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Deus guarde a V. Exc.ª Paço das Cortes em 16 de abril de 1882 _ João Baptista Felgueiras.

Para Candido José Xavier.

Illustissimo e Excelentissimo Senhor. -- As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugneza mandão remetter ao Governo, a fim de ser competentemente verificado, o incluso oferecimento, que o juiz de fóra de Moura, Manoel Alvares de Sousa, dirigiu ao soberano Congresso, para as urgencias do Estado, de todos os emolumentos que tem vencido, e de futuro vencer pela prontificação de transportes naquelle lugar. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Majestade.

Deus guarde V. Exc.ª Paço das Cortes em 16 de Abril de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para Ignacio da Cosia Quintella.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor.-As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza, tomando em consideração o requerimento do capitão de fragata graduado, Faustino José Schiltz, e dos segundos tenentes, Luiz José Dias, e Silvestre José Nogueira, transmittido pela Secretaria d'Estado dos negocios da marinha, em data de 30 de Março proximo passado, no qual expôem, que havendo-se desarmado a fragata Principe D. Pedro, em cuja guarnição, vierão da Bahia, e tendo-se annullado a promoção em que forào comtemplados, feita pela Junta Provisoria do Governo daquella provincia, se lhes pretendem agora descontar as maiorias que perceberão: ordenão que fique igualmente extensiva aos supplican-tes a resolução tomada em Cortes aos 2 de Março proximo passado, pela qual se dispoz, que nenhum desconto se fizesse aos officiaes do 2.° batalhão do re-gimento de infantaria n.° 2, regressados de Pernambuco, assim das gratificações, como do accrescimo dos soldos dos postos a que tinhão sido elevados, e em que não forão confirmados. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exc. Paço das Cortes em 16 de Abril, de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Redactor - Velho,

SESSÃO DE 17 DE ABRIL.

ABERTA a Sessão, sob a presidencia do Sr. Camello Fortes, leu-se a acta da antecedente que foi approvada.

O Sr. Secretario Felgueiras mencionou os seguinte officios.

1.° Do Ministro dos negocios estrangeiros concebido nestes termos: - lllustrissimo e Excellentissimo Senhor. Sua Magestade desejando combinar na or-ganisaçao que se tem proposto do corpo consular, o bom serviço de commercio com a necessaria economia neste ramo de publica despeza, entendeu que por um lado supprimia um grande numero de consulados, cuja conservação, attenta a sua pouca utilidade, he um excessivo onnus para o Estado; assim como por outra parte se fazia indispensavel augmentar ao numero de sete os dos estados unidos da America Septemtrional, para cumprimento das disposições indicadas por V. Exc.a, de ordem do soberano Congresso no seu officio dirigido a esta Secretaria d'Estado na da- ta de 9 do corrente. He nesta conformidade que foi traçado o mappa letra A, em que se mencionão os consulados a que ao Governo pareceu que cumpre reduzir os que devem ter vencimentos, e serem exclusivamente occupados por nacionaes. Além da suppressão dos consulados actualmente em cidades que não são portos de mar, taes como Paris, Berne, Roma, e Madrid, pareceu ao Governo conducente ao mesmo fim de economia encarregar das funcções consulares nas cortes, que são portos de mar aos primeiros addidos das respectivas legações, com o que alem disso se consegue identificar mais e mais os interesses do commercio com as relações politicas do Estado, que por sua natureza são inseparaveis. O mappa letra A, traçado na conformidade destes principios, mostra reduzidos ao numero de trinta e tres os consulados que no actual estado do nosso commercio pareceu conveniente conservar, e em frente de cada um delles os ordenados que tomando-se em consideração, assim a carestia das terras, como o provavel producto dos emolumentos, se reputarão adequados para a decente sustentação de cada um dos agentes consulares. Como porem por effeito daquella suppressão de consulados, bem como pelo principio que o Governo julgou dever adoptar de não empregar senão nacionaes nos consulados de maior importancia, ficasse sem emprego um certo numero de cônsules, que tendo servido por muitos annos o Estado, tem adquirido direito a não serem inteiramente esbulhados dos meios de subsistencia que unicamente tiravão daquelles seus empregos, pareceu a Sua Magestade que não desmerecia a approvação do soberano Congresso distinguir estes agentes consulares em duas classes: a primeira comprehendendo aquelles que o Governo reputa em estado de poderem ainda prestar uteis serviços ao commercio, seria destinada a occupar consulados que por sua morte ou desistencia deverão entrar no numero dos vice-consulados que na conformidade do decreto de 4 de Fevereiro do corrente anno devem ser preenchidos por pessoas estabelecidas no lugar, e só pelo producto dos emolumentos, sem outro algum salario d'Estado; e he o que representa o mappa letra P. A outra classe comprehenderia aquelles cônsules que ao Governo he constante não poderem mais prestar serviço nem nos consulados que actualmente occupão, nem em algum outro para onde se quisessem transferir. O seu numero pouco consideravel he o que consta da relação letra C. Sua Magestade, considerando, tanto a natureza destas innovaçõvs, como o accrescimo de despeza que do indispensavel augmento de ordenados resulta no Thesouro do Estado, me ordenou fizesse participante a V. Exc.ª de todo o re-

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ferido, a fim de que subindo ao conhecimento do soberano Congresso, se resolva como cumprir ao publico serviço, não devendo com tudo o Governo deixar de advertir, que comparada a total despeza do corpo diplomatico, e consular no actual estado, segundo o que vai expendido nos appensos de A até E com a que montava o mesmo ramo de serviço no ultimo anno comparavel de 1820, resulta uma economia de mais desessenta e nove contos de réis, sem contar a que deve provir da diminuição das despezas de secretarias, assim das missões, como dos consulados, que da simplicidade da presente organização, e das limitações que o Governo tem ordenado em suas instrucções deve infallivelmente resultar.

Deus guarde a V. Exa. Secretaria de Estado dos negocios estrangeiros, em 16 de Abril de 1822. - Senhor João Baptista Felgueiras. - Silvestre Pinheiro Ferreira.

Foi mandado á Commissão diplomatica.

2.º Do Ministro da fazenda, transmittindo um officio da junta da administração e arrecadação d a fazenda publica da provincia do Prauhi, pedindo a confirmação do augmento que fizera aos officiaes empregados na escrituração e trabalhos do expediente da mesma junta. Passou á Commissão de fazenda do Ultramar.

3.° Da Commissão encarregada da inspecção geral e administração do terreiro publico, remettendo a balanço annual do mesmo terreiro do anno 1821. Passou ás Commissões de agricultura e fazenda.

O mesmo Sr. Secretario expoz que na copia que se tirou do decreto das Cortes de 3 deste mez, sobre os direitos que devião pagar as fazendas da Asia, tinha havido uma equivocação no artigo 1.° escrevendo-se vinte e dois por cem em lugar de vinte e quatro por cem, e que para remediar este inconveniente fizera um projecto de decreto, que leu e foi approvado (vai transcripto no fim da sessão).

Foi presente uma carta do Sr. João Vicente, da Silva, Deputado pela provincia do Minho, em que expondo a sua falta de saude pedia mais dez dias de licença, o que lhe foi concedido.

O Sr. Ferreira Borges apresentou um requerimento de João Antonio Salgado, chefe de divisão da armada nacional, e de outros, que foi mandado remetter á Commissão de petições.

O Sr. Malaquias pediu licença para poder requerer e obter uma provisão de insinuação; mas julgou-se não ser necessaria a licença para este objecto, por ser negocio judicial.

Feita a chamada, achárão-se presentes 111 Deputados, faltando 29, a saber: os Srs. Falcão, André da Ponte, Andrade, Moraes Pimentel, Canavarro, Ribeiro Costa, Bernardo Antonio de Figueiredo, Barata, Feijó, Lyra, Agostinho Gomes, Baeta, Almeida e Castro, Queiroga, Ferreira da Silva, Pinto de Magalhães, Vicente da Silva, Correa Telles, Faria, Sousa e Almeida, Moura Coutinho, Vaz Velho, Gomes de Brito, Serpa Machado, Vergueiros, Ribeiro Telles, Bueno.

Passando-se á ordem do dia, entrou em discussão a excepção determinada no artigo 33 do projecto n.º 243, a qual se propunha que os regulares, não se comprehendendo os das ordens militares nem os secularisados, não possão ter voto nas eleições de Deputados. Sendo proposto á votação, foi logo approvado.

Entrou em discussão outra excepção do mesmo artigo, na qual se propunha que os condemnados a prisão ou degredo para fóra do respectivo continente, não podessem igualmente ter voto na eleição de Deputados.

O Sr. Villela: - Lembro que á expressão respectivo continente, se substitua respectiva provincia.

O Sr. Macedo: - Esta excepção parece-me desnecessaria, porque já está dito que para votar era necessario ser cidadão, é estar no exercicio dos direitos de cidadão. No artigo 24, cuja doutrina provavelmente, será approvada, se declara expressamente que Um dos meios porque se perde o exercicio do direito de cidadão, he por estar preso. Por tanto se os que estão presos por esse facto ficão privados do exercicio do direito de cidadão, claro está que estão excluidos de votar: consequentemente parece-me superfluo declarar aqui esta excepção, que está comprehendida na primeira parte do artigo.

Procedendo-se á votação, não foi approvada a excepção tal qual estava, mas sim com a emenda das palavras para ora da provinda, em lugar de para fóra do respectivo continente.

Passando-se a discutir se os estrangeiros naturalizados deverião ter direito de votar nas eleições dos Deputados. A este respeito disse

O Sr. Franzini: - Opponho-me a esta clausula do artigo, pois que é projecto da Constituição tem já sido assas illiberal para com estrangeiros; e não convem aggravalo mais. Se tambem os excluirmos de poderem votar na eleição dos Deputados, não vejo quaes sejão os direitos que vai adquirir o estranho, que se naturaliza cidadão portuguez; e que por este facto renuncia aos direitos de que gozava na sua patria. Por um artigo constitucional já os estrangeiros forão habilitados para exercerem o cargo de juizes; e por outra parte não se achão excluidos dos maiores cargos militares. Ora na verdade não seria um absurdo, que a individuos, que até perdem ser officiaes generaes, e juizes, se lhes negue o direito de eleitores para Deputados, direito que se concede a todos os cidadãos em geral? Concluo por tanto, que os estrangeiros naturalizados devem gozar do direito de eleitores, quando nelles concorrão as outras circunstancias exigidas pelos antecedentes artigos da Constituição.

Depois de alguma discussão mais, em que, a favor da concessão aos estrangeiros naturalizados, no direito devotar, falárão os Srs. Braamcamp, Borges Carneiro, Miranda, e Caldeira, cujas falas não apanhou o taquigrafo do dia, - procedeu-se á votação, e se venceu que os estrangeiros naturalizados tivessem direito de votar na eleição de Deputados das Cortes.

Entrou depois em discussão um additamento offerecido pelo Sr, Sarmento, em que propunha, que os vadios não podessem votar nas eleições para Deputados de Cortes.

O Sr. Guerreiro, apoiando o additamento, mostrou que os vadios devião ser privados do direito de eleger, que exercião os demais cidadãos.

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O Sr. Sarmento: - A demonstrarão da verdade da doutrina do meu additamento acaba de ser feita pelo illustre Preopinante o Sr. Guerreiro, e eu pouco pertendo accrescentar. Parece-me que foi em 31 de Agosto, que eu offereci este additamento: elle não era concebido no termo geral da expressão de vadio, receando que me não explicasse bem, agarrei-me ás formaes palavras do § 4.º do artigo 25 da Constituição de Hespanha, e servindo-me das expressões que ali se encontrão, accrescentei ao termo vago aquelle que não tem emprego, officio, ou modo de viver conhecido, sinto que se perdesse o meu additamento, e que em vez delle appareça, em a nota redigida pela Commissão de Constituição, a palavra vadio acompanhada de um signa!, como cie pergunta: ao menos por ser este additamento copiado por mina. da Constituição de Hespanha mereceria melhor acolhimento. Eu sei perfeitamente, que admittidas as formas democraticas no systema representativo da nossa Constituição, era uma consequencia a doutrina do suffragio universal, porem esta doutrina tem suas excepções; o nosso velho amigo Jeremias Bentham tambem estabelece excepções. Alguns ainda que tenhão com pretensão, e virtude, são excluidos, em attenção a outras cousas, como as mulheres, apesar de que entre nós, aonde não tem vigor a determinação das leis as dicas, as linhas femininas são chamadas á successão do throno, na falta de linhas masculinas t todavia os deveres do sexo, a paz domestica, e outras considerações fazem com que as mulheres sejão excluidas de votar nas eleições de representantes da Nação, apesar de se não duvidar que as mulheres são capares de amarem a patria, e de terem lodo o descernimento para fazerem boa escolha de Deputados. Ha tambem um principio, que estabeleceu um dos maiores apaixonados, que a liberdade teve nos nossos dias, o grande Carlos Jaime Foz; uma elle que o melhor principio para a representação nacional he aquelle, que põem em actividade o maior numero devotos independentes, e exclue aquelles, cujas circunstancias fazem com que não possão deliberar. Parece que os vadios estão incluidos em o numero daquelles, que não tem a independencia de que ha mister um eleitor. Insisto que não se consigne o termo de vadio sem alguma explicação, como já reflecti, para evitar questões, que nas mezas eleitoraes se poderão suscitar, ou por motivos de inimizade, e muitas vezes de boa fé. Eu não duvido que entre os vadios haja quem diga que tenha amor da patria, se que deveras exista essa virtude em alguns delles, porem quando se tomão medidas de tamanha importancia, olha-se para a regra geral, e se não contemplão excepções, e até porque os vadios tem um meio prompto de renunciarem ao seu estado, procurando emprego, e modo de vida.

O Sr. Moura: - Os vadios devem ser excluidos de votar; não me opponho a que se esplique o que he vadio; entre tanto a palavra vadio entre nós não tem uma inunciação vaga, tem uma inundação legal: vadio, diz a ordenação, he aquelle que não tem officio, nem mister em que ganhe a sua vida, e por isso seria escusado declarar o que era vadio. Entre tanto se se quizer explicar o termo, explique-se muito embora, mas talvez não seja necessario.

O Sr. Varella: - Antes de passar á doutrina do artigo seguinte quereria que se ingerisse nestas excepções os celibatarios, logo que chegarem á idade de 60 annos parece que não ha razão alguma para que um celibatario depois de 60 annos quando não tem um legitimo representante continue ainda a exercer aquellas funcções. Eu limito-me á idade de 60 annos, porque até esta idade ainda póde prestar serviços com algum amor; mas uma vez que não deixar representação, creio que não tem interesse nenhum na ordem das cousas futuras; comtudo a beneficio da humanidade e sociedade quereria que estes celibatarios desta idade fossem admittidos uma vez que apresentassem dois filhos legitimados.

Procedendo-se á votação, decidiu-se que os vadios não tivessem direito de votar nas eleições, e que na redacção se declarasse que por vadios sé entendião aquelles homens que não tinhão emprego, officio, ou modo de vida conhecido.

Propondo-se á votação o additamento do Sr. Varella em que propunha que os celibatarios logo que cheguem a 60 annos, não tendo dois filhos legitimados, não possão votar nas eleições. - foi rejeitado.

Passou-se a discuti rum artigo offerecido pelo Sr. Miranda, em que propunha, que depois do anno de 1850 todos aquelles que não souberem ler e escrever não tenhão direito de votar. Em apoio deste artigo disse

O Sr. Miranda: - He necessario, Sr. Presidente, promover de um modo indirecto a instrucção publica: todo o que tiver direito de cidadão não póde exercitar este direito, sem saber ler e escrever. Só um descuido e desmazelo reprehensivel he que faz com que os homens ignorem uma cousa que lhe he tão conveniente. Por tanto a minha indicação deve approvar-se; não podemos porem ser injustos ar respeito da geração presente, que tem cooperado grandemente para o estabelecimento do systema constitucional, e attendendo a isso he que julgo necessario estabelecer o prazo de 30 annos, que não me parece muito curto.

O Sr. Sarmento: - Não posso deixar de me oppor a este additamento, porque me parece injustiça privar qualquer cidadão do maior direito que lhe compete, qual he o de eleger os seus representantes, por um motivo- de utilidade que não póde de modo algum reputar-se de tal monta, que seja mister exigir-se do cidadão ião grande sacrificio. Parece-me que similhante additamento vai cercear consideravelmente o numero dos que hão de votar, segundo o systema da eleição directa, e fazer de pouco effeito aquelle methodo de eleição, que o Congresso já decidiu ser o mais conveniente, para a livre, e melhor escolha de representantes da Nação. Eu não posso convencer-me de que o saber ler e escrever he bastante para pôr qualquer cidadão, independente de procurar outra informação ácerca das qualidades das pessoas que devem ser escolhidas para Deputados; porque afama e reputação, que algum cidadão tiver alcançados na opinião publica, tão bem se communica aos ouvidos daquelles, que não sabem ler, e escrever. Se se considera este meio como efficaz de promover a instrucção publica, eu acho muito violentos e julgo que ata-

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ta um dos maiores direitos do cidadão. Sei que esta doutrina tem a seu favor um artigo da Constituição de Hespanha, e a opinião de Bentham, porem sem embargo disso, eu não convenho que o interesse do aumento da instrucção publica deve sanccionar a privação dos maiores direitos do cidadão.

O Sr. Moura: - Acho muito racionavel a proposta do Sr. Miranda, sem me importar que esteja na Constituição hespanhola, e mesmo na ingleza, porque para mim não me importa a autoridade tanto de uma, como de outra, mas sim a minha razão. Digo pois que a excepção he muito conforme aos principios do systema representativo, porque o direito de votar, não he uma qualidade tão inseparavel do cidadão portuguez, que haja de lhe competir só pela circunstancia de ser cidadão portuguez; não compete este direito só por esta qualidade; o direito devotar compete mais pela qualidade inherente ao cidadão, de ser interessado na politica do Estado, e com os conhecimentos necessarios para bem discernir a alta funcção a que se dedica; isto he, que tenha todos os meios necessarios, e sufficientes para fazer uma boa escolha. Ora quem negará que não seja preciso a todo o homem, para adquirir estes conhecimentos, ter os primeiros elementos por onde se adquirem as primeiras idéas? He evidente que muitos homens ha que sabem ler e escrever, que não terião conhecimentos para isto, mas da hi não se segue que os que não sabem, tenhão mais conhecimento que os que sabem. Os que sabem tem a porta aberta para adquirir toda a casta de instrucção: por tanto eu acho que esta excepção he muito justa e racionavel; e não posso deixar de a approvar.

O Sr. Franzini: - Todas as Constituições conhecidas exigem a qualidade de saber ler para autorizar o cidadão a poder votar; mas no systema de eleições directas que já está adoptado, digo que he indispensavel, e para nos convencermos basta ler o artigo 43 deste projecto, que determina que o eleitor leve escrito o nome do Deputado que escolhe. Ora o eleitor que não sabe escrever, como poderá estar seguro de que o nome que desejava e julgava escolher, vai com effeito parar na urna? Por este motivo sou de opinião que deve adoptar-se o aditamento do Sr. Miranda.

O Sr. Villela: - Eu tinha-me levantado para dizer quasi o mesmo que disse o Sr. Franzini; as eleições hão de ser feitas por listas; um homem que não sabe escrever pede a um vizinho que lhe escreva a sua lista, e diz-lhe escreva Antonio, ou José; este vizinho, póde muito bem enganalo, e apparecer na uma o nome de um Deputado que elle não queria eleger. Diz-se que o direito de votar he um grande direito, e que os cidadãos não devem ser privados delle; mas eu digo que he de reconhecida necessidade que todo o homem tenha alguma instrucção, pelo menos que saiba ler, e escrever: e por conseguinte cumpre para convidar os homens a ter esta instrucção o approvar-se o additamento. Quanto porem ao tempo, julgo muito longo o prazo indicado pelo Sr. Miranda; talvez fosse melhor estabelecer a época até 1830.

O Sr. Castello Branco: - Parece-me que n'uma Constituição politica só devem apparecer leis uteis e proveitosas na pratica, e não leis apparatosas, só porque são conformes com as theorias luminosas do seculo actual; eu conheço muito bem que para a liberdade politica concorre muito a instrucção dos povos, mas isto que não póde negar-se em theoria, he por ventura praticavel a respeito da massa de uma nação, em geral? E se he praticavel he unicamente de saber ler e escrever essa illustração tão desejada? Além disto, que certeza tem os honrados Membros que me precederão a falar, que daqui a 28 annos se acharão já povoadas, e reduzidas a cultura as grandes charnecas do Alemtejo? E se não estiverem ainda povoadas, e por consequencia reduzidas a cultura, que difficuldades se não apresentarão, para se verificar esta lei? Os povos do campo residindo numa pequena porção de terreno que cultivarem, mas separados de outras povoações por vastas charnecas, que difficuldade não terião para mandarem seus filhos ás escolas? Por isso não vamos estabelecer na Constituição uma regra muito conforme com as theorias actuaes, mas que na pratica vai ser inteiramente inutil, pelas difficuldades que encontrará; e uma vez que contenha estas difficuldades, que injustiça não vamos nós fazer aos povos, em os obrigar a uma cousa, para a qual o Governo lhe não apresenta os meios necessarios, nem póde apresentar? Eu não sei sobre que principios se fundão os honrados Membros que pretendem separar do cidadão este direito politico de votar: tudo ha querer inculcar que este direito não he tão inalienavel da sociedade, como se reputa; eu porem não posso conformar-me com estes principios; o direito de votar nos representantes da nação, he tão inalienavel do cidadão, quanto he inalienavel de um membro de uma sociedade a qualidade de cidadão; uma vez que elle entra na sociedade deve gozar de todos os direitos que competem aos membros dessa sociedade. Ora um desses direitos he o de votar nos seus representantes, porque he um meio que cada um tem de exercer a soberania que reside na nação; e esta parte da soberania que compete a cada um he sem duvida o direito mais sagrado do cidadão; he o que mais o lisongeia; he o que o eleva mais na qualidade de membro da sociedade. Por isso com muita injustiça se pertende considerar este direito como uma especie de favor que se concede ao cidadão. Uma vez que elle entra na sociedade, uma vez que he membro da sociedade, esse direito de nomear os seus representantes he um direito inalienavel; só se lhe póde tirar por uma autoridade publica, quando concorrerem circunstancias as quaes facão que o exercicio desse direito naquelle individuo venha a ser prejudicial ao todo; então subsiste a regra geral de que deve prevalecer a utilidade publica, cedendo a ella o interesse particular;. mas todos vem que isto he uma excepção, e que he uma excepção feita em razão da utilidade publica. Entretanto não subsiste menos a regra geral de que o direito de votar nos representantes, he um direito inalienavel da qualidade de cidadão; dos honrados Membros se persuadem que a qualidade de ler e escrever concorre essencialmente para a conservação da liberdade, ou que ella he exclusivamente

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necessaria para isso; eu devo dizer-lhes que completamente se enganão: debalde os cidadãos todos saberão ler e escrever, se aquelles que tem uma representação na sociedade, não forem constitucionaes, se os ministros da religião não forem constitucionaes, se os cidadãos não ouvirem os principios de liberalismo da boca de seus parocos e pregadores, que lhe ministrarem a palavra sagrada, debalde elles saberão ler e escrever; elles serão sempre inimigos da Constituição. Diz-se tambem que por isso que as eleições se devem fazer por listas, he preciso que os cidadãos saibão ler e escrever; entretanto estabelece-se um prazo entre a época presente e a futura, e um prazo de 28 annos: ora eu reflectirei que se acaso nestes 28 annos a Constituição permanecer, sem1 que os cidadãos sejão o Brigados a saber ler e escrever, posso assegurar á nação portugueza, que ella será sempre livre, ainda que passados esses 28 annos a totalidade dos cidadãos não saiba ler nem escrever. O perigo não está de 1850 por diante; uma vez vencida a difficuldade até esse tempo, vencida está a outra; portanto não duvidando do principio de que he necessario que a totalidade de uma nação seja instruida, e que tenha os elementos de saber ler, e escrever, necessarios para a sua instrucção, reconhecendo este principio em these, não convirei que se estabeleça como lei constitucional que o saber ler e escrever he uma qualidade essencial, sem a qual o cidadão não poderá exercer e direito mais sagrado da sociedade.

O Sr. Borges Carneiro: - A materia desta indicação está; na Constituição de Hespanha; e com tudo foi omittida pelos redactores do nosso projecto: o que Com outros muitos exemplos prova que elles não forão servis compiladores da Constituição de Hespanha, como alguem aqui diaria e habitualmente quer inculcar. He facil ver que elles laborarão sobre os principies do direito natural e das gentes, sobre a Constituição de França de 1791, sobre a dos Estados Unidos da America, sobre a de Hespanha; e não tiverão nem anglomania nem hispanomania, mas a terem de declarar alguma preferencia, estimão antes o liberalismo da Constituição hespanhola, que o feudalismo da ingleza. Vindo já ao additamento em questão, direi que ou lê approve ou se regeite, ficarei contente. Entretanto o meu voto he pela regeição. Sendo o direito de eleger os seus representantes um dos mais preciosos do cidadão, e do qual por consequencia elle não deve ser privado, senão por gravissima causa do bem geral, quantos não ficão já excluidos deste direito pelas exclusões já sanccionadas? Quantos não excluiu a clausula dos 25 annos de idade, ainda mesmo condecorados já com os gráos academico? e patentes militares, com titulos de ordens sacras, ou já casados e havidos por maiores na censura de direito, etc.? Quantos excluidos pela clausula de vadios etc., etc.? Se pois passamos agora a excluir mais a todos os que não souberem ler e escrever, assim em Portugal, como nas incultas campinas do Brazil, quantos não ficão privados deste precioso direito, não digo homens inuteis, mas homens mui consideraveis, que sem saberem ler e escrever, tratão com tudo grandissimos negocios, agrarios, mercantis, fabrís de industria de todos os generos. Nós conhecemos muitos neste caso; ninguem aqui está que os não conheça. E que? Para eleger bons Deputados, he necessario saber ler, e escrever? Não: o que he necessario he ter bom senso commum, e boas intenções: se não escreve a lista dos nomes, pede a quem lha escreva: não ha homem nenhum que não tenha um filho, um amigo, um irmão de quem se he. Muitos meios he de promover o ensino das primeiras letras- seta despojar de um grande direito ao cidadão que inculpavelmente o ignora. Vota por tanto contra o additamento.

O Sr. Sarmento: - Posto que eu seja superior a tudo o que acaba de expressar o illustre Preopinante, cujas expersões visivelmente se dirigem a mim, responderei ás reflexões, que fez com a moderação possivel. O illustre Preopmante nota-me de affeiçoado aos principios politicos da Constituição ingleza. Ainda quando assim fosse na sua totalidade, eu mereceria ao illustre Preopinante alguma indulgencia, porque ainda hoje agradeço a quem me mando educar desde os meus primeiros annos a um paiz, unico então na Europa aonde se cultivava a liberdade; tenho muita honra de ter ali aprendido a amar a liberdade desde tenra idade. Se o illustre Preopinante tivera conhecimento de mim, e examinasse a minha collecçao de livros, veria que esta estava recheada do que ha de melhor ácerca de principios de liberdade (bem entendido que eu amo aquella liberdade bem regulada, e digna do homem, porque essa he para mim a verdadeira liberdade), e então se desenganaria que eu não sou liberal desde o dia 24 de Agosto. Apezar da minha educação,- e dos principies, que o illustre Preopinante em mim suppõe, convém que eu lhe diga, que estando este reino governado, de modo que o governo-inglez tivesse bastante influencia, eu nunca jamais fiz a corte a nenhum individuo daquella Nação, nem por intercessão estrangeira consegui despacho, nem mercê. Parece-me que qillustre Membro não andou coherente em pertender arguir-me de inteira desafeição aos principios da Constituição de Hespanha, porque hoje mesmo offereci um additamento copiado formalmente daquella Constituição. Se o illustre Deputado se persuade que eu sou o mais cioso possivel de influencia estrangeira, faz na verdade um juizo exacto dos meus principios politicos, porque o amor pela independencia da minha patria, ha de abrazar-me até o derradeiro termo da minha vida.

O Sr. Miranda: - Nunca esperei que um principio tão claro fosse com tanta força combatido. He necessario, Senhores, que a Nação portugueza, passada certa época, seja muito mais instruida, e que todos os- cidadãos saibão ler e escrever. Como he possivel que n'uma Nação livre, vá um homem assignar um depoimento, sem saber o que assigna? Só em Constantinopla he que poderá contrariar-se um principio que tende a promover a instrucção dos povos. Desenganemo-nos, Senhores, que uma Nação só póde ser livre, quando for instruida. Qual foi a causa da queda do despotismo na França, senão a instrucção do povo Francez? Se em 1789 começarão ali a raiar os principios da liberdade, foi porque todos sabião ler e escrever, foi porque nas cabanas dos pas-

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tores, se ha o contracto social de Rosseau. Deve pois sanccionar-se na Constituição este principio, porque he um principio constitucional, que para um povo ser livre, he necessario ser instruido; nem digão os illustres Preopinantes que nisto se põem restricções, quando se da o prazo de trinta annos. Aquelles cidadãos que não estão em circunstancias de saber ler, nem escrever, ainda continuão a ter direito de votar sem que o saibão; os que não souberem ler para o futuro, não tem que se queixar da lei, mas sim da sua inépcia. Por tanto sustento o meu additamento.

O Sr. Bastos: - A indicação do Sr. Miranda tem uma face de apparente utilidade. Figura-se como influindo nos progressos da instrucção publica. Eu porem a julgo absolutamente estranha a estes progressos. Quem não aprender a ler e a escrever, pelos interesses que d'ai sempre costumarão resultar, não aprenderá pela simples prerogativa devotar na eleição dos Deputados, a qual se he mui lisongeira aos habitantes civilisados das villas e cidades, he summamente onerosa e incommoda aos habitantes dos campos e aldêas remotas. Se se quer verdadeiramente promover a cultura dos povos, porque senão recorre aos meios directos? Porque senão multiplicão as escolas? Porque senão leva o ensino até ás mais distantes e humildes choupanas? Preterir estes meios, antepondo-se-lhes o indirecto inefficaz e violento da privação de um dos mais preciosos direitos civicos, he um despotismo esteril, he uma revoltante injustiça. Por outra parte se a qualidade de escriptor publico fosse necessaria para se poder ser Deputado de Cortes, eu exigiria o estudo e os conhecimentos das primeiras letras, como uma qualidade essencial aos eleitores;. pois quem não sabe ler mal póde avaliar o merecimento de um livro e do seu autor: mas não se requerendo aquella qualidade nos Deputados, para que se ha de requerer esta nos eleitores? Por ventura a não podem elles, independentemente de um tal estudo, conhecer quaes são os homens do merecimento mais distincto no seu districto, na sua comarca, ou ainda na sua provincia? Probidade, desinteresse, e desejo de acertar suo sem duvida as qualidades essenciaes para constituirem um bom eleitor: e não podem ellas acaso possuir-se sem se saber ler nem escrever? O inconveniente da formação das listas, cuja existencia ainda se não decidiu, desapparace quando se considera que não ha incompatibilidade alguma em que ellas se mandem fazer, assim como se manda fazer a escripturação de muitos outros actos da maior importancia.

O Sr. Feio: - (Não o ouviu o taquigrafo Machado).

O Sr. Fernandes Thomaz: - Tenho visto atacar a emenda do Sr. Miranda com razões que a meu ver não são muito attendiveis; eu creio que este additamento não tem só em vista a grande razão de que se serviu o Sr. Franzini, elle tem tambem em vista- fazer que a Nação se illustre; e nós carecemos muito de impulsos desta ordem. Pois nós havemos de continuar a estar para o futuro nas desgraçadas circunstancias em que nos adiamos? He tal o estado de ignorancia a que de proposito se quiz reduzir a Nação, que chega a época da regeneração, buscão-se es homens paia os cargos, e não se achão, porque são poucos, e muito raros! E de que vem isto? Da falta de luzes em que se achava a Nação, parque os governos despoticos, o manhoso fanatismo interessavão em conservala na ignorancia, e na total privação dos conhecimentos uteis aos nossos povos. Ninguem póde desconhecer esta verdade. Qual he a razão porque se estabeleceu que os vadios não votassem nas eleições. He só por serem vadios? Não, he para obrigar estes homens a não serem vadios; para obrigar o vadio a adoptar um modo de vida util a se e á sociedade. Eis-aqui pois a razão pela qual esta emenda se deve adoptar, não he para castigar o homem que não ler; nem escrever, mas he para animar e estimular o homem que não sabe ler a que saiba, a que aprenda, porque a sociedade tira disto grandes interesses. Disse: mas isto he privar o homem de um dos direitos mais sagrados que elle tem, só por não saber nem ler, nem escrever. Perguntarei eu agora, qual he mais facil aprender o homem a ler, e a escrever, ou a ter bens da fortuna? Supponho que para aprender a ler basta ir a uma aula; ter bens da fortuna depende de muitas circunstancias; entretanto os que não os tem, são privados devotar. Está, acaso na mão de um homem ter meios de se sustentar, sem ser criado de servir? Não; a sua desgraça o obriga a ser criado de servir, não póde resistir ao seu destido, e por isso não vota. E tem alguem culpa em não ter bens da fortuna? Mas todo o homem póde aprender a ler; e senão aprende, he porque não se quer dar a esse trabalho; he por preguiça., ou por desmazelo dos pais. Tem sempre havido moitas aulas publicas de ler e escrever, e he obvio que o Congresso ha de augmentar para o futuro os meios; ha de facihcar aos povos os meios de instrucção. Conseguintemente não acho que haja embaraço algum a este respeito; limito-me porém a falar assim, relativamente a Portugal e Algarve, os Srs. Deputados do Brazil dirão se esta providencia he applicavel áquelle paiz.

Pelo que pertence a época que estabelece o additamento, eu diria que em lugar de 1850, se marcasse o anno de 1850; mas só para aquelles que tendo nesse tempo a idade de 25 annos, não souberem ler nem escrever; porque estes achão-se já em circunstancias de aprenderem, e se o não fizerem he porque não querem.

O Sr. Barão de Mollelos: - Tem-se feito longos discursos, e muitos argumentos Sobre a presente questão, mas noto que todos são fundados só em theorias, e nenhum na experiencia; e tendo-me esta ensinado que aquellas por si só são muito alheias, cumpre contronlalos com a pratica, e ver se são exequiveis. Propõe-se em uma emenda 28 annos, e em outra 8 para todos os Portuguezes aprenderem a ler, e a escrever; e que aquelles que não souberem dentro neste espaço de tempo, sejão excluidos das eleições. E disse um illustre Deputado que lhe e a usava horror ouvir dizer que não obstante tão lento tempo, ainda restaria algum individuo sem aprender a ler, e a escrever. A mim porém não me causa isto horror, nem causará áquelles que conhecem bem os povos das montanhas, e districtos menos civilizados, não digo só do

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Brazil, porem mesmo de Portugal; e a poderosa influencia que nelles tem a educação, os habitos invetrados, e o seu modo de vida. Quero suppôr, o que será muito difficil, que se estabeleção, em todos os districtos essas escolas de ensino mutuo, e todas as mais que alguns illustres Opmanles tem imaginado. Apesar disto não será tão facil, como elles pensão, que todos os cidadãos, desde o grande proprietario até o ultimo jornaleiro, cujo serviço ás vezes he mui distante de povoações, e se resolvão a ir ás escolas de mistura com as crianças; e que aprendão a ler, e ainda, o que he mais dificit, a escrever. Muitos destes individuos que não tem um instante que perder para poderem subsistir, com as suas familias, e que vivem em casaes muito distantes das povoações, poderão acaso resolver-se a serem mininos de escola? Eu creio que não. E por tanto ficarão daqui a 18 annos por uma emenda, e daqui a 8 pela outra, excluidos de votarem nas eleições; isto he, ficarão privados de um direito tão sagrado como todos reconhecemos. Não entro na questão se desta doutrina se deve fazer um artigo constitucional porque já se tem discutido demasiadamente: sou de opinião que, se se vencer que sim seja este artigo decretado pela legislatura a que tiverem precedido os estabelecimentos necessarios para se cumprir o que se decretar; e isto em todo o Reino Unido; pois de outra maneira vamos decretar uma causa que talvez não possa conseguir-se. Concluo que nunca serei de voto que sejão obrigados a aprender a ler, e a escrever as pessoas que tiverem mais de 10 annos; porque ainda que pareça aos illustres opinantes mui facil que aquelles desde esta idade até á de 40, ou 50 aprendão a ler e escrever, a experiencia lhes mostrará o contrario; e vamos excluir do direito de votai cidadãos com mais firmeza de caracter, e melhores intenções que muitos daquelles que sabem ler.

O Sr. Annes: - Eu sigo a opinião daquelles illustres Deputados que dizem que para o cidadão ter este direito de votar em seus representantes convêm que saiba ler e escrever em certo Tempo. A todas as razões que se tem dito se póde accrescentar o que todos os dias se diz, e vem a ser que sem opinião publica, e sem liberdade de imprensa, não póde haver systema constitucional. Ora sem que a maior parte dos cidadãos saibão ler, e escrever, não assento que possa haver liberdade de imprensa; mas quando he que se deve assignar esta época? Se eu soubesse quando esta vão feitos os estabelecimentos publicos, então facilmente poderia designar a época; se eu soubesse que daqui a 10 annos havião de estar estabelecidas tantas escolas que todos os cidadãos portuguezes podessem aprender a ler e escrever, designaria a época, mas eu não sei o que será no futuro; não sei se continuará a haver augmento a respeito das escolas; o que sei he que na mesma França tão gabada a respeito de instrucção publica, muitos escriptores se estão queixando da falta della, pois que ás escolas de ensino mutuo donde se esperavao tão vantajosos resultados, o Governo tem machiavelicamente subtrahido todos os meios e auxilios necessarios; de maneira que a 4.ª parte dos cidadãos francezes, segundo afirma um dos seus escriptores, não sabe ler nem escrever. Ora em que porporção está Portugal para a França, e que meios tem Portugal relativamente a França, para pôr em execução todos os estabelecimentos publicos? Por isso, não podendo eu saber qual he o praso em que as escolas se hão de estabelecer por toda a parte, não posso dizer a época em que deva ter lugar o additamento. Eis pois a minha idéa: até que se revogue a Constituição haverá o praso de 5 ou 6 annos; conseguintemente quereria eu que se determinasse na Constituição, que as primeiras Cortes que houvessem de rever a Constituição, designem a época em que deve principiar a obrigação de saber ler e escrever.

O Sr. Bastos: - Um dos illustres Preopinantes, declarando-se a favor da indicação, não a apoiou se não com sofismas. He necessario, disse elle, excluir os que não souberem ler e escrever de certa época por diante, para com isto os obrigar a aprender, assim como já excluimos os vadios para que deixem de ser vadios. A principal, ou antes a solida, a verdadeira razão porque nós excluimos os vadios, não foi essa; mas a de serem elles regularmente homens sem moral, sem caracter, e sem patriotismo. Não he muito (accrescentou o illustre membro) que excluamos os que não souberem ler, nem escrever, assim como já privámos os criados de servir do direito de votar não tendo estes commettido delicto algum, nem tendo culpa de ser pobres. Os criados de servir não forão privados de similhante direito em pena de delicto, nem o podião ser por tal motivo ou porque sua pobreza se lhe possa imputar em culpa; a sua condição he digna de compaixão e não de castigo: privárão-se de exercitar esse direito, pela incapacidade de o exercitarem devidamente: privárão-se da faculdade de eleger; porque nelles se suppõe pouco interesse, pouco zelo pela causa publica, e porque a dependencia em que se achão os tornaria mui faceis de subornar, ou seduzir; circunstancias que não são igualmente de recear nos lavradores, e em outros homens estabelecidos com a sua propriedade, ou com o seu officio, nos quaes se encontra o zelo, a honra, o espirito da independencia, o senso commum, e em muitos uma grande intelligencia, apezar de não saberem ler nem escrever. Quem não sabe ler nos livros dos homens, lê no grande livro da natureza, que instrue mais do que aquelles: e o caracter e a probidade dos homens vivos, que são os que se elegem, estuda-se mais no seu trato, e escutando-se a opinião publica a seu respeite, do que nos livros. Pelo atrazamento d'instrucção publica (ponderou mais o mesmo honrado membro) he que se estão procurando homens capazes para os empregos, e ou senão achão, ou se achão muito poucos. Eis-aqui uma inversão de principios. Não: a época feliz em que se procurem homens para os empregos, e não empregos para homens, ainda não chegou. Por ora são os homens que solicitão os empregos; e he por isso que cidadãos dignissimos estão cultivando as sciencias e a virtude numa vida particular, e que uma grande parte dos empregos, a que elles devião ser chamados, estão providos em homens da mais reconhecida incapacidade, é ha muito condemnados no tribunal in-

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flexivel da opinião publica. Para se conhecer a opinião publica (disse outro Preopinante) he que he indispensavel saber ler e escrever; porque he pela imprensa que ella se manifesta, e se derrama. Não he só pela imprensa, que a opinião publica se fórma, se patentea, e se espalha: infinitos são os meios parque nasce, cresce, e se propaga prodigiosamente a opinião. Eu poderia accumular as demonstrações desta verdade, se ella precisasse de demonstração. Além de que, pensa-se acaso que as pessoas, que não sabem ler, estão absolutamente privadas desse imaginario auxilio, que no objecto em disputa, lhes póde vir da imprensa? Quem não lê, póde ouvir ler, e a instrucção que não póde entrar pelos olhos, póde entrar pelos ouvidos, e crescer pela reflexão.

O Sr. Abbade de Medroes: - Eu vivo n'um paiz que tem 14 freguezias; creio que ha vinte e tantos mestres de ler e escrever, entre régios e particulares; com tudo duas terças partes dos habitantes não sabem ler, e eu mesmo na minha freguezia estou pagando a um mestre aonde vão vinte e tantos rapazes tão sómente, porque por uma parte os pais não tem a curiosidade de os mandar á escola, e por outra não tem vestidos decentes, e os preparos necessarios. Por tanto venho a dizer que a medida he boa, mas vamos privar grande parte dos cidadãos de poder votar, por outra parte estou persuadido, que pelo direito de votar ninguem vai á escola, porque a maior parte dos lavradores não tem empenho nisso; com tudo acho que o prazo de trinta annos he muito sufficiente, porque daqui a trinta annos as cousas se podem mudar; mas eu queria antes que isto se deixasse para outro tempo, e que as Cortes futuras providenciassem como lhes parecesse mais justo.

O Sr. Villela: - Os illustres Deputados que se oppõem ao additamento, suppõem que isto vai tirar aos cidadãos o direito de votar. Aqui marca-se um prazo, um tempo certo; depois do qual, aquelle que não souber ler e escrever fica excluido daquelle direito. Se depois deste prazo assas sufficiente não estão habilitados, queixem-se de si, e não da determinação. A respeito do Brazil informarei ao illustre Deputado, o Sr. Fernandes Thomaz, que a instrucção de ler e escrever está lá mais adiantada: quazi todos os libertos, e mesmo muitos escravos sabem ler e secrever. Julgo pois util e necessario, e voto a favor delle.

O Sr. Bettencourt: - Eu approvo o additamento do Sr. Miranda, mais por principios politicos, do que por principios que acompanhão o governo representativo. He innegavel que pela falta de instrucção nas provincias, a nossa agricultura, tudo quanto são artes e industria, estão em anniquilação, e quazi na sua infancia, e quando se fala a um homem qualquer em um invento novo, achão-se difficuldades invenciveis, mesmo porque os que se dão a este trabalho, para pôr em execução qualquer invento, achão-se difficuldades nos que tem de trabalhar com as maquinas; a sua rudez he em extremo; são obstinados; tudo quanto he novidade, e invento, ou descoberta, para elles he obstaculo; estão na ruina escandalosa porque seus pais e seus antepassados o fizerão daquella maneira, e que de modo nenhum devem ser feitos de outra sorte; e de que nasce isto? Nasce da ignorancia crassa de não saberem ler nem escrever. Tudo quanto for meio para alcançar a illustração e instrucção he de necessidade que deve promover-se? porque da prosperidade geral da Nação he que deve depender o systema constitucional, e por isso este additamento acho-o muita politico, constitucional, e digno de se approvar, não só pelo principio de animar a industria, e tudo quanto pertence á agricultura, fabricas, e manufacturas, mas tambem pelo principio de adoçar os costumes, e melhorar a moralidade. Nós vemos que nas nações aonde existem estes estabelecimentos ha menos crimes, e menos delictos. Trarei por exemplo a Escocia; nesta polida Nação he certamente aonde existe maior numero decente, e cidadãos que tem esta qualidade de saber ler e escrever. Sapateiros e alfaiates, no seu exercicio mecanico, reservão no dia um bocado de tempo para ler uma Gazeta; em todas as provincias que compõem o Reino de Inglaterra, a Escocia he aonde ha mais instrucção popular, e menos crimes e delidos. Vê-se em Hespanha, que a provincia que tem maior instrucção he a Galiza: todos os Galegos sabem ler e escrever, já ha menos crimes; elles, quando saem da sua patria, conservão uma correspondencia com as suas familias, e mandão os capitães, daqui para lá, e dão-lhe logo o seu destino. Desta maneira ha nos seus negcios uma condição essencial, que he o segredo; o que faz com que elles dêm empregos aos bens capitães. Por isso julgo que este additamento pelo lado economico, politico, e moral, se deve admittir na Constituição, porque he um novo estimulo aos povos, que indirectamente os vai animar a aprender a ler e escrever, de que lhe resultarão as maiores vantagens, que todas se converterão em bem geral da Nação; pois não se póde duvidar que o acto mais augusto para um povo livre, he a eleição dos seus representantes, e neste caso todos os povos, sendo uma condição o saberem ler, escrever os votantes, quererão habilitar-se para este acto, de que depende a prosperidade delles: as Cortes serão fiscaes da execução das leis, e promotores da felicidade da Nação, se os Deputados tiverem as qualidades devidas, e a sua maioria for composta de Deputados sabios, independentes, probos, e liberaes; isto he, amantes da legitima liberdade; liberdade bem entendida, e bem executada.

O Sr. Castello Branco: - Tenho ouvido a muitos Preopinantes estabelecer uma proposição d'onde deve tirar-se uma conclusão, e he que a Nação portugueza tem sido escrava por ser ignorante........De todas as reflexões que tenho feito, e de todo o meu estudo sobre a natureza, e marcha das sociedades actuaes, e mesmo das sociedades passadas em todos os tempos, em todos os seculos, e debaixo de todas as formas de governo quaesquer que sejão, eu, acho um unico resultado, e este resultado para mira he uma verdede eterna, e vem a ser que todas as nações congregadas em sociedade se dividem essencialmente em duas principaes classes, que uma destas classes he destinada a instruir a outra, e que a outra classe recebe daquella a instrucção publica. Necessaria-

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mente os homens que nascem iguaes por natureza, uma vez que entrárão na sociedade se tornão desiguaes todos conhecem as muitas causas que concorrem para isto; por consequencia nem todos se podem dar á mestria instrucção, nem todos se achão nos mesmos meies, nem iodos se podem habilitar para a perfeição. He sempre necessario que uma classe se occupe em trabalhos que não são proprios para a instrucção, entretanto que a outra classe tem vagar de sedar a si mesmo essa instrucção. Daqui vem que a Nação, se divide em duas classes; uma que instrue, e outra que he instruida; por isso não he da illustração da massa total da Nação, ou para melhor dizer, da cultura dos talentos, e de todos os membros de uma sociedade, que provem os progressos da industria, e de lado o mais que póde concorrer para a felicidade publica, he sim da liberdade da instrucção livre de prejuizos da classe instructora. Os déspotas quando firmão o seu trono he por esta classe; pouco lhes importa o povo rude ... He certo o principio que a falta de instrucção favorece o despotismo, que a falta de instrucção se oppõe aos progressos de todo o artigo de industria, e por isso se oppõe á felicidade publica, mas he a falta de instrucção das classes que são destinadas a instruir: logo cessa o grande motivo por que sequer fazer neste artigo uma violencia a uma classe de cidadãos. A indicação apresenta ar de liberdade muito grande, e bastava isto para ser apoiada, senão fosse o mal que ella produz nos direitos do cidadão. Por isso torno a dizer: não he de saberem ler, e escrever todos es Portuguezes, que hão de vir os bens da instrucção publica. He nas palestras, e exemplos dos que são destinados a instruir uma parte da Nação, que essa parte deve receber essa instrucção, e não simplesmente por saber ler, ou escrever. Algumas circunstancias haveria em que seria melhor não saber ler, nem escrever. Agora mesmo quando na divisão de partidos uma multidão de malvados se serve da liberdade da imprensa para obstar ao progresso constitucional, poderia alguem dizer em these geral que quereria que todos os cidadãos soubessem ler, e escrever? Não seria uma, verdade em geral que seria melhor que não soubessem ler, e escrever, e que por isso esses papeis informes se roubassem á leitura? Certamente ninguem o negaria. Entretanto porque não acontece agora, porque isto póde acontecer em outra epoca, eu estou bem longe de tirar uma consequencia que devia tirar, isto he, que se deveria deixar de promover a instrucção publica. O Governo, e um Governo activo tem á sua disposição os meios do tirar as armas das mãos dos informes que pretendem assim recorrer a meios violentos de opprimir os povos: e por essa razão he que não quero que se faça outra violencia a estes povos, excluindo das eleições aquelles que não sabem ler, menos por falta de vontade, do que por impossibilidade, e arranjos domesticos e economicos, e muito principalmente pela falta de meios que o Governo deve apresentar aos povos.

O Sr. Annes:- Duas reflexões fez o illustre Preopinante. Não he necessario, diz elle, saber ler, nem escrever, mas o que he preciso he que a classe instructora tenha bons principios. O segundo argumento, he o abuso da liberdade da imprensa, e o ser melhor não saber ler e escrever: quanto ao primeiro argumento, perguntarei eu para que a classe instructora ha de ser bem instruida, e a quem ha de instruir, se a multidão, isto he, a classe que ha de receber a instrucção, não souber ler, nem escrever? Não póde approveitar-se da classe instructora. Quanto ao outro argumento, não me canço em responder-lhe, porque he bem obvio a todos quanto elle he falso, e como he obvio refutalo.

Declarada a materia suficientemente discutida, propoz o Sr. Presidente, se para qualquer cidadão, depois de certa epoca, ler direito de votar nas eleições dos Deputados he necessario saber ler e escrever. E venceu-se que sim. Entrando em discussão qual deveria ser essa época, offereceu o Sr. Fernandes Thomaz uma emenda ao additamento discutido, concebida nestes termos: todos os que actualmente tiverem 17 annos de idade, ou dahi para baixo, e para o futuro, não poderão votar nas eleições, ainda que cheguem a idade competente, em quanto não souberem ler, e escrever. Sendo posta a votos, foi approvada, ficando salva a redacção.

Entrou depois em discussão outra indicação do Sr. Miranda, em que propunha que os libertos e seus filhos não tivessem direito de votar. A este respeito disse

O Sr. Peixoto: - Se nós admittimos os cidadãos naturalisados, porque não havemos de admittir os libertos? Por terem tido a desgraça de supportarem ferros iniquos? Depois que pela sua industria, ou pela benevolencia de um pai benigno conseguirão a liberdade, não póde haver motivo justo, pelo qual haja de ser-lhe denegada em parte a qualidade de cidadão; e muito menos aos seus descendentes: pelo contrario julgo, que visto não haver meio de negar-lhe o anterior aggravo, deve riscar-se quanto for possivel a memoria delle: e uma vez que no liberto concorrão as qualidades, que alei exige para qualquer emprego politico, tenha accesso a elle, como os outros cidadãos, sem a menor differennça.

O Sr. Fernandes Thomaz: - Sobre este objecto desejarei que fallem, e dêem a sua opinião os Srs. Deputados do Ultramar.

O Sr. Ledo: - De maneira nenhuma póde passar o additamento. Não ha razão alguma para privar os libertos deste direito. Ha muitos libertos no Brazil, que hoje interessão muito á sociedade, e tem grandes ramos de industria; muitos tem familias; por isso seria a maior injustiça privar estes cidadãos de poderem votar, e até poderia dizer que he aggravar muito o mal da escravidão. Um homem que nasceu escravo injustamente, que já viu seu pai escravo, seu avó, e a sua geração escrava, chega finalmente a ser liberto, tem um ramo de industria, e commercio, este homem só porque foi escravo injustamente, ha de ser privado do sagrado direito de votar. Certamente não. Muito poderia eu dizer, mas não venho preparado, e por isso os illustres Deputados supprirão o que eu não posso dizer.

O Sr. Feio: - Os homens nascem todos iguaes, e todos livres. O ser escravizado he uma desgraça, e

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o ser filho de escravo, ou de liberto he um accidente. Punir uma desgraça, ou um accidente com uma pena tão rigorosa, como a privação de um dos mais preciosos direitos do cidadão o de concorrer para eleição dos seus representantes, não he proprio de um povo livre. Longe de nós semelhante idéa! Não confundamos o crime com a desgraça. O crime merece castigo, a desgraça compaixão.

O Sr. Lino Ccutinho: - Os libertos devem votar. O cativeiro acaba immediatamente que elle tem a sua carta de liberdade, e elle entra nos direitos de cidadão como outro qualquer homem. O systema antigo não fazia distincção de libertos para os elevar a grandes dignidades. Temos libertos que são capitães de milicias outros coroneis etc. Ora se o systema antigo não fazia exclusão dos libertos, como ha de fazela o systema liberal, e constitucional? Demais A condemnação que esta indicação passa sobre os libertos, parece-me igual á que nós soffremos pela culpa de Adão. Eu não a posso admittir no presente caso. Por isso não approvo a indicação.

O Sr. Villela: - O meu parecer nesta materia he que isto fosse omisso na Constituição, e que não tratassemos deste negocio. Quanto aos filhos dos libertos estou persuadido de que esses de madeira nenhuma devem ser privados do direito de votar. Duvido porém muito, que aquelle que foi escravo tenha sentimentos generosos, fraticos, e livres, quaes cumpre que tenha o homem que deve escolher os representantes da Nação. A escravidão ordinariamente abate o espirito mais forte. Todavia não duvido de que haja algumas excepções: mas de como entre os escravos Africanos não se hão de achar epitetos.

O Sr. Corrêa de Seabra: - Esta indicação deve ser regeitada, porque vai escandalisar classes numerosas no Brazil, e legalizar prejuizos que obstão á prosperidade daquelle paiz, e que he necessario trabalhar pelos desterrar: e por tanto eu convido o Congresso a que nem mesmo discuta esta indicação.

O Sr. Miranda: - Eu não penso assim: apezar dos inconvenientes apontados deve discutir-se. He impossivel que um escravo que ainda está marcado com o ferrete da servidão, possa ter os mesmos sentimentos que outro qualquer homem livre. Ha muita differença entre um estrangeiro, e um escravo; o escravo não vem dos paizes livres, como o estrangeiro que se naturaliza: o escravo está sempre debaixo do jugo de seu senhor, e por conseguinte para ser verdadeiramente livre ha de se revoltar contra o senhor, desobedecendo-lhe se elle quizer obrigalo a votar em qualquer. Custa-me por isso a crer que elle tenha a mesma nobreza de sentimentos que tem outro qualquer cidadão portuguez. Deve por tanto admittir-se á indicação.

O Sr. Marcos Antonio de Sousa: - Sr. Presidente, admittida esta indicação se iria fazer um grande scisma no Brazil, aonde um terço da sua população consta de libertos, e entre elles ha homens de muita inteireza e probidade: por isso não devem ser excluidos de modo algum. Nós não estamos no caso de admittir todas as cousas do direito romano; e além disso existem em seu vigor as leis do Sr. D. José, pelas quaes era concedido aos libertos servirem cargos publicos: o Marquez de Pombal conheceu que esta medida era necessaria para o Brazil, para bem do qual se devião empregar estes homens. Não devemos pois estabelecer principios de tanta restricção, que certamente nada convem, e hão de produzis muita intriga. Mós o que devemos fazer he unir todos os cidadãos, constituir uma boa sociedade, e não provocar a discordia, que he de que poderia servir esta indicação.

O Sr. Pinto da França: - Acaba de falar o honrado Membro, fundando-se em principies politicos, que são assas admiraveis: Conformo-me com isto, mas vou mais avante, vou por principies liberaes; servir-me-hei dos principios do honrado Membro para tirar uma conclusão diversa. Um estrangeiro vota porque veio do paiz da liberdade; um escravo tem em si o ferrete da escravidão, por consequencia não deve votar. Assim he: mas tem elle culpa de nascer escravo! Não. Assim o quiz a sua sorte: mudou porém a sua sorte, está chegado á classe de cidadão, deve gozar de tudo assim como todos os mais cidadãos. Be por isto pois que eu voto contra a indicação.

O Sr. Sarmento: - Posto que não tenha a maior experiencia do Brazil, não posso deixar de me oppor é emenda. Os motivos porque se concedem as cartas de alforria, geralmente falando, ou são motivos de utilidade publica, ou de honra para a humanidade. Os escravos conseguem as suas manumissões ou pelo ganho da sua industria, e nesse caso vem a ser cidadãos uteis, pela prova que já derão de amor ao trabalho; ou pelo espirito de humanidade e generosidade de seus antigos senhores, e nesse caso vem para a sociedade civil depois deterem sido testemunhas de bons exemplos. Eu não digo que os nossos libertos estejão nas circunstancias dos de Roma, de cuja classe sairão nomes tão respeitaveis, e que forão muitas vezes o ornamento daquelle estado, todavia he uma falta de liberalidade excluir o sangue africano daquelles direitos que se concedem ao europeu, ao americano, e ao asiático; e neste sentido voto contra a emenda.

O Sr. Vasconcellos: - Tambem voto a favor dos libertos. A razão mais forte que se aponta contra isto he, que tendo elle o ferrete, da escravidão não póde ter verdadeira liberdade. A Nação portugueza era escrava, quebrou os ferros da escravidão, hoje he mais livre do que aquellas que nascêrão livres.

O Sr. Fernandes Thomaz: - Eu quero tambem dizer a minha opinião. Voto contra a emenda. Como poderia alguem votar a favor della se os illustres Deputados do Brazil que vierão de lá dizem que periga a segurança delle? Como elles são os primeiros que concordão nos principios, eu com muito gosto declaro que sempre tive em horror a idea de escravidão.

O Sr. Miranda: - Retiro a minha indicação, e devo fazer uma declaração. Persuadido que alguns Senhores Deputados do Brazil julgarão que ella convinha pata o bem daquella parte da monarquia, por isso a propuz, mas agora convencido do contrario peço, licença para a retirar.

O Sr. Lino Coutinho: - He preciso que eu faça um manifesto neste Congresso, e vem a ser, que sem-

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pre tive horror a escravidão, apezar de ser Brazileiro.

Declarada a materia suficientemente discutida, procedeu-se á votação, e decidiu-se unanimemente que os libertos podessem votar.

Entrou depois em discussão outro additamento do Sr. Guerreiro, em que propunha que fossem tambem exceptuados os homens de trabalho, e officiaes de officios manuaes que não tivessem um capital conhecido de propriedade ou de industria. Em apoio deste additamento disse o seu illustre autor: - O mesmo espirito que tem levado este augusto Congresso a determinar outras excepções ao direito de votar he o que me suggeriu a idéa desta indicação. Todo aquelle cidadão que não tem bens de propriedade nem de industria, que vive numa continua dependencia, nunca póde ter um interesse real na bondade das eleições. Concorram pois nestas classes que pretendo se exceptuem as mesmas circunstancias que fizerão excluir os criados de servir, e os que não tem um modo de vida conhecido.

O Sr. Moura: - Eu acho que esta idea implica contradicção, porque um jornaleiro adquire um capital do trabalho que faz. É como se ha de excluir de votar a um homem que tem um capital? Não o podemos fazer. Diz-se que o jornaleiro não he interessado na felicidade publica, porque nella pouco interessa. Todos tem o mesmo direito e interesse. O proprietario tem a sua propriedade fysica, o que trabalha tem a sua propriedade manual, e o que se applica ás artes e ás sciencias tem a sua propriedade intellectual.

O Sr. Guerreiro: - Não duvido que não sejão exactas as excepções que marquei; e confesso que para isso me vi, bastantemente embaraçado. O que eu queria era que fossem excluidos das eleições aquelles que não tem outra subsistencia senão o trabalho de cada dia: sendo esta idea approvada, não tenho duvida que seja marcada com outras palavras.

O Sr. Peixoto: - Eu bem quizera que a todos os cidadãos se concedesse a maior extensão de direitos; mas na sociedade não permitte a boa ordem publica tão absoluta liberalidade: são necessarios alguns sacrificios, e basta que os cidadãos tenhão o pleno exercicio de seus direitos, quando se habilitarem com todos os requisitos que as leis exigem. A eleição dos Deputados he o ponto mais importante de todo o systema: se a representação nacional for bem escolhida, tudo prospererá; se mal, tudo se arruinará. Um dos maiores perigos das eleições he o suborno, e este será tanto mais facil, quanto o for a accumulação de muitos votos em um só individuo. Se o simples jornaleiro, que anda de casa em casa, ganhando o jornal de dia para comer á noite, e a quem, geralmente falando, nada mais importa do que o lucro do momento, tiver o direito de votar, será mui facil aos homens ricos de qualquer districto, aos directores de fabricas, e a todos aquelles que trouxerem muitos jornaleiros no seu serviço, concentrar em si os votos delles, e dirigirem a eleição a seu arbitrio. O voto de homens a quem pouco interessa a ordem publica, ha de ser sempre ou perdido, ou, o que he peior, subornado; e por isso deve rejeitar-se.

O Sr. Castello Branco: - Eu estou muito certo que o honrado Membro autor da indicação, é os outros que a tem apoiado, não adoptão certamente os principios que se podem inferir das palavras que vou a dizer (He preciso que eu me previna com esta reflexão para não escandalisar os honrados Membros). Direi pois que a admittir-se esta indicação, ou outras quaesquer que a assemelhem a ella, iremos pôr os collegios eleitoraes em um pé de aristocracia. Nós já ternos excluido de votar nas eleições um não pequeno numero de cidadãos; não devemos por isso agora excluir uma tão numerosa classe como a dos jornaleiros. Todos sabem que em Inglaterra ha glandes povoações que não tem o direito de mandar Deputados ás camaras, porque no tempo em que ali se fez a Constituição não se achavão nas circunstancias em que agora se achão; e pela restricção deste direito, se diz que em Inglaterra, não ha rigorosamente representação nacional: se nós adoptássemos esta restricção, iriamos destruir a nossa representação nacional, e com bastante razão se diria de nós o mesmo que a este respeito se diz de Inglaterra. Eu reprovo o artigo, ainda coherente com o systema que tenho seguido, de refutar todas as excepções nas eleições, uma vez que para isso não haja uma razão muito forte. Disse um honrado Membro que para evitar o suborno convem diminuir o numero dos votantes: a mim parece-me o contrario, porque sempre julguei que era mais facil subornar vinte do que cem. Diz-se que estes homens hão de votar sempre naquelles de quem recebem o jornal: serão elles por ventura escravos? Talvez que em todas as classes da sociedade não haja homens que verdadeiramente sejão tão livres como elles. Como tem a felicidade de achar em toda a parte que fazer, póde dizer-se por isso que são os mais livres individuos da sociedade. Por conseguinte approvando a indicação iremos excluir da votação uma das classes mais numerosas e interessantes da sociedade. Reprovoa por tanto.

O Sr. Castello Branco Manoel: - Eu tambem reprovo a indicação. Duas razões se apontão para excluir os jornaleiros de votar; he a primeira o serem dependentes; a segunda, terem pouco interesse na sociedade, e por isso nunca poderão eleger bem. Pelo que pertence á primeira direi que me parece que esta classe he muito independente de sua natureza, porque tanto se lhe dá trabalhar nesta como naquella terra; e não tem por isso dependencia fixa de ninguem: muito mais dependente está o proprietario, pois que precisa delles para conservar a sua propriedade. Suppôr por tanto que esta gente não tem liberdade para dar um voto, he cousa com que não posso conformar-me. Pelo que toca a outra objecção, dengue elles não tem interesse na sociedade, julgo que quando ella prospera, cada um igualmente melhora segundo o seu estado; e que o contrario succede quando a mesma sociedade está abatida. O pobre e o rico tem o mesmo interesse no felicidade commum. Estou por tanto pela opinião que proferi.

O Sr. Borges Carneiro: - Vão-se fazendo tantas excepções a isto, que me parece lição as eleições sem ser directas. Se assim continuarmos ficarão as

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Juntas eleitoraes reduzidas a conselhos aristocraticos. Parece-me que quando a assembléa estabeleceu as eleições secretas, foi porque quiz dar a lados os cidadãos o direito de escolher o seu representante. Diz-se que os jornaleiros são dependentes; não acho que por isso devão ser excluidos: a verdadeira independencia que se deve buscar he que as eleições sejão secretas: sendo assim todos votam com liberdade;, mas se forem publicas, então todos tem dependencia, uns por amor, outros por contemplação, outros por interesse etc.: nada póde dar a independencia necessaria ao eleitor senão o segredo; tudo o mais são historias. Nós já temos excluido bastantes cidadãos porque para isso houve razões muito fortes: mas nos jornaleiros não concorrem de certo estas mesmas razões, e alem disso he uma classe muito numerosa. Voto por tanto contra esta indicação, e contra quantas mais se poderem excogitar.

O Sr. Guerreiro: - Grande he a desgraça do homem que tem de falar em publico, e não tem para isso os talentos necesarios; colligem-se muitas vezes de suas palavras cousas que nem lhe passarão pela imaginação: eis o que agora me acontece. Alguns illustres Deputados tem opposto doutrinas contra a indicação em cousas que ella não fala. A indicação não pretende excluir de votar o homem que não tem capital algum, que o não tenha empregado em commercio ou industria; mas sim aquelle que se vê reduzido a viver do trabalho do dia. Todo aquelle homem que tem uma propriedade, ou uma industria, he certamente interessado no bem publico, mas um jornaleiro que anda de casa em casa, que não está acostumado a fazer cousa alguma sem que lhe paguem, não póde ter interesse na causa publica; e esse homem he que eu pretendo que não tenha voto nas eleições. Isto he querer que a aristocracia não entre jamais nos conselhos eleitoraes. Qual foi a nação que querendo conservar a sua liberdade admittiu toda a classe de pessoas a votar? Nós jurámos uma fórma de Governo o monarquico-constitucional, e he necessario por isso que todas as nossas operações tenhão este cunho: bastantes medidas temos tomado para estabelecermos o que se chama liberdade, e temos conseguido segurar a nação; mas he necessario darmos uma garantia ao Poder executivo para que ninguem possa conspirar contra elle.....Acho que a parte importante da nação he aquella que tem interesses particulares na sociedade. E terão estes interesses os homens que a indicação aponta? E entrarão naquella ordem aquelles que não conhecem cousa alguma, nem buscão mais que satisfazer ás primeiras necessidades da vida? Terão estes homens por isso a independencia necessaria para fazer uma boa escolha? Eu estou intimamente convencido que não. Temos excluido outras classes porque estão nas mesmas circunstancias que esta e não havemos de excluila? Eu não conheço a disparidade. Disse um honrado Membro que estes homens tem o mesmo interesse que qualquer pelo bem da patria. Eu não sei que tenha interesse pela sociedade, senão quem tiver uma porção destes mesmos interesses; quanto maior for a somma dos interesses pessoaes tanto maior será a do interesse pela boa ordem, A minha indicação tende só a fazer os conselhos eleitoraes, os mais livres e seguros que for possivel, e por isso deve ser admittida.

O Sr. Peixoto: - Direi poucas palavras, para ser entendido perfeitamente. He mui facil combater opiniões desfigurando-as, e mostrando-as pelo avesso somente: he mui facil argumentar contra excessos, que os autores dellas não proferirão, nem tiverão no sentido. Foi o que fizerão alguns dos illustres Preopinantes, como muito bem advertiu o illustre Membro, que acabou de falar. A intenção que tive foi de excluir o simples jornaleiro, que nada mais tem, do que o seu serviço, que de casa em casa aluga: o jornaleiro, que de alguma sorte póde equiparar-se ao criado de servir, já exceptuado; porque não tem delle mais differença, do que o modo de assoldadar-se; porque alguns ha, que posto que o seu ajuste seja diario, com tudo aturão trabalhando na mesma casa mezes, e annos. A esta mesma excepção puz limites na sessão de hontem, quando estabeleci o principio constitucional, de que ninguem deve pagar tributo directo, para cuja imposição não tenha contribuido com o seu voto.

Aqui temos, que por tal principio o mesmo jornaleiro, que tenha de seu uma casa, ou uma leira, pela qual pague decima, será admittido a votar: aquelle official de officio, que dirigir uma officina, ou artista, que dirigir uma officina, um estabelecimento, que lhe forme um capital de industria, pelo qual seja collectado, será admittido a votar: vindo a ser excluidos sómente os cidadãos, que nada tem, que os ligue á patria; e esses mesmos durante este impedimento; e logo que o removão ficarão habilitados. Neste sentido he que deve ser entendida a minha opinião; e nelle não apresentará a face absurda, que se lhe quiz dar.

Não se julgando a materia sufficientemente discutida, e sendo chegada a hora da prolongação, decidiu-se que ficasse adiada a indicação do Sr. Guerreiro.

Lêrão-se mais duas indicações, uma do Sr, Borges de Barros, em que propunha que a mai de 6 filhos tivesse voto nas eleições; e outra do Sr. Lino em que propunha que dos menores de 25 fossem exceptuados os casados, os officiaes militares, e os bachareis formados. Ficárão ambas para se tomar em consideração na 1.º sessão de Constituição.

O Sr. Ferreira Borges offereceu um projecto de decreto tendente a favorecer a construcção e animar a marinha que ficou para 2.ª leitura com urgencia.

O Sr. Girão, por parte da Commissão de agricultura, leu a seguinte

INDICAÇÃO.

A Commissão de agricultura teve a honra de apresentar ao soberano Congresso em 24 de Março do anno passado o relatorio de uma exposição feita pelo corregedor da comarca d'Aviz, e que elle já remettêra ao Governo antigo em Agosto de 1818, sobre a agricultura de Coruche e Benevento, as duas terras de maior lavoura daquella comarca. A vista daquella exposição, e das informações, que lhe dizião res-

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peito, referio a Commissão, que sendo os campos de Coruche e Benevente os mais fecundos deste reino na producção de trigo, e outros cereaes, estão sujeitos a terriveis estragos procedidos das inundações; as quaes se por uma parte fertilizão, por outra os arruinão sobre maneira, quando se convertem em arrebatadas correntes; sendo tão consideraveis os damnos por ellas causados, que sem temeridade se póde conjecturar que Benevente deixará de existir antes de 60 annos, se hão se acudir com alguma efficaz providencia áquelles campos, que os ponha a abrigo da total ruina? que os ameaça, e que seja capaz de manter a sua agricultura, unico manancial da subsistencia dos moradores da dita villa. A providencia que se propunha, e pertendia, consiste na abertura de uma valia de legoa e meia de cumprimento, de 40 palmos de boca, e 15 de fundo; e na construcção de uma ponte de 3 arcos no sitio chamado do Pego da Pontinha: obras estas que não serião de excessiva despeza, attentas algumas circunstancias, que se ponderavão. A Commissão reconheceo a utilidade e necessidade destas obras, e fez ver as grandes vantagens que ellas promettem em beneficio da agricultura do commercio interino, e da saude publica; objecto que merece mui particular attenção em uma terra, onde por desgraça nos annos proximos tem successivamente diminuido o numero dos nascimentos, ao passo que o dos falecimentos vai crescendo progressivamente. A mesma Commissão relatou os arbitrios suggeridos peio corregedor d'Aviz, e juiz de fora de Benevente para fazer face ás despezas das obras pretendidas e approvando o projecto das mesmas obras, bem como o recurso para ellas apontado pelo sobredito juiz de fora, foi de parecer que se remettesse o seu relatorio á Regencia com as memorias que o acompanhavão, para que ella mandando proceder aos exames necessarios, e ouvindo as camaras interessadas, desse as providencias, que julgasse mais conducentes para o fim proposto. O soberano Congresso sempre sollicito em promover a felicidade da nação, que tem a honra de representar, não só approvou o parecer da Commissão de agricultura, mas até votou agradecimentos aos dois zelosos magistrados, cujos trabalhos tinhão servido de base áquelle parecer: e nesta conformidade se expediu ordem á Regencia em 26 de Março de 1821.

Mais de um anno tem passado, e por conseguinte tempo de sobejo tem havido para se dar cumprimento á minorada ordem: entretanto não consta á Commissão que se haja dado principio ás obras indicadas. E se por incuria do Governo antigo ficou subsistindo o deploravel estado dos campos de Coruche e Benevento apezar da representação que em 1818 lhe dirigiu o corregedor da comarca d'Aviz: de modo nenhum devem agora as Cortes confundir, que por mais tempo se retarde a applicação dos meios capazes de evitarem a total ruina, de que estão ameaçados aquelles preciosos campos; por consequencia não basta que o soberano Congresso tomasse já a este respeito a deliberação, que mais acertada lhe pareceu; he tambem do seu dever vigiar pela observancia dos seus proprios mandados. A vista do exposto propõe a Commissão, que se pergunte ao Governo se a mencionada ordem
de 26 de Março de 1821 tem já tido o seu devido effeito, ou quaes sejão os obstaculos que se tem opposto á sua execução. Sala das Cortes 17 de Abril de 1822. - Caetano Rodrigues de Macedo; Francisco Soares Franco; Francisco de Lemos Bettencourt; Girão; Francisco Antonio de Almeida Pessanha.

Foi approvada.

O Sr. Borges Carneiro apresentou a seguinte

INDICAÇÃO.

No juizo do anno relativo ao vinho do Alto Douro ordenarão as Cortes que acabada a feira do mesmo vinho, fizesse ajunta da companhia arrolamento de todo o que ficasse por vender com declaração de suas qualidades e preços, e que com informação sua sobre o consumo que poderia ter, fizesse tudo presente ás Cortes para se fixar o preço porque a mesma junta ha de comprar o dito vinho, visto haver-se-lhe concedido com essa obrigação o exclusivo da agua ardente. Tem passado mais de um mez depois que findou a feira, o arrolamento não se faz nem se apresenta; os negociantes, visto o dito exclusivo revogarão as commissões que havião dado para a compra daquelle vinho; os lavradores que querião distillar, abandonárão suas especulações; e o resultado he que os lavradores que não vendêrão seus vinhos na feira, os tom empatados nas adegas sem haver ninguem que lhos compre, e carecem de todos os meios para se sustentarem e cultivarem as vinhas.

Proponho por tanto se diga ao Governo que ordene á junta da companhia que sem perda de tempo de cumprimento á dita ordem das Cortes. - Borges Carneiro.

O Sr. Soares Franco: - Creio que isto não podo ter lugar, porque ainda se não passou o decreto, e depende da sua discussão.

O Sr. Borges Carneiro: - Disse o illustre Preopinante que a minha indicação depende de decreto; eu perguntaria de que depende a barriga daquelles lavradores, que tem os seus vinhos estagnados nos armazens, sem que ninguem lhos procure comprar, e elles sem dinheiro para comer, e para cultivarem suas vinhas. O decreto venceu-se nas actas, e ficou sepultado: a ordem para a junta da companhia remetter o arrolamento dos vinhos restantes da feira, ainda não produziu seu effeito: os negociantes vão introduzindo mais de 3$000 pipas de agua ardente. He este um objecto que não admitte esperas.

O Sr. Peixoto: - A necessidade de tratar de dar-se aos lavradores meio de extrahirem os vinhos que não tem vendido, he manifesta; porem presumo que a companhia já dirigiu ao Congresso alguma consulta sobre este ponto.

Decidiu-se que a indicação ficasse para 2.ª leitura com urgencia.

O Sr. Soares Franco, por parte da Commissão de agricultura leu o seguinte

PARECER.

A' Commissão de agricultura foi presente uma

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da junta da companhia, sobre o manifesto dos vinhos do Douro, remettida por officio do secretario de Estado dos negocios do Reino, em data de 3 de Abril. A junta da companhia pergunta, se deve ou não tomar-se o manifesto dos vinhos aos lavradores, que o não fizerão nos dias determinados pela. lei, e que o requerem agora; e se deve permittir-se a carregação dos mesmos vinhos áquelles lavradores, que assim o exigem, independentemente do dito manifesto, suppondo não lhes ser precisos.

A Commissão julga, que tendo a lei marcado designadamente os tres dias consecutivos aos tres primeiros de cada uma das duas feiras da Regoa, para se fazer o dito manifesto, não ha lugar algum a que agora se reformasse. Nem tambem se deve permittir a carregação dos vinhos aos lavradores, sem o dito manifesto; porque a lei deve ser igual para todos; e os negociantes serião certamente defraudados nas suas especulações e cálculos, que fizerão, se fossam achar nos mesmos mercados vinhos do Douro por preços muito inferiores áquelles porque se virão obrigados a compralos nos tres dias da feira.

Sala das Cortes em 17 de Abril de 1822. - Francisco Soares Franco; Francisco de Lemos Bettencourt; Antonio Lobo de Barbosa Ferreira Teixeira Girão; Francisco Antonio de Almeida Pessanha.

Foi approvado.

O Sr. Secretario Felgueiras deu parte que acabava de receber um officio do ministro dos negocios da marinha donde constava a parte do registo do porto tomado ao bergantim portuguez Espirito Santo, vindo de Pernambuco, e juntamente incluia officios de Francisco Maximiliano de Sousa, cem mandante da expedição do Rio de Janeiro, em que dava parte da sua expedição até áquelle porto; de que as Cortes ficárão inteiradas.

O Sr. Vasconcellos por parte da Commissão de marinha leu o seguinte

PARECER.

O Ministro da marinha representa ao soberano Congresso, que estando proxima a partir para a Bahia a Corveta Regeneração ali comprada, armada, e guarnecida com gente daquella provincia, entra em duvida se deve, ou não pagar-se aos seus officiaes, os quaes forão promovidos pela Junta daquella provincia, e de cuja promoção o soberano Congresso se approvou a parte honorifica, tendo elles a seu favor acharem-se em serviço nacional, que se deve concluir com a sua chegada á Bahia.

Parece á Commissão, que os officiaes da Corveta Regeneração devem continuar a ser pagos até a sua chegada á Bahia, segundo as patentes, a que forão promovidos pela Junta da sobredita provincia, sem que na contadoria se lhes faça desconto algum de maiorias, que tenhão recebido na Bahia, conforme se determinou a favor dos officiaes do exercito regenerador de Pernambuco, e dos da armada, que vierão da Bahia na Fragata Principe D. Pedro.

Sala das Cortes 17 de Abril de 1822. - Manoel de Vasconcellos Pereira de Mello; Francisco Villela Barbosa; Marina Miguel Franzini, José Ferreira Borges.

Foi approvado.

O Sr. Basilio Alberto, por parte da Commissão de justiça criminal leu os seguintes

PARECERES.

Primeiro. O intendente das obras publicas representa pelo Ministro da justiça, que cinceenta dos noventa é seis presos sentenciados do presidio civil da galé, tendo recebido fardamento em 3 de Novembro de 18§1, e 17 do mez antecedente tem vendido todo, ou uma grande parte delle, e estão de novo reduzidos á mesma nudez em que dantes estavão, sem que seja possivel ao cabo do presidio obstar a isso, porque os presos como não são castigados por este extravio empregão todos os meios, e ardiz para o effectuarem; e que por isso seria conveniente fazer extensivo aos ditos presos o artigo 10 do addicionamento á regulação militar de 14 de Junho de 1817, que castiga com vinte chibatadas, e dez dias de reclusão jejuando a pão e agoa em cinco delles alternadamente aos sentenciados militares; que comettem áquelle extravio do fardamento.

A' Commissão parece, que não ha inconveniente em se conceder aquella extensão, de que resulta utilidade ao publico, e aos mesmos presos. - Basilio Alberto de Sousa Pinto; José Ribeiro Saraiva; José Pedro da Costa Ribeiro Teixeira; Manoel José de Arriaga Brum da Silveira.

Segundo. A Commissão de justiça criminal viu a carta do desembargador Vicente José Ferreira Cardoso da Costa, dirigida ao Sr. Deputado Trigoso, como Presidente do soberano Congresso, em data de 23 de Janeiro; e apresentada em sessão de 18 de Fevereiro proximamente pastados, na qual agradecendo ao mesmo soberano Congresso ter deferido em sessão de 20 de Novembro ao seu requerimento; he com tudo obrigado a observar, e notar, que no relatorio da Commissão sobre elle publicado no Diario das Cortes do dito dia, se achava um periodo equivoco, e do qual poderá alguem querer tirar vantagem contra elle, nas palavras: sobre umas carias do Conde da Ega .... por onde se soube, e conheceu ser suspeito de pouca lealdade etc.; as quaes parece dizerem, que elle confessa e reconhece na sua representação, que por ellas se soubera ser suspeito de pouca lealdade, quando nunca confessou tal, antes sempre o negou; o que posto pareça evidentemente proceder do erro de copia, ou de imprensa, com tudo para tirar, e desfazer todo o equivoco, pede que a mesma carta seja inserida no Diario das Cortes, ou no do Governo. A Commissão não podia ver sem alguma surpreza esta carta, por não poder entender a maneira, porque contra a sua intenção desse ao supplicante uma tão justa causa para esta sua tão bem fundada reclamação, e protesto. Examinando porem o original, e authografo do parecer, existente na secretaria das Cortes, muito se lisongeou da justiça, com que o mesmo supplicante conjectura proceder tudo de erro da copia, que foi para a imprensa, ou da mesma

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imprensa; porque nelle se achão as palavras:, por onde soube e concedeu (referindo-se aelle), e não por onde se soube e conheceu (referindo-se ás cartas). He por isso de parecer, que a carta do supplicante com esta declaração, se publique no Diario das Cortes; tanto para tirar todo o equivoco a respeito delle, como tambem aquelle que póde haver, sobre a exactidão, e fidelidade dos relatorios da Commissão; a principalmente neste, no qual se achão muitas alterações, e erros, ou de copia, ou de imprensa. - José Pedro da Costa Ribeiro Teixeira; Basilio Alberto de Sousa Pinto.

Foi approvado, excepto na parte em que dizia se imprimisse a mesma caria no Diario das Cortes.

Terceiro. Antonio Alves Grande, e José Pinto de Oliveira, sendo comprehendidos numa devassa, a que procedeu o juiz de fora d'Almada por occasião da tomadia de tabaco feita no pinhal de Vai de Cavalla, forão a final condemnados na conservatoria geral da junta do tabaco, em cinco annos de galés com açoites, e confiscação de bens, a qual sentença tem cumprido em parte, e estão cumprindo no resto: e neste estado recorrêrão ao Congresso implorando perdão do resto da pena, que tem a cumprir, ou uma levisla do processo, em que forão julgados, arguindo-o da falta de prova do delicto, e defeza delles réos.

Os requerimentos dos supplicantes forão remettidos á junta do tabaco para consultar com audiencia dos contractadores do tabaco, os quaes sendo ouvidos, respondêrão: que nada tinhão a dizer, porque não forão partes aos reos, e o procedimento contra elles tinha sido feito ex-officio. Fundada nesta resposta dos contractadores, e na falta de prova contra os réos, consulta a junta do tabaco em favor destes.

A Commissão muito estimaria poder conformar-se com esta consulta, e ter não só para com estes réos, mas tambem para com outros implicados em crimes da mesma natureza a contemplação, que a humanidade reclama: porem recea propor em favor delles um perdão ao Congresso, porque vendo por uma parte a resposta equivoca dos contractadores, que já em outra occasião fugirão de responder terminantemente sobre o perdão: e por outra, as condições 17, e 41, com que em 25 de Janeiro de 1817 foi arrematado o contracto do tabaco, e condição 5 da carta dos privilegios do contracto do tabaco datada em 10 de Maio do 1817, aonde se convencionava, que as leis, decretos, e anais resoluções expedidas a favor do estanco contra os desmaninhos, e contrabandistas do tabaco se observarão inviolavelmente sem se admittir em favor dos transgressores interpetração alguma, entra em duvida se o perdão iria prejudicar estas condições, sem ter precedido o dos contratadores expresso, e claro, cuja denegação deixa equivocas as intenções daquelles.

A Commissão pois, aproveitando a decisão, que este Congresso já deu em outro caso semelhante, sómente propõe em favor dos réos a concessão da revista do seu parecer. Paço das Cortes em 15 de Abril de 1822. - Basilio Alberto de Sousa Pinho; José Ribeiro Saraiva; José Pedro da Costa Ribeiro Teixeira; Manoel José de Arriaga Brun da Silveira.

Terminada a leitura deste ultimo parecer, disse

O Sr. Girão: - He necessario advertir que aquelle Antonio Alves, he já falecido, e só temos a tratar do outro que foi involvido ao mesmo supposto crime, o qual consiste unicamente em dizer um denunciante que o accusado tinha escripto uma carta, e concordado com elles para irem tirar um pouco de tabaco;
mas averiguado o caso, o pobre accusador não sabe ler! Parece-me pois que se lhe deve este o perdão. Muito me admiro que sendo a junta do tabaco a primeira a dizer que elle está innocente, a Commissão lho não queira conceder, eu rogo ao soberano Congresso, que attenda ás minhas supplicas em favor de um miseravel, que ha tanto tempo geme nos ferros, que se mostra sem culpa, e que merece por todas estas razões um perdão, a fim de que seja restituido a uma pobre familia, a quem barbaramente foi roubado, e vá ganhar o pão a seus filhos famintos.

O Sr. Borges Carneiro: - Eu tambem voto pelo perdão, visto que os contractadores cão o impugnão, e que a junta informou a favor, e deseja que se attenda a isto com olhos de humanidade, Proponho, mesmo que a Commissão criminal apresente um projecto que corrija a barbara legislação que ha nesta materia, e as mais barbaras interpretações que se lhe dão, para ver se assim se e vilão as grandes injustiças que se estão praticando com os crimes de contrabando de tabaco e sabão. Ahi estão prezos com condemnação de seis annos, duas mulheres de Campo Maior, por terem contrabandeado em um pouco de sabão. Não disse bem duas, porque agora ouço que uma dellas morreu ontem na prisão; e dos dois prezos de que hoje se trata tambem já um foi para a eternidade. Quem está bem he o superintendente dos contrabandos do Porto, contra quem indiquei fundado no exame da imparcial Commissão fiscal, que se averiguassem os extravios que se presume subirem a cera contos de réis. Este logo que soube que as Cortes havião mandado proceder contra elle, deu um jantar publico no Porto, e fez varias saudes ao Borges Carneiro e á Commissão fiscal; e vai bem, porque para estes grandes peccadorassos são as nossas leis teas de aranha, que os moscardos rompem, só as fracas moscas he que nellas ficão enleiadas. Antes eu aconselhara que a fazenda nacional não peça contas áquelles grandes depredadores, porque em boa reconvenção ha de ficar-lhe alcançada a elles, e pagar-lhe os cem contos. Pobres das mulheres que contrabandêão em uma quarta de sabão, que hão de morrer nas enxovias!! Voltando ao caso, digo que se faça uma lei racionavel: os contractadores não querem nem se interessão em que o processo seja tumultuario, e a pena desproporcionada ao delicto; o seu interesse he que seja indefectivel;

O Sr. Azevedo: - Eu opponho-me a que se lhes conceda perdão, porque se he indigno de um homem o ser incoherente comsigo mesmo, muito mais indigno he de um Congresso legislativo o ser incoherente. Ha poucos tempos nós negámos o perdão a Simão Smith, réo do mesmo crime, processado do mesmo

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modo, e nas mesmas circunstancias, apezar de ter eu pugnado pelo perdão; e como havemos agora concedelo a estes estando nas mesmas circunstancias? Seria certamente a maior incoherencia? Dizem os illustres Deputados que pugnão pelo perdão, que elles forão injustamente condemnados, e que estão innocentes, concedo; mas como querem os illustres Opinantes conceder no perdão a um innocente? He o maior absurdo? Quanto mais acaso a nós compete-nos o julgar se estes reos estão ou não innocentes! Somos poder judicial, ou poder legislativo? Quero porem conceder que elles estejão innocentes, por isso mesmo não se lhes deve conceder o perdão, mas revista, porque por esta não só são julgados innocentes, mas podem e devem ser indemnisados de todas as perdas e damnos que soffrêrão se forão injustamente condemnados; e devem tornar-se responsaveis os ministros que injusta e illegalmente os condemnárão. Voto por tanto pela revista, e contra o perdão; e que se pratique a respeito destes, o mesmo que se praticou a respeito de Simão Smith.

O Sr. Franzini: - Como eu concordo em que sejamos coherentes, por isso tambem requeiro que se lhe mandem tirar os ferros, pois que se concedeu igual alivio ao Smith.

O Sr. Girão: - Eu não duvido da probidade dos juizes, nem da sua inteiresa; não duvido que seja mais coherente mandar rever o processo deste homem, mas elle he um desgraçado, he um pobre, e os pobres padecem muito quando estão presos; porque os mais pequenos obstaculos são para elles invenciveis; quem não tem dinheiro não tem procuradores, e quem não tem procuradores vai esquecendo nos carceres até que a morte se lembra delle, e ás vezes tambem he tardia para os desgraçados. Dar o perdão a este homem seja incoherencia, mas elle a estimará mais do que essa decantada marcha regular da justiça, que nem sempre vai direita. Que o soberano Congresso não he tribunal judiciario, isso he uma verdade; mas he soberano, e póde perdoar. Ora se este homem tivesse culpas leves, parece-me que era hoje perdoado, segundo vejo da discussão, e da excelente disposição, em que acho a todos os illustres Preopinantes, e permittirá Deus que por elle estar innocente, e ter soffrido tanto, fique de peior partido!! Ah! Senhores, perdôe-se ao infeliz, porque quem perdoa assemelha-se á Divindade.

O Sr. Guerreiro: - Eu levanto-me para me oppôr ao perdão, o que nós podemos conceder he que se faça uma nova revista, e seja o objecto de uma sentença visto que os illustres Membros da Commissão não achão injustiça manifesta; mas em quanto subsistir o contrato actual, opponho-me a que se conceda o perdão.

O Sr. Freire: - Se bem entrarmos na naturesa deste objecto, todos conhecem a arbitrariedade das leis por que se regulão as penas impostas aos contrabandistas do tabaco, porem foi sómente debaixo destas condicções que os contratadores derão pelo contrato o que outros nunca derão em tempos mais florecentes, isto he 1340 contos, que com os direitos da alfandega chega esta renda quasi a quatro milhões, de cruzados, perto da quarta parte das rendas da Nação. E por tanto pelo que pertence ao perdão, digo que ninguem sente mais do que eu que se não conceda: porem debaixo da minha consciencia digo que não sé póde conceder sem prejuizo de terceiro; em quanto á revista concedo por me parecer justo.

O Sr. Fernandes Thomaz: - Eu estou por estes principios, assim como pelos principios expendidos pelo Sr. Guerreiro.

O Sr. Azevedo: - Deve-se tornar responsaveis aquelles que os condemnárão injustamente, uma vez que se julgue terem sido injustamente sentenciados, e só por este motivo, ainda que não houvesse outro, se deve conceder uma revista, mas nunca de modo algum o perdão.

O Sr. Feio: - Se a culpa deste homem he tão sómente aquella que referiu um dos honrados Membros, foi injustissima a prizão a que se procedeu contra elle; e injusto será o conceder-lhe perdão, porque o perdão suppõe culpa, e o homem está innocente; como tal deve ser solto. O principio em que se fundão alguns dos honrados Preopinantes, de que se não póde alterar a legislação quanto ás penas com que ella pune o crime de contrabando em quanto existir o actual contrato do tabaco, he um principio falso. Nós não só podemos, mas devemos alterar a legislação a este respeito, como e quando julgarmos conveniente. Como não fiquem impunes os contrabandistas, nós nada temos com os contratadores do tabaco. Elles contratão em tabaco, e não no sangue dos cidadãos.

O Sr. Franzini: - Parece já estar provado, até pela declaração do tribnnal, que este homem he innocente; e que elle está reduzido a um lastimoso estado de miseria. Agora concede-se-lhe a revista, mas para se executar esta mesma revista devem fazer-se muitas despezas, e por tanto he necessario dar alguma providencia a este respeito, porque então a innocencia ficaria opprimida. pela pobreza; e por isso assentava eu que se determinasse que esta revista se faria gratuitamente.

O Sr. Borges Carneiro: - Um destes homens já morreu: o outro, a não se lhe conceder o perdão, he de crer lhe venha tambem a succeder outro tanto, como succedeu a uma das duas mulheres presas em Campo Maior pelo contrabando de meio arratel de sabão. Para estes nenhum processo; condemnações de muitos annos de prisão; fome, miseria, e morte: o superintendente dos contrabandos do Porto, que contrabandeiava por methodo mais elevado, bons jantares, e boas saudes. Dizem as bases da Constituição que a lei he igual para todos, mas he só in scriptis: na pratica são outras as cousas que regem: he igual para todos os que tiverem os mesmos meios. Isso entendo eu. Pois em quanto isto assim for, só bens quimericos conseguiremos do systema constitucional. Andão por ahi com uma differença de constitucionaes ou liberaes e não liberaes; que em Hespanha chamão liberaes e servis. Eu não admitto senão duas classes, justos e injustos; aos que querem a justiça, e a firme e igual execução das leis, chamo-lhes constitucionaes; aos outros, fação elles a bulha que fizerem, digo que são escravos de suas paixões, que tem

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a alma torta e mal formada, e chamo-lhes por tanto corcundas, Ímprobos, mãos portugueses, e quantos nomes injuriosos me occorrerem.

O Sr. Gyrão: - Como autor da indicação que deu causa a esta questão, eu tenho direito de falar tres vezez, e quero usar deste precioso direito, para alçar a minha voz e clamar até ser vencido, que se deve perdoar a este infeliz. Não me canso a lançar negruras sobre os abusos passados, nem sobre aquelles que os tem praticado, todos os sabem, e agora só trato de salvar uma de suas victimas, ente desgraçado, que bafeja um fado avesso; pois não só tem gemido innocente nas gales; mas até quando apparece innocente á face da representação nacional, ainda he novamente obrigado a esperar uma tardia sentença! Hominem non habeo: dizia aquelle infeliz que gemia ás bordas da piscina, e se queixava ao Salvador do mundo; homem não tem, digo eu aos salvadores da patria, homem não tem esse miseravel por quem oro, não tem quem vá falar aos ministros, quem lhe siga, lhe pague as despezes do seu livramento; de maneira que negar-lhe o perdão, he dar-lhe a morte, e morte lenta e cruel; he matar tambem uma pobrissima familia que lhe pertence, já cabida nas garras da miseria! Eis-aqui uma ligeira amostra dos males dos monopolios; mas de tal natureza que santifica o odio que eu lhe tenho. Não se diga porem que os benemeritos contratadores do tabaco tem culpa nisto; não, Srs., eu o sei, e até affirmo que este caso lhe tem feito correr as lagrimas, e mesmo o tem soccorrido com esmolas. O infeliz de que se trata só tem por parte a justiça, e por perseguidor a sua má fortuna. Não quero Cansar mais a attenção do soberano Congresso, e por isso concluo que se lhe deve dar o perdão, e por elle, voto.

O Sr. Bastos: - O Sr. Borges Carneiro por mui instruido que esteja, sobre as prevaricações do empregado de que falou, creio que ainda ignora muitas. He vasto o campo, e mui longa a carreira, para não escapar cousa alguma á vista mais perspicaz. Não he esta a occasião de tratar de similhante objecto. Se o fosse eu mui tarde acabaria. Apenas tocarei de passagem um facto presente, em attenção a esta só qualidade; porque os preterilos são todos de uma gravidade muito maior. Habita o tal empregado ha quatorze onnos, um palacio, pelo previlegio de dezembragador: não tem pago aluguel; e ainda agora sendo rogado para que vê deixe, protesta que o não ha de largar, não lhe impondo o decreto deste Congresso, pelo qual se abolirão as aposentadorias. Tal he, hoje mesmo, o seu respeito á propriedade! Tal he o caso que faz das leis que a protegem! Tal he o resultado de uma longa, e escandalosa impunidade.

Passando agora ao objecto que deu lugar a esta discussão confesso que me custa muito resistir ao perdão de pequenos reos, quando vejo os grandes reos não só impunes, mas occupando lugares eminentes, a que os homens não devem ser elevados se não por talentos, e virtudes. Entretanto pelo que collijo do relatorio do Commissão, e do que ouvi dizer a um dos seus membros, os réos de que se trata não precisão de graça, não precisão de perdão. O perdão releva da pena, mas não indemniza, e quem tem soffrido injustamente deve ser indemnizado consequentemente, são elles culpados, ou são innocentes? Se são culpados, soffrão embora a pena do seu delicto; se o não são, devem ser declarados innocentes; devem-se-lhes pagar perdas e damnos; deve-se-lhe restituir os bens que se lhe tiverem confiscado; e deve-se fazer effectiva a responsabilidade da juizes, que os condemnárão. (Apoiado, apoiado). Para isto he necessario que se mande rever o processo, e gratuitamente, attendendo o seu estado de probresa, e de miseria. Se os juizes, se os seus officiaes, por falta de emolumentos, forem morosos no expediente respectivo, mande-se descarregar sobre elles a espada da justiça (apoiado, apoiado).

O Sr. Castello Branco: - Eu assento que os contractadores do tabaco se não glorião na perdição de victimas innocentes. He certo que elles arrematárão o contracto debaixo da condição que o Governo havia de castigar os culpados, e que aquelles que commettessem delictos de semilhante natureza não ficarião impunes; porem quando he que nós podemos dizer que um homem commetteu um delicto de tabaco? He quando se lhe prova este delicto, de uma maneira que não deixe a menor duvida. Seria impossivel que o Governo quisesse alterar condições que estipulou, e sacrificar os interesses dos contractadores do tabaco; mas não he menos impossivel que elle queira ou deva punir as victimas.

Declarada a materia sufficientemente discutida, propoz-se á votação o parecer da Commissão, e foi approvado, com a declaração que se mandasse entretanto suspender as penas de gales.

O Sr. Secretario Freire fez a leitura de um projecto de lei sobre o modo de prover á substancia dos officiaes de todas as classes do exercito portuguez, pertencentes ás provincias Ultramarinas, ou que dellas tem chegado, offerecido pela Commissão especial de reforma do exercito; que foi mandado imprimir com urgencia.

O Sr. Araujo Lima, por parte da Commissão militar, leu o seguinte

PARECER.

A' Commissão de guerra foi enviada a indicação do Sr. Deputado Borges Carneiro, feita por occasião da prisão do soldado desertor do regimento de milicias do Porto, Domingos José Cardoso. Tem ella duas partes: na 1.ª he arguido o coronel do dito regimento, D. Antonio de Amorim, por ter dado licença a um desertor, pois que este coronel no seu despacho, documento n.° 3, declara que o mencionado soldado he desertor desde o 1.º de Setembro de 1819, e como ta4 verificado no 1.º de Março de 1820, quando a publica fórma da licença apresentada pelo soldado queixoso he datada, documenta n.° 2.°, de 17 de Fevereiro de 1820; donde o illustre Deputado concilie que o coronel dera licença a um desertor, devendo por isso responder a um Conselho de guerra.

Na 2.ª parte da indicação, se queixa o mesmo

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Sr. Deputado do muito tempo de prisão que nesta cidade teve o mencionado desertor, e do modo cruel repentino com que foi tirado da prisão r sem proceder aviso, sendo mettido como um facinoroso em, uma escolta de 20 soldados, elevado por Torres Noras a Thomar, onde estivera em um calhabouço; e que parece que o itenerario marcado inda destinava áquelle infeliz uma longa serie de paragens, de cadeias e de desgraças. O que tudo o illuslre Deputado attribue á tyrannia do déspotas, de que ainda abunda Portugal, e parece querer indicar, que algum ha na Secretaria de guerra, que tem entrado na vistas de perseguidor deste soldado.

Em quanto á primeira parte da indicação, a Commissão, tendo pedido as necessarias informações, julga não haver motivo para se arguir o coronel, D. Antonio de Amorim.

Pelo documento n.° 5.°, elle diz que a deserção do soldado Domingos José Cardozo, fora verificada no 1.° de Março de 1820, passados seis mezes da sua primeira falta na companhia, na fórma do regulamento, e que a licença lhe fora concedida em 1819, e não em 1820, sendo falsificada na era a licença; cuja publica fórma apresenta o queixozo, o que muito facil he de fazer.

Prova isto plenamente com o documento n.° 6 e 7: sendo o n.° 6 uma justificação dos officiaes, e officiaes inferiores da companhia do queixozo, que todos jurarão o acima dito, e um delles he o tenente Victorino Leal Falcão, actualmente reformado, o qual diz que o dito Cardoso tivera licença em Fevereiro de 1819, e que em Julho do mesmo anno, commandando então a companhia por impedimento do capitão, o dera ausente sem licença, como mostra a relação que deve existir no arquivo do regimento, não lhe constando que tivesse mais reforma de licença. O mesmo jurarão os outros officiaes, e officiaes inferiores, accrescentando o sargento Manoel Alves da Cruz, que o sabia muito bem, por ser então o sargento que respondia pela companhia, e provando o que diz com a sua lista da chamada. O documento n.° 7 he a relação nominal de que faz menção no seu depoimento o tenente Victorino Leal Falcão, em que este tenente, agora reformado, dá o dito soldado ausente sem licença. Diz mais o mesmo illustre Deputado, que não sendo costume fazerem-se diligencias para serem prezos os soldados de milicias, que estão nas mesmas circunstancias, 50 a este depois de tanto tempo he que o coronel mandou prender, o que parece mostrar que o perseguidor do soldado fez entrar ao mesmo coronel no seu partido. A isto respondeu o coronel no despacho proferido no documento n.° 3, que tendo-lhe sido denunciado e domicilio do réo, elle procedera na conformidade das leis. E com effeito inda quando fosse verdadeiro o costume que o Sr. Borges Carneiro diz existe, nem por isso se podia arguir a quem seguisse a lei, porque o costume contra a lei nada vale. E que havia de fazer o coronel, inda mesmo que soubesse que havia uma intriga contra o réo, e que o seu inimigo he quem promovia e solicitava a sua prisão? Que havia de fazer depois de se lhe denunciar que aquelle desertor existia em um sitio certo, senão mandalo prender?

Pelo que respeita á segunda parte da indicação, a Commissão de guerra já foi encarregada de examinar outra feita pelo mesmo Sr. Deputado, por causa deste mesmo individuo, e só tem agora a examinar os procedimentos que com elle houve desde que foi entregue ao Governador das armas da corte e provincia da Estremadura, e sómente estes, por que em quanto á primeira indicação, a Commissão deu o seu parecer em data de 27 de Dezembro do anno passado, que foi approvado na sessão de 4 de Janeiro deste anno, e já naquelle tempo o preso tinha sido entregue ao mencionado Governador das armas, como se póde ver no citado parecer e documentos a elle annexos.

O Governador das armas sendo mandado dar a razão por que o soldado Domingos José Cardoso era conduzido á cidade do Porto em uma escolta de vinte homens, como se fôra facinoroso, e por um itinerario muito mais longe do que convinha para chegar prontamente ao seu destino: responde: que sendo-lhe entregue em 15 de Dezembro o mencionado preso,, vendo que não havia tão sedo escolta, que com a brevidade recommendada o levasse ao seu destino, na dia 15 o entregou (assim como mais dois desertores do regimento numero 11 de infantaria) ao sargento de cassadores numero 2 José Joaquim da Silva, que cota um anspeçada, e dezoito soldados devião nesse dia marchar para Santarem, donde tinhão vindo a esta cidade trazer alguns presos: que ao mesmo sargento entregára com os presos os seguintes officios: 1.º para o commandante do destacamento do dito batalhão que está em Santarem: 2.° para o commandante do batalhão numero 2 que está em Thomar para os remetter para Abrantes: 3.° para o governador do Abrantes, a fim de os fazer conduzir a Vizeu; 4.° ao governador das armas da Beira para fazer entregar os dois desertores do regimento numero 11 ao seu commandante, o de milicias do porto ao governador das armas daquelle partido. Em quanto ao itenerario que levara a escolta, nenhum se lhe marcou nesta cidade, sendo costume seguido recolherem-se as escoltas pelos mesmos transitos que lhes forão marcados pelos commandantes dos seus respectivos corpos.

Pela exposição antecedente se conhece não ter havido dolo, pois a Commissão sabe ser este o costume em similhantes casos, e posto que seja dura fazer dar uma grande volta a presos, quando podem ser levados ao seu destino por caminho mais curto; com tudo não ha menores inconvenientes em mandar de proposito uma escolta com um preso, sómente para evitar a este o caminhar menos algumas leguas, fazendo com isto que por causa de criminosos sejão incommodados muitos innocentes.

Pelos máos tratamentos que o desertor soffreu no calhabouço de Torres Novas, não póde ser responsavel o ministro, nem tão pouco o governador das armas, e he de crer sejão em parte filhas do máo estado em que se achão as nossas prisões. -- José Antonio da Rosa; Antonio Maria Ozorio Cabral; Manoel Ignacio Martins Pamplona; Alvaro Xavier das Povoas; Francisco de Magalhães de Araujo Pimentel; José Victorino Barreto Feio; Luis Paulino de Oliveira Pinto da França. - Foi approvado.

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Designou o Sr. Presidente para a ordem do dia o projecto da reforma das secretarias; e para a prolongação o parecer da Commissão de fazenda sobre a divida publica.

Levantou-se a sessão ás duas horas. - Francisco Xavier Soares de Azevedo, Deputado Secretario.

RESOLUÇÕES E ORDENS DAS CORTES.

DECRETO.

As Cortes Geraes, Extraordinarias e Constituintes da Nação portugueza, conhecendo o erro que por equivocação de copia se introduziu no artigo primeiro do decreto de tres de Abril do corrente anno, donde passou para a carta de lei de quatro do mesmo mez e anno, dizendo-se ser o direito que devem pagar as fazendas tintas, de vinte e dois por cento, quando deveria dizer-se vinte quatro porcento, segundo estava sanccionado: decretão, que o mencionado artigo, e carta de lei se restitua, ao seu verdadeiro e exacto sentido, sendo vinte e quatro porcento, e não vinte e dois por cento, os direitos que devem pagar-se pelas fazendas tintas, indicadas no mesmo artigo. Paço das Cortes, em 17 de Abril de
1822 - Antonio Camello Fortes de Pina, Presidente; João Baptista Felgueiras, Deputado Secretario; Francisco Barroso Pereira, Deputado Secretario.

Para Filippe Ferreira de Araujo e Castro.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza, attenttendo á contradição e notoria injustiça com que o doutor em theologia Rodrigo de Sousa Machado, foi reprovado e excluido de oppositor ás cadeiras daquella faculdade pela respectiva congregação, apesar de lhe haver dado unanimemente boas informações em literatura, costumes, e desinteresse depois dos seus ultimos actos na universidade, aonde mais não voltou por ter sido eleito Deputado ás Cortes pelos povos da sua provinda. Ordenão, que o mencionado doutos Rodrigo de Sousa Machado fique oppositor da sua referida faculdade, conservando a antiguidade que lhe compete, como se tal reprovação não existisse. O que V. Exca. Levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 17 de Abril de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portuguesa ordenão que lhes sejão transmittidas informações sobre se a ordem das Cortes de 26 de Março de 1821, expedida á Regencia do Reino, ácerca da agricultura de Coruche e Benavente, tem já tido o seu devido effeito, ou quaes sejão os obstaculos que se tem opposto á sua excussão. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exc. Paço das Cortes em 17 de Abril de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza, tomando em consideração a consulta da junta da administração da companhia geral da agricultura das vinhas do alto Douro de 28 de Março proximo passado, transmittida pala secretaria de Estado dos negocios do Reino em 3 do corrente mez, expondo a duvida que occorre em deferir aos requerimentos, que lhe tem sido dirigidos por lavradores do Douro já para se lhes tomar termo de manifesto de seus vinhos depois de findo o prazo prescripto pela resolução tornada em Cortes a 4 de Fevereiro proximo precedente sobre o juizo do anno, já para se lhos passarem guias a fim de os carregarem por sua conta independente de manifesto: attendendo a que a citada resolução ha clara e terminante, e a que de nenhuma maneira deve ser illudida a boa fé, com que os negociantes calcularão suas especulações sobre os principios estabelecidos: resolvem que não são actualmente admissiveis os referidos manifestos, e que sem elles não he licito ao lavrador carregar vinhos por sua conta. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 17 de Abril de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para José da Silva Carvalho.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza, tomando em consideração a conta do intendente das obras publicas, transmittida pela secretaria de Estado dos negocios da justiça em 9 de Março proximo passado, ácerca da necessidade de estabelecer uma pena para os presos sentenciados do presidio civil da gale, que venderem o seu fardamento; ordenão que fique extensivo aos referidos presos o artigo 10.º do addicionamento á regulação militar de 14 de Junho de 1817, o qual impõe a pena de vinte chibatadas, dez dias de reclusão, e jejum a pão e agoa em cinco destes dias alternadamente, a os sentenceados militares, que vendem todo, ou parte do seu fardamento. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exc. Paço das Cortes em 17 de Abril de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. -As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza, sendo-lhes presentes os inclusos autos crimes transmittidos pela secretaria do Estado dos negocios da justiça em data de 29 de Março proximo passado, nos quaes Antonio Alves Grande, e José Pinto de Oliveira forão julgados pelo juizo da conservatoria geral, da junta do tabaco, e condemnados em cinco annos de gales, açoites, e confiscação de bens, por contrabando de tabaco apprehendido no pinhal de Val de Cavala: mandão remetter ao Governo os mesmos autos, para serem revistos, e julgados na Casa da Supplicação, segundo as leis competentes, suspensa no entre

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tanto aos reos a pena de galés. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 17 de Abril de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para Ignacio da Costa Quintella.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portuguezea, tomando em consideração o officio do Governo expedido pela Secretaria de Estado dos negocios da marinha em data de 15 do corrente mez, representando, que estando proxima a partir para a Bahia a corveta Regeneração, ali comprada, armada, e guarnecida com gente daquella provincia, entrava em duvida se deve, ou não pagar-se aos seus officiaes, os quaes forão promovidos pela junta provisoria de governo da dita provincia, de cuja promoção só foi approvada a parte honorifica: resolvem, que os officiaes da sobredita corveta continuem a ser pagos até á sua chegada á Bahia, segundo as patentes a que forão promovidos pela junta provisoria de governo, sem que na contadoria se lhes faça desconto algum de maiorias, que tenhão ali recebido, na conformidade das resoluções tomadas era Cortes aos 2 de Março proximo passado, e 16 do corrente mez, a favor dos officiaes do segundo batalhão do regimento de infantaria n.º 2, regressados de Pernambuco, e dos da armada, que vierão da Bahia na fragata Principe D. Pedro. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 17 de Abril de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para João Vicente da Silva.

As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza concedem a licença que V. Sa. requer por tempo de dez dias para tratar da sua saude. O que participo a V. Sa. para sua intelligencia.

Deus guarde a V. Sa. Paço das Cortes em 17 de Abril de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Redactor - Galvão.

SESSÃO DE 18 DE ABRIL.

A Hora determinada disse o Sr. Camello Fortes, Presidente, que se abria a sessão: e lida a acta da sessão precedente pelo Sr. Deputado Secretario Soares de Azevedo, foi approvada.

O Sr. Deputado Secretario Felgueiras deu conta da correspondencia, e expediente seguinte.

De um officio do Ministro dos negocios da justiça, remettendo a informação do governador das justiças da relação, e casa do Porto, dando a razão, o que se mandou metter em folha o desembargador Manoel Antonio Velles Caldeira, que se mandou remetter á Commissão de fazenda.

De outro do mesmo Ministro, pedindo, lhe fosse communicada a conta, que no ultimo de Janeiro havia dado ás Cortes a Commissão encarregada do exame, e melhoramento das cadeias, para poder melhor cumprir-se o que as Cortes havião determinado na sua ordem de 20 de Fevereiro proximo passado: resolveu-se, que lhe fosse remettida.

De um officio do Ministro dos negocios da guerra, remettendo uma relação dos primeiros e segundos medicos do exercito, e pedindo resolução sobre a duvida, que occorre, no modo de contar os dez annos de serviço, que determina o §. 7.° do decreto das Cortes Geraes, e Extraordinarias de 14 de Dezembro ultimo, que se mandou remetter á Commissão especial de organisação do exercito.

De outro do mesmo Ministro, remettendo o officio do brigadeiro José Maria de Moura, governador, que foi da provincia de Pernambuco, e actualmente da do Pará: Ficárão as Cortes inteiradas.

O Sr. Villela: - Não posso deixar, Sr. Presidente, de votar elogios ao governador José Corrêa de Mello na sua chegada a Pernambuco. A decisão que tomou de desembarcar sem soldados não só prova o seu valor, mas deve necessariamente cativar a confiança daquelles povos. Oxalá que todos os generaes, que daqui se mandarem para o Brazil, se lembrem de que vão estar tambem ali entre Portugueza. Este procedimento do brigadeiro Mello ha de produzir certamente os melhores effeitos: e eu me animo a esperar, que a tranquillidade reinará de boje em diante entre os Pernambucanos: e que o seu comportamento será digno da opprovação do soberano Congresso. (Appoiado.)

O Sr. Felgueiras mencionou mais um officio do Ministro dos negocios estrangeiros, remettendo tudo quanto na sua secretaria se achava, relativamente á entrega da praça de Olivença, que se mandou á Commissão diplomatica com urgencia.

De um officio da junta provisoria do governo da provincia da Paraiba do Norte, datado do 1.° de Fevereiro, participando haverem-se expedido as ordens nacessarias para se fazer a eleição da nova junta provisoria, na fórma do decreto das Cortes, e pedindo providencias sobre differentes objectos de agricultura, commercio, fazenda, e instrucção publica, que se mandou remetter á Commissão de Ultramar.

De outro da mesma junta provisoria do governo da Paraiba do Norte em data de 3 de Fevereiro, expondo os motivos, porque entregara o commando do governo dos armas daquella provincia ao major graduado Trajano Antonio Gonsalves de Medeiros, excluindo ao tenente coronel de infantaria Antonio Bernardino Mascaranhas, e ao tenente coronel graduado Francisco Ignacio do Valle, que se mandou remetter á Commissão militar.

De uma conta da junta do governo provisorio da provincia do Rio Grande do Norte, representando haver mandado restituir a serventia do lugar de contador da junta da fazenda a Agostinho Leitão de Almeida, excluindo a Manoel de Salles Paiva e Pacheco, e pedindo ás Cortes a approvação desta sua deliberação: mandou-se remetter á Commissão de

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