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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

5.ªSESSÃO

EM 13 DE JANEIRO DE 4903

SUMMARIO. - Lida e approvada a seta, faz-se a declaração de não haver expediente - O Sr. Ferreira da Cunha presta juramento na qualidade de supplente á presidencia. - O Sr Alberto Charula participa a constituição da commissão de legislação criminal - O Si Luciano pereira da Silva realiza o seu aviso previo sobre o actual regime de instrucção secundaria, respondendo-lhe o Sr. Ministro do Reino (Hintze Ribeiro) - Mandam requerimentos para a mesa os Sr. Manoel Affonso de Espregueira, Antonio Centeno, Antonio Cabral e Luiz José Dias

Na ordem do dia ( eleição de commissão) elege-se, em primeiro logar, a commissão de redacção - O Sr. Espregueira pede a palavra para um negocio urgente, propõe que o Sr. Ministro da Fazenda seja convidado a mandar publicar com brevidade anota da divida fluctuante, desde julho a dezembro - O Sr. Francisco José Machado requer votação nominal sobre se é urgente a proposta do Sr. Espregueira. Approvado o requerimento, procedi-se á chamada, sendo a urgencia rejeitada por 56 Srs. Deputados conta 24, e ficando a proposta para segunda leitura - Em seguida são eleitas as commissões de administração publica, de instrucção publica superior e especial, e de instrucção primeira e secundaria. - Antes de se encenar a sessão, trocam-se e aplicações entre os Srs. Presidente do Conselho (Hintze Ribeiro) e Espregueira.

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2 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Presidencia do Exmo. Sr. Matheus Teixeira de Azevedo

Secretarios - os Exmos. Srs.

Amandio Eduardo da Motta Veiga
José Joaquim Mendes Leal

Presentes - 68 Srs. Deputados.

São os seguintes: - Alberto Allen Pereira de Sequeira Bramão, Alberto Antonio de Moraes Carvalho Sobrinho, Alberto de Castro Pereira, de Almeida Navarro, Alexandre Ferreira Cabral Paes do Amaral, Alfredo Augusto José de Albuquerque, Alfredo Cesar Brandão, Alfredo Mendes de Magalhães Ramalho, Alvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Anselmo Augusto Vieira, Antonio Alberto Charula Pessanha, Antonio Augusto de Mendonça David, Antonio Belard da Fonseca, Antonio Caetano de Abreu Freire Egas Moniz, Antonio Centeno, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio Maria de Carvalho Almeida Sousa, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio Rodrigues Ribeiro, Antonio Sergio da Silva e Castro, Arthur Eduardo de Almeida Brandão, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Augusto Cesar Claro da Ricca, Avelino Augusto da Silva Monteiro, Belchior José Machado, Carlos de Almeida Pessanha, Carlos Augusto Ferreira, Carlos Malheiro Dias, Carlos Mariano de Carvalho, Conde de Castro e Solla, Domingos Eusebio da Fonseca, Eduardo de Abranches Ferreira da Cunha, Eduardo de Abranches, Emento Nunes da Costa Ornellas, Francisco Antonio da Veiga Benão, Francisco José Machado, Francisco José de Medeiros, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Francisco Roberto de Araujo de Magalhães Barros, Frederico Alexandrino Garcia Ramirez, Frederico dos Santos Martins, Guilherme Augusto Santa Rita, Henrique Vaz de Andrade Basto Ferreira, João Alfredo de Fana, João Carlos de Mello Pereira e Vasconcellos, João Joaquim André de Freitas, João Pinto Rodrigues dos Santos, João de Sousa Tavares, Joaquim Pereira Jardim, José Coelho da Motta Prego, José da Cunha Lima, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Jeronymo Rodrigues Monteiro, José Joaquim Mendes Leal, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Maria Pereira de Lima, Julio Ernesto de Lima Duque, Libanio Antonio Fialho Gomes, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla, Luciano Antonio Pereira da Silva, Luiz Fisher Berquó Poças Falcão, Luiz José Dias, Luiz de Mello Correia Pereira Medella, Malhou Augusto Ribeiro Sampaio, Matheus Teixeira de Azevedo, Ovídio de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral e Rodolpho Augusto de Sequeira.

Entraram durante a Sessão os Srs.: - Affonso Xavier Lopes Vieira, Agostinho Lucio e Silva, Antonio de Almeida Dias, Antonio José Boavida, Antonio Rodrigues Nogueira. Augusto José da Cunha, Augusto Neves dos Santos Carneiro, Carlos Alberto Soares Cardoso, Christovam Ayres de Magalhães Sepulveda, Clemente Joaquim dos Santos Pinto, Henrique Carlos de Carvalho Kendall, Henrique Matheus dos Santos, Hypacio Frederico de Brion, Jayme Arthur da Costa Pinto, João Ferreira Craveiro Lopes de Oliveira, José Maria de Oliveira Matos, José Maria de Oliveira Simões, Julio Mana do Andrade e Sousa, Luiz Filipe de Castro (D.), Manoel Affonso de Espregueira, Manoel Francisco de Vargas, Manoel Joaquim Fratel, Rodrigo Affonso Pequito e Visconde de Mangualde.

Não compareceram a sessão os Srs.: - Abel Pereira de Andrade, Albano de Mello Ribeiro Pinto, Alberto Botelho, Albino Mana de Carvalho Moreira, Alexandre José Sarsfield, Ahpio Albano Camello, Alvaro de Sousa Rego, Amadeu Augusto Pinto da Silva, Antonio Affonso Maria Vellado Alvas Pereira da Fonseca, Antonio Augusto do Sousa e Silva, Antonio Barbosa Mendonça, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Joaquim Ferreira Margando, António José Lopes Navarro. Antonio Roque da Silveira, Antonio do Sousa Pinto de Magalhães, Antonio Tavares Festas, Arthur da Costa Sousa Pinto Basto, Augusto Cesar da Rocha Louza, Augusto Fuschini, Conde de Paçô-Vieira, Conde de Penha Garcia, Condo do Restello, Custodio Miguel de Borja, Filipe Leite de Barros e Moura, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco José Patrício, Frederico Ressano Garcia, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida o Vasconcellos, João Augusto Pereira, João Monteiro Vieira de Castro, Joaquim Antonio de Sant´Anna, Joaquim da Cunha Telles e Vasconcellos, Joaquim Faustino de Pôças Leitão, José Adolpho de Mello e Roupa, José Caetano Rebello, José Caetano de Sousa e Lacerda, José Dias Ferreira, José Matinas Nunes, José do Matos Sobral Cid, José Nicolau Raposo Botelho, Julio Augusto Petra Vianna, Luiz Gonzaga dos Reis Torgal, Manoel Antonio Moreira Junior, Manoel Homem de Mello da Camara, Manoel de Sousa Avides, Mariano Cyrillo de Carvalho, Mariano José da Silva Prezado, Mano Augusto de Miranda Monteiro, Marquês de Reriz, Paulo de Barcos Pinto Osorio, Visconde de Reguengo (Jorge) e Visconde da Torre

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SESSÃO N.° 5 DE 13 DE JANEIRO DE 1903 3

ABERTURA DA SESSÃO - Ás 2 horas e 55 minutos da tarde

Não houve expediente.

O Sr. Presidente: - Convido o Sr. Deputado Ferreira da Cunha a prestar juramento na qualidade de supplente á presidencia.

S. Exa. prestou juramento.

O Sr. Charula Pessanha (por parte da commissão de legislação criminal): - Mando para a mesa a seguinte

Participação

Participo a V. Exa. que se acha installada e constituida a commissão de legislação criminal, sendo seu presidente o Exmo. Conselheiro Dias Ferreira e secretario eu, participante. = O Deputado, Alberto Charula.

Para a acta.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra ao Sr. Luciano Pereira da Silva para realizar o seu aviso previo, que, na sessão de 10 de janeiro, annunciou ao Sr. Ministro do Reino, sobre o actual regime da instrucção secundaria.

O Sr. Luciano da Silva: - Tendo tido a honra de presidir aos exames de saida no Lyceu Central de Lisboa, a sua experiencia leva-o a vir chamar a attenção do Sr. Ministro do Remo, a quem os assuntos da instrucção teem merecido especial cuidado, como mostram as suas recentes reformas de instrucção primaria, especial e superior, e ainda a resolução tomada por S. Exa. de serem publicadas na Imprensa da Universidade as obras do glorioso professor Gomes Teixeira, sobre algumas modificações que, a seu ver, devem ser introduzidas no regime actual.

A reforma de instrucção secundaria de 1894 pode considerar-se como uma das melhores que se conhecem. A sua opinião nada vale, mas o sabio pedagogo allemão Dr. Schiller, em dois artigos publicados na Revista allemã do ensino no estrangeiro, fazendo a apreciação d´essa reforma, tece-lhe os mais rasgados elogios, embora lhe faça tambem alguns reparos.

O regime vigente é, na opinião d´elle, orador, bom, mas carece de algumas alterações na sua realização pratica.

A Allemanha reformou em 1901 o seu ensino secundario; a França em 1902, e a Inglaterra no mês passado. Todos estes países modificaram radicalmente o seu ensino, porque entendem que é d´elle que deve provir a prosperidade dos povos.

Elle, orador, é da mesma opinião, e por isso entende que se lhe deve dar uma forma pratica.

O methodo de ensino recommendado no regulamento é excellente, mas faz referencia a material de ensino que não existe.

Para que o ensino seja profícuo não basta, porem, que o methodo seja bom; é indispensavel que os edificios onde elle se ministra sejam apropriados á educação physica, e que haja o material de ensino necessario.

Analysando o plano de estudos do lyceu, manifesta-se contra a pratica actual que exclue o inglês. Deseja o inglês, mas não á custa do allemão, sim á custa do latim. O inglês ou allemão optativos levaria á exclusão do allemão.

O desenho occupa um logar inferior, como mostram os menores vencimentos dos respectivos professores, o que não deve ser dando-se a esta disciplina a missão de dar aos alumnos uma educação artística elementar.

Não quer um curso unico para todas as vocações intellectuaes e para todas as profissões. Cita os exemplos da Allemanha, Suecia, Noruega, Suissa, Austria, Belgica, Italia, França e Estados Unidos Refere se á tendencia que ha na Allemanha para a generalização das escolas reformistas de Altona e Franckfort com uma base commum de tres annos para os differentes cursos

Manifesta-se contra, o regime do compendio unico que subalterniza o professor ao compendio, com graves penas e serios inconvenientes para o ensino.

Pede a revisão dos programmas, que acha longos e exagerados.

Compara as horas de aula semanaes em Portugal com as horas correspondentes da Allemanha e acha uma sobrecarga proveniente da hora escolar allemã ser de 50 minutos. Compara tambem com os horarios franceses e dos Estados Unidos, que são mais reduzidos que os portugueses. Pede que o intervallo que separe os dois períodos se ponha de acordo com os usos familiares, para que os alumnos possam ter descanso á hora habitual do almoço.

Pede que a faculdade de mathematica possa, por si só, habilitar os professores de mathematica.

Não desejando cansar mais a Camara, e tendo chamado a attenção do Sr. Ministro do Reino para os pontos, na reorganização do ensino, que lhe pareceram essenciaes, o orador dá por findas as suas considerações, confiando plenamente em que, dedicando S. Exa. as suas poderosas faculdades á questão da instrucção, nós teremos um ensino tão perfeito quanto permittem os recursos do país.

(O discurso será publica-lo na integra quando S. Exa. restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Presidente : - Tem a palavra o Sr. Presidente do Conselho. Previno S. Exa. de que faltam sete minutos para se entrar na ordem do dia

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros e Ministro do Reino (Hintze Ribeiro): - Sr. Presidente: Folguei de ouvir, o illustre deputado, o Sr Luciano Pereira da Silva a quem dirijo as mais sinceras felicitações por ser a primeira vez que S. Exa. toma a palavra nesta casa do Parlamento e por ter falado com uma elevação de vistas e com uma facilidade de palavra que o tornam um orador distincto. E folguei de o ouvir, não só pelo bom criterio que manifestou discursando com a experiencia que lhe dá o professorado, mas tambem porque me pareceu que S. Exa. em todo o seu discurso teve sempre uma nota absolutamente justa. (Apoiados).

O illustre Deputado fez varias observações a cêrca da realização pratica da reforma do ensino secundario apontando algumas alterações, aperfeiçoamentos e modificações a introduzir, mas applaudiu o pensamento essencial da reforma, e, por consequencia, contrapondo á indolencia de muitos e aos ataques de outros, o que parece ser perfeitamente justo e perfeitamente praticavel

Pouco depois da reforma do ensino secundario entrar em execução houve uma modificação ministerial e veiu para o Ministerio do Reino quem tinha responsabilidades ligadas a reformas e regulamentos essencialmente diversos no seu modo de ser e de interpretar. E por que surgiram reclamações, porque não faltou quem viesse apresentar defeitos graves e perigos grandes e manifestos da reforma de instrucção, foi nomeada uma commissão pelo meu antecessor, commissão composta d´aquelles que tinham não só experiencia do professorado, mas conhecimentos precisos do que era e do que devia ser o ensino secundario entre nós, e desprendidos de qualquer paixão política para examinarem a questão no que ella era verdadeiramente em si, isto é uma questão de superior importancia.

Essa commissão em 1898, quer dizer quando a reforma

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4 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

do ensino secundario já tinha tres annos de execução quando por consequencia já se haviam manifestado os seus inconvenientes, quando já se haviam feito reclamações acêrca dos perigos que poderia apresentar, emittiu o seu voto. E folgo de poder fazer neste momento leitura d'esse voto perfeitamente esclarecido, inteiramente, insuspeito:

"Por seu lado a commissão, pelo menos um prende maioria, reconhece que, em materia de instrucção secundaria, é a primeira vez que Portugal conseguiu um lugar honroso junto das nações da Europa que caminham na vanguarda da civilização e que seria um erro voltar a praticas condemnadas e a processos caídos, ha muito, no ouvido, em toda a parte, onde os grandes interesses do ensino são respeitados".

Este voto, assim tão claramente expresso é a condemnação do passado e um appello para o futuro, a fim de se manter nas suas bases ensenciaes a reforma de instrucção secundaria criada em 1894. Esta commissão era composta dos seguintes Srs.: Conselheiro Antonio Candido, Dr. Fernandes Vaz, Achiles Machado, Moreira Junior, Manoel Joaquim Teixeira, Arsenio de Mascarenhas, Evaristo Gomes Saraiva e Francisco de Paula Azevedo. Todos cavalheiros, que durara uma honesta opinião acêrca d'esta reforma, absolutamente desprendidos de quaesquer interesses particulares, olhando para a reforma no que ella tinha de alcance, no que valia e no que representava e no que d'ella havia a esperar.

Ora, Sr. Presidente, eu li hoje este parecer tão autorizado e, tão insuspeito sobro o ajunto para dizer á Camara muito convencidamente, que em materia de instrucção secundaria não sou, até o extremo, partidario de tudo quanto a reforma encerra actualmente, que não veja e reconheça a necessidade de a modificar em um ou outro ponto a fim, d'ella ficar mais pratica. Sou partidario dos seus principios e estou absolutamente convencido da conveniencia dos seus elementos principaes e do que retroceder ao passado seria uma vergonha.

(S. Exa. não reviu).

O Sr. Presidente: - Deu a hora de se passar á ordem do dia. Os Srs. Deputados que pediram a palavra e tenham papeis para mandar para a mesa, podem fazê-lo.

O Sr. Manoel Affonso Espregueira: - Apresento os seguintes

Requerimentos

Requeiro que, pelo Ministerio da Fazenda, me seja enviada uma nota dos creditos especiaes autorizados para o exercicio de 1904-1902, separadamente por Ministerios, e por capitulos d'esses Ministerios, indicando-se as datas em que foram publicados no Diario do Governo, - M. Espregueira.

Requeiro que, pelo Ministerio da Fazenda, me sejam enviados os seguintes esclarecimentos, como additamento ao mappa publicado a pag. 45 do relatório da fazenda de 1902, parte II:

Importancia, em moeda francesa, dos títulos da divida externa de 3 por cento, 4 por cento e 4 1/2 por cento, na posse da Fazenda e em circulação em 31 de dezembro de 1901;

Importancia da mesma moeda dos titulos amortizados no primeiro bimestre de 1902 = M. Espregueira.

Mandaram-se expedir.

O Sr. Antonio Centeno: - Mando para a mesa os seguintes

Requerimentos

Requeiro que me sejam enviados com urgencia os seguintes documentos:

1.° Mappa mensal e detalhado das forças effectivas no exercito, durando o exercício de 1901-1902 e até 31 de dezembro de 1902;

2.° Mappa mensal dos solipedes existentes nos regimentos de cavallaria e artilharia, durante o exercicio de 1901-1902 e até 31 de dezembro de 1902;

3.° Producto da venda de solipedes julgados impróprios para serviço, durante o mesmo lapso de tempo, e destino dado a esse dinheiro = Antonio Centeno.

Requeiro que me sejam enviados com urgencia os seguintes documentos:

1.º Copia das peças apresentadas pelo Governo ou pelos seus representantes e pela Empresa Hersent e Ca. perante o Tribunal Arbitral que proferiu sentença em 12 de julho do proximo passado;

2.° Copia do compromisso de nomeação de arbitros;

3.° Copia das actas de todas na sessões que os árbitros realizaram, incluindo a do julgamento final;

4.° Copia da respectiva sentença;

5.° Copia de qualquer correspondência que sobre este assunto tenha sido trocada entre o Ministerio das Obras Publicas e qualquer outro Ministerio, Tribunal Arbitrai e Empresa Hersent - Antonio Centeno.

Mandaram-se expedir.

O Sr. António Cabral: - Apresento os seguintes

Requerimentos

Requeiro que, pelo Ministerio da Fazenda, me seja enviada com urgencia copia do decreto que collocou o antigo empregado da fiscalização aduaneira, Antonio Pusich do Mello, no corpo da fiscalização dos impostos. = Antonio Cabral.

Requeiro que, pelo Tribunal de Contas, me seja enviado com urgencia documento que prove, qual foi a data precisa em que aquelle tribunal pôs o seu visto no decreto do anno de 1902, que collocou Antonio Fusich de Mello, antigo empregado da fiscalização aduaneira, no corpo da fiscalização dos impostos. = O Deputado, Antonio Cabral.

Mandaram-se expedir.

O Sr. Luiz José Dias. - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que, pela Direcção Geral de Agricultura, me sejam mandados com urgencia os seguintes documentos:

1.º Nota de todas as fabricas de formação e panificação existentes no país devidamente matriculadas com nomes de seus donos e localidades de sua laboração; e bem assim nota das padarias pertencentes á Companhia Portuguesa de Panificação, nomes e localidades e igual nota das que não pertencem a essa companhia, situadas em Lisboa dentro da area local da circunvalação; e bem assim ainda nota das licenças de trepaste de padarias concedidas pela Inspecção Technica das marinhas e do Pão, seus nomes e localidades, desde 1899 até 31 de dezembro de 1902;

2.º Nota do numero de amostras de farinhas e de pão colhidas pela Inspecção Technica, e das oferecidas pelos fabricantes desde 1 de julho de 1900 até 31 de dezembro do 1902; e bem assim nota das amostras classificadas de corruptas, avariadas e adulteradas e das classificadas de capazes para o consumo e das prejudiciaes á saude publico; e ainda nota do procedimento havido por parte da Inspecção com respeito aos generos assim classificados e nos seus respectivos donos, desde 1 de julho de 1900 até 21 de dezembro de 1902;

3.º Nota mensal das transgressões descobertas pela Fiscalização Technica das Farinhas e do Pão desde 1 de julho de 1900 até 31 de dezembro de 1902 e qual o proce-

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SESSÃO N.º 5 DE 13 DE JANEIRO DE 1903 5

dimento intentado contra os transgressores; e bem assim nota dos autos levantados contra os vendedores de trigo exotico, sendo fabricantes matriculados, e qual o destino d´esses autos relativamente ao citado periodo;

4.° Nota das fabricas da formação e panificação visitadas pela Inspecção Technica desde 1 de julho de 1900 até 31 de dezembro de 1902 para o effeito de colher amostras e sua respectiva classificação pelo competente laboratorio; e bem assim relatorios mappas da commissão revisora das fabricas de moagens do país para conhecer a sua capacidade de laboração; e a nota da quota distribuída pela inspecção a cada fabrica para o effeito do rateio, e nota d´este durante o mesmo período ;

5.º Nota do numero de padarias que executaram obras por ordem da inspecção, destrinçando-se cada uma de per si e o tempo gasto na execução d´essas obras, bem como nota das licenças provisorias dadas pela inspecção, e isto desde a vigencia do decreto de 26 de julho de 1899 até 31 de dezembro de 1902; e bem assim nota das fabricas que desde 1 de julho de 1900 até 31 de dezembro de 1902 foram eliminadas da matricula ou suspensas da laboração; e ainda mappas mensaes estatísticos relativos ao serviço da fiscalização das farinhas e do pão durante o mesmo periodo. = O Deputado, Luis José Dias.

Mandou-se expedir.

ORDEM DO DIA

Eleição de commissões

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se á eleição da commissão de redacção.

Fez-se a chamada.

O Sr. Presidente: - Convido os Srs. Agostinho Lucio e Luís Correia Medella a servirem de escrutinadores.

Corrido o escrutinio, verificou-se terem entrado na urna 59 listas, sendo 11 brancas, saindo eleitos os Srs.:

Alberto Allen Pereira de Sequeira Bramão, com 48 votos

Alipio Albano Camello .................. 48 "

Antonio Sergio da Silva e Castro ........... 48 "

Carlos Malheiro Dias ..................... 48 "

João de Sousa Tavares ................. 48 "

O Sr. Presidente : - Peço a attenção da Camara e peço aos Senhores Deputados que occupem os seus lugares O Sr. Deputado Espregueira. pediu a palavra para um negocio urgente. A mesa não o considerou como tal e por isso vae lêr-se para a Camara se pronunciar sobre elle.

Leu. É a seguinte

Proposta

Proponho que o Sr. Ministro da Fazenda seja convidado a mandar publicar, com brevidade, a nota da divida fluctuante nos meses de julho a dezembro ultimo = M. Espregueira.

O Sr. Francisco José Machado (sobre o modo de votar): - Mando para a mesa o seguinte requerimento

Requerimento

Requeiro que haja rotação nominal sobre se é ou não urgente a proposta do Sr. Deputado Espregueira. = F. J. Machado.

Foi approvado.

O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados que entendem que a proposta do Sr. Espregueira é urgente dizem approvo e os que entendem que não é urgente dizem rejeito.

O Sr. Francisco Beirão: - V. Exa. explicou bem? Quem quer saber o estado da divida fluctuante diz approvo e quem não quer, diz rejeito. Não é verdade?

O Sr. Presidente: - É o que consta dos termos da proposta.

Faz-se a chamada.

Disseram approvo os Srs.: Alexandre Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio Caetano de Abreu Freire Egas Moniz, Antonio Centeno, Antonio Ferreira Cabral Paes da Amaral, Antonio Mana de Carvalho Almeida Serra, Antonio Mana Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio Rodrigues Nogueira, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Augusto José da Cunha, Carlos de Almeida Pessanha, Carlos Augusto Ferreira, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco José Machado, Francisco José de Medeiros, Frederico Alexandrino Garia Ramirez, João Pinto Rodrigues dos Santos, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabial, José Mana de Oliveira Matos, Libanio Antonio Fialho Gomes, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla, Luiz Fisher Berquó Pôças Falcão, Luiz José Dias, Manoel Affonso de Espregueira, Ovidio de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral.

Disseram rejeito os Srs.: Affonso Xavier Lopes Vieira, Agostinho Lucio o Silva, Alberto Allen Pereira de Sequeira Bramão, Alberto Antonio de Moraes Carvalho Sobrinho, Alberto de Castro Pereira de Almeida Navarro, Alfredo Cesar Brandão, Anselmo Augusto Vieira, Antonio Alberto Charula Pessanha, Antonio de Almeida Dias, Antonio Belard da Fonseca, Antonio José Boavida, Antonio Rodrigues Ribeiro, Arthur Eduardo de Almeida Brandão, Augusto César Claro da Ricca, Augusto Neves dos Santos Martins, Avelino Augusto da Silva Monteiro, Belchior José Machado, Carlos Malheito Dias, Carlos Mariano de Carvalho, Christovam Ayres de Magalhães Sepulveda, Clemente Joaquim dos Santos Pinto, Conde de Castro e Solla, Domingos Eusebio da Fonseca, Eduardo de Abranches Ferreira da Cunha, Eduardo Burnay, Ernesto Nunes da Costa Ornellas, Francisco Roberto de Araujo de Magalhães Burros, Frederico dos Santos Martins, Henrique Matheus dos Santos, Henrique Vaz de Andrade Basto Ferreira, Hypacio Frederico de Brion, Jayme Arthur da Costa Pinto, João Alfredo de Faria, João Carlos de Mello Pereira e Vasconcellos, João Ferreira Craveiro Lopes de Oliveira, João Joaquim André de Freitas, João de Sousa Tavares, Joaquim Pereira . José Coelho da Motta Prego, José da Cunha Lima, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Jeronymo Rodrigues Monteiro, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, José Maria de Oliveira Simões, José Mana Pereira de Lima, Júlio Mana de Andrade e Sousa, Luciano Antonio Pereira da Silva, Luiz Filipe de Castro (D), Luiz de Mello Correia Pereira Medella, Manoel Joaquim Fratel, Matheus Augusto Ribeiro Sampaio, Rodolpho Augusto de Sequeira, Rodrigo Affonso Pequito, José Joaquim Mendes Leal, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Matheus Teixeira de Azevedo.

O Sr. Presidente: - Approvaram 24, rejeitaram 56. Vão lêr-se os nomes dos Srs Deputados que disseram approvo.

Leram-se.

O Sr. Presidente: - A urgencia da proposta está rejeitada e esta fica na mesa para segunda leitura.

Vae proceder-se á eleição da commissão de administração publica.

Fez-se a chamada.

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6 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

O Sr. Presidente: - Convido para escrutinadores os Srs. João Alfredo de Faria e Hypacio de Brion.

Corrido o escrutínio, verificou-se terem entrado na urna 51 listas das quaes 3 brancas, Sendo eleitos os Srs.:

Abel de Andrade, com.................... 48 votos

Affonso Lopes Viena.................... 48

Alvaro Possolo......................... 48

Amadeu Finto da Silva.................. 48

Augusto dos Santos Carneiro.............. 48

Conde do Paçô-Vieira.................... 48

Francisco de Lacerda Ravasco............. 48

Henrique Vaz de Andrade Basto Ferreira.... 48

Jayme Arthur da Costa Pinto............. 48

Joaquim Pereira Jardim.................. 48

José da Motta Prego..................... 48

José Joaquim Mendes Leal................ 48

Manoel Fratel .......................... 48

Mario de Miranda Monteiro............... 48

Rodrigo Affonso Pequito................... 48

O Sr. Presidente: - Vae proceder-se ás eleições das commissões de instrucção publica, superior e especial e das commissões de instrucção primaria e secundaria A urna da direita é para a eleição da commissão de instrucção publica superior e especial e a da esquerda para a de instrucção primaria e secundaria.

Fez se a chamada.

O Sr. Presidente: - Convido os Srs. Costa Pinto e Matheus Sampaio a servem de escrutinadores.

Corrido o escrutínio para a eleição da commissão de instrucção publica superior e especial, verificou-se terem entrado na urna 4G listas, sendo 2 brancas, e ficando eleitos os seguintes Srs.:

Abel de Andrade, com.................. 44 votos

Arthur Pinto de Miranda Montenegro....... 44 "

Christovam Ayres de Magalhães Sepulveda... 44 "

Clemente Joaquim dos Santos Pinto......... 44 "

Eduardo Burnay...................... 44 "

José Dias Ferreira....................... 44 "

João Maria de Oliveira Simões............. 44 "

José de Matos Sobral Cid................. 44 "

Luciano Antonio Pereira da Silva........... 44 "

Mariano Cyrillo de Carvalho............... 44 "

Rodrigo Affonso Pequito................... 44 "

Frito em seguida o escrutinio para a eleição da commissão da instrucção primaria e secundaria, verificou-se terem entrado na urna 46 listas, sendo 3 brancas, ficando eleitos os Srs. :

Abel de Andrade, com................. 43 votos

Alberto Botelho......................... 43 "

Alipio Albano Camello................... 43 "

Antonio Affonso Maria Vellado Alves Pereira da

Fonseca............................ 43 "

Augusto Cesar Claro da Ricca............. 43 "

Carlos Malheiro Dias.................... 43 "

Henrique Vaz de Andrade Basto Ferreira ... 43 "

João de Sousa Tavares................... 43 votos

José Joaquim Mendes Leal................ 43 "

José Nicolau Raposo Botelho............... 43 "

Mariano José da Silva Pregado............. 43 "

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros (Hintze Ribeiro): - Sr. Presidente: A Camara comprehende que eu não venho, nem posso, discutir a proposta mandada para a mesa pelo illustre Deputado o Sr. Espregueira, e cuja urgencia a maioria d´esta casa do Parlamento rejeitou. Entendo, pela minha parte que a maioria rejeitou essa urgencia por julgar que o Governo não carecia de ser convidado a esclarecer a situação financeira do país (apoiados). Mas, por deferencia para com o illustre Deputado quero declarar que o Governo publicará logo que possa os documentos que S. Exa. deseja. O que não podo é publicar, desde já, as notas da divida fluctuante até o fim de dezembro, porque quem foi Ministro da Fazenda sabe que em meados de janeiro ainda não estão apuradas as contas e os saldos respectivos para se poder publicar immediatamente a nota da divida fluctuante até 31 de dezembro.

Logo, porem, que isso esteja apurado, o Governo publicará essas notas para que todos as possam apreciar.

Tenho dito.

(S. Exa. não reviu).

O Sr. Manoel Affonso Espregueira: - Sr. Presidente: Peço a V. Exa. que consulte a Camara sobre se permitte que eu use da palavra por poucos minutos.

Consultada a Camara, resolve affirmativamente.

O Sr. Manoel Affonso Espregueira: - Sr. Presidente: Em primeiro logar agradeço ao illustre Presidente do Conselho as suas explicações e a deferencia que acaba de ter commigo, assim como á mesmo, o ter-me consentido que usasse da palavra nesta altura. O illustre Presidente do Conselho disse, e muito bem, que é quasi impossível em l5 de janeiro dar-se a nota exacta e definitiva da divida fluctuante até 31 de dezembro. Mas a de julho, agosto, setembro, outubro ou novembro, com certeza não teem as mesmas difficuldades. Por isso, o que pedia ao Sr. Presidente do Conselho é que, em logar de se reservar a publicação do segundo semestre do anno passado se vão publicando as notas das meses posteriores a junho. Era isto unicamente o que eu tinha a dizer.

(S. Exa. não reviu).

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros (Hintze Ribeiro): - Sr. Presidente: Pedi a palavra unicamente para declarar ao illustre Deputado que a resposta affirmativa ao seu desejo julgava eu estar comprehendida nas palavras que proferi ha pouco tempo, de que, logo que o Governo possa, publicara as notas da divida fluctuante.

(S. Exa. não reviu).

O Sr. Presidente. - A primeira sessão é amanhã, 14, á hora regimental. A ordem do dia é a mesma que estava dada para hoje: eleição do commissões.

Está levantada a sessão.

Eram 5 horas e 20 minutos da tarde.

O REDACTOR = Mello Barreto.

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APPENDICE Á SESSÃO N.º 5 DE 13 DE JANEIRO DE 1903 7

Discurso proferido pelo Sr. Deputado Luciano Augusto Pereira da Silva, que devia ler-se a pag 3 da sessão n.º 5 de 13 de janeiro de 1903

O Sr. Luciano Pereira da Silva: - Sr. Presidente, a actual organização do ensino secundario attingiu, no anno lectivo findo, o periodo da sua completa execução. Tendo eu tido a honra de presidir, no anno passado, aos exames, de saída do curso complementar no lyceu de Lisboa, e, anteriormente, a exames de saída do curso geral noutros lyceus, a pratica d´estes serviços, e o interesse que naturalmente em mim despertam as questões relativas ao ensino, determinam-me a chamar para tão importante assunto a attenção do Sr. Presidente do Conselho e Ministro do Reino, a quem a instrucção publica do país tem merecido, sempre, os maiores desvelos e o maior interesse. (Apoiados), Provam-no as importantes reformas por S. Exa. feitas na instrucção superior, especial e primaria (Apoiados) e, na instrucção secundaria, a particular attenção que lhe tem merecido a questão da habilitação e educação dos professores, que é, na verdade, o ponto fundamental do ensino (Apoiados). Ha um facto, porem, que não posso deixar de mencionar aqui, e que em mim causou o maior prazer quando o soube. Refiro-me á portaria que manda imprimir na Imprensa da Universidade a obra do eminente professor o Sr. Dr. Francisco Gomes Teixeira. Este acto não é dos que menos honram o Sr. Ministro do Reino, porque a obra do modesto mas glorioso professor colloca o nosso país, no ramo especial das sciencias mathematicas, a par das nações mais cultas. (Apoiados).

Sr. Presidente: não se veja, nas considerações que vou fazer, menos apreço pela actual organização do nosso ensino secundario, cujos resultados, apesar das naturaes hesitações do principio, se fazem já sentir favoravelmente nos cursos superiores. Pelo contrario: estou bem convencido que, depois do decreto de 17 de novembro de 1836, que criou os lyceus nacionaes, o facto culminante na historia do ensino secundario português é o decreto de 22 de dezembro de 1894 de que resultou o actual regime. (Apoiados). Mas a minha opinião nada vale, e, por isso, não quero deixar de citar a de um illustre pedagogista allemão, o professor Dr. Schiller que, apreciando em dois artigos successivos na Deutsche Zeitschriftar Auslandisches Unterrichtsivesen a reforma portuguesa de 1894, lhe faz os maiores elogios, embora lhe faça tambem alguns reparos, como é o systema do compendio unico, que elle julga contrario ao espirito da reforma, e a demasiada extensão de alguns programmas.

Quando subiu ao poder a ultima situação progressista, aquelle distincto pedagogista voltou a occupar-se do ensino português num pequeno artigo, de que peço licença para ler algumas passagens:

Não é exagero dizer-se que a reforma portuguesa se pode, sob o ponto de vista pedagogico, pôr a par do que de melhor possuem os outros países... Chega-nos a noticia da queda do Ministerio que fez a reorganização, assumindo o governo dos negocios da Instrucção publica o mesmo estadista que pelos seus conselheiros foi levado ás infelizes reformas de 1886 e 1888. Tomará elle a actual reforma sob a sua protecção? É para desejar e é de esperar".

Os votos do illustre professor foram satisfeitos pelo nobre e honrado chefe do partido progressista.

Referindo-se ainda a uma petição dos professores de ensino livre, que então reclamavam a redacção do curso lyceal a seis annos, com uma bifurcação a partir do 4.° anno, o francês e inglês obrigatorio com exclusão do allemão, o regresso ao antigo systema de exames e a admissão dos professores do ensino livre como membros dos jurys de exames, diz finalmente:

É profundamente lamentavel que, logo depois do acto mais importante da legislação escolar portuguesa, ousem manifestar-se tão obsoletas opiniões.

Sr. Presidente, convencido como estou de que a actual organização é boa nas suas linhas geraes e essenciaes, eu entendo que ella precisa de algumas modificações nas suas formas accidentaes, na sua realização pratica.

É tempo de introduzir no ensino os melhoramentos que a experiencia reclama. Não faremos nisso mais do que seguir o exemplo das nações mais adeantadas.

A Prussia modificou o seu ensino secundario em 1901, a França refundiu-o completamente pelo decreto de 31 de maio de 1902, e a Inglaterra acaba de approvar, no mês findo, o seu education bill que reforma a instrucção primaria e secundaria.

Não foram pouco importantes as modificações prussianas Pela primeira vez obteem as mesmas sancções os cursos dos gymnasios, dos reaes gymnasios e escolas reaes superiores; o realismo alcança emfim as regalias do humanismo. O exame de saída do 6.º anno, a que corresponde, entre nós, o do 5.° anno, foi supprimido.

Devemos nós, a exemplo da Prussia, acabar com o exame de saída do 5.° anno, fazendo a passagem do 5 ° anno para o 6.°, como nos demais annos, e tendo apenas um exame de saida no fim do curso? Entendo que sim

A Allemanha, persuadida de que deve ás suas escolas a sua actual prosperidade e grandeza, vela constantemente pelo aperfeiçoamento dos institutos secundarios, onde os alumnos recebem uma educarão completa, quer sob o ponto de vista physico, quer sob o ponto de vista intelectual e moral

Para o desenvolvimento physico teem os alumnos a gymnastica e exercícios militares; o ensino das disciplinas é feito pela organização em classes, como a reforma portuguesa adoptou, em que se pretende menos dar noções e conhecimentos do que promover o desenvolvimento gradual e harmonico das diferentes actividades intellectuaes; forma-se o caracter, solicitando a vontade na aspiração de um elevado ideal moral; trata-se de educar uma creatura humana moralmente bella, intelectualmente forte e physicamente resistente.

Quem estuda attentamente a forte organização do ensino na Allemanha, cuidada nas menores particularidades, vê este grande país estabelecendo nas suas escolas uma linha de defesa intellectual, que, indirectamente, é uma linha de defesa industrial e commercial.

A França, no anno passado, transformou completamente o seu ensino secundario. As causas d´esta transformação podem ver-se nas palavras com que o Sr. Jules Lemastre, da Academia Francesa, começa a sua conferencia sobre a reforma do ensino, em plena Sorbonne, em 5 de junho de 1898:

"Mesdames et Messieurs:

Il y a de tristes vérités que vous connaissez tous. Nous

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sommes présentement dépassés, et de beaucoup, par d´autres peuples en activité productive. La Franco n´est plus une puissance industrielle ni commerciale de premiei ordre. Nos colonies ne nous sauveront que si nous savons les exploiter.

Or, il y a de terribles disconvonances entre l´enseignement qui est donné à la plupart des enfants des classes moyennes et ce qu´ils auront à faire dans la vic...

Sr. Presidente: O problema do ensino é assim posto como um problema economico, e mais vital. A Franca, reformou a sua instrucção secundaria, para que a mocidade não saia das escolas munida de diplomas, que só lhe sirvam para concorrer aos logares remunerados pelo Estado; mas antes receba nellas uma solida educação que a habilite a lançar-se nas carreiras do commercio, da agricultura, da industria e das explorações coloniaes (Apoiados), procurando nellas os meios de fortuna propria, e desenvolvendo, ao mesmo tempo, poderosamente a riqueza publica. (Apoiados).

O Governo inglês reformou, ainda no mês passado, o seu ensino primario e secundario, através de grandes difficuldades, sobretudo de ordem religiosa. Os catholicos e a Igreja Anglicana eram favoraveis á reforma, mas atacavam-na violentamente as Igrejas livres, porque, mantendo á custa do Estado as escolas denominacionalistas, o education bill contrariava principios de liberdade civil e religiosa que os não conformistas sempre defenderam.

Na Inglaterra as escolas foram nascendo, filhas da iniciativa particular, para satisfação de necessidades locaes, com vida propria e independente, mas com uma tal variedade de formas que Lord Rosebery, no seu celebre discurso de Chesterfield, dizia que os ingleses não tinham um systema nacional de ensino, mas sim um cabos desordenado.

Para pôr ordem nesta confusão, o novo Education Act submette, nos condados, as escolas aos Education Comitties e estes ao Board of Education de Londres.

Num país como a Inglaterra, de uma grande liberdade de iniciativa particular, o Estado entende necessario pôr mão forte sobre o ensino, para o elevar á altura da sua missão.

E porque? Porque lá se ouve este grito de alarme: Educate, educate, educate! or perish. Ensinar ou morrer!

Na luta de concorrencia que lhe fazem, do lado do Mar do Norte - a Allemanha, e do lado do Atlantico - os Estados Unidos, a Inglaterra busca um forte ponto de apoio nas suas escolas, que ella julga superiores sob o ponto de vista educativo, porque, melhor do que na Allemanha, ellas desenvolvem as qualidades de iniciativa, independencia e de self-government, mas que são inferiores sob o ponto de vista do ensino.

Ainda na ultima sessão outonal da British Association for the Advancement of Science, em Belfast, o presidente Prof. Dewar, no discurso inaugural, reconhecia que, actualmente, as industrias chimicas teem na Allemanha um valor triplo do que teem na Inglaterra estas industrias, que se fundam largamente em descobertas feitas por chimicos ingleses, nunca devidamente apreciadas na terra em que nasceram. E aquelle illustre professor de chimica attribue esta inferioridade á falta de diffusão do ensino, e pede que se trate com ardor de aumentar a instrucção geral, para que a Inglaterra, possa lutar com vantagem no campo industrial e commercial.

Os paises, a que me tenho referido, consideram uma boa e solida organização da instrucção secundaria como condição e base indispensavel da sua prosperidade. A Inglaterra, que sae de uma guerra que tantos sacrifícios lhe custou em vidas e dinheiro, destina-lhe sommas consideraaveis.

Tambem nós, dentro das forças do orçamento, devemos dotar as nossas escolas com os recursos necessarios.

Ha uma parte material que é fundamental na instrucção. Refiro me não só ao material de ensino, mas aos edificios dos lyceus que devem, alem de satisfazer ás precisas condições hygienicas, ser apropriados para se dar á mocidade a educação physica que não pode continuar a ser descurada e desattendida.

A educação secundaria não deve dirigir-se só ás faculdades intellectuaes; devo dar aos alumnos as qualidades de resistencia physica indispensaveis para que possam dedicar-se ás differentes carreiras da actividade humana, quer na metropole, quer nas colonias. (Apoiados).

É preciso dotar as escolas com o conveniente material do ensino, para que se acabe com a pratica de decorar compendios, com os processos mnemonicos de sobrecarregar a memoria com mal comprehendidas noções, e se possam empregar os methodos praticos, fundados na observação e experiencia, que são os que permittem a acquisição de conhecimentos permanentes, e o desenvolvimento progressivo e harmonico da intelligencia. (Apoiados).

Relativamente aos outros elementos de ensino, direi já, que não concordo com o quadro de estudos que preceitua um curso unico para todos os destinos sociaes, como não concordo com o monopolio do compendio unico. Os programmas devem ser simplificados Quanto a methodos de ensino, excellente doutrina se encontra no artigo 22.° do regulamento, mas faz-se ahi referencia a um material do ensino, que não existe e appella se para as qualidades dos professores. Ora esta é a questão principal, porque programmas, material, quadros de estudo e compendios, são em si cousas mortas, e é o professor que nellas insuflavida. Bons professores - quer dizer-bom ensino; maus professores - quer dizer-mau ensino. (Apoiados).

Actualmente, segundo o exemplo allemão, tanto em Franca, como na Inglaterra, como nos Estados Unidos, a attenção volta-se para a preparação pedagogica theorica e pratica dos professores. Tambem, na organização dos cursos para habilitação do professorado secundario, o Sr. Presidente do Conselho seguiu a moderna orientação, porque, sendo os tres primeiros annos destinados á necessaria preparação scientifica, o quarto anno exercita especialmente para o magisterio. Neste ponto desejo eu pedir ao Sr Presidente do Conselho, não uma modificação, mas um additamento, para que a faculdade de mathematica da Universidade possa, por si só, habilitar tambem professores de mathematica para os lyceus.

Occupar-me-hei mais em particular d´este assunto tanto quanto o tempo m´o permittir.

Entrando agora na analyse do actual plano de estudos, começarei pela situação criada á língua inglesa, que, sendo obrigatoria só para o curso geral, acabou por não ser estudada em lyceu algum: isto é, está praticamente banida do ensino secundario. Ora o inglês não deve ser excluído do curso dos lyceus. (Apoiados).

Então ha de deixar de estudar-se precisamente a lingua do país com que vivemos em relações mais intimas, a lingua da Inglaterra e dos Estados Unidos, as duas nações mais importantes sob o ponto de vista economico?

Mas, independentemente das vantagens praticas do inglês no país e nas colonias, a Inglaterra, pela sua literatura e pelo desenvolvimento que nella tem a applicação da arte ás industrias, merece que se estude a sua lingua. Só John Ruskin, o mais bello prosador britannico do seculo XIX, dá, na leitura dos seus livros encantadores, compensação sufficiente ao trabalho da acquisição do inglês. (Apoiados).

Mas, até lendo os nossos programmas, ou vejo os incon-

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venientes de se pôr de parte o inglês. Na pag. 151 do regulamento (edição official), leio o seguinte, no programma de historia, 4.ª classe:

"A revolução inglesa de 1648. Suas causas. Os Stuarts. Jarques I e Carlos I".

Oh Sr. Presidente! Mas quem é este Jaeques l? Qualquer inglês nos dirá que não houve no seu país nenhum rei Jacques l, mas sim JAMES I. Ora, tendo nós mais de um nome até para, substituir este, porque é que o alumno português não ha de empregar, para designar um rei de Inglaterra, nem o nome inglês, nem o nome português, mas sim, o nome francês correspondente?! É como se ao proprio Sr. Conselheiro Jayme Moniz, a quem o país deve tão assinalado e relevante serviço como a organização da actual reforma, alguem se lembrasse de trocar o primeiro nome pelo de Jacques!

Ora eu não peço que se introduza o inglês como optativo com o allemão, porque os alumnos escolheriam naturalmente a língua mais facil, e seriamos assim levados praticamente á exclusão do allemão, que tem um grande valor pelo enorme desenvolvimento scientifico da Allemanha Abra-se caminho, antes á custa do latim do que do allemão.

Para o alumno que já estudou o francês e o allemão, é muito facil o estudo do inglês. Esta, lingua é, como todos sabem, um ramo do baixo allemão que, transportado para a Gran-Bretanha pela invasão anglo-savanica, soffreu, depois da conquista normanda, a influencia do francês que, até Eduardo III, foi a lingua da côrte, dos tribunaes e das escolas.

Tres seculos de influencia do francês e uma larga introducção de termos latinos, por via erudila, na Renascença, fizeram com que o inglês tenha apenas uma percentagem de 60 por cento de vocabulos saxonicos, sendo os restantes 40 por cento, ha sua maior parte, de origem latina, quer directamente, quer indirectamente pelo francês. O inglês é, por isso, uma lingua de facil acquisição para um alumno português que já tenha estudado o francês e o allemão. A difficuldade maior é a da pronuncia, que será vencida facilmente, se o professor estiver á altura das suas funcções, porquanto aos professores de linguas vivas não basta traduzir só a língua que ensinam; é preciso que a falem correntemente e com correcção. (Apoiados).

Outra disciplina, de que quero occupar me, é o desenho, que, officialmente, é de uma categoria inferior, como resulta da leitura da tabella de vencimentos, que dá ordenado de categoria aos outros professores, e, ao de desenho, tira a categoria, dando-lhe nos lyceus nacionaes uma gratificação de 300$000 reis, e de 400$000 reis nos centraes. Esta disposição não é propriamente da actual reforma; vem já no decreto de 29 de julho de 1880. Ora a situação do professor de desenho não deve ser inferior á dos seus collegas das outras disciplinas, porque deve incumbir-lhe o elevado encargo de fazer a educação esthetica da mocidade.

Para se apreciar a importancia do desenho, citares o que succedeu na Inglaterra, por occasião da exposição internacional de Londres, em 1851, inaugurada em Hyde Park pela Rainha Victoria e Príncipe consorte. A Inglaterra, que queria mostrar o seu poderio industrial, patenteou, nessa exposição, a inferioridade artística, o mau gosto dos seus productos. Ora a razão d´esta inferioridade reconheceu-se estar nas pessimas condições do ensino do desenho. Pois a Inglaterra não tratou só de melhorar o ensino technico, fundou tambem escolas elementares do desenho para educar o senso artístico das massas, porque entendeu que de pouco serviria aperfeiçoar as industrias, se o publico as não soubesse comprehender e estimar. E taes foram os resultados colhidos, que, na exposição de 1862, a França se alarmava com a concorrencia da Inglaterra, e, tendo a Austria aproveitado do exemplo inglês, na exposição de Vienna de 1873, via se que a França não dominava, só, nas antes industriaes, pois tinha a par de si a Austria e a Inglaterra. E aqui está como uma simples disciplina se abre em fontes de riqueza, quando bem ensinada nas escolas technicas e introduzida na educação geral.

O desenho é tambem uma disciplina de grande valor educativo, porque, para desenhar bem, é preciso observar bem; e a comparação do objecto com o desenho leva á percepção exacta do mundo externo. Saber desenhar representa a acquisição de uma nova linguagem, e, por isso, muito bem prescreve o programma, o

"Desenho de figuras schematicas que se relacionem com os estudos de historia natural".

Mas o desenho deve ser tambem auxiliar da cadeira de historia. Ao alumno, que nesta cadeira ouve falar das civilizações egypcia, grega e romana, da idade media, Renascença, etc., deve o professor de desenho mostrar a severidade triste, e sombria dos monumentos egypcios, com as suas columnas coroadas pela flor do lotus, a nobreza, a harmonia e á graça dos edificios gregos, como a perfeição inimitavel das suas esculturas, a majestade, força e riqueza dos monumentos romanos. E, tratando da arte romanica, de que temos tão bellos exemplares, desde S. Pedro de Rates até á velha Sé de Coimbra, o alumno aprenderá como ella deriva da arte romana por influencia bysantina, e como, por um problema de abobadas, evoluiu para a arte gothica, que é a architectura que melhor traduz o ideal christão, o desprendimento de espirito dos laços da materia. E, depois, como do gothico derivou a arte manuelina e como, contemporaneamente com esta, voltando á tradição classica, apparece a arte da Renascença, que se transforma na pesada architectura do seculo XVII, e se aligeira, no seculo XVIII, no requintado estylo baroco, etc.

Todas estas noções, sempre elementares, entrarão na parte que o programma intitula - ensino oral descritivo. Para que se não diga que isto é demasiada exigencia, tenho aqui um pequeno livro, que tem por titulo L´Art, cujos autores são Elie Pecaut e Charles Baude, e que contém uma serie de capitulos que tratam, rudimentarmente, da arte egypcia, grega, romana, bysantina, arabe, romanica, gothica e da Renascença, e de gravura, ceramica, tapeçaria, ourivezaria e mobiliario.

Pois, Sr. Presidente, este pequeno livro é destinado aos alumnos do instrucção primaria, e não me parece muito exigir na instrucção secundaria uma elementar educação artistica que, em França, se julga dever dai-se já na instrucção primaria. (Apoiados).

O professor terá na aula reproduções graphicas de obras de arte é albuns photographicos convenientemente escolhidos, e deverá acompanhar os alumnos em excursões aos monumentos e museus ao seu alcance. É o exemplo que nos dá a Italia. Eu leio o n.° 7 do artigo 5.º do regulamento de 3 de fevereiro de 1901 para os gymnasios e lyceus italianos:

"Durante il corso deli anno scolastico e nei giorni festivi che saranno indicati dai Capi degli Istituti, gh alunni delle classi superiori dei Ginnasi e dei Licei, guidati da ano dei loro professori, dovranno di tratto in tratto, divisi in piccole squadre, visitare i musci, le gallerie e i monumenti della cita o dei luoghi più prossmi "

Taes visitas incutirão na mocidade o respeito dos nossos monumentos, que é a garanta unica da sua conservação,

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e, pelos factos historicos que a elles se ligam, um mais entranhado amor pela patria portuguesa.

Estafe noções de arte, estudadas especialmente na aula do, desenho, sob a direcção de um professor competente, não devem, comtudo, ser excluidas das outras aulas. Está isso de acordo com o principio da actual organização, em que se trata de fazer uma educação geral, e não o estudo isolado de disciplinas.

Assim, no Amherst College, do Estado do Massachnissets (Estados Unidos), os sophómeros (alumnos do segundo anno) estudam o latim, juntando á literatura latina, o estudo da archeologia romana.

No Williams College, os juniors e os seniors (alumnos de 3.º e 4.º anno) dedicam o terceiro trimestre do latim ao estudo especial das questões de archeologia, esculptura, pintura, e architectura. O estudo do grego é combinado tambem com o das obras de arte; expoem se aos alumnos na photographias dos monumentos da Grecia.

Finalmente, para mostrar quanto este estudo tem de attrahente e incita o enthusiasmo dos rapazes, quando dirigido por um professor que tenha o amor do que ensina, citarei o exemplo de um collegio inglês, o collegio de Bedales, no Sussex. No "Bedales Record" que publica estudos redigidos pelos alumnos, lê-se o seguinte:

" O nosso professor M. Grubb fez, em 6 de fevereiro, uma conferencia sobre architectura, descrevendo os differentes estylos. Foi tão interessante, que, depois, pedimos muitos licença para fazer, aos domingos, excursões ás igrejas e monumentos antigos do nosso districto. Estas excursões tem se feito a pó e em bicycleta, com um professor.

" Esperamos ter no anno proximo um jornal com estudos pormenorizados sobre as igrejas visitadas, illustrados com vistas e photographias "

Estas palavras de enthusiasmo juvenil provam bem o prazer com que os alumnos, se o professor souber nelles despertar as emoções do bello, receberão a educação esthetica, que denuncia os povos cultos, porque, influindo, nas construcções, nos trajes e nos costumes, transforma o aspecto das cidades e das populações.

Passando agora ao conjunto do curso lyceal, direi que, em vez do curso unico, deve antes haver um curso geral commum com duas ou mais ramificações complementares, adaptadas ás necessidades das differentes profissões e satisfazendo as differentes tendencias e gostos intellectuaes. Assim se poderá reduzir a sobrecarga de estudos, proveniente de se querer, com um mesmo quadro, attender a todas as carreiras Nas differentes ramificações, porem, tem de continuar a organização em classes; não deve passar-se ao systema de disciplinas isoladas.

O plano de estudos secundarios tem, nos differente países, oscillado entre o extremo classicismo e o extremo realismo, tomando geralmente multiplas formas de transição.

A Allemanha deu aos seus gymnasios, na primeira organização de 1816, uma forte feição classica, com latim e munto grego, porque no enthusiasmo hellenico, devido á influencia de Winckelmann, Schiller e Goethe, se queria patentear aos alumnos, nas suas origens, os thesouros da litteratura grega, fonte sagrada das civilizações modernas. O latim era introduzido como uma verdadeira disciplina, uma gymnastica para desenvolvimento da intelligencia; o grego como um fermento intellectual A orientação, porem, dos modernos tempos, em que a actividade das nações se dirige sobretudo á posse da terra e ao domínio das forças da natureza, levou á organização realista das escolas, que não podem nem devem subtrahir-se ás tendencias do seculo.

No famoso discurso de inauguração da Conferencia escolar de Berlim de 1890, disse o actual imperador:

" Devemos tomar a lingua mãe como fundamento dos estudos do gymnasio. Devemos educar allemães. Não temos de educar gregos nem romanos É forçoso abandonar a base que tem sido a tradição de séculos desde as escolas monasticas da idade media, onde, com algum grego, o latim era a materia principal".

Esta corrente levou a uma solução radical na Noruega que, na reforma de 27 de julho de 1896, excluiu, completamente, o grego e o latim do ensino secundario.

Pois, ainda assim, ha nos gymnasios noruegueses duas divisões com as mesmas disciplinas uma com predominio de linguas e historia, e outra com mais sciencias naturaes e mathematica.

Na Allemanha ha, como se sabe, tres institutos differentes: os gymnasios com latim e grego, os reaes gymnasios sem grego e com latim, como nos nossos lyceus, e as escolas reaes superiores sem grego nem latim. Em Altona, porem, para se attender ás necessidades de uma cidade maritima e commercial e á preparação para cursos superiores, combinou-se um real gymnasio com uma escola real, dando lhes uma base commum de tres annos sem classicos, de onde saem duas divisões parallelas: uma com latim como forma dominante de disciplina linguistica, e outra sem latim, procurando a correspondente disciplina no estudo do francês e inglês. Era Frankfort do Meno, as tres classes inferiores, no gymnasio e no real gymnasio, são as mesmas; de um tronco commum de tres annos sem latim, partem duas divisões parallelas, uma classica, outra semi-classica, podendo haver uma terceira, não classica.

Ha actualmente na Prussia 35 estabelecimentos reformistas: 24 pelo systema de Frankfort, e 11 pelo de Altona.

Apesar da conferencia escolar de Berlim de 1900 ter exprimido o voto de que a experiencia do gymnasio reformista de Frankfort não devia ser generalizada, o Imperador, na ordem imperial de 26 de novembro de 1900, diz que a existencia de uma base commum tem vantagens sociaes que não são para despresar, e exprime o desejo de que a experiencia se continue a fazer e em maior escala, onde se possa tentar com exito.

O systema de base commum é não só mais economico, mas, retardando tres annos a escolha do alumno, permitte que a sua vocação se manifeste.

Na Suecia os cursos são de nove annos, como na Allemanha, com as tres classes inferiores communs. Da 4.ª em deante ha dois ramos: o real, sem latim nem grego, e o ramo latino, que, da 6.ª classe em deante, se parte em duas divisões com grego e sem grego.

Na Suissa predominam os tres typos de ensino secundario.

Citarei, porque é interessante, a organização de Genebra, onde ha uma base commum de tres annos, seguida de quatro secções de quatro annos cada uma: a classica, com latim e grego, para os que se destinam á thcologia e á philologia; a real, sem grego e com latim, para medicina e direito, a techica para os que seguem para a Escola polytechnica federal de Zurich; e a pedagogica para os que querem seguir o magisterio.

Na Austria ha o ensino secundario classico e o moderno, professados nos gymnasios e nas escolas reaes.

Na Belgica ha, nos atheneus reaes as tres secções intituladas: humanidades greco-latinas, humanidades latinas e humanidades modernas, com a duração de sete annos.

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Na secção de humanidades modernas ha ainda, nas tres ultimas classes, duas divisões: a commercial e a scientifica.

Na Italia, ao curso de cinco annos dos gymnasios segue-se, como complemento, o curso de tres annos dos lyceus. O typo de ensino é o classico, com latim o grego. Mas ha tambem as escolas technicas, com um curso de tres annos, de quatro especies: as escolas de typo commum, com destino agrario, commercial, e industrial, de que são continuação os institutos technicos, com quatro annos, tendo tres secções: a physico mathematica, a de agrimensura e a secção de commercio.

A França divide o seu curso em dois cyclos: o primeiro, de quatro annos, com uma divisão sem latim e uma divisão latina, podendo ter grego nas duas ultimas classes; e um segundo cyclo, de tres annos, com quatro secções, respectivamente designadas por latim-grego, latim-linguas, latim-sciencias o sciencias-linguas. Todos os cursos que o alumno pode seguir, combinando as divisões do primeiro cyclo com as secções do segundo, teem sancções iguaes para entrada nos cursos superiores.

Tambem nos Estudos Unidos as propostas de reformas que receberam a approvação do Comítte of Ten, nomeado em 1892, por occasião da exposição de Chicago, pela Associação Nacional de Educação, aconselham nas high-schools a organização de quatro cursos: o curso classico, o curso latim-scientifico, o curso de línguas modernas e o curso inglês, que é o mais adaptavel á satisfação de fins utilitarios. As high schools, cujos cursos duram, em media, quatro annos, são escolas secundarias, gratuitas, do 1.° grau, a que servem de continuação os collegios com as suas tradiccionaes quatro classes de freahmen, sophómoros, juniors e senior s, e que constituem na realidade a divisão superior do ensino secundario. Nos collegios ha geralmente uma grande variedade de cursos optativos.

Tal é a pratica de tantos países onde a instrucção merece tão esmerada attenção.

A experiencia tem-me levado tambem a condemnar o systema do curso unico.

Ha dois annos presidi a exames de saida da 5.ª classe num lyceu onde só havia dois alumnos tendo completado o curso geral. Ora, um d´elles era inferior em physica e mathematica, e bom nas outras disciplinas; o outro compensava a sua inferioridade no latim com boas provas na mathematica e nas sciencias naturaes. Ambos davam a impressão de uma intelligencia bem desenvolvida, tendo um conhecimentos sufficientes para a carreira jurídica, por exemplo, e o outro para uma carreira de sciencias naturaes. Se houvesse mais do um curso, cada um d´elles teria seguido o que mais em harmonia estivesse com as suas aptidões, vencendo-o sem difficuldade.

Creio ter demonstrado, Sr. Presidente, com as razões expostas e com os exemplos das outras nações, a necessidade de offerecer á opção dos alumnos mais de um curso secundario.

Razões de ordem economica e social levam a adopção de um curso commum nas classes inferiores, com ramificações nos ultimos annos. Em cada uma das divisões, porem, devem dispor-se as disciplinas de modo a formar um conjunto organico, entre si e com as classes da base commum.

Nem curso unico, nem compendio unico! Não me demorarei em argumentos contra o monopolio de um só compendio, defendido pelo artigo 50.° do Regulamento. Citarei á Camara um facto succedido commigo, no anno passado, e que é emmentemente instructivo. O digno reitor do Lyceu de Coimbra convidou-me, em julho, para substituir um vogal no jury dos exames de physica do período transitorio. Convidei um dos examinandos, que estava dando uma boa prova, a fazer-me a descrição de um galvanometro. Com grande espanto meu, ouço o alumno dizer que as duas agulhas do apparelho, que elle de resto descreveu bem, estavam suspendas por um fio de côco, e, como eu me admirasse, defendeu-se dizendo que assim estava no livro adoptado. Com maior espanto, leio no compendio, proposto pela commissão encarregada do exame dos livros destinados ao ensino secundario, e mandado adoptar pelo Governo, que no galvanometro de Nobili um fio de coco sem torsão suspende um systema astatico ! E então comprehendo que aquelle fio de côco é traducção de fil de cocon. Cocon, o casulo do bicho da seda, assume na traducção portuguesa as dimensões de um côco!

Ora, pelas disposições do $ 3.° e do n.° 17 do artigo 50.° do Regulamento do ensino secundario, é punido com a pena de demissão o professor que obrigar os alumnos á compra ou á lição de livros não adoptados pelo Governo. Se o professor, para corrigir aquella inexactidão, disser aos alumnos que leiam neste ponto um manual de physica, o de Langlebert, por exemplo, mcorre, portanto, na pena de demissão. E, se o apparelho estiver em cima da mesa, a que assertos aquella disposição do Regulamento pode obrigar o professor!

E eis aqui está, Sr Presidente, como um professor está, neste regime de monopolio de compendio, numa ameaça permanente de demissão, com a sua carreira, os seus serviços, o trabalho de uma vida inteira, tudo suspenso de um fio de... côco!

É preciso acabar com este systema absurdo, que, não sendo indispensavel na actual organização de estudos, antes a prejudica e contraria, subalternizando o professor ao compendio. Examine-se, sim, se os livros estão no caso de ser adoptados, e, de entre os que se julguem bons, o conselho de cada lyceu que escolha os que entender mais convenientes. (Apoiados).
* * *
Referir-me-hei agora aos programmas, cuja boa redacção é condição principalissima no systema de classes, entre nós adoptado, como em todos os países onde ha um ensino digno d´este nome "Os programmas, como diz o celebre Dr. Reinhardt, sob cuja direcção se tem feito a experiencia do gymnasio reformista de Frankfort do Meno, devem ser antes curtos que compridos. Se são curtos, ainda podem produzir um salutar appetite de saber mais, mas, quando muito extensos, produzem a saciedade". Ora, os nossos programmas exigem demais. Foram redigidos por pessoas, as mais competentes, sem duvida, mas que se deixaram levar pelo gosto das suas especialidades, e cada um, e portanto, todos, se esquecerem de que os programmas iam cair em cima de um só cabeça Creio que não ha hoje duas opiniões sobre os exageros dos programmas, cuja revisão se impõe.

O proprio professor Dr. Schiller, a quem ha pouco me referi, acha, no programma de historia, accumulação de particularidades e demasiada extensão do campo historico. No de mathematica, considera muito desenvolvida a cosmographia. Nas sciencias naturaes, diz que se exige em geral mais do que na Allemanha, e observa que, em particular na chimica e mineralogia, o enorme amontoado de noções, que se requer dos alumnos nos exames, terá de ser aprendido por um puro trabalho de memoria, e não por observação e inducção. No de philosophia, acha demasiada exigencia nos domínios da psychologia, logica, ethica e metaphysica, p que, segundo elle, resulta da tradição do país que conserva o gosto ecclesiastico da philosophia.

O que é o estudo da philosophia entre nós, surprehendi eu bem claramente uma manhã, no Jardim Botanico de Coimbra, onde encontrei um estudante que, com um livro na mão, ia dizendo, em voz alta, debaixo das tilias: o criterio é o juízo, criterio é o juizo considerado como meio de.. , criterio é o juizo considerado como meio de descobrir a verdade". E fechando o livro, monologava: "criterio é a verdade considerada como meio de descobrir o juizo,

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12 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

não, é o meio descoberto como verdade de considerar o juízo..." E lá andou toda a manhã este forçado da philosophia secundaria a decorar palavras sem nexo, nem sentido! O que se observa nas provas d´esta disciplina, nos exames, é geralmente comico. Aqui é precisa uma grande reducção.

Devem simplificar se os programmas, tendo em vista que, no curso secundario, se pretende mais desenvolver a intelligencia do que dar grande copia de noções, que o valor da escola está mais nos methodos de ensino do que nos conhecimentos reaes que communica. Depois de simplificados, é preciso harmonizá-los de modo a não haver repetições nem contradições, evitando soluções de continuidade na successão das materias, e fazendo uma conveniente distribuição pelos differentes annos É este um difficil problema, bem sei; mas precisa de ser bem resolvido, porque é condição importantissima para o bom resultado da reforma.

A conveniente limitação dos programmas, e o agrupamento das disciplinas em dois ou mais cursos apropriados as differentes profissões permittindo pôr de parte conhecimentos superfluos, trará, como resultado, poder diminuir se a sobrecarga de estudos que pesa sobre o alumno português, e que é superior á do alumno allemão, contra a qual tambem se fazem ouvir queixas; pois na propria Allemanha se pede já um maximo de quatro horas diarias de aulas, porque ha quem receie o depauperamento da raça em resultado do demasiado trabalho escolar.

O plano português do estudos, como consta do artigo 11.º do regulamento, dá uma somma de 189 horas semanaes, nos sete annos do curso. O horario dos gymnasios prussianos de 1892, que vigorava ao tempo em que se fez a reforma, dá 192 horas semanaes, em sete annos. O curso é de nove annos, mas excluo os dois ultimos do curso geral, as classes III-A e II-B, para comparar sete annos allemães com os sete annos portugueses. Parece pois que ha menos tempo de trabalho escolar para os nossos alumnos.

Pois não ha; porque na Allemanha em cada hora se tiram 10 minutos para e intervallo, de modo que a duração real das lições é de 50 minutos; isto é, a hora escolar allemã é de 50 minutos, ao passo que, entre nós, se succedem lições de 6O minutos com intervallos de um quarto de hora. Assim, reduzindo á mesma unidade - o minuto, temos em Portugal 189 X 60 ou sejam 11:340 minutos semanaes, e na Prussia 192 X 00 ou sejam 9:600 minutos, o que dá uma differença de 1:740 minutos ou sejam 29 horas, a mais, para o alumno português. Ora 29 horas semanaes é já uma grande somma para um anno, o que quer dizer que o nosso estudante supporta, em sete annos, o trabalho que se dá, em oito, ao estudante prussiano. Tenho aqui presentes horarios de alguns dos nossos lyceus com cinco aulas consecutivas de 1 hora, o que obriga os alumnos, por causa dos intervallos de quarto de hora, á permanencia de 6 horas no lyceu O alumno allemão, em taes circunstancias, estaria no Jyceu 5 horas só, e teria cinco aulas de 50 minutos cada uma.

Assim uma sobrecarga de aulas, que se julga já demasiada numa raça forte, em vez de se aligeirar, aggrava-se para uma população escolar, com menor capacidade de trabalho. (Apoiados).

Numa publicação official de ensino, na Inglaterra, o Sr. Lipscomb, traduzindo os programmas prussianos de 1892, não se esquece de chamar a attenção para esta circunstancia importante, juntando esta nota:

"Stunde" is trauslated throughout by "hour". The official stunde is a lesson of 50 minutes´ duration.

Na Allemanha julga se que 50 minutos é o maximo de esforço util de attenção que se pode exigir do alumno.

Nos Estados Unidos as aulas são geralmente de 45 minutos.

Comparemos, agora, com os horarios franceses para ver ainda o excesso dos nossos. No primeiro cyclo, isto é, nos primeiros quatro annos, o numero de horas obrigatorias semanaes é de 22, 23 ou 24 num anno. No segundo cyclo, só no ultimo anno da secção de sciencias-linguas se attinge o maximo de 28 horas obrigatorias. A somma total de horas semanaes, nos sete annos, oscilla entre 153 horas e meia e 168, o que dá uma differença, para as nossas 189 horas, de menos 21 a 35 horas e meia. Assim se pode tambem dizer que temos, nos nossos sete annos, um peso de aulas de oito annos de um lyceu francês,

É de mais. É preciso reduzir a 24, as horas semanaes em cada anno, baixar a 168, as nossas 189 horas. Contando as quintas feiras, temos assim uma media de 4 horas diarias, que é o maximo regularmente exigível. (Apoiados).

Nos Estados Unidos vae-se mais longe. A Commissão dos Dez, nomeada em 1892, aconselha para as high-schools 20 horas semanaes. É o regime do feriado na quinta feira, e de 4 horas diarias nos outros cinco dias.

Ainda quero, tambem, referir-me a outro ponto. Preceitua o regulamento, no artigo 13 °, que o ensino se effectue em dois períodos, antes e depois do meio dia.

Aqui, tenho eu um horario allemão, com um intervallo de descanso, do meio dia ás duas horas. Este intervallo corresponde á hora em que geralmente se janta naquelle país. Não só as escolas, mas as repartições e os escurtios, fecham, em geral, áquella hora. Os alumnos vão tranquilamente jantar com as suas familias, como todos a gente

A disposição do artigo 13.°, que prescreve um primeiro periodo de 3 horas, e um segundo período de não mais que 3 horas, fazendo esperar um intervallo ao meio dia, não se cumpre, nem nisso se faz reparo, porque estas disposições não são motivadas nas necessidades dos usos locaes. Tenho, sobre a mesa, o horario de um lyceu onde, em certos dias, os alumnos teem cinco aulas consecutivas, que vão desde as 8 horas e meia da manhã, com intervallos de um quarto, até ás 2 horas e meia da tarde; o horario de outro lyceu tem as cinco aulas, desde as 9 horas da manhã ás 3 horas da tarde, a seguir. O alumno chega ao fim num estado de cansaço facil de imaginar.

Alguns estudantes conheço eu que, numa das cidades principaes, aproveitam um dos quartos de intervallo, para ir, rapidamente, a casa tomar alguma cousa. Depois de comer apressadamente o que podem, em poucos minutos, voltam, a correr, pela rua fora para o lyceu, trepam quatro lanços de escadas, precipitam-se no corredor e entram esbaforidos pela aula dentro. Isto durante um anno, dois, sete!

Desde que um rapaz se matricula no lyceu, perde o direito de almoçar com a familia durante sete annos; a sua saude não merece a attenção de ninguem. Ora o regular é que, em cada cidade, por proposta do reitor, haja nas aulas um intervallo para o almoço, segundo os usos locaes familiares. A Allemanha tem os seus horarios dispostos em harmonia com as horas habituaes das refeições. O que entre nós se faz, não deve continuar. (Apoiados).

Sr. Presidente: o tempo vae adeantado, e eu quero ainda dizer algumas palavras sobre a preparação dos professores de mathematica dos lyceus. Os candidatos a este magisterio, que frequentarem a Universidade, teem, depois de um curso de tres annos, constituído por cadeiras das faculda-

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APPENDICE Á SESSÃO N.° 5 DE 13 DE JANEIRO DE 1903 13

des de mathematica e philosophia, de estudar mais um anno no Curso Superior do Letras, que tem por fim inicia-los nos methodos proprios do ensino secundario.

Ora não deve a faculdade de mathematica ter, em si, os elementos precisos, para fazer a educação pedagogica de professores de mathematica elementar? Não deve ella occupar se tambem de pedagogia, com applicação á sua especialidade?

Na reforma dos estudos da Universidade, de 24 de dezembro de 1901, foi criada na Universidade a cadeira de analyse superior.

Do programma d´esta cadeira, que é complementar das de algebra superior e calculo differencial e integral, faz parte uma revisão rigorosa e completa dos princípios fundamentaes da analyse, o que, como se reconhece no relatorio que precede aquelle decreto, é de principal utilidade para os candidatos no magisterio da mathematica elementar, que, por isso, deviam frequentá-la. A frequencia da cadeira de astronomia é naturalmente indicada para quem tom de ensinar a cosmographia.

Para a preparação, propriamente profissional, formar-se-hia, na faculdade, um seminario pedagogico, á semelhança do que se faz na Allemanha, constituído pelos alumnos e pelos professores que se julguem convenientes, estando naturalmente indicado, o de analyse superior.

Para a preparação theorica, teriam logar, sob a direcção de um dos professores, um certo numero de conferencias semanaes, sobre os principios de educação e ensino, applicaveis á instrucção secundaria, e sobre a methodologia das sciencias mathematicas em especial, fazendo-se tambem uma revisão historica dos principaes pedagogistas modernos, desde o século XVI.

Para a preparação pedagogica pratica, fusão os alumnos lições de ensaio, que serão apreciadas nas conferencias, aproveitando-se os cursos do lyceu e das escolas normaes de Coimbra.

Não haverá que criar cadeiras novas. Terá, quando muito, de se adaptar uma parte do programma da cadeira de analyse, mais largamente, no sentido da educação para o magisterio.

Na Allemanha, ainda se exige mais, para a nomeação definitiva de professor secundario, um anno de pratica num gymnasio, real gymnasio ou escola real superior, com boas informações do respectivo chefe. A Inglaterra tambem vae exigir agora as tres condições: um grau universitario ou diploma equivalente, um anno de preparação numa universidade ou num instituto apropriado como professor-alumno, e, finalmente, um anno como professor-praticante num estabelecimento secundario.

Como a conveniente preparação do corpo docente é questão primordial para um bom ensino, convem que, para isso, se aproveitem todos os recursos, e se façam convergir todos os esforços. Como membro, que tenho a honra de ser, da faculdade do mathematica da Universidade, embora o mais humilde, especialmente me referi aos professores de mathematica elementar, e peço ao Sr. Presidente do Conselho, que attente na justiça e conveniencia de habilitar a faculdade a, por si só, poder prover á completa preparação dos candidatos a este magisterio Ella saberá corresponder a este honroso encargo.

Será uma medida bem recebida pela cidade de Coimbra e pelos alumnos que, começando uma educação na Universidade, teem toda a vantagem em poder ali terminá-la. (Apoiados).

Mas eu não quero cansar mais a attenção da Camara. Referi-me aos pontos principaes em que entendo dever soffrer modificações o actual regime, mas sem que elle seja alterado na sua estructura essencial: no estudo das disciplinas ligadas num conjunto organico, constituindo um ensino educativo, em que a frequencia prima sobre os exames; e na organização das classes sob a autoridade de um director, que deve reunir as altas qualidades precisas para o desempenho das suas importantes funcções junto de professores, alumnos e paes de familia. O alumno deve avançar de classe em classe, constituindo cada uma um todo indecomponivel. É preciso não regressar ao systema obsoleto do estudo isolado das disciplinas, que transforma as escolas secundarias em fabricas de exames.

Tendo chamado a attenção do Sr. Presidente do Conselho para a questão vital da instrucção secundaria, de cuja organização e administração depende o desenvolvimento das energias physicas, intellectuaes e moraes da mocidade portuguesa, termino, exprimindo a minha inteira confiança em que, se S. Exa. dedicar á solução d´este problema as suas poderosas faculdades, teremos um ensino tão perfeito quanto o permittem os recursos do país. (Apoiados.- Vozes: - Muito bem).

(O orador foi muito cumprimentado pelos Srs. Ministros presentes e pelos membros da maioria e alguns da minoria).

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