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SESSÃO DE 11 DE MARÇO DE 1871

Presidencia do ex.mo sr. Antonio Cabral de Sá Nogueira

Secretarios — os srs.

Adriano de Abreu Cardoso Machado

Domingos Pinheiro Borges

Summario

Explicações do sr. presidente do conselho ácerca do complemento do ministerio — Declarações de alguns srs. deputados sobre o mesmo assumpto — Apresentação de propostas de lei por parte dos srs. ministros do reino, fazenda e obras publicas.

Chamada — 66 srs. deputados.

Presentes á abertura da sessão — os srs.: Adriano Machado, Agostinho de Ornellas, Osorio de Vasconcellos, Anselmo Braamcamp, Pereira de Miranda, Soares de Moraes, Antonio Augusto, Sá Nogueira, Veiga Barreira, Antunes Guerreiro, Arrobas, Pedroso dos Santos, Sousa de Menezes, Rodrigues Sampaio, Antonio de Vasconcellos, Barjona de Freitas, Cau da Costa, Falcão da Fonseca, Barão de Rio Zezere, Barão do Salgueiro, Bernardino Pinheiro, Ferreira de Andrade, Carlos Bento, Pinheiro Borges, Pereira Brandão, Eduardo Tavares, Francisco Mendes, Francisco Beirão, Coelho do Amaral, F. M. da Cunha, Van-Zeller, Quintino de Macedo, Freitas e Oliveira, Jayme Moniz, Santos e Silva, Zuzarte, Barros e Cunha, J. J. Alcantara, Mendonça Cortez, Nogueira Soares, Gusmão, J. A. Maia, Bandeira Coelho, Dias Ferreira, Mello e Faro, Figueiredo de Faria, José Luciano, Almeida de Queiroz, Moraes Rego, Mello Gouveia, Mexia Salema, Teixeira de Queiroz, José Tiberio, Julio de Carvalhal, Julio Rainha, Luiz de Campos, Luiz Pimentel, Camara Leme, Affonseca, Marques Pires, Thomás Lisboa, Mariano de Carvalho, D. Miguel Pereira Coutinho, Pedro Franco, Pedro Roberto, Visconde de Valmór, Visconde de Villa Nova da Rainha.

Entraram durante a sessão — os srs.: Eça e Costa, Augusto de Faria, Saraiva de Carvalho, Conde de Villa Real, Francisco de Albuquerque, Costa e Silva, Caldas Aulete, Barros Gomes, Silveira da Mota, Mártens Ferrão, Candido de Moraes, Lobo d'Avila, Elias Garcia, Rodrigues de Freitas, Latino Coelho, Visconde de Moreira de Rey, Visconde dos Olivaes.

Não compareceram — os srs.: Alberto Carlos, Villaça, A. J. Teixeira, Freire Falcão, Pequito, Santos Viegas, Telles de Vasconcellos, Pereira Lago, Pinto Bessa, Palma, Ulrich, Alves Matheus, Augusto da Silva, Pinto Magalhães, Faria Guimarães, Rodrigues de Carvalho, J. M. dos Santos, Nogueira, Mendes Leal, Lopo de Sampaio e Mello, Paes Villas Boas, Sebastião Calheiros, Visconde de Montariol.

Abertura — Á uma hora e meia da tarde.

Acta — Approvada.

EXPEDIENTE

A QUE SE DEU DESTINO PELA MESA

Officios

1.º Do ministerio do reino, do teor seguinte:

«Ill.mo e ex.mo sr. — Tenho a honra de participar a v. ex.ª, para conhecimento da camara dos senhores deputados da nação portugueza, que tendo-me Sua Magestade El-Rei concedido por decreto de 1 de março corrente a exoneração que lhe pedi do cargo de ministro e secretario distado dos negocios das obras publicas, commercio e industria, houve por bem encarregar-me definitivamente da pasta dos negocios do reino, de cujas funcções já havia sido encarregado interinamente; nomeando na mesma data, para o cargo de ministro e secretario d'estado dos negocios ecclesiasticos e de justiça, ao conselheiro do supremo tribunal de justiça José Marcellino de Sá Vargas, ministro e secretario d’estado honorario e antigo deputado da nação; e para o de ministro e secretario d'estado dos negocios das obras publicas, commercio e industria ao visconde de Chancelleiros, par do reino.

«Deus guarde a v. ex.ª Secretaria d'estado dos negocios do reino, em 11 de março de 1871. — Ill.mo e ex.mo sr. presidente da camara dos senhores deputados da nação portugueza. = Marquez d'Avila e de Bolama.»

Á secretaria.

2.º Do ministerio da fazenda, remettendo os autographos dos decretos das côrtes geraes, sanccionados por Sua Magestade El-Rei, e já convertidos nas cartas de lei de 26 de dezembro de 1870, a primeira das quaes auctorisa o governo a conceder ao barão da Trovisqueira, ou á companhia que elle organisar, a admissão livre de direitos nas alfandegas, de todo o material fixo e circulante indispensavel para a construcção e exploração do caminho de ferro «rail-road» a que se refere o decreto de 25 de agosto de 1870; e a segunda renova a concessão feita á camara municipal de Guimarães do convento de S. Domingos, e de parte da respectiva cerca.

Á secretaria.

3.° Do mesmo ministerio, remettendo 100 exemplares do relatorio dos actos do ministerio da fazenda durante o anno de 1870.

Á secretaria.

4.° Do ministerio da guerra, satisfazendo ás informações pedidas pela camara em 22 de dezembro proximo passado, sobre o requerimento do dr. Guilherme Centazzi,

Á secretaria.

5.º Do mesmo ministerio, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Domingos Pinheiro Borges, a correspondencia havida com o commandante da 2.ª divisão militar ácerca do aluguer de casa para o quartel general, quando a sede da mesma divisão esteve em Lamego.

Á secretaria.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Marquez d'Avila e de Bolama): — Creio que foi lido na mesa um officio que tive a honra de dirigir a esta camara, no qual lhe participava que o ministerio estava completo, tendo sido confiada a pasta dos negocios ecclesiasticos e de justiça ao sr. conselheiro José Marcellino de Sá Vargas, e a pasta das obras publicas, commercio e industria ao sr. visconde de Chancelleiros.

Desejo dizer á camara que o ministerio assim completado segue rigorosamente o programma que eu tinha tido a honra de apresentar a esta camara em outubro ultimo.

Nós vamos resolutamente occupar-nos da solução da questão de fazenda, e contâmos com a benevolencia da camara para nos ajudar a levar ao cabo esta empreza, que não é hoje só do governo, mas do paiz inteiro (apoiados).

É absolutamente indispensavel fazer desapparecer o deficit do nosso orçamento: para isto havemos de continuar incansaveis na eliminação de todas as despezas, que não forem absolutamente indispensaveis para o serviço publico, e na reducção das outras tanto quanto o permittirem as necessidades do mesmo serviço. Procuraremos tambem augmentar a receita, na convicção em que estamos de que o paiz, vendo que seguimos fielmente o systema da mais rigorosa economia ha de ajudar-nos a saír do estado anomalo em que infelizmente temos estado ha muito tempo, por circumstancias que são conhecidas de todos.

Felizmente a situação da fazenda tem melhorado, graças aos esforços de todas as administrações e das camaras que as tem acompanhado.

Temos visto com satisfação que os nossos fundos tem subido. As condições, com que temos feito diversas operações de thesouraria, têem melhorado consideravelmente, em

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relação aos juros elevados por que eram feitas essas operações, e o sr. ministro da fazenda mais desenvolvidamente o demonstrará á camara.

Hoje os encargos da divida fluctuante externa, não excedem, termo medio, a 10 por cento; e os da divida fluctuante interna a 8 por cento. E temos tambem a esperança de que estes mesmos encargos hão de ir diminuindo gradualmente até chegarem ao estado normal.

O orçamento das nossas provincias ultramarinas, que o sr. ministro da marinha ha de apresentar á camara, manifesta que não só não ha já deficit entre a receita e despeza d'aquellas possessões, mas que ha algum excedente que póde ajudar-nos a adoptar algumas providencias, que concorram efficazmente para que se possa dar o devido desenvolvimento á prosperidade d'aquellas importantes possessões, de que, na minha opinião, depende ainda o futuro d'este paiz (apoiados).

Mas nós não nos occupâmos só da questão de fazenda, a respeito da qual o sr. ministro da fazenda ha de n'esta sessão apresentar algumas propostas tendentes a apressar a sua definitiva resolução. Ha outras necessidades a que é preciso prover, e entre ellas avulta o melhoramento da instrucção publica. Para isto vou ter a honra de apresentar á camara duas propostas de lei, que tendem a aperfeiçoar, não só a instrucção primaria, mas a secundaria.

A camara sabe que, quando se tratou dos decretos dictatoriaes publicados pela situação que principiou em 19 de maio, se resolveu que dois decretos importantes que tinham sido publicados por um dos ministros mais illustrados d'aquella situação não fossem comprehendidos na lei que approvava algumas das medidas adoptadas por aquella situação, porque essas medidas não estavam em execução.

Tomei por base, nas reformas que vou apresentar á camara, muitas das disposições d'esses decretos, e já n'essa occasião o governo declarou que o facto de não insistir então na approvação d'elles não o inhibia de os considerar como projectos de lei para lhes fazer as modificações que as circumstancias tornassem necessarias, e apresenta-los como taes ás côrtes.

Espero tambem apresentar brevemente á camara uma proposta que melhore a nossa organisação administrativa, fazendo no codigo administrativo as alterações que a experiencia já tem tornado necessarias.

Conto trazer esta proposta na sessão immediata; e, se a não trouxe hoje, é porque não estava ainda ultimada a sua copia.

Peço á camara que me dispense da leitura do relatorio da primeira d'estas propostas, que diz respeito á instrucção primaria. Limitar-me hei a ler a proposta, que a camara terá a bondade de mandar á respectiva commissão (leu).

N'esta proposta de lei acham-se ainda algumas disposições que se podem considerar como meramente regulamentares; mas eu preferi inseri-las, porque a camara e a commissão de instrucção publica, com cujas luzes espero que este projecto seja muito melhorado, e escusado é dizer que aceitarei de bom grado todas as emendas e additamentos que a illustre commissão de accordo com o governo julgue conveniente inserir aqui; repito, que não eliminei algumas disposições, que têem evidentemente o caracter regulamentar, para que a illustre commissão e a camara possam conhecer melhor o pensamento do governo.

A segunda proposta é a seguinte (leu).

Ambas estas propostas são acompanhadas das necessarias tabellas, que manifestam qual a despeza que se effectuará adoptados estes dois projectos.

Aproveito esta occasião para mandar para a mesa uma proposta, para que alguns srs. deputados possam accumular, querendo, o exercicio das funcções legislativas com as dos seus respectivos empregos.

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Em additamento á proposta apresentada em sessão de 6 de fevereiro ultimo, e em conformidade com o disposto no artigo 3.° do acto addicional á carta constitucional da monarchia, o governo pede á camara dos senhores deputados da nação a necessaria permissão para que possam accumular, querendo, as funcções legislativas com as dos empregos que exercem n'esta capital os srs. deputados:

José da Silva Mendes Leal, bibliothecario mór da bibliotheca nacional de Lisboa.

Francisco Julio Caldas Aulete, professor da escola normal.

Secretaria d'estado dos negocios do reino, em 11 de março de 1871. = Marquez d'Avila e de Bolama.

Foi logo approvada.

Leram-se na mesa e foram enviadas ás commissões respectivas as seguintes propostas de lei:

Proposta de lei

Senhores. — A carta de lei de 2 de setembro de 1869, prohibindo o provimento das cadeiras vagas nos estabelecimentos de instrucção secundaria, até que se decretasse uma reforma completa, impunha, naturalmente, ao governo o dever de propor ao vosso esclarecido exame as bases d'essa reforma geral n'este importantissimo ramo da educação nacional.

A nossa instrucção secundaria, exclusivamente classica até ao restabelecimento do regimen constitucional, tomara desde esta epocha uma nova direcção. As necessidades da situação, as novas condições da nossa organisação politica e interesses inteiramente diversos, que d'ella dimanavam, tornaram indispensavel uma larga transformação em todos os ramos do ensino publico.

Na instrucção secundaria a creação de lyceus nacionaes nas capitães dos districtos administrativos, pelos decretos de 17 de novembro de 1836 e 20 de setembro de 1844, e as subsequentes reformas por que estes estabelecimentos têem passado, alargando á area do seu ensino, e introduzindo n'elle os elementos das sciencias physico-mathematicas e historico-naturaes, das artes graphicas e das suas applicações ao commercio, á industria e á agricultura, realisaram um pensamento eminentemente civilisador e liberal.

Ministrando a todas as carreiras e a todas as profissões a instrucção litteraria, moral e scientifica; preparando os alumnos que se dedicam aos estudos superiores para pro-seguirem nos cursos scientificos, com reconhecido proveito e habilitando a classe, não menos importante, dos que se destinam a outros laboriosos misteres, que aperfeiçoados pela luz da sciencia, são condição essencial de vida e prosperidade das sociedades modernas, os lyceus nacionaes devem constituir de per si um poderosíssimo elemento de educação geral.

Mal podia porém o novo plano de estudos corresponder aos verdadeiros fins da sua instituição no meio do geral atrazo da instrucção elementar, e na completa ausencia de escolas do 2.º grau, onde os alumnos se iniciassem nas primeiras noções dos conhecimentos litterarios e scientificos que a instrucção secundaria, seguindo a ordem natural do desenvolvimento das faculdades intellectuaes, tem por fim aperfeiçoar e completar, apropriando os ao tempo consagrado ao ensino, á idade dos alumnos e aos variados destinos da mocidade escolar, como base essencial de uma solida educação nacional, e não com o fim unico e interesseiro de um simples estudo preparatorio para as diversas carreiras e profissões na vida publica.

A preponderancia porém de antigos e inveterados habitos, e a fatal tendencia de que nem sempre são isentos, até os mais eminentes e illustrados espiritos, para considerar a instrucção superior como titulo exclusivo para aspirar aos cargos e ás honras da republica; mal permitte que os estudos secundarios completem a educação do homem e do cidadão, independentemente de qualquer profissão publica, desenvolvendo as forças physicas a par da cultura do espirito, e não instruindo exclusivamente os alumnos nos conhecimentos indispensaveis para os serviços e cargos publicos mais lucrativos.

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Assim, a quasi totalidade da mocidade escolar não frequenta os lyceus senão com a mira de antecipado o tempo e a idade, entrar nos cursos superiores e obter os diplomas academicos que particularmente lisongeiam o amor proprio das familias, e dão aos candidatos a perspectiva de mais prompto adiantamento.

Com estes intuitos a instrucção secundaria é estudada superficialmente; e o ensino particular surge a par do ensino publico, não como salutar incitamento de emulação para aperfeiçoar o ensino; mas, salvas honrosas excepções, como industria que só busca supprir por uma instrucção incompleta, quasi material e por isso mesmo esteril, os solidos e bons estudos que, exercitando a reflexão e o raciocinio, constituem a verdadeira cultura do espirito.

Estes inconvenientes sobem de ponto quando muitos professores publicos, fazendo tambem parte dos jurys de exames nos lyceus nacionaes, se empregam ao mesmo tempo no ensino particular. É por isso que a população escolar escasseia em muitos lyceus; que a maior parte dos alumnos frequentam as aulas publicas na classe de voluntarios; que são rarissimos os que levam a cabo o curso completo e que os exames dos alumnos estranhos excedem muito o dos matriculados, particularmente nos lyceus das cidades sédes de faculdades, ou cursos da instrucção superior. De modo que se pelo crescido numero de alumnos que concorrem a exame perante os lyceus nacionaes de 1.ª classe e pelos resultados favoraveis d'estes exames, se avaliasse do estado dos nossos estudos secundarios, o quadro seria por extremo lisongeiro; mas estes mesmos factos, devidamente apreciados, só revelam o vicio capital d'este errado systema de educação publica, e a inevitavel decadencia de estudos que, reduzidos a um simples ensino preparatorio, não podem concorrer para a cultura moral e intellectual do paiz, nem levar o germen fecundo da civilisação, da morigeração e da verdadeira liberdade a todo o corpo social.

Para que a instrucção secundaria corresponda cabalmente a tão elevado fim, é portanto indispensavel tornar util e real o seu ensino, organisando-o sob as largas e solidas bases da verdadeira educação, pela cultura geral e harmonica de todas as faculdades humanas.

A par da instrucção litteraria deve ministrar-se o ensino profissional; as sciencias e as suas applicações têem logar proprio n'esta classe de estudos, e os lyceus nacionaes devem ser o centro d'essa educação geral tão proveitosa aos individuos, como á sociedade.

Os estudos litterarios completam-se com a instrucção scientifica, e esta, sem aquelles, seria sempre deficiente; mas, para satisfazer a este duplicado fim, sem tornar demasiado oneroso o encargo da sustentação dos estabelecimentos destinadas ao ensino secundario assim organisado, cumpre limitar o numero de lyceus ao absolutamente indispensavel, creando nas povoações maia importantes, fóra da sede d'estes estabelecimentos, cursos onde, segundo os peculiares interesses da população, se professem algumas das disciplinas que entram no plano geral dos lyceus, e supprimindo, em compensação, as cadeiras de instrucção secundaria dispersas por algumas terras do reino, e que sendo, pela maior parte, destinadas ao ensino da lingua latina, tem hoje escassa frequencia, e essa mesma longe de toda a fiscalisação, de modo que nem do aproveitamento dos alumnos se póde colher informação segura.

A lei, porém, não podia fixar, sem inconveniente, o logar de cada um d'esses estabelecimentos a cuja creação se deve proceder successivamente, porque são muitas e diversas as condições a que é necessario attender e que por sua natureza são variaveis.

Organisado o ensino secundario n'estes termos, o serviço da inspecção escolar, a habilitação dos professores para o magisterio e o bom regimen, direcção e aperfeiçoamento d'este ramo da instrucção nacional, tornava necessario estabelecer circumscripções academicas, que fossem outros tantos centros de toda a administração litteraria e scientifica dos estabelecimentos publicos e livres, comprehendidos nos limites assignados a estas circumscripções, segundo as conveniencias do serviço publico.

O numero das circumscripções, e a séde d'ellas, estava natural e economicamente indicada em Lisboa, Porto e Coimbra, por serem tambem centros de instrucção especial e superior.

Os ordenados dos professores de instrucção secundaria são mui diminutos, e o governo desejaria augmenta-los proporcionalmente á importancia dos serviços que esta classe presta; as circumstancias, porém, do paiz reclamam a maxima parcimonia nas despesas publicas, e por isso o governo limita-se a propor um pequeno augmento n'estes vencimentos; e estabelece ao mesmo tempo que os professores possam reger dois cursos por dia mediante as correspondentes gratificações por este serviço, tornando-se assim tambem mais completo o ensino sem augmentar os quadros do pessoal docente, o que é uma verdadeira economia.

A ampla liberdade de ensino que a nossa legislação auctorisa, permitte que o ensino particular estabeleça uma larga concorrencia com as escolas mantidas pelo estado, attrahindo ali muitos professores publicos pelas vantagens que lhes offerece aquelle serviço accumulado com o das suas cadeiras nos lyceus nacionaes.

Os poderes publicos tinham direito de prohibir aos professores subsidiados pelo estado o exercicio do ensino particular pelos graves inconvenientes e abusos que d'ahi provém; mas parece que melhorando as condições dos professores publicos, e inhibindo os que exercerem cumulativamente o ensino particular de fazerem parte dos jurys dos exames nos proprios lyceus a que pertencem, a fim de serem commissionados para igual serviço n'outras localidades, se conseguirá sem detrimento do ensino particular, elevar o nivel dos estudos nos lyceus nacionaes, e assegurar a completa independencia e imparcialidade nos jurys dos exames.

A boa escolha d'estes jurys e a vigilancia que n'elles exerce o estado, pelos seus delegados, tornando rigorosas as provas e seguro o julgamento dos candidatos, póde dispensar os que se destinarem ás escolas superiores de repetir perante ellas os exames em que tiverem obtido approvação n'esses jurys, segundo os programmas para este fim approvados pelos conselhos d'essas escolas.

Esta providencia fortalece a auctoridade moral e litteraria dos lyceus nacionaes; toma mais numerosa a sua frequencia; e ao mesmo tempo isenta as faculdades e escolas superiores de um oneroso encargo que as distraia de outras funcções mais importantes, e poupa aos alumnos avultadas despezas e penosos sacrificios.

As condições da instrucção secundaria, e o seu fim, são mui diversos dos da instrucção primaria, para que o seu ensino seja inteiramente gratuito. Os alumnos não podem ser dispensados das propinas de matricula. A legislação vigente impõe-lhes esta obrigação, mas a taxa de 960 réis pela abertura e de outra igual quantia pelo encerramento das matriculas, não está em harmonia com a largueza e importancia dos estudos que se professam nos lyceus e com os encargos d'este ensino, e é extremamente diminuta e quasi mesquinha comparada com as despezas do ensino particular; pareceu, por isso, justo elevar as propinas de matriculas nas escolas publicas de instrucção secundaria, e destinar o producto para as despezas d'estes estabelecimentos a cargo das juntas geraes de districto.

N'este ponto o governo não hesita em adoptar o systema prescripto na legislação de quasi todas as nações cultas, interessando directamente os districtos e as diversas povoações na sustentação, e por consequencia na fiscalisação do ensino secundario, e no engrandecimento dos cursos e escolas onde elle for professado. A iniciativa local auxiliada pelo estado ha de operar uma notavel e proveitosa transformação na vida litteraria, no gosto pelas boas letras e pelas mais uteis applicações das sciencias; na importancia dos estudos e no aperfeiçoamento do ensino nos estabelecimentos

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de instrucção secundaria que, sem perderem o caracter de institutos de educação geral, devem adquirir a feição característica das localidades para promover a diffusão dos mais uteis conhecimentos nos diversos ramos da industria agricola, fabril e commercial, que constituem as principaes fontes da sua riqueza.

É tambem, seguindo estes principios, que aos districtos, em cujas capitaes só existirem cursos de instrucção secundaria, se permitte transforma-los em lyceus nacionaes, correndo elles com o augmento da despeza correspondente.

A inspecção da instrucção secundaria é commettida, em cada circumscripção academica, aos respectivos reitores, e sob sua direcção aos dos lyceus nacionaes comprehendidos nos limites das mesmas circumscripções academicas; a estas funcções os reitores d'estes lyceus podem, quando as conveniencias do serviço o exigirem, reunir as de inspectores de instrucção primaria; e é por isso indispensavel tornar aquelles cargos incompativeis emquanto durar o seu exercicio com as funcções e vencimentos do magisterio para os que forem professores effectivos, porque o bom desempenho das obrigações da inspecção escolar, e o proprio serviço do lyceu exigem constante e infatigavel vigilancia, que não se compadece com o cumprimento de outros serviços publicos.

Os secretarios das circumscripções academicas, e mesmo os dos outros lyceus, não podem accumular tambem o exercicio d'estes cargos com o do magisterio. A experiencia tem largamente provado os inconvenientes para a regular escripturação e expediente dos lyceus, de tal accumulação nos de 1.ª classe, onde maior era a frequencia dos alumnos, e juntando a este serviço o do expediente das secretarias dos reitores, como inspectores de instrucção secundaria e primaria, é evidente que o logar de secretario de lyceu nacional deve ser incompativel com o exercicio effectivo do magisterio.

A organisação completa do ensino secundario só póde realisar-se successivamente, porque está subordinada ás condições e ás conveniencias da instrucção nacional, e aos interesses litterarios e economicos das diversas localidades, onde este ensino tem de ser professado, com maior ou menor largueza nos seus differentes ramos, e portanto fôra inconveniente fixar desde já os quadros das cadeiras e do pessoal dos estabelecimentos publicos que lhe são destinados e que, ou por demasiado avultados prejudicariam inutilmente os intuitos economicos d'esta reforma, ou por extremamente reduzidos, serviriam de estorvo a qualquer aperfeiçoamento importante que o progresso dos estudos reclamasse. O preceito de que o mesmo professor deve, sempre que for compativel, reger dois cursos em cada dia lectivo, circumscreve, desde logo, aquelles quadros a um numero pouco crescido.

Os lyceus nacionaes e as cadeiras existentes fóra d'elles, ainda se compõem de 249 professores, apesar das reducções feitas n'estes quadros pelos decretos de 14 e 18 de dezembro de 1869, e a despeza com este pessoal effectivo e com o material dos estabelecimentos é de 88:080$625 réis.

Pela presente proposta de lei são supprimidos 15 logares de substitutos nos lyceus de 1.ª classe e 93 de professores de instrucção secundaria fóra dos lyceus, o que eleva a 108 os logares cuja suppressão é decretada. O pessoal dos lyceus nacionaes e dos cursos de instrucção secundaria que houverem de organisar-se, em virtude d'esta lei, não excederá a 180 professores, e por consequencia ainda o numero d'estes será inferior, em relação ao quadro actual, em 69.

Metade da despeza com este pessoal e a totalidade da que respeita á inspecção do ensino secundario, e a acquisição de livros, machinas e collecções scientificas para os lyceus, póde elevar-se, pelo maximo, a 63:000$000 réis, suppondo que nos lyceus das tres circumscripções academicas; haverá 12 professores, 8 nos outros lyceus e 4 nos cursos de instrucção secundaria, e que metade d'estes professores hajam de fazer duas leituras por dia, o que dá por semana dezoito cursos nos lyceus das circumscripções academicas, doze nos mais lyceus e seis nos estabelecimentos de instrucção secundaria; alem de que ha disciplinas que sem inconveniente podem ser lidas em cursos biennaes.

Por este modo o ensino será mais completo, os professores a quem elle for confiado melhor remunerados, e o estado economisará ainda 25:080$625 réis.

Outras providencias contidas n'esta proposta de lei completam, na parte que dependia de sancção legislativa, as alterações que são desde muito reclamadas pelos conselhos dos lyceus e pelas corporações a quem tem estado confiada a superior inspecção do ensino publico.

A codificação da legislação vigente em que se acham consignadas importantes providencias, e os regulamentos que devem desenvolver o pensamento d'esta reforma nas suas diversas bases aperfeiçoadas pela sabedoria da representação nacional, devem poderosa e efficazmente concorrer para o progresso da instrucção secundaria, apropriando a ás condições da nossa organisação politica e ás necessidades economicas do nosso paiz, e tornando-a elemento fecundo da verdadeira educação liberal.

Tenho, por isso, a honra de submetter ao vosso esclarecido exame a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° O ensino secundario tem por fim a instrucção geral litteraria e scientifica, e a profissional; e comprehende as seguintes disciplinas:

Lingua portugueza;

Lingua latina;

Lingua grega;

Lingua franceza;

Lingua ingleza;

Lingua allemã;

Eloquencia e litteratura;

Philosophia racional e moral e principios de direito natural;

Desenho linear;

Mathematica elementar;

Cosmographia e geographia;

Chronologia e historia;

Principios de physica e chimica e introducção á historia natural;

Agricultura e economia rural;

Chimica applicada ás artes;

Principios de geometria descriptiva e de mechanica industrial;

Desenho de machinas;

Elementos de economia politica e de administração publica;

Escripturação e noções de direito natural;

Historia e geographia commercial e industrial;

Musica;

Gymnastica;

Calligraphia.

§ 1.° Este ensino é professado nos lyceus nacionaes, e, fóra d'estes estabelecimentos, em cursos de instrucção secundaria.

§ 2.° O governo póde organisar no continente do reino e ilhas adjacentes até doze lyceus nacionaes, e vinte cursos de instrucção secundaria.

§ 3.º Nas capitaes dos districtos administrativos, que não forem séde de lyceu nacional, haverá sempre um curso de instrucção secundaria.

§ 4.º As disciplinas que devem ler-se em cada um d'estes estabelecimentos são determinadas pelo governo segundo as especiaes condições e necessidades locaes.

§ 5.º Nos districtos onde só for estabelecido um curso de instrucção secundaria, póde este ser elevado á categoria de lyceu nacional para todos os effeitos legaes, quando as juntas geraes dos districtos se obrigarem a concorrer com todo o augmento de despeza correspondente.

Art. 2.° Para administração e inspecção da instrucção secundaria ha tres circumscripções academicas, cujas sedes são Lisboa, Coimbra e Porto.

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§ 1.° Em cada circumscripção academica ha um reitor, que exerce tambem funcções de inspecção geral primaria e secundaria, e um secretario, nomeados pelo governo.

§ 2.° Em todos os outros lyceus nacionaes os reitores e secretarios são tambem nomeados pelo governo; os reitores exercem funcções de inspecção nos districtos administrativos que lhes forem designados.

Art. 3.º Ha uma só classe de professores, e são nomeados pelo governo em concurso de provas publicas dadas perante o reitor da circumscripção academica a que pertencer a cadeira vaga.

§ 1.° Os professores vitalicios têem direito a ser transferidos, antes de aberto concurso, para as cadeiras vagas na mesma circumscripção academica, e cujas disciplinas tenham professado.

§ 2.° A transferencia requerida para cadeiras fóra da propria circumscripção só póde ser concedida aos professores de relevante merito litterario devidamente comprovado.

§ 3.° Os professores de instrucção secundaria podem ser transferidos por conveniencia do serviço de um para outro lyceu, ouvido o interessado, e precedendo proposta motivada do reitor e do conselho do lyceu da capital da circumscripção academica, e parecer affirmativo da junta consultiva de instrucção publica.

§ 4.º O numero de professores em cada lyceu nacional, e nos cursos de instrucção secundaria, é fixado pelo governo, devendo em regra cada professor reger annualmente duas cadeiras ou dois cursos.

§ 5.° Os professores publicos que exercerem cumulativamente o ensino particular, não podem fazer parte dos jurys dos exames finaes nos lyceus a que pertencem, e são obrigados a concorrer a expensas suas aos jurys de outros lyceus para que forem designados pelo governo.

§ 6.º Os vencimentos dos professores e mais funccionarios de instrucção secundaria constam da tabella que faz parte d'esta lei.

§ 7.° Os vencimentos de jubilação e aposentação dos professores d'esta classe são pagos pelo estado nos termos da legislação vigente.

§ 8.º As infracções e delictos commettidos pelos professores de instrucção secundaria no exercicio das suas funcções são julgados nos termos do decreto de 20 de setembro de 1844 e da presente lei.

A demissão porém só póde ser decretada depois de sentença passada em julgado nos casos previstos no titulo 3.°, capitulo 13.° do codigo penal.

Art. 4.° Ha uma só classe de alumnos nos lyceus nacionaes.

§ 1.° Cada alumno paga, pela abertura da matricula nos lyceus nacionaes em todas as disciplinas que constituem um anno do curso, uma só propina de 2$500 réis, e outra igual quantia no acto do encerramento da matricula no fim do anno lectivo.

§ 2.° São isentos do pagamento das propinas de matricula os alumnos subsidiados dos seminarios diocesanos.

§ 3.° As propinas de matricula em cada um dos annos dos cursos de instrucção secundaria, fóra dos lyceus nacionaes, são metade das que ficam estabelecidas no § 1.° d'este artigo.

§ 4.° A propina de matricula para os secretarios de lyceus nacionaes, por cada anno do curso, é de 100 réis no acto da abertura, e outra igual quantia pelo encerramento no fim do anno lectivo, seja qual for o numero de cadeiras que os alumnos frequentem, e por cada certidão pagam os alumnos 120 réis.

§ 5.° As despezas do expediente das secretarias dos lyceus nacionaes são pagas pelo cofre dos emolumentos estabelecidos no § antecedente.

§ 6.° Os exames finaes têem logar nos mezes de julho e agosto, perante jurys nomeados annualmente pelo governo.

§ 7.º Os alumnos que não frequentam os cursos publicos são admittidos aos exames perante estes jurys, e pagam as propinas de matricula estabelecidas nos §§ 1.° e 4.° d'este artigo.

§ 8.° A approvação perante os jurys nomeados pelo governo para os exames dos lyceus nacionaes nas disciplinas exigidas para admissão aos cursos de instrucção superior e especial dispensa do exame de habilitação perante estes estabelecimentos.

Art. 5.° O governo designa os serviços publicos, para que é habilitação necessaria, ou motivo de preferencia, a approvação nas disciplinas que compõem o quadro dos lyceus nacionaes, e dos cursos de instrucção secundaria ou das suas diversas secções.

Art. 6.° Os districtos administrativos, sedes de lyceus nacionaes, concorrem obrigatoriamente com metade das despezas do pessoal d'estes estabelecimentos; e a outra metade é paga pelo estado, que tambem tem a seu cargo a acquisição de livros e collecções scientificas para o ensino.

§ 1.° Os vencimentos dos reitores e secretarios das circumscripções academicas e dos lyceus nacionaes são incluidos integralmente no orçamento do estado.

§ 2.° Os edificios, mobilia, e todas as mais despezas de conservação material dos lyceus nacionaes, são encargo obrigatorio das camaras municipaes das cidades ou villas onde estes estabelecimentos existirem.

§ 3.° O governo póde para este fim ceder ás camaras municipaes os edificios nacionaes que tiver disponiveis.

Art. 7.° São applicaveis aos cursos de instrucção secundaria fóra dos lyceus as disposições do artigo antecedente e seus §§, quando esses cursos forem collocados nas capitães de districto onde não existir lyceu nacional.

§ 1.º Nos outros centros mais importantes de população, não sendo capitães de districto, em que se estabelecerem aquelles cursos, ás camaras municipaes compete obrigatoriamente concorrer com metade das despezas do pessoal, e com todas as do material nos termos do artigo 6.° e dos §§ 2.° e 3.°

§ 2.° Metade das despezas do pessoal, e a acquisição de livros e collecções scientificas para o ensino n'estes cursos são encargo para o estado.

§ 3.º Pertence ás juntas geraes de districto, para ser applicado ás despezas obrigatorias do ensino secundario, o producto das propinas de matricula, e dos diplomas dos lyceus nacionaes e dos cursos de instrucção secundaria estabelecidos nas capitães dos respectivos districtos.

§ 4.° A mesma disposição é applicada, quanto ás propinas de matricula, ás camaras municipaes, fóra das capitães dos districtos administrativos, dos concelhos onde existirem cursos de instrucção secundaria.

Art. 8.° São extinctas as cadeiras de instrucção secundaria fóra dos lyceus, e existentes á data da publicação d'esta lei.

Art. 9.º São objecto de disposições regulamentares as habilitações para o magisterio e para as matriculas; a escolha e adopção de livros de texto para as lições; a fórma dos exames; a inspecção dos estudos; a distribuição e organisação dos cursos e disciplinas; a policia escolar, e o regimen economico, litterario, scientifico e disciplinar, e os deveres e obrigações de todos os funccionarios nos estabelecimentos publicos de instrucção secundaria.

Art. 10.° O governo é auctorisado para codificar, em harmonia com a presente lei, a legislação por que actualmente se rege a instrucção secundaria.

DISPOSIÇÕES TRANSITORIAS

Art. 11.° Os professores e empregados nos lyceus nacionaes e nas cadeiras fóra dos lyceus, ao tempo da publicação d'esta lei, continuam a ser abonados dos seus actuaes vencimentos pelo estado até ao fim do corrente anno.

§ 1.° Os actuaes professores, ou sejam proprietarios ou substitutos, que ficarem fóra do quadro legal do ensino secundario organisado na conformidade d'esta lei, são addidos aos estabelecimentos de instrucção secundaria, e sendo vitalicios são promovidos sem novo concurso ás cadeiras que vagarem.

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§ 2.° O governo póde dispensar as provas publicas do concurso aos actuaes professores provisorios que n'esta qualidade tiverem prestado valiosos serviços ao ensino nos lyceus nacionaes.

Art. 12.º Fica revogada toda a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios do reino, em 11 de março de 1871. = Marquez de Ávila e de Bolama.

Tabella dos vencimentos e gratificações pelo serviço escolar nos estabelecimentos de instrucção secundaria, na conformidade do § 6.º do artigo 3.º d'esta proposta de lei

Reitor de circumscripção academica e inspector geral de instrucção primaria e secundaria — ordenado.......... 600$000

Ajuda de custo, cada dia de serviço em inspecção a 5 kilometros fóra da sede da circumscripção academica...... 1$200

Secretario da circumscripção academica e do lyceu nacional - ordenado....................................400$000

Reitor do lyceu nacional, fóra das sedes das circumscripções academicas — ordenado............................. 400$000

Secretario do lyceu nacional — ordenado................ 200$000

Professores:

Nos lyceus nacionaes das circumscripções academicas — ordenado........................................ 500$000

Nos outros lyceus nacionaes......................... 400$000

Fóra dos lyceus................................... 300$000

Porteiros:

Nos lyceus das circumscripções academicas — ordenado... 200$000

Nos outros lyceus nacionaes.........................150$000

Continuos:

Nos lyceus das circumscripções academicas — ordenado... 180$000

Nos outros lyceus nacionaes.........................120$000

Secretaria d'estado dos negocios do reino, em 11 de março de 1871. = Marquez d'Avila e de Bolama.

Annexo á proposta de lei sobre a instrucção secundaria

Lyceus de circumscripção academica a 12 professores em cada um, ou 36 professores a 500$000 réis... 18:000$000

Metade do vencimento........... 11:000$000

Gratificações a 6 professores em cada um dos 3 lyceus, ou 18 gratificações

a 250$000 réis......... 4:500$000

Metade d'estas gratificações....................... 2:250$000

9 Lyceus a 1 professores cada um, ou 63 professores a 400$000 réis........... 25:200$200

Metade do vencimento........... 12:600$000

Gratificações a 4 professores em cada lyceu, ou 36 professores a 200$000 réis... 7:200$000

Metade d'estas gratificações....................... 3:600$000

20 Cursos de instrucção secundaria a 4 professores cada um, ou 80 professores a

800$000 réis........... 24:000$000

Metade do vencimento........... 12:000$000

2 Gratificações em cada curso de instrucção secundaria, ou 40 gratificações a

150$000 réis........... 3:000$000

Metade das gratificações......... 42:450$000

3 Reitores de circumscripção academica, a 600$000 réis........... 1:800$000

3 Secretarios de circumscripção academica, a réis 400$000......................... 1:200$000

9 Reitores de lyceus nacionaes fóra da sede das circumscripções academicas,

a 400$000 réis.................... 3:600$000

3 Porteiros nos 3 lyceus das circumscripções academicas, a 200$000 réis..... 600$000

9 Ditos nos outros lyceus, a 150$000 réis........... 1:350$000 1:950$000

3 Continuos nos lyceus das circumscripções academicas, a 180$000 réis..... 540$000

9 Ditos nos outros lyceus, a 120$000 réis.......... 1:080$000 1:620$000 10:170$000

Despezas de inspecção, acquisição da collecções scientificas, bibliothecas, expediente, gratificações dos jurys de exames no fim do anno lectivo, e substituições extraordinarias de cadeiras........... 10:380$000

63:000$000

Despeza actual................................ 88:080$625

Differença para menos................. 25:080$625

Secretaria d'estado dos negocios do reino, em 11 de março de 1871. = Marquez d'Avila e de Bolama.

Proposta de lei

Senhores. — A organisação das escolas primarias é tão necessaria para a educação como para a instrucção popular. D'essa organisação bem regulada, do zêlo e dedicação de uma esclarecida vigilancia, e da provada competencia dos que dirigem o ensino, depende todo o aproveitamento dos alumnos, o progresso moral do paiz e o seu desenvolvimento intellectual.

Diffundir a instrucção primaria, e torna-la tão completa quanto for possivel, é o primeiro e mais solido fundamento da educação nacional. Por isso os diversos governos, depois da reforma de 1844, se têem geralmente empenhado em melhorar este importantissimo ramo da publica administração.

Nenhuma porém d'essas reformas póde até hoje levar-se a cabo, no meio das difficuldades da nossa situação economica, aggravadas pelo deploravel atrazo da educação popular, devido em grande parte á notavel falta de preceptores que comprehendam bem a verdadeira importancia da sua missão eminentemente civilizadora, e que saibam inspirar o amor da educação e da instrucção da mocidade no seio das familias, pelos beneficos resultados do seu ensino.

Os proprios decretos dictatoriaes de 3 e 16 de agosto do anno proximo passado, contendo excellentes preceitos para a completa organisação do ensino primario, não chegaram a ter execução e não foram por isso comprehendidos na carta de lei de 27 do dezembro do anno proximo passado.

Antes da publicação d'estes decretos, já a junta consultiva de instrucção publica tinha por ordem do governo submettido ao seu exame um projecto contendo as principaes bases d'essa reforma, que foram ampla e luminosamente desenvolvidas n'aquelles decretos.

O governo annuindo a que a mesma reforma não fosse incluida nas providencias confirmadas pela referida lei, não abdicou por isso o direito e o dever de a submetter ao exame do corpo legislativo com as alterações que um detido exame lhe indicasse como indispensaveis para completar ou aperfeiçoar algumas das suas disposições; e até não teria duvida em renovar perante esta camara quasi integralmente a iniciativa dos citados decretos de 3 e 16 de agosto do anno findo, se a sua extensão, e a especialidade de disposições de caracter regulamentar, que ali se encontram, não difficultassem a discussão, mormente estando adiantada a epocha dos trabalhos parlamentares, e tendo as côrtes de occupar-se de gravissimos assumptos da fazenda publica.

Por isso o governo, adoptando os principios fundamentaes d'aquelles decretos na maxima parte das suas disposições, consignou nas bases que formam a presente proposta de lei os pontos essenciaes em que assenta todo o edificio da educação popular.

Duas são as causas capitaes do lastimoso atrazo em que jaz a instrucção popular entre nós: a carencia de professores devidamente habilitados, e a quasi completa ausencia de toda a inspecção escolar.

Sem escolas normaes, e sem uma constante e illustrada fiscalisação, por meio de auctoridades e corporações especiaes, infructuosos serão todos os esforços com que se procure elevar o nivel da instrucção primaria, e lançar no paiz o germen fecundo da civilisação e da liberdade por meio da educação popular, que é a missão da escola primaria.

Do professor depende todo o aproveitamento do ensino. As melhores condições de casa e mobilia escolar não bastam para constituir boas escolas, se o professor pela sua mori-

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geração, pela sua competencia, e pela zelosa consciencia do cumprimento dos seus deveres, não souber tornar-se digno das modestas mas importantissimas funcções que lhe são confiadas.

Para conseguir este intento é indispensavel habilitar os futuros preceptores, doutrinando-os não só nos conhecimentos que devem ministrar aos alumnos, mas formando-os na difficil arte de instruir e educar a mocidade pela palavra e pelo exemplo nos mais nobres e generosos sentimentos.

Para este fim as escolas normaes são tão necessarias, como as proprias escolas primarias; mas a instrucção adquirida nas escolas normaes não produziria todos os seus proficuos resultados, se aos alumnos mestres, entrados nas funcções do magisterio, não se proporcionasse occasião de fortificar e aperfeiçoar os seus conhecimentos segundo os progressos do ensino, por meio de conferencias e de bibliothecas escolares.

É emfim necessario melhorar as condições materiaes da vida do professor; remunerar os bons serviços prestados n'esta laboriosa carreira, para afervorar o seu zêlo e anima-lo para perseverar no cumprimento dos seus deveres escolares.

A escola normal, porém, deve ser modesta como a carreira para que ella habilita, e accessivel ao maior numero de candidatos nos proprios districtos onde tem de exercer o magisterio, para que outros habitos, outras praticas e outras diversões, não despertem n'elles ambições, que ou os desviem para diversos serviços, ou lhes tornem pesada e quasi fastidiosa a condição de professorado, cuja vida deve ser toda de abnegação de simplicidade e de pura dedicação.

A inspecção é incontestavelmente uma condição essencial para assegurar o zêlo dos professores, manter o rigor da disciplina e dos regulamentos escolares, e promover os melhoramentos que a instrucção popular incessantemente reclama, e por isso toda a despeza com este serviço será sempre proveitosa para o ensino publico. Mas esta inspecção não carece de ser toda exercida por delegados do poder central, e com um caracter inteiramente official, sobre tudo sendo a sustentação do professorado um encargo obrigatorio para os municipios e para as parochias, por isso directamente interessadas em fiscalisar o serviço dos professores, e exigir o exacto cumprimento dos deveres do magisterio áquelles a quem tem de remunerar esse serviço.

A inspecção não necessita de ser tão amiudada como a visitação das escolas; esta, inteiramente local, aconselha, esclarece e promove tudo quanto é a bem do ensino, e evita por uma constante vigilancia os abusos, empregando meios suasorios e de benevolencia; a inspecção tem deveres mais imperiosos, uma acção mais decisiva, e por isso não poderia tornar-se demasiado frequente, sem inconveniente para o proprio decoro do magisterio.

Assim parece na actualidade bastante, que em cada districto administrativo, attenta tambem a sua pequena area, haja um inspector de instrucção primaria, que, não devendo accumular outras funcções ou profissão, se dedique exclusivamente a este serviço, podendo unicamente reunir a inspecção da instrucção secundaria, cujas cadeiras por outra proposta de lei ficam limitadas ás dos lyceus, e a alguns cursos de instrucção secundaria fóra d'estes estabelecimentos.

Commissões locaes devem completar este systema de inspecção, cujo centro são os reitores das tres circumscripções academicas estabelecidas pela referida proposta de lei, e que exercem as funcções de inspectores geraes, e deliberam com os inspectores dos districtos comprehendidos em cada uma d'aquellas circumscripções sobre as necessidades do ensino; adoptando desde logo as providencias que estão dentro da sua alçada, e propondo ao governo as que dependem de resolução superior.

A despeza do pessoal da inspecção e das escolas normaes, pela natureza das suas funcções não póde deixar de entrar nó orçamento do estado; esta despeza porém não será avultada, principalmente organisando sempre que for possivel as escolas normaes para um e outro sexo nos estabelecimentos de beneficencia, onde se ministra instrucção aos alumnos, o que reune á economia do thesouro a vantagem de dar a esses alumnos desfavorecidos da fortuna, e que revelarem especial vocação para o magisterio, uma honesta e proveitosa profissão.

Os vencimentos dos professores de instrucção primaria do 1.º e 2.º grau devem ser encargo municipal e obrigatorio.

É este o direito commum de toda a Europa desde os paizes mais cultos até aos que menos avultam pela sua posição. E nenhuma rasão justifica a excepção mantida n'este ponto na nossa legislação.

A educação elementar que a todos é indispensavel, e que constitue um dever indeclinavel para os paes e tutores, e um direito sacratissimo para os filhos, não póde ser e não é encargo menos rigoroso, nem menos legitimo que o da sustentação dos expostos, e dos partidos dos facultativos, que são pagos pelas camaras municipaes.

Em um futuro mais ou menos proximo, quando for diversa a organisação parochial em relação á sua area e aos seus recursos, poderá competir-lhe este encargo escolar; na actualidade seria impossivel impor-lhe este onus, bastando que ellas forneçam casa e mobilia para a aula, e residencia para o professor.

O estado e o districto auxiliam as juntas de parochia a que faltarem os meios para satisfazer a estas despezas; o estado corre tambem com os encargos provenientes das jubilações e aposentações dos professores que se impossibilitarem para continuar no magisterio.

Os ordenados dos professores são extremamente exiguos, posto que não sejam mais acrescentados n'outras nações, que por seus recursos se nos avantajam; e fôra muito para desejar que as circumstancias do paiz permittissem remunerar condignamente esta benemerita classe; mas contando nós apenas 2:006 escolas, das quaes só 365 do sexo feminino, e carecendo instantemente de eleva-las pelo menos ao triplo, ainda que o vencimento de cada professor não excedesse termo medio a 150$000 réis, teriamos um encargo de mais de 1.000:000$000 réis, que a nossa situação financeira mal comportaria na actualidade.

Por isso o governo se limitou a propor o minimo dos vencimentos que podiam abonar-se aos professores vitalicios, segundo o grau do ensino e as localidades onde for professado.

Os professores de instrucção primaria, ainda que pagos dos seus ordenados pelas municipalidades, não devem perder por isso o caracter de funccionarios publicos, nem deixar de ser nomeados pelo governo para assegurar a necessaria independencia da sua classe, não os deixando sujeitos ás incertezas da administração local, e de caracter transitorio, onde não raro póde preponderar o espirito de encontradas parcialidades, a que o professor deve ser sempre estranho, mas ás quaes a sua mesma isenção torna muitas vezes suspeito, senão odioso.

Na Prussia, onde esta questão fôra largamente debatida em 1848, prevaleceu pela constituição de 1850 o principio aqui consignado.

A instrucção do sexo feminino não podia merecer menos solicitude aos poderes publicos, que a do sexo masculino. Na educação da mãe de familia está o futuro das novas gerações nas suas mais elevadas e grandiosas aspirações; e esta educação deve começar na escola primaria, e completar-se no ensino secundario e profissional, organisado em condições apropriadas.

A proposta de lei que tenho a honra de submetter á vossa illustrada discussão estabelece largamente as bates d'esta reforma, n'este ponto do maior momento para a educação nacional.

O estabelecimento de igual numero de escolas de 1.° grau

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para ambos os sexos, a creação das do 2.° grau, e de escolas normaes para o sexo feminino, transformando em estabelecimentos d'esta categoria os institutos de beneficencia, em que se professa uma educação incompleta, ou menos conforme ás necessidades economicas e sociaes da epocha actual; a igualdade dos vencimentos e vantagens para os professores dos dois sexos; e o ensino elementar tornado obrigatorio para o sexo feminino, são fundamento solido de uma completa transformação n'esta importantissima parte da nossa educação publica.

O ensino obrigatorio para o sexo masculino estava já consignado na legislação patria com as correspondentes penalidades. Este principio, geralmente sanccionado nos codigos de instrucção publica das nações mais cultas, não devia ser excluido das nossas leis; mas o governo confia que o regimen da liberdade e a iniciativa particular mais largamente desenvolvida, a par do ensino ministrado gratuitamente nas escolas publicas, sob a direcção de professores idoneos e sujeitos a uma esclarecida inspecção, tornará de futuro desnecessaria, como n'outros paizes succede, a imposição d'aquelle preceito.

O encargo da sustentação das escolas primarias, que por esta lei passa para as camaras municipaes e juntas de parochia, é em parte compensado com os recursos que para este effeito lhes são concedidos; e se esse encargo assim mesmo as obriga a recorrer ao augmento do imposto municipal, é tambem certo que nos paizes em que mais prospero e florente é o estado da instrucção primaria, existe geralmente estabelecida nas suas leis obrigatoriamente uma retribuição fixa, que os alumnos pagam aos professores, alem da taxa escolar que onera todos os chefes de familia, sem exceptuar os que não têem filhos que frequentem as escolas publicas, ou os que provêem particularmente á educação d'elles.

Para facilitar porém a execução, por parte das municipalidades, do preceito que as obriga ao pagamento dos vencimentos dos professores do 1.º e 2.° grau, é permittido que duas ou mais parochias possam concorrer para a sustentação de uma unica escala de cada sexo; e mesmo, quando as circumstancias o exigirem, que haja uma só escola mixta; assim como que nas freguezias onde existir ou se estabelecer alguma escola livre, esta dispense a creação da correspondente escola publica, comtanto que na escola livre sejam admittidos gratuitamente todos os alumnos pobres.

O estado emfim reserva-se para concorrer com subsidios para as escolas que não poderem só manter-se com os recursos locaes, consignando para este fim, e para auxiliar a construcção de casas e mobilia para as escolas, promover a acquisição de bibliothecas escolares, e outras despezas do ensino primario, a somma que annualmente for approvada pelas côrtes.

O governo desejaria poder applicar a estas mais que justificadas despezas as verbas que no orçamento actual são destinadas á instrucção primaria, na importancia total de 240:224$600 réis; mas a imperiosa necessidade de não aggravar os encargos dos contribuintes pelo augmento do imposto local, sem reducção no orçamento geral do estado, obrigam-no a propor a eliminação de 90:224$600 réis do orçamento da instrucção primaria a contar de 1 de janeiro proximo futuro, em que esta proposta, sendo convertida em lei, deve começar a vigorar quanto ao pagamento dos professores pelas camaras municipaes.

Sem duvida reformas taes impõem a todos graves sacrificios; mas na sua realisação está o futuro da independencia, da liberdade e da prosperidade nacional, para que seja licito recusa-los.

Tenho por isso a honra de propor á vossa superior illustração a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° As escolas de instrucção primaria de um e outro sexo são de dois graus;

Escolas elementares e escolas complementares.

§ 1.° As escolas elementares subdividem-se em urbanas e ruraes.

§ 2.° Os programmas designam as materias que fazem objecto do ensino em cada um d'estes graus, com relação á idade, sexo e ás diversas condições locaes.

§ 3.° Em cada freguezia haverá sempre que for possivel uma escola do 1.º grau para cada sexo.

§ 4.° Quando houver uma só escola esta é mixta, não excedendo dos nove annos a idade dos alumnos de ambos os sexos.

§ 5.° Estas escolas podem ser regidas por uma professora ou por um professor.

§ 6.° Duas ou mais freguezias podem reunir-se para manter uma escola para cada sexo, ou uma escola mixta.

§ 7.° As freguezias onde existirem escolas, ou cursos livres de instrucção primaria, que admittam gratuitamente á sua frequencia os alumnos pobres, podem ser dispensadas de manter escolas publicas do 1.° grau.

§ 8.° São instituidas escolas elementares para a primeira infancia, subsidiadas pelas juntas de parochia e corporações e estabelecimentos de piedade e beneficencia.

§ 9.° E mantida a obrigação da frequencia escolar do 1.° grau da instrucção primaria para os alumnos de ambos os sexos, pelo modo que os regulamentos estatuírem.

Art. 2.° São estabelecidas escolas complementares para o sexo masculino nas capitães dos concelhos, e para o sexo feminino nas capitaes de comarca judicial.

§ 1.° O ensino n'estas escolas é gratuito, sómente para os alumnos cujos paes ou tutores provarem pobreza.

§ 2.° A propina de matricula n'estas escolas, nos termos do § antecedente, é de 1$000 réis no acto da abertura, e de outra igual quantia no encerramento.

§ 3.° Nas capitães de concelho e de comarca judicial, onde existirem escolas ou cursos livres d'este grau, e que ministrarem gratuitamente o ensino aos alumnos a que se refere o § 1.°, póde dispensar-se a creação das correspondentes cadeiras publicas.

§ 4.° A approvação nas desciplinas do 2.° grau substitue o exame de admissão perante os lyceus nacionaes, para a matricula nos cursos de instrucção secundaria e nas escolas normaes; e é habilitação necessaria passados dez annos depois da creação d'estas cadeiras, para todos os empregos de vencimento não inferior a 120$000 réis, em que se não exigirem outros diplomas superiores.

§ 5.° São estabelecidos cursos elementares temporarios do 1.° grau nas povoações ruraes que não forem sede de freguezia; e cursos nocturnos em dias santificados, para instrucção de adultos, nas disciplinas do 1.° e 2.° grau.

Art. 3.° A sustentação do pessoal das escolas elementares e complementares, para um e outro sexo é obrigatoria para as camaras municipaes.

§ 1.º Ás juntas de parochia incumbe obrigatoriamente prover á acquisição de casa para a escola e habitação dos professores, bibliotheca e mobilia escolar.

2.° As juntas geraes de districto consignam nos seus orçamentos annuaes as verbas indispensaveis para auxiliar as juntas de parochia que de per si não poderem satisfazer a todos estes encargos.

3.° O governo propõe ás côrtes annualmente um subsidio para auxiliar o estabelecimento de escolas de instrucção primaria do 1.º e 2.° grau, e a construcção de casas para as escolas do 1.º grau, e acquisição de mobilia escolar.

Art. 4.° São applicados ás despezas obrigatorias das camaras municipaes com as escolas de instrucção primaria nos termos d'esta lei:

I O producto dos baldios municipaes;

II As doações, legados e subsidios de individuos ou corporações;

III Os rendimentos das confrarias, irmandades e estabelecimentos de beneficencia que forem legalmente extinctos.

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§ unico. São applicados ás juntas de parochia para o fim d'este artigo:

I. O producto dos baldios parochiaes;

II. As doações, subsidios e legados, de individuos ou corporações;

III. As sobras dos rendimentos das confrarias, irmandades e estabelecimentos de piedade e beneficencia.

Art. 5.° É o governo auctorisado a crear escolas normaes de 1.° e 2.° grau, para alumnos mestres, preferindo, sempre que for possivel, os estabelecimentos publicos de beneficencia onde se ministre instrucção a alumnos pobres.

§ 1.° A despeza com o pessoal e material d'estas escolas compete ao estado; as pensões e premios dos alumnos são encargo obrigatorio para os districtos administrativos a que elles pertencerem.

§ 2.º É o governo auctorisado para reorganisar a escola normal do sexo feminino, estabelecida pela carta de lei de 9 de julho de 1862, e transformar em escolas normaes e escolas complementares, para o mesmo sexo, os collegios e recolhimentos actualmente existentes, cujas instituições não contrariarem expressamente esta organisação; podendo, para este fim, reunir mais de um d'estes estabelecimentos.

§ 3.° É applicado, para as obras necessarias de construcção e restauração de edificios para estas escolas, o producto da venda dos que pela reunião de dois ou mais institutos, se tornarem desnecessarios para igual fim.

§ 4.° A sustentação das escolas normaes do sexo feminino pertence ao estado quando não forem suficientes os rendimentos proprios e os subsidios do governo estabelecidos para os institutos a que se refere o § 2.° d'este artigo.

§ 5.º É applicado ao estabelecimento e dotação das escolas normaes de um e outro sexo, a ás despezas da inspecção escolar metade do producto da desamortisação dos bens que constituem a dotação ou propriedade dos conventos, nos termos do artigo 11.° da carta de lei de 4 de abril de 1861.

Art. 6.° A inspecção da instrucção primaria, publica e livre, é exercida, em cada districto, por um inspector nomeado pelo governo; por juntas de instrucção primaria, em cada concelho; e por commissões parochiaes em cada freguezia, pelo modo que os regulamentos determinarem.

§ 1.° O logar de inspector de districto é incompativel com o exercicio de outro cargo publico, excepto o de reitor de lyceu nacional fóra da sede de cada uma das circumscripções academicas.

§ 2.° O ordenado dos inspectores de districto é de réis 600$000, alem da ajuda de custo de 1$000 réis por cada dia que andarem inspeccionando as escolas, na distancia de 5 kilometros pelo menos fóra da capital do districto.

§ 3.° Os inspectores de districto, que forem tambem reitores de lyceu nacional, vencem n'este caso, como gratificação metade do ordenado estabelecido no § antecedente, e a competente ajuda de custo.

§ 4.° Um regulamento fixará a parte que compete a todas as auctoridades administrativas no serviço de inspecção escolar.

Art. 7.° As cadeiras de instrucção primaria de ambos os sexos, tanto para o 1.° como para o 2.º grau, são providas pelo governo de entre os candidatos habilitados com o curso das escolas normaes, e na falta d'estes de entre os candidatos approvados em concurso publico.

§ 1.° Os vencimentos dos professores vitalicios, de ambos os sexos, das cadeiras do 1.° grau, não são inferiores a 120$000 réis nas freguesias ruraes; a 150$000 réis nas capitães de concelho, fóra de Lisboa, Porto e Coimbra, onde estes vencimentos não podem ser de menos de réis 200$000.

§ 2.° Os vencimentos dos professores temporarios do 1.° grau continuam a ser os mesmos que se acham estabelecidos pela legislação actual.

§ 3.º Os professores de ensino primario complementar, de um e outro sexo, vencem, o minimo, em Lisboa, Porto e Coimbra 280$000 réis, e nas outras terras do reino réis 180$000.

§ 4.° A casa de escola, e para habilitação dos professores das escolas complementares, de um e outro sexo, e a mobilia escolar é fornecida pelas camaras municipaes.

§ 5.° Os vencimentos dos professores de instrucção primaria, de um e outro sexo, que se aposentarem por incapacidade physica ou moral, são pagos pelo estado.

§ 6.° Os regulamentos determinam: o accesso dos professores de cada grau ao immediato e ás escolas normaes; os premios e distincções honorificas, segundo as suas habilitações e as mais provas de merito distincto no exercicio do magisterio.

Art. 8.º As camaras municipaes que subsidiarem escolas ou collegios de ensino livre, onde se ministre instrucção gratuita aos alumnos pobres, podem ser dispensadas de prover á sustentação de escolas publicas do correspondente grau e sexo, na mesma freguezia.

§ 1.° Só podem obter subsidio das camaras municipaes, para este fim, as escolas ou collegios de ensino livre cujos professores apresentarem diploma de habilitação para o magisterio publico.

§ 2.° Todas as escolas e collegios de ensino livre são sujeitos á inspecção official.

Art. 9.° São extinctos os logares de commissarios dos estudos nos districtos administrativos.

Art. 10.° E o governo auctorisado a codificar a legislação sobre instrucção primaria.

Art. 11.° São objecto de disposições regulamentares as habilitações para o magisterio e para a frequencia escolar os methodos e materias de ensino, os exames, a organisação dos cursos; e o regimen economico, disciplinar, litterario e scientifico do ensino elementar, complementar e normal.

DISPOSIÇÕES TRANSITORIAS

Art. 12.º Os actuaes professores vitalicios de instrucção primaria, de ambos os sexos, continuam a ser abonados pelo thesouro dos ordenados que presentemente lhes competem, e pelas camaras municipaes da gratificação estabelecida pelo artigo 26.º do decreto de 20 de setembro de 1844 até ao fim de dezembro do corrente anno, e d'essa data em diante são lhes pagos pelas mesmas camaras os seus vencimentos nos termos d'esta lei.

§ unico. As mesmas disposições são applicadas aos actuaes professores temporarios.

Art. 13.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Secretaria d'estado doa negocios do reino, em 11 de março de 1871. = Marquez d’Avila e de Bolama.

Despesa com a instrucção primaria por conta do estado, na conformidade da proposta de lei d'esta data

Escolas normaes de um e outro sexo................ 25:000$000

21 Inspectores de instrucção primaria, a 600$000 réis... 12:600$000

Despezas da inspecção............................ 16:000$000

Subsidios ás juntas de parochia para construcção de casas para escolas e acquisição de mobilia.......... 25:000$000

Subsidio para bibliothecas escolares, etc........... 5:000$000

Auxilio ás camaras municipaes para o estabelecimento de escolas..................................... 66:400$000

150:000$000

Despeza actual..........240:224$600

Diferença para menos.... 90:224$600

Secretaria d'estado dos negocios do reino, em 11 de março de 1871. = Marquez d’Avila e de Bolama.

O sr. Pereira de Miranda: — A posição especial em que eu, e mais alguns collegas meus nos encontrâmos n'esta casa, determinaram-nos a prestar a mais séria attenção a um assumpto de subida gravidade e importancia para a capital, que nós temos a honra de representar n'esta casa.

Quero referir-me á questão das subsistencias, e sobretudo á carestia da carne. Tratámos de elaborar um simples projecto de lei ten-

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dente a combater o mal que com tanta força se está sentindo, mostrando assim aos nossos constituintes que não descurâmos dos seus interesses.

Dispenso-me de ler o projecto e o relatorio, por serem documentos bastante longos. Espero que, ao menos, terá elle a vantagem de levantar n'esta camara uma discussão sobre um assumpto tão grave e que a sabedoria do parlamento possa, corrigindo o projecto, adoptar algumas medidas que remedeiem os males que todos nós sentimos.

Eu tinha pedido a palavra unicamente para este objecto; mas depois das declarações que fez o nobre presidente do conselho o sr. marquez d'Avila e de Bolama, que eu ouvi com muita satisfação, de que a politica do gabinete actual era a mesma do gabinete que se apresentou aqui em outubro passado, julgo dever dizer com toda a franqueza que espero que os factos, vindo confirmar estas declarações; darão occasião a que eu possa prestar a este governo o meu apoio, como desejo; apoio que só póde ser modesto, como modestas são as minhas faculdades.

Mando o projecto para a mesa.

O sr. Mariano de Carvalho: — Vou mandar para a mesa dois projectos de lei, mas antes de o fazer cumpre-me declarar á camara que me associo completamente ás idéas apresentadas pelo meu collega, o sr. Pereira de Miranda, a respeito do novo governo.

Creio que a camara ouviu, como eu, com satisfação, as declarações do sr. presidente do conselho, de que o gabinete envidara todos os esforços para equilibrar a receita com a despeza, por meio de acertadas economias e da simplificação dos serviços, assim como pelo augmento da receita publica.

Espero que o governo cumpra as suas promessas, e já hoje deu uma prova d'isso.

O sr. presidente do conselho apresentou ha pouco propostas de lei sobre o ensino primario e secundario, pontos que eu julgo de capital interesse para o progresso intellectual, moral e economico do paiz, e prometteu que em breve apresentará a reforma administrativa, a qual julgo alicerce indispensavel da questão financeira.

Ditas estas palavras, vou mandar para a mesa os meus projectos. Um d'elles versa sobre um ponto em que tocou o sr. presidente do conselho.

Tive occasião de fazer alguns estudos sobre a questão do ensino primario, quando não podia prever que o nobre presidente do conselho traria hoje a esta camara um projecto sobre o mesmo assumpto; parece-me, porém, que a este respeito não póde haver questão politica de especie nenhuma, e que devemos concorrer com todos os esforços para auxiliar o governo na realisação d'esta reforma.

Apesar do sr. presidente do conselho apresentar a sua proposta de lei, mando para a mesa o meu projecto, porque entendo que do encontro das opiniões deve resultar a luz.

Desde já prometto encarar esta questão friamente e na altura em que ella deve ser tratada, tanto quanto as minhas faculdades m'o permittirem.

Ainda que o meu projecto concorda em pontos essenciaes com a proposta do governo, haverá talvez algumas divergencias que facilmente se poderão conciliar.

Se tive a fortuna de acertar, folgo por prestar um serviço ao meu paiz.

O outro projecto, que mando para a mesa, tem por fim crear os meios necessarios para os municipios occorrerem ás despezas que sobre elles vão pesar. Não basta fazer pesar sobre elles os encargos da instrucção primaria, é mister dar-lhes meios, que não têem hoje, para concorrer a essa despeza avultadissima. O contrario seria illusorio.

Tenho concluido.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Visconde de Chancelleiros): — Mando para a mesa a seguinte proposta de lei (leu).

Leu-se na mesa, e foi enviada á respectiva commissão, a seguinte proposta de lei:

Proposta de lei

Senhores. — O regular abastecimento dos mercados de todos os generos, que entram na alimentação publica, é a principal condição do progresso dos povos livres.

Em outros tempos os que exerciam a magistratura da suprema administração publica, quando se elevava o custo das subsistencias, recorriam á taxação dos preços, como unico meio de evitar as carestias.

Era erronea a doutrina que auctorisava estas praticas, e tanto que as crises das subsistencias se manifestavam frequentemente, acompanhadas de todas as suas funestas consequencias.

A diffusão dos conhecimentos das sciencias economicas esclareceu o espirito publico, e só os entendimentos ignaros, ou preoccupados de interesses deshumanos, deixam hoje de saudar os principios da liberdade como bandeira presagiosa do progresso intellectual, moral e material das nações cultas.

Promover o aperfeiçoamento de todos os ramos do trabalho licito e util, e remover todos os impedimentos do livre transito dos generos, é n'isto que se resume a intervenção dos poderes publicos que se mantem dentro da orbita dos bons principios.

Vem a proposito estas observações, quando o governo se dispõe a tomar a iniciativa na apresentação de algumas providencias, tendentes a modificar as difficeis circumstancias da carestia de um dos principaes artigos da alimentação publica.

É incontestavel que o preço das carnes verdes excedeu actualmente os limites ordinarios, impondo sacrificios ás classes consumidoras menos favorecidas da fortuna, que são as mais numerosas na capital do reino.

A carestia das carnes não tem origem em uma só causa: depende de um complexo d'ellas, que seria longo enumerar, sendo a principal sem duvida a carestia dos gados.

Ha já annos que o preço das rezes destinadas ao fornecimento das carnes de consumo sobe progressivamente, beneficiando a industria da sua producção, creação e engorda. Esta elevação de preço significa o incremento da riqueza publica.

Todavia não se póde negar que n'estes ultimos tempos a ascensão dos preços é tão rapida, que denuncia a presença de alguma influencia extraordinaria.

A epocha do anno em que se compram os gados para aproveitamento das pastagens, coincidindo com a mais activa procura dos bois de exportação, explica até certo ponto a subida do preço das rezes.

Mas parece que alem d'estas causas outras actuam na elevação do custo da carne em Lisboa; porque em outros centros de consumo do paiz o nivel dos preços é mais baixo, lançando em conta o excesso das despesas que sobrecarrega o commercio das carnes verdes da capital.

As demasias dos preços attribuem-se ao conluio dos marchantes; mas o governo, qualquer que seja a verdade dos factos, e mesmo sem desconhecer a possibilidade d'esse conluio, não póde saír da orbita assignalada pelos principios das instituições liberaes. O que lhe compete unicamente é remover todos os impedimentos artificiaes, que possam obstar á liberdade e facilidade das transacções e concorrer para o melhoramento das condições da industria da producção, creação e engorda dos gados.

É este o caracter fundamental das providencias que se comprehendem na proposta de lei por que termina este relatorio.

Ha muito tempo que se condemnava o systema do lançamento do imposto do consumo, que tinha por base o peso da carne limpa. Esse systema é substituido pelo lançamento do mesmo imposto sobre o peso da rez viva. Em todos os principaes mercados da Europa, e mesmo entre nós, é a base do peso vivo que está adoptada para a compra das rezes destinadas ao talho. Se esta base é geralmente adoptada como a mais commoda e segura para as transacções

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particulares, seria um contrasenso preferir-lhe outra nas operações do fisco.

Mas não é sómente a facilidade e segurança da pesagem em vivo que recommenda esta operação, outras vantagens ainda d'ella se derivam que reflectem sobre os interesses dos productores, fornecedores e consumidores de carnes verdes.

É sabido que a rez completamente gorda traz para o talho uma quantidade maior de sebo do que a rez magra ou em meia engorda, mas o marchante paga pelo sebo que vem na rez para o talho direito igual ao que paga pela carne.

D'aqui resulta que perdendo tanto mais quanto for a quantidade do sebo, o marchante se abstém de comprar as rezes que estiverem completamente gordas.

Esta facto desharmonisa os interesses dos marchantes, dos productores de gados e dos consumidores.

Levar as rezes a meia engorda custa mais do que completa-la. Ha raças de maior aptidão para a ceva, e outras que dão um rendimento maior em carne limpa, porém como ao marchante não convem rezes gordas, nem lhes aproveita a melhoria das aptidões e raças d'ellas, são obvios os males que d'ahi procedem contra os interesses da industria bovina.

Não é menos prejudicial para os consumidores este estada de cousas, porque os priva do uso das carnes mais saborosas e substanciaes, como são as das rezes gordas e de boa raça cevatriz.

Mas não accusemos os marchantes d'estes males. É a fórma do direito que os origina.

Todo deve mudar com a substituição da fórma do direito, recaindo sobra o peso vivo, na rasto de 50 por cento do peso total da rez. Então a fonte dos interessas dos marchantes, doa productores de gados e consumidores é commum, porque a rez gorda e de boa raça é a que produz mais carne limpa, e quanto maior for a quantidade d'esta alem dos 50 por cento, maior é o interesse do marchante.

Vem aqui a proposito fazer algumas observações ácerca do imposto de consumo, que pela sua elevação é uma das causas da carestia das carnes verdes. Sem contestação o é, mas será esta a occasião opportuna de o reduzir?

Insurgem se todos os economistas contra os direitos de consumo, mormente quando alies são excessivos. Todavia na presença de dois males aconselha a prudencia que se escolha e menor, quando é inevitavel optar entre um d'elles.

O maior de todos os males da nossa economia publica é incontestavelmente o desequilibrio entre a receita e a despeza do estado. O deficit é o mais gravoso e funesto de todos os impostos. É um fogo latente, que sem lançar chama nem fumo, abrasa lentamente o edificio da independencia e da prosperidade nacional.

Vejamos agora quaes são os fundamentos das outras disposições da proposta de lei.

Confirma-se a permissão da entrada, pelas barreiras da cidade, da carne abatida fóra do matadouro de Lisboa. Essa permissão consignada na legislação anterior, tem-se interrompido diversas vezes em nome das conveniencias da saude publica.

Sem entrar na questão da perniciosidade ou innocuidade do consumo das carnes, provenientes das rezes doentes ou de morticinio, o governo entende que se devem respeitar os habitos da população da capital, a quem repugna o uso d'aquellas carnes, e por isso submette a entrada d'ellas á fiscalisação dos regulamentos sanitarios.

Esta fiscalisação torna-se ainda necessaria, porque independentemente de doença ou morticinio, as carnes de rezes extremamente magras são improprias para consumo por lhes faltarem muitos dos principios nutritivos, o que as faz insipidas e indigestas.

Entendeu o governo que a administração municipal podia prestar um valioso auxilio ao melhoramento do consumo das carnes verdes, e n'esta conformidade reforçou as suas attribuições, auctorisando-a para providenciar dentro dos limites que parecem mais eficazes para alcançar tão importante resultado. O gado bravo, não se comprehendendo n'esta denominação os touros, mas sim as vaccas e bois castrados, póde fornecer uma boa parte de carnes verdes para o consumo da cidade, regulando convenientemente o processo da sua matança.

É sabido que o gado manso de modo nenhum vem tão commodamente ao matadouro, como pelo seu proprio pé, quando as distancias não são grandes. Mas tambem é certo que não acontece assim ao gado bravo. Conduzido por seu pé chega sempre ao matadouro cansado e pisado, e é abatido em um estado de ferocidade febril, que produz uma alteração dos humores e das carnes, inconveniente para a alimentação publica.

Tudo isto desapparece uma vez que em local apropriado e proximo dos campos da creação se estabeleçam matadouros, onde o gado bravo se possa abater, sendo depois as carnes transportadas para a cidade.

Dá-se á camara municipal de Lisboa auctorisação para estabelecer os ditos matadouros, com o intuito de evitar complicações de fiscalisação sanitaria, e de não prejudicar os seus interesses da percepção do imposto, com que tem de remir-se dos encargos que lhe resultaram da edificação do matadouro de Lisboa.

Auctorisa-se tambem a camara municipal de Lisboa para estabelecer talhos na cidade, onde os creadores ou negociantes de gados possam mandar decepar e vender as carnes de suas rezes.

Já Se vê que os talhos de que se trata são unicamente casas guarnecidas de todos os utensilios necessarios para o corte e venda das carnes por conta dos donos das rezes.

Esta disposição tem por fim facilitar os meios da concorrencia de carnes ao mercado da capital, supprimindo-se todos os intermedios que no movimento d'esta industria se têem estabelecido entre os productores e consumidores.

Outra providencia auctorisa a camara para estabelecer classes e categorias na carne que se expozer á venda. Ninguem ignora que a rez bovina se divide naturalmente em certo numero de regiões, cujas partes se distinguem pelo seu valor alimentar. Os consumidores interessam muito que as carpes se vendam por categorias, fundadas na alludida distincção. Nivelar o preço da carne que tem maior valor com a que o tem menor é uma confusão prejudicial a todos os consumidores, mormente aos menos abastados, que se alimentam das carnes de inferior qualidade, vendidas pelo preço das de maior valor.

A venda das carnes por categorias encontra-se estabelecida nas principaes cidades da Europa, e seria indesculpavel que n'esta capital, nosso primeiro mercado de carnes verdes, se não adoptasse tão rasoavel e util pratica.

O que se diz ácerca das categorias da carne da mesma rez é applicavel á qualidade das diversas rezes, porque umas produzem carnes mais estimadas do que outras.

É desnecessario memorar os resultados beneficos das exposições e concursos. Ninguem os desconhece, mórmente depois que estes pacificos certames se têem especialisado para as diversas industrias. Nos dois grandes mercados de bois gordos, de Poissy na França, e de Islington, na Inglaterra, todos os annos se abrem concursos com valiosas recompensas aos que mais se distinguem pela apresentação da rezes cevadas. Sigamos pois o exemplo d’estas duas illustradas nações, que assim o fazem todas as outras que não descuram os meios de accelerar a sua marcha pelo caminho do progresso.

A verba de 2:000$000 réis, que se propõe para o estabelecimento do concurso das rezes gordas, é tão insignificante na importancia, como fecunda na sua applicação. Cortar nas despesas superfluas e acrescentar nas productivas é o verdadeiro systema de realisar economias.

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Finalmente não se esqueceu o governo de promover a diminuição das tarifas do caminho ferro com relação ao transporte das carnes verdes, convencionando com a companhia real dos caminhos de ferro portuguezes a referida diminuição.

Movido pelas considerações que ficam expostas, o governo tem a honra de submetter ao vosso esclarecido exame a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.º As rezes bovinas, que entrarem no matadouro publico de Lisboa, e que houverem de se abater para consumo, serão pesadas em vivo; registando-se authenticamente o resultado da pesagem, a idade, raça e procedencia das rezes, bem como o nome do dono a que ellas pertencerem.

Art. 2.º Os direitos da carne bovina, destinada para consumo do concelho de Lisboa, serão contados:

1.° Na rasão de 30 réis de cada kilogramma que pesarem em pé as rezes que houverem de se abater no matadouro da cidade;

2.° Na rasão de 60 réis de cada kilogramma de carne limpa que vier a despacho pelas barreiras.

É por esta fórma alterado o artigo 3.° da pauta, approvado pelo decreto de 23 de junho de 1870, confirmado pela carta de lei de 27 de dezembro do mesmo anno.

Art. 3.° As couramas, miudezas e mais despojos das rezes despachadas em pé, na conformidade do n.º 1.° do artigo antecedente, não ficam sujeitas a direito algum de consumo.

Art. 4.° Continua a permissão da entrada das carnes verdes, pelas barreiras da cidade, que o governo designar, ficando as ditas carnes sujeitas á fiscalisação prescripta nos regulamentos sanitarios que para esse effeito especial se estabelecerem.

§ unico. É do mesmo modo permittida, mas livre de direitos, a entrada das miudezas correspondentes á carne limpa das rezes que se abaterem para abastecimento da cidade, nos matadouros especiaes, pertencentes á camara municipal de Lisboa.

Art. 5.° Fica a camara municipal de Lisboa auctorisada a providenciar ácerca do regular abastecimento das carnes verdes, tendo em vista as seguintes disposições:

1.º Estabelecer matadouros especiaes e filiaes do de Lisboa nos pontos que fóra da cidade julgar mais convenientes para matança dos gados destinados ao consumo da capital;

2.° Abrir talhos ou açougues municipaes, onde os creadores ou negociantes de gados possam mandar decepar as suas rezes e vender a carne, segundo as condições estabelecidas pela camara, e em harmonia com os regulamentes fiscaes e sanitários;

3.° Promover a distribuição das carnes verdes por classes e categorias, de modo que se não vendam pelo mesmo preço as carnes das differentes qualidades de rezes, ou das differentes regiões da mesma rez.

Art. 6.° É auctorisada a despeza, até 2:000$000 réis, para o estabelecimento de concursos e premios, com o fim especial de promover o melhoramento das raças pecuarias destinadas ao talho.

Art. 7.° Fica o governo auctorisado para applicar as disposições d'esta lei, pelo modo que julgar mais conveniente, ás carnes verdes procedentes das rezes lanares e caprinas.

Art. 8.° O governo poderá suspender a cobrança do imposto de transito sobre o preço do transporte de gado vaccum e carnes verdes pelos caminhos de ferro do norte e leste, em presença das reducções que a companhia effectuar nas respectivas tarifas.

Art. 9.° O governo publicará os regulamentos necessarios para a melhor execução d'esta lei.

Art. 10.º Fica revogada a legislação contraria.

Ministerio das obras publicas, commercio e industria, em 11 de março de 1871. = Marquez d'Avila e de Bolama = Carlos Bento da Silva = Visconde de Chancelleiros.

Senhor. — Por portaria de 28 de fevereiro passado mandou Vossa Magestade que fosse consultado o conselho geral do commercio, agricultura e manufacturas, ácerca das providencias que devam ser adoptadas com o intuito de evitar o desequilibrio que parece haver entre o preço dos cereaes em grão e o preço do pão cozido.

Cumprindo as determinações de Vossa Magestade, reuniu-se o conselho no dia 4 do corrente mez, sendo presidido pelo actual ministro e secretario d'estado dos negocios dás obras publicas, commercio e industria, o qual, expondo os motivos da convocação, fez sentir que seria util que a discussão se não circumscrevesse ao exame da questão proposta na mencionada portaria; mas que, pelo contrario, se alargasse abrangendo a questão relativa ás carnes verdes que se consomem na capital, de cuja carestia as classes consumidoras se queixam, por ser este tambem um genero de primeira necessidade para uma boa alimentação publica.

Em vista d'esta indicação o conselho procurou dar a sua mais seria attenção ao exame de ambas as questões, não tendo chegado a uma conclusão definitiva ácerca das medidas que possam racionalmente ser adoptadas para destruir o desequilibrio que, de facto, parece existir entre o preço dos cereaes e o pão cozido.

Parece comtudo ao conselho que no estado actual da nossa legislação, do qual não resulta monopolio algum legal, porque o commercio da padaria é regido pelos principios de liberdade, nenhuma providencia póde ser tomada que não tenha um caracter artificial contrario aos bons principios, e por isso contraproducente.

Discutindo-se porém largamente sobre o alto preço da carne, o conselho entendeu que é do seu dever chamar novamente a attenção do governa de Vossa Magestade para a sua consulta de 23 de março de 1865, publicada no Diario de Lisboa de 28 do mesmo mez e anno.

E porque este assumpto já foi largamente tratado no mencionado documento, desnecessario é dar-lhe agora largo desenvolvimento repetindo o que já está dito.

Muito especialmente pede o conselho ao governo de Vossa Magestade que tome em consideração a resposta dada na epocha indicada ao 5.° quesito, dos que serviram então de base á consulta de 1865.

Entende o conselho que o imposto sobre a carne de gado bovino, que se consome n'esta capital, que hoje é lançado sobre a carne limpa, deve recaír sobre o peso do animal vivo. Este é o systema seguido com vantagem provada, relativamente ao gado suino que se consome na capital em larga escala, e d'elle deve resultar melhor alimentação e mais abundancia de carne, o que no futuro, pelas leis naturaes da offerta e procura, ha de influir no preço da venda d'este importantissimo genero.

Se as actuaes circumstancias do thesouro publico não aconselhassem grande circumspecção na alteração de qualquer imposto, o conselho, attendendo á elevação dos direitos que hoje pesam sobre a carne que se despacha para venda na capital, consultaria, sem duvida, no sentido da redacção de taes direitos, não só em referencia á carne, mas tambem ao vinho e cereaes.

O imposto de consumo sobre estes generos é de facto elevadíssimo, mas o patriotismo do conselho leva-o a reconhecer que hoje a nossa primeira e mais urgente necessidade é equilibrar a receita com a despeza publica.

Se estes pesados direitos se poderem modificar por meio de justas compensações, e por modo que a receita do estado não soffra, grandes vantagens poderá colher o publico.

Limita-se porém o conselho hoje a propor a Vossa Magestade que, desde já, se altere a base do imposto em referencia ao gado bovino, devendo o governo de Vossa Magestade verificar qual deva ser o direito que se deve lançar sobre o peso vivo do animal. Alguns dos vogaes do conselho lembraram tambem du-

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rante a discussão que será conveniente admittir a despacho carne morta fóra do matadouro de Lisboa; mas outros entendem que esta medida não deve ser adoptada sem um circumspecto e maduro exame, da influencia que ella possa ter sobre a hygiene publica.

Tambem parece ao conselho que a camara municipal de Lisboa poderia prestar bom serviço estabelecendo talhos seus, ou para melhor dizer, casas proprias para talhos, com todos os utensilios necessarios para o corte das carnes, onde os lavradores, ou qualquer outra pessoa, que não exerça habitualmente a profissão de marchante, possa vender a carne que tiver despachado.

Tambem lembra facilitar a venda da carne a pregão.

Finalmente o conselho entende que convem adoptar todas as medidas que tendam a approximar o productor do consumidor, como meio natural de dar regularidade aos preços de venda, e de evitar os desequilibrios de que se queixa hoje o publico.

Taes são as considerações que o conselho julga dever submetter á sabedoria de Vossa Magestade.

Deus guarde a preciosa vida de Vossa Magestade por dilatados annos.

Sala do conselho, em 4 de março de 1871. = R. de Moraes Soares = Marquez de Ficalho = Conde de Ficalho = Ayres de Sá Nogueira (com declarações) = Carlos Ferreira dos Santos Silva (com declarações) = Fortunato Chamiço Junior (com a declaração precedente) = Antonio José Pereira Serzedello Junior (com declarações) = Geraldo José Braamcamp = Joaquim José Gonçalves de Matos Correia (vencido em parte tanto no que respeita ás causas que determinaram o preço elevado da carne bovina, como aos meios indicados para se lhes prover de remedio) = Estevão Antonio de Oliveira Junior = José Ferreira Pinto Basto = João Palha de Faria Lacerda,

Voto em separado do ex.mo sr. conselheiro João de Andrade Corvo sobre a consulta de 4 de março de 1871

Não concordo em que na consulta se não proponha a reducção dos direitos sobre as farinhas, ao que era antes da ultima medida tomada a este respeito. Não concordo em que se não admittam as carnes mortas, dadas as convenientes regulamentações. Não concordo em que se trate agora do assumpto da reducção dos direitos, porque póde ter inconvenientes. Não concordo em que se não indique explicitamente a creação de dois mercados para a carne que entre morta, e para a que os lavradores tragam ao mercado, á similhança do mercado de legumes, etc. mediante uma pequena indemnisação á camara. Não concordo em que se não recommende a transformação do systema vicioso seguido no matadouro. Por estas rasões summariamente apontadas não assigno agora a consulta e reservo-me para no fim assignar «vencido» = Corvo.

Voto do ex.mo sr. Carlos Ferreira dos Santos Silva

Verificado, como me pareceu ficar da discussão no conselho, que o elevado preço do pão não provém do alto preço do trigo em grão e sim da carestia da farinha;

Verificado que os aperfeiçoamentos introduzidos na industria da moagem em França permittem que do trigo em grão se tire 75 por cento de farinha;

Verificado portanto que da ultima elevação dos direitos da farinha estrangeira ao dobro dos do trigo em grão resulta uma exagerada protecção á industria da moagem em Portugal, em detrimento dos consumidores do pão;

Entendo que os direitos estabelecidos para a importação da farinha estrangeira devem ser modificados para a baixa como meio de baratear o pão.

Por este motivo assigno a consulta com declarações, e são estas que tenho a fazer. = Carlos Santos = Fortunato Chamiço Junior.

Voto do ex.mo sr. Serzedello Junior

Não concordo com algumas das idéas que se acham consignadas na consulta, taes como a de aconselhar á camara municipal de Lisboa a interferencia activa n'este assumpto, abrindo talho, e a de receiar a alteração para menos dos direitos estabelecidos aos cereaes, farinha e carne bovina, por isso assigno a referida consulta com declarações. = Serzedello Junior.

Está conforme. — Repartição do commercio e industria, 11 de março de 1871. = João Palha de Faria Lacerda.

O sr. Ministro da Fazenda (Carlos Bento): — No uso da palavra que v. ex.ª me concedeu vou ler á camara as seguintes propostas de lei (leu).

Devo começar pela parte mais grata da exposição que tenho a fazer á camara.

Cabe-me n'esta occasião agradecer de novo a benevolencia e cooperação que ambas as camaras deram ao governo com a approvação de algumas medidas da sessão anterior, a fim de se poder equilibrar a receita com a despeza e assentar o nosso credito tanto quanto o alcance d'essas medidas permittam.

O apoio que o governo encontrou em ambas as casas do parlamento para a realisação d'este intuito produziu nos mercados estrangeiros a impressão mais favoravel, porque uma apreciação pouco exacta tem contribuido para fazer acreditar que ha uma reluctancia invencivel para o augmento da contribuição no nosso paiz. Não tem porém acontecido assim, porque os rendimentos publicos têem augmentado.

Este progresso, infelizmente para nós, não tem nascido, como em algumas outras nações, da elasticidade natural do imposto, tem provindo da necessidade indispensavel de augmentar as contribuições existentes.

A missão do ministro da fazenda n'esses paizes a que alludi tem sido muito grata, permittindo diminuir a quota da contribuição na presença do augmento da receita. Improba porém é a tarefa dos que têem de pedir ao augmento do imposto o recurso contra a insufficiencia do rendimento publico.

A condição impreterivel para a exigencia d'estes sacrificios é inquestionavelmente a demonstração pratica de todas as reducções possiveis nas despezas publicas; e qualquer que seja a idéa que formemos a respeito das reducções effectuadas pelas differentes administrações, vê-se que a diminuição da despeza não é tão pouco importante que nos ultimos quatro annos não apresente uma quantia bastante avultada.

A existencia de um facto d'esta ordem deve contribuir para alimentarmos a esperança de alcançar em pouco, com o auxilio de outras medidas, o equilibrio no orçamento.

As continuadas operações financeiras obrigam a fazer despezas com encargos muito graves, e que dão causa a prejudicar tanto os interesses como o bom conceito de um paiz.

As nações, ainda as mais modestas em largueza de territorio, devem sempre tornar se respeitaveis pelas condições da seriedade da sua administração, inspirando assim o credito de que precisam; porque se não podem apresentar condições de administração que a indiquem como um modelo, pelo menos tem necessidade de preparar elementos promettedores de um prospero resultado no futuro.

No estado em que nos encontrâmos, quando são graves as difficuldades financeiras com que lutâmos, não me parece que seja a occasião mais propria para tratarmos de theorias economicas, e creio que em materia de impostos a pretensão de inventar contribuições está muito limitada, como facilmente se conhece pela historia financeira dos diversos paizes.

Parece-me que é permittido, e que é mesmo de rigoroso dever, pelas circumstancias em que nos achâmos, tendo de pedir novos sacrificios ao paiz, tratar de ver com todo o cuidado que os novos impostos lançados sobre um ramo de riqueza publica o não vão affectar exclusivamente, convindo dividir o encargo.

É esta a opinião de um eminente estadista, que hoje preside aos destinos de uma grande nação.

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Diz mr. Thiers, que para o imposto se tornar toleravel é preciso distribui-lo pelas differentes fontes de riqueza publica, tendo em attenção o maior ou menor desenvolvimento d'essa mesma riqueza.

Não nos illudamos com innovações radicaes ácerca de impostos. Aquelles, por exemplo, que nos aconselham o estabelecimento entre nós do imposto de renda, não consideram bem que nos aconselham a adopção de um arbitrio que nos não póde salvar, alem de que entre nós já existe um imposto de renda; e admira-me que não se tenha reconhecido a verdade d'esta asserção, quando um distincto publicista, fallando dos nossos impostos, Mr. Parieu, reconhece que entre elles temos o imposto de renda como ha em outras nações, com outros nomes porém, sendo assim que o imposto industrial, predial e outros correspondem ás divisões inglezas do imposto de renda.

As nossas actuaes circumstancias impõem-nos o dever de ser mui cautelosos no modo de elevar os impostos, de maneira que esta necessidade, aliás indeclinavel, não se imponha alem do que o permittem as forças do paiz.

O rendimento predial offerece-se em primeiro logar á avidez do fisco, e se bem que considerações imperiosas determinam que não se abuse d'este elemento de riqueza, sendo certo que o exemplo de outras nações nos mostra em larga escala o emprego d'esse recurso, é urgente ir pedir á contribuição predial mais algum sacrificio, principalmente quando a diversas outros ramos de producção temos pedido e pedimos o mesmo augmento de imposto.

A proposta de lei, que contém a fixação de contribuição predial do continente, addiciona á somma inicial a somma extraordinaria de 20 por cento, votada desde 1869 para fazer parte do contingente; e, alem d'isso, contém no segundo artigo a seguinte disposição (leu).

Eu não ignoro as allegações da desigualdade em que existe este imposto, nem o governo se desobriga de empregar todos os meios para que esta desigualdade desappareça. Embora a perfeição absoluta seja impossivel de attingir n'este ramo, o governo está na disposição de empregar constantes esforços no intuito de melhorar as condições actuaes.

Brevemente deverá ser publicado um decreto com o fim de regular, tanto quanto possivel, a proporcional distribuição d'este rendimento.

Esse decreto tomará para base do lançamento da contribuição a publicidade e a inspecção directa, obviará a alguns inconvenientes que providencias analogas tenham trazido comsigo, e procurará dar satisfação a todos os interesses, e não suscitar nenhuns pretextos para que deixe de ser levada á execução uma medida que, introduzida, deve importar um melhoramento.

Á contribuição pessoal é tambem pedida a imposição do augmento proveniente da alteração de algumas disposições da lei actual.

Passo a ler a respectiva proposta de lei (leu).

Antes de acompanhar de algumas reflexões a apresentação de outras propostas, parece-me mais conveniente lê-las (leu).

Fazem parte da collecção d'estas propostas duas, que trarei nas sessões immediatas, relativamente aos direitos das alfandegas.

Espero tirar d'ellas um resultado moderado, mas ainda assim com o augmento das verbas propostas deve d'aqui resultar para a receita um augmento, na totalidade, de réis 1.400:000$000 proximamente.

Esta somma não póde extinguir o deficit, mas obriga a que se effectuem reducções, que possam fazer com que o deficit desappareça dentro de praso mui proximo.

Nas condições economicas e financeiras d'este paiz, eu, como ministro da fazenda, não posso deixar de ter as condições inherentes ao desempenho d'estas funcções e de levar as previsões até ao ponto de impertinencia.

Talvez a incompetencia do ministro que exerce estas funcções torne a exigencia difficil de satisfazer, mas eu devo declarar que, se na occasião em que exijo novos sacrificios aos contribuintes, não podesse trazer como auxiliar d'elles, e como desculpa da sua imposição, a possibilidade de effectuar algumas reducções, não podia continuar a fazer parte do actual ministerio, cujo programma se póde resumir na pessoa do sr. presidente do conselho.

O sr. presidente do conselho é um homem que, antes de se inventarem as economias, deu, na minha opinião, demonstrações de que seguiria sempre esse programma, e não havia de o desmentir n'esta occasião em que ha a necessidade imperiosa de impor novos sacrificios ao paiz.

É preciso portanto alliar as reducções com o augmento dos impostos, para assim salvar quanto possivel o interesse dos contribuintes.

Direi mais. Não é só o interesse dos contribuintes que o exige, é tambem o interesse d'aquellas classes que são obrigadas actualmente a deducções importantes, algumas com vencimentos muito insignificantes, e que vêem cortada a sua carreira pela reducção dos quadros das differentes repartições, dando-se já o abandono das funcções publicas por parte de funccionarios muito importantes.

Digo, pois, que não é só o interesse dos contribuintes que o reclama, são tambem as condições em que se acham as classes dos empregados publicos, que na epocha actual estão sujeitas a prejuizos e sacrificios.

Ha ainda a possibilidade de outras reducções. Todos sabem que ha despezas effectuadas em diversos ministerios, que podem soffrer diminuição, sem comprometimento do serviço publico e de interesses legitimos. Por exemplo, a prosperidade crescente de uma parte da monarchia, isto é, as melhores condições financeiras em que se acham algumas provincias do ultramar, ás quaes nós nunca negámos a cooperação que circumstancias difficeis em que ellas se encontraram exigiam da metropole, permittem a realisação de uma economia importante.

Gastámos centos de contos de réis com expedições destinadas tanto á Africa occidental, como á Africa oriental, o que demonstra que a metropole não regateia nunca estas despezas quando circumstancias extraordinarias as determinam. Mas a metropole não póde de maneira nenhuma continuar a fazer sacrificios superiores ás condições do seu estado financeiro, quando aquellas provincias se podem considerar no caso de dispensarem esses sacrificios.

Ha mais alguma cousa. Ha factos que vem em abono d'esta opinião. Ha subsidios importantes, concedidos a companhias que incontestavelmente poderam fazer serviços apreciaveis dentro de um certo praso; mas as condições em que essas companhias os fizeram não são hoje as mesmas, e esses serviços não são agora de uma urgencia tão immediatamente indispensavel, visto que outras companhias, não subsidiadas pelo estado, tendem a estabelecer communicações regulares com as nossas provincias do ultramar, e quando da regularidade de taes communicações ha de provir de certo o estreitamento dos laços que já unem aquellas differentes porções da monarchia entre si e com a metropole.

Entretanto, eu não quero entrar nos dominios das differentes partes em que se divide a administração do estado; e v. ex.ª sabe e a camara não ignora que a resolução dos problemas financeiros que exigem uma decisão prompta, não é o ministro da fazenda só que a faz. Se o ministerio inteiro não for um conselho de finanças, de certo a questão de fazenda não se póde resolver (apoiados).

Direi mais. Se a camara toda o não fizer, se não se constituir em conselho de finanças, a resolução da questão de fazenda não se póde conseguir (apoiados), pela iniciativa, ainda que fosse muito vigorosa e muito intelligente, de um ministro qualquer, que tivesse uma superioridade decidida sobre as modestas qualificações a que posso aspirar.

A minha idéa é que se podem effectuar reducções até á importancia de 500:000$000 réis nos differentes ramos da administração; podendo contar, alem d'isso, com a econo-

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mia resultante de operações de credito que se façam relativamente a despezas, que não podem ter uma acção duradoura da mesma fórma. Fallo, por exemplo, das classes dos reformados e das classes dos veteranos, porque as circumstancias especiaes que deram augmento ás despezas feitas com essas classes não se podem repetir todos os dias, e naturalmente tudo indica que a respeito d'ellas, sem prejuizo dos seus vencimentos actuaes, se effectuem operações analogas ás que tiveram logar a respeito das pensionistas, que não ficaram em condições peiores.

Tambem espero alcançar reducção nos encargos da divida fluctuante. Já foi possivel fazer algumas reducções importantes n'esta divida; todavia a certeza da dotação de meios sufficientes para augmentar a receita, e a votação de reducções na despeza hão de concorrer para que o governo possa diminuir todos os dias os encargos d'essa mesma divida, e diminui-los em tal importancia que consiga uma somma de economia approximadamente a 300:000$000 réis. É modesta a avaliação. E se acaso as condições financeiras continuarem a melhorar, como entendo que é de urgente necessidade, o deficit ficará reduzido á importancia das despezas extraordinarias que se effectuam para obras de natureza mais reproductiva, e que muitas nações não comprehendem como despeza corrente (apoiados), calculando só como encargo o que trazem as operações de levantamento de capitaes para obras d'esta natureza.

Devo tambem declarar que a minha opinião é que limitemos o mais que podermos essas operações de credito. Entendo que quando os encargos provenientes da divida publica attingiram uma somma importante, como a que se vota no nosso orçamento, devemos ser muito reservados em recorrer a novas operações de credito (apoiados). Só uma circumstancia nos póde levar á necessidade de emprehender operações d'esta ordem e emprehende-las a todo o custo — a existencia de uma divida fluctuante externa, que é causa de terem sobrevindo circumstancias em que se tem estado á mercê de individuos, que fazem os adiantamentos com um acompanhamento de circumstancias todas cheias de onus e até de opprobrio para o paiz (apoiados) que se sujeitasse voluntariamente á continuação de similhante mal.

É por isso que o governo se empenha nos meios de reduzir ou substituir essa divida, para fazer cessar situação tão anomala como a que por vezes se tem dado.

Peço licença á camara para não entrar em mais considerações, visto que tenciono dar a este assumpto maior desenvolvimento em relatorio que apresentarei á camara.

Mando para a mesa as propostas, e devo assegurar á camara que em mim não ha o menor amor proprio na sua apresentação; porque estou, pela minha parte, disposto a aceitar todas as modificações que se julgarem conducentes á realisação do mesmo fim. O que se não póde é hesitar um só momento na necessidade que ha da exigir que o governo esteja sufficientemente habilitado para fazer face aos encargos; depois d'isso attendido seria a mais criminosa de todas as vaidades pretender supprimir, na apresentação de um projecto de lavra propria, a acção de qualquer intelligencia ou de qualquer boa vontade.

Vozes: — Muito bem.

Leram-se na mesa as seguintes propostas de lei, sendo logo enviadas ás commissões respectivas.

Proposta de lei

Artigo 1.º A contribuição predial relativa ao anno de 1871 é fixada para os districtos administrativos do continente do reino, na importancia de 1.979:053$200 réis, e será repartida pelos mesmos districtos, na conformidade do mappa junto, que faz parte da presente lei.

Art. 2.° Ao contingente da contribuição predial de cada districto será addicionada a importancia da despeza correspondente ás quotas, gratificações e salarios relativos ao serviço da mesma contribuição.

§ 1.° Esta despeza será fixada em 1 por cento do rendimento collectavel total das matrizes prediaes, distribuida pelos districtos administrativos na proporção dos respectivos contingentes.

§ 2.° Sobre esta verba não recairá o imposto de viação.

Art. 3.° Os empregados de fazenda não receberão quotas do augmento da contribuição predial proveniente das disposições d'esta lei.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrario.

Ministerio da fazenda, em 11 de março de 1871. = Carlos Bento da Silva.

Mappa a que se refere a lei d'esta data

[Ver diario original]

Ministerio da fazenda, em 11 de março de 1871. = Carlos Bento da Silva.

Proposta de lei

Senhores. — A lei de 22 de fevereiro de 1861, modificando uma parte da legislação das alfandegas, permittiu o transito para a capital das mercadorias estrangeiras entradas por Elvas, estabelecendo ali deposito, e sujeitando-as ao imposto de 1 por milhar ad valorem. Posteriormente o regulamento de 28 de novembro de 1864, ampliando as disposições da referi da lei, permittiu que o transito tivesse tambem logar entre Elvas e o Porto, mas não existia legislação que o auctorisasse de uma ou de outra das duas localidades para Elvas de mercadorias destinadas a saírem do paiz; foi porém isso estabelecido pelo tratado de 27 de abril de 1866 entre Portugal e Hespanha, e livre de todo o imposto.

Diversas circumstancias têem concorrido para que o regulamento a que o tratado se refere ainda se não concluisse, mas, apesar d'isso, em Hespanha foi auctorisado o transito livre por decreto de 15 de julho de 1870.

Algumas mercadorias têem vindo por transito ao nosso paiz; porém tendo de pagar o imposto as que entram por terra, e sendo obrigadas aos direitos de saída as entradas por mar, deixam de affluir aos nossos portos com grave prejuizo do movimento commercial e do caminho de ferro, em cujo producto o estado interessa pelo que arrecada de imposto de transito.

Tendo subido ao governo varias reclamações sobre o assumpto, a respeito das quaes foram ouvidas as estações competentes e o conselheiro procurador geral da fazenda, pareceu-me que ampliando por nova lei as disposições da de 22 de fevereiro de 1861 e regulamento de 28 de novembro de 1864, e abolindo o imposto de 1 por milhar, ficam attendidos todos os interesses, não resultando prejuizo para a receita, porquanto o imposto de transito no caminho de ferro ha de resarcir sufficientemente a perda do referido 1 por milhar.

Por estas rasões tenho a honra de submetter á vossa approvação a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.º São ampliadas as disposições da carta de lei de 22 de fevereiro de 1861 e regulamento de 28 de novembro de 1864, permittindo-se o transito por terra entre

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Lisboa e Elvas, e entre o Porto e Elvas, de mercadorias para saírem livremente do paiz.

Art. 2.° É abolido o direito de transito de 1 por milhar ad valorem estabelecido pelo artigo 3.° da referida carta de lei de 22 de fevereiro de 1861, e tornado extensivo aos caminhos de ferro pelo artigo 17.° do mencionado regulamento de 28 de novembro de 1864.

Art. 3.º A abolição do direito não isenta as mercadorias da fiscalisação que for indispensavel empregar no transito até ao respectivo destino.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrario.

Ministerio dos negocios da fazenda, em 11 de março de 1871. = Carlos Bento da Silva.

Proposta de lei

Artigo 1.° É o governo auctorisado a vender todos os pinhaes e matas do estado, que não forem necessarios para a defeza dos valles e bom regimen dos rios, ou que não devam conservar-se no interesse florestal.

Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Ministerio dos negocios da fazenda, gabinete do ministro, em 11 de março de 1871. = Carlos Bento da Silva.

Proposta de lei

Artigo 1.º A contribuição industrial compõe-se de percentagens fixas, sobre lucros certos, e de taxas fixas ou variaveis, sobre lucros presumidos, em conformidade com as disposições d'esta lei e das anteriores, que por ella não forem alteradas ou revogadas, e segundo o que é disposto nas tabellas annexas A e B, que fazem parte da presente lei.

Art. 2° O contingente que competir a qualquer gremio é distribuido pelos diversos membros d'elle, conforme os seus lucros respectivos, não devendo nenhum contribuinte pagar mais de dez taxas, nem menos de um decimo da taxa estabelecida para a sua classe.

Art. 3.° O governo poderá reduzir provisoriamente, até que as côrtes hajam de prover, as taxas impostas a qualquer profissão, industria, arte ou officio na tabella B, em todas as ordens de terras, ou em alguma d'ellas, se os interessados requererem tal reducção, provando que as taxas excedem 10 por cento dos seus lucros.

Art. 4.° A contribuição industrial é devida desde o principio do trimestre em que o exercicio de qualquer industria, profissão, arte ou officio começar, e deixa de o ser no fim do trimestre em que cessar esse exercicio.

Art. 5.º Ficam sujeitos á contribuição industrial todos os proventos que o estavam em virtude das leis anteriores e os seguintes:

1.° Os lucros de companhias, bancos, e sociedades anonymas de qualquer natureza até agora não tributados;

2.º Os juros de capitães que não são actualmente sujeitos á decima de juros;

3.° Os vencimentos dos directores, agentes, gerentes, thesoureiros, mandatarios e representantes das associações a que se refere o n.º 1.°

4.° Os ordenados, subsidios, gratificações, emolumentos, quotas de cobrança, congruas e quaesquer vencimentos ou proventos, com outra denominação, dos empregados civis do estado, pertencentes ás classes activas, e bem assim as pensões e outros vencimentos das classes inactivas de consideração;

5.° Os ordenados e outros proventos dos empregados de corporações administrativas, e de quaesquer estabelecimentos publicos subsidiados ou não pelo estado.

§ unico. São comprehendidos na disposição d'este artigo os lucros de bancos e sociedades anonymas estrangeiras, de qualquer especie e natureza com relação ás operações e transacções que fizerem em territorio portuguez.

Art. 6.º São isentos da contribuição industrial:

1.° Os membros do corpo diplomatico estrangeiro em effectivo serviço;

2.º Os agentes consulares de paizes estrangeiros, sómente com respeito aos proventos do seu emprego;

3.° Os juros de titulos de divida fundada;

4.° Os proventos das obrigações da companhia de credito predial;

5.º A parte dos lucros ou juros a que se referem os n.ºs 1.° e 2.° do artigo antecedente, que for proveniente de juros de titulos de divida fundada, ou de quaesquer titulos isentos da contribuição industrial pela presente lei, ou finalmente de rendimentos de predios sujeitos á contribuição predial;

6.º Os juros dos capitaes pertencentes a hospitaes, a asylos de beneficencia ou de caridade e de casas de educação de infancia e escolas de instrucção primaria approvadas pelo governo;

7.° Os prets, ferias e soldadas, qualquer que seja a sua importancia;

8.º As forragens e ajudas de custo eventuaes e as comedorias abonadas a empregados em serviço do estado;

9.º Os vencimentos dos patrões e remadores das alfandegas e outras estações publicas;

10.º As gratificações extraordinarias e as incertas, por trabalhos com a formação das matrizes, lançamentos e roais serviços relativos ás contribuições geraes do estado;

11.º As quantias para fieis e falhas abonadas a varios thesoureiros e seus ajudantes;

12.º Os pescadores ou emprezas de pesca, e os concessionarios de minas com relação aos seus respectivos lucros emquanto obtiverem sujeitos a impostos especiaes;

13.° Os cultivadores ou exploradores de quaesquer predios rusticos, com relação aos seus respectivos lucros sujeitos á contribuição predial;

14.° Os monte pios subsidiados pelo estado e os que são legalmente estabelecidos com o exclusivo fim de beneficencia e caridade ou de mutuo auxilio dos associados e suas familias;

15.° Os jornaleiros ou trabalhadores que não exercerem alguma das profissões designadas nas tabellas que fazem parte d'esta lei.

Art. 7.º Nos casos a que se refere o n.º 1.° do artigo 5.°, a contribuição será liquidada na mesma occasião em que se fizer a partilha dos juros ou dividendos, e immediatamente entregue nos cofres da fazenda pela administração do respectivo estabelecimento.

§ unico. Pelas mesmas administrações será effectuado o pagamento das collectas a que se refere o n.º 3.° do citado artigo.

Art. 8.° Ficam abolidos todos os privilegios de isenção de imposto industrial, excepto quando esta seja o resultado de contrato oneroso ou tratado especial.

Art. 9.° Aos empregados publicos que individualmente forem collectados em contribuição industrial relativa aos proventos dos seus empregos, que não satisfizerem as respectivas collectas nos prasos estabelecidos para a cobrança voluntaria das mesmas collectas, serão descontadas nos vencimentos que percebam por qualquer cofre, e não o havendo soffrerão a pena de suspensão por todo o tempo que estiverem em divida.

Art. 10.° É o governo auctorisado a fazer os regulamentos necessarios para a execução da presente lei, e a estabelecer as multas convenientes para tornar effectiva essa execução.

Art. 11.° As disposições legaes relativas á contribuição industrial serão applicadas a todos os subditos estrangeiros, salvas sómente as modificações estabelecidas em tratados emquanto estes subsistirem, devendo o governo entabular as necessarias negociações para que se generalise o preceito estabelecido pelo artigo 1.° do tratado de commercio e navegação entre Portugal e a França, em virtude do qual os subditos francezes pagam actualmente os mesmos impostos, contribuições e tributos a que os nacionaes estão sujeitos.

Art. 12.° O governo, dois annos depois de estar esta lei em execução, tendo reunido todas as informações conve-

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nientes, mandará rever as tabellas A e B e a tabella da ordem das terras, e proporá ás côrtes a correcção de que 83 referidas tabellas carecerem.

Artigo transitorio. A disposição dos numeros 4.º e 5. do artigo 5.° da presente lei não começará a vigorar emquanto subsistirem as deducções estabelecidas pelo decreto de 26 de janeiro de 1869;

Art. 16.° Fica revogada a legislação em contrario.

Ministerio da fazenda, em 11 de março de 1871. = Carlos Bento da Silva.

TABELLA A

Que comprehende as profissões, industrias, artes ou officios que não podem formar gremio

Aferidor de pesos e medidas, 1 por cento do vencimento que perceber da respectiva camara municipal.

Arraes de embarcação, a quinta parte da taxa da 5.º classe na 1.ª ordem de terra, qualquer que seja aquella em que a industria for exercida.

Cera e mel (creador de) até 50 colmeias nada paga, de 50 para cima, a decima parte da taxa da 5.º classe na respectiva ordem de terra.

Companhia de trabalhos braçaes com caracter official, 10 por cento sobre os lucros que distribuir no ultimo anno anterior ao do lançamento.

Companhia ou sociedade anonyma de qualquer especie commercial, industrial ou fabril, não sendo destinada para a exploração de theatros e outros espectaculos publicos, 10 por cento sobre os lucros do anno anterior ao do lançamento, ou sobre os dividendos se os lucros forem todos distribuidos aos accionistas.

Eira com trilho e gado para debulhar cereaes que não sejam de lavra propria (alugador de) a decima parte da taxa da 5.º classe na respectiva ordem de terra.

Empregados publicos de corporações ou estabelecimentos subsidiados ou não pelo estado:

nos vencimentos que excederem 800$000 réis, 10 por cento.

nos que excederem 600$000 réis até perfazerem réis 800$000, 7,5 por cento.

nos que excederem 400$000 até perfazerem 600$000 réis, 5 por cento.

nos que excederem 200$000 réis até perfazerem réis 400$000, 2,5 por cento.

nos que não excederem 200$000 réis, 1 por cento.

Os vencimentos excedentes a 800$000 réis nunca podem ficar inferiores a 716$000 réis liquidos; os que excederem a 600$000 réis não podem ficar inferiores a 558$000 réis liquidos; os que excederem a 400$000 réis não podem ficar inferiores a 386$000 réis liquidos; os que excederem a 200$000 réis nunca podem ficar inferiores a 197$200 réis liquidos.

Estão comprehendidos n'esta verba os empregados publicos que receberem emolumentos tenham ou não vencimento pelo thesouro; se o tiverem, a percentagem correspondente será a que competir ao producto dos vencimentos tomados com os emolumentos; se o não tiverem será a que corresponder á somma em que os emolumentos estiverem lotados, ou que for distribuida pelo cofre respectivo nas corporações em que o houver.

Estão igualmente comprehendidos n'esta verba os empregados de compromissos maritimos, taes como facultativos, boticarios ou outros empregados, quando exerçam a sua industria exclusivamente a bordo dos navios.

Espectaculos publicos (emprezario ou companhia de actores ou sociedade constituida por qualquer modo) o vigesimo de uma recita completa ou producto de uma enchente no respectivo local, sem deducção de despezas em cada mez que trabalhe, seja qual for a quantidade dos dias.

Ás companhias ambulantes exigir-se-ha o pagamento adiantado das respectivas collectas, ou fiança idonea que por elle responda no acto de ser registada a licença, nos termos do artigo 34.º do regulamento do sêllo de 2 de dezembro de 1869.

Lenha, o que vae busca-la para vender em cavalgaduras, a decima parte da taxa de 5.ª classe na respectiva ordem de terra.

Mera (fabricante de), a decima parte da taxa de 5.ª classe na respectiva ordem de terra.

Mergulhadores, a decima parte da taxa de 5.º classe na respectiva ordem de terra.

Mestre de navios, não commandante:

De cabotagem, metade da taxa de 5.ª classe na 1.ª ordem de terra, qualquer que seja aquella em que a industria for exercida.

Moinhos, azenhas ou atafonas onde só se moe o grão, 5 por cento da respectiva renda, quando não moerem para o consumo do proprio dono.

Moleiro (mestre de moinho, dono ou emprezario), a decima parte da taxa de 5.ª classe em terras de 1.ª ordem, qualquer que seja a ordem d'aquella em que a industria for exercida.

Mós (fabricante de), a decima parte da taxa de 5.º classe em terras de 1.ª ordem, qualquer que seja a ordem d'aquella em que a industria for exercida.

Officiaes de quaesquer officios ou artes designados nas tabellas A e B, a decima parte da taxa de 5.ª classe na respectiva ordem de terra.

Singeleiro ou alugador de bois ou vaccas, a decima parte da taxa de 5.ª classe na respectiva ordem de terra.

Notas

1.ª As fabricas e estabelecimentos que para uso proprio tenham officinas de qualquer especie, alheias á principal industria, contribuirão com a taxa respectiva a essas officinas sómente quando trabalhem tambem para outros estabelecimentos ou individuos.

2.ª As mulheres que, como operarias ou officiaes de qualquer officio, estejam sujeitas á taxa, só pagarão metade d'ella.

3.ª As mulheres menores de quatorze annos e os homens menores de dezeseis não serão sujeitos á taxa como operarios ou officiaes de qualquer officio.

TABELLA B

Que comprehende todas as profissões, industrias, artes ou officios que podem formar gremio

[Ver diario original]

Para os effeitos d'esta tabella a população de qualquer cidade ou villa comprehenderá todos os habitantes das freguezias cujas sedes estejam dentro da povoação agglomerada de que se trate; mas só aos habitantes d'essa povoação serão applicadas as taxas da ordem de terra a que ella corresponda por aquelle calculo. Os habitantes das ditas freguezias, que ficarem fóra da povoação agglomerada, serão taxados segundo a ordem da terra immediatamente inferior.

Nos arredores de Lisboa as freguezias de S. Bartholomeu do Beato, dos Santos Reis do Campo Grande, de S. Sebastião, do Lumiar, de Nossa Senhora do Amparo de Bemfica, de Nossa Senhora da Ajuda e de Santa Maria de Belem serão, com a parte rural das freguezias extra-muros da cidade, consideradas terras de 3.º ordem.

Nos arredores do Porto as freguezias de Campanhã, Lordello, Foz e Paranhos serão consideradas como terras de 4.ª ordem.

N.B. Na fixação das taxas d'esta tabella vae considerado o augmento de 50 por cento, contribuição extraordi-

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naria, que sobre as taxas da antiga tabella estabeleceu a lei de 24 de agosto de 1869.

Profissões, industrias, artes ou officios que podem formar gremios e cujas taxas são sujeitas ás seis ordens de terras

Primeira classe

Agencias de companhias estrangeiras de seguros de vidas, de fogo ou maritimos. Aguardente de qualquer especie ou genebra (fabricante de) não distillando generos de producção propria, em terras de 1.ª e 2.ª ordem.

Bacalhoeiros.

Banqueiros, capitalistas e negociantes ou mercadores por grosso em quaesquer objectos.

Entende-se que é banqueiro ou capitalista o que habitualmente desconta letras ou outros papeis de credito; compra e vende fundos publicos, faz emprestimos, recebe e paga por conta alheia ou tira rendimento do emprego ou aluguer de capitaes por meio de outras quaesquer transacções de similhante natureza.

Entende-se que é negociante por grosso o que faz commercio de importação ou exportação.

Entende-se que é mercador por grosso o que compra mercadorias para as vender de ordinario aos mercadores por miudo.

Bazar de mercadorias novas (emprezario de).

Botões e colchetes de qualquer qualidade (fabrica de) com machinismo a vapor ou agua.

Cambista (quando alem de outras transacções compra e vende fundos publicos e faz descontos de letras ou outros quaesquer).

Corretor de cambios, fundos publicos, navios ou mercadorias, sendo de numero. Cortiça, mercador por grosso.

Emprezario de construcção de edificios.

Especuladores que, não sendo classificados negociantes, accidentalmente armazenam em grande e vendem em differentes epochas do anno, por sua conta ou por commissão, cereaes, azeite, vinho, aguardente ou generos coloniaes, ainda que o azeite ou vinho proceda de azeitona ou uva comprada aos lavradores. Estabelecimentos ou lojas em grande de venda a retalho de quaesquer objectos ou generos, tendo mais de tres caixeiros.

Estofador (com estabelecimento) vendendo moveis e outros objectos de adorno de casa.

Fundição de objectos de bronze, cobre, ferro e outros metaes não preciosos (emprezarios de) com motor a vapor.

Gado vaccum (mercador de).

Louça de porcelana (fabrica de).

Modas (armazém ou casa).

Navios para fretar (dono de) para navegação de longo curso.

Tecidos de algodão, linho, lã ou seda (fabrica de) com teares movidos a vapor, agua ou cavalgadura.

Vidro ou crystal (fabrica de).

Segunda classe Açougue (emprezario de).

Administradores de bens rusticos ou urbanos, e de quaesquer rendas pertencentes a particulares.

Advogado com exercicio e passados dois annos depois da sua formatura.

Agencia commercial (emprezario ou dono de escriptorio de).

Agentes de bancos, companhias ou quaesquer emprezas.

Agentes de cambios, fundos publicos, navios ou mercadorias, vulgarmente denominados corretores sem ser de numero.

Alfaiates ou algibebes (com armazem de fazenda ou fato feito).

Assucar (fabrica de refinação de).

Bazar de mobílias usadas (emprezario de).

Bolacha para embarque ou de outras qualidades, e pão de munição ou commum (fabrica de), com motor a vapor ou agua.

Bolacha (marcador por miudo de, vendendo tambem farinhas, semeas e productos analogos) com estabelecimento.

Botequim com sorvetes, bilhar ou outros jogos (emprezario os dono de).

Bronze, cobre, ferro ou outros metaes não preciosos (mercador de objectos de grandes dimensões de).

Caes e porto para embarque e desembarque (dono ou emprezario de).

Cambista (quando as suas transacções se limitam ordinariamente á troca de moedas e a venda de bilhetes e cautelas das loterias).

Carvão (emprezario de côrtes de arvoredo para lhe extrahir casca e fazer).

Casa de saude para tratamento de doentes (emprezario de).

Casas onde se empresta dinheiro ou generos sobre penhores de qualquer especie ou sem elles.

Cerieiro (mercador ou fabricante de vélas os de outras obras de cera).

Commissario nos mercados publicos da vinho, azeite e cereaes (quer volantes ou com estabelecimento ou numero, salvo se forem classificados como negociantes).

Conserveiro (com estabelecimento, incluindo os que preparam comida, hortaliças e fructas doces em latas hermeticamente fechadas).

Cordoeiro (fabricante ou mercador de cabos e outros aprestes para embarcações).

Corretor de cambios, fundos publicos, navios ou mercadorias, não sendo de numero.

Couros cortidos de qualquer qualidade (mercador por grosso da).

Directores, gerentes e thesoureiros de bancos, companhias e sociedades anonymas de qualquer especie.

Engenheiro civil.

Especuladores, que não sendo classificados negociantes, accidentalmente armazenam em grande e vendem em differentes epochas do anno, por sua conta ou por commissão, quaesquer productos ou generos que não sejam os mencionados na primeira classe.

Estamparia de tecidos (fabricante de) com machinismo a vapor ou agua.

Estancia de madeira para construcção.

Ferragens novas (mercador de) vendendo objectos de luxo.

Ferro em barra, chapa, vergalhão, etc. (marcador de) com estabelecimento.

Fiação de algodão, lã ou linho (fabrica de) de fusos movidos por agua, vapor, ou cavalgaduras, quer sejam para trama, urdidura ou para torcer.

Gado cavallar ou muar (mercador de).

Guano ou estrume artificial (fabrica de) com machinismo a vapor ou agua.

Guarda livros ou primeiro caixeiro de escriptorio.

Hospedaria, tenha ou não conjunctamente casa da pasto.

Leilões (agente de, com estabelecimento ou sem elle).

Lenha, carvão e outros objectos para combustivel (estancia em grande de).

Louças de porcelana e outras finas estrangeiras (mercador de).

Medicos ou cirurgiões-medicos com exercicio e passados dois annos depois da sua formatura.

Melaço (fabricante ou mercador de).

Neve em rama (marcador de).

Papel para escrever ou imprimir (fabrica de) sendo continuo e com motor de vapor ou agua.

Pelleiro (fabricante ou mercador de obras de pelles).

Pianos e harpas (mercador de).

Relogios novos (fabricante ou mercador de)

Sabão duro, molle ou sabonete (fabrica de).

Sejes, carruagens, carrinhos, ou outros vehiculos similhantes (fabricante ou mercador de).

Serrar madeiras ou pedras (fabrica de) com machinismo completo a vapor ou agua,

Stearina (fabrica de vélas de) com motor de vapor ou agua.

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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Terceira classe

Adelo com estabelecimento.

Algodão (fanqueiro ou mercador por miudo de tecidos de).

Alugador de moveis, incluindo objectos funerarios e armações da igreja.

Azulejos (fabrica de).

Banhos mineraes e thermaes alimentados por nascentes (emprezario de).

Boticario, com estabelecimento.

Candieiros de bronze ou de outros metaes com ornatos (mercador de).

Canteiro ou esculptor em pedra, com estabelecimento.

Capellista, vendendo objectos de modas.

Carvão (mercador de), vendendo em barcos ou nos mercados.

Casa de pasto (emprezario ou dono de).

Casca de sobre para cortumes (mercador de).

Cerveja ou bebidas gasosas (fabricante de).

Chá (mercador por miudo de).

Chapéus (fabricante ou mercador de).

Chumbo para caça (fabricante de).

Cirurgiões da antiga escola ou algebristas.

Cobre em chapa (mercador de).

Confeiteiro, com estabelecimento.

Despachante.

Dourador de ornatos com estabelecimento.

Droguista, mercador por miudo de drogas com estabelecimento.

Estofador com estabelecimento.

Farinhas (fabrica de) com machinismo a agua ou vapor para moer, peneirar e classificar as farinhas, sem fazer pão ou bolachas.

Ferragens novas (mercador de).

Ferro em moveis (fabricante ou mercador de camas, cadeiras e outros objectos de mobilia).

Fogões de sala (constructor ou mercador de).

Fructas (exportador de) que não sejam da sua producção.

Fundição de objectos de bronze, cobre, ferro e outros metaes (emprezario de) sem motor a vapor.

Fundição de typos ou outros objectos typographicos (emprezario de).

Gado ovelhum ou caprum (mercador de).

Gado suino (mercador de).

Galão de oiro ou prato (mercador ou fabricante de).

Guano ou estrume artificial (fabrica de) sem machinismo a vapor ou agua.

Instrumentos astronomicos, nauticos ou do physica (fabricante os mercador de).

Instrumentos de cirurgia (fabricante ou mercador de).

Instrumentos musicos de vento (fabricante ou mercador de).

Lã (mercador por miudo de tecidos de).

Lavadouros de lã (emprezario de), empregando prensas hydraulicas para empacotar.

Madeiras, emprezario de córtes de arvoredo para extrahir tabuada e madeira de construção.

Marceneiro, fabricante ou mercador de moveis novos de mogno, murta, vinhatice e outras madeiras de estimação.

Massas (fabricas de aletrias, macarrão e similhantes).

Massas (mercador de aletria, macarrão e outras similhantes).

Merceeiro ou dono de armazem de viveres.

Mestres de postas ou outros individuos que fornecem cavalgaduras para serviço de correios, malas postas, diligencias ou empresas analogas.

Navios (constructor de).

Navios para fretar (dono de) para navegação de cabotagem.

Neve (dono ou arrendatario de poços de).

Ourives de oiro ou prata (fabricante ou mercador).

Palha para alimento dos animaes (mercador de).

Papel para escrever (mercador de).

Pasteleiro com estabelecimento.

Perfumes (mercador de).

Pianos (fabricante de).

Productos chimicos (fabricante de).

Proposto estipendiado para gerencia de negocios commerciaes ou fabris.

Realejos (mercador ou fabrica de).

Refinador de assucar, quer venda ou não este genero.

Retroseiro com estabelecimento.

Rolhas de cortiça (fabricante de).

Sacos e pannos (alugador de).

Salchicheiro com estabelecimento.

Salga de carnes (estabelecimento de).

Seges, carruagens, calaças, liteiras, diligencias e outros vehiculos similhantes (alugador ou emprezario de).

Toucinho, presuntos ou carnes ensacadas (mercador por miudo de) com estabelecimento.

Vidro ou crystal (mercador por miudo de objectos de).

Vinho ou outras bebidas espirituosas engarrafadas (mercador), considerando-se como tal o lavrador ou fabricante que em diferente edificio ou local do da producção estabelecer loja ou armazem para venda.

Quarta classe

Administradores de emprezas litterarias.

Agentes ou commissionados volantes para compras, por conta alheia, da cereaes, liquidos, fructos e outros generos com destino ás fabricas ou armazens de seus donos.

Alfaiate de medida com estabelecimento.

Algibebe com estabelecimento.

Arame (fabricante ou mercador de).

Architecto.

Armeiro de armas de fogo ou brancas, com estabelecimento.

Azeite de oliveira ou de qualquer outra qualidade (mercador exclusivo por miudo de) com estabelecimento.

Bahuleiro, com estabelecimento.

Balanças (constructor de pesos e de).

Banhos no mar ou nos rios (emprezario de), sendo em barcas ou barracas fixas de madeira.

Banhos publicos de vapor, artificiaes ou simples sem nascente de agua (estabelecimento de).

Barcas permanentes de passagem nos rios (dono ou emprezario de), excepto quando pertençam ás municipalidades.

Bate-folha com estabelecimento de preparar metaes em folhas ou laminas.

Bate-folhas (mercador de folhas ou laminas).

Bilhar (casa de) sem botequim.

Bolacha (fabricante de).

Bolacha (mercador por miudo de) com estabelecimento.

Botões e colchetes de qualquer qualidade (fabricante de) sem motor a vapor ou agua.

Bronze, cobre, ferro e outros metaes não preciosos (mercador de objectos de pequenas dimensões de).

Caixeiro de escriptorio ou caixeiro de fóra.

Cal, areia, tijolos e objectos analogos (mercador por miudo de).

Cal e gesso (fabricante de) nas terras de 1.ª e 2.ª ordem.

Camaroteiro ou bilheteiro de theatros e de outros espectaculos publicos.

Candieiros de bronze ou de outros metaes (fabricante de).

Capitão ou mestre commandante de navios do alto mar.

Carpinteiro de seges, carruagens e outros vehiculos com estabelecimento.

Cartas de jogar ou cartões (fabricante de).

Cera em bruto (mercador de).

Cerveja (mercador de).

Chapéus de sol com tecidos de seda (fabricante ou mercador de).

Chocolateiro (fabricante ou mercador).

Colchoeiro com estabelecimento.

Collegio de educação, não se entendendo sob esta denominação as aulas de instrucção primaria só de alumnos externos (emprezario de).

Conteiro (fabricante ou mercador de missangas).

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Contraste (alem da taxa que lhe pertença pelo estabelecimento, tendo-o).

Correeiro com estabelecimento (fabricante ou mercador).

Couros cortidos de qualquer qualidade (mercador por miudo).

Cravador, o que crava pedras preciosas, com estabelecimento.

Cuteleiro, com estabelecimento.

Dentista, fabricando dentes e vendendo objectos da sua arte.

Editor que faz d'isso a sua habitual profissão, ou o que publica obras em periodos certos, como almanachs, annuarios, etc.

Elasticos para suspensorios, espartilhos, ligas e outros objectos analogos (fabricante ou mercador de).

Enxofre (refinador ou mercador de) com estabelecimento.

Escriptor publico (os que fazem d'isso sua habitual profissão).

Esculptor em madeira com estabelecimento.

Esmaltador, com estabelecimento.

Estalajadeiro.

Estanho (mercador de).

Esteiras finas (fabrica ou mercador de).

Estrumes (mercador de).

Estucador (emprezario).

Explicador particular de mathematica ou de outras sciencias, ainda que seja lente ou professor dos estabelecimentos de instrucção pagos pelo estado.

Fatos para mascaras, theatros, etc. (alugador de).

Fio de oiro ou prata (fabricante ou mercador de)

Fundas para quebraduras (fabricante ou mercador de).

Galão de oiro ou prata (mercador de).

Harpa (mestre de).

Lavadouros de lã (emprezario de).

Licores (mercador ou fabricante por miudo de).

Linho (mercador por miudo de tecidos de).

Lithographia (emprezario de).

Livros scientificos ou litterarios nacionaes ou estrangeiros (mercador de).

Louça de pó de pedra (mercador de).

Louça ordinaria de pó de pedra ou commum (fábrica de).

Luveiro (fabricante ou mercador).

Marfim (fabricante ou mercador de objectos de).

Mestre de fabrica (não sendo dono ou emprezario).

Mestre de obras (pedreiro ou carpinteiro).

Mós (emprezario).

Oculista (fabricante ou mercador de oculos).

Oleados (mercador de).

Oleados ou encerados (fabrica de).

Ossos em bruto (mercador de).

Padeiro.

Papel para escrever ou imprimir (fabrica de) não sendo continuo, com ou sem motor a vapor ou agua, tendo mais de quatro tinas.

Papel pintado (mercador de).

Perfumes (fabricante ou mercador de).

Photographia (estabelecimento de).

Piano (mestre de).

Pintor (mestre).

Preparador de vinhos para embarque.

Quinquilherias (mercador de).

Sebo (fabricante de vélas de).

Seda em rama, fio ou tecidos (mercador por miudo de).

Solicitador ou procurador de causas e seus ajudantes.

Stearina (fabrica de vélas de) sem motor de vapor ou agua.

Tanoaria (mercador ou fabricante de objectos de).

Typographia (emprezario de).

Velame para embarcações (o que tem estabelecimento de).

Veterinario.

Vidraceiro com estabelecimento.

Vinho, aguardente ou vinagre (mercador por miudo ou taverneiro, considerando-se como tal o lavrador ou fabricante que o vende fóra da sua adega, em loja ou armazem, dando ou não comida).

Quinta classe

Abridor ou gravador com estabelecimento ou officina.

Aço em espelho (estabelecimento para pôr).

Açougue (emprezario de) para venda de gado miudo.

Actor ou actriz de companhia estabelecida por mais de tres mezes no mesmo local.

Adelo ou vendilhão, vulgarmente chamado ferro velho.

Afinador de pianos, cravos e outros instrumentos.

Agencias indeterminadas ou individuos que dizem viver da sua agencia, quando não possam ser classificados de outro modo.

Agente de enterros.

Aguardente de qualquer especie ou genebra (fabricante de) não distillando generos de producção propria:

Em terras de 3.ª, 4.ª, 5.ª e 6.ª ordem.

Aguas mineraes ou thermaes (vendedor de).

Albardeiro, com estabelecimento.

Alcatrão, breu ou outras materias resinosas (fabricante de).

Almocreve ou recoveiro.

Alveitar.

Alviçareiro.

Amolador ambulante.

Amolador com estabelecimento.

Apontador de obras.

Apparelhador de navios.

Arameiro com estabelecimento de objectos de arame.

Arcos de barris ou de pipas (fabricante ou mercador de).

Arroz (estabelecimento de descacar) que não seja de producção propria.

Azeite de oliveira (fabricante de), não sendo de producção propria; qualquer que seja o tempo de exercicio em cada anno.

Azeite que não seja de oliveira (fabricante de) qualquer que seja o tempo de exercido em cada anno.

Banheiro que tenha barracas ambulantes para banhos do mar ou nos rios.

Banhos no mar ou nos rios (emprezario de), sendo em barracas volantes.

Barbeiro (com estabelecimento ou sem elle, sendo sangrador).

Barcos e outras embarcações maiores e menores que navegam nos rios (dono ou rendeiro de).

Batatas (mercador por miudo de).

Betumes (fabricante ou mercador por miudo de).

Bordador com estabelecimento.

Botequim sem bilhar, nem sorvetes (emprezario de).

Botica (administrador ou rendeiro de).

Botões de osso ou de unha (simples fabricante de).

Bronze (fabricante de objectos de pequenas dimensões de).

Brunidor de objectos de metal, com estabelecimento.

Bufarinheiro com ou sem cavalgadura, homens ou mulheres.

Cabelleireiro ou barbeiro, com loja ou sala.

Cabresteiro com estabelecimento.

Caça ou aves domesticas (o que tem loja ou logar para a venda de).

Caçador de caça do chão ou do ar, quando faça d'esta industria a sua habitual profissão.

Cadeirinhas (alugador de).

Café, estabelecimento de o torrar.

Caixeiro de balcão, incluindo os denominados marçanos que tenham quinze annos completos de idade, ou qualquer outro empregado mercantil que não seja proposto guarda livros, caixeiro de escriptorio ou de fóra.

Cal e gesso (fabricante de):

Nas terras de 3.ª, 4.ª, 5.ª e 6.ª ordem.

Calafate (emprezario).

Calceteiro (somente mestre ou emprezario).

Caldeireiro ambulante. Canto (mestre de).

Capellista, com loja de capella, sem objectos de modas.

Capitão ou mestre commandante de navios de cabotagem.

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Cardação (fabrica unica e exclusivamente destinada a).

Carniceiro ou cortador (o que corta ou pésa carne nos açougues).

Carpinteiro de carros ou outros instrumentos agricolas, com estabelecimento.

Carpinteiro de obra miuda, com estabelecimento.

Carros (alugador de carros de bois ou cavalgaduras).

Carvão (mercador por miudo de).

Casa de pasto nos barcos a vapor (emprezario de).

Casca de carvalho (mercador de).

Castradores de gado.

Cavallos (alugador de gado cavallar ou muar).

Cera (lagares de espremer a).

Cereaes (mercador por miudo de).

Cerzidor com estabelecimento.

Chapéus de sol com tecidos não de seda (fabricante ou mercador de).

Cinzas (mercador de).

Cobrador nos açougues.

Cobre (fabricante de objectos de pequenas dimensões de) taes como caçarolas e outros similhantes.

Colheres de pau, palitos, gamellas, tinas e outros objectos analogos (fabricante ou mercador de).

Colla (fabricante de).

Confeiteiro ou conserveiro, o que faz doce de todas as qualidades, para fornecer as mercearias e outras lojas de venda, para encommenda e mesmo para os vender na propria casa, sem estabelecimento.

Cordas para instrumentos (fabricante ou mercador de).

Cordoeiro, fabricante ou mercador sómente de cordas, cordel ou fio.

Coronheiro com estabelecimento.

Cortiça (mercador por miudo de).

Cortumes (fabricante de).

Costureira ou engommadeira era casa propria com operarias.

Dansa (mestre de).

Dansarino ou dansarina de companhia estabelecida por mais de tres mezes no mesmo local.

Dentista (o que só tira dentes sem vender objectos da sua arte).

Desenhador para fabricas.

Desenho (mestre de).

Director de typographia.

Dobador.

Dourador, bronzeador ou galvanisador com estabelecimento.

Embutidor com estabelecimento.

Encadernador com estabelecimento.

Ensaiador de oiro e prata.

Entalhador com estabelecimento.

Equitação (mestre de) ou ensinador de cavallos.

Ervanario (mercador de sanguesugas, com estabelecimento).

Escovas (fabricante ou mercador de).

Escrevente de escriptorio de tabelliães ou escrivães, incluindo os denominados regentes.

Esculptor em barro, com estabelecimento.

Esgrima (mestre de).

Esmerilhador com estabelecimento.

Esparteiro com estabelecimento.

Estalagem para guardar animaes.

Estampador de bilhetes, registos de santos e outros objectos analogos.

Estamparia de tecidos á mão (fabricante de).

Estampas (mercador de).

Estanhador ambulante.

Estivador, o que arruma a carga nos navios, quando não pertença á tripulação.

Estojos ou carteiras de bolso (fabricante ou mercador de).

Farinha (mercador por miudo de).

Ferrador com estabelecimento.

Ferragens usadas (mercador de) com estabelecimento.

Ferro (fabricante de objectos de pequenas dimensões de).

Fiação de algodão, lã ou linho (fabrica de) de fatos movidos á mão.

Por menos de dez fusos não se paga imposto.

Fiel de feitos.

Fiscaes dos arrematantes do imposto do real de agua, e dos impostos municipaes.

Flores artificiaes (fabricante ou mercador de).

Flores ou arvores naturaes (mercador de).

Fogueteiro (fabricante ou mercador de fogos de artificio).

Formeiro (o que faz fôrmas para calçado e outros destinos).

Forneiro (emprezario de fornos para cozer pão sem vender).

Fressura (loja ou logar onde se vende).

Fructas e hortaliças em barcos (mercador de).

Fructas e hortaliças (mercador por miudo de).

Funileiro (com estabelecimento de objectas de folha branca).

Gabinete de leitura (emprezario de).

Galochas (fabricante ou mercador de).

Gelo artificial (fabrica de).

Gesso (mercador de objectos de) com estabelecimento.

Graxa, estabelecimento de engraxar calçado.

Graxa (fabricante ou mercador de).

Grude (fabricante ou mercador de).

Inculcador de creados ou creadas de servir (com estabelecimento ou sem elle).

Instrumentos de cordas, não sendo pianos ou harpas (fabricante ou mercador de).

Jardineiro (emprezario).

Jogos publicos de malha, bola ou os lícitos de cartas, ainda que haja um só.

Jumentos (alugador de).

Lã em bruto, cardada, lavada ou fiada (mercador por miudo de).

Lagareiro, mestre de lagar de fazer azeite.

Lapidario com estabelecimento.

Latoeiro (mercador ou fabricante de objectos de latão) com estabelecimento. Legumes (mercador por miudo de).

Leite (o que tem animaes sem emprego na agricultura e sómente para a venda de). Leite (vendedor de).

Lenha (mercador por miudo de) com estabelecimento.

Lenha, o que vae busca lã para venderem carros ou barcos.

Leques (fabricante ou mercador de).

Linho (engenho ou fabrica unica e exclusivamente destinada a amassar ou picar o linho, não sendo de producção propria).

Linho, estabelecimento de assedar.

Linho em rama, assedado ou fiado (mercador por miudo de).

Lithographo.

Livros (alugador de).

Livros em branco, pautados ou riscados para escripturação (fabricante em mercador de).

Louça de barro ordinario (fabrica de).

Louça de barro ordinario (fabricante de, sendo só elle operario).

Louça de barro ordinario (mercador de).

Magarefe, matador ou esfolador de gado.

Manteiga, como industria separada da agricultura (fabricante de).

Marceneiro (fabricante ou mercador de moveis de madeiras ordinarias).

Marroteiro (mestre de marinhas de sal).

Mestre de navio, não commandante de alto mar.

Mestre de officina, não sendo dono ou emprezario.

Mineiro (mestre).

Mordomo ou administrador domestico.

Musica, com excepção de piano ou harpa (mestre de).

Musico.

Obreias (fabricante ou mercador de).

Odres (fabricante ou mercador de).

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Oleados (fabricante de) não tendo mesas de estampar.

Osso (fabricante ou mercador de objectos de).

Ossos (fabricante de pó de).

Palha (fabricante ou mercador de tranças, cordões, chapéus e outros objectos de).

Palhinha ou rotim, o que o põe nas cadeiras, com estabelecimento.

Papel para escrever ou imprimir (fabrica de) não sendo continuo, tenha ou não motor a vapor ou agua.

Papel pintado (fabricante de).

Papelão (mercador de).

Papelão ou papel pardo (fabrica de).

Parteira.

Passaros (o que tem estabelecimento para a venda de).

Pavios ou palitos phosphoricos (fabricante de).

Peixe fresco ou salgado, não sendo bacalhau (o que tem loja ou logar para venda de).

Pelles para curtir (mercador por miudo de).

Peneiras (fabricante ou mercador com estabelecimento de).

Penteeiro (fabricante ou mercador de pentes).

Picheleiro (fabricante ou mercador de obras de estanho).

Piloto de navio.

Piloto ou pratico de barcos.

Pinceis (fabricante ou mercador de).

Pintor.

Pintor de ornatos.

Pintor ou artista (que vende producções da sua arte).

Pisão, estabelecimento de apisoar panno com machinismo.

Plumas (emprezario de estabelecimento de preparar).

Poceiro (emprezario habitual de construcção e limpeza de poços).

Poleeiro (com estabelecimento de moitões e outros objectos similhantes).

Polidor (emprezario).

Pós para gomma (fabricante ou mercador de).

Pregoeiro nos leilões.

Prensa, estabelecimento exclusivo de apertar pannos e de lhes dar lustro.

Preparador de objectos de historia natural.

Professor de instrucção secundaria, ou de artes e sciencias, não pago pelo estado, ou ainda que o seja, quando dê lições particulares.

Queijos (mercador por miudo de) com estabelecimento.

Redes para caça ou pesca (fabricante ou mercador de).

Relogios usados de algibeira ou de parede (mercador de ou o que os concerta).

Rendas (o que as compra para exportação).

Revisor de provas typographicas.

Rolhas de cortiça (mercador de).

Roupa (empreza ou estabelecimento de lavagem de, por processos mechanicos).

Sabão e sabonetes (mercador por miudo de).

Sal (mercador por miudo de) com estabelecimento.

Sangrador, não sendo barbeiro.

Sapateiro (fabricante com officiaes ou mercador por miudo de calçado).

Sebo em rama ou em pão (mercador de).

Serigueiro com estabelecimento.

Serrar madeiras ou pedras (fabrica de) por agentes braçaes ou pequenos e accidentaes motores de agua.

Sumagre (fabrica de).

Sumagre (mercador de).

Surrador de pelles com estabelecimento.

Tamancos (o que faz ou vende por miudo).

Tanques para lavar (o dono ou emprezario que os dá de aluguer diariamente ou a outros prasos).

Tecelão trabalhando por conta alheia ou por propria conta em teares á mão em sua casa ou officina, não tendo mais de dois.

Tecidos de algodão, linho, lã ou seda (fabrica de) com teares á mão.

Telha ou tijolo (fabrica de).

Tinturaria (fabrica sómente de tingir zuartes ou fio).

Tinturaria (officina ou estabelecimento de tingir quaesquer fazendas ou objectos que não sejam roupas usadas).

Tinturaria (officina ou estabelecimento de tingir roupas usadas).

Torneiro com estabelecimento.

Tosador (estabelecimento de tosar pannos).

Tosquiador de animaes.

Traductor para jornaes.

Trapeiro com estabelecimento.

Tripas (mercador por miudo de).

Vallador.

Vassouras (fabricante ou mercador de) com estabelecimento.

Vedor ou descobridor de agua.

Vendedor de livros velhos, em local fixo ou porta de escada.

Vendedores ambulantes de carne, azeite, vinagre e outros objectos ou generos com ou sem cavalgadura.

Vendedores de quaesquer objectos nas feiras e mercados publicos, vulgarmente chamados barraqueiros, sem estabelecimento fixo, quando não tenham designação especial na tabella.

Verniz (fabricante ou mercador de).

Vimes (estabelecimento em que se fazem cabazes, cestas, canastras e outras obras similhantes de).

Notas

1.ª São isentos da taxa, como officiaes de quaesquer officios ou artes designados n'esta tabella, a mulher e filhos não casados que trabalhem por conta do chefe da familia na propria casa ou officina d'este, e os irmãos que trabalhem conjunctamente tambem na propria casa ou officina, ficando n'um e n'outro caso só sujeito ao imposto o chefe da familia ou do estabelecimento.

2.ª Não se consideram mercadores sujeitos á taxa os lavradores que vendam os seus generos por grosso ou miudo no local da producção ou mercados e feiras.

Tambem se não consideram mercadores os que não têem estabelecimento fixo.

Proposta de lei

Artigo 1.° É dividida a contribuição pessoal, creada pela carta de lei de 30 de junho de 1860, em duas contribuições de lançamento denominadas «contribuição da renda das casas e contribuição sumptuaria», as quaes serão reguladas pelas disposições da presente lei.

Art. 2.° Ficam sujeitos á contribuição da renda das casas as rendas ou valores locativos das casas de habitação não inferiores a 120000 réis, nas terras de 1.ª e 2.ª ordem, a 3$000 réis nas de 3.ª e a 2$000 réis nas 4.º, 5.º e 6.º ordem, no continente do reino e ilhas adjacentes.

§ 1.º Esta contribuição será de 4 por cento sobre as rendas ou valores locativos inferiores a 20$000 réis nas terras de 1.ª e 2.ª ordem, a 10$000 réis nas de 3.ª, e a 5$000 réis nas de 4.ª, 5.ª e 6.ª ordem; e de 6 por cento sobre as rendas ou valores locativos superiores.

§ 2.° Exceptuam-se d'esta contribuição os paços episcopaes, as casas de residencia dos parochos, cujos rendimentos forem computados nas respectivas congruas, os conventos das religiosas, e as casas em que as camaras municipaes, juntas de parochia, misericordias, confrarias e outras instituições publicas de piedade ou instrucção estiverem estabelecidas.

Art. 3.° A contribuição sumptuaria compõe-se de taxas fixas, reguladas pela tabella annexa que faz parte da presente lei, as quaes recaem:

1.° Sobre os creados do sexo masculino;

2.° Sobre cavallos, eguas ou muares;

3.º Sobre os vehiculos destinados ao transporte de pessoas.

§ 1.° Exceptuam-se das disposições do n.º 1.°:

1.º Aquelles que só accidentalmente fizerem serviço de creados;

2.° Os creados ou moços dos forneiros e padeiros, ou amassadores e moços de fornos, os moços, bulieiros e co-

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cheiros de seges e carruagens de aluguer, os serventes e moços de casas de pasto, hospedarias, lojas de bebidas e outras analogas, e creados empregados exclusivamente no serviço da agricultura, e nos hospitaes e estabelecimentos pios.

§ 2.° Exceptuam-se da disposição do n.º 2.°:

1.° Os cavallos, eguas e muares que tiverem praça no exercito, e os das pessoas a quem o estado os concede ou obriga a ter para desempenho dos seus cargos, quando não forem tambem empregados no serviço de vehiculos;

2.° Os cavallos, eguas ou muares que se empregarem exclusivamente no serviço da agricultura ou da industria fabril;

3.º As eguas de creação, os cavallos destinados á padriação e os poldros até quatro annos, não prestando serviço de commodo pessoal;

4.º As cavalgaduras de carga ou transporte.

§ 3.º Exceptuam-se da disposição do n.º 3.°:

Os trens de aluguer.

§ 4.º A excepção do § antecedente não aproveita aos individuos que tomarem trens de aluguer para serviço aturado.

Art. 4.° São sujeitos ás contribuições da renda das casas e sumptuaria todas as pessoas nacionaes ou estrangeiras que residirem no continente do reino e nas ilhas adjacentes.

§ unico. Exceptuam-se:

1.° Os membros do corpo diplomatico estrangeiro em effectivo serviço;

2.° Os agentes consulares de paizes estrangeiros que não tiverem em Portugal rendimento algum alem do que lhes provier do seu emprego.

Art. 5.° Pela contribuição da renda das casas são responsaveis os senhorios na falta ou insolvência dos inquilinos.

Art. 6.° O lançamento das contribuições da renda das casas e sumptuaria será feita por concelhos.

§ 1.º Haverá em cada concelho informadores louvados especiaes para o serviço d'estas contribuições, nomeados pela junta dos repartidores da contribuição predial.

§ 2.° Os diversos bairros em que se dividem os concelhos de Lisboa e Porto serão considerados para os effeitos d'esta lei como outros tantos concelhos.

§ 3.° A junta dos repartidores compete a imposição de quaesquer multas a que possa dar logar o lançamento das referidas contribuições.

Art. 7.° Haverá em cada concelho uma matriz que servirá para o lançamento das contribuições da renda das casas e sumptuaria, a qual será feita pelo escrivão de fazenda nos termos que forem estabelecidos no respectivo regulamento,

§ unico. N'esta matriz declarar-se-ha:

1.° O nome da pessoa sujeita ás duas contribuições ou a alguma d'ellas;

2.° A sua morada;

3.° A ordem da terra em que reside ou tem factos sujeitos ás contribuições;

4.° A renda ou valor locativo das casas sobre que deve recaír a contribuição da renda;

5.° O numero de creados, cavalgaduras ou vehiculos sujeitos á contribuição sumptuaria;

6.° A contribuição da renda e addicionaes que sobre ella recaírem;

7.° A contribuição sumptuaria e addicionaes que sobre ella recaírem.

Art. 8.° A matriz depois de feita pelo escrivão de fazenda será entregue ajunta dos repartidores da contribuição predial, que a patenteará aos contribuintes com reclamação para a mesma junta e recurso para o conselho de districto, no tempo e pelos prasos que os regulamentos fixarem, havendo das decisões do conselho de districto recurso para o supremo tribunal administrativo, sem effeito suspensivo nos prasos estabelecidos no regulamento d'este tribunal.

Art. 9.° A matriz depois de rectificada por virtude das decisões da junta dos repartidores e das do conselho de districto, sobre as reclamações e recursos dos contribuintes, será encerrada pela mesma junta, ficando assim definitivamente concluida para por ella se proceder á cobrança das duas referidas contribuições.

Art. 10.° As contribuições da renda das casas e sumptuaria começa a vencer-se desde o principio do trimestre em que o contribuinte tiver no concelho alguma casa por sua conta habitada, ou por elle arrendada, ou algum objecto sujeito ás mesmas contribuições, e cessa de vencer-se desde o principio do trimestre em que o contribuinte deixou de ter objectos a ellas sujeitos.

§ unico. Quando o contribuinte deixe de ter os objectos sujeitos a qualquer das duas contribuições no mesmo trimestre em que começou a te-los ficará sujeito á contribuição respectiva a todo esse trimestre.

Art. 11.° Os contribuintes poderão prestar previamente ao escrivão de fazenda respectivo, declarações verbaes ou por escripto, contendo os esclarecimentos convenientes para a formação da matriz.

§ 1.º Nas cidades de Lisboa e Porto estas declarações são obrigatorias, não podendo haver reclamação ordinaria nem extraordinaria contra as collectas lançadas aos contribuintes que tiverem deixado de prestar as referidas declarações.

§ 2.° A disposição do § antecedente não prejudica o direito de reclamação dos collectados sem fundamento algum para o ser.

Art. 12.° É o governo auctorisado a fazer os regulamentos necessarios para o desenvolvimento e execução das disposições contidas na presente lei, e a estabelecer as muletas convenientes para tornar effectiva essa execução.

Art. 13° A presente lei começará a ter vigor no anno civil de 1871.

Art. 14.° Fica revogada a legislação em contrario.

Ministerio da fazenda, em 11 de março de 1871. = Carlos Bento da Silva.

Tabella das taxas fixas de contribuição sumptuaria

[Ver diario original]

N. B. As taxas d'esta tabella são as estabelecidas na tabella que faz parte da lei de 30 de julho de 1860, com as modificações da lei de 20 de junho de 1863, addicionadas com a contribuição extraordinaria de 60 por cento creada pela lei de 17 de julho de 1869.

Ministerio dos negocios da fazenda, em 11 de março de 1871. = Carlos Bento da Silva.

Leu-se na mesa o seguinte

Decreto

Tomando em consideração a proposta da camara dos senhores deputados da nação portugueza, e visto o disposto no artigo 1.º da carta de lei de 3 de setembro de 1842:

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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

hei por bem nomear os deputados visconde dos Olivaes e Anselmo José Braamcamp, conselheiro d'estado effectivo e ministro e secretario d'estado honorario, para supprirem o eventual e simultaneo impedimento do presidente e vice-presidente da mesma camara.

O presidente da camara dos senhores deputados da nação portugueza assim o tenha entendido e faça constar á camara. Paço da Ajuda, em 11 de março de 1871. = REI. = Marquez d'Avila e de Bolama.

Prestou juramento de supplente á presidencia o sr. visconde dos Olivaes.

O sr. Ministro da Guerra (Moraes Rego): - Mando para a mesa a seguinte proposta.

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Senhores. — Em conformidade do disposto no artigo 43.° do acto addicional á carta constitucional da monarchia, o governo pede á camara dos senhores deputados permissão para que os membros da mesma camara abaixo designados possam accumular, querendo, o exercicio das funcções legislativas com as dos seus empregos ou commissões:

João Baptista da Silva Ferrão de Carvalho Mártens, membro da commissão encarregada de formular um projecto do codigo de processo e composição dos tribunaes militares.

José Maria Latino Coelho, capitão de engenheria e membro da commissão encarregada de formular um plano de reforma das instituições e organisações militares actuaes.

Domingos Pinheiro Borges, capitão de engenheria, chefe da 4.ª secção da direcção geral da dita arma.

José Elias Garcia, capitão de engenheria, lente da escola do exercito.

Guilherme Quintino Lopes de Macedo, capitão do estado maior de artilheria e sub-chefe da 3.ª repartição da secretaria da direcção geral da dita arma.

Visconde de Villa Nova da Rainha, capitão de cavallaria e membro da commissão revisora do recrutamento em Lisboa.

Alberto Osorio de Vasconcellos, tenente do estado maior de engenheria, incumbido de trabalhos da dita arma em Lisboa.

João José de Alcantara, tenente de infanteria n.º 11, ajudante de campo do governador da praça de S. Julião da Barra.

Sala das sessões da camara dos senhores deputados, em 11 de março de 1871. = José Maria de Moraes Rego.

Foi logo approvada.

O sr. Coelho do Amaral: — Tinha pedido a palavra para chamar a attenção de qualquer dos nobres ministros, do reino ou das obras publicas, sobre a instante conveniencia de ser convertido em lei o projecto que auctorisa as camaras municipaes a applicarem o serviço braçal, bem como o de transportes, decretado pela lei de 6 de julho de 1864, aos trabalhos de reparações dos caminhos vicinaes, e outros que as camaras julguem de necessidade e interesse para os seus concelhos.

Este projecto foi votado n'esta casa. Não passou na outra creio que por se encerrar a sessão.

A utilidade que resulta de que elle seja convertido em lei é instante e reconhecida por todos.

O sr. Francisco de Albuquerque: — Apoiado.

O Orador: — As camaras municipaes estão privadas dos recursos mais importantes para o melhoramento da viação concelhia e vicinal, e logo que este projecto seja convertido em lei, as difficuldades com que lutam desapparecem em grande parte.

Peço por isso a qualquer dos srs. ministros, tanto ao das obras publicas como ao do reino, porque, comquanto este assumpto incumba mais immediatamente ao nobre ministro do reino, por isso que é uma alteração nas disposições da lei de 6 de junho de 1864, é certo que a illustre commissão de obras publicas d'esta casa, de accordo com o respectivo ministro, foi encarregada de formular o projecto

que aqui passou, vindo assim o cuidado da solução d'este negocio a estar affecto ás duas pastas; peço, digo, ao nobre presidente do conselho de ministros e ao nobre ministro das obras publicas, que empreguem todos os meios ao seu alcance para que este projecto passe quanto antes na outra casa do parlamento, a fim de que as camaras municipaes fiquem habilitadas a occorrerem ás gravissimas necessidades da viação dos seus concelhos e a outros melhoramentos de que estão privadas, por lhes não ser permittido applicarem convenientemente o serviço braçal.

Por esta occasião permittir-me-hão v. ex.ªs e a camara que eu aproveite a palavra para me associar á manifestação dos desejos dos meus illustres collegas, Pereira de Miranda e Mariano de Carvalho, de prestarem o meu apoio sincero e leal ao governo, visto que elle, pela boca do nobre presidente do conselho, se declarou disposto a proseguir desassombradamente no programma apresentado pelos conselheiros da corôa em outubro ultimo.

Eu desejo concorrer com o meu apoio, modesto e humilde como é, mas muito sincero e convicto, para a minoração dos males que affligem o meu paiz.

Se o governo se empenha deveras em resolver a questão mais momentosa, a primeira de todas, a questão do desequilibrio do nosso orçamento, o meu apoio está á disposição d'este ou de qualquer outro governo que se proponha tão importante fim (apoiados), mas devo declarar que este meu apoio é condicional.

Eu voto todas e quaesquer medidas tributarias que não repugnem á minha consciencia, uma vez que a par d'ellas se apresentem as medidas para a reducção da despeza publica, em cuja possibilidade o nobre ministro da fazenda acaba de declarar que acredita e promette apresentar, mas que por ora deixa na pasta; e para mim é necessario que passe mais alem, isto é, que traduza em factos palavras, promessas e planos.

Para que nós possamos minorar a resistencia que tanto se apresenta á elevação dos tributos, resistencia que procede em grande parte da falta de forças pecuniarias do paiz para sustentar essa elevação sempre progressiva; para que ella seja recebida com menos repugnancia é necessario que a reducção das despezas publicas, até onde possa ser levada, justifique a necessidade fatal e impreterivel que actua sobre o governo e sobre o parlamento para se soccorrerem ao imposto.

Por isso declaro: é condição minha, e já muito antiga, para que o meu voto acompanhe o decretamento de medidas tributarias, que conjunctamente com ellas sejam decretadas medidas para uma real e importante reducção na despeza publica, reducção em cuja possibilidade, repito, o sr. ministro da fazenda declarou ha pouco que acreditava.

É certo que eu por mais de uma occasião tive já o gosto de ouvir da boca de s. ex.ª que estas reducções effectivamente podiam e deviam ser feitas, e, ainda mais, aonde S. ex.ª por vezes nos tem dado a satisfação das mais doces esperanças, que infelizmente ainda não tem passado de palavras. É preciso que as palavras se convertam em obras. Está dependente d'isto o meu voto. Realisada esta condição póde contar o governo, este ou qualquer outro governo (já não curo de nomes), com a minha cooperação sincera, leal, franca e dedicada.

E apoio qualquer governo n'estas condições, porque n’isto sirvo o meu paiz. Vejo as angustiosas circumstancias em que elle está, para saír das quaes é necessario que todos nós prestemos grandes sacrificios (apoiados). Pela minha parte não recuso o quinhão que me possa pertencer tanto da impopularidade que contráha votando aqui as indispensaveis medidas, como concorrendo com o meu conselho, a minha voz e o meu exemplo em todo e qualquer logar para que ninguem se subtráha á parte que lhe toque n'esses sacrificios, indispensaveis e impreteriveis para salvar o paiz da ruina que o ameaça, e talvez muito proximamente (apoiados).

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O sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Estou completamente de accordo com as considerações que acaba de apresentar o illustre deputado, o sr. Coelho do Amaral, e peço só a s. ex.ª, que seja menos severo na apreciação que fez nas promessas do meu collega o sr. ministro da fazenda. Pareceu-me ouvir a s. ex.ª, que o sr. ministro da fazenda já tinha feito, por mais de uma vez, a declaração de que a par das medidas tributarias, ou que exigissem novos sacrificios ao paiz se haviam de fazer todas as economias compativeis com as necessidades do serviço, mas que esta declaração não tinha ainda vindo á execução. N'esta parte a apreciação de s. ex.ª não é exacta. O primeiro acto que praticámos em outubro de 1870, e comprazo-me em alludir a essa epocha, foi o decreto de 31 d'esse mez, por virtude do qual nos impozemos a obrigação de não preencher vacatura alguma senão com empregados addidos que tivessem as habilitações necessarias para exercer as funcções inherentes aos logares vagos. Posso assegurar ao illustre deputado, que este decreto tem sido levado á execução com todo o rigor, e quando se apresentarem os resultados d'elle verá s. ex.ª que, alem de ser um grande principio de moralidade, é um principio que póde produzir com o tempo grandes e importantes economias (apoiados).

Mas o meu collega da fazenda já tem praticado outras economias que devem chamar a attenção da camara, e que s. ex.ª ha de explicar melhor no relatorio que prometteu trazer breve á camara, e que eu esperava que viesse hoje, mas que não foi possivel, está se copiando a toda a pressa: por esse relatorio se verá, que o meu collega da fazenda já tem feito valiosas economias, especialmente nos encargos da divida fluctuante, e principalmente na divida fluctuante externa.

Eu tinha aqui dito que os encargos d'essa divida hoje não excedem, termo medio, a 10 por cento. Se o illustre deputado attender a que uma grande parte d'essas divida foi effectuada a juros muito maiores, algumas até a juros que excederam a 20 por cento, só ahi encontrará s. ex.ª uma economia extremamente valiosa. Farei uma demonstração em cifras redondas, para tornar mais clara essa demonstração. Supponha o illustre deputado, que a divida fluctuante externa é de 6.000:000$000 réis, que essa divida custava 15 por cento, o que importa um encargo de 900:000$000 réis. Ora, hoje custando só 10 por cento, o que equivale ao encargo de 600:000$000 réis, ha portanto uma economia de 300:000$000 réis. Qual é a economia que se poderá fazer nos diversos serviços, e refiro-me designadamente ao pessoal d'esses serviços, que possa produzir aquella cifra? Não digo que se não façam essas economias, porque entendo que todas as economias nos são precisas, grandes e pequenas, quando não fosse senão como um principio de alta moralidade; porque é indispensavel provar ao paiz, que só se gasta o que é absolutamente indispensavel (apoiados).

O que digo é que não ha economias tão valiosas como as que se fazem com a realisação da receita publica, com as operações de thesouraria; estas podem produzir centenares de contos, alem da grande influencia que exercem no melhoramento do credito, e por consequencia no desenvolvimento da prosperidade publica.

Acrescentarei ainda, que eu estou convencido de que havemos de trazer sem grande demora a divida fluctuante a um encargo que não ha de exceder a 6 por cento.

Ora, imaginem os illustres deputados que esta divida, fallo da divida fluctuante, monta a 10.000:000$000 réis (está em 9.400:000$000 réis), custava 12 por cento: o encargo era 1.200:000$000 réis. Custando 6 por cento, importaria o encargo em 600:000$000 réis, e poupar-se-íam 600:000$000 réis.

Já vêem s. ex.ªs que o sr. ministro da fazenda não se tem contentado com fazer promessas, têem-as realisado em todo o rigor.

Não pense a camara que estou dizendo isto para agradecer ao meu collega as expressões benevolas que elle empregou para commigo. Essas expressões são filhas da excellente camaradagem que existe entre nós, de estarmos todos animados do pensamento de contribuir cada um pela sua parte para a resolução da questão de fazenda, porque essa resolução não pertence só, como já se disse, ao respectivo ministro, pertence a todo o gabinete, e pertence não menos aos corpos legislativos (apoiados), sem o concurso dos quaes é impossivel conseguir este desideratum.

O programma enunciado pelo ministerio que se apresentou á camara em 29 de outubro foi este: «Nós havemos de collocar a questão de fazenda acima de todas as outras, havemos de subordinar as outras questões á questão de fazenda». E este programma é exactamente o do actual gabinete.

Os dois cavalheiros que nos fizeram a honra de se associar comnosco estão de accordo n'este intuito, nem era possivel que deixassem de o estar.

Agradeço aos illustres deputados, os srs. Coelho do Amaral, Pereira de Miranda e Mariano de Carvalho, a declaração que fizeram. Nós contâmos com o seu apoio, como com o apoio da camara e do paiz, porque hão de convencer-se todos da sinceridade das nossas declarações e da resolução em que estamos de as levar a effeito.

Quanto ao projecto a que alludiu o illustre deputado, tomei nota d'elle e hei de empregar os esforços que de mim possam depender para que passe na outra camara.

Creio que dei á camara uma demonstração do meu desejo de contribuir para o desenvolvimento da viação municipal, no pouco tempo em que tive a honra de gerir a pasta das obras publicas (apoiados).

O meu collega, actualmente encarregado d'essa pasta, está inteiramente nas mesmas idéas, e ha de completar muito melhor do que eu o meu pensamento n'esta parte.

Vozes: — Muito bem.

O sr. Pinheiro Borges: — Algumas camaras municipaes, e entre ellas a da notavel villa de Montemor o Novo, representaram ao parlamento, pedindo auctorisação para poderem remir os fóros inferiores a certa quota, independentemente da acção superior da direcção geral dos proprios nacionaes.

Eu tive a honra de ser o apresentante da representação a que alludo, bem convicto de que as complicações proprias dos processos que têem de seguir por qualquer das repartições do estado, e a despeza necessaria para effectuar qualquer remissão, têem dado o resultado de que áquem de certo limite os emphyteutas preferem continuar com a propriedade onerada a gastar no processo da expropriação muito mais do que o valor do fôro; acrescendo ainda a esta circunstancia o incommodo de vir á capital tratar do processo, ou o de passar procurações, e arranjar procuradores para que o sigam.

Não fui só eu que apresentei sobre o assumpto uma representação n'esta casa. O meu illustre collega e amigo, o sr. Francisco Costa, tambem apresentou outras das camaras municipaes de Mafra e Cintra; e consta-me que muitas camaras não representaram em igual sentido, porque o assumpto é tão simples e a necessidade tão manifesta, que era de esperar que logo que apparecesse n'esta casa qualquer iniciativa de petição, o sr. ministro da fazenda se apressaria a apresentar uma proposta de lei que, satisfizendo ás reclamações das camaras municipaes, seria de grande proveito para a propriedade, concorrendo para a libertar de encargos.

Rogo portanto a s. ex.ª o ministro, e ás commissões que têem de dar parecer ácerca das representações, que tratem com urgencia do assumpto, que é de interesse geral, porque muitos municipios hão de tirar d'estas remissões alguns recursos.

Como está presente o sr. ministro da guerra, tambem desejo chamar a attenção de s. ex.ª sobre a necessidade de se codificar toda a legislação militar.

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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

As repetidas reformas do exercito; a quasi diaria publicação de portarias nas ordens do dia, muitas vezes contrarias ao espirito de outra parte da legislação urgente, têem produzido na legislação militar uma grande confusão por que, como s. ex.ª muito bem sabe, as ordens do exercito têem força de lei. Tudo isto faz com que a legislação militar exista n'um cahos, de que é preciso que se tire.

Esta necessidade de codificar toda a legislação militar não é moderna. O sr. marquez de Sá da Bandeira em 1868, creio eu, deu terminantes ordens e instrucções ao director geral e chefes das repartições do ministerio da guerra, para que se fizessem alguns trabalhos que deviam servir de base a esta codificação.

É pois provavel que exista actualmente um grande subsidio para facilitar a empreza, porque em tres annos alguma cousa se deve ter feito, e não me consta que se tivesse dado contra ordem que sustasse a apresentação dos trabalhos pedidos.

Esta necessidade ê urgente, porque d'ella tem por muitas vezes resultado o arbitrio, e, como v. ex.ª sabe, a força publica deve ser dirigida por meio de regulamentos severos e austeros, mas nunca por actos arbitrarios.

D'esta confusão de leis, d'esta multiplicidade de portarias, resulta muitas vezes que no ministerio da guerra se proceda de um modo muito irregular, e que decidindo-se favoravelmente uma pretensão n'um dia, igual pedido não é attendido no dia immediato.

N'um dia, por exemplo, dá se muita importancia e faz-se logo obra sobre uma consulta do supremo tribunal de justiça militar, porque aproveita a quem se quer servir; no dia seguinte, porque aproveita a quem se quer contrariar, as consultas do mesmo tribunal põem-se de parte. Isto não póde ser.

Desejava tambem chamar a attenção de s. ex.ª sobre a necessidade de apresentar os regulamentos necessarios para que se ponha em pratica a lei das promoções.

Como as cousas se têem passado n'estes ultimos annos não é possivel continuar; e, sem querer acreditar que tenha havido intenção de preparar terreno, e de commetter arbitrariedades para especular com a promoção, é certo que se têem dado coincidências suspeitas, tendo acontecido haver rigor demasiado em certas epochas, para deixar de o haver n'outras.

Em certo tempo, por exemplo, exigiram-se exames, que foram dispensados quando a promoção se approximou de quem podia influir n'estas variantes de habilitação.

N'outras occasiões ha grande rigor nas inspecções sanitarias, o que dá logar a muitas reformas, augmentando consideravelmente a despeza com a classe dos reformados e accelerando a promoção de certas armas; de repente deixa de haver este rigor, os reprovados n'esta epocha ficam fóra das fileiras, aonde fariam muito melhor serviço do que os dados por aptos nas epochas de benevolencia. Ora para que se não diga que ha intenção na pratica d'essas arbitrariedades; para que não haja abusos, é necessario que a lei das promoções, suspensa por falta dos indispensaveis regulamentos, seja quanto antes posta em execução.

É necessario que o arbitrio acabe nas cousas militares, e que se não dêem occasiões para que se apresentem suspeitas que a disciplina não comporta. A disciplina não admitte o arbitrio, nem se confunde com elle, sustenta-se pela convicção da sua necessidade; e a convicção não póde existir quando as leis principaes da organisação militar forem parciaes, e favorecerem injustiças estabelecendo desigualdade de direitos, condições e garantias, que não podem ter justificação.

O sr. Ministro da Guerra: — Não poderei satisfazer, como desejava, a interpellação do illustre deputado que me precedeu, porque é a primeira vez que tomo a palavra n'esta casa, e mesmo não estava prevenido como era necessario que o estivesse.

S. ex.ª fallou na lei das promoções; pergunto, quem publicou essa lei? De que tempo é, e que data tem? Quem a assignou? O ministro actual não tem culpa do que fizeram ou deixaram de fazer os seus antecessores.

O ministro actual nomeou uma commissão para tratar da reforma das instituições militares actuaes. Essa commissão está trabalhando com muito zêlo e tratando de apresentar os seus trabalhos, o portanto a boa rasão e a delicadeza pedem que o ministro da guerra se não precipite a apresentar mais medidas emquanto não vierem os trabalhos da commissão, e quando elles vierem hei de apresentar esses e muitos outros.

Uma das cousas que é preciso fazer é codificar as leis militares, porque está tudo disperso e confuso; mas não é o ministro da guerra actual o culpado d'esse estado.

Logo que chegue a occasião opportuna, e que eu seja coadjuvado com os trabalhos da commissão, hei de cumprir o meu dever.

O sr. Pinheiro Borges: — Não fiz censura alguma ao sr. ministro da guerra (apoiados). Chamei a attenção de s. ex.ª para aquelles objectos de que tratei, a porque alguns defeitos são antigos, por isso pedi remedio para elles.

O sr. Freitas e Oliveira: — Mando para a mesa a seguinte nota de interpellação (leu).

Abstenho-me de fazer qualquer observação sobre o assumpto d'esta interpellação no momento actual, porque não quero fazer uma surpreza ao sr. ministro, e antes desejo que s. ex.ª esteja preparado para responder e dar explicações que satisfaçam não só a esta camara, mas tambem ao partido liberal a que tenho a honra de pertencer.

O sr. Francisco de Albuquerque: — Não podia deixar de pedir a palavra depois do meu collega e amigo, o sr. Coelho do Amaral, fallar no importante assumpto da viação municipal, que tem merecido a minha attenção especial n'esta camara. Eu tambem fazia tenção de fallar sobre esta materia e de pedir a attenção dos srs. ministros das obras publicas e do reino, como já o tinha feito na sessão passada, quando ainda era ministro das obras publicas o sr. marquez d'Avila, dando me por essa occasião s. ex.ª explicações que me satisfizeram, e estando eu certo que s. ex.ª havia de cumprir a promessa que fez se circumstancias politicas não viessem interromper os trabalhos parlamentares.

Agora fico satisfeito tambem com as explicações que s. ex.ª deu, mas eu desejava ir um pouco mais adiante do pedido que fez o sr. Coelho do Amaral.

Eu peço aos srs. ministros das obras publicas e do reino que hajam de reformar a lei de 6 de junho de 1864 em conformidade com as necessidades dos municipios e do paiz (apoiados). Aquelle projecto é de grande necessidade que passe quanto antes na nitra camara, mas julgo indispensavel fazer uma reforma radical na lei, e que nos não satisfaçamos com esta pequena reforma ou alteração, que comtudo é de maximo interesse...

O sr. Coelho do Amaral: — Mas que não prejudique a prompta approvação do projecto que está na outra casa.

O Orador: — É claro. Este para já porque é mais urgente, e não soffre as delongas que deve necessariamente haver para uma reforma completa de toda a lei de 6 de junho de 1864. O que eu quiz dizer foi que precisámos de mais alguma cousa do que o pedido por v. ex.ª

Por consequencia eu limito-me tambem a chamar a attenção dos illustres ministros, e estou convencido de que ss. ex.ªs hão de presta-la a este assumpto que bem a merece. S. ex.ª, o sr. marquez d'Avila, já declarou que não se havia de esquecer d'este negocio, e eu confio muito na promessa de s. ex.ª

Aproveito esta occasião para tambem dizer a v. ex.ª e á camara, que faço igual declaração ás que fizeram os meus collegas e amigos os srs. Pereira de Miranda e Marianno de Carvalho. Estou convencido de que o governo cumprirá aquillo que disse, e assim corresponderá com os seus actos á espectativa de todos nós,

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Por consequencia ha de merecer o apoio da camara, e os meus pequenos recursos e serviços ficam á disposição do governo, como ficariam á de todo aquelle que, considerando a gravidade da nossa situação, olhar com seriedade e proveito para os interesses do paiz.

Eu declaro a v. ex.ª que folgo muito em fazer esta declaração; e folgo tanto mais em poder dar este apoio ao governo em vista das medidas que prometteu, e da politica que disse seguir, quanto é certo que pela minha parte devo muito reconhecimento ao nobre presidente do conselho, e sinto muita satisfação em dar a s. ex.ª este publico testemunho...

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Muito agradecido.

O Orador: — Reconheço a sua intelligencia, e os serviços que tem prestado á causa publica, não posso pois deixar de lhe prestar homenagem.

Tenho dito.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Pedi a palavra unicamente para agradecer ao illustre deputado as expressões benevolas que me dirigiu e que eu não mereço, e asseverar que eu me encarrego de empregar todos os esforços para que o projecto a que s. ex.ª se referiu, assim como o sr. Coelho do Amaral, passe com a maior brevidade possivel.

O sr. Rodrigues de Freitas: — Pedi a palavra para mandar para a mesa um projecto de lei.

Peço a v. ex.ª que lhe dê o destino conveniente.

Mando tambem para a mesa um requerimento pedindo, pelo ministerio das obras publicas, seja remettida com urgencia uma nota das sociedades anonymas, ás quaes tenha sido concedido por contrato, que ainda hoje vigore, isenção de pagamento de impostos.

O sr. Presidente: — Está quasi a dar a hora.

A ordem do dia para segunda feira são os projectos n.º 30, 29, 21 e 31.

Está levantada a sessão.

Eram quasi quatro horas.

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