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APPENDICE Á SESSÃO N.° 17 DE 12 DE FEVEREIRO DE 1898 302-A

Discurso do sr. deputado Dias Ferreira, que devia lêr-se a pag. 292 da sessão n.° 17 de 12 de fevereiro de 1898

O sr. Dias Ferreira (continuando): - Entro já no fundo do projecto em discussão.

Em assumpto de tanta magnitude, não seria justo occupar-me com mais largueza das questão secundarias a que o incidente de hontem porventura se prestasse.

Começo por declarar a v. exa. e á camara que tres são os topicos principaes da minha oração, ou antes tres os argumentos capitaes com que justifico o voto contra o projecto.

Quero ser bem explicito na exposição dos factos que mais feriram a minha attenção e mais particularmente condemnam o projecto sujeito ao debate parlamentar, para ficar bem clara o bem nitida a minha idéa, e com toda a lucidez definido o meu pensamento.

A primeira rasão por que voto contra, é porque o projecto torna quasi impossivel a conversão, reclamada pelos interesses do thesouro e pelas necessidades do paiz.

Esta medida, desde o primeiro dia denominada projecto de conversão, simplesmente porque esse nome lhe foi dado no relatorio official que acompanhou as propostas de fazenda, é, depois da remodelação, a antithese da conversão indispensavel para regularisar a situação da fazenda publica, porque, longe de a favorecer, impossibilita de futuro os trabalhos necessarios á verdadeira conversão da divida publica.

O primeiro argumento, pois, contra o parecer sujeito ao nosso exame, é que similhante providencia, longe de auxiliar, voe prejudicar qualquer projecto de conversão da divida.

Segunda rasão. As percentagens, juros, dividendos, ou como melhor lhes quizerem chamar, que o projecto, garante aos credores estrangeiros, poderão ser satisfeitos no primeiro ou no segundo anno. Mas o thesouro não póde com ellos por muito tempo, a não paralysar o movimento de outros serviços necessarios para a regularidade da vida nacional.

E seria não só perigoso, mas contrario a todas as noções do decoro politico, assignar um contrtao que de antemão se sabe que poucos annos poderá ser cumprido!

Terceira rasão. Por mais disfarçada que venha e por mais encoberta que appareça, está no projecto, e em mais de um artigo, a administração estrangeirai (Apoiados.)

Já disse hontem a v. exa. e á coroara que a administração estrangeira, como qualquer acto e violencia por parte do estrangeiro, poderá ainda pesar sobre a nosso paiz.

Não seria a primeira vez que Portugal tem sido victima da violencia estrangeira, e comprehende-se que o paiz se resigne com a administração estrangeira imposta á viva força.

Mas não só comprehende que seja precisamente o parlamento, a assembléa dos representantes da nação, que abra com o seu voto as portas á administração estrangeira! (Apoiados.)

Para obter um emprestimo ainda á custa de todos estes desastres é que se apresenta uma providencia com o rotulo de conversão, quando similhante medida nem sombra tem de conversão.

Mas desde que o illustre ministro da fazenda, no seu relatorio financeiro do anno passado, lhe chamou conversão, toda a imprensa e toda a gente politica repetiu o mesmo nome; quando o projecto é de anti-conversão.

O sr. ministro da fazenda apresentou ao publico a proposta com este rotulo; mas quem quizesse dar-se ao incommodo de ler escusava do certo de abraçar a nuvem por Juno, porque no relatorio que precedia os propostas de lei se explicava claramente o que era o projecto da conversão.

Dizia o sr. ministro muito clara e nitidamente no relatorio, que lhe era indispensavel a conversão para abrir ao credito portuguez as bolsas estrangeiras, que estavam bloqueadas.

O governo queria romper o bloqueio, a fim do levantar um emprestimo para viver socegadamente alguns annos e para preparar a rehabilitação nacional.

O relatorio exprimia-se assim: «Para isto julgo indispensavel ligar á conversão da divida a realisação de uma operação de credito sufficientemente avultada para fornecer ao governo ao meios de prover durante alguns annos ás remessas de oiro para o estrangeiro em pagamentos de encargos publicos.

«Elimina-se para o thesouro a necessidade da compra de cambiaes, desapparece o mais forte concorrente ao mercado para provisões de oiro, e necessariamente benefica seria a influencia exercida sobre o premio do metal. Torno-se então possivel a suspensão do recurso permanente ás emissões da moeda-papel; ficam mesmo disponiveis no orçamento sommas bastante avultadas para attender á eliminação do meio circulante depreciado; beneficia-se largamente o paiz nas suas condições de trabalho e de actividade, o dá-se tempo á nação para repor paciente o corajosamente, pelo trabalho e pela producção, a riqueza nacional indispensavel á reconstituição das reservas metallicas e á collocação definitiva dos titulos de divida, cujo valor está actualmente antecipado nas notas emittidas.»

Pois, sem embargo de explicação tão clara, a idéa de quasi toda a gente e a linguagem da imprensa é de referencia a um projecto de conversão, quando nem o primeiro parecer se podia chamar projecto de conversão, nem as nossos especiaes circumstancias nos permittem pensar sequer em conversão, como é elementar para todos que lidam em questões financeiras.

Poderio fazer conversão o governo francez, o governo inglez, o governo belga e o governo hollandez ou qualquer outro com finanças prosperas. Nós não.

A verdadeira conversão representa o offerecimento ao credor de juro menor ou o reembolso do titulo ao par.

Se o estado, que paga 4 1/2 por cento, offerece ou portador do titulo 3 por cento, por exemplo, ou o reembolso do titulo, dá-se a verdadeira conversão, porque se resgatam os titulos antigos, e offerecera-se titulos novos com juro mais diminuto.

Mas similhantes conversões não as fazem, nem as podem fazer, senão os paizes de finanças prosperas e acreditadas, cujos fundos têem cotação alta e merecem tal confiança, que os credores preferem de ordinario novos titulos, contentando-se com juro menor.

Esta é a verdadeira e unica conversão no rigor da linguagem financeira. Ora, similhante conversão não a podemos nós fazer.

O que estamos discutindo é uma conversão concordataria, ou antes um emprestimo com caução.

Seria util uma conversão concordataria, não só por motivos financeiros, quando d'ahi resultasse grande diminuição de encargos, mas até por motivos politicos.

Grande parte do paiz está inquieta e sobresultada com a questão dos credores externos, receiando complicações que affectem a integridade governativa da nação.

Ora é preciso retirar da scena politica fato ponderoso motivo de desassocego.