.

TOMO VII. Tttt

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Julgada a materia sufficientemente e discutida, o Sr. Presidente poz a votos o parecer da Commissão, e foi approvado.
Lerão-se mais os seguintes

PARECERES.

Primeiro. José Antonio Ferreira Vianna, um dos membros da Commissão para o thesouro publico, allega, para obter a escusa que pede, o não ser compativel aquella Commissão com o seu emprego de guarda livros do contracto do tabaco, e saboaria, do qual tira a sua única subsistencia, e que por isso não póde largar.
Parece á Commissão de fazenda que deve conceder-se-lhe a escuda que pede.
A mesma graça pede o Barão de Teixeira, juntando certidão de um facultativo, que attesta que os seus padecimentos o inhabilitão de qualquer applicação.
Parece á Commissão que deve conceder-se-lhe a escusa que pede.
Paço das Cortes 19 de Setembro de 1828. - Francisco Barroso Pereira; Francisco Xavier Monteiro; José Ferreira Borges; Francisco de Paula Travassos; Manoel Alves do Rio.
Foi approvado.
Segundo. A Commissão de fazenda á vista da informação remettida pelo Governo, do governador das justiças da relação e casa do Porto, dando o motivo porque se mandou metter em folha ao desembargador Manoel Antonio Vellez Caldeira: he de parecer que nenhuma duvida póde haver em se receber com agrado o oferecimento que o mesmo desembargador faz para as urgências do Estado, do que tem vencido e vencer por aquella folha da relação e casa do Porto, em quanto receber por alguma outra repartição com que posta decentemente sustentar-se, em vista da sua carta de mercê.
Paço das Cortes 10 de Junho de 1822. - Francisco Barroso Pereira; Francisco Xavier Monteiro; Manoel Alves do Rio.
Sobre este parecer, disse:
O Sr. Borges Carneiro: - Não ha receber-se com agrado, o que não póde offerecer-se. Este ministro não póde levar aquelle ordenado. Que quer dizer vir offerecer o que não podia ter por lei?
O Sr. Camello Fortes, e Caldeira: - (Não os ouviu o tachygrafo Leiria).
O Sr. Fernandes Thomaz: - Eu, a ser assim, também offereço o meu ordenado do desembargador do Porto: 5 annos, desde 1812 ate 1817 fui desembargador do Porto, e servia em Coimbra, nunca ninguém me mandou dar cinco réis. Pelo que pertence á questão presente parece-me muito bem o desinteresse de quem o offerece, mas muito mal a decisão da regência.
O Sr. Peixoto: - Está geralmente reconhecido que o ordenado do Porto foi illegalmenle concedido ao desembargador Caldeira: não lhe era devido, e elle não devia acceitalo. Foi sempre o estilo, ainda no tempo antigo, quando se despachava para desembargador da relação algum ministro, que estava occupado em Commissão extraordinária, ser excluído da, folha da relação; e só começar a vencer nella ordenado, depois de ter entrado no effectivo exercicio da casa; alguns havia, que ainda durante a Commissão vencião o ordenado da relação, mas era quando essa commissão lhes dava lugar ao exercicio da casa nos intervallos, em que estavão desembaraçados. A regencia alterando esta regularidade obrou arbitrariamnte, contra a lei, e contra o estilo, o que não faria a não ser solicitada para isso pelo agraciado. Creio que disto ninguem duvidará; assim como, que elle não ignorava, que tal ordenado não lhe competia. Em consequencia nada temos que lhe agradecer pelo seu offerecimento; principalmente, quando sabemos por varios impressos que neste congresso nos tem sido distribuidos, que o mesmo offerecimento não foi uma generosidade espontanea; mas um arbitrio tomado, depois de se haver manifestado a illegallidade do despacho da regencia. Portanto voto contra o recebimento com agrado.
O Sr. Macedo: - Creio que não devemos confundir o procedimento da regencia, com o do cidadão por ella despachado: o que se trata he de decidir se há de ou não receber-se com agrado o offerecimento que elle faz. A elle não competia entrar no conhecimento da justiça ou injustiça da decisão da regencia; e he certo que uma vez que o legitimo poder executivo mandou pagar o ordenado de desembargador, adquiriu desde logo direito a recebelo; direito que lhe continua a assitir em quanto não for derrogada aquella determinação. Por conseguinte quando elle offerece o dito ordenado, cede realmente do que he seu, e pratica um acto de generosidade; e nestes termos sou de parecer que a offerta deve ser recebida com agrado.
O Sr. Macedo: - Creio que não devemos confundir o procedimento da regencia, com o do cidadão por ella despachado: o que se trata he de decidir se ha de ou não receber-se com agrado o offerecimento que elle faz. A elle não competia entrar no conhecimento da justiça ou injustiça da decisão da regência; e he certo que uma vez que o legitimo Poder executivo lhe mandou pagar o ordenado de desembargador, adquiriu desde logo direito a recebelo; direito que lhe continua a assistir em quanto não for derrogada aquella determinação: por conseguinte quando elle offerece o dito ordenado, cede realmente do que he seu, e pratica um acto de generosidade; e nestes termos sou de parecer que a offerta deve ser recebida com agrado.
O Sr. Guerreiro: - Apoio aquella opinião, e que se receba com agrado; mas que estos papeis vão á Commissão de justiça civil, para ella dar o seu parecer sobre este objecto.
Julgando-se discutida a matéria, propoz o Sr. Presidente á votação o parecer; e se decidiu que fosse recebido com agrado quanto ao oferecimento do que aquelle magistrado tem vencido até ao presente, e que se remettesse á Commissão de justiça civil para decidir se deve ou não vencer para o futuro.
Lerão-se mais os seguintes

PARECERES.

Primeiro. A Commissão de fazenda examinou o requerimento de Joaquim José Martiniano de Oliveira, mostre e crector de uma fabrica de pentes de marfim, que tendo na casa da India nove pontas de marfim para sua fabrica, requereu á junta do commercio a respectiva provisão para se lhe darem livres de direitos na conformidade das reaes ordens: a junta lhe pasmou a dita provisão, e requerendo com ella no conselho da fazenda para effectivamente se cumprir a provisão da junta, o conselho mandou informar o provedor da casa da India, e o escrivão da fazenda: e dando-se de tudo vista ao desembargador procurador

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da fazenda, que respondeu, que prestando fiança se fizesse justiça, deferiu a final o conselho que não tem lugar darem-se livros de direitos generos para officinas como he o de que se trata.
Por este despacho do conselho se vá, que toda a duvida consiste em saber se o supplicante tem fabrica ou tem officina de fazer pentes de marfim : se se chamar fabrica não paga direitos, se porém for officina entende o conselho que os deve pagar. O supplicante no seu requerimento trabalha por mostrar que entre nós a casa, ou loja em que se exercita esta manufactura, jámais se chamou officina, porém sim fabrica; e que os que trabalhão em pentes de marfim não pertencem a alguma bandeira. Tendo na verdade taes lojas o nome de fabrica, como o tinha a real fabrica de pentes de marfim estabelecida no reinado do Sr. D. José ás Amoreiras: parece á Commissão de fazenda, que se deve dar, pelo conselho, como se dêo pela junta do commercio, as nove pontas do marfim livres de direitos ao supplicante.
Paço das Cortes 18 de Dezembro do 1821. - Manoel Alves do Rio; Francisco Barroso Pereira; Francisco de Paula Travassos; Francisco Xavier Monteiro; Francisco João Moniz.
Sendo posto a votos este parecer, se decidiu que não pertencia ás Cortes.
Segundo. A Commissão de fazenda, tendo examinado o balanço da receita e despesa do cofre da universidade de Coimbra, e vendo que o deficit annual não póde descer de 46:082$195 réis, conhece a absoluta necessidade de usar prontamente dilemma financeiro de, ou aumentar a receita, ou diminuir a despesa; porque um tão nobre e tão útil estabelecimento se definhará se lhe faltarem meios, e acabará bem depressa, se se lhe não acudir com pronto remédio.
Mas para se proceder com melhor conhecimento de causa, a Commissão julga que se deve dizer ao Governo que inunde consultar o reformador reitor da universidade de Coimbra para que com a brevidade possível exponha os meios que julgar mais fáceis e adequados afim de que se aumente a receita, e diminua a despesa, assim como quaes quer providencias, que possão melhorar a arrecadação, e aumentar os fundos da fazenda da Universidade.
Paço das Cortes 4 de Outubro de 1952. - Francisco Barroso Pereira; José Ferreira Borges, Francisco de Paula Travassos; Manoel Alces do Rio; Francisco Xavier Monteiro; Agostinho José Freire; Francisco João Moniz.
Foi approvado.
Terceiro. O Ministro dos negócios do Reino enviou ás Cortes duas consultas da mesa do desembargo do Paço sobre a representação da regente do recolhimento denominado da Rainha Santa Izabel do Anjo do Porto, expondo o deplorável estado em que se acha o edifício do mesmo recolhimento.
A Commissão de instrucção publica diz no seu parecer que julga muito conveniente a conservarão de taes estabelecimentos públicos de beneficencia, principalmente quando pela boa disciplina com que são regidos merecem o bom conceito publico, e se tornão de evidente estabilidade para a Nação.
E por isso a Commissão de fazenda se conforma inteiramente com o parecer das consultas do tribunal da mesa do desembargo do Paço, que conclue dizendo: Que achando-se o mesmo recolhimento summamente arruinado, e sendo pelas razões expendidas nas informações que precederão, de muita utilidade, e por isso necessária a sua conservação; se poderia prover aos reparos para ella necessários, concedendo-se ao mesmo recolhimento para esse fim por tempo de dois annos a imposição de meio real em cada quartilho de vinho que se lhe vendesse nas tabernas do Porto, sendo a obra administrada pela junta das obras publicas da mesma cidade, e por ella igualmente arrematada em cada anno a referida imposição.
As ditas obras se achão orçadas de seis a oito contos de reis, e o producto da imposição do meio real se orça em cada anno na quantia de quatro contos seis centos e quatro mil e quarenta réis. Achando-se já cada quartilho do vinho gravado somente com dois reaes, e nos mezes d'Abril e Maio com tres reaes para differentes applicações, como tudo consta dos calculos, e relações juntas ás mesmas consultas.
Paço das Cortes em 30 de Julho de 1822. - Francisco Barroso Pereira; Manoel Alves do Rio; Francisco de Paula Travassos; Francisco João Moniz.
Sobre a matéria deste parecer disse
O Sr. Guerreiro : - Parece que o vinho do Porto não póde com tanta imposição, e que seria necessário que esse recolhimento fosse de utilidade privativa do Porto e de seus habitantes, para concorrerem para a sua conservação. Quando se tratou do projecto da reforma dos regulares, teve-se em vista a respeito dos freires, os meios da sua subsistência; por consequência te este estabelecimento não tem rendas próprias para subsistir, creio que não ha inconveniente algum em que elle acabe, porque não julgo que resultem tantas vantagens da sua conservação, principalmente quando assento que não serve senão para receber as pessoas que querem entrar para elle, e não he estabelecimento de benificencia: por isso, não tendo a importância que se lhe per tende dar, he uma injustiça ir gravar os habitantes do Porto, e não só a elles, mas a passageiros, com mais meio real. Por tanto voto contra o parecer.
O Sr. Girão: - Pelo que pertence ao recolhimento, digo que he bom porque nelle se recebem e sustentão pessoas pobres; e se elle precisa de rendimento ha muita cousa que se lhe applicar mas de nenhuma sorte convém gravar os vinhos com mais tributos. Se eu tivesse aqui um mappa dos impostos que paga o vinho do Porto, o Congresso ficaria admirado de quanto está já carregado. Por tanto a minha opinião he que não se em regue mais. A comunidade da cidade do Porto está em primeiro lugar, do que meia dúzia de pessoas que ali estão recolhidas; voto por tanto contra o parecer.
Procedendo-se á votação sobre este parecer, foi rejeitado.
Designou o Sr. Presidente para a ordem do dia a continuação do projecto das relações N.º 299; leitura de indicições; e para a prolongação dois parece-

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res da Commissão ecclesiastica de reforma sobre collação de benefícios.
Levantou-se a sessão ás duas horas da tarde. - Francisco Xavier Soares de Azevedo, Deputado secretario.

RESOLUÇÕES E ORDENS DAS CORTES.

Para Filippe Ferreira de Araujo e Castro.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação Portugueza mandão restituir ao Governo o officio incluso n.º 12
da junta provisional de governo da provincia da Bahia datado em 27 de Abril do corrente anno, e transmittido ás Cortes pela secretaria de Estado dos negocios do Reino em 15 de Junho proximo passado, com a devassa a que a mesma junta mandára proceder pelo desembargador ouvidor geral do crime, sobre os factos acontecidos naquella cidade nos dias 19 e 20 de Fevereiro deste anno; e com informação sobre o espirito publico na referida provincia.
Deus guarde V. Exc. Paço das Cortes em 5 de Fevereiro de 1822. - João Baptista Felgueiras

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senbor. - As Cortes geraes e Extraordinarias da Nação portugueza sendo-lhes presente o balanço da receita e despesa do cofre da universidade de Coimbra, transmittido pela secretaria de Estado dos negocios do
Reino em 6 de Agosto proximo passado, em virtude da ordem de 3 de Maio do corrente anno: ordenão que o reverendo Bispo conde reformador reitor informe com a possivel brevidade sobre os meios que julgar mais faceis e adequados para se obter o augmento da receita e diminuição da despesa, bem como sobre quaesquer providencias que possão melhorar a arrecadação, e augmentar os fundos da fazenda da universidade. O que V. Exc. Levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 5 de Outubro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para José da Silva Carvalho.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes Extraordinarias da Nação portugueza mandão voltar ao Governo os dois officios inclusos, e documentos que os acompanhárão, da junta administrativa do governo da provincia de Goiaz, datados de 21 e 30 de Janeiro do corrente anno, e transmittidos ás Cortes pela secretaria de Estado dos negocios da guerra em 8 de Julho proximo passado sobre o que havia occorrido naquella provincia desde o juramento da Constituição.
Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 5 de Outubro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para Sebastião José de Carvalho.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza em consideração o que lhes foi representado por José Antonio Ferreira Vianna, e Barão de Teixeira, ácerca dos motivos pelos quaes um e outro não podem cumprir as obrigações de membros da Commissão do thesouro publico, creada por decreto das Cortes de 19 de Agosto do presente anno: resolvem que os supplicantes José Antonio Ferreira Vianna, e Barão de Teixeira fiquem escusos do referido encargo para que forão nomeados pelo citado decreto. O que V. Exc. Levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 5 de Outubro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza, sendo-lhes presente a consulta da Commissão encarregada de estabelecer a norma do lançamento e arrecadação da collecta applicada para amortisação da divida publica, datada em 9 de Julho proximo passado, e transmittida ás Cortes pela secretaria de Estado dos negocios da fazenda em 12 do mesmo mez, pedindo uma remuneração a favor dos dois officiaes da junta dos juros que tem sido empregados na correspondencia, e expediente da referida Commissão: ordenão que a mesma Commissão consulte o que julgar justo que se dê aos ditos officiaes em attenção ao excesso e acrescimo de trabalho, e ao que vencem já como pertencendo á contadoria da junta dos juros. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 5 de Outubro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza, sendo-lhes presente o offerecimento, que a beneficio do Estado fez o desembargador da relação do Porto, secretario da junta do commercio, Manoel Antonio Vellez Caldeira Castello Branco, do ordenado vencido, e que de futuro vencesse na qualidade de desembargador, em quanto por outra repartição tiver vencimentos, com que decentemente possa sustentar-se: resolvem que seja competentemente verificada a referida offerta pelo que pertence as quantias até ao presente vencidas, ficando suspensa a acceitação do resto, em quanto se não delibera, se o offerente deve de futuro vencer ordenado pela folha da sobredita relação. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes e 5 de outubro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza,

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tomando em consideração a certidão transmittida pela secretaria de Estado dos negocios da fazenda em 6 de Setembro próximo passado, d'onde se mostra a impossibilidade em que se acha João Anastacio da Costa de cumprir as obrigações de membro da Commissão do thesouro publico, para que foi nomeado pelo decreto das Cortes de 19 de Agosto do presente anno: resolvem que o mencionado João Anastacio da Costa fique escuso do referido encargo. O que V. Exca. levara ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 5 de Outubro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinnrias da Nação portugueza, sendo-lhes presente a consulta da Commissão encarregada da inspecção, e direcção da fabrica das sedas e obras das agoas livres, datada em 26 de Agosto do corrente anno, e transmittida ás Cortes pela secretaria de Estado dos negocios do Reino, com officio de 4 de Setembro, sobre o requerimento de João Antonio Lopes Pastor, que pretende arrematar certa porção de sedas velhas, e antigas; e instando-se no sobredito officio pela resolução de outra anterior consulta da mesma Commissão, transmittida pela mesma secretaria de Estado em 9 de Novembro de 1822; propondo uma segunda arrematação daquellas sedas velhas, e avariadas; attendendo a que na resolução de 11 de Dezembro de 1821, remettida ao Governo pela secretaria de Estado dos negocios da fazenda se acha o referido negocio decidido em quanto dispõe no artigo 2 que todos os bens nacionaes, de qualquer natureza que sejão, sempre que a sua conservação, ou administração for prejudicial, e mais util a sua alienação, devem ser arrematados precedendo editaes, annuncios, e todas as mais solemnidades da lei, e estilo: resolvem que a citada resolução seja communicada ás outras repartições do ministerio, sendo provavel que da falta desta devida communicação tenhão procedido as irregularidades que a este respeito apparecem no proceder da Commissão da fabrica das sedas. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 5 de Outubro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza, tomando em consideração o officio do Governo, expedido pela secretaria do Estado dos negocios da fazenda em data de 9 de Setembro proximo passado, dando conta de que apesar de todas as diligencias não tem sido possivel installar-se a Commissão do thesouro publico, creada por decreto das Cortes de 19 de Agosto do presente anno, por se não haver reunido sufficiente numero de membros: attendendo a que o referido procede do justo impedimento de alguns dos nomeados, tres dos quaes já tem obtido a sua escusa: resolvem que a sobredita Commissão fique autorizada para se installar com o maior numero de membros que for possivel reunir, convocando os substitutos, e procedendo nos seus trabalhos todas as vezes que se juntarem pelo menos cinco membros. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 5 de Outubro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para Luiz Monteiro.

As Cortes Geraes, e Extraordinarias da Nação portugueza ordenão que pela thesouraria das Cortes se abone ao illustre Deputado pelo reino de Angola, Manoel Patricio Corrêa de Castro, a dicta ordinaria desde o dia 31 de Agosto proximo passado, em que tomou assento no soberano Congresso, na conformidade do que se acha decidido em caso identico na resolução de 3 de Maio do corrente anno. O que participo a V. Sa. para sua intelligencia e execução.
Deus guarde a V. Sa. Paço das Cortes em 5 de Outubro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para o Barão de Molellos.

As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza concedem a V. Sa. 15 dias de licença para tratar da sua saude. O que participo a V. Sa. para sua intelligencia.
Deus guarde a V. Sa. Paço das Cortes em 5 de Outubro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Redactor - Galvão.

SESSÃO DE 7 DE OUTUBRO.

ABERTA a sessão, sob a presidencia do Sr. Trigoso, leu-se a acta da antecedente, que foi approvada. O Sr. Deputado Secretario Felgueiras deu conta do expediente, e mencionou os seguintes

OFFICIOS.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - Sua Magestade manda remetter às Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação a planta da foz da barrinha da praia da Nazareth, feita pelo coronel engenheiro Luis Gomes de Carvalho, e uma memoria sobre o mesmo objecto na conformidade da ordem das mesmas Cortes. Como constava na secretaria d'Estado dos negocios do Reino, que no arquivo do mosteiro de Alcobaça existião os planos, e mais papeis pertencentes á foz da barrinha, de que havia sido encarregado o defunto corregedor do Ourem Rodrigo de Sá Mendonça Godolfim, expedirão-se as ordens competentes ao actual corregedor de Alcobaça para verificar esta

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