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SESSÃO DE 13 D'ABRIL.

(presidencia do Sr. Dias d'Oliveira.)

ABRIU-SE a sessão ás onze horas da manhã, estando presentes noventa e nove Srs. Deputados.

Leu-se e approvou-se a acta da sessão antecedente.

Mencionou-se a seguinte correspondencia.

1.º Um officio do Ministerio dos negocios da fazenda, partecipando a recepção do officio das Côrtes, que lhe transmittiu a indicação do Sr. Pereira Brandão, sobre as exigencias de lord Wellington, e lord Beresford, a respeito de pensões, declarando que ficavam satisfeitas as ordens para se lhe satisfazer. O Congresso ficou inteirado.

2.º Outro do Ministerio da guerra, remettendo para ser presente ao Congresso, o requerimento de D. Marianna Victoria dos Santos Cardozo, viuva de João Esteves da Silva Cardozo, capitão de cavallaria, era que pede lhe seja proficua a disposição da lei de 20 de Fevereiro de 1835, que ampliou a de 19 de Janeiro de 1827. Foi remettido á Commissão da guerra.

3.° Outro do mesmo Ministerio, remettendo, para ser presente ás Côrtes, o requerimento de D. Maria Alves Pinheiro Corrêa da Lacerda Cabreira, viuva do marechal de campo, Sebastião Drago Valente de Brito Cabreira, pedindo lhe seja applicavel o beneficio concedido pela lei de 20 de Fevereiro de 1835, ou uma pensão equivalente aos importantes serviços de seu falecido marido. Foi mandado á Commissão de guerra.

4.° Outro officio do mesmo Ministerio, remettendo, para ser submettido á deliberação das Côrtes, a resolução provisoriamente tomada por decreto de 14 de Novembro ultimo, fazendo applicaveis as disposições da lei de 19 de Janeiro de 1827, a D. Maria Catharina de Freitas, viuva do tenente de infantaria, Alberto Antonio da Fonseca. Foi mandado á Commi ssão de guerra.

5.° Outra officio do mesmo Ministerio, remettendo, para ser submettido á approvação das Côrtes, a copia do decreto de 11 d'Agosto de 1836, com o requerimento, e documentos de D. Maria do Carmo Valdez de Moura, viuva do tenente general, José Maria de Moura, á qual foi concedido o soldo de seu fallecido marido. Foi remettido á Commissão de guerra.

6.° Outro officio do mesmo Ministerio, remettendo ás Côrtes um requerimento dos prazos hespanhoes, que se acham em Portugal, pedindo que se lhes conceda passaporte para qualquer paiz da Europa. Foi remettido com o requerimento do Sr. João Victorino, sobre este objecto á Commissão diplomatica, para sobre todos dar o seu parecer.

7.° Uma representação dos moradores do extincto concelho de Santa Eulalia, sobre divisão administrativa. Mandou-se á Commissão d'estatistica.

8.º Uma representação da Camara municipal da villa das Caldas, pedindo que ella seja elevada á cathegoria de cabeça de comarca. Foi remettida á Commissão d'estatistica.

9.º Um requerimento dos officiaes despachados para os Estados da India, pedindo augmento de soldos, e que o seu ajustamento de contas até ao seu embarque se faça na razão de quinze mil réis. Foi remettido á Commissão do ultramar.

10.° Um officio do conselheiro Luiz José Ribeiro, remettendo cento e vinte exemplares impressos da conta geral da receita; e despeza de repartição do commissariado a seu cargo. Mandaram-se distribuir.

11.° Uma partecipação do Sr. Deputado Midosi, dando conta, que não comparecia por molestias. O Congresso ficou inteirado.

Teve Segunda leitura o seguinte requerimento.

Requeiro, que se peçam ao Governo todos os papeis, respostas, e informações dos juizes, e authoridades, sobre a nova reforma judiciaria, que foram remettidas ao mesmo Governo, para que os envie á Commissão de legislação. Sala das Côrtes 12 d'Abril de 1837. = Alberto Carlos.

Foi approvado sem discussão.

O Sr. M. A. de Vasconcellos: - Pedi a palavra para rogar a V. Exca. queira ter a bondade de me dizer, se já foi apresentado na mesa o parecer da Commissão respectiva sobre o requerimento, por mim entregue nesta Camara, do corneta de chaves do regimento n.º 18, que se acha preso.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabraza: - O parecer da Commissão de guerra está sobre á mesa.

O Sr. Presidente: - E' Verdade, que está sobre a mesa; mas para seguir a ordem estabelecida, com outros pareceres com o qual está junto.

O Sr. M. A. de Vasconcellos: - Bem; mas eu pedia a V. Exca. tivesse a bondade de mandar fazer a segunda leitura desse parecer, apesar de que eu não sei sé lhe cabe já o tê-la por vez; mas dado o caso negativo, eu rogo a V. Exca. o mande ler segunda vez.

O Sr. Presidente: - A prática é, que quando os pareceres não envolvem projecto da lei ficam sobre a mesa, para entrarem depois em discussão, quando lhe cabe por sua ordem. No entretanto, não haverá inconveniente em se fazer agora leitura desse, a que se refere o Sr. Deputado.

O Sr. M. A. de Vasconcellos: - Rogo mais a V. Exca. a bondade de mo conservar a palavra a este respeito; porque ainda tenho mais alguma cousa a dizer.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabroza: - Eu não me opponho, a que se leia o parecer; mas a minha duvida está, em julgar se nós podemos entrar agora na discussão d'elle, interrompendo assim a ordem dos trabalhos.

O Sr. Presidente: - Eu não sei, o que o Sr. Deputado faz tenção de fazer depois da leitura do parecer; ver-se ha depois d'ella. ( Leu o parecer.)

O Sr. M. A. de Vasconcellos: - Na occasião em que tive a honra de apresentar o requerimento, de que se tracta n'esta Camara, logo disse, que me parecia ser essa supplica um tanta incurial; porque este Congresso não tinha authoridade de só entrametter n'este negocio, pela fórma que a supplica era feita. Vejo agora, que o parecer da Commissão é conforme á minha opinião: - de maneira nenhuma me opponho a elle; mas direi ( que sendo este negocio relativo á prisão de um cidadão, é por isto de muita ponderação. Julgo que a justiça pede, que se ella está culpado se lha applique a pena da lei; e a não estar culpado, então solte-se. E' por isso, que eu faço o seguinte requerimento (leu-o).

O Sr. Presidente: - Queira mandar o requerimento para a mesa, e amanhã terá segunda leitura.

O Sr. M. A. de Vasconcellos: - Depois dos esclarecimentos, que o governo mandar, direi mais alguma cousa a este respeito.

O Sr. Ochôa: - Sr. Presidente, no principio da semana passada levantei-me aqui a representar contra a centralisação dos provimentos dos officios nos logares, e nas aldêas, pelo governo.

Assentou-se então, que este requerimento devia ser apresentado como projecto de lei: - eu trago aqui esse projecto, no qual abranjo tambem os escrivães do ramo administrativo a respeito dos quaes não ha o mesmo defeito no codigo administrativo; mas ha outro peior, que é o ficarem inteiramente a arbítrio das Camaras, o que é peior; porque é máo extremo, como o é o outro; por quanto, a uns e outros escrivães se confiam grandes interessei; e tambem porque sem boa escolha de escrivães não póde haver boa fiscalisação no procedimento das authoridades.

Não direi mais a este respeito, passo a ler o projecto de lei (leu).

Não comprehendi aqui os escrivães de hypothecas, esta-

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belecidos na ultima legislado; porque estes pertencem ás comarcas, e não aos julgados; e por isso eu farei outro projecto separado, porque entendo que estes escrivães estão muito mal collocados nas comarcas.

Peco a V. Exca., que me deixe inscripto para outros projectos, que agora não apresenta, para não tomar mais tempo, ao Congresso, nesta dia destinado a discussões urgentes.

O Sr. Gorjão Henriques: - Sr. Presidente, quando eu ha seis sessões pedi a palavra para antes da ordem do dia, a qual tenho reclamado differentes vezes, e sómente hoje me pertenceo, era unicamente para fallar do segundo dos objectos do que vou tractar; mas um acontecimento recente, e de que hontem tive conhecimento, por via de algumas pessoas, me faz hoje occupar tambem a attenção do Congresso. - He um facto; coma já disse, eu o não pronunciei, mas repito, elle me foi afirmado por varias pessoas, em cuja probidade confio; e porque ainda não é dos mais publicos, e será um tanto difficil de aclarar-se pelas circumstancias particulares de que é revestido, e porque até se attribue ao mesmo administrador, por isso aqui o venho relatar, e renovo o protesto de que elle vai por conta das pessoas, que para isso me instaram, o que eu não conheço, nem os nomes das personagens que figuram neste = melo-dramma = é excepção d'um só nome.

Affirma-se que dentro da casa da Misericordia desta cidade, houve quem lançou vistas phylantropicas de mais, sobre uma orfã, ou enjeitada, pertencente á mesma casa, a qual, a ser verdade o que se conta, renuncia aquellas qualidades que do seu Euryalo cantou Virgilio - Gratior et pulchro veniens in corpore virtus - o certo é, que no caso supposto ella se conservou firme; porque, assentou que não encontrava - virtus - nem o - pulchro: - seguiram-se, segundo dizem, ás boas maneiras, os actos de vingança... (Algumas vozes: - Isto não é para aqui, nem é logar proprio). Eu acento que é para aqui, e que é logar proprio para ennunciar este facto no Ministerio; porque eu tracto este negocio como Deputado da Nação, e como tal, aqui é meu logar, e, não hei de andar por casa dos Ministros, a informa-los; porque entendo que lhe não devo subir as escadas como Deputado, quando até como particular; o não faço; por tanto saibamos, é ou não é logar proprio e fallo, ou não fallo? E ser-me-ha permittido fazê-lo era um estillo menos carregado do que se costuma quasi geralmente era taes casos? (Muitas vozes, é, é, falle, falle.)

Bem: depois de muito bem tractada, e ellevada aquella rapariga por alguns tempos, passou a ser maltractada, e ehatida, o que foz com que, ella adoecesse, ou mesmo adoeceria casualmente; por combinação com o cirurgião, passou-se uma guia para ella ser remettida, e com effeito o foi, ao hospital dos alienados; quando, pelo que se refere ella nada tinha de douda: houve desencontro d'entrega, e ella foi recebida na enfermaria do facultativo, ou perito, que me dizem chamar-se Farto; o qual inquirindo, e examinando a rapariga, que protestava estar muito em seu juizo (apesar de que estas affirmativas, não são provas sempre, e ainda que o sejam, ás vezes não valem, e se tomam por doudice confirmada): achou digo, o dito facultativo, ou perito, que não havia motivo para como tal a classificar, antes lhe fez estabelecer a dicta n.° 4.°, que segundo me dizem é de alimento mais abundante, e forte; quando a que se prescreve aos alienados mentalmente, é diminuta, o debil; pouco mais ou menos como a que o nosso estado de finanças prescreve á maior parte da gente, mesmo cá fóra do hospital, (Risadas) Appareceu porém quem reclamasse, que a desgraçada fosse com effeito arrastada á casa das palhas, e o foi - invito domino: - forte teima da se querer, que a gente seja douda á forca! (Risadas.) Bem se vê quanto seria encantadora, e cómmoda semelhante morada nestes dias de athemosfera russianna, e sendo provavel que a rapariga, já tivesse a grippe, que segundo a frase technica, tem por caracter recidivar a mais leve descautella (risadas); em fim bem se vê, que a ser assim pelos menos esteve bem em perigo de ser engrippada (risadas); mas o Sr. Farto que, a existir o caso, tambem agora mostrou que tem um coração farto em virtude, e humanidade, fartou-se de ver a violencia, e não se fartou de punir a favor da desgraçada para ser resgatada de tal violencia; negou-se-lhe, que ella tivesse estado nas palhas; mas affirma-se que sim, e eu não sei que destino posterior ella teve, assim como uma, e muitas vezes repito, que isto me foi contado, e que eu não respondo pela sua innegavel veracidade, para se aclarar pois a existencia do facto, e se dar razão, e fazer justiça a quem a tiver, é que eu pertendo, que o Governo pelo Ministerio, competente se informe ácerca d'elle minuciosamente; porque, Sr. Presidente, se no asylo da desgraça, e qne o deve ser da innocencia, e da moral, se erige a violencia, e o crime, então em que mundo estamos? (apoiada, apoiado) e muito principal mente se conhecidos taes crimes o governo os não faz punir severamente, e apresentar mais esse motivo para se continuar a dizer que, ou conserva os individuos maus das administrações, que se classificam más, ou elle mesmo imita essas administrações, pondo nos logares pessoas, que os não devem occupar, dando assim mais uma prova de que estamos no mesmo estado, ou peior que d'antes (apoiado). Vamos agora ao outro objecto, e neste he necessario mudar de estillo; porque nelle he mister - infundum renovare dolarem - tenho em meu, poder, ha dias, para mandar para a mesa uma representação, ou antes reclamação dos povos das freguezias de Alvega, desannexada do concelho de Abrantes para o do Gaveão, a qual eu teria mandado para a mesa desde logo, senão tivesse a informar previamente este Congresso de circumstancias particulares, que concorram neste caso; e vem a ser: os habitantes d'esta freguezia são d'aquelles, que entre os de outras freguezias do condelho de Abrantes tem desde o momento era que se tractou de serem desannexadas taes freguezias, sempre reclamado contra essas desannexações; pelas muitas, e ponderosas razões, que em suas representações se acham produzidas, e estão na commissão de estatistica; mas, pertenções, ou particulares, ou do concelho absorvente, erigirão em procurador, ou seductor de alguns poucos individuos da referida freguezia, um homem, que não he da melhor moral, ou dos melhores precedentes politicos; isto dizem os que assignaram a representação, que tenho na mão; o qual se encarregou de fazer assignar uma segunda representação, que o foi por verdadeiras assignaturas em muito pequeno numero, e por outras suppostas, e irregulares, e creio que nem reconhecidas, em que ellas em sentido contrario dizem, que lhes convém passar para o concelho de Galveão, mas a quasi totalidade dos habitantes daquella freguezia, que tem uns 355 fógos, apresenta agora uma reclamação, que he esta assignada por mais de 200 pessoas, cujas assignaturas vem legalmente reconhecidas, na qual se queixam contra o agente da segunda representação, e renovam seus protestos de desejo de ficarem pertencendo ao concelho de Abrantes pelas commodidades, a vantagens que dahi lhes resultam, e não querem caír nas unhas do Gavião; - ora eis aqui, Sr. Presidente, mais uma próva das dissensões a que tem dado motivo a lei da divisão territorial, ou o decreto de reforma judiciaria, que faz parta dessa legislação, da chamada dictadura, e na qual dentro, do Congresso os que a discutiram, e fóra delle os que escreveram, todos confessam, que as leis, que a compõem são para maior parte, além de tantos vicios, de que estão içadas, inconsideradas, inuteis, e até prejudiciaes; ora Sr. Presidente tirada uma porção de cada uma das classes destes vicios, que ficará da boa? e entre tanto a titulo do muito pouco bom, hão de os povos sofrer o immenso máo, ainda que seja provisoriamente?!! Sr. Presidente; esta lei, em que aparece a divisão actual de territorio, além de tantas rasões porque he muito má, ha pes-

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sima pela mesma divisão territorial; ella tem trazido a desordem e inimizade ao seio dos povos, pois erradamente quasi em geral de diz, que essa legislação nova tem a bondade de ser baseada nos costumes dos povos, e que nesta se verifica essa qualidade essencial até na reinstauração dos emolumentos, e então a ser assim baseada, porque senão guardaram os usos, e as vontades dos povos nessa lei a respeito da divisão territorial, que, como está, tem feito inimizar, e armar os povos encarniçados já de tal modo uns contra outros, que muito difficil será reconcilia-los pela força, e bom será que se faça pela prudencia, em quanto he tempo, para se evitarem as taes conspirações, como lhe querem chamar, e que não tão mais que o resultado do descontentamento assaz pronunciado contra o systema adoptado pelos homens do governo, e não tanto contra o sistema do governo - quanto aos povos do concelho de Abrantes, eu posso affirmar, que se tem conseguido até agora pelas diligencias da Camara Municipal, pelas de homens probos, e pelas minhas recommendações, e do illustre Deputado o Sr. Raivoso, governador da praça, que elles se tenham conservado na passiva, promettendo-se-lhes justiça, mus se forem despresadas suas justas pertenções, não respondo pelo resultado, e por isso rogo muito a este Congresso em geral, e especialmente a Commissão de Estatistica, que tome em muito séria consideração este negocio, e abrevie a sua decisão, e que sobre este caso especial da freguezia de Alvega confronte, á vista desta minha informação previa, as representações dos povos da mesma freguezia; decidindo-se além disso pela verdadeira conveniencia, que realmente existe, de ficar aquella freguezia ao concelho de Abrantes como antes era. - Mando para a mesa a reclamação a que me refiro.

O Sr Lopes Monteiro: - Tanto em uma, como em outra substituição, fundaram-se os seus authores na differença que ha entre Villa Nova, e Porto; mas esta differença não existe; porque estas duas povoações apenas estão divididas por um rio; mas communicadas por uma ponte.

Além pois de ser falso este supposto, a substituição de novo apresentada, hia prejudicar o Porto e seus habitantes, o que eu não posso soffrer. E' verdade, que os vinhos e agoas-ardentes seriam todos introduzidos por Villa Nova, e neste caso a fazenda perdia, a não ser que o Sr. Ministro da fazenda não convenha na diminuição destes direitos na certeza de que Villa Nova fica sendo o caminho de Sião, e todos irão por elle. (O Sr Ministro respondeu, que não era possivel a diminuição geral dos direitos.) Então voto outra esta substituição tambem.

O Sr. Ferreira de Castro: - Parece-me, Sr. Presidente, que não pode abrir-se agora discussão sobre o objecto em que primeiro fallou o Sr. Deputado, e que deve reservar-se o que houver a dizer, para quando se tractar desta materia.

O Sr. Presidente: - Decerto não póde agora entrar-se na discussão deste objecto.

O Sr. Rojão: - Sr. Presidente, tenho a honra de mandar para a meia um requerimento da Camara municipal, da cidade de Evora, em que pede ao Congresso, lhe conceda a cêrca e convento da Remedios, dos extinctas carmelitas daquella cidade, para nelle construirem o seu cemiterio. Sr. Presidente, esta Camara em 1835, representou ao Governo a difficuldade que tinha, de construir o seu cemiterio, pela falta de meios, porque as rendas do concelho são 500.000 rs, e as suas despesas montão a 5 contos, e por tanto já se vê, que não é possivel, que a Camara possa lançar uma derrama, alem daquella que é obrigada a lançar para cobrir o deficit, para fazer o cemiterio, e por isso recorreu ao Governo, pedindo-lhe a dita cêrca, e convento, porque é muito pequena, e não lesaria por isso os interesses da fazenda, mas como o Governo não lhe decidiu as suas representações, representaram ás Côrtes, e as Côrtes mandaram remetter essa representação ao Governo, para que excluisse estes bens de venda, mas o Governo não o fez, no tempo em que eu estava segundo de administrador geral em Evora; a Camara dirigio-se a mim, para que eu representasse ao Governo a necessidade que havia de se lhe conceder aquella cêrca, eu assim o fiz; mas o Governo nada decidiu quando vim tomar assento neste Congresso, particularmente pedi a S. Exca. o Sr. Ministro da fazenda, que houvesse de conceder aquella cerca, S Exca. respondeu que visto estar reunido o Congresso, não podia fazer nada, então a Camara sabedora disto, dirigiu-me esta representação, para eu a apresentar ao Congresso, eu assim o faço, pedindo a V. Exca. o obsequio de a remetter á Commissão de fasenda, para ella decidir se sim, ou não se ha de conceder este terreno, aproveito esta occasião para fazer o seguinte requerimento (leu.)

O Sr. Vasconcellos Pereira: - Sr. Presidente, tenho a honra de mandar para a mesa um requerimento de 51 officiaes da armada, de differentes graduações, que se queixam ao Soberano Congresso, do Governo não ter cumprido a lei de 16 de Março de 1836, que determina, que os officiaes da armada sejam pagos a par com os officiaes do exercito: pedem ao Congresso, que exija do Governo a prompta observância desta lei. Sr. Presidente, por uma fatalidade que persegue a repartição da manilha ha muitos annos, por uma injustiça manifesta, os pagamentos desta repartição tem sempre andado atrasados das outras repartições do Estado. Quando muitas se achavam pagai adiantadas, outras em dia, a marinha andava atrasada muitos mezes; nada prova mais a incapacidade dos que nos tem governado, do que a falta de contemplação que tem tido sempre para com uma arma, de que tanto depende a honra, e gloria nacional, para com uma arma que nunca póde ser perigosa á liberdade do paiz. As Côrtes passadas, querendo obstar a esta injustiça, decretaram a lei de 16 de Março dó 1836, que determina «que os soldos dos officiaes pertencentes á classe effectiva d'armada, sejam os mesmos, e pagos na mesma época em que o forem os dos officiaes pertencentes á classe effectiva do exercito.» Nada mais justo do que esta lei, fundada sobre a mais perfeita igualdade, porque se os officiaes do exercito arriscam sua vida pela honra, e defeza da Patria, nos campos de batalha, os d'armada arriscam-se igualmente nas planicies do Oceano; elles correm iguaes riscos, soffrem iguaes privações, pesa sobre elles igual responsabilidade, por consequencia devem ser considerados da mesma maneira, porém que importa fazer leis, se as leis se não observam?! Sr. Presidente, ha mais da um anno que esta lei foi feita, mas os soldos da armada estão atrasados quatro mezes dos do exercito, porque este está pago até Setembro, e os da armada até Maio se o Governo quizesse ter cumprido a lei durante o espaço de um anno, ter-lhe hia sido muito facil, pagando dous mezes de soldo á armada, sempre que pagasse um ao exercito, e não se digo, que isto era impossivel, porque o importe de um mez de soldo á classe effectiva da armada; não sóbe a mais de doze contos, caso que não tivesse este dinheiro, não devia pagar-se ás classes mais adiantadas, ate que as outras chegassem ao par dellas, a lei é igual para todos; o Governo, quando tem dinheiro, deve pagar a todos os empregados; quando não tem, todos devem soffrer igualmente.

A repartição da marinha está prompta a soffrer os maiores sacrificios e privações, quando a Patria o exigir, mas não pode ver tem grande magoa esta distincção odiosa, que se pratica com ella por tanto, eu peço no Soberano Congresso, queira tornar em consideração este requerimento, fundado em tanta justiça, e que exija do Governo a observancia da lei.

O Sr. Castro Pereira: - Peço a palavra, a fim de pedir licença para mandar para a mesa um requerimento dos habitantes do extincto concelho de Villarinho da Castanheira.

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na provincia de Traz os Montes, districto de Bragança; assignado por mais de seiscentos individuos, habitantes do mesmo concelho, que se queixam, que na nova divisão territorial não só se extinguisse aquelle concelho, mas que as povoações, de que era composto, fossem injusta, e impoliticamente divididas pelos tres concelhos limitrofes de Moncorvo, Villa Flor, e Anciães, quando elle tinha mais de novecentos fógos, e quando a sua posição topografica permittia, que se formasse um concelho de muito mais de mil fógos, reunindo-lhe tres pequenas freguezias pertencentes ao concelho de Moncorvo, e situadas na margem esquerda da ribeira Villariça, cujas enchentes no inverno, e a falta de ponte, as deixam todos os annos, e por longo espaço de tempo, sem communicação com aquella villa. Não quero tomar mais tempo ao Congresso com este objecto, e concluirei rogando a V. Exca. queira mandar este requerimento á Commissão de estatistica, para ser tomado na consideração, que muito merece.

Aproveito esta occasião para mandar lealmente para a mesa um requerimento dos moradores de Villa Pouca, freguezia de Villa Marim, concelho de Mezão Frio, que requerem ser desannexados desta freguezia, e fazerem parte da de S. Vicente da Cidadelha, cuja igreja dista apenas um quarto de legoa do seu logar, quando Villa Marim esta a uma legoa do mesmo.

O Sr. Derramado: - Alem da palavra, que tenho para ler um parecer da Commissão de estatistica, tenho-a tambem para apresentar um requerimento.

O Sr. João Joaquim Pinto: - O meu requerimento é muito simples, elle tende a cumprir as determinações do Congresso, a por consequencia sobre elle direi alguma cousa, mas passo a le-lo (leu) O decreto, a que allude, e de 16 de Janeiro, decreto que é inexequival, desde o primeiro até ao ultimo artigo, só texa um que o seja, que é, o que determina a suspensão dos jurados, mas de que serve suspender os jurados, aonde não ha juizes; porque só em Loanda, paiz do meu conhecimento, e que ha juiz? O decreto não o só foi feito com luta de conhecimentos especiaes, mas até com falta geral de conhecimentos estatisticos, sem attender á topografia do paiz, ao numero da população, e sua qualidade, etc., por quanto se estabelece em Benguela um juiz ordinario, dependente do julgado do juiz de direito de Angola, que fica desviada tres gráos e meio ao Sul, para onde se não pode ir por terra, que e um sertão inhóspito, habitado por selvagens, e alguns antropófagos, e só por mar, contra uma corrente de tres a quatro milhas por hora; que por tanto melhor seria dizer ao juiz de direito, que fôsse fazer audiencias em Pernambuco, do que a Benguela, por ser mais breve a jornada; entre tanto eu não entro na analyse particular de cada um destes artigos; peço que sejam remettidos á Commissão porque ella quer fazer a refórma delles, por ter muito em vista o bem das provincias do ultramar.

O Sr. Costa Cabal: - Eu peço, que V. Exca. me reserve a palavra, para quando estiver presente o Sr. Ministro da fazenda, porque lhe quero pedir explicações sobre um requerimento, que foi ha muito mandado ao Governo.

O Sr. Franzini: - Eu quero unicamente declarar, para intelligencia do Congresso, que não fui encarregado desta divisão.

O Sr. Barjona: - Sr. Presidente fui um destes dias informado, de que ha tempos tivera logarr no porto de Moçambique um acontecimento mui desagradavel. Que havendo se travado uma rixa entre um brigue inglez, e um hespanhol, perto daquella nossa possessão, que sendo a embarcação hespanhola de menor força, que a outra, correra a buscar protecção dentro do porto de Moçambique, onde entrara perseguida pelo brigue inglez, que este alli mesmo, debaixo da nossa bandeira, lhe dera uma abordagem, e pesara, á espada a maior parte da tripulação. Que depois disto ainda chegara ao arrojo de querer sair do porto com o vaso hespanhol prisioneiro, mas que então a nossa fortaleza lhe atirara, e o brigue inglez se vira obrigado a largar a presa. Consta finalmente, que naquella occasião se achava dentro do porto uma charrua portugueza com bastante força, e que seu commandante tivera a baixeza d'observar inalteravel similhante attentado. Sr. Presidente, esta é a informação que me deu pessoa, que devo reputar bem informada, e incapaz de mentir: entre tanto desejo, que o Sr. Ministro dos negocios d'ultramar, queira dizer-nos se as informações, que recebeu, concordam no essencial com o que acabei d'apresentar. E se havendo exactidão no que expuz, S. E. já deu alguns passos para obter a devida satisfação e se estão já passadas as ordens precisas, para que o commandante da charrua portugueza seja julgado em concelho de guerra, com todo o rigor das leis. Sobre este ultimo ponto tinha eu muito que dizer: porem abstenho-me de o fazer por ora, por temer, que as minhas expressões deem origem a alguma prevenção: lá está o conselho para o julgar, e praza ao Ceo, que nisto só haja com o maior rigor, e imparcialidade

O Sr. B. da R. de Sabrosa: - Sobre a ordem. Parece-me, que o Sr Ministro dos negocios estrangeiros deverá ter deste successo melhor informação, do que o Sr. Ministro da marinha. Em quanto ao facto, que é atroz, póde ter sido praticado debaixo de nossas fortalezas, sem que ellas o pudessem evitar, porque a nossa artilheria no ultramar, é de ferro, carcomida, e desfagonada, grande parte é do tempo dos Filippes. E por isto qualquer pirata póde insultar a nossa bandeira a vista dellas.

O Sr. Ministro da Justiça: - O que acaba do dizer o Sr. Barjona, é desgraçadamente exactissimo, como se deixa ver da participação official da junta governativa de Moçambique, que foi dirigida por via do nosso encarregado de negocios no Rio de Janeiro, ao Ministerio da marinha, e ultramar. Acha-se em Moçambique o brigue inglez Leveret, o qual cruzando uma noite no mar largo, vio passar um brigue hespanhol, que pretendeu registar, e para o que lhe dirigiu uma lancha com gente armada, que em logar de satisfazer ao fim a que se propunha, recebeu alguns tiros, de que, resultou a morte d'um marinheiro, e o ferimento d'outros: no dia seguinte entrou no por o de Moçambique um outro brigue hespanhol, que sendo falsamente tomado por aquelle, que na véspera tinha feito fogo sobre a lancha do brigue inglez, deu occasião a ser perseguido por este, naquelle mesmo logar, aonde a nesta bandeira o devia proteger contra todo o insuto. Como o commandante da fortaleza observasse, que um brigue com bandeira brasileira se aproximava, em attitude ameaçadora, tom portas abertas, e artilheria fóra, intimou o commandante do brigue, que desse fundo, o qual, fazendo içar immediatamente a bandeira ingleza, respondeu não quero, e proseguiu até que foi dar uma abordagem ao brigue hespanhol, e passar á espada grande parte da sua inerme tripulação, que toda teria sido victima da brutalidade feroz de seus agressores, se alguns tiros dirigidos da fortaleza não pozessem termo á carnagem, assim como impediram de levar a reboque o navio hespanhol, que para maior escandalo queriam reputa como boa presa.

Este facto é tão horrivel, e tão pouco vulgar entre as nações civilisadas, que logo que fôr conhecido do governo inglez, estou certo de que se não ha da recusar a dar-nos as satisfações necessarias, e eu não cessarei em quanto ellas não forem completas. O Sr. Ministro dos negocios estrangeiros já tem conhecimento do facto, e não perderá tempo em fazer as conveniente reclamações.

Agora pelo que respeita á ultima observação, que fez o Sr. Barjona, direi, que as authoridades de Moçambique, assim como o commandante da fortaleza, sustentaram convenientemente a bons, e dignidade nacional; não direi ou-

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tro tanto a favor do commandante da charrua Princesa Real, que achando-se naquelle conflicto, e com sufficiente força (segundo me consta) para estorvar um similhante insulto, e vingar a bandeira portugueza, ficou mudo expectador, e n'um estado de culpavel inacção, por que ha de responder immediatamente que chegue a esta capital.

O Sr. Visconde de Fonte Arcada: - Eu tinha pedido a palavra, porque o Sr. Ministro da justiça parecia, ter-se esquecido de dizer se a charrua portugueza effectivamente estava no porto, e qual tinha sido a conducta do commandante, por isso lhe queria perguntar se tinha sido, como disse o Sr. Deputado, que antes tinha fallado, e se alli teria força bastante para poder resistir ao brigue inglez. S. E. no fim do seu discurso deu a este respeito explicações, que combinam com o que disse o Sr Deputado, por isso nada mais tenho a dizer espero porém, que logo que a charrua chegue a Lisboa, o seu commandante será immediatamente posto em conselho de guerra. A sua conducta, sendo como aqui se tem dito, e infame. (Apoiado, apoiado.)

O Sr. Barjona: - Agora se vê com que razão eu pedi por vazes a palavra a V. Exca., para quando se achasse presente o Sr. Ministro d'ultramar. Estou satisfeito, porque vejo que S. Exca. já tem tomado as medidas, para que o commandante da charrua seja julgado em conselho de guerra espero que o Governo exigira todas as satisfações, que se devem dar em taes circunstancias a uma nação independente. Dá-me ainda maior satisfação a noticia, que o commandante de fortaleza de Moçambique fez o seu dever.

O Sr Cezar de Vasconcellos: - Eu peço a palavra para pedir a V. Exca. pergunte ao Sr. Ministro do reino, se o administrador geral de Santarem já mandou os esclarecimentos pedidos pela Commissão de administração publica ácerca da questão das causas verdes, e barca de passagem no Tejo em frente d'aquella villa.

O Sr Presidente: - Creio que já veio parta d'isso ao Congresso, que se mandou a Commissão de administração publica.

O Sr. Ministro do Reino: - Sr. Presidente, este negocio depende de medidas legitimas.

O Sr. Leonel: - Sr. Presidente, a sociedade farmaceutica de Lisboa pediu-me, que entregasse aqui dous requerimentos, em que pedem alteração parcial d'algumas das leis, que regulam a sua faculdade, eu não entendo d'esta materia, não sei se os requerimentos são ou não justos, mas estimaria que a Commissão, a quem pertence-se tomar conhecimento deste negocio, os examinasse com brevidade, e nos apresente tambem com brevidade o seu parecer.

O Sr. Derramado: - Tenho a honra de mandar para a mesa uma representação do concelho de Panoias, districto de de Béja, pedindo a commercio do mesmo concelho como familia politica separada do de Messejana, a que foi reunido pelo decreto de 6 de Novembro ultimo. Peço que vá a Commissão d'estatistica, aonde eu exporei os motivos em que os recorrentes fundam a sua pertenção.

O Sr Lopes Moraes: - Sr. Presidente, não tendo eu observado os usos parlamentares estrangeiros, como muitos meus collegas, e não tendo tido a honra de ser Deputado nas Côrtes passadas, de certo que estou ainda novo nos usos parlamentares, mas tenho visto que aqui se terminam as discussões, ou naturalmente, não havendo quem queira fallar sobre a questão, ou artifficialmente por proposta do Sr. Presidente, a requerimento d'algum Sr. Deputado, que pede V. Exca. proponha se a materia esta discutida, ou por brado a votos d'uma grande parte do Congresso, e isto o que eu tenho observado aqui muitas vezes: ora isto assim corpo muitas vezes tem sido muito util pela economia do tempo, tambem muitas vezes tem tido muito nocivo: eu tenho visto, Sr. Presidente, que nas nações estrangeiras (por escripto, porque nunca tive occasião de ver de facto), em Inglaterra na Camara dos communs) vejo que as discussões, quando se findam, é quando tem faltado os que tem a palavra, e ainda se propõe áquelles que fallaram, se tem alguma cousa a dizer não quero agora entrar na analise do caso, nem se elle será util; ou se será exemplo a seguir, ou abuso a evitar restrinjo-me simplesmente a observar os effeitos dos nossos usos, e tenho observado por vezes, e n'uma discussão de ha pouco, que quando a discussão se fecha, havendo ainda muitas com a palavra, ella resuscita com peior cara, do que tinha acabado. Sr Presidente, eu n'uma das sessões passadas tambem fui um d'aquelles, que não fallaram, votei conscienciosamente por admissão de todas as leis, e eu entendi, para n'um não tinha duvida nenhuma, que era ale ao dia 26 de Janeiro (apoiado) não e por n'um que eu faço esta indicação, e pela discussão, que se tornou suscitar no dia seguinte, que foi menos airosa. Eu tenho observado, que isso se tem suscitado principalmente, quando ficam muitos Srs. Deputados por fallar eu não sou nunca o primeiro, que peço a palavra, por não ser dianteiro, como me educaram, deixo muitas vezes de pedi-la por economia de tempo, e quando a peço, é ou porque preciso ser illustrado sobre algum ponto da questão, ou porque possa illustrar, e sempre a hm de habilitar, ou ser habilitado para votar, e algumas vezes para mostrar os motivos, por que voto, quando a discussão tem tomado um caracter sentimental ou pessoal, a fim d'evitar qualquer suspeita de parcial, devo ser, este parecer imparcial por tanto não e por mim, que votei conscienciosamente pela admissão das leis da chamada dictadura, escolhendo o menor entre dous males, mas para que as questões não resuscitem peiores do que acabarem, e que eu proponho as regras, que vou ler, sobre o modo de terminar as discussões, (Leu, e mandou para a mesa.)

O Sr. João Victorino: - Mando para a mesa uma representação, que aqui mesmo na Camara recebi, sobre a minha, proposição a respeito dos Hespanhoes.

O Sr. Mont'Alverne: - E' para mandar um requerimento para a mesa.

O Sr. Lopes Moraes: - Sr. Presidente, foi ha muito, que pedi a palavra em consequencia d'uma carta, que recebi d'uma das provincias sobre segurança publica, mas não e ainda fóra de tempo para informar os Srs. Ministros, e ser informado, e não para increpar, declaro, que eu nunca quererei increpar alguem, sem conhecimento de causa, é só com o meio d'informar. Na mesma occasião recebeu aqui o Sr. João Victorino uma outra semelhante eu, Sr. Presidente, direi, que se ha governos, se se fazem constituições, e leis, é para garantir a segurança pessoal, a liberdade individual, e propriedade real, aliás para nada servem, mas, Sr. Presidente, leis sem execução, são mais que nada são nocivas (apoiado) enganam a esperança, a quem espera nellas; retiram a confiança aos legisladores, e aos executores, forçam a vingança particular, animam o crime pela impunidade, e finalmente, em vez da ordem, produzem a desordem, e a anarchia. Eu ignoro até que ponto os Srs. Ministros sabem dos crimes enormes relatados na carta, que peço licença para ler (leu). Tantos crimes, Sr Presidente, se commettem ha muito na serra da Estrella, como diz a carta eu o sei, sim, por ella, que não traz assignatura, e bem póde ser d'algum miguelista seja, ou não, as crimes existem, e os seus effeitos são os mesmos miguelistas, ou constitucionaes criminosos, para mim e a mesma cousa, e peores reputo os constitucionaes, porque desmentem o nome com que se cobrem. Repito: sei que continuam semelhantes crimes, ignoro com tudo se os Srs. Ministros sabem delles, se tem posto meios de reprimi-los, e até que ponto a força das cousas se opponha a essas meios reservo me por tanto de toda a censura, e increpação, bem que estivesse no meu direito faze-la, se tivera conhecimento de causa. Porém, Sr. Presidente, nunca serei tão indiscreto, que sem isso o faça (apoiado). E' necessario reprimir os crimes, sejam miguelistass, ou constitucionaes os que os commettem, e mais

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sensivel é para mim, se elles forem commettidos a titulo de constitucionalismo (apoiado) (leu): já digo, isto que eu disse, hão é para censurar, eu sei que para punir muitos crimes se depende de muita força, entretanto, o meu dever era informar este sujeito me pede, que taça esta declaração na Camara; porque isto póde servir; porque ao menos será uma repressão mural. Porém, Sr. Presidente, criminosos não tem moral, nem vergonha: é indispensavel a repressão legal; aliás deixemo-nos disto, porque leis sem execução só fazem mal.

O Sr. Ministro do Reino: - Sr. Presidente, levanto-me outra vez, para dar explicações a este Congresso a respeito de segurança publica, que realmente é objecto, que deve merecer a maior attenção deste Congresso. Depois das grandes dissenções politicas, a desmoralisação é por toda a parte. Não são só os miguelistas, que assassinam, ha homens, que tem defendido a Constituição , outros que o não tem feito, homens de todas as côres, que tem coberto o paiz de crimes, o governo não póde ser informado, senão pelas authoridades subalternas, das quaes algumas, ainda que da escolha do governo, são com tudo, pela maior parte, eleitas pelo povo. Aqui está assentado um Sr. Deputado, que me revelou um facto de um homem suspeito de assassino, e eu julguei, que o devia demittir do emprego para que fôra eleito e demittio-o logo. O Sr. Deputado Branquinho communicou-me um facto relativo a um alferes de dous de caçadores accusado de muitos assassinios; pedi logo esclarecimentos ao administrador geral, as informações, que elle me deo, não concordavam com as que me deo o Sr. Deputado, sendo o administrador geral homem muito capaz. Devo fazer uma declaração ao Congresso, que o governo a este respeito, fica com as mãos atadas; sem embargo disso, o governo regula-se pelas informações dos administradores geraes, e continúa, com as mais positivas recommendações: tambem se me revelou um facto, de que um façanhudo miguelista tinha sido assassinado dentro do hospital, é um crime horrivel, que deve ser castigado hoje mesmo acabo de receber noticias d'Evora, dizendo-me, que um miguelista foi assassinado por uma multidão. Eis-aqui está o estado do paiz, e o estado em que se acha o governo. Outro dia passaram uns poucos de soldados, e musicos de caçadores n.° 2, e os miguelistas, que os apanharam sós, mataram dous; este estado, é um triste legado das dissenções passadas, e da guerra civil; o meio de o evitar, é fazer castigar severamente todos aquelles, que infringirem as leis. (Apoiado, apoiado.) Todo o homem, que attenta contra a liberdade, e segurança dos cidadãos, é um assassino eu como homem não admitto a pena de morte; como Ministro da Corôa já pedi ao Sr. Ministro da Justiça, que faça nomear um carrasco, e enforcar os criminosos, de outra fórma, sem severo castigo é impossivel poder haver paz, e liberdade: as circumstancias em que se acha o paiz, são estas. - Em quanto ás Guardas Nacionaes, não podam dar todo o auxilio; nós temos pouca força de linha, e essa está mal paga; eu estou certo, que o Sr. Ministro da Guerra ha de empregar todos os meios, para fazer manter a disciplina; quando a Guarda Nacional faltar ás leis, hão de ser castigados, porque um cidadão, porque veste uma farda, não deve ser ladrão, ou assassino. O Governo, quando lhe chegam as participações vem em grande parte alteradas; os juizes eleitos, ou por terror, ou por desleixo, ou por convencia, não fazem os seus deveres. A eleição em Portugal não tem sido uma realidade, uma grande parte das authoridades tem sido miguelistas; uma grande parte de homens, a pretexto de constitucionaes, tem desacreditado o systema. Ha camaras constitucionaes, a quem appellidam de miguelistas, e que o não são, aliás compostas de homens, que tem que perder; até aqui o Governo no estado de revolução não tinha a força necessaria: mas agora e necessario que todos os cidadãos saibam, que tem obrigação de satisfazer á lei. (Apoiado, apoiado.) Esta é, que é a minha politica, e são os meios de que o Governo tem intenção de lançar mão: ha a difficuldade do provisorio estado do poder judiciario; tudo isto faz com que o governo não se ache revestido de todos os poderes; com tudo espero que do andamento do governo representativo com a força do Congresso, e do governo, tudo se ha de conseguir.

O Sr. Presidente: - A hora já deo, e devemos passar á ordem do dia.

O Sr. Visconde de Fonte Arcada: - Eu tinha pedido a palavra a V. Exca. sobre este objecto, que é muito importante, pois que continuando o estado do reino como até agora, será impossivel constituir-nos, por isso rogo a V. Exca. que dê a palavra aos Srs. Deputados, que a tem pedido a este respeito.

O Sr. Presidente: - Se o Congresso assim o quizer, eu pouco me custa dar-lhe a palavra.

O Sr. B. do Bomfim: - Sr. Presidente, apesar de devermos passar já á ordem do dia, rogo a V. Exca., que me conceda a palavra, que peço, porque preciso explicar um facto, a que alludio o Sr. Ministro do Reino, que toca na honra do exercito .... O Sr. Ministro do Reino disse, que ha falta de disciplina no exercito: isto toca na honra delle; toca, repito.....E' verdade, que o Sr. Ministro do Reino disse, que o exercito está mal pago; ninguem o póde duvidar, que está falto de vestuario.....E' verdade, mas faltou dizer, que ha nelle grande falta de officiaes, e outras cousas, capitães faltam oitenta, ou mais de um cento. E' preciso que se façam. Sem officiaes não póde haver exercito, nem subordinação; e sem isso não ha disciplina, nem póde haver ordem, ou cousa alguma que seja boa.

O Sr. Ministro dos negocios do Reino: - Eu estou certo , que todas as vezes que o Governo tem fallado no exercito, lhe tem feito toda a justiça. O Governo reconhece que não tem pago como devia, mas isso e filho das circumstancias quando eu digo, que tal ou tal soldado tem faltado á disciplina, refiro-me ao facto individual, e não ao exercito; assim como quando digo, que tal guarda nacional se conduzio mal, não quero dizer que o crime de trez ou quatro ha de reverter sobre toda a guarda.. (Apoiado, apoiado.)

O Sr. Presidente: - Passa-se a ordem do dia.

O Sr. Derramado: - Não pretendo de modo algum estorvar a ordem do dia, mas peço a V. Exca., que convide o Sr. Ministro da Fazenda, para que, sendo possivel, queira comparecer ámanhã na sessão, a fim de assistir á leitura de um requerimento que eu tenho sobre a meza, relativamente ás pautas.

O Sr. Ministro do Reino: - Não tenho duvida, e muito desejo que a Commissão ouça a Commissão das pautas, para que o negocio se conclua com toda a clareza.

O Sr. Derramado: - Eu não pretendo augmentar os embaraços do Governo, nem estorvar a execução das pautas; mas desejo que ellas se executem de modo, que não comprometam as finanças do estado, nem a agricultura, e industria do paiz.

O Sr. Presidente: - A ordem do dia é a continuação da discussão do artigo 1.º do projecto n.º 23 sobre os vinhos do Douro: na sessão passada tinha o Sr. Deputado 1mto Soares offerecido uma substituirão aos quatro artigos primeiros deste projecto; e entrou-se em uma discussão de ordem sobre qual havia ser o methodo de discussão se havia continuar a discussão do 1.° artigo do projecto, ou se haviam substituisse os 4 artigos do Sr. Pinto Soares: resolveu-se que estes se imprimissem, e mandaram-se distribuir, pare se attenderem na occasião da discussão, então o Sr. Ministro da Fazenda tinha pedido a palavra sobre este objecto para dar explicações, agora o que se pegue, é continuar nesta discussão sobre a ordem, e tem a palavra o Sr. Leonel.

O Sr. Leonel: - Eu não sei se ficou resolvido na sessão

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passada, se se havia discutir as substituições, ou se ficou para ser resolvido hoje.

O Sr. Presidentes: - Não se tomou resolução alguma; estava-se na discussão se a Commissão retirava ou não os quatro primeiros artigos do projecto, para entrarem em discussão as substituições.

O Sr. Leonel: - Então parecia-me que certa mais conveniente discutir, em logar dos quatro primeiros artigos do projecto, as substituições, e fica o resto do projecto, que tem materia ligada com ellas até certo ponto: os artigos cinco, e dahi por diante, não tem nada com o systema apresentada nas substituições que me parecem melhor; e se se concordar nisto, será atais conveniente entrar assim na discussão, e continuar depois com o artigo 5.°, e seguintes do projecto.

O Sr. Pinto Soares: - Sr. Presidente, quando eu apresentei os quatro artigos para substituir os quatro primeiros do projecto, vi com muita satisfação, que foram adoptados pela Commissão: se o Congresso lhe parece, eu poderia esclarecer a questão, mostrando qual era a fórma, que regulava o pagamento dos direitos antes da promulgação do decreto de 2 de Novembro, e dahi se poderá colhêr se são de vantagem os artigos que eu apresentei. E' o que tenho a honra de propôr a V. Exca. para consultar o Congresso. (Falle, falle.)

O Sr. Freire Cardozo: - Eu supponho que para fallar sobre a ordem é preciso fallar sobre o merito dos artigos offerecidos; se fallar por tanto sobre este objecto é estar na ordem, eu direi alguma cousa; do contrario não digo nada.

O Sr. Presidente: - Eu parece-me que é preciso mais ou menos entrar no merito de uma ou de outra cousa; mas nesse caso darei a palavra ao Sr. Pinto Soares para elle expôr o que tinha a dizer, e depois a darei aos outros senhores.

O Sr. Pinto Soares: - Sr. Presidente, antes da promulgação do decreto de 21 de Novembro, os vinhos que davam entrada na cidade do Porto, ou eram para consumo, ou pura exportação; no primeiro caso pagavam logo os direitos estabelecidos pelo decreto de 14 de Julho de 1892, de 6:800 rs. por pipa. - No segundo caso nada pagavam. Eram recolhidos em armazens especiaes, fiscalisados pelas authoridades administrativas, e sómente pagavam os direitos de exportação, estabelecidos pelo decreto de 30 de Maio de 1834, de 12:000 rs, por pipa, quando se exportavam sem attenção á sua qualidade, ou para onde o destinavam. Os depositos mais consideraveis destes vinhos, são estabelecidos em Villa Nova de Gaia, e na margem esquerda do Douro, e os vinhos que ali davam entrada, nada pagavam, se não no momento do seu embarque para exportação. Os habitantes da cidade eterna queixavam-se, e com razão, desta desigualdade: elles eram gravados com o direito do consumo; os seus armazens fiscalisados pelas authoridades administrativas; quando Villa Nova da Gaia, a duzentos passos de Distancia, separada sómente pelo rio Douro, gosava as vantagens de um mercado franco. Esta desigualdade era ainda aggravada pela fórma com que os exactores dos direitos de consumo, os percebiam; esses direitos andavam arrematados, e os rendeiros perpetravam taes extorções e vexames, aponto de não podêr tramitar pela cidade, um açafate ou cesto coberto, que não fôsse por seus agentes devassado. Isto originou queixas feitas, se bem me lembro, pela Camara municipal da cidade do Porto, ás Côrtes de 1836.

Tractou o Governo da querer remediar aquelles males, com o Decreto de 2 de Novembro; mas a experiencia tem mostrado que elle é inefficaz, e que foi augmentar o mal que existia; digo augmentar o mal que existia, fallando do artigo 1.º do regulamento, que obriga ao pagamento de 6:300 rs. em pipa, todo o vinho que dar entrada na cidade do Porto, e Villa Nova da Gaia, seja qual for o uso a que se destine; quer dizer, seja para consumo ou para exportação; fazendo pelo artigo 8.° extensiva esta medida a mais de 112 mil pipas, que alli se achavam armasenadas!!! Em quanto ao direito de consumo, justo é que o vinho que for destinado a esse uso, o pague imediatamente; mas pelo que respeita ao vinho d'embarque, nada mais injusto, nem oppressivo para a lavoura, e para o commercio, do que gravalos com o pagamento de direitos, que só terão de ser encontrados d'ahi a dois, quatro, seis, ou mais annos; isto é, quando se exportarem; sendo os negociantes forçados a distrair para este fim, capitaes que se tornam inuteis, e que poderiam ser applicados com vantagem á lavoura, e ao commercio, dando mais extensão ás suas especulações. - O artigo 1.º do projecto da Commissão estabelece que - as fianças exigidas no artigo 2.° do regulamento, que faz parte do decreto de 2 de Novembro proximo passado, ficam, dispensadas:-quer dizer, que se continham a pagar os direitos na conformidade do artigo 1.° desse regulamento, e apenas ficam dispensadas as fianças: se aprovarmos este artigo, o mal principal, que queremos remediar, continuará, e nascerá um novo mal; que vem a ser o prejuiso do Thesouro pela falta dessas fianças.

Pelos motivos expendidos, julguei insufficientes os quatro artigos do projecto, offerecendo outros que espero ver adoptados pelo Congresso, como o foram já pela Commissão. - Estou longe de pensar, Sr. Presidente, que com estas substituições que proponho, quando sejam aprovados, tenhamos feito uma lei tão perfeita e previdente, como precizâmos para este ramo de nossa producção; mas essas considerações não devem prendemos, para desde já removermos obstaculos, que eu considero vilães, para a prosperidade de traz das mais ricas provincias de Portugal. (Apoiado.)

O Sr. Freire Cardozo: - Eu tinha votado pelo parecer da Commissão especial dos vinhos, não porque me parecesse assás amplo, e previdente; mas porque de dous males escolhia o menor, e por que na discussão especial dos artigos alguma cousa mais se poderia ampliar. Os Srs. da Commissão reconheceram mesmo esta falta, como aqui tão ingenuamente o declarou S. Exa. o Sr. barão da ribeira de Sabrosa, o que na realidade grande honra dá aos membros da Commissão, que fizeram calar os seus interesses particulares diante do imaginado interesse publico. Eu pela minha parte se fôsse membro da Commissão não poderia observar tal defferencia nem para com o Sr. Ministro da fazenda, que parece receava offender o melindre do Governo inglez pela desigualdade dos direitos d'exportação, nem tambem em relação ás apuradas circunstancias do thesouro. Não posso convencer-me do que a este respeito disse, ou se me figurou dizer o Sr. Ministro da fazenda, quanto aos receios em que elle estava, de que o Governo inglez reclamasse, ou usasse de represalias, se abatessemos os direitos do vinho exportado para o Brasil: o Governo inglez é demasiadamente sensato e respeitador do direito das gentes, para se julgar com direito a qualquer reclamação, ou represalia, pelo simples facto de abatermos os direitos dos vinhos, que mandassemos para um paiz longiquo, não só porque vai sujeito a maiores eventualidades, do que aquelle que se exporta para Inglaterra, mas até pela natureza do genero; pois que o vinho que se costuma exportar para o Brasil, é sempre de segunda qualidade, tem menos calor que o importado para Inglaterra, e justo é que valendo menos, venha por conseguinte a pagar um direito menos pesado. Os artigos apresentados pelo Sr. Pinto Soares emendam grande parte destes inconvenientes, e tornam mais amplas as garantias de commercio; por consequencia não posso deixar de adoptalos por substituição aos primeiros quatro do projecto da Commissão; e tambem por que elles tendem a cortar mais pela raiz o pessimo effeito dos decretos de 2 e 30 de Novembro de 1836; decretos que eu supponho até impoliticos, por que no principio de uma revolução (tempo era que foram publicados) convém identificar os interesses mais notaveis com essa revolução, e os decretos não fizeram mais que separalos, não

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só porque elles importavam uma especie de emprestimo, ou adiantamento forçado; mas porque tinham um caracter excepcional, não recahiam sobre uma classe inteira, por isso que os lesados não eram todos os lavradores e negociantes de Portugal, mas apenas (ao menos directamente) os lavradores do Douro; e os negociantes do Porto; os negociantes da cidade eterna, os lavradores do paiz que mais contribue pata a dotação do thesouro! Sei bem que o Sr. Ministro da fazenda, fez por certo um grandissimo sacrificio, quando consentio na publicação destas medidas; mas tão difficeis, tão arduas eram as circunstancias do estado! Além disso os decretos eram immoraes, não só pelo seu effeito retroactivo, opposto a todas as regras de direito, e razão natural em que este se funda; mas porque illudiam a boa fé dos contractos, impondo uma contribuição á immensidade de vinhos armazenados em villa nova da Gaia; e por certo quando seus actuaes proprietarios os compraram, não foi com intenção de que haviam de pagar direitos, a que não eram obrigados segundo o decreto de 30 de Maio de 1834, se não quando esses vinhos fôssem exportados. Esta inopinada medida podia abalar as fortunas mais bem estabelecidas, e diminuia um quinto o numero das compras. Tambem era muito illusorio o effeito dos dous decretos, em relação aos interesses da fazenda pública, por isco que deviam encontrar uma resistencia legal, obrigando a pagar um direito individuo, e porque a paga d'esse direito era verificada de um modo tal, que o thesouro pouco lucrava: refiro-me á concessão das fianças e letras, ao menos respectivamente ao vinho que vai dando entrada no Porto, o que junto á diminuição d'exportação, resultado necessario desta medida; tornaria illusoria a intenção do legislador. Algumas razões se tem dado para santificar as disposições dos taes decretos, mas nenhuma dellas colhe. Diz-se que estas medidas tinham sido apoiadas ou aconselhadas por alguns negociantes do Porto. Foram esses quatro, ou cinco; mas ainda quando fôssem vinte, ou trinta não consistia em consultalos, o meio de saber a vontade do commercio do Porto, como tão judiciosamente diz a associação mercantil d'aquella cidade: o corpo ao commercio tem hoje uma representação legal, é unico orgão que pode exprimir o seu pensamento, e essa mesma associação não propoz similhantes medidas, antes reclamou sempre contra ellas. Tambem não justifica as disposições dos decretos, o dizer-se que tinham sido concebidas pelas administrações passadas. E Deos nos livre que se dissesse do ministerio da revolução de Setembro, do ministerio patriota, do ministerio das refórmas, das economias, o mesmo que em 1828 se disse do Governo de D. Miguel, que lançando por terra todas as disposições feitas em nome da Carta, não perdoando a um ponto, a uma virgula, salvou com tudo as medidas que lhe proporcionavam meios pecuniarios! O actual ministerio parece que pouco ou nada achou bem, do que tinham feito as passadas administrações, tratando de reformar, compôr, e recompôr todos os variadissimos ramos da pública administração; e então não era decente que se adoptassem estas, que pésam sobre a lavoura e commercio do Porto, só porque se lhe entolhou podiam trazer mais alguns contos de réis ao thesouro, uma vez que ellas não eram conformes á equidade e justiça. Approvo por tanto os quatro annos da substituição na sua generalidade, apresentados pelo Sr. Pinto Soares, e lhe dou meus cordiaes parabens, pois que deste nitido respondo victoriosamente aos seus detractores, aos que se lembraram de dizer, que tinha sido. V. Sra. Quem aconselhava a adopção dos seus decretos ao ministerio.

O Sr. Barão da Ribeira da Sabrosa: - Já declarei, como membro da Commissão dos vinhos, que adoptava a substituição, apresentada polo Sr. Pinto Soares; não adopto só, porque ella melhora em parte, o ramo principal do nosso commercio; mas tambem porque o Sr. Ministro da fazenda se não oppõe a isso; pois entendo, que em materia de finanças, quando é respectivo Ministro põe o veto, nenhuma passa. Por dous motivos convenho na medida: primeiro por que a dispensa absoluta das fianças, póde prejudicar a fazenda, segundo porque entendo, que a permissão d'exportação para os Estados Unidos d'America, com o direito d'um por cento, tambem favorece a exportação. Eis-aqui as differenças notaveis da substituição. O resto, com algumas pequenas emendas, está no projecto da Commissão.

Quanto ao que acaba de dizer o meu nobre amigo, que me precedeu, relativamente á associação mercantil do Porto, é necessario responder-lhe alguma cousa. A associação representou logo contra os decretos de 2 e 30 de Novembro, tanto ao Governo, como ao Congresso; e assim usou do seu direito; mas tambem é verdade, que uma parte do commercio do Porto se conformava em parte com essa medida. A associação diz, que não foi ella, que deu sancção á medida, quando em projecto: é verdade que não; mas alguns negociantes, pessoalmente, o fizeram. Alguns negociantes, chamados a casa do visconde de S. Gil de Perre, em tempo da passada administração, alli convieram na medida: isto tambem é verdade. A mesma associação é, quem o declara, e para prova disso, lerei algumas de suas proprias expressões. ( leu, e proseguiu.) A junta da companhia hoje é, apenas uma Commissão de liquidação da companhia; mas é certo, que a praça do Porto ainda hoje tem medo da companhia, que no meio de seus abusos, tambem algumas, vezes dava força á lavoura, hoje sem recurso, contra qualquer combinação dos, compradores. (Continuou a ler, e accrescentou:) Isto foi só para provar, que a medida tinha sido sujeita á approvação do administrador, da alfandega, e de alguns negociantes do Porto; e a associação funda-se, e com justiça, em que não foi ouvida. Concluo, que como individuo, e como membro da Commissão, adopto a substituição do Sr. Pinto Soares, com pequenas alterações, que terei a honra de propôr na marcha da discussão; e então poderia ao Congresso concordasse na admissão da mesma substituição, por que o nosso principal desejo, e interesse é, que os decretos sejam, por qualquer modo derogados com brevidade.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: - Este decreto de 2 de Novembro não merece tanta censura, como se lhe tem feito. Eu tomo sobre mim toda a responsabilidade d'elle; mas note-se, que o Governo, logo depois da revolução, estava occupado nas medidas geraes de segurança publica, e pôr tanto cada um de nós, Ministros, inteiramente occupados, em sua repartição. Quando depois tomei conta da pasta da fazenda trouxe-me o Sr. visconde de Sá este decreto assignado por Sua Magestade; notei-lhe, que me parecia cercado de difficuldades; mas S. Exca. disse-me, que estava muito meditado, e feito sobre os trabalhos de algumas repartições. Ora o decreto tinha uma grande duresa; esta grande duresa era o artigo 8.º do augmento, relativamente aos vinhos armasenados; porque isto fazia ao commercio do Porto pagar uma somma talvez de oitocentos contos immediatamente. Se o Governo, depois da revolução, não tivesse os meios para segurar a mesma revolução, o decreto devia ter sido executado; mas a associação commercial não se limitou realmente a combater aparte vulneravel do decreto, combateu-o artigo por artigo; nada achou bom, e realmente fez uma opposição systhematica, e de acinto, e pelos documentos officiaes, que existem na secretaria, consta, que esta opposição não era sincera: eu entendo que o seria até certo ponto; por exemplo, o artigo 8.º Por consequencia as suas reclamações não eram fundadas, e estão em contradicção com outras suas reclamações; entretanto os dividendos pagaram-se em Londres não foi necessario recorrer ao patriotismo dos negociantes do Porto. As suas representações foram feitas em taes termos que eu como Ministro da Corôa julguei, que não devia considera-las com a cortezia que mereciam, e com que em outras circunstancias os teria tratado. Mas elles pegaram em si, e disseram, é a cidade do Porto, que se quer opprimir;

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a cidade eterna. Mas todos sabem que o povo da cidade eterna, é o povo que ficou com o libertador, e não os que fugiram, os que fugiram diante do libertador, e foram os negociantes os primeiros, que fugiram; e os que ficaram foi para especularem com a fome, e a miseria; por consequencia não posso cubri-los com a gloria ganhada pelos cidadãos do Porto, nem com os que especularam com a sua fome, e miseria, (apoiado, apoiado) e foram o mais poderoso auxiliar contra o Governo da tyrannia. Fallo assim deste, ou d'aquelle individuo, a quem cae tal inculparão; não fallo na associação commercial, cuja maioria é de cidadãos fieis á causa da Rainha, e da liberdade; mas não quero que usurpe para si a gloria da cidade eterna. O Governo nas suas difficuldades não suspendeu este decreto directamente; mas não lhe deu execução: a commissão, que foi nomeada trabalhou com zêlo, e desejos de acertar. Este trabalho é erriçado de difficuldades; porque o commercio dos vinhos do Douro tem muita especialidade; porque, é necessario considerar a exportação não só para todos os pontos do mundo, mas para Inglaterra, o nosso principal consumidor, o unico, porque o mais são fracções, que não devem entrar em calculo de nenhum homem d'estado, mas o direito de consumo, é muito consideravel pelo resultado, que apresenta, mas não pelo que tem produzido; porque tem sido só trinta e quatro contos, nem pelo que poderá produzir pelo sistema de fiscalisação, porque não chega a duzentos contos, mas a cidade de Lisboa tambem importe muito, e paga um grande direito de consumo, e é necessario, que isso não pese só sobre uma cidade, ainda que deva pesar com mais força sobre, as grandes cidades; porque é ahi onde se agglomera uma povoação immensa, inutil, que destroe o paiz, e que seria mais vantajosa derramada pelas provincias; porque nas capitães ha muitas vantagens especiaes, que não existem nos desgraçados habitantes das provincias. (Apoiado.)

Ora eu entre todos os sacrificios, que tenho feito ao meu paiz, um só me restava fazer; era apresentar o decreto de direito de consumo em todos os generos importados na cidade do Porto, á similhança, ad instar, de Lisboa. Este era o unico sacrificio, que me restava a fazer ao meu paiz. - Eu Deputado pelo Porto, honrado por aquelles honrados habitantes, vi-me obrigado a impor-lhe uma lei de ferro, senão fôsse o nobre Conde da Taipa, e outros Deputados que me obstaram; porque me disseram, que uns poucos de contos de réis não deviam entrar em balanço com um povo o baluarte da liberdade, e da civilisação - que se elles se esfriassem, a Constituição cahia por terra, e que era necessario considerar mais as vantagens moraes, que as pecuniarias! Entretanto o patriotismo, e a dedicação á causa do meu paiz estava consumado; porque tinha promulgado o projecto do consumo. Este direito de consumo por arrematação tem rendido 94 contos, e é o flagella dos habitantes do Porto. - Por 94 contos de réis foram flagellados os habitantes do Porto com uma rigorosissima fiscalisação. - Elles queixavam-se d'esta terrivel fucalisação, que importava uma grande escravidão; porque as suas casas eram abertas a todo o tempo aos malsins dos arrematantes - outros queixavam-se de que suas propriedades valiam menos, que as de Villa Nova de Gaia, e pagavam direitos de consumo, que não pagava Villa Nova, quando Villa Nova era uma pane integrante da cidade do Porto. Era este acontecimento, que tinha estado um cento de vezez para perturbar a paz da cidade. Este inconveniente tinha sido presente ao Governo, e mesmo as administrações passadas tinham querido remove-lo com todo o zelo, bem como todas as authoridades que tem algum amor ao seu pau; porque a difficuldade era grave, e a anarchia estava proxima. Assim era necessario livrar o povo do Porto dos vexames da fiscalisação interior, muito severa. Isto não se podia fazer senão pelo systema de barreiras: era necessario estende-las para Villa Nova de Gaia, e para as do Porto, para que não dissessem, que eram tractados como enteados, e os de Villa Nova de Gaia como filhos.

Sorri, quando vi a Camara de Villa Nova fazer uma representação, pedindo providencias; tive piedade d'ella, porque estava a expirar, clamando contra a tyrannia, e injustiça do governo. Ora, Sr. Presidente, eu conheci que a arrematação dos direitos de consumo suscitava um grande embaraço; porque ainda que o vinho da Porto, que havia de exportar-se, era mais de 100 pipas, os negociantes, quero dizer, os especuladores, que não eram amigos da revolução, e que estavam feridos por essa disposição d'aquelle decreto, haviam de empregar todos os meios para não se comprarem os vinhos do Douro, e não podendo concitar; como alguns pertenderam, as classes inferiores do Porto, e Villa Nova, classes eminentemente patriotas, e amigas da ordem, quizeram pela fome levar a provincia de Traz-os-Montes, e parte da Beira, a declarar-se contra a nova ordem de cousas. Assim, considerada a questão pelo lado do Governo, eu estou persuadido, que os mesmos embaraços para a exportação hão de continuar a existir, modifique-se, ou não este decreto; mas entendo que se salva o Congresso, e o Governo de imputações, que ainda, que infundadas, não podem deixar de parecer justas aos olhos dos menos providentes, e esclarecidos..

Ora o cálculo dos novos direitos de consumo, pelos officios do prefeito do Porto de 9 de Setembro de 34, calcula-se render o vinho maduro............deduzidos vinte por cento da fiscalisação deve render ........ A agoardente deve render........abatendo os 20 porcento da fiscalisação ......... Por consequencia este cálculo dá em direitos de consumo no Porto......................réis.

Este cálculo julgou-se muito exaggerado, apesar de feito na prefeitura com muita miudeza. - Mas o Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa fez-me observar, que aquelle direito embaraçava a exportação, e ficava aquella provincia reduzida á ultima extremidade, e então não podia pagar nem decima, nem nenhuma contribuição. Ora o deficit em Portugal só se póde preencher por uma decima rural, estabelecida por arrematação, ou por um systema directa, o que eu heide propôr ao Congresso. Só nós agora reduzirmos as provincias á miseria, nenhuma contribuição se poderá impôr, e o deficit não se ha de preencher.

Ora um Sr. Deputado disse, que eu entendia, que em quanto ao Brasil o ministerio Inglez discordava........O ministerio Inglez não concorda, nem discorda. Eu tenho declarado, que sou partidista da alliança commercial, e politica da Inglaterra: - digo, que o grande consumidor dos nossos vinhos é a Inglaterra; por consequencia nenhuma outra nação póde ser-nos tão vantajosa como a Inglaterra. Da mesma maneira posso eu provar com os discursos dos mais brilhantes oradores do parlamento inglez, em todas as épocas, que a alliança de Portugal é summamente necessaria á grandeza, e preponderancia d'Inglaterra: - podia citar n'este sentido muitas passagens deminentes oradores, que tenho notado. Por consequencia esta alliança, que tem produzido este grande effeito politico, não depende do governo, está na natureza das cousas. Ora agora eu como ministro da Corôa, como homem politico, não admitto supremacia nem ingleza, nem franceza, nem hespanhola, nem brasileira, nem romana: nós como nação portugueza, havemos de governanos pelas nossas leis. Se nós fôssemos uma nação, que não podesse subsistir por si só, haviamos de unir-nos a qualquer nação, que nos conservasse como parte integrante da sua nação; mas eu persuado me, que nós podemos continuar a existir certo monarchia (Apoiado, apoiado). Mas uma cousa é preponderancia de um gabinete sobre nós, outra cousa são relações commerciaes. Então digo eu, que a Inglaterra não a considero senão como o nosso principal consumidor, e é com Inglaterra, que devemos ter todas as contemplações, que ella merece; mas a respeito da especula-

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ção dos vinhos, ha uma grande difficuldade. A administração passada nesta parte calculou bem - não fez caso da exportação dos vinhos para outras partes do mundo; porque a exportação para o Brasil, que tinha chegado a 8 mil pipas, tinha sido reduzida nos ultimos tempos a 700, e tem diminuido para a America Ingleza a exportação era de 2 mil pipas, e foram especulações, que não produziram grandes resultados: por consequencia nós não podemos considerar a questão dos vinhos se não em relação á Inglaterra. Ora quanto a mim, eu conheço que a Inglaterra tem interesse de conservar a nossa alliança.

Quanto á qualificação, o commercio tem-se opposto a esta idéa, porque o nobre Deputado explicou, o que eram as qualificações antigas, que eram uma medida arbitraria, e então lembrei-me de um meio de qualificação indirecto, declarando, que todo o vinho, que fôsse para Inglaterra era de primeira qualidade, e para a America de segunda.

Dizia eu, o que se exporta para Inglaterra é de primeira qualidade; porque paga mais direitos, e póde exportar-se para todas as partes do mundo; porque sempre ha de conservar o seu credito; - e o segundo póde ir para o Brasil, e não vai diminuir o credito dos nossos vinhos na Inglaterra; entretanto o ministerio entendeu isto na sua opinião particular; entretanto o que entendo é, que a questão dos vinhos não póde ser olhada em geral, se não com relação á exportação para Inglaterra. Os nossos vinhos no Brasil são tem podido sustentar a concorrencia; entretanto não tenho duvida, que isto fique sujeito ás reclamações, que se podem fazer......

Debaixo d'este ponto de vista, digo, que eu teria adoptado o primeiro projecto; mas attendendo não só ás ponderações feitas pelos Srs. Deputados, e á miseria que podia resultar á provincia da Tras-os-Montes, não tenho duvida em annuir.

O Sr. S. Payo e Araujo: - Eu creio que, e que está em discussão é verdadeiramente uma questão de ordem complicada com uma questão da merito comparativo: isto é, averiguar qual é melhor, se os quatro artigos do projecto offerecido pela Commissão, se os quatro que para os substituir offereceu o Sr. Pinto Soares. Eu tive a honra de pertencer a essa Commissão, e fui um dos que assignaram esse projecto; mas não tenho duvida nenhuma em annuir á substituição offerecida. Aqui ha duas circumstancias a meu ver, uma é o augmento de fiscalisação, a fim de que não hajam extravios; mas isto pertence ao Governo, e já para isso Sr. Ministro pediu ser habilitado: estou por tanto de accordo nesta parte. Em quanto porém á deficiencia de direitos do que se exportar para a America, não duvido em que passe; mas parece-me que a provincia de Traz-os-Montes, pouco ha de lucrar com isso; porque tambem me parece que a exportação para alli, ha de ir diminuindo cada vez mais; porque os vinhos que alli concorrem mais, ião osde Lisboa, e da Figueira. Eu posso como testemunha occular dizer, que os vinhos conhecidos naquelle paiz por = de Lisboa = são se que mais se estimam: e isto é tanto verdade, que o vinho chamado do Mediterraneo, não o querem lá, e costumam mistura-lo com o vinho branco, a que chamam palheta. O vinho do Douro, sendo bom, como é, não é com todo aquelle de que mais gostam alli, por ser muito forte, e talvez pelo amargo que tem. Parece-me por tanto, Sr. Presidente, que o Douro pouco ha de lucrar com o estabelecimento deste direito differencial. Se com tudo isto não fôr dar occasião a reclamações, eu não tenho então duvida em approva-lo.

O Sr. Barjona: - Não obstante a precisão de economisar o tempo, e apesar da necessidade de havermos quanto antes uma lei que regule os direitos dos vinhos do Douro; não posso deixar de fazer algumas reflexões sobre o projecto em discussão, até porque receio que ella venha até certo ponto a ser um privilegio exclusivo para os lavradores do Douro.

Eu entendo, Sr. Presidente, que nas terras grandes deve haver direitos de consumo; e que no Porto especialmente não póde deixar de os haver: mas não me parece justo, que pelos vinhos da Bairrada, se pague o mesmo, que pelos do Douro. Allega-se que em Lisboa, por todos os vinhos, ou elles sejam bons ou máos, se paga sempre o mesmo direito de consumo: porém uma irregularidade não justifica outra; e um exemplo tirado de Lisboa não póde terá mesma força, que um tirado da propria cidade do Porto. Com effeito, pelos vinhos verdes paga-se metade dos direitos a que estão sujeitos os vinhos maduros; e não ha similhança entre os vinhos do Douro de primeira qualidade, e ainda es melhores da segunda, e a generalidade dos vinhos da Bairrada. Devemos por tanto, a fim de nos conformarmos com os principios de justiça, resolver que nas barreiras de Villa Nova de Gaia, os direitos de consumo sejam menores alguma cousa. Este principio corrobora-se ainda até um certo ponto, pela idéa que os habitantes d'uma terra devem pagar direitos de consumo, que sejam tambem em proporção com o gráo da commodidades da mesma terra: e posto que Villa-Nova, e Porto sejam quasi a mesma terra, não o são com tudo exactamente.

Mando pois a minha emenda para a mesa, que é a seguinte:

Os vinhos que entrarem pelas barreiras de Villa-Nova de Gaia, sendo maduros, pagarão de direitos de consumo 3$150 rs. por pipa; e sendo verdes, 100 rs. por almude.

Esta diminuição nos verdes, poderá estender-se a todas as barreiras.

O Sr. Presidente: - Eu entendia que esta discussão não era perdida: no entre tanto póde perguntar-se ao Congresso se consente, em que a Commissão retire os quatro artigos do seu projecto, para em logar delles ficarem subsistindo os quatro artigos offerecidos pelo Sr. Pinto Soares. Proponho por tanto isto.

A Camara conveio.

O Sr. Presidente: - Entra por tanto em discussão o 1.º artigo da substituição do Sr. Pinto Soares.

O Sr. Barjona .................................

O Sr. B. da R. de Sabrosa: - Sr. Presidente, não póde haver cousa mais admiravel, do que o discurso do Sr. Barjona, o qual mostra, que elle não tem dado toda a attenção, de que é capaz, a esta materia; d'outra sorte não viria dizer ao Congresso, que a Bairrada, e a Anadia ficavam prejudicadas. Eu espero, que o diario do governo transmittirá estas palavras, que vou dizer, e não tenho medo de ser combatido. Os vinhos da Bairrada são vinhos maduros, e não haverá um só lavrador, que queira dizer, que os seus vinhos são verdes; porque se o dizem, pagam logo 3150 sómente; mas tambem ninguem os bebe, ninguem os quer; ora ser vinho maduro, e querer pagar como verde, é inadmissivel. Além disto, o projecto de lei não é contrario aos interessas da Bairrada; pois é sabido, que os vinhos da Bairrada não são consumidos no Porto, senão quando não ha vinhos do Douro por igual preço. E porque? Por a especialidade de se consertarem menos, e terem menos corpo para consumir a agoardente, que seria mister deitar-lhes. Dizer o Sr. Barjona, que se lhes fecha a barra do Porto, quando o projecto quer abrir-lh'a por alli tambem, para onde vão os vinhos do Douro da segunda ordem, não concebo essa argumento. Nós desejamos, que os vinhos da segunda ordem paguem só um por cento, e este pedido é só para o Douro, pois a Bairrada já o gosa por Aveiro, e pela Figueira, e gose o tambem pelo Porto. Donde vêm o egoismo? Em quanto durou a companhia dos vinhos, não entrava no Porto uma só pipa de vinho da Bairrada; e com razão clamava ella, porque estava em estado de escravidão; mas agora, se eu entendi o nobre Deputado, não quer só ser livre; quer ser senhora; quer entrar no Porto sem pagar com igualdade. A. Bairrada tem prosperado, o que eu estimo muito; mas não

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póde querer, que o Douro morra. Eu sou possuidor de bastantes vinhas no Douro; mas se me fosse possivel troca-las por vinhas da Bairrada, fa-lo-ia de bom grado. O mesmo terreno, que na Bairrada produz dez pipas de vinho, não produz uma sobre as montanhas d'ardesia, onde se colhe o bom vinho do Douro. E porque é bom? Porque é fino, e alchoolico? Porque essa ardesia preta absorve todo o calorico durante o dia, para o reflectir de noute sobre essas cepas mirradas nos ultimos mezes do estio. Ninguem cultiva uma pipa de vinho fino nas bordas do Douro, e do Pinhão, etc., etc., por menos de dez, ou doze mil réis; e na Bairrada nem custara mil e seiscentos. Além disto; a despeza do lavrador na Bairrada acaba com a vindima; e no Douro principia outra maior com a aguardente nos toneis. E' minha persuasão, que o lavrador da Bairrada, vendendo si doze mil réis, vende melhor que o lavrador de Cottas, ou do Corgo, a trinta mil réis. Ora, o Sr. Deputado disse, que os vinhos da Bairrada não pagam direitos de consumo. Oh! Sr. Presidente! no Porto sempre se pagou direitos de consumo. Para prova lerei a tabella dos que alli se pagam, é minucioso; mas é preciso faze-lo(leu): por aqui se mostra, que sempre se pagaram direitos de consumo; agora a questão é sómente com Villa Nova, que quer um privilegio, que poderia transforma-la em villa de contrabandos. Permitta-me o nobre Deputado, que eu lhe diga quanto dista Villa Nova do Porto: sómente a largura do rio. Então o Porto, a cidade eterna ha de ser obrigada a pagar direitos de consumo, e Villa Nova, não? Villa Nova ha de gosar todas as vantagens da cidade, e não ha de pagar; e o Porto sim! Bella doutrina! Para concluir, Sr. Presidente, nós não pedimos privilegio, pedimos a execução da lei, pela qual os direitos devem ser iguaes para todos os vinhos exportados. E' uma grave, e intoleravel injustiça, que eu pague mais vinte por cento, que os vinhos brancos da Estremadura, que se vendem por alto preço. Igualdade de direitos d'entrada, e de saída, é o que pedimos; é impossivel recusar-se, particularmente para os vinhos da segunda ordem.

Quanto vinho se consome em Villa Nova? Tres mil pipas. E pensará alguem, que o motivo de tamanha opposição venha de tão pequena causa? Não, Sr. Presidente; a causa é outra. Quer-se fazer o contrabando, defraudar os direitos, e então condemna-se toda a medida, que possa tender a evita-lo, e a mostrar nos armazens a differença entre o consumo, a exportação, e entrada. Diz-se que visitar um armazem, é violar a casa do cidadão: absurdo. Um armazem, não é a casa do cidadão. Em todos os paizes, e principalmente em Inglaterra, os armazens, os docks mesmo, aonde estão os vinhos do Porto. estão sujeitos ao varejo d'alfandega, etc. Em Villa Nova não se quer, que se saiba, que aquelle que recolheu cem pipas de vinho, se vendeu para consumo cincoenta, e se exportou trinta, deve ter ainda perto da vinte pipas, ou o consumio por contrabando.

O Sr. P. Basto, Senior: - Tem-se fallado a respeito dos povos da Bairrada, dizendo se que elles se queixam; está na mesa um requerimento dos póvos da Bairrada, que pedem esta providencia, que agora se vai dar; pedem a revogação destes dous decretos; por tanto não é de justiça, que se esteja a fazer censura aquelle povo, quando elle pede o que se está praticando.

O Sr. Presidente: - Está Sobre a mesa, e por tanto lê-se. (Leu-se.)

(Todos os Srs. Deputados se levantaram dos seus logares, para de pé darem attenção á leitura).

O Sr. Barjona: - Mas que pedem, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Pedem a revogação dos decretos de 2, e 30 de Novembro.

O Sr. Leonel: - Sr. Presidente, já se ouviu hoje neste Congresso um requerimento de sessenta officiaes de marinha, que se queixão de se lhe não pagar. Como este temos ouvido todos os dias, e em toda a parte, e não é só da falta de pagamentos que se queixam, aquelles a quem senão pague: queixa-se toda a outra gente; o tendeiro queixa-se que se não paga no empregado publico, porque este lhe não paga a sua fazenda; e não é só o tendeiro que se queixa, é todo o mundo; e todo o mundo tem razão. Qual é o remedio para evitar estas queixas? E' pôr algum tributo; até aqui todos dizem são precisos; mas quando se lhe diz pague vem, cá este tributo, respondem eu não! Diz-se o mesmo a outro, diz elle, eu tambem não; o mesmo responde o outro, e o outro!... Todos querem que o Governo pague, que se ponham tributos, menos cada um a si. Ora, Sr. Presidente, nestes termos não se póde governar, nem se póde constituir o paiz. Não póde haver socego, nem segurança, e tudo o mais que é preciso; então o que havemos de fazer? Attender a estas cousas, a ir pondo tributos, não ha outro remedio; se os Srs. Deputados não estão dispostos a isso, podem ir-se embora; porque não cumprem o seu dever.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: - A palavra, para responder ao Sr. Leonel.

O Sr. Leonel: - Sr. Presidente, é para confirmar, o que elle disse, que eu apontei esta razão; agora vamos ao negocio por miudezas. Quanto paga Lisboa pelo consumo de uma pipa de vinho? Doze mil réis, pipa de vinte e seis almudes: quanto queria que se pagasse no Porto por cada pipa de consumo? Seis mil e trezentos, pipa de vinte e um almudes, que equivale a 30 de Lisboa, ora, Sr. Presidente, eu não concordo que o Porto haja de pagar muito menos do que paga; Lisboa, porque a certos respeitos o Porto é melhor do que Lisboa; para provar isto basta dizer, qual das duas terras e povo é mais rico? E' o do Porto. Ora, Sr. Presidente, não podendo por consequencia haver questão na necessidade de que no Porto se pague este tributo, vamos a Villa Nova: em Villa. Nova, Sr. Presidente, podem fazer-se quantas divisões quizerem; Villa Nova fisicamente é o Porto; e qual é razão por que Villa Nova não ha de pagar, e ha de pagar o Porto, quando, apesar do commarCio ser feito por negociantes do Porto, muito mais gente de Villa Nova lucra neste negocio, do que o Porto, porque alli é armazenado o vinho; por isso lucre o proprietario do armazem; d'alli são os tanoeiros; era fim d'alli é muito maior o numero de pessoas que ganha, do que do Porto, e por tanto Villa Nova tira mais vantagens a este respeito do que o Porto; e por tanto qual a razão porque não ha de contribuir, gozando Villa Nova das mesmas vantagens de que goza o Porto? Deve pagar. Sr. Presidente, a razão, pela qual se diz, que os habitantes das grandes cidades hão de pagar mais, é por terem maiores commodidades, na verdade esta razão é fundada; mas esta razão assiste tanto em Villa Nova como no Porto, porque Villa Nova tem illuminação como o Porto etc.; goza das mesmas vantagens que o Porto a todos os respeitos, com a differença de mais um quarto de hora: ora a razão, que se apontou, de que os habitantes de Villa Nova não podiam ir ao theatro em noites chuvozas, porque se molham, Sr. Presidente, os habitantes do Porto hão de molhar-se quando chover, e alguns habitantes, que ficam ao redor do Porto, hão de molhar-se mais que os de Villa Nova; por consequencia essas gotas de agua que alguem ha de apanhar, não é argumento. Agora, Sr. Presidente, vem os interesses de Bairrada: pergunto eu, e Barrada quer leis? Quer. Quer gozar de todos os beneficios da sociedade? Quer. Quer tudo isto? Logo ha de pagar; não quer? Se se me disser que não, podemos nós tambem dizer: tudo quanto a nação póde dar de beneficio aos seus cidadãos, ficam; excluidos os povos de Bairrada: elle quer isto? Não quer! Então hão de pagar. Quanto á differença dos vinhos de Bairrada e Porto, já respondeu o Sr. baião: ora demais é preciso attender, que os vinhos de Bairrada não acham consumo, senão quando falta uma certa qualidade de vinho do Douro, de mais elles não tinham entrada no Porto no tempo da Companhia, por tanto já se vê que são hoje mais favorecidos; por todas estas razões entendo que elles devem pagar, e por isso voto contra a substituição do Sr. Barjona.

O Sr. Fernandes Thomaz: - Sr. Presidente: eu estive

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muito attento ao discurso do Sr. Ministro do reino sobre este objecto, e como elle fallou na generalidade, tocou por consequencia a questão em todos os pontos de vista, debaixo dos quaes se póde encarar: eu confórmo-me em muita parte com as idéas ao Sr. Ministro do reino, e muito principalmente com o modo porque elle terminou o seu discurso: elle disse em conclusão, que esta era uma questão muito difficultosa, porque tinha relação com os interesses mais vitaes do paiz, e por consequencia que a lei que agora se fizesse, fosse privisoria, por isso mesmo que nós não tivemos o tempo nececsario para meditar em materia de tanta importancia, com aquella madureza necessaria. E' nesta idéa que eu continúo a opinar, para que tudo aquillo que agora se estabelecer seja provisorio, em quanto, senão fizer uma lei mais segura a este respeito (apoiado, apoiado), e para a qual se precisa de tempo (apoiado).

Ora agora entrando na. materia do primeiro artigo, parece-me que o Sr. Barjona não deixa de ter razão no requerimento, que fez: Sr. Presidente: é necessario, que os Srs. Deputados tenham em vista, que os vinhos da Bairrada hojo não tem a mesma extracção, que tinham algum tempo; porque em outro tempo ia uma grande quantidade para o Brazil, e hoje por circumstancias, que de todos são reconhecidas, não vão; deixaram de ter essa sabida; e se nós lhe taparmos a unica porta, que elles tem aberta á sua extracção, de certo arruinaremos uma grande parte do territorio portuguez, cujo principal meio de interesse, e industria agricola é o vinho: o preço dos vinhos da Bairrada no anno passado foi de 20 a 22$ réis a pipa, e depois que se estabeleceu o direito de consumo: aquelle preço diminuio proporcionalmente, os vinhos da Bairrada para chegarem ao Porto fazem uma despeza de 7000 réis por pipa; por consequencia attendendo-se aos direitos, que elles pagam, á despeza, que ellas fazem na jornada para o Porto, ver-se-ha qual é a depreciação do valor daquelles vinhos, e então a agricultura perde-se.

Disse o Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa, que não sabia a razão porque Villa Nova, estando tão proxima do Porto, hão da ser izemptos de direitos de consumo os vinhos, que se consumissem alli, e não aquelles, que se consumissem no Porto; mas isto, Sr. Presidente; acontece em toda aparte aonde são estabelecidos os direitos de barreira: em Lisboa, tambem aonde existem direitos de consumo ainda maiores que na cidade do Porto, passadas as barreiras de Lisboa os generos depois se acham mais baratos; da mesma maneira que em França, apenas se passam as barreiras de Pariz, os generos, e nestes o mesmo vinho, são mais baratos; e então por esse lado, Sr. Presidente, ha a mesma razão, entre Villa Nova, e o Porto.

O Sr. Leonel começou dizendo, que os empregados publicos não tinham que comer; que o governo precisava de dinheiro; e d'aqui concluio - logo pagem os lavradores da Bairrada! logo estabeleça-se esse tributo!

Disse mais, que a Bairrada queria leis; que a Bairrada queria bom governo; e d'aqui concluiu tambem,- logo a Bairrada pague: - a Bairrada quer pagar; mas não quer pagar mais que os outros pagarem; a Bairrada quer uma justa e igual distribuição de tributos; logo o Sr. Deputado quiz fazer uma injustiça áquella parte do territorio portuguez: tambem disse, que no tempo da companhia sempre os vinhos da Bairrada pagaram direitos de consumo no Porto, mas é porque no tempo da companhia tambem haviam abertos os portos do Brazil, a nenhuma concorrencia alli de vinhos estrangeiros, e então tinham uma extracção muita grande os vinhos da Bairrada.

Eu o anno passado, Sr. Presidente, tive á honra d'advogar os interesses dos lavradores dos vinhos, e negociantes da cidade do Porto, a fim de que lhes fossem diminuidos os direitos de exportação dos vinhos, que sahissem pela Foz do Douro para os portos da America; hoje conservo-me n'essa mesma idéa; mas ao mesmo tampo, que desejo se facilite quanto fôr possivel a exportação dos vinhos pela Foz de Douro, não quero tambem que se lhe imponham, grandes direitos, á importação dou vinhos para o Porto; porque seria contradictorio querer facilitar por um lado a sabida dos vinhos pela Foz do Douro, e ao mesmo tempo não facilitar a entrada do outros partes de oude podem vir os vinhos; por consequencia se acaso queremos facilitar a exportação, devemos tambem facilitar a importação: e demais, Sr. Presidente, os vinhos da Bairrada são precisos na cidade do Porto, porque com elles vão lotar tombem os vinhos do Douro (riso)... Agora a respeito de um outro liquido espirituoso, a jerupiga, tambem não devemos admittir grandes direitos; este espirito muito se fabrica hoje na Bairrada; e esta jerupiga he reputada (segundo m'informam) melhor, que aquella que se fabrica no Douro; e em consequencia de grandes direitos que paga, a jerupiga do anno passado não se vendeu, e ainda hoje está em ser por não haver, quem a compre; ora parece-me pois que sem disconveniencia alguma para os vinhos do Douro, e com grande conveniencia para os vinhos da Bairrada, poderemos admittir aquillo que propõem o Sr. Barjona; e eu concluindo digo, que approvo a substituição do Sr. Barjona e reprovo n'essa parte o artigo 1.° do projecto.

O Sr. Lacerda: - Sr. Presidente, eu pedi a palavra a V. Exca. quando ouvi dizer a um Sr. Deputado, que este projecto de lei, era um exclusivo a favor dos vinhos do Douro. Parece-me que não ha nada tão injusto, como o avançamento d'esta proposição, O Douro, Sr. Presidente, é exactamente uma superficie de 16 legoas quadradas; porque tem de cumprimento apenas 8 legoas, de largura na maior parte não tem mais de uma legoa; mas eu quero de mesmo suppor, que tenha em todas legoas, 2 por 8 são 16, são por consequencia 16 legoas de superficie quadrada: disto precisamente se conclue, que Portugal tendo como tem 3300 legoas quadradas, vem a ter 200 superficies do tamanho das do Alto Douro. O paiz do Douro, sabem todos os Srs. Deputados, porque tem visto nos mappas da alfandega, exporta para Inglaterra 3500 pipas de vinho, tem tido annos de mais 35, e mesmo o anno passado trinta e tantas mil; eu quero suppor só 30000: ora 30000 pipas multiplicadas por doze mil réis, fazem trezentos e sessenta contos: vai para a cidade do Porto para consumo outras 30000, e além deste vinho alguma aguardente, que paga mais direitos; mas suppondo mesmo pelo menor de seis mil, ou seis mil e duzentos que paga cada pipa para consumo, fazem mais de cento e oitenta contos, que juntos a trezentos s sessenta fazem quinhentos e quarenta contos de réis; se nós tivessemos a fortuna de poder conseguir que o resto de Portugal pagasse outro tanto, ou no menos se estivesse nas circumstancias de pagar a decima parte, então teriamos a despeza do estado todas satisfeitas, e talvez em menos de dez annos a divida publica estaria paga: ora uma porção do paiz que paga quinhentos e tantos contos de réis, além da decima, e maior decima que paga o resto da nação, por isso mesmo que as decimas são lançadas proporcionaes aos rendimentos, porque sempre que a lançam, suppõem que o rendimento do vinho é maior, uma porção do paiz que paga exactamente os mesmos tributos, os mesmos onus, que paga o resto do paiz, além dos quinhentos e tantos contos, e então como é , que o Sr. Deputado se persuade, que esta lei é um exclusivo a favor d'um paiz que está n'estas circumstancias?

Em quanto aos vinhos da Bairrada, se não querem que elles paguem os mesmos direitos, ou a mesma imposição que se impõe ao Douro, não tem mais nada, que dizer, senão que este vinho, é vinho verde, e então paga ametade. Sr. Presidente, logo que isto não querem para poder ser exportado ha de pagar o mesmo que o outro; e desgraçadamente, Sr. Presidente, a exportação dos vinhos da Bairrada não fiz só não ir desacreditar os nossos vinhos em Inglaterra, que tem com que nós não tenhamos d'elle exportação bre-

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vemente, e fará a desgraça da nação, acabando o giro do ultimo crusado novo em Portugal (Apoiado).

O Sr. Pereira Boeges: - Levanto-me para sustentar o artigo 1.° da substituição ao projecto n.º 28 na parte, que diz respeito aos direitos sobre os vinhos da Bairrada, entratrados no Porto para consumo: eu entendo, Sr. Presidente, que este tributo nada tem de injusto como se disse; por que estabelece direitos iguaes para todos os vinhos entrados no Porto, e não ha motivo para que sejam exceptuados da regra, que estabelece o decreto de 14 de Julho de 1832, os vinhos da Bairrada: differentes são as razões porque estes vinhos devem pagar iguaes direitos; a primeira é, porque fica livre aos lavadores a occorrencia no mercado na qualidade, que mais conta lhe fizer, logo se não querem pagar, os mesmos direitos, que os da Douro, hão concorram com elles: 2.° porque tem o favor da cultura das vinhas, que para os do Douro é muito dispendiosa: 3.° porque o beneficio dos vinhos do Douro é dispendiosissimo, em quanto que os da Bairrada nada gastam: ha mais a vantagem dos portos da Figueira, é d'Aveiro, em quanto que os do Douro só tem a foz do Duoro.

A sua condição é mais favoravel, porque não podendo entrar no Porto no tempo da Companhia, agora que podem entrar, tem mais um recurso de venda, e é mais uma razão para não serem favorecidos neste tributo.

O pagamento d'estes direitos diminue o abuso, que se está fazendo destes vinhos, os quaes misturados com os do Douro, neste nome são mandados para Inglaterra: este abuso póde fazer o descredito do nosso vinho, e acontecer-nos o mesmo, que acontece aos da Madeira, que tendo o seu vinho perdido o credito na Inglaterra pela mistura, que os seus habitantes fizeram dos vinhos magnificos com os ordinarios, agora ainda á custo de alguns lavradores, que tem pertendido de novo introduzir o gosto, o vinho se não vende, nem é procurado como era em outro tempo; é justamente o que eu receio, e então desejaria, que se difficultasse quanto possivel fôsse a entrada dos vinhos da Bairrada na cidade do Porto, e por isso voto pelo artigo.

O Sr. Pinto Soares: - Eu levanto-me para combater o adiamento do illustre Deputado por Coimbra, o Sr Barjona tudo quanto se podo fazer a respeito dos vinhos da Bairrada, está consignado nos quatro artigos, que eu tive a honra de propor: o meu illustre amigo o Sr. Leonel já disse tudo quanto se podia dizer a este respeito; sómente accrescentarei que os vinhos da Bairrada não eram admittidos no Porto no tempo da companhia, não era admittida a sua exportação pela foz do Douro, e eram obrigados a exporta-los pelas barras d'Aveiro, e Figueira; presentemente podem vende-los dentro do Porto, e exporta-los pela sua barra, são vantagens que nunca tiveram, e tem hoje; se se lhe reduzissem os direitos de consumo todas as outras terras teriam direito a reclamar o mesmo beneficio; por isso taes excepções não se podem fazer: em Lisboa pagam sem distincção quatro centos e vinte réis por almude, que equivale a seiscentos réis medida do Porto, e não se distingue o bom do mau; por consequencia voto contra o additamento.

O Sr. Barjona: - Não me encarregarei de responder a todos os argumentos apresentados contra a minha emenda; basta reflectir sobre alguns, que mostram claramente qual é a justiça que assiste a meus illustres opponentes nesta parte.

Um nobre Deputado disse, que as pessoas, que houvessem d'entrar com vinhos nas barreiras de Villa Nova, podiam dizer que o seu vinho era verde, a fim d'evitarem, o excesso do imposto sobre um vinho d'inferior qualidade; mas eu que tenho bastante conhecimento de caracter do nobre Deputado, fiquei sobre modo maravilhado de lhe ouvir dizei tal. Supponhamos de barato, que os donos dos vinhos podessem mentir de tal sorte impunemente, seta isto um conselho que dém os Deputados da nação, que se minta, e com o fim de roubar a fazenda publica? Eu mesmo não quero demorar-me nesta idéa por mais tempo.

Um outro illustre Deputado, permitta-se que o nomeie, o Sr. Leonel Tavares, reduziu toda a sua argumentação a isto: que os fundamentos da minha emenda eram logares communs, e que são precisos impostos, porque a nação não póde subsistir sem elles. Mas, pergunto eu, quaes serão logares mais communs? Que os direitos de consumo d'uma terra devem ser proporcionam ás commodidades, que nella se gozam; ás despezas que a nação precisa de fazer com as ditas commodidades, e ao valor do genero consumido; ou aquillo em que tanto se estribou o illustre Deputado, que é preciso que se paguem impostos, porque a nação não póde passar sem elles? (Apoiado.) Em fim resolva o Congresso como entender; mas se a minha emenda fôr rejeitada, resta-me ao menos a consolação de ter feito a favor dos póvos da Bairrada tudo quanto estava da minha parte.

O Sr. Lopes Monteiro: - Se eu, porque pertenço a um districto, me esquecesse de que era Deputado por todo o Portugal, para ter em vista o interesse sómente do meu particular paiz, nada mais facil do que admittir a substituição, que o Sr. Deputado por Coimbra offerece ao artigo em questão; mas, Sr. Presidente, eu conheço os embaraços do thesouro, e não quero uma medida, que tende a augmenta-los.

Todas as pessoas, que reflectirem um pouco sobre a substituição, hão de achar que, isentando-te a introducção dos vinhos por Villa Nova de Gaia de direitos, ou diminuindo-se estes, todos os especuladores d'este genero hão de seguir este caminho privilegiado. Não é só a Bairrada, que ha de introduzir seus vinhos por Villa Nova; o Douro ha de fazer o mesmo; porque lhe é muito facil desembarca-los em Quebrantões, e conduzi-los em carros por esse previlegiado caminho de Sião. E neste caso o thesouro não vem a receber um real destes direitos.

Mas supponhamos que era impossivel aos lavradores, é negociantes em vinhos do Douro este descaminho; seria justo que se fizesse contra nós, os habitantes d'aquella parte de Portugal, mais esta vexativa excepção? Os Srs. que defenderam a Bairrada avançaram , que sim; e produziram para isso as seguintes razões: 1.ª que os vinhos da Bairrada ha dous annos desceram de preço, tem menos consumo, e só actualmente acham venda a vinte e dous mil réis por pipa: 2.ª que os nossos vinhos do Douro, pela sua subida qualidade; tinham grande preço, e deixavam grandes lucros ao lavrador , para o habilitar a pagar maiores tributos.

Sr. Presidente, se os vinhos da Bairrada desceram de preço, os do meu paiz cahiram de preço; porque ninguem os cumpra. Este anno não se venderam ainda, (e o tempo das vendas vai findo) mais talvez de tres mil pipas, sendo o mercado d'oitenta mil. Isto é verdade, Sr. Presidente, (apoiado) e então quem está mais infeliz o Douro ou a Bairrada! Quem merece mais contemplação e favor?

Mas, instam os Srs. Deputados por Coimbra, os vinhos da Bairrada são igualmente bons, e até com os do Douro fazem uma excellente composição, e são igualmente exportados. Isto prova o contrario; pois que se elles são bons, é sahem misturados com os nossos para a Inglaterra, devem pagar os mesmos direitos. Entretanto eu nego, que os vinhos da Bairrada façam uma boa composição misturados com os do Douro, apezar do que esta proposição agora favorecesse o meu argumento; pelo contrario, Sr. Presidente, a mistura dos Vinhos da Bairrada com os do Douro, debilita estes, e passado algum tempo os corrompe, desacreditando assim o vinho do Douro no mercado estrangeiro; e por isso, se eu fôsse letrado a medidas excepcionarias; se eu estivesse persuadido, que o proprio interesse do negociante não ha de ser o maior embaraço a similhante composição, eu proporia a esto Congresso medidas d'estorvo á introducção dos vinhos da Bairrada no Porto. Quanto ao segundo argumento, que os vinhos do Douro são sui generis, os melhores que temos; respondo ao Sr. Barjona, que já pagam doze mil réis, o que não pagam ainda os da Bairrada. Além de que os do Douro tem uma despeza muitissimo grande, a qual não só consis-

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se no que referiu o meu nobre amigo, o Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa, mas tambem no beneficio, como lhe chamam os lavradores d'aquelles sitios; isto é, precisa cada pipa dous almudes de agoa-ardente de supperior qualidade: alguns ha que não deixam de lhe fazer outras composições, como lançar-lhe uma grande quantidade de passas, porque o vinho doce tem sido moda. Ora quando se ouve fallar, que uma pipa de vinho do Douro se vende por cincoenta mil réis, e se compara este preço com o de vinte e dous mil réis que tem os da Bairrada, á primeira vista acha-se uma grande differença; mas examinando o caso, tendo-se em vista que o lavrador do Douro gasta para aguardentar cada pipa vinte e dous mil réis; em passas, e outros ingredientes para o adoçar, não menos de seis, (que é preciso beneficia-lo todos os annos) de maneira que vendido por aquelle preço, que parece grande, apenas se vem a vender por vinte e dous ou vinte e tres mil réis, de que hão de sair ainda doze mil réis para o grangeio, depois ha um empate, e o lavrador, que o sofre fica arrumado para quasi toda a sua vida (apoiado).

Os meus illustres patricios, os Srs. Macario de Castro, e barão de Sabrosa, hão respondido triunfantemente a todos os outros argumentos; e eu estou certo, que o Congresso não ha de adoptar uma substituição, que prejudica o thesouro, desmoralisa o negociante e o lavrador, instando ao descaminho, e não utilisa até a mesma parte do paiz , que em prejuizo do resto se pertende favorecer; voto por tanto contra a substituição, e adopto o artigo.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabroza: - Principiarei repetindo as palavras do Sr. Monteiro, se se convém na substituição, eu lucro em cada pipa tres mil réis. Todos gabem que não ha nada mais facil, do que desembarcar o vinho em Quebrantões, ou no Carvoeiro, e leva-lo a Villa Nova. Quem perde tudo é a fazenda. Por tanto acceito o additamento do Sr. Barjona, não serei do generoso como o Sr. Monteiro; e se o Sr. Ministro da fazenda convém, digo que approvo já o additamento.

Diz o Sr. Barjona, que sou injusto. Não o sou: elle reconhece, que póde exportar os vinhos por Aveiro, pela Figueira, e pelo Porto; reconhece, que são iguaes aos do Douro, da sua ordem; quer igual vantagem, para elles, e não quer pagar os direitos! Donde vem a injustiça? Aquelle elogio, que o Sr. Deputado fez aos vinhos do meu paiz, chamando-lhes medicinaes, optimos, indispensaveis, no estado actual, em vista do que acontece hoje na minha provincia, aonde ninguem os procura, não me parece elogio, parece-me uma ironia amarga. Dizem-me, Sr. Presidente, hoje mesmo, dous respeitaveis compradores de vinhos, que o meu vinho branco é precioso; mas accrescentam ambos, que me não podem dar um vintém por elle. E' medicinal, é verdade; mas, com taes direitos, ninguem quer beber o remedio, e lá fica. E se eu não vender, difficilmente poderei pagar tributos. Um dos sitios mais classicos de vinhos do Douro, é a costa dos Goivinhas; offerece-se ahi quinze mil réis por cada pipa do de primeira qualidade! Lembre-se o Congresso bem disto. Diz o Sr. Barjona, que vende o da Bairrada a dezeseis mil réis isso foi em 1834, e algum mesmo a vinte e dous mil réis; mas este anno receio muito que nem a dez mil réis lhe dêem por elle. E se fôr como diz o Sr. Deputado, é um argumento contra a sua pretenção. Diz que os vinhos da Bairrada entram para compor os do Douro: se assim é, por que não hão de pagar como os outros? Sr. Presidente, eu amofino-me, quando fallo nesta questão; e quando ouço revelar cousas, que fazem mal ao negociante, e por consequencia ao lavrador; mas não póde deixar de ser, porque nenhum especulador convirá em misturar os vinhos da Bairrada com os finos do Douro. Reconheço, que o meu paiz está coberto de dividas, e de pobreza, senão for attendido, cento e trinta mil pipas de vinho ficaram empatadas: uma grande parte do vinho do anno passado, está ainda nos armazens; eu até os podia agora mesmo nomear, assim como aos seus proprietarios. E se elles não venderem, como hão de pagar os impostos? Por tanto voto pelo artigo do projecto, porque algum bem faz no momento, e não cançarei mais o Congresso.

O Sr. Macario de Castro: - Se os Srs., que tem pedido a palavra depois de mim, quizerem prescindir della, por que julguem o artigo discutido, desisto da palavra. Peço a V. Exca. queira consulta-los.

O Sr. Presidente: - Não sei as suas tenções; mas quem pediu a palavra foram os Srs. S. Paio Araujo, Lacerda, e José Estevão.

(O primeiro, e ultimo dos Srs. Deputados referidos, declararam, que precisavam fazer explicações)

O Sr. Leonel: - Eu peço a V. Exca. queira perguntar ao Congresso, se a materia está sufficientemente discutida.

O Sr. Macario de Castro: - O Sr. Deputado não tem direito a pedir essa votação, depois de eu estar em pé para fallar. Eu tomei a deliberação de não gastar mais tempo nesta discussão, se os Srs. Deputados não quizerem combater o artigo; de contrario fallarei.

O Sr. Leonel: - Declaro, que quando pedi a V. Exca. perguntasse se a materia estava discutida, foi apoiando o Sr. Macario de Castro esta foi a minha intenção.

O Sr. Sampayo Araujo: - Quando se nomeou a Commissão especial dos vinhos, foi isso encarregado á mesa, que procurou, entre outras circumstancias, individuos para entrarem nella, que tivessem o conhecimento das provincias: eu fui nomeado pelo Minho. O Sr. Barjona no seu additamento propõe a reducção dos direitos do vinho verde, creio que é um tostão em almude, que entrar sómente por Villa Nova, mas eu que desejo a igualdade, e que estou em stricta posição de defender os interesses do Minho, proponho, que no caso de ser admittida a reducção de direitos, seja extensiva a todos os vinhos verdes, que entrarem no Porto, tanto pelas barreiras do Sul, como pelas do Norte.

O Sr. Lacerda: - Cedo da palavra, dizendo ao Sr. Barjona, quando julgou que eu lhe tinha feito um ataque, me fez uma injustiça. Creio que o Congresso deve saber, que eu só quiz provar, que não ha exclusivo a favor de um paiz, quando paga mais que os outros quinhentos e tantos contos de réis do genero, que colhe; sendo mais que treplicada a despeza na cultura: espero que S. Sa. fará a justiça de me acreditar.

O Sr. José Estevão: - Depois que pedi a palavra, fiz tenção de não dizer nada a este respeito; mas como o Sr. Macario de Castro se resolveu a fallar, sempre direi alguma cousa, para lhe dar a que responder. Com effeito, levantando-me para fallar nesta materia, dou a mais completa prova do meu atrevimento, e Congresso ouvindo-me, não menos a dá de illimitada benevolencia.

O vinho da Bairrada, em quanto está nas adegas de teus donos; vale indubitavelmente menos, que o vinho do Porto em quanto se acha nas mesmas circumstancias, são mercadorias de differente valor, e a differença é consideravel: isto cuido que ninguem o contesta, porque os factos o dizem. Mas o vinho da Bairrada sáe das adegas, faz longas, e custosas jornadas; chega ás barreiras do Porto, e ainda assim mesmo o seu preço é muito menor do que o do Douro, considerando o tambem junto ás mesmas barreiras já se vê pois que estas barreiras fazem milagres, destroem as propriedades naturaes das cousas, e igualam o que é intrinsecamente desigual. Os vinhos do Douro pagam nas barreiras do Porto os mesmos direitos, que os da Bairrada, e estes vinhos não tem então, nem vem a ter nunca o mesmo valor. Isto não é justo.

Entendo eu, Sr. Presidente, que todos os principios de economia politica (ainda que pouco lido sou nesta materia) ensinam a contrabalançar com os favores da lei os desfavores da natureza: paiz menos favorecido pela natureza, deve-o ser mais pela lei; e o que o fôr mais por aquella, deve-o ser menos por esta; isto creio que é a doutrina de todos os economistas.

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Folguei de ouvir o Sr. Lacerda, tratando esta questão com um desenvolvimento estatistico, com que eu desejara ver tratar todas as questões desta especie: mas permitta-me S. E, que eu lhe diga, que todos os seus argumentos nada colhem. E' verdade que o Douro paga mau do que qualquer outra parte do paiz; mas se o Douro está em igual estado de prosperidade com outras partes do reino, que pagam menos, o que se conclua é, que póde pagar o que paga. Creio que comparando o Douro com a Bairrada, se achará que elle é muito menos miseravel que a Bairrada; se por tanto pagando mais se conserva em estado de igual prosperidade.

Uma voz: - Não conserva.

O Orador: - A respeito da Bairrada certamente que está em estado mais próspero: cada um póde dizer que sabe da mal, que lhe vai por casa.

Um illustre Deputado disse, que se se estabelecesse qualificação, e differença de direitos para os vinhos da Bairrada, se devia estabelecer para os outros vinhos agricultados em volta do Porto, que lhe fossem iguaes. Não duvido que seja justo; mas é preciso que combinemos os principies de justiça com as exigencias da necessidade. Que importa que uma pipa, ou duas de vinho, que vem ao Porto dos seus arredores para consumo, não se venda? Não se trata da existencia do paiz, que produziu esse vinho; porque nelle não ha só essa especie de agricultura. Mas a respeito da Bairrada ha a circumstancia, que senão se vender ella acaba, porque não tem outro commercio. E demais, que importa que para esse vinho mesmo haja uma qualificação, e differença de direitos? Perde o estado muito? Não. Advirta-se que eu tolero a qualificação só para os vinhos, que são lavrados em volta do Porto, porque os do Douro mesmo de segunda qualidade, são muito superiores aos da Bairrada.

O Sr. Presidente: - Eu queria ver se trazia a questão nos seus termos; porque serve de augmentar a confusão o modo, porque se tem tratado a questão. Este primeiro artigo é relativo aos vinhos do consumo, e vinhos de consumo que entram no Porto, não são os de primeira qualidade do Alto Douro, nem os que vão ficar sugeitos a este direito de entrada nas barreiras. Ora não é a questão com relação aos vinhos, que entram no Porto....por ora trata-se só do direito que se paga no acto da entrada dos vinhos nas barreiras do Porto, que são os vinhos de consumo.

O Sr. José Estevão: - Eu creio que entrei na questão do mesmo modo, que os meus collegas.....

O Sr. Presidente: - Eu não digo, que não; mas fiz esta observação por ver que tem havido esta confusão.

O Sr. José Estevão: - Eu perguntei depois, que se trata esta questão, se o direito de saída para os vinhos da Bairrada, é o mesmo que para os do Porto, e disseram-me que sim; então é segunda injustiça sobre a primeira, que eu já notei. Pagam um direito igual na entrada para consumo, e depois na caída para exportação tem outro direito igual; temos pois, constantemente desigualdade de mercadorias, e igualdade de direitos.

Ultimamente concedeu-se, que a qualificação é justa; mas augmenta-se com a difficuldade de a fazer. Eu entendo que este argumento não é tão forte, como se quer inculcar; por que creio, que o meio de o evitar está nas regras geraes de fiscalisação; e então sustentar por estes principios, que se não podem qualificar os diversos vinhos que entram no Porto, é dizer, que não ha fiscalisação, e isso equivale a affirmar que não ha alfandegas, e por conseguinte nem administração, nem governo.

Sr. Presidente, disse-se que a substituição será favoravel ao Douro; porque deve occasionar a fraude de embarcar vinhos do Douro, como da Bairrada; supponhamos que isto é verdade; mas sempre, que se fazem leis, crescem occasiões de fraudes; porque se as leis não déssem occasião a fraudes, a sua execução seria natural, e regular, o que não acontece; essa fraude, porém, é remediavel pelos meios ordinarios da fiscalisação. Concluo com uma profecia; ignoro se tudo o que disse era exacto; mãe o que vou dizer, comprometto-me, porque se verifique. Os vinhos da Bairrada antes que lhe fosse permittido entrar no Porto, saíam pela barra d'Aveiro, e Figueira; mas hoje o commercio por estes portos desappareceu, e foi todo para o Porto; não póde deslocar-se com a facilidade, que se pensa, e em quanto isso se não fizer, a Bairrada morreu. Voto pois, pela substituição do Sr. Barjona, e pela doutrina das qualificações.

O Sr. Macario de Castro: - Como V. Exca. disse ha pouco, tem-se confundido esta questão com outras muito differentes. Aqui trata se dos direitos de consumo no Porto, e não se trata dos direitos de exportação. Ora o Congresso deve ter conhecido que o consumo, que villa Nova faz, que é segundo uma asserção já aqui emittida, de tres mil pipas, não daria logar a tão longo debate, por um lado o Governo pouco lucrava com os direitos sobre tres mil pipas, por outro lado a consecção era pequena, vamos pois analizar qual é a causa desta divergencia nas opiniões. Outra causa, não o direito de consumo em villa Nova, se leva em vista; mas sim, a fraude no direito de exportação. (Apoiado.) Ainda ninguem quiz alliviar o Porto dos direitos de consumo; pertende-se alliviar villa Nova, e será por consideração aos habitantes de villa Nova, ou da somma proveniente dos direitos do vinho, que alli se consome? Não por certo: faz-se esta questão, porque se quer que os vinhos da Bairrada tenham vantagens superiores ao vinho do Douro: aquelles vinhos quando vão ao Porto, é para terem os mesmos lucros, que tem os nossos vinhos; logo devem pagar os mesmos encargos. Os vinhos do Douro são exportados pela Foz do Douro com doze mil réis de direitos, qualquer que seja sua qualidade. Ora os Srs. Deputados, que defendem os chamados interesses da Bairrada, reconhecem, que alguns vinhos do Douro são d'igual qualidade, ou inferior ao da Bairrada; e então ha de vir este vinho do Douro de segunda qualidade ser exportado com doze mil réis de direitos, e o outro não os ha de pagar? Ainda outra differença; o vinho da Bairrada tem a sua exportação natural pela Figueira, e não paga se não um por cento, e o vinho do Douro não póde ser exportado se não pela Foz do Douro. Então já se vê, que aquelle vinho tem duas vantagens, os dous meios de exportação, uma pela Figueira, outra pelo Porto. Mas ainda que significa vinho do Douro? O vinho do Douro, é o vinho da provincia do Minho, da Beira, e de Traz-os-Montes; tem a sua saída natural pela Foz do Douro, nós temos estorvado esta exportação por um direito excepcional para este vinho, qualificando-o lodo de primeira qualidade. O vinho do Douro com todas as leis, que tem havido desde 1832, tem perdido da sua exportação, em quanto o vinho da Bairrada tem ganhado, eu vou demonstra-lo. O vinho do Douro era exclusivamente consumido no Porto, e o vinho da Bairrada vem hoje ser consumido ao Porto, e assim o consumo do Porto é feito com vinho da Bairrada, e d'antes só era com o vinho do Douro; por consequencia diminuiu o consumo deste. O vinho do Douro era dantes exportado para o Brazil na quantidade de quinze mil a doze mil pipas, e hoje tem diminuido até setecentas pipas, e mesmo quinhentas, e a exportação para o Brazil, do vinho do reino não tem diminuido; por consequencia diminuiu a exportação de uma qualidade de vinhos para ir augmentar outra. Vamos ao preço: o preço todos reconhecem , que não é o preço nominal de cada pipa; mas o preço que fica livre para o lavrador de cada pipa. Ora este preço que fica livre ao lavrador, não tenho duvida de sustentar, é de sete, oito, e nove mil réis. Ora agora veja-se o preço que tem tido o vinho, e veja-se quanto fica liquido de cada pipa ao lavrador, veja-se o juro do dinheiro, adiantado, ou empatado, e combine-se com o outro vinho, que é vendido sem dinheiro empatado no amanho das vinhas, ou em concerto; por consequencia, já se vê que a differença de preço de que se falla, é uma differença nominal, e não real.

Ora quanto a haver barreiras em villa Nova, apontou-se

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o exemplo de que nas aldeias visinhas de Lisboa as não havia. E apresentou-se o exemplo das cidades estrangeiras. Responderei que á medida, que essas aldeias se aproximam com as cidades, é costume estabelecerem-se as barreiras n'outros logares, e apontarei um facto, que me lembrou agora das barreiras de Pariz terem mudado tres vezes, porque, as aldeias immediatas tem ido formando uma continuação da cidade. Essa continuação vejo eu em Villa Nova. Os habitantes de villa Nova tem as mesmas vantagens que os do Porto; por consequencia devem pagar os mesmos direitos de consumo. Ora ainda notarei, que ha uma desvantagem, que os que tem vendido os vinhos da Bairrada acham na sua vinda para o Porto, vantagem................................ o vem fazer perder o credito dos vinhos do Douro; porque misturam um com o outro. Este vinho é bom nos primeiros dous, ou tres annos; mas depois perde-se, e então os inglezes dizem hoje, que o vinho do Douro está adulterado, mas está-o, porque o misturam com outro; e então venha muito embora o vinho da Bairrada ao Porto, para ser exportado; mas saiba-se que existe nos armazéns; saibam os inglezes iguaes são os armazens, que teem o vinho da Bairrada, e os que costumam ter outra qualidade de vinho, porque isso não lhe faz mal. Os negociantes que entenderem, que lhe convém exportar e vinho como originario do Douro, continuarão a exporta-lo; e os que entenderem, que lhes é mais util fizer a mistura, que a façam. Aqui está toda a questão. Os negociantes não querem que se conheçam as misturas, que elles fazem, muito embora se desacredite o vinho do Douro. Tambem se disse, que a jeropiga da Bairrada é a melhor. Eu concedo; mas a jeropiga é uma qualidade de liquido, ou de vinho (porque assim se lhe póde chamar), que custa mais dinheiro, e então essa jeropiga não estará em proporção quando paga o mesmo, que a outra, se ella é melhor.
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Direi ainda, que ninguém trata de vinhos d'exportação. Os vinhos d'exportação ficam hoje no mesmo estado, em que e lavam pelo projecto, quero dizer, ficam com os mesmos direitos, vinho de consumo já se vê, que não é se não tres mil pipas, que se gastam em villa Nova: é esta a differença.

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Concluo por conseguinte dizendo, que o vinho entrado em villa Nova deve pagar; e que existam as barreiras, tanto em Villa Nova, como no Porto, e que tanto em uma, como em outra, devem ser os mesmos direitos de consumo que devam pagar-se.

O Sr. Freire Cardozo: - O projecto é de uma tão grande importancia, que cada momento que se perder, será um prejuiso, tanto para a fasenda, como para a lavoura: é por isso, que eu pedia que se não levantasse hoje a sessão, tem se discutir pelo menos este primeiro artigo.

O Sr. Presidente: - Proponho se a sessão deve ser prorogada até se concluir a discussão deve 1.º artigo.

A Camara decidio affirmativamente.

O Sr. Fernandes Thomaz: - Sr. Presidente, um Srs. Deputados querem facilitar, e melhorar a agricultura dos vinhos nas suas provincias, e querem melhorar o commercio dos mesmos no Porto; mas os outros o que querem? A mesma cousa. Eu não impugno cousa alguma do que querem os Srs. Deputados; mas ao mesmo tempo serei justo, pugnando pelos interesses de outra parte da Monarchia.

O Sr. Barjona quer com a sua emenda, facilitar a venda dos vinhos da Bairrada, e diminuir os seus direitos; - eu porém tenho a propor a isto outra emenda, e vem a ser, que em lugar de pagarem 300 rs. por almude, paguem 200 rs. E' nisto que consiste a minha emenda, entendendo-se que deva ser extensivo a todos, quer sejam da Bairrada, quer de outra qualquer parte do territorio portuguez.

O Sr. Valentim: - E' verdade que todos estão conformes, com a deferencia de que se pertende uma excepção para a Bairrada, e é que os seus vinhos não paguem o direito de consumo, que pagam os outros: dous são os argumentos de que usão, os que pertendem este exclusivo; argumentos que se destroe um ao outro. Tenho ouvido dizer a uns, que os espiritos da Bairrada são melhores; e que por isso não devera pagar esse direito, eu tiro a contraria consequencia: outros dizem que são peiores, e que por isso devem, ser favorecidos para os nivellar com os outros. Isto Srs., é querer estabelecer uma lei agraria, que mata tudo; valha mais, valha menos, pague; porque eu não admitto os principios de economia, que estabeleceu o Sr. José Estevão, porque se as leis tendessem a esse fim, alterava-se tudo, e de um modo que ninguem entende, nem espera. Tambem se argumentou dizendo-se, que o vinho do Douro é mais caro; mas eu digo que não ha tal: elle é mais caro para o negociante, mas não para o lavrador; o valorem que uma pipa do vinho do Douro excede a uma da Bairrada, não é todo do lavrador, isto é, não é liquido: o lavrador comprou-o, porque pagou muito mais do que o da Bairrada, e se deduzir-mos o custo do fabrico, acharemos que o do Douro tem menos liquido. Limitto-me por tanto a dizer, que não devemos admittir o principio de igualar com a lei as differenças que ha no terreno; porque isto é contra todos os principios de economia, de justiça, e mesmo de juiso.

O Sr. Lopes Monteiro: - Sr. Presidente, eu desejo saber se está em discussão a emenda offerecida pelo Sr. Fernandes Thomaz.

O Sr. Brandão: - Eu mando para a mesa uma emenda, para se discutir com essa ao mesmo tempo, a qual sustentarei depois.

O Sr. Barjona: - Eu retiro a minha emenda, para ser substituida pela do Sr. Fernandes Thomaz.

O Sr. Presidente. - A emenda do Sr, Fernandes Thomaz é a que vou ler: - Proponho que os direitos de consumo estabelecidos pelo decreto de 14 de Julho de 1834, a respeito dos vinhos e agoas-ardentes, na cidade do Porto e Villa Nova, sejam reduzidos a 200 rs. por almude para os vinhos, e 500 rs., para a agoa-ardente.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: - Eu peço que V. Exca. consulte, o Congresso, se a materia está sufficientemente discutida.

O Sr. João de Oliveira: - Eu rejeito o artigo; mas desejava dar a razão porque o regeito.

O Sr. Presidente: - Mas já, não póde ser; porque o Congresso decidio que a materia, estava sufficientemente discutida: - vou por tanto á votação.

Posto o artigo á votação, salva a emenda foi aprovado; e posta á votação a emenda do Sr. Fernandes Thomaz, foi regeitada, ficando o artigo tal e qual.

O Sr Pinto Soares: - Eu tinha pedido a palavra para uma explicação, e vem a ter para dizer ao Sr. Barão da Ribeira de Sabroza, que eu fui um desses administradores da companhia dos vinhos do Porto, de que falla a representação da associação commercial do Porto, sendo mais um dos que votei, que os direitos de consumo fôssem pagos á entrada; mas tratava se nessa occasião sómente dos direitos da cidade, e não de Villa Nova, por me parecer que era o unico meio de acabar com os vexames do rendeiro, e de resolver a questão que se nos propoz de saber-se = que meio haverá para se arrecadar bem, e sem prejuiso e desfalque na fasenda publica, o direito de consumo do vinho na cidade, sem vexar os moradores com as guias, guardas, e exacções do rendeiro, do que se queixaram os negociantes, e geralmente todos os habitantes?=

O Sr. Presidente: - A hora deu; a ordem do dia para ámanhã, é a continuação da mesma de hoje. Está levantada a sessão. Eram 4 horas e um quarto.

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