O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

[1526]

vez em discussão. - Grandes males precipitarão a Nação no abysmo, de que a salvou a heroica virtude de seus filhos. A origem destes males foi o desprezo dos direitos de Cidadão, e o esquecimento das leis fundamentaes da Monarquia. O remedio para que se não renovem, he a Constituição Politica que vai a discutir-se, e que assenta nessas antigas leis fundamentaes, ampliadas com opportunas providencias. O fim por tanto da Constituição he assegurar os direitos de cada um, e o bem geral de todos os cidadãos portuguezes.

Quando pela primeira vez se discutiu este preambulo, forão muitos e mui variados os pareceres de meus illustres collegas; mas para me não fazer cargo de tudo o que então ouvi, apontarei sómente as objecções que me parecerão mais arrazoadas; e são as seguintes: 1.ª que erão duvidosas as Cortes de Lamego, que estipularão o nosso pacto social; e que não parecia airoso que esta Assemblea sanccionasse como certo um facto incerto da maior transcendencia: 2.ª que com quanto existissem, não era pelo estabelecimento das leis ahi ordenadas, que poderiamos acabara grande obra da nossa regeneração politica; por que nellas se não falava de Cortes, nem as Cortes de então gozavão, do poder que cumpria para o grande fim da felicidade publica: 3.ª que havendo-se assignalado como causa das desgraças que opprimião e opprimem os Portuguezes, o desprezo dos direitos do Cidadão, era escusado falar no esquecimento das leis fundamentaes da Monarquia.

Vou responder a cada uma destas duvidas. E pelo que toca á primeira direi, que não he proprio de uma Assemblea constituinte entrar nas miudas, e cançadas indagações sobre a existencia das Cortes de Lamego. Deixemos a tarefa aos eruditos nacionaes e estrangeiros, que terá debatido este ponto de nossa historia politica: aos legisladores só cumpre saber que nas Cortes de 1679, e 1697 se dispensarão, e derrogárão alguns capitulos das de Lamego; e que a Nação reconheceu por esse mesmo facto a existencia e validade dos que não forão dispensados, nem derrogados. Não he portanto esta augusta Assemblea a que sancciona o pacto fundamental estipulado em Lamego, forão sim as Cortes de 1679, e 1697.

Em quanto á segunda. Convenho em que nossas leis fundamentaes não farão em Cortes; mas devo observar que o nosso direito publico não foi fundido de um só jacto, nem derivado de uma só fonte, de direito consuctudinario nos vierão estas grandes Assembleas da Nação chamadas Cortes: e se accreditar-mos um Illustre autor portuguez, já estas Assembleas serão conhecidas dos antigos Lusitanos, antes da invasão dos povos do Norte, a quem outro as attribue, fiado no testemunho de Tacito, que diz - de minoribus rebus principes consultant, de majoribus omnes. O certo he que as Cortes forão reconhecidas sempre pelos senhores Reis destes reinos, que muitas vezes as convocarão, chegando a fixar certos periodos para a sua convocação. Accrescento mais, que até forão reconhecidas por aquelle mesmo monarca, em cujo reinado morrêrão: falo do senhor D. João V., que nos annos de seu, governo continuou a exigir tributos, esperançando os povos de que chamaria as Cortes logo que a urgencia das circunstancias o permittisse; porque não era da sua real intenção violar nossos usos e costumes. Do que levo dito tenho direito a tirar a seguinte conclusão. - As Cortes sempre forão olhadas pela Nação, e pelos senhores Reis deste reino como formando parte das leis fundamentaes da Monarquia.

Qual foi porém a autoridade das Cortes nos tempos passados? Se consultarmos os nossos publicistas, as Cortes erão nada. Se consultarmos os monumentos, e a historia, as Cortes exercêrão muitas vezes a soberania, como representantes da Nação, em que ella reside. Por cinco vezes no espaço de 525 annos as Cortes nomeárão os senhores Reis deste Reino, e quasi sempre excluindo pessoas, que se dizião com direitos á Coroa mais ou menos fundados. Elegerão o nosso primeiro Rei o senhor D. Affonso Henriques; o conde de Bolonha Affonso III., excluindo a seu irmão Sancho II.; o senhor D. João I., excluindo a infanta D. Beatriz, filha d'ElRei D. Fernando, e os filhos de D. Ignez de Castro, e d'ElRei D. Pedro I.; o senhor D. João IV., excluindo os réis de Hespanha; e ao senhor D. Pedro II., excluindo o senhor D. Affonso VI.

Q nosso primeiro Rei reconheceu nas Cortes o poder legislativo, quando disse aos Deputados da Nação juntos em Lamego = Constituamus leges per quas terra nostra sit in pace = Vultis facere leges de nobilitate, et justitia? Todavia os Deputados se esquecerão de levantar barreiras, que lhes pozessem a coberto este poder: e o que resultou do tão fatal esquecimento foi, que 300 annos depois dizia o senhor D. Affonso V. em sua Ord. Do Liv. 3.° Tit. 78 § 1.º - ElRei he a lei animada sobre a terra, e póde fazer lei, e revoga Ia quando vir que he compridoiro. Em verdade nas Cortes de Coimbra de 1385 algumas restricções se pozerão ao poder Real, as quaes o senhor Rei D. João I. acceitou, é jurou cumprir; e taes forão = que não faria, guerra nem paz sem consultar as Cortes. E quantas desgraças se não terião poupado á nossa heróica Nação, se pontualmente se houvesse observado esta clausula expressa do nosso pacto social. Virião por ventura a effeito as extravagantes expedições do senhor D. Affonso V., e a sobre todas fatal expedição, que enterrou nos campos de Alcacerquivir a gloria, e a fortuna da gente portugueza?

Pelo nosso direito publico as Cortes da Nação erão as competentes para concederem os pedidos e contribuições necessarias ás despezas publicas: e ao menos nesta parte ha sido mais dificultoso aos advogados do poder arbitrario torcer o sentido, e as actas das Cortes passadas; porque os factos tem uma fysionomia mais pronunciada e muito menos equivoca; Esqueceu-se este principio da nossa lei fundamental; e a Nação ficou abysmada n'uma divida enorme, que sem duvida custará grandes sacrificios á geração presente. A perda desta prerogativa foi a que mais custou aos povos, que sempre protestárão, e patenteárão a sua desapprovação, por todos os meios que se lhes offerecerão: de muitos exemplos que poderia