O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

263

Discurso ano devia ler-se na sessão n.° 20 d'este vol. pag. 232, col. 2.º, lin. 4.

0 sr. Bettencourt: — Eu pedi a palavra para demonstrar que com o systema actual de prover as cadeiras das nossas escolas de applicação, é incompativel a idéa que o illustre deputado o sr. José Estevão apresentou.

S. ex.ª parece-me que admitte como principio na sua proposta que = sendo as sciencias de construcção estudadas e praticadas pelos engenheiros, ninguem deve exercer os cargos do magisterio que lhe dizem respeito, em melhores condições do que os engenheiros, elles mesmos =. Este principio parece-me ser admittido nas escolas de applicação dos paizes estrangeiros, escolas muitas das quaes são reputadas as melhores do mundo, como as francezas. Ali esses logares do magisterio são exercidos por homens em commissão, a maior parte d'elles. Este systema importa comsigo grandes vantagens. Quando um official engenheiro esta ha dez annos sem praticar uma construcção qualquer, elle deixa de ser engenheiro. Todo o official artilheiro que não pratíca por longo tempo nas construcções especiaes proprias da sua arma, deixa do ser artilheiro. O official que se diz do estado maior, que se não acha em circumstancias de desenvolver no gabinete um espaço ou uma extenção de dez leguas de estrada percorrida a galope, dando uma representação do terreno sufficiente para servir de base aos planos do general, não serve de official do estado maior. Portanto, um engenheiro que rege uma cadeira durante o espaço de dez annos consecutivamente, póde ser um excellente lente theorico, mas não pratico. Ha grande distancia da pratica á theoria; esta, na applicação, soffre certas modificações quo só podem ser cabalmente conhecidas pelos homens versados na elaboração dos projectos de construcções e na confecção das obras.

Por conseguinte eu entendo que os logares do magisterio deveriam ser exercidos por officiaes em commissão; mas não se admitte esse principio entre nós, por consequencia exigir-se hoje para habilitação do concurso que os concorrentes apresentem documentos de lerem visitado construcções nos paizes estrangeiros, de terem elaborado projectos, etc, é uma condição que passados cinco, seis, dez annos é perfeitamente inutil; porque com o tempo as sciencias progridem, as theorias variam, diversas devem pois ser as modificações que ellas soffrem na applicação. E taes documentos são muito difficeis de apreciar: quem póde avaliar quanto aproveitou um engenheiro visitando um caminho de ferro, uma praça, um porto de mar? Como conhecer bem uma construcção feita por elle sem a ver, sem a examinar?...

O sr. José Estevão: — Mas é que eu não supponho que um lente esteja dez annos sem praticar; isso só aqui.

O Orador: — Mas eu refiro-me ao que se passa no nosso paiz e não ao que se passa nos outros. Todo o engenheiro que adquire a propriedade de uma cadeira, não a abandona para se ir entregar a trabalhos de engenheria civil que tenham alguma importancia, para ir contrahir uma responsabilidade muito superior e que lhe impõe um trabalho physico e espiritual, muito maior, sem augmento de vencimento. Por consequencia eu acho que inserir hoje na lei a condição dos concorrentes lerem um tirocinio pratico servirá de alguma cousa por algum tempo, mas no fim de dez annos não serve para nada. Fallaram alguns illustres deputados no curso de engenheria civil da escola do exercito. A lei ou decreto de 12 de janeiro de 1837, que organisou a escola do exercito, determinou que houvesse n'esta escola um curso de engenheria civil, mas este curso nunca se organisou. Tanto assim que o conselho da escola não se acha hoje habilitado para passar diplomas de curso de engenheria civil a ninguem absolutamente, nem mesmo aos paizanos que frequentem a escola. A escola passa diplomas a militares e a paizanos, mas com tanto que tenham estudado as theorias completas de um curso de instrucção militar. Se o alumno se dedicou á artilheria, quer lenha praça ou não, passa-lhe diploma do curso de artilheria, e passa-o ao paizano da mesma maneira por que o passaria ao militar, mas nunca dá diploma de engenheria civil. Isso provém de que a lei não determina positivamente quaes sejam as disciplinas que devem constituir o curso de engenheria civil, o que, na minha opinião, e necessario.

Vejo presente o nobre ministro da guerra, que tem a seu cargo a escola, peço-lhe que tenha a bondade de olhar por ella e de ver se isto é ou não de necessidade que ali exista...

O sr. Ministro da Guerra (Antonio Rogério Gromicho Couceiro): — Isso está a cargo do conselho.

O Orador: — Eu não sei se está a cargo do conselho, o que sei é que não existe. E mesmo dar diplomas de curso de engenheria civil a paizanos não lhes offerecendo as mesmas garantias que se offerecem aos alumnos militares, e perfeitamente inutil, ninguem se dedica a uma carreira sem futuro. O alumno militar immediatamente que termina o curso preparatorio da arma a que se dedica, isto é, quando tem quatro annos de estudos completos, tem direito a graduação de alferes alumno, tem o vencimento regular de 12$000 réis mensaes e tem uma carreira aberta diante de si no futuro; não acontece o mesmo ao paizano que frequenta a escola.

Sr. presidente, o que é necessario é separar os dois grupos de conhecimentos humanos de que nos lemos occupado, porque qualquer d'elles é vastissimo. É impossivel no espaço de tres annos abranger todas as theorias de engenheria militar e de engenheria civil, como se exige na escola do exercito. Basta reflectir que nas escolas estrangeiras esta» theorias são separadas e constituem exactamente cursos de -tres annos. O curso da escola de pontes e calçadas de París I é o de tres annos. O curso da escola de engenheria militar em França não sei se é de tres annos, mas na Prussia certamente é. D'isto resulta um grande inconveniente, que é que nunca da escola do exercito, no estado em que ella se acha, hão da saír alumnos que possam realisar bem na pratica qualquer das theorias que ali são professadas, porque é tal o complexo das theorias que elles não podem estuda-las com a meditação, com a profundidade necessaria.

Póde dizer-se que estudam simultaneamente engenheria civil e militar, porque os engenheiros militares, assim como os artilheiros, assim como os officiaes do estado maior precisam ter conhecimento de construcções civis, porque em muitas occasiões têem de as praticar. Isso é a verdade, mas ha uma distincção profunda entre as construcções effectuadas por engenheiros militares e as construcções da mesma especie effectuadas por engenheiros civis; estas pela maior parte prestam serviços a muitas gerações successivas, e não acontece o mesmo aos trabalhos analogos effectuados pelos engenheiros militares. Muitas vezes, em campanha, para ligar diversos pontos de uma linha de operações, tactica ou estratégica, ou para ligar diversas linhas entre si póde ser necessario abrir communicações, porque as que se acham praticadas não sejam sufficientes; mas esses trabalhos desapparecem immediatamente que a paz se restabelece. Se é necessario construir uma ponte, a maior parte das vezes é feita de madeira. Por consequencia o engenheiro militar precisa ler conhecimento da engenheria civil, assim como precisa o artilheiro e o official do estado maior, mas não precisa conhece-la tão profundamente como o engenheiro civil propriamente dito. (Uma voz: — E as fortificações permanentes?) Os trabalhos das fortificações permanentes prestam serviços por muitos seculos. Todos sabem que no lodo de construcções, que constituem uma praça, ha communicações, pontes, arsenaes, officinas, ás vezes até são necessarios canaes, reprezas, etc. etc; mas para ahi basta ao engenheiro militar ler conhecimento profundo de construcções militares e consultar o engenheiro civil na parte em que elle encontrar difficuldade, e certamente o contacto que ha entre estas duas classes de constructores é sufficiente para que se coadjuvem mutuamente sem inconveniente nenhum para o serviço do estado. Sr. presidente, eu não desejo que se organise immediatamente um corpo de engenheiros civis porque

Vol. II—Janeiro—1858.

20