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SESSÃO DE 13 DE MARÇO.

(Presidencia do Sr. Dias d'Oliveira, Vice-Presidente).

Abriu-se a sessão pelas onze horas e um quarto da manhã; estando presentes noventa e sete Srs. Deputados.

Leu-se e approvou-se a acta da sessão antecedente.

Mencionou-se a seguinte correspondencia.

1.º Uma representação da junta de parochia, e mais moradores da freguezia da Horra d'Escalhão, concelho da Figueira de Castello Rodrigo, sobre a divisão judiciaria. Foi á Commissão d'estatistica.

2.º Uma representação da Camara municipal da Guarda, sobre a eleição da que deve entrar em exercicio no corrente anno, e difficuldades que tem havido a esse respeito. Foi á Commissão de petições.

O Sr. Freire Cardozo: - A Commissão d'estatistica a que tenho a honra de pertencer, é daquellas que se acha mais sobre carregada de trabalhos, trabalhos que julgo de summa importancia, não só em relação á força mental e material, que demanda, mas em relação ás circumstancias do paiz. A maior parte d'estes trabalhos consiste em deferir as inumeraveis reclamações, que a este congresso tem affluido de todos os pontos do reino, e grande parte dessas povoações entenderam ou fingiram entender desde logo, que não deviam sujeitar-se ás disposições do decreto de seis de Novembro, até que se lhes deferisse; e alguns administradores geraes não tem tido a força necessaria para os fazer submetter. Neste caso um grande numero de municipios, acha-se em perfeito estado de desorganisação, estado que não póde subsistir por que é contrario a todos os interesses sociaes; não sendo possivel a execução das leis, a manutenção da segurança publica, e arrecadação da fazenda nacional, etc. Todavia a Commissão ainda não póde reunir-se n'um só dos dias destinados para trabalhos de commissões; não por culpa de nenhum de seus dignos membros; mas porque alguns pertencem a outras commissões, tambem de grande importancia, como é a da fazenda; e outros, tem-se achado incomodados. É verdade que assim mesmo estão promptos muitos trabalhos: quasi todos tem sido obra do Sr. Fransini; honra seja feita a tão benemerito varão; mas eu temo que quando a Commissão se reunir se não conforme a muitos respeitos, com a opinião do Sr. Fransini, e que então muitos desses trabalhos fiquem baldados; eu proporia por tanto que se nomeassem mais dois membros; e se V. exca. me dá licença, lembraria os Srs. José Maria d'Andrade que não pertence a commissão alguma, e o Sr. Joaquim Pompilio da Motta, que foi membro da junta geral do districto do Viseu, e por conseguinte já trabalhou neste sentido. Igualmente pedia a V. Exca. consultasse o congresso para que a Commissão fosse authorisada, quando tratasse de examinar as reclamações de tal ou tal districto, a convidar os Srs. Deputados desses districtos, para receber esclarecimentos especiaes, e locaes, por que só por este modo poderá marchar com acerto.

O Sr. Vice-Presidente: - Quanto á segunda parte, não ha que propor á votação, porque já houve decisão do Congresso a esse respeito; isto é, que as commissões estavam authorisadas a chamar aquellas pessoas que julgassem lhes convinham para obter esclarecimentos; quanto á primeira eu vou propôl-o ao congresso.

Assim o fez S. Exca., e se resolveu affirmativamente.

O Sr. Costa Cabral: - Vou mandar para a mesa uma representação da sociedade patriotica lisbonense, que pede se conservem certas disposições da constituição de 22.

O Sr. Silva Pereira: - Tenho na mão uma representação da Camara da villa da Feira, e cópia de uma outra que mandou ao Governo, incluindo tambem uma da freguezia de Sandim, sobre a divisão territorial, que se fez por decreto de seis de Novembro; pedem se faça pertencer aquella freguezia ao julgado da Feira, e não ao de Santa Catherina, porque tendo justiça a legoa e meia, escusam de ir buscala a quatro legoas, accrescendo que com o julgado da Feira já estão acostumados ha muito tempo; parece-me que deve ser mandada á commissão d'estatistica.

O Sr. Midosi: - Para fazer um requerimento que deve ser presente á Commissão de fazenda e artes (leu ). Existem projectos relativamente á lei do sello; ha um sello novo que será mais difficil de falsificar do que o actual, que na verdade tem dado azo a que nove decimos do papel sellado que se vende seja falso. Nas provincias, sobre tudo, é aonde ha mais abundancia de papel sellado falso, que tira á fazenda uma parte de seus rendimentos. O novo sello que existe tem a circumstancia de ser feito em papel do paiz, e o sello é de rotação, tornando-se mais difficil e dispendioso o mechanismo. Se se tivesse feito ao principio o que agora se procurou fazer, ter-se-hia evitado empregar o sello preto, que até á mão se póde falsificar. Desejo que o papel do novo sello seja presente ás com- missões que disse, e estas poderão com seus conhecimentos práticos, illustrar o Governo, e dar não só a sua opinião sobre tal materia, que é indispensavel reformar-se, mas tambem sobre o modo de o fazer mais convenientemente.

O Sr. Pereira Brandão: - Remetto para a mesa uma representação da Camara municipal d'Ovar, que pede, por demonstração que faz, que se estabeleça um julgado naquelle circulo, tendo a uma legoa, ou legoa e meia, mais de seis mil fogos: em consequencia remetto para a mesa a mesma representação, para ser mandada á Commissão d'estatistica, a fim de que apresente o seu parecer a tal respeito; reservando-me para na discussão dar outros esclarecimentos que justificam a pertenção da Camara, que é de muita justiça.

O Sr. Conde de Lumiares: - Tenho a honra de mandar para a mesa este requerimento (leu ). Este projecto foi apresentado pela Commissão da guerra, da Camara dos Pares, e em consequencia de se achar a sessão mui adiantada, não se decediu na de 1835 na Camara dos Deputados; deve achar-se na secretaria das Côrtes, peço que seja remettido á Commissão de guerra deste Congresso, para por ella ser adoptado, tomado na consideração que merecer, porque diz respeito a uma classe de alumnos, que se dedica á vida militar, aquem é preciso procurar todos os meios de fazer que elles tenham uma instrucção conforme a propria da sua profissão.

O Sr. Vice-Presidente: - Como já houve decisão do Congresso, toca á mesa o mandar buscalo; queira por tanto remetter o seu requerimento.

O Sr. Derramado: - Sr. Presidente, peço a attenção das Côrtes sobre o papel que tenho na mão, e vou mandar para a mesa. É uma representação da Camara municipal d'Evora, na qual, pelos motivos expostos na mesma representação, pede a revogação de uma, e a declaração d'outra das disposições do decreto de 27 de Outubro passado, pelo qual se deu o regulamento para a organisação, e administração da casa pia actualmente instalada naquella cidade. Esta representação merece a consideração das Côrtes, tanto pela qualidade dos representantes, como pela natureza do objecto: a representação é feita pelos mandatarios municipaes da 3.ª cidade do reino, conspicuos na mesma por sua independencia, probidade, e patriotismo. O objecto da representação é um estabelecimento de beneficencia, que tem dentro em si duzentos orfãos e expostos, que ahi recebem alimento, vestuario, e educação. Este estabelecimento tem actualmente de renda oito contos e trezentos mil réis, e acha-se sobrecarregado com um numero de empregados, que lhe absorve dous contos e quinhentos: a Camara propõe a suppressão de alguns ordenados superfluos; e propõe outras medidas, pelas quaes, sem detrimento para a fazenda publica, e sem pre-
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juizo da boa administração do instituto, se póde augmentar o rendimento do mesmo, a ponto de poderem ser alli admittidos mais um canto de desvalidos para gozarem do seu beneficio. Peço á Camara que mande este requerimento á Commissão competente, e que esta, quanto antes, apresente seu parecer sobre um negocio tão digna da attenção das Côrtes.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: - Este estabelecimento da casa pia foi um acto da dictadura; - o Sr. Rojão, administrador geral, disse ao Governo que era impossivel manter o estabelecimento com o que se tinha dado para o seu costeamento; o Governo não póde ver estas cousas de per si, ha de confiar-se nos seus administradores. Diz-se agora que o estabelecimento póde manter-se com mais economia; esse é desejo do Governo: peço pois que vá á Commissão, e que ella examinando a representação dê a sua opinião, para que naquelle estabelecimento sejam as despezas o melhor possiveis, ouvindo o administrador geral , pois que ninguem melhor do que elle póde dar esclarecimentos.

O Sr. Bardo do Casal: - Sr. Presidente, pedi a palavra para mandar para a mesa uma representação, que me foi dirigida pela companhia de pescadores da villa de Peniche; elles reclamam a devogação de parte do decreto n.º 24 de 6 de Novembro de 1833 , o qual lhe põe obrigação de pagarem uma licença para poderem pescar, que lhe custa 3:200 por anno; ellas allegam que ha bateis na villa que pescam no alto mar, e que occupão dez e doze homens; outros que occupão somente dous a trez homens, e que por tanto não devem pagar igual quantia áquella que pagão os barcos, de maior lotação; pediam por tanto ao Congresso houvesse de modificar aos pequenos bateis o preço das licenças.

Teve 2.ª leitura, o seguinte:

Requeiro que o Projecto n.º 10 da Commissão da administração publica, sobre o recrutamento para o exercito, seja admittida á discussão seguidamente áquelle que foi dado para a ordem do dia de hoje. Sala das Côrtes 13 de Março de 1837. Manoel Bernardo de Brito Perache.

O Sr. Vice-Presidente: - É um requerimento tendente a estabelecer a ordem do dia; segundo o regimento pertence ao Presidente o estabelece-la,; mas o Congresso póde resolver outra cousa, e determinar que se dê para ordem do dia este projecto da Commissão da administração publica n.º 10; mas este projecto foi distribuido, em sessão de 8 de Março, e por consequencia não está nos termos da lei, só se se quizer dispensar esta.

O Sr. Peroche: - As muitas representações das Camaras municipaes do Alentejo, e dos lavradores da mesma provincia, fazem com que eu julgue muito urgente discus-são do projecto, de que falla o requerimento.

Q Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: - Sr. Presidente, concordo com o illustre Deputado que acaba de fallar, que seja muito conveniente tratar-se deste objecto; mas não posso deixar de lembrar a. V. Exca. e ao Congresso a prioridade
do projecto n.º 7, que foi distribuido terça feira, e que de hoje em diante estará nos termos de ser dado para ordem do dia, quando se entenda que é isso conveniente. O projecto é aquelle que se refere á parcia das pipas do vinho do Alto Douro.

Q Sr. Vice-Presidente: - O Congresso resolverá se se há de dar para entrar em discussão o projecto que se pede, e que ainda não completou os oito dias.

O Sr. Derramada: - Sr. Presidente, o projecto de que fallou o meu illustre amigo, o Sr. Perache, tem a prioridade áquelle em que acaba de fallar o Sr. Barão da Ribeira de Sabroza. De mais, o recrutamento não póde verificar-se sem se decidir as representações, a que se deferiu naquelle projecto.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabroza: - Sr. Presidente, se o projecto tem a prioridade, dê-se-lhe, quando não mal posso consentir nisso, porque o projecto de lei , que deve abolir o cilicio do pareador deverá ser dado antes para a
ordem do dia. A urgencia do recrutamento está demonstrada, mas se admittirmos todas as excepções que se reclamam, inutil será o decreto que o determina. Eu por mim, hei de votar contra todas as excepções, quando se apresentarem.

O Sr. Vice-Presidente: - Eu vou propor se o projecto da Commissão de administração (n.° 10) deve entrar já em ordem do dia, antes de passarem os oito dias depois da distribuição.

Resolveu-se negativamente, ficando por tanto rejeitado o requerimento do Sr. Perache.

Teve mais segunda leitura o seguinte requerimento do Sr. Cezar:

Requeiro que se authorise o Governo para conceder ao batalhão da guarda nacional de Thomar, para estabelecer o quartel e secretaria do mesmo batalhão, uma propriedade de casas sitas na mesma villa, pertencente aos bens nacionaes, e que já se requereu ao Governo. Sala das Cortes, 11 de Março de 1837.

Remettido ao Governo.

O Sr. Leonel, como relator da Commissão de poderes, leu e mandou para a mesa um parecer da mesma sobre a excusa requerida pelo Sr. Deputado eleito, L. da S. Mousinho d'Albuquerque. Ficou sobre a mesa para entrar em discussão.

Teve depois segunda leitura o seguinte:

RELATORIO.

Sendo da maior urgencia para a tranquillidade dos povos, occorrer desde já com medidas promptas, e proficuas, ás inquietações que se tem suscitado pela incerta execução do decreto de 13 de Agosto de 1832, forcejando os senhorios indistinctamente por obter a cobrança da seus antigos direitos dominicaes, e os povos resistindo com razão para que se lhes não tornem illusorias as promessas feitas naquelle generoso decreto, o que tem produzido centenares de pleitos, que se acham pendentes, intentados a medo, e combatidos com receio; sendo a principal, e quasi unica difficuldade que embaraça o foro, o saber quem ha de provar a origem, e natureza dos bens e direitos questionados; e não sendo compativeis as providencias designadas no artigo 16 do citado decreto; nem sendo elle bem terminante nesta parte, apezar das mui amplas declarações, que sobre tal assumpto fez o seu author, e outros Deputados na sessão de 4 de Dezembro de 1894; sendo igualmemte claro, que o decreto se tornará puramente illusorio, se aos senhorios não fôr em geral incumbida aquella prova; porque segundo a natureza do negocio, os foreiros, e inquilinos, nem são os que conservam os titulos primordiaes, nem os poderão jámais obter, tanto pelo interesse que os senhorios tem em lh'os occultar quando lhes convenha, como pela excessiva pobreza da maior parte, distancias, e falta de relações para os fazerem procurar; e por ser instantes e perigosos os inconvenientes que actualmente se experimentam; não sendo possivel aguardar a reforma geral daquelle decreto, e de todo o direito emphyteutico, de que se acha encarregada a Commissão de legislação: reforma que terá de ser discutida com vagar, e madureza que o negocio exige: por todos estes motivos tenho a honra de apresentar, e propor como providencia especial até á lei geral, o seguinte projecto de lei, que trata somente de regular a obrigação, modo e effeitos de provar a natureza, e origem dos foros, e mais direitos designados no referido decreto.

PROJECTO DE LEI.

Art. 1.º Todas as pessoas, ou senhorios, seus agentes ou recebedores publicos, ou particulares, de qualquer de-

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nominação, ou cathegoria, que pretenderem receber direitos dominicaes, consistentes em foros, censos, rações, laudemios, luctuosas, jugadas, quartos, quintos, ou oitavos; eiradêgas, teigas d'Abrahão, ou quaesquer outros, de qualquer denominação que sejam vencidos depois que nas diversas terras começou a vigorar o decreto de 13 d'Agosto de 1832, são obrigados a apresentar o titulo, ou documento legal, e intelligivel, que mostre claramente a origem, e natureza desses direitos, para se vêr se são ou não dos abolidos pelo referido decreto.

Art. 2. Na falta de titulo, presume-se (e não é admissivel prova testemunhal em contrario) que os direitos mencionados no artigo antecedente são d'origem da Corôa, para lhes serem applicaveis as determinações do mencionado decreto, todas as vezes que elles forem: 1.° dos que pelas ordenações, e leis do reino são conhecidos pela denominação de direitos reaes, ou da Corôa; 2.º quando pertencerem, ou tiverem pertencido á fazenda nacional; a donatarios da Corôa por qualquer titulo que seja; ás ordens militares; ás ordens religiosas; ás corporações de mão morta, e estabelecimentos publicos de qualquer denominação; 3.° quando pertencerem a senhorios meramente particulares; mas os foreiros, ou inquilinos, fizerem certo por qualquer genero de prova, que os direitos pedidos provieram por qualquer titulo aos senhorios d'alguma das pessoas, ou corporações especificadas no numero antecedente.

Art. 3. Fóra dos casos mencionados no artigo 2.°, na falta de titulo, a lei presume, que os direitos referidos pertencentes a senhorios particulares são de origem particular, para se poderem cobrar; com tanto que a existencia da obrigação de pagar aliunde, se faça certa por algum dos modos que o direito ordena.

Art. 4. Todos os direitos dominicaes, que forem de origem particular provada por titulo competente, na fórma do artigo 1.°, e que depois da publicação do decreto de 13 de Agosto de 1832 foram incorporados na fazenda nacional, continuarão a cobrar-se. Porém não apresentando os recebedores e agentes da fazenda nacional, ou seus rendeiros os títulos da tua origem e natureza, conforme ao disposto nesta lei, ficam comprehendidos nas disposições do artigo 2.º para se presumirem de origem da Corôa.

Art. 5. Fica por esta fórma entendido o decreto de 13 de Agosto de 1832, quanto á obrigação da prova, e seus effeitos; e revogado o artigo 16 na parte somente em que incumbe ao Poder legislativo a decisão das duvidas sobre a origem, e natureza dos direitos nelle espicificados; porque isso fica desde já pertencendo ao Poder judicial nos termos das leis geraes: bem como ficam revogadas quaesquer leis em contrario.

Sala das Côrtes, 28 de Fevereiro de 1837. = 0 Deputado por Coimbra, Alberto Carlos Cerqueira de Faria.

Passou á Commissão de legislação.

O Sr. M. A. d´Vasconcellos: - Sr. Presidente, tenho visto apresentar alguns projectos de lei sobre imposição de novos tributos; por ora não trato de questão, se esses novos tributos são ou não necessarios; porque isso demanda muitas outras averiguações, que não é tempo de fazer agora; não entro pois nessa questão, mas por isso mesmo me parece que não é tempo de apresentar semelhantes projectos, porque este Congresso deve ser coherente com as deliberações tomadas anteriormente; deve respeitar algumas regras de politica necessarias ao progresso em materia de novos impostos. Logo que se apresenta um projecto para novas contribuições, põe-se em sobresalto o povo, e por isso entendo que não será politico apresentar esses projectos antes de se ter demonstrado á nação, que os rendimentos actuaes, bem arrecadados, não podem bastar para os encargos indespensaveis, e absolutamente necessarios para manutenção da ordem publica. Esta demonstração ainda se não fez, Sr. Presidente, e em quanto se não fiser, não póde a nação convencer-se da necessidade de contribuir novamente; de mais este Congresso já mostrou qual devia ser sua politica a este respeito na resposta á falla do throno; já se disse alli que depois de feitas as reducções necessarias o Congresso não duvidaria votar os tributos de indespensavel ne-cessidade para manutenção das despezas publicas: em consequencia acho eu que não só o Congresso está ligado a esta decisão, mas tambem cada um dos individuos, de que elle se compõe, e é por isso que faço o seguinte requerimento.

Leu-o, e ficou para segunda leitura.

O Sr. Raivoso: - Sr. Presidente, mando para a mesa os requerimentos de tres freguezias do antigo concelho de Abrantes, Bemposta, Aldeia do Mato, e Mourisco, que se queixam ao Congresso da nova divisão do territorio; pedem continuar a pertencer ao concelho de Abrantes, aonde sempre pertenceram, e para onde os chamam os seus interesses.

O Sr. Branquinho Feio: - Este Congresso está em maioria, por uma boa parte de mil almas está sem ser representada: eu presumo que sobre a mesa, ou na commissão de poderes, estará algum parecer com relação a algum Sr. Deputado, ou substituto que devam vir tomar assento neste Congresso: ha uma questão a decidir, supponho eu, da divisão eleitoral de Trancoso; como eu tomei assento neste congresso, nos fins de Fevereiro, não sei o estado em que se acha; desejo, podendo ser, obter informações, assim como tambem pedia que a Commissão de pareceres, tendo alguns outros pareceres promptos, os apresente para serem discutidos, porque, sendo um dos direitos mais sagrados que o povo exerce, o da votação, tornar-se-ía illusorio, todas as vezes que seus constituidos não vierem tomar assento neste Congresso; porque um ou dois votos podem influir na decisão de uma questão importante. É por isto que eu requeiro, que a Commissão apresente algum parecer sobre este negocio, para que entre em discussão, sem com isto querer estabelecer a ordem da discussão, que pertence ao Sr. Presidente determinar.

O Sr. Vice-Presidente: - Pelo que pertence á questão de Trancoso, devo informar ao Sr. Deputado, que não póde ainda tratar-se della, porque o negocio está dependente de certos esclarecimentos que se pediram, e que ainda não vieram.

O Sr. Branquinho Feio: - O Sr. Ministro dos negocios do reino está presente, póde dar algum esclarecimento a este respeito.

O Sr. Ministro do reino: - Todos os papeis relativos a eleições, apenas chegam á secretaria do reino, são logo remettidos ao Congresso.

O Sr. Leonel: - A Commissão dos poderes não tem nenhum parecer prompto, porque nenhum negocio lhe tem sido apresentado para o dever fazer. Agora, Sr. Presidente, me diz aqui um dos meus companheiros, na Commissão, que ha lá um: trataremos delle. Pelo que pertence porém ao negocio de Trancoso, direi, que os papeis que se pediram, ainda não vieram; mas logo que forem remettidos á Commissão, ella dará o seu parecer.

O Sr. José Alexandre de Campos: - É para dizer aquillo mesmo que eu pedi a palavra. A Commissão de poderes foi de parecer, que se requisitasse a acta original, e as relações para sobre ellas se fazer um miudo exame; mas estes papeis ainda não vieram, nem cabe no tempo o terem vindo.

O Sr. Costa Cabral: - Se me não engano o Congresso decidio que a Commissão dos poderes apresentasse o seu parecer a respeito do Sr. Mosinho, e então parecia-me que ella devia ser convidada para o apresentar quanto antes, afim de se discutir juntamente a do Sr. Pestana, que são da mesma naturesa.

O Sr. Leonel: - O parecer sobre o negocio do Sr. Mosinho, foi por mim escripto antes de eu adoecer; se cá se assignou pelos outros membros, ou não, eu não o sei,

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Agora, Sr. Presidente, mo mostram aqui sem estar assignado: assigne-se pois, vá para a mêsa, e entre em discussão.

O Sr. Visconde de Fonte Arcada: - Sr. Presidente, sobre a mêsa está o parecer sobre a escusa do Sr. Deputado Pestana: a resolução da Camara foi, que aquelle e o do Sr. Mosinho, fossem juntamente discutidos; e como aquelle não tenha sido dado para ordem do dia; por isso é que se não tem apresentado o do Sr. Mosinho, o qual está feito, e falta só assignado; o que agora se póde fazer é ir para a mêsa.

O Sr. Ministro dos negocios do reino: - Sr. Presidente, a obrigação do Ministro da fazenda, era apresentar o orçamento da receita, e despesa do anno economico de 1837, e §§, no principio da sessão; e tambem o orçamento, supplementar; mas tendo-se feito algumas reformas durante o tempo da dictadura, acabou esta na época da convocação das Côrtes; mas não foi possivel ainda concluir-se o arranjo final do orçamento. O Congresso não póde votar os meios necessarios para as despezas do estado, sem estar primeiro ao facto dessas despesas; convém porém ir trabalhando em conhecer quaes os precisos meios, não só de fazer face ao deficit; mas igualmente para supprir os rendimentos futuros, gastos por antecipações; e tambem para fazer face ás despesas correntes que se acham por satisfazer. O Congresso já está informado pouco mais ou menos, pelos orçamentos que tem sido apresentados pelas differentes administrações, que existem taes e taes dividas, importantes em uma quantia que tem mostrado o deficit que delles se vê, quantia que não tem sido diminuida, e a qual deve satisfazer-se, porque está a cargo da nação.

Com tudo, vejo agora, que o Sr. Deputado Vasconcellos acaba de apresentar uma proposta, fundada em principios que eu reconheço como verdadeiros; porque pede nella O Sr. Deputado, que nenhuma contribuição seja votada, sem que sejam primeiro presentes ao Congresso todos os orçamentos; mas é debaixo dos mesmos principios do Sr. Deputado, e sem faltar ao respeito que para com elle tenho, que me atrevo a ler os projectos que aqui tenho. Um delles é sobre uma nova imposição no tabaco, que montará a duzentos contos de réis (leo). Este augmento até certo ponto, póde diminuir o consumo; mas a Commissão de fazenda á vista dos dados que lhe forem apresentados, vencerá quaesquer difficuldades que se offerecerem a este respeito, e alli en darei os esclarecimentos precisos.

O Sr. Francisco Antonio de Campos pedio um credito de 850 contos: esta conta ha de ser apresentada ao Congresso. As anticipações que nós encontrámos, quando entrámos para o ministerio, eram de 3000 contos de réis. Convém pois, votarem-se meios para satisfazer estas dividas, até conseguir-mos equilibrar a receita com a despesa, e fazer com que andem paralellas: isto é, que quando se votarem vinte mil contos de contribuições, as despesas sejam tambem de vinte mil contos. Para occorrer porém ao pagamento do deficit, é necessario empregar outros meios; por exemplo, a venda dos bens nacionaes, ou recorrer a um emprestimo; mas estes não se podem realisar em Portugal, em grande quantidade, como tem mostrado a ex-periencia, e só se podem obter recorrendo a paizes estrangeiros; para isto pois, é que convem considerar-se diversas medidas. A que eu tenho a honra de apresentar, e que vou lêr, é ligada á venda dos bens nacionaes (leo). Digo isto neste artigo 1.º por esta fórma, porque o Governo tem obrigação de pagar effectivamente a dinheiro, e quando o não fizer assim, importa uma banca-rota.

Continuou a lêr o artigo 2.º e 3.°, e ponderou, que aquelle que fôr credor ao estado, de cem mil réis, recebe uma inscripção de 120$. O governo tem obrigação de pagar estas inscripções em dinheiro effectivo. Desta fórma o Governo sustenta o credito, pagando assim as dividas a que a nação está obrigada.

(Continuou a lêr os artigos 4.°, 5.°, 6.°, e 7.°; e disse.) Na capitalisação entra uma parte de ordenados, e estes não têm titulos; porque são mettidos em folha, e então era necessario forçosamente que isto se diga aqui por esta fórma.

Ora, Sr. Presidente, além deste projecto, o Governo tem outros a apresentar, não só para vencer o deficit; mas tambem para ser habilitado o occorrer ás outras precisões do estado: um dos que tenho a apresentar é relativo á decima rural, e urbana; outro sobre o sello, e diversos outros sobre a organisação da Fazenda em geral. Remetto agora estes dous projectos para a mêsa, e peço sejam mandados á Commissão de fazenda.

O Sr. M. A. de Vasconcellos: - O Sr. Ministro do Reino teve a bondade de interpretar as minhas intenções por occasião da apresentação do meu requerimento, que mandei para a mesa. Permitta-me S. Exa. que eu lhe note, que o melhor interprete das minhas intenções são as minhas palavras: en disse muito clara, e distinctamente no meu requerimento, pedia, que os Srs. Deputados fossem convidados para aquelle fim; agora está da parte dos Srs. Deputados o annuirem ou não ao convite. Eu exerci um direito, que tenho, fazendo o meu requerimento. Em quanto porém ao fim, digo, que d'elle se conhece a minha intenção, e mais claramente agora o direi: - foi feito positivamente para que houvesse, uma discussão sobre este negocio com o fim de ver se se suspendia a corrente de taes apresentados; porque elles transtornam a ordem de nossos trabalhos, e julgo que a sua apresentação antes de ser discutido o Orçamento, é summamente impolitica.

O Sr. Ministro do Reino: - Eu tinha declarado que tinha estes projectos a apresentar, e alguns membros da Commissão de fazenda convidaram-me para que o fizesse quanto antes. Agora direi, que se interpretei mal as palavras do Sr. Deputado, peço-lhe que se persuada que foi porque julguei que era aquelle o sentido em que fundamentava o seu requerimento. Sobre a ordem, Sr. Presidente, direi, que peço sejam impressas nos jornaes as propostos que hoje apresentei, vista a sua importancia; e o interesse que offerecem.

O Sr. Vice-Presidente: - Nisso não póde haver duvida. A Constituição diz no artigo 105 o seguinte (leu). Quando em uma das sessões passadas se apresentou aqui uma proposta sobre a suspensão das garantias na serra do Algarve, houve alguma discussão sobre se era applicavel ás propostas do Governo o artigo 106 da Constituição; isto é, se deviam ter o intervallo de oito dias depois da primeira leitura: resolveo-se que fosse á Commissão. Conseguintemente parece-me que agora em quanto aos que apresenta o Sr. Ministro d'Estado, se deve seguir o mesmo: consultarei porém o Congresso sobre isto.

O Sr. Sá Nogueira: - A marcha a seguir agora é exactamente a que V. Exa. indicou; mas como os projectos são de muitissima importancia, parece-me que o mais conveniente seria mandarem-se imprimir, para serem examinados pelos Srs. Deputados, e poder tambem tirar-se a vantagem de se offerecerem reflexões sobre elles, que sirvam á Commissão de fazenda para poder dar um parecer com mais conhecimento de causa.

O Sr. Vice-Presidente: - O Sr. Ministro da Fazenda já requereo isso mesmo: mandar-se-hão para a imprensa para se publicarem no Diario do Governo, e os Srs. Deputados que o recebem encontrarão alli os projectos. Os Srs. que são de opinião que estas propostas vão á Commissão de fazenda, levantem-se. (Venceu-se que sim.)

O Sr. Ferreira de Castro: - Sr. Presidente, eu vou dizer muito pouco sobre um objecto, a respeito do qual já preveni o Sr. Ministro dos Negocios do Reino, e rematarei por fazer uma indicação. A barra do Porto de sua naturesa perigosa e difficil, apresenta, depois d'alguns annos, e de dia a dia, uma face assustadora para o commercio d'aquella Cidade, commercio, que deve merecer a attenção do Governo,

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e que está hoje rivatisando com o de Lisboa. trago isto para dizer, que me parece ser digno de toda a attenção o fazer-se a obra de que vou fallar.

Não é necessario, Sr. Presidente, que os invernos sejam rigorosos, e as chuvas muitas, mas basta sómente a chuva dos montes por dois ou tres dias, como aconteceu o mez passado, para que não possa sahir um navio só, como então succedeo por bastantes dias. O primeiro navio que se atreveu a sahir foi o Vapor Porto em o dia 18 do sobredito mez; este Vapor é digno de attenção, não só pela sua boa construcção, mas tambem por pertencer a uma empresa consideravel, e de respeito; conduzia elle pessoas respeitaveis, e grandes fortunas; e então já se vê que os proprietarios da empresa haviam de encarregar aos melhores Praticos a sua sahida; mas assim mesmo os Praticos não asseguravam demasiadamente a sua sahida. O commercio do Porto recêa muito que em poucos annos se obstrua, de todo aquella barra, e que durante a estação invernosa poucos sejam os navios, que possam ter entrada, ou sahida. A obra é grande, mas tambem não é a grande obra do Tonel em Londres, ou d'outra igual em Plymouth. O commercio do Porto já pagou um imposto para a defeza d'aquella barra, mas não se lhe tem dado aquella devida applicação, e podia muito bem ser convertido para este fim. Além d'isto, achando-me eu o mez passado no Porto, aonde me demorei um quinze dias, e fallando a alguns negociantes d'alli sobre este importante assumpto, disseram-
-me, que elles se offereciam a fazer alguns sacrificios para o concerto d'aquella barra, sacrificios que elles serão obrigados a fazer por interesse seu, se o Governo o não fizer. É mesmo do decoro da Nação que ao menos se ensaiem estes trabalhos; ainda não sabemos até que ponto chega a sua difficuldade, para se dizer que não ha meios para os costear. Vou por tanto pedir ao Sr. Ministro dos Negocios do Reino, que obra um concurso por meio de uma empresa, se fazer aquella tão necessaria obra: [...] desde já peço ao Sr. Ministro muito de favor, que quando este meu requerimento possa ter algum seguimento, merecendo a attenção do Congresso, que não nos traga cá senão o que fôr puramente legislativo, para nos não vermos nos embaraços em que nos vimos com as estradas. Eu vou ler a indicação.

Leu-a, e mandou-a á Mesa.

O Sr. Vice-Presidente: - Este requerimento deve ter seguimento como todos os outros, e na occasião competente o Sr. Ministro dos Negocios do Reino terá a palavra sobre elle:

O Sr. Barjona: - Eu tenho a palavra sobre o Orçamento, para perguntar ao Sr. Ministro da Fazenda quando o teremos.

O Sr. Vice-Presidente: - Torno a lembrar a disposição do artigo 30 do Regimento (leu-o). Eu peço que observem este artigo, concluindo os seus discursos por uma moção na fórma delles.

O Sr. Barjona: - Nós approvámos aqui o Regimento da maneira que V. Exa., e o Congresso sabe, por duas fortes razões; a primeira porque era necessario que tivessemos uma lei quanto antes; uma defeituosa era melhor que nenhuma; segunda porque nos reservámos o direito de ir modificando os differentes artigos á medida: que fôssemos conhecendo a necessidade de o fazer. Já se tem revogado algumas partes do Regimento sem discussão; porque se tem conhecido, que não eram as mais convenientes, e tem-se-lhes substituido a prática da Camara passada e ainda no sabbado se fez isso na votação nominal: entretanto a Camara decidirá sobre este ponto; mas não posso deixar de ponderar, que da prática stricta deste artigo se seguirão graves inconvenientes.

O Sr. Vice-Presidente: - Eu nem quero defender, nem impugnar a bondade d'este artigo, mas nem devem fazer executar a lei. - O Congresso entretanto póde modifica-la.

O Sr. Silves Sanches: - Eu pedi a palavra para apoiar a proposta feita pelo meu nobre amigo o Sr. Barjona. Todos louvarão a V. Exa. em quanto observar a lei escripta, não só porque esse é o dever de V. Exca.; mas porque os legisladores devem sempre principiar por darem o exemplo da observancia das leis; e se o regimento é para nós uma lei, devemos observa-la, tanto quanto nos fôr possivel. Mas como a existencia d'essa lei depende da resolução do Congresso, eu não julgo que haja inconveniente em o Congresso resolver, que esse artigo não se entende com as interpelações aos Ministros da Coroa. Pois sempre esta a prática d'este parlamento, e de todos os outros: e prática contraria traria comsigo mais morosidade, e prejuiso do que brevidade nas discussões, e, conveniencia publica. É por essa razão pois, que eu tambem voto, porque esse artigo do regimento se não entenda relativamente ás interpellações aos Srs. Ministros da Coroa, apoiando por este modo a proposta do Sr. Barjona.

O Sr. João Victorino: - Eu pedi a palavra, quando fallava um illustre Preopinante, porque queria dizer alguma cousa nesta materia para oppor-me com todas as minhas forças, para que este artigo do Regimento se derogasse, e queria refutar esta proposta, quando ella se apresentou em geral. Com tudo ella já está muito mais modificada; e mettida nos eixos em que póde correr. Este artigo do Regimento, o qual o que tem de mão é não ser rigidamente observado, parece-me um dos mais bem lançados naquella lei; porque elle tende a evitar estas conversas eternas, estas divagações ociosas, e inuteis, estas questões fóra da ordem, que não servem senão de nos levarem o tempo, com prejuiso manifesto das cousas proficuas, e interessantes, de nos embrulharem as questões, e muitas vezes
tem coberto de indecencia, e mesmo descredito as sessões das Côrtes. O artigo é magnifico em geral. Agora da maneira porque se pertende altera-lo, e da nova fórma porque se propoz a questão, que é se elle deve ser revogado só a, respeito das interpellações, que qualquer Sr. Deputado tem a fazer aos Srs. Ministros da Corôa, não tenho duvida em approvar essa modificação no mesmo. (Apoiado.)

O Sr. Costa Cabral: - Eu já fui prevenido em parte pelo Sr. Julio, mas para evitar todas as duvidas lembra-me apresentar uma excepção a este artigo nestes termos.(leu)

O Sr. Vice-Presidente: - Eu tinha tenção de propôr isso mesmo.

O Sr. Macario de Castro: - Peço que se não ponha isso á votação sem se me ouvirem duas palavras. Nesta materia o Sr. Alberto Carlos, e o Sr. Costa Cabral preveniram-me inteiramente; mas parece-me que não estamos rigorosamente prohibidos de fazer interpellações aos Srs. Ministros da Corôa; porque eu não comprehendo bem que uma moção seja restricta a um projecto de lei, ou outra cousa similhante: pedir ao Sr. Ministro da fazenda que declare quando apresenterá o orçamento,é uma moção; é mover um peditorio, que não está excluido do artigo 30.

O Sr. Vice-Presidente: - Não ha duvida nenhuma que qualquer Deputado póde fazer uma moção; e o Sr. Barjona faria uma moção se a tivesse mandado por escripto; mas a questão é ser por escripto, porque lá está o art. 68 que o diz. (leu.)

O Sr. Leonel: - É quasi escusado que eu falle, porque appoio o que se tem dito; entretanto uma moção para perguntar ao Sr. Ministro quando apresenta o orçamento, para uma simples pergunta, não é preciso ser por escripto.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: - Eu voto pelo requerimento; mas antes de votar quiséra fazer uma unica reflexão, e vem a ser, que em todos os Parla- mentos se reconhece o direito de interpellar os Ministros sobre os negocios do estado; mas quando essas interpellações se não referem á segurança publica, ou a um objecto de transcenden-

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te e subita importancia, sempre se lhes dá noticia previamente. Se o requerimento é assim entendido, voto por elle, de outra sorte não. Porque os Ministros são Deputados, e podem deixar de o ser; mas sempre se deve presumir que serão urbanos e polidos, e dando como taes, todas as explicações possiveis; e por isso mesmo o Congresso não quererá prescindir de igual urbanidade e cortesia, dando-lhes noticia previa do objecto, sobre o qual se pretende interroga-los. Nenhum Ministro póde ser encyclopedico, e se o franciscano Macedo defendia conclusões de omni scibili, os Ministros difficilmente poderão responder com exactidão a tudo o que se lhes perguntar sem noticia previa. Eis aqui o motivo porque eu penso que essa noticia se lhes deve dar, excepto nos casos em que a segurança publica possa exigir uma interpellação instantanea etc.

O Sr. Silva Sanches: - Muito fundada é a opinião do meu nobre amigo o Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa, em quanto quer que todos aquelles Srs. Deputados, que houverem de interpellar os Ministros da Corôa, hajam de os prevenir com antecipação. Digo que é fundada, não só porque, como elle muito bem disse, é a prática de todos os parlamentos; mas porque, como elle igualmente ponderou, os Ministros não são encyclopedicos, e não poderiam promptamente responder a todas as perguntas, que se lhes houverem de fazer; porém é preciso distinguir entre moções fundadas em actos seus, e moções que se reduzem a simples perguntas, como aquella que o Sr. Barjona acaba de fazer; n'uma simples pergunta, como aquella, não ha inconveniente algum em que se não hajam prevenido os Ministros da Corôa; porque a cousas tão simples facilmente elles poderão responder. Agora quanto á moção sobre um seu acto, que haja de se censurar, ou ainda mesmo para censurar um acto praticado por authoridade subalterna, contra quem os Ministros não tenham feito effectiva a responsabilidade, então sim senhor, convém, é de civilidade, é de necessidade, que se lhes dê parte com antecipação, não só de um dia, mas com a antecipação de dous ou tres dias. Podendo todavia a differença, se agora fosse feita, produzir inconvenientes: melhor será que ella se não faça, e que se vote puramente sobre se as interpellações aos Ministros não estão comprehendidas no citado artigo do regimento.

O Sr. Barjona: - Esta questão vai-se demorando realmente muito mais do que se esperava; todavia tendo ella chegado a tal ponto não posso deixar de dizer alguma cousa, até para vêr se a abbrevio, porque muitas vezes alonga-se mais a questão, quando se quer acabar com ella, abafandoa-a. Sr. Presidente, uma cousa é a questão primeira, outra é o additamento, que apresentou o Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa. É preciso, que uma assembléa destas tenha regras, por que seja obrigada a dirigir seus trabalhos; mas deve tambem ter muito cuidado em não estabelecer leis tão restrictas; que venham muitas vezes a causar-lhe grandes embaraços: o bom senso, o tacto delicado, está em achar o meio termo: e eu não sei se resultarão graves inconvenientes em estabelecer a regra que apresentou o Sr. Barão: o prevenir os Srs. Ministros antes de os interpellar reputa-se um acto de civilidade em todos os parlamentos; eu, parece-me, ainda não faltei a esta regra; porque até para este objecto avisei o Sr. Ministro duas ou tres vezes: todavia a necessidade publica muitas vezes exige que se faça uma pergunta de repente, e o Ministro se não está habilitado para responder, póde pedir espera, e temendo que a espera possa affectar a sua reputação, póde pedir ao publico, que suspenda o seu juizo era quanto não se justifica. Não me parece por tanto, que a proposta do Sr. Barão seja necessaria; com tudo, resolva o Congresso o que julgar mais conveniente.

O Sr. Ferreira de Castro: - Convenho tambem na indicação, ou substituição, ou artigo especial, que apresentou o Sr. Costa Cabral ao artigo 30 do regimento: convenho igualmente no que disse o nobre Deputado o Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa; mas no que não convenho, é em que se altere o artigo do regimento sobre tal objecto. A prática apontada pelo Sr. Barão está em uso em todos os parlamentos, em Inglaterra, e França, que são os mais conhecidos; mas parece-me que nos regimentos d'esses parlamentos não está um tal artigo escripto: convenho na sua doutrina, nas suas idéas, mas quero unicamente, que o resultado que daqui se tire, é lembrarem-se os Srs. Deputados para fazerem disto um uso prudente, filho da civilidade, da educação, etc.; porque o que acaba de dizer o Sr. Barjona é muito exacto; eu mesmo neste momento, depois de me assentar aqui, tendo, quando se estava fazendo a chamada, aberto o meu correio, acho cartas sobre objecto em que desejava ouvir o Ministro, mas não o exijo, porque são materias um pouco sérias. Por consequencia desejo eu que todo o Congresso tenha muito em vista o que acaba de dizer o Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa, mas que de maneira nenhuma se escreva ou metta o tal artigo no regimento, mas sim o que propôz o Sr. Costa Cabral.

O Sr. Ministro da justiça: - Não sei para que se questiona sobre uma materia que ninguem impugna. É certo, que o Congresso, e cada um dos Srs. Deputados, tem direito de interpellar os Ministros da Corôa sempre que assim o julgarem conveniente; mas é igualmente certo, que por mais amplo que seja esse direito elle nunca póde destruir a obrigação que tem os Ministros de responder a essas interpellações, como convém á dignidade da Corôa, e ao interesse do paiz, ou de não responder, se por ventura da sua resposta se podesse seguir algum compromettimento.....(Aqui advertio o Sr. Presidente, que o orador tinha pedido a palavra sobre a ordem, e então concluio pedindo, que se consagrasse o principio em toda a sua extensão, deixando aos Ministros e Srs. Deputados o uso, que a sua discripção quizesse fazer).

O Sr. Pinna Cabral: - Limitar-me-hei a ponderar que me parece, pelo que tenho ouvido dizer, que V. Exca. se deve limitar a propôr ao Congresso se este artigo do regimento se deve ou não alterar; mas parece-me que não é praticavel alterar um artigo com força de lei sem ser por meio d'outra lei, ou uma proposta escrita na forma do artigo 57 do regimento. Por tanto se o Sr. Barjona quer que se altere este artigo, seria bom que se seguissem os tramites regulares, e se passasse a tomar uma decisão; mas não entendo que o Congresso possa alterar um ponto de lei sem primeiramente meditar qualquer proposta, que se lhe apresente.

O Sr. Vice-Presidente: - Parece-me que é muito exacto o que disse o Sr. Deputado, mas isso é para quando se tratar de uma lei: agora quando se trata do regimento das Côrtes, podemos nós revoga-lo quando convenha; porque isso não importa a revogação de uma lei geral, é a revogação de uma resolução que só vigora dentro das mesmas Côrtes; por consequencia não me parece que seja aqui necessario isso que o Sr. Deputado lembrou, e que aliás não é agora a questão, que se tem tratado: eu vou ler o additamento do Sr. Costa Cabral (leu). Os Srs. que approvam este additamento, ou esta emenda ao artigo 30 do regimente tenham a bondade de levantar-se. (Approvado). Agora o Sr. barão da Ribeira de Sabrosa tinha feito um additamento a esta modificação, que se fez ao artigo 30, mas como a não fez por escripto eu não a posso pôr á votação.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: - Sr. Presidente, eu não pretendi fazer additamento algum, mas sómente offerecer ao Congresso a minha opinião sobre aquelle objeto.

O Sr. Vice-Presidente: - Eu tambem entendi isso, isto é, que o Sr. barão da Ribeira de Sabrosa não queria senão appellar para o bom censo, e para a urbanidade dos Srs. Deputados, quando tiverem de interpellar os Srs. Ministros.

O Sr. Barjona: - Depois que tomei assento neste Con

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gresso tenho sempre esperado pelo orçamento com ansiedade. Nisto sou de certo acompanhado por meus illustres collegas, e posso até dizer que por todos os meus constituintes. É indubitavel, Sr. Presidente, que ha hoje em todo o paiz um grande desejo de saber quaes são as nossas despezas, e que meios temos para lhes fazer face: mas na hora em que nos achamos existe uma nova razão que [...], e é o ter o Sr. Ministro interino da fazenda apresentado varios projectos sobre impostos, e ser impossivel que approvemos semelhantes projectos sem primeiro termos examinado o orçamento. Não posso em consequencia deixar de instar de novo por elle.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: - Sr. Presidente, eu entendo que uma das melhores bellezas do sistema representativo, é a presença dos ministros da corôa nos parlamentos, porque muitas vezes é necessario nos ministros darem explicações vocaes que se tornão indespensaveis para a boa ordem dos trabalhos das assembléas legislativas, por consequencia, eu muito agradeço aos Srs. Deputados, a bondade de nos interpellar quando tiverem para isso motivo; porque quando nós tivermos feito a bem do nosso paiz, os Srs. Deputados hão de nos fazer a justiça de approvar nossas acções; e quando nós tivermos errado, os Srs. Deputados terão a bondade de nos advertir. Agora pelo que toca a respeito da questão, estou certo que os ministros da coroa hão de poder responder immediatamente pelos actos da sua administração; mas quando o não possam fazer, os ministros pedirão desculpa. Agora a respeito do orçamento, o Sr. Deputado mostrou grande desejo que elle se apresentasse sem muita demora. Na ultima vez que eu fui interpellado neste Congresso, já eu declarei que o orçamento na parte relativa á despeza, já está parte no Congresso, e as outras duas partes já eu assignei os officios para lhe serem remettidas; agora direi que o do ministerio da guerra é mais longo, e por isso ha de gastar mais tempo a imprimir, e mesmo porque se torna indispensavel que estes trabalhos venham perfeitos, porque o orçamento é a declaração do Governo sobre tudo que elle julga receita provavel, e despeza ordinaria, e se esses trabalhos não vierem reflectidos, não prehencherão os desejos do Congresso, e o tempo que se gastar na sua discussão será inutilmente perdido; por consequencia este negocio deve ser aqui apresentado com muita circunspecção, e com muita dignidade da parte do Governo; e o Sr. Deputado teve muita razão quando disse que elle não podia votar as novas contribuições, sem primeiro ver o sistema geral dellas estabelecido no orçamento, mas o Governo tambem não quer que o Sr. Deputado vote sem conhecimento de causa, o que o Governo deseja é ir apresentar os seus trabalhos á Commissão de fazenda com toda a clareza, para que ella com mais facilidade possa dar o seu parecer sobre um objecto tão importante para a boa economia da fazenda publica; com esta declaração, feita com a melhor boa fé, julgo eu que o Sr. Deputado, e todo o Congresso deve ficar satisfeito.

O Sr. Vice-Presidente: - Eu creio que já deu uma hora, e então é necessario passarmos á ordem do dia; os outros Srs. que estão inscriptos fica-lhe reservada a palavra para outro dia.

Vozes: - Votos, votos.

O Sr. Vice-Presidente propoz o seguinte additamento (do Sr. Costa Cabral) ao artigo 80 do regimento - Cessa a disposição do artigo antecedente, quando algum Deputado tiver de interpellar os Ministros - da Corôa. - Foi approvado.

Passando-se á ordem o dia, foi lido o seguinte

PARECER.

A Commissão de guerra foi remettido o requerimento de D. Maria Clara da Gama, viuva do tenente coronel Antonio Peixoto da Gama, em que representa á Camara nos termos seguintes. (Segue o requerimento.)

A Commissão é de parecer, que em quanto á divida dos contractos feitos pelo Governo, pertence a este satisfazer-lhe; e em quanto ao monte-pio para suas filhas não pode ter logar, por se não dever fazer uma excepção a seu respeito.

Sala da Commissão de guerra, em 23 de Fevereiro de 1837. = João da Silveira de Lacerda; Conde de Lumiares; Antonio, Cezar de Vasconcellos; Manoel da Souza [...]; Bardo do Bom Fim; Barão da Ribeira de Sabroza; João Pedro Soares de Luna.

O Sr. Ministro da Justiça: - Eu peço perdão ao Congresso, e mais particularmente aos membros da Commissão, em ter concorrido para que ficasse sobre a mesa o parecer, que novamente se acha em discussão, e que agora me parece lançado do unico modo que convém. A supplicante foram mandadas abonar pelo Ministerio dos negocios da marinha as comedorias que lhe pertenciam, e a cinco filhos pela viagem para Cabo Verde. Em quanto ás duas pertenções, cujo deferimento ella reclama no presente requerimento, nunca tiveram seguimento pelo Ministerio da marinha, nem o podiam ter, porque o batalhão provisorio mandado para Cabo Verde, a que pertencia o marido da supplicante, foi expedido pelo Ministerio da guerra; e segundo o decreto da sua creação ficou considerado como devendo fazer parte do Exercito de Portugal: por conseguinte não dependia de mim o dar favoravel deferimento á sua pretenção.

O Sr. Vasconcellos Pereira: - Eu desejava que algum dos membros da Commissão de guerra me dissesse, se a lei que manda dar o soldo por inteiro ás viuvas dos officiaes que morrem em campanha, prohibe que ellas continuem a receber o monte pio que lhe pertence.

O Sr. Raivoso: - A lei declara, e diz que seja descontado todo e qualquer lucro, ou pensão que as viuvas tivessem por outra parte.

Foi approvado o parecer da Commissão.

Leu-se mais o seguinte;

PARECER

A Commissão encarregada de inspeccionar os trabalhos
da publicação das sessões das Côrtes, examinando o requerimento d'alguns tachigrafos que pedem augmento em seus ordenados, e chamando a uma conferencia geral, não só os requerentes, mas todos os outros para assim se instruir cabalmente das razões, e justiça das pretenções: achou que os ordenados, que agora percebem os tachigrasos, não lhes foram arbitrados em relação á sua aptidão, mas talvez por motivos, e considerações, que não podem merecer a approvação deste Congresso; e ppara combinar quanto é possivel a justiça dos requerentes com a economia que as circunstancias exigem; é de parecer que os tachigrafos (de hoje em diante), que abaixo se mencionam, passem a receber os ordenados que a cada um vai designado. - Luiz Antonio de Mesquita Falcão; Julio José da Silva; Antonio José da Luz Fernandes, em logar de trezentos mil réis que até agora percebiam, quatrocentos e oitenta mil réis; José Vieira Caldas de Lemos, em logar de trezentos mil réis, trezentos e sessenta mil réis. E considerado mais que é não só mister animar entre nós a arte tachigrafica, mas mesmo de presente augmentar o numero dos tachigrafos para abreviar a cópia das sessões, e fazer cessar a individua desigualdade de ordenados em outros empregados desta repartição; parece-lhe que o tachigrafo Alexandre Antonio da Cunha Basto seja admittido ao serviço das Côrtes com o ordenado de duzentos e quarenta mil réis, e que o amanuense da secretaria tachigrafica José Pedro Pereira passe a receber em logar de duzentos, trezentos mil réis por anno. Palacio das Côrtes 11 de Março de 1837. - José Liberato Freire de Carvalho; Paulo Midosi; José [...] Coelho.

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O Sr. Midosi: - Sr. Presidente, na ausencia do Sr José Estevão, membro da Com- missão de redacção do diario das Côrtes, aquem coube ser o seu relator, tomo eu a palavra para dar as razões em que a Commissão fundou esse parecer. Sr. Presidente, é penoso sem duvida, attento o estado dos nossos poucos meios, que uma Commissão creada ha tão poucos dias, para fazer com que as sessões do Congresso se publiquem diariamente, começe logo por pedir um augmento de ordenado aos tachygrafos, mas em verdade depois da Commissão ter ouvido particularmente o tachygrafo em chefe, e os tachigrafos subalternos sobre as differenças dos ordenados de cada um delles, e sobre o trabalho que prestam, e depois de ter meditado nas observações de alguns delles, sobre a pequenez de certos ordenados, que percebem em comparação com outros, e ponderando as difficuldades do trabalho, que em verdade é pesado, e insano, não pôde a Com- missão deixar de convir, que a alguns delles se devia augmentar o ordenado, assim como entendeu que se devia chamar mais um tachygrafo, que se julgou ter alguma aptidão para coadjuvar nos trabalhos, porque o numero dos tachygrafos que existe é pequeno. O Congresso tem visto a difficuldade que ha para a prompta publicação das sessões, e por diversas vezes tem observado as causaes, pelas quaes ellas não pódem publicar-se em dia. A Commissão entendeu que o primeiro objecto a que devia attender, era satisfazer ás reclamações dos tachygrafos, para que não apparecessem depois pretextos de irregularidade de serviço, e tratando logo de obviar a tal circumstancia, propõe no parecer, que se discute, o meio que julgou melhor.

A Commissão deve declarar que viu com satisfação, que os tachygrafos lhe apresentaram prompta uma sessão em vinte e quatro horas, ou ainda menos; porque elles entregaram ás dez horas do dia seguinte a sessão que tinha acabado ás quatro horas do dia anterior. A Commissão logo no mesmo dia mandou pôr a sessão em uma das mesas das correcções, e fez uma declaração, e um annuncio para que os Srs. Deputados se dessem ao incomodo de rever os seus discursos immediatamente, porque em verdade é esse o grande atraso da sua prompta publicação no diario. A Commissão depois disto determinou que as sessões fossem regularmente, e sem a minima demora, para a imprensa, e julgo que alli a falta que ha de braços, e á affluencia de trabalho, é que demoravam a publicação. O Sr José Liberato está presente, e sobre a imprensa poderá melhor dizer qual foi a causa por que não se imprimiu a ultima sessão, porque dos tachygrafos nenhuma falta houve. Quanto ao augmento total dos ordenados pouco excede a seiscentos mil réis, o qual divi-dido por todos torna-se muito diminuto. O Congresso póde comparar os ordenados de todos os tachygrafos, verá que elles não são excessivos, e achará sem duvida que esse augmento era de justiça e indispensavel, e fará com que elles desempenhem melhor o trabalho que se lhes exige. O expedito desse trabalho offerece, devo confessa-lo, esperanças não só de satisfazer ás vistas da Com- missão, mas tambem aos desejos do Congresso, que tantas vezes se tem occupado com a necessidade da prompta publicação de suas sessões. Fiz estas observações porque a Commissão interessa justificar porque propõe o augmento dos ordenados, que poderão parecer talvez algum tanto pesados; mas se se attender á falta que ha de tachygrafos, e ás circumstancias que aconselharam a medida, medida compativel com o estado actual do thesouro, creio que não duvidará o Congresso approvar o parecer da Commissão.

O Sr. Costa Cabral: - Sr. Presidente, eu tinha pedido a palavra, não para impugnar, nem para sustentar o parecer da commissão, mas sim para pedir algumas explicações: já ellas se acham satisfeitas em parte pelo Sr Deputado que acaba de fallar; entre tanto parece-me que o Congresso ainda carecerá de alguns esclarecimentos para poder votar sobre a materia do parecer da commissão. O parecer é um pouco confuzo, quando diz que os ordenados foram taxados aos tachygraphos no estado em que se acham, tendo em attenção motivos e considerações, que o Congresso não póde approvar. Eu desejava, e parece-me que o Congresso desejará tambem, que se nos diga e explique quaes são esses motivos e considerações; só assim, e depois de os conhecermos, poderemos dizer se os approvamos, ou reprovamos. A commissão diz depois que, combinando a justiça com a economia, se deve augmentar o ordenado de alguns dos tachygraphos, nesta parte tambem o parecer era una pouco confuzo; mas o Sr. Deputado acaba de explica-lo, dizendo que a commissão vota pelo augmento dos ordenados; por isso que é hoje maior a aptidão e conhecimentos dos tachygraphos: estou satisfeito nesta parte; mas desejava que o Sr. Deputado, vista a confuzão do parecer, désse mais os esclarecimentos que pedi, a fim de que com mais conhecimento de causa poder-mos votar sobre esta materia. Depois dos esclarecimentos serem dados, pedirei a palavra para dizer mais alguma cousa.

O Sr. José Liberato: - Eu pedi a palavra para dar a razão porque hoje não appareceu no Diario do Governo a sessão de sexta feira. A razão foi, segundo me consta, porque o original só fôra hontem para a imprensa pelo meio dia, ou pelas duas horas; ora hontem foi domingo, e não se sabia que ella hontem é que havia de ser mandada, porque se se tivesse dito no sabbado, que ella havia de hir no domingo, ter-se-hiam dado as providencias para ella apparecer hoje; porém como não estava nada prevenido, e era domingo, quando a sessão alli chegou não haviam compositores na imprensa, e não era possivel chama-los, porque cada um tinha tomado seu destino, por não contarem com este trabalho: por consequencia a verdadeira razão foi por se não ter prevenido isto no sabbado.

Agora é preciso que eu diga tambem uma cousa: eu hoje estive com o Director da imprensa, e elle disse-me que a rasão da demora anterior, é porque algumas vezes se tem passado oito e dez dias sem se lhe mandar sessão alguma, e depois apparecem umas poucas de uma vez, se isto se fizesse de maneira, que houvesse sempre na imprensa uma sessão preparada, seria muito facil que todos os dias ellas se publicassem, porém mandar-se em alguns dias muitas sessões, e em outros nenhumas, é o que tem causado o atraso de sua publicação: assim eu peço que se faça a deligencia para que hajam sempre na imprensa, uma ou duas sessões de antemão, e que se não demore a sua remessa quatro ou cinco dias, como tem acontecido; porque então a difficuldade que tem havido para, a sua publicação, ha de desapparecer; sendo tambem necessario que as sessões que se houverem de
imprimir para se publicarem no dia seguinte, se não mandem para a imprensa ao meio dia, ou ás duas horas do dia antecedente; porque então é impossivel o publicarem-se; é preciso mandalas com tempo. Concluo tornando a repetir que se a sessão de Sexta Feira não appareceu hoje, foi por hontem ser Domingo.

O Sr Freire Cardoso: - Sr. Presidente, eu approvo em geral o parecer da Commissão, porque me parece que a mola principal deste negocio consiste em haver Tachigrafos, e Tachigrafos que bem desempenhem os seus deveres. Alguns Srs. Deputados já aqui fallaram em haver uma imprensa neste palacio, mas a falta não é da [...], e tambem já alguem se lembrou de uma empresa, que se fosse possivel, eu não deixaria de approvar, até para em certo modo punir um procedimento menos delicado que houve da parte d'alguem a respeito do Congresso: entretanto o Congresso deve mostrar-se sobranceiro a miseraveis resentimentos feminis: sunt delicta tamen quibus ignavisse velimus ...... Eu approvo pois o parecer da Com- missão, mas acho que em haver bons Tachigrafos, e em se publicar com toda a exactidão os discursos dos Srs. Deputados, interessa

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menos a pessoa moral do Congresso, que individualmente cada um dos Srs. Deputados; porque a opinião publica ha de julgar bem ou mal dos trabalhos deste Congresso, segundo o bom ou máo resultado de suas deliberações legislativas: mas cada um dos Srs. Deputados póde perder ou ganhar em sua reputação politica ou litteraria, se acaso se publicarem os seus discursos como elles os não fizerão, as suas palavras como elles as não pronunciaram. Ainda ha poucos dias me aconteceu citar aqui uma Portaria, e na publicação das Sessões errar-se a data, porque o Tachigrafo facilmente se enganou pela semelhança dos sons das duas palavras gemeas, e escreveu 19 de Novembro em logar de 19 de Setembro; o que podia ser objecto d'algum pequeno artigo desses malignos Jornaes estrangeiros, que por aqui se escrevem em Portuguez, arguindo-me de falsificador de datas. Como porém este accrescimo que se faz aos ordenados dos Tachigraphos vai augmentar a despeza do Thesouro, he para evitar isso, que eu desejo que elle seja deduzido das diarias dos Srs. Deputados, por isso que cada um delles tem um particular interesse na publicação dos seus discursos. Eu, Sr. Presidente, sou um d'aquelles que menos interesse deveria tomar na exacta publicação das Sessões, e por tanto procurar subtrahir-me a este pequeno sacrificio, pois V. Exca. sabe, e sabe-o todo este Congresso; que eu poderia ser uma capacidade na Academia dos silenciosos, mas nesta assembléa não passo de zero, todavia custa-
-me sempre a votar augmento da despeza nacional, e por isso desejava que este augmento fôsse abatido nas nossas diarias.

O Sr. Silva Sanches: - Sr. Presidente, a primeira vez que se tachou ordenado aos tachygrafos, foi no fim da sessão extraordinaria de 1834, ou no principio da de 1835; mas o seu adiantamento estava ainda então em tal estado, que o ordenado, que se lhes arbitrou, foi unicamente para os animar a continuarem na frequencia da arte; e tanto foram estas as vistas da Camara daquelle tempo, que o ordenado, que então se lhes votou, apenas foi de cem mil réis. Depois em 1835 , quasi no fim da sessão, achando a Camara que elles se tinham dado com efficacia a este estudo, decretou-lhes o ordenado de trezentos mil réis; mas este ordenado ainda foi para os estimular a continuar no progresso de sua arte. Foram pois estas as razões, porque se conservaram até aqui com o ordenado de trezentos mil réis; e talvez sejam estas as considerações, a que allude a Commissão, e que o Sr. Costa Cabral queria ver explicadas. Agora porém, que a sua aptidão tem realmente crescido, e que se acham por conseguinte em muito melhor estado para poderem preencher o fim, para que são aqui chamados, parece-me de razão e de justiça, tachar-se-lhes um ordenado correspondente ao seu trabalho: e eu por estes motivos, e vendo pelas notas, que elles mesmos me apresentam, que já merecem sem duvida nenhuma mais alguma cousa, voto pelo accrescimo do ordenado, segundo o parecer da Commissão.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: - Sr. Presidente, eu tinha pedido a palavra quando um nobre Deputado disse, que a despeza com a publicação do diario das sessões das Côrtes, devia ser feita á custa das diarias dos membros do Congresso. Sr. Presidente, eu entendo que pelas condições do sistema representativo, o Governo tem obrigação de fornecer todos os meios necessarios, para que as sessões das Côrtes se publiquem; porque em todas as nações, que se governam pelo mesmo sistema, é esta uma despeza a cargo geral da nação, e eu entendo que é uma das mais legitimas que a nação póde fazer, d'outra maneira não o julgo muito conveniente. É verdade que nós não podemos fazer despezas, sem attender á mais severa economia, mas é necessario que as diarias dos Srs. Deputados, sejam effectivas. O Governo quando arbitrou essas diarias, que os Srs. Deputados actualmente percebem, foi mesquinho, por attender ás circums- tancias em que se achava o paiz; mas quando pela Constituição se tratar de se fixar essa diaria aos Srs. Deputados das futuras camaras, eu hei de votar com generosidade por um augmento rasoavel, e correspondente ás suas funcções. Sr. Presidente, estamos no tempo das economias, entretanto não podemos prescindir das despezas indispensaveis, apesar que prodomina uma idéa eminentemente ante-
-liberal, que é, que as funcções dos Deputados sejam gratuitas. J. Baptista Say, no seu curso de economia politica, pretende mostrar que só a pretenção daquelles homens, que querem empolgar o Governo dos estados, é que faz nascer a idéa de que as funcções dos Deputados sejam gratuitas; mas isto é porque não querem, que os homens de grandes talentos, e de grandes virtudes, mas menos favorecidos da fortuna, possam sentar-se ao lado da aristocracia da nobreza, e da aristocracia dos cruzados novos. Eu, Sr. Presidente, não quero ser exclusivamente governado pelos homens de grandes propriedades; mau sim pelos homens de sabedoria e virtude; porque se sómente os homens de grandes propriedades podessem entrar na administração dos negocios publicos, teriamos uma só classe predominante. Se isto prevalecesse entre nós; teria acaso tido assento neste Congresso o Sr. Barreto Feio? E pergunto eu; seria util que os homens, que tivessem as qualidades do Sr. Barreto Feio, fôssem privados de concorrer para a felicidade do paiz, só porque não possuem grandes propriedades? Por consequencia parece-me que nós nos não devemos limitar á aristocracia da nobreza, nem á aristocracia dos cruzados novos; mas que devemos aproveitar todas as luzes, e talentos aonde quer que elles existam. Sirva de exemplo, o que aconteceu em França na Camara dos trezentos Deputados, que não eram assalariados, isto é, que não venciam ordenados; qual foi o resultado sob o ministerio Villele? Todos o sabem, para que eu o não repita aqui. Por isso direi, que todo o serviço da nação deve ser pago. O Rei, que é o chefe do estado, cujas funcções são as mais sublimes, porque não ha nada mais honroso, do que presidir a uma nação, recebe um ordenado como primeiro empregado, e isso não lhe fica desairoso; os magistrados que fazem justiça, tambem recebem ordenados, e não se diz por isso, que elles a vendem. Sr. Presidente, estas theorias são verdadeiras, e não pódem ser combatidas senão por força inimiga, ou pela illusão.

O Sr José Estevão: - Creio que nenhum dos Srs. Deputados tem tratado de impugnar o parecer da Commissão; mas como elle tende a augmentar ordenados, não será fóra de proposito expor os seus motivos. As considerações particulares, a que se allude neste parecer, são as seguintes: havia tachygrafos nas camaras extinctas dos Pares, e dos Deputados, alguns destes ultimos tem igual, ou quasi igual habilidade, e saber; mas os da Camara dos Pares gozavam ordenados maiores do que os da dos Deputados; o que dictou esta desigualdade de ordenados, em capacidades tão simelhantes, foram de certo considerações particulares. A Commissão entendeu, que essa desigualdade de ordenados não devia continuar por mais tempo, visto não haver nisto justiça, nem ser possivel que os tachygrafos quizessem assim continuar a servir. Mas neste augmento necessario, teve a Commissão em vista o rigor da justiça combinado com as circumstancias do paiz; pois a quantia de cento e oitenta mil réis, que augmentou, ainda não iguala uns a outros. Ha algum com seiscentos mil réis de ordenado, são os dos Pares; e é de notar que um dos tachygrafos (pelo menos ) a favor de quem se propõe o augmento, é talvez igual a alguns desses que tem o maior ordenado. Os tachygrafos d'ora em diante, passam a viver debaixo de um regimen rigoroso, e faltando ás suas obrigações, hão de ser castigados como parecer justo á Commissão, e n'aquillo que esta não poder remediar, ha de ser participado ás Côrtes, para ellas o fazerem.

A respeito da publicação das sessões, eu diligenciarei, em quanto formar parte da Commissão, não ser a este res-

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pello interpellado (se é que posso usar desta frase tão gasta com ministros, referindo-a a uma pobre Commissão). Nesta diligencia começei hontem, indo á imprensa cinco vezes, e apesar de ter mostrado todo o empenho para com o director, apesar de ter alli pedido, rogado, e até usado de meiguices, não pude conseguir que fôsse hoje publicada uma Sessão, que lá se achava. A imprensa está carregada de muitos trabalhos, e para os concluir faltam-lhe os braços necessarios; porque com os existentes não é possivel dar expediente ao muito que tem a fazer, e que por diversas repartições se exige com urgencia: entretanto veremos se convidando mais operarios, nos podemos desembaraçar deste inconveniente.

Quando porém, a Commissão tiver inteiramente perdido a esperança de dar conta da missão que se lhe incumbio, com franqueza o dirá ás Côrtes, representando-lhe os embaraços, para estas proverem de remedio; por ora taes embaraços são de momento, e ainda não perdemos a esperança de os superar; se o não conseguir-mos, a Commissão dirá - não é possivel fazer cousa alguma por este methodo: e se as Côrtes não adoptarem medidas a tal respeito, a Commissão dará a sua demissão, pelo menos eu, porque trabalhar sem meios, é uma continua mortificação, descredito, e nenhum proveito.

O Sr. Freire Cardoso: - Queria declarar que não emitti a idéa, a que se oppõe o Sr. Ministro dos negocios do reino: tudo o que elle disse é verdadeiro, eloquente, sed nune non erat hic locus, levantou um moinho de vento para ter a miseravel gloria de combate-lo. Não sou eu da opinião de que os Deputados não vençam subsidio, não sou da aristocracia dos cruzados novos, nem de aristocracia alguma, senão do povo; eu mesmo, que nem directa, nem inderectamente concorri para aqui vir, declaro que se não me pagarem a minha diaria, hei de senti-lo muito, e ficarei empenhado com os meus amigos; mas se os Srs. Deputados quizerem dispensar uma insignificante fracção das suas diarias para ajudar a pagar aos tachigrafos, creio que o poderão fazer com melhor direito do que S. Exa. o teve para reduzi-las; e entendo que este procedimento em nada é opposto á natureza do systema representativo, senão muito louvavel.

O Sr. Costa Cabral: - Quando fallei a primeira vez sobre este objecto, pedi explicações sobre o parecer da Commissão, estas já foram dadas por um Sr. Deputado, com ellas estou satisfeito; por consequencia approvo o mesmo parecer, mas accrescentarei alguma cousa por se Ter aqui tocado no objecto da imprensa. O Sr. José Liberato disse, que uma sessão não tinha saído no diario de hoje, por ter sido remettida tarde á imprensa; e o Sr. José Estevão affirmou que isso acontecera por falta de operarios n'aquella repartição, porque os que tem não chegam para todo o serviço: parecia-me pois que o Sr. José Liberato, quando tenha necessidade delles, os peça ao Governo com urgencia; porque na verdade a falta da publicação dos trabalhos do Congresso tem os inconvenientes, que mais de uma vez se ponderam. Chamarei tambem a attenção da Commissão sobre outra especie, visto que nos achâmos em um grande atrazo de sessões; julgava conveniente que de hoje em diante se imprimissem seguidamente as actuaes, reservando as que faltam para se irem publicando em supllemento, ou pelo melhor modo que julgar a Commissão.

O Sr. José Estevão: - Para uma explicação. O methodo que acaba de lembrar-se foi exactamente o que a Commissão adoptou; começar a publicação das sessões desde que foi nomeada, e reservar as atrazadas para se irem publicando o mais breve possivel, talvez fazendo com que estas saiam nas segundas feiras, aproveitando os domingos em que não ha sessão, se a imprensa quizer prestar-se ao trabalho nestes dias. Ha alli muita falta de operarios, muita obra para fazer, de maneira que sem augmento de braços é impossivel contar com publicação regular: disse-se a alguem de lá que era necessario chamar mais operarios, promettem-se de assim fazer; disto depende tudo, se se cumprirem as promessas haverá publicação regular.

O Sr. Midosi: - Fui prevenido pelo Sr. José Estevão. A Commissão adoptou o methodo de publicar logo a sessão do dia anterior, e as atrazadas em supplementos; porque desta fórma em pouco tempo será possivel vencer o atrazo.

O Sr. Alves do Rio: - Antes de votar no parecer da Commissão, desejava ser informado se ha orçamento das despezas deste Congresso. Em minha consciencia não posso votar um real para cousa nenhuma, sem se preencherem as formulas parlamentares. Desejo que se saiba em quanto importa a despeza do Congresso, e a que fins é applicada, a fim de que o publico não ignore a utilidade que della resulta; e por tanto antes de apparecer o competente orçamento torno a dizer, que não voto por um real para cousa alguma. Não sei se a Commissão respectiva terá alguma dúvida em formar o mesmo orçamento; mas eu lembro que é prática constantemente seguida em todos os parlamentos, antes de approvar qualquer despeza propria separadamente fixar todas que lhe dizem respeito; aquillo que o Congresso exige do Governo, e de todas as repartições é o que elle tambem deve quanto antes fazer, orçando os seus gastos. Concluo que approvarei o augmento dos ordenados, que propõe a Commissão, mas desejo guardar todos os estilos parlamentares, principalmente em objectos de despeza.

O Sr. Vice-Presidente: - Parece-me que a pratica a este respeito, é que o orçamento respectivo ás despezas das Côrtes entra n'uma das verbas a cargo do Ministerio dos negocios do reino; a Commissão administrativa da casa remette o seu orçamento particular áquelle Ministerio, a fim de ser incluido no orçamento geral; mas antes dessa remessa creio que ha de ser presente ao Congresso, e então é a occasião de approvar ou rejeitar alguma despeza.

O Sr. José Estevão: - O Sr. Deputado, que acabou de fallar, exige que as despezas da casa em todas as suas repartições, venham no orçamento; isso infallivelmente deve acontecer, nem se poderia prescindir dessa formalidade, porque as despezas das Côrtes fazem parte da despeza do estado, e esta ha de examinar-se antes de ser aqui approvada. Agora que se não possa votar sobre o augmento destes ordenados antes de chegar esse orçamento, é em que eu não concordo: as despezas das Côrtes hão de apparecer no corpo do orçamento geral, creio eu, e então quando este se discutir examinar-se-ha aquella; mas nunca póde ser motivo para não approvar uma ou outra verba de despeza, o não ter ainda apparecido o orçamento. Ora o Governo tem augmentado alguns ordenados até consideravelmente, e as Côrtes hão de ter escrupolo de approvar um pequeno augmento, para conseguir objecto tão interessante como é a publicidade das suas sessões? Digo pois que a falta do orçamento não póde inhibir o Congresso de sanccionar qualquer despeza necessaria: entre tanto elle não está a cargo da Commissão, e por isso não o podia apresentar. Concluindo, declaro que é indispensavel, para o andamento dos trabalhos tachygraficos, o qual não prejudica qualquer disposição que haja de tomar-se quando se tratar do orçamento.

O Sr. Leonel: - O orçamento das despezas das Côrtes, vem no orçamento geral; mas antes disto ha de nos ser apresentado pela nossa Commissão administrativa. Ora a Commissão do diario não é a que tem a inspecção do dinheiro, e talvez isto seja o que tenha causado algum embaraço ao Sr. Alves do Rio. Eu como conheço a necessidade de publicar as nossas sessões, approvo o parecer da Commissão, ainda que estimaria que esta verba se examinasse com o nosso orçamento; mas como isto não é agora possivel, e por outra parte é necessario fazer o augmento de que se trata, creio que este se póde já approvar.

muno, e ficarei empenhado com -as, mens amigos, maa se os Sfs. Deputados quize-Jom dispensar uma insignificante fracção das suas diárias para ajudar a pagar aos lachigrafos, creio que o poderão lazer com melhor direito do que S. Exe " o teve para reduzi-las; e entendo que este procedimento em nada é op-posto á natureza dosystema representativo, senão muito louvável.

O Sr. Cosia Cabral - Quando fjllei a primeira ve^ bo-Iro este objecto , pedi explicações sobre o parecer da Coin-misíão, estas já foram dadas par um Sr Deputado, comellas estou satisfeito, por consequência approvo o mesmo parecer, Jiias acciescentarei alguma cousa por se ler aqui tocado no objecto da imprensa. O Sr José Liberato disse, que uma seisao não tinha saído no diurio de hoje, por ter sido ré* niottlda iw.rde á imprensa ; e o Sr. José Esteva» affirmou que isso acontecera por falta de operários uaque)Ia reparti. çao, porque os qoe tem não chegam para todo o serviço pa-Teria-rnc pois que o Sr, José L ibera Io, quitndo tenha neces* sidade dslles, 09 peça ao Governo com urgência, porque na verdade a falta da publicação doe trabalhos do Congres-bO terei O"! inconvenientes, que mais de uma vez se ponderaram Chnmarei tambem a attenção da Commissào sobre outra espécie, visto que nos acl-àmos em nm grande atraco de sessões, julgava conveniente que de hoje em diante se impriniihsem seguidamente as actuaes, re^-ervando as que faltam para se irem publicando em supplemento, ou pilo melhor motto que julgar a Commissào.

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O Sr. Mídost: - Fui prevenido pelo Sr. José Estevão. A CommBsào adoptou o methodo- dfr publicar logo a sessão do c|ia anterior, e as atrazadas em supplemcntos; porque desta forma em pouco tempo será possível vencer o atraao.
O Sr. Aleis c/o Rio: -*- A ntes de votar no parecer da Commisjão, desejiiva sei informado se ha orçamento das despezas deste Congresso. Era minha consciência não posso votar um real para Cousa nenhuma, sem se preencherem aã formulas parlamentarei. Desejo que se saiba em quanto ira por-tn a despeza do Cohgresso, C a que Gns é apphcada, afim-de q\ls o publuo não ignore a utilidade que dolla resulta; e por íanto anles de apparecer o competente orçamento torno a dizer, que não voto por um real para cousa alguma. Não sei se a Commissào respectiva terá alguma dúvida em formar o mesmo orçamento; mas eu lembro que é prática cohítanlemente seguida efti todos os parlamentos, antes de approvar qualquer despeza própria separadamente hXar to-dus que lhe dizem respeito aqullto que o Congresso exige do Governo ( e de tod js os repartições é o que elle tambem devequanto antes ia O Sr. yice-Ptcsidente: - Parece-me que a pratica a este respeito, é que o orçamento respectivo às despezas das Cortes entra numa das verbas a cargo do Ministério dos negócios do temo1 a Commissão administrativa da casa re-mette o teu orçamento particular árjuell? Ministério, a fim de ser iilcluidó do orçamento geral, mas antes dessa remessa creio que ha de ser presente ao Congresso, e então é a ooca-siào de approvar ou rejeitar alguma despeza.
O Sr. José Rsícráo: - O Sr. Deputado, que acabou de fntlar, exige que O far. Leonel -O orçamento das despesas das Cortes, vem no orçamento geral , mas antes disto ha de nos Ser apresentado pela nossa Commissão adumistrativa. Ora a Coiumissjo do diário não é a que tem a mpecção do dinheiro, e talvez i^to seja o que tenha causado Igum embaraço ao br Alves do líio. Eu como conheço a necessidade de publicar as nossas sessões, approvo o parecer da Com-inibeào, ainda que estimaria que esta verba se examinasse com o nosio orçamento, mas como isto não e agora possível , e por outra parte é necessario fazer o augmento de que se trata, creio que este áe póde já approvar.

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O Sr. Costa Cabral: - Pediria aos Srs. Deputados, que exigem a apresentação do orçamento antes da decisão deste negocio, se lembrassem de que os ordenados dos tachigrafos não entram na regra geral dos ordenados dos outros empregados publicos; porque são elles um resultado de ajuste variavel segundo as circumstancias. Elles dizem «queremos servir dando-se-nos tanto» a nós só nos resta acceitar, ou rejeitar. Ora como é indispensavel publicar desde já as sessões, tambem é indispensavel votar desde já as quantias, que para esse fim, são necessárias; e como ha grande differença entre estes e todos os outros empregados, os principios de que nos devemos servir para decidir esta questão, são tambem muito differentea daquelles, que nos devem regular com relação ao augmento, que se pedisse para outra sorte d'empregados. Eu voto pelo augmento.

O Sr. Alves da Rio: - Eu o que quero é, que esta despeza se approve com todas as outras que pertencem ao Congresso. Não trato de saber se os tachygrafos tem ordenados, ou se servem por ajuste; o meu desejo é que se trate do nosso orçamento, para á vista delle saber em quanto importa a nossa em relação às outras despezas. Eu sei que o Congresso pede ao Governo as quantias necessarias para os seus gastos, e que a sua fiscalisação nos pertence a nós; mas por isso mesmo é que eu quero, que a Nação saiba a importancia da nossa despeza, e os objectos a que é applicada; por conseguinte acho de absoluta necessidade que ap-pareça o nosso orçamento, porque não entendo que se façam despezas a esmo.

O Sr. Conde da Taipa: - Sr. Presidente, esta questão é separada de todas as outras, porque não é outra cousa mais do que pagar a artistas com quem se contracta; estes empregados não podem tratar-se como outros quaesquer: porque uma educação ordinaria pode habilitar para qualquer emprego, aonde basta saber ler, e um bocado de grammatica; e para isso ha gente de mais. Não acontece o mesmo aos tachygrafos, cuja arte é muito difficultosa. Ora, todos sabem que a differença dos sallarios, está na razão da difficuldade do objecto, ou arte que se exercita. A razão por que um relojoeiro ganha mais sallario do que um cavador de enchada, não é porque estes dous individuos sejam de casta differente; e sim porque o officio do primeiro é incomparavelmente mais difficultoso que o do ultimo; muita gente se applica a trabalhar em relogios, e pouca os aprende a fazer; e assim fica perdida uma producção de trabalho muitissimo grande; (isto segundo os principios de economia politica) e então os que aprenderam ficam, como em loteria, gosando os interesses de todos os que não aprenderam.

O systema representativo é novo entre nós, por isso acontece que a tachygrafia se acha em grande atraso, visto que ella é ligada com o principio da publicidade. Mas ha pouca gente que exercite esta arte, e então que acontece? O mesmo que quando ha pouca mercadoria de certa especie no mercado; vende-se cara: por isso os tachigrafos em Portugal hão de, por agora, pagar-se um pouco mais caros do que nos outros paizes aonde ha muitos. Em Inglaterra, por exemplo, não ha tribunal de justiça, de policia correccional, ou outro qualquer ajuntamento publico, aonde não appareça um tachygrafo, que tira quanto se diz nestas reuniões, e no outro dia o publica nos jornaes; lá põe tudo á censura , ou ao louvor do publico. Ora se ha arte que seja necessaria é a tachygrafia (digo em relação aos paizes livres) , e se entre nós o principio do governo é a publicidade, não deve neste ponto haver mesquinharias; tudo tem limites, e o mesmo acontece com o desperdicio e a economia, e esta em certos casos se torna em desperdicio. Quando em 1834 se tratou de fazer o diario da Camara dos Pares, partiu-se do principio de que a alma do systema representativo é a publicidade; fizeram-se as diligencias para chamar alli os melhores tachygrafos, o que se alcançou; porque é certo que os que lá estavam eram muito bons. Disse-se-lhes então «por quanto lhe faz conta trabalhar aqui?» Responderam elles « por tanto:» e não houve objecções que fazer ao preço: se fôsse outra qualquer gente, poderia tratar-se de achar mais barato, mas com esta não pode isso ter logar, porque não ha outros. Além disto é preciso não esquecer que o seu trabalho é o mais acerbo; um tachygrafo está aqui occupado todo o tempo da sessão, e quando os outros empregados vão descançar até ao outro dia, vai elle traduzir as suas notas em letra ordinaria, e vesitar a imprensa, a ver se alli caminha o trabalho; de maneira que das vinte e quatro horas que tem o dia, poucas lhe ficam para descançar. Por conseguinte deve haver uma compensação muitíssimo grande com um trabalho desta natureza. As difficuldades que se tem apresentado, na minha opinião, são faceis de remediar. Diz-se que só á vista do nosso orçamento é que se póde approvar o augmento dos ordenados propostos pela Commissão. E que nos importa a nós neste caso com o orçamento: E a despeza util e necessaria? É pois então decidamo-la previamente, e depois entraremos no orçamento. Nós reconhecemos a necessidade, e a utilidade de se approvar já esse augmento; está nas possas atribuições, façamo-lo já; mas agora tratar-se d'um negocio de tempo, e d'um negocio de lugar, isso creio que não tem cabimento nenhum, porque nós necessitamos de ter o nosso diario publicado; os tachygrafos querem, e querem com multa razão, saber em que regra hão de viver, e o que hão de ganhar, e saberem se o seu trabalho ha de ser recompensado, aliás elles podem ir trabalhar para outra parte, podem-se ajustar com os jornaes, e trabalhar por sua conta, porque não estão apegados só aos trabalhos da Camara. Por consequencia peço que se decida já esta questão, e peço que se ponha á votação se se deve, ou não approvar o parecer da Commissão: não vejo inconveniente nenhum em se tomar esta decisão.

O Sr. Paulo Midosi: - Sr. Presidente: a questão não deve progredir; a Commissão tractou com os tachygrafos; os tachygrafos disseram, nós não podemos continuar a trabalhar sem sermos equiparados em justa proporção com os da Camara dos Pares, visto que o nosso trabalho é igual ao delles; nós barateámos, e a final concordámos n'isso, ouvindo a opinião do tachygrafo chefe. Agora o que a Commissão vem pedir, é provisoriamente um credito supplementar. A Commissão administrativa ha de apresentar o seu orçamento, e as duvidas do Sr. Alves do Rio parece-me que devem então ter lugar nessa occasião, por que no orçamento ha de figurar esta verba. Nesse momento os Srs. Deputados poderão approvala ou não approvar; se a não approvarem os tachygrafos ou vão-se, ou ficam, ou fazem novos ajustes. Querer que se espere pelo orçamento, que virá daqui a quatro ou cinco semanas, não acho eu possa ter lugar, por que então os tachygrafos não quererão esperar por esse praso, e despedem-se sem que nós possamos dizer-lhe, não se vão embora, que a seu tempo se tratará disto, é proloquio commum , que quem quer os fins põe-lhe os meios, os meios são estes por ora, acabemos pois com esta questão; que se reduz a dizer o Congresso sim , ou não; disso dependerá termos, ou não termos tachygrafos.

Julgando-se a materia sufficientemente discutida foi o parecer da Commissão posto á votação, e approvado.

O Sr. Vice-Presidente: - Agora segue-se a outra parte da ordem do dia, que é o projecto n.º 2, sobre a creação da junta do credito publico.

O Sr. Lourenço J. Moniz: - Sr. Presidente, sobre a ordem. O estabelecimento da junta do credito publico foi um remedio achado pelos governos absolutos para o mal da falta de confiança, que a natureza d'esses governos por si mesmo inspirava: desde que se estabeleceu em Portugal o Governo Representativo, se bem me lembro, tem havido sempre desejos de pôr este estabelecimento d'accordo com o caracter dos governos livres, isto é de fazer cessar um estabe-

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lecimento que por si mesma está denunciando a falta de confiança no Governo; infelizmente esse mal herdado do governo absoluto não cessou, nem podia cessar logo com elle, mesmo que as nossas circunstancias tivessem sido muito mais favoraveis, e é por isso que os governos subsequentes tem deixado continuar este remedio que, a dizer a verdade em um sistema de fazenda e credito bem regulado, em um governo livre é uma anomalia, uma verdadeira contradicção, e é por isso tambem que me parece que nas nossas circumstancias , ainda não podemos de todo prescendir de semelhante remedio: mas lembro-me que nas Côrtes de 34 a 35; e nas seguintes a reforma do thesouro, foi objecto porque muito pugnou não só a antiga opposição, mas que sériamente occupou algumas das administrações do partido opposto, e que se tinha em vista que esta instituição caminhasse sempre de accordo com o todo da reforma, e tendendo para a sua total extenção na mesma proporção em que se fosse estabelecendo a confiança no governo. Talvez existão trabalhos preparados neste sentido: talvez que o Sr. Ministro da fazenda delles tenha lançado mão; ou tenha preparado alguns com este mesmo caracter, e em que esta parte esteja em harmonia com o resto da reforma. Não he minha intenção por este meio offender nem levemente o direito de iniciativa de cada um dos Srs. Deputados e muito menos embaraçar o andamento do projecto dado para discussão; mas o que lembro é, porque me parece que esta parte do systema melhor será apreciada em vista do todo, e em attenção ao que ha pouco disse. Se ha pois outros trabalhos, melhor seria talvez que todos conjunctamenta fossem tomados em consideração, e que para isso este projecto voltasse á Commissão para tudo se meditar e combinar do modo mais proprio para se obter o fim, que se deseja, segundo as idéas que acabo de expender.

O Sr. Vice-Presidente: - Nós vamos involver-nos n'uma questão de ordem. O projecto que vai agora entrar em discussão na sua especialidade, já foi discutido na generalidade ; agora tracta-se de cada um da seus artigos: o Sr. Deputado apresenta uma questão perleminar que eu acho de muita consideração e de muito peso; mas eu não sei se ella estará um pouco fóra da ordem a seguir n'esta discussão, e tanto mais quando a conclusão do Sr. Deputado em summa reduz-se a um additamento; mas um additamento que não é pedido em fórma; e por consequencia eu não posso dar-lhe o seguimento que o regimento tem marcado em taes circumstancias.

O Sr. L. J. Moniz: - V. Exa. observou, que a minha proposição depende de esclarecimentos; se o Sr. Ministro declara que ha outros trabalhos já promptos sobre esse objecto eu proponho o additamento; se declara que não, então vamos nos remediando com o que for apparecendo; e eu segundo as luzes que poder obter, expenderei as minhas idéas no progresso da discussão na conformidade do que já indiquei.

O Sr. Leonel: - Sr. Presidente: tanto quanto eu posso dizer, é verdade que o Ministerio tem projectos sobre esta materia; passo dizer isto por que em fim elle não me pedia segredo; mas, Sr. Presidente; o Ministerio não póde de maneira nenhuma pedir , por attenção ao seu projecto, a suspenção da discussão d'outro projecto que já tinha sido apresentado e approvado na sua generalidade; o Ministerio não devia de maneira nenhuma pedir a suspensão da discussão d'este que agora faz o objecto da questão; mas se qualquer Deputado por estar informado de que á alguns projectos do Governo sobre essa materia quizer pedir às Côrtes que pare a discussão, e se as Côrtes assim o resolverem, não ha n'isso inconveniente nenhum: por tanto Sr. Presidente a Commissão de fazenda e o Ministerio é, que nos pódem informar d'aquillo que nós precisarmos saber para resolvermos se ha de ou não parar esta discussão, no que me parece não ha inconveniente nenhum, e o Sr. Moniz se para isso fizer à sua proposta eu certamente o appoiarei.

O Sr. Conde da Taipa: - Sr. Presidente, o projecto que appresentou a commissão de fazenda a respeito da junta do credito publico, tende a dar mais confiança ao povo, e a dar mais confiança aos possuidores da divida publica, que recebem juros, e para assim fazer estabelecer o credito do estado; ora bem disse o Sr. Moniz, que era em consequencia do discredito em que tinha estado sempre o governo, que se tinha tomado aquella medida de crear a junta do credito publico, é verdade; é uma cousa que não existe em paiz nenhum senão em Portugal; mas as circumstancias assim o querem; na Inglaterra o banco é quem faz as transacções do Governo; recebe, e paga e ninguém se queixa disso; porém Portugal está em differentes circumstancias; porque um homem que tem sido sempre homem de bem, custa-lhe muito menos a andar pelo mundo, do que outro que tem tido alguma ligeireza (riso), e que quer tornar a adquirir credito; então não bastam as boas obras, é-lhe preciso recorrer á graça, ser jansenista em politica; e é nessas circumstancias que está o crédito publico em Portugal, e em consequencia disso a commissão de fazenda propôz aquelle plano: entre tanto depois vio, ao menos eu pela minha parte vi, que o plano tinha seus defeitos; vi que a junta do credito publico tinha attribuições do poder executivo, e portanto não podíamos fazer uma junta de credito publico electictiva que fôsse um imperium in imperio; era preciso que as attribuições do poder executivo passassem para o poder executivo, por isso mesmo que a junta actual era uma delegação do poder executivo; exercia por isso essa delegação aquellas attribuições, o que não podia continuar a ser, quando fosse delegada de outro poder, como é esta junta electiva , que a commissão propõe. Ora agora o Sr. Ministro da fazenda tem prompto um projecto de lei a este respeito, e é muito mais amplo, e nelle está consignado o mesmo parecer da commissão de fazenda; vem a ser, que haverá uma junta de credito publico eleita pelas Côrtes, e pelos accionistas, para receber, e pagar aos credores do estado: ora quando o projecto do Sr. Ministro tem consignado o princípio que nós temos em vista, e é muito mais amplo, acho que não póde haver duvida nenhuma em que se peça ao Sr. Ministro que leia o seu projecto, e que entre então em discussão; e eu julgo que os meus collegas da commissão estarão de acôrdo.

O Sr. Alves do Rio: -- Sr. Presidente, a pessima administração da fazenda publica desde 1792 a esta parte, é a causa da necessidade de um estabelecimento de junta de credito publico (apoiado); até 1792 não havia mais divida nacional, que uma chamada de juros reaes a qual andava, segundo minha lembrança, por setecentos contos: até essa época todos os pagamentos andavam em dia, apesar dos desvarios dos governos passados com o convento de Maffra, com Patriarchaes, com o convento do Coração de Jesus, Necessidades, etc., tudo andava em dia: em [...] foi a nossa desgraça mandar uma porção de tropa para o Rossilhão; havia sempre em caixa dous mil a tres mil contos de réis; essa devizão absorveu não só esses dous mil ou tres mil contos de réis, e contrahio grandes dividas ao estado; não se tomaram medidas nenhumas para augmentar a receita, e diminuir a despeza; e finalmente chegou-se a 1796, e foi mandado abrir o primeiro emprestimo de 10 milhões de cruzados, admittindo titulos de divida com o juro de 5 por cento, e sendo a dinheiro effectivo se dava mais 1 por cento de annuidade; não se completou este emprestimo, e logo no anno de 1797 se abrio outro em logar de 10, por 12 milhões, admittindo-se os mesmos titulos que no primeiro; em fim como do que muito se precisava era dinheiro, estabeleceu-se uma parte do emprestimo, mil e dozentos contos em apolices de menos de cincoenta mil réis, esta é a origem do papel-moeda; foi assim continuando esta moeda; porém o papel-moeda não parou nos mil e dozentos contos, chegou á enorme quantia de onze mil e setecentos contos,

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e foi isso que fez toda a desgraça de Portugal; mas isso mesmo não bastou, porque foi preciso abrir um terceiro emprestimo em 1801 por outros 12.000 contos de réis; ahi se augmentaram muito as imposições sobre o estado, e dahi vem os dous tostões por arroba de algodão, dahi vem o tostão por arroba de assucar, dahi vem os 3 por cento sobre as rendas dos predios urbanos de Lisboa , e Porto, imposição sobre as parelhas de segos, cavallos, etc., o que se conhece por novos impostos, e finalmente dahi vem a nossa desgraça; nada d'isso bastou; e então intendeu-se a necessidade da creação de uma junta administrativa para esses capitaes, que entravam no thesouro a servirem para pagamento dos juros da divida, que se contrahia, e amortisação do papel-moeda: esta é a origem da junta do credito publico, ou da junta de juros dos reaes emprestimos; era composta do thesoureiro geral dos juros, do seu escrivão, e de dous negociantes; um é muito respeitavel, que ainda boje vive; outro foi o Porto-côvo da Bandeira; porém foi preciso augmentar mais esse numero para mais confiança; no entanto era um engano essa confiança, porque quem era o presidente dessa junta era o mesmo presidente do thesouro, ou do erario; o dinheiro das rendas applicadas para o pagamento dos juros foi por muitas vezes para o thesouro, e não pagaram juros nenhuns, nem amortisaram o papel-moeda, e por consequencia enganaram completamente o publico. Ora attendendo ao principio da necessidade, a commissão de fazenda lembrou-se de construir esta junta de uma junta de credito publico, de um modo que fosse independente inteiramente do governo. O Sr. Ministro tem razão em notar, que a commissão não apresentou as attribuições da junta, e que esta junta diminue o credito do thesouro. Eu tive uma contenda, nas Côrtes Constituintes de 1821, muito grande com o meu illustre amigo Sr. Fernandes Thomás , e elle era d'essa opinião, que se extinguisse a junta de juros; porque, dizia elle, o primeiro discredito do thesouro é haver essa junta de juros; é verdade que assim era; porém eu era de opinião, que, attentas as nossas circumstancias, ella se não devia extinguir, e estou ainda hoje na mesma opinião, e talvez não seja muito remoto o tempo de não ser precisa essa junta; a Nação tem muitos recursos, e ha de ser salva: não precisa mais, que uma administração patriota, e franca; mas por ora é preciso que os credores tenham esta junta em quem tem confiança : as despezas do thesouro são muito grandes, e é preciso igualar a receita com a despeza. Eu desde 1821 estou muito ao facto deste negocio, mesmo por propria utilidade, porque tambem lá tenho alguma cousa, e para me instruir tenho tractado do objecto, e por isso não tenho duvida em affirmar, que por ora é preciso junta de credito publico. Podia fallar muito, mas não quero cançar o Congresso; a questão é amplíssima; essa immensa divida estrangeira, a nossa divida interior, é enorme, mas temos meios, e temos recursos para tudo; o que se precisa é patriotismo e boa vontade para tudo se conseguir. (Apoiado.)

O 8r. M. dos Negocios do Reino: - Começo por agradecer á Commissão de fazenda pelo zelo que mostrou. A Commissão considerou que a junta interina do credito publico não deve ser permanente, mas sómente em quanto for necessaria: o mal do paiz está na fazenda, e precisa de remedio; por estas considerações a Commissão apresentou este seu projecto; eu não pude ter nenhuma conferencia com a Commissão, porque estava então doente. - Apresentou pois um projecto para a creação da junta do credito publico composta de differentes partes, mas deixou a responsabilidade solidaria ao Ministro da fazenda; e então ou eu havia ser responsável, por ordens que não eram dependentes de mim, e era uma injustiça; ou então tínhamos um Ministro da fazenda com certas attribuições por um lado, e outro Ministro da fazenda collectivo com outras. Isto fez-me muito pêso. - A junta do credito publico foi d'antes a junta dos juros; esta junta fazia uma parte integrante do Thesouro , estava porém debaixo da sua dependencia, e lhe pertenciam as attribuições dispostas neste Decreto (leu). Em consequencia passando estas para a junta do credito publico independente totalmente do governo, não póde este ser responsavel. Estas observações não as pude fazer, como já declarei, porque estava doente; mas como Ministro da Coroa tinha obrigação de o representar ao Congresso, e então resolvi-me tomar a base da Commissão de fazenda, e apresentar um projecto em poucos artigos como substituições a cada um dos artigos do da Commissão; os membros da Commissão mostrando os melhores desejos disseram-me, que este projecto devia ter meditado: elle tem por base o projecto da Commissão, a differença é ter mais artigos, (leu). Eu tinha tenção de apresentar isto como proposta do governo, se não tivesse aparecido outro projecto, mas agora peço sómente que vá á Commissão de fazenda, e que ella o addite ou restrinja, corpo entender.

O Sr. Barjona: - Eu começo por declarar que não desejo tirar a palavra a algum Sr. Deputado. - Com tudo o Congresso deve dar-se por muito satisfeito; quando póde acabar com uma discussão sem lhe ficarem remorsos de haver resolvido sem conhecimento de causa. O projecto do Sr. Ministro tem duas partes, uma é a que está no projecta da Commissão de fazenda, com mui pouca differença; e outra são as attribuições da junta do credito publico; no projecto da Commissão diz-se que haverá uma lei, que regule as attribuições da junta, e o projecto do governo apresenta as attribuições já marcadas; por tanto parece-me que o caminho, é que vá a Commissão de fazenda, para que veja se a parte das attribuições, que o governo apresenta, é boa, que dê o seu parecer, e assim temos acabado a questão.

O Sr. Alves do Rio: - Eu tinha pedido a palavra para, dizer em parte o que acabou de dizer o illustre Deputado que me precedeu. Em nome da Commissão de fazenda requeiro, que lhe seja remettido o projecto do Sr. Ministro, para que ella veja o que se deve fazer. - O Sr. Ministro apresentou este projecto alguma cousa precipitado, porque entendeu, que assim convinha ao paiz; o Sr. Ministro adiantou nesta parte o que a Commissão assentou que era preciso, mas que tinha reservado para um projecto particular; por tanto requeira, em nome da Commissão, que o projecto lhe seja remettido para ella dar uma medida geral.

O Sr. Ministro do Fazenda: - Eu mando para a mesa o meu projecto.

(Assim o fez S. Exa. - Acha-se inserido no Diario do Governo n.º 62.)

O Sr. L. J. Moniz: - Desta maneira eu vejo, que está satisfeito o que eu desejava, e propunha; e ao mesma tempo espero que o Sr. Ministro e o Congresso, me facão a justiça de acreditar, que as razões que pezavam na minha consciencia eram dignas de attenção; e nada mais tenho a propôr.

O Sr. Silva Sanches: -- Apoio que a proposta vá á Commissão de fazenda para ella dar seu parecer, e que até que ella o dê, se adie a discussão do Projecto apresentado pela mesma Commissão. Porém o que desejo tambem é, que não fique precedente para no momento em que se vai entrar na discussão de um Projecto, se podêr sustar na sua discussão pela apresentação de outro Projecto. (O Sr. Ministro da Fazenda pede a palavra, e o orador continúa). Escusa o Sr. Ministro da fazenda cuidar, que eu lhe quero alludir, porque eu não tive esse fim, nem quero fazer allusões para increpar pessoa alguma. Entretanto S. Exa. sabe muito bem, que em 1835 se apresentaram nesta Salla, por differentes vezes, questões desta naturesa; lembrar-se-ha muito bem, que em 20 de Janeiro desse anno apresentou nesta Salla o nobre Duque de Palmela um Projecto de administração civil do reino, quando já outro Projecto tinha sido apresentado, e devia entrar em discussão; porque já uma

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Commissão havia sobre elle dado o seu parecer; lembrar-se-ha elle, e lembremo-nos nós, que deste lado da Camara se fez uma vivíssima opposiçâo á admissão desse Projecto, com fundamento muito solido a meu ver, que havendo já a iniciativa sido exercida por membros da Camara, sobre essa materia, e achando-se com effeito esse Projecto, sobre que os Deputados tinhão tomado a iniciativa, a entrar em discussão, não devia sustar-se esta pela apresentação do Projecto do Governo. Não foi esta questão a unica desta naturesa; quando se tratou da venda dos bens nacionaes tambem o Sr. Mousinho apresentou um Projecto, e discutindo-se se havia de esperar-se por elle, decidio-se, que a apresentação desse não sustasse a discussão do outro. Para que pois não fique prejudicada esta questão de iniciativa para o futuro, e para que um Deputado, ou um Ministerio que não mereça a nossa confiança; mas que domine por uma maioria, não possa vir sustar a discussão de qualquer Projecto, fundando-se em precedentes, é que eu digo, que convindo em que o Projecto volte á Commissão de fasenda, e que o da Commissão se não discuta sem ella dar seu parecer sobre o do Governo, se deve tudo declarar, que isto de modo algum servirá de precedente para no futuro com a apresentação de outros Projectos, se suspender a discussão dos que já nelle estavam a entrar.

O Sr. Ministro dos negocios do reino: - Sr. Presidente, eu não quiz obstar á discussão do Projecto de Commissão; a próva é que tendo eu hoje apresentado diversos Projectos, não apresentei este; a Commissão apresentou o seu Projecto quando eu estava em estado de não poder com ella conferenciar. Trabalhei neste plano, antes de adoecer; que depois ficou completo: tive depois intenção de o apresentar em substituição por artigos; apresentei-o primeiro aos Srs. membros da Commissão; foram alguns desses Srs. que pediram que eu o apresentasse, o que só agora faço por ter sido interpellado, declarando que eu não tive tenção nunca da obstar á discussão do Projecto que foi dado para ordem do dia, nem mesmo de qualquer outro.

O Sr. Leonel: - Sr. Presidente, está conhecido o que é de bom todos estarmos de accôrdo; a Commissão de fasenda teve um motivo para apresentar o Projecto com rapidez, ainda se não disse quaes foram esses motivos, dilos-hei agora; os nossos inimigos, começaram a dizer que nós queriamos declarar banca-rota, e que partilhava particularmente desta opinião um membro da Commissão de fasenda; poseram isso em letra redonda, dizendo mais, que esse tinha sido o objecto das sessões secretas; era necessario desmentir, e fazer uma declaração solemne por factos de que havia de pagar-se: e as Côrtes approvando este Projecto mostraram qual era sua tenção; daqui veio a pressa, e por isso veio sem a meditação necessaria, porque era urgente desmentir nossos inimigos: ora agora, Sr. Presidente, todos nós reconhecemos que o Projecto precisará mais alguma cousa; eu tinha tenção de quando se chegasse ao art. 5.° pedir se parasse ali, até que por artigos especiaes se declarasse, quaes devião ser as attribuições da nova Junta de credito, e esta minha opinião a communiquei ao Sr. Barjosa; o Ministerio não veio apresentar o Projecto, porque isso tinha o inconveniente que notou o Sr. Julio; elle teve differencia precisa para não o apresentar, foi pedido por um membro da Commissão, porque se o Ministerio viesse apresentar o seu Projecto com o effeito de suspender uma discussão, sendo eu o primeiro a oppor-me a isso, faça-se pois na acta a declaração que pedio o Sr. Silva Sanches.

O Sr. Sá Nogueira: - Sr. Presidente, tem dois Srs. Deputados atacado este projecto na sua generalidade, quando a sua generalidade já não está em discussão, pelo modo que o tem feito, tem-lhe servido o ataque de defeza. Um membro de Commissão disse , que esse projecto tinha defeitos, e outro Sr. Deputado, que acaba de fallar, disse que elle tinha sido feito sem a necessaria meditação: mas Sr. Presidente, a próva de que foi meditado, é de que a Commissão reconheceu a sua importancia , é que no projecto do Governo discutido com mais vagar vem todas as idéas que estão no da Commissão, ou por outras palavras, vem consignados os mesmos princípios: disse-se que tem defeitos por uma disposição em virtude da qual se davam á junta do credito publico attribuições executivas; mas convém que esses Srs. notem, que taes attribuições erão dadas provisoriamente, e devião notar tambem que a Commissão teve muito em vista tornar esse estabelecimento absolutamente independente do Governo, ou tanto quanto fosse possivel: está reconhecido em Portugal, e um dos nossos escriptores de economia politica mais conhecido e que certamente merece grande credito, é de opinião que essa junta, como disse um Sr. Deputado, está denunciando a falta de credito do nosso governo, isto é verdade; mas tambem infelizmente é verdade que ella existe, e que para o remediar é necessario que exista uma corporação, que seja independente do governo e que tenha ao mesmo tempo os meios necessarios de satisfazer aos encargos da Nação: pelo que tenho dito se mostra, que não houve precipitação da parte da Commissão, e que as attribuições dadas á junta erão provisorias, e que a Commissão só quiz principiar por organisar uma repartição independente do Governo para depois a dotar convenientemente; porque sem isso decerto nem a junta actual, nem a que se pertende crear, nem outra qualquer poderá merecer a confiança publica; ora devendo esta junta de ter attribuições especiaes, e sendo o projecto do Governo mais desenvolvido a este respeito, concordo em que volte á Commissão para que esta os dous refunda em um só.

Julgando-se a questão discutida, o Sr. Vice-Presidente poz á votação se a proposta do Governo devia ser remettida á Commissão de fazenda juntamente com o projecto que esta havia appresentado, para dar o seu parecer, com urgencia, ficando sustada a discussão do mesmo projecto; e venceu-se que sim.

Leu-se depois a seguinte declaração do Sr. Silva Sanches: a resolução de se addiar a discussão do Projecto da Commissão de fazenda, até que esta dê o seu parecer sobre a proposta appresentada pelo Governo sobre o mesmo objecto, não servirá de precedente para pela appresentação de novos projectos se suspender a discussão d'aquelles sobre que já houver parecer. Foi approvada.

Terminados os objectos que havião sido dados para ordem do dia; leu-se o seguinte:

PARECER.

Foi presente á Commissão de petições um requerimento de Joaquim José Carlos Bastos em que pede o logar de moço da meza da alfandega de Lisboa, allegando os serviços que fez na defeza da cidade eterma, do que lhe resultou o ficar aleijado d'uma mão; como porém elle confessa que aquelle logar, ainda que vago, é suprido por outro empregado de menor ordenado, e isto por costume resultaria (deferindo-lhe) augmentar-se a despeza sem necessidade: foi por isso de parecer a Commissão que não se podia deferir; reconhecendo ao supplicante justiça para pedir ao Governo outro qualquer emprego, que não esteja nesta rasão. Sala da Commissão 23 de Fevereiro de 1837. - Joaquim Pedro Judice Samora; José Lopes Monteiro; Valentim Marcellino dos Santos; Bernardino de Sampaio Araujo; Balthazar Machado da Silva Salazar.

Foi appprovado sem discução.

O Sr. Barjona: - Sr. Presidente, peço licença para mandar para a meza uma representação da camara de Caimbra relativa ao art.° 15 do contracto das estradas.

O Sr. Lacerda: Está chegado o tempo, a não haver outra cousa, de ser dado para a ordem do dia o projecto da Pareia.

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O Sr. Presidente : - Ainda não é tempo, foi distribuido na Sessão de 8. ,

O Sr. Rebello de Carvalho: Sr. Presidente, eu pedi a palavra para fazer uma moção ao Sr. Ministro do Reino. N'uma das Sessões passadas foi approvado um requerimento meu , no qual se pedia uma relação dos predios rusticos e urbanos que tinhão sido pedidos pelas camaras municipaes e outros corpos para estabelecimentos de utilidade publica; como seja possivel que na Secretaria do Reino não existam sufficientemente informados os generos dessas representações, e que o Governo tenha de pedir esses esclarecimentos; eu pedia a S. Exa. désse suas ordens para que fôsse remettida já uma relação daquelles que tiverem sufficiente informação para serem tomados na consideração que merecer e que necessariamente vá remettendo os de que obter informações para o futuro.

O Sr. M. do Reino: - Queira ter a bondade de mandar uma nota; porque quando daqui saio já a Secretaria do Reino está fexada, mas eu com ella dou providencias.

O Sr. Lopes Monteiro: - Sr. Presidente, o desgraçado estado em que se acha a administração dos orfãos, obriga-me a dizer, que o Decreto que alterou a nossa jurisprudencia antiga, que não era boa, ainda foi muito peior. Posso dizer sem receio de ser contrariado, que os orfãos estão roubados; todos quantos se tem entregue á administração dos juizes de Paz estão sem cousa alguma, eu tenho visto isto; ora se todo o cidadão, a que uma lei prejudica, deve ser considerado, quanto mais são dignos de compaixão os orfãos? A este respeito na Camara dos Deputados de 36 apresentou-se um projecto, que infelizmente não foi discutido, eu pediria que este projecto fosse exigido da secretaria, e que fôsse remetido á Commissão de legislação, esperando que ella quanto antes dê o seu parecer, porque eu entendo que a maior necessidade do paiz não é de Constituições, nós temos uma que não é má; mas é de prever a segurança individual e de propriedade.

O Sr. Presidente: - É da attribuição da meza dar seguimento a esse requerimento.

O Sr. L. J. Moniz: - Sr. Presidente, a não ser este intervalo de um meio ocio, que insperadamente teve a Camara, talvez que não tivesse hoje de incomodar o Sr. Ministro do Reino para que me diga, que andamento tem tido um Decreto que tanto contribue a diminuir a immoralidade, e promover a civilisação entre as classes industriaes; quero dizer o Decreto para o estabelecimento das caixas economicas, ou bancos economicos ; este objecto tem merecido muita consideração desde que em Portugal começou a estabelecer-se o systema representativo: eu fiz alguns esforços para introduzir uma instituição tão benefica e vantajosa; quando o Decreto foi publicado tive meus receios de que a occasião não fôsse a mais opportuna às filantropicas intenções do seu author; os acontecimentos posteriores sem duvida não lhe podem ter sido favoraveis, quando cada um mal tem para as mais urgentes necessidades do momento, como poderá ter para pôr de parte? Desejo todavia saber o estado deste negocio. Sei que o Sr. Ministro dos Negocios do Reino, sobcarregado como está com muitos trabalhos, talvez não tenha podido dar toda a considerarão a este objecto; desejava porém que S. Exa. me dissesse o effeito que tem produzido essa lei, que se publicou para a criação das mencionadas caixas economicas, e se alguma medida legislativa é precisa para que ellas possam progredir a fim de hir este Congresso occupando-se deste objecto, que não póde deixar de reconhecer-se como muito interessante.

O Sr. Ministro do Reino: - Em resposta á pergunta que o Sr. Deputado Moniz acaba de fazer, direi, que o asilo da mendicidade está estabelecido nesta cidade no edificio do extincto convento de Santo Antonio dos Capachos, e muito bem administrado pelo Sr. Braamcamp, e Conde de Paraty, que tem sido incançaveis em reger aguelle estabelecimento, com o zello que lhes é proprio. O do Porto, está igualmente muito bem administrado, e presidido pelo Sr. visconde de Beire, e consta-me que acaba de se lhe fazer um legado de doze mil cruzados; e já expedi uma portaria, recommendando o exame da verdade, e dada ella, para que se proceda á sua arrecadação, e boa segurança. Em quanto porém às caixas economicas, direi, que este negocio foi incumbido ao conselho geral de beneficencia, e tem estado encarregado delle. Creio porém que o plano precisará soffrer alguma alteração para se pôr em melhor armonia; e eu concordo com o Sr. Deputado, que convirá ser revisto, com maduresa, para se lhe fazerem as alterações que se julgar serem mais úteis. Esta qualidade de caixas á muito conveniente, e oxalá que se criem bastantes, e em todas as Secretarias, como já o tem feito em algumas.

Creia porém que o defeito do Decreto publicado a este respeito, está em se dar sobre elle algumas attribuições ao Governo, que será mais conveniente não se lhe darem; por que o Governo não deve ter com ellas nenhuma ingerencia.

Em quanto porém ao asilo da mendicidade, direi, que os pobres velhos trabalhão alli, e são ainda por esta fórma uteis; mas eu creio, que o meio mais promto para acabar com a mendicidade, é o encarregar isto às parrochias, e haver nas freguesias uma contribuição especial , destinada a prover ao sustento delles. O nosso Paiz está em estado de hir marchando progressivamente para se alcansarem estes fins, mas não é possível levar-se de repente áquelle grau de perfeição que se deseja.

O Sr. L. J. Moniz: - Dou-me por satisfeito com os esclarecimentos que acaba de dar S. Exa., e confesso que a duvida , que se me offereceu logo quando li o projecto antigo, foi aquella mesma de que acaba de fallar o Sr. Ministro. Eu conheço, que estamos na necessidade de ir marchando pouco a pouco. Todavia como muito bem disse um illustre Deputado em outro Congresso; é necessario que a Nação se não tenha sempre na conta de um cego de bordão, conta ou conceito em que muito cuidado teve o governo absoluto de a conservar. Eu vejo com muito prazer, que o cego ultimamente começa a querer largar o bordão: - muitas corporações já vão caminhando por si mesmas. Estas mesmas caixas creadas nas differentes secretarias já são muito bom ensaio, porque ellas as administram sem que o governo com isso se intrometta.

Convenho em que a occasião não é das melhores; mas isto não embaraça para se ir já tratando de examinar este objecto , e preparando-o , para o futuro.

O Sr. Leonel: - Desde que eu vi em paizes estrangeiros as vantagens, que resultam do estabelecimento das caixas-economicas, tenho desejado muito que taes estabelecimentos se criem em Portugal. Estas caixas são um depósito, aonde qualquer pessoa póde ir depositar uma quantia qualquer, por exemplo doze vintens, ou um cruzado novo, que lhe resulte de sobras das suas despezas, evitando assim o gastarem-no mal, e tirando a vantagem de se acharem dentro de pouco tempo com o seu capital accrescentado com o competente juro que tiverem vencido. Á muito tempo que eu, e outras muitas pessoas, temos feito diligencias para que taes caixas se criem; mas nada se tem conseguido.

Direi por esta occasião, que leis sobre tal materia não é necessario fazerem se; porque com ellas nada se obtem: agora por maios indirectos talvez alguma cousa se possa fazer; e para exemplo eu lembrarei um, é elle o contribuir-mos todos nós com nossas forças para que taes caixas se criem: por este meio sim; mas por meio de decretos, que se publiquem, creio eu que pada se conseguirá.

O Sr. Barão da ribeira de Sabrosa: - É certamente digno de toda a attençâo o que propõe o Sr. Deputado Moniz, e creio que seu desejo é que haja em nosso paiz, aquillo a que em Inglaterra se chama Saving bank, e em França Caisse d'épargne. Entendo eu porém que isto depende mais

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da instrucção primaria, do que de outra qualquer cousa; porque sem ella não se poderá obter a introdução de tais caixas entre nós. Não succede assim em Inglaterra; porque alli um criado de servir, sabe ler, e escrever, e concebe bem o que é um fundo, e um juro; e então calcula que tendo uma libra, e depositando-a alli, esta lhe ha de produzir no fim do anno um certo lucro. Em Portugal porém, a maior parte dos criados de servir e jornaleiros, não sabem ler, nem escrever, e por isso não concebem nada disto: por consequencia sem instrucção primaria não se faz nada. Por esta occasião permitta-se que eu alluda a um facto, que tem relação com o que acabo de dizer. Na villa de Canellas, patria do mui nobre amigo, o Sr. Deputado João de Lacerda, pagam-se setecentos mil réis de subsidio litterario, mas nunca alli houve um mestre de primeiras letras, nem hoje o ha ainda: pelo contrario , na Beira Baixa, villas que não pagam mais de 20$000 réis de subsidio litterario, tiveram sempre mestres de primeiras letras. O peior é que estes mesmos poucos professores, que existem, andam sempre mal pagos. Eu creio que o Sr. Passos já mandou pagar a alguns destes desgraçados; mas é certo que o mestre de primeiras letras da minha propria aldéa, não havia recebido, ainda ha pouco, um só vintem, depois que se restabelecera o Governo da Rainha. Concluo por tanto dizendo, que nenhum estabelecimento desta natureza poderá prosperar em Portugal, em quanto o povo não conhecer as vantagens que delles lhes podem resultar, e só poderão, entender por meio da instrucção primaria, até agora mui desattendida. Não me parece que se tenham dado tantos cuidados á instrucção primaria, como ao ensino superior, o que é muito para lamentar.

Leu-se o seguinte

PARECER.

Foi presente á Commissão de instrucção publica, o requerimento que dirigiu às Côrtes Henrique José do Couto, que se diz professor substituto da cadeira do grego do 3.° districto de Lisboa, allegando, que sentindo-se lesado nos seus direitos peto Decreto de 17 de Novembro de 1836, que regulou a instrucção secundaria , por ter deixado subsistentes sómente tres cadeiras desta disciplina, requererá ao Governo pedindo a applicação das providencias do mesmo Decreto nos art. 48.°, §. 1.º e 49; a respeito dos professores, que serviam anteriormente á data do Decreto, e que não tendo tido deferimento, requeria às Côrtes, para que enviando o seu requerimento á Commissão de instrucção pública, désse esta o seu parecer ácerca da justiça do requerente quando tractasse daquella refórma.

O requerente não junta o diploma, porque foi provido no cargo de professor, e a referencia que faz ao numero de cadeirão, que ficaram subsistindo, não é conforme ao Decreto, porquanto em virtude delle ficaram subsistindo quatro, e não tres; mas se assim mesmo o requerente ficasse desempregado em virtude das disposições do citado Decreto nos art. 48.º e 49.°, estão dadas as providencias para similbantes casos.

Parece portanto á Commiasão, que o requerente deve recorrer ao concelho geral director da instrucção primaria, e secundaria, a fim de lhe poder ser applicada a disposição dos artigos citados, procedendo talvez a falta do deferimento que allega, de haver requerido directamente ao Governo. - Salla da Commissão 18 de Março de 1837. - José Alexandre de Campos. - João Lopes de Moraes. - João Baptista d'Almeida Garrett. - R. J. Fernandes Thomaz. - Antonio Joaquim Barjona. - Antonio Cabral de Sá Nogueira. - José Liberato Freire de Carvalho.

O Sr. J. A. de Campos: - Alguns professores receando que não seriam empregados em virtude do projecto, que se apresentou, tem requerido, como o fez esse de que trata o parecer que acaba de ser lido: porém o receio que elles tem desappareça porque elles hão de ser empregados na instrucção primaria, com accesso para a instrucção secundaria, no caso de succeder que não houvesse logares para elles serem empregados na instrucção secundaria, o que creio que não se verificará. Esse professor não sabia disto, e foi por essa razão sem duvida, que elle requereu; mas os seus direitos, nem os de outros professores em identicas circumstancias, não foram lesados. - Agora elle requereu directamente ao Governo, em vez de requerer ao conselho director, e é a causa de não ter tido deferimento no Governo, segundo entendo.

O Sr. Vice-Presidente: - Propoz á votação o parecer da Commissão, e approvou-se.

O Sr. J. A. de Campos: - Eu tinha pedido a palavra para quando estivesse presente o Sr. Ministro da Justiça, em virtude de um caso que succede, e é a absolvição de um réo preso em uma das cadêas de Villa Real, réo que foi chefe de uma guerrilha miguelista; mas não só me referirei a este, porém a respeito de outros muitos, dos quaes todos os dias constam absolvições desta natureza. Eu porém que tenho de votar, quando se tratar da reforma judiciaria, preciso para bem o fazer estar habilitado, e saber se este defeito procede da lei, ou da falta d'execução; e se ella é applicavel ao nosso paiz: sendo pois os factos verdadeiros, e não se podendo duvidar que uma das causas porque entre nós não ha perfeita tranquilidade, a immoralidade dos povos, e impunidades são as causas principaes de que resultam todos os males; principio este tão verdadeiro, e que o Congresso reconheceu tanto, que o inseriu na resposta ao discurso do throno. Ora, Sr. Presidente, é necessario que se intenda, que os povos proclamam os systemas politicos, para terem segurança individual, e de propriedade: é este o fim mais importante para que o fazem: estes bens quando se gozam, é o melhor systema politico do mundo, e tanto melhor quanto estes bens mais bem garantidos são; ora sendo este o fim, tudo o mais são constituições de papel. Se no meio da liberdade, o cidadão não tem segurança, se as portas de sua casa são arrombadas a machado, então a Constituição não passa de ser um papel, e nada mais, porque a não tem de facto: - ora sendo pois os factos verdadeiros, deve seguir-se ou do defeito das leis, de não serem adoptadas ao estado do povo, ou da falta d'execução. Devemos pois indagar d'onde procede este estado de que actualmente soffremos tanto; porque se procede da falta d'execução das leis, devemos empregar todos os meios para que a lei seja executada, e punidos os que a não executam: se provém das instituições, então é preciso reformar essas instituições, que não são verdadeiras leis. É preciso entrar nisto com seriedade, porque uma lei póde merecer muito a approvação do povo, e não ser adaptada ao paiz. Eis aqui sobre que eu queria alguns esclarecimentos do Sr. Ministro da Justiça; não sei se hoje m'os poderá dar, não obstante eu telo prevenido; e desejava que S. Exa. me informasse não só ácerca deste facto, mas de todos os que procedem de falta d'execução das leis, ou de defeito dellas.

O Sr. Ministro dos Negocios da Justiça: - O Sr. José Alexandre creio que se referiu á absolvição de um homem , que se suppunha involvido em crime de rebellião, chamado Soares d'Albergaria. Eu não tenho noticia nenhuma official a tal respeito; mas sei extra-officialmente, que fôra absolvido pelo jury de sentença. - O que o Sr. Deputado ponderou é justo até certo ponto; nós soffremos, e soffremos por muitas causas; uma dellas póde muito bem ser a impunidade; impunidade de que o Governo não tem culpa nenhuma; mas nós soffremos principalmente pelo estado provisorio em que estamos; e isso cada vez mais me convence, que é preciso pôr em execução quanto antes a nova reforma judicial. É preciso fixar a sorte dos juizes, e tiralos do estado de anciedade, e incerteza em que se acha , pois que um tal estado é realmente nocivo á boa administração da justiça.

O Sr. Lopes Monteiro: - Sr. Presidente, o conhecimento que o Sr. José Alexandre de Campos tem a este respeito, foi-lhe dado por mim. Recebi no correio passado uma carta de um advogado muito distincto, fallando dos males que afllí-

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gem o nosso desgraçado paiz, resultando principalmente da absolvição dos criminosos. Eu já fallei a este respeito, e já disse alguma cousa que se reduzia a executar as sentenças, e reformar as leis. Tornando ao objecto, de que faltou o Sr. José Alexandre; tenho a informar o Congresso que o absolvido é Manoel Soares d'Albergaria, accusado de chefe da sedição tentada em Agosto passado. O jury foi quem o absolveu, e com isso não tem nada o Sr. Ministro das Justiças, e tambem nós o não temos: com o que temos tudo é com a lei que regula a formação do jury. Do modo porque está, posso dizer que é uma garantia para os ladrões e malfeitores; e eu hei de propugnar pela sua reforma quanto em mim couber. - Pelo uso, e prática que tenho do foro estou convencido, que no estado de moralidade, e civilisação do paiz, não podemos ter senão um jury electivo, como se estabelece na Constituição.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: - Devo dar uma explicação sobre este facto, que se passou na minha provincia, e a decisão do Jury foi em Villa Real em Abril do anno passado, quando o povo do Porto se perturbou um pouco por causa da caristia dos cereaes, alguns amotinadores enganaram se com o motivo, e perturbaram a ordem publica em Soalhães, ou Gouvea sobre o Tamega.

Parece que esses motins foram promovidos por Soares de Albergaria, ou por seus filhos; o certo é que poucos dias depois a Guarda Nacional a cavallo de Villa Real foi a Rede, prendeu Manoel Soares, e conduziu-o para Villa Real. Esteve prezo nove ou dez mezes, e ha poucas semanas foi absolvido por um Jury de sentença. Esta é a historia de Manoel Soares. Agora, Sr. Presidente, darei todo o apoio às razões expendidas pelo honrado Deputado o Sr. José Alexandre. O Jury por meio de recenseamento não póde convir-nos, por ora , é preciso augmentar o censo, ou que seja electivo. A maior parte das decisões proferidas pelo Jury resentem-se, ou de coacção, ou de ignorancia. É necessario figurar-se um tribunal de primeira instancia numa das Villas do interior. E uma mesma salla para o Juiz, e para as testemunhas, e são um e outros accessiveis ao publico. Os Jurados, geralmente timidos, e de poucas letras, acham-se n'uma posição delicada. Muitas vezes os cumplices do réo ou indiciado, cercam o Jury, e ameação-no, e elle vê-se obrigado a julgar sem saber como. Ora se o Jury fôr eleito, e escolhido entre os mais ricos, e illustrados, ha de temer menos, e ser por isso mais independente em suas decisões. Uma guarda de policia local deveria ser permanente junto aos tribunaes de primeira instancia para que os jurados, e testemunhas podessem julgar, e depôr em liberdade.

As Camaras municipaes tambem tem alguma culpa na má composição do Jury, porque dispensam geralmente da obrigação de jurado os moradores mais instruidos, e abonados. Os juizes Letrados às vezes acham-se embaraçados com a timidez, e pouca aptidão dos jurados. É necessario alterar esta excellente instituição, para que possa concorrer para administrar justiça, e manter a segurança publica.

O Sr. Barjona: - Não é possível deixar de concordar com a maior parte das idéas apresentadas pelos illustres Deputados que me precederam: todavia a materia é de tal importancia, que não serão perdidas mais algumas reflexões; além de que é necessario encher o intervallo que vai d'aqui até á hora, visto que se acabou a ordem do dia: e estou bem certo, que em nenhum objecto empregariamos tão bem este pouco de tempo que ainda resta.

Nada admira a absolvição de Manoel Soares d'Albergaria pelo jury: as pessoas que tem considerado um pouco a organisação do jury entre nós, que tem algum conhecimento do estado do nosso paiz, que sabem qual foi sempre o modo de viver de Manoel Soares, e quaes eram as pessoas com quem se ligava, deviam, ouso dize-lo, esperar já similhante resultado. Qualquer destes topicos é merecedor de muitos, e mui serias considerações: comtudo fallarei mais particularmente do jury, por isso que pertence exclusivamente a este Congresso o reforma-lo, e é absolutamente necessario que se occupe de o fazer com a possivel brevidade, já que o Governo, que tanto se empregou em cousas inuteis para a época presente, despresou inteiramente um dos objectos do mais vital interesse. (Vozes, está reformado, está reformado.) O Orador: está reformado, é verdade o jury de pronuncia: mas falta a emenda mais essencial, que é: - o fase-lo electivo ou levantar o censo para os jurados. Comtudo devo explicar-me: algumas pessoas pensão que os maiores males do jury cessaram, fazendo que elle seja electivo:. porém eu creio que então será tambem preciso, que os eleitores sejam d'um certo censo, aliás teremos um circulo vicioso; ficará ainda o jury máo, porque o são os eleitores, como está acontecendo na eleição d'algumas Camaras. Repito, se querem que o jury seja electivo, cumpre que ninguem possa votar na eleição d'elle, sem que tenha uma certa renda, e esta calculada com escrupulo, e não com o desleixo e patronato com que se fazem os actuaes recenseamentos. Eu pela minha parte penso; que a eleição é desnecessaria; e que satisfará melhor aos fins que nos propomos, o elevar o censo a umgráo sufficiente, havendo-se as pessoas a quem compete o recensear, com a devida honra e desinteresse, e deixando nós às partes a faculdade de rejeitarem um certo numero de jurados na occasião, sem que lhes seja preciso darem o motivo da rejeição. Isto é, a meu ver mui simples; a experiência tem mostrado, que não podemos passar sem uma similhante medida. Entretanto, é desagradavel a idéa de que para casos como aquelle que moveu a presente discussão um jury assim desorganizado não é sufficiente: não basta a reforma que apontei para os crimes politicos; é ainda necessario um jury especial; e é sobre isto que eu vou chamar toda a attenção desta assembléa. Ha homens illustrados, e muito liberaes, que entendem não convir o jury para os crimes politicos: talvez que neste recinto se ache agora alguém que se lembra de ouvir annunciar a mesma idéa na Camara dos Deputados de França a pessoas bem liberaes. Em Inglaterra onde se sabe o que é liberdade, e onde se conhecem cabalmente as vantagens do jury, diz-se: - que sendo os jurados a primeira, e a mais sólida base do governo representativo, se tem não obstante isto conhecido pela experiencia, que em occasiões d'agitação popular é o jury o peior dos julgadores. Em confirmação d'isto me lembro eu agora dum acontecimento, que teve ha poucos annos logar em a cidade de Londres, provavelmente se achará neste Congresso alguem que fôsse testemunha d'elle. (É verdade, é verdade.) Teve a policia de socegar um tumulto popular, em uma occasião em que os animos se achavam sobre maneira agitados: a policia houve-se, forçoso é confessa-lo, com toda a moderação; porém o povo não obstante , cahio sobre ella com a maior injustiça e brutalidade, e varios homens da policia foram feridos. Instaurou-se o processo; todo o mundo sabia que a razão e a justiça estavam da parte da policia; mas apesar d'isto, como o jury foi tirado do povo, foi a policia condemnada, e os do povo absolvidos. Isto, repito eu, é cousa mui conhecida em Inglaterra, e nos povos onde ha prática do jury. (Apoiado, apoiado.)

Agora seja-me permittido perguntar, estará a Nação ao presente em um verdadeiro estado de tranquilidade? Infelizmente ninguém póde ter duvida a este respeito ... E quantos haverá hoje em o nosso malfadado Portugal, que, na presença de qualquer occorrencia politica, destas que tem logar não poucas vezes, se possam reputar verdadeiramente imparciaes? Peço encarecidamente ás pessoas que me fazem a honra de me ouvir, que reflictam, e se recordem do que tem observado (Apoiado, apoiado). Senhores, a verdade é, que em uma terra miguelisla, o miguelista mui difficultosamente será condemnado, qualquer que seja o cri-

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me, é a prova delle; e pelo contrario em terra onde domina o constitucionalismo exaltado, o que não entra na mesma seita, corre grande risco de ser condemnado pelo menor crime em certas occasiões d'[...]. Abstenho-me de proposito de continuar neste assumpto, por conhecer quando elle é desagradavel. Todavia não devo deixar de fazer de passagem uma nota importante. Talvez alguem se lembre de que um Jury especial não é compativel com as verdadeiras idéas constitucionaes: mas para desviar toda a prevenção neste ponto, não são precisas vastas, nem profundas reflexões. Blackstone , o Jurisconsulto Inglez , diz, quando falla da suspensão do habeas corpus: - que é necessario que se deixe de gosar a liberdade por algum tempo, para a segurar permanente para sempre; e eu fazendo applicação da mesma idéa digo: - soffre-se muito embora um Jury menos liberal, os menos conforme com as idéas liberaes com os crimes politicos, a fim de segurarmos o nosso systema politico para o futuro (Apoiado): e não valerá isto a pena? Sr. Presidente, se nós nos não convencemos desta verdade, ai da nossa desgraçada patria! (Apoiado). Mas não é o máo Jury a causa unica das nossas desgraças! A escolha dos delegados, e dos juizes não foi a melhor (Apoiado); e a nomeação de certas authoridades administrativas pareceu mais para fomentar a anarchia, e para saciar vinganças particulares, do que para estabelecer a ordem, a união, e a moralidade. Que terrivel quadro se me apresenta á minha imaginação! Elle seria por extremo doloroso para meus illustres Collegas, e é absolutamente desnecessario depois do que tive a honra de lhes apresentar em apoio do meu additamento á resposta ao discurso do throno; additamento que hoje o illustre Deputado, que abrio a discussão, tomou como para thema, additamento em fim, com que não devemos ser contradictorios, e em consequencia não devemos deixar subsistir a falta de segurança individual, que temos reconhecido existir em alguns pontos da Monarchia.

Tendo dado a hora, disse o Sr. Vice-Presidente, que na sessão de amanha, depois de mencionada a correspondencia, o Congresso se dividiria em Commissões. - Fechou a sessão depois das quatro horas da tarde.

SESSÃO DE 14 DE MARÇO.

(Presidencia do Sr. Dias d'0liveira , Vice-Presidente).

Abriu-se a sessão às onze horas e meia da manhã; estando presentes oitenta e nove Srs. Deputados.

Leu-se e approvou-se a acta da sessão antecedente.

Mencionou-se a seguinte correspondencia.

1.° Um officio do Ministerio do reino, acompanhando, em cumprimento de uma indicação do Sr. Deputado Rojão, a representação da Camara municipal de Tavira, e mais papeis relativos á abertura de uma nova barra no rio de Tavira. Foi remettido á secretaria.

2.° Um officio do mesmo Ministerio, acompanhando , em cumprimento de uma indicação do Sr. Perache, cópias dos officios do administrador geral interino do destricto de Evora, e do administrador do concelho de Borba , sobre o destino que se deu ao producto de uma tomadia de azeite hespanhol feita pela guarda nacional da mesma villa de Borba. Remettido á secretaria.

3.º Um officio do Ministerio dos negocios da fazenda, participando que ficam expedidas as ordens necessarias a fim de ser satisfeita a proposta do Sr. Deputado Barjona, para ser informado se a arrematação que José da Costa Alves Ribeiro fez da renda do hospital de S.Lazaro, em Coimbra, foi celebrada com as formalidades legaes. O congresso ficou inteirado.

4.° Um officio do mesmo Ministerio, particidando ficarem expedidas as ordens necessarias para se obterem os esclarecimentos relativos á indicação do Sr. Deputado Barjona, pela qual deseja saber a razão porque se mandaram sustar algumas execuções da fazenda publica no districto de Coimbra. O Congresso ficou inteiradol.

5.º Um officio do mesmo Ministerio, participando, em cumprimento da proposta do Sr. Deputado Macario de Castro, que ficam passados as convenientes ordens para ser exceptuado da venda dos bens nacionaes o extincto convento de Santa Cruz, da cidade de Lamego, para servir de hospital. O Congresso ficou inteirado.

6.º Um officio do mesmo Ministerio, communicando ficarem expedidas as convenientes ordens para ser satisfeito com urgencia o requerimento do Sr. Deputado Alberto Carlos, em que pediu uma relação exacta, e circunstanciada de todos os livros pertencentes á fazenda nacional, e administração publica, que eram do cartorio do escrivão da antiga provedoria da Camara de Coimbra Isidoro José da Costa. O Congresso ficou inteirado.

7.° Um officio do mesmo Ministerio, communicando terem-se expedido as ordens necessarias, para se obterem os esclarecimentos exigidos pela indicação do Sr. Deputado Silva Sanches, a respeito das arrematações dos bens nacionaes, feitas pela administração geral de Coimbra. O Congresso ficou inteirado.

8.º Cinco representações dos povos da Bemposta, juntas de parochia e povos da freguezia d'Aldea do Mato, juntas de parochia e povos da freguezia das Mouriscas, Camara, municipal da villa da Feira, e Camara municipal do concelho de Ovar, sobre divisão administrativa. Foram á Commissão de estatística.

9.° Uma representação dos juizes, e eleitos da capella do Corpo Santo de Peniche, pedindo que as embarcações de remo d'aquella villa paguem direitos proporcionados às de véla empregados no uso da pesca. Foi á Commissão de fazenda.

10.º Uma representação da Camara municipal da cidade de Coimbra , a pedir que se não estabeleça uma barreira a distancia de legua e meia ao sul da mesma cidade, ou para lá de Condeixa.

O Sr. Alberto Carlos: - Sr. Presidenta, a palavra sobre a direcção d'essa representação. Eu hão fui quem a apresentou, mas parece-ma que se fosse remettida ao Governo seria milhor, visto que ella trata do estabelecimento das barreiras, para elle as designar, ou dar os esclarecimentos necessarios aos seus commissarios afim de as collocarem convenientemente; porque ir á Commissão de estatistica nada vale, por já se achar dececido esse negocio.

O Sr. Barjona: - Aquella representação de Coimbra, que eu mandei para a mesa antes de ser lida, era só para ser remettida ao Governo, para ter em consideração o que a Camara representava em conformidade com o que eu disse. Foi isto mesmo o que pede, porém desgraçadamente não fui entendido, ou não me expliquei bem.

A representação foi mandada ao Governo. Mencionou-se mais:

11.º Uma representação da Camara municipal d'Evora sobre a casa pia estabelecida na mesma cidade. Foi á Commissão de administração publica.

O Sr. Rojão: - Sr. Presidente, eu pedi a palavra não só para apoiar com todas as minhas forças a representação que acaba de ser lida, porque e seu objecto é justo, e concorre mui poderosamente para o augmento e propriedade do phihantropice estabelecimento da casa pia d'Evora, mas porque ella me fornece uma occasião favoravel para me defender de uma falsa e calumniosa accusação que contra mim se fez em um jornal d'esta Capital, aonde fui chamado de-

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