O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

198

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

importante e fundamental da proposta que acabei de ler.

Nos reinados de D. Affonso IV e de D. João I a pesca da baleia tinha assumido grandes proporções, pois que vemos da carta de 1 de setembro de 1352, e de outra de 15 de março de 1424, que se concedia a baleiação a differentes individuos, o que prova que a pesca da baleia era importante no nosso paiz n'esse tempo.

Hoje todos sabem que esta pesca não tem importancia alguma, é completamente nulla, pois que só por acaso as ondas arrojam ás praias algum d'esses enormes cetaceos.

No tempo de D. Affonso IV e D. Affonso V vejo que se tomaram differentes providencias para se assegurar o estabelecimento de uma esquadra que protegesse os nossos estabelecimentos piscatorios e a exportação das pescarias que em larga escala se fazia por Vianna, Villa do Conde e outros pontos não só para os nossos vizinhos de Hespanha, mas principalmente para os portos do Mediterraneo, Levante e Inglaterra, etc.

Vejo que até ao fim do seculo passado pelas cartas de 15 de janeiro de 1450, 30 de setembro de 1483, e pelo alvará de 2 de março de 1711 concedeu se o monopolio da pesca do coral a differentes individuos, e entre outros ao duque de Tarento por tres annos. Isto demonsta que sendo este paiz desde alta antiguidade abundantissimo em pescarias, tem, pela incuria e desleixo da classe dos pescadores e dos poderes publicos, deixado chegar essa fonte de riqueza e prosperidade ao estado de decadencia em que actualmente se acha. D'aqui deduzo que é preciso que a industria da pesca seja regulamentada, e como corollario que seja regulamentada tambem a ostricultura como sua parte importante.

N'este ponto todos concordam, mas no que não concordâmos é nos meios que o ministerio apresenta para chegar áquelle resultado; no que não estamos de accordo é na modalidade com que o governo pretende revestir o decreto promulgado em 15 de dezembro de 1868.

Isto leva-me a analysar desde já os pontos mais importantes das considerações do sr. ministro das obras publicas, nobre e intelligente caracter, diante do qual me curvo reverente; mas v. ex.ª comprehende que estas considerações, que são de grande peso para altearem s. ex.ª na minha estima, não valem nada para me impedir de tratar a questão desassombradamente; e peço a s. ex.ª que, se nas considerações que vou fazer eu interpretar mal as suas palavras, tenha s. ex.ª a bondade de o declarar, porque sinceramente desejo ser esclarecido.

Dizia s. ex.ª: «É necessario o monopolio, porque é o desiderandum da regulamentação d'esta industria; se elle acabasse, se deixasse de existir, mal iria á industria piscatoria».

Eu concordo em que é necessario haver o monopolio, mas no que não concordo é em que o monopolio exista pela maneira por que o governo quer que nós o admittamos.

Que o monopolio exista, para que um certo e determinado cidadão possa construir parques de engorda ostreiras e especular com ellas, de maneira que se aproveitem as riquezas que elle saiba arrancar ao mar, nada mais justo e consentaneo com os principios que regulam a nossa sociedade civil, com os principios da carta constitucional, e com os verdadeiros interesses das nossas pescarias; mas o que não posso admittir é que o monopolio seja concedido em condições taes que, envolvendo todo o litoral aproveitavel, offenda, a meu ver, o artigo 145.° §§ 21.º e 23.° da carta constitucional, como me parece que já hontem aqui um sr. deputado nos disse.

Eu vejo que na Belgica, na Hollanda, na Dinamarca e na Inglaterra, onde ha ostreiras ricas, antigamente mais ricas talvez do que as nossas, e hoje se não tão ricas, isso depende das condições ichtylogicas dos mares que banham esses paizes; vejo, digo, que ali as providencias que se têem tomado para regalar a industria da ostricultura admittem os monopolios até certo ponto, mas não o levam ao excesso que revela o contrato que s. ex.ª apresenta para nós approvarmos.

Concedem-se ali certas e determinadas zonas para se estabelecerem bancos artificiaes de ostreiras ou parques para engorda das ostras e seu desenvolvimento, mas o que não vejo é que em paiz nenhum d'estes se conceda a um certo e determinado concessionario a área toda, todos os bancos, todas as ostreiras d'esse paiz.

Isto é que creio que s. ex.ª me não póde mostrar em paiz algum; e não obstante são paizes importantissimos que nos devem servir de modelo, não só n'isto como em muitos outros ramos de administração, mas particularmente n'este que tem importancia como fonte de alimentação e como fonte de riqueza publica.

Diz s. ex.ª, que a regulamentação é necessaria; de accordo, mas regularise-se, combinando o exercicio da propriedade particular com o livre direito que todos os cidadãos têem de usarem livremente, nos limites da lei e dos regulamentos, das faculdades da sua intelligencia e dos seus capitaes.

Seja permittido a A, a B ou a C estabelecer um parque para engorda das ostras em qualquer ponto do paiz onde ellas porventura existam, conceda-se-lhes o monopolio da exportação dos productos d'aquella zona, nada mais justo e consentaneo com o nosso direito civil, e mesmo com as nossas leis fundamentaes; mas se qualquer d'estes individuos vier pedir a concessão exclusiva, para elle só explorar a ostricultura em todo o paiz, isso é o que me parece que realmente as leis não consentem, nem a indole constitucional das nossas instituições o permitte.

Toda a gente sabe que a propriedade das minas é uma propriedade tão respeitavel, tão sagrada, tão magestatica, como é a propriedade territorial, como é a propriedade urbana e a propriedade rustica. Pois bem; todos hesitariamos em conceder a um só concessionario, embora poderosissimo, a exploração de todas as minas do paiz. Porque deixaria de haver o monopolio que concorre e desenvolve, para haver o monopolio que esmaga e aniquila.

Esta questão está perfeitamente no mesmo caso.

Todos têem direito de pedir que se lhes conceda a exploração d'esta ou d'aquella mina, prestando-se ás condições que as leis e regulamentos estabelecem, e que o sr. ministro das obras publicas sabe melhor do que eu que são apenas para que a concessão não seja uma illusão, para que a nação não seja defraudada nos seus justos interesses, para que o governo não seja illudido.

Eu tenho muito receio d'esta concessão de que se trata. As rasões e algarismos que se apresentaram, cuja linguagem é eloquente, por isso mesmo que é simples, creio que provam que este projecto, cuja approvação se nos pede, não é tão simples como realmente parece.

Estava resolvido, sr. presidente, a votar a favor da concessão pelas considerações que fiz, pelo desprezo e mau uso que os pescadores fazem da sua liberdade, prejudicando elles mais do que ninguem os seus interesses futuros; não obstante, as considerações que se fizeram levaram me a hesitar, a ter serios receios; as palavras do nobre ministro das obras publicas, que eu esperava que me haviam de tranquillisar, sobresaltaram-me, de modo que hoje duvido de dar a minha approvação a este contrato.

Disse-nos s. ex.ª que se acaso não mencionassemos a restricção, a liberdade da exportação implicava essa restricção o contrato mesmo, que se não concedessemos ao concessionario o privilegio exclusivo da exportação, iriamos prejudicar a industria particular. S. ex.ª liga este direito ao direito sacratissimo da propriedade. Parece-me que ha n'isto equivoco. Discrepo das idéas de s. ex.ª

Que o concessionario tenha direito sacratissimo á propriedade dos parques artificiaes, ninguem questiona; mas s. ex.ª sabe que em toda a parte onde ha parques artificiaes, de pouco servem estes sem os bancos naturaes que os alimentam.

Aqui o que se pede é o direito exclusivo de exportação,