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DIARIO DAS CORTES GERAES E EXTRAORDINARIAS DA NAÇÃO PORTUGUEZA.

NUM. 236.

SESSÃO DE 27 DE NOVEMBRO.

Aberta a Sessão, sob a presidencia do Sr. Trigoso, leu-se a acta da antecedente, e foi approvada.

O Sr. Secretario Felgueiras deu conta dos seguintes officios do Governo.
1.º Do Ministro dos negocios do Reino, dando conta de se haver expedido portaria á junta provisoria do Governo de Santa Catharina, para remetter a acta da junta eleitoral dos Deputados de Cortes pela dita provincia, de que as Cortes ficarão inteiradas.

2.º Do mesmo Ministro, dando conta das ordens, que se tem expedido ao Conselho da fazenda; assim como de outras providencias, e resoluções, que tem havido, sobre consultas relativas á extincta companhia do Grão Pará, e Maranhão, que se remetteu á Commissão de justiça civil.

3.° Do mesmo Ministro, incluindo uma consulta da meza do Desembargo do Paço sobre a representação de Manoel Antonio Soares de Barbosa Abreu Vasconcellos, e outros, a respeito da demolição de uma azenha, e paredão no rio Cavado, acompanhada dos mais papeis relativos a este objecto, que se mandou á Commissão de justiça civil.

4.° Do Ministro da marinha, acompanhando um requerimento de Antonio Pussich, chefe de esquadra graduado da marinha portugueza, e seus dous filhos, pertencentes ao mesmo corpo, que requerem ser pagos de seus respectivos soldos, que se dirigiu á Commissão de fazenda.

5.° Do Encarregado da pasta dos negocios da guerra, pedindo exclarecimentos sobre a inteligencia do paragrafo 16 do regimento do Conselho de Estado, a fim de se proceder quanto antes á nomeação de governadores das armas para as provincias do Brazil, que se remetteu a Commissão de Constituição.
6.° Do mesmo Encarregado, transmittindo duas representações do Brigadeiro commandante da força armada desta capital, Setubal, e Cascaes, sobre a diminuição progressiva, que experimentão os corpos do seu commando, o que os torna cada dia menos em estado de supprir a necessidade do serviço das respectivas guarnições, que se dirigiu á Commissão militar.

7.° Pela mesma repartição, dando conta de se haverem expedido as ordens competentes, para que possa effectuar-se o offerecimento, que para as urgencias do Estado fez o juiz de fora de Coimbra Jose Corrêa Godinho, de que as Cortes ficárão inteiradas;

Mencionou igualmente os seguintes papeis: cento e cincoenta exemplares do mappa demonstrativo da receita e despeza do cofre da Universidade, e suas administrações em todo o mez de Setembro do corrente anno, que se mandárão distribuir pelos Srs. Deputados. Uma carta de felicitação do almoxarife da commenda da villa do Torrão Joaquim Antonio Baptista Varella. Uma participação dos individuos, que saírão eleitos para a Commissão de Negociantes creada na villa de Barcellos. Um plano sobre eleições directas, pelo abbade Antonio de Sousa e Castro, que se mandou á Commissão especial, encarregada deste objecto. Um discurso, recitado na eleição da paroquia de S. Miguel de Villar de Perdizes pelo encommendado da mesma Bento Marques Pereira. Uma relação das festas, que se fizerão na villa da Covilhã no memoravel dia 24 de Agosto do presente anno, de que as Cortes ficárão inteiradas. Uma obra com o titulo de - Desaggravo da gramatica portugueza - ou, Reflexões criticas sobre a gramatica ordenada por Sebastião Jose Guedes Albuquerque - offerecida por Joaquim Jose de Campos Abreu e Lemos, que se mandou á Commissão de instrucção publica. Um projecto do monte pio dos officiaes militares, por João Cyrillo Machado, que se remetteu á Commissão de fazenda. Uma memoria sobre o augmento da agricultura, offerecida por Christovão de Sousa e Carvalho, da villa de Muge, que se mandou á Commissão de agricultura.
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O Sr. Secretario Freire leu uma indicação do Sr. Correa de Seabra, propondo, que se diga ao Governo, que as Cortes prescindem das informações, que se lhe havião pedido relativamente a foraes, que foi approvada.

Verificou-se pela chamada acharem-se presentes 104 Srs. Deputados, e que faltavão 18; a saber: os Srs. Moraes Pimentel; Pereira do Carmo; Bernardo Antonio de Figueiredo; Sepulveda; Bispo de Castello Branco; Lyra; Van-Zeller; Xavier Monteiro; Pereira da Silva; Faria de Carvalho; Guerreiro; Faria; Xavier de Araujo; Manoel Antonio de Carvalho; Gomes de Brito; Sande e Castro; Zeferino dos Santos; Araujo Lima.

Passou-se á ordem do dia, e, por parte da Commissão militar, deu conta o Sr. Sousa e Almeida do parecer sobre o officio do Encarregado da pasta do ministerio da guerra em data de 26 de Outubro do corrente anno, que foi remettido á Commissão especial, para que com a maior urgencia apresente um plano sobre o objecto do mesmo officio, indicando todas as reformas, que forem compativeis com o estado presente de cousas.

O Sr. Vaz Velho, por parte da Commissão de pescarias, deu conta dos seguintes

PARECERES.

A Commissão das pescarias examinou o requerimento de Jose Martins Leite, Manoel Machado, e outros em numero de 9; mestres dos barcos de pescarias da villa de Olhão da Restauração no Algarve, os quaes dizem, que empregando-se todos elles no importante ramo da pesca para salgar, e escalar, no mar de Larache, lhes foi concedido para os comboiar, e fiscalizar as suas communicações em tempo de peste e corsario Piedade, de que he commandante Escarniche, o qual os devia acompanhar no tempo, e volta da pesca, a fim de lhes passar o competente attestado, para constar que não tinhão communicado com embarcação ou gente de suspeita, e assim ficarem livres da quarentena. Succede porém que estando os ditos 9 barcos na acção da pesca forão desamparados pelo dito corsario sem lhes dizer causa alguma o seu commandante, e menos deixar alguem, que os podesse vigiar. - Que elles finalizárão a sua pescaria; esperárão ainda mais dez dias pelo corsario; acabárão-se os mantimentos; e como se vissem nas tristes circunstancias de morrer de fome, vierão para os seus respectivos postos, em um dos quaes encontrárão o corsario, cujo commandante não póde dar um attestado em forma, e por isso passárão por uma rigorosa quarentena, em que perderão a pescaria, fizerão grandes gastos, e inutilizárão aquelle tempo consideravel tão necessario para o augmento de subsistencia.

Requerem que se mande estranhar ao dito commandante um similhante procedimento, e que se lhes mande pelos meios competentes resarcir os damnos soffridos por elles, e de que foi causa o mesmo commandante contra quem logo protestárão, como mostrão por documento.

A Commissão das pescarias demorou-se mais na exposição deste negocio, porque acha summamente estranho o predicto facto praticado em tempo, que este Soberano Congresso tem manifestado de um modo muito positivo as suas beneficas intenções a favor da uma classe, que tanta tem de util, quanto de desgraçada, e por isso he de parecer que se remetta ao Governo o requerimento dos supplicantes, para que mande logo conhecer do facto, e proceder na fórma das leis. - Paço das Cortes 17 de Novembro de 1821. José Vaz Velho, Jeronymo José Carneiro, Manoel Jose Placido da Silva Negrão.
Foi approvado.

Á Commissão de pescarias veio um requerimento, dos negociantes, e moradores da villa de Povoa de Varzim, no qual se queixão da pertenção, que tem a abbadeça do mosteiro de Santa Clara da villa do Conde de querer impedir, e obstar a importação do sal no porto, e enseada da villa da Povoa de Varzim, e pertender que sómente seja importado, e se vá descarregar em villa do Conde, onde se lhe deve pagar a vintena, ou 5 por cento de todo o sal importado na fórma do foral. Dizem que esta exclusão de não poder ir o sal em direitura á Povoa de Varzim he prejudicial aos supplicantes pelos grandes gastos de condução por terra; ao publico porque a despeza carrega sobre a pescaria, para que se destina a maior parte do sal: e á fazenda nacional, porque o sal importado na Povoa de Varzim paga 10 reis de cada raza á fazenda nacional, de que he izento o que entra no porto da villa do Conde. - Pertendem que se lhes permitia a importação do sal no porto de villa nova de Varzim.

A Commissão de pescarias he de parecer que entendendo este negocio mais directamente com a fazenda do que com as pescarias (que aliàs se devem beneficiar), pois se trata de pagar ou não direitos á fazenda nacional, para a Commissão de fazenda deve ser remettido o requerimento para dar o seu parecer. Paço das Cortes 17 de Novembro de 1821. - Jeronymo José Carneiro, Manoel José Placido da Silva Negrão, Jose Vaz Velho.
Approvado.

Os procuradores da villa da Povoa de Varzim na Comarca do Porto, representão ao Soberano Congresso a violencia que lhes ferem as autoridades da dita villa, em privar os supplicantes de um certo espaço e local nas praias proximas ao mar, para onde puchávão as suas lanchas na occasião das tempestades; e onde estendem as suas redes, vellas, maçames, e mais utencilios da pescaria, e que lhes causa grande damno cuja reparação de balde tem solicitada da camara, e do Governo, em outro tempo; supplicão um remedio prompto a este mal, que vai pezar sobre o ramo das pescarias, cuja utilidade he por todos bem conhecida.

Á Commissão de pescarias parece que este requerimento pertence ao Governo, a quem compete mandar dar as providencias necessarias, e requeridas pelos supplicantes.

Paço das Cortes 17 de Novembro de 1821. -

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Jose Vaz Coelho; Jeronymo José Carneiro; Manoel José Placido da Silva Negrão.
Approvado.

Por parte da Commissão da redacção do Diario, deu conta o Sr. Rodrigo Ferreira do seguinte

PARECER.

A Commissão da redacção do Diario das Cortes, sendo-lhe apresentado pelo administrador dos Diarios, que na pequena loja onde estão á venda, já não ha capacidade para recolher os que se vão imprimindo, e muito menos os volumes das actas das Sessões das Cortes; e que na loja contigua, pertencente ao mesmo edificio nacional, e presentemente vaga, ha melhor accommodação para o mesmo fim.

Requer ao Soberano Congresso, que mande expedir ordem ao Senado da camara desta cidade, para que ponha á disposição do administrador do Diario das Cortes a referida loja visinha; e tome entregue da loja actual, logo que esteja feita a mudança.

Paço das Cortes em 23 de Novembro de 1821. - Rodrigo Ferreira da Costa; Antonio Lobo de Barbosa Ferreira Teixeira Girão; Antonio Pereira; José Ferrão de Mendonça e Sousa; Francisco Antonio d'Almeida Moraes Pessanha.

Foi regeitado, e se decidiu, que se passasse ordem ao Governo para que das casas nacionaes que tem á sua disposição aprompte uma, que seja commoda para a venda dos Diarios.

Apresentou mais o mesmo Sr. o parecer sobre um requerimento dos cinco discipulos de Taquigrafia, empregados nas Cortes, João José Alves Freineda, José Pedro Prestes, Jeronymo de Almeida Brandão, Francisco de Sales Rodrigues Leiria, e Deocleciano Antonio Pedro Freire, a respeito do qual se venceu, que se abra um novo concurso perante a mesma Commissão, o qual se deve annunciar para determinado dia, ficando aberto a todos os concorrentes, que quizerem comparecer; e que o parecer seja novamente restituido á Commissão com os mais, que se achão adiados, para interpor depois do concurso um juizo difinitivo.

O Sr. Presidente annunciou que estava presente uma carta do Coronel, e Tenente Coronel do regimento de infanteria n.º 4, que se achavão na sala de fora, e que, em nome da oficialidade do Batalhão expedicionario do regimento do seu commando, vinhão offerecer às Cortes seus respeitosos comprimentos de despedida, e leu-se a seguinte carta.
O Coronel do regimento de infanteria n.° 4., João Leandro de Macedo Valladas, e o Tenente Coronel do dito, Filippe Thomaz Ribeiro da Fonseca, tem a satisfação e a honra de apresentar a este soberano Congresso formado pelos dignos Representantes da liberal e heroica Nação portugueza, o corpo da oficialidade pertencente ao batalhão expedicionario do regimento do seu commando, que vai partir para o Rio de Janeiro: elles vem fazer os seus respeitosos cumprimentos de despedida; renovando ainda uma vez á face de toda a Nação (concentrada e representada neste augusto recinto) os sinceros protestos da sua adhesão ao systema constitucional, e de obediencia á lei, ao Rei, como primeiro Magistrado, e às autoridades legitimamente constituidas; confirmando o solemne juramento que gostosamente prestárão, e que protestão fazer valer nos mais remotos paizes, a que os interesses e a voz da sua cara patria os chamar; promettendo igualmente pôr em pratica todos os meios e esforços, que estiverem a seu alcance, para segurar a conservação, e até apertar cada vez mais os vinculos da boa fraternidade e boa harmonia, que existe entre nossos irmãos daquelle hemisferio, e que fazem uma parte da nossa respeitavel Nação.
O Tenente Coronel commandante do referido batalhão expedicionario e seus officiaes, assim como o chefe do regimento e os officiaes do batalhão remanescante, rogão ao Supremo Autor da natureza auxilie e prospere as assiduas tarefas, e importantes fadigas deste soberano Congresso, e á Providencia que vigie na sua feliz conservação, para vermos logo concluida a magestosa obra da nossa regeneração politica, e consolidada a ventura de Portugal; esperando que estes dignissimos órgãos da Nação acreditem benignos a sinceridade das suas expressões e dos seus sentimentos, desculpando ao mesmo tempo terem vindo perturbar os seus augustos trabalhos. Quartel em Campo de Ourique 27 de Novembro de 1821. - João Leandro de Macedo Valladas, Coronel do n.º 4 de infanteria; Filippe Thomaz Ribeiro, Tenente Coronel commandante do batalhão que marcha para o Rio.
Mandou-se fazer honrosa menção na acta, e que se publique no Diario na fórma do costume; e ordenou-se que dois dos Srs. Secretarios saíssem a fazer-lhes certo o justo apreço que as Cortes fazem de seu leal e patriotico comportamento.
O Sr. Soares Franco, por parte da Commissão de saude publica, deu conta dos seguintes

PARECERES.

O Juiz de Fóra da Villa de Pombal representa que no anno de 1800, em razão de um grande contagio, que afligiu aquelles habitantes, se mandou ordem para os defuntos se enterrarem em um cimiterio e não nas igrejas. Assim se executou, tanto que lá foram enterrados o predecessor deste ministro, o Desembargador Thomaz Carlos de Sousa e Menezes e o Vigario da freguezia. Como porém aquella villa foi incendiada na retirada do exercito francez em 1810, não apparece registo de tal ordem, e por isso os Religiosos da provincia de Santo Antonio de Portugal vão admittindo enterramentos na sua igreja pela esmola de 6400 réis, e a misericordia vai fazendo o mesmo na sua capella por 1300 réis. Lembra mais, que não se tendo cercado com muro algum o dito cemiterio, este he accessivel á entrada dos animaes, que tem desenterrado alguns cadaveres, o que he summamente indecente. Pede em consequencia duas cousas: 1.ª que seja autorizado para prohibir os enterramentos nas igrejas: 2.ª que se mande cerear com um muro o cemiterio. A Commissão he de parecer, que se passe ordem para que o Juiz de Fóra da villa

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ao Pombal mande enterrar todos os defuntos no cemiterio da dita villa; prohibindo os enterramentos nas igrejas: 2.° que a camara pelos sobejos das sizas mande fazer o muro indicado, e não os havendo, por uma derrama só até ao ponto de se fazer a obra decente, mas sem luxo. Paço das Cortes em 12 de Novembro de 1821. - Francisco Soares Franco, João Alexandrino de Sousa Queiroga, João Vicente da Silva, Luiz Antonio Rebello da Silva, Henrique Xavier Baeta.
O Senado da camara da Povoa de Varzim representa que lhe são precisos para obras publicas do seu districto os sobejos das sizas, que são remettidos para os reparos da ponte de Coimbra, e encanamento do Mondego; pede a suspensão desta remessa. E por esta occasião lembra a necessidade de se mandar fazer o hospital naquella villa. A Commissão he de parecer que em quanto á primeira parte depende a sua decisão da lei que o Soberano Congresso mandou que se fizesse a respeito das sizas, e que anda em discussão. A respeito da segunda depende das informações que a Commissão de saude publica requereu que se procedesse. E por isso insta de novo, que ellas se peção, e venhão por officio, e não por um requerimento. Paço das Cortes em 12 de Novembro de 1821.- Francisco Soares Franco, João Alexandrino de Sousa Queiroga, João Vicente da Silva, Luiz Antonio Rebello da Silva, Henrique Xavier Baeta.

Joaquim Baptista, medico da villa de Vouzella, e do hospital das Caldas de S. Pedro do Sul, representa, que fôra suspenso deste ultimo lugar pelo Corregedor, inspector das ditas Caldas, em virtude do decreto, que ordena que não se pague pensão ou ordenado, que não seja estabelecido por lei, e que nas mesmas circunstancias estão o cirurgião, o capellão, uma banheira, e o chaveiro, os quaes todos em razão dos seus tenues ordenados (sendo o medico unicamente de quinze mil réis nos cinco mezes que durão os banhos) servião pela simples nomeação do Corregedor da comarca, sem provisão.

A Commissão he de parecer, que se mandem pagar áquelles empregados os seus ordenados; porém para maior legalidade devem tirar provisão, a qual em razão da pequenez dos seus ordenados póde ser uma para todos, e mandada tirar pela camara.

Paço das Cortes em 17 de Novembro de 1821.- Francisco Soares Franco; Henrique Xavier Baeta; João Alexandrino de Sousa Queiroga.
Forão todos approvados.

Por parte da Commissão de Policia, e Governo interior das Cortes, deu conta o Sr. Ferrão dos seguintes

PARECERES.

A Commissão de Policia, e Governo interior das Cortes viu o requerimento de João da Cunha Taborda, perito taleographo por carta regia, da qual junta a copia, e de outros documentos que provão a sua capacidade, e bom comportamento no desempenho da sua profissão: pedindo ser empregado no serviço das Cortes, quando sejão necessarios alguns extractos, ou traslados de documentes latinos, ou vulgares do archivo nacional da Torre do Tombo.

Notando porém a Commissão que quando sejão necessarios nas Cortes similhantes extractos, ou traslados se devem pedir ao Governo, he de parecer que ao mesmo deve o supplicante requerer para o empregar nesse trabalho, se assim o julgar conveniente.

Paço das Cortes em 20 de Novembro de 1821.- Francisco Manoel Trigoso de Aragão Morato; José Ferrão de Mendonça e Sousa; Francisco de Magalhães de Araujo Pimentel; João Alexandrino de Sousa Queiroga; José Maria de Sousa Almeida.

A Commissão de Policia viu quatro requerimentos de José Francisco da Fonseca, feitos ao Soberano Congresso: o 1.º em 4 de Maio passado, pedindo ser ajudante do porteiro mór das Cortes: o 2.º e o 3.° em 19 de Outubro, em que requer ser nomeado porteiro da Secretaria das Cortes, ou ajudante do dito porteiro: e o 4.º em 14 de Novembro, em que pertende ser empregado em porteiro da Secretaria de Estado dos negocios da justiça, ou seu ajudante; tudo em remuneração de serviços feitos á Nação na feliz restauração de Portugal, e donativos, que então offereceu conforme suas posses.

Quanto aos 3 primeiros requerimentos, parece á Commissão não terem lugar por não haver nas Cortes necessidade de taes empregos. Quanto porém ao ultimo julga que deve requerer ao Governo para lhe defirir como bem entender.

Paço das Cortes em 20 de Novembro de 1821.- Francisco Manoel Trigoso de Aragão Morato; José Ferrão de Mendonça e Sousa; Francisco de Magalhães de Araujo Pimentel; João Alexandrino de Sousa Queiroga.
Forão ambos approvados.

O Sr. Freire, por parte da Commissão especial, leu o seguinte

PARECER.

O official, que serve de contador fiscal da thesouraria geral das tropas, apresentou ao Governo uma lista de cinco officiaes inglezes, que servirão na repartição civil do exercito de Portugal; e representou que os indicados officiaes não forão comprehendidos na relação, que acompanhou a portaria expedida da Regencia em 14 do Maio, para se executar na mesma thesouraria o decreto de 5 de Março; e por esta omissão duvida se se deve pagar aos ditos officiaes, e pede explicação. O Governo enviou esta representação ao Congresso, e foi instaurada a Commissão especial, que tinha redigido o Decreto de 5 de Março para interpor a sua opinião sobre a duvida proposta.
Parece á Commissão, que o referido decreto não precisa de declaração, porque não faz alguma distincção dos officiaes civis, e combatentes: que o defeito esteve na relação, que acompanhou a portaria de 14 de Maio: e que ao Governo compete fazer emendar esse defeito.

Paço das Cortes 23 do Novembro de 1821. - Jose Antonio de Faria Carvalho; José Ribeiro Saraiva; Francisco Xavier Monteiro; Alvaro Xavier

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das Povoas; Barão de Molellos; José Ferreira Borges; Manoel Alves do Rio; Agostinho José Freire; João de Figueiredo.
Foi approvado.

O Sr. Bettencourt, por parte da Commissão de agricultura deu conta do seguinte

PARECER.

A Commissão de agricultura vio a Representação de Manoel Maria Holbeche Granate de Oliveira da Cunha e Silva, em que expõe o methodo de cultura, que tem já em grande parte realisado pelo systema da alternação das sementes; methodo que tão pasmosos, e tão admiraveis effeitos tem produzido em França, e nos outros paizes, onde se tem introduzido: applicou-o em uma grande fazenda que possue ao pé de Santarem a qual tinha ribeiras alagadiças; e quasi incultas. Produzia antigamente só 5 a 6 meios de pão de differentes qualidades, agora 50; produzia 8 pipas de vinho; agora acabada a plantação projectada, e já em grande parte feita, póde produzir 100; alem de muita creação de vaccas, de que se tira já, e póde tirar muito mais, manteiga e queijo.

A Commissão de agricultura reconhece a excellencia daquelle systema, como unico capaz de tirar da terra a maior quantidade de producções e sobre tudo de cereaes; desejaria ardentemente que elle servisse de uma escolla pratica aos outros lavradores, para se generalizar no paiz; sabe, que em todas as Nações ha depositos ou bancos para se emprestarem fundos aos agricultores que intentão grandes roteações; e por isso não duvida, que o supplicante deva ser auxiliado no que requer; e reduz-se a pedir quatro contos de réis pelo terreiro público, com obrigação de os começar a pagar no fim de quatro annos, em duas ou tres prestações, dando hypothecas sufficientes, para poder acabar o plano, que está muito adiantado; a Commissão constando-lhe a verdade de tudo he de opinião, que se indique ao Governo, que authorise o terreiro publico para fazer este emprestimo, cujo fim não he menos util do que varios outros para que se costumão adiantar dinheiro pelo referido cofre.

Paço das Cortes 11 de Novembro de 1821.- Francisco Soares Franco; Francisco de Lemos Bettencourt; Antonio Lobo de Barbosa Ferreira Teixeira Girão; Pedro José Lopes de Almeida.

O Sr. Franzini: - Eu não me conformo com este parecer: seria no meu entender muito melhor dar noticia desse methodo de cultura por meio de impressos, que circulassem e instruissem os lavradores. Por outro lado eu vejo que esse proprietario não deve precisar do emprestimo, porque he um grande proprietario, e deve ser rico pelas vantagens que irá tirando desse novo methodo. Seria muito melhor applicar esse dinheiro a pequenos cultivadores: doutro modo não serião bastantes todos os fundos do Terreiro.

O Sr. Baeta: - Eu tenho conhecimento do local pertencente às propriedades do requerente, sei muito bem que ha tres ou quatro annos que nada produzia, e agora pelo seu zelo está reduzido a um estabelecimento de agricultura, que póde servir de modello a todos os agricultores portuguezes; porém para isto, e com esperança de ser reintegrado pelo mesmo producto do predio, tem feito gastos extraordinarios, e tem-se empenhado. Completando a sua obra o homem certamente poderá retirar os capitaes que empregou; mas acha-se sem meios para conclui-la e devendo algumas sommas. He por isto que recorre a este soberano Congresso, para que haja por bem mandar-lhe emprestar quatro contos de réis do Terreiro publico; e admira-me muito que tendo está augusta Assemblea sacrificado grandes interesses em beneficio da agricultura; haja hoje contradicção em fornecer esta pequena somma a um agricultor, que tem feito estes trabalhos animado do bem da sua patria. Eu julgo que se deve ajudar este proprietario para dar complemento á sua obra, e apoio o parecer da Commissão.

O Sr. Brito: - Pelo que acabo de ouvir está conhecido que a grande producção daquelle terreno he resultado dos grandes cabedaes que esse homem empregou nelle; e que um terreno que então não produzia nada, agora produz muito. Se isto he assim o homem está rico; porque quem tem um predio que produz muito não he pobre. Porém a julgar pela supplica parece que o está, pois o que pede importa o mesmo que a esmola dos juros desse capital pelos annos do desembolço, e eu não direi que não seja justo que se lhe de essa esmola, mas deve-se estender este beneficio a todos os lavradores do Reino, que forem tão pobres como elle. Seu methodo de alternar as sementes não he novo, he tão antigo como o mundo, e não ha lavrador que o não saiba; por tanto parece-me que ha outras cousas muito mais uteis em que empregar o dinheiro em beneficio da mesma agricultura; que he abrir estradas, canaes, fundar escolas d'agricultura, d'economia politica, e de primeiras letras, etc.

O Sr. Miranda: - He necessario olhar este caso por dois lados. Ou se olha como cousa particular, ou se considera como um estabelecimento publico de agricultura: se o requerente quizesse fazer um estabelecimento publico, por dizer assim, uma escola pratica de agricultura, seria do voto da Commissão, mas não vejo isso; o que vejo he, que he um particular que tem feito os seus ensaios segundo o methodo de sementes alternadas, que tem feito gastos, e pretende se lhe empreste este dinheiro para restabelecer-se. Porém como no caso em que este se acha haverá outros muitos lavradores em Portugal, e não he possivel que com todos se faça o mesmo, não posso approvar o parecer da Commissão. (Apoiado).

O Sr. Camello Fortes: - Este homem o que quer he achar quem lhe empreste dinheiro, talvez não ache um particular, e vem á Nação que lho dê: eu não sei se a Nação está neste caso. Se ella está em estado de precisar de um emprestimo porque não tem, como ha de dar a este homem um dinheiro, no qual não só perde o juro, senão talvez o mesmo capital, porque as fianças não são certas.

O Sr. Soares Franco: - Ha equivocação em alguma cousa do que se tem dito. He necessario
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saber que no terreiro ha um cofre do qual se costuma adiantar aos lavradores dinheiro para as sementes quando tem tido algum contratempo; porém como o maximum do adiantamento he de um conto de réis, e sómente pelo tempo de um anno, este homem recorre por isso ás Cortes porque precisa um emprestimo maior, e por mais tempo. Nestas circunstancias assento; que deferindo a este homem como pede, não se faz, se não estender a autoridade do Governo no que de costume faz.

O Sr. Maldonado: - Acaba de prevenir-me o Sr. Soares; no entretanto sempre proporei este argumento. O terreiro faz estes emprestimos para beneficios ordinarios da agricultura; porque pois o não ha de fazer para beneficios extraordinarios?

O Sr. Borges Carneiro: - O dinheiro verdadeiramente não he do erario, nem da Nação: he aquelle que do cofre do terreiro se applica a esses objectos. Depende pois a questão de saber-se que dinheiro ha naquelle cofre; por tanto sou de parecer, que o requerimento se remetta ao terreiro, para que auxilie esse homem como for possivel.

O Sr. Castello Branco: - Este negocio he publico, ou particular? Eu julgo que particular: he um proprietario que fez suas expeculações agricolas, e hão lhe correspondêrão ao plano que se tinha proposto, como acontece a um negociante n'uma especulação mercantil, ou a outro qualquer num ramo de industria. Querer involver nisto o bem publico, he o que eu não acho coherente. Eu não entendo, que qualquer que seja o ramo de industria; se deva ter em vista se não o bem geral; e não devendo haver beneficiados particulares, devem ser igualmente attendidos todos os que se achem nas mesmas circunstancias. He preciso consultar, se a Nação se acha em estado de poder soccorrer a todos os que precisão de fundos para emprezas particulares.

O Sr. Bettencourt: - Eu falo nesta materia por ser membro da Commissão, e não por outra razão. Eu já disse a alguns dos meus collegas da Commissão que decerto o parecer não era approvado, por isso que he negocio de agricultura, porque em o nosso paiz não tem sido esta muito feliz. Que realmente neste negocio estão todos a falar sem ter conhecimento de causa, he verdade. Este homem não vem a pedir, senão que se indique ao Governo, que aquelle beneficio, que sempre se tem feito aos lavradores em circunstancias particulares, seja mais extensivo a elle. Elle não vem a pedir esmola, porque se tem feito muitas esmolas: ainda este anno se tem applicado sincoenta e tantos contos do dinheiro destinado para estes objectos a cousas muito diversas; e oxalá se tivessem applicado ao que se deveria applicar. Tornando á questão digo; que este homem por seu zelo, e pelo amor á sua patria tem feito uma verdadeira escolla, de que seus visinhos começárão a tirar interesse, particularmente o de fazer queijos e manteigas, por uma fabrica que elle inventou. Oxalá tivessemos muitos homens desta classe, não veriamos sair tantas sommas, para procurarmos manteiga, como até agora tem saído, e sáe; porque esse genero tem vindo a ser um objecto de primeira necessidade. Digo, que este homem vem a pedir, que aquillo que se facilita aos outros lavradores se lhe facilite a elle só com a differença, que em vez de se por sete ou outro mezes, seja de quatro annos. Por consequencia a cousa não he tão grande como se pensa, eu a julgo justa, e appoio o parecer da Commissão.

O Sr. Peixoto: - O supplicante emprehendeu essa bemfeitoria que allega com o unico fim de melhorar a sua propriedade: se acertou está permeado: se errou, a sí se torne; e calcule com mais attenção para a outra vez. Não havia cousa melhor do que especular cada um para si sómente, sem consultar o Governo; e exigir depois do publico a idemnisação das perdas, devidas talvez aos seus desvarios. Se a este sujeito se concedesse uma tal graça, virião muitos outros, e talvez com melhores razões, solicitar igual contemplação; e não haveria cofre que fizesse frente a taes saques.

Ouvi dizer; que assim como o cofre do terreiro faz aos lavradores adiantamentos ordinarios por alguns mezes, tambem póde fazer este emprestimo extraordinario. Respondo; que para o cofre continuar com os ordinarios, he que não deve distrair os seus fundos para os extraordinarios. Tambem se disse; que do cofre se tinhão adiantado mais de sincoenta contos de reis a varios lavradores para sementes, por occasião de se lhe haverem arruinado as searas: mas esta razão he contra producentem. Para acudir com sementes aos lavradores; que soffrerão uma tal calamidade, á qual não podião resistir, he que deve ser especialmente consagrado um tal deposito. Em fim; se o supplicante está nos termos de receber algum soccorro, habelite-se aonde compete; porque he improprio das Cortes o estarem dispondo sobre objectos particulares, de que os seus membros em geral não podem estar instruidos.

O Sr. Fernandes Thomaz: - Este negocio he meramente particular. Eu desejo que o homem seja favorecido; mas que o seja pelos meios competentes, e pelas pessoas a quem pertence. Sabemos nós se este homem he um impostor? Eu sou o primeiro que creio que o não he; mas que razão ha para dizer sim ou não? Por outro lado, não he ao Governo a quem pertence promover a dustria e a agricultura, segundo as leis por que está autorisado? Pois a elle he a quem compete deferir. Quando não haja lei, ou precise de uma nova para fazer estes beneficios; ao Governo pertence perguntar ao Congresso. Por agora o que se sabe he, que um homem requer, e que se diz, que o que tem feito he util. Eu não me contento com isto, he necessario que o Governo tome conhecimento, e saiba se he assim, de maneira a se faça presente ao Congresso que esse homem merece esta graça especial; porque eu considero como graça especial o que pede; porque o mesmo direito tem elle que outro, que diga, eu quero ser auxiliado porque vou melhorar uma terra. Por tanto, que o Governo examine, pois pelo menos nada se póde resolver sem um perfeito conhecimento.

O Sr. Moura: - Eu sou a favor deste homem, e por uma razão de justiça, e de grande justiça, ainda mesmo não considerando as suas circunstancias.

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particulares, porque a este respeito convenho em que se devem pedir informações ao Governo. Tem-se dito que este homem he um mero particular, e que tudo quanto tem feito não se deve considerar como um estabelecimento publico de agricultura; convirei nisto mesmo. Mas os auxilios que se devem dar aos agricultores não dependem de serem publicos ou particulares os objectos de seus trabalhos. Ha um cofre no Terreiro publico desta cidade que costuma dar dinheiro aos lavradores de Riba-Tejo, por certo tempo com as seguranças precisas, para elles se restabelecerem de alguma desgraça particular, e melhorarem os seus predios. Pergunto; estas applicações que se fazem deste dinheiro são para utilidade particular dos lavradores necessitados, ou para a necessidade publica? Não póde deixar de se me responder, que com estes auxilios se attende directamente á utilidade particular, ainda que dahi possa indirectamente resultar a utilidade publica do Estado. Pois eu acho que este homem está nas mesmas circunstancias, só com uma differença, que o Terreiro não costuma fazer aquelles emprestimos por mais de seis mezes ou um anno, e o que agora se requer he que aqui se faça por quatro. For esta razão não se póde dizer ao Governo que defira seu requerimento; porque elle consultaria o regulamento do Terreiro, e segundo o dito regulamento não poderia deferir-lhe; sendo que o pedir por mais ou menos tempo o dinheiro, he a razão por que deve ou não deve ser deferido. Nunca porém se dê em razão que senão defere porque he negocio de um particular, e não interessa a utilidade geral. Eu digo que a agricultura só prosperará facilitando-se-lhe estes auxilios e estes meios, e não com theorias vãs. He verdade que não podemos franquear estes auxilios a todos os lavradores; mas ha um cofre destinado para soccorrer aos que se achão em taes e taes circunstancias: veja-se se este homem está nessas circunstancias, e estando-o deve ser igualmente soccorrido. Para que he estudar theorias agronomicas? O lavrador entre nós só precisa de meios, e de que lhe removão estorvos, e nada mais. Por tanto indique-se ao Governo que tome a este respeito as informações precisas, e que veja se o lavrador de quem se trata está nas circunstancias em que se achão os de Riba Téjo, quando são soccorridos, e soccorrão-no sem demora, que para isso he destinado esse dinheiro. Esta he a minha opinião.

O Sr. Peixoto: - O cofre ao Terreiro está franco, e patente para todos aquelles lavradores que estão nas circunstancias do regimento ou estilo que aos seus admnistradores serve de norma: se porém nos constar que os seus fundos tem força para prestarem maiores socorros, e por tempo mais dilatado, calcule-se a extensão que se lhes póde dar; faça-se novo regimento, e então, se o requerente for dos comprehendidos nelle, attenda-se; aliás fique excluido como os mais que estiverem nas suas circunstancias; de maneira que ninguem possa queixar-se, attribuindo ao Congresso parcialidade em favor de um ou de outro individuo. Quanto mais, que eu ouvi falar em atrazamento por causa de plantações de vinhas; e aquelle cofre he destinado ao auxilio de lavoura dos cereaes exclusivamente.
O Sr. Alves do Rio informou detidamente ácerca do regulamento do Terreiro, e concluio votando que se deve autorisar o Governo, para que achando naquellas circunstancias o supplicante, seja soccorrido como pede.

Tendo-se julgado sufficientemente discutido este parecer; foi posto a votos, e não foi approvado.

Poz-se a votos igualmente, se o requerimento seria remettido ao Governo, e se resolveu, que não se remetta.
O mesmo Sr. Bettencourt leu mais os seguintes

PARECERES.

Os lavradores dos Campos, e bairros da villa de Santarem representão por petição assignada por 75.

Que uma das causas mais oppostas ao augmento, e ainda á conservação da agricultura, he o excesso a que os jornaleiros, e mancebos tem feito subir seus jornaes, ou paga dos seus serviços campestres, pois que sem lhe ser pago quanto elles querem, e entre si convencionão em fórma de monopolio, se recusão ao trabalho, vivem no ocio, e na mendicidade, trabalhando apenas em algum dia, quando tem maior necessidade; de maneira que aos recorrentes he mais util diminuir a cultura, do que consumir toda a sua producção no pagamento dos indispensaveis serviços.

Pedem por tanto a este Augusto Congresso, que mande observar o determinado pela Ord. I. 1.° tit. 66 § 32, nas Cortes de Coimbra de 1434, e no decreto de 15 de Junho de 1756, em que se mandárão taxar, e taxárão os ditos jornaes, e proceder contra os infractores.

Parece á Commissão de agricultura que por uma parte será providenciada a pertenção dos recorrentes, executando-se inteiramente as leis existentes contra os vadios, e mendigos, que podem trabalhar; devendo até ser denunciados as competentes autoridades para contra elles procederem. E por outra, que o remedio lembrado pelos mesmos recorrentes he totalmente opposto ao systema constitucional, opressivo da liberdade do cidadão, e prohibido já pela Ord. I. 4.º tit. 11, que não permitte ser qualquer obrigado a vender, ou locar o que he seu contra sua vontade; e pela provisão do Desembargo do Paço expedida a todos os magistrados sobre este mesmo objecto em 7 de Junho de 1814 com o fundamento de estarem já, em desuso aquellas leis.

Julga por tanto a Commissão indeferivel o requerimento dos recorrentes.

Lisboa. Paço das Cortes 12 de Setembro de 1821. - Francisco de Lemos Bettencourt, Pedro José Lopes de Almeida, Caetano Rodrigues de Macedo, Antonio Lobo de Barbosa Ferreira Teixeira Girão.

A Commissão d'Agricultura examinou os officios, que por copia tinha remettido ao Governo o visitador dos portos secos da provincia da Beira, e que em 30 de Julho forão transmittidos ás Cortes pela Secretaria d'Estado dos negocios do Reino.

Versão estes officios sobre duvidas, cuja resolução pertence ao Soberano Congresso, como se passa a referir.

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Constou ao juiz de fóra de Castello Branco, que havendo no seu districto uma povoação chamada Malpica, fronteira, e muito proxima ao povo de Ferreira no Reino da Hespanha, e costumando os moradores della de tempos antigos fazer parte das suas lavouras no districto de Ferreira, e conduzir depois, para suas casas os frutos que recolhião pertendião continuar no seu antigo costume: considerando porém aquelle magistrado que taes fructos, apezar de serem de industria portugueza, erão producção do territorio hespanhol, ordenou aos juizes que obstassem á sua passagem até nova ordem. Constando-lhe igualmente que os moradores de Malpica tinhao por costume ir moer o seu pão nos mezes do estio aos moinhos de Ferreira, por lhes ficarem mais proximos, mandou que tal não praticassem, e que fosse aprehendida a farinha, que em contravenção do seu mandado, viesse do territorio hespanhol.

De tudo isto deu parte o dito juiz de fora ao visitador das provincias da Beira, e Traz-os-Montes, em officio de 19 de Julho, para que este lhe determinasse o que devia continuar a praticar para o futuro a similhante respeito. Respondeu promptamente o visitador ao juiz de fóra de Castello Branco, em officio de 20 de Julho, dizendo-lhe que a decisão das duvidas, que se lhe tinhão offerecido, dependia de uma declaração da lei, e por isso as levava á presença de Sua Magestade para que fossem resolvidas onde conviesse; mas que interinamente lhe participava a sua particular opinião, e vinha a ser 1.º que lhe parecia que a lei não quiz privar os portuguezes de qualquer propriedade, ou uso-fruto, que tivessem em territorio hespanhol, o que indirectamente succederia se lhes fosse prohibido trazer para sua casa os fructos que alli colhem: 2.º que tambem se não persuade que a lei quizesse privar os povos da raia de ir moer o seu pão em Hespanha, quando não tenhão commodidade em Portugal; mas que podendo por ambos esses motivos commetter-se grandes abusos, era do dever delle, juiz de fóra tomar todas as medidas para os evitar.

A Commissão d'agricultura não approva em geral e principio de que seja licito conduzir para este Reino os fructos creados no territorial hespanhol pelo simples facto de serem devidos á industria, e trabalho de lavradores portuguezes; porque com este pretexto se podia dar azo á introducção de uma quantidade illimitada de generos cereaes daquelle paiz: mas reflectindo que os moradores de Malpica de certo não terião por costume cultivar as terras situadas alem da fronteira em tempo, em que não era vedada a introducção dos grãos estrangeiros, se acaso o seu districto lhes offerecesse em quantidade sufficiente terrenos susceptiveis de cultura, he de parecer que se lhes permitta o transportarem para a sua povoação os fructos que segundo o costume colherem no districto de Ferreira, com as mesmas cautelas, com que se facultou aos moradores de Jerumenha a importação dos fructos das suas terras, situadas no territorio Hespanhol, as quaes se achão declarados em uma das ordens das Cortes transmittidas ao Secretario d'Estado dos negocios do Reino em 4 de Agosto. Igualmente he de parecer a Commissão que em quanto subsistir a necessidade que tem tido os moradores de Malpica de ir moer o seu pão nos moinhos de Ferreira, possão continuar a ir alli moêlo no tempo do estio; mas que se alguem abusar desta permissão, alem de incorrer na pena imposta por decreto de 18 de Abril aos importadores de generos cereaes prohibidos, fique para sempre inhibido de se aproveitar della; e que alem disto seja obrigado o Juiz, debaixo de rigorosa responsabilidade, a vigiar que se não illuda com este pretexto a disposição do citado decreto. - Sala das Cortes 22 de Novembro de 1821. - Caetano Rodrigues de Macedo, Antonio Lobo de Barbosa Ferreira Teixeira Gyrão, Francisco Antonio de Almeida Moraes Pessanha, Francisco Soaras Franco, Francisco de Lemos Bettencourt.
Forão ambos approvados.

O Sr. Miranda, por parte da Commissão de artes e manufacturas, deu conta dos seguintes

PARECERES.

A Commissão das artes e manufacturas considerando o estado actual do thesouro, e que o Governo nem deve estabelecer fabricas por sua conta, nem tão pouco confiar muito nos estabelecimentos cujos progressos dependem dos seus immediatos auxilios, a pezar dos mais pomposos annuncios, julga devem ser indeferidos os seguintes requerimentos.

1.º O de D. Luiza Leonor de Santo Orans Mourão Macklin em que pede uma ajuda de custo de 500 a 600$ réis para estabelecer uma fabrica de grudes. Este requerimento tinha sido favoravelmente consultado pela junta do commercio, foi porém escusado pela Regencia do Reino em 18 do passado mez de Abril; e tanto a consulta como o requerimento vierão ás Cortes por assim o haver ella requerido, queixando-se de delongas que não erão taes como alegava, e occultando o principal fundamento porque a Regencia o havia escusado.

2.º O de Izidoro Schiapa Pietra, em que representa a utilidade que resultaria á Nação de estabelecer-se por conta do Governo uma fabrica de panno de linho na villa de Azeitão, e em que pede ser nella empregado como instructor, e director, com o ordenado que merecesse pela sua aptidão.

3.º O de Jeronymo Vaz Vieira de Mello e Napoles, da villa de Guimarães, em que, para estabelecer uma fabrica de panno de linho, pede a quantia de vinte contos; a saber: 8:834$260 réis em pagamento de quantias de que he credor ao thesouro, e 11:165$740 réis de emprestimo, que affiança por seus bens, e se propõe satisfazer em pagamentos annuaes de um conto de réis, entrando neste pagamento a quantia de 511$630 réis, que vence cada anno em padrões de juro.

Paço das Cortes em 24 de Outubro de 1821. - Manoel Gonçalves de Miranda; Hermano Jose Braamcamp de Sobral; Thomé Rodrigues Sobral; Vicente Antonio da Silva Corrêa.

A Commissão das artes, e manufacturas examinou os requerimentos seguintes, sobre que apresenta os pareceres respectivos.

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1.º Sobre o de Antonio da Silva, Antonio Pereira, e outros officiaes cabouqueiros da cidade do Porto e seu termo, cujo officio he simplesmente arrancar e cortar pedra, em que pedem ser eximidos do exame e taxa correspondente cio officio de pedreiros, que não exercitão, e a que estes querem compelidos, e continuarem no livre exercicio de um trabalho que sempre sem estorvo exercerão, parece á Commissão muito justo o requerimento dos supplicantes, e que deve deferir-se-lhe como pedem.

2.° Sobre dous requerimentos, um dos juizes e mestres dos officios de espingardeiro e coronheiro das cidades do Porto e Braga em que pedem se prohiba a introducção de armas estrangeiras, e outro de Lourenço de Sousa Pinto juiz do officio de cordoeiro e outros officiaes cordoeiros da cidade do Porto em que tambem pedem se prohiba a introducção de massame estrangeiro, parece á Commissão que ambos elles não tem lugar em quanto se achar em vigor o tratado de 1810; porém em devido tempo serão dignos da mais séria attenção.

3.º Sobre o dos officiaes fabricantes de chapeos, desta cidade, em que requerem que os donos e credores destas fabricas sejão obrigados a por á testa dellas officiaes approvados, e que nellas não possão ter senão um limitado numero de aprendizes, parece a Commissão inadmissivel a sua representação, por ser contraria á liberdade de industria, que em vez de se restringir deve ser ampliada quanto for possivel.

4.º Sobre o requerimento de Antonio Rangel de Quadros da cidade de Aveiro, em que pede um privilegio exclusivo por vinte annos para uma vela de eixo fixo, ou passemoro de nova invenção, que elle diz ter descoberto, parece á Commissão que o recorrente não sabe bem avaliar a dificuldade da nova invenção que annuncia; no entretanto elle deve apresentar ao Congresso um modelo, ou o desenho da referida vela, para se lhe deferir como fôr de justiça, na certeza de que sendo a veia de sua invenção pelo menos tão vantajosa como as velas ordinarias de eixo movel, terá uma recompensa muito superior á que elle requer.

Paço das Cortes em 18 de Junho de 1821. - Hermano José Braamcamp de Sobral; Thomé Roiz Sobral; João Pereira da Silva; Francisco Antonio dos Santos; Manoel Gonçalves de Miranda.
Forão todos approvados.

O Sr. Luiz Monteiro, por parte da Commissão do commercio, deu conta do seguinte parecer.

A Commissão do commercio veio dirigido um requerimento de oito corretores do numero dos desta cidade, em que se queixão de que sendo fixado por lei o numero dos corretores unicamente a doze, todos nacionaes, e juramentados, o Senado da camara tem permittido a estrangeiros de differentes nações e religiões o poderem exercer um tal emprego, tornando assim o seu numero indefinito; e pedem em consequencia que sejão anullados e cassados taes provimentos passados a estrangeiros, ficando estes prohibidos, debaixo das penas impostas aos Zangaos, a exercerem mais similhantes empregos.

A Commissão pediu a este respeito informações á Junta do commercio: esta mandou ouvir os commerciantes, e Juizes Conservador e Fiscal, e todos informarão que o numero era restricto unicamente a doze, e que não sabem em que titulo o Senado da Camara se fundara para prover alem deste numero, que foi fixado expressamente pelos Srs. Reis D. Manoel, e D. João II., até que o augmento do commercio não exigisse outro maior. Que os Inglezes restringem esta occupação aos naturaes do paiz, e que professão a religião dominante. Os Francezes tem um artigo proprio a respeito dos corretores, de que excluem os commerciantes francezes fallidos, em quanto não provão sua boa fé; e he pratica constante em todas as Nações civilisadas não admittirem para corretores senão os naturaes do paiz.

A Commissão do commercio conformando-se com a consulta da Junta, nada acha mais justo do que serem preferidos sempre os nacionaes aos estrangeiros. A commissão he por tanto de parecer que os corretores devem ser todos portuguezes, ou pelo menos naturalizados, e que nenhuns outros possão intervir em quaesquer transacções commerciaes senão elles. Achando-se porém o seu regimento, além de muito antigo, em desuso, e sendo aliás o mesmo pouco conforme ao augmento do commercio, e estado actual das cousas; parece tambem á Commissão ser de absoluta necessidade um novo regimento, a que deva logo proceder-se, sobre as bases de uma perfeita liberdade dos negociantes, e da responsabilidade individual dos corretores, e sua rigorosa obrigação de não fazerem jámais negocio algum de conta propria; as quaes se achão mais desenvolvidas no esboço junto, que offerece o illustre Deputado, que se acha incumbido do codigo mercantil. - Lisboa 20 de Novembro de 1821. - Francisco Antonio dos Santos, Luiz Monteiro.

Regimento dos Agentes de cambio, e Corretores.

Artigo 1.° Só podem ser agentes de cambio, e corretores os Portuguezes, que tiverem curso completo nas aulas de commercio de Lisboa, e Porto; que forem pessoas de boa vida e costumes, e probidade provada, e que tiverem conhecimentos praticos de commercio verificados por exame publico.

Art. 2.º Os filhos familias, menores de 25 annos; os fallidos; e os que tiverem sido condemnados em qualquer crime não podem ser agentes de cambios, nem corretores.

Art. 3.º Na junta do commercio, ou no tribunal do commercio, que a substituir, se farão as habilitações, exames, e provas necessarias; tornar-se-lhe-ha juramento, e se lhe passará provimento gratuitamente, cujo effeito não durará, mais que um anno.

Art. 4.º Haverá agentes de cambios, corretores de seguros, de fazendas, de fretamentos, e corretores interpretes.

Art. 5.º Os agentes de cambios, devem ter um perfeito conhecimento dos valores dos metaes, moedas, e dinheiros de cambios de todos os paizes commerciantes, das leis, e estilos das principaes praças da europa, que regulão este contracto. - Elles são
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obrigados a apresentar diariamente na junta, ou tribunal do commercio uma cedula do curso dos cambios do dia, agio do papel moeda, e de quaesquer papeis de credito publico negociaveis para ser impressa no diario do Governo, ou folha mercantil. - Esta cédula tem o cunho de autenticidade.

Art. 6.º Os agentes de cambios, respondem pela verdade das firmas das letras, ou obrigações cherografarias em que entrevem.

Art. 7.º Os corretores de seguros, e fretamentos devem ter conhecimento perfeito das leis, e pratica das condições, e clausulas, e natureza destes contractos. Elles respondem pela verdade das assignaturas das apolices, cartas-partidas, e conhecimentos, e identidade das pessoas contrahentes; autenticão as clausulas destas convenções por seus protocolos, e o curso dos premios do seguro, nas cedulas, que imprimem.

Art. 8.º Os corretores de fazendas intervem nas compras, e vendas, trocas, cessões, carregações, e descargas, commissões, e despachos de fazendas, e, quaesquer outros contractos commerciaes, do que devem igualmente possuir conhecimentos exactos. - Elles são obrigados a apresentar tres vezes por semana cedulas dos preços correntes para serem impressos na maneira acima.

Art. 9.º Os corretores de fazendas podem fazer a corretagem das materias, e especies metalicas; porém não podem autentificar-lhes o curso.

Art. 10.° Os corretores interpretes devem ter conhecimentos das diversas lingoas, em que pretenderem habilitar-se taes. - São elles os traductores privativos dos documentos, que tenhão do produzir-se em juizo. - Elles intrevem exclusivamente em quaesquer convenções das acima mencionadas, passadas entre estrangeiros de ambas, ou de uma das partes.

Art. 11.° Ninguem he obrigado a empregar corretor, ou agente de cambios em suas transacções: porém ninguem poderá servir-se de pessoa alguma intermedia no contracto, salvo de corretor, ou agente de cambios, pena de nullidade do contracto. Esta disposição não comprehende os empregados do escriptorio de qualquer negociante.

Art. 12.° Os agentes de cambios, ou corretores percebem a corretagem do estilo da praça.

Art. 13.º Os agentes de cambio, e corretores são obrigados a ter um protocolo rubricado, e encerrado por um Deputado da junta, ou tribunal do commercio, no qual lançarão chronologicamente as transacções, em que intervierem, resumidas na substancia; e terão este livro limpo, sem lacunas, razuras, inversão de datas, nem cousa, que o torne suspeito de falsidade: delle passarão certidões, que terão fé em juizo, e as quaes serão contadas segundo o regimento dos tabelliães, cujo officio exercem, tem as suas obrigações, e respondem como elles por suas prevaricações, erros, e crimes.

Art. 14.º O agente de cambios, e corredor não póde negociar por si, ou interposta pessoa, pena de perdimento d'officio, e inhabilidade perpetua para este, ou qualquer outro officio de justiça, ou fazenda.

Art. 15.º Os agentes de cambios, e corretores respondem pela identidade das pessoas, com quem annuncião haver tratado.

Art. 16.º O numero dos agentos de cambio, e corretores he indefinido. Elles não constituem sociedade, ou corporação. Adquirem solidariamente suas corretagens; assim como solidariamente respondem por suas obrigações.

Art. 17.° Os agentes de cambios, e corretores devem assistir diariamente por turno na praça do Commercio nas horas della, permanecendo ali ao menos um de cada especie; e o turno será semanariamente regulado pela junta, ou tribunal do commercio.

Art. 18.º Os agentes de cambios, e corretores não conhecem em respeito as obrigações de seu officio outro tribunal senão a junta ou tribunal de commercio, que a substituir.

Art. 19.° Este regimento terá inteira observancia ate á formação do codigo de commercio, e por elle ficão revogadas todas as leis em contrario. - José Ferreira Borges.

Votou-se por partes o parecer da Commissão, e foi approvada a primeira parte, isto he, que não possão ser corretores senão os Portuguezes; e em quanto á segunda, que fazia respeito á formação do novo regimento, se resolveu que ficasse addiada para ser discutido o apresentado pelo Sr. Ferreira Borges.
Tendo chegado a hora da prolongação o Sr. Presidente ia a suspender os pareceres das Commissões; porém o Sr. Maldonado, disse: a Commissão de constituição tem que dar o seu parecer sobre um negocio em que se trata, ou de castigar um grande criminoso, ou de desafrontar a innocencia opprimida; tal he ocaso do Conde dos Arcos. Segundo o que nos annunciou antes de ontem o Sr. Pereira do Carmo, o parecer está feito, e por falta de tempo he, que se não leu hoje faz oito dias. A importancia do negocio me faz pedir que se não fexe a sessão sem que se faça esta leitura. Decidiu-se, que a Commissão de constituição désse conta, e o Sr. Moura em nome da mesma leu o seguinte parecer.

A Commissão de Constituição havendo visto a inclusa petição de Francisco de Borja Garção Stokler, e as razões que allega da ruina da sua saude, com as attestações de facultativos, para obter uma homenagem, he de parecer que se remettão estes papeis ao Governo, ficando este autorisado, para prover como for conforme á justiça.

Sala das Cortes 20 de Novembro de 1821. - Manoel Borges Carneiro; José Joaquim Ferreira de Moura; Manoel Fernandes Thomaz; Bento Pereira do Carmo; João Maria Soares de Castello Branco.

O Sr. Alves do Rio: - Eu não digo que se não faça, o que propõe a Commissão; mas que o Governo responda por Stokler, como se fez responsavel pelo Conde dos Arcos.

O Sr. Borges Carneiro: - Stokler expressa que está muito enfermo, e que está prezo n'uma casa em que nunca entra o Sol, e onde sómente ha uma janella por onde entra o vento do Norte, o que lhe arruina a saude, e por tanto pede se lhe dê homena-

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gem: ha homenagem de cidade, de castello etc. pareceu pois á Commissão que seu requerimento fosse remettido ao Governo para proceder como julgar justo. Nisto a Commissão julgou igualmente obrar com justiça. Diz-se, que se o partido antiliberal prevalecesse contra nós talvez seriamos conduzidos ao cadafalso, e acaso seria verdade; mas nós não devemos proceder senão com justiça, e generosidade, muito particularmente na boa marcha que leva a nossa regeneração.

O Sr. Alves do Rio: - Eu não me opponho a isso; mas o que digo he, que acho uma certa incoherencia, em que o requerimento do Conde dos Arcos se remetteu ao Governo para que mandasse informar, se era certo o que expunha, e o pozesse em lugar seguro; e agora vejo que o requerimento de Stokler se manda ao Governo sem alguma condição. Digo tambem que isto me parece tanto mais reparavel, quanto que Stokler se acha iniciado de crimes horrorosos contra a Constituição: eu não digo que estes crimes sejão certos; mas presentemente se anda tirando uma devassa delle, da qual não se sabe até agora o resultado. Por tanto me parece, que o Governo deveria responder por Stokler, assim como se fez responder pelo Conde dos Arcos.

O Sr. Castello Branco: - Accusa-se a Commissão de Constituição de incoherencia: eu sou membro da Commissão, e devo responder a esta inculpação. He preciso trazer á memoria o procedimento da Commissão a respeito dos dois individuos: o Conde dos Arcos, e o General Stokler. Primeiramente o Conde dos Arcos depois de ser prezo na Torre de Belem requereu para ser tirado daquella prisão aonde sua saude perigava. O parecer da Commissão foi não que se puzesse em liberdade, senão que se trasladasse a uma prisão mais commoda, visto que elle expunha, que na em que se achava, perigava a sua vida, e por todos os principios de humanidade, e de justiça não se devia querer que se lhe aggravasse o mal. Tal foi o parecer da Commissão que o Soberano Congresso sanccionou. Depois disto requereu, Stokler pedindo homenagem: este requerimento foi remettido ao Governo, o qual decidiu, que como se tinha dado ordem ao Ministro para devassar, quando fosse posto em juizo então poderia pedir homenagem ao juiz competente, o qual lha poderia negar ou conceder na fórma das leis. Tal foi em ambos os casos o parecer da Commissão, e a decisão do Congresso; por tanto não acho essa incoherencia que se nota. Agora tanto um como outro requerem segunda vez ao Congresso incluindo varias attestações. O illustre membro accusa de incoherencia a Commissão ouvindo só o parecer que dá sobre o primeiro: se tivesse esperado a ouvir o parecer do segundo não teria lugar a accusar dessa incoherencia. Em quanto a Stokler esse pede homenagem, e se realmente prova que o estado da sua saude he tal, que por permanecer naquella Torre periga a sua saude, nem o Congresso quererá tal cousa, nem poderia querer-se no estado de luzes, e, illustração do seculo actual.

O Sr. Fernandes Thomaz: - He preciso não confundir as idéas de prizão, e de homenagem, pois são muito diferentes. Todos conhecem que não se póde querer, que Stockler, nem ninguem, esteja em uma má prizão; mas isto he differente de homenagem; e digo, ninguem, porque todos os homens tem nome diante deste Congresso, todos são cidadãos; todos são considerados do mesmo modo; porém que he Stockler? He um prezo: se está enfermo deve ir para a enfermaria. A homenagem pertence concedela ao Poder judiciario, a qual só o póde conceder neste caso á vista das culpas que resultem da devassa, que contra o réo se está tirando; mas como a ha de conceder sem saber toda a extensão destas culpas, aliás mui grandes, pois até se sabe, que na prizão escreve e publica impressos em que chama perfidos aos que proclamarão a liberdade na ilha Terceira. A pesar de tudo se está doente pede a humanidade, (não por ser Stockler senão por ser um cidadão) que seja mudado a outra parte aonde esteja mais commodamente, mas não se entenda isto por homenagem.

O Sr. Brito: - Um homem como o General Slockler, que sabendo que o querião prender, elle mesmo veio acudir á prizão, parece que he digno de homenagem. Tem-se confundido erros politicos com crimes. Slockler duvidou jurar as bases da Constituição porque entendeu talvez que era da sua honra sustentar a provincia que tinha jurado, sustentar em nome do Rei: em consequencia duvidou acceder ao nosso pacto social. Estes são erros politicos, e talvez da devassa não resulte nada do que se tem dito contra elle.

O Sr. Castello Branco: - Eu não apoio o homem, senão a razão. Se o Governo julga que se lhe deve mudar de prizão, elle o fará: a Commissão não fala em homenagem; nem diz outra cousa senão que vá o requerimento ao Governo.
Julgou-se sufficientemente discutido o parecer da Commissão, e foi approvado.
O Sr. Moura, leu o seguinte

PARECER.

A Commissão de Constituição tendo presente a summario de testemunhas, tiradas pelo Corregedor, do Crime da Corte, sobre as arguições feitas pela Junta da Bahia ao Conde dos Arcos; e bem assim a memoria justificativa offerecida pelo Conde, para aclarar mais este negocio; vai fazer uma exacta e imparcial narração de todo elle, para depois assentar seu parecer, que o Soberano Congresso avaliará com a justiça e dignidade que he propria desta Augusta Assemblea.
A Junta da Bahia em officio de 20 de Junho participou ao Ministro que então era da Marinha, Francisco Maximiliano de Sousa, que o Conde dos Arcos aportára em costodia áquella cidade (no brigue Treze de Maio) sáhido do Rio de Janeiro a 10 de Junho, em consequencia dos memoraveis acontecimentos do dia 5: e que havendo muitos Membros da Junta recebido varias cartas de pessoas de intima confiança, escrupulosa probidade, e decidido amor pela Monarquia, que denunciavão o Conde como chefe da mais exacranda conspiração contra os interesses da Nação, e do Rei; fizera assignar um termo de res-

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ponsabilidade ao commandante do brigue, para se dirigir em direita viagem a Lisboa, aonde devia entregar o Conde.

Como este officio foi o que deu azo á prizão do Conde dos Arcos, julgou a Commissão que devia chamar a attenção Congresso sobre o seu conteudo, que se reduz aos tres artigos seguintes: 1.º o Conde dos Arcos vinha em custodia do Rio de Janeiro: 2.º foi denunciado pela Junta da Bahia como chefe da mais execranda conspiração: 3.º as provas do crime forao cartas recebidas por muitos membros da Junta, e vindas de pessoas de intima confiança, escrupulosa probidade, e decidido amor pela Monarquia. Em quanto ao primeiro; fica desvanecido completamente pelo documento que ajunta o Conde com o n.º 3.º que vem a ser a licença lançada pelo proprio punho do Principe Real, e concedida á filha do Conde para acompanhar seu pai: a licença he concebida nestes termos: A sua filha dou licença para o acompanhar para Lisboa, para onde V. ex. ha de ir neste correio com bem sentimento deste seu amo e amigo.

Em quanto ao segundo; nota a Commissão que he principio hoje reconhecido, e adoptado pela jurisprudencia criminal moderna, illustrada pela filosofia, que quanto maior he o crime, maior, e mais decisiva deve ser a sua prova: nota bem assim, que uma conspiração contra o Estado he o maior de todos os crimes na ordem social, e consequentemente exige a maior de todas as provas. Ora estas provas não são certamente as que se declárão no terceiro artigo, isto he, cartas que se não apresentão, e de pessoas que se não nomeião.

Para encontrar a accusação de conspirador mostra o Conde em sua memoria quaes forão sempre os seus sentimentos politicos, e maximas administrativas, comprovadas nas disposições que constão dos decretos que junta, e de que se torna responsavel; lisonjeando-se de ver alguns unisonos com o que as Cortes tem decretado a duas mil leguas de distancia.

O exame do summario de testemunhas, todas de reconhecido caracter, a que procedeu o Corregedor do Crime da Corte, em virtude da portaria do Governo de 19 de Setembro, vem em apoio do que allega o Conde, e prova sem sombra de duvida não haver existido a accusada conspiração.

Na presença do que fica ponderado parece á Commissão que o Conde dos Arcos deve ser immediatamente restituido á sua inteira e plena liberdade, o que se deve participar ao Governo para sua intelligencia e devida execução.

Paço das Cortes 20 de Novembro de 1821. - Bento Pereira do Carmo, Manoel Borges Carneiro, João Maria Soares Castello Branco, José Joaquim Ferreira de Moura.

O Sr. Castello Branco: - Apezar de ser membro da Commissão opponho-me ao parecer da Commissão; que o Conde seja tirado da prizão não me opponho; mas sim que seja restituido á sua liberdade, em tal sorte que possa ficar em Lisboa; pois eu sem julgalo criminoso não posso ainda julgalo inteiramente innocente; e eu não seria coherente com as minhas opiniões se quando por disconfiança votei, porque se afastassem da Corte alguns dos que vierão com S. Magestade, não votasse pela mesma razão que o Conde seja afastado della. Não seria coherencia, digo, que o Congresso tivesse sanccionado, que os outros permanecessem a vinte leguas distantes da Capital, e que o Conde dos Arcos de quem desconfiamos, podesse viver livremente nella. Convenho pois que saia da prizão; mas que passe pela mesma medida que passarão os outros. Se o Conde dos Arcos vem para a Capital, a justiça pede que venhão os outros tambem.

O Sr. Maldonado: - Parece que o illustre Deputado que acabou de falar está esquecido da decisão do Congresso sobre o negocio do Conde dos Arcos, e parece tambem que não deu toda a attenção ao parecer da Commissão. A decisão do Congresso foi, que se devaçasse do Conde dos Arcos inquerindo as pessoas que do Rio de Janeiro a tinhão vindo para Lisboa; a decisão foi tomada depois de um longo debate; eu então me esforcei para mostrar que tal devassa não era legal; que se devia tirar no Rio de Janeiro; mas o Congresso decidiu o contrario, sanccionou por tanto a sua legalidade, e por esta devassa somos agora obrigados a decidirmos. Que diz a Commissão? - Que da devassa não resulta crime algum ao Conde dos Arcos. - Como he pois que se põem duvidas sobre a sua innocencia? Como se póde opinar, que seja desterrado aquelle que está innocente? Não comprehendo. Pergunto: de que modo se prova a innocencia de qualquer pessoa? Quando se lhe não provão delictos. Todo o homem tem por si a presumpção de que está innocente quando provas legaes o não fazem apparecer delinquente. Isto he o justo; o mais he barbaro, e despotico. Deixemo-nos de despotismos no imperio da lei. Apoio por consequencia o parecer da Commissão; segundo elle o Conde dos Arcos não só he innocente, mas innocentissimo.

O Sr. Brito: - Eu conheço a Bahia, e o Rio de Janeiro, e não tenho duvida em asseverar que a cabala que se formou contra o Conde dos Arcos foi por seus inimigos. Não ha duvida que elle tem muitos na Bahia, e no Rio de Janeiro porque governou com a espada direita, e quando se governa assim facilmente se ganhão inimigos. O Conde dos Arcos não precisa provar sua innocencia, he necessario ter sempre em vista o principio de que um homem he considerado innocente em quanto não se prova contra elle delicto algum. Porém eu posso dizer pelo contrario, que o Conde dos Arcos he um homem justo e sabio, e he por tanto constitucional; porque he necessario ser um patife para não amar a Constituição, e a liberdade. Sabe-se que o Conde dos Arcos he constitucional, e que até aconselhou o Principe Real que jurasse a Constituição. Ha todos estes dados a favor delle, mas ainda que os não houvesse, ninguem deve ser julgado por accusações vagas; e se o Conde dos Arcos he um homem, deve ser favorecido pelas leis igualmente que os outros.

O Sr. Borges Carneiro: - Nós legem habemus: nós temos a lei das bases que diz, que ninguem deve ser preso sem culpa formada; segundo esta lei o Conde não deve estalo. Quando nós não estamos em tem-

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po de perturbação, se não em tempo era que a náu vai em boa viagem, ainda que se receasse deste homem uma sinistra influencia, deveria estar preso não resultando contra elle culpa? Para que se mandou fazer o summario? Para ver se resultava réu: não resultou, e he por tanto o meu parecer que seja inteiramente livre. Não sou de opinião que permaneça a vinte legoas da capital, como se propõe; porque os exemplos para isto apresentados são muito diferentes, e muito diversas as circunstancias daquellas, em que se adoptou essa medida por receio de uma influencia perigosa; mas agora que estamos satisfeitos dos sentimentos constitucionaes de ElRei, e de que a náu vai em boa viagem, não he necessario mais estas precauções.

O Sr. Villela: - Eu não digo que o Conde não seja innocente, e me inclino mais a isto, que a julgalo culpado; porém he aos juizes, e não ao Congresso, a quem pertence julgar de sua culpabilidade, ou de sua innocencia.

O Sr. Castello Branco: - Vejo quanto se está trabalhando por querer impugnar a minha opinião sustentando que o Conde dos Arcos deve ser solto, quando eu não digo o contrario. Tornarei por consequencia a explicar o meu parecer. Diz um honrado membro que o Congresso tinha determinado que se devassasse contra o Conde dos Arcos; mas pergunto eu: decidiu o soberano Congresso que o Conde dos Arcos fosse julgado por esse summario? Certamente que não: por consequencia fica no mesmo estado o negocio do Conde dos Arcos; quando muito essas testemunhas que aqui se tirárão servem para nós podermos formar um juizo mais ou menos favoravel, mais ou menos prejudicial ao dito Conde; e por tanto eu acho que elle não está plenamente justificado, porque ainda não está julgado. Pergunto se he neste Congresso que se pretende julgar o Conde dos Arcos? Não certamente, nem nós temos mais que desconfianças, que em parte se desvanecêrão, e em parte não forão desvanecidas. Não serei eu nunca de opinião que por estas desconfianças exista preso; mas como alguma parte destas desconfianças ainda existe para mim, he por isso que hão posso votar que permaneça livremente na capital, aonde eu o julgo tão perigoso como todos os outros que mandamos affastar della. Diz um honrado membro que a Constituição vai marchando sem tropeços! Isto são palavras: todos conhecem bem que são palavras. Mas se he assim, porque havemos de reter os que estão fóra da capital? Venhão elles, e venha o Conde dos Arcos. Pois as Bases da Constituição hão de servir ao Conde dos Arcos, e aos outros não? (Appoiado) Eu não sou de opinião de que nem se deixe estar livremente na capital o Conde, nem os outros.

O Sr. Maldonado: - A unica medida que o Congresso adoptou para se dicidir sobre as arguições feitas ao Conde dos Arcos, foi mandar devassar delle, ouvindo as pessoas que se achão nesta capital vindas do Rio de Janeiro, para que á vista da devassa se conhecessem os seus crimes ou a sua innocencia. Esta devassa chegou, muitos documentos se lhe ajuntárão, a Commissão de Constituição informa á vista da devassa, e dos documentos: que mais ha de esperar o Congresso? Com que melhor conhecimento de causa se ha de decidir? Deixemo-nos de inculpações vagas; a opinião publica às vezes he a obra de um momento inconsiderado, e a voz de meia duzia de inimigos. A essas inculpações, a essa opinião publica, opponho factos da mais distincta natureza: os documentos testemunhão que o Conde dos Arcos he muito constitucional: todos os decretos lavrados nos 38 dias do seu ultimo ministerio são cheios de liberalidade, e de constitucionalismo. Estando duas mil legoas distante de nós parece que lá estava adevinhando o que se fazia nas Cortes para nos imitar. E querem-no tratar como aquelles a cujos conselhos se attribuem as desgraças da patria?.. Tal procedimento seria summamente injusto, e não quero suppor que possa acontecer: o contrario he da maior justiça. O Conde dos Arcos não só deve ser posto em plena liberdade, elle he credor de muito mais; he minha opinião que deve ser declarado benemerito da patria.

O Sr. Borges Carneiro: - Não trato de averiguar se o Conde he muito bom ou muito mau, trato sómente de averiguar se há causa para que se conserve prezo ou não. Não apparece causa da devassa que se mandou tirar contra elle; por conseguinte deve ser posto em liberdade.

O Sr. Moura: - O meu modo de discorrer a respeito deste negocio he muito simples. Eu não trato de defender o Conde dos Arcos, nem de averiguar se elle he innocente ou se he culpado: trato de fazer observar uma lei de nosso codigo constitucional, e de applicala a este caso; nada mais. Por uma lei constitucional está sanccionado que ninguem possa ser prezo sem culpa formada. O Conde não tem culpa, e está passa de dois mezes, dentro de uma torre! Mas a politica diz:. "Cuidado legisladores! Ha casos em que a salvação do Estado exige que um homem seja prezo sem aquella circunstancia da culpa formada; deste homem se diz que maquinou a separação de Portugal do Brazil; isto são cousas melindrosas, e devem observar-se outras regras, que são na verdade tão sómente applicaveis a casos extraordinarios. Convenho nisto tudo; mas por ventura he tal o caso em que nos achamos a respeito do Conde dos Arcos? Depende a segurança publica da causa, que defendemos, de estar, ou não estar, este homem dentro de uma Torre? Eu chamo a consciencia de todos os que me ouvem, e se algum approvar que póde o nosso estado politico ser offendido por estar o Conde dos Arcos em sua casa; se alguem me fizer crer esta quimera. Convirei que deve estar o Conde n'uma prisão; mas em quanto me não mostrarem esta intima connexão entre a prisão do Conde, e a salvação do Estado, ou a segurança do nosso systema politico, não posso convir dentro de minha consciencia que se haja de fazer uma excepção á sagrada lei das Bases que jurarmos. Destes severos principios não poderei ser facilmente desviado. E se ha alguem, que os contradiga, ou os julgue inaplicaveis, fale, e eu ouvirei com muita docilidade.

O Sr. Bastos: - A que fim ha de ser o Conde dos Arcos retido na prizão? Em pena, ou para segu-
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rança? Em pena não póde ser; porque esta suppõe necessariamente sentença em juizo competente, e nenhuma sentença ha proferida contra o dito Conde: para segurança tambem não, porque elle não he suspeito de fuga, he um grande do Reino, tem muito que perder, e não ha de querer abandonar tudo desterrando-se. Mas quando mesmo podesse haver o receio disso, deveriamos imitar a moderação daquelles povos antigos, que não tratavão de executar penas algumas contra os que espontaneamente se expatriavão. A opinião do Sr. Castello Branco reduz-se a substituir e degredo á prizão: mas como ha de degradar-se um homem, que nem está julgado delinquente, nem o he com effeito, e contra o qual acaba de tirar-se uma devassa, que he uma formal justificação de sua innocencia?

O Sr. Peixoto: - Depois que o Congresso mandou proceder a uma devassa contra o Conde dos Arcos, reservando a si a decisão da sua futura sorte, já não póde deixar de tomar resolução definitiva a respeito delle. Em vista da devassa deve declaralo innocente ou culpado; alias perderia dizer-se, que aquelle procedimento foi um laço, que se armou ao supposto réo para preseguilo se se achasse culpado, e no caso contrario ficar sem effeito a diligencia feita.
A innocencia do denunciado, segundo a Commissão informa, he manifesta á vista da devassa, e documentos; e na verdade o proprio officio da junta do governo da Bahia, unico fundamento das arguições que se lhe fizerão, traz comsigo o cunho da falsidade: para nos convencermos disto, alem das suas incoherencias, basta que começava por dizer, que o Conde vinha do Rio em custodia, quando o contrario se prova por documentos.

Ultimamente a prevenção tomada a respeito dos validos que acompanhárão a Sua Magestade não deve de maneira alguma estender-se ao Conde dos Arcos, não só por estarem em differentes circunstancias; mas porque o Conde acaba de passar por um processo rigoroso, do qual sahio limpo de toda a suspeita; e já que não temos meio de reparar a oppressão, que injustamente soffreu em uma torre, ao menos testemunhemos perante o publico o mais completo reconhecimento da sua innocencia, restituindo-lhe a liberdade sem a menor restricção.

Um Sr. Deputado de Pernambuco: - Quando se resolveu que se tirasse devassa contra o Conde dos Arcos, se resolveu que se tirasse uma aqui e outra na Bahia; faltou a segunda, como podemos pois saber o que lá passou? não posso portanto consideralo livre de toda a suspeita o Conde, ainda que convenho no parecer da Commissão.

O Sr. Braamcamp: - Se a devassa fosse confraria havia de valer: sendo favoravel não: esta he a maior das incoherencias.

O Sr. Fernandes Thomaz: - Não me opponho a que se dê liberdade ao Conde; porém se se lhe permitte estar em Lisboa, hei de requerer que venhão todos os outros, a quem até aqui não se tem permittido vir. Eu não digo que o Conde seja innocente ou culpado, isto o dirá a historia, e talvez antes de poucos mezes. Tem-se dito que foi muito boa a sua administração: eu poderia mostrar como foi, e apresentar factos, pois não quero passar por calumniador. Tem-se falado do seu constitucionalismo e da sua liberalidade; em prova desta se poderia apresentar como facto o ter deixado livre a Targini, dar suas contas por feitas, e com uma pensão de quatro mil cruzados. Tambem tem-se dito que elle não queria a independencia do Brazil; mas sabe-se que mandára arrombar os caixões, e separar para vir para Portugal o que pertencia a Portugal, ficando com o que pertencia ao Brazil. Eu tambem poderia dizer do modo por que comprou quintas, fez casas, etc. etc. o que não digo porque não he objecto de questão; mas basta dizer-se que a opinião publica o julgou indigno do ministerio, e como tal fôra deposto; e saiu do Brazil não como um ministro, senão como um furagido: esse bilhete que o Principe lhe deu foi para que podesse sair, porque senão sabe Deus o que seria. Eu dão digo isto para fazer um mal a elle, mas o digo para fazer a outros um bem. Se ninguem póde dizer que o Conde dos Arcos he culpado, ninguem póde dizer que he innocente: mas torno a dizer que se se requeressem alguns factos, eu os poderia apontar, concluo, que se ao Conde dos Arcos se permitte ficar em Lisboa, o mesmo se deve praticar com os outros.

O Sr. Sarmento: - Para não poder ser eu amigo do Conde dos Arcos basta saber o arbitrario facto, que commetteu de fazer arcabuzar um clerigo na Bahia, desprezando as formalidades da lei da sua patria, quando recorreu a um procedimento arbitrario á vista de um tribunal de justiça, que era a Relação da Bahia. Voto todavia porque elle seja posto em liberdade, porque não quereria nunca que as decisões deste Augusto Congresso se pareção com as do Conde, e julgo que elle deve ser protegido pelas bases da Constituição, a cujo abrigo deverão recorrer todos os portuguezes opprimidos, e achar segura protecção.
Julgou-se sufficientemente discutido o parecer da Commissão, foi posto a votos, e approvado.

O Sr. Freire leu a seguinte

INDICAÇÃO.

Tem chegado o fim do anno, e o Congresso não sabe, devendo saber já, qual he o orçamento das despezas para 1822, e qual o meio, e methodo de haver os recursos, e subsidios para ellas. Em quanto assim fomos, caminharemos ás escuras, e a ruina da Nação deve ser infallivel.

Proponho que se mande ordem ao Ministro da fazenda para apresentar aquelle orçamento que deve ser feito acompanhado do plano para o realisar.

E proponho tambem que tirados os dias em que deve continuar a discutir-se a Constituição, todos os mais sejão consagrados á discussão deste objecto, pois que as Cortes não tem outro que lhe deva dar maior cuidado. Salão das Cortes 27 de Novembro de 1821 - Manoel Fernandes Thomaz.

Foi approvada a 1.ª parte da indicação, e mandou-se reservar o resto para Segunda leitura.

Designou o Sr. Presidente para a ordem do dia

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a continuação do projecto da Constituição e na hora da prolongação o parecer adiado sobre as casas da Intendencia, e, se couber no tempo, o projecto a respeito dos oppositores da Universidade.
Levantou-se a Sessão ás duas horas. - João Alexandrino de Sousa Queiroga, Deputado Secretario.

RESOLUÇÕES E ORDENS DAS CORTES.

Para Filippe Ferreira d'Araujo e Castro.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes, e Extraordinarias da Nação portugueza, sendo-lhes presente a inclusa representação e documentos juntos de José Martins Leite, Manoel Machado, e outros mestres dos barcos da pescaria da villa d'Olhão da Restauração, em que expõem que empregando-se todos no importante ramo da pesca para salgar e escalar no mar de Larache, lhes foi concedido pare comboiar e fiscalisar as communicações de seus barcos em tempo de peste o corsario Piedade, de que he commandante Scarnichia, o qual devendo em consequencia acompanhalos, a fim de lhes passar o competente attestado, ao contrario os abandonou em acto de pesca, donde resultou que na chegada a seus respectivos portos forão, por falta do attestado, obrigados a uma rigorosa quarentena, de que lhes vierão graves despezas, além da perda do pescado: mandão remetter ao Governo a mesma representação para que faça logo conhecer sobre o seu conteudo, e proceder na fórma das leis. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exc. Paço das Cortes em 27 de Novembro de 1821. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza, tomando em consideração o que lhes foi representado por oito Corretores do numero da praça de Lisboa sobre os provimentos que o Senado da Camara tem mandado passar a estrangeiros para servirem aquelles empregos; attendendo a que similhante pratica he contraria á que se acha estabelecida entre todas as Nações cultas. Ordenão que sómente os Portuguezes ou quando muito os naturalizados possão ser Corretores, e que nenhum estrangeiro possa exercer este officio. O que V. Exca. Levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 27 de Novembro de 1821. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza ordenão que lhes sejão transmittidas as informações exigidas pela ordem de 11 de Setembro proximo passado, sobre a capacidade das casas da camara da villa da Povoa de Varzim, e possibilidade ou conveniencia de se destinarem que requeria na representação do procurador da mesma camara, em nome de todos os moradores, que acompanhava a consulta da Meza do Desembargo do Paço, que ia inclusa na citada ordem, declarando V. Exca. a razão da demora. O que participo a V. Exca. para sua execução.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 27 de Novembro de 1821. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza, tomando em consideração o que lhes foi representado pelo juiz de fóra de Pombal, sobre a necessidade de se prohibirem os enterros nas igrejas daquella villa, e de se fazerem em um cemiterio que ali ha, mandando-se este murar de modo que fique defendido dos animaes: attendendo a que esta providencia he muito conveniente á saude publica: ordenão, 1.º que na villa de Pombal se fação os enterramentos de todos os fallecidos no cemiterio e não nas igrejas: 2.º que se proceda á obra do muro decente, mas sem luso, sob a inspecção da camara; satisfazendo-se a despeza pelos sobejos das cisas, ou não os havendo, por uma derrama até á quantia que for indispensavel. O que V. Exca. Levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 27 de Novembro de 1821. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação Portugueza, attendendo ao que lhes foi representado por Joaquim Baptista, medico da villa de Vouzella e do hospital das Caldas de S. Pedro do Sul, acerca de ter sido suspenso deste ultimo lugar pelo Corregedor, Inspector das ditas Caldas, em virtude do decreto de 12 de Março do corrente anno, que extinguiu as pensões ou ordenados não estabelecidos por lei ou decreto, estando nas mesmas circunstancias o cirurgião, o capellão, um banheiro, uma banheira, e um chaveiro, que todos em razão dos seus tenues ordenados servião pela simples nomeação do Corregedor da comarca sem provisão: ordenão que aquelles empregados continuem a ser pagos de seus ordenados; devendo a camara para maior legalidade mandar tirar uma só provisão para todos elles, attenta a pequenez dos mesmos ordenados. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 27 de Novembro de 1821. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação Portugueza, tomando em consideração a conta do visitador dos portos seccos da provincia da Beira remettida ao soberano Congresso pela Secretaria de Estado dos negocios do Reino em data de 30 de Julho sobre as duvidas que occorrião á vista do decreto de 12 de Abril

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do corrente anno, ácerca dos generos cereaes relativamente ao costume em que se achão os moradores de Malpica de conduzirem para este lugar os fructos que lavrão nas terras de Ferreira do territorio Hespanhol, e bem assim, de irem moer o seu pão, no tempo do estio, nos moinhos do mesmo povo de Ferreira por lhes ficarem mais proximos: attendendo a que os referidos moradores não adoptarião aquelle costume se assim lhes não fosse absolutamente necessario: ordenão que fique permittido aos moradores de Malpica transportar para a sua povoação os fructos, que segundo o costume, colherem no mencionado districto de Ferreira, debaixo das cautelas que em caso similhante se achão prescriptas por ordem de 4 de Agosto do presente anno, a respeito dos moradores de Jeromenha, e que possão outrosim ir moer o seu pão aos moinhos de Ferreira nos mezes do estio, em quanto subsistir a necessidade de assim o praticarem; com declaração porém, que se algum abusar da faculdade concedida pela presente ordem, além de incorrer nas penas impostas pelo citado decreto de 18 de Abril aos importadores de generos cereaes prohibidos, ficará para sempre inhibido de se aproveitar della, sendo além disto o juiz obrigado, debaixo de rigorosa responsabilidade, a vigiar que se não illuda com este pretexto a disposição do dito decreto, o que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 27 de Novembro de 1821. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza ordenão que lhes sejão transmittidas as necessaria informações sobre a inclusa representação da camara de Estremoz, ácerca da necessidade dos reparos de suas estradas, orçadas em cinco contos de reis. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 27 de Novembro de 1821.- João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza, attendendo ao que lhes foi representado por Antonio da Silva, Antonio Pereira, e outros officiaes cabouqueiros cortadores de pedra no Monte Pedral junto á cidade do Porto, expondo que os mestres pedreiros de profissão, e juizes deste officio pretendem compellir os supplicantes a exame, e taxa correspondente do officio de pedreiros que não exercem: ordenão que os supplicantes fiquem isentos daquelle exame, e taxa, e continuem livremente no exercicio do referido trabalho. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 27 de Novembro de 1821. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza ordenão que das casas nacionaes, que se achão á disposição do Governo, se apronte uma loja que tenha a capacidade necessaria para a venda, e administração dos Diarios, e actas das Cortes. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 27 de Novembro de 1821. - João Baptista Felgueiras.

Para José da Silva Carvalho.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portuguesa, tomando em consideração o summario de testemunhas transmittido pela Secretaria de Estado dos negocios, da justiça, em data de 27 de Outubro, a que procedeu o Corregedor do crime da corte em virtude da ordem de 17 de Setembro proximo passado; ácerca da supposta conspiração que a Junta do Governo da Bahia imputou ao Conde dos Arcos na sua conta de 20 de Junho do presente anno; e tendo juntamente presentes a memoria e documentos justificativos, offerecidos pelo mesmo Conde, do que tudo se mostra a falta de fundamento daquella imputação, em que a Junta se reporta a cartas, que não manda, recebidas do Rio de Janeiro, de pessoas que nem nomeia, accrescentando que o Conde vinha em custodia no brigue Treze de Maio, quando he evidente por seus documentos que vinha para Portugal com sua filha por licença do Principe Real: resolvem que o Conde dos Arcos seja immediatamente restituido á sua inteira e plena liberdade. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Majestade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 27 de Novembro de 1821. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portuguesa mandão remetter ao Governo, autorizando-o para prover, como for conforme á justiça, sobre o seu objecto a inclusa petição, e documentos juntos de Francisco de Borja Garção Stokler, pedindo homenagem pelo estado de ruina em que se acha a sua saude. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exc. Paço das Côrtes em 27 de Novembro de 1821. - João Baptista Felgueiras.

Redactor - Velho.

LISBOA: NA IMPRENSA NACIONAL.

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