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DIARIO DAS CORTES GERAES EXTRAORDINARIAS DA NAÇÃO PORTUGUEZA

NUM. 255.

SESSÃO DE 20 DE DEZEMBRO.

Aberta a Sessão, sob a presidência do Sr. Trigoso, leu-se a acta da antecedente, que foi approvada.

O Sr. Secretario Felgueiras mencionou os seguintes officios.

1.º Do Ministro dos negócios do Reino, incluindo uma consulta da Junta da directoria geral dos estudos a respeito da creação de duas cadeiras, uma de latim, e outra de primeiras letras, na freguesia de S. José, parte principal do concelho de Godim; que se remetteu á Commissão de instrucção publica.

2.° Do Ministro doa negocios da fazenda a respeito de uma consulta, que veio resolvida do Rio de Janeiro, para os merceeiros pagarem a siza da revenda das carnes seccas com o augmento de tres por cento nos direitos, que pagão nas sete casas, acabando-se as avenças; que se dirigiu â Commissão de fazenda.
Dirigião-se á Commissão de constituição sete representações remettidas pela camera de S. Luiz do Maranhão, de todos as classes de cidadãos daquella cidade, a favor dos serviços feitos á província pelo general Bernardo da Silveira Pinto, expondo a necessidade da sua presença para conter alguns poucos de facciosos, o que he confirmado em uma representação da mesma camara, que reclama providencias para a manutenção da boa ordem.

Forão presentes: - Uma carta de felicitação ás Cortes da camara, da villa de Alcantara da provincia do Maranhão, acompanhado uma representação de diversos escalões, expondo e concluindo o mesmo que a de [...], apoiado e confirmado tudo pela mesma camara a favor do general Dernardo da Silveira Pinto; que as remetteu á Comissão de constituição mandando-se fazer menção honrosa da felicitação. - Uma representação da camara e das autoridades civis e militares da villa de Itapieurú Mirien, provincia do Maranhão, sobre o mesmo objecto das antecedentes, e á qual se deu por conseguinte a mesma direcção. -

Uma carta de felicitação da sobredita camara, que se mandou mencionar honrosamente na acta. - Uma carta do corregedor de Portalegre, Antonio Joaquim de Gouvea Pinto, offerecendo dois exemplares do indice chronologico, por elle publicado em 1818, assim como o terceiro appendice da collecção dos assentos da casa da Supplicação; o que se ouviu com agrado.

Uma carta de Ignacio Antonio da Fonseca Benevides, offerecendo dois exemplares do terceiro volume da collecção de constituição; o que se ouviu com agrado, remettendo-se os exemplares á Commissão de constituição. - Uma carta de Sebastião José de Carvalho, remettendo um certo numero de exemplares da conta geral da repartição do Commissariado do mez de Agosto do corrente anno, os quaes se mandárão distribuir pelos Srs. Deputados. - Uma representação do major José da Silva Mafra, eleito Deputado substituto pela provinvia de Santa Catharina, que ficou reservada para se tomar em consideração na Sessão seguinte.

Mandou-se lançar na acta a seguinte declaração de voto do Sr. Pinto de Magalhães:

Na Sessão de ontem, sobre o artigo 137 do projecto de Constituição, fui de voto que o emprego de Conselheiro de Estado fosse vitalicto. - João de Sousa Pinto de Magalhães.

O mesmo voto assignárão os Srs. - Antonio Camello Fortes de Pina; Manoel Martins do Couto; José vaz Velho; Carlos Honorio de Gouvea Durão; João de Figueiredo; José Peixoto sarmento de Queiros; Antonio Maria Ozorio Cabral; Luis Antonio Rebello da Silva; Manoel de Serpa Machado.

Propz o Sr. Felgueiras, e se approvou que as collecções dos Diarios e Actas, que as Cortes mandárão remetter ao venerando Jeremias Bentham fossem enviados ao Ministro dos negocios estrangeiros, para por via da legação em Londres os fazer entregar áquelle insigne jurisconsulto; e que do mesmo modo, e pela mesma via se continuassem as remessas successivas dos Diarios e Actas, que se fossem publicado.

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Fez-se a chamada e achárão-se presentes 103 Deputados, faltando 20, a saber: os Srs. Mendonça Falcão; Sepulveda; Bispo de Beja; Bispo de Castello Branco; Lyra; Van Zeller; Braamcamp; Ferreira da Silva; Guerreiro; Faria Sousa e Almeida; Xavier de Araujo; Corrêa de Seabra; Fernandes Thomaz; Pamplona; Arriga; sande e
Castro; Zeferino dos Santos; Araujo Lima.

O Sr. Pereira do Carmo, offereceu a seguinte indicação, que ficou para se tomar em consideração no fim da Sessão.

As ultimas Cartas do Príncipe Real a ElRei seu pai confirmão as noticias, que por differentes vias bavião chegado ao meu conhecimento a respeito de mesquinho estado do banco do Rio de Janeiro. E como estou persuadido, que este Augusto Congresso deve estender suas vistas bemfazejas a todas as parte do nosso vasto imperio, sem preferencia de umas e outras; requeiro, que a Commissão de fazenda reunindo alguns illustres Deputados daquella provincia, e das outras do Brazil, pedindo outro sim todas as informações que houver mister para o bom o fiel desempenho de sua commissão, proponha às Cortes, e com urgência, os meios que julgar mais ao certados para sustentar o banco do Rio de Janeiro; e que immediatamente comece a discutir-se o parecer, para acudirmos quanto antes á subsistencia das innumeraveis pessoas, que são interessadas naquelle estabelecimento.

Paço das Cortes 30 de Dezembro de 1811. - O Deputado Pereira do Carmo.

Passando-se a ordem do dia entrou em discussão o artigo 10 do projecto sobre a criação de um banco em Lisboa, concebido nestes termos:

10. Poderá emprestar os seus fundos sobre toda a especie de generos, mercadorias, e bens moveis, que receberá em deposito; e não pagando o devedor no tempo aprazado, poderá por conta delle, posto que sem necessidade do seu consentimento, proceder em leilão á venda do penhor depositado, fazendo oito dias antes publicamente o annuncio.

Terminada a leitura do artigo, disse.

O Sr. Peixoto: Como ninguem fala, abrirei a discussão, reprovando este artigo. O banco de que estamos tratando he propriamente de circulação; e não poderá conservar esta natureza, e satisfazer aos fins da sua instituição, logo que por portaria as suas operações alem da esfera, que lhe he propria. Deverá pois limitar-se ao giro de dinheiro, e letras, sem se metter com penhores, e sua distracção.

O Sr. Brito: - Não se póde inhibir ao banco a faculdade de fazer emprestimos; porque se as soas operações se limitarem a descontos de letras não empregará todos os fundos de que póde dispor nem alimentará mais que a industria commercial em grosso, a qual presentemente he diminuta, tanto pela liberdade do commercio de que goza o Brazil fazendo-o directamente com os estrangeiros, como pelas restricções que ha pouco se tem augmentado no destes reinos, as quaes encurtão cada vez mais as transacções, mercantis, e consequentes saques da letras. O que porém eu julgo prudente he que se limite aos directores do banco esta faculdade ampla de emprestar sobre toda e qualquer espécie de géneros como lhe permitte o artigo, e em qualquer quantidade, pois à meu vêr elle só deve emprestar sobre penhores d'outro, ou praia, e quando muito d'algum genero de valor pouco variável, e que não seja corruptivel. Porque de contrario se expõe a soffrer muitos damnos pelo risco resultante das alterações no valor dos penhores, já pelos descuidos dos empregados na sua guarda, já pelas variações dos preços mercantis, e até pelo favor, e contemplações de amizade que muito influem em toda a administração publica, do que hão de resultar damnos, extravios, em summa riscos incompatíveis com a natureza destas instituições como se reconhece no art. 16. Por isso eu quizera que o banco não recebesse penhores que não fossem de valor permanente, e que excedesse á 3.º parte do emprestimo.
Em quanto á 2.ª parte do artigo, eu approvo em geral a sua disposição, pois que sómente por esta forma he que o banco poderá haver prontamente seus fundos, em ocaso de crise extraordinária, e se os devedores não querem sujeitar-se a verem vendidos os seus penhores paguem no vencimento o que derem ou reformem as letras, ou obrigações.

O Sr. Moura: - He escusado o nós estarmos a lembrar arbitrios sobre as diversas operações que o banco ha de fazer, porque elle o soube melhor do que ninguém. O banco entrega o sen dinheiro representado nos bilhetes pela segurança, que o devedor deposita na sua mão; estas seguranças podem consistir em papeis de credito, e diz o §. que podem consistir era bens moveis, que o banco receberá estes ou aquelles penhores, isto he o que pertence á mexa da direcção, elles podem receber todos aquelles que quiserem, e que mais facilmente possão dispor; porém isto como já disse he proprio da meza. Este não he o caso; o caso está todo em nós considerarmos o banco como credor, em uma linha differente de um crédos particular. Este que na linguagem jurídica se chama crédor pignoraficio não póde dispor do penhor, senão debaixo dos precisos termos da lei do Reino. A ord. liv. 4.º lit. 56 diz: o credor pignorasticio, em chegando o dia aprazado em que lhe começa a ser devido o seu dinheiro, poderá dispôr delle pelo seguinte modo: mande avaliar o penhor por dois homens juramentados e escolhidos pelas partes, e nunca de nenhum modo possa o credor pôr-lhes avaliação. Taes são as circunstancias em que o credor pignoraticio póde dispor do penhor. He preciso que nós agora observemos a diferença que ha entre crédor, e o banco; a lei diz, que o crédor particular chamará dois homens juramentados etc.; porém o projecto offerece ao banco diversa forma, pois que diz (leu o artigo do projecto): em consequência disto he que nós devemos legislar; he mesmo por estes motivos que tenho ponderado, que eu algo necessario o conceder-se ao banco este privilegio. A ordenação considerou só o caso de ficar o penhor ao crédor; e então para isto justo he que se avalie e prohiba que seja o próprio que faça a avaliação porém

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como aqui a fórma he diversa, e he que o crédor se poderá desfazer do penhor em leilão, não temos duvida alguma que recear, porque a praça não engana pessoa alguma... Temos contra este estabelecimento uma classe de individuos muito poderosa, isto he os Agiotas, que fazem o commercio do agio, estes necessariamente hão de ser contra o banco: em consequencia o meio de evitar, que o banco soffra males produzidos por esta classe de gente, he conceder-lhes estes privilegios. (Apoiado, apoiado).

O Sr. Ferreira Borges: - O que acaba de dizer o illustre Preopinante, são verdades; e verdades que julgo se não podem contestar: entretanto deverei dizer a este Augusto Congresso, que a Commissão não fez outra cousa mais, do que apresentar um projecto, para se formar um banco de desconto; desejou annexar-lhe as attribuições possíveis, e que elle reunisse em si as maiores utilidades, e não só quiz que este banco foste de desconto, mas igualmente banco de deposito, e não fés mais então do que annexar-lhe tambem alguns daquelles privilégios que tem todos a outros bancos de deposito.

Declarada a matéria suficientemente discutida, poz o Sr. Presidente a votos o artigo, e foi approvado.

Entrou em discussão o artigo 11, concebido hestes termos:

11. Poderá nos seus emprestimos receber em hypotheca bens de raiz, cem as clarezas, e fianças que julgar idoneas, e proceder á venda delles na falta de pagamento, findo o prazo do empréstimo, como se fossem bens moveis, precedendo annuncio publico trinta dias ao acto da venda.

O Sr. Peixoto: - Se eu fui contrário ao artigo antecedente, não posso deixar de declarar-me altamente contra este, por maioridade de razão. A faculdade concedida ao banco de emprestar sobre hypothecas de bens de raiz, fará que elle conceda para os pagamentos prazos mui largos: se assim o fizer, verá em pouco tempo desapparecer os meios de satisfazer ás operações quotodianas, e aos fins de sua instituição, por falta de numerário metálico, com que possa realisar os seus títulos; porque às quantias que der por tal maneira, como não são de ordinário para o giro de commercio na praça, mas para os lavradores de fóra, que precisão dispendelas em parcellas, hão de sair logo do banco em metal. Se os prazos houverem de ser curtos, vejo então, que uma tal faculdade junta ao exorbitante privilegio, que se pretende conceder ao banco na 2.ª parte do artigo, será um precipício aberto aos proprietários para sua ruina.
O proprietario, logo que precise de dinheiro, calculará facilmente, o quando, e como poderá pagar; mas taes especulações falhão quasi sempre na pratica; e apenas assim lhe aconteça em uma transacção com o banco, por mais segura que a divida esteja na hypotheca, e fiadores, eilo com um credor inexoravel sobre os seus bens, com execução aoarelhada; e não há mais do que arrematar-lhos, por muito ou por pouco, seja ou não o momento proprio; e pelo que observo, tenhão ou não outros encargos. Reprovo por tanto a primeira parte do artigo, por ser contra a instituição do banco: e em caso, que ella passe, reprovo á Segunda, pela exorbitancia do privilegio que contém.

O Sr. Vigario da Victoria: - Parece-me que são muito attendiveis as razões do illustre Preopinantes, e accrescento a ellas, que a hypotheca de bens de raiz difficulta muito as operações de banco. Se uma propriedade valer vinte mil cruzados e estiver hypotheca por nove mil cruzados, he necessario que o banco fique autorisado para pôr um preço por mais de valor por que estiver hypothecaria; por isso he que eu digo, que não só difficulta as suas opperações mas até he muito nociva; principalmente se attendermos, que talvez se siga e venderem-se os bens dos devedores por um preço muito pequeno, e se se attender que nós não temos registo algum de que bens se achão hypothecados antecedentemente a outras pessoas.

O Sr. Moura defendeu o artigo, mostrando que elle continha um privilegio absolutamente indispensavel para convidar os accionistas, e para manter o banco.

O Sr. Bettencourt: - este artigo 11 he seguramente um dos de maior importancia que tem este projecto. Elle deve comprehender não sómente aquelles individuos que estão empregados no commercio, mas aquelles que se applicão a agricultura, fabricas, e manufacturas. Eu julguei que este projecto não teria a menor opposição, attendendo a que Portugal pela sua posição, deve ser primeiro agricultor do que commerciante. Estando a agricultura em Portugal na maior decadencia, necessitando de socorro e protecção: nenhuma se pode dar mais facil, do que poder cada um dos individuos em particular por meio do estabelecimento do banco, com alguma hypotheca ou fiança, Ter quem lhes subministre aquilo de que mais precisa para que a sua propriedade valha, e venha a Ter algum vigor é solidez. Para isto he que julgo necessario este artigo 11, o qual apoio, com todas as minhas forças, por isso mesmo que nelle se estabelece um banco não só mercantil, mas nacional, que comprehende, como disse, todas as classes de cidadãos.

O Sr. Franzini: - Eu me opponho a este artigo porque o considero como a cousa que pode vir a causar a ruina de banco. Não repetindo as razões, que tem expendido alguns dos illustres Preopinantes, só dogo que tenho a meu favor o exemplo de todos os bancos da Europa, os mais acreditados em similhantes negocios. O banco da Inglaterra, e o de França, já mais emprestárão dinheiros sobre bens de raiz: o banco de Inglaterra nunca empresta seus fundos, se não com o prazo de um ou dois mezes, porque então lhe viria a faltar para pagar as suas letras. Ora pergunto eu se 6 ou 7 milhões poderão ser sufficientes, para descontar as letras que há no Reino, e para poder ainda emprestados aos agricultores, não de ser em moeda metalica, pois que sómente nesta especie he que o hão de levar; esse assim for, digo eu, que dentro em bem pouco tempo não terá fundos.

O banco mesmo de França, o de Hamburgo, e de Veneza, que alguns Srs. Tem apontado, de certo não fazem similares operações.

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O Sr. Serpa Machado: - Todas as difficuldades, que se propõem contra o artigo, se removem com as suas mesmas palavras poderá» em os seus emprestimos etc.» Nisto concordo eu; no que discordo porém he em o privilegio, que se lhe dá, de elle poder vender estes bens da mesma sorte que os moveis: são cousas absolutamente differentes, e parece que este methodo que se quer estabelecer prejudica a agricultura, e he contra todas as regras de justiça. Estabelecido este methodo sem formalidades algumas, segue-se que os credores hypothecarios, que tinhão direito aos bens hypothecados no banco, não podem entrar, nem formar concurso de preferencia; o que de certo he uma injustiça, e além disto falta-se por esta maneira, a uma qualidade essencial, que he a falta de avaliação, e da-se um privilegio mais exorbitante, do que dão as nossas leis contra os devedores, que estabelecerão um processo muito summario, mandando avaliar os bens, dando-lhes lugar à embargos de terceiro e estabelecendo a preferencia. Sendo pois este previlegio concedido no projecto, exorbitante, parece-me que s«ria bem o remediar-se isto, estabelecendo um processo muito summario, na venda dos bens hypothecados, a fim de se não prejudicar direito de terceiro, no caso que o houvesse.

O Sr. Borges Carneiro: - Estou algum tanto perplexo em apoiar em combater este artigo. De uma parte vejo as demoras e embaraços a que se vão sujeitar as operações do banco com as hypothecas de bens de raiz: da outra eu não quizera privar dos benefícios delle os agricultores e proprietários que nenhuma outra segurança tem a dar senão os seus prédios. Se o artigo fosse preceptivo, eu votaria já contra elle; porem elle diz poderá receber: autoriza os administradores do banco para admittirem esta hypotheca, quando a julgarem conveniente, cate ás quantias, que julgarem lhes não poderá prejudicar: e nada lhes manda. Porem para passar esta permissão da 1.º parte do artigo, he necessario 1.°, que fique nelle expresso o prazo dentro do qual o banco poderá proceder a fazer vender o prédio hypothecado: 2.º que se designe o processo summarissimo pelo qual se ha de fazer esta arrematação; pois as operações mercantis não soffrem as delongas e chicanas forenses: 3.° que se declare o riiodo de determinar preferencias no caso de concorrer outro credor hypothecario que diga dever preferir ao banco no pagamento da sua divida, e se decida quem La de ser o juiz deste concurso: e talvez seja o melhor dous arbitros nomeados, um pelo banco, outro pelo credor concurrente; os quaes de plano, e á vista dos documentos juntos, decidão a questão sem appellação.

O Sr. Varella: - Voto contra o artigo, ou como accionista, ou como legislador: por qualquer destas formas acho que he muito prejudicial ao banco dar dinheiros para um» especulação que he absolutamente contraria aos seus fins. As sommas que o banco der sobre hypothecas de bens de raiz, são sommas que se vão paralisar por longos tempos; isto he uma verdade inegavel: o lavrador pede dinheiro ou para o seu costeio, ou para pagar alguma divida que tenha contraido; neste caso se o banco ha de ser estabelecido de maneira que possa paralisar as suas operações e esgotar seus fundos por muitos annos, convenho que elle faça empréstimos ao agricultor; mas he necessario que seja autorisado para fazer, as suas emissões por seis, sete, ou oito annos, sobre hypothecas de bens de raiz; consignando os devedores prestações annuaes ao banco. Mas isto talvez traga a desgraça do lavrador, porque este não poderá talvez pagar estas prestações. Por tanto ou havemos de querer que o banco possa paralisar as suas operações, ou então não poderemos admittir de maneira alguma as hypothecas de bens de raiz.

O Sr. Xavier Monteiro: - He necessario admittir a doutrina deste artigo, porque não se admittindo continuaria a usura, quasi da mesma maneira que até aqui. Respondo ao Sr. Franzini, que basta ler os estatutos de Guilherme III de Inglaterra, relativos ao banco, para se conhecer que não lhe era prohibido receber hypothecas de bens de raiz. Concluo pois que ca palavra clareza, que se acha no mesmo artigo, se inclue a declaração que o Sr. Serpa Machado exigia sobre a avaliação; e ao mesmo tempo julgo muito necessario o fazer-se o registo geral das hypothecas, como já tinha pedido o Sr. Luiz Monteiro na Sessão antecedente; porque desta maneira se obvião grande parte dos letigios a que estão sujeitos os bens de raiz.

O Sr. Peixoto: - Direi mais duas palavras. Ponderarão alguns illustres Preopinantes que nós não deviamos ser tutores dos directores do banco, e dos accionistas. Respondo que ao legislador compete prevenir os abusos, onde quer que elles possão introduzir-se: quanto mais, que os capitalistas ao entrarem com os fundos para o estabelecimento do banco, ainda não sabem se os directoras delle merecerão ou não a sua confiança; e posto que todos hajão de ter voto para a sua escolha, como esta não ha de proceder da unanimidade, sempre lhe resta a incerteza; e convem por isso, que na lei do estabelecimento sejão prevenidos quanto for possivel os abusos dos administradores. Também não me parece que haja pelas provincias lavrador cordato que venha á capitai buscar dinheiro, sujeitando-se á dureza da condição deste artigo; quando com as seguranças da hypotheca, e das fianças que no mesmo artigo se exigem, póde em outra qualquer parte remir a sua precisão por uma escritura de obrigação, feita em forma ordinaria a corporações, que em quanto tiverem seguro o seu capital, e receberem os juros, não afligem os devedores. Ponderou tambem um illustre Preopinante, que os fundos do banco serão por ora sobejos; e que para os pôr em actividade he até necessario dar-lhes esta saída. Pois bem: então de o banco o dinheiro a juro, na forma ordinaria, sem prazo; a hypotheca especial nos bens do devedor, e fiadores, já a tem no artigo 9.°: contente-se com ella, como lhe convém para convidar concorrentes; e deixemo-nos da arrematação dos bons pela maneira escrita no artigo. Só assim podo ter lugar o beneficio que alguns Srs. Lhe attribuem de poder contribuir para emprezas de agricultura, e de industria; aliás haveria sempre o perigo de ir arruinar o emprehendedor antes que elle começasse a colher o producto de suas fadigas. Não confim lamos as idéas: são

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muito úteis os fundos destinados para favorecer as emprezas de agricultura, e os estabelecimentos de industria: mas deve a sua natureza ser mui differente da «lestes: para isso lemos por ora os das irmandades, confrarias, e outras corporações; podem instituir-se outros, e limitar-se o banco unicamente á circulação, que he o seu objecto, o qual não permitte que as transacções que elle fizer excedão ao espaço de alguns mezes.

O Sr. Ferreira Borges: - Tem-se dito por uma, e outra parte o que se póde dizer a respeito deste artigo; agora porém se acaba de fallar de uma maneira que não sei bem o que deva respondei, porque não sei se se approva, ou se reprova o que no artigo se diz. Peço aos illustres Preopinantes que abrão o primeiro volume do diccionario de commercio dedicado ao banco de França por uma sociedade de negociantes, etc., e nelle acharão os regulamentos de quasi todos os bancos notáveis da Europa, e ahi acharão o mesmo que achão aqui neste, artigo. Podem tambem ver Tolenare, entraves du commerce, Beawes, lex mercatoria rediviva, alem de outros muitos que eu poderia citar aqui: e com isto tenho respondido. Chamar porem banco a uma companhia de seguros devidas e de gados, isto he cousa que não está em parte nenhuma. Eu vou pois, já que he necessario, dizer que cousa he banco, e banca-rota, em que se falou, sua origem, e progresso.

Nos principios do commercio houve ainda mais frequentes, e maiores feiras do que ha actualmente na Europa; e logo depois da invenção das letras levavão-se estas às feiras, e até tinhão marcados os vencimentos para cilas, e havia alli uns homens que compravão, e descontavão por um lucro aquelles papelinhos; e quando elles não tinhão dinheiro para isso quebra vão-se-lhe as pernas do banco, e aqui está donde nasceu a fraze banca-rota. Depois houve bancos de depositos, bancos de transportes de partidas, e em fim bancos de descontos como aquelles primeiros banqueiros, e o tempo melhorou, e engrandeceo estes estabelecimentos. Ora até aqui conheço eu bancos; agora bancos de vidas, e de gados, isto he que eu não entendo. Fallando, na matéria, e nos temores, que se suscitão digo: os que hão de reger este banco tambem são accionistas , e olharão pelo seu interesse com segurança. - Só deixarão de fazer o que lhes não convier, e por tanto baldado h« o legislar a este respeito. - Em quanto a dizer-se que doze milhões e meio era muito pouco, eu direi que he muito bastante; porque tirados os cinco milhões que hão de emprestar-se, no resto elles hão de ter todo o cuidado de faze-lo andar em giro; porque o banco faz despeza: os directores ou hão de comprar casa, ou alugala; alem disso devem ter empregados a quem hão de pagar para que ponhão as cousas em effectiva actividade: e certamente o nosso commercio pela desgraça em que se acha não o ha de empregar todo: oxalá que todo, e mais podesee achar emprego, e Jogo. - Tendo pois olhado por todos os lados este paragrafo, parece que elle deve passar como está sem nos mettermos com isso de hypotecas, etc., porque he melhor fazer um plano geral, por quanto não só o banco aproveitará, mas aproveitarão todos os que quizerem servir-se dos seus fundos.

O Sr. Vaz Velho: - Levanto-me para aclarar uma idéa, posto que já expendida, e para responder ao argumento de um dos illustres Preopinantes. Objectou-se contra a necessidade que o banco tinha de ter um livro de registo de hypothecas, o grande detrimento e incommodo que todos terião (ainda os de fora do continente de Portugal) demandarem examinar a Lisboa as hypothecas no banco para a segurança das suas transacções e negocios, o que he opposto ao principio bem conhecido, de que não deve padecer o todo para beneficio de uma corporação, ou de uns poucos de particulares. A esta arguição com toda a facilidade se satisfaz. Todos conhecem a grande necessidade que ha da instituição de um registo de hypothecas, cuja necessidade claramente se demonstra, se tomarmos por principio o grande prejuízo que a falta delle tem causado, institua-se por tanto o dito registo, e haverá um meio fácil, não só do banco, mas de todas as pessoas saberem os hypothecas com que os prédios estão onerados. Deste modo aquelle incommodo publico cederá a um bem igualmente publico, e como modo geral. Disse mais o mesmo illustre Preopinante que não he do modo expendido no projecto, isto he, na admissão das hypothecas ou bens de raiz , que se augmenta a agricultura: mas sim pelo commercio somente, de cujo augmento depende o augmento da agricultura. Este principio não póde passar na economia politica moderna, na qual, considerando-se o commercio interno, como a riquesa real da Nação, a qual consiste na somma dos excedentes, pois que a Nação não he rica, a qual só tem quanto lhe basta para a sua subsistencia, e só a medida da sua riquesa he áquella dos excedentes da sua subsistencia; e como o commercio interno se entretenha nos mencionados excedentes, segue-se logo que o commercio interno representa a riquesa real da Nação: mas como os ditos excedentes são pela maior parte consistentes em productos da agricultura, deduz-se que se não podo talar em commercio, e prescindir-se da agricultura, quando se truta do augmento de qualquer destes objectos, por isso que ambos mutuamente se auxilião em boa economia política moderna. Passando á matéria sujeita, eu não acho ainda desenvolvida com toda a claresa a utilidade que resulta á agricultura, da faculdade que por este plano seda ao agricultor de empenhar os bens de raiz a beneficio da mesma agricultura. He necessario saber que nas províncias falta muitas vezos o dinheiro ao agricultor, que este não tendo quem lho empreste, vai metter os seus fructos nas mãos dos negociantes, e, pedir-lhes sobre elles as quantias necessárias para o costeamento das terras, e seus productos. E por quanto lhos pagarão depois os negociantes? Ou por um preço muito diminuto, segundo a ambição de uns, e a necessidade dos outros, ou pelo preço mais baixo que correr, preço que elles mesmos negociantes arbitrão, quando comprão, tendo em vista as referidas compras, e vendas obrigadas. Do que resulta as mais das vezes ficar o lavrador sem géneros, e sem dinheiro. Isto não acontecerá, haven-

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de o banco, logo he util; voto pela sua existencia relativa ás hypothecas dos bens de raiz, pela utilidade que dellas resulta á agricultura.

Julgando-se a materia sufficientemente discutida, procedeu-se á votação e foi approvado o artigo, ficando-se na intelligencia de que a Commissão apresentará um projecto para o registo das hypothecas, separado desta lei.

Forão approvados os seguintes artigos:

12.º Poderá comprar e vender papel moeda, e todos os mais papeis de credito da Nação, assim como ouro, e prata, debaixo de qualquer fórma, espécie, ou qualidade.

13.° Poderá guardar em deposito dinheiro dos particulares, com os quaes abrirá conta corrente, e a cuja ordem pagará á vista a parte das quantias depositadas, que lhe for determinada.

14.° Poderá tambem receber dos particulares, para pagar a pratos certos, mediante um interesse annual estipulado, as sommas pecuniárias, que para augmentar as suas operações julgar opportunas.

Passou-se ao artigo immediato, concebido nestes termos:

15.° De todas estas negociações, emprestimos, e transacções, não pagará o banco tributo, imposto, ou contribuição alguma.

A este respeito, disse

O Sr. Luiz Monteiro: - He expressamente contra as Bases da Constituição leu o artigo 34 das Bases, que diz: A imposição de tributos e a forma da sua repartição, será determinada exclusivamente pelas Cortes. A repartição dos impostos directos será proporcionada ás faculdades dos contribuintes, e delles
não será isenta pessoa ou corporação alguma).

O Sr. Moura: - Ali trata-se dos impostos directos, e este he indirecto.

O Sr. Brito: - He preciso confessar francamente que este direito da decima dos juros e lúcios do dinheiro he directo; porém esta isenção que se concede não he propriamente tal; não he privilegio, he convenção estipulada pelos encargos que o banco toma sobre si em compensação. Basta contemplar o de emprestar logo no primeiro anno cinco milhões a menos do juro da lei, e o privar-se de comprar e vender á excepção dê ouro, prata, e papel moeda. A vista de taes sacrifícios não he muito que se lhe conceda a isenção dos direitos, que não montarião a maior valor, maiormente considerando a necessidade em que estamos de nos livrarmos do papel moeda, que alterando continuamente o valor do nosso numerário rios torna o cambio sempre oneroso, encarece o preço dos géneros, embaraça o giro mercantil, dá lugar á introducção do falso, com que os fabricadores nos levão os valores reaes, e acabarão de arruinar-nos se não acudirmos com pronto remedio.

O Sr. Moura: - Eu ainda diria uma cousa: se isto não he indirecto, digão-me os illustres Preopinantes qual o he; se este o não he então não ha nenhum.
O Sr. Ferreira Borges: - Eu cuidei que imposto directo era aquelle que recaía sobre um rendimento annual determinado e fixo; assim como indirecto
aquelle que sendo para certos casos somente, se paga chegado o evento, tal como as loterias, o porte das cartas do correio, em regra os direitos da alfândega, ele. Isto entendo que he indirecta, o mais he novo.

O Sr. Castello Branca: - O tributo de que se trata he um tributo directo: diz-se, não he um rendimento permanente; tambem os da terra não são um direito permanente, porque eu posso ter uma terra que me não renda dinheiro; mas não he por isso que devemos combinar isto com as Bases, he porque queremos fazer este favor ao banco, porque tem feito o emprestimo.

Poz o Sr. Presidente a votos o artigo, e foi approvado.

Foi tambem approvado, sem discussão, o seguinte artigo:

16.° Não poderá o banco emprehender negociação alguma de risco, ou de seguros, nem comprar ou vender géneros de commercio por sua conta, assim com» não poderá possuir bens de raiz, além dos predios urbanos necessários para o desempenho das suas operações.

Entrou por consequência em discussão o seguinte artigo.

17.º Não poderá tambem verificar, nem contractar empréstimo algum com o Governo sem o prévio consentimento das Cortes, nem o mesmo Governo terá nelle ingerência alguma.

Terminada a sua leitura, disse

O Sr. Ferreira Borges: - Parece-me que este artigo não admitte discussão, salvo se a admittirem de novo as bases.

O Sr. Borges Carneiro: - Já se tem dito que nenhum banco póde medrar nem durar, em terra de governos despoticos. Em elles pilhando algum dinheirinho junto logo lhe andão de roda com o olho, embrulhados na capa do bem commum, até lhe botarem a unha. Nos governos constitucionaes he necessario ficar esta materia muito bem declarada; aliás o Governo, se achar alguma portinha aberta, ainda dirá: isto não esta expressamente prohibido, e irá ingerendo-se no banco. Temos disposto que elle estará debaixo da protecção das Cortes; isto não basta: diz este artigo que o Governo não poderá contractar com o banco algum emprestimo; tambem não basta: porque poderá então o Governo mandar pedir-lhe dinheiro sem ser por emprestimo, mas sim para nunca o pagar. Por tanto he necessario que expressamente se diga que o Governo não terá nunca ingerência nenhuma no banco.

O Sr. Moura: - Opponho-me a isto, porque se o banco quizer dar dinheiro ao Governo, deve este acceitalo. Se o Governo disser: dai-me cá um pouco de dinheiro, e se o banco lhe quizer dar, não o ha de acceitar?

O Sr. Xavier Monteiro: - Não custa nada dizer-se: e não terá sobre elle influencia alguma?

O Sr. Castello Branco: - Eu estou conforme com o parágrafo, porem sempre requereria uma pequena emenda, isto he, que não possa fazer emprestimos, sem que
o Governo obtenha para isso licença das Cortes; porque isto he o mesmo que repetir o que já está sanccionado na Constituição.

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Procedendo-se á votação, ficou approvado o artigo com a emenda do Sr. Borges Carneiro, concebida nestes termos: nem o mesmo Governo terá nelle influencia alguma.

Passou-se ao artigo 18 assim concebido:

18.° Para effeituar o teu gyro poderá o banco emittir unia quantidade de nota» de banco, pagáveis ao portador em metal, ou de letra» d ordem, com alguns dias precisos, para commodidade dos viajantes.

E esta emissão tanto de notas, como de letras, será feita em proporção tal, que nunca exponho o banco a deferir, ou interromper os seus pagamentos.

Feita a leitura deste artigo, disse

O Sr. Ferreira Borges: - Onde diz á ordem com alguns dias, deve accrescentar-
se o termo de vista, que escapou á imprensa.

O Sr. Castello Branco: - Eu assento que o artigo deve ser supprimido por que não serve de mais nada se não para aclarar ao banco o que elle deve fazer, como o faz qualquer negociante; por tanto voto pela suppressão do artigo.

O Sr. ferreira Borges: - Assim muitos outros terão essa mesma duvida, e por isso chamaremos áquelles bilhetes pagáveis ao portador, notas de banco; e áquelles que hão de ser pagos a alguns dias da vista, letras de banco.
Não se julgando o assumpto suficientemente discutido ficou adiado o artigo.

O Sr. Secretario Ribeiro Costa leu uma carta do Sr. Deputado Braamcamp, pedindo ser dispensado por algum tempo de assistir às sessões, por motivo 4e moléstia: e lhe foi concedida a dispensa.

Leu mais o Sr. Ribeiro Costa o seguinte

PARECER.

A Junta da Inspecção dá parte ao Congresso que julgou conveniente ao serviço das Cortes despedir o porteiro menor Manoel José Henriques, e nomear em sou lugar a Domingos José dos Santos Pereira, por ter boas informações do seu prestimo e actividade, e por ter sido empregado na extincta inquisição. Sala dos Cortes em 18 de Dezembro de 1881. - Francisco Manoel Trigoso d'Aragão Morato, Presidente; Antonio Ribeiro da Costa; José Ferrão de Mendonça e Sousa; Francisco de Magalhães de Araújo Pimentel.

Terminada a leitura, disse

O Sr. Borges Carneiro: - Eu louvo muito a Commssão por ter nomeado para este officio uma pessoa, cujo officio havia sido supprimido; com o que fica cessando a pensão que o Thesouro lhe pagava. Praza a Deus que isto sirva de exemplo ao Governo, e que não vejamos repetido o que fez o Ministro dos negócios estrangeiros, chamando para a sua Secretaria pessoas novas, contra a expressa prohibição das Cortes.

O Sr. Baeta: - Entretanto despede-se um empregado que pertence às Contes, e o Congresso não sabe o motivo.

O Sr. Presidente: - Antes disto examinei o regimento das Cortes, e em consequência, delle he que foi demittido; os motivos não convem que se digão agora. (Appoiado).

Procedeu-se á votação, e foi approvado o parecer.

Leu mais o mesmo Sr. Secretario a seguinte

INDICAÇÃO

As Commissões de fazenda e artes propõem que se ordene ao Governo que na arrematação dos direitos que pagão os couros verdes, a que vai proceder, não indique os direitos chamados, de lavagem, visto estar pendente da decisão do Congresso a continuação ou extincção destes direitos. - Travassos; Alves do Rio; M. G. de Miranda; Borges; Silva Corrêa; Barroso; Xavier Monteiro; Sobral.
Approvou-se que para este fim se expedisse ao Governo a competente ordem.

Sendo chegada a hora de prolongar-se a Sessão, leu o Sr. Freire pela segunda vez o seguinte

PARECER.

A Commissão de Constituição encarregada por este soberano Congresso de interpor a sua opinião sobre os assumptos que ficarão indecisos a respeito das províncias do Brasil, tem a honra de apresentar é resultado das suas conferencias, com a urgencia que lhe foi recommendada. A mesma Commissão, depois de ter ouvido os
illustres Deputados das refundas províncias, concordou nos seguintes artigos:

1.° Que fiquem extinctos todos os tribunaes que ElRei creou na cidade do Rio de Janeiro, depois que para ali se trasladou, com a sua corte.

2.° Que as funcções do Desembargo do Paço, e da Meza da Consciência, sejão exercidas de ora em diante do mesmo modo que o erão antas de serem creados estes tribunaes no Brazil.

3.º Que as funcções do Conselho da fazenda, e do Erario, no que respeita á provincia do Rio dê Janeiro, serão exercidas por uma Junta de fazenda, que será installada do mesmo modo, e com as mesmas attribuições, que estão decretadas para as outras províncias do Brazil: e para esta Junta passarão os documentos parciaes que lhe são necessários para a administração da fazenda da provincia.

4.º Que o Governo seja autorisado para nomear outra Junta temporária, para ser particularmente encarregada de inventariar todos os livros, documentos, e tudo o que percence em geral ao Reino Unido; e para arrecadar, liquidar, e remetter para Lisboa, ao Ministro da fazenda nacional, o que successivamente for liquidando, arrecadando, e inventariando com a necessária clareza, tanto em relação ao Conselho da fazenda, como ao Erario, notando especialmente o que for entregue á Junta da fazenda provincial.

5.° Que a esta mesma Junta de Commissão de liquidação fique pertencendo o que respeita á contabilidade, liquidação, e arrecadação dos objectos da extincta Junta do Commercio, nos termos do artigo antecedente: e a inspecção sobre os melhoramentos da agricultura, commercio fabricas, e navegação da provincia, fique pertencendo á Junta provincial adminis-

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trativa, a qual proporá as reformas ou alterações que lhe occorrerem para se obterem os pretendidos melhoramentos.

6.° Que a Casa da Supplicação do Rio de Janeiro fique reduzida a uma Relação provincial, e que nella, assim como nas outras Relações do Brazil, seja a ultima instancia, em que findem as demandas: «alvo o recurso da revista , nas causas que excederem o valor de 2:000$000 reis, para Lisboa, no juízo, e nos termos que prescreve a actual legislação existente. As províncias que actualmente não tem Relações, continuarão a interpor seus recursos para aquellas a que actualmente recorrem, em quanto se vão decretar e fazer installar as outras Relações provinciaes.

7.° Que provisoriamente fique exceptuado da abolição indicada no primeiro artigo o supremo Conselho de Justiça, estabelecido no Rio de Janeiro, para serem remettidos a elle, como actualmente, os conselhos de guerra, em quanto se não faz extensiva às outras províncias a providencia estabelecida a favor da provincia do Maranhão.

8.º Que os membros dos tribunaes extinctos fiquem aposentados com meios ordenados, em quanto o Governo os não chamar, e empregar como lhe parecer conveniente para o bom serviço publico.

9.° Que a todos os officiaes, e empregados subalternos das extinctas repartições, se conservem metade dos ordenados por tempo de um anno, e só aquelles que não tiverem vencimentos por outra repartição, que igualem os meios ordenados.

10.º Que a Junta provincial empregue com preferencia aquelles dos indicados no artigo antecedente, que o merecerem no serviço que por estas novas disposições se ordena: A mesma Junta formará uma relação de todos elles, com explicação de seus estados, dos serviços para que tem aptidão, da sua conducta, de todos os vencimentos que percebem; e consulte o Governo sobre os que em presença da mesma relação merecem ser inteiramente demittidos, ou empregados, privados de meio ordenado, ou conservados na continuação delles.

Progressivamente se irá fazendo a reforma de outros estabelecimentos, e se adianta esta pela sua urgencia. Paço das Cortes 10 de Outubro de 1821. - Francisco Manoel Trigoso de Aragão Morato; José Joaquim Ferreira de Moura; José Antonio de Faria Carvalho.

Terminada a leitura, e principiando a discussão pelo artigo primeiro, disse

O Sr. Borges Carneiro: - A urgência deste decreto, bem como a suppressão dos estabelecimentos do Rio de Janeiro, he evidente, depois que se ouvirão aqui ler as cartas do Principe. Os empregados públicos, diz elle, são aqui sem numero. Em outras cartas diz que havia mandado pedir dinheiro às outras províncias do Brazil, e que ellas o não mandavão, e que o banco do Rio de Janeiro fora dilapidado pelos seus mesmos administradores. Ha pois uma apertadíssima necessidade de darem as Cortes providencias muito prontas para prevenir o estado que póde ouvir-se na Rio de Janeiro, se occorrer uma banca rota, e se virem tantos bocas sem pagamentos. E como há sobre isto uma indicação do Sr. Pereira do Carmo, indicarei já as providencias seguintes. Quanto aos empregos publicos, extingão-se já todos os que forem desnecessários, e aos empregados cessantes se dê metade dos seus ordenados, se esta não exceder a uma justa sustentação, nem elles tiverem outra cousa de que viver. Quanto aos que se conservarem, e geralmente â todas as pessoas que desfructarem rendimentos nacionaes ou ecclesiasticos, que a Junta Provisória do Rio de Janeiro seja autorisada para assignar o rendimento que cada uma das ditas pessoas deva ficar vencendo, segundo a sua condição e mesmo segundo os seus bens patrimoniaes, e que o resto reverta logo á sua natureza, quero dizer, á nação donde saiu.
Quanto aos que dilapidarão o banco; áquelles que forâo para o Rio de Janeiro pobres, e sem terem tido género nenhum de commercio entrarão em administrações publicas, e se achão hoje com milhões de seu, comprando casas e fazendas, vivendo em palácios, nadando em luxo, gastando cada anno trinta mil cruzados, a estes se faça logo como Nuno da Canha fazia aos Cóges Abrahens: pregue-se-lhe um sequestro em todos os seus bens, quero dizer, em todos os seus roubos, não se lhes deixando mais que um tenue comer e um simples vestir, segundo a frase de S. Bernardo: Nihil procter tenuem victum ac simplicem vestitum. E se recalcitrarem, sejão então entregues á severidade das leis que ha, sobre a concussão e peculato.

Vindo agora precisamente ao 1.º artigo do nosso projecto, digo que nenhuma duvida elle póde ter. Estes tribunaes fizerão-se para a Côrte: esta acabou no Rio, acabem elles.

O Sr. Varella: - Eu creio que nada ha mais natural que acabar as cousas pela mesma forma que forão creadas; estas repartições forão creadas pelo almanaque, he justo que pelo almanaque sejão tambem acabadas: a extincção destes tribunaes he muito precisa, he necessario acabarmos com estas sanguixugas, que tanto tem arruinado aquella provincia.

Procedendo-se á votação, ficou approvapo o artigo.

Passou-se ao artigo 2.º, e a este respeito disse

O Sr. Sousa: - Acho que algumas attribuições do Desembargo do Paço, e da Meza da Consciencia devem ser mais amplas, e não conforme o regimento de 55, quando foi creada a relação; porque os povos do Rio de Janeiro lera as mesmas necessidades que tinhão até á retirada da Côrte: por consequência este expediente do Desembargo do Paço, que era exercido por dois Desembargadores, deve ser ampliado á Casa da Supplicação, cujas attribuições devem ser mais amplas. Eis aqui a minha ponderação; e os Srs. melhor reflectirão sobre isto.

O Sr. Presidente: - Talves seria melhor fazer uma indicação.

O Sr. Ferreira Borges: - Está demonstrada a, necessidade de entrarmos na reforma dos tribunaes do Rio de Janeiro: diz-se que as funcções do Desembargo do Paço, e da Meza da Consciência devem ser mais amplas; e as attribuições de que fala o illustre Preopinante estão anexas a alguma outra repartição?

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Eu não sei nada do Rio de Janeiro, e por isso peço aos Srs. que de lá viera» que me informem sobre isso.

O Sr. Borges Carneiro: - Estamos tomai do medidas provisórias, e que não admittem demora. Por tanto, visto estar o Rio de Janeiro tão longe de Portugal, e não ser justo que por pequenos negocios estejão os Portuguezes ultramarinos dependentes de Lisboa, o que lhe traz muito pezo e escravidão, entendo que se deve installar a Junta que dantes havia na relação, chamada do Desembargo do Paço, e Meza da Consciencia, e isto não só na relação do Rio de Janeiro, mas tambem nas da Bahia e do Maranhão; e que estas Juntas devem despachar todos os negócios que em Lisboa despacbão o Desembargo do Paço e a Meza da Consciência pelo seu expediente; e ainda alguns dos que estes tribunaes não despachão sem consulta. (Apoiado).

O Sr. Presidente: - Proporei por tanto o artigo com a emenda.

O Sr. Brito: - A emenda talvez tenha alguma dificuldade na pratica, e por isso parecia mais seguro restabelecer agora as cousas como estavão anteriormente, e mais facil para não dar lugar a difficuldades na execução; e depois se tratará de lhes dar novas attribuições.

O Sr. Moura: - Não ha inconveniente nenhum em se lhe darem todas as attribuiçòes que aqui tem o Desembargo do Paço; e que quando os negócios dependerem de consulta, ou para reformar lei, ou para fazer lei, muito embora venhão a Lisboa.
Declarada a materia suficientemente discutida, propoz o Sr. Presidente «e se approvava o artigo, advertindo que em quanto aos negócios que pertencem ao Desembargo do Paço, a nova meza não só expedirá os negócios que antigamente expedia pelo seu alvará, mas tambem aquelles que o Desembargo do Paço do Rio de Janeiro fazia expedir sem consulta - e se venceu que sim.

Entrando em discussão o artigo terceiro, disse

O Sr. Sousa: - Este tribunal do conselho da fazenda tem attribuições contenciosas, alem de outras mais; parece-me que estas attribuições devião tambem ser annexas á casa da supplicação, e que todas as outras funcções fossem exercidas pela junta da fazenda. Parece-me tambem que essa junta da fazenda deveria ser composta dos sete camaristas, ou dos sete membros do senado; e que houvesse um presidente dessa mesma junta, com um provedor; é que estes nove membros compozessem ajunta da fazenda; e nella não entrasse, nem o thesoureiro do erário, porque como elles devem responder pela sua condacta perante a junta não devem ser membros da mesma. Também julgo acertado que elles sejão escolhidos pela junta, e que quando a sua conducta não corresponda ao que se deve esperar, sejão demittidos é nomeados outros em seu lugar.

O Sr. Borges Carneiro: - Parece-me que fica bom o artigo em se dizendo que tudo que he jurisdicção contenciosa passará á relação para o juizo dos feitos da fazenda; e o que for administrativo, passará â junta da fazenda; pois he esta a natural divisão dos negocios.

Procedendo-se á votação, foi approvado o artigo, accrescentando-se depois do termo exercida, as seguintes palavras: ha parte que não for contenciosa.
Designou o Sr. Presidente para a ordem do dia a continuação do projecto de Constituição; na hora dá prolongação, a continuação do parecer á respeito dos tribunaes do Rio de Janeiro; e cabendo no tempo, á indicação dó Sr. Villela a respeito dos Deputados substitutos do Ultramar.

O Sr. Borges Carneiro foi encarregado pelo Sr. Presidente, de examinar o regimento dos negócios que os tribunaes despachão pelo expediente ou por consulta, e de apresentar sobre isso as observações, que julgar convenientes. Levantou-se a sessão às duas horas da tarde. - João Alexandrino de Sousa Queiroga, Deputado Secretario.

RESOLUÇÕES E ORDENS DAS CORTES.

Para José Ignacio da Costa.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza ordenão que na arrematação dos direitos, que pagão os couros verdes, a que vai proceder-se, se não incluão os direitos chamados de lavagem, visto estar pendente dá deliberação do soberano Congresso a continuação, ou extincção daquelles direitos. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 20 de Dezembro de 1821. - João Baptista Felgueiras.

Para José da Silva Carvalho.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinárias da Nação portugueza ordenão que lhes sejão transmittidos todos os autos e papeis que se achão na Meza do Desembargo do Paço, no Conselho da fazenda, e no Juizo da Coroa pertencentes á denuncia de umas apólices deixadas aos padres congregados dá Casa das Necessidades. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 20 de Dezembro de 1821. - João Baptista Felgueiras

Redactor - Galvão.

LISBOA, NA IMPRENSA NACIONAL.

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