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democracia, assim como serve de corpo intermedio para evitar os choques, que podem suscitar-se entre a primeira camara, e o poder executivo, que tambem tende ordinariamente para o despotismo.

Se este argumento vale, se isto é verdade, forçoso é admittir que a segunda camara deve ter seus interesses differentes dos da primeira, porque com interesses iguaes a sua tendencia teria a mesma.

Mas para que a segunda camara tenha interesses differentes é necessario que ella seja organisada de differente maneira, e então fica evidente que ella não póde, nem deve ser temporaria e electiva.

Uma segunda camara temporaria e electiva, semelhante á primeira na sua organisação, seria absurdo no systema representativo: n'uma camara assim organisada achavam-se identificados os interesses da primeira, e por consequencia uma tal camara não tose tornava completamente inutil, mas até prejudicial, porque della nenhum bem podia provir, e só o mal na demora das medidas legislativas.

Tem-se dito já que a segunda camara temporaria e electiva offerece uma garantia, que não pode dar-se na camara vitalicia, e vem a ser que os seus membros, aspirando á gloria de uma reeleição, se mostrarão mais zelosos dos direitos do povo: pois Srs., nesta parte, em que parece existir uma grande vantagem, é aqui mesmo que eu descubro um grande mal. Uma segunda camara deste modo organisada, acha-se é verdade identificada com a primeira; mas por isso mesmo que acontecerá? Acontecerá que uma e outra olharão sómente aos interesses do povo, e os interesses do throno serão esquecidos, e deste modo o equilibrio, que deve haver entre o throno e a primeira camara desapparecerá, e desta falta de equilibrio, mais cedo ou mais tarde deve seguir-se a anarchia, e a dissolução social.

Se se quizer, Sr. Presidente, que a segunda camara seja temporaria, e formada não por simples eleição, mas por nomeação do Rei, fundada em eleição popular, o mal nem por isso diminuirá, antes augmentará. O membro da segunda camara, que aspirar a ter entrada na camara futura, tendo de attender a interesses oppostos para agradar, ver-se-ha em continua colisão, e embaraço, querendo ganhar ao mesmo tempo a sympathia do Rei, e a sympathia do povo, e findará sempre por perder a confiança de um e do outro; e aquelle que, tem ter uma tal ambição, quizer seguir sómente os dictames da sua consciencia, virá por fim a desagradar a um dos dous, e as portas da segunda camara lhe ficarão provavelmente fechadas para sempre.

Se finalmente se quizer que a segunda camara seja temporaria, mas formada por simples nomeação do Rei ou do poder executivo, terão de seguir ás cégas as suas vistas para que a sua nomeação seja repetida.

São estas as razões, em que eu principalmente me fundo para seguir que a segunda camara não deve ser temporaria: a estas accresce ainda uma outra, que me merece algum peso, e vem a ser - que não devendo os membros da segunda camara perceber subsidios, poucos quererão á custa de sacrificios, e de avultadas despezas, acceitar uma dignidade efemera, de que mais tarde se hão de ver despojados: já se vê pois que, tendo estas as minhas idéas, eu hei de votar para que a segunda camara seja vitalicia. Os membros da camara vitalicia, uma vez eleitos eu nomeados, de ninguem dependem para a conservação da sua dignidade, e por consequencia, sendo independentes, melhor tractarão dos interesses do povo, e dos interesses do throno: é só então que póde existir esse supposto equilibrio, que com a segunda camara se pertende formar: entro porém agora em duvida qual dos dous meios será preferivel para a constituir, se a eleição, se a nomeação? Sr. Presidente, no meu modo de pensar a dignidade de membro da segunda camara, sendo vitalicia, deve ser considerada a mais elevada do estado, e então ella deve servir a recompensar um merecimento distincto, ou serviços remarcaveis, quando a elles se reunir o merito. Se este principio, que eu não tracto agora de demonstrar, for admittido, como eu julgo que deve ser, tambem se deverá admittir que a segunda camara deve ser formada por nomeação do Rei; mas o Rei ou os seus Ministros podem abusar, podem nomear pessoas indignas. Eis-aqui um grave inconveniente, para evitar o qual será preciso buscar alguns remedios.

Direi em poucas palavras a idéa, que a este respeito me têm lembrado, e é a seguinte = O Rei antes de proceder á eleição de qualquer membro deveria por um de seus Ministros mandar fazer na Camara dos Deputados uma proposta sobre = Se o individuo, que elle tinha em vista nomear, era digno de o ser aos olhos da nação, ou se poderia ser considerado benemerito da patria, ou em outros quaesquer termos decentes. A Camara dos Deputados deveria discutir as qualidades do sujeito em sessão publica, ou em sessão secreta, segundo parecesse mais acertado: sendo a sua decisão negativa, não poderia o Rei nomea-lo, e sendo affirmativa deveria ficar ao seu arbitrio expedir ou não o seu decreto da nomeação; na discussão porém deveria ser admittido o procurador geral da corôa para defender as qualidades do individuo, os seus interesses, e justificar assim a escolha do Governo.

Eis-aqui como me pareço que a nomeação regia seria mais regular, e como poderia evitar-se o inconveniente de uma má escolha, e de virem a entrar em segunda camara homens corrompidos, e perigosos á liberdade; e eis-aqui tambem como a nomeação dos membros da segunda camara viria indirectamente a ser modificada pelas vontades populares; com tudo devo declarar ao Congresso que, dado o caso que esta minha idéa podesse agradar, eu conviria em que ella fosse adoptada só para as nomeações do futuro, e que a primeira formação da segunda camara fosse feita por nomeação regia sobre proposta de eleição popular até certo numero de membros.

Sr. Presidente, tenho expendido o candido pensar da minha convicção; são estas as idéas de um homem, que não se abate, e que não é capaz de dobrar o joelho a ninguem para lhe agradar (e o mesmo conceito faço eu de todos os meus illustres collegas). São em fim as idéas de um homem firme nos seus principios, e que se lisongeia deter dado provas de ser verdadeiro amigo da liberdade da sua patria. Sim, Sr. Presidente, o meu amor da liberdade não consiste sómente em palavras de nullo e vão patriotismo; o meu amor da liberdade tem sido provado por factos successivos da minha vida publica. Muito me custa fallar de mim. Sr. Presidente, e ainda o não fiz neste Congresso, apezar do exemplo, que me tem dado varios Srs. Deputados: e não é sem grande pejo, e repugnancia que agora o faço; mas quando vai decidir-se o ponto mais importante da Constituição, eu quero evitar que fóra desta casa a malignidade, e a calumnia mordaz, que não sabem respeitar ninguem, nem ainda as conductas mais illibadas, se atrevam a lançar veneno na pureza das minhas intenções. Esta é uma occasião solemne, em que eu tenho rigoroso dever de declarar á nação que eu sou um dos seus filhos, que ajudei a quebrar-lhe os ferros, e a expulsar a tyrannia; que para lhe dar a liberdade arrisquei muitas vezes a vida; que unido ás fileiras academicas combati em toda a parte, em que o exercito libertador se viu a braços com os soldados de tyranno, nos Açores, no Porto, desde o Algarve até Cacilhas; e que aqui mesmo nas linhas desta capital combati ainda; até que as minhas forças desfaleceram, até que fui obrigado a succumbir ao ferro, ou ás balas dos inimigos: as minhas cicatrizes attestam esta verdade; mas estas épocas já lá vão muito remotas, e muita gente parece tê-las esquecido já: vamos á época mais proxima, á revolução de Setembro. Creio eu que ninguem haverá tão insensato, que ouse duvidar da minha adhesão ás instituições de Setembro, que