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ella ainda fez muito mais a bem da liberdade, do que a das outras nações. E á escóla, que ella creou naquelle paiz classico, tem ido aprender as outras nações, até as que tem aperfeiçoado a theoria moderna dos governos, divida esta, que não é pequena. As guerras emprehendiosas para conquistar o imperio das mares lambem me parece que vieram a campo; os grandes fundamentos d'esse imperio, se isso é grande peccado, foram lançados por Cromwel no tempo da Republica, e essas guerras foram sempre as mais populares, porque eram as mais conformes á situação geographica, e aos interesses daquelles povos. - A guerra da successão de Hes-panha não foi mais da aristocracia britanica, do que dos outros governos da Europa em Estados onde hão havia parlamentos, e principalmente da ambição de Luiz XIV, para engrandecer o dominio da sua dinastia.

A guerra da America foi injustíssima na sua origem, mas tambem foi no parlamento britanico, que se fez a maior guerra a esta grande injustiça. E não foram só os raios da eloquencia de Burck. que fulminaram na camara dos Communs a politica atroz de Lord North: ainda agora se me eriçam os cabellos, quando imagino ouvir na camara dos Pares Lord Chathan trovejando contra esta horrivel injustiça! E quando tiveram as liberdades populares um advogado mais zeloso, mais energico, mais desinteressado? Em fim um advogado, que por ellas fez exhalar no parlamento o ultimo alento de sua grande alma? Seu nome dado a tantas cidades e villas na America do norte attesta ao mundo a gratidão daquelles povos! A democracia nem sempre tem sido innocente do peccado de guerras injustas. Bem o provam as guerras da França democratica, que começaram em nome da propaganda da liberdade, e acabaram pela do espirito de conquista, e de despotismo. Até ha bem pouco tempo era tão geral em França o espirito militar, que levava os Francezes a confessarem que preferiam a gloria das armas a tudo. - E até não duvidavam substituir o ídolo desta ao da liberdade e davam razão a muitos dos seus grandes homens para se queixarem de que em França não havia ainda neste sentido um espirito publico bem formado. Certamente não foi para defender a liberdade, que esses filhos da democracia franceza vieram á Península sustentar os ambiciosos planos de Napoleão, nem que outra vez cá voltaram para executar á força d'armas o programma da propaganda da Santa Alliança. E não esqueça que na lista dos que enviaram a Hespanha esta cruzada contra a liberdade, entrou essa mesma authoridade, que aqui vimos hontem invocada para nos dar lições constitucionaes, e foi a mesma que assignou o tractado do Congresso de Verona, para não consentir mais a peste dos governos representativos na Europa! É provavel que nesse mesmo espirito o apostolo de todas as contradicções politicas não podesse achar boa, nem a Camara feudal de Inglaterra, nem a Camara dos Pares de França, nem a Camara unica da Assembléa Constituinte, para talvez sómente achar optima a monarchia pura do seculo 17 em França.

Fallou-se tambem na distribuição dos tributos, taxa dos pobres etc., como grandes argumentos contra a aristocracia britanica, e não sei se tambem contra a Camara dos Pares. A taxa dos pobres? Os pobres são em grande parte o effeito da grande desigualdade de fortunas em Inglaterra, como em toda a parte; mas essa desigualdade de bens territoriaes não vem da instituição de duas camaras, mas foi o resultado das conquistas em tempos muito anteriores aos tempos regulares da Constituição, e sem esta muito peiores, e mais insupportaveis seriam seus effeitos. Nem são sómente os da classe media que carregam com o peso da taxa dos pobres. É uma verdade que as alfandegas, os Exeises, e os tributos indirectos em geral pagam sommas muito maiores que as contribuições territoriaes em Inglaterra. Mas o Land-Tax é dos mais antigos, e este só com os Assessed Jaus, produz mais que as rendas todas de Hespanha. A ordem na composição dos tributos naturalmente começa com os dos productos da terra, porque são os primeiros que o homem conhece, e seguem-se depois os dos generos de commercio, e de luxo, porque estes não vem senão em um estado mais adiantado da sociedade. Bem antigo era o tributo dos dizimos, que pagavam os fructos da terra. Os objectos de luxo em Inglaterra estão bem carregados, e não são os pobres que pagam pelo luxo. Além disto a taxa territorial (Land Tax) em ser tão moderada julgam bons economistas haver grande vantagem, porque deixa folgar, e prosperar a agricultura, o que não é em beneficio sómente dos grandes proprietarios, mas dos cultivadores tambem, e de todas as classes, para quem refluem os benefícios desta fonte de prosperidade publica. Ao menos em Inglaterra abundam as instituições de beneficencia a bem dos pobres, o que não acontece em outros paizes, onde abundam os tributos, e com elles o desamparo, e abandono dos desgraçados. Quanto á censura de ingratidão a Douton, e a outras personagens da revolução franceza, póde ser que a geração actual, ou as que vierem lhe reconheçam a divida, mas naõ lh'a reconhece certamente a geração, que elles, e tambem a aristocracia francesa sacrificaram; e esta até como aggressora ainda mais para isso concorreu. Eu decerto não lhe agradeço a cadeira, que aqui occupo, como quer um illustre Deputado, e entendo que lha devo tanto, como devo a D. Miguel alguma instrucção, que adquiri por oc-casião de emigrar, mas não pela vontade nelle de me fazer bem. Voltando outra vez, depois desta longa digressão historica, ás razões que tenho para preferir uma segunda camara, encontro mais uma na maior difficuldade que ha na Corôa para corromper em um systema de duas camaras bem constituidas cada uma segundo o caracter, e destino que lhe é proprio.

Uma só Camara tambem tem o risco de tornar o uso do veto mais frequente pela falta da barreira da outra; e em um systema monarchico hereditario muito máo é expôr o Throno a comprometter-se frequentemente, ora com o Parlamento, ora com a Nação.

Com todas estas razões, e outras que expozeram tão habilmente os meus illustres collegas, tem a maior importancia para comigo o ir eu no meu voto de acordo com a minha procuração, e com a vontade sabida dos meus constituintes, segundo as informações que tenho podido obter; e em geral tambem com as dos Portuguezes com quem tracto. Elles vêm nesta instituição mais uma garantia de segurança, de conciliação, e de paz, não só com os outros Portuguezes, mas com a Europa, que está com os olhos em nós. A nossa moderação até agora tem sido exemplar, e porque o não ha de continuar a ser? Estaremos nós em situação de offender a Europa com innovações, que lhe dêm receios? Será possivel que não haja liberdade para nós senão com uma condição, que até hoje nenhuma Nação tem abraçado como indispensavel? Se ha essa tendencia geral na Europa para uma só Camara, como aqui se deu a entender, como condição exclusiva, eu ainda o não vi nos livros, nem na imprensa periodica, nem a percebi em quanto viajei. - Finalmente, Sr. Presidente, uma organisação de duas Camaras, uma dotada de attribuições mui populares, outra de attribuições, que sem deixarem de o ser, sejam ao mesmo tempo taes, que lhe assegurem revoltados contra a volubilidade e desacertos dos comicios populares, e suas consequencias, e um Throno dotado de solidas prerogativas para a felicidade publica, e ornado de todo o esplendor compativel com as nossas circumstancias, são no meu entender o governo mais proprio para conciliar o respeito e veneração ás leis no nosso paiz, porque nesta organisação terá o Povo Portuguez occasião de ver tudo, o que elle estava acostumado a ver de mais respeitavel.

E então a que poderemos nós ter mêdo em uma segunda Camara Legislativa? Será o reviverem nella os Senhores