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Discurso que devia ler-se a pag. 16, col 2.ª, lin 50, da sessão n.º 2 d’este vol.

O sr. D. Antonio da Costa: — Continuarei a indicar algumas questões que eu entendo que devem ser trazidas para esta discussão, e porque o discurso da corôa não falla n'ellas, por isso mesmo eu entendo que é indispensavel que n'ellas fallemos,.

Apontarei a reforma das cadeias. O estado das nossas cadeias é o mais lastimoso possivel; os srs. deputados são das provincias, e por isso mesmo podem conhecer e avaliar o estado em que as prisões se acham; por consequencia eu sôbre este ponto não digo mais nada. vou unicamente apresentar as minhas idéas sôbre a maneira de remediar este estado, para que peco a attenção da camara.

A opinião publica tem uma idéa a respeito da reforma das cadeias que me parece que não é exacta. Entende-se geralmente no paiz que a reforma das cadeias consiste na creação de unia penitenciaria modelo, e suppõe se que logo que ella se crie, a reforma das cadeias esta realisada. Não é assim. Note a camara que o principal não é tratar dos presos condemnados á pena de prisão de dois annos para cima, porque esse numero é muito menor do que o dos condemnados á pena de dois annos para baixo, e ha ainda a classe dos delictos, que são aquelles que segundo o estado lastimoso do nosso processo antes de serem condemnados estão dois, tres, quatro e uma immensidade de annos II a cadeia. Por consequencia a questão não é a creação de uma penitenciaria modelo; muito bom seria que se creasse, mas a questão é a reforma das cadeias locaes, e para isso é que eu chamo a attenção da camara.

Eu entendo que a maneira de reformar as cadeias é a seguinte. Primeiramente dividi-las em tres classes; nacionaes, districtaes e municipaes; Cadeias nacionaes as de Lisboa e Pôrto, por isso mesmo que recebem os presos de todas as localidades do paiz, e alem d'isso uma penitenciaria modêlo para quando for possivel, e estas serem custeadas pelo estado. As cadeias districtaes, que são as mais importantes, devem ser feitas pelas juntas geraes de combinação com o auxilio que der o governo; e as cadeias municipaes deverá ser feitas por conta dos municipios. De maneira que estabelecendo nós uma penitenciaria modelo gastaremos 200 a 300:000$000 réis; com esses 200 a 300:000$000 réis, de combinação com as quantias fornecidas pelas juntas geraes, teremos a reforma das nossas cadeias districtaes.

Eu podia apresentar mais considerações sobre este ponto, mas unicamente chamo a attenção do governo sôbre elle, porque é esta uma questão de moralidade.

As nossas cadeias não são cadeias, são casas de prostituição; e preciso que.se diga a verdade, são casas de prostituição. Quer a camara saber o que acontece? Quando e preso um pae de familia, para que seus filhos não fiquem ao desamparo, leva-os para a cadeia, de modo que as nossas cadeias estão hoje sendo povoadas por uma immensidade de creanças de sete, oito, nove e dez annos, como eu vi e presenciei por occasião da visita de Sua Magestade a Rainha, de saudosa memoria, ás provincias do norte. Eu acompanhei Suas Magestades, e aproveitei o ensejo para visitar a maior parte das cadeias do reino. Vi e entrei em quasi todas as cadeias da Estremadura, em muitas da Beira e em quasi todas do Minho; conheço quasi todas as cadeias das provincias do norte, e realmente o seu estado é lastimoso tanto pelo lado material como pelo moral. É forçoso acudirmos a este mal quanto antes.

Passando ao nosso systema de beneficencia, reputo-o atrazado bastante. Nós tinhamos o primeiro systema de beneficencia quando os outros paizes não tinham nenhum ou quasi nenhum; hoje que os outros paizes passaram por cima de nós, ficâmos com o que naquella epocha possuiamos, mas que hoje não esta ao par da epocha. Por consequencia é necessario sobre este ponto chamar a attenção da camara e do

govêrno. O estado da beneficencia publica é o mais lastimavel possivel. O estado da contabilidade das misericordias, dos hospitaes, das irmandades e confrarias chegou ao ultimo apuro; a contabilidade esta pessima; muitos fundos acham-se perdidos, e muitos titulos extraviados. Quando não queiramos fazer uma reforma em grande, remediemos ao menos os abusos existentes, e demos direcção a estes estabelecimentos. Eu entendia que era da maior conveniencia diminuir o numero das misericordias pequenas, que é da maior conveniencia crear nas misericordias as caixas economicas, estabelecer os monte-pios das classes laboriosas, dando a estes as misericordias os remedios de botica e facultativos. Alem d'isto n'esta materia de beneficencia, eu entendo que é necessaria uma reforma sôbre as contas destes estabelecimentos, derogando o artigo do codigo administrativo que impõe aos administradores de concelho a tomada gratuita da contabilidade pia.

Não quero passar adiante, sem chamar a attenção da camara sôbre um ramo importante da beneficencia: a materia dos expostos. As camaras applicam os rendimentos proprios, contribuições directas e indirectas, tudo para os expostos, e estes é que consomem quasi todos os rendimentos municipaes; não lemos hoje os beneficios da organisação municipal; não se attende á instrucção publica; em todos ou quasi todos os paizes do mundo quem paga a instrucção primaria são as localidades, e entre, nós é o governo, pois as camaras municipaes pagam apenas 20$000 réis por escola. É preciso tratarmos d’esta questão dos expostos: eu peço ao governo que traga a questão dos expostos ainda este anno á camara, (Apoiados.) e se ss. ex.ªs não podérem, hei de eu traze-la; faça a camara o que quizer, eu hei de traze-la, porque é uma questão de primeira ordem. Eu julgo que se se devem fazer estabelecimentos centraes nas cabeças dos districtos, e que se deve dar aos expostos uma educação não só instructiva mas industrial; e quer a camara saber a rasão por que eu digo isto? É porque eu estou persuadido que quando os expostos de quatorze annos para cima podérem trabalhar, talvez que os trabalhos dêem para lodo ou ao menos para parte do custeamento d'esses estabelecimentos centraes.

A penultima questão para que eu tambem chamo a attenção da camara é para a reforma administrativa, e não a chamaria talvez se não visse ha pouco publicada a portaria de 15 de dezembro ultimo; n'esta portaria o governo recommenda aos governadores civis que tomem muita cautéla na nomeação dos administradores de concelho e regedores de parochia: eu peço a attenção do nobre ministro do reino para esta questão, porque s. ex.ª, reconhecendo perfeitamente a importancia do cargo dos administradores de concelho, recommenda aos governadores civis que não nomeiem para estes cargos os individuos do fóra d'esses concelhos, e que alem d'isso sendo de fóra sejam bachareis formados em direito. Ora eu pergunto ao nobre ministro e á camara: como é que querem para administradores de concelho individuos de fóra d'esses concelhos com ordenados annuaes de 30$000 réis? No districto de Leiria sei eu que alguns administradores de concelho recebem 28, 30 e 40000 réis; e esses mal pagos. Como é possivel d'esta maneira haver administradores de concelho capazes? Como é possivel que um individuo vá para a universidade, onde consome um capital, tempo e estudo, para no fim de tudo ser administrador de concelho com 28$000 réis annuaes? Esta é uma questão importante. Quer a camara saber o que me parece necessario? É crear a carreira administrativa; é precisa uma lei da dotação administrativa; é preciso que o curso da administração publica não seja facultativo, mas seja obrigatorio; é preciso que haja duas classes de administração local de concelhos, que se não seja secretario geral sem ser primeiro ad