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tes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza ordenão, que o administrador das sete casas de as informações necessarias sobre o incluso requerimento de varios lavradores, para serem transmittidas a este soberano Congresso com a maior brevidade, remettendo-se juntamente por copia toda a legislação existente, sobre os direitos que pagão as palhas, e modo de sua cobrança. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exca. Peço das Cortes em 25 de Abril de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza, sendo-lhes presente, que os habitantes das ilhas do Faial e Pico, desejando offerecer um donativo para as despezas e urgencia do Estado, deliberarão collectar-se entre si com uma partida de pipas de vinho, mas que não podendo este genero sair daquelle porto sem pagar os direitos de dois e tres por cento, que se achão estabelecidos por saida, e devendo ser dispendiosa a sua conducção para Lisboa pelos fretes dos transportes, se absorveria nestas despezas uma grande parte da importancia do donativo, lembrando por isso, que a conducção fosse feita pelos paquetes, que para ali navegão todos os mezes em lastro por conta do Estado; recebendo a seu bordo a porção de pipas que acharem prontas, e permittindo-se para este fim mais algum dia de demora na bahia do Faial, attenta a applicação da offerta: ordenão que naquella alfandega seja a saida do dito donativo livre do pagamento do direito dos tres por cento, mas não do outro direito por estar por arrematação, é que em quanto ao mais, o Governo de as providencias convenientes. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 25 de Abril de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para Ignacio da Costa Quintella.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza, sendo-lhes presente o officio do Governo expedido pela Secretaria de Estado dos negocios da marinha em data de ontem, ácerca dos officiaes de fazenda que vierão da Bahia nas fragatas fremis, e Princepe D. Pedro, e dos que estavão nomeados para servirem os novos navios, da Bahia: ficão inteiradas do seu contheudo, achando muito justo que vão de passagem para a dita cidade na corveta Regeneração os officiaes de fazenda pertencentes áquella provincia, que tinhão vindo em serviço a bordo das mencionadas fragatas. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 25 de Abril de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Redactor - Velho.

SESSÃO DE 26 DE ABRIL

ABERTA a Sessão, sob a presidencia do Sr. Camello Fortes, leu-se a acta da antecedente, que foi approvada.

Forão mandadas lançar na acta as duas seguintes declarações de voto:

Primeira. Requeiro se lance na acta, que eu fui de voto, que senão pagasse aos officiaes de secretaria por consignação. - Manoel Fernandes Thomaz.

Segunda. Declarámos que fomos de voto que a decisão tomada sobre os ordenados dos officiaes de secretaria aposentados não tivesse effeito retroactivo.- Villela, Borges de Barros, Belford, Carneiro, Andrada, Braamcamp, Quental, Martins Ramos, Van Zeller, Peixoto, Moniz Tavares, Ferreira da Silva.

O Sr. Secretario Felgueiras mencionou os seguintes officios.

1.° Do Ministro dá marinha, remettendo 3 partes do registo do porto, tornado no dia antecedente, á escuna Conceição de Maria, vinda da Ilha de S. Thomé, ao bergantim General São Payo, vindo do Siará; e ao bergantim Lusitano, vindo do Rio de Janeiro. Ficarão as Cortes inteiradas.

2.° Da junta do Piauhi, participando as providencias que tem dado para a partida dos Deputados daquella provincia, e a causa da sua demora. Ficarão as Cortes inteiradas.

3.° Da junta da provincia do Siará, no qual, ao mesmo tempo que participa ao soberano Congresso a sua installação, o felicita, e protesta cooperar para a causa nacional quanto estiver da sua parle. Mandou-se fazer menção honrosa.

4.° Da junta eleitoral da provincia do Siará Grande, em que transmitte o termo da eleição dos Deputados eleitos por áquella provincia. Passou á Commissão de podores.

5.° De Francisco Xavier de Torres, datado do Siará, em que participa ter tomado posse do commando interino das armas daquella provincia por nomeação de junta do governo, felicitando ao mesmo tempo as Cortes, em seu nome, e de toda a officialidade da 1.ª e 2.ª linha, que se acha debaixo do seu commando, e protestando firme adhesão e obediencia ás Cortes; de que se mandou fazer menção honrosa.

Mandou-se tambem fazer menção honrosa de uma felicitação ás Cortes, e protestos de firme adhesão á causa da regeneração, e obediencia ás Cortes, feita pelo coronel commandante da 1.ª brigada de voluntarios reaes d'ElRei, Antonio Claudino Pimentel, em seu nome, e da dita brigada.

Postou á Commissão de petições uma representação assignada por varias pessoas do Maranhão.

Ficárão as Cortes inteiradas de uma carta do Sr. Fortunato Ramos, em que participava ter-se achada impossibilitado de assistir ás sessões das Cortes por falta de saude.

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Foi presente uma carta de José Joaquim Gomes e companhia; moradores na rua nova d'ElRei n.° 91, em que, em nome, e por ordem, que tem de seu correspondente, José Francisco Medeiros, negociante na ilha do Faial, offerece ao soberano Congresso para as urgencias do Estado 120$000 réis na fórma da lei, e que estão prontos a verificalo logo que se lhes determine, que foi ouvido com agrado, e se remettesse ao Governo para ser verificado.

Feita a chamada, acharão-se presentes 112 Srs. Deputados, faltando 30; a saber: os Srs. Falcão, Povoas, Gomes Ferrão, Moraes Pimentel, Osorio Cabral, Canavarro, Ribeiro Costa, Sepulveda, Feijó, Malaquias, Lyra, Agostinho Gomes, França, Baeta, Almeida e Castro, Innocencio de Mirarida, Pinto de Magalhães, João Vicente da Silva, Correia Telles, Faria, Sousa e Almeida, Moura Coutinho, Isidoro dos Santos, Manoel Antonio de Carvalho, Vergueiro, Baldeira, Ribeiro Telles, Vicente da Silva, Fortunato Ramos.

Passando-se a ordem do dia, continuou a discussão da parte do artigo 43 do projecto das eleições, que havia ficado adiada na sessão de 24 do corrente Sobre esta materia disse

O Sr. Bastos: - Quando as votações versão sobre cousas, ellas devem ser publicas: versando sobre pessoas devem ser secretas. No primeiro caso a publicidade não prejudica á liberdade, no segundo ou a tolhe, ou a diminue. Querer que sejão publicas, porque póde haver homens, que em segredo votem em pessoas indignas, em que em publico não votarião, he querer que os eleitores renunciem á sua propria consciencia e convencimento, para cederem ao convencimento, á consciencia, ou á intriga dos espectadores, que os rodeão: he ir percipilalos n'um abismo com o intento de os salvar.

Não nego que nas votações secretas ha inconvenientes, mas quanto maiores são os das publicas? Se um homem rico se lembrar de comprar votos, e elles forem occullos, não se animará a grandes liberalidades com o receio de ser enganado, e consequentemente a compra não produzirá grandes resultados: irias se os votos se derem publicamente, e o receio do engano se desvanecer, serão muito maiores as liberalidades, e muito mais amplos os seus effeitos. Se um coronel de um regimento quizer attrair os votos dos seus soldados, em favor de algum seu collega, amigo, ou parente, e empregar a esse fim a sua influencia sobre os officiaes, e estes sobre os soldados, e os votos forem occultos, muitos lhe faltarão porque podem faltar impunemente; porem se forem publicos, quaes serão aquelles, que se atrevão a negar-lhos, ficando expostos á vingança de superiores irritados, para a qual nunca faltarão pretextos? E se acontecer que o Governo queira dar as eleições uma direcção favoravel aos seus interesses, ou para afastar da deputação homens verdadeiramente zelosos do bem publico, amantes da liberdade, e formidaveis ao ministerio pela superioridade dos seus talentos, ou para incluir nella os do seu partido? Elle não precisará senão de se entender com as autoridades locaes, creaturas suas, e suas dependentes; estas se entenderão com os seus amigos, e com os empregados seus subalternos;" e os amigos e empregados subalternos irão propagando e communicando as impressões recebidas a todos os que com elles estiverem em contacto, ou em directa ou indirecta dependencia. A final se os votos forem occultos, a colheita não será grande; mas se forem publicos, que grande não será o seu numero? Similhantemente se póde discorrer relativamente á outras classes de pessoas poderosas, ou influentes.

Oh, a differença procede de que a publicidade exclue a possibilidade da dissimulação, e não dá, como o segredo, occasião a faltar sem perigo ás promessas; e por isso mesmo ella he preferivel ao segredo, não concorrendo como este para desmoralizar os povos!

Eu não sei como aquelle que ataca outro para o seduzir ou sobornar tenha direito á sua franqueza: não sei como a dissimulação em tal caso não he antes uma virtude do que um crime: não sei como promessas extorquidas por medo possão em algum caso produzir obrigação: não sei como se possa figurar maior moralidade em ceder á intriga, á seducção, e ao suborno, do que em escapar-lhe industriosamente: mas quando nisso houvesse algum mal, seria mui pequeno, e servindo de evitar um mal maior perderia essa natureza. Quem haverá que leve tão longe o rigor daquelles principios, que queira que para evitaria dissimulação, ou cumprir-se uma irreflectida ou extorquida promessa, se elejão monstros que em vez de concorrerem para a prosperidade da Nação, vão minar e destruir o edifficio da sua prosperidade e da sua liberdade?

Consideremos agora outro inconveniente, o das commossões populares, o das desordens, que ha de haver nos actos das eleições, se as votações forem publicas. Não he preciso ser dotado de grande imaginação, para se figurar o extenso quadro das scenas horrorosas que ahi terão lugar. Nem se pense que o fogo das paixões, que ahi se atear, se apagará tambem ahi. Não he esse o caracter, nem são os costumes portuguezes. Dissolver-se-hão ás assembleas, mas os odios, as vinganças não farão então senão principiar. Em consequencia haverá muita gente de probidade, que para evitar compromettimerftos, para escapar a essas vinganças e a esses odios, deixe de comparecer nas ditas Assembleas; tornando-se assim mais livre o campo á intriga, a mais predominante a seduccão e o suborno.

Os illustres Membros, que se tem decidido pelas votações publicas caem talvez no erro vulgar de julgar os outros homens por si. Sentindo-se com o valor necessario para votar em publico, em quem suas consciencias lhes declarem, sem lhes importarem receios, contemplações, ou interesses, pensão que outro tanto acontecerá geralmente.

Eu em mais de uma occasião fiz à Nação portugueza a justiça de proclamar neste Recinto que ella não he menos illustrada que as outras; e ainda hoje sou dessa opinião. Mas como poderei eu crer que o espirito de independencia, e de liberdade, a nobre altivez, e firmeza de caracter que vem em consequencia, tenhão nella chegado ao gráo em que se achão

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ha Nação Britanica, e em que se acharão nos felizes tempos da Grecia, e Roma?

Os Portuguezes sairão ha pouco dos ferros, tem ainda roxos os pulsos, são de direito independentes e livres: mas a maior parte delles ainda não crem que o sejão, e de facto o não são; porque não julgão se-lo. A força da educação e dos habitos modifica a naturesa dos homens de uma maneira prodigiosa, e até muitas vezes os inabilita para receberem as melhores instituições. Supponhamos por tanto que as votações publicas são absolutamente consideradas como as melhores votações, no que todavia não creio, ellas não quadrão ainda ás circunstancias do povo portuguez; são um alimento muito forte, que estômagos fracos não podem digirir.

Solou perguntado se tinha dado aos Athenienses; as melhores leis, respondeu que lhes dera as melhores que elles podião soffrer: e quando a sabedoria divina disse que dera ao povo judaico preceitos que não erão bons, quiz dizer que estes preceitos não tinhão mais que a bondade relativa. Por tanto não sanccionemos a publicidade das votações. He mui duvidoso se o tempo proprio para ellas existirá; mas he certo que não existe ainda. Deixemos isso aos futuros legisladores. Se ao reverem a Constituição elles assentarem que o espirito publico mudou de tal sorte, que aquella publicidade convinha, elles a decretarão.

O Sr. Sarmento: - As razões que acaba de expôr o illustre Preopinante são de tamanha clareza, é tambem deduzidas que ainda quando eu não estivesse convencido da verdade dos seus principios, ellas me farião persuadir. Por esta occasião me veio á lembrança o dito de um escritor francez, o qual vendo que estão estabelecidas sociedades para frequentemente decretarem premios aos que apresentão novos inventos, e descobrimento para aperfeiçoamento das artes, e das sciencias, lamenta o esquecimento de se não ter ainda offerecido cousa alguma, que incite alguem paira resolver o problema de se faceiem as eleições de representantes da Nação com toda a segurança de liberdade. Nós acabamos do presenciar em a derradeira sessão, em que se debateu este objecto, a variedade de recursos que procurou cada um dos membros, que falárão. Recorreu-se aos Romanos, e aos frades, objectos tão desvairados um do outro: um illustre Deputado foi destelhar as cellas dos cardiaes quando estão reunidos em conclave: outro illustre Deputado, depois de muitas vezes derrotar o direito canonico, foi procurar novamente a aliança delle, e o seu auxilio, a fim de fortalecer com aquella autoridade os seus argumentos. O Sr. Pessanha, cheio daquelle amor classico pelos Romanos, e pelos Gregos, foi buscar os seus argumentos na historia das instituições politicas daquelles celebres povos da antiguidade. Na verdade as recordações daquelles antigos povos enchem de enthusiasmo a imaginação; porem por isso que essas Nações são as primeiras na entrada da liberdade, e que algumas das suas instituições ainda se acommodem á organisação politica dos povos mudemos, não se segue que todas ellas possão indiscriminadamente ser applicaveis ás nossas circunstancias. Nem o nome aos Gregos e dos Romanos he absolutamente indicador de virtude, e de patrocinio: he preciso mais critica, e mais observação. Quando Pintarco refere o exemplo daquelle Espartano, a quem 300 dos seus concidadãos tinhão sido preferidos, e que dava graças aos Deoses de que a sua patria possuia 300 filhos mais dignos do que elle; similhante exemplo apontado com admiração, mostra que o desenteresse tambem não era vulgar entre os Espartanos, que forão os mais rigorosos sectarios das leis da patria. Em Roma poderia eu apontar muitos exemplos de falta de virtude, e de amor da patria: basta a ingratidão com que os Romanos se houverão para com Tiberio Gracho, de quem se diz que fora o Romano que mais amara a sua patria; qual foi o premio dos seus trabalhos, para diminuir o poder da aristocracia? Foi uma cruel morte! O mesmo aconteceu a seu irmão Caio Grachom que segundo o exemplo fraterno de se expor pelo bem dos seus concidadãos, teve delles o mesmo pago, como havia acontecido ã seu irmão. Quantas vezes não foi o virtuoso Catão de Utica insultado, e mal tratado? Mas deixemos essas recordações historicas. Pareceu-me que se pretende trazer nesta questão o exemplo da Inglaterra: he necessario não confundir as circunstancias da eleição directa em Inglaterra com os principios da eleição directa adoptado entre nós. Em Inglaterra he verdade que as eleições são directas, e em publico: porem lá não está admittida a base do suffragio universal, como catre nós esta circunstancia faz variar muito esta materia, porque o suffragio universal faz com que o circulo dos votantes seja muito mau extendido, e nessa parte como os nossos principios constitucionaes são mais similhantes aos dos Americanos, parece-me que seria conveniente admittir com elles a eleição por crutinio secreto, ou ballot, como entre elles se chama. A doutrina do suffragio universal, e a da eleição em segredo tem entre si a mais intima connexão: os Americanos, posto que tenhão adoptado a doutrina do suffragio universal com maiores restricções do que nós, assim mesmo tem estabelecido a eleição por escrutinio, e a experiencia tem justificado o seu procedimento. Com maior razão devemos nós estabelecer o principio de que a eleição tenha lugar por escrutinio secreto, porque as nossas juntas eleitoraes vão ser muito numerosas. Outra consideração nos deve merecer attenção, e he que em quanto durarem as eleições; está sanccionado que a ellas não deverão assistir tropas: vê-se bem quanto se póde recear que haja tumultos de proposito incitados por máos, ou occasionados por pessoas imprudentes. Nós mesmos trinos sido testemunhas de até onde chega a imprudencia e a qual muitas vezes se tem atrevido diante da soberania da nação a querer perturbar o socego das delliberações de representantes da Nação, e não só póde suspeitar que essa mesma gente ainda mais se atrevão a perturbar, e pôr em confusão as juntas eleitoraes. Qual he a força, e autoridade que os ha de então cohibir? Eu vejo já quaes hão de ser os resultados se a eleição for em publico: os denagogos, e seus sequazes, e certa qualidade de gente indifferente ao bem da patria, gente que para me servir das palavras do La Fontaine, dizem: Selon le temps, vive le

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Roi, vive la ligue, farão a parte principal dos eleitores, em quanto os homens sãos, e cidadãos pacificos não irão votar para se não envolverem em desordens, e tumultos. Concluirei as minhas reflexões, que embora se restrinjão alguns direitos do cidadão, mas que se lhe deixe a mais inteira liberdade na escolha dos seus representantes; porque de outro modo vamos estabelecer o imperio da facção que dominar, e nunca o da liberdade.

O Sr. Margiochi: - O argumento mais ponderoso que se tem produzido a favor deste artigo, he a meu ver aquelle que dá mais perfeita liberdade nas eleições; mas o fundamento com que se quer dar esta perfeita liberdade, consiste em suppor que os cidadãos que são eleitores são dotados de um espirito que he particular á nossa Nação, ou a toda a raça humana, ou a todos os seres que sentem. Ora se esse he o principio, que he o receio de dizer cada um publicamente a sua opinião, ou o seu parecer, se este he o principio inherente a todos os cidadãos, digo que este principio he derivado do receio que um homem tem de perder os seus interesses pessoaes. Se pois ha esto receio no homem de perder os seus interesses pessoaes, tambem ha por outra parte o amor a estes mesmos interesses. Ora havendo amor a estes mesmos interesses na votação secreta, existe por consequencia a venalidade, porque o mesmo principio que produz o medo, produz a venalidade, e eis-aqui como eu do que serve de fundamento áquelle argumento tiro o principio contrario, e he que a eleição secreta he má, porque dá origem á venalidade. Disse-se mais que para votar publicamente sobre os Deputados da Nação era preciso ter heroismo, e que os legisladores não poderião contar com o heroismo dos povos. Ora eu julgo que não he heroismo algum votar em alguem para Deputado de Cortes; eu até não julgo que seja heroismo o votar contra os interesses de alguem, quanto mais o votar a favor de alguem, por isso não quero considerar isto como uma acção heróica, o que seja preciso que os legisladores assim o considerem: supponho pois que não tem lugar este heroismo. Diz-se mais, que nós temos saido do estado do servilismo e despotismo, e que não temos educação sufficiente para votar francamente sobre os Deputados da Nação: Ora ao isto he assim, e nós adoptássemos o artigo, obrigando perpetuamente os cidadãos a votar com temor, nunca concorreriamos com a nossa legislação para tirarmos os cidadãos deste estado de degradação, nunca estabeleceriamos esse estado de educação que precisa, mós. Diz-se mais que haveria perigo para o systema liberal, e para a patria, e então quer-se tirar este perigo, pondo homens por quem se deve trotar occultamente; isto não he conceder liberdade nenhuma ao homem, isto até os déspotas concedião; uma votação levantado occulta não he liberdade; isto todos tinhão lá ás escondidas, e he de nenhum momento. Ora este modo de votar occultamente, sem o homem se offerecer a falar francamente, he tirar ao mesmo homem toda a dignidade, não só de cidadão, mas até de homem. Que gloria póde haver em ir votar debaixo de um principio que por timidez não póde votar claramente, e ir assim votar occultamente? Isto he tirar toda a idéa de gloria, parque não havendo perigo e não póde haver gloria. Disse-se aqui que nas eleições dos Deputados de Cortes, que he um dos grandes interesses da Nação, se póde estabelecer uma especie de fermentação seja daquella que produz grande fervura, e até cachões, como era a fermentação dos povos da antiguidade, como he a fermentação que ha em Inglaterra; mas tambem não quero que seja uma fermentação tão placida, tão socegada da qual resulte podridão; quero uma fermentação de que saia uma substancia espirituosa: por isso o modo de fazer as eleições publicas não admittindo discussão sobre o merecimento dos candidatos, evita esta grande efervescencia, e os cidadãos permanecerão tranquillos como nas eleições passadas, sem com tudo cair numa especie de fermentação putrida, de que não póde resultar proveito algum. Ora se os homens tem essa timidez de não se atreverem a deixar de votar naquelles de que dependem, apezar de conhecerem que não tem merito para serem elevados do lagar de Deputados, então digo que he da mesma sabedoria do legislador aproveitar esta supposta timidez: se o homem não se atreve a deixar de votar naquelle que o rodea, como se atreverá a votar num homem que he inimigo da patria, contra a opinião de todos os seus concidadãos? Então aproveitemos este mesmo medo, e aproveitemo-lo para este fim: he preciso alem disto estabelecer uma especie de responsabilidade nas eleições. O que voto occultamente não se empenha em votar bem, se votar mal fica sempre sujeito a uma accusação da opinião publica, e por consequencia sempre com alguma responsabilidade, á qual nenhum cidadão deve escapar quando se trata dos interesses de todos os outros. He preciso demais que se estabeleça esta educação, e que se aprenda mesmo a votar; e como se ha de aprender a votar? Votando-se occultamente, e não se sabendo quem votou bem ou mal? Assim não podendo corrigir-se o que votou mal, não se lhe póde dizer, este cidadão em quem votaste não presta, porque os seus escritos, as suas palavras, as suas acções o mostra o; e por tanto fizeste mal em votar sobre este homem. Demais, como ha de elle aprender a votar para as eleições seguintes? Convem muito dar aos cidadãos portuguezes uma certa elevação de espirito; he preciso influir-lhe um certo brio. Sem elevação de espirito, não póde haver nada que seja relevante.

O argumento que se pretendeu destruir a respeito da moralidade não está destruido, porque o estabelecer-se nestas eleições secretas que se póde prometter uma cousa e fazer outra, he uma cousa que não deve dizer-se; estabelecer um principio de desmoralização para a Nação inteira! isto de maneira nenhuma. Tambem parece incompativel o que se disse sobre a liberdade com este segredo. Esta prohibição do homem falar em publico já he uma falta de liberdade. Como quer compadecer-se com a liberdade, esta prohibição, não só de discutir cada eleitor sobre o merecimento do seu elegendo, mas mesmo de pronunciar o seu nome? A respeito de partidos, estou que clandestinamente he mais facil soltarem-se redeas a todos os partidos; he ás escuras que os navios mudão rumos, e fogem, dos combois, para se entregarem nas

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dos inimigos; ás claras tudo se desdobre, e se acha o rasto, e a ligação; por isso voto que as eleições sejão publicas, para mesmo influir sentimentos nobres nos elegendos: ou estes votos sejao dados pelos homens que tem conhecimentos, ou pelos que os não tem, sempre em todos os casos esta voz da clareza, liga sempre, he voz que estimula a obrar bem; por tanto não deve perder-se esta influencia da publicidade. Alem disto he preciso ainda attender a outra cousa; sempre existe na especie humana um desejo de chegar á perfeição; e para que o homem possa aproximar-se a esta perfeição, he preciso tambem que elle possa franca e claramente dizer quaes são as suas opiniões, e sendo prohibido o falar claramente, acontecerá que o homem lançando um voto numa turné sem ser assignado, sem se saber quem elegeu, não póde considerar-se como homem, mas só como machina. Por outra parte he preciso evitar as fraudes que possa haver nas eleições. Combinando-se elles da maneira que quizerem, e como quizerem, não se podendo dizer ao principio, esta lista he do cidadão fulano, que vota no cidadão fulano, como he que se ha de verificar prevaricação na meza se a houver? de maneira nenhuma. He preciso, por outra parte, considerar que o homem não he um tapir do Peru, não he um animal noctambulo ou lucifugo, que queira fazer tudo ás escondidas; o homem procura a luz, e a verdade ás claras. O verdadeiro cidadão não quer outra cousa; agora he preciso mais. Se nós quizermos sustentar esta causa, he preciso de alguma maneira fazer os homens complices da liberdade, e inimigos do despotismo, e para isto he preciso que os homens no modo de escolher os seus Deputados, escolhão os mais constitucionaes, e nenhum amante do despotismo; he preciso que estes fiquem complices com aquelles para resistirem ao despotismo; de outra maneira sem haver esta capacidade não póde haver systema liberal; se os cidadãos portuguezes fossem, taes como se suppõe, e não tivessem coragem sufficiente para dar o seu voto em publico, então tambem elles não erão dignos de ter uma representação nacional: então esta representação nacional devia parecer-se com elles; então neste augusto Recinto não devia falar-se contra abusos e contra pessoas interessadas nelles; as nossas indicações deverião ser dadas ás escuras, não se devia saber quem as deu, e não se devião discutir nunca, nem serem approvadas ou reprovadas, senão por escrutinio secreto. Finalmente isto seria uma tal novidade que nos faria perder uma das cousas que nos dão mais força, que he a amisade dos homens livres, e de todos os paizes livres: que idéa farião elles de nós, e que mal nos não succederia de perder esta amizade, porque uma das cousas que mais fortemente nos sustentão, he a amizade dos povos livres que influem nas outras nações.; Por consequencia iriamos desta maneira com similhante novidade, não só merecer o ludibrio delles, mas mesmo ficarmos sem o seu apoio. Quando eu fui de opinião que não se adoptassem as eleições directas, foi por suppor que os povos portugueses, assim como os povos de todo o universo não tem o gráo de illustração precisa, e necessaria intelligencia para elegerem os seus Deputados; como porem o projecto os suppõe neste gráo de intelligencia, he necessario tambem dar-lhe o gráo de virtude. Ora este gráo de virtude, sem duvida não se póde negar aos povos, porque em verdade ha certas cousas em que he impossivel corrompelos; por exemplo, he impossivel persuadir aos povos que he util o jugo estrangeiro, que he util a desmembração da sua nação, e nessas cousas he impossivel corrompelos. Para o homem ter virtude basta que as suas acções se conformem com a sua consciencia; para ter virtude não he preciso trabalhar; mas para ter illustração he preciso grande fadiga. Por tanto suppondo o projecto os povos intelligentes, seria uma contradicção não os suppor virtuosos para poderem dar a sua opinião claramente. Ora como a soberania reside na Nação, seria tambem uma causa pasmosa que a unica occasião em que os povos a tem a exercitem de uma maneira occulta. Em fim para ver qual seria a opinião publica a este respeito, he que convem sempre consultar a experiencia! imagino que estão todas as juntas unidas para propor aquelles que hão de ficar representantes da Nação; supponhamos que se hia a dizer aos votantes, os votos para os vossos representantes dai-os occultamente, e dai-os occultamente porque vós sois fracos, e não tendes modo de resistir áquelles de quem dependeis. Estou certo que o cidadão diria logo: pois não quero dar o meu voto occultamente mas publicamente. Eu tambem me conformo com esta opinião e digo: quero votar em publico e não em segredo.

O Sr. Feio: - Houve já um tempo (segundo dizem) no qual as virtudes habitavão entre os homens, não havia dependencia alguma, o mundo era um paraizo, e a vida era uma delicia; veio depois a ambição e o despotismo, as virtudes fugirão então, e a justiça foi a primeira a aumentar-se. Agora veio visitar-nos a liberdade; mas a justiça ainda por lá ficou. Se ella vier, as votações devem ser publicas, porque então acaba toda a influencia das pessoas, e principia o imperio da lei: se não vier, tanto faz que as votações sejão publicas, como secretas, porque tudo ha de ser dependencia, tudo corrupção, e vileza. Mas eu que ainda lenho esperanças de que a justiça ha de voltar, voto pela maior publicidade nos escrutinios.

O Sr. Miranda: - Trata-se se as eleições devem ser publicas ou occultas. Quando se tratou da redacção do projecto, eu para ser coherente fui do opinião que fossem publicas; um dos argumentos mais fortes, he que já está sanccionado o artigo 35: e obstar persuadido que isto deve ser religiosamente observado, pelo perigo que ha de versatilidade nas decisões do Congresso: voto pois que as eleições sejão publicas: resta porem examinar se haveria grandes inconvenientes em o serem; confesso que ha razões fortes por um e outro lado. Em geral póde estabelecer-se que nas cidades populosas as eleições sejão publicas, porem nas provincias onde ha pequenas povoações, e estas distantes entre si, ha grandes inconvenientes em serem publicas, e não deixaria de haver vantagem em serem secretas. Importa que as eleições sejão publicas na parte onde ha opinião publica, nas cidades populosas aonde ha fermentação, nas cidades aonde a influen-

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cia do poder se torna nulla; porem nas pequenas povoações onde se achão grandes distancias, onde aqui, e alem se acha um homem poderoso, aqui não póde haver opinião publica de um modo tão energico, a fermentação he pequena, a influencia do poder he então maior, e por tanto os poderosos podem influir. Entre tanto esta influencia não he tal, como alguns Preopinantes suppõem; já não póde haver influencia dos capitães móres, dos caudeis, e outras muitas autoridades que exercita vão sobre os povos um poder soberano: por outra parte os cidadãos livres, já não tem que recear da influencia dos poderosos, o que se passou mesmo nas eleições passadas prova que elles não poderão ter muita influencia: muitos poderosos, nas eleições passadas, quizerão ser eleitos, mas não poderão ser eleitos, apesar dos povos viverem dependentes delles. Não se diga que das eleições serem publicas nascerão menos desordens, a Nação Portuguesa o acaba demostrar, não houve desordem alguma nas eleições passadas, apesar de que acabavamos de recobrar a nossa liberdade. Em segredo póde haver conloios, pôde-se eleger um homem mão; pelo contrario em publico não he assim; os crimes fogem sempre da luz, e qualquer cidadão que tramou um conloio, sendo a eleição publica, fica desmascarado e desacreditado pela sociedade; por consequencia escuso demorar-me mais tempo. Em geral póde estabelecer-se que onde a população se acha concentrada, convem que a votação seja publica; nos outros lugares, onde não acontecer assim poderá haver alguns receios; mas as causas que tem dado origem a este receio, e a esta influencia tem desapparecido. Eu não sou da opinião dos illustres Preopinantes que querem dizer que as eleições directas suppôem nos povos mais conhecimentos e virtudes do que elles realmente tem. Eu supponho pelo contrario que o povo tem os conhecimentos e as virtudes necessarias para escolher bons Deputados; e por tanto estou na minha opinião que as votações devem ser publicas; até mesmo para haver coherencia com o que se acha sancionado no artigo 35.

O Sr. Sarmento. - Julgo que me he preciso explicar-me, a fim de que se não reputem contrarios á liberdade os principios que eu estabeleci. Se uma Constituição se reputa mais, ou menos liberal, segundo nella predominão mais, ou menos os principios de democracia, aquellas que se assimilharem ás da Hespanha, e dos estados unidos da America serão as mais liberaes, porque estas Constituições são as mais democraticas do mundo todo. No artigo 73 da Constituição de Hespanha, se determina a eleição por escrutinio secreto; como isto he um facto, he facil a sua verificação: igualmente nos estados unidos da America, he a eleição feita por ballot, isto he, não se dão em publico as nomeações. Accrescentarei mais a estes exemplos práticos de duas Nações, a theoria de escriptores celebres; bastará talvez citar qual he a opinião do nosso amigo, o ancião Jeremias Benthan, o qual tambem he a favor do ballot, ou do escrutinio secreto por tanto tenho chamado em apoio da minha opinião as tres autoridades, que eu deixo referidas; parece-me que ella poderá merecer toda outra qualificação, menos o sobrescripto de illiberal; por esse lado não he que eu temerei os ataques da opinião era contrario, antes os escriptores menos liberaes são os que pertendem a eleição em publico, porque temem o resultado da eleição, quando aquelle que vota está em toda a sua liberdade, e independencia, sem influencia de medo, sem receio de incorrer em desagrado, e podendo inutilizar a intriga.

Tambem se pertende argumentar que pela sancção da doutrina do artigo 35 está decidido que as eleições sejão publicas. Em primeiro lugar direi, que seria uma incoherencia pasmosa, que uma decisão de tamanha ponderação, talvez a maior em todo o nosso systema de eleições, fosse uma consequencia forçosa de um artigo de tão inferior importancia, como o não poderem votar os militares da 1.ª e 2.ª linha nos seus commandantes. Em segundo lugar eu não descubro essa absoluta contradicção entre estes dois artigos, de tal forma que se não possa achar algum meio de conciliação: parece-me que sabendo-se pela matricula de cada uma das juntas eleitoraes, se entre os que votão existem individuos militares, que se separe a eleição dos seus chefes da eleição geral, a fim de quando se proceder á eleição delles, ficarem excluidos os militares. Póde muito bem acontecer em algumas juntas eleitoraes, que a ellas não concorrão militares, e nesse caso não será necessaria a eleição dos chefes militares em separado; muitos outros expedientes poderão occorrer, a fim de que se rnostre que he um sofisma o exigir-se que a eleição seja publica, por isso que assim o pede a doutrina já anteriormente sanccionada.

O Sr. Soares de Azevedo: - Srs., trata-se hoje de uma questão que no meu entender a sua decisão póde influir muito na prosperidade do systema constitucional que ternos adoptado; tal he a questão sobre deverem as eleições dos Deputados serem feitas em publico ou em escrutinio secreto. Tenho visto que muitos dos illustres Deputados que me precederão a falar tem seguido a opinião de que as eleições devem Ser publicas, e supposto eu já em outra occasião ainda que incidentemente manifestasse a minha opinião a este respeito, todavia eu antevendo os graves inconvenientes que podem resultar de se abraçar uma tal opinião julgo do meu dever não só rectificar a minha opinião, mas fazela publica á nação para que saiba qual ella foi.

Tenho aqui ouvido dizer a alguns dos illustres Opinantes, e já por mais de uma vez, que he um grande problema de qual dos methodos de eleições poderá regular maiores inconvenientes, se das eleições feitas por votos dados em publico, ou dados em escrutinio secreto; eu porem digo que depois, que o Congresso decidiu, ainda que eu fui de opinião contraria, que as eleições fossem directas, para mim já não ficou sendo problema as eleições e votos publicos ou secretos, para mim ficarão sendo, para assim dizer os votos secretos de uma evidencia mathematica, e eu o mostro. He da natureza das instituições civis, que muitas vezes os legisladores se vem obrigados a abraçar um mal, para evitarem outro maior, e nisto he que consiste a prudencia, e sabedoria do legislador; todos concordão que he necessario haver, eleições,

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e em consequencia votos; que estes só podem ser publicos ou secretos, consequentemente reduz-se toda a questão a saber de qual destes modos resulta maiores ou menores inconvenientes. Mostrando eu pois que das eleições publicas resultão muito maiores inconvenientes, tenho mostrado que devem prevalecer as eleições secretas; e era consequencia resolvido o chamado problema. Todo o grande inconveniente que os illustres Opinantes tem encontrado nas eleições secretas, vem a ser a facilidade de só poder comprar e dar votos subornados; dizem elles que o ladrão, o assassino, é o malfeitor procura sempre o segredo da noite para perpetrar seus crimes, e semelhantemente muitos se aproveitarão do segredo dos votos para os subornarem; e o conseguirão tanto mais facilmente, quanto elles são dados em segredo. Eu ponho de parte o mostrar a inconsequencia deste argumento, porque ella he de sua natureza clara, não só porque se o eleitor he venavel tanto o póde ser dando o voto em publico, como em segredo, como porque sendo dado em segredo haverá menos quem pertenda comprar votos pelo perigo de perder o preço sem ter a certeza do voto. Eu me limitarei unicamente a mostrar os incomparaveis inconvenientes que resultão das eleições ou votos dados em publico, e direi que ha de haver sempre homens ricos e pobres, senhorios e cazeiros, devedores e credores, poderosos e desvalidos, protegidos, protectores, em uma palavra ha de haver sempre dependencia; a ordem social he composta de cadeas presas por muitos elles, que indo prender por ultimo em um poder superior, cada um dos inferiores fica sustentado pelos superiores, e em consequencia dependente delles; e pergunto eu agora, se um senhorio pedir os votos dos seus cazeiros, o credor dos seus devedores o rico e poderoso dos pobres e desvalidos, é seus dependentes, pregunto de que modo será mais facil a estes para poderem deixar de annuir a um tal peditorio, e seguir os impulsos de sua consciencia, dando o seu voto em publico e á face daquelle mesmo que lho pediu, ou dando-o em escrutinio secreto? De que modo podo a elle obrar com mais liberdade? Creio que ninguem se atreverá a negar que he em escrutinio secreto, logo se em escrutinio secreto se vota com mais liberdade, se as eleições são tanto melhores quanto mais livrei, se nenhuma eleição se póde dizer legitima sem ser feita com toda a liberdade, como ha quem queira sustentar, e preferir os votos em publico? Que perseguições, e que vinganças não resultarião daqui? O resultado seria sem duvida, ou a desgraça dessas pessoas que postargando a seducção, seguirão os impulsos da sua consciencia e dá sua intima convicção, ou uma eleição feita sem a necessaria liberdade, e filha unicamente da patronage, da peita, e do soborno.

Consideremos agora a questão por outro lado. As eleições dos Deputados sendo feitas directamente como já está decidido, hão de necessariamente ser um resultado de ajuntamentos populares, e em consequencia sugeitas a partidos, e facções; e quem haverá com tanto valor e presença de espirito que se atreva a dar publicamente o seu voto em uma eleição popular, segundo a sua consciencia, e contra um partido, ou uma facção? Os legisladores devem considerar os homens como na realidade são, e não segundo devem ser, pois que as leis são executadas segundo o que são, e daqui fica evidente, que debalde recorremos a Roma, a Inglaterra, a França: que nos importa Roma, França, ou Inglaterra, quando nós legislamos pana Portugal? Só Portugal e o caracter dos Portuguezes devei-nos ter em vista; não he neste caso que bem nos podem dirigir os exemplos das nações estrangeiras, ainda quando fossem veridicos os factos apontados. E porque he necessario1 recorrermos nós a exemplos estranhos, quando os temos bem recentes dentro de Portugal? Convido a todos os illustres Deputados que se achão neste Congresso, e forão eleitores de provincia no Porto, a que digão o que ali aconteceu; quantas vezes ouvirão em altas vozes: ou Lessa ou a morte, ou fulano ou morrer! Digão senão virão annuncios e pasquins pelas esquinas das ruas, fazendo os mesmos ameaços, e senão houve olguns insultos feitos a alguns eleitores mesma de cara a cara? He verdade, e para honra dos mesmos eleitores devo dizer, que nenhum sahiu eleito daquelles que a populaça pediu; mas tambem devo dizer que muitos deixarão de ir ás eleições, e outros se retiravão da sala para o interior da casa do Senado, quando se abria o escrutinio, receando algum insulto ou reacção, não tendo sabido eleito quem a populaça pedia. Agora pergunto eu, quando isto succedeu nas eleições indirectas, e em uma Assemblea formada de homens escolhidos, e sendo os votos dados em escrutinio secreto, que aconteceria se fossem dados em publico? De duas uma, ou não haver eleição, ou eleger-se quem a populaça quizesse. E he este o bello e óptimo modo de fazer as eleições? He este o melhor modo de se eleger para Deputado quem o eleitor julga na sua consciencia mais digno? He esta a decantada liberdade que deve haver em um tal acto? Desenganemo-nos Senhores, já o disse o outro dia, e agora o repetirei; todos quererão ser Catões, e que os mais o sejão; mas eu ainda não ouvi falar senão de um, não duvido que houvesse um ou outro que desse ou quizesse dar provas de o ser, mas esse um ou outro he quem ha de fazer as eleições? A esse um ou outro he a quem nos havemos do accommodar a formula das eleições? Para esse um ou outro he que nós legislamos, ou para, todos geralmente, e segundo o que he mais ordinario? Pensemos, Senhores, maduramente o que vamos a decidir; eu estou altamente persuadido, que no mesmo momento em que decidirmos que os votos sejão dados em publico, he nesse mesmo momento que nós excluimos do acto das eleições a todo o homem de probidade. O nosso amor proprio de ordinario não nos deixa ver a inferioridade que temos aos outros, e nos faz considerar quando não superiores, ao menos iguaes; por esta razão muitos se hão de persuadir terem as qualidades e merecimentos necessarios para Deputado, e todos estes se julgarão offendidos por aquelles que sendo seus amigos e conhecidos não os julgarão dignos dos seus votos, e nesta colisão que homem de probidade haverá que queira ir assistir a um acto onde o resultado ha de ser necessariamente a ir comprometter-se e adquirir inimizades? Creio

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não foi outra a razão porque nós mesmos decretámos que as eleições que nós fizéssemos tanto de Presidente e Secretarios, como de Conselheiros do Estado, etc. fossem feitas em escrutinio secreto. Pois os Representantes da Nação não se considerão com firmeza de caracter tal que se atrevessem a dar una taes votos em publico, e querem suppôr o povo com essa firmeza? E se motivos de delicadeza justificão umas similhantes eleições secretas, não. serão talvez ainda maiores motivos de delicadeza na eleição de Deputados? Se tal decidissemos não haveria uma contradicção mais manifesta. Dizem os iliustres Opinantes que o povo tem todo esse patriotismo e virtudes necessarias para darem em publico o seu voto segundo a sua consciencia; mas não terá elle as mesmas virtudes para seguir a sua consciencia ciando o seu voto em escrutinio secreto, onde lhe he tanto mais facil, quanto mais livre? Estas reflexões, Senhores, no meu entender não tem resposta, e por isso decididamente sigo que as votações não devem ser dadas em publico. Não he porem tambem a minha opinião que ellas sejão absolutamente secretas, mas que sejão assignadas as listas, que só poderão ser vistas e lidas pela meza eleitoral sem declararem o nome no acto da leitura, excepto sendo o voto dado contra algum artigo deste regulamento; tendo a meza prestado um juramento de guardar o segredo devido, e queimando-se depois as listas. Duas são as razões porque sigo esta opinião: a primeira he porque evitando-se por este modo o maior dos inconvenientes que tem ambas as eleições, secretas e publicas, consegue-se o bem que ambas tem. A segunda he para combinar com as decisões que já estão feitas, como o não poderem os freguezes votar nos Parochos, os diocesanos nos seus Prelados, os soldados nos seus Commandantes, e dever-se tambem determinar que não possão os pais votar nos filhos, nem estes naquelles, os irmãos nos irmãos, os tios nos sobrinhos, etc. pois he evidente que não se fazendo uma tal prohibição haverá individuo cujo parentesco esteja muito ramificado em um districto, que reunindo em si os votos dos seus parentes venha por este motivo a alcançar um grande numero de votos, sem ter outras qualidades mais do que a de ser parente dos eleitores; e eu não vejo outro modo de remediar este inconveniente senão sendo as eleições feitas pelo modo que proponho, porque absolutamente secretas, estas disposições se tornarião illusorias, e he por estas razões que eu proponho este methodo, e voto por elle.

O Sr. Girão: - Ha muito tempo que tenho vacillado sem poder decidir quaes são melhores, se as eleições publicas, ou se as eleições secretas. Os illustres Preopinantes que romperão esta discussão, encherão os seus discursos de taes flores que poderião seduzir; porem observando eu bem estas brilhantes flores, achei-as semelhantes ás que a natureza faz dobradas, as quaes são mui lindas, mas estereis. Deixando metaforas, mostrarei o principio em que me fundo, para assim discorrer. Diz um illustre Preopinante, que os militares se votassem em publico, não se atreverão a, deixar de dar o seu voto nos seus commandantes; este he o primeiro argumento, o qual força nenhuma tem, porque está prohibido votar nos commandanles. Disse outro illustre Preopinante, que não haveria perigo de suborno de dinheiro, porque sendo os votos secretos, o que desse o dinheiro não poderia contar com elles mas isto não he assim; quando os votos forem publicos, he que decerto não haverá esse perigo, porque os que tem muito dinheiro, não são (ordinariamente falando) os que tem mais virtudes: os mais endinheirados são os verres que tem feito os povos desgraçados. E qual seria o homem que quereria dar o seu voto no que tivesse muito dinheiro adquirido por tal forma? Ora no escrutinio secreto haveria muito, e muito disto, porque o mysterio os segurava, e pouco lhe importaria que taes monstros apparecessem votados. Diz mais o illustre Preopinante que haveria perigos de tumulto; he verdade que algum se póde recear, mas não haverá peor tumulto, e mais falaes consequencias no caso que a eleição recaia em homens indignos? Poderá, torno a dizer, perturbar-se momentaneamente o socego quando algum imprudente der o seu voto numa pessoa mal vista, e que tenha a execração publica; mas este pequeno tumulto não trará grande desconcerto na maquina politica; porem quão terriveis serão os aballos, se as eleições secretas produzirem uma escolha de representantes indignos, ou inteiramente conhecidos por contrarios a esta causa.

Por tanto, pesando eu na balança do meu entendimento os males de uma e outra eleição, voto pela publica. Outro Preopinante disse, qual será o homem que tenha tanta virtude que sendo devedor deixe de dar o seu voto no seu credor? Ora este perigo não he nenhum, porque não póde haver um homem que tenha todos, os vogaes por devedores; poderá sim juntar dez ou vinte votos, mas isto não he nada, porque de duas uma, ou este homem he bom, ou máo; se he bom, então nenhum mal faz que o elejão; e se he náo, ficará com os votos dos seus devedores sem proveito. Os homens bons de certo o não hão de eleger. Outro illustre Preopinante trouxe exemplos muito antigos; he certo que todos são verdadeiros, mas como estavão naquelle tempo os conhecimentos humanos? Então não havia senão influencia dos poderosos manobrada occultamente. Se a nação portugueza estivesse como estava Polonia, ameaçada de exercitos estrangeiros, e dividida pelos partidos dos nobres, então succederia o mesmo; mas nós jurámos, e temos uma Constituição que ha de defender a todos, e que ha de livrar a Nação dos partidos dos homens poderosos. Alem disto, não temos inimigos ás nossas portas.

Por todas estas razoes, e outras muitas já ponderadas, voto que as eleições sejão publicas. Os crimes perpetrão-se durante a noite; as feras saem durante as trevas dos seus covis, mas logo que vem a luz do dia desapparecem e fogem: por isso quando as eleições forem feitas ás claras, apparecerão os homens honrados, os quaes darão o seu voto com muito boa escolha, e então apparecerão tambem representantes dignos de um povo livre, e heroico, como he o portuguez.

O Sr. Soares Franco: - Este objecto he cheio de difficuldades, he de muita importancia, e por isso ainda que esteja dito tudo, devo dizer a minha opinião. O Sr. Soares Azevedo falou muito contra as

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eleições secretas, mas por fim veio a dar um arbitrio que em certo modo estabelece as publicas. Todos estão conformes que n'uma cidade muito populosa, onde não póde haver a prepotencia de um ou mais homens, onde os interesses são concentrados, e a opinião publica torna responsaveis os cidadãos, as eleições publicas serão as melhores; mas nas terras pequenas onde ha um ou dois homens de consideração, só podem ter uma influencia particular, o escrutinio secreto seria o melhor, porque augmenta a liberdade aos habitantes. No entanto o arbitrio do Sr. Soares de Azevedo parece-me mais acertado: quererei que as listas sejão assignadas, mas quererei tambem que estas listas se mandem queimar depois de feito o exame. Desta sorte teremos grande utilidade que he salvar o que está votado: nós votámos estas restricções para evitar a dependencia que poderião ter os soldados dos seus coroneis, os freguezes dos seus parochos. Para evitar isto, julgo muito necessario que as listas sejão assignadas; assim lemos salvado uma cousa que he constitucional, eternos acostumado os homens ao caminho da liberdade e da honra.

O Sr. Miranda: - Alguns illustres Preopinantes attendendo ao que já está sanccionado, e vendo que o contrario do que está estabelecido no artigo 33 he consequencia necessaria deste artigo: querendo observar o que já se acha sanccionado, não querem admittir com toda a sua latitude a votação publica, e quererá transigir adoptando um meio termo, que nem Vem a ser eleição publica, nem secreta. Eu acho o arbitrio do Sr. Soares de Azevedo, o peior de todos os arbitrios porque não tem a vantagem de um nem de outro. Dar o votante o sou voto assignado em nome do Deputado que elege, e depois queimar-se esta lista, acho que este meio não tem a vantagem, nem das eleições publicas nem dar, occultas, e que he o arbitrio prior de todos os arbitrios. Devemos advertir que nas grandes cidades e vilas populares, a eleição publica he sem duvida preferivel á secreta, mas tambem devemos advertir que nas povoações pequenas, nas assembleas particulares compostas de largos na presença do presidente da assembléa, terão elles receio de votar livremente, visto que as listas hão de ser examinadas pela meza. Por outra parte não tem a vantagem das eleições publicas pois que a vantagem destas he ser presente á assemblea o modo de votar de cada um dos eleitores.... Não se assustem tanto os Preopinantes com as desordens de uma assemblea eleitoral. Devemo-nos lembrar, que nas assembleas eleitorais quando houver alguns cidadãos debatinados, os cidadãos prudentes hão de contelos; quando houver alguem que quizer promover grandes desordens acharão grande numero de individuos que reclamem a ordem, e daqui seguir-se-ia serem eleitos aquelles que mereção a opinião da assemblea. Nas votações secretas o que interessa he que o eleitor vote do modo mais conveniente ao bem publico, mas póde haver um conloio, em que um cidadão seja obrigado a votar do modo que não quer. Na votação publica o votante votará como interessa á Nação que elle vote. Um dos illustres Preopinantes quiz produzir um argumento contra producentem. Disse elle que um magistrado querendo ser reconduzido alcançara uma lista nem a assignatura de quatrocentas pessoas; mas por ventura o que a alcançou expoz uma folha aberta do publico? Foi por um voto publico que elle obteve tantas assignaturas? De modo nenhum. Convenho que em um Governo dispotico, o cidadão que legislasse a favor da liberdade estabeleceria a votação secreta, mas em um Governo liberal e constitucional deve ser publica. Não levemos a mal que algum servir se queixe de votar em liberdade. O que eu quero he deixar uma amplitude á liberdade que existe a bem da Nação. Não se disse que a liberdade do cidadão he a que he regulada pela lei? que o cidadão pode tudo que a lei não prohibe? Como pois não havemos de ter escrupulo em estabelecer na lei que acabe com as associações de classes? E qual he o meio senão apresentar-se cada um dos eleitores diante da opinião publica, a dar publicamente o seu voto? Nem receemos que a influencia do poder obre de um modo mais poderoso em publico do que em particular. Em segredo he mais facil estabelecer um conloio do que um publico. Allegão-se exemplos das eleições passadas; mas que aconteceu nestas eleições, que a penas apparecia um conloio, porque em verdade em algumas partes apparecêrão muitos; mas apenas se tornava publicos desapparecião á vista da luz. Alem de que eu não posso deixar de considerar que a votação publica he consequencia necessaria do sanccionado no artigo 30. Seria dar exemplos de versatilidade, revogar o determinado no artigo 35, sem haver para isso razões mui fortes, e mais claras do que a luz sem haver vantagem em contrario: e eu por consequencia desejarei que elle se não revogue, e para que isto não aconteça he necessario que as eleições sejão publicas, e de maneira nenhuma como diz o Sr. Soares de Azevedo, porque este remedio, como disse, he peior que o mal. Um dos illustres Preopinantes argumentou com as eleições deste Congresso. A isto responderei que nunca foi do meu voto que taes eleições fossem secretas. Nenhum cidadão deve ter pejo de dar em publica sua opinião e o seu voto. Este he outro motivo para que as eleições sejão publicas: voto por tanto por estas.

Interrompeu o Sr. Presidente a discussão para participar que se achava proximo á sala o sargento mór de infanteria do exercito nacional e real, João José da Cunha Fidié, nomeado governador das armas da provincia do Piauhi, que estando a partir para o seu destino, vinha apresentar ao soberano Congresso uma ratificação de Votos de obediencia ás Cortes, e adhesão á Constituição concebida nos termos da sessão seguinte carta:

Senhor. - A este augusto Congresso tem a honra de se apresentar João José da Cunha Fidié, sargento mór de infanteria da exercito nacional e real, nomeado governador das armas da provincia de Piauhi, que se acha proximo a sair para o seu destino na charrua Gentil Americana.

He pois do seu dever, antes de partir, apresentar-se a este soberano Congresso para ratificar os votos da sua obediencia, e protector a mais firme, e constante da pela Constituição, e bem da causa da na-

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ção: possa elle no desempenho das suas obrigações obter a approvação deste soberano Congresso, e proceder em tudo conforme os seus beneficos sentimentos. Lisboa 26 de Abril de 1822. - Sou com o maior respeito - De V. Magestade - Muito respeitoso, e obediente subdito - João José da Cunha Fidié.

Foi ouvida com agrado, mandando-se publicar neste Diario e no do Governo; e se determinou que fosse um dos Srs. Secretarios participar-lhe isto mesmo, o que foi verificado pelo Sr. Secretario Barroso.

Igual participação fez o mesmo Sr. Presidente a respeito do commandante e officiaes que guarnecem a charrua Gentil Americana, promptos a sairem da capital a darem cumprimento á commissão que se lhes confiou; os quaes vinhão tambem prestar homenagem ao soberano Congresso, e exprimir os seus sentimentos de adhesão á causa constitucional, e obediencia ás Cortes, por meio da seguinte carta:

Senhor. - O commandante, e officiaes, que guarnecem a charrua, Gentil Americana, promptos a sair do porto desta capital a cumprir a commissão que se lhes confiou, sustendo sentimentos os mais fieis, e respeitosos, que caracterisão os verdadeiros portuguezes, vem de novo protestar perante o soberano Congresso esses votos de adhesão á causa constitucional, e feliz regenerarão da patria, e a mais rendida obediencia com que se dedicão ao cumprimento das sabias e providentes determinações do soberano Congresso, que tão heroicamente, e com tanto zelo se empenha na firme consolidação da felicidade dos portuguezes.

O respeito, a obediencia, e o desejo de prestarem o melhor serviço á nação portugueza a que pertencem, constituem o unico fim de seus cuidados e muito seria applicação: assim tem a honra de o protestar e se dirigem ao desempenho da sua commissão á ilha de S. Thiago, ao Maranhão, e Paia. Lisboa 26 de Abril de 1822. - Joaquim Manoel Mendes, capitão de fragata, e commandante; João Baptista Escrivanis, capitão tenente; Pedro José Correia, primeiro tenente; Bernardo José Henrique, primeiro tenente; João José dos Santos, segundo tenente; Vicente José dos Santos Moreira Lima, voluntario.

Fez-se menção honrosa desta corta, mandando-se publicar neste Diario e no do Governo; e se determinou que se lhes participasse isto mesmo, o que foi verificado pelos Srs. Secretarios Barroco e Soares de Azevedo.

Continuando a discussão interrompida, disse

O Sr. Brandão: - Eu tambem fui daquelles que por muito tempo hesitei sobre qual das formas de votação era mais conveniente nas eleições, se havia dar preferencia á votação secreta, se á votação publica a final decidi-me pelo escrutinio secreto. Depois de assistir a discussão ouvi razões de muito peso por uma e outra parte, que me não fizerão mudar de opinião; porque a força de umas foi illudida pela de outras, e por isso persisto no meu primeiro anno. Não entrarei no exame destas razões; assaz estão examinadas, direi simplesmente as que me determinarão a preferir a votação secreta, porque me parece que ainda não forão attendidas. Estabeleceu-se a eleição directa e por consequencia deu-se a cada um dos eleitores o direito de votarem rios representantes da nação, isto he, deu-se-lhes o direito, e se lhe impoz a obrigação de declararem qual he o cidadão, que segundo o seta proprio juizo, segundo a sua convicção inteira, foi mais digno de ser seu representante e Deputado da nação. Ora, ou a publicidade da votação, tem alguma influencia nos eleitores ou não; se a não tem tanto importa que as eleições sejão secretas como publicas; não percamos tempo em discutir; se influem (como eu, e todos nós julgamos) toda a influencia que não he superflua força o cidadão a desviar-se do dictame da sua consciencia, e renunciar ao seu proprio juizo, para seguir o juizo, e dictame alheio, toda a influencia importa privação dos direitos que lhes são inherentes, e uma diminuição da liberdade. Por tanto a publicidade que influe nos eleitores se não está em manifesta contradicção com a eleição directa que estabelecemos, está em contradicção com os principios em que ella se estabelece, e com o fim para que se estabeleceu. Adoptámos a eleição directa para preferirmos as vontades de todos á vontade de alguns; a opinião publica, á opinião dava parcialidade influente; e porque nós já separamos da eleição algumas clases craque deviamos suppôr menos capacidades e confiamos a eleição sómente áquelles cidadãos em quem devemos suppôr a capacidade necessaria. Estabelecendo-se porem a votação publica, estabelecendo-se uma influencia que dirige os cidadãos, e substitue a sua consciencia; quer-se que a eleição seja o resultado não da vontade de todos, mas da vontade de alguns; que seja a expressão, não da opinião publica, das da opinião de um partido influente. Suppôe-se que os eleitores a quem se confiou o direito do eleger são incapazes de eleger. Para evitar estas contradicções he que eu me decidi pela votação secreta. Outra razão porque me decidi a, favor da votação occulta foi porque a opinião a favor da votação publica funda-se em uma hypothese; a qual he que a maioria dos eleitores intrinsecamente propende para o mal, e que elles se precipitarão se não houver um freio que o contenha; a opinião a favor da eleição occulta responda sobre uma hypothese contraria, suppõe nos eleitores tendencia para o bem, e receia que possão ser desviados da sua natural tendencia pela influencia de interesses parciaes, esta ultima hypothese he que eu julgo verdadeira. Eu supponho que os eleitores, ou pelo menos, a maioria querem o bem, querem a sua liberdade, querem a conservação do Governo actual que lha assegura, e tem a intelligencia necessaria para conhecerem quaes são os Deputados que lhes convem, e por isso não quer limitar a sua liberdade por meio da influencia externa, e quer remover obstaculos que a dependencia lhes tornaria invenciveis. Abstraindo destas razões de justiça, consideremos se he util que na eleição dos Deputados haja alguma influenia. Eu julgo que não. Se nas eleições dos Deputados houver influencia, uma das forças influentes será o poder executivo. Ora o poder executivo tem iamos agentes, tem á sua disposição tantos meios de influir, será tão grande o receio que a maior parte

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dos cidadãos terá de se malquistar com elle, que se julgo que entre todas as forças influentes na eleição, sejão ellas quaes forem, a do ministerio será sempre preponderante, e por isso quero quanto for possivel excluir das eleições a influencia, é inutilizar os seus esforços para que não prepondere nas eleições dos Deputados a influencia do ministerio. Ha um argumento a que tenho ouvido dar alguma força, e he que nós decretamos que devem ser excluidas certas pessoas da votação, e que não póde verificar-se esta lei sendo as eleições secretas. Eu não sou desta opinião. Para uma lei ter lugar basta que haja em caso em que possa verificar-se. Eu convenho, que em muitos casos não póde conhecer-se que o parente votou em si mesmo ou no seu parente e porem ha um caso em que isto se póde verificar, e basta este para a lei puder ter lugar. A lei fica com toda a sua força; ninguem póde votar em si mesmo; áquelle que votar importar-se-lhe uma pena. Dir-se-ha que nunca se pôde verificar: pôde. Se acaso forem tantos votos que se seja que aquelle homem nunca podia ser certo senão por ter a concorrencia de todos os votos dos seus patentes, já se póde verificar o caso da lei; já esta se póde estabelecer, pois ha um caso em que he util; e por isso não tem contradicção alguma com o artigo. Pelo que respeita á opinião que se emittiu, que seria bom que as listas fossem assignadas, eu conformo-me nisso com a opinião do Sr. Miranda, não só pelas razões que elle deu, mas tambem porque assignando-se as ditas eleições, se tornão publicas, e eu voto pelas secretas.

O Sr. Bettencourt: - Falar em huma questão, que já tem sido objecto da discussão de duas sessões, imporia o mesmo que repetir as mesmas idéas, argumentos, e até muitas vezes as mesmas palavras: os Deputados não podem todos falar ao mesmo tempo, e por isso he de necessidade que os que falão depois de outros repitão muitos argumentos, de que os primeiros se tem servido e esta a razão, porque eu não falo mais vezes, por não enfastiar este soberano Congresso: agora porem, que se trata de uma materia, que eu julgo a mais transcendente, não posso nem devo deixar de patentear a minha opinião, e em publico, á face da Nação: pois quando se tratasse as eleições dos Deputados para as Cortes, devem ser feitas em publico, ou por escrutinio secreto, está bem evidente, que eu querendo em publico dar o meti voto, e as razões delle, he porque sigo a opinião, de que devem as listas dos eleitores serem publicas. - Esta minha opinião he o resultado de se terem decretado as eleições directas; estas suppõem os eleitores illustrados, e então não os devemos contemplar virtuosos e probos! Demais, tem-se sanccionado, que haja certas pensões, em que certos cidadãos não podem votar; logo como se poderá verificar o artigo sanccionado? ha contradicção por certo; e não póde deixar, ou de se revogar o que já está sanccionado, ou então serem publicas as eleições para se ver, que não votão nas pessoas prohibidas. Demais, senhores, eu vou a expender uma razão, que ainda não vi aqui alegar: qual he o fim para que são eleitos os Deputados, para em Cortes tratarem de leis, que fação a prosperidade da Nação; e como se fazem estas discutindo-se em publico; logo porque razão as causas não devem ler a mesma natureza que os effeitos? Os Deputados são effeitos das eleições; elles são para falar e votar em publico, nas Cortes; porque não hão de ser publicas os votações nas eleições que eu contemplo primeiras Cortes, onde a Nação exercita o acto mais augusto da sua soberania? Demais, eu sou desta opinião até para costumar o povo a ser justo e mais moderado; Conhecendo por experiencia a grande difficuldade, que ha, de dar hum voto publico: daqui lhe resulta a responsabilidade, quando aconteça votar em um Deputado, que não he constitucional e amigo da sua patria, elle será increpado, e censurado, e este procedimento o fará acautelado, e o fará votar com muita circunspecção. Porque razão hão de estar os Deputados a falar, e votar em publico, e todo o povo com direito de os censurar, não só os que falão nas galerias, mas todos os que lêem os Diarios das Cortes; dizem uns, este Deputado votou assim, por interesse proprio, aquelle por ignorancia, este por paixão, aquelle por theorias etc. etc.; e não ha de haver igual direito para uns cidadãos não dizerem a outros: vós votastes deste por amizade, naquelle por suborno, neste por fraco, naquelle por seducção, e contemplação etc. etc. O cidadão muitas vezes votou segundo a sua consciencia, e entretanto he calumniado injustamente: daqui resulta, que o povo com esta amiga experiencia, será mais sisudo, e moderado em julgar as discussões, e votações dos futuros Deputados, he preciso que eu fale com franqueza; daqui em diante não ha de haver empenhos para ser Deputado, porque este emprego he de tal responsabilidade, de taes comprometimentos, e para desempenho das suas augustas funcções se precisão tantos talentos e virtudes, que bem poucos poderão abalançar-se a quererem ser Deputados sem ter os requisitos necessarios: a experiencia destas Cortes assás tem provado isto que acabo de expender. Tem havido dias em que eu tenho sahido deste Congresso, como se tivesse caminhado muitas legoas, fatigado, e feito em pó: tenho soffrido muitos prejuizos, pois as minhas circunstancias se tem prejudicado com a obrigação que me impõe o emprego de Deputado; e deste meu modo de pensar hão de ser certamente muitos dos meus colegas. A' vista disto sou de opinião que as votações para Deputados nas eleições sejão publicas, e então o povo conhecerá de facto, quanto melindroso, e arriscado he falar, e votar em publico.

O Sr. Pessanha: - A razão mais forte em que fundão seus argumentos os illustres Deputados que tem falado contra a publicidade das eleições, consiste na maior liberdade que o escrutinio secreto procura aos votantes; mas para que esta razão procedesse, seria preciso suppôr o que desgraçadamente não succede, isto he, que todos os homens não podessem arredar-se nunca dos dictames da sua consciencia: assim propondo esta maior liberdade sem o freio da opinião publica, não se faz mais do que pôr na mão dos perversos uma espada de dois gumes, que elles podem a seu salvo empregar contra a causa publica; desta maneira fica muito mais facil a corrupção como

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bem o entenderão os intrigantes de Roma, os vendo que a compra dos votos quando erão publicos lhes ficava muito cara, conseguirão introduzir o escrutinio secreto nas eleições dos magistrados. He bem sabida a historia daquelles candidatos, que não podendo já com as despezas das compras dos votos sendo estes ainda publicos fizerão entre si um tratado para não recorrer a essa compra, obrigando-se no caso de contravenção a pagar uma certa multa cujo valor: depositarão nas mãos de Cutão; um dos candidatos tentou infringir o contracto, e foi condemnado por Catão; mas os outros não consentirão que o infractor pagasse a multa havendo que era pena sufficiente ter elle sido condemnado por Catão. Receia-se a influencia dos partidos sendo os votos publicos; mas quando deixará de haver partidos? A habilidade do legislador consiste em dirigilos para um fim util. Entre os povos livres os partidos entretem-se na discussão dos grandes interesses nacionaes; a saber na discussão das leis quando o povo legisla por si mesmo como nas republicas antigas; ou na discussão das qualidades dos seus mandatarios quando como entre nós se tem adoptado o systema representativo; entre os povos que não gozão da liberdade os partidos entretem-se em cousas futeis e de mera ostentação, no merecimento de um comediante, ou de um cocheiro como aconteceu em Roma sob o despotismos dos Imperadores: ora sendo nós livres iremos tolher ao povo a discussão precisamente naquillo em que elle immediatamente exercita a sua soberania isto he no acto da escolha dos seus representantes? Nem posso acceder á opinião do meu amigo o Sr. Miranda, o qual julga que a publicidade da votação teria inconvenientes nas provincias; já desapparecerão essas autoridades, que podião impor respeito aos eleitores: a unica influencia que ha de existir tanto nas cidades, como nos campos he a dos homens virtuosos e de talento; mas essa influencia que he bem que exista para esclarecimento dos cidadãos menos instruidos, só póde desenvolver todo o seu bom effeito com a publicidade, e discussão; então ella servirá mais e mais para radicar nos corações portugueses o systema constitucional; fazendo applicavel a Portugal o verso de Enio:

Moribus antiguis stat res romana virisque.

Desta arte a Constituição da Monarquia terá um fundamento inabalavel na opinião publica, dirigida pelos grandes homens que deve produzir a nossa feliz regeneração.

O Sr. Ferrão Mendonça: - Sr. Presidente, eu votei pelas eleições directas, e as razões que a isso então me moverão, são as mesmas que hoje tambem me determinão a votar pelas eleições publicas. Em quanto os Portuguezes conservarem os nobres sentimentos constitucionaes, e seguirem

O rumo de ser livres, de ser homens
Em que peza aos tyrannos! (*)

Mas terão cuidado de eleger nas futuras eleições óptimos Deputados, assim como nas passadas se esmerarão em escolher excelentes compromissados; porque como já aqui disse, notei que na eleição de 700 a 800 listas a que assisti, sempre a maioria dos votos, recahiu nas pessoas mais conspicuas da freguezia por talentos e virtudes. Mas se desgraçadamente a nação perder o enthusiasmo da liberdade de que está possuida, ou as eleições sejão publicas, ou sejao por escrutinio secreto, ella será outra vez escrava sem remedio! Alguns dos illustres Preopinantes que votão pelo escrutinio secreto nas eleições dos Deputados, allegão-nos com a Constituição da America, e com a Constituição de Hespanha, que sanccionarão estas eleições por escrutinio secreto: ao que eu- respondo, que nós jurámos fazer uma Constituição mais liberal que a da Hespanha, e caprichamos que será melhor que todas as conhecidas. Outros Srs. apoião o escrutinio secreto com a autoridade do nosso velho amigo o grande Jeremias Bentham; e com opiniões de outros sabios. Eu respondo tambem que respeito muito as maximas e recommendações do nosso bom amigo, mas neste caso não me agrada a sua doutrina, sem por isso perder nada do conceito que della formo, aliquando bonus dormitat Homerus. Quanto ás opiniões dos outros sabios autores tambem muito os venero; mas não os tenho por infalliveis, summi enim sunt, homines tamen. O illustre Deputado, e meu amigo o Sr. Moura na sessão passada conveio que as eleições publicas não terião grande inconveniente em Lisboa, e Porto, e mesmo nas grandes cidades; mas que nas aldeias se não podião admittir pela influencia que as pessoas ricas e poderosas tinhão rio povo; mas a isto já responderão sem replica os Srs. Miranda, e Pessanha. E na verdade não havendo já capitães móres, monteiros mores, caudeis mores, e outros déspotas que os povos com grande prazer virão abolir, que influencia póde haver sobre cidadãos que estão ciosos em manter os seus direitos? Quando os illustres Defensores do escrutinio secreto o apoiavão na sessão passada, asseverando que suas eleições erão as unicas em que havia liberdade de votar, e que menos podião ser influidas ou subornadas por intriga externa, eu reparei que dois frades que estavão nas galarias se rião muito, e conversavão um com o outro, e talvez dizendo: estes Srs. não sabem nada desta materia, que he exclusivamente nossa. Assim o acredito; porque com effeito nós nada sabemos do eleições, porque apenas temos feito uma! Esta materia he sómente sabida pelos frades, porque a estudão toda a sua vida de dia, e da noite! Mas quando o illustre Deputado o Sr. Ferreira Borges, como habil Canonista destelhou o Conclave Romano, e poz á luz as cabalas, e intrigas que se praticão naquella eleição, apezar de ser feita por escrutinio secreto, e com todas as formalidades canonicas, eu notei tambem que os dois frades ficavão muito serios, e escutavão attentos o seu discurso, como quem diz: este sim sabe do que fala, e conhece-nos as manhas! Mas para se mostrar que as eleições feitas por escrutinio secreto são influidas, e subornadas, não he necessario ir a Roma, nem destelhar o Conclave Romano; nem

(*) Felinto Elysio; ode a J. J. Rousseau. Nota do redactor.

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he preciso cair de Lisboa. Aqui mesmo temos uma corporação monastica, na qual ha tres partidos sancionados por uma bulla, a celebre Ternativa, vulgo Tripartita, que foi mandada executar por uma carta regia (*). Os tres partidos se denominão - Caraças, - Esperanças - Escolos, - e eu terei, se me dão licença, as sub-divisões. (A' ordem).... (Leia, leia). Lerei, porque isto he curioso. São os partidos declarados na bulla, a carta regia, e nomes ou reppelidos com que os padres muito se honrão. São pois os tres partidos creados pela bulla - Caraças, - Esperanças, - Escotos. - O primeiro subdividi-se em - Caraças Caetanas - Caraças linhares - Caraças carrancas - Caraças amarantes - Caraças athenasias. - O segundo subdivide-se em - Esperanças serras - Esperanças çapateiras - Esperanças almeidas - Esperanças porciunculas. - O terceiro subdivide-se em - Escotos marrecos - Escotos chouriços - Escotos claras - Escotos leonissas. - Ora quem diria que estes tres partidos creados por uma bulla, autorisados por cartas regias para solicitarem no capitulo os seus interesses, não só honrosos, mas lucrosos (honrosos, porque o provincial he o prelado maior da provincia, e lucroso, porque o provincialato antes da vinda dos francezes sempre rendeu no triennio de 36 a 40 contos de réis; e depois da saida dos francezes ainda rende de 16 a 20 contos): quem diria pois que estes partidos e suas subdivisões não fiscalisarião abertamente os seus interesses, para que no capricho se escolhessem para os empregos da provincia os religiosos mais conspicuos, e benemeritos, sendo a eleição feita por escrutinio secreto, e com todas as formalidades canonicas? Pois não he assim! O provincialão (que assim chamão ao padre que dispõe dos votos a seu arbitrio), o provincialão, apezar de serem os votos numerosos, governa sempre á sua vontade a eleição, e sahe eleito quem se quer, de sorte que se hoje 26 de Abril alguem lhe perguntar quem ha de sair provincial no dia 18 de Maio, em que se ha de celebrar o capitulo (e contra minha vontade, porque o Congresso não quiz olhar como urgente a indicação que eu fiz para se suspenderem) póde responder, se quizer falar verdade: ha de sair o padre Fulano!! Aqui está pois demonstrado por experiencia de longos annos que as eleições feitas por escrutinio secreto são infindas, e subornadas. De mais o systema das eleições secretas está em contradicção com as ideas liberaes. Nós queremos educar a Nação; queremos que seja livre ver e que em consequencia tenha sentimentos nobres, exprimindo com franqueza e lealdade os sentimentos do seu coração: e ordenamos que vote atraiçoadamente por escrutinio secreto!! Isto era proprio só do antigo governo despotico, que em 1803 convidou a Nação inteira, por editaes afixados por todas essas esquinas, a fazer denuncias em segredo, e até por cartas anonimas, contra os seus concidadãos, do que resultou fazerem-se injustiças, e despotismos sem numero! Eu mesmo, procurando um magistrado encarregado de tomar denuncias, observei como isso se fazia. Mandou-me entrar para uma sala em quanto não podia falar-me; entrei, e vi uma banca no meio da casa com um maço de papeis aberto, tinteiro, e arieiro, e duas cadeiras nos lados um homem aceado, que eslava sentado e só, a um lado da sala, se levantou, e vindo para mim, me disse com muito bom modo: V. m. tem alguma cousa que queira dizer? Respondi, que eu queria falar ao Ministro. Então reflecti que era o escrivão que tinha a devassa aberta, e esperava os denunciantes em segredo, que certamente lá não irião se as denuncias fossem dadas em publico, e confrontados os denunciantes com as victimas denunciadas. Argumentão finalmente alguns dos illustres Preopinantes com as nossas eleições da meza, que sempre se tem feito por escrutinio secreto. Assim he: mas isso o que prova he, que temos seguido a velha rotina, que eu reprovo, porque nem eu, nem algum dos illustres Deputados deste Congresso teriamos pejo de votar em publico no nosso Presidente, e Secretarios etc. Voto por tanto que as eleições dos Deputados ás Cortes sejão feitas por votos dados publicamente. E seria de desejar que já hoje fizéssemos um ensaio das eleições publicas, votando publicamente nas pessoas que devem servir na meza para o mez futuro.

Sendo chegada a hora destinada para as eleições da Meza, e não se julgando a materia sufficientemente discutida, ficou adiada.

Passando-se á eleição da Meza, correu-se o 1.° escrutinio para Presidente, e não produzindo pluralidade absoluta de votos, entrou em 2.° escrutinio o Sr. Camello Fortes com 41 votos, e o Sr. Luiz Paulino com 25, e saiu eleito o Sr. Camello Fortes, com 60 votos contra 44, não se achando presentes mais que 104 Deputados.

Corrido o 1.º escrutinio para a eleição de Vice-Presidente, saiu eleito o Sr. Luiz Paulino por pluralidade absoluta de 54 votos.

Seguiu-se a eleição de Secretarios: e sairão eleitos o Sr. Soares de Azevedo por 75 votos, o Sr. Felgueiras por 74, o Sr. Freire por 73, e o Sr. Barroso por 63; e para Secretarios substitutos o Sr. Araujo Lima por 10 votos, e os Srs. Peixoto, e Feijó, por 6 votos cada um.

Designou o Sr. Presidente para a ordem do dia a continuação do projecto das relações commerciaes entre Portugal e o Brazil.

Levantou-se a sessão ás duas horas da tarde. - Francisco Xavier Soares de Azevedo, Deputado Secretario.

(*) A Ternativa foi supplicada ao papa Clemente XII pelo capitulo provincial com beneplacito regio, e foi condedida ou creada pelo rescripto apostolico de 18 de Setembro de 1739, que foi mandado observar por carta regia de 13 de Julho de 1741. O dito resceipto foi depois confirmado por Benedicto XIV na bulla - In apostolica; dignilatis solio - datada em Roma aos 5 dos idus de Janeiro de 1742, e mandada observar por carta regia do 1.° de Junho de 1743. Nota do redactor.

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RESOLUÇÕES E ORDENS DAS CORTES.

Para Filippe Ferreira de Araujo e Castro.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza mandão communicar ao Governo, que para o mez que decorre desde esta data até 26 de Maio, tem eleito Presidente, Antonio Camello Fortes de Pina; Vice-Presidente, Luiz Paulino de Oliveira Pinto da França; e Secretarios Francisco Xavier Soares de Azevedo; João Baptista Felgueiras; Agostinho José Freire; e Francisco Barroso Pereira. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Majestade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 26 de Abril de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para Sebastião José de Carvalho.

Illustrissimo e Excelentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza mandão remetter ao Governo, a fim de ser competentemente verificado, o offerecimento incluso, que Joaquim José Gomes, e companhia dirigirão ao soberano Congresso em nome do seu correspondente, José Francisco de Medeiros, negociante na Ilha do Fayal, da quantia de 120$000, na fórma da lei, para as urgencias da Nação. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 26 de Abril de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Redactor - Galvão.

SESSÃO DE 27 DE ABRIL.

A' Hora determinada disse Presidente, que se abria a se sessão precedente pelo Sr. Deputado Secretario Soares de Azevedo, foi approvada.

E logo o mesmo Sr. Secretario leu a indicação, que na sessão antecedente havia apresentado o Sr. Deputado Secretario Barroso, e sobre que se não havia tomado deliberação, propondo, que na redacção do decreto da reforma das secretarias a Commissão de fazenda tomasse em consideração o pagamento dos meios ordenados, e pensões, que antes se pagavão pela folha das secretarias. Foi approvada.

O Sr. Deputado Secretario Felgueiras deu conta da correspondencia, e expediente seguinte.

De um officio do Ministro dos negocios do Reino, remettendo duas consultas da junta da directoria geral dos estudos sobre a creação de cadeiras de primeiras letras, e de latim no concelho de Sousa, e na freguezia de S. Christovão de Muro, concelho da Maia, que se mandou remetter á Commissão de instrucção publica.

De outro do mesmo Ministro, remettendo as indicações da commissão do commercio da villa de Thomar, que se mandou para a Commissão de commercio.

De outro do mesmo Ministro, remettendo os trabalhos da commissão do commercio desta cidade de Lisboa, que se mandarão para a mesma Commissão de commercio.

De um officio do Ministro da marinha, remettendo a parte do registo do porto do dia 26, de que as Cortes ficarão inteiradas.

De um officio do Ministro da guerra, remettendo uma conta do tenente general João Manoel da Silva, governador de Moçambique, que se manejou á Commissão de Ultramar.

De uma representação do governador, e presidente do governo provisorio da ilha de S. Thomé João Baptista da Silva de Lagos, que se mandou remetter ao Governo.

De um officio da junta provisoria do Siará em data de 15 de Janeiro, acompanhando o requerimento do tenente coronel e mais officiaes do batalhão de 1.ª linha, que guarnece aquella provincia, que se mandou para a Commissão de Ultramar.

De duas representações, uma do corpo da officialidade do batalhão de 1.ª linha do Siará, e outra dos officiaes dos differentes corpos milicianos da mesma provincia, pedindo para governador das armas della ao tenente coronel Francisco Xavier Torres, que se mandou para o Governo.

De um officio do governo provisorio da ilha de S. Thomé, em seu nome, e de todos os habitantes daquella ilha, apresentando os seus votos de respeito, e gratidão ao soberano Congresso, participando haver-se prestado o juramento constitucional, e relatando as mais occurrencias politicas: foi ouvido com agrado, e ficarão as Cortes inteiradas.

De um officio do governador general presidente do governo da ilha de S. Thomé, participando, que no dia 9 de Junho se havia ali jurado a Constituição, e relatando tudo quanto posteriormente havia occorrido até á sua data: ficarão as Cortes inteiradas.

De uma conta do mesmo governador general de S. Thomé de 30 de Setembro, participando haver estabelecido duas aulas de arithmetica, geometria, desenho, e francez, que se mandou para a Commissão de Ultramar.

De outro do mesmo governador general, pedindo o despacho de seus serviços, e a approvação das promoções de alguns officiaes, que se mandou para a mesma Commissão de Ultramar.

O Sr. Deputado Corrêa de Seabra apresentou uma representação da camara da villa de Angeja, relativa á mudança do alveo do rio Vouga no sitio do Campo, que se mandou remetter á Commissão de petições.

O Sr. Deputado Barreto Feio apresentou o cathecismo politico para instrucção da mocidade, dedicado ao soberano Congresso nacional por Antonio Rodrigues, commissario do exercito, que se mandou remetter á Commissão de instrucção publica.

O Sr. Ferrão: - Sr. Presidente, apresento uma

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