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SESSÃO DE 16 DE MARÇO.

(Presidencia do Sr. Dias d'Oliveira, Vice-Presidente).

Abriu-se a sessão às onze horas e meia; estando presentes cem Srs. Deputados.

Lida a acta da sessão antecedente, foi aprovada.

O Sr. Secretario Velloso da Cruz deu conta da seguinte correspondencia.

De sete representações da Camara municipal do extincto conselho de Santa Martha de Bouro; das juntas de parochia das freguesias do mesmo concelho; da Camara municipal do concelho de Póvoa de Lanhoso; da Camara municipal do concelho de Leça do Balio; da Camara municipal do concelho de Mourão; da Camara municipal do concelho de Mesão-frio; e da Camara, e administrador do concelho d'Alvarenga, sobre divisão administrativa. - Foram á Commissão d'estatistica.

O Sr. Secretario d'estado dos negocios da fazenda, apresentou por parte do Governo uma proposta sobre impostos em diversos objectos. - Foi remettida á com missão de fazenda, para a converter em projecto de lei, se o julgar conveniente, devendo desde logo ser impressa no Diario do Governo.

O Sr. Visconde da Fonte Arcada: - Sr. Presidente, eu pedi a palavra para apresentar um requerimento da Camara municipal de Alemquer, no qual pede certas providencias sobre divisão administram a Sr. Presidente, um dos rendimentos mais líquidos que tinha a Camara de Alemquer, era o do porto da villa do Carregado, que annualmente lhe rendia seiscentos sessenta mil réis; mas em consequencia da nova divisão de território, ficou pertencendo ao concelho da Castanheira: a Camara requereu logo ao Governo, e avisou a Camara desta ultima villa para que aguardasse a decisão de Sua Magestade; mas não teve resposta; e a Camara da villa da Castanheira tomou logo posse do dito porto, e mandando para lá gente armada, pôz a Camara d'Alemquer na mesma precisão de mandar tambem para alli uma força da guarda. Estas divisões de territorio, sem se attender às precisões, e commodidades dos povos, tem sido origem de estarem muitos delles quasi em guerra aberta uns cout os outros: convém por tanto que este Congresso de remedio a tudo isto. Eu peço aos Srs. Deputados membros da Commissão de estatistica, que queiram ter a bondade de se reunirem quanto antes para tratarem deste objecto; e de outros similhantes. Eu não pretendo com isto fazer censura á Commissão; sei que ella é composta de membros muito capazes, e que por pertencerem a outras com missões são importantes não tem podido trabalhar, e que esta é a razão de não ter apparecido ainda pareceres sobre os requerimentos, e queixas dos povos; mas peço licença para lembrar, que conviria que se reunisse á Commissão mais alguns membros, que tenham conhecimentos locaes, para poderem assim informar sobre muitos requerimentos que nella estão é necessario que o Congresso dê resolução às representações dos povos, para que elles vejam que se tomam em consideração osseus interesses.

Sr. Presidente, por esta occasião igualmente entrego um requerimento da junta parochial de S. Mamede desta cidade, pedindo que a igreja do extincto collegio real dos nobres, sirva de parochial da mesma freguezia.

O Sr. Deputado mandou á mesa ambas as representações.

Tendo o Congresso de dividir-se em commissões, o Sr. Vice-Presidente deu para ordem do dia da seguinte sessão; primeiro, a continuação da discussão do parecer da Commissão de poderes, ácerca da escusa do Sr. Deputado eleito F. Solano Constancio; e depois a discussão, na generalidade dos projectos n.ºs 7, 8, 10, 11 e 12, e finalmente a discussão de pareceres de Commissões que estão sobre a mesa: fechou a sessão sendo meio dia.

SESSÃO DE 17 DE MARÇO.

(Presidencia do Sr. Dias d'Oliveira, Vice-Presidente).

Abriu-se a sessão pelas onze horas e um quarto da manhã estavam presentes cem Srs. Deputados.

Leu-se e approvou-se a acta da sessão precedente.

Foram mandadas para a mesa as seguintes declarações de voto.

1.ª Do Sr. Santos Cruz; - Peço que se declare na acta, que se estivesse presente á apresentação do projecto de Constituição, votaria porque elle voltasse á Commissão, para redigir não - um projecto de Constituição - mas - de modificações á Constituição.
2.ª Do Sr. Pereira de Lemos; - Declaro que na sessão do dia 15, eu fui de ,voto contrario ao parecer da Commissão de poderes, sobre as procurações dos dous Deputados eleitos, Pestana, e Mousinho.

O Sr. Secretario Vellozo da Cruz, deu conta da correspondência seguinte:

1.° Um officio do Ministerio dos negocios do reino acompanhando um officio do administrador geral interino do districto da Guarda; e outro do delegado do procurador regio no julgado da Meda, e cópia da sentença dada pelo substituto de juiz de districto contra os mesarios da assemblea eleitoral de Ranhados, e parochos d'aquelle extincto concelho, por faltarem á eleição de Deputados no terceiro Domingo de Dezembro ultimo. A Commissão de poderes.

2.° Outro do mesmo Ministerio, acompanhando um officio do administrador geral do Porto, e mais papeis, relativamente á incompetência do recenseamento das praças da companhia dos incendios do Porto, para a guarda nacional. A Commissão da administração publica.

3.° Outro do mesmo Ministerio, acompanhando um requerimento, e memoria de Pedro António Lopes de Carvalho, em que pretenda previlegio d'introducção neste reino de alguns productos chimicos, e bem assim algumas informações sobre este objecto. A Commissão de commercio e artes.

4.° Outro do mesmo Ministério, participando ter-se officiado ao ministerio da fazenda, por ser da sua competência, a fim de ser satisfeita a proposta do Deputado Rebello da Carvalho, para que se exigisse do Governo uma relação dos bens nacionaes, que tem sido pedidos para estabelecimentos de utilidade publica, acompanhada de todos os documentos que lhe disserem respeito. Ficou o Congresso inteirado.

5.º Outro do mesmo ministerio, acompanhando um officio do administrador geral interino do districto da Guarda, e mais papeis relativos á eleição dos conselhos de Celorico da Beira, e Lagiosa no segundo escrutinio, para a eleição de Deputados às Cortes actuaes, pela divisão eleitoral de Trancoso. A Commissão de poderes.

6.º Um officio do Ministerio dos negocios da guerra, acompanhando, em satisfação da indicação do Sr. Deputado Macario de Castro, relativa á lei que obriga os viajantes a pagar seiscentos réis na entrada dos navios na barra de Lisboa, cópia da resposta que sobre aquelle objecto deu o tenente coronel ajudante da torre de Belém. Para a secretaria.

7.º Duas representações, uma da Camara municipal da villa de Alemquer, por si e em nome de seus constituintes; e outra dos povos da freguezia de Semide sobre divisão administrativa. A Commissão d'estatistica.

8.º Uma representação da Camara, e mais authoridades electivas do concelho de Miranda do Corvo, sobre divisão judiciaria. A Commissão d'estatistica.

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8.° Uma representação do arcipreste, e mais párochos do arciprestado de Cazal Comba, bispado de Coimbra, a queixarem-se das juntas de parochia no arbitramento das congruas aos parochos, e a pedirem providencias para que nem as parochias sejam abandonada pelos pastores, nem estes obrigados a servir de graça. A Commissão ecclesiastica.

10.º Uma representação da junta de parochia de S. Mamede da cidade de Lisboa , a pedir que a igreja do extincto collegio real dos nobres sirva de parochial desta fregue-2ia. A Commissão de fazenda.

Teve segunda, leitura o seguinte.

REQUERIMNTO

Não tendo havido audencia geral no julgado de villa Pouca d'Aguiar no quartel de Novembro, nem tambem de Fevereiro, e havendo na cadêa daquelle julgado vários presos por graves cumes: requeiro se recommende ao Governo tome promptas providencias, para que immediatamente vá um juiz de direito fazer a audiência daquelle julgado. O Deputado José José Joaquim da Costa Pinto.

Sobre ella , disse

O Sr. Costa Cabral: - Por se não terem feito as audiências geraes em muitos julgados, tem resultado grandes inconvenientes às justiças, e aos povos. O Sr. Deputado que fez esse requerimento, limitou-se a fazello relativamente a um julgado; mas parece-me que se deve representar ao Governo, que dê as providencias em geral, para que se façam as audiencias geraes em todos os districtos, porque na realidade soffre-se muito por se não terem feito.

O Sr. Costa Pinto: - Eu concordo n'esse additamento.

O Sr. Alberto Carlos: - Eu concordo tambem com as idéas do Sr Costa Cabral, e tenho pena que não esteja presente o Sr Ministro da justiça. Estamos todos os dias a queixar-nos das leis existentes, e ellas boas ou más não se executam queria dizer alguma cousa sobre uso, e tenho pena que S. Esca. não esteja presente, por consequencia limito-me a isto, e peço que o requerimento vá ao Governo em termos geraes, visto que seu auctor concordou e isso, para nós não estarmos sempre a queixar das leis, quando a falta é da sua hão execução.

O Sr. José Marta d'Andrade: - Eu pedi a palavra para apoiar o requerimento do Sr. Costa Cabral para que a medida se tome em consideração geralmente para todos os julgados, porque ha falta de regularidade nas audiências geraes com grave detrimento de justiça, e prejuizo dos povos. Em Odemira não as ha desde Mato do anuo passado, a cadeia está cheia de presos, que é perciso sentenciar, e que estão fazendo grande peso aos habitantes daquella villa, e alguns talvez soffrendo maior pena do que aquella, a que deverão ser condemnados, e mesmo para, punir com promptidão os que se acharem criminosos.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: - Eu reconheço o inconveniente que acaba de apontar-se, mas tambem tenho algum motivo para o attribuir a causas diversas. Anunciou-se uma reforma judicial, e depois essa reforma suspendeu-se em consequencia de resoluções adoptadas n'este Congresso. D'aqui vem que magistrados, que deviam estar nos seus togares, receosos de deixarem de o ser, não estão n'elles; outros, que deviam ir fazer audiencias num districto, o que dá incommodo e despeza, receando encontrar no caminho o decreto, que os dispense d'aquelle serviço, deixam de partir. A falta em Villa Pouca d'Aguiar vem tambem de se acharem neste Congresso dous benemaritos juizes de direito d'aquellas immediações. Para obviar a todos estes inconvenientes é necessario, quanto antes, decidir a questão judicial, ou pôr em vigor o que está decretado, quando não ficaremos sempre nesse provisorio, que e já cansa.

O Sr. Lopes Monteiro: - Convenho com as idéas do Sr. barão de Sabrosa até certo ponto. Póde acontecer que hajam julgados, onde não seja possivel ao Sr. Ministro da justiça fazer que hajam audiências geraes, porque os juizes de direito muitos são Deputados, e alguns legares estarão vagos, mas não creio que estejamos habilitados para fazermos uma tão grave censura aos juizes de direito. Parece-me impossivel que haja um juiz de direito, que só porque vai a haver um novo despacho, ou porque não está bem pago, (porque o não estão) deixe de cumprir seus deveres, isto não se póde dizer. Os Magistrados estão por pagar, o trabalho é muito grande, e não sei que se possam inculpar os magistrados sem se saber quem são, porque então é preciso puni-los.

O Sr. Branquinha Feio: - Levanto-me para apoiar o Sr. Costa Cabral, em quanto pede que a medida seja ostensiva a todo o reino. Não me demorarei em mostrar a conveniencia, que resulta ao peno da prompta administração da justiça, lembrando ao Congresso que já em 2 de Março presente pelo Ministerio da justiça se expediram portaria, aos presidentes das relações para informarem sobre este mesmo objecto, dando as providencias, que julgassem competentes para se levar effeito, e n'este mesmo correio eu recebo a cópia d'esta mesma portaria, que não fui enviada ao julgado, a que eu presedia, para aqui menino dar as informações, que julgasse convenientes. No meu julgado, ou circulo, a que era adstricto, tem havido graves inconvenientes pela falta de audiências geraes, e com especializado no de Pinhel, em que não tem havido audiencias geraes desde Maio elle compõe-se de quatro julgados, a saber, Trancoso, Pinhel, Meda, e S. João da Pesqueira os Juizes que foram nomeados para a Meda, e S. João da Pesqueira não tem ido ainda tomar posse de seu cargo. Apoio por tanto a medida proposta, porque é urgentissima.

O sr. Costa Cabral: - Se é verdade que não se tem feito aã audiencias geraes, porque muitas magistrados não estão nos seus logares por se terem ausentado d'elles, não posso deixar de estranhar ao Sr. Ministro da justiça, por não dar providencias para que os empregados estejam nos seus logares. Sinto que o Sr. Ministro não esteja presente, porque desejava que elle nos informasse a tal respeito. O empregado não pode retirar-se do seu logar, senão quando não quer servir, e se dá por demittido. Eu reservo me para quando estiver presente o Sr. Ministro da justiça para o interpellar sobre este objecto, porque na realidade será insupportavel, que se tenha tolerado uma tal falta por esta mesma razão não póde deixar de ser approvada a substituição, que eu propuz ao requerimento para ir em termos geraes. (Apoiado)

O Sr. Alberto Carlos: - Não quero continuar esta discussão por não estar presente o Sr. Ministro da justiça Convenho que a culpa não é só d'elle; mas tambem estou persuadido que alguma poderá ter tido tambem, e que as leis estão em grande falta, mas por isso aproveito esta occasião para dizer, que tenho trabalhado para organisar algumas reflexões, e emendas ao decreto judiciario, e que brevemente as apresentarei aqui para serem tomadas na devida consideração, e para o que V Exca. já me inscreveu. Por tanto para saciar de alguma forma a justa anciedade com que o Congresso deseja ver melhorada a justiça, declaro que brevemente hei de apresentar esse trabalho.

O Sr. Leonel: - Eu não pedi a palavra para fazer observações ácerca da necessidade de se providenciar a materia, de que se trata, porque isso é bem reconhecido entre tanto pedi a palavra para dizer, que ha poucos dias se disse aqui com muita razão, que uma das causas principaes da desordem das províncias, a respeito às segurada publica, vem do foro, n'uma palavra, a causa de tudo isso, é o estado provisorio. (Apoiado.) Ha poucos dias se disse aqui, e parece-me, que essa idéa teve um assenso geral das Cortes (e eu agora levanto-me para o repetir), que o estado provisorio tem em grande parte a culpa do mal, de que se

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trata. Eu peço ao Congresso que me permitta uma observação: esse estado provisório a respeito do foro, existe era grande parte por culpa das Côrtes; quando se. chegar, ou hoje ou amanhã a essas materias, se verá se a temos ou não, e somos nós os que havemos de fazer acabar esse estado provisório, e havemos de dar-lhe um remedio: quando chegar a occasião de tratar disso serei mais extenso.

O Sr. Gomes da Moita: - Eu levanto-me só para dizer, que não é culpa deste Congresso o estado provisório, em que se collocou a administração da justiça; mas sim do Ministerio, que se arrogou o poder de legislar, que lhe hão competia; nem era reclamado pela necessidade de sustentar a revolução de 9 e 10 de Setembro; pois que para isto tinham os Srs. Ministros da Corôa poderes mais que sufficientes, marcados na Constituição política de 1822, sem invadirem as atribuições do legislativo, que reside essencialmente nos Representantes da Nação reunidos em Côrtes.

O Sr. Leonel: - Visto que o Sr. Deputado mostrou acrimonia respondendo-me, não poderá levar a mal que eu ,lhe responda, pouco mais ou menos no mesmo tom. O Sr. Deputado levantou-se aqui um dia com muita pressa, a pedir que se declarasse já suspenso, ou sem execução o decreto da reforma judiciaria, foi o Sr. Deputado que se levantou para isso elle dará a razão que teve: foi o Sr. Deputado, levantando esse alegro, quem teve em grande parte a culpa de que exista o estado provisorio. Ora agora diz-se que a revolução não precisava disso; quando tratarmos dessa materia eu mostrarei ao Sr. Deputado que a revolução, o precisava: não é agora occasião mas esteja certo que lho mostrarei.

O Sr. Alberto Carlos: - Eu peço palavra para então, para mostrar ao Sr. Leonel o contrario.

O Sr. Gomes da Motta: - Para uma explicação. Eu pedi que se não fizesse em execução aquillo que se queria pôr contra a lei; o decreto da reforma judiciaria, feito pelo presente Ministerio, não estava em execução; mas sim o de 16 de Maio de 1822, que não eraprovisório, e que não .pôde ser re.vqgado, ne,m alterado senão por este Congresso.

O Sr. Leonel: - Também para uma explicação. Repito o que disse aqui, quando se tratou da grande questão dos juizes ordinarios, se começarmos por isso, depois veremos, as difficuldades que havemos de ter, se quizermos voltarão, antigo systema. Ha muito tempo que eu esperava uma occasião para explicar umas palavras, que disse aqui haverá quinze dias, que por falta de explicação se podem entender referidas a outras, pessoas. Aqui ha juizes de direito, e outros empregados do foro que são de opinião que é preciso voltar aos juizes ordinarios. O Sr. Valentim, que pede agora a palavra (provavelmente, para requerer que eu me explique), é um dos juizes de direito, que tem esta opinião: em consequencia nada do que eu disse se referia ao Sr. Valentim. O Sr. Judice Samora, e o Sr. Lopes Monteiro são da mesma opinião; e agora declaro eu, quando menciono estes, e não os outros, não é porque os suppunha doutra opinião; é porque não são juizes. A verdade é que, quando aqui, se estabeleceram cento e trinta juizes de direito, eu disse que ao depois, se quizessem voltar aos juizes ordinários, se haviam de ver nestas difficuldades a experiencia confirmou a minha profecia.

O Sr. Lopes Monteiro: - Esta questão está muito fora dos seus termos peço a V. Exca. que proponha á votação o requerimento.

Julgada a materia suficientemente discutida, foi approvado o requerimento do Sr. Costa Pinto com, o additamento do Sr. Costa Cabral.

Teve mais segunda leitura o seguinte

REQUERIMENTO.

Não posso approvar o systema de recommendação, feita pela camara ao Governo em alguns requerimentos, que se lhe dirigem; pois me parece esta formula ainda resto desse antigo edificio gothico, que ha dezeseis annos tanto trabalho tem dado para derribar. Esta recommendação assemelha-se, tem feições do monstro patronato; é um patronato disfarçado. Srs. cada um dos sublimes Poderes tem limites: ultrapassa-los é um crime. O soberano Congresso só pode mandar o que está nas suas attribuições: recommendar é uma especie de favor, que se pede aos Srs. Ministros da Corôa, e isto é indecoroso á Assembléa. Se quem segue a opinião contraria, fundado na differente interpretação que dá á palavra recomemdar; isto é, chamar a attenção do Ministerio, para tomar em mor consideração o requerimento; é indecoroso ao Governo, pois suppõe que sem este estimulo o não fará. Deixemos pois obrar livremente o executivo; e quando não marche, na linha, que lhe é marcada, nós lhe pediremos responsabilidade. Removam-se os motivos de ciume, que causaremos aquelles, cujas representações não recommendarmos. Sem que obste a prática em contrario, pois estamos em Cortes constituintes, e nos reunimos para reformar abusos.

Proponho por tanto que se elimine a palavra recommendação; dizendo-se apenas = seja remettido ao Governo. Quando porém a Camara na sua sabedoria decidida o contrario, peço que depois de posto á votação, se o requerimento deve ser remettido ao Governo, na hypothese e affirmativa, e havendo algum Sr. Deputado que peça a recommendação, seja segunda vez convidada a Camara para decidir se deve ou não ir com essa clausula, pois muitos Votarão a favor da primeira proposta, e se denegarão a subscrever á segunda. = Galvão Palma.

A cujo respeito disse.

O Sr. Galvão Palma: - Sr. Presidente, eu estimaria antes, que às representações que vem á Camara, e cuja decisão ella julga não estar nas suas attribuições, se lhe deferisse com a simples fórmula: Não pertence, á Camara.

Mas em quanto ella não decide neste sentido, e continuar á pratica de se dizer remetta-se ao Governo, eu entendo, que se não deve accrescentar á palavra com recommendação; o que se colherá da analise deste vocabulo, combinada com a magestade do Corpo legislativo. Examinemos pois o que elle significa na linguagem familiar, na scientifica, em todos os tempos, elle inculca favor que se pede. Os classicos, desde o seculo da pureza da nossa linguagem até agora, não lhe ligar a uma outra idéa. Limito-me a prova-lo pelo, que diz o nosso bem conhecido Moraes no seu diccionario recommendado, isto é, protegido afilhado. Recommendar é inculcar como benemerito, e digno, de merce pedindo que se lhe faça: daqui vem a bem conhecida frase cartas de recommendação. Sendo pois esta a significação primitiva, e mesmo hoje usada da palavra recommendar: quem dirá que é decente a um Corpo Soberano usar desta frase, quando só dirige ao Governo? Se á Constituição que juramos, no artigo 99 do capitulo 3.°,prohibe ao Deputado solicitar para qualquer pessoa mercês porque o julga degradante da alta herarchia à que subiu; como poderá ella permittir, que este corpo organisado, pratique, um acto, que tolhe o individuo e affecta a sua independencia? E como não seja provavel; que se faça esta recomniepdação a todos os requerimentos que a Camara dirigir ao Governo, é forçoso que se despreceem aquelles que não vão armados com este escudo, inculcando-se pelo menos, que a sua justiça não é tão saliente; o que dará motivo a ciume, e animadversão, e acaso a inculcar-se o Congresso como parcial. Sr. Presidente, eu, como soldado veterano, respeito muito o Corpo, a que tenho pertencido; e por isso me magoa sobre modo quando o mais insignificante quilate do decoro, que lhe é devido. O exemplo, que a Camara metem dado (louvores lhe sejam votados) de quanto zela a soberania, da que está investida é um novo estimulo, que imperiosamente me move a imi

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te-la, sustentando com a minha já debil vez, a sublime magestade da mesma. Quando porem as minhas theorias a tal respeito não sejam exactas, estimaria, como disse na indicação, que depois de posto á votação o requerimento, e decidido que se remetia ao Governo, e havendo algum Sr. Deputado, que peça a recommendação, seja segunda vez convidada a Camara para resolver, se deve ou não ir com esta clausula; pois haverá quem, votando a favor da primeva proposta t se denegue a subscrever á segunda. Decidi, Srs. na vossa alta sabedoria.

O Sr. B. da Ribeira de Sabrosa: - Sr. Presidente, os requerimentos e os motivos, em que elles se fundam, são ordinariamente tão variados, como os horisontes. Então eu não sei, como seja justo privar o Congresso da faculdade de recommendar aquelle recorrente, que parece digno de justiça ou d'equidade, e minto mais quando todos os Tribunaes tem essa faculdade. Nos concelhos de guerra he permittido, depois de condemnar os réos á morte, recommendallos á benevolencia do Soberano; e nos tribunaes judiciarios acontece o mesmo. Não só aqui, mas em outro:, paizes, attende se sempre às circumstancias attenuantes dos, delictos, e recommendam-se os condemnados á benignidade de quem lhe póde minorar a pena sendo isto assim, não se deve querer, que os Srs. Deputados tenham um coração menos compassivo, é; persatn a faculdade de sympatisar por este, ou aquelle pretendente, recommendando-o, senão por justiça, por equidade: sendo certo que o Governo, que he o fiscal da execução de leis, ha de attender ou não attender a essa recommendação, como julgue justo; porque uma recommendação do Congresso, não é um despacho. Tal requerente póde, á vista do que expõem, merecer muita contemplação ao Congresso, entre tanto a responsabilidade pesa no Ministerio; elle deverá fazer o que a justiça pedir, se a sua informação foi outra; mas o Congresso não deve sempre mostrar-se insensivel ao que se allega, votarei por tanto para que o Congresso continue no methodo, que tem adoptado.

O Sr. Galvâo Palma: - Não me parecem conducentes os argumentos, com que o nobre membro impugnou a minha opinião. E verdade que os tribunaes pedem ao Governo, mui especialmente quando se tracta de commutar a pena a algum réo; mas como é o inferior que recorre ao superior, não tem esta analogia com o corpo soberano. Conheço que é independente o poder judicial, mas simplesmente quando julga, e não descendo da sua escalla para rogar a clemencia do Rei. Disse, que não é despacho que se pede, mas porque não ha de ser estensivel esta fórmula a todos que derigem representações á Camara. Continuou o nobre membro dizendo, que o acto de recommendação não é julgar contenho, mas é prevenir o Governo de qual he o seu methodo de pensar a tal respeito. Srs., o Congrego só póde mandar dentro dos limites das suas attribuições, e quando o Governo não cumpra, exigir a responsabilidade.

O Sr. Vice-Presidente: - Eu julgo que é do meu dever declarar ao Congresso, que este requerimento é tendente a estabelecer uma regra, é uma especie de additamento ao regimento interno do mesmo Congresso, e então como eu sou obrigado a evitar surpresas, e decisões menos maduras, julgo que é do meu dever declarar isto á Assembléa para, no Caso de entender, que elle é mais uma indicação do que requerimento, decida se quer que vá á Commissão do regimento interno, a fim de ella interpor o seu parecer sobre elle.

O Sr. Galvão Palma: - Mas em quanto não haja essa decisão, requeiro que se suspenda o effeito da palavra recommendar, e entre tanto vá o requerimento á Commissão do regimento para dar sobre elle um parecer.

O Sr. Vice-Presidente: - O Congresso resolverá o que se ha de fazer a esse respeito.

O Sr. Leonel: - Eu desejava que se tornasse a ler o requerimento do Sr. Galvão Palma.

Satisfeito, prosseguiu

O Sr. Leonel: - Sr. Presidente, o Sr. Deputado auctor desse requerimento sabe perfeitamente a consideração em que eu o tenho, desde que o conheço, e sabe muito bem que sempre o respeitei por ter direito a isso; entretanto elle ha de permtttir-me que eu me não conforme agora com a sua opinião. O Congresso fazendo uma recommendação ao Governo não pratica um acto de submissão, e segundo me parece não pratica um acto que não seja das suas attribuições.

O Congresso não se mette com os negocios do Governo exe0cutivo, porque o Congresso não faz despachos, mis todos os Cidadãos portugueses tem direito de fazer ao Congresso quantos requerimentos quizerem, e é por isso que aqui
apparecem muitos sem nenhum fundamento de justiça; apparecem tambem outros revestidos de taes circunstancias, que nós julgámos que elles merecem alguma attenção, posto que sejamos nós quem os ha de defferir, e nesse caso ou havemos de remette-los ao Governo com um signal de approvação, ou o direito de petição se torna uma perfeita illusão; e é necessário, que nós nos não exnonhimos a que se julgue, que é innutil fazer requerimentos ao Congresso, e para que se não diga, que é innutil fazer requerimentos á Côrtes, é que se introduziu a pratica de fazer recommendações ao Governo, tanto nas Cortes extraordinarias de 1834, como nas ordinarias de 1835 e 1836: mas não se diga, que por o Soberano Congresso fazer recommendações ao Governo, fica sendo inferior, porque por tal procedimento elle se não mette com a administração que compete ao Governo, e Deos nos livre que nos quizesssinos metter com isso, porque dabi não viriam senão desordens Mas quando se recommenda ao Governo qualquer requerimento, não se vai pedir a um inferior, assim como os Tribunaes quando impõem uma sentença, e por essa occasião fazem uma recommendação ao Governo a favor do réo, tambem se não póde dizer que lhe são inferiores; porque os Tribunades judiciarios são tão independentes, e tão iguaes no Poder executivo, coroo é o Corpo legislativo, mas os Tribunaes só podem sentenciar segundo as leis, o resto não lhe pertence, porque os Tribunaes, em um caso contencioso, só tem o direito de julgar segundo o que está marcado nas leis, mas não o direito de aggraciar, e por tanto fazem essa recommendação ao Governo quando entendem que devem ser minoradas as penas, que as leis lhes mandam impor, entretanto cumpriram o seu dever que lhe pertence, e depois remette o processo ao Governo para lá se ver que se cumpriu a lei, e fazem ao mesmo tempo uma recommendação a esse raspeito, mostrando, a quem tem O direito de minorar, ou perdoar as penas, a razão em que se fundou o Tribunal. Por estes motuos creio, que o requerimento do Sr Deputado se não poderá approvar, mas se esse requerimento for mandado á Commissão, ainda menos se poderá suspender a pratica até aqui usada de se fazer recommendações ao Governo em quanto a Commissão não der o seu parecer; e por isso eu não approvo o requerimento, nem o additamento.

O Sr. Costa Cabral: - Sr. Presidente, desde que V. Exa. ponderou, que a materia desse requerimento poderia servir de um artigo addicional ao nosso augmento interno, parece-me que não devamos prolongar mais esta discussão, e que convinha ser mandado á Commissão respectiva, para dar o seu parecer e portanto peço a V. Exa. que consulte o Congresso, e esse requerimento deve ser remetudo á Commissão do regimento interno.

O Sr. Vice-Presidente: Os Srs. que são de opinião que o requerimento do Sr. Galvão Palma seja remettido á Commissão do regimento interno para dar sobre elle o teu parecer, tenham a bondade de se levantar. ( Venceu-se que sim.) Os Srs. que são de parecer que em quanto a Commissão não apresentar o seu parecer, se suspenda a pratica de mandar ao Governo requerimentos com recommendação....

O Sr. Galvão Palma: - Sr. Presidente, eu retiro o meu

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ultimo requerimento, e até o não tinha mandadd por escripto para a mesa.

O Sr. Vice-Presidente: - Uma vez que retira esta parte ou este additamento, que tinha feito ao seu requerimento, não a ponho á votação. Teve depois segunda leitura o seguinte

REQUERIMENTO.

Requeiro se peça ao Governo, pela secretaria d'estado dos negocios da guerra, haja de informar com urgência sobre os seguintes quisitos.

1.º A quem se apresentou o tenente-general Palmeirim, depois que abandonou o serviço do usurpador?
2.° A época e logar da apresentação?
3.° .Qual o decreto., promessa, ou contracto que serviu de fundamento ao decreto, em virtude do qual foi passado á classe dos reformados.
4.° Que igualmente se satisfaça aos sobreditos quisitos com relação a quaesquer outros officiaes, que tendo pertencido ao exercito do usurpador tenham durante a actual administração sido encorporados no exercito, ou tenham sido passados aos corpos da veteranos e á classe dos reformados.

Sala das sessões, 15 de Março de 1837. = Antonio Bernardo da Costa Cabral.

O seu auctor obteve a palavra, e disse

O Sr. Costa Cabral: - Sr. Presidente, é este um daquelles objectos em que o Congresso parece ter dado maiores demonstrações de querer ver decidido ; porque uns Srs. Deputados tem dirigido censuras ao Sr. Ministro da guerra por ter reformado o tenente-general Palmeirim , e feito entrar na classe de veteranos a officiaes que serviram no exercito do usurpador, e outras tem julgado que a lei tem a tal respeito sido cumprida; é para acabar de uma vez com estas incertezas que eu fiz esse requerimento, e espero que o Congresso tome isto em consideração.

Não se fez outra, observação; foi posto á votação e approvado o requerimento.

Teve depois segunda leitura este

REQUERIMENTO

Proponho que os Deputados substitutos, que se acham em todos os districtos, sejam encarregados em Commissão de fazer a divisão dos concelhos e parochias com a melhor commodidade dos povos, dando parte às Cortes da divisão que fizerem para se resolver sobre as suas propostas.

Sala das Cortes, 16 de Março de 1837. - Visconde de Bobeda:

O Sr. Vice-Presidente: - Parece-me que este requerimento involve algumas cousas que dependa de medidas legislativas, e então eu não sei se elle póde ter hoje discussão por dever ser objecto de uma proposta de lei. Eu peço licença para o tornar a ler, e tambem a attenção do Congresso; porque me parece que em parte carece de medidas legislativas (leu). Desejava que o Congresso, ou aquelles Srs. que tomarem a palavra sobre este objecto, tenham em vista esta consideração.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: - Parece-me que este negocio deve ir, desde já, mesmo sem discussão, á Commissão de legislação para ella, em tempo competente, dar o seu parecer. Se o Congresso convier nesta idéa, poderiamos evitar agora qualquer discussão sobre essa matéria.

O Sr. Alberto Carlos: - Parece-me que este negocio é mais da Commissão administrativa, que da Commissão de legislação; por isso eu convenho tambem, que não haja discussão sobre requerimento e que Se mande á Commissão de administração para dar o seu parecer.

O Sr. Meneses: - Eu fallo sobre a ordem, não serei extenso. - Esse requerimento tende a fazer revogar a legislação existente sobre administração publica, e tendendo a revogar o que se acha determinado na legislação administrativa, contém por conseguinte matéria legislativa, e não é objecto que se possa tratar por um simples requerimento; parece-me que é preciso uma moção, que passe pelos tramites prescriptos aos assumptos desta natureza.

O Sr. Visconde de Bobeda: - Sr. Presidente, eu propuz esse requerimento ácerca da nova divisão de territorio, para remediar a má divisão que se tem feito, apesar de ser nomeado esses procuradores de districto: tem se feito dividir de tal mineira os Concelhos, que hoje acha se aquelle, a que pertenço, que era um Concelho dos maiores, reduzido a um pequeno Concelho, aonde se acha uma casa de Expostos; a que são obrigados os poucos Cidadãos, a grandes contribuições, para sustentar um grande numero, de Expostos, e outros encargos daquelle Conselho. Formaram tres Concelhos, tornando-se por isso um delles muito pequeno, cujos habitantes carregam agora com os tributos, para todos aquelles Expostos, o que se torna muito pezado por estarem a cargo de muito menos habitantes: era por isso que eu queria se estabelecesse uma Commissão de Deputados substitutos, que são homens, que a Nação nomeou, e por tanto da sua confiança, para fazerem aquella divisão, e ao mesmo tempo para fazerem a divisão das Parochias, que é muito necesssaria; porque, por mais que se faça aqui, na pratica, hão de sempre haver queixas. Estas são as razões porque eu desejava, que se nomeassem
Commissões de Deputados substitutos, para que, cada uma em seu districto, fizessem a divisão que fosse mais commoda aos povos, porque estou certo, que com o que elles fizessem, os povos havião de ficar contentes e satisfeitos. É, este o motivo porque eu fiz esse requerimento.

O Sr. Freire Cardoso: - Sr. Presidente, eu opponho-me a esse requerimento, como indicando a necessidade de uma, medida legislativa para se proceder a uma nova divisão de territorio. Respeito muito as boas intenções do nobre general author do requerimento, puras, illibadas, como asila inimitavel conducta politica, e militar; mas receio muito que as suas boas intenções a respeito da divisão do territorio em vez de tenderem a melhorar o estado moral e material dos povos, vão antes peiora-lo. E preciso, Sr. Presidente, dar às medidas legislativas um caracter de vigor e permanancia, de maneira que não desfaçamos hoje, o que fizemos hontem, e amanhã o que fizermos hoje: alias que hão de pensar os povos que nos elegeram-se em vez de toda a possivel e necessaria preseverança, estivermos todos os dias alterando a legislação, já em grande parte executada; que respeito poderemos merecer como legisladores; e representantes de uma Nação sensata? Seremos havidos por uns poucos de idiotas, que não deveríamos aqui sentar-nos.

Sr. Presidente, se se perder o respeito às leis pelo seu cunho dó instabilidade; se se perder o respeito a este Congresso, a dissolução social é inevitavel. Eu respeito, e confio muito nos Srs. Deputados substitutos; mas se elles forem encarregados de uma nova divisão de território, haverá sempre as mesmas queixas, e os mesmos inconvenientes; por que elles haviam de desacertar em muitos pontos se seriam susceptiveis das mesmas paixões, das mesmas sympathias e antipathias, de que foram talvez affectados os membros das juntas de districto, e de que nós o seremos igualmente, se formos encarregados de similhante genero de trabalhos; sendo certo que esta operação em todos os casos é difficilima, o nada sabe perfeito das mãos do homem: a perfeição virá com o tempo. Eu, Sr. Presidente, imo louvo nem approvo o grande numero de leis que se fizeram no tempo da Dictadura; entretanto não posso deixar de approvar o decreto de 6 de Novembro, que marca a divisão do territorio, posto lhe reconheço gravissimos defeitos; mas todo o caso estava em traçar uma linha através de todas as dificuldades: a linha: tratou-se; agora cumpre emendar as más tortuosidades, que melhor se conhecerão pela prática na execução

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do referido decreso; e este parece-me o unico meio de fixarmos por uma vez a divisão territorial, e evitar um estado provisorio, que é para as nações o peior de todos os estados.

Tem-se feito muita bulha com a sinistra influencia, que o decreto produzio no espirito dos povos; mas em geral não são os povos que mostram descontentamento, é um ou outro Sr. de Chateaut, que entre elles reside, e que os induz a esse estado para os conservar sempre, e a todos os respeitos, debaixo da sua immediata tutella. Ha individuos que pertendem reunir nas suas familias todos os cargos municipaes, e torna-los assim hereditarios em vez de electivos. Estes são pois es que fazem a maior bulha, e não os povos, que facilmente reconhecem a, utilidade da medida, quando alguém lhe mostra os seus verdadeiros interesses.

Eu peço ao, Congresso observe, que sendo a divisão do districto de Vizeu uma das mais defeituosas, não por culpa rios membros da janta, mas do Governo daquella época que nem ao menos lhes deu tempo para poderem conferir seus trabalhos, é entre tanto uma daquellas contra as quaes se tem apresentado um menor numero de reclamações. E porque? Porque sempre que se apresentavam na administração de Vizeu os procuradores dos povos com requerimentos mal fundados, tomava-se o cuidado de os convencer da verdade, e elles desistindo, iam contentes
sobmetter-se às disposições do decreto de 6 de Novembro. - Por tanto voto contra o requerimento, como indicação duma medida legislativa para se proceder a nova divisão de territorio.

O Sr. Cosia Cabral: - Este requerimento involve materia e grande transcendencia, e até alguns Srs. Deputados tem conhecido que o seu objecto carece de uma medida legislativa; portanto o que eu peço, é que se consulte o Congresso sobre se deve ir a uma Commissão, e se esta ha de ser a de legislação ou a de administração publica.

O Sr. Leonel: - Sobre a ordem. - É sem duvida que este objecto involve materia legislativa, por tanto é preciso mandato a uma Commissão, e talvez que por identidade de assumpto, deva essa ser a d'estatistica. É preciso tractar de tranquilizar já uma parte dos povos que se queixam com razão; e por isso seria conveniente, que aquella Com missão apresentasse algum parecer sobre reclamações, que se possam decidir favoravelmente; sem que daqui se conclua, que eu pertendo de maneira alguma censurar o procedimento de seus membros, por terem apresentado algum que não póde ter este deferimento. Acho até que nisto houve razão; porque se ha algumas queixas sobre divisão territorial feitas com razão, ha outras a que não acontece o mesmo. Existem concelhos, Sr. Presidente, que não podem permanecer taes; mas cuja existencia é util a um escrivão da camara (por exemplo): este arranja um requerimento da camara municipal, arranja mais algumas assignaturas e diz que é o povo do conselho de tal, que tem 800 ou 400 fogos, que pretende continuar a subsistir. Ora isto não quer dizer que entre as muitas representações desta natureza não haja alguma que não seja fundada em razão....

Vozes: - Isso é fora da ordem.

O Sr. Leonel: - Eu sou parco em censurar os outros; peço a mesma benevolencia para comigo, quando eu estiver fallando; muitas vezes me parece que se está aqui fadando fora da ordem, e calo-me....

Vozes: - Falle, falle.

O Sr. Leonel: - Acabemos com isto por uma vez, já que os meus visinhos são mais intolerantes do que eu....

O Sr. Silva Sanches: - A palavra sobre a ordem.

O Sr. Leonel: - Prossigo.- A Commissão de estatistica hade ter algumas reclamações (como dizia) fundadas em razão: se decidimos só as que a não tem, isto faz mal. Eu desejava que a Commissão tivesse a bondade de nos apresentar algum parecer sobre qualquer que esteja no primeiro caso. - Ora como eu queria lembrar isto aos Srs. Deputados da Commissão destatistica, e como não estava em discussão esta matéria, não podia falar restrictamente sobre a ordem, e peço ao Congresso me desculpe se sahi della.

O Sr. Freire Cardoso: - Queria simplesmente dizer, que o motivo porque a Commissão estatistica apresentou ao Congresso numa das Sessões passadas pareceres sobre reclamações, que se julgaram em circunstancias de se deverem ser desattendidas, não proveio de propósito, mas de casualidade: a Commissão devia começar por algumas, e começou por aquellas que infelizmente estavam nas circumstancias de ser indeferidas, casualidade talvez n'outra Sessão apparecerá um masso de requerimentos, que estejão no caso deverem ser deferidos.

O Sr. Leonel: - Bem.

O Sr. Visconde de Bobeda: - Eu não pretendo, que agora se transtorne a ordem do que se tem feito em geral, quero que se attenda aos povos, se é que elles tem razão de se queixar; porque o meu desejo é o bem dos mesmos povos, e não gosto de ouvir queixas de que são massacrados; eis aqui porque eu pedia alguma medida a este respeito. Na divisão dos concelhos e mesmo das freguezias, houve muitas cousas de capricho; porque todos querem a cabeça do conselho na sua aldêa: e eis-aqui a razão porque muitos povos ficaram descontentes. Concluo, tornando a dizer, que o meu fim, é o bem dos povos, e não outra cousa (Apoiado). Vá o requerimento á Commissão, e convenho que ella dê o seu parecer sobre elle (Apoiado).

O Sr. Silva Sanches: - Tinha pedido a palavra sobre a materia para responder a alguns principios emittidos na discussão, que por me parecerem pouco exactos, julguei não deviam ficar sem resposta; pediu-se depois, que o Congresso fosse consultado sobre se a materia estava sufficientemente discutida, e vi-me por isso inhibido de dar a minha resposta. Como porem, algum, pedindo a palavra sobre a ordem, fallasse na materia, creio que V. Exca. me permitirá, que, apesar de me ter dado a palavra sobre a ordem, eu me aproveite della para responder aos mencionados principios.

Um delles foi, que ao Governo pertencia fazer a divisão administrativa. E verdade, que em 1835 o corpo legislativo me concedeu esta faculdade; mas com a reunião das Cortes em 1836 cessou esse poder. Logo, tal faculdade existe agora no Congresso, e não no Governo. Segundo principio, que não devemos estar a desfazer o que se acabou de fazer ainda ha pouco. Isto se é verdade, prova uma só cousa e é, que convém sermos mui cautellosos sobre as medidas, que houvermos de tomar, que devemos previamente confrontar assim as desvantagens com a das desvantagens de uma qualquer medida; e que somente depois de nos convencermos, que a somma das primeiras é superior á das segundas, nos devemos resolver pela adopção da medida. Entre tanto, depois determos tomado boje uma medida, se por exemplo amanhã reconhecermos, que ella não é conveniente, não a revogaremos nós, só para não alterar o que hontem fezemos? Se tal acontecesse, seguir-se ia a maior de todas as inconveniencias; a inconveniencia de se ter feito hoje uma lei desvantajosa para o paiz, e reconhecendo-a tal amanhã, não a alterariamos, deixando continuar o mal pelo supposto bem da manutenção das nossas resoluções. Por conseguinte nem um, nem outro principio podem vogar. Não entro agora na questão de saber, se a divisão foi bem ou mal feita; mas voto e concluo apoiando as ideas, de que o requerimento do Sr. visconde de Bobeda vá á Commissão d'estatistica.

O Sr. Ferreira de Castro: - Contém esse requerimento mataria, que demande medida legislativa? Parece-me que bem duvida; porque ataca de alguma maneira o decreto que estabeleceu a divisão administrativa: julgo por tanto que só uma determinação do Congresso póde fazer essa alteração. Fará isto é preciso, que o requerimento vá a uma Commissão

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são, e por conseguinte creio que deve ir ahi, e não ao Governo. Este é o ponto, onde a questão se deve ferir. Portanto, em relação á ordem ou á materia, peço a V. Exca. queira consultar a Assemblea sobre se a materia está sufficientemente discutida, porcjue1 desta discussão entendo, que não póde tirar-se outro resultado que não seja remetter o requerimento ou a uma Commissão, ou ao Governo.

Julgando-se a questão discutida, resolveu-se, que o requerimento do Sr. Visconde de Bobeda passasse á Commissão d'estatistica.

O Sr. Rojão: - Acabo de receber uma representação da Camara municipal do Sarddal, em que expõem, que as freguezias de Souto, e Mouriscos não tem querido obdecer ao decreto de 6 de Novembro proximo passado, nem cumprir as ordens das authoridades do novo Conselho, a que hoje pertencem, espancando os officiaes de justiça, e ameaçando-os com a morte: pede providencias para evitar males tão grandes. Isto parece que pertence ao Governo; porque lhe compete fazer executar as leis. Entre tanto pediria a V. Exa., que esta representação fosse mandada á Commissão d'estatistica, para a tomar em consideração; e uma copia ao Governo, para, conhecedor dos factos de que falla a representação, dar as providencias necessarias a tal respeito.

O Sr. J. Victorino mandou para a mesa a representação de uma Camara municipal.

O Sr. Rojão apresentou um projecto de lei sobre a fiscalisação das alfandegas dos portos sêccos. Ficou para a 2.ª leitura.

O Sr. Pinto Borges mandou para a mesa uma representação da Camara municipal de Valença do Minho, sobre divisão de territorio; e pediu se remnettesse á Commissão d'estatistica.

O Sr. Silva Sanches: - A junta de parochia da freguezia dia Pombeiro representa o prejuízo, que resulta de se haver extinguido o concelho daquella villa; porque da extremidade da freguezia á villa d'Arganil ha a distancia de duas legoas, o que causa grande incommodo aos povos para irem lá tratar de seus negocios forenses. Expõem, que apesar da desmembração do antigo concelho, se pode alli formar outro com a annexação de varias terras, que apontam, e pedem providencias sobre estes inconvenientes. Requeira, que a representação vá á Commissão d'estatistica. (Enviou-a á mesa.)

O Sr. Santos Cruz: - Peço que se declare acta, que se eu estivesse presente na sessão, em que se representou o projecto de Constituição, votaria pela sua rejeição in limine, por que não foi esse o objecto incumbido á Commissão: o que se lhe incumbio - foi um projecto de modificações á Constituição de 1828, e não um novo projecto da Constituição: para remediar isto eu teria pedido, que em logar de se imprimir o projecto apresentado, voltasse á Commissão para o redigir convenientemente:

O Sr. Vice-Presidente: - Não houve outra votação sobre esse projecto, senão sobre se elle devia ser impresso; por tanto não póde tambem haver outra declaração senão que o Sr. Deputado votaria contra à impressão. Se quizer mandar isto por escripto á mesa, lança-se na acta, mas outra declaração não é possivel.

O Sr. Santos Cruz: - Creio que o mandar-se imprimir um projecto, corresponde a admitti-lo á discussão quanto ao de que fallei, desde já declaro que o rejeito, pela fórma por que foi redigido.

O Sr. Leonel: - Julgo que é absolutamente indispensavel dizer duas palavras ao que acaba de se expender; porque não tendo resposta alguma, poderá o effeito ser muito máo. - Sr. Presidente, que queria o Sr. Deputado? Queria que a Commissão dissesse - tal artigo da Constituição deve ser reformado - tal artigo alterada tal artigo rejeitado - tal artigo approvado? Queria que a Commissão mettesse o Congresso no chos, que trás comsigo o principio remissivo? Quanto todo o mundo sabe que nada póde haver, que apresente tantas dificuldades; queria o Sr. Deputado, que a Commissão seguisse este methodo? A Commissão pegou na Constituição de 1822; examinou o que na sua opinião podia ou não precisar modificações, e apresentou um projecto: nelle se acham muitas cousas dessa Constituição, e muitas cousas que não estão em nenhuma Constituição, é que não serão talvez ate peiores. A Commissão entendeu que as que apresentava, eram as modificações necessarias. Ora se este methodo não agrada ao Sr. Deputado! se que por força que se apresente um projecto remissivo, eu que sei alguma cousa de leis, por que é a minha profissão, declaro que desta maneira não sahiremos da questão. Não digo isto por ter sido eu, quem fizesse a redacção do projecto; sabe a Commissão que não fui eu, e que tão pouco approvo alguma parte delle. - não defendo portanto a minha obra. A Commissão entendeu, com todas as pessoas, que sabem o que são leis, é a maneira de as redigir, entendeu digo, que não havia outro methodo a seguir. Se o Sr. Deputado entende porém, que a Commissão procedeu mal, se entende que pela sua obra merece censura, diga-o quando for occasião propria, e então se lhe responderá; agora não póde tractar-se similhante materia. Sr. o Sr. Deputado tem outro projecto, apresente-o para ahi e se o quer apresentar na discussão, reservemo-nos para então, e se o quer já impresso, imprima-se; mas não venha fazer censuras á Commissão, por que ella apresentou o que julgou conveniente, por que o senzello teve por firri único fazer cousa boa. - Quando se tractaram alguns pontos do projecto, cada membro da Commissão deu francamente à sua opinião; por que queriamos achar o bom - mas não brigámos. Finalmente quanto á forma, entendeu toda a Commissão, que não devia seguir o methodo remissivo: isto é tambem reprovado por que tem alguma prática de fazer leis; e adoptando-se tal methodo declaro, que não me encarregava de redigir, e difficilmente de discutir.

O Sr. Vice-Presidente.- Eu não posso dar a palavra a mais ninguem sobre esta questão.

O Sr. Santos Cruz: - Eu só quero dizer, que a Commissão; apresentei uma declaração de voto e para isso estou no meu direito.

O Sr. Silva Sanches: - Peço a palavra, por que me parece não dever deixar passar a gravissima accusação, que se fez á Commissão, repetida já nalgum jornal. Será necessario, para responder ao Sr. Deputado, que eu leia a formula da poderes, que nos foram concedidos; se V. Exa. mo permitte, lêla-hei.

Vozes: - Falle, falle.

O Sr. Vice-Presidente: - A ordem não consente, que haja mais discussão sobre isto; entretanto o Congresso decidirá se quer que o Sr. Deputado falle; mas neste caso, hei de dar a palavra a todos os outros que a pedirem.

Fozes: - Nada.

Outras: - Não é preciso.

O Sr. Silva Sanches: - Se havemos de ter uma longa discussão, cedo.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa - Reserva-me para occasião opportuna; a censura é incommensuravelmente incompetente.

O Sr. Vice-Presidente: - É verdade, mas o Sr. Deputado não tinha a palavra. Tem a agora, como Relator da Commissão de guerra.

O Sr. Barão leu então os seguintes

PARECERES.

A Commissão de guerra foi presente o requerimento de varios individuos, que capitularam em Castello de Vide com o General Rodil, que pedem seja mantida a dita capitulação dizendo que o dito Genaral estava auhtorisado pelo Governo da Rainha.

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A Commissão é de parecer que se pegam esclarecimentos ao Governo, e especialmente pobre a authorisação dada ao General Rodil.

Sala da Commissão de guerra, em 14 de Março de 1837. = João da Silveira de Lacerda. = Antonio Cezar de Vasconcellos. = Barão da Ribeira de Sabrosa. = Barão do Bom-fim. = Conde de Lumiares. = João Pedro Soares Luna.

A Commissão de guerra foi presente o requerimento de 4 Officiaes, e 12 Officiaes inferiores de varios corpos do exercito, em que pedem que a Commissão da liquidação da divida dos militares, e empregados civis do exercito, lhes passe titulos de rações de pão, em número igual aos dias que vencerem de pret.

A Commissão é de parecer que se remetia ao Governo para informar o que se tem praticado sobre objectos desta especie.

Sala da Commissão de guerra, em 14 de Março de 1837.= João da Silveira de Lacerda. = António César de Vasconcellos. = Barão da Ribeira de Sabrosa. = Barão do Bomfim. = Conde de Lumiares. = João Pedro Soares de Luna.

A Commissão de guerra, tendo meditado a proposta que o Governo apresentou á Camara dos Srs. Deputados na, Sessão ordinaria de 1836, pedindo que o Corpo legislativo approvasse o Decreto de 16 de Junho de 1835, que applicou a Carta de lei de 20 de Fevereiro do mesmo anno, às familias dos Officiaes do batalhão de Cabo Verde, assassinados na Tília de S. Thiago pelos soldados do mesmo corpo, rebellados contra o legitimo Governo da Rainha, é de parecer, que o referido Decreto está nas circumstancias de merecer a confirmação deste Congresso. Ante a Commissão está pendente outra proposta do Governo, pedindo providencia singular a favor da familia, do tenente...............que morreu combatendo contra a facção, que se acontava nas serras do Algarve. A este respeito entende a Commissão que, é preciso adoptar uma medida geral, e nesta persuasão toma a liberdade de propor, que a mencionada lei de 20 de Fevereiro de 1835, seja applicavel lambem às famílias dos militares, que, depois da convenção de Evora Monte, tiverem morrido, ou venhão a morrer combatendo pelo throno da Rainha, e da Constituição da monarchia.

Projecto de Lei.

Artigo 1.º O Congresso approva e confirma o Decreto de 16 de Junho de 1835, que applicou a Carta de lei de 30 de Fevereiro do mesmo anuo, às famílias dos Officiaes do batalhão da provincia de Cabo Verde, que foram assassinadas pelos soldados do mesmo corpo, revoltados contra o legitimo Governo da Rainha.

Art. 2.° A Carta de lei, citada no Art. antecedente, será tambem applicavel às famílias de todas os militares, que, depois da convenção de Évora Monte, tiverem morrido , ou vierem a morrer combatendo pelo throno da Rainha, e pela Constituição da monarchia.

Sala do Congresso, 17 de Março de 1837.= João da Silveira de Lacerda. = Barão do Bom Fim. = Antonio Cezar de Vasconccllos. = Conde de Lumiares. = João Pedro Soares de Luna. = liarão da Ribeira de Sabrosa, Relator.

Terminada a leitura, disse

O Sr. Vice-Presidente: - Pelo que toca aos pareceres que comprebendem projectos de lei, eu vou consultar o Congresso, se se hão de mandar imprimir (assim o fez Sua Exa., e se resolveo afirmativamente). Pelo que toca aos outros pareceres, que tendem a pedir esclarecimentos ao Governo; pela secretaria se devem pedir esses esclarecimentos, em consequencia da resolução que o Congresso tomou a este respeito; e pelo que respeita aos outros, ficam sobre a mesa para entrarem em discussão em occasião opportuna.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: - Sr. Presidente, eu mandei para a mesa uma collecção das contas da junta do credito publico; mas como não veio um numero de. exemplares sufficiente para iodos os Srs. Deputados , eu peço á mesa que mande distribuir esses que exibem, e o Governo mandará o resto.

O Sr. Vice-Presidente: - A primeira parte da ordem do dia é o parecer da Commissão de poderes ácerca da excusa pedida pelo Sr. Francisco Solano Constancio, Deputado eleito pela divisão de Barcellos. Contem-se no parecer, já approvado, a respeito dos Srs. Mousinho e Pestana. - V.

O Sr. João Victorino: - Pelo que pude perceber da leitura do parecer da Commissão; parece-me que elle se reduz a que seja dispensado o Sr. Constantino de vir a este Congresso.

O Sr. Vice-Presidente: - Torne-se a ler o parecer (leu-se).

O Sr. João Victorino: - Então não tenho nada a dizer.

Vozes: - Votos, votos.

O Sr. Ferreira de Castro: - Sr. Presidente, não obstante eu ver o Congresso na sua maioria, e grande maioria inclinado a approvar o parecer da Commissão, com tudo, como tenho de votar contra elle, e porque já em outra occasião, quando esse parecer foi mandado para a mesa, eu emitti algumas idéas n'esse sentido, forçoso é motivar o meu voto, mas não serei extenso. Com tudo eu proporei uma questão preliminar, e d'ordem, que segundo ella for resolvida pelo Congresso, talvez me dispense de fallar nesta matéria. E ou pão competente este Congresso, Sr. Presidente, o juiz competente para conhecer da escusa que pede o Sr. Solano Constancio? é ou não aplicavel o artigo 84 da Constituição ao caso em questão? ou, e mais explicitamente, tracta-se n'esse artigo da escusa que pede um
Deputado antes de ser proclamado, e tomar assento, ou da que pede depois de estar proclamado? Parece-me que é esta uma questão prévia que, decidida pela negativa, deve pôr termo á, questão principal, e poupar-nos tempo, de que tanto carecemos: pois que, decidido que o artigo não é applicavel á espécie do Sr. Constancio, o Congresso nada tem de que se occupar, e só ficar enteirado de que o Sr. Constancio pedio a sua escusa, para se proceder ao chamamento ter substituto immediato. Se porém assim não for decidido, então este Congresso é o juiz competente pela Commissão; mas já mais pela minha opinião, para conhecer dessa escusa. V. Exa., Sr. Presidente, na questão si dos Srs. Mousinho, e Pestana, deo bem a entender ao Congresso que esta questão devia ser tractada previamente; tenho por tanto , a esperança de que ella será tomada em consideração, para que V. Exa. tenha de a propor ao Congresso, como prejudicial; até para que se estabeleça uma regra para o futuro, e não aconteça em casos similhantes julgar-se por differentes modos.

O Sr. Leonel: - Sr. Presidente, diz o artigo 84 da Constituição, (leu).

Ora bem, esta questão póde-se estabelecer de differentes maneiras; pôde, por exemplo, propôr-se a decisão do Congresso se é motivo justo e permanente a impossibilidade, que o Sr. Constancio diz, que tem para cá vir; sobre isto póde haver uma resolução: póde-se tambem propor dest'outro modo: - É possivel obrigar a vir às Cortes um homem que não quer? Também isto póde ser objecto duma discussão e resolução; - e mesmo se póde accrescentar a esta segunda questão uma outra circumstancia: supponhamos que nós podíamos obrigar a vir aqui um individuo, que estivesse em Portugal; (não podemos; mas supponhâ-mos que podíamos) e podemos nós obrigar a vir aqui um homem que está em paiz estrangeiro? (Vozes: - Não.) A vista de tudo isto, Sr. Presidente, a Commissão entendeo, que não havia outro remedio senão dar ao Sr. Constancio a escusa, que elle pede de vir tomar assento n'este Congresso.

O Sr. Ferreira de Castro: - Sr. Presidente, o nobre Deputado que me precedeo, está na materia: eu propus uma questão d'ordem ; pedi que V. Exca. tivesse a bonda-

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de de propor ao Congresso se nós podemos ou não tomar conhecimento da recusa do Sr. Coiutanpio: quer dizer, se o art. 84 é applicavel a este caso. Esta é uma questão preliminar; nós não podemos, é verdade, obrigar de maneira nenhuma, nem aquelles que estão, fora do território Portuguez, nem aquelles que estão dentro delle, avir tomar assento neste Congresso; esta é a minha opinião. Mas antes disso é necessário, que se decida aquella questão, que ainda pesso a V. Exca. de a querer bem propor ao Congresso.

O Sr. Vice-Presidente: - Não ha precisão alguma de se tractar desta questão, como questão prévia ; porque me persuado que ella ettá introdusida no parecer da Commissão: por consequência os Srs. Deputados, tem ouvido a questão; apresentada pelo Sr. Deputado que acaba de fallar; pódem-na ter em consideração, mesmo tractando-se da materia principal: tem a palavra o Sr. Rodrigo de Menezes.

O Sr. Rodrigo de Meneses: - Sr. Presidente, temos um artigo, na Constituição que nos constitue juizes, para dar a escusa aos Srs. Deputados que a pedem; mas perguntarei eu agora: será pedir uma escusa dizer, - eu não quero lá ir? E que diz o Sr. Deputado? Não quero. Póde permittir a Sociedade que jamais alguém fallasse assim; não quero! E quando responde, não quero , teremos nós o direito de recalcitrar? De certo temos: o Congresso conhece da validade das eleições, não como Corpo legislativo ; mas como uma espécie de juiz privativo para este caso: é a junta preparatória a quem compete o conhecer se no processo eleitoral se guardou ou não a lei das eleições: é um perfeito Jury: eis aqui o que é nosso: rejeitar ou admittir procurações, segundo se conhece que no processo eleitoral se guardou, ou postergou a lei das eleições, no primeiro caso o eleito é proclamado Deputado; no segundo a eleição se julga nulla. Se o Sr. Constando foi eleito segundo a lei, deve ser proclamado Deputado; se o não foi, não é Deputado. Se o Deputado pedir uma escusa, pesaremos suas rabões para te lhe deferir seu requerimento. Mas o caso é outro; um individuo, que ainda não é Deputado, diz que o não quer ser. Eis aqui o que não é nosso; os nossos poderes, são poderes de delegação; o povo soberano reserva para si o direito da eleição: se por simples arbitrios admittirmos, ou rejeitarmos procurações, vamos invadir um direito, que existe no direito original do povo; o Deputado não quer vir aqui representar o circulo que o elegeo, que vá ter com seus constituintes, e lhe diga; tomem lá a tua procuração, que eu não quero ir deffender seus direitos; mas dizer, Sr. Presidente, ao juiz que não acceita a procuração; eis aqui está o que o juiz não póde admittir. Perguntarei eu, haverá algum juiz que tendo uma procuração junta aos autos, te intrometia com o conhecimento da adberencia do procurador á vontade do constituinte? Que tem elle com essa questão, que não lhe pertence, e que pertence ao procurador, e ao meu constituinte? E este o caso do Sr. Conotando: não lhe faz conta a - procuração, pegue nella, remetta-a a seus constituintes, e diga-lhes, que nomeiem outro procurador: ocaso não é pedir uma escusa; o que só se póde admittir ao Deputado; e para o ser, cumpre que primeiro seja proclamado: o caso é outro: um indivíduo indigitado Deputado, diz que o não quer ser. Eu acho que dizer: eu não quero, é um crime na ordem social. Diz o parecer da Commissão; e é por isso que eu me opponho a elle; que nós não ternos remedio senão acceitar a escusa; porque a acção do Governo não póde ir daqui a Paris, aonde existe o Deputado eleito; e eu digo, que póde chegar a Paris; porque o Deputado eleito não renuncia os direitos de Cidadão portugues; e por consequencia ha de ser punido neste paiz como Cidadão portuguez: nós temos leis que dispõem, que todo aquelle que recusar cargos de eleição, fique privado por quatro annos, dos direitos de Cidadão; o Sr. Conotando não acceitou um cargo de eleição; o Sr. Constancio ficando em Paris não renuncia os direitos de Cidadão portuguez; e nos entregando este negocio ao Governo para applicar as disposições da lei citada ao Cidadão, que se recusa aos ónus, sem renunciar às vantagens da Sociedade, assim temos decidido esta questão sem offender o principio.

O Sr. Ferreira de Castro: - Sr. Presidente , ainda que minha opinião seja, que o Congresso não póde tomar conhecimento da escusa pedida pelo Sr. Solano Constancio, assim como de nenhum Deputado, que a pedir; entre tanto vejo, que a maioria delle, talvez contradictoriamente, se julga juiz competente para conhecer desse negocio; e então forçoso é, tomar a questão no estado em que o Congresso a toma, e como ella se apresenta, tendo de combater o parecer da Commissão. Dous são os fundamentos da escusa do Sr. Constancio; 1.º o não ser nomeado pela Provincia de sua naturalidade, aonde só podia ser conhecido; 2.° o achar-se estabelecido em Paris, e ser-lhe incommodo o deixar aquella Cidade, faltando-lhe os meios de fazer viagem. Em quanto ao primeiro, se o Sr. Constancio tivesse conhecimentos, como diz a Commissão, da legislação posterior, por certo se não valeria desse argumento, que nenhum pêso tem hoje. Mas sendo eleito por uma Província, aonde não era conhecido, mal podia essa eleição ser a expressão dos votos desse povo, que se poderia dizer subornado, e nullo; por consequência a eleição. Sr. Presidente, o povo portuguez está tão atrasado, são tão poucos os seus conhecimentos, que se deixássemos á sua livre escolha as pessoas, que devem representar os grandes interesses, ninguém duvida do resultado triste, e das nullidades, e vergonhas, que apparecerião n'um Congresso. Mesmo sem suborno, o povo portuguez precisa de ser guiado por muitos annos neste importante negocio de eleições; é necessario que os homens patriotas nos seus respectivos paizes, empreguem as suas luzes e conhecimentos em indicar, e ensinuar aos menos illustrados os homens que estão no caso de desempenharem essa nobre missão. E é isto o que se faz em paizes, bem mais veteranos que nós, em matéria de eleições; todos sabemos que é isso o que se faz em Inglaterra e França, e Deos sabe como, e os modos travessos, porque isso é feito nesses paizes e entre os paizes clássicos da liberdade, e aonde o baixo povo tem uma educação igual á da maioria do nosso. Sr. Presidente, se a eleição do Sr. Constancio estivera nulla por esse motivo, isto é, por ter sido eleito em uma Província que o não conhecia, que triste ilação se poderia dahi
tirar....... Em quanto ao segundo fundamento, eu tenho
a honra de conhecer o Sr. Constancio, e de ser seu íntimo amigo, não sei até que ponto elle carece de recursos; mas tendo elle sido nomeado legalmente, porque a lei faculta 9. nomeação de Deputado, residente em paiz estrangeiro, e dando ella um subsidio para viagem ,aos que se achão em paiz mais remoto, ainda que portuguez; porque rasão seria delle privado o Sr. Constancio, quando o serviço da pátria o chama? Não é pois a falta de meios, que póde justificar a escusa do Sr. Constancio; e assim parece-me terem desapparecido os fundamentos, que elle tomou para a offerecer.
Agora permitta-me V. Exca., Sr. Presidente, que eu não deixe passar um principio immittido pelo Sr. Deputado, que me precedeu. Eu não posso admittir de modo algum, que o Cidadão que não quer acceitar o cargo de Deputado, seja por isso condemnado a perder os direitos de Cidadão por quatro annos. Eu entendo na generalidade, que todo o Cidadão, que se recusa a servir um emprego necessario á republica, deve ser castigado; porque não podendo os empregos públicos serem servidos se não pelos seus naturaes, forçoso é que haja uma sancção, e nenhuma outra mais própria que a perda dos direitos de que o Cidadão não quer gozar; mas tambem tenho para mim, que este principio é inapplicavel ao cargo de Deputado. Um Deputado é um mero procurador, e ninguém dirá, que um procurador póde ser coagido a acceitar uma procuração, nem

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haveria Constituinte que lha confiasse contra sua vontade, com o receio de que elle advogaria antes a causa de seu adversário, que a sua é um negocio do consciencia, do qual se não poderia pedir responsabilidade, porque o Deputado nenhuma tem. Disse mais, Sr. Presidente que seria immoral obrigar um Cidadão a tomar assento neste Congresso contra sua vontade: pôr um Deputado na violenta, e penosa posição, ou de tomar assento, e occupar um logar que elle detecta, e em que se não acha de coração e consciência , e que jamais póde desempenhar á vontade de seus constituintes, obrigando-o a ser um traidor á confiança que nelle foi posta, ou obiga-lo a perder os direitos cívicos por quatro annos, a maior regalia do homem constituido em Sociedades é a mais immoral, a mais tyranna das alternativas... Não me é possivel deixar passar este principio do Sr. Deputado, com o qual concordo quasi sempre, e sinto que elle não esteja presente para per meio das suas instancias, me poder illustrar nesta materia. Sendo esta a minha opinião, e desattendendo a escusa que pede o Sr. Constancio, voto contra o parecer da Commissão.

O Sr. João Victorino: - Sr Presidente, permitta-me V. Exca., que eu diga, que nenhum dos membros desta nobre assemblea respeita mais do que eu o logar de Presidente d'ella, este meu respeito só póde ser igualado pela consideração individual, que consagro á pessoa de V. Exca., mas não excedido, entretanto consinta V. Exca., que eu me não queixe d'aquillo, que já por mais vezes me tem acontecido, e que mesmo aqui e na todos os dias tendo logar. Eu tinha cobre a presente questão alguma cousa a dizer: pedi por isso a palavra, e seguia-me a fallar; eis que um outro Sr. Deputado, pedindo a sobre a ordem, aproveitando se desta estratagema me prefere, e eu fico calado: seguem-se outros Srs. com o mesmo protesto, e todos tratão da materia, e por fim de não haver quem mais queira discorrer sobre ella, pedindo faze-lo sobre a ordem, chega-me finalmente a palavra. Ora, Sr. Presidente, eu revolvo o regimento interno das Cortes, revolvo a Constituição, e não acho lá similhante liberdade de interromper a ardem da discussão, tirar a vantagem aquém primeiro pediu fallar, com o pretexto da o fazer sobre a ordem. No regimento ha dois artigos, em que se falla na palavra - Ordem -, mas em nenhum delles no sentido em questão, são os artigos 75, e 76. Diz o 75 - " Em todos casos do artigo antecedente (falla de divagar da questão o Deputado, ou nomear a pessoa do Rei para influir na votação) é do dever do Presidente interromper o Deputado, que falla, e não preenchendo esta
funcção qualquer Deputado da Assemblea tem direito de bradar - Á Ordem - isto é, denunciar o comportamento do Deputado, que se desvia da regra, e de pedir que o Presidente laça respeitar o regimento da Assemblea, "O artigo 76 diz: que algum dos outros membros quiz fallar sobre a violação da ordem, elles devem ser todos ouvidos, e cumpre então decidir-se se aquelle, que foi trazido á ordem, é permittido continuar o seu discurso, ou se se lhe deve denegar a palavra, ou mesmo soffrer uma censura pelo comportamento que teve, e isto antes de se resolver a questão originariamente debatida". Ora digão me se em algum destes logares appareceo um só vestigio de idea, que annuncie similhante liberdade, e astucia, para preferir a quem se quer? Sr. Presidente, diz o regimento desta Camara, dizem-o o das outras, e mais que tudo di-lo a razão, que quem tem
o direito, que digo eu, o dever de regular as discussões, governar a marcha dellas, mette-las na devida ordem, no andamento conveniente, é o Presidente. Logo isto é um abuso, é uma prática erronea, que tem constantemente dado origem a divagações, perda de tempo, e pode dá-la a outras occurrencias igualmente prejudiciaes. Peço pois, e isto e do interesse de todos os Srs. Deputados que não sabem, não costumão não querem usar de tal estrategia, peço a V. Exca. digo queira pôr em observação a lei, e se lhe faz dificuldade arreigar tão absurdo costume, se digne consultar sobre isto a Assembléa.

O Sr. Vice-Presidente: - Todo quanto acaba de dizer o Sr. Deputado dirige-se a mim unicamente, e, posto que com muita política, foi uma censura directa, que eu não poiso deixar de repelir No regimento das Cortes passadas ha um artigo em que sã permute a qualquer Deputado pedir a palavra sobre a ordem , e o Presidente não lha pode negar se o Sr. Deputado entende, que se não deve dar a palavra para este fim, está no seu direito fazer uma proposta para se alterar o artigo 125, que nos casos ommissos faz reger os antigos regimentos, e se ella for approvada póde ter a certeza, que eu não dou mais a palavra sobre a ordem.
O Sr. Ferreira de Castro: - Parece-me, que o nobre Deputado, que muito respeito, se dirigiu a mira, e por isso eu tinha pedido a V. Exca. a palavra para uma explicação; porem V. Exca. quando fallou para responder á censura, que d'algum modo lhe foi dirigida, teve a bondade de responder por num, por tanto não gastarei tempo á Camara, que tanto d'elle precisa para objectos de transcendente necessidade.
Julgando-se a materia suficientemente discutida, foi o parecer da Commissão posto a votos e approvado, ficando por isso declarado vago o logar do Sr. Constando, e devendo chamar-se o respectivo substituto.

O Sr. Vice-Presidente: - Passa-se á segunda parte d'ordem do dia, que é a discussão do projecto n.° 7 na sua generalidade.

Leu-se: é o seguinte

PARECER

A Commissão especial dos vinhos, tendo examinado o projecto de lei sobre a extinção do officio de pareador das pipas rio vinho do Alto Douro, tem a honra de offerecer á consideração deste illustre Congresso as seguintes observações
A necessidade da lei, confiada ao exame da Commissão, era reconhecida, tanto no interesse da fazenda como dos lavradores, mas, depois da extincção do Companhia, essa necessidade tornou-se urgente Este objecto foi tratado nas Cortes de 1834, e na sessão de 1836 foi approvado na Camara electiva um projecto de lei similhante áquelle que hoje se apresenta. A Camara hereditaria alterou um pouco o projecto submettido á sua deliberação, a Camara electiva não póde convir nessa alterado, e por essa unica razão devia o penúltimo artigo do projecto ser discutido novamente numa Commisão mixta. Neste tempo dissolveram-se as Cortes, e o mal continua e cresce com grave prejuízo da lavoura, e da fazenda publica.

Por estes motivos entende a Commissão, que o projecto de lei em questão e necessário, e deve merecer a approvação do Congresso.

Sala das Côrtes, 28 de Fevereiro de 1337. - Macario de Castro. - Roque Francisco Furtado de Mello. - Barão da Ribeira, de Sabrosa, Relator - José Pinto Soares -Bernardino de Sampayo Araujo - Caetano Xavier Pereira Brandão - Fernando Marta do Prado Pereira.

Projecto de lei sobre a extincção do officio de pareador das pipas do vinho do Alto Douro.

Artigo 1.° Fica extincto o officio de pareador das pipas que servem para a conducção da vinhos do Douro
Art. 2.° As authoridades administrativas estabelecidas nos Districtos, Concelhos, e Freguesias, que embarcarem vinhos pelo Douro, compete, na conformidade das leis. o vigiar em que as pipas empregadas na compra dos vinhos, agoas ardentes, e vinagres tenham a medida legal.
Art. 3.° As Camaras municipaes elegerão os homens peritos e probos, que forem necessários aos administradores dos

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Concelhos, e Commissarios de freguezia para os auxiliarem em suas diligencias; e vigiarão em que elles não commettam abusos, vexando os conductores das pipas, e causando estorvos ao Coramercio.

Art. 4.° É legal para a compra da vinhos; agoas ardentes, e vinagres, que embarcarem pelo Douro e toda a pipa que não levar menos de vinte e um almudes, nem mais de vinte e um ai mudes é nove canadas, regulados pelos padrões do almude e canada da cidade do Porto.

Art. 5.° É falsa toda a pipa empregada na compra da vinhos, agoas-ardentes, e vinagres que embarcarem pelo Douro, que não chegar aos vinte e um almudes, ou exceder aos vinte e um almude e nove canadas, declaradas no artigo antecedente.

Art. 6.º Todas as pipas empregadas na compra dos vinhos, agoas-ardentes, e vinagres, que embarcarem pelo Douro, terão as marcas dos tanoeiros que as fabricaram, ou de novo consertaram, e o nome do logar onde foram fabricadas ou de novo consertadas. Todas estas marcas feitas a fogo.

Art. 7.º É falsa toda a pipa que não se achar marcada na conformidade do artigo antecedente.

Art. 8.º Todas as Camaras municipaes dos Concelhos que embarcarem vinhos pelo Douro são obrigadas a terem medidas do cantaro e do almude reguladas pelos padrões do cântaro e do almude da cidade do Porto, para que os lavradores possam por ellas afferir, e conferir as suas medidas.

Art. 9.º Quando se suscitar alguma questão entre o lavrador e o negociante, poderá um e outro requerer ao administrador do Concelho ou ao commissario da freguezia do lavrador, que mande medir, e conferir as pipas em questão, pagando a despeza que nisto se fizer aquelle que sem causa o requerer.

Art. 10.° Quando se verificar dolo na medida das pipas, ou se encontrar alguma pipa falsa, o dono as perderá, e pagará trinta mil réis de condemnação para as despezas do Concelho.

Art. 11.º O imposto de trinta réis em cada pipa de vinho de embarque, e de vinte réis em cada pipa de vinho do ramo, agoa-ardente, ou de vinagre, estabelecido para as despezas da pareação pelo arvará com força de lei de 20 de Dezembro de 1778, fica reduzido a vinte réis. que os lavradores pagarão por cada pipa de vinho, agoar-dente, ou vinagre, que carregarem, e será cobrado pelas Camaras municipaes dos Concelhos respectivos para satisfazerem aos encargos que por esta lei lhes são impostos.

Art. 12.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Palacio das Cortes, em 15 de Fevereiro de 1837. - Barão da Ribeiro de Sabrosa. - Macario de Castro. - João da Silveira Lacerda. - J. Lopes Monteiro. - Manoel de Castro Pereira.

Teve a palavra, e disse

O Sr. João Victorino: - Eu peço a palavra sobre este projecto, mais com desejo de me instruir para dar o meu voto do que por soppor, que elle fosse menos meditado pela illustre Commissão, que o redigiu. Tenho porém a dizer, que eu tinha apenas passado os olhos por elle; mas chegando aqui, fui ver a lei de 20 de Dezembro de 1773 , a que elle em alguns de seus artigos se refere. Depois desta declaração, digo, que elle me suscita duas idéas: ou o objecto sobre que quer legislar não a precisa; ou precisando-a, então confesso com toda a ingenuamente de que sou capaz, me julgo mais previdente e acertada a referida lei de 1773.

Eis-aqui estão as duas proposições, sobre que vou dizer alguma cousa: e assim claramente as ennuncio para que no pouco, que tenho a dizer, possa metter algum methodo. E ou não necessario este projecto? Quero dizer; ha necessidade que as pipas, que andão neste tão importante ramo de commercio, sejam iguaes (porque isto é que dá a entender a palavra parear) a um escalão, e uma medida regulada por uma lei; cuja medida, segundo a dita lei era de 21 almudes e seis canadas, e segundo o presente projecto é de 21 almudes e nove ditas: Eu lendo o projecto inclino-me a crer, que isto é voluntario, e não coacto, como inculcava a mesma lei no seu preâmbulo, mencionando a falsidade e que podia, fazer-se tanto em prejuiso drf commerciari te, como do lavrador. Com effeito isto parecia uma pêa ao commercio; e agora que com a extincção da Companhia elle se acha em plena liberdade, talvez não seja necessario sujeita-lo a tal cativeiro. Além disso, em muitas outras provincias de Portugal se embarcam vinhos, e se vão buscar às adegas dos lavradores, e não ha esta prática; ajustão-se ordinariamente ao almude, em algumas partes dá-se mais um cântaro para escalfos, e tudo fica acabado sem disputas, e sem pareações. Entendamo-nos. Senhores, neste negocio de vinho, assim como em todo outro qualquer, dos dois contractantes o que está de cima, é que dá sempre a lei. Por isso, se o lavrador do Douro estiver sobranceiro, dirá: "Eu não encho essa pipa senão por tanto, e vamos a medi-la, e o que exceder de tantos almudes, ha de ser pago á parte; e se v. m. não quer, deixe o vinho, e outro comprador virá. Este caso será prementemente raro, mas já existiu nos bons tempos de Portugal. Se porém, o que desgraçamente hoje acontece, 6 commerciante está de cima, e o lavrador recebe como um grande favor o tirar-lhe elle os- seus vinhos, então dirá o comprador: " Esta pipa ha de ser chêa por tanto, e se não quer, vou a outra adega. Nestas circumstancias está, como disse, este negocio exactamente no pé dos outros contractos, e nas mesmas bem parece escusada a pareação e eis-aqui o que eu tinha a dizer sobre a primeira parte da minha divisão.

Agora pelo contrario, se se julga necessária a operação dá pareação, mesmo depois da extincção da Companhia; se é indispensável que as pipas tenham uma Capacidade fixa, e inalteravel; digo, que a lei de 20 de Dezembro de 1773, me parece muito mais providente. Alli tem os dois contractantes mais garantias; ha uma serie de responsabilidades, que se prendem, que se encadêão, e fazem um compacto; uma prisão de acções, que não será tão facil transgredir como póde parecer. Ha um pareador mor, com responsabilidade ao Conservador da junta dá administração da Companhia (bem se vê, que extincta esta, a responsabilidade de prender em outra authoridade): são responsaveis os seus commissionados; são responsáveis os tanoeiros mestres das fabricas de pipas, pelas marcas que nellas pozerem, se se acharem depois; falsas; ultimamente são responsaveis até os arraes, que conduzirem á Regoa pipas não pareadas. Ora isto é, que eu chamo fazer uma lei para ser executada. Prende as mãos aos que aquizerem infringir. Eu sei que ultimamente havia alguma dirfereriça nisto, e as pipas não podiam sahir do Porto, sem irem pareadas. Ora digam-me agora, que comparação tem com isto o presente projecto? Elle manda que os tanoeiros marquem as pipas; mas se com a marca ellas apparecerem falsas, os tanoeiros nenhuma responsabilidade, ou castigo tem. Os carreiros, se em vez de conduzirem pipas legaes, as conduzem falsificadas, nenhuma pena soffrem, e os arraes o mesmo. As únicas pessoas, que pelo projecto vem a ter castigadas, são justamente aquellas, que menos o merecem, os donos dellas, os quaes quando ellas apparecerem infiéis, as perdem: entretanto o proprietario comprou, e apresenta uma pipa marcada; elle póde
dizer: "eu comprei, e conduzi na boa fé; quem pôz a marca, é que me enganou; eu não sei nem tinha tempo para fazer esta medição , etc., e mil cousas póde dizer, as quaes são muito difficeis de retorquir. Em fim, é insufficientissimo este projecto para cumprir o fim a que se propõem. Por tanto, ou elle deve ser muito, e muito alterado, ou então não façamos leis novas, tendo-as boas. Sr. Presidente, a mania moderna é esta: ha uma lei antiga, e portugueza

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magnifica mas abusou-se della, ou a perversidade a deitou em desuso, pois bem, dizem os reformistas " já outra:, ahi vai um chefe d'obra, isso tudo é antigo, não presta... Com effeito vem a lei nova, desencaixa com a serie dos factos, sobre que legisla, mostra, a experiencia, a sua incongruência, faça-se outra. Eis aqui o que tem acontecido. Embora gritam os sabios legisladores, que quanto menos, e mais simplices são as leis, tanto melhor, tudo, é em vão. Eis-aqui porque eu desenganado finalmente dos males, das desgraças que soffremos, provirem de leis más, repugnantes os nossos costumes, e vontades, estou quasi a calar no partido conservador Mas isto é fora da questão, nem por agora tenho nada a accrescentar.

O Sr. Freire Cardoso: - Sr. Presidente, não posso conformar-me com a opinião do Sr. João Victorino. Por falta de attenção, com vergonha minha o digo, não dei fé de que este projecto entrava, hoje em discussão, se o soubesse teria offerecido um aditamento. Este projecto deve apresentar um caracter especial, porque especialissimas são as circumstancias que o reclamao estou persuadido de que o projecto não prehenche o fim, que se pertende alcançar. Os contractos de compra e venda dos vinhos do Douro não se podem apreciar pelas regras geraes dos outros contractos é preciso evitar o grande dolo, que a este respeito se pode fazer, o para ovital-o não basta deixar ao lavrador a faculdade de poder medir o seu vinho, é necessario collocal-o na rigorosa obrigação da não deixar de o fazer porque levando as pipas mais que a medida legal, prejudica-se extraordinariamente a fazenda publica, e por outro lado, quero dizer,
obrigando-os a medir, livrão-se os lavradores do grande embarco em que se acham, pela absoluta dependencia em que estão dos negociantes. Porque se deixarem de ser obrigado por lei não ha hoje lavrador no Douro, que depois do negociante apresentar 30, 40, 50 cascos a porta da, sua adega, ainda que reconheci, que elles levam mais um, dous, ou tres almudes, se atreva a medir um só casco, Todo o lavrador tracta de estar na maior armonia com os seus negociantes, com quem se acha afreguesado, pelas dificuldades que só encontram na venda e exportarão dos vinhos.

Por tanto reconheço a necessidade de uma medida legislativa; porque dous almudes que vão de mais em mil pipas, prejudica a lavoura, e a fazenda perde os direitos de mil almudes. Na discussão especial terei a honra de apresentar alguns artigos de aditamento ao projecto, que ora se discute na sua generalidade.

O Sr. Vice-Presidente: - A discussão por ora é em geral, quando ella for artigo por artigo, então poderá o Sr. Daputado fazer quantos aditaremos julgar convenientes.

O Sr. Pereira Borges: - Sr. Presidente, os systemas de fiscalização até aqui adoptados não tem dado o resultado, que se esperava, e mais tem servido para embaraçar o commercio dos, vinhos do Douro, sem nada lhe aproveitar o systema de parea creado no tempo da companhia, chamada do Alto Douro, nada fez para que do continuo não apareçam á porta do lavrador pipas maioies do que devem ser, e para que não sejam roubados por alguns d'quelles commerciantes, que lhe compram os seus vinhos, pelo que, Sr. Presidente, parece me que o officio de pareador das pipas que servem para a conduçãop dos vinhos, não satisfaz aos fis para que foi creado, por tanto voto pela sua extincção, e approvo o projecto na sua generalidade, 1.° porque estabelece uma medida legal das pipas, a qual da um principio de direito para aquelle que se sentir agravado com uma medida, que não seja aquella que foi consignado, 2.° evita as questões que esta differença podia occasionar, porque estando os interessados certos do seu direito não questionarão uma medida, que é abonada pelas authoridades administrativas; 3.° tira os delongos que podia haver nas carregações dos vinhos, por isso que retirada questão do prejuiso ou a suspeita do maior medida os lavradores se dispensão de a conferir pelo padrão respectivo, 4.° porque se evitam os descaminhos dos direitos que se cobram por volume, ou pipa, pois dada uma quantidade certa, o calculo é facil de fazer, e o excesso que senão contava entra na medida regular, e fica sujeita aos competentes direitos, pelo que, Sr. Presidente, voto pelo projecto na sua generalidade.

O Sr. Lacerda: - Sr. Presidente, disse se que este projecto não era preciso, ou sendo preciso devia seguir-se a lei antiga, que é preciso facilmente, se verá, que a lei antiga era péssimo, é fácil de demonstrar, porque só enriquecia um homem dando-lhe uns poucos de mil cruzados, e não satisfazia, ao seu fim. Este projecto tende a diminuir esse tributo, que pesava sobre o lavrador, e dá-lo às Camaras que tanto delle precisam para satisfazer a seus deveres, e obrigações, que é precisa, digo eu, e muito preciso por isso mesmo que sendo carregadas todos os annos muitas mil pipas de vinho, levando ellas um ou dous almudes de mais, importa, isso talvez oitenta ou mais contos de reis era prejuiso dos lavradores. Dirão, o lavrador fica com direito de poder medir, nenhum se atrevera a fazer tal, receando que lazendo-o não terá mais um comprador aos annos futuros, e ficará assim privado de vender a sua fazenda, e tão preciso quanto e grande o prejuiso que resulta aos lavradores do paiz do Alto Douro, como acima expuz, Sr. Presidente, aquelle pau merece toda a consideração, não póde produzir outro genero, e se os lavradores não forem postos a coberto das fraudes que soffrem , a lavoura só perderá, e disto resultara um grande mal a Portugal; porque se o resto delle pagasse proporcionalmente, bastava que fosse a decima parte das contribuições, que para o genero que produz, alem de todas as mais que pagam os generos produzidos pelos outros paizes, não só não teriamos déficit, mas em muitos poucos annos se teria pago a divida nacional.

O Sr. Lopes Monteiro: - Sr. Presidente, os illustres Deputados meus patricios tem tratado de combater a opinião do Sr. J Victorino, eu vou fazer outro tanto, seguindo os argumentos do illustre Deputado, que argumenta contra o projecto.

Sua Senhoria, fará favor de dizer se são, ou não estes seus argumento 1.° que não era necessaria a pareação das pipis do vinho do Douro 2.° que quando fosse, podia pôr se em execução o decreto de 1773! Fallando nesta segunda parte do seu discurso, tratou de mostrar que esse decreto era mais providente do que o actual, porque se entendia a responsabilidade da, falsificação das pipas ao tanoeiro, e ao arráes. Ambos estes argumentos não colhem quanto a nim. Não colhe o primeiro, porque a abundancia do genero, e a difficuldade de venda, põe o lavrador em circumstancias de não ser minucioso com o negociante e comprador, e de não regatear a respeito da medida. Mas diz o Sr. Deputado meçam os lavradores por almude, e não precisarão de parêa de modo nenhum Sr. Presidente, eu já disse, e torno a repetir o vinho no Douro offerece um mercado tão abundante, que a sua medida, é pipa, e não almude, é preciso um padrão pare esta medida maior, e não o tinhamos apesar do decreto de 1770.

É verdade que este decreto, tanto pertendeu a exactidão nas pipas, que responsabelisou pela fidelidade da sua medida o arráes que as conduzia, e até o tanoeiro que as fabricava; motivo porque o illustre Preopinante acha esse decreto preferivel ao actual projecto. Mas permita Sua Senhoria que eu lhe diga que tal rigor nunca produzio effeito, nem eu o queria por tal preço, porque era uma injustiça.
O artista faz, o que lhe encomendam; e o arráes dirige barcos, e não fiscalisa medidas. Que culpa tem o espingardeiro no uso que faz o assassino da arma que elle fabricou? Como se há levar a pena além do delinquente? Quem usa da medida falsa, é que se torna culpado; é por isso que eu acho este projecto mais coherente, e justo.

Entretanto eu não estou pesuadido, que o projecto vai remediar de todo o abuso na medida das pipas; mas é me

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lhor que a legislação que havia anteriormente, e por isso preferível. Devo dizer: que eu combino com o illustre Deputado em censurar a mania d'innovar tudo.

Sem considerar o que estava legislado, e que às vezes é melhor: mas não acho isto applicavel ao caso presente, â por isso voto pelo projecto na sua generalidade, e espero quando elle se approve, que se os lavradores não forem muito melhorados, se delle senão seguir quasi mais liada, que uma contribuição para as nossas municipalidades, em logar de ir enriquecer um particular, chamado pareador, assim mesmo lucramos muito.

O Sr, Mont'Alverne: - Eu tenho de approvar este projecto, porque conheço que é necessário; mas com tudo tendo de o approvar em geral, hei de rejeitar algum de seus artigos, approvo o projecto em geral; porque dizendo os membros da Commissão que são alli proprietarios, que elle é necessario, não devia
rejeita-lo; porque são elles, e não eu que tem d'alli conhecimentos, que eu não tenho: no entanto julgo que a fazenda publica perde muito com o novo sistema de pareagem, e com o sistema até agora praticado, e com responsabilidade do pareador poderiamos conseguir melhores vantagens. Também estou persuadido de que as Camaras não poderão fiscalisar, nem os administradores, por isso mesmo que não quererão tomar sobre si responsabilidade; porque nunca se quer tomar responsabilidade quando não ha utilidade, e interesse particular: no entanto conheço que ha necessidade de existir a parêa, conheço igualmente que podem conbinar-se os, negociantes do má fé com os lavradores, e que não havendo fiscalização nas pipas, e sendo maiores de vinte e um almudes, a fazenda pública perde muito, e por tanto julgo que o projecto não satisfaz nesta parte, e que a parêa tal qual está, satisfaria melhor da maneira indicada; isto é, coro a responsabilidade do empregado na parêa, ou que será necessario em logar de um pareador, crear um verificador, assim como ha Lisboa; porque não só ha na alfandega um verificador, mas um aspirante; porque assim se fiscalisariam melhor os direitos; de outra maneira não vejo que tenha remedio, antes pelo contrario hão de defrandar-se os direitos da fazenda; porque as authoridades administrativas hoje, não o são daqui a um anno, e então não querem malquistar-se com pessoa alguma, e especialmente com aquelias com que tem de viver; de mais se os lavradores medirem as pipas ou as denunciarem, os negociantes fugirão da sua porta no anno seguinte, e não só da sua porta, mas do seu distrito; e neste caso quando se pertende dar auxilio aos lavradores, se lhe irá fazer um grande mal. Com tudo julgo até impolitico oppôr-me ao projecto, porque sendo os seis defensores grandes proprietários, e em quem eu supponho grandes desejos de beneficiar o Douro, apesar da minha convicção de que os lavradores pequenos hão de soffrer, e em nada melhorar com o presente projecto; com tudo coroo elle peide ser alterado, e remediado logo que se conheça o seu mal, por isto voto por elle, e até para que não continue o actual abuso, de que eu poderia ser
increpado, pondo obstaculos, quando eu tenho grandes dssejos de teneficiar esta parte da minha provincia; approvo pois o projecto na sua generalidade; e farei na especialidade aquellas emendas que julgar convenientes.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabroza: - Sr. Presidente, o projecto de lei em questão, é de mui grande importancia para as províncias do Norte: foi combinado, e desenvolvido já em duas sessões da ultima legislatura; foi ultimamente discutido em 1836, na Camara dos Srs. Deputados; e na dos dignos Pares, e em ambas ellas foi approvado. Teve por consequencia o paiz tres annos para poder requerer contra elle , se a medida não fosse da mais urgente necessidade. Os interessados tiveram toda a noticia da sua existencia; porque só pediu aos negociantes, lavradores, e mesmo às Camaras municipaes do Alto Douro, que dissessem a sua opinião a respeito deste projecto: nada se disse contra elle, e isto prova a justiça dos lavradores, que reclamam altamente contra a existencia dum emprego, á sombra do qual são defraudados.

Agora em quanto às observações, que se tem apresentado contra elle, se o Congresso mo permitte, direi que sou do Douro, nasci alli, e alli sou proprietária, e estas condições dão-me direito a pedir licença para dizer, que os Srs. Deputados, que tem fallado contra o projecto, não tem idéa alguma exacta do commercio, e carregação dos vinhos do Alto Douro. Sr. Presidente, na Beira Alta, e no Alemtejo, póde medir-se uma pipa de vinho, porque Taro é o dia em que se vendem dez; mas no meu districto, aonde o negociante apresenta de repente, e não póde deixar d'apresentar, á porta do lavrador cincoenta, ou cera cascos, que é forçoso encher no mesmo dia, na mesma manha, seria impossivel medir todas as pipas sem treplicar as despezas da carregação. Como se quer, Sr. Presidente comparar o modo como se ajustam, e vendem os vinhos, aos quartilho; almuder, ou alqueires, em outros pontos do reino, com e commercio em grande que se faz no Alto Douro. E impossivel, Sr. Presidente, tirar d'alli argumentos de comparação.

A parêa foi creada em 73; e debaixo da inspecção da companhia, e da a (cada, ou juízo excepcional da sua conservatoria, conservou ale ceito ponto a legalidade das medidas; mas apenas aquella conservatoria foi extincta, o Douro foi invadido por uma multidão de pipas falsificadas, que tiram d'alli, por fraude, mais de três a quatro mil cascos de vinho cada um anno. Ainda mais, depois que se aboliu o exclusivo da companhia, a maior parte das pipas nem procuram acareação; cada tanoeiro é arbitro da sua mediria especial, e nau ha no Douro quem tenha direito, como authoridade, a fiscalisar essa prevaricação. A parêa, tal, qual existe hoje é a bandeira que salva, e cobre aquella prevaricação. Um P é facil de gravar na tampa d'uma pipa. Porque, Srs., o que é um pareador? (Não me refiro á pessoa, que hoje exerce nominalmente esse officio, cidadão benemérito, que pelejou sempre a pró da liberdade, e que deverá receber do Governo outro officio.) Um pareador, Srs., é um homem que vive no Porto, donde saem, por cáes differentes, cem mil pipas, que vão buscar vinho a vários districtos; e será possível que um homem assista á pareação de todas ellas. Não. E que acontece, como eu tenho visto com estes meus olhos? Quando um negociante de boa fé quer mandar um barco de pipas vasias para se encherem no Alto Douro, o manda dizer a uma barraca, que tem pipas no cáes para parear; então vai desta barraca um rapaz de tamancos, e sem chapéo, accende uma fogueira, aquece um ferro, e grava um P na tampa de cada pipa. A pipa póde ser legal , mas se o não for? Eis-aqui o que se chama parca. Eis-aqui a garantia de medida legal, que s'offerece a seis mil lavradores do Alto Douro! Se a pipa deve levar vinte e um almudes e meio, ou vinte e um almudes e nove canadas maximo, os tanoeiros especiaes de cada armazem mandam fazer pipas de modo, que levem vinte e três almudes, ou- vinte e dous e meio: esta pipa é apresentada ao rapaz, que lhe põe o milagroso P , e a pipa lá vai pelo Douro acima, e volta trazendo , á custa do lavrador, e em beneficio do tanoeiro, um ou dous almudes mais do que devia trazer. E isto toleravel? Accrescentarei a isto que, geralmente fallando, este excesso de medida é em beneficio do tanoeiro do armazém, e não do negociante é uma molliadura que o negociante probo não toma, mas não embaraça que o seu tanoeiro a leve. Ora as pipas assim marcadas pelo rapaz do pareador, ou obreptiçiamente, chegam todas num dia á porta dos armazéns, pela maior parte, longe das povoações. O barco está esperando, e às vezes é preciso abrir a dous toneis de vinte, ou vinte e cinco pipas para encher os cascos com a brevidade necessaria; não ha tempo para medir, e se as pipas são illegaes a fraude é inevitável.

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Por minha parte devo declarar, que tenho vendido nestes ultimos annos ao Sr. Kopke e companhia, tenho tido a colagem de mandar medir uma, outra pipa, e nunca se encontraram irregulares. Digo coragem, porque a maior parte dos lavradores não podem, nem se atrevem a mandar fazer essa medição Sr Presidente, o que se propõe neste projecto de lei Obviar um mal, cuja existencia ninguém nega. Mas diz-se - Exista essa parea creada em 74, e não se separa que falta a companhia, e o conservador, que vigiavam em certos ramos os interesses simultâneos da fazenda, e da lavoura. A responsabilidade dos tanoeiros não está na lei, não pelos motivos que disse um Sr. Deputado, mas porque é impossivel ovenfica la essa responsabilidade seria por mil modos illudida. Ouvi tambem dizer crie-se um verificador não se, Sr. Presidente, para que isto servisse, nem sei tambem conhecer o interesse que d'alli se tirava, porque pela mesma razão que ao pareador não é possivel verificar todas as pipas, tambem esse verificador não suppriria. Mas nada veda que os fiscaes d'alfandegas examinem a medida, que despacham por entrada sempre o deveram fazer. Sr. Presidente, um negociante que se respeita, não vai dizer face a face a um lavrador = eu mando aqui pipas, que levam mais do que a medida legal, para defraudar os direitos, deve ir, e entender nos hemos. Nunca existiu conluio similhante Sr. Presidente, o abuso tem logar sem descer a este vexame e o seu objecto não é a defraudação dum direito, em tal caso, insignificante, mas as sobras da medida no armazém. E singular, Sr. Presidente, que este terno e vivo interesse pela fazenda pública, nunca lembrasse, senão depois que reclama a abolição do officio de pareador, pelos interesses dos lavradores nunca vi corações partidos. Disse o Sr. Deputado, a quem eu recomendo, que este projecto de lei não ia remediar o mal logo Sua As. concorda comigo na existencia deste mal, mas eu não concordo em que, o abolir o officio inutil de pareador, seja igual á extenção da parea, pelo contrario, o projecto de lei multiplica. Os pareadores nos concelhos, e freguezias, e então nenhum comprador honrado consentirá, que debaixo do seu nome, ou a sombra da sua cifra, gravada na pipa, appareça um casco falsificado. Também ouvi dizer, que, passando a lei nesta occasião, ia embaraçar a remessa das pipas, do Porto para o Douro, e talvez suscitar duvidas sobre aquellns que alli podessem estar Responderei, que desgraçadamente poucas são as pipas que tem ido, e essas, pela maior parte, para azeite do Tua, e do Sabor, azeite que todos medem, e outras para gerupiga, que os mesmos negociantes mandam preparar. Mas ou essas pipas são legaes, ou não, se são legaes não ha embaraço, se o não tão, soffram a pena da lei, e não sejam os lavradores defraudados por mais um anno, a favor do defraudador. Dissesse mais, que se devia fazer pesar a responsabilidade sobre os arraes mas o arraes nunca poderia responder senão pela marca, e o Congresso só já sabe quanto vale essa marca, esse milagroso P, com que um rapaz carimba as pipas V. Exca. Sr. Presidente, e todos os Srs. Deputados pelo Porto, sabem muito bem o que é, que vida leva, e pelo que póde responder um arraes.

Terminarei affirmando, que não tenho ouvido argumentos, que possam oppor-se ao projecto na sua generalidade sustento por tanto o parecer da Commissão.

O Sr. Lopes Monteiro: - O Sr barão da ribeira de Sabrosa, que tantos conhecimentos tem sobre este objecto, quasi que esgotou a materia, porém fallarei sobre o que disse o Sr. Mont'Alverne, quando pertendeu achar este projecto prejudicial a fazenda publica, ao mesmo tempo que o decreto de 1773 lhe era mais vantajoso.

Sr. Presidente, o officio de pareador não utilisava nada á fazenda publica, pois que os 50 réis que por pipa se pagava, eram destinados para as despezas da pareação, isto e para os pareadores, e grandes fortunas se fizeram sem vantagem nenhuma para os lavradores que pagavam, e que não vião dar páreas por esse methodo, nem outro resultado, que uma marca no tempo d'uma pipa.

Pelo contrario, no projecto actual apparece utilidade para as municipalidades, que mais depressa eu chamarei fazenda publica. Insisti nesta asserção do Sr. Deputado para que ninguém se assente pela fazenda publica, ella aqui, Sr. Presidente, não figura nada, senão em perder direitos, que sendo as pipas reguladas, lhe irião pelo maior numero que hão de sommar, e é isto exactamente o que se quer no projecto combinando a utilidade do lavrador com a fazenda publica

O Sr. Mont'Alverne: - Sr. Presidente, eu pedi a palavra só para declarar que quando fallei, não me quiz referir aos negociantes probos, porque todos nós sabemos, que elles não são capazes de commetter taes indignidades. Eu sei, Sr. Presidente, como se faz no Douro este negocio, e como se rouba nelle, por que o vi, e observei dizendo isto não quero offender os negociantes probros torno a dizer, porque elles não são capazes de fazer taes cousas, mas a homens que as fazem , porque andam sempre naquelle negocio por trafica nella, é destes de quem eu fallo. Torno a repetir, que os meus collegas, que defendem este projecto, tem casas no Douro, e que estão ao facto deste negocio, sabem melhor e que convém do que eu, e por isso não tenho duvida em annuir ao que elles pertendem, mas oxalá que elles senão venham a arrepender, e que os pequenos lavradores não tenham muito que sentir, porem como o remédio não é impossivel, e quando se conheça, o mal se poderá evitar, por isso digo me não opponho ao projecto em geral.

O Sr. Barão de Bom fim: - Sr. Presidente eu ouvi sustentar a opinião da Com missão de uma maneira tal, que decididamente não será preciso o meu limitado appoio para elle poder ter produzido á convicção consequentemente e só o meu objecto, levantando-me, dizer que tendo estado em paizes d'um grande commercio de vinhos, como é a Madeira, alli não ha dl posição alguma sobre este objecto, e então a única garantia, que lá ha, é a boa fé do commercio; e então a experiência da Madeira, que as vezes embarca 25 a 50 mil pipas de vinho num anno, póde convencer o Congresso, que nada ha a arriscar em abolir um officio, que põe e torvos em objecto de tanta importancia.

O Sr. João Victorino: - Eu, Sr. Presidente, estive sempre na idéa de que era necessaria a pareação das pipas no commercio do vinho do Douro, porém quando li o projecto, então e que entrei em duvida da minha opinião. É cousa bem notavel, que a primeira parte do discurso, que ha pouco proferi, a saber, que me parecia ser inutil esta operação, e que foi refutada por alguns dos, membros da Commissão, o pensamento dessa primeira parte foi concebido neste mesmo projecto. Foi nelle que eu perdi a persuasão, em que estava, de deverem as pipas, para maior sinceridade do contracto, ter uma medida e capacidade legal. E com effeito como podia eu persuadir-me, que os illustres auctores delle fizessem tão indispensável a necessidade da parea, e fallassem tão pouco, tão indirectamente dessa necessidade? Se esta parea e indispensável, como é possivel, dizia eu, como e cruel que não haja neste projecto um artigo, que diffina este mesmo? Sem duvida alguma este devia vir logo na frente, este era o primeiro objecto a apresentar, até mesmo era preciso para salvar o melindre, que os lavradores do Douro não tem remédio senão conservarem os seus compradores. Estes estranhariam, porque desgraçadamente não temem concorrencia nas compras, levariam, digo a mal, e talvez fizessem arrepender o proprietario do vinho, quando este lhe dissesse, podendo deixar de lho dizer, por ser livre, ou não ser, a pareação seu quero que as pipas, em que vós tendes de levar o meu vinho, passem primeiro por esta prova de serem legitimas, e ficar eu seguro de que se me não tira mais do que aquelle, que deve dar-vos legiti-

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mamente." Era, torno a dizer, necessario pôr em frente do projecto este artigo decisivo = Nenhuma pipa já mais entrara neste trafego sem ser medida, ou pareada. = Mas pergunto, aonde se acha no projecto esta proposição tão necessária? Pelo contrario, combinem-se 09 artigos todos delle, e diga-se-me se com effeito elle apresenta as garantias indispensáveis para segurar a existência desta operação preparatoria nas pipas. Torno a dizer, peço, e pedirei sempre que se leia a lei de 20 de Dezembro de 1773, e então ficar-se-ha persuadido se é verdade, o que eu aqui estou asseverando. Ninguém, ninguém me convencerá, que seja precisa uma lei nova, quando existe uma antiga legislando sobre a mesma série de factos; se esta satisfaz a todas as necessidades que a exigiam; e tem ao mesmo tempo na sua intrinseca construcção todas as seguranças de sua futura execução, e effectividade; ninguém me convencerá que uma lei, porque se não cumpre, ou porque se abusa della, é má. Isso não posso admittir. Na lei de 1773 dão-se todas estas qualidades; alli é responsavel o arraes, e muito justa responsabilidade, que, conduzir pipas não marcadas, com dous mezes de prisão, 10$000 réis de condenação, e confisco do barco; é responsavel o fabricante, que prevaricar, pela primeira vez em fazer reforma da pipa á sua custa ; é pela segunda com uma condemnação. Em fim está tudo providenciado. São responsáveis todos pelo dolo nas pipas; menos os que tem interesse nesse dolo; e muito bem; porque nada tendo a ganhar com elle, mas muito a perder, devem melhor que ninguém vigiar que elle não tenha logar. Mas dizem os nobres andores do projecto; agora abusa-se disso: como se faz a pareação? Vai um rapaz de tamancos, que sahe de uma taberna muito vil, quando passa a pipa lá em uma rua do Porto, e com um ferro em braza põe no tampo um = P. = Ora aconselho aos Srs., que vão lera lei, e vejam se lá ha algum artigo que mande, que um rapaz de tamancos vá pôr a marca nas mesmas pipas. Ah! falem desapaixonadamente, e digão-me, quem me assegura mais fortemente sobre a exactidão desta operação? Por ventura um arranjo, um systema de officiaes peritos a quem se paga, versados nesta medida, que devem ser castigados se errarem, ou prevaricarem; em fim homens cujo officio é aquelle, e por elle tem a sua subsistência com o risco de a perderem; ou uns insignificantes homens, nomeados pelas Camaras todos os annos, sem pericia, sem pratica, sem medo, e sem responsabilidade? Digão-me torno a dizer, de que parte está mais segura garantia; da parte do projecto, ou da Lei? Desta que toma tantas, e tão seguras medidas para evitar qualquer falsidade, ou malversação; ou daquelle que dá às Camaras esta nomeação, e apenas faz uma esteril recommendação às Authoridades administrativas para vigiarem sobre a operação? Em fim, Sr. Presidente, eu tambem sou de um paiz, aonde se produz vinho; e no tempo da fortuna do reino, talvez no continente de Portugal abaixo do Douro, fosse aquelle, donde maior numero se embarcava para a Rússia, para o Brazil, e muitos outros portos; e sei que é possivel, e muito possivel encher com canecos, ou outros vasos de capacidade determinada - (uma voz que elles não sejam portos immediatamente debaixo das torneiras dos toneis) as pipas, e medi-las ao mesmo tempo. Porém ao menos não se me diga, que fiz grande injuria aos lavradores do Douro, propondo-lhe uma prática seguida em moitas parles, aonde tambem ha vinho. Mas deixando esta insignificante particularidade, concluo que, para poder levar a diante este projecto , é preciso fazer-lhe grandes alterações, sem as quaes o negocio fica muito peor do que está, e os lavradores no mesmo cativeiro, de que por tal modo se não podem libertar. Vê-se pois, que todas as objecções, que sã fizeram contra as minhas, não são tão fortes que não caiam ao primeiro encontro e que o projecto em discussão é muito menos seguro, muito menos proveitoso para a agricultura, do que a lei de 20 de Dezembro de 1773.

O Sr. Zuzarte: - Peço, que se ponha á votação, se a materia está suficientemente discutida.

Consultado o Congresso resolveu affirmativamente; approvando tambem o projecto na sua generalidade.

Passou-te depois á discussão geral do seguinte

RELATÓRIO.

A Commissão de administração publica tendo examina do as representações das Camaras municipaes de Ponta Delgada, Lagoa, Agoa de Pau, Villa Franca do Campo, e Villa da Ribeira Grande da Ilha de S. Miguel, bem como as que as municipalidades de Angra, da Villa da Praia, da Villa de S. Sebastião, e as que as juntas de parochia dos Altares, das Fontainhas, da matriz da Villa de S. Sebastião, de Porto Judeu, dos Biscoitos, de Santa Beatriz das Quatro Ribeiras, d'Agualva, da freguezia da Villa Nova das Lageas, todas da ilha Terceira, dirigiram a Sua Magestade sobre o recrutamento ordenado por decreto de 25 de Novembro ultimo: achou que todas ellassão conformes em pedir a isenção do referido recrutamento, accrescendo que a da muito nobre e sempre cidade de Angra pede mais, para ilha Terceira, a isenção do recrutamento pôr espaço de dez annos.

A Commissão reconhecendo verdadeiros os fundamentos, em que se estribam estas representações; por ser claro a todas as luzes, que os povos Açorianos deram um contingente de soffrimentos, de dinheiro, e de sangue para a grande obra da regeneração da Liberdade Portugueza, e restauração do Throno ligitimo, além do superior às suas forças inquestionavelmente em disproporção com o resto da Monarchia; e attendendo a que o presente recrutamento iria augmentar a emigração daquelles povos para o continente da America, e concorrer para a despopulação de tres bellas Provincias Portuguezas: parece á Commissão, que as povos Açorianos merecem a isenção do recrutamento, não como ama medida excepcionaria, mas como um acto de justa compensação.

Attendendo mais a que o recrutamento de 1831 para a formação do exercito Libertador, bem como a maior parte dos sacrificios e soffrimentos, que nesses calamitosos tempos quasi exclusivamente pesaram sobre aquella parte dos Portuguezes, foram extensivos a todas as ilhas dos Açores t parece á Commissão, que a referida isenção deve tambem abranger todo aquelle archipelago.

Attendendo que a ilha Terceira, além dos sacrificios communs às outras IIhas, soffreo exclusivamente muitos outros, e mui penosos: parece á Commissão de rigorosa justiça, que ella seja isenta de recrutamento por espaço de quatro annos, além da isenção do actual.

Parece mais á Commissão, que estas isenções de modo algum devem prejudiciar o cumprimento da promessa de baixa, feita pelo Augusto Regente de saudosa memória aos Açorianos, recrutados para o exercito Libertador; não só por ser de justiça e decoro o cumpri-la, mas porque se deve attender ao muito tempo, que já tem servido nas frieiras do Exercito.

Por todas estas razões a Commissão tem a honra de propôr o seguinte

PROJECTO DE LEI.

Artigo 1.º As ilhas dos Açores ficam isentas do recrutamento, ordenado pelo decreto de vinte e cinco de Novembro de mil oitocentos e trinta e seis.

Art. 2.° A ilha Terceira fica mais isenta de recrutamento por espaço de quatro anãos, a contar da data da presente lei.

Art. 3.º Ficam revogadas todas as leis em contrario.

Sala da Commissão, em 23 de Fevereiro de 1837. - Manoel de Castro Pereira; José Ignacio Pereira Derra-

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nado; Antonio Joaquim Barjona, José Caetano de Campos; Manoel Antonio de Vasconcellos.

Teve a palavra, e disse.

O Sr. J. Alexandre de Campos: - Sr. Presidente, os nossos maiores males, uma das nossas maiores calamidades, é que hoje todos applaudem os princípios geraes; todos elogiam a execução da lei em geral mas quando se trata de a applicar a rm caso particular, ninguém a quer é esta uma das maiores difficuldades, que encontram os Governos actuaes, que depois de fazerem as leis o egoismo apresenta á execução das leis uma barreira tão forte, que é quasi irresistivel. Ora na execução, um pelo direito de representação, se põe obstáculos a execução das leis, e se em vez de vencermos esses obstáculos com firmeza, for o corpo legislativo o primeiro a condescender em dispensar as leis, é impossível qualquer sentença de administração.

Eu desejara muito, que nem o continente, nem as ilhas dos Açores tivessem de contribuir com um tributo de sangue, e que fosse possivel não somente aliviar os Açores, mas o continente declaro que folgo mais de ver que o cidadão maneje o arado antes que a espingarda eu era tambem d'opiniam que tivesse logar esse desarmamento geral tão desejado pela Europa civilisada; mas não é atida chegada a occasião; por consequencia é preciso partir do principio de que não podemos dispensar o exercito, e se admittirmos mais uma excepção do que as que estão feitas, que são muito brandas, e a cuja confeição presidio o espirito de moderação, e de filantropia, estou persuadido que se se estabelecerem outras, não pode haver recrutamento. Alem deste motivo geral não me convencem tambem os apresentados pela Commissão. Diz a Commissão, que o archipelago dos Açores contribuiu com um contingente muito maior; mas é preciso estender a vista mais ao largo; mesmo restringindo-me a este ponto não estou convencido. Foram grandes os serviços, que prestaram os Açorianos; mas em quanto elles soffriam o peso, que lhes podia imprimir um Governo popular, o pau do continente soffria o jugo de D. Miguel: no mesmo dia aos habitantes do continente se pedia não um só tributo, mas um tributo desde a manhã até á noite: de manhã, um tributo de dinheiro, ao meio dia de géneros, e a meia noute prendia-se o dono da casa; isto não pesou sobre os Açores, mas sim sobre os do continente, e eu estou persuadido que por muito grande que fosse o peso dos actos de um Governo regular, era sempre mais leve que o do governo de D. Miguel, que pesou sobre o continente: por tanto neste ponto é preciso reconhecer que por muito grande, que fosse o peso sobre os Açores, era maior o que pesou sobre o continente, que estava em contacto com o tiranno; e não foi só nesta época, é preciso lançar a vista mais longe. Ainda da face do território continental não desappareceram as pegadas do exercito Francez, que pisou o nosso territorio na sua retirada de Lisboa para Coimbra; ainda não foram reparadas as ruinas, que elle produzio meio seculo de prosperidade não póde apagar as pisadas do exercito invasor. Sobre que parte da monarchia pesou com mais força o peso da guerra peninsular? Foi sobre os povos do continente, e ainda não houve excepção a respeito delles; portanto se compararmos os sacrifícios, que os povos do continente tem feito com os das ilhas, havemos achar os do continente muito maiores: teve de sustentar o peso dos exercitos de um, e outro partido continuamente, portanto a primeira razão produzida pela Commissão não me convence, nem é exacto quanto aos ultimos tempos, e muito menos se lançarmos as vistas mais ao longe. A segunda razão e attendendo a que o presente recrutamento inaaugmentar a emigração daquelles povos " declaro que não posso comprehender a força desta razão; pois se a emigração dos Açores prova ou um excesso de população, ou que a população existente não póde achar alli emprego, então conclue-se que se deve fazer o recrutamento, e longe de nós considerar o serviço do exercito como um serviço de gravame, ou que deve assustar. Eu creio que hoje não se recruta debaixo dos auspícios de um governo despótico, que condemne o soldado arbitrariamente: estão no exercicio de seus direitos politicos não estamos na época, em que o cidadão soldado principiava por ser manietado, preso, e depois conduzido para ás fileiras, nem na época, em que elle era chibatado, e tratado como escravo. E preciso não inspirar aversão ao sistema do exercito, e não sermos nós que o façamos, porque se os Açores tem minta população para fornecerem a emigração, porque não hão de tê-la para o serviço do exercito, que é o serviço do estado, que deve ser honrado? Por tanto seria lançar um odioso sobre o serviço militar o querer exclui-los em remuneração dos serviços passados. Não posso comprehender como o recrutamento nos Açores obrigue a expatriarem-se os seus habitantes, não tendo o serviço do exercito hoje nada de degradante, eu considero, que todos os cidadãos amam mais a sua pátria, e que hão de preferir o residir nella a
expatriarem-se.
Sr. Presidente, a lei do recrutamento tem tão numerosas excepções, que me parece que não só não póde prehencher o numero de recrutas que na mesma lei estão marcadas, mas digo, que as excepções são taes, que apenas vai abranger aquelles mancebo? que não poderem ter de maneira nenhuma outra profissão, e então não é exacto a razão que se allega, de que a lei do recrutamento irá despovoar os
Açores; e visto que esta razão não tem peso sufficiente para authorisar uma lei de despensa, é de necessidade e de grande transcendência da parte do corpo legislativo não inspirar motivos de ciúmes entre os diversos povos que compõem a Nação portuguesa, e neste caso parece-me que não póde ter logar o projecto, que se offerece á discussão.

O Sr. Leonel: - Uma das nossas primeiras calamidades, e que sempre nos tem perseguido, é não ter havido uma só crise política que não seja acompanhada de um recrutamento; e eu , se fosse possivel passarmos sem recrutamento, seria essa a minha opinião, e seria o melhor: entre tanto é de absoluta necessidade fazerem-se recrutamentos e visto que é necessario effectuar-se um recrutamento, não deve para elle conceder-se nenhuma excepção: mas tambem contra esta generalidade ha argumentos, e a mim quando se me apresentar os argumentos a que eu não posso resistir, não vou por diante, nem digo que os principios que reclamam uma igualdade devam prevalecer às causas moraes que ia oppôert a essa justissima igualdade Agora, Sr. Presidente, além de outras excepções, propõem se mais uma para os Açores, excepção que eu direi que é justa, e até para alguém póde ser esta excepção de uma natureza muitissimo odiosa, e eu mesmo senão conhecesse os Açores não votaria por nenhuma excepção a favor dessas Ilhas, mas eu conheço a necessidade absoluta da excepção, e pôr consequencia voto por ella, e voto por ella porque não tenho outro remedio.

Disse-se, que concedendo-se esta excepção aos Açores se ia augmentar com desigualdade este tributo de sangue nas povoações do continente; mas eu sei que nos Açores não se faz o recrutamento, e sabendo eu esta circumstancia, antes quero por uma lei conceder-lhe esta excepção, do que fazer com que fuja a gente toda da Açores. - Disse-se, que allegar esta razão não é prudente,- pois eu não hei de allegar a razão que mais mflue no meu espirito para votar a favor da excepção? Sr. Presidente, a imigração dos Açores não procede de lhe não concedermos excepções do recrutamento, mas o certo é que existo lá o espirito de emigração, e todo o rapaz que poder ser soldado, e lhe constar que ha de ser recrutado, hoje, e vai augmentar povoações estranhas, deminuindo a povoação de uma província nossa: isto tem de mais a mais outro inconveniente, e vem a ser, que quando nós tratar-mos com interesse nacional dos nossos arranjos

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domésticos, nós havemos de tirar dos Açores para Portugal muita povoação, e se -agora não evitar-mos a emigração da gente que ainda lá existe, não encontraremos esse recurso quando o quizermos aproveitar; mas se nós tratarmos desde já de remediar este inconveniente, estou certo de que os Açores hão de dar muita população a Portugal; em consequencia desta razão se approvo a excepção do recrutamento nas ilhas dos Açores, e tambem para isso influem muito em mim alguns dos outros argumentos muitissimo consideraveis em relação á tua população, que se acham no parecer da Commissão.

Disse-se também, que assim como no tempo do Duque de Bragança se fizera alli um recrutamento tão consideravel, e que poucos foram os comprehendidos nelle, que não comparecessem , é de crer que agora tambem senão vão embora, visto ser um recrutamento, tão suave. Mas eu digo que então não se foram embora, porque? Porque as circumstancias são outras: quando o Duque de Bragança mandou alli proceder áquelle recrutamento, foi repentinamente, não tiveram tempo porá fugir, e este recrimento, se lá se chegar a fazer, vai já annunciado com tanta antecedência, e de tão longe, que os rapazes hão de abalar todos antes de se pôr em execução. - Dissesse mais; que os Portugueses do continente soffreram muitono tempo de D. Miguel e que os Açores não soffreram tanto; mas eu digo que os Açores tambem soffreram bastante, porque no governo de D. Miguel tambem lá se fizeram grandes sacrificios tambem lá houveram perseguições e tambem de lá se tirou gente porque os que estavão na Ilha Terceira, em Agosto de 1829, trataram de se defender, e a mim lembrar-me muito bem que D. Miguel para ir atacar a Villa da Praia, levou muitos barcos lá ficaram quasi todos, e lá ficaram tambem muitos dos barqueiros. - Eu apontei este facto para dizer, que com maior razão approvo o artigo primeiro do projecto: mas desejo que se conheça que é por uma vez que admito esta excepção pelo que respeita á Ilha Terceira. Eu bem sei, que o projecto está claro para quem o entende; porque quem o entende sabe muito bem, o que quer dizer este artigo; mas seria bem que na sua redação se pozesse mais claro.

O Sr. Vice-Presidente: - Essa observação seria boa para quando se tractar da especialidade do projecto, mas agora só se discute na sua generalidade.

O Sr. Leonel: - Eu peço perdão, porque cuidava que já se discutia na especialidade; não adverti que ainda se está discutindo na discussão geral.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: - Sr. Presidente, a todo o cargo publico é inherente o desempenho de deveres agradaveis, e deveres penozos; mas quem o occupa deve exercer com igual dedicação uns e outros, em que lhe pese. Hoje que está em discussão um projecto de isenção de recrutamento nas ilhas dos Açores, é forçoso que eu desempenhe esses deveres penosos, combatendo o projecto.
Eu não desconheço, Sr. Presidente, que o meu terreno é máo, e que todos áquelles Srs. que combatem os meus princípios estão na região das phrases, e no campo das mota foras: bem quizera eu tambem estar nelle, mas nem por isso deixarei de resignar-me às condicções da minha posição.

Sr. Presidente, voto contra o projecto, e não posso votar por elle para não ir de encontro aos principios que sustentei, quando se discutiu a lei sobre este mesmo recrutamento. Eu oppuz-me então, com todo o calor de que sou capaz, a todas as isenções, que não eram communs em todos os paizes exceptuando somente filhos de viuva, de pai cego, voluntarios na guerra contra o usurpador etc. Votei contra todas as mais, e até contra os bachareis formados, comprehendidos nas disposições da lei.

Os Açôres, Sr. Presidente, fizeram grandessimos serviços á Causa da Liberdade; nisto concórdo eu completamente, e sempre concordei nos sacrificios que os Açorianos fizeram em 1828, 29, 30 , e 31; mas em Portugal nos annos de 1832, 33, e 34, não se soffreram males menores, nem se fizeram menores sacrificios. Eu conheço, Sr. Presidente, que á ilha Terceira se deve muito, e que a todos os Açores se deve bastante; mas tambem conheço que ao Povo de Portugal, e principalmente ao do Porto, de Lisboa, do Algarve, e Marvão, se deve igualmente uma divida, um valor incalculavel em fortunas, padecimentos, e vidas. E se compararmos a riqueza, população e perdas com o archipelago, a balança não hade pesar contra Portugal. Um illustre Deputado disse que os Açores tinham uma população de 150:000 almas: Balbi, fonte a que se referio, calcula 220:000, e neste caso deverião os Açores fornecer 550 recrutas. Que é isto, Sr. Presidente, ainda que se cumprisse á risca, n'um grupo de ilhas tão populosas, como os Açores? E seria justo que para isentar um archipelago assim povoado, fizessemos cair em dobro o tributo do recrutamento sobre qualquer provincia de Portugal?

Não posso, Sr. Presidente, dar o meu consentimento a, uma medida, que para evitar o desconsolo duma familia nos Açores, póde causar a consternação d'uma mãi disvalida na minha provincia, no meu districto ou a minha propria aldêa. Affirma-se que nos Açores se recrutam muito quando em Portugal nenhum sacrificio se fazia pela causa da liberdade. A plitica póde calcular assim, mas o coração não. Quem reinava em Portugal nesses tempos de ditosos? D. Miguel, que exigia, dos esmagados habitantes deste reino, comedisse mui bem um illustre Deputado por Coimbra, muito maiores, e mais violentos sacrificios de que se exigiam nos Açores. Esses sacrificios serão, menos penosos essas vidas perdidas menos lamentadas por suas familias, quando um usurpador obriga, do que quando um governo legitimo o necessita? Dom Miguel levava d'envolta a viria, A honra, e a fasenda d'uns, e o resto gemeu nos calabouços. Não seria isto perda, e sacrificios? Não estão ahi centenares de familias perdidas, e decimadas?

Sr. Presidente, porque motivo foi necessario combater dous ou tres annos para derribar D. Miguel? Porque elle tinha um exercito; e esse exercito de quem era composto? de Portuguezes. Esses Portuguezes aonde estão hoje? Uns epultados nas trincheiras do Porto, e os ossos de outros ainda agora alvejão nos valles d'Almoster, e da Asseiceira. E porque elles morreram, muitos violentados, ao serviço de Dom Miguel, deixaram suas famílias de perde-los? Ficaram menos orfãas suas mãis, choraram menos a morte de seus filhos, porque o fado os arrojou is fileiras de Dom Miguel, e não ás bravas legiões do Duque de Bragança? Decerto que não; o que essas mais sabem, é, porque a dor calcula pouco, que seus filhos entraram nas fileiras, que morreram, e que ellas ficaram sem o amparo, que a vida delles lhes promettia.

Eis aqui, Sr. Presidente, a razão porque eu combato essa isenção para uma parte do território portuguez. Não posso approvar, que em circumstancias iguaes, peze mais em uma parte da Monarchia do que em outra, um tributo de sangue. E quanto eu combato a isenção pedida para os Açores, combato-as todas; porque eu já disse que me havia oppôr às isenções do recrutamento todas as vezes, que aqui se apresentarem. Disse um Sr. Deputado, e meu nobre amigo, cujas ideas, e sentimentos eu muito respeito, que os Açoriannos não devem ser soldados; porque em se lhes foliando em recrutamento, fogem todos os mancebos. E verdade, não gostaram nunca de ser soldados; mas porque nos Açores se não gosta de ser soldado, hei de eu isenta-los? e quem é que quer pagar o deficit? Os meus visinhos, meus constituintes jamais consentirei. Uma isenção adoptada por taes
Motivos seria injusta e impolitica pois seria o mesmo que dizer aos mancebos das provincias, que fugissem tambem, visto que a fuga traria comsigo a isenção.

Se a isenção em materia de recrutamento, podesse ad-

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mittir-se, ou justificar-se, deveria ter logar na provincia de Traz dos Montes, aonde não á braços para a cultura. E necessario que a Galiza nos mande todos os annos tres mil trabalhadores, d'outra sorte seria impossivel cavar as vinhas. E quanto dinheiro não levam esses gallegos no seu fluxo, e refluxo de Portugal para Galliza, e para Portugal? Não trazem um maravedi e levam muitos pesos duros. E então, Sr. Presidente, havemos isentar ilhas aonde a população é numerosa para dobrar o recrutamento em provincias desertas como parte do Alem-tejo, e Traz dos Montes minha convicção, e meu dever não me permitem deixar de votar contra o projecto.

O Sr. Cesar de Vasconcellos: - Sr. Presidente: levanto-me para sustentar com todas as minhas forças o parecer da Commissão dadministração publica, em que apresenta um projecto de lei para serem dispensados do recrutamento os habitantes das Ilhas dos Açores; e faço-o, Sr. Presidente, por querer seguir os principios de justiça, e igualdade ennunciados pelos meus amigos e nobres Deputados por Coimbra, e Villa-Real.

Eu, Sr. Presidente, desejo como os Srs. Deputados, que combatem o parecer, que este tributo de sangue seja repartido por todos os cidadãos portuguezes, mas, Sr. Presidente, o caso de que se trata é outro, e o votar a favor do parecer hão é dizer que as ilhas dos Açores sejam aliviadas deste tributo; mas sim levar-lhe em conta essa contribuição que já pagaram adiantada é debaixo d'este ponto de vista que se deve encarar a questão; e sendo assim estou convencido, de que os illustres oradores ractificarão a sua opinião. Quando tratar-mos de discutir uma lei geral de recrutamento, eu serei o primeiro a votar contra todas as excepções, por isso que classe nenhuma de cidadãos Portugueses deve deixar de contribuir para tributo de sangue, assim como contribue para os outros e então terá lugar appplicação das boas razões, com que os illustres Deputados tem querido combater o projecto em discussão. Ora, Sr. Presidente, digo eu, que essa parte do territorio portuguez já pagou esse tributo adiantado, e com muito excesso, porque na realidade foi extraordinário o recrutamento, que se fez nas ilhas dos Açores, e excede muito em proporção no que se pede agora a Portugal.

Sr. Presidente talvez muitos dos Srs. Deputados deste Congresso não saibam que nos recrutamentos das Ilhas dos Açores principalmente nos ultimos que alli fizeram, se recrutaram homens casados dos quaes ainda hoje estão alguns no serviço do exercito. Para recrutar-mos estes homens foi preciso engana-los, allistando-os em 2 companhias que denominamos de sapadores, e que passados tempos foram encorporados no batalhão d'artilharia n.º l, e que neste corpo alli serviram, e o acompanharam a Portugal, aonde fizeram toda a campanha. Ora este proceder foi bárbaro, e pouco leal, é verdade; mas tal era o apuro de nossas circumstancias, e tal a escassez de braços nas circumstancias da lei, que foi forçoso lançar mão deste expediente, e com effeito conseguimos com isto organisar um exercito, que defendeu a Terceira, restituio á obdiencia da Rainha legitima as demais Ilhas, e com os recursos que destas se tiraram mais tarde veio libertar Portugal. Por tanto Sr. Presidente, todos os sacrificios que se fizeram em Portugal para sustentar a guerra, e debellar a usurpação, não se pode comparar com os sacrificios que se fizeram nas ilhas dos Açôres: nós estavamos, alli abandonados de todos, e conseguintemente entregues aos nossos próprios recursos, e aos recursos d'aquelles desgraçados insulanos, a a quem nada se pagou, quando tudo nos forneceram nesse tempo, em que estivemos abandonados de todos, tórho a repeti-lo, n'um rochedo no meio do mar, porque até o immortal D. Pedro nos abandonou talvez forçado a seguir a policiea do ministerio do Brasil Homens, cavalgaduras, trigos, milho, cevada, dinheiro, carne, etc. tudo se lhes tirava para sustentação do exercito, e nada se pagava, de maneira que a não serem as Ilhas não estariamos nós aqui, em Portugal livre do exercito do usurpador. Tanto como isto não se fez em Portugal, nem no Governo de D. Miguel, e então tenho razão, quando digo que os sacrifícios dos Açores foram superiores aos de Portugal. Não pareça porém que eu pertendo censurar os Governos, que alli houve, bem pelo contrario eu só tenho que louva-los, porque conseguiram os fins conservando sempre na obdiencia da Rainha um ponto do territorio portuguez para servir de reunião a todos os emigrados. Ora, Sr. Presidente, se esses habitantes dos Açores estão ainda nos corpos, ao mesmo tempo, que muitos que assentaram praça depois em Portugal, já se acham em suas casas; se os emprestimos do Porto é Lisboa estão pagos, quando os dos Açores se devem, não lhe tendo ao menos dado a mais pequena satisfação, haverá razão para se dizer, que os habitantes das ilhas não são considerados Portuguezes! (Apoiado.)

E preciso que V. Exca. e o Congresso saibam, que depois do recrutamento que perfez os 7:500 homens, que vieram desembarcar no Mindello, ainda alli houve outro recrutamento, cujas praças aqui chegaram depois do ataque das linhas da Capital o regimento 18 de infanteria, que desembarcou em Lisboa em Setembro de 1833, era composto todo de Açorianos pelo recrutamento, que para elle e fez, dando perto de 300 ou 400 homens, e esse mesmo regimento ainda hoje se conserva com a maior parte dos soldados das ilhas dos Açores o mesmo acontece ao batalhão 4.° de caçadores, e artilheria n.º 1 etc. Agora digo eu, que se este Congresso não fizer justiça a estes povos, levando-lhes em conta aquillo que elles já tinham pago adiantado, que de certo não decide com conhecimento de causa. Alguns Sr. Deputados faltaram na emigração, que costuma haver nos Açores, julgando por isso que este recrutamento lhe não seria pesado, porque parece sobrarem alli braços pelo facto dessa emigração. E preciso que os Srs., que não estiveram ainda nos Açores, se presuadam que a causa da emigração d'aquelles habitantes, não é o excelso da população, procede de muitas outras causa. A emigração nos Açores é uma mania, entregam-se a ella, não só os que nada possuem, mas até às tezes quem é senhor de uma tal na qual fortuna e porque? Porque depois de alguns annos tem apparecido um ou outro homem vindo do Brasil com muito dinheiro, e então julgam, que todos quantos lá forem voltarão ricos esta é uma das muitas causas, as outras já aqui muito ha as ponderou na sessão de 36 o meu nobre amigo o Sr. Costa Cabral Por tanto não é a falta de meios, nem o excesso de população, que obriga os Açorianos a emigrar. Quanto ao receio do Sr. Leonel, confesso, que não é esse o motivo por que voto pela isenção, mas pelos principios de igualdade e justiça apresentados pelos Srs. Deputados, que fatiaram contra o projecto. Voto por tanto pelo parecer da Commissão.

O Sr. Leite Pereira -St. Presidente, a justiça do projecto de Lei em discussão, é tão manifesta que não é preciso incalca-la com muitas palavras, porque ella por si mesma falla, por si se recommenda Não é pelo principio de gratidão, que, aliás devemos tributar eternamente aos habitantes dos Açores, por terem cooperado poderosamente para se levar avante a grande obra da regenaração da patria, nem tão pouco pela inconveniencia de se roubarem mais braços a agricultura daquellas ilhas, que assaz se resentem já da falta delles por diversas causas, sendo uma das principaes a emmigração que alli tem havido para a Trindade, e para as provincias do Brazil, é sim por um principio mais santo, pelo qual devemos modelar as nossas decisões, que aquelles povos devem ficar isentos do recrutamento de que tracta o parecer da Commissão. Este principio é de uma justa igualdade.

Sr. Presidente, em 1831 decretou-se nos Açores, e foi ahi levadoa effeito tal recrutamento de quatro mil homens cem os quaes se compoz, na sua principal parte, o

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exercito libertador que desembarcou nas praças do Mindello, capitaneado pelo Duque de Bragança, e que ajudou a derribar o tyranno, restituindo o Throno á Rainha. E não tendo os habitantes do continente concorrido naquella época com um contingente proporcionado á sua incomparavel mente maior população, seria uma iniquidade, seria, peccar contra e principio de igualdade, sanccionado na lei fundamental. Obrigar os açorianos a contribuir pela segunda vez, com um tributo de sangue, antes que os habitantes do Reino satisfizessem por inteiro o que lhes compete. (Apoiado.) As ilhas dos Açores tem uma população mais diminuta comparativamente com o Reino, e por isso para haverem de ser ai recrutados quatro mil homens, como foram, deveria o Reino, por se guardar a devida proporção, dar sessenta a setenta mil; porém aonde está esse exercito tão numeroso?... Se elle existisse, não teria apparecido o Decreto de 25 de Novembro de 1856, que ordenou o recrutamento de oito mil e setecentos homens; e em termos taes é de rigorosa justiça, que os Açorianos em geral sejam delle aliviados, não como uma medida excepcionaria; mas sim como uma compensação devida do tributo de sangue, que pagaram com adiantamento, e que lhe deve ser agora tomado em conta, lato pelo que pertence em geral aos habitantes dos Açores. - Agora fallando especialmente dos da Terceira, entendo que elles devem ser isentos não só do actual recrutamento; roas dos que possam seguir-se, por espaço dos quatro annos futuros. Não é pela consideração de haver a Ilha Terceira padecido mais do que qualquer outra a prol do Throno Constitucional, nem por que ella fosse o ultimo asilo da fidelidade Portugueza perseguida, o baluarte inexpugnavel da liberdade, e finalmente a principal taboa de nossa salvação, o que eu lhe concedo uma isenção mais ampla; é sim pelo principio já proclamado da justa igualdade. - A ilha Terceira, além do recrutamento feito em 1831, tinha já em 1880 dado outro; com esses soldados se engrossou a divisão expedicionaria que foi reduzir á nossa obdediencia as outras ilhas, e nella esses soldados bisonhos rivalisaram em valor com os veteranos. Poderia trazer, em abono da minha asserção, muitos militares que se sentam neste Congreso, e até o proprio ministro da guerra, que foram testemunhas presenciaes de que a ilha Terceira, além do recrutamento de 1831, já havia fornecido outro. E então, tendo ella concorrido mais do que as outras ilhas, é de justiça que tambem gose um alivio proporcionado a esse augmento de braços, com que contributo. E por estes principios de justiça, e não pelos de gratidão, que eu defendo o Projecto; aquelles só poderiam produzir uma obrigação imperfeita, em quanto estes produzem uma obrigação perfeita. Os Açores soffrem muito por causa da emigração de seus habitantes para differentes panes, mas esta emigração iria ser augmentada só com a lembrança de que dentre elles se havia de tirar o numero de recrutas, de que se tracta. Entretanto nau é esta consideração que me move a votar pela isenção, mas, como tenho dito, o principio de igualdade.

Voto pois pelo parecer da Commissão, em toda a sua plenitude; não por querer lisongear os meus Constituintes, mas porque no tribunal de minha consciencia entendo, que elles tem justiça; se a não tivessem eu mesmo teria o primeiro a levantar a minha fraca voz para impugnar a exclusão proposta; porque me não reputo só representante do Circulo que me elegeu, mas sim da Nação inteira: então se entrassem em colisão os interesses geraes com os particulares desse Circulo, sem hesitar sacrificaria estes aquelles. Peço em declaração porque, mais de uma vez, tendo ouvido dizer que se vota às vezes mais por lisongear opiniões do que seguindo os dictames da própria Consciencia (Apoiado).

O Sr. Barjona: - A materia tem sido muito bem tratada, especialmente pelo meu illustre amigo o Sr. César de Vasconcellos; e por isso direi só duas palavras para declarar a minha opinião contra um principio emittido pelo Sr. José
Alexandre de Campos. Diz o illustre Deputado, quanta ilhas dos Açores não devem ser isentas do recrutamento, a que temos e proceder agora; porque se ellas deram muitos soldados para a expedição do Duque de Bragança, muitos soldados portuguezes militavam então debaixo das bandeiras do usurpador; e é esta uma das principaes bases que o Sr. Campos adoptou para fundamentar o seu voto. Sr. Presidente, eu quero apresentar este assumpto em toda a sua luz; desejo patentear qual é o meu pensamento sobre elle. Se os soldados miguelistas combateram a favor do usurpador por serem a isso obrigados, todos devemos lamentar a situação em que elles se achavam; se combatiam voluntariamente, é nosso dever o perdoar-lhes, e dirigi-los para o verdadeiro caminho. Mas pôr em o mesmo parai leio os homens que nos fizeram a guerra, com aquelles que nos, defenderam , isto, Sr. Presidente, é cousa nova; esta idéa é subversiva de todos os princípios admittidos até hoje. (Apoiado, apoiado.) Estou espantado de tal ouvir neste Congresso principalmente ao Sr. José Alexandre de Campos.

O Sr. Ministro da Justiça: - Sr. Presidente, eu não tinha tenção de fallar n'esta materia, e faço-o por satisfazer á interpellação que fez ao Governo o meu nobre amigo o Sr. José Alexandre de Campos; não tendo consultado cornos meus collegas sobre este negocio, não deve a minha resposta ter mais importância que a da minha particular opinião.

A minha opinião resulta da profunda convicção, em que estou, de que semelhantes isenções são perigosas, e o que se tem dito em contrario em nada a tem podido alterar: em quanto o interesse geral não for sacrificado ao interesse particular, nunca eu hesitarei em me declarar por tudo que for favoravel aos honrados habitantes dos Açores; mas se no caso de que se tracta o interesse particular póde comprometter o interesse geral, é do meu dever, e do dever da todos nós, pronunciar-nos pelo interesse geral, ainda que para o manter tenhamos necessidade de ser severos. Postos estes principios, eu não posso apoiar o parecer da Com missão. Seria uma injustiça manifesta se eu deixasse de reconhecer o muito que merecem os habitantes dos Açores; todos nós ternos, mui viva lembrança dos seus padecimentos, dos sacrifícios de toda a ordem, e serviços com que nos ajudaram na grande obra da nossa regeneração; mas estes sacrificios, estes serviços foram prestados exclusivamente pelos Açores? Não! ... Ha muitas terras no reino, e particularmente a cidade eterna, e idade de Lisboa, aonde se desenvolveram iguaes sentimentos de amor, e adhesão às instituições liberaes, aonde se praticaram, senão superiores, pelo menos iguaes serviços; e felizmente para nós o egoismo, e a corrupção não tinha feito tantos progressos no nosso paiz, que o sacrifício de todo o interesse, de toda a conveniência pessoal aos grandes interesses da pátria não fosse ainda, cousa muito, commum. Sr. Presidente, da adopção do parecer da Commissão podem,
seguir-se uma de duas consequencias igualmente funestas, ou ficarmos sem exercito, ou estabelecermos um parallelo odioso entre as ilhas dos Açores, e aquellas terras do continente de Portugal que se julgam com os mesmos direitas: eu me explico - se adoptada esta medida, que eu presisto em lhe chamar excepcional, vier a cidade eterna, e outras, que supporUram as calamidades da guerra, pedir que se lhes faça extensiva, o que ha de fazer o Congresso? Ou ha de decedir afirmativamente, o que importa na minha opinião a impossibilidade effectuar o recrutamento, ou ha de decidir negativamente, e aqui temos uma distincção feita aos Açorianos, isto é, julgados mais valiosos os seus serviços; e com quanto sejam muitos e bons os serviços feitos pelos Açorianos á causa da liberdade, não é justo, nem elles mesmos o consentem, que façamos sobresair o seu mérito á custa da gloria doutros muitos Portuguezes, que tem merecido da pátria tanto como elles fundado nestas razões que eu não posso approvar o pá-

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recer em discussão, e no caso que se adopte, então offerecerei uma emenda, ou uma excepção a esta mesma excepção, a esta mesma estabelecer a favor dos Açores; isto é, quando os Açores fiquem isentos da recrutamento para o exercito de terra, não o fiquem do recrutamento para o batalhão da marinha: é a minha opinião.

O Sr. Manoel Antonio de Vasconcellos: - O parecer da Commissão tem sido impugnado, e tem sido defendido; por uma e outra parte, se tem allegado bastantes razões; mas parece-me, que as que se tem allegado a favor do parecer, são mais conformei á justiça do que as outras o são: os Srs. Depurados, que impugnam o parecer da Com missão, consideram-no como uma excepção ao recrutamento, quando não é senão uma compensação do desproporcionado recrutamento, que os Açores soffreram em 1831; como eu já tive a honra de fazer notar n'este Congresso no primeiro dia, que fallai n'esta materia. Um dos illustres Deputados que oraram contra o parecer da Commissão, fez uma resenha dos soffrimentos, que Portugal teve anteriores mesma, á desgraçada época da luta contra a usurpações; e parece que desses soffrimentos, ou do quadro d'elles, excluio absolutamente os assorianos: permitia me o Sr. Deputado, que eu lhe diga, que nós tambem demos o nosso contingente, e não foi pequeno, para essa guerra chamada continental; não me posso agora lembrar do numero de recrutas, que deram as ilhas dos Açores; mas sei que foi muito pesado o recrutamento, e que esses recrutas chegaram a Portugal no tempo em que et Rei D. João VI esteva a partir para o Brasil; e isto é um facto: d'esses recrutas una foram para o Brasil, e outros ficaram em Portugal; e individuos bastantes conheço eu, que ainda lá estão alleijados das feridas que receberam não só em Portugal em toda a guerra do continente; mas na Hespanha, e que foram positivamente a França com o nosso contigente! Ora eu não quero de maneira alguma, pôr os açorianos em parallelo com os habitantes de Portugal quanto aos soffrimentos dessa época; mas noto que não é exacto o excluírem-se elles do quadro desses sacrificios: tambem soffreram muito. Quanto ao recrutamento ordenado por decreto da regencia d'Angra, creio que de 19 do Novembro de 1831, elle foi o mais pesado, que talvez povo algum tem soffrido; não só foi o mais pesado, mas foi ordenado com demasiado rigor; por esse demasiado rigor, que foi: mandar-se effectuar em 15 dias se cometteram grandes violencias, e eu confesso, que fui um d'aquelles, que as ajudei a commetter, porque infelizmente estava Camarista n'essa occasião, e tive tambem o meu voto na factura d'esse recrutamento; mas não póde deixar de sei; porque entendo, que antes soffrer o mal d'uma lei, posto que rigorosa, do que o bem que produz um arbitrio; commetteram-se de certo algumas violencias, mas não houve outro remedio: era todos sabem que os povos de Portugal não gostão da vida militar; não por que a vida militar seja desonrosa; mas causas que seria longo refferir agora tem arreigado essa aversão nos corações dos povos, tomara eu que um dia st perdesse essa desgraçada aversão; mas têm de pedir-se, quando o exército for bem pago; quando a vida militar se não der por castigo e facinorosos, como ainda á bem poucos tempos se fazia; e é isso que fez com que ella fosse depreciada na opinião dos povos; porém isto é um facto, e um facto que se não remedeia aqui com oratórias. Sr. Presidente, é verdade o que diz a Commissão, de que o, recrutamento iria augmentar a emigração para o Brasil; porém a Commissão não diz isso como o fundamento em que estriba o sen parecer; mas sim como um effeito que ha de produzir o recrutamento: diz a Commissão, que não por uma excepção; mas sim por um principio de rigorosa justiça, devem ser isentos os açorianos do presente recrutamento: quando eu aqui fallei a n'outra occasião sobre esta materia, votei o numero de recrutas, que deram os açorianos em 1831, e fiz ver que tinham sido quatro mil recrutas e estas quatro mil recrutas pedidas a 220$ habitantes equivallão a um pedido de perto de 70$ recrutas a Portugal, que tem tres milhões de habitantes. Disse um illustre orador com muita razão, que era preciso fazer differença entre soldados que se bateram contra nós; porém eu até não quero allegar em favor da pertenção simolhante motivo; mas quero que se sómente o exercito de linha de rigor, quero que se sómme o exercito de linha que teve o usurpador; e quero que se somme o do partido liberal; e estou certo que estes dous exercitos sommados não hão de chegar ao numero de recrutas que Portugal deveria dar em concorrencia com os Açores.
Ainda apresentarei mais uma reflexão a este Congresso esse mesmo exercito da linha, quando se acabou a luta foi mandado para suas casas quasi todo; eu digo quasi todo, porque sei, que o nosso exercito consta hoje talvez de 12 ou 18 mil homens, e sei que ainda há neste exercito uns dous mil açorianos; por consequencia os Açores ainda estão soffrendo a mesma, ou maior desproporção.
Ora pergunto eu, com que justiça, se mesmo reunindo o exercito do usurpador com o exercito liberal, acha-mos uma desproporção muito grande no contingente, que deram os Açores, se pede aos Açorianos o seu contingente neste recrutamento, tendo-o elles pago adiantado. Com que razão se póde dizer, que isto é uma graça, que isto é um deferimento, gratuito a favor dos Açorianos? Eu continuo a sustentar o parecer da Commissão, por elle conter um acto de rigorosa justiça; pois que propõe o pagamento de uma divida, que se deve aos Açorianos, e que de justiça rigorosa só lhes deve pagar. Por consequencia voto a favor do parecer da Commissão; e peço a V. Exca., que me inscreva para ter a palavra, se alguem tornar a combater o parecer da mesma commissão.

O Sr. Moreira Maia: - Tem-se já dito tanto, Sr. Presidente, que eu cedo da palavra.

O Sr. José Estevão: - Depois de tão eloquentes vozes se terem levantado nesta Assembléa para sustentar o parecer da Commissào, seria escusado que eu levantasse em defeza delle a minha; mas não posso deixar passar esta solemne occasião sem pagar solemnemente um devido tributo de agradecimento aos nossos generosos hospedes, e valentes companheiros d'armas. Tanto os que combatem o parecer, como os que o sustentam, estamos concordes nos principios, mas discordamos na applicação delles. Sr. Presidente, eu tambem não quero que nós enfranqueçamos a acção da lei com multiplicadas isenções; mas eu não peço uma excepção , exijo um acto de justiça. Se o combate é em parte igual commodo, é para os combatentes de ambos os lados o manejo das metáforas, e das mais bellezas oratórias; e é forçoso confessar que não é pequeno o talento daquelle nobre orador, que declarando-se impossibilitado de fazer uso dellas as empregou com tanta profusão, como habilidadei. Irei, Sr. Presidente, seguindo as observações, que cada um dos Srs. Deputados tem feito contra o parecer.
Disse-se primeiro que os portuguezes no continente estavam soffrendo todos os males da usurpação, em quanto os povos da Terceira estavam vivendo debaixo d'um Governo regular. Vamos á historia, Sr. Presidente, que nesta que tão só ella nos póde metter no caminho da justiça. Antes que se restabelecesse esse Governo da Carta, na Ilha Terceira, tinha já pesado sobre ella o governo do usurpador, e senão foi longa a que duração, se não chegou a produzir alli todos os effeitos de calamidade, e tyrannia, devem-no os Terceirenses á sua devoção cívica, e á coragem e firmeza do invicto batalhão 5.° Quando partimos para d ilha Terceira não fomos fazer un1a conquista; achámos estabelecido o Governo da Rainha, esse Governo regular, de que se fallou.

Mas, Sr. Presidente, quando se trata de fazei guerra póde haver governos regulares. Quando tudo se subordino-

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ao grande e imperioso fim da defeza que governo póde, ser brando, moral, respeitador dos direitos, individuais, e protector da justiça, e da ordem? Nenhum, Sr. Presidente; e aquelle que se, esquece da, sua posição, e quer tomar os habitos do tempo de paz, acaba deshonrado, e com o crime de ter deixado perder, o paiz que lhe cumpria deffender. (Apoiado, apoiado.)

Sr. Presidente, a guerra; terna commum a situação de, todos os governos, e, igual a sua politica; felizmente ou Governo da Terceira soube conhecer, este grande, principio, e sujeitar-se às consequencias. Foi um Governo tão, irregular, como eram irregulares ás circumstancias, em que elle se achava. A diferença que; ha nestas circumstancias, entre governos regulares, e irregulares, é que, os regulares, depois de anda a guerra tratara seriamente de indemnisar os cidadãos de todas as perdas, que por elles tiveram; de reparar todas as ruinas, que ella causou; pagar todas as despezas, que se fizeram; mas a respeito das Ilhas é mister confessar, que os nossos, Governos não tem sido regulares; porque depois da paz fecharam-se os, olhos a, todos os soffrimentos dellas.

Nós chegamos á Terceira, e d'ahi era diante, converteu-se ella em uma praça d'armas: parou a industria, parou o commercio, e não parou a agricultura, porque nós precisavamos dos produtos della para nosso sustento; os filhos da Terceira com a enchada, com que abriam, a terra para as sementeiras, levantaram as trincheiras, e abriam, os fossos combatiam conmosco nas mesmas fileiras,
davam-nos todos auxilios para combater, e toda a consolação para os desastres da guerra. Na Terceira, Sr. Presidente, só se tratava da defeza, e tudo era sacrificado a este grande objecto. Depois tratou-se da conquista das outras ilhas, e com os meios que nos dava a Terceira, podemos, faze-la som quebra do credito das nossas armas. Quando parecia que estavam acabados os trabalhos para os Açorianos, quando uma quadra de descanço se esperava, e desejava, então nós lhe dissemos: - Agora é preciso que nos acompanhem a, Portugal; resta acabar a nossa obra; uma grande campanha nos chama. Disse-se, e executou-se. Fez-se um recrutamento horroroso, que pesou sobre todas as ilhas, e a juventude açoriana acompanhou-nos para Portugal. Eu fiz parte dessa expedição, mas alguém lá ficou que me contou as acenas - melancólicas, que alli se passaram durante a campanha, de Portugal. Longa era a demora das nossas correspondências: quando se divisava algum navio juntavam-se nu praia as mais, os pais, os filhos, as esposas, e algumas outras, que esperavam sê-lo (Riso.), e às vezes esse temido, e desejado navio,, mandava para terra uma noticia de morte, e de lucto geral, Eis-aqui, Sr. Presidente, o que fizeram as ilhas, e o que soffreram pela nossa causa, isto não soffreu terra alguma em Portugal.

Diz-se que as ilhas passaram descançadas o tempo da guerra peninsular, em quanto sobre Portugal pesaram todos os incommodos d'uma companha devastadora. Sr. Presidente, nas Ilhas não se, vê a pegada do soldado conquistador, mas ver-se a pegada da guerra, dessa fúria que deixa vestigios, mesmo no territorio, que não pisa; eu lá vi ainda parapeitos meios destroçados, baterias arruinadas; e
perguntando aos filhos do paiz para que se tinham construido tantas fortificações, elles me responderam: - Isso foi da guerra do francez (é frase delles); então, Sr. soffremos nós grandes desgraças, soffremos.... soffremos... Ah! que o recitado do que então ouvi, seria a resposta a mais concludente á historia de exagerados descanços, e fortunas, de que se nos pintaram gosando os açorianos no tempo da guerra peninsular! Nas ilhas não se vê a pegada do soldado conquistador; mas veem-se os vergonhosos documentos, do desprezo e desleixo de todos os nossos governos. Sr. Presidente, entre nós, a acção das medidas bemfeitoras, as mais das vezes, não passa da cabeça dos homens d'estado, que as conceberam; as aguas do Oceano principalmente, afrouxam-na, de todo. A's nossas possessões ultramarinas só chega o, mal, e raras vezes apparece o bem.

Tambem se disse que se não sabia como o recrutamento iria deixar augmentar a emigração nos Açores; e eu julgo que isto é muito facil de conceber. Qualquer incommodo faz deixar a terra, ao habitador, que nella não está bem. Nos Açores a classe mais numerosa vive em uma especie, de, servidão pessoal; os possuidores de, terras são, poucos, são os morgados; elles pagam os serviços do campo com os productos, que o campo lhes dá; mas pagam-nos pelo, preço, que lhes parece, e, ha trabalhador que tem o seu braço empenhado pelo sustento, que consumiu ha mezes. Muitas vezes com, o trabalho d'uma semana, apenas pagam o trabalho de uma semana apenas pagam a sustentação de tres dias. Quem assim vive não deixará por pouco tão ingrata terra? O recrutamento sem duvida augmentará a emigração dos Açores.

Diz-se, nas ilhas não se gosta do recrutamento porque em parte nenhuma se gosta delle. Nós não devemos condescender com esta repugnancia: assim será mas ouçam este facto, talvez seja o único a respeito de recrutamento na historia portugueza. Quando se faziam recrutamentos pelo antigo systema de vilencia nas ilhas dos Açores inutilisavam-se os moços, morriam de fome pelas brenhas para fugirem ás armas fez-se um recrutamento por ordem da Regencia, pelo methodo porque se costuma fazer em toda a parte, e os recrutados correram sem hesitação ao sorteamento, e depois ás levas no logar e hora aprasadas,. Houveram algumas ilhas em que os pais de familia se reunram e disseram entre si: - pedem.nos tanto filhos, vamos vêr quaes havemos dar, e quaes nos fazem menos falta. Depois de ter accordado entre entre si o mlhor modo de satisfazerem aos seus deveres, sem offenderem os seus interesses, elles mandaram apresentar ás authoridades os moços que tinham apurado em suas reuniões familiares. Nas ilhas obdece-se só quando há razão, justiça, e bom modo de mandar. E preciso não perder de vista que aqui não se trata de uma exepção, trata-se de justiça; exigindo-se das ilhas agora um recrutamento exige-se mais do que de Portugal. Fez-se um recrutamento cá no continente; mas para que? Para defender o usurpador!

Sr. Presidente, a questão veio complicar-se ultimamente com os parallelos; a comparação?............Concluo votando pelo parecer da Commissão.

Tendo dado a à ura, adiou-se a discussão.

O Sr. Vice-Presidente disse que a ordem do dia para à sessão seguinte seria a mesma, que fora dada para a de hoje; ç levantou a sessão depois dag quatro horas da tarde.

SESSÃO DE 18 DE MARÇO.

(Presidencia do Sr. Dias d'Oliveira, Vice-Presidente).

Abriu-se a sessão pelas onze horas da manhã, estando presentes noventa e nove Srs. Deputados.

O Sr. Secretario Rebello de Carvalho leu a acta da sessão precedente, e foi approvada.

O Sr. Secretario Vellozo da Cruz deu conta da seguinte correspondencia.

1.º Um officio do Ministerio dos negocios do reino, remettendo para serem presentes às Cortes, vários papeis relativos á divisão do território. A
Commissão, d'estatistica.

2.° Outro do Ministério dos negocios da fazenda, rémettendo sete exemplares do orçamento da despeza do Ministerio dos negocios do reino para o anno economico de 1837 a 1838, para serem distribuidos pelos membros, da Commissão d'admnistração publica. Assim se verificou.

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