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gueza approvado em Sessão do hontem a Indicação da sua Commissão nomeada para proceder ao exame ordenado no Artigo 139 da Carta, que remetto por copia conforme, sobre se pedirem ao Governo esclarecimentos relativos ao objecto da mesma Indicação, tenho o honra de assim o communicar a V. Exa.

Deos guarde a V. Exa. Palacio da Camara em 8 de Janeiro de 1828 - Illustrissimo e Excelentissimo Senhor Carlos Honorio de Gouvêa Durão - Antonio Vicente de Carvalho e Sousa, Deputado Secretario.

Para o Ministro da Guerra.

Illstrissimo e Excellentissimo Senhor. - Tendo a Camara dos Senhores Deputados da Nação Portuguesa approvado em Sessão de hontem a Indicação do Senhor Deputado Francisco Joaquim Maya, que envio por copia conforme, cobre se pedirem ao Governo informações sobre o número effectivo de todas as Classes, e Corpos do Exercito, e os seus vencimentos, assim tenho a honra de o Communicar a V. Exa.

Deos guarde a V. Exa. Palácio da Camara em 8 de Janeiro de 1828. - Illustrissimo e Excellentisso e Senhor Candido José Xavier - Antonio Vicente de Carvalho e Sousa, Deputado Secretario.

SESSÃO DE 10 DE JANEIRO.

Ás nove horas e meia da manhã fez a chamada o Senhor Deputado Secretario Paiva Pereira , e se achárão presentes 100 Senhores Deputados faltando, além dos que ainda o não apresentarão, 16, a saber: os Senhores Marciano de Azevedo - Rodrigues de Macedo - Gravito Leite Lobo - Xavier da Silva -Santos - Costa Rebello - Sousa Queiroga - Ferreira Moura - Sousa Cardoso - Rocha Couto -
Claudino Pimentel - Barão de Qintella com causa: e sem ella os Senhores Sousa d'Azevedo - Visconde de S. Gil - e Ribeiro Saraiva.

Disse então o Senhor Presidente que estava aberta a sessão, e foi lida pelo Senhor Deputado Secretario Carvalho e Sousa a Acta da antecedente, a que fizerão algumas reflexões os Senhores F. J. Maya, e Visconde de Fonte Arcada, as quaes se mandárão accrescentar, sendo o resto approvada.

O Senhor Deputado F. J. Maya apresentou a seguinte declaração de voto, tambem assignada pelo Senhor Deputado Cordeiro. - Declaro que na Sessão de 8 do corrente votei que se observasse o Regimento da Camara.

O Senhor Deputado Ribeiro Costa, como Relator da Commissão de Verificação de Poderes, lêo o Parecer sob e o Diploma do Senhor João Carlos Leitão, Deputado eleito pelas Ilhas dos Açores, o qual foi approvado; e sendo o mesmo Senhor Deputado introduzido pelo Senhor Secretario Carvalho e Sousa, prestou o devido Juramento, e foi tomar o seu lugar.

ORDEM DO DIA.

Projecto N.° 141 sobre a Liberdade de Imprensa.

Entrou em discussão o

Art. 25.º "O Auctor, ou Editor de qualquer Escripto litografiado, ou impresso, ou Estampas litografiadas , ou impresas por qualquer maneira que forem, pelas quaes se ataque a ordem de succeder no Throno estabelecida na Carta Constitucional, a Authoridade legitima d'ElRei, Regente, ou Regencia, a inviolabilidade de sua Pessoa, ou a legitima Authoridade da Camara dos Pares, ou dos Deputados da Nação, ou se procure incitar o odio, ou o desprezo contra o Sistema Constitucional fundado na Carta, incorreu nas penas declaradas no Artigo 21, accrescendo a pena do perdimento dos Cargos Publicos que o delinquente occupar."

O Senhor Borges Carneiro: - As palavras = atacar a Authoridade do Rei, Regente, ou Regencia, ou de alguma das duas Camaras, por mui vagas, podem vir a prejudicar a Liberdade de escrever; porque he inevitavel nascerem ás vezes duvidas sobre os, limites dos Poderes Politicos, sobre os quais podem recahir justas interpretações , ou controversias, que com tudo não são: e por isso convém dizer-se = atacar manifestamente = , ou fazer outra semilhante declaração. Em segundo lugar louvo a por exprimir aqui a especie dos que promoveram, odio ou desprezo contra o actual Systema Constitucional: por quanto tendo o Reino perdido a felicidade, e gloria dos tempos primitivos, em que possuia o Governo Moderado e Representativo, e cahido na presente desgraça, pela desordem geral, que ha muitos annos se introduzio na Administração, e pela, gradual destruição das liberdades públicas, não pode aquella restabelece-se, nem estas recobrarem-se, senão pela restauração do Governo Representativo: necessidade esta que tem formado hoje o espirito Europêo a favor de tão bom Systema: e por tanto são verdadeiros homicidas da Patria aquelles, que pela Imprensa pertendem tronar odioso ou despresivel tão feliz Governo, e manter direitos usurpados, e o bem de um punhado de pessoas contra os direitos, e o bem da totalidade nacional, e conseguintemente sujeitos justamente as penas aqui cominadas.

Finalmente deseja que as penas quaesquer que sejaõ se exprimão aqui e se não faça referencias ás do artigo 21, no qual se tracta da blasfemia, por não parecer equiparar-se uma especie temporal a uma espiritual, o humano ao divino.

O Senhor Moraes Sarmento: - Entre as palavras atacar, e disputar existe grande diferença; a Commissão não teve nunca em vista vedar a que qualquer Escriptor exponha os seus argumentos sobre semelhantes objectos, mas somente que os ataque, o que se conhece com toda a facilidade. Em fim, a Commissão jamais se poderia lembrar de organisar um Artigo, em o qual de qualquer maneira se coarctasse as discussões dos objectos politicos, por isso que a Commissão convencida que esta liberdade he uma das maiores bellezas do Systema Constitucional, porque só pelo meio do argumento se pode chegar ao conhecimento da verdade; mas sempre será differente o atacar uma Authoridade, e o discutir objectos da sua competencia. A Commissão debaixo deste ponto de vista estabeleceo este Artigo, e nem doutro modo se pode julgar das palavras, que ella usou. Em quanto á segunda parte do discurso do Senhor Deputado Borges Carneiro, era que fallou na referencia feita ao

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Artigo 21, julgo-a viciosa, porque vejo que se persuade que desta maneira se equiparão especies temporaes, e espirituaes; a Commissão de modo algum pertendeo, nem sequer, comparar estas especies, o que teve em vistas foi não accumular determinações identicas, ainda que sobre objectos diversos, e fazer o Projecto o menos extenso possível, e evitar repetições; por isso, tanto nestes casos como nos do Artigo 21, julgou a Com missão que se devião impor as mesmas penas. Ninguém duvidará que por meio do abuso da Liberdade de Imprensa pode seguir-se a anniquilação do Systema Constitucional, uma vez que não sejão exacerbados as penas, que devem recahir sobre o Escriptor, que com menos acordo tractar das materias, que formão o Artigo; pois quasi sempre quando se quer deitar por terra alguma Instituição se valem os seus adversarios da mofa, do despreso, e de todos os meios, que tendão a ridiculisar, para a tornar odiosa, e despresivel. Parece-me que á vista destas razões se desvanecerá o escrúpulo do Senhor Deputado.

Julgado o Artigo suficientemente discutido, propoz o Senhor Presidente se se approvava salva a redacção de alguma expressão, que a Commissão julgasse dever alterar; e se venceo que sim.

Passou-se á discussão do

Art. 26. "O Auctor, ou Editor de qualquer Escripto litografiado, ou impressa por qualquer forma que seja, em que se imputar a qualquer Empregado Publico acções, ou omissões criminosas no seu Emprego, e que, sendo demandado, não provar
aquillo, que imputou, incorrerá nas penas pecuniarias de cincoenta mil réis até cem mil réis no primeiro gráo; de cento e cincoenta mil até duzentos mil réis no segundo gráo; de trezentos até quatrocentos mil réis no terceiro maximo gráo, e mais em dez dias de prizão no primeiro gráo, em um mez no segundo gráo, e em dous mezes no terceiro gráo."

O Senhor F. J. Maia: - Estamos chegados á discussão desta importante Lei, ao Artigo que estabelece as penas dos abusos da Liberdade de Imprensa contra os Cidadãos Empregados Públicos. A Carta Constitucional pondo na mão de todos esta arma poderosa, e garantindo o direito de communicar, sem censura previa, os pensamentos pela Imprensa, sabiamente determinou que fosse responsavel quem usasse mal della. Na verdade he muito necessária toda a cautella, para que na defeza de uns direitos não ataquemos, ou menoscabemos outros. A honra do Cidadão he a sua mais preciosa propriedade, e esta tambem he garantida pela Carta em toda a sua plenitude. Consentiremos nós, por tanto, que ella seja atacada impunemente? Certamente não. O Artigo está concebido da maneira mais clara possivel, e nada tenho a notar, senão que lhe falta a palavra = Estampa = pois por este meio se pode tambem offender a honra dos Cidadãos. Todos nós sabemos, que tanto effeito podem produzir neste sentido as palavras, como as pinturas.

Requeiro pois que se inclua devidamente pela Commissão, neste Artigo, bem como se acha no seguinte. Eu não quero privar os Escriptores de analisarem, e publicarem os factos criminosos das Authoridades constituidas; será talvez esse o fim mais util da Liberdade de Imprensa para a boa Administração em todos os seus ramos, mas he preciso que esses factos sejão verdadeiros, e que o publicador prevê a sua existencia; aliàs será estabelecer em Lei o direito de calumniar, o que de nenhuma forma se pode admittir.

O Artigo diz, acções, ou omissões, isto he, ter esse Empregado praticado, ou deixado de praticar tal cousa, e a prova não será difficultosa ao Escriptor, que a tiver publicado. Eu tenho em vista, alterando as penas aqui comminadas, cohibir os excessos de paixões, e vinganças mal entendidas; e estou persuadido, que ainda com penas graves, olhando para o estado actual político e moral do Reino, se não deixarão até de commetter grandes abusos; assim como estou igualmente persuadido, que para a prosperidade nacional basta usar bem deste direito, e em caso algum se tira proveito do seu abuso.

Acho por tanto as penas demasiadamente pequenas, pois se a calumnia, puramente em si, he um crime , digno do mais seveeo castigo; a calumnia pela Imprensa o deve soffrer muito maior. Não se entenda que por este meio se pertende embaraçar, ou entorpecer a Liberdade de imprimir; essa está concedida já, quando se diz nesta Lei, que não ha pena para ninguém antes da publicação de qualquer Eacripto , e só o não escriptor poderá queixar-se de que as penas sejão grandes: pois pode livrar-se dellas não comettendo abuso, horrorisa a idéa de um escriptor, que no fundo de um gabinete, com a penna na mão esteja ferindo deliberadamente com este util instrumento, o que os homens tem de mais valor, a Sociedade demais sagrado, convertendo em instrumento de morte o instrumento que devia dar vida, e saúde á Sociedade, no meio da qual se lhe permitte escrever.

Eu não confundirei questões e motivos, que se apresentão para sustentar liberalidade nesta materia, porque não perca de vista, que o Artigo da Lei tracta somente do Escriptor calumniador, e por isso fica sempre salvo o Escriptor de probidade. Muitas mais reflexões faria para demonstrar que nada conseguiremos com as penas do Artigo; e por isso concluo dizendo que ellas são inefficazes inteiramente, se as não augmentarmos tanto no pecuniario como na prizão.

Mando para a Mesa a minha Emenda neste sentido.

O Senhor João Elias: - Senhor Presidente, faltando sobre a doutrina deste Artigo, não posso deixar de fazer referencia ao seguinte, pela semelhança dos casos: as penas comminadas neste Artigo parecem-me muito módicas, ellas não serão bastantes para reprimir os abusos de que nelle , e no seguinte se tracta, é neste sentido concorrerão mais a promover taes abusos, que a reprimi-los; de mais estas penas pecuniárias isoladas não são próprias, e proporcionadas a estes crimes; ellas são mais proprias para os crimes, que tem por fim a ambição, e avareza; mas estas peccão na corrupção do coração, por consequencia he preciso que as penas ataquem o principio fundamental do crime: por tudo isto sou de voto, que as penas estabelecidas no Artigo 26 se augmentem mais um terço, e que umas e outras se comminem no Artigo 27, supprimindo-se a palavra = pecuniarias =: Diz Blakstone que a verdadeira Liberdade de Imprensa consiste em ser isenta antes da publicação de toda a restricção, e ser sujeita depois a toda a repressão; deste modo fica sempre livre o pensamento nas suas operações, sómente se castigão os vicios da vontade, ou a licença: além de que, nestes crimes somente se

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castiga a provocação, por issco não importa que sejão verdadeiros ou falsos os factos imputados a particulares; não he assim nos actos da vida pública , a qual he propriedade da Nação.

O Senhor Mozinho da Silveira: - Todos sabem que a Nação Portugueza tem muita propensão para os Escriptos, em que se atacão os individuos; estes papeis se vendem em profusão, se lêm com sofreguidade, e se procurão com avidez, em quanto livros serios de materias graves chegão ordinariamente às mãos de muitas poucas pessoas; o Escriptor que abusa assim da Liberdade de Imprensa não pode ter desculpa alguma, nem dizer que não teve tempo para reflectir no que publica, porque sempre a tem do sobejo; devo notar que ha um paiz aonde não se reputa crime o fallar contra a Religião, nem contra o Governo, e que pouco lhe importa que se diga que he melhor o do Grã-Turco, ou o Republicano, porem ahi ha imperdoavel o convencido de calumniador, a este se impõe a maior responsabilidade, e as penas mais austeras; em Inglaterra succede o mesmo; he necessario grande reflexão para se capitularem taes delictos; não se deve deixar ao calumniado o direito de demandar o calumniador: eu nunca tal faria, sendo-me mais facil perpetrar um crime, como mata-lo, atirar-lhe á balla , ou outra qualquer acção, do que usar deste meio para haver uma reparação de 50$000 reis: semelhante pena he irrisoria em si mesma, e contra os nossos costumes; os calumnindores tem sido os roedores da tranquillidade publica, e a elles se devem immensos meios, que temos soffrido; se este Artigo passar sem se imporem penas severas aos calumniadores, o Systema Constitucional se tornará odioso; apenas a Lei apparecer uma nuvem de Periodicos infectará a todos; a experiencia he já de outro tempo, em que tanto despreso merecerão os que disserão mal, como os que falam só verdades: chegou a impudencia daquelles a tractarem do mais recondito de familias, como de chás, bailes, etc., etc.; he a semelhantes escrevinhadores que se devem impor penas fortes, e longe estou ou de não querer que só accuse qualquer Authoridade que lançou um despacho asno; do um Magistrado que proferio uma sentença iniqua; de qualquer Empregado que praticou uma acção má; em fim, de um Juiz, que para satisfazer o seu capricho, ou daquelles aquem julga dever servir para seus fins, manda a torto e a direito proceder a prizões arbitrarias, perseguindo assim grande número de Cidadãos: concluo dizendo que, a não se imporem penas severas neste Artigo, será lançar em terra o Systema Constitucional.

O Senhor Moraes Sarmento: - A Commissão, quando estabeleceo este Artigo, teve em vista fazer uma Lei exequivel, e foi por isso que impoz penas, que tambem fossem exequiveis. Aos Jurados pertencerá o conhecerem da boa ou má fé do Escriptor, para se lhe impor a pena mais leve, ou mais grave. Em Inglaterra os Empregados Públicos encarão com toda a constancia algumas calumnias, não são tão pressentidos como o Illustre Deputado, que acaba de fallar, porque se o fossem não teria Lord Gastelreagh, e Mr. Canning uma só hora de tempo, que não fossa para responder a quantas injúrias, e calúmnias lhes imputarão; de certo lhes não sobejaria tempo para tractar dos Negocios, que tinhão a seu cargo. Algumas injúrias ha, que ninguém de certo as acreditará, e a estas não se responde, nem só faz caso; alli nunca faltão Escriptores, assim como em toda a parte onde houver Liberdade de Imprensa, de boa fé, que rebatão essas calúmnias; e então que maior gloria para o culumniado, que ver o calumniador convencido, e a opinião pública toda a seu favor; a maior gloria do calumniado he ver que, entre tantas diatribes, a sua consciencia está pura, e certo prazer que sente na sua própria generosidade. Mão he por pensar assim que a Commissão teve em vista poupar os calumniadores, e tanto que, sendo es Membros da Commissão (quasi todos) Empregados Públicos, talvez sejão as primeiras victimas da brandura da Lei, mas certamente se nos não dá disso, porque a nossa consciencia estará tranquilla do que não depende a nossa reputação de quatro escrevinhadores, que a maior parte das vezes escrevem de noite para com o vil interesse, que lhes resulta, almoçarem no dia seguinte.

O Senhor Magalhães: - Todos os Senhores, que faltarão, e que julgarão as penas do Artigo moderadas, querendo por isso que elles se aggravassem, a meu ver tem laborado em um equivoco, isto he, que aquelle, que expõe um facto pela Imprensa, o faz sempre maliciosamente: não he assim; pode acontecer que um facto exposto por qualquer Escriptor não seja sempre verdadeiro, e nem sempre o que o publica calumniador; resultando daqui a necessidade da existencia dos diversos gráos, conforme o mal, que tal erro faça á Sociedade, para que o Jurado possa, quando conhece que o Escriptor cometteo estes delidos com mais ou menos malícia, appliçar-lhe a pena maior ou menor; e por isso a Commissão entendeo devia estabelecer a proporção, que inserio no Artigo, para servir de escala aos Jurados, o não acontecer que estes, temendo impor uma pena excessiva a um delicio muito pequeno, absolvão o delinquente: digo pois aos Senhores Deputados, que fallarão em exacerbar as penas, que resultará por este meio o effeito contrario ao que elles buscão, ou, para melhor dizer, a impunidade: isto he tonto assim que ate ha uma Carta Regia do Senhor D. João V, em que, reflectindo que a maior parte das penas de morte, que se achão comminadas na Ordenação, forão feitas mais para terror do que para se lhes dar execução; resulta pois que o maior número de delictos ficarião impunes, por isso mesmo que não he exaggeração da pena que intimida o homem para infringir a Lei, mas sim a certeza de que aquella lhe ha de infalivelmente recahir; donde se vê que a mesma pena não satisfará os diversos gráos. Sou por tanto de opinião que a pena do primeiro grão seja minorada, embora se exaggere a do maximo gráo. Neste sentido mando a minha Emenda para a Meia.

O Senhor Derramado: - Depois das luminosas razões, com que os Senhores, que tem impugnado o Artigo, concluirão a necessidade de uma comminação de penas mais severas para reprimir os calumniadores dos Empregados Públicos, julguei que ninguem mais se animaria a sustenta-lo; mas como esta sustentação acaba de se fazer por um Illustre Deputado com toda a força do talento, de que a natureza o dotou, eu procurarei fazer sentir novamente o vigor das conclusões deduzidas pelos primeiros Senhores. O voto dos Publicistas, que tem defendido mais apaixo-

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nadamente a Liberdade da Imprensa, todo se reduz á faculdade illimitada de imprimir, e publicar independentemente de qualquer Censura previa; propugnando ao mesmo tempo (no interesse desta preciosa faculdade) pela severidade das penas contra os calumniadores: e eu adopto este mesmo voto; e bem persuadido da importancia do serviço, que faz á sua Patria o Escriptor judicioso, que usar do, direito de uma censura sisuda contra os actos arbitrarios, ou ineptos dos Empregados Públicos; censura esta, que começando onde se cala a Lei da Responsabilidade, que pode acautelar Senão abusos criminosos, e previstos pelo Legislador, he como o seu supplemento; e tão opportuna garantia dos direitos dos Cidadãos, que onde quer que ella existe lá existe a liberdade legal, e onde quer que ella falta, ahi falta esta libeldade: tambem estou convencido que ha muitos homens, inimigos da tranquillidade pública, e dispostos de antemão a contradizer em tudo o exercitio da Authoridade; e que existem por toda a parte ambiciosos colligados contra os melhores Ministros, só pelo ardente desejo de lhes succeder; e que a suavidade das penas do Artigo dará aso á cohorte dos foliculanos, que animados por taes, e semelhantes paixões vis, e anti-sociaes, perturbão a tranquillidade dos Estados; e em presença da qual nenhum Governo, por melhor que seja, pode subsistir, pois que elles podem formar uma opinião ficticia, que falsa, e temporariamente se arroga o nome de opinião pública, quando não he mais do que a opinião dos partidos. O honrado Membro, que arguio os impugnadores do Artigo delaborarem n'um equivoco, suppondo que censurar, e calumniar he uma, e a mesma cousa, attribuio-lhes uma opinião, que elles não proferirão; antes bem pelo contrario emittirão o seu voto sobre a magnitude do bem, que resulta da censura franca, e imparcial dos abusos do poder, assim como das pessimas consequencias das injúrias, e calúmnias gratuitas; injúrias, e calúmnias estas, que eu torno a instar porque sejão punidas com severas penas, taes que tirem a tentação de injuriar, ou calumniar os Empregados Públicos, e que sirvão de escarmento o quem quer que ousar faze-lo. O honrado Membro, no seu parecer, he que está equivocado, não só a respeito deste objecto, mas tambem de muitos outros deste Projecto, que prepara um Jury, que ainda não tem modelo na natureza, afora da Hespanha, e de Portugal, onde já produzio os perniciosos effeitos, que a todos são notorios. O Jury do Projecto he essencialmente differente em muitos pontos capitães do da Inglaterra, e da America do Norte, onde uma tal Instituição tem apresentado resultados praticos tão vantajosos! Basta para isto que estabeleça tres gráos de criminalidade, e depenas correspondentes, deixando á discrição dos Jurados a determinação de cada um dos grãos, e que não pode verificar e sem entrar no exame de muitos pontos de direito; exame repugnante às funcções dos Juizes de facto, quando naquelles Paizes só decidem da criminalidade genericamente considerada, e do ponto de direito inseparavel do facto, previsto pela Lei, com a especifica circumstancia que o torna ou não criminoso: se se tracta, por exemplo, de uma accusação de homicidio, o acto desta accusação deve conter: - que F. matou a S. com animo de o matar: - se d'um furto, accrescenta-se a clausula - com animo de furtar: - deste modo o Jurado terá sempre de fazer uma declaração sobre um facto especificado na Lei; e entre nós terá sempre de o imaginar. Nem me diga o honrado Membro que se deixa esta grande latitude entre o primeiro e terceiro gráo para nos não vermos obrigados a comminar penas severas contra meras imprudencias, que resvestidas doutras circumstancias podem ser gravissimos crimes. - Imprudencias tambem são previstas nas Leis; e castigão-se como taes.

Alem do que, do mesmo Juizo dos Jurados pode haver recursos fundados em escusas, onde possa recahir a graça judiciaria; e para os casos desgraçados, que o coração absolve, em quanto a Justiça os condemna, existe a Graça moral, que he attribuição do Chefe Supremo do Estado. Mas, tornando ao ponto principal da questão, espero pelas emendas dos Senhores, que tem impugnado o Artigo para votar por a que me parecer mais arrazoado.

O Senhor Serpa Machado: - Tanto na doutrina deste Artigo, como nos mais, que se lhe vão seguindo, occorrem duas perguntas: 1.ª Está bem qualificado, e definido o facto criminoso, que se pertende punir? 2.ª Será a pena proporcional ao delicio? Em quanto á primeira não ha que duvidar, e a Commissão definio de um modo claro a natureza do delicto, e declarou o abuso da Liberdade de Imprensa, a imputação de acções, ou ommissões criminosas feitas ao Funccionario Publico no exercicio do seu Emprego, que, sendo falsas, se não poderão provar: deste modo muito bem se distingue a calúmnia da injúria; uma e outra merece castigo, mas o daquella deve ser mais grave. Pelo que pertence á proporção da pena indicada no Artigo, eu não a encontro. Os fins principaes das penas são a correcção, e emenda do criminoso, o exemplo dos mais Cidadãos, e a reparação do damno do offendido. Nenhum destes fins se preenche com as leves penas indicadas no Artigo. A multa de 50$ rs. será sufficiente para corrigir a manifesta calumnia contra o Funccionario Publico? Servirá tal pena de exemplo, ou de incitamento para novos crimes? E aonde está a reparação do damno, e injúria? O meio mais efficaz de indemnizar o offendido he obrigar o calumniador a desdizer-se em público, ou, como dizem nossas antigas Leis, a cantar a palinodia: sustento pois em opposição á 2.ª parte deste Artigo, que as penas devem ser maiores para reprimir o delicto; e, já que se introduzio a desgraçada doutrina dos tres arbitrários gráos do facto criminoso, augmente-se a pena em o minimo,
aproximem-se as taes differentes penas, coarctemos o arbitrio de uns e outros Juizes, que he o maior beneficio, que podemos fazer á manutenção dos Direitos dos Cidadãos.

O Senhor Gonsalves de Miranda: - Tem-se combalido a doutrina deste Artigo com o fundamento de que as penas nelle impostas são muito moderadas em todos os gráos, e tem-se pertendido que ellas devem ser mui exaceibadas, por isso que a calumnia contra um Funccionario Publico, como homem publico, he um crime, que, a lei do descredito do calumniado, pode acarretar sobre o Sociedade as maiores calamidades, que são: a falta de respeito às Leis, e aos Magistrados, a confusão, e a anarchia, e por fim até a dissolução da Sociedade. O quadro he por certo bem carregado; os argumentos muito fortes; porem elles perdem toda a sua força pela simples consideração,

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de que ella se funda na confusão, que se tem feito da materia do Artigo em questão com a dos Artigos 24, 25, e 27.

Neste Artigo não se tracta dos abusos da Liberdade de Imprensa, em que se publicão os actos da vida particular de um Funccionario Publico, ou de qualquer pessoa particular: As penas contra estes abusos achão-se estabelecidas no Artigo 27. Tambem não só tracta neste Artigo daquelles Escriptos, aonde, confundindo-se o Empregado com o Emprego, ou seja individual, ou collectivamente, te provoca a desobediencia ás Leis, e aos Magistrados, ou se excita o ódio, ou o despreso contra o Systema Constitucional.

Destes já se tractou nos dous Artigos antecedentes, isto he, nos Artigos 24, e 25. Neste Artigo tracta-se tão somente daquelles Escriptos, que contem imputações feitas aos Empregados Públicos, por faltas, ou ommissões comettidas no exercicio dos seus Cargos. Qual he porem a ordinaria natureza destes
Escriptos? Esta simples reflexão nos apresentará a questão no seu verdadeiro ponto de vista. Os Escriptos, a que se refere este Artigo, são aquelles, em que se palenieão ao Publico todos os Actos dos Depositarios do Poder, e seus Agentes Subalternos, os dos Magistrados, e, geralmente fallundo, os de todos os Funccionarios Publicos. Nestes Escriptos he que se denuncião, e apresentão no incorruptivel, e inexoravel Tribunal da Opinião Publica os peculatos, ou patronatos, as injustiças, e prevaricações dos Empregados públicos. Nestes Escriptos apparecem, sem que seja necessario recorrer a informações officiosas, todos aquelles Actos, porque as Authoridades são responsaveis. Nestes Escriptos fazem-se patentes todos os mysterios de iniquidade, que nos Governos arbitrários são ignorados do Publico, e cuidadosamente atrancados, e aferrolhados nas Secretarias, e Archivos. E, finalmente, se a Liberdade de Imprensa he a artilhe fia do pensamento, como lhes chama Rivarol, estes Escriptos são as baterias, que mortalmente fulminão as prevaricações, e os abusos. He para estes Escriptos particularmente que o Supremo Legislador fez o § 3.ª do Artigo 145 da Carta, e he na sua livre impressão, e publicação que essencialmente consiste a garantia da Liberdade da Imprensa; garantia, e direito ao mesmo tempo, sem o qual não pode haver Nação bem constituída, e cujo exercicio pratico dentro dos limites legaes he necessario, e convem não empecer por meio algum, quer seja directo, quer indirecto. Pode porem abusar-se deste direito! Pode calmnniar-se um Funccionario Publico recto, e probo? Desta calumnia pode resultar a perda da sua honra, da sua fortuna; por conseguinte a sua ruma, e a ruina da sua familia honrada, som culpa, e innocente como elle! Assim poderá acontecer, eu não o duvido; porem só em casos extraordinarios, e naquelles, em que he necessario já admittir um vicio no Governo. Nestes casos uma tal injustiça não he o effeito simples, e directo de um abuso da Liberdade de Imprensa, he o resultado de cabalas, de intrigas, ou de outros vicias anti-sociaes, que infectão o Governo.

Não está no poder de um Periodico, ou de dous, ou tres Periodicos protegidos, e assalariados estabelecer uma boa opinião a favor de um Funccionario Publico geralmente detestado, assim como não está em seu poder desacreditar aquelle, que notoriamente for reconhecido como honrado, e probo. Disto exemplos lemos entre nós, os quaes deixo á penetração, e comprehensão de quantos me ouvem. Mas pode haver abuso! Ninguém o duvida, nem disso duvidarão os IIlustres Membros da Commissão, quando neste Artigo estabelecerão as Sancções penaes para esta espécie de delidos. Todavia he necessario reflectir que, se por uma parte he necessario pôr ao abrigo da calumnia a boa reputação dos Funccionanos rectos, e probos, por outra he necessario não aterrar os Escriptores com a Sancção de penas exorbitantes por leves faltas. Devemos considerar que aquelle Escriptor, que censura os Actos illegaes, ou as commissões dos Depositarios do Poder, marcha sempre ao longo de um precipicio, e que dentro dos limites do uma justa, e legal censura pode tocar as raias da imprudência. Em consequencia se as penas por faltas leves forem exacerbadas, os Escriptores escreverão com receio, a demasiada cautela os tornará timidos, e por fim abandonarão uma empreza, cujas vantagens não podem ter comparação com o risco, a que se expõem. Então com o silencio dos Escriptos erguerão a cabeça os abusos, e ficarão sem receio os males públicos, que deve acautelar, e prevenir uma boa Lei da Liberdade de Imprensa.

As penas exacerbadas por faltas leves porão tambem os Jurados em grande perplexidade. De um lado se lhes apresentará uma Parte, á qual, posto que levemente aggravada, se deve, em seu entender, e consciencia, ao menos a reparação moral, que rexulta do effeito da Sentença condemnatoria. De outro lado se lhes offerecerá a grande desproporção da pena, em que o reo deve infalivelmente incorrer, se elle não for declarado innocente. E qual seria então o resultado de penosa situação, em que se acharião os Jurados os roais probos, o da mais sã consciência? Qual ? A impunidade do reo, sem dúvida. Reduzidos a tal extremo, os Jurados não poderão hesitar em serem injustos para não serem iniquos, e tyrannos; porque toda a pena exacerbada nada menos he que tyrannia.

Parece-me por tanto sobejamente demonstrado que no primeiro gruo devem ser as penas moderadas, e nos outros guardada a devida progressão, taes quaes se achão no Artigo. He tambem evidente que não pode estabelecer-se um maximum, e um minimun relativamente às penas, como alguns Senhores tem proposto. Se esta idéa se adoptasse, limitando-se o Jurado á simples declaração de que o Escripto contem abuso de Liberdade de Imprensa, por imputação feita a um Funccionario Publico, ficaria ao Juiz de Direito a qualificação do facto, a qual lhe não compete, juntamente com o poder de applicar a Lei ao facto, o que he de sua competência; porque se elle pode applicar todas as penas desde o minimum até o maximum fica com o arbitrio de qualificar o delicio desde a simples indiscrição e imprudencia até á calumnia a mais atroz. Ora: persuado-me que ninguem quererá conceder um tal poder a um homem somente, e a um homem empregado pelo Governo, e sujeito á sua influencia. Se um Juiz de Direito ficasse com este poder seria illusoria a garantia da Instituição dos Jurados. Tem-se dicto que he impossível marcar na Lei os diversos gráos de culpabilidade em os crimes desta classe: convenho; mas he por isso mesmo que deve competir aos Jurados essa qualificação, pela foram

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que se acha no Artigo, a unica, a que pode recorrer-se praticamente com a intervenção de um Juiz de direito. Sendo pois impossivel marcar na Lei todos os casos, ou todas as gradações de culpa, que fez a Commissão? Dividio, por uma abstracção metafisica, em taes partes todo o intervalo desde o zero da culpa, permitta-se-me esta expressão, até á culpa a mais aggravante, os quaes designou com a denominação de 1.º, 2.°, e 3.º gráo; e a designação, e classificação da culpa nestes gráos, em os casos particulares, deixou ao entender, arbitrio, e consciencia dos Jurados; porem como em nada gráo a culpa pode ser maior, ou menor, estabeleceo para cada gráo um minimum, e um maximum de pena, ficando assim marcados em cada gráo dous limites, que restringem a latitude deitada ao Juiz de Direito. Desta maneira fica para o Juiz de Direito aquella pequena parte de arbitrio na qualificação real do facto, que não pode confiar-se aos Jurados, sem que se torne inutil a intervenção do Juiz de Direito, evita-se injustiça de impôr-se uma mesma pena a delictos de differente gravidade, fica o reo com sufficientes garantias contra a arbitrariedade dos Juizes de Direito, ao mesmo tempo que, por uma perfeita gradação de penas, não se deixão impunes os crimes leves. Por isto ppprovo o Artigo tal qual se acha redigido.

O Senhor Derramado: - Senhor Presidente, eu já não sei onde vá procurar os principios das minhas opiniões, para agradar aos homens que tem fama de Liberaes na minha Patria; pois quando, sobre a materia em questão, eu defendo os de um Bentham , de um De Lolme, e de Benjamin Constant , deste Campeão da Liberdade, applaudido pelos Liberaes de todo o Mundo civilisado; sou arguido num discurso, onde se começa por dizer, que não admira que o Artigo soffra tão grande impugnação, pois que elle se propõe cohibir os abusos dos Empregados Públicos: se tal he a tendencia do Artigo, eu louvo, e approvo a sua boa tenção; mas, longe de ver nelle uma doutrina capaz de satisfazer um tal proposito, eu só encontro um convite feito á magna caterva dos Libellistas para difamarem, quasi impunemente, os homens mais virtuosos, aponto de os fazer aborrecer do Mundo, reduzindo-se á nullidade; concorrendo-se por tal modo para fazer odiosa, n'uma opinião ficticia, como já disse, a Causa Sancta da Liberdade, fundada nas Instituições, que eu amo apaixonadamente, e das quaes espero a prosperidade da Patria. Falla-se contra as theorias: eu fallo só contra as theorias viciosas, que são todas aquellas, que se não deduzem rigorosamente dos factos próprios, bem ohservados: tal he a deste Artigo. O que he que mostrão os factos a respeito da sua doutrina? Que onde quer que ella se estabeleceo, ahi reinou a anarchia: logo, onde quer que se restabelecer , ahi se restabelecerá a desordem.

O Senhor Serpa Machado: - Reflectamos um pouco no nosso estado actual, e no de toda a Europa, e observamos que de tempos a esta parte ha uma perigosa tendencia á desobediencia, e á insubordinação, e á anarchia em todas as classes, e estados, e até mesmo no domestico. Os filhos, como que se affligem com a authoridade e respeito devido a seus Pais; os Discipulos com a dos Mestres; os Criados com os Amos; os Soldados desobedecem a seus Chefes; e em geral, ha uma geral revolta dos subditos contra os Superiores. E poderá assim manter-se qualquer Sociedade em socego e tranquillidade? E fomentaremos nós este espirito de insubordinação indiscretamente, tornando-se illusorio o justo e bem merecido castigo dos calumniadores contra os Empregados Públicos, única hypothese do Artigo 26? Se passar este Artigo com tão modicas e insufficientes penas, em vez de fazermos um Artigo repressivo dos abusos da Imprensa, faremos um Artigo protector dos falsos calumniadores. Deixemos de levantar nelle um throno á arbitrariedade dos Juizes; porque, ainda que os de Facto passem por mais imparciaes, não são Anjos; hão de ter paixões como os outros; e grande e imperdoavel erro será o alargar-lhe tanto arbitrio de maneira que pelo mais entranha contradicção elles mesmos fazem a Lei, marcão a pena, e a applição, podendo castigar sem regra, nem medida, já com 50$000 réis, já com 400$000 réis a seu belo humor. Não sacrifiquemos os direitos dos nossos Concidadãos em Juizos arbitrarios. Saiba, o que infringe a Lei, a pena que se lhe ha de impor. Sigamos antes os modelos da Inglaterra que tanto tem apurado este Instituto, de que os tres gráos da Lei Hespanhola, feita em tempos de perturbação e desordens, de que elles colherão tão amargos fructos. Aproveitemos a experiência do passado, e não vamos cahir em, precipicios aonde outros cegos se despenharão.

O Senhor F. J. Maya: - Senhor Presidente, temos por fim na presente Lei reprimir os abusos, que se possão cometter pela Liberdade da Imprensa contra a Sociedade em geral, e contra os individuos em particular. He irrisorio, e até absurdo, que se pertenda, que este fim se consiga com a pena do Projecto contra o calumniador, que atacar a honra de qualquer Cidadão. A atmosphera de Inglaterra não he a mesma de Portugal, quer fisica, quer moralmente falhando. Estou sempre prevenido contra os argumentos de analogia, que de ordinario pouco provão, porque as circumstancias raras vezes são as mesmas em toda a sua extensão: e he por isso que as Instituições dos Paises Estrangeiros, ainda os mais civilizados, se não podem transplantar para Portugal, sem as modificações nascidas da natureza, e indole diversa dos seus habitantes. Os Costumes, a Religião, as Leis, e a sua prompta e igual execução, e mesmo a Constituição Política dos Inglezes, tudo, he differente dos Portuguezes; queremos no principio do goso deste direito fazer uma como a actualmente em vigor na Inglaterra, a qual está em harmonia com toda a outra sua Legislação, não só em relação á ibrma do Processo, mas tambem com os hobitng, e usos demuj-tns annos? Se o? Empregados Públicos de Inglaterra, soffrem que os Escriptores de má fé dirijão contra elles ataques pela Imprensa, he porque estão, certos, que na mesma Nação Ingleza ha logo Escriptores de boa fé, que combatem aquelles immediatamente que apparecem.

Disse um Illustre Deputado, que se pertende por este Artigo fazer responsaveis os Empregados Públicos pelo abuso do poder, na conformidade da Carta: mas aonde está na Carta que os Empregados Públicos fiquem sujeitos aos Escriptores, e que seja livre a estes fazer-lhes todos os ataques, que quizerem, falsos, ou verdadeiros? Não confundamos questões muito diversas. O Escriptor pode analysar, e censurar os actos de qualquer Empregado, e declarar

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que elle cometteo tal, ou tal facto criminoso: sendo Verdadeiro faz um serviço á Nação, para que o Governo se não sirva de pessoas indignas, e seja devidamente castigado: se he falso, então o Escriptor he um calumniador, e deve ser punido rigorosamente. Quando combato este Artigo, não intento, como já disse, defender os Magistrados, ou Empregados, que não desempenharem os seus deveres, mas quero prevenir com o augmento das penas, que no Artigo seguinte se possa comminar uma pena que evite, que se estabeleça a desmoralisação por este meio, facilitando pela demasiada pequenhez dos castigos as injurias, as invectivas, e a culumnia, com que nada se aproveita, e a que o estado actual de divisão de partidos no Reino dará lugar. Neste sentido remetto uma Emenda para a Mesa.

O Senhor Girão: - Requeiro a V. Exa. na conformidade do Regimento que queira propor á Camara se está suficientemente discutido.

O Senhor Presidente propoz, e decidio-se negativamente.

O Senhor Moraes Sarmento: - Peço á Camara a sua attenção sobre o Artigo 27, que he aonde se tracta da Liberdade de Imprensa, em que o abuso pode causar maior
damno. He preciso differençar as circumstancias do Cidadão em particular, do Cidadão constituido Empregado Publico. Em quanto aos costumes da Nação Portugueza, eu acho a Nação Portugueza mais digna de admiração do que outra qualquer; basta ver que os preversos tem procurado fomentar entre ella a desordem, a rebellião, a anarchia, e ella no meio de tudo isto se tem comportado com muita prudencia, com moderação, sem se alterar; e haverá quem diga que a Nação Portugueza não he merecedora dos maiores elogios? Quem contar, e calcular com a moral desta Nação não funda mal a sua opinião. Eu não dou por mal empregado o tempo, que levei em meditar para comparar a Nação Portugueza com a Ingleza.

O Senhor Borges Carneiro: - Muitos Senhores tem insistido fortemente em a necessidade de reprimir a insubordinação, e calumnia contra os Empregados Públicos, e Agentes do Poder Executivo, e lamentado que ellas tenhão geralmente existido na Europa.

Eu tambem o deploro: mas quereria que os mesmos Senhores notassem tambem a outra parte, que he correlativa a estes crimes; a saber, a insubordinação dos Empregados às Leis, e a sua calumnia contra os Cidadãos. Em dous polos roda a maquina social, bem mandar, e bem obedecer: porem muitas vezes os que mandão cuidão só do bem obedecer, e não lhes importa o bem mandar. Será então o caso da burrinha de Balão, de que ha dias fallou um Senhor Deputado: o cavalleiro a dar sem tom nem som na burrinha, e a burrinha não ter falla senão para dizer - Porque me dás? Será o caso, de que falla o Illustre Gerardo Noodt, os que mandão espesinhar os Súbditos, postergar as Leis a seu sabor, e depois dizerem; haja socêgo público, ninguém mova um dedo, sob pena de rebellião. Senhores, o direito de censurar os actos dos Empregados Públicos, e dos Agentes do Poder está essencialmente ligado a fazer-lhes alguma imputação, e por tanto poder quem lha faz chegar-se á espécie, de que tracta o presente Artigo, sem com tudo ser calumniador. Ha nisto uma grande differença, segundo a boa fé ou dolo de quem escreve, e outras circumstancias; e com tudo commummente, costumão muitos Empregados confundir estas cousas, e dizer indistinctamente que quem os censura lhes faz perder o respeito, e tende a destruir a ordem pública. Quem a destroe porem são os máos Empregados; são os que lisonjeão as suas arbitrariedades, não os que as reprehendem. Os seus actos públicos pertencem á Nação. "Somente nescios, diz Bentham , ou mal intencionados podem pertender que he promover a insubordinação, o censurar os actos dos Agentes do Poder: os que o fazem são os verdadeiros amigos do Governo, da Ordem , e da Justiça." Pois que? Poderão os Ministros de qualquer Governo Representativo infringir impunemente as Leis, sem que ninguem note, não digo, a offensa, que com isso fazem ao individuo, que a soffre, mas o grande mal, que causão á Sociedade, desmoralisando a Nação, dando às Authoridades subalternas tão máo ao exemplo? Como poderão elles fazer punir, ou reprimir as prevaricações dos Empregados subalternos, se elles mesmos primeiro lhes abrirem o caminho para prevaricarem, e delinquirem? Se em alguma Relação alguns poucos Juizes se combinarem para dar uma sentença injusta,
dir-se-ha que tende a perturbar, a ordem pública quem demonstrar pela Imprensa que tal sentença, he contraria às Leis? Não offende a ordem social dar a sentença injusta manifestamente, e offende-a o demonstrar essa injustiça? Como pois, segundo bem observou um Senhor Deputado, se pertende espantar com penas graves aos Escriptores, que fatiarem de Empregados Públicos? Como he mui punivel o calumniador do Empregado, assim, he mui louvavel o justo censor dos máos actos do Empregado. Cumpre que os Jurados considerem a intenção de quem escreveo, se ha dolo, se produzio imputações graves ou leves, verdadeiras ou falsas; se as não póde provar por serem falsas, ou porque as testemunhas talvez comovidas pelo temor do Empregado não ousarão fallar, os Tabelliães temerão passar Certidão, os que sabião receárão attestar: e depois de pezadas todas estas circumstancias decidirão se o Escriptor he calumniador, no qual caso merece pena mui grave, ou se fez sómente censura de um acto, de que o Empregado deve razão ao Publico. Por tanto, as penas do Artigo estão bem graduadas: deve haver um minimum assaz leve, e um maximum assaz forte: as multas pecuniarias guardão esta proporção: somente aprizão he a que me parece dever ser augmentada em todos os tres gráos.

O Senhor Leomil: - Estamos chegados a um dos Artigos, que mais uso ha de ter na execução da presente Lei, - o denunciar pela Imprensa os abusos, erros, e prevaricações dos Funccionarios Publicos. - Este he o alvo, a que principalmente se encaminha a Lei da Liberdade de Imprensa, e por isso deve merecer toda a circumspecção. O Artigo da maneira que está redigido bem dá a conhecer a intenção dos Illustres Membros da Commissão, que tiverão em vista o estado actual de corrupção geral dos nossos Funccionarios Públicos, e por isso estabelecerão penas as mais brandas contra os Escriptores, que os denunciarem, ainda quando não provem suas imputações. Já no decurso da discussão alguns Senhores Deputados, sustentando a doutrina do Artigo, altamente manifestarão estes sentimentos, - de que nem todos os deli-

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ctos dos Funccionarios Publicos poderião provar-se, já pela difficuldade da prova, já pela prepotencia, e poderio do alto Funccionario, ja fialmente pelo desvalimento do denunciante; e que por isso se tornava indispensavel o abrandar as penas, para não ser o Publico privado de poder saber o abuso dos Empregados Públicos, em que principalmente interessa a Nação.

Eu confesso ingenuamente que não posso combinar taes theorias, nem entender como possa um Escriptor qualquer saber um abuso, ou prevaricação d'um Empregado Publico para o dennunciar pela Imprensa, e ao mesmo tempo não poder provar isso, que denunciou: porque elle, a não ser calumniador, não tem outros meios de sciencia dos actos, que de demnuncia senão as vias de facto, e da publicidade e eis ahi á mão os modos de poder provar sua denuncia; e sevio que não estava exactamente informado, ou que corria a risco de não poder provae esses factos, para que os denunciou? ... He necessariamente um calumnindor quem assim obrar; nem eu posso dar-lhe outro nome, e muito menos posso admittir differença entre o denunciante, que imputa a qualquer Empregado uma prevaricação, que elle não commeteo e de que he convencido de culumniador no Juizo dos Jurados, e entre o denunciante, que faz uma igual imputação, e a não pode provar.

De qualquer forma he calumnia, crime o mais pestilento, e execranto, por isso que ataca o direito mais sagrado, e o mais precioso do homem, qual o da sua boa reputação. Se pudesse suppor que n'uma Sociedade, qualquer que seja a sua forma de Governo, era preciso integrar a calumnia, então poderiaão justificar-se já penas adoptadas n'um Artigo; porem isso ninguem se oporá a calumnia foi sempre, um crime, ainda antes das Leis positivas o definirem.

He necessario, Senhores, voltar o quadro, e não o olhar só pelo lado prazenteiro dos Escriptores bons contra os Empregados máos, mas olha-lo tambem pelo outro lado dos Escriptores máos contra o Empregados bons. Contra estes he que se ha de descarregar toda a artilharia da culumnia, da Satira, e da declamação, porque a virtude e a verdade sempre tiverão inimigos naturaes, e hão de por isso ser victimas da culumnia os Empragados Públicos virtuosos , que mais se distinguirem no desempenho de seus deveres, e adhesão as actuaes instituições e não os Empregregados máos, que hão de ser sempre apologistas. Se a Lei da Liberdade Imprensa fosse particular só para os bons Escriptores, e amigos do nosso actual systema, então nem quereria pena alguma nella; mas se ella he geral para todos, inimigos do actual systema são não só maiores em número, mas até mais finos, e melhores Escriptores no genero de maldade!... Ainda existem os Hercules, e Sandovaes.... e eu já como que estou ouvindo esta Sucia de Trombeteiros, Rabecões afinando a Orquestra, e preparando-se para a romperem com uma gritaria, que aturdira até os surdos caso esta Lei passe com penas tão suaves, com as quaes de barato elles transigirão, só pelo gostinho de darem pasto a suas virulentas paixões.

A recente experiencia passada dos poucos momentos em que nós houve liberdade de Imprensa, mostrou ao vivo qual era o Typo de moral, e tendencia dos nossos Escriptores = dizer mal do que era e bom do que era máo. = Nem prevalecem contra esta experiencia os exemplos dos Castelereags, e Cannings superiores a toda a invectiva, porque na Inglaterra, depois que em 1688 recuperou a Liberdade de Imprensa, ha moral, ha civilização, e patriotismo, o que ainda custa muito a apparecer em Portugal. Alli todos sabem lêr, e escrever, todos têm o seu Jornal e, se um Escriptor calomnio, outro defende; aqui em Portugal nem ha Escriptores capazes, nem ha nas classes, medias quem os saiba lêr; e como nunca tivemos Liberdade de Imprensa, mas só agora esta Lei tiver a fortuna de sahir á luz), o commum dos Portugases, em ouvindo têr um Libello famoso acredita-o como um evangelho só porque está em letra redonda.

He necesario finalmente advertirmos que a base d'esta grande garantia da liberdade de Imprensa não console ao na exclusão da Censura previa; mas tambem na repressão dos abusos depois da publicação.

Estas duas bases são de tal maneira connexas que nunca pode haver Liberdade sem o concurso unanime d'uma, e outra.

He necessario que haja a primeira, porque sem ella não podia haver Liberdade de Imprensa; he necessrio que haja a segunda, porque sem ella a Liberdade se conentia na Licença. Eu não sou Empregado Publico, nem tenho muita tenção de o ser: antes poderei alguma vez ser Escriptor, e por tanto se alguma partilha me pode caber nesta Lei he a das penas, que acabo de reclamar contra os Escriptores, que abusarem do seu nobre Officio.

O Senhor Galvão Palma: - Disse um Illustre Preopinante que diminuir o gráo das penas ao Escriptor que pertende publicar os direitos das Authoridades, he levantar um Throno á arbitrariedade, por isso que dá occasião aos maledicos; chamarem. Eu porem, Senhor Pesidente, direi que aggravar as penas he erigir um throno á prevaricação, por isso mesmo que dá lugar a perpetrarem-se maiores Crimes. Qual he, Senhores, a origem mais fecunda dos nossos males?

As Authoridades, os Empregados que com tanto despejo ferem a Lei em menoscato da Carta, e dos Direitos civicos, que ella nos concede. Promover pois por todas as medidas que se diminua este manancial fecundo das nossas desgraças he um dever sagrado do Legislador: o Escriptor, tendo aliàs muitos poderosos motivos, que lhe tolhem os patentear no Publico os abusos do poder, estremecerá, receando soffrer uma multa de grande importe, por isso ficará a Sociedade sem conhecer os defeitos, dos Empregados Públicos, e estes sem o estimulo da Imprensa perpetuando-os a seu bel prazer. A influencia, a força moral das Authoridades desanima o Escriptor, que em regra se julga desvalido. A difficuldade de encontrar testemunhas para provar a accusação he um novo obstaculo, que lhe suspende lançar mão da Imprensa: ora, se estes obstaculos se aggravarem com o castigo sobre maneira violento, adeo Imprensa , e, o que he resultado, campêa altivo o Emprgado, sem receio da notoriedade do seu crime. Os delictos commetidos na escuridade ordinariamente não me podem documentar, por isso o que faltão as provas; e, quando ellas existão, continua a mesma difficuldade em se poderem extrahir. Cada um de nós tem a este respeito so-

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bejos testemunos. E não he de admirar, quando na Sessão passada appareceo um Requerimento, em que se criminava um Ministro da Coroa por não, ter mandado passar um instrumento, que a Parle requereo para bem de sua justiça. Esta Camara pedio illustrações: não me consta que ainda1 chegassem. No dia 17 do próximo passado Fevereiro se pedio ao Governo fizesse avocar os Papeis, que se achárão na bagagem dos Rebeldes; Titulos, que aliàs nos poderião dar pleno conhecimento de Pessoas, que perpetrarão attentados contra a Patria. Esta mesma requisição não foi satisfeita. E que acontecerá ao inerme Escriptor? Não accumulemos pois aã dificuldades com penas muito graves de elle dar exercicio ás suas faculdades intellectuaes. Roma foi feliz em quanto os Censoras publicavão os defeitos das Authoridades. Cicero diz que o primeiro Tribuno, que abolio esta instituição, cavou a ruina á Republica. D'Agousseau invectivando contra os Senadores de Franco, e Platão contra os Empregados da Grécia, forão Cidadãos benemeritos da Patria. Os Vieiras, Quevedos, Lobões, descrevendo os prevaricações dos Empregados, interessarão á Pátria, não menos que aquelles, que a sustentarão com II e«pada. Seja pois o castigo tal qual diz o Artigo, aliás, a não ser moderado, veremos a Nação sepultada no túmulo, de que a levantou o Grande Rei Legislador.

O Senhor Barreto Feio: - Os Senhores, que com tamanho affinco tem combatido as penas estabelecida no Artigo, estribão-se n'um principio falso. Elles pensão que não depende só dos Empregados Públicos ser honrados, e respeitados; mas que na mão da Jornalistas está o dar-lhes, ou tirar-lhes a honra, e fama. Mas eu pergunto aos meemos Senhores, quem são os Magistrados, que vemos mais respeitados, e bcmquis-ios ? São aquelles, de que os Periodistas tem diclo mais bem, ou aquelles, de quem as proprias acções tem feito o seu elogio? Senhores, a nossa honra he só nossa; ninguém no-la pode dar, nem tirar. Sejamos probos, e honrados, e seremos respeitados do Publico. E, se a calumnia nos quizer offuscar, será névoa, que o sol da verdade em breve dissipará. Portanto, não receiemos os calumniadores, que para os reprimir são mais que bastantes as penas propostas no Artigo, e por isso eu as approvo. Alem de que, Senhores, he necessario que nos lembremos de que alonga oppressão, que esta Nação tem supportado, a tem posto n'um tal abatimento, que mais precisa de estimulos, que de calmantes.

O Senhor Sousa Castello Branco: - Eu já agora, depois do que disserão os Illustres Deputados os Senhores Galvão Palma, e Barreio Feio, pouco tenho a ponderar. Grande tem na verdade sido a questão sobre a matéria deste Artigo, que aliás he de importancia, e merece a mais seria attenção; mas o progresso do debate mostra que toda a dificuldade tem consistido em combinar a liberdade de censurar pela Imprensa os Actos dos Empregados Públicos com a prohibição de os calumniar. Uns Senhores tem achado as penas estabelecidas demasiadamente severas, outros as pertendem exacerbar de forma, que parece que com difficuldade achão pena bastante para prevenir a calumnia, que se faça a algum Empregado Publico; não vêm mesmo senão calumnia na censura, que recahe sobre Actos do Empregado Publico, ainda sendo Actos, de que não pode fazer-se prova. Mas, Senhores, ha nisto manifesta illusão. Quantas vezes um Juiz, e um Escrivão massácão a qualquer Cidadão sem que este possa apresentar documentos disso? Só quem não tem uso do foro pode desconhecer quantas malfeitorias deste genero existem. Se a Authoridade he a propria, que lhe estorva apresentar o documento, como o apresentará o Cidadão, que accusa esse Acto? Devemos considerar mesmo o caso, em que a pessoa, que imputa, ou censura o Acto ao empregado Publico, não he um Escriptor, supponhamos que he uma Parte: Pois não poderá esta queixar-se pela Imprensa sem o risco de ser considerado calumniador, ainda que não prove a imputação feita ao Empregado? Aos Jurados toca, em falta de Documento, considerando as razões, que persuadirão o Cidadão a fazer sem provar a imputação referida, decidir do seu animo, e intenção para o qualificarem calumniador, e declararem o, gráo de sua culpabilidade, ou para o considerarem como um imprudente, para ter lugar contra elle uma pena branda, que se estabeleça para correcção no primeiro gráo, ou em fim para julgarem se e falta do Documento he devida a uma difficuldade invencivel posta ao Cidadão pelo Poder, e pela Authoridade, a quem a producção do Documento prejudica. Já o Senhor Galvão Palma citou exemplos, de que temos noticia por terem sido presente nesta Camara, de Certidões denegadas á Parte na Secretaria d'Estado dos Negócios do Reino: eu accrescentarei que todos sabem que pelo Ministerio dos Negocios Estrangeiros se fez pública Ordem, que ainda vigóra, de não se publicarem Peças Officiaes do Governo sem que a Gazeta de Lisboa as tenha primeiramente publicado. Supponhamos que alguém he queixoso de providencias emanadas do Governo, e quer imprimir o seu Requerimento; supponhamos que alguem quer censurar essas providencias usando de um Direito, que lhe outorga a Carta. Ao Governo não convém a publicação; e como a Gazeta não as publique, não será então possível imprimir Requerimento, ou Censura sem o perigo de ser punido como Callumniador, por falta dos Documentos, que a propria Authoridade nega ao Publico, deixando de fazer inseri-las na Gazeta do Governo. He preciso grande tento nesta materia. Não se enganem os Senhores, que querem grandes penas, e que em todo o caso de não se provar a imputação achão ter-se feito uma calumnia ao Empregado Publico. Pode haver imputações feitas sem animo, e intenção de calumniar; pode haver cenouras licitas feitas aos Actos dos Empregados do Poder, apesar de não se apresentar Documento: havendo imprudencia não deve ficar impune; mas seja branda a pena, porque não existe então calumnia: ainda mesmo nesta ha gráos, e he preciso que as penas não sejão excessivas, para que não se altere o Escriptor, ou queixoso; não se dê garantias aos oppressores, deixando sem ellas os opprimidos; e como as do Artigo satisfazem concluo que devam ser approvadas.

Julgado o Artigo suficientemente discutido, fez o Senhor Presidente lêr as seguintes emendas, que ao mesmo se havião offerecido :
1.º Do Senhor Deputado Francisco Joaquim Maia = Que se inclua a palavra = Estampas. = Que as penas sejão no primeiro gráo 200 a 300 mil réis, e

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seis meies de prizão. No segundo de 400 a 600 mil réis, e doze mezes de prizão. No terceiro de 800 a um conto de réis, e dezoito mezes de prizão.

2.ª Do Senhor Deputado Magalhães =. Proponho que o minimo no primeiro gráo seja de 20 mil réis; e o máximo no ultimo gráo seja de um conto de réis.

3.ª Do Senhor Deputado Elias = Proponho que se augmente a terça parte nas penas, tanto pecuniárias, como de prizâo.

Disse então o Senhor Presidente que o Artigo tinha duas partes; que na primeira cê determinava o crime; na segunda se marcavão as penas. Que por tanto propunha se havia de impôr-se uma pena ao Auctor, ou Editor de qualquer escripto litografiado, ou impresso, em que se imputem a qualquer Empregado Publico acções criminosas no seu emprego, Geralmente se vencêo que sim. Se igualmente se devia impor ao que o fizesse por meio de Estampas: vencêo-se que sim.

Passando-se á segunda parte do Artigo, quanto á pena pecuniaria do primeiro gráo, propoz o Senhor Presidente successivamente as mencionadas nas tres Emendas, que forão rejeitadas: e propondo então a pena marcada no Artigo, foi approvada por 61 votos contra 31. Propoz o Senhor Deputado Magalhães que fosse nominal a votação, e assim se vencêo.

Propoz então o Senhor Presidente a Emenda do Senhor Deputado F. J. Maia sobre o segundo gráo, que foi rejeitada por 79 votos contra 17. Pedio o Senhor Deputado Elias que se lhe concedesse o retirar a sua Emenda: decidio-se que sim. Igual pedido fez a respeito da sua o Senhor Deputado Magalhães, e igualmente foi decidido. Propoz então o Senhor Presidente a pena marcada no Artigo no segundo gráo, e foi approvada por 63 votos contra 33. Pedio o Senhor Deputado F. J. Maia que se lhe consentisse o retirar a sua Emenda, e foi-lhe concedido.

Propoz então o Senhor Presidente a pena do Artigo, quanto ao terceiro gráo, que foi approvada por 67 votos contra 36.

Vencidas assim as penas pecuniárias, passou-se á votação sobre as de prizão; tendo-se primeiro geralmente decidido que, além das penas pecuniárias, devia accumular-se a de prizão. Propoz pois o Senhor Presidente a pena marcada para o primeiro gráo na Emenda do Senhor Deputado F. J. Maia, que foi rejeitada por 86 votos contra 7. Propoz immediatamente a declarada no Artigo, que foi igualmente rejeitada por 60 votos contra 36.

Propoz-se então se devia o Artigo voltar á Commissão para graduar a pena de prizão, de novo, e geralmente se decidio que sim , sendo á mesma remettidas as duas seguintes Emendas: 1.ª Do Senhor Deputado Conde de Sampayo = Que estas penas se reduzão a dous mezes de prizão para o primeiro gráo; a quatro mexes para o segundo; e a seis mezes para o terceiro gráo. 2.ª Do Senhor Deputado Visconde de Fonte Arcada = Proponho que a pena de prizão seja no primeiro gráo dous mezes; no segundo quatro; e no terceiro oito. - E o seguinte Additamnento do Senhor Serpa Machado =. Proponho que os calumniadores se desdigão em publico, ou cantem a palinódia.

Entrou em discussão o Art. 27. O Auctor, ou Editor de qualquer Estampa, ou Escripto litografiado, ou impresso por qualquer forma que seja, em que se publique algum acto da vida particular de qualquer Cidadão, Individuo, ou Corporação legal, quer este facto seja falso, quer seja verdadeiro, de cuja publicação possa resultar infâmia, deshonra, ou injuria, incorrerá nas penas pecuniarias somente que ficão declaradas no Artigo antecedente: incorrerá sómente em ametade das penas pecuniárias em cada um do: grãos declarados no mesmo Artigo, se o Artigo contiver expressões de injúria, ou despreso contra qualquer. Em todos estes casos fica sempre o direito salvo para a reparação civil da offensa, a qual será arbitrada era dinheiro pelos Jurados.

O Senhor Macedo Ribeiro: - Tem sido este Projecto tão bem discutido, que eu emittindo mais vezes a minha opinião, serviria isto apenas de tomar tempo á Camara inutilmente, o que não deve ser; com tudo occorrem-me por agora algumas observações, que julgo do meu dever manifestar.

A rubrica deste Titulo 3.°- he = dos Auctores, e Editores =: quem ler simplesmente a rubrica, de nenhum modo pode conhecer por ella á primeira vista a matéria do Titulo, porque a expressão Auctores, e Editores he muito vaga, e não se sabe se vai nelle tractar-se do officio, obrigações, privilégios, ou muitos outros objectos, que podem ter referencia aos Auctores, e Editores; olhando nós para a matéria do Titulo, vê-se que em Cada um dos seus Artigos se suppõe um delicio, e se estabelece a pena, que lhe corresponde; parece-me por tanto que seria mais própria, expressiva, e restricto a seguinte rubrica; a saber = Das penas contra o abuso da Imprensa.

O Artigo 27, de que se tracta, bem como os antecedentes e subsequentes, começão pelas expressões = O Auctor, Ou Editor = e eu quizera se lhe accrescentasse = o Publicador = dizendo: = O Auctor, Editor, ou Publicador = a fim de comprehender nesta generalidade todos os casos, e todos os delinquentes possiveis: Auctor entendo eu o primeiro productor de uma obra; Editor aquelle que a imprime, ou manda imprimir; pode com tudo haver casos, em que se publique uma Estampa, ou um Livro, de que nunca se conheça nem o Auctor, nem o Editor, e neste caso fica o delicto impune; tal he por exemplo o caso em que se imprima em Lisboa, ou no Porto um Livro, em cujo rosto se declara falsamente ser impresso em França, ou em outra parte, e aqui temos como, senão for comprehendido nos Artigos o Publicador, este delicto fica sem castigo, não obstante a generalidade do Artigo 18, que, sem interpretação violenta, não comprehende este caso, e outros que ainda na pratica podem occorrer.
Tambem reparo que neste mesmo Artigo 27 se impõe ao que infama, deshonra, ou injuria Corporações, ou individuos na sua vida particular, penas pecuniarias somente, e se omitte a pena de prizão, quando esta he aqui tão essencialmente necessária como no Artigo antecedente, e em alguns outros, e sem esta pena afflictiva, um tal delicto ficará unicamente com pena para os pobres, e impune em os ricos delinquentes, podendo qualquer pecuniário sacrificar sem custo a quantia de cincoenta mil réis, e muito mais ao gosto de satisfazer a sua particular vindicta, injuriando

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atrozmente pela Imprensa a sua victima, a troco de uma quantia para elle insignificante. Sabemos todos o prazer que achava esse rico Romano em dar bofetadas nos seus Concidadãos, correndo as das de Roma como um escravo ao lado com a bolsa aberta, esbofeteando quem lhe parecia, e pagando immediatamente a multa: em consequência parece-me indispensavel que lambem neste Artigo haja uma pena de prizão qualquer, e não somente a pecuniaria.

Faço ainda observação sobre o ultimo periodo deste mesmo Artigo: diz que nos casos delle fica sempre o direito salvo para a reparação da injuria, e supposto accrescenta que ha de ser arbitrada em dinheiro pelos Jurados, parece-me com tudo impropria neste lugar a expressão = direito salvo = que nos termos actuaes da nossa praxe forense suppõe sempre um novo processo posterior, o que de modo algum aqui seria admissivel, nem mesmo a Commissão o entende; mas por desviar todos os equivocos, eu desejaria que antes se adoptassem as expressões do Artigo 39 in fin. do Projecto que a este servio de base, e se dissesse = Em todos os casos do presente Artigo, sempre, alem da pena, terá lugar a reparação civil da offensa qual será logo arbitraria em dinheiro pelos Jurados - neste sentido mando as minhas emendas para a Mesa.

Estando aproximada a hora, e julgando-se a matéria deste Artigo de grande ponderação, ficou adiado para a Sessão seguinte.

Fez-se a segunda leitura do Projecto do Senhor Guerreiro para a reformação provisória da ordem do Juiz nos feitos crimes (Vide pag. ); e, posto á votação, foi unanimemente approvado, e foi decidida a sua urgência; determinou-te a sua impressão, bem como a da motivos, que o acompanhão.

Fez-se igualmente segunda leitura da Proposição do Senhor Deputado Cluadino (Vide pag. ), e não foi approvada.

Igualmente o não foi a outra do Senhor Deputada F. J. Maya (Vide pag. ) sobre Castigos Militares.

O Senhor Deputado Mózinho da Silveira perguntou, se nesta Sessão se podião tractar Projectos tractados no Sessão antecedente? e unanimemente se decidio que sim.

Lêo a seguinte Proposição o Senhor Deputado Henriques do Couto, que ficou para segunda leitura.

- Quão doloroso he, Senhores, considerar a lamentável decadência, a que tem chegado a Agricultura Portugueza, que podia fazer a felicidade não só da Habitantes dos Campos, mas ainda dos que povoão as Cidades! Ouvir todos os dias gemidos dos Lavradores, que maldizem a sua infeliz condição, que os sujeita a assiduos trabalhos, já na cultura dão terras, já na plantação, ou sementeira de arvoredos, ainda mesmo infructiferos, como indispensáveis á Agricultura, e já finalmente na creação de seus gados, e ver que entre fadigas tão penosas elles não recebem prémio algum daquelles, com que a terra em outros Paizes paga abundantemente os trabalhos de seus Cultivadores, que correm com agigantados passos para a sua ruína; e, opprimidos do pêso da sua dura escravidão, até muitos se lembrão de abandonar os seus lares, e ir mendigar sustento nas Cidades. E que geral desgraça, Senhores, seria, se pozessem em pratica tão lastimosas cogitações!

E pois já que a Poderosa Mão Divina, commovida pela infeliz sorte de Portugal, dêo ao Nosso Magnanimo e Muito Poderoso Rei o Senhor D. PEDRO IV bastante Sabedoria para felicitar este Reino com, ditosas Instituições, que o habilitão para poder remmediar os males, que o afligem, permitti, Senhores, que eu chame a vossa attenção sobre a infelicidade, que vexa grande número de Agricultores, uma das. líiais beneméritas, e estimáveis Classes dos Estados.

A compaixão não deixará de laçar vossos sensíveis corações, como tem penetrado o meu; e todos unanimemente concorreremos para o augmento, e prosperidade da primeira fonte da riqueza Nacional.

Na providencia, que vou propôr, não se contem prezuizo para os Donatarios, antes estes terão maiores vantagens á proporção que os Lavradores, animados com os allivios, que tanto reclamão, augmentarem a Agricultura, e com isso a quantidade das Prestações agrarias, como já a experiencia tem mostrado. Com a referida providencia, que eu espero adoptareis, começarão os Povos a ver realisar aquellas lisongeiras esperanças, que o Senhor D. João VI de saudosa memoria lhes dêo na sua Carta Regia de 7 de Março de 1810, e na Lei da 5 de Junho de 1824, & . 5.
A vossa sabedoria, Senhores, me previne em tão ponderosa matéria; e, por poupar um tempo precioso, eit paeso já a propor a providencia, de que fallo no seguinte

PROJECTO DE LEI.

Art. 1. Todas as Prestações incertas, que até agora se pagavão de Cereaes, ou quaesquer outros fructos, sejão ou não determinados por Foral, ficão reduzidas a ametade, salvo as que excederem o outavo, pois essas serão conservadas sem alteração. Esta disposição não comprehende quaesquer Foros sensiticos, ou emfitenticas, que não venhão do Foral.
Art. 2. Na disposição do Artigo antecedente se com prebendem os Direitos de Jugadas, seja qualquer, que for a sua instituição.
Art. 3. Toda e qualquer Posse, posto que immemorial, que for contraria, ou diversa do disposto no Foral, não terá o effeito algum, sendo em prejuiso do Lavrador; será porem mantida, se lhe for favoravel.
Art. 4. Fica subsistindo o Direito das Avenças individuaes, como está determinado na Lei de 24 de Julho de 1824, e só no caso de Avença proposta, e não convencionada por ambas as Partes interessadas, deverão intervir dous Louvados, um por cada uma, para arbitrarem a Prestação, que o Lavrador deve pagar. Fora deste caso fica prohibido ao Senhorio, ou seus Administradores, mandar fazer na Propriedade do Lavrador, ou Seareiro qualquer averiguação por homens denominados Quarteiros.

Art. 5. O pagamento das sobredictas Prestações será feito na Eira, depois de esbulhado o Pão, e nunca no agro, ou em palha.

Art. 6. Nos Lugares, ou Casaes, aonde, alem dos Direitos do Foral, se pagão ao mesmo Senhorio Prestações certas por Cartas de Povoação, ficão estas extinctas.

Art. 7. Fica revogada toda a Legislação em con-

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trario. Camara dos Deputados em 10 de Janeiro de 1828. - João Henriques do Conto.

O Senhor João Joaquim Pinto: - Eu reconheço a necessidade, que ha, de se tractar das Leis Regulamentares; nem eu fallaria em outro sentido, a não me urgirem as obrigações, que contraiu ao ser Eleito Deputado por Angola, e Benguella. A Indicação, para que pedi ser inscripto na lista das Propostas, tende a garantir o Direito de Propriedade daquelles Povos, os quaes, sujeitos às incalamidades inherentes a um clima infecto, soffrem quanto uma viva imaginação pode pintar do males provenientes de um desenfreado despotismo, descarada rapacidade, e desacicisado capricho, que he a Lei do Paiz; e, para cumulo de males, parecem esquecidos da Mãi Pátria. Estes Povos subsistem unicamente por via do Commercio de Escravos, e tem por consequência empregados seus fundos neste genero de Mercadoria; he verdade que o animo se revolta ao ouvir dar a um homem o nome de Mercadoria, irias a ordem das Cousas ainda he esta, e o Direito adquirido por estes Senhores sobre seus Escravos tem todos os effeitos civis, que a Lei lhes outorga; este Commercio porem espira, porque se oppõe aos interesses de uma Nação poderosa, e as luzes do seculo o não consentem: o Tractdo, por que se extingue, se não está ratificado, e publicado, está, pelo menos, estimulado, e projectado entre as Potencias Ingleza, e Brazileiro, o que importa, a total ruina de grande parte daquelles Povos, sem o meio de salvarem estes: fundos. Entretanto eu não sei que o Governo, por via de seus Agentes nas respectivas Cortes contradances, tenha intervindo para que fique resalvado um prazo razoável, em que os, Súbditos Portuguezes residentes naquelles Estabelecimentos possão ultimar as suas transacções já entaboladas ao tempo da ratificação do Tractado, e depois da sua publicação, sahir para onde quiserem com os Escravos seus domesticos, assim como já se estipulou para os habitantes das Possessões Portuguezas na Africa, ao norte do Equador; e eu não julgo importarem muito às duas Nações, a quem interessa a ultimação do Tractado, os interesses de um terceiro, que tendo Ministros nas suas Cortes não pugnão pelos de seus Subditos: eu não quero dizer que o Governo seja tranquillo espectador de tantos males, antes eu julgo que a falta de conhecimentos das necessidades daquellas Colonias he a causa da ommissão (se a ha), por isso faço a seguinte Proposta, que estimarei seja tornada em consideração por esta Camara, e julgada urgente, e que o he tanto mais, quanto se tornou incerta a época da extincção deste trafico, pela primeira recusação da Corte de Londres ao praso, que no Rio de Janeiro se tinha estipulado.

O mesmo Senhor passou em consequência a ler a dicta Proposição, que he a seguinte.

Proposição.

Proponho que se faça presente ao Governo quanto exige a violenta posição dos Habitantes nos Estabelecimentos Portugueses da Africa Austral uma prompta direcção aos Governos do Brasil, e Grã Bretanha, porque fique resalvado no Tractado da abolição do trafico da Escravatura, que se diz estipulado entre as duas Potências mencionadas, um prazo razoavel, em que os Súbditos Portuguezes estabelecidos naquelles Dominios possão ultimar as transacções já estabelecidas ao tempo da ratificação do dicto Tractado, assim como o liberdade de passarem para qualquer outro Paiz com os Escravos seus domesticos depois da publicação do mesmo, o que he conforme ao mencionado para os Estabelecimentos Portuguezes na Africa no Norte do Equador, pelo Tractado de 23 de Janeiro de 1815 Art. 1.° e Art. addicional, dando depois conta do resultado ás Cortes, na conformidade do § 7 e 8 do Capitulo 2 da Carta. Camara dos Senhores Deputados aos 8 de Janeiro de 1828. - O Deputado por Angola, e Benguella João Joaquim Pinto.

Ficou para segunda leitura.

O Senhor Deputado Secretario Paiva Pereira disse que o Cirurgião Mor do Reino offerecia no exemplares da receita e despeza das Escholas de Cirurgia de Lisboa, e Porto, para se distribuírem pelos senhores Deputados: assim se mandou.

Dêo mais o mesmo Senhor conta de um Officio do Ministério da Guerra relativo á divisão do Território.

De outro do Ministerio da Justiça sobre o mesmo objecto.

De outro do ministerio da Fazenda com o Autografo do Decreto das Cortes Geraes de 30 de Março de 1827: que se mandou guardar no Archivo.

De outro do Ministério da Reino, contenda diversos papeis relativos a pezos e medidas: que se mandárão remetter á respectiva Commissão,

De outro do Ministerio da Fazenda acompanhando exemplares dos resumos da receita e despesa do Descuro Publico desde 18 de Junho proximo passado até 30 de Novembro do mesmo anno, para se distribuirem pelos Senhores Deputados, o que se mandou fazer.

De outro da Camara dos Dignos Pares do Reino remettendo exemplares das suas Actas para serem distribuidos.

O Senhor Deputado Secretario Carvalho e Souto disse que a Commissão de Fazenda participara tinha eleito para seu Presidente o Senhor Deputado Filippe Ferreira, e para Secretario Relator o Senhor Deputado Florido Rodrigues Pereira Ferraz.

Lêo o mesmo Senhor a declaração mandada fazer na Acta, que foi approvada.

O Senhor Deputado Aguiar pedio se lhe lançasse na Acta o seu voto em separado, igualmente assignado pelo Senhor Camello Fortes, Francisco Joaquim Maya, e Tavares de Almeida.

Na ultima Sessão da Camara votei - Que no Artigo 20 do Projecto de Lei repressiva dos abusos de Imprensa, se considerassem criminosos os Auctores, ou Editores de Escriptos impressos, em que directa, ou indirectamente se negasse, ou pozesse em duvida, algum Dogma da Religião Catholica, ou se estabelecessem Dogmas falsos, ou Doutrinas Religiosas, que a Igreja condemnou; e as penas estabelecidas contra elles no referido Artigo se exacerbassem, accrescentando-se ainda às pecuniárias outra em qualquer gráo.

Que no Artigo 21 se distinguisse a blasfémia contra Deos da blasfemia contra os Sanctos, para effeito de se imporem maiores ou menores penas. Que as penas indicadas no Artigo 92 contra os que atacão pe-

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la Imprensa a Moral Christã, e costumes públicos, erão excessivamente diminutas, e devião ser substituidas pelas que se approvarão no Artigo 20. Que os
Auctores, ou Editores de Escriptos, em que se procurasse incitar á rebellião, e anarchia, não só fossem punidos pelo abuso, que fuzerão da Imprensa, com as penas estabelecidas na Lei repressiva delia, mas seguindo-se a rebellião, e anarchia, ficassem sujeitos às que por outras Leis são impostas a estes delictos, o que convinha declarar-se no Artigo 24.

Dêo então o Senhor Presidente para Ordem do Dia a continuação da discussão sobre o Projecto N.° 141, e a nomeação da Commissão para o Projecto do Senhor Deputado Guerreiro, e disse que estava fechada a Sessão às duas horas e meia.

SESSÃO DE 11 DE JANEIRO.

Ás 9 horas e meia da manhã fez a chamada o Senhor Deputado Secretario Paiva Pereira, e se acharão presentes 99 Senhores Deputados, faltando, alem dos que ainla se não apresentarão, 16, a saber: os Senhores Claudino - Rodrigues de Macedo - Pereira Ferraz - Gravito - Leite Lobo - Xavier da Silva - Santos - Costa Rebello - Sousa Queiroga - Ferreira de Moura - Fonseca Rangel - Sousa Cardoso - Rocha Couto - com causa; e sem ella os Senhores Soares d'Azevedo - Alves Diniz - e Visconde de S. Gil.

Disse então o Senhor Presidente que estava aberta e. Sessão, e lêo o Senhor Deputado Secretario Carvalho e, Sousa a Acta da Sessão antecedente.

O Senhor Cordeiro: - Parece-me que falta na Acta a circumstancia do que se passou na Sessão antecedente relativamente á Indicação do Senhor Claudino Pimentel, em que V. Exa. dêo uma explicação, ou razão, por que se tinha rejeitado esta Indicação, e visto ser feita esta explicação pelo Senhor Presidente da Camara, e ser a Acta um relatorio fiel do que aqui se tracta, parece-me que nella deve entrar isto.

O Senhor Presidente: - Eu não podia fazer essa declaração por maneira alguma, pareceu-me só que a rejeição da indicação do Senhor Claudino foi fundada na razão de não querer tolher a Camara, para não deixar de tractar de outras matérias urgência.

O Senhor Cordeiro: - Eu não procedimento de V. Exa. , peço só que entre na Acta.

O Senhor Secretario Carvalho e Sousa: - Os Secretários da Camara não são Tachigrafos, e por isso não tem obrigação de copiarem as palavras, ou discursos do Senhor Presidente, o dever dos Secretarios reduz-se o expor com exactidão as resoluções da Camara, e nada mais; foi isto o que fiz, e o que consta da Acta.

O Senhor Cordeiro: - Bem sei que não são Tachigrafos, mas principalmente as reflexões do Senhor Presidente, e esta que he uma declaração feita a uma rejeição, devem entrar na Acta.
O Senhor Secretario Carvalho e Sousa: - Eu julgo que a minha obrigação he pôr as decisões da Camara, e não os motivos de qualquer rejeição.

Entregue a Acta á votação foi approvada.

O Senhor Deputado Cordeiro pedio se lançasse na Acta o seguinte voto em separado: - Na Sessão de 10 do corrente fui de voto que não houvesse votação nominal sobre as penas do Artigo 26 do Projecto de Lei em discussão. -

ORDEM DO DIA

O Senhor Presidente: - Continua a discussão sobre o Artigo 27 do Projecto N.º 141 adiado da Sessão de hontem: tem a palavra o Senhor Soares Castello Branco.

O Senhor Soares Castello Branco: - Eu approvo a doutrina deste §, porem não a absoluta generalidade, em que está concebido: levanto-me pois para fazer uma excepção, que julgo ser essencial. He muito justo que se dê ao Cidadão todas as garantias possiveis, para que não possa ser impunemente calumniado: he uma propriedade a boa reputação, e boa fama tão sagrada como outra qualquer, o por consequência deve-se trabalhar com toda a força para a sua conservação; porem nem por isso se deve tolher a outro Cidadão o seu interesse, e o direito, que elle em certos casos tem, em que sejão publicados factos alheios criminosos, quando nisso interessão, e principalmente quando se tracta de justa indemnisação de igual interesse. Todos nós sabemos quanto a conducta passada de um homem influe para o conceito da sua vida. O homem, que desgraçadamente foi uma vez convencido de malfeitor, de calumniador, de falsario, ou de outro qualquer crime infamante, chama sobre si uma certa prevenção, para assim dizer, que imprime era todas as suas acções o cunho da malícia, e da falsidade. Eu sei muito bem que, se um homem, foi uma vez máo, não se segue que elle senão emende, e venha mesmo a merecer a boa nota, que tinha perdido, e a estima de seus Concidadãos: neste caso he então muito justo que a malignidade não vá revelar cousas, que ou os tempos tem feito cahir em esquecimento, ou a diversidade dos lugares as fizesse ignorar daquelles, com quem se vive; mas se este homem continua a exercer a sua má índole contra a honra de seus Concidadãos, então não acho razão, para que a Lei prohiba a esses Cidadãos offendidos a publicação de factos, ainda que ignorados dos outros, mas que podem mostrar o pezo, que se deve dar á calumnia imputada por aquelle homem. Seria na generalidade, em que o § está concebido, conceder a quem o não merece uma natural vingança, que elle voltaria em prejuizo dos outros, e negar o direito, que a outro compete, em consequência da garantia, que lhe deve ser dada para a sua justificação. Esta influencia he que eu pertendo que se exceptue naquella generalidade, em que está concebida esta matéria, isto he, que seja licito a quem tiver interesse publicar pela Imprensa os factos criminosos daquelle, que o calumnia, daquelle, que o accusou. He tanto mais necessario nestes desgraçados tempos, em que os Portuguezes, os melhores Portuguezes, os mais amantes da boa ordem, se tem visto atacados por uma relé a mais infame da Sociedade, de detratores denunciantes, e espiões. Muitos homens te-

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