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DIARIO DAS CORTES GERAES E EXTRAORDINARIAS DA NAÇÃO PORTUGUEZA.

NUM. 72.

Lisboa, 7 de Maio de 1881.

SESSÃO DO DIA 5 DE MAIO.

Leo-se e approvou-se a Acta da Sessão antecedente.

O senhor Secretario Felgueiras apresentou as Cartas de felicitação e prestação de homenagem ás Cortes das Cameras de Melgaço - Sabugal - Alvito - Alpalhão -Lamas de Orelhão, Comarca de Villa Real - Lousan - Peniche - Payo de Pelle - Torrão - Atouguia da Balêa - Fornos, Comarca de Linhares - Soutelo, e Valença de Douro, annexas a de S. João da Pesqueira - das quaes se mandou fazer honrosa menção. = E do Coronel do Regimento de Milicias de Soure, Antonio Joaquim Dias de Azevedo, por si e em nome de todos os individuos do seu Regimento - do Major Commandante do Batalhão de Caçadores N.° 7, José Rodrigues de Lima Nogueira, por si e em nome de todo o Batalhão - que tambem se mandarão honrosamente mencionar. = E dos Conegos meios prebendados e tercenarios de Lamego - dos Officiaes da Correição de Lamego - do Visconde de Sousel - de Antonio Joaquim da Cunha, Juiz de Fora encarregado da visita dos cofres da Provincia do Minho - e do Ex-Juiz de Fora, com predicamento de Correição, Antonio José da Fonceca Mimoso Pereira Guerra - que forão ouvidas com agrado.

O mesmo senhor Secretario deo conta de hum Projecto para creação de hum Registo Nacional, e Archivo geral dos predios e contratos, offerecido por João Nicoláo de Freitas, da praça de Belem, que foi remettido á Commissão do Legislação - e outro de Francisco Simas, pedindo o uso de hum novo laço para o chapéo, como o da amostra, que foi remettido á Commissão das Artes.

O senhor Secretario Freire leo por segunda vez, e mandou-se imprimir para se discutir o seguinte:

PROJECTO.

As Cortes Geraes Extraordinarias e Constituintes da Nação Portugueza, tomando em consideração os arbitrarios emolumentos que os Escrivães encarregados do expediente do Sêllo tem, a seu proveito e damno do Publico, estabelecido, não sendo todavia justo que deixem de ser competentemente remunerados, para que o seu serviço seja prompto e regular, decretão.

1.° Que do seu producto recebão tres por cento, sahindo desta importancia o custo dos livros.

2.° Que outra, alguma despeza se não abone ao Ministro encarregado da sua fiscalisação.

3.° Que nenhum Escrivão possa exigir ou acceitar, a titulo de gratificação, dinheiro algum ás Partes, pena de perdimento de seu Officio.

4.° Que os Corregedores fiscalisem o exacto cumprimento deste Decreto, sendo responsavies pela sua infracção.

A Regencia do Reyno etc.

O mesmo senhor Secretario leo, tambem por segunda vez, o seguinte:

PROJECTO.

Sendo hum ds mais importantes cuidados Soberano Congresso pôr em ordem as rendas do Thesouro Nacional para contribuirem ás suas necessarias despezas, sem o que não pode a Nação fazer progresso; e sendo igualmente certo que sem rendas correspondentes ás necessarias despezas nenhum Reyno, sociedade, ou familia póde existir; porque quando apenas em annos desgraçados se supportão revezes da fortuna, o apojo destes he a esperança de dias venturo-

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sos, e devendo estes agora apparecer, nos indicão que sendo o rendimento do Thesouro Nacional huma deducção sobre os interesses dos homens, ou para melhor dizer huma, collecta sobre o manejo destes, promette na sua influencia todos os meios para engrossar o Thesouro Nacional.

As medidas que se podem applicar ao augmento das rendas, e á satisfação das despegas, dependera do conhecimento do seu actual estado, para cujo fim proponho:

Que se passe ordem á Regencia do Reyno para determinar que as Contadorias Geraes do Thesouro Nacional fechem as Contas auxiliares, e Livro Mestre das rendas e despezas da sua competencia até 31 de Dezembro de 1820, e que quando as tenhão continuado se externem as partidas escripturadas.

Que deste dia em diante principie huma nova escripturação (menos de Caixas que não tem incompatibilidade em seguirem as mesmas) em livros separados, os quaes, supposto devesseis principiar pelo balanço do seu estado antecedente, comtudo, aberta a conta deste balanço geral no Livro Mestre, se vá debitando nella, e abonando aos credores do Estado aquelles alcances que no futuro se forem legalisando pró e contra.

Que para não estorvar o progresso do ajustamento das contas antecedentes com o expediente actual, se faz necessaria esta separação, e até mesmo para constar no futuro qual o empenho do Estado, e quaes as providencias ou utilidades que a Constituição applicou a esteada.

Que das respectivas Contadorias Geraes se remetta a este Soberano Congresso hum orçamento de todas as rendas do Thesouro Nacional, classificadas pelos seus differentes ramos e natureza, com as observações que se poderem fazer em supplemento; e bem assim o orçamento da despeza com as indicadas especificações.

Que havendo difficuldade em produzir este orçamento, com a exacção necessaria, se offereça sem demora por aproximação, e do modo que for possivel.

Foi remettido á Commissão de Fazenda, e

O senhor Borges Carneiro pedio que a esta Commissão se unisse o mesmo Senhor Deputado Moniz; approvado.

O senhor Castello Branco Manoel, propoz a necessidade de providenciar sobre o vinho e aguas-ardentes da Ilha da Madeira.

O senhor Moniz offereceo-se a apresentar huma memoria sobre este assumpto.

O senhor Borges Carneiro, lembrou que, para beneficio da mesma Ilha da Madeira, visto ser fallecido hum dos seus Deputados; Antonio João Rodrigues Garcez, devia mandar-se chamar o seu substituto João José de Freitas e Aragão. Assim se determinou.

O senhor Secretario. - Eu era de parecer que o Congresso nomeasse huma Deputação para hir assistir ás exequias daquelle Deputado.

O senhor Maldonado. - O defunto não era Deputado em Cortes, era elleito: fazia-se preciso verificar-lhe os poderes, e ter prestado juramento para ser Deputado. Pelo que não se póde ter com elle as mesmas contemplações que com qualquer outro Deputado se devião ter (Apoyado, apoyado.)

O senhor Peçanha apresentou, e lêo hum Projecto sobre o preço regulador e taxas do azeite.

O senhor Soares Franco, por parte da Commissão de Saude Publica, lêo o seguinte:

PARECER.

A Commissão de Saude Publica tendo examinado o requerimento dos Negociantes da Villa de Vianna, que pedem remedio aos embaraços que padece o Commercio daquella Terra, em rasão das Visitas do Subdelegado do Fisico-Mór; a respeito do Delegado deste, assim como os 26 Documentos que acompanhão a dita resposta; e tendo já em vista a reforma desta Legislação, prescindindo daquelle requerimento, reconhece dois objectos, differentes em todo este negocio; o primeiro qual tem sido a conducta do Delegado, e Subdelegados deste Juizo, qual a natureza, utilidades, ou prejuisos das Leys que o regulão.

Em quanto a primeira parte, não ha motivo para se accusar o Juiso em geral, porque as licenças sobre aguas-ardentes, licores, a vinagres, importarão nos tres annos de 1818, 1819, e 1830 para o Fisico-Mór em 1:645$ réis e para os Empregados pouco mais de 700$ ditos, como consta da Certidão passada pelo Escrivão da Repartição, N.º 8; vemos mais que os Emolumentos do Fisico-Mór, andão huns annos; nos outros (visto que ás visitas das Boticas são trienaes) por nove mil crusados, como se vê do Documento, e Mappas N: 10; em lugar dos 40 contos, que os Supplicantes allegavão. Mostra-se mais, que os principios de moderação, e de probidade tem dirigido as acções do Delegado do Fisico-Mór neste Reino, porque ha desde o anno de 1811, até 1820, - 301 Réos culpados; e á excepção de 22, nenhum tem culpado no seu livramento; nem contra elles se tem procedido; affirma o Delegado que nesta moderação vai de accordo com as Instrucções particulares que tem do mesmo Fisico-Mór, o qual só deseja que a Ley sirva para amedrentar os culpados, e chama-los á emenda. Por este motivo as condemnações feitas pelos Subdelegados em todo o Reyno nos tres annos proximos passados, importarão pela Certidão N.° 12; sómente em 190$320 réis. Na Cidade de Lisboa, e seu Termo; onde o Delegado faz o serviço pessoalmente, inda não culpou hum só Cirurgião, quando a Ley a todos faz réos, porque todos curão de Medecina; em ultima visita impoz; numa pequena condemnação a hum unico Boticario, como consta da Certidão N.º 12, e apesar disso o melhoramento das Boticas de Lisboa he reconhecido pelos Facultativos da Capital. Na Commissão porém consta por Informações extra-Judiciaes, que alguns Subdelegados nas Provincias não professão a mesma moderação; mas que tem abusado excessivamente da Jurisdicção que lhes foi confiada tanto em Vexações, co-

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mo na exorbitancia dos emulomentos, e por isso ella tem a honra de dar o seu informe sobre a utilidade, ou prejuisos da Legislação, ácerca do Juiso do Fisico-Mór, que era o seu segundo objecto.

A primeira, e fortissima prova da sua injustiça he tirada dos proprios documentos, delles nos consta que ha 301 Réos, contra os quaes não se tem procedido, por motivos de moderação: duas consequencias se tirão, daqui 1.ª que o seu crime fica em aberto, e qualquer outro Delegado que succeder ao actual o póde conseguir, e arrumar de todo; 2.ª que a Ley não se póde pôr em pratica, e he de continuo arbitrariamente modificada pelos .Executores; nada póde haver mais contrario ao Systema Constitucional; a Ley deve ser igual, e obrigatoria para todos, e não dependente da frouxidão, ou da asperesa do Executor; as Leys são para se executarem, e não para amedrontarem os homens.

A segunda prova da injustiça desta Legislação he tiraria do seu objecto; nella nada se trata de Hospitaes, do criação de Expostos, nem de meios de atalhar as epidemias em Portugal, etc. o que deveria ser o principal abjecto da Saude Publica; mas dirige-se toda para os exames de Cirurgiões para Medicos, o que produz dous grandes males; deixarem de ser Cirurgiões, porque nunca mais se applicão a semelhante estudo, e não chegarem, a ser Medicos; porque o exame de hum dia não lhes póde dar os conhecimentos para que não estão habilitados pelos competentes, e penosos estudos.

A terceira prova da sua injustiça he dar ao Fysico-Mór, e seus Delegados huma Jurisdicção contenciosa, com auctoridade de fazer processos, e tirar devassas, o que deve ser huma attribuição privativa do poder Judicial.

Em fim esta Legislação não he justa porque obriga todos os contractadores de agoas ardentes, licores, e vinagres a tirar huma licença annual para venderem estes liquidos com o sopposto fundamento de poder a sua falsificação prejudicar á Saude Publica; como se a licença dada em hum dia (inda quando se fizesse o exame que se não faz) podesse embaraçar a mistura dos ingredientes, que se quizesse praticar no decurso do anno!

Attendendo a tudo o que fica exposto, a Commissão he de parecer, que fiquem suspensas todas as Correições, Visitas, e Licenças feitas pelos Subdelegados do Fysico-Mór, em quanto não se fórma a Ley organica, e Regimento a este respeito, cujo Plano já está traçado, e anda nas mãos dos seus Membros; e que além disso seja livre a venda dos licores, agoas ardentes, e vinagres, sem dependencia de Licença da Saude; mas com a obrigação de poderem ser examinados, pelo methodo que se usa com os outros comestiveis, quando houver denuncia, de que estão compostos, e alterados com ingredientes nocivos.

Paço das Cortes, em 4 de Maio de 1821. - Francisco Soares Franco - Luiz Antonio Rebello da Sylva - Henrique Xavier Baeta.

Foi approvado, ampliando-se a suspensão tambem aos exames, e mandando-se Ordem á Regencia para assim o fazer executar; impor perpetuo silencio aos Processos daquelle Juizo, e recolhellos nos Juizos dos respectivos domicilios.

O senhor Vanzeller apresentou hum Requerimento dos Povos do Termo da Villa de Cantanhede, Comarca de Coimbra, pedindo remedio aos vexames que soffrem em rasão do seu foral, e das Justiças que executão os seus grandes foros. Foi remettido á Commissão de Agricultura.

O senhor Alves do Rio lembrou a necessidade de participar a Sua Magestade os trabalhos do Congresso, e o acolhimento das faustissimas noticias recebidas do Rio de Janeiro, visto que havendo-se já determinado ainda se não tinha posto em execução.

O senhor Barroso. - Eu fui encarregado no dia 10, de accordo com os meus Companheiros, de escrever a Sua Magestade: no dia 13 estava prompta de Carta, entretanto julgou-se mais urgente tratar de outros objectos: successivamente trouxe a Carta sem nunca ter vez de a apresentar: as circunstancias mudárão, e ha huma especie de lacuna em quanto aos successos daquelle tempo até hoje. Parecia-me por tanto que se devia aproveitar aquella Carta, e fazer-se outra referindo os factos novamente acontecidos.

Determinou-se que a apresentasse para ser approvada, e expedir-se, redigindo-se de novo em conformidade dos posteriores acontecimentos.

O senhor Pimentel Maldonado: - Tendo pelo Decreto de 26 de Fevereiro, e factos posteriores mudado inteiramente as relações de Portugal com o Brazil, parece já não ter lugar o que determinámos relativamente ao modo porque se devia receber Sua Magestade, ou qualquer Pessoa da Real Familia no cazo de abicarem á barra de Lisboa, e que nos cumpre organizar hum novo Decreto que regule as solemnidades com que Sua Magestade deverá ser recebido (Apoyado, apoyado.)

Determinou-se que a Commissão da Constituição, ainda com o Senhor Vasconcellos tomasse isto em consideração, e apresentasse o Projecto.

O senhor Pinto de Magalhães offereceo, como additamento ao do Senhor Bastos, o seguinte:

PROJECTO.

As Cortes Geraes Extraordinarias e Constituintes da Nação Portugueza, considerando que a inviolabilidade do sagrado direito da propriedade, já garantida nas Bases da Constituição não póde soffrer restricções, que não sejão indispensavelmente exigidas pela publica felicidade, Decretão.

1.º Ficão geralmente abolidos os privilegios de Aposentadoria activa ou passiva, e revogados todos os regimentos, leys, ou determinações que os estabelecêrão, introduzírão, eu regulárão.

2.° A disposição do paragrafo antecedente fica interinamente suspensa, quanto áquelles privilegios de Aposentadoria, que ou forão estipulados em Tratados com as Potencias Estrangeiras, em quanto solemnemente se não reformarem, ou forão concedidos

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em Contratos Publicos, durante a existencia destes, ou competem a Commerciantes e Artifices, que pelas leys estão obrigados a arruamentos certos, mas sómente dentro dos limites dos seus respectivos arruamentos, e em quanto subsistirem as referidas leys.

Determinou-se que se discutisse junto com o Projecto do senhor Bastos, e ácerca do seu contheudo disse:

O senhor Sarmento. - Eu insto em que se deve dar huma gratificação: servi n'huma Comarca onde não havia Padres Bentos nem Padres de Alcobaça onde hir estar, e por isso era obrigado a levar comigo hum pequeno trem de campanha. Creio que todos os Corregedores poderão tambem arranjar o seu pequeno trem: para isso he preciso huma gratificação, porem não muito grande; e sendo pequena peza pouco a toda a Nação, quando huma requisição peza muito sobre o individuo a quem se faz. Por isso sou de opinião que fique extincto o principio de pedir camas e trastes, e que se estabeleça huma gratificação.

O senhor Bazilio Alberto pôs parte da 2.ª Commissão de Legislação, leo o Decreto para abolir o Juizo da Inconfidencia, que foi approvado com a emenda de ser os Processos remettidos para as Varas da Correição do Crime da Corte, e assim se mandou expedir - Outro das aposentadorias aos Ministros, que foi remettido á mesma Commissão para de novo o redigir por se duvidar de parte da sua doutrina - E outro dos Recursos á Coroa, ácerca do qual disse

O senhor Borges Carneiro. - A base do Decreto está contra o que se resolveo: resolveo-se que os Recursos devião seguir a marcha ordinaria dos Aggravos, e que o Juiz Ecclesiastico seria logo obrigado a cumprir a primeira Carta. Isto he como se determinou, e he como deve ser redigido o Decreto.

O senhor Fernandes Thomaz. - O que se resolveo, e propôz foi unicamente em quanto á falta de cumprimento do Juiz Ecclesiastico á primeira Carta. Em se decretando isto, não he preciso mais nada: a pratica actual do Processo dos Recursos em quanto ao mais está muito regular.

O senhor Correa de Seabra. - A Commissão, quando na formação deste Decreto deixou lugar a este segundo Recurso ou Aggravo, teve em vista o que se pratica nos Juizos Seculares, em que não cumprindo o Juiz inferior a Sentença de desaggravo, se torna a aggravar disso mesmo, por o Superior. E o não ser este segundo Aggravo para o mesmo Juiz da Coroa, e sim para a Mesa grande de Aggravos, foi 1.° em attenção a tomar-se alli mais promptamente o Assento que até agora se tomava no Desembargo do Paço, e ter esta consideração com os usos antigas do Reino; tendo mostrado a experiencia que a cada passo se julgava naquelle Tribunal serem as Cartas Rogatorias mal passadas; 9.° Na lembrança de que reduzido atégora o Foro Ecclesiastico só ás causas Ecclesiasticas, havia mais necessidade do que taes Recursos não fossem definitivamente decididos em hum só Juizo, e da primeira vez para dar mais lugar a serem ponderados os motivos que tivesse o Juiz Ecclesiastico, ou o Prelado no seu procedimento.

Foi mandado redigir de novo em conformidade do que se havia resolvido, e estava lavrado na Acta.

O senhor Secretario Felgueiras lêo tres Officios do Ministro Secretario de Estado dos Negocios do Reyno: 1.° enviando Copia da Carta e Instrucções de 2 de Abril de 1806, dirigida a Camara de Moncorvo para occorrer aos damnos que os rios Sabor, o Villariça causa no campo do mesmo nome, e foi remettido á Commissão de Agricultura: 2.º enviando o Requerimento de alguns Cidadãos para creação de huma Sociedade Patriotica, por não competir á Regencia, e foi remettido á Commissão da Constituição: 3.º enviando o Regulamento da Salarios dos Magistrados e Officiaes de Justiça, feito pelo Superintendente da Agricultura Alberto Carlos de Menezes, que existia na Meza do Dezembargo do Paço, e foi remettido á Commissão de Legislação.

O senhor Barroso, por parte da Commissão das Petições apresentou hum Requerimento dos Homens de negocio da Cidade do Porto, dizendo que se lhe não dera direcção por não vir assignado, mas que por sua materia o julgava digno de apresentar-se ao Soberano Congresso. Foi remettido á Commissão do Commercio.

O senhor Secretario Freire leo a seguinte:

Relação nominal dos Requerimentos.

Joaquim Antonio Leal.
Antonio Cordeiro.
Joaquim José de Santa Anna.
José Francisco Martins Romão.
Antonio Ferreira.
Manoel Carneiro Faia.
João Marques Neto.
Henrique Nunes.
Manoel Martins da Rua.
Francisco Luiz da Silva.
Manoel José Pereira, e outros.
Manoel Martins da Rua Viana.
D. Maria Izabel de Faria.
Habitantes da Chamusca e Ulme.
Manoel Ferreira.
Domingos Affonso Barreiros, e outros.
Antonio Dionisio Gonzaga.
Francisco da Silva.

A' Regencia.

Alvaro Antonio de Azevedo Bravo.
D. Anna Maria Francisco.

A' Commissão Ecclesiastica.

Herdeiros de José de Araujo Braga.
João Nepomuceno da Silveira.

A' Commissão de Legislação.

Negociantes da Praça de Lisboa.

A' Commissão do Commercio.

Francisco José da Silva Rego.
Gregorio José de Noronha.

A' Commissão de Fazenda.

Reitor, e Collegiaes de S. Pedro da Universidade.
Os Pays, e chefes de familia do Conselho de Entre Homem e Cavado.

A' Commissão de Instrucção Publica e Legislação.

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O mesmo senhor Secretario lêo por segunda vez o Projecto do Senhor Borges Carneiro para abolir o uso das Rubricas, e Tenções em latim, sobre o que disse:

O senhor Sarmento. - Conhecendo as minhas poucas forças, e a habilidade que exige a arte de escrever opitaphios, não me opponho ao Projecto. Eu não querer a assistir ao enterro da lingua latina, á morta: sou hoje de opinião que as Tenções se escrevão em Portuguez para não tornarmos a ler = de Stachis non cura = e outras sentenças latinas, cuja barbaridade excede o que os seculos da adulteração da lingua latina produzirão.

O senhor Borges Carneiro. - Parece-me que em quanto á primeira parte a minha proposta deve ser approvada, quanto á segunda pouco importa que siga a marcha ordinaria.

Foi o Projecto unanimemente approvado e remettido á Commissão para redigir o Decreto.

Fez-se a chamada nominal, e achou-se faltarem os senhores = Ferreira de Sousa - Brotero - Braamcamp - Pereira da Sylva - Guerreiro - Rosa - Borges - Castro e Abreu - Izidoro José dos Santos - Rebello da Silva = e estarem presentes 89 dos senhores Deputados.

Seguio-se a Ordem do dia: e decorrendo duvida sobre o ponto por que deveria começar a discussão, resolveo-se que pela continuação da Ley sobre a Liberdade de Imprensa, e que este mesmo assumpto occupasse não só o tempo Ordinario das Sessões, senão tambem o de sua prololigação, até se ultimar, por tanta que he a sua necessidade; e tão sómente exceptuando os dias determinados para debater os negocios da Fazenda, e os Pareceres das Commissões.

Aberta a discussão, disse:

O senhor Sarmento. - Creio que se trata dos Jurados: eu tinha que propor huma circunstancia que não está ainda tratada, por ser materia alhea do nosso Direito Portuguez, e vem a ser: quando qualquer Escriptor estrangeiro for accusado, qual deverá ser a composição dos Jurados? Huma das Ley e mais notaveis da Inglaterra he a Ley dos Jurados, que manda que quando qualquer estrangeiro for accusado tenha lugar o Juizo de medietate linguas, que vem a ser ametade dos Jurados composta de estrangeiros. Proponho que seria conveniente admittir-se em Portugal este principio: elle he fundado hum principio de liberdade, e como elles se estão a admittir em toda a sua extensão, eu quereria que tomássemos tambem por principio, que para julgar hum Escriptor estrangeiro, o Jurado seja composto de Estrangeiros e Nacionaes.

O senhor Peçanha. - Não tem lugar nenhum o que diz o Senhor Sarmento: era preciso que os Estrangeiros tivessem Eleitores de Comarcas. Por tanto parece inadmissivel a proposta, á vista do Plano que se tomou por base para as eleições.

O senhor Borges Carneiro. - Parece mesmo inconveniente: os Estrangeiros subjeitem-se ás Leis do Paiz em que estão. Si Romae fueris, Romano vivito more.

O senhor Sarmento. - Nós estamos tratando não de jure constitudo, mas de jure constituendo. Os nossos Reys Portuguezes forno tão liberaes com os Mouros e Judeos que estes tinhão Juizes proprios. Creio que a Nação presentemente não deverá dedignar-se de admittir pura os Estrangeiros hum Jurado composto de Estrangeiros, parece que se deve receber este principio em hum a Nação onde a Liberdade Civil existe no seu maior esplendor. No tempo dos nossos Affonsos e Dinizes, os Mouros e Judeos tinhão Juizes proprios, nós não devemos mostrar que somos filhos degenerados de tão bons Pays.

O senhor Xavier Monteiro disse, que não ha meio algum de satisfazer aquella opinião, por quanto na Inglaterra a eleição dos Jurados he muito facil, visto ser feita pelo Sheriff, o qual a póde repelir sem incommodo; é entre nós, como o methodo he differente, e mais complicado, não póde haver hum Jurado especial para os Estrangeiros.

O senhor Sousa Magalhães. - O Foro natural he o Foro de domicilio: por consequencia deve estabelecer-se em regra paia estos causas o Foro de domicilio. Está na vontade e prudencia do Auctbr o saber primeiro quem quer demandar. He no frontispicio da obra vem indicado o nome de seu Auctor, o Accusador o vai procurar e demandallo ha Terra onde ha Jurados por sua residencia é domicilio: e se não vem do impresso o nome do Auctor, então tem de requerer contra o impressor, e vai ao Foro deste; depois pela pronuncia he que se sabe quem fica responsavel por aquella obra, e convencido da violação da Ley; porque depois da pronuncia o Juiz proprio da Terra entra na indagação, chama o Impressor, este mostra o Editor, e o Editor mostra o Auctor.

O senhor Soares Franco. - Não acho bom o que diz o Illustre Preopinante. He necessario saber que em Hespanha este Foro dos Jurados tem caindo, em grande descredito, porque os Juizes de facto são homens pouco intelligentes... (havia lacuna), e este estabelecimento exige não só quem saiba ler, mas quem saiba entender he necessario muita intelligencia, quando não desacredita-se o Juizo.

O senhor Serpa Machado. - Eu sou de parecer que se deve preferir o Foro... (havia grande lacuna). A respeito dos abusos da Liberdade de Imprensa he mais facil o achar provas onde se commetteo o delicto, do que em hum lugar mais remoto; neste Juizo não se guardão todos os rigores do Juizo Criminal, como se vê do Plano que vai começar-se á desinvolver; por tanto não he muito que nós escolhamos para Juizo o Foro do lugar do delicto.

O senhor Sousa Magalhães. - Peço licença para responder. Diz-se que no Juizo do Domicilio nem sempre os Jurados são tão capazes, como naquellas Capitães onde ha Imprensa: serios sabemos de antera ao que não póde haver Jurados capazes senão naquellas Capitaes onde ha Imprensas, então fomos iniquos quando estabelecemos o Juizo dos Jurados fora das terras onde ha imprensa; mas huma vez que nós já julgámos que podia haver hum numero sufficiente de homens capazes para julgar ainda mesmo nas Capitães aonde não ha Imprensa, agora somos contradictorios; e mostramos que fomos inconsiderados; se-

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gundo aquelle methodo dá grandissimo incommodo aos auctores. Qualquer homem que do fundo de huma Provincia mandou imprimir a Lisboa huma obra, terá depois disso de vir á Capital para responder? neste caso não quererião escrever, antes do que subjeitar-se na duvida ao incommodo de andar muitas legoas. Accrescenta o senhor Serpa que he cumulativa a jurisdicção. Assim he, por motivos particulares que não existem na Liberdade da Imprensa: o motivo particular he que no lugar onde o delicto foi commettido ha rasões para adquirir as provas desse delicto; isto não milita a respeito da Liberdade da Imprensa, porque o Corpo de delicto he a mesma obra; por esta sabe-se quem he o Auctor, e se não se sabe, o Impressor deve declarar o Editor, e este mostra quem he o Auctor; por isso parece-me que estão resolvidas as objecções do senhor Soares e Serpa.

O senhor Peçanha. - Conformo-me com o Illustre Preopinante: só tenho de accrescentar, que no caso, por exemplo, que o Reo escrevesse o seu Livro em Tras-os-Montes, e o mandasse imprimir a Lisboa, se não admitta que o Foro do Delicio seja em lugar da impressão; só se se quizer admittir o principio de que hum homem poderá commetter hum delicto n'huma parte em que não esteve.

O senhor Miranda. - Relativamente a este objecto, eu tinha de reflectir, que estes crimes estavão em circunstancias muito diversas; porque nos outros delictos a parte mais difficil he a contestação do Corpo de Delicto, e neste a mesma obra he o Corpo de Delicto: se admittirmos o principio do senhor Soares, de que serve o Projecto de que estamos tratando? Se nas Provincias não ha homens capazes para que estabelecemos Jurados nas Provincias? De mais, o Réo a confiança que tem he nos seus Juizes, e tem a faculdade de rejeitar para isto he necessario que o Reo tenha conhecimento dos Juizes: não sabendo se elles estão por certas opiniões que são admissiveis, não os conhecendo, e não tendo confiança nelles, não póde confiar na Justiça das suas decisões; por isso eu serei sempre de opinião que os Reos por abuso da liberdade de Imprensa devem ser julgados no lugar do seu domicilio.

O senhor Sarmento. - A respeito do Foro, faço differença entre o Homem Publico, e o Homem Particular: o Homem Publico sou de opinião que seja obrigado a seguir o Foro do Reo, mas o Homem Particular acho que elle o possa chamar ao lugar do seu domicilio.

O senhor Serpa Machado. - Continuo a sustentar a minha opinião. As rasões que se acabão de ponderar parece-me não terem muita força: o officio do Juis relativamente aos Jurados não versa sobre o escripto, mas sobre o Auctor. O Auctor mais visivel he o Editor, por consequencia estabelecendo-se que o Juiso dos Jurados seja a Foro do delicto, mais facilmente se poderá averiguar quem he seu Auctor. O inconveniente de chamar para o domicilio affastado do delicto he o mesmo inconveniente que acho em o Editor declarar quem foi o Auctor do Impresso: esse inconveniente tem o de ser chamado ao domicilio do mesmo Reo: alli ha dons Reos, hum he o Editor; por consequencia quando se estabeleça, o lugar do Foro do Delicto, tem-se attenção ao Editor. A outra observação entre os delictos e accusações contra os homens publicos, não deve ter lugar; porque a Jurisprudencia relativamente as... (outra lacuna) estas ficarão subjeitas á regularidade das Leys, porque cada hum tem direito de vindicar a injuria que se lhe fez, tem sempre direito de se defender; por consequencia como todas os Leys que tomos estabelecido a respeito da Liberdade da Imprensa sempre salvão a injuria particular, a minha opinião he que o Juiso dos Jurados seja a Foco do delicto, e não o Foro do domicilio.

O senhor Miranda. - Ainda tenho que responder ao Illustre Preopinante no que diz relativamente ao Impressor. Este não he preciso que vá ao Conselho dos Jurados onde se trata do delicto porque... (não ouvi - diz o Tachygrapho Machado) O que diz o senhor Sarmento, sobre fazer distincção entre o Homem Publico, e o Homem Particular, jamais a poderei admittir.

O senhor Castello Branco. - Os que opinão contra o juizo proprio do réo, querem que seja no lugar onde se commetteo o delicto; e os que opinão contra, querendo que esse mesmo delicto seja julgado no domicilio do réo, ambos se fundão em muito fortes rasões; porque de ambos resulta tão graves inconvenientes, e escuso repetillos de novo. Portanto parece que o que se deve tratar actualmente, he procurar hum meio termo que concilie as difficuldades de huma e outra parte. Este parece, a meu ver, que he facil de achar, depois da resolução que a Assemblea tem tomado, ou parece inclinada a tomar, de que não haja Jurados só nas Capitães das Provincias, e que estes Jurados se multipliquem ou para todas as Comarcas, ou naquellas que se julgar conveniente. Então parece que o Juizo do réo não deve ser, nem no lugar da Imprensa, nem no lugar do domicilio, e que deverá ser na Terra mais proxima ao domicilio do réo, em que houverem Jurados. Este he o meio de conciliar as difficuldades de hum e outro partido. Não se causa grave incommodo ao réo, porque he natural que o lugar do domicilio não seja demasiadamente distante do outro lugar onde he o estabelecimento dos Jurados.

O senhor Margiochi. - Eu tambem sou de parecer que o Juizo dos Jurados que ha de julgar o accusado dos abusos da liberdade da imprensa seja o do seu distincto ou domicilio, e que o accusador seja obrigado a hir alli; de maneira que seja sempre favorecido neste caso (visto querer-se favorecer a liberdade da imprensa) o accusado antes do que o accusador.

O senhor Presidente, a final da discussão, propoz:

1.º Em que lugar o Escriptor, Editor, ou Vendedor, de qualquer escripto, que delinquir por abusos da liberdade de imprensa deve ser julgado, se no Foro onde commetteo o delicto, ou no Foro do seu domicilio? e decidio-se unanimemente que no do seu domicilio.

2.° Se esta regra deve ter excepção em caso de

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libellos famosos contra pessoas publicas, ou particulares no respectivo ás acções da vida particular de cada hum, ficando livre ao injuriado demandar o injuriante no seu Foro, ou no delle injuriado? decidio-se que sim, e que lhe ficava livre a escolha sómente destes dous Foros.

Seguio-se a discussão do Projecto dos Regulares, e logo:

O senhor Ferrão. - Peço a palavra. O illustre Deputado o senhor Borges Carneiro quando propoz no primeiro artigo deste Projecto o prohibir provisionalmente as admissões dos Noviços e Profissões dos que não tiverem mais de seis mezes de Noviciado; e no segundo promover as Secularizações de todos os Religiosos Professos que quizerem sahir dos Conventos das suas respectivas Ordens, e auxiliallos imperando por conta do Estado Breve da Sé Apostolica, que em vista sem duvida reduzir as Ordens, ao menor numero possivel de Religiosos, e até extinguillas sem violencia. Eu persuadi-me, sendo nos mesmos sentimentos do illustre Deputado, que não era bastante este projecto para se conseguir este fim; e julgando eu que elle se poderia alcançar sem aquietar o pequeno numero de Noviços que presentemente existem em todos os Noviciados, e desgostar seus Pays que fizerão despesas na entrada, que ficão perdidas, tendo obtido as licenças Regias; vendo malograda a educação de seus filhos que dedicavão ao Estado Ecclesiastico: vendo eu mais alem disto, ser manifestamente injusto que se permitta a Profissão aos que tem seis mezes de Noviciado, e se denegue aos que tem cinco, quando o direito he igual entre, o que tem seis mezes e o que tem hum dia; pareceo-me substituir ao primeiro artigo os dous artigos do primeiro additamento, prohibindo no primeiro todas as admissões a Ordens a todos os que não se acharem já constituidos em Ordens Sacras; e no segundo prohibir todas as accertações para o Estado Monastico em todos os Conventos de hum e outro sexo, em quanto as Cortes não decidirem sobre esta materia. É porque o segundo artigo do Projecto do mesmo illustre Deputado permitte a Secularização e a protege impetrando-se pelo Governo Bulla da Se Apostolica, tambem me não pareceo bastante; porque para hum Frade se Secularizar não basta que haja licença Pontificia, e que esta se lhe consiga pelo Estado, he necessario alem disto que hum Bispo acceite o Religioso na sua obediencia, e he preciso que o Religioso tenha Patrimonio; porque de outra sorte não póde desfiadar-se. Por tanto eu accrescentei no segundo additamento mais dous artigos: no primeiro proponho, que os Ordinarios da naturalidade ou residencia do Religioso, sejão obrigados a acceitallos debaixo da sua obediencia. No segundo que os Conventos Monachaes, e os que tem rendas proprias dêem patrimonio aos egressos (o que já alguns practicão e entre elles os Conegos Regrantes, segundo tenho ouvido.) E quanto aos Mendicantes que sejão preferidos aos Beneficios que vacarem de Cura de Almas. E finalmente no terceiro artigo restituo aos regressos os direitos civicos que já se achão Decretados por este Augusto Congresso depois do meu projecto) como hum grande atractivo para a Secularização; e para não tornarem a entrar os egressos nas Ordens que abandonarão, vendo que não podião testar. São estes os meios que me parecião necessarios para poder promover as Secularizações. Quanto porém aos Noviços que se achão nos Noviciados, eu sou de parecer que devem professar aquelles que por sua livre e espontanea vontade o quizerem fazer: por estas rasões. Nós proclamámos a Religião Catholica Apostolica Romana, e esta tem necessidade de Ministros do Culto, em proporção ás quatro mil trezentas e tantas Freguezias que existem, no Reyno. Suppondo pois, que os Noviços tem hoje 16 annos, daqui a oito, em que chegão á idade requerida para Presbyteros, já teremos necessidade de Parochos, e por tanto devem professar para serem educados nos Conventos, julgando-se como Seminaristas! Nós sabemos que a maior parte dos Bispados não tem Seminarios: e alguns dos que as tem não ha nelles a maior regularidade, não tem Mestres, nem Livrarias, como tem os Conventos: serão por tanto mais completos, mais habeis, mais bem instruidos, e até se ordenão com menos trabalho e despesa sendo professos, o que não acontece com os Ordinandos Seculares que tem grandes incommodos e despesas em habilitações, exercicios, e jornadas para se ordenarem nos seus Bispados; e até muitos vão entrar nas Religiões com o fim de se ordenar, e logo que tomão a Orcem do Presbyterio, immediamente se Secularizão. A em disto os Pays que metterão seus Filhos no Noviciado fizerão despesas, e esta parece ser outra rasão para que professem aquelles que tiverem vocação, por que os outros que a não tiveram devem sahir. Quanto ás Religiosas (segundo o illustre Deputado o senhor Gyrão, como advogado do bello sexo, tem opinado) eu tambem direi a favor deste que as Religiosas não devem professar com violencia, porque isso seria uma barbaridade; mas eu acho injusto que não professe aquella que tem vocação, ou abborrecimento ao Mundo. Ora huma mulher póde ter vocação ou abborrecimento ao Mundo quando chega a huma idade em que conhece o que he o Mundo: esta idade parece-me a mim que deve ser a de 36 annos, em que toma as pessoas tem conhecido o que elle he. São por tanto estas as ideas que submetto ao exame do Augusto Congresso para serem discutidas, e decretar-se o que for mais justo. Ha huma terceira addição do illustre Deputado o senhor Pimentel Maldonado relativa á Ordem de Malta, que tambem já está decidida.

O senhor Gyrão. - Eu fallei hum destes dias em favor do Bello Sexo; agora expenderei as minhas ideas o melhor que puder = O senhor Presidente = A' Ordemm não tem lugar por ora, deve discutir o que quiser no N.º 16 = o Orador proseguio) Pois este he o N.° 16, e folio da materia que trata o preambulo, e o artigo 1.° (o senhor Presidente = he verdade, póde continuar) Pois bem: trata-se dos Regulares de hum e outro Sexo, eu só fallarei das Religiosas, e a minha opinião he que a rasão, a justiça, e as luzes do Seculo nos gritão que protejamos hum Sexo Bello, e fraco, que até aqui tem sido barbaramente tratado, sendo victima lentas vezes

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dos humanos caprichos, de inveterados prejuisos, e sobre tudo, da ambição das Familias. Nunca, pude ver sem magoa, que hum Pay egoista ou imprudente, levasse huma Filha por engano, ou por força ao precipicio de fazer hum voto indiscreto, n'huma idade em que nada se considera, e que tolhe para sempre a liberdade. Quantas infelizes no interior desses escuros claustros, passão huma da melancholica alternada de lagrymas e desesperação! - Ah! Senhores o habito pode muito; mas nunca faz perder o amor da liberdade. - Quem póde duvidar que a seducção, e a violencia tem enchido os conventos dessas desgraçadas, que agora a necessidade, e a honra obrigar, huma affectada designação? Feche-se a porta a annos males, e prescrevão-se barbaros costumes, deixemos em partilha a escravos Turcos prender em ferros o mimo da Natureza; mas nós que somos livres, que somos liberaes, não consintamos entre nós, que se abafe a votada rasão, que se atropelle a justiça, e que se prenda sem culpa huma jovem donzella, capeando tal barbaridade com o nome de estado perfeito, e devota vocação. Torno a dizer: sempre vi com magoa, que hum Pay leve á prisão huma innocente filha, ás vezes a mais carinhosa, a mais desvelada para com elle, e que pertendendo abrandar sua dureza, lhe seja a mão, lavada em pranto; a mão que devendo amparalla e protegella, emprega a força e os rigores para arrastalla ao sepulchro dos vivos! Não, a mim não me fascinão os quadros poeticos de Chateaubriand, abrilhantados com o verniz de sua eloquencia: debalde, para mim elle faz o elogio dos Conventos no seu Genio do Christianismo; antes pelo contrario, reputo extravagante o contraste que elle, achou dos perigos do mar, com a tranquillidade do Claustro: se elle ama a tranquillidade desta natureza, maior ainda a encontrará nos sepulchros. Concluo pois o meu discurso, por não mortificar este respeitavel Congresso, que o meu voto o qual sustentarei com todas as minhas forças, he que se não permitte mais a profissão de huma só Freira.

O senhor Borges Carneiro. - Eu penso que não nos devemos limitar a discorrer sobre os annos de profissão. No Concilio de Trento foi debatida esta questão fortemente, e declarárão-se os 16 annos completos como idade apta para a profissão religiosa; por tanto este objecto pertenceria á auctoridade ecclesiastica, e nada direi sobre elle: vamos ao artigo. Depois da publicação deste Decreto já não podião ser admittidos mais Noviços, hontem porém tive eu informação de que os Capuchos do Alemtejo por hum dolo e malicia recebei ao quarenta Noviços, os Domenicos só ao Convento de Elvas quinze Noviços, e outros que estão com licença para professar. Não sei se os Breves tem tido Beneplacito da Regencia: se o não tem tido devem sahir, e se a Regencia lhe deo o Beneplacito não fez bem. O meu voto pois he, que estes que forão recebidos com dolo Noviços não professos, devem sahir; que lhes deve ser restituido o dinheiro que derão, á excepção das comedorias, que devem ser pagas aos Conventos; e em quanto ao prazo certo, eu julgo que deverá ser do primeiro de Janeiro em diante.

O senhor Sarmento. - Apoyo o parecer do Illustre Preopinante: e contrahindo as minhas ideas á doutrina do primeiro artigo, sou de parecer que não se admitta profissão nenhuma. Creio que a Commissão Ecclesiastica está encarregada de Fazer o plano da reforma das Ordens Monasticas, mas isto vai a complicar esta reforma. Quanto á necessidade da Igreja eu direi que a Igreja muito tempo se servio com Bispos, Presbyteros, Diaconos, e Subdiaconos, sem ser preciso votos Monasticos; e quando se admittão Religiosos, deverá haver hum numero limitado de cada Ordem, e daquellas Ordens que se julgarem necessarias para a prosperidade das Sciencias, e cultura dos conhecimentos divinos: por isso sou de opinião que fique prohibida toda a admissão dos Noviços a professar. A respeito do que disse o senhor Borges Carneiro de restituir aos Conventos as comedorias, tambem me parecia que ficassem esses arranjamentos como objecto particular dos superiores das corporações, e das familias dos Noviços.

O senhor Ferrão. - Eu pergunto ao Soberano Congresso se se prohibem Ordenações Seculares? e digo, que a prohibirem-se, não deve prohibir-se aos Noviços que estão no Noviciado o professar: são Seminaristas, e como taes se devem contemplar.

O senhor Trigoso. - Póde considerar-se este projecto de Decreto debaixo de diversos pontos de vista: primeiramente he util que continuem as Congregações Religiosas? parece deduzir-se do preambulo que a sua continuação póde ser util, mas devem ser reduzidas estas Congregações, e o numero de seus individuos, de tal maneira que não sejão pesadas á lavoura e industria; ou ao contrario devem subsistir as Congregações como estão até ao ponto de se extinguirem os seus individuos. Tudo são questões differentes, e em quanto se não assentar no verdadeiros espirito deste Decreto, não se póde assentar na opinião verdadeira ácerca do modo porque se hão de reformar. Diz o preambulo (lêo) mas tambem he preciso reduzir estes Conventos a tal numero que possão ser uteis aos povos, porque das Ordens Regulares sempre se deve esperar que os povos tirem alguma utilidade e se a não tirão então era escusado que ficassem essas Ordens Regulares. Suppondo pois que ellas produzem alguma utilidade publica, o que sendo muito multiplicadas podem causar incommodo á lavoura e industria, parece que a primeira cousa que deverá fazer-se será regular o numero dos Conventos, e o numero dos membros de cada Convento, de tal maneira que não fizesse incommodo á lavoura e industria: eis o ponto de vista em que considero esta questão. Consideradas as Cortes em quanto ao futuro, desejaria que se procedesse a huns arbitrio, ou a huma Consulta feita pelo Tribunal competente, em que se determinasse ou propuzesse quaes são as terras em que se necessitava haver Conventos se em que erão uteis, e qual o numero de individuos que deveria ter cada Convento; que reduzido este numero de Conventos, e individuos, se não pudessem estabelecer mais Conventos, nem mais Individuos; e admittido isto então era escusado por huma parte facilitar a sabida dos Regulares, por outra permittir a sua entrada além

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do numero que fosse estabelecido. Por tanto, em quanto isso se não faz, deve subsistir a prohibição da admissão dos Noviços, a qual já foi determinada por este Congresso; e em quanto á segunda parte, os Noviços que entrarão nas Ordens Regulares não se póde dizer que entrarão com dolo e malicia, porque não se póde provar que seja contra o Sistema Constitucional o systema das Ordens Regulares, aliás ter-se-ha feito hum Decreto para serem, abolidas. Se não he contra o Systema Constitucional a existencia das Ordens Regulares, não vejo nisto nem malicia nem dolo, ao contrario vejo que elles entrarão em hum estabelecimento publico em que era permittida a sua admissão pelas Leys existentes. Se com effeito algum Noviço professor antes do tempo competente com auctoridade legitima, e Beneplacito Regio, a profissão está valida: se professou com Breve, e não teve Beneplacito, he nulla a profissão; mas os Noviços que professarão com tempo competente, ou com dispensa Apostolica e Beneplacito Regio, e os que mais estão no Noviciado, se estão constrangidos, não he preciso Ley que lhe faculte a sabida, e se não estão constrangidos não podem ser obrigados a sahir; porque elles tinhão a liberdade pelas Leys existentes de escolher aquelle modo de vida: por isso não póde determinar-se senão o continuar a prohibição de acceitar Noviços, em quanto se não fixar o numero certo de Conventos, e individuos certos de cada Convento, o que se deve fazer logo.

O senhor Bazilio Alberto. - Eu sigo justamente a opinião do senhor Trigoso, e tambem julgo que não devem ser os Noviços obrigados a sahir para fora dos Conventos. Suppõe-se que os Noviços estão violentados, mas isto he huma supposição voluntaria: considere-se muito embora esta violencia pela necessidade das circunstancias que os fizerão entrar; mas em os excluir vai-se-he, fazer maior violencia: hum filho mais velho que estava senhor de Morgados, e Prazos... (havia grande lacuna), prefere nestas circunstancias hir para hum Convento. Se não se extinguissem primeiro os Morgados e Prazos, e se fizesse que hum homem tal entrasse na sua legitima, muito embora se fizesse sahir... (outra lacuna), por isso longe de lhe fazer beneficio, faz-se hum mal. Nós tratando de abolir qualquer instituição, cuidamos da existencia dos Empregados: mas vamos abolir aquelle modo de vida, e não lhe damos outro; porque os embaraços que tinhão para entrar são os mesmos que tem quando sahem: se entrou qualquer para huma Religião porque não tinha estabelecimento sufficiente, sahindo, e não o tendo, longe de se lhe fazer beneficio, faz-se-lhe violencia... (Este senhor Deputado ficou muito longe da minha meza, e só puderão chegar aos meu ouvidos os pensamentos que aqui vão escriptos - palavras do Tachygrapho.)

O senhor Borges Carneiro. - Eu não sou inimigo das Ordens Religiosas, nem digo que sejão contrarias ao systema Constitucional, e tanto que no preambulo se não toma este principio como fundamento do Decreto. Todo o Mundo sabe que ellas não são necessarias para a Igreja: agora dizer que são contrarias ao systema Constitucional, a minha opinião não he essa. Hum dos Illustres Preopinantes disse, que este primeiro artigo era superfluo, por isso, que devia começar a fazer-se hum orçamento sobre o numero dos Conventos. O que a mim me parece he que desde já devem atalhar-se os grandes malles que resultão do grande numero de Conventos: hum numero excessivo de Conventos he gravoso ao Estado, e á Lavoura: isto he que eu digo que he contrario ao systema Constitucional, e isto he que eu julgo contrario á felicidade da Nação. Evora tem 28 Conventos: Coimbra que he toda de Conventos, não sei para que sejão necessaios: isto he sem duvida gravoso á Lavoura, porque todos aquelles homens que habitão os Conventos sustentão-se, e vivem do suor do Lavrador, do Artista, e do Commerciante: as, terras pequenas vejo-as chêas de Conventos, e isto, sem duvida he inconstitucional: a multidão delles dizem que he para auxiliar os Parochos, que estão a louvar a Deos e a pedir por nós; eu cá pedirei por mim, é cuido que todos tambem pedirão a Deos cada hum segundo ás suas necessidades, e destro da sua casa: esta he a Doutrina do Evangelho mim in cubiculum, et ora patrem trum, in abscondito, et Dominus in abscondito reddet tibi. Por tanto eu combino que se deve fazer a reforma geral, vendo-se as terras em que devem ser estabelecidos os Conventos, por isso punha a palavra provisionalmente. Quanto á segunda parte que não deverá lançar-se nenhum fora, eu quando disse que elles tinhão entrado com dolo, sempre suppuz que este não era da parte dos Noviços, mas da parte de seus Pays, é foi tambem, dolo da parte dos Provinciaes que os acceitárão: e dolo essa que faltei era demonstrativa e hão taxativamente. A razão que se toma he da causa publica, porque he preciso reduzir o numero dos Frades: elles são gravosos á Lavoura, e pesão ao Estado; por tanto segue-se que aquelles que entrarão, ou entrassem com dolo dos Pays ou sem elle, devem sahir: a difficuldade esta em classificallos, e por isso se não parecer que sejão todos devem ao menos sahir estes ultimos.

O senhor Bispo de Beja. - Não ha rasão nenhuma para que os Noviços que se achão nos Conventos, sejão obrigados a sahir delles, sem serem admittidos á Profissão. Os Noviços já senão reputão Seculares, já se reputão como Religiosos, em quanto aos effeitos; já tem seus Privilegios, como o Privilegio de Canon; em fim não se podem julgar como Seculares. Pede pois a justiça, e pede a humanidade, que se deixem Professar. Ora lá causa alguma estranhesa o ver as Cidades inundadas de homens occiosos que não pertencem á classe productora, mas consumidora he não se olhar para elles; e que se esteja olhando para 70, ou 80 Noviços que se achão no Noviciado, julgando a existencia destes, passando a Religiosos, como nociva á lavoura, e industria!

O senhor Ferrão. - Os Noviços que estão no Noviciado, todos entrarão regularmente, os Provinciaes não admittirão Noviço algum sem ordem da Mesa ao Melhoramento; por tanto os que professão tem huma Profissão regularissima, e a respeito de

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dolo de Pais, deve-se dizer que a Mesa do Melhoramento manda expedir Ordens aos Bispos, e estes mandão ouvir sobre isto aquelles que querem ser Religiosos; por isso fazem-se certas deligencias, entre estas são perguntados se então por sua vontade, se vão constrangidos, e depois destas deligencias, e informada a Mesa do Melhoramento, vendo esta que está nos termos de se defirir o Requerimento em que pedem ser admittidos, he que lhe differe. Por tanto a maior parte dos Noviços estão por sua vontade, e outros he porque tem hum titulo para se Ordenarem com menos despesas, e incommodos, huma vez que entrão nos Ordens Religiosas, porque lá estudão, e se sustentão á custa da Ordem, e por fim Ordenando-se de Presbyteros, logo se Secularisavão. Não ha pois dólo nenhum da parte dos Pais, porque precedem as dilligencias que acabei de dizer.

O Senhor Castello Branco. - Que as Ordens Regulares devão existir, que se reformem, que soja outro o seu Instituto são questões que não vem para aqui. A respeito da materia que se trata limito-me unicamente á questão, se hão de professar, ou ser obrigados a sahir os Noviços que actualmente existir nos Conventos de hum, e outro Sexo. Ha dous principios de que ninguem póde duvidar: que o numero de Regulares entre nós, relativamente á nossa População, he demasiado; por consequencia seria hum bem, se elle se diminuisse. Para o diante não se póde determinar hum tão grande abuso. Ha outro principio de que tambem ninguem póde duvidar: coma sé deverá concorrer para que os rapazes de 17 annos, e huma rapariga de igual idade vão ligar-se por toda a sua vida, quando o homem he variavel, e inconstante por natureza, quando o homem não obra senão por motivos, é os motivos varião, não digo todos os annos, mas todos os dias, a toda a hora, a todo o momento? que isto não deva subsistir para o futuro, quando existão as Ordens Regulares, quando se deva fixar huma idade muito mais adiantada para se fazerem os votos, julgo que ninguem me poderá negar no Seculo actual: por consequencia não consentindo que professem os Noviços que actualmente estão para professar, nós vamos a fazer dois bens; vamos desde já a diminuir o numero dos Regulares que he demasiado, e vamos a evitar a acção mais temeraria que o homem póde commetter, qual he n'hum momento ligar-se para toda a sua vida a hum genero de vida certo, e determinado que inclue em si as privações daquillo que a natureza humana mais deseja. Em evitar este absurdo da idade em que se fazem similhantes votos he que devemos considerar. Eu sei o respeito que se deve ter aos votos feitos a Deos, a votos que sejão dignos de que Deos os acceite. Deos mesmo, que conhece a fragilidade humana, de certo, deve arguir de temeridade ao homem quando em tão tenra idade no fogo das suas paixões elle se vai sacrificar todo, sem estar certo que Deos lhe assistirá com huma Graça poderosissima, e extraordinaria que precisa todo o homem para se ligar com Deos: por isso vemos todos os Claustros cheios de homens arrependidos; por isso vemos os Claustros receptaculos de desgraçados, e desgraçados para toda a sua vida. Diz-se que não serão mais de 100 os individuos que se achão no Noviciado; mas 100 homens, 100 mulheres he por ventura hum objecto indifferente aos olhos do bom Legislador: não certamente: e não será objecto bastante para merecer a nossa commiseração? para merecer a protecção da Nação?... para isto hum unico individuo bastava, porque tanto direita, tanta protecção da Sociedade merece hum individuo como hum milhão delles. E depois podem ser indifferentes os resultados beneficos para a Sociedade que podem provir da cooperação de 100 homens? mesmo olhando á população, não he facil ver no decurso de meio Seculo, no decurso de hum Seculo o augmento que 100 homens lhe trarão? e são isto objectos que se tratem de bagatella, e que não devão merecer as mais serias attenções do Legislador? não certamente. Por consequencia, respeitando os principios de piedade, que nos levão a sustentar as Ordens Regulares, nós não devemos perder de vista os abusos que nella póde haver, os abusos que se tem introduzido na sua instituição; e não podemos deixar de os coarctar. Por tanto penso que não só aquelles que quizerem ficar, ou quizerem professar, bem como os que estivessem violentados, devem sahir do Noviciado; mas que não se lhe deve permittir o commetter hum acto tão temerario. He sobre este principio que eu insisto: para o diante jamais se deverão consentir profissões em similhante idade; isto nada obsta aos principios de Religião, elles deverão ser obrigados á sahir. Diz-se que tem entrado em boa fé, que tomarão hum modo de vida como meio unico de sua subsistencia; pelo contrario acho que não devem professar fazendo-se efficaz a protecção da Sociedade sobre estes individuos. Por ventura não entra de boa fé aquelle que entrou na occupação de huma instituição, d'hum Tribunal que nesse tempo era tão legitimo como todos os outros, e que depois se julgou por motivos muito solidos que não devia existir? e esses individuos sabem para fora. Fez-se-lhe alguma injuria por ventura? faz-se-lhe alguma violencia que a necessidade da Nação, e circunstancias della o não permittão? pois se nós convimos que he abusivo fazer huma profissão em taes idades, para que as havemos de consentir? se nós conhecemos que he excessivo o numero de Regulares, para que o havemos de augmentar com os que podem sahir, porque estuo em circunstancias disso? Mas aos Empregados que sabem pela extincção desse estabelecimento em que estavão, o Congresso prove nos meios da sua subsistencia. Ha huma razão muito differente, esses homens achão-se em huma idade em que não podem tomar outra occupação, em hum modo de vida em que não podem tomar huma profissão differente daquella em que estão. Hum Noviço, hum rapaz de 16 annos não está nas mesmas circunstancias, então he que elle está em estado de tomar hum modo de vida, huma profissão que seja conveniente á Sociedade, e não prejudicial á Sociedade, e prejudicial a elle mesmo. Acho pois que o partido que o Congresso deve adoptar he o mandar sahir todos os Noviços que existem dos Conventos.

O senhor Peixoto. - Eu considero esta questão debaixo de dous pontos de vista, de utilidade publi-

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ca, e de justiça, e devo separalla entre os dous sexos. Quanto ao sexo masculino, desfaria saber se acaso no estado em que estão os Noviços, seria mais util o lançallos já fora, ou deixallos professar. Aquelles que estão no noviciado são sugeitos que se dedicarão a huma vida literaria; fazendo-os sahir, não sei qual ha de ser o seu destino. A Universidade está cheia de gente, o Clero secular tambem se não quer, porque vão a ser prohibidas as admissões a Ordens: a vida Militar tambem não a podem abraçar, porque vai a diminuir-se o Exercito, e não offerece vantagens permanentes: o que acontece pois sahindo para fora? he hirem para suas casas, e terem huma vida ociosa, huma vida desoccupada, vida de vadios, e corruptores de costumes. Por outra parte pouca ha de ser a gente contente com a expulsão dos Noviços; a ninguem toca immediatamente. A commodidade do total dos individuos da Nação por este modo he mui pequena, e o incommodo he mui directo. Primeiramente não ter hum modo de vida: 2.º para o futuro ficar em vida ociosa, e fazer desgraçadas essas familias, que contavão com aquella accommodação. Conduzem asnas casas subjeitos que vão a fazer embaraço, e por tanto estas familias tornão-se desgostosas e descontentes. Isto he eu quanto ao particular, porque em quanto ao publico individualmente ninguem poderá dizer com a sahida dos Noviços: "Ora tive hum prazer superior á magoa que tiverão os que soffrem este incommodo." Isto quanto á utilidade publica. Pelo que pertence á justiça, entrarão os Noviços para o noviciado segundo as Leys? Penso que sim. Os Prelados tiverão huma licença da Nação para os admittir, tiverão licença da Mesa do Melhoramento, elles entrarão segundo essas Leys. Por tanto tomarão hum modo de vida que as Leys permittião? Agora se mandarmos expulsar os Noviços, daremos á nova Ley hum effeito retroactivo, em desprezo do seu direito adquirido. A Ley deve fazer disposições geraes para o futuro; e esta dirigindo-se a individuos corresponde a huma sentença. Por tanto digo que os Noviços não devem ser obrigados a sahir. Accrescento, que os que professão presentemente, professão com conhecimento: já não são rapazes, que na idade de dezeseis annos para cima se embarassem de declarar aos Pays a sua repugnancia: se elles quizerem sahir, e não professar, não haverá que os estorve. No sexo feminino não he assim: muitas vezes huma menina vai a ser Freira para satisfazer os desejos da sua familia: querendo sahir do noviciado apresentão-se-lhe dous receios para permanecerem nos Conventos; da parte das Freiras, de quem serão mal vistas; e se sabem o de sei em igualmente mal vistas das familias; e até são contidas pelo pondenor, para que a sua sahida se não attrubua a origem immodesta: por isso estas cousas movem huma menina a professar muitas vezes contra sua vontade; portanto eu a respeito dos Noviços serei de opinião que os que estão de dentro devem professar querendo: e quanto ás Noviças, que se lhe suspenda sómente a profissão até que haja sobre este assumpto regulamento geral.

O senhor Sarmento. - Ouvi o illustre Preopinante fallar sobre esta materia: elle he hum Pai de familia, e tem rasões para assim fallar; entretanto eu fui hum Funccionario Publico, fiz perguntas a muitos filhos familia, e achei que o poder Paternal tinha muita influencia. O direito dos Pays em Portugal he tirado do Direito do Romano, vão tem o jus vitae et nzeis como tinhão os Romanos, e he a unica limitação: por isso sempre julgarei que hum, filho, tendo respeito a seu Pay, hade annuir á sua vontade. Eu estou convencido de que o Congresso ha de prover aos Noviços, no caso que elles tornem para suas casas, e debaixo deste principio he que eu sou de parecer que devem sahir os Noviços.

O senhor Gouvêa Osorio. - Tenho ouvido dizer que o numero dos Frades he superior, e pouco proporcionado á nossa População: eu sou o primeiro que duvido muito que se tenha feito hum calculo para affirmar com certeza este principio. Diz-se que era absurdo, e injusto o consentir que hum rapaz, ou huma menina de 16 annos pudesse dispôr da sua liberdade, eu com effeito no meu juito particular cedo á disposição Geral do Concilio de Trento, este disse 16 annos.... (havia lacuna) Não deve presumir-se que houvesse dolo dos Pais na entrada dos Noviços: por tanto parece-me que os Noviços não devem sahir, porque entrárão com aquellas licenças que Sua Magestade tinha mandado. Por consequencia, para não se tirar hum direito que a Ley tinha estabelecido elles devem ficar nos Conventos, e serem admittidos á Profissão, e depois fação-se os calculos necessarios, e que parecerem convenientes.

O senhor Innocencio Antonio de Miranda. - Dizer-se aqui que era justo que os Noviços se conservem para depois se secularisarem, he huma cousa inteiramente opposta a Religião, e Profissão; porque se vão a Professar com o sentido de sahir a Profissão he nulla, porque ha dolo. Em segundo lugar, dizer-se que nós temos hum viveiro de Ecclesiasticos, tambem não são os que provão melhor cá fora. Eu sou amigo das Ordens Religiosas, estimo-os muito, tenho dentro delles muitos amigos, e até Parentes; mas sou de parecer que os Noviços que existem nos Conventos, se com effeito elles entrarão com Ordem da Regencia actual, então não ha razão de os mandar expulsar, muito principalmente os que entrarão antes de installado este Congresso. Agora aquelles que entrarão já depois disto, e sem licença do Governo, era justo que sahissem, attendendo tambem á sua idade; porque com effeito a idade de 16, e 18 annos está admittido pela Igreja, mas he hum tempo muito intempestivo para dispor qualquer da sua liberdade; e da sua vida. Em tal caso fazendo-se o Regulamento deve-se prover sobre esta materia como ella exige.

O senhor Vanzeller. - Basta ter visto, e ter frequentado a Sociedade, para conhecer a influencia que hum Pai tem sobre hum Filho de 16 annos: elles vão a fazer votos muito serios, e isto parece que pão deve consentir-se em tão pequena idade. Hum Pay manda seu filho fazer o que quer, e elle obedece. Por tanto o meu voto he, que os Noviços que estão dentro podem ficar, mas que não devem admittir-se a que professem sem ter a idade de 20 annos.

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O senhor Margiochi. - Consentir n'huma Profissão Religiosa, he consentir que se abandonem todos os sentimentos da Naturesa, e por consequencia consentir em formar hum desgraçado, ou hum Monstro. Consentir em que alguem renuncie a sua liberdade, he querer destruir pelas Bases a Constituição; por isso não devemos consentir em similhantes Profissões, porque seria huma nodoa muito grande para este Augusto Congresso.

O senhor Castello Branco. - Tenho que propor o meu parecer, em poucas palavras, relativamente a hum Illustre Preopinante. Disse elle, que não póde considerar violencia da parte de hum Pay para com hum rapaz de 16 annos, porque hum rapaz de 16 annos póde ter o desembaraço de dizer a seu Pay, que está violento. Eu attestarei ao Congresso com hum facto proprio. Eu tive huma educação assás liberal, porque desde o principio fui mandado para Collegios, Casas de Mestres, e Ultimamente á Universidade: nada menos apetecia do que ser Ecclesiastico, as minhas ideas erão bem contrarias a isto; entretanto na idade de 18 annos, tendo tido huma educação que me deveria dar mais desembaraço, quando meu Pay por interesse de familia me declarou que a sua vontade absoluta era que eu fosse Clerigo, não achei nenhum pé para lhe resistir, € fui realmente Clerigo.

Ficou adiada a questão, e

O senhor Presidente levantou a Sessão, determinando para Ordem do dia os Pareceres das Commissões, e a Liberdade da Imprensa. - Antonio Ribeiro da Costa, Secretario.

DECLARAÇÃO.

O Deputado Silva Correa em Sessão de 35 de Abril declarou que o Desembargador José Francisco Fernandes Correa cedia a favor dás urgencias do Estado o ordenado que lhe competia, como Membro da Junta Preparatoria das Cortes: de que se mandou fazer na Acta honrosa menção.

AVISOS.

Para João José de Freitas e Aragão.

As Cortes Geraes, e Extraordinarias da Nação Portugueza, mandão participar a V. Sa. que deve apresentar-se neste Soberano Congresso, para tomar o exercicio de Deputado Substituto pela Ilha da Madeira.

Deos guarde a V. Sa. Paço das Cortes em 5 de Maio de 1821. - João Baptista Felgueiras.

Para o Conde de Sampayo.

Illmo. e Exmo. Senhor = As Cortes Geraes, e Extraordinarias da Nação Portugueza, Conformando-se com o incluso parecer da Commissão de Saude Publica, Ordenão, que fiquem suspensas todas as Correições, Visitas, e Licenças do Subdelegado do Fysico-Mór do Reyno, em quanto se não estabelece a Ley regulamentar sobre este objecto, e que bem assim fique livre acenda de licores, agoas ardentes, e vinagres, sem dependencia de licença da Saude, sendo com tudo sujeitos, como os outros generos similhantes, ao exame competente, quando haja denuncia de que são compostos e alterados com ingredientes nocivos. E Ordenão outro sim as Cortes, que todos os processos findos e pendentes sobre os mencionados objectos, sejão remettidos immediatamente aos Juizos do domicilio, aonde se lhes porá perpetuo silencio, O que V. Exa. fará presente na Regencia do Reyno para que assim se execute.

Deos guarde a V. Exc. Paço das Cortes, em 5 de Maio de 1821 = João Baptista Felgueiras.

OFFICIOS.

Illmo. e Exmo. Senhor. = Ordena a Regencia do Reyno, em Nome d'ElRei o Senhor D. João VI, que se envie a V. Exca. a copia da Carta, e Instrucções de 2 de Abril de 1806, remettida á Camera de Moncorvo para occorrer aos damnos que o Sabor e Villariça causão no Campo deste nome; e assim fica cumprida a Ordem das Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação Portugueza de 24 de Abril proximo passado.

Deos guarde a V. Exca. Palacio da Regencia, em 4 de Maio de 1821 - Senhor João Baptista Felgueiras. - Joaquim Pedro Gomes de Oliveira.

Illmo. e Exmo. Senhor. - A Regencia do Reyno, em Nome de ElRey o Senhor D. João VI, manda remetter ao Soberano Congresso das Cortes Geraes Extraordinarias da Nação Portugueza o Requerimento incluso de alguns Cidadãos no mesmo assignados, para a creação, e instalação de huma Sociedade Patriotica, por não ser da competencia da mesma Regencia o seu deferimento. O que participo a V. Exa. para que assim o faça presente no referido Congresso.

Deos guarde a V. Exca. Palacio da Regencia em 4 de Maio de 1821. - João Baptista Felgueiras. - Joaquim Pedro Gomes de Oliveira.

Illmo. e EXmo. Senhor = A Regencia do Reyno, em Nome d'ElRei o Senhor D. João VI., Manda remetter ao Soberano Congresso das Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação Portugueza o Regulamento dos Salarios dos Magistrados, e Officiaes de Justiça, feito pelo Superintendente de Agricultura, Alberto Carlos de Menezes, que existta na Mesa do Desembargo do Paço: ficando assim satisfeito o Aviso do mesmo Congresso de 6 de Abril proximo passado.

Deos guarde a V. Exa. Palacio da Regencia em 4 de Maio de 1821. = Senhor João Baptista Felgueiras = Joaquim Pedro Gomes de Oliveira.

LISBOA: NA IMPRESSÃO NACIONAL.

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