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N.º 4. Sessão em 6 de Fevereiro 1849.

Presidencia do Sr. Rebello Cabral.

Chamada — Presentes 48 Srs. Deputados.

Abertura — Eram tres quartos depois do meio dia.

Acta — Approvada sem discussão.

Correspondencia.

Officios. — 1.º Do Ministerio da Guerra, acompanhando todos os papeis comprehendidos desde n.º 1 a 174 inclusive, que naquella Secretaria existem a respeito de José Joaquim d'Abreu, Tenente Coronel na 3.ª Secção do Exercito, a quem Sua Magestade concedeu o soldo do mesmo posto, ficando assim satisfeito o pedido da Commissão de Guerra. — Á Commissão de Guerra.

2.º Do mesmo Ministerio acompanhando o Requerimento do Brigadeiro Reformado, José Vellez

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Cardoso, com as informações que por está Camara lhe foram pedidas. — Á mesma Commissão

3. Do mesmo Ministerio acompanhando o Requerimento do Capitão da 3.ª Sessão do Exercito José Filippe d'Almeida, informando circunstanciadamente a respeito da pertenção do mesmo Official. — Á mesma Commissão.

4.º Do mesmo Ministerio devolvendo o Requerimento do Major Governador da Praça de Chaves, Antonio Rodrigues Lucas, e informando circunstanciadamente a respeito da sua pertenção. A mesma Commissão.

5.º Do mesmo Ministerio devolvendo o Requerimento de Bernardo de Fonseca Pinto, e informando a respeito da sua pertenção. — Á mesma Commissão.

Representações: — Uma dos Empregados addidos á Bibliotheca de Lisboa sobre pagamentos. — A Commissão de Fazenda.

O Sr. J. J. de Mello: — Mando para a Mesa uma rectificação ao Extracto do que eu hontem disse por isso que apparece no Diario do Governo tudo transtornado, e peço que nelle se imprima esta minha rectificação.

O Sr. Presidente: — A Mesa examinará esta rectificação, e se estiver nos termos, manda-se publicar.

O Sr. Baptista Lopes: — Peço ser inscripto para apresentar um Projecto de Lei.

O Sr. Palmeirim: — Participo a V. Ex.ª e á Camara que a Commissão de Guerra nomeou o Sr. Barão de Francos para seu Presidente, em logar do Sr. Barão de Villa Nova d'Ourem.

ordem do dia.

Continuação da discussão do Projecto n.º 66.

O Sr. Presidente: — Na Sessão passada esteve em discussão o adiamento proposto pelo Sr. Deputado J. J. de Mello, sobre o Projecto n.º 66, e não havendo mais ninguem inscripto tractava-se de se votar, se a materia do Adiamento estava sufficientemente discutida, porem não póde haver essa votação por falta de numero legal; por tanto vou sujeitar á votação da Camara se a materia está discutida — Consultada a Camara, decidiu-se affirmativamente, e seguidamente votando-se o Adiamento, verificou-se não haver numero pró ou contra, que constituisse votação legal.

O Sr. Presidente: — Como não houve votação continua o Adiamento em discussão. — (Pausa)

O Sr. Presidente: — Como não ha quem peça a palavra, vou pôr novamente o Aditamento á Votação.

Ainda nesta segunda votação não houve numero pró ou contra, que constituisse votação legal.

O Sr. Presidente: — Visto que é já a segunda vez que este Adiamento não obtem votação, fica reservado para outra occasião em que haja maior numero na Casa. Passa-se portanto á discussão do Projecto n.º 77 que vai lêr-se (F. Sessão n.º 17.º de Julho de 1843 — Foi. 7.º pag. 2.º J

O Sr. Palmeirim: — Sr. Presidente, este Projecto foi declarado em discussão a 20 de Julho do anno passado; a Requerimento do Sr. Deputado Xavier Ferreira foi adiado por dois dias, a fim de se obterem varios esclarecimentos; esteve adiado não só por dois, mas por muitos dias, aponto que não se póde discutir o anno passado.

Sr. Presidente, este Projecto, segundo se deprehende mesmo do Relatorio da Commissão de Guerra, versa sobre assumpto de summa importancia, diz respeito nada menos que a todo o systema de gerencia, disposição, recepção, e distribuição, em summa de tudo quanto é relativo á enorme somma com que é dotado annualmente o Exercito. — Houve em 1841 um Voto de Confiança dado ao Governo a fim de estabelecer, do modo que julgasse mais conveniente, o Regulamento da Fazenda Militar; o Governo não exerceu esse Voto, e logo em 1845 o mesmo Sr. Ministro da Guerra veio dizer á Camara que tinha achado grandes difficuldades para só por si resolver este objecto. Assim esteve este negocio ale 1846. Na Sessão passada porem é que o Governo, quasi no fim da Sessão, e tendo já havido duas prorogações de Sessão, foi nesse momento que o Sr. Ministro da Guerra se apresentou á Camara a pedir um Voto de Confiança para regular este objecto definitivamente. S. Ex.ª disse á Commissão de Guerra que existiam já trabalhos entre mãos a tal respeito; e para dizer o que houve, cumpre-me notar que a Commissão teve alguma repugnancia em dar o Voto de Confiança, houve uma seria discussão na Commissão, e depois d'ella concordou nas quatro bazes que n'elle se consignaram; foi assim apresentado pela Commissão; ficou elle no estado que eu já apontei, não se discutiu a Sessão passada; nesta foi elle dado á dois dias para Ordem do dia. Porem o Sr. Ministro da Guerra já declarou á Commissão de Guerra, que o Governo estava na resolução de não insistir neste Voto de Confiança; por que se propunha a appresentar um Projecto acabado e completo a este respeito. — Parece-me pois que não sómente pela ausencia de S. Ex.ª o Sr. Ministro da Guerra, porem mesmo pela declaração que já fez na Commissão, e tambem porque a Commissão de Guerra tencionava requerer que o Projecto fosse adiado, proponho o Adiamento do Projecto n.º 77, e neste sentido mando para a Mesa a seguinte Proposta.

Proposta: — Proponho o Adiamento do Projecto N.º 77. — Palmeirim.

Foi apoiado e entrou em discussão.

O Sr. Castro Ferreri: — Já na Sessão passada entrou este Projecto em discussão, e não teve andamento pelos motivos expostos pelo Sr. Deputado Palmeirim. Esta auctorisação foi aqui pedida, porque disse S. Ex.ª o Sr. Ministro da Guerra d'então, que não havia tempo de discutir uma Lei geral a tal respeito, e notar que sobre o objecto da organisação da Fazenda Militar já existiam trabalhos começados. A razão pois dada o anno passado caducou, porque nós ainda estamos no principio da Sessão, e por tanto caducou por sua natureza o Projecto. Parece-me pois justo o Adiamento proposto pelo Sr. Palmeiro, a fim de que se apresento, e discuta aqui uma Lei completa a respeito da organisação da Fazenda Militar; no entretanto como está agora presente o Sr. Ministro da Guerra, S. Ex.ª poderá dizer alguma Cousa a este respeito.

O Sr. Ministro da Guerra: — Sr. Presidente, eu pouco poderei dizer sobre a materia de que se tracta; mas quanto ao Adiamento declaro que o acceito. Estou muito resolvido a não pedir Votos de Con-

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fiança sobre este ou outro ramo de Serviço Publico, salvo em caso muito extraordinario, (Apoiados) Quando Sua Magestade me fez a honra de me chamar ultimamente para os seus Conselhos, achei uma Commissão nomeada para apresentar as modificações que julgasse convenientes sobre o systema da Fazenda Militar, tractei de saber o estado destes trabalhos, e nessa occasião achei que nesta Commissão não haviam dois Membro; accordes sobre os principios, ou bases a adoptai; porém eu expuz á Commissão qual era o meu pensamento a respeito da materia, e espero que em muito breve virei a apresentar á Camara um Projecto que servirá de base á discussão, e então a Camara dará a respeito delle o voto que lhe parecer melhor, resolvendo com perfeito conhecimento de causa. Por consequencia approvo o Adiamento proposto pelo Sr. Deputado Palmeirim.

O Sr. Pessanha: — Visto que os trabalhos da Camara estão adiados, eu pedia a V. Ex.ª que consultasse a Camara, se dispensando o Regimento, consentia que eu verificasse agora a minha Interpellação visto que está presente o Sr. Ministro da Fazenda.

O Sr. Presidente: — Noto primeiro que ainda ha mais trabalhos dados para Ordem do Dia; no entretanto eu vou pôr á votação da Camara o Requerimento do Sr. Deputado.

Considerada a Camara decidiu-se affirmativamente. O Sr. Ministro da Guerra leu o Relatorio do Ministerio da Guerra.

(Mandou-se imprimir, e publicar-se-ha no fim do volume por appendice).

O Sr. Pereira dos Reis: — Lembrava a V. Ex.ª que estando presente agora o Sr. Ministro da Fazenda, tambem poderia usar da palavra para dirigir a S. Ex.ª uma Interpellação, que já aqui annunciei, relativa ao negocio das Sete Cazas.

O Sr. Ministro da Fazenda: — Ainda me não foi communicada

O Sr. Presidente: — Eu mando á Secretaria para que informe sobre este objecto. Agora tem a palavra o Sr. Pessanha para fazer a sua Interpellação.

O Sr. Pessanha: — Sr. Presidente, o objecto ácerca do qual se torna necessario que eu interpelle S. Ex.ª o Sr. Ministro da Fazenda é um objecto muito importante para o Paiz, principalmente para as Provincias do Norte, e com especialidade talvez para a de Traz-os-Montes

Sr. Presidente, depois que pela Convenção de 31 de Agosto de 1835, e pelo Regulamento de 23 de Maio de 1840 para a Navegação do Douro, foi permittida a condicção dos Cereaes de Hespanha por aquelle Rio para serem exportados pela bana do Porto, por muitas vezes têem sido geraes os clamo res dos Proprietarios daquella Provincia de que consideravel contrabando de Cereaes de Hespanha era introduzido pelo mesmo Rio. Quando em 1840 se discutiu nesta casa aquelle Regulamento, eu oppuz-me a elle com todas as minhas forças, logo então manifestei aqui os meus receios sobre os males que daquelle Regulamento haviam de resultar para a nossa Industria e Agricultura; desgraçadamente as minhas apprehensões tem sido realisadas; e os clamores publicos sobre estes males têem redobrado nestes ultimos tempos. (Apoiados)

Sr. Presidente, eu não desejo ser denunciante de pessoa alguma, não quero lançar descredito sobre os Empregados Fiscaes daquelles pontos, os quaes não

digo que sejam conniventes naquelle trafico ião illicito e culposo, antes quero suppôr que o não são: não sei quem faz aquelle contrabando, nem aonde, ou como; ouço apenas affirmar que a introducção daquelle contrabando se verifica entre a Barca de Alva, e os pontos do Sabor, e Pinhão; mas a verdade é que as queixas por causa desta introducção são cada vez mais geraes, e mais fortes, e que muitas circumstancias me fazem acreditar que aquelle contrabando tem effectivamente logar.

Sr. Presidente, é bem sabido por todos a barateza em que se acham os nossos productos agricolas; são muitas as causas que têem motivado esta barateza, com tudo é certo que por grande que esta barateza seja, ha sempre no anno alguns mezes, algumas épocas em que os Cereaes sobem alguma cousa de preço por ser então natural a maior escacez desses generos. Sr. Presidente, na Provincia de Traz-os-Montes, por exemplo, costumam os Cereaes subir um terço do seu preço, e algumas vezes o dobro delle nos mezes de Abril e Maio, em que aquelle genero é já muito menos abundante, ou para melhor dizer começa já a ser muito escaço; mas que aconteceu naquelles mezes no anno anterior? Em logar daquelle producto subir um terço ou o dobro do seu valor como era de esperar desceu amenos de metade do preço, por que até ali se vendia!! E isto quando, Sr. Presidente? Quando todos asseveravam, quando era publico que quatorze barcos de Cereaes de Hespanha tinham entrado por contrabando no Douro.

Eu saí da Provincia de Traz-os-Montes no dia 20 de Outubro ultimo, naquelle tempo estão já concluidas naquella Provincia as sementeiras: sempre os Cereaes costumam alli subir de preço naquella época, porque grande parte delles se consomem para sementes; e que se observava naquella occasião na Provincia de Traz-os-Montes, observava-se que o trigo que naturalmente devia subir de valor, descera em alqueire de um cruzado a quatorze vintens!! E isto quando, Sr. Presidente? Quando publicamente se asseverava que grande porção de contrabando havia entrado pelo Douro, e em não menor escala pela Raia Secca.

Refiro estas coincidencias, por isso que podendo ter influido naquellas baixas de preço outras circumstancias tambem do Commercio, e do mercado, eu estava persuadido que não foram devidas senão ao contrabando aquellas baixas do preço.

Sr. Presidente, nas margens do Rio Douro não se cultivam Cereaes, porque aquellas margens como todos sabem, acham-se cobertas de vinhas; os Cereaes que alli se consomem, eram para alli conduzidos das Provincias do Noite: haviam Povoações no alto Traz-os-Montes, cujos habitantes se occupavam exclusivamente na conducção dos generos Cereaes para os mercados do Douro, mas esta industria acabou inteiramente, ninguem se occupa já alli naquelle trafico: antigamente poucos Proprietarios no alto Traz-os-Montes precisavam de mandar de mandar os seus trigos aos mercados, iam os almocreves compra-los aos celleiros para os levarem aos mercados do Douro, hoje nenhum desses almocreves procura já esses celleiros! E então pergunto eu quem fornece agora aquellas margens do Douro de Cereaes, a não ser o contrabando procedente de Hespanha?

Por estas razões, Sr. Presidente, persuadido como. estou de que desgraçadamente se contrabandeja, e

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minto com este genero com gravissimo prejuiso para a nossa Industria, o Agricultura, cujos productos se acham apreciadissimos por muitas outras causas, peço a S. Ex.ª o Sr. Ministro da Fazenda se sirva informar-me se pela Repartição da sua competencia tem chegado ao seu conhecimento algumas noticias ácerca daquelle contrabando, e se S. Ex.ª tem em vista empregar algumas, medidas para o cohibir? E quando S. Ex.ª não tenha conhecimento official daquelle tão criminoso trafico, peço então ao Sr. Ministro haja de dar as suas ordens mais promptas, e positivas para se chegar ao conhecimento da verdade a este respeito.

Sr. Presidente, eu repito que não desejo lançar descredito sobre as Auctoridades Fiscaes; posso mesmo affiançar a probidade, e zêlo d'algumas dellas, a quem conheço particularmente como, por exemplo, do Director do Circulo de Bragança, do Sub-Director da Alfandega daquella Cidade, e da de Miranda, mas, Sr. Presidente, ainda hontem um Jornal desta Capital publicou uma correspondencia sobre este assumpto, que a Camara me permittirá que eu leia aqui, porque não é uma correspondencia qualquer, e um communicado escripto, e assignado pelo Chefe d'uma das Alfandegas de Traz-os-Montes, da Alfandega de Montalegre, que confirma quanto eu acabo de dizer: o Jornal e a União do dia 5 do corrente (Leu.)

Peço pois a S. Ex.ª o Sr. Ministro que haja de informar-me ácerca deste objecto.

O Sr. Ferreira Pontes: — Eu pedia a V. Ex.ª consultasse a Camara, se me concedia a palavra para eu fallar tambem nesta Interpellação; tanto mais que na Sessão passada fiz uma Interpellação a esse respeito, e prometteram-se providencias...

O Sr. Presidente — Não póde desenvolver o seu pedido, tanto mais que 0S1. Ministro ainda não deu resposta. Eu consultarei a Camara depois do Sr. Ministro responder.

O Sr. Ministro da Fazenda: — Mas se V. Ex.ª quer, póde agora fallar o Sr. Deputado, e eu responderei a ambos.

O Sr. Presidente — Bem, eu consulto a Camara

Decidiu-se affirmativamente.

O Sr. Ferreira Pontes — Sr. Presidente, pedi á Camara me permittisse tomar parte nesta Interpellação que acaba de fazer ao Sr. Ministro da Fazenda o meu nobre Amigo o Sr. Pessanha, não para a sustentai, que elle a justificou com razões tão claras, e concludentes que as minhas só poderiam tirai-lhe a força que ellas teem, mas para dar alguns esclarecimentos mais de factos de que eu tenho conhecimento Já na Sessão passada eu dirigi outra Interpellação igual ao Sr. Ministro da Fazenda, que então era. e denunciei um facto importante qual fôra o de se terem despachado na Alfandega da Barca d'Alva quatorze barcos de Cereaes do Reino visinho, para na fórma desse fatal Tractado de 23 de Outubro de 1840 serem conduzidos pelo Douro, para serem expoliados pela barra do Porto, mas que não deram enfiada na Alfandega desta Cidade, que descarregaram alli, e nos pontos visinhos, de sorte que a abundancia que estes Cereaes trouxeram ao mercado fez com que, além de outras causas, descessem os nossos um terço do preço em que se achavam na occasião em que costumavam subir. Este facto foi-me communicado por pessoas de todo o credito,

e depois me affirmaram que o numero de barcos que haviam introduzido esse contrabando, foram vinte e sete, que isto o não affirmava com a mesma segurança, por lhe não ter sido communicado por pessoas que suppunha tão bem informadas; que fossem mais ou menos, e certo que não sendo contestado um facto desta gravidade, adquiria um gráo de certeza de que não se póde duvidar. De novo repito que não sei quaes foram os Empregados que por dólo ou negligencia devam sei responsaveis por elle, mas ainda que o soubesse os não declararia, porque nunca fui denunciante ou accusador, nem esse officio se compadece com o meu genio, com o meu caracter, e com o elevado cargo que aqui occupo. O que eu certifico á Camara e que me não consta que o Governo desse demonstração alguma de ter tomado em consideração as requisições que então lhe fiz, apesar das solemnes promessas que daquellas Cadeiras então fizera.

Sr. Presidente, alguns barcos tendo despachado na Alfandega da Barca d'Alva uma porção de carros de Cereaes de Hespanha para exportação, em os

portos immediatos a distancia de uma ou duas legoas, augmentam a carga com o duplo e ás vezes mais, e como na Alfandega do Porto só são obrigados a dar entrada do que foi guiado, deixam o outro no Porto e nas suas visinhanças; officio que então lembrei; foi o de serem obrigados a verificar a carga nas Estações do Sabor, e do Pinhão, ainda agora o lembro como um dos meios mais efficazes de se evitar aquelle fraudulento trafico.

Não é só por aquelle ponto que se introduz este contrabando, introduz-se tambem por Freixo, Lagoaça, e outros sitios atravessando o Douro com toda a franquia, e como se naquelle Districto não houvesse Empregados alguns encarregados desta fiscalisação, que uns desses Cereaes se consomem nas Freguezias immediatas, e outros que são conduzidos á Fós do Sabor, e que alli são carregados em barcos que os conduzem para o Porto como nacionaes — de sorte que nas terras da margem direita do Douro que ficam em frente da Hespanha se consomem mais vindos d'alli, que dos que produz o Paiz. Com a mesma facilidade, com pequena differença, se introduz por toda a raia secca do Alemtejo, Beira, Traz-os-Montes, e Minho segundo informações verídicas que vem de toda a parte. Bem conheço que não é tão facil o evitar-se a introducção por terra como pelos rios, e que em uma tão grande extensão não se póde esperar que em um ou em outro ponto não entre alguma porção, mas se houver cuidado e zêlo da parte das Auctoridades Administrativas, e Empregados Fiscaes póde-se evitar, que entre em tão grande escala. Uma das causas que concorre tambem mais poderosamente para este trafico, é sem duvida a facilidade com que se admittem os manifestos aos Lavradores da laia, que ficam dentro das cinco legoas, que alguns costumam dar tres partes mais da colheita, para depois com os seus attestados os contrabandistas obterem as Guias para serem conduzidos para dentro do Reino como nacionaes; e tal é o abuso que nisto se commette, que na raia do Alemtejo se arrendam algumas Fazendas pelo duplo do seu producto, e porque costumam arrendar-se em outros sitios, só pelas vantagens que depois terão de darem aquelles attestados.

Sr. Presidente, neste objecto não é só interessada a Provincia de Traz-os-Montes, nem e o espirito de

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provincialismo que nos move a chamarmos sobre elle a attenção do Governo: antes a provincia do Minho e do Alemtejo produz muitos mais Cereaes, é interessado todo o Paiz; e se não se tomarem medidas promptas e efficazes para pôr termo a este abuso, a nossa Agricultura deste genero não é possivel deixar de ter uma decadencia rapida, porque não e possivel que continue por muito tempo um Ramo de industria, que attendendo aos subidos jornaes que em algumas partes ganham os operarios, e ao baixo preço do seu producto, não produz metade da despeza que com elles se faz. Daqui ajuizará o Governo a importancia que deve ligar a este ramo de serviço publico, aliás não espere receber os tributos, porque quem não tem o que lhe é preciso para viver, nada póde pagar; e bem sabido é que o nosso Paiz vive principalmente da Agricultura, dos Cereaes e do Vinho, e ambos estes generos se acham na maior depreciação, que ha cousas que não está na nossa mão o evitar, mas a este mal de que nos occupamos se lhe póde dar algum remedio, e eu confio em que o Governo ha de ser inexoravel para com os Empregados, que por dólo ou ommissão faltarem aos seus deveres, e que ha de tomar as mais providencias convenientes para que um tão escandaloso, e illicito commercio não continue — assim dará vida e protecção a nossa Agricultura, e fará ao Paiz o mais valioso -ter viço.

O Sr. Ministro da Fazenda. — Sr. Presidente, eu agradeço aos nobres Deputados o serviço que acabam de fazer ao Governo, dando-lhe esclarecimentos sobre um negocio tão importante como é a fiscalisação das Alfandegas nos porto> seccos, pelos quaes se julga entrar esse contrabando, e sobre o que geralmente, diga-se a verdade, ha um clamor publico. Officialmente porém não me consta que tenham tido logar os factos de que o nobre Deputado acaba de fazer menção; officialmente não tenho conhecimento delles; mas em virtude desta voz publica, que constantemente se está levantando, denunciando esse abuso, dizendo que effectivamente se fazem grandes contrabandos, eu fallaria ao meu dever se por ventura nestes poucos dias, que tenho de gerencia na Repartição a meu cargo, não tivesse já pensado sobre uma medida, em virtude da qual eu podesse vir no conhecimento da verdade; quero dizer, se por ventura ao ou não fundadas essas queixas, que se fazem contra os Empregados Fiscaes, e até mesmo contra algumas Auctoridades Administrativas, ou se porventura aqui ha um pouco tambem dessa injustiça, que constantemente se está fazendo á maioria dos Empregados Publicos.

Ora, o que eu posso asseverar aos Srs. Deputados que não só pelos esclarecimentos que tiveram a bondade de dar ao Governo, nas Interpellações que acabam de dirigir-me; mas em virtude das providencias que tenho concebido, e vou immediatamente pôr em practica, porque effectivamente, como acabo de dizer, já as tenho concebido, se por ventura em virtude dessas providencias achar que ha esses abusos, prometto aos Srs. Deputados, e assevero á Camara, que hei de ser inexoravel contra todos os Empregados dependentes da Repartição -a meu cargo; (Apoiados) porque realmente se por ventura tiver fundamento esta queixa geral que se repete todos os annos contra os Empregados encarregados, de um ramo tão importante d'Administração Publica, como é a fiscalização das Casas Fiscaes, é necessario indispensavelmente dar um grande exemplo para que esses abusos se não repitam. (Apoiados) Mas não é só por uma providencia interina, que estou na resolução de o levar a effeito, e digo intendia, por isso que de prompto não se podem adoptar as medidas que eu julgo convenientes para atalhar este mal que todos lamentamos, porque o Governo tambem lamenta a falta dos rendimentos que deviam produzir estas Casas Fiscaes, que se podem radicalmente fazer cessar estes abusos. A minha intenção é pois dar agora uma providencia prompta, a qual já tenho concebido; porém entendo que o mal está na actual organisação das Alfandegas. Eu ainda não pude pôr-me ao facto, se o Governo tem uma auctorisação ampla para reforma das Alfandegas; parece-me que sim; e neste caso, se me demorar algum tempo no Ministerio, hei de levar a effeito essa reforma; (Apoiados) as Alfandegas hão de ser effectivamente reformadas, segundo Os principios que convêem, porque, Sr. Presidente, desenganemo-nos de que os Empregados collocados na situação em que eu considero, e todos nós devemos considerar os Empregados de Fazenda, e principalmente os encarregados da Fiscalisação, com ordenados pequenos, e esses mal pagos, é impossivel quasi, na sua grande maioria, exigir o fiel cumprimento das suas obrigações; (Apoiados) é impossivel que haja uma austeridade de honra, de probidade levada a um ponto tão subido, o mais subido que é possivel imaginar-se, para que o Empregado luctando com as privações a que se vê obrigado, não só com ordenado pequeno, mas mal pago, cumpra fielmente os seus deveres; (Apoiados) é impossivel quasi, Sr. Presidente, que Empregados aliás dotados de certa honestidade possam resistir á tentação da corrupção. (Apoiados) Portanto essa reforma ha de apparecer, e ha de apparecer principalmente sobre este ponto, porque estou capacitado de que a actual administração das Alfandegas dará meios, diminuindo o seu pessoal, para se estabelecerem aos Empregados, com que ellas se organisarem, ordenados melhores, e estabelecer tambem providencias ara que elles lhes possam ser mais regularmente pagos. Mas isto não tem nada com o objecto das Interpellações dos nobres Deputados, as quaes eu lhes agradeço; porque realmente fizeram um grande serviço só pelo facto de as dirigirem ao Governo; porque em quanto ao objecto dessas Interpellações eu já disse que tenho pensado sobre o melhor meio de poder haver em todas as Casas Fiscaes o melhor governo possivel; e se em virtude désse pensamento que eu tenho sobre uma medida geral que vou adoptar, eu conhecer que effectivamente ha essas prevaricações, estejam os illustres Deputados descansados, esteja a Camara certa, de que eu hei de ser inexoravel contra todos os prevaricadores. (Apoiados)

O Sr. Pessanha: — Sr. Presidente, em grande parte fico satisfeito com a resposta de S. Ex.ª, nem podia exigir de S. Ex.ª as explicações mais explicitas, achando-se ha tão pouco tempo encarregado da Pasta da Fazenda. Eu faço justiça a S. Ex.ª, e supponho que ha de ter em vista um negocio que affecta tanto os interesses Publicos; estou certo de que S. Ex.ª de empregar todas as medidas que entender convenientes para evitar a repetição destes abusos; mas permitta-me S. Ex.ª que eu lhe lembre a conveniencia de consultar tambem as Auctoridades Adminis-

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trativas sobre este objecto, porque ouvindo só as Auctoridades Fiscaes, póde haver alguma parcialidade, e interesse, principalmente da parte daquellas que tenham sido menos zelosas no cumprimento dos seus deveres; e pelo contrario, ouvindo tambem as Auctoridades Administrativas póde vir melhor no conhecimento da verdade; ha de talvez descobrir melhor os culpados de factos tão escandalosos, e ha de obtêr os melhores dados para as medidas que, como acaba de declarar, tem em vista empregar sobre este ramo de serviço.

O Sr. Ministro da Fazenda: — Sr. Presidente, eu não indiquei verdadeiramente qual e a providencia que tenho tenção de adoptar; mas talvez as Interpellações me suggerissem a conveniencia de proceder como o illustre Deputado acaba de me indicar, isto é, de ouvir as Auctoridades, e os differentes Empregados que podem esclarecer o Governo sobre este objecto tão importante; e então se por ventura eu me dirigir a ouvir os Empregados, e as Auctoridades, que eu entenda que podem esclarecer o Governo, já se vê que não podia prescindir do auxilio que ao Governo podem prestar as Auctoridades Administrativas, como aquellas que possuem a maior somma de dados e conhecimentos para o habilitarem a conhecer desse negocio completamente; e não só isto, Sr. Presidente, mas e que aproveitando-me do zêlo que os illustres Deputados mostram neste objecto importantissimo, até convido a SS. Ex.ªs para que me ajudem, quando eu me dirigir aos illustres Deputados, a conhecer Tudo quanto fôr necessario para que eu possa adoptar as providencias que o caso exige (Apoiados): estou persuadido de que os illustres Deputados não me recusarão tambem em particular este serviço que me acabam de principiar a fazer no meio desta Camara. (Apoiados)

O Sr. Ferreira Pontes: — Sr. Presidente, eu tenho a palavra..

O Sr. Presidente: — Não póde ter segunda vez a palavra segundo o Regimento... Está findo este incidente.

Quanto ao Requerimento do Sr. Pereira dos Reis devo observar que em Sessão do dia o, por occasião do Sr. Deputado fazer uma recommendação á Commissão de Fazenda, disse que reservava a palavra para quando estivesse presente o Sr. Ministro da Fazenda; mas não mandou nota para Interpellação: por consequencia não se fez communicação alguma ao Sr. Ministro: indicou qual era o objecto, e reservou a palavra para então... Agora não é de certo a hora competente para lhe dar a palavra; só quando a Camara assim o delibere.

O Sr. Pereira dos Reis: — Peço licença para dizer unicamente duas palavras.

O Sr. Presidente: — Eu pergunto á Camara, se consente que se dê a palavra ao Sr. Deputado, visto que o conceder-lh'a agora é fóra da ordem dos trabalhos, e so a Camara o póde decidir, para fazer algumas perguntas ao Sr. Ministro da Fazenda respectivamente ao Contracto da arrematação das Sete Casas.

A Camara resolveu affirmativamente.

O Sr. Pereira dos Reis: — Sr. Presidente, é exacto o que V. Ex.ª acaba de dizer. Na falta do Sr. Ministro da Fazenda, que não estava presente então, entendi eu que sobre um negocio urgente, e que respeitava do mesmo modo ao Ministerio, e á

missão de Fazenda, podia dirigir-me ao Relator desta Commissão.

O objecto que me propuz é sabido de S. Ex.ª, e sabido da Camara, e é sabido do Publico. Esta rigidez de formular o que pertendo interpellar, realmente não a acho admissivel nas circumstancias actuaes, em nenhumas circumstancias. O Ministerio que se propõe fazer jôgo liso, permitta-se-me a fia-se, não deve demorar resposta á Interpellação feita por um Deputado sobre negocio, que interessa o Publico, e que entende com a subsistencia de milhares de familias. Eu sei que as Interpellações mudam de natureza, segundo a posição politica do Deputado que as faz; ha certas Interpellações que são uma especie de valores entendidos; esta que eu pertendo fazer é uma Interpellação que entendo deve ter resposta promptissima, e não posso conceber que o Sr. Ministro da Fazenda ignore a resposta que ha de dar — O objecto da minha Interpellação é muito simples, versa sobre um ou dois factos; portanto não póde pedir-se tempo, porque a resposta dá-se immediatamente.

E sabido o que tem occorrido sobre este desgraçado negocio do Contracto das Sette Casas, e do Pescado. Eu pertendia, que S. Ex.ª me respondesse precisamente a duas ou tres perguntas, que tenho a dizer-lhe a este respeito.

Desejo saber em primeiro logar, se a Camara dos Deputados tem tanto direito como um Estabelecimento monetario da Capital, para saber qual é a opinião do Governo sobre este objecto; isto é, se o Governo tenciona conservar, ou retirar a Proposta de Lei, que tem presente da Camara dos Deputados a respeito da arrematação das Sete Casas, e do Pescado.

Pertendo mais saber: se o Ministerio actual antes de reconstruído, recebeu alguma somma, e qual, adiantada á conta daquelle Contracto.

Pertendo saber ultimamente: se o Ministerio actual já reconstruído, recebeu algum dinheiro do Banco de Portugal, sobre a promessa de retirar este Contracto da discussão.

Depois de ouvidas as Explicações dadas pelo illustre Ministro, tomarei a palavra, se o entender necessario.

O Sr. Ministro da Fazenda: — Sr. Presidente, ainda bem que V. Ex.ª confirmou o facto, que eu tinha apresentado, de não ter ainda recebido aviso para responder a esta Interpellação! Se V. Ex.ª o não tivesse enunciado désse logar, certamente podia eu, e o Governo termos passado, como o illustre Deputado quiz ter a bondade de nos querer fazer passar, como Ministerio que não quer jogar liso. Portanto já se vê, que nesta parte ha toda a franqueza e lealdade, e em tudo a haverá; e o illustre Deputado, no correr do tempo verá, que este foi sempre o procedimento do Ministerio passado, e ha de ser o deste.

Tambem principiarei por agradecer ao illustre Deputado o zêlo, que mostra pelo interesse Publico, e o serviço mesmo, que fez ao Paiz, na Interpellação que acaba de dirigir ao Governo. Esta interpellação, com quanto seja fóra dos salutares preceitos do Regimento, porque effectivamente não está nesses preceitos, com tudo este negocio é grave, como diz o illustre Deputado, ha apprehensões, e eu não quero que ellas por mais tempo existam no Paiz. (Apoiados) Este negocio está resolvido, e não passarão tal

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cez muitos instantes, que a illustre Commissão de Fazenda não traga aqui o seu Parecer sobre esse Projecto. É o que tenho a responder ao illustre Deputado.

O Sr. Pereira dos Reis: — Eu tambem tenho conhecimento das regras que costumam seguir-se no Parlamento, e que devem seguir-se: não direi que enjeito as lições, que me dá o Sr. Ministro, mas elle e menos antigo do que eu nesta Casa, e creio, que neste negocio não excedi as minhas attribuições, e se as excedi, foi com o consentimento da Camara. Quando se dá um caso tão grave, como este, que contende com tantas familias, que excita tantas apprehensões, não se póde dizer que se tem andado diligente neste negocio. pelo contrario, é preciso dizer-se, que se tem andado muito de vagar, esta é a minha opinião, e a de muita gente. Mas eu ainda não estou satisfeito, é possivel, que o Parecer da Commissão, que se promette, que ha de apparecer dentro de poucas horas, me satisfaça; mas eu formulei a minha interpellação de modo. que ainda ficam de fóra algumas respostas, que me são necessarias; ha uma Proposta de Lei, a Commissão póde concluir, aprovando ou rejeitando essa Proposta de Lei; mas não me esclarece sobre alguns pontos, que são já do dominio publico, que se sabem lá fóra, e que o Parlamento ignora completamente. De certo, a Commissão, que não tem poder para isco, não ha de dizei, que o Governo anterior tinha recebido sommas adiantadas á conta d'um Contracto, que ainda estava longe de ser realisado, nem ha de dizer, que o Ministerio actual tem recebido tambem algumas quantias, sobre promessa de retirar o Contracto; e era sobre este ponto que eu desejava ouvir as explicações de S. Ex.ª

Sr. Presidente, eu desejo, e desejo sinceramente, que o Governo proceda com toda a lisura, não ganho nada em que proceda mal, ganho tudo em que proceda bem, acredite-se que da minha parte não ha o menor pensamento reservado, não lisongeio o Governo, e digo-lhe a verdade; entendo que é esse o meu dever como Deputado. SS. Ex.ªs não se hão de vêr abarbados com pedidos meus, nada lhes tenho pedido, nem lhes hei de pedir, mas como Deputado tenho obrigação de velai, e pedir que velem pela Causa Publica Não entra aqui um Deputado da Opposição com desejo de impedir a marcha governativa, o se nas palavras de S. Ex.ª a ha alguma imputação, que me possa dizei respeito, peço-lhe que retire. Este negocio como tenho dito, e negocio que entende com muita gente, o perdoe S Ex.ª e a Camara, se fui um tanto exigente neste objecto, mas de certo o não fui. Portanto, senão ha mal, se se não offendem os principios diplomaticos em S. Ex.ª responder aos pontos que indiquei espero que o faça, porque a Commissão de certo me não póde satisfazer neste ponto

O Sr. Ministro da Fazenda — Sr. Presidente, eu não sei como possa contentar mais o illustre Deputando, depois do que disse. O objecto principal é saber, seja por ventura o Contracto das Sete Casas vai ou não por diante, a fim de se desvanecerem essas apresentações que existem não na Camara, mas no Paiz, porque á Camara ainda não chegou o momento demittir a sua opinião, mas na Cidade ha apprehensões que se diz terem-se levantado por causa da celebração desse Contracto. Ora parece-me, que avinda que a illustre Commissão não trouxesse hoje esse Parecer, não se aumentariam por isso mui essas apprehensões, mas ella ha de apresentar hoje ou amanhã esse Parecer, e á vista delle se saberá, se esse negocio sai ou não por diante.

«Mas dinheiros que se receberam já no Ministerio anterior por conta desse Contracto, e dinheiros que se receberam já por este Ministerio com a condição de retirar o Contracto.» Não sei como possa respondei a isto, e como Ministro da Corôa não posso adiantar mais do que dizer ao Sr. Deputado que tudo quanto se fizer sobre este objecto, o Governo não ha de fazer monopolio dos negocios que tractar, não ha de fazer segredo de nenhuma transacção, ha de apresentar-se com franqueza, dizendo tudo que foi com a sinceridade que lhe é prompta, e que a Capina e o Paiz tem direito a exigir delle (Apoiados).

O Sr. Presidente — Como se acha a Camara em grande numero, vou outra vez sujeitar á sua decisão a Proposta de Adiamento do Projecto n.º 66

O Sr. Fontes Pereira de Mello: — Sr. Presidente acabo de entrar agora na Sala, e consta-me que tendo-se proposto á votação da Camara a Proposta de Adiamento do Projecto n.º 66, por não haver numero, não se votou, V. Ex.ª disse, que ninguem mais tinha pedido a palavra, eu acabo de entrar a gota como disse, se V. Ex.ª ma concede, direi alguma, cousa sobre o Adiamento, porque desejo votar por elle, mas não da maneira porque está concebido.

O Sr. Presidente: — Agora está o negocio no pé em que estava depois da votação, e não posso dar a palavra ao Sr. Deputado sem consentimento da Camara.

O Sr. Fontes Pereira de Mello: - Pois eu requeiro a V. Ex.ª que consulte a Camara, se me permitte dizer algumas palavras sobre o Adiamento antes de se votar.

Resolveu-se affirmativamente.

O Sr. Fontes Pereira de Mello: — Sr. Presidente, eu não tenciono roubar muito tempo á Camara sobre o objecto em discussão, mas pela minha posição especial, pelas circumstancias que me dizem respeito, não podia deixar passar esta discussão sem dizer alguma cousa, e como vejo que se tracta de votar o Adiamento proposto pelo Sr. Deputado pelo Douro, entendi que era do meu devei dizei algumas palavras para justificar os motivos que me levam a apoiar o Adiamento, mas concebido debaixo de outros principios do que os que apresentou o illustre Deputado. Espero pois, nestas pequenas considerações que vou fazei, que a Camara me ouvirá com benevolencia, porque o objecto e mais importante do que talvez pareça. Desgraçadamente quando se daria de um objecto desta natureza, a Camara parece não prestar tanta attenção, como quando se tracta de objectos Politicos; no entretanto este assumpto e importantissimo, porque se tracta, nada menos, do que da Instrucção Publica, da creação de uma Escóla, que sempre e objecto grave.

Sr. Presidente, a respeito desta Escóla Naval. Tem-se proposto muitas reformas, e feito outras. Desde o tempo da Sr.ª D. Maria 1.ª em que foi creada a Companhia dos Guardas Marinhas tem-se organisado e reorganisado a Escóla de diversas maneiras ultimamente o Governo creou uma Commissão extinta para fazer um Projecto, essa Cornu.i3sã > apresentou o seu Parecer, que foi alterado em alguns pontos. Ora eu não sei se V Ex.ª e a Camara se-beii1, que o Governo antes de apresentar a sua Pro-

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po-la tinha consultado o Corpo Cathedratico daquelle Estabelecimento, o qual tinha apresentado um Projecto fundamentado no mau resultado que estava dando a Escola, montada como se acha e propondo finalmente que se organisasse a Escóla Naval, mas adoptando o systema collegial a bordo.

Eu, Sr. Presidente, não pedi hontem a palavra (é preciso que diga que não estou mais habilitado para fallar hoje, do que estava hontem) porque entendi que a Camara não queria votar o Adiamento, nesse caso tinha muito tempo de fallar quando se tractasse da discussão na generalidade; mas como hoje me parece que se esta em disposição de votar o Aditamento, e por consequencia o Projecto ha de voltar á Commissão talvez por toda esta Sessão, por que geralmente assim acontece com os Projectos que voltam ás Commissões sem uma determinação especial da Camara, que exija a sua urgencia, entendi que devia tomar a palavra neste negocio para dizer alguma cousa sobre elle.

Eu acho-me n'uma posição especial a respeito deste objecto: fui Alumno da Escóla organisada em terra, e pelo systema de Alumnos externos, mas entretanto e preciso que eu diga a V. Ex.ª, que ainda naquelle tempo, isto é, ainda ha poucos annos, a Escóla estava constituida de sorte, que podia fornecer bons Officiaes d'Armada. quando hoje, pelo methodo actual, difficilmente os poderá dar.

Em Portugal não se estabeleceu o systema collegial na antiga Companhia dos Guardas Marinhas, porque em objectos maritimos tem procurado imitartar-se sempre o systema Inglez, mas, Sr. Presidente, com quanto os Inglezes tenham o systema collegial em terra, em Portsmouth, com tudo uma grande parte dos Aspirantes da Armada andam embarcados nas suas immensas Esquadras, e reunem assim o systema collegial em terra com a parte practica adquirida sobre o mar. É um costume que nós temos de imitar tudo que se passa lá fóra, sem estarmos nas mesmas circumstancias, fez com que nos estabelecemos cá o nosso systema em terra, mas não collegial, e ainda naquelle tempo (note V. Ex.ª) era talvez possivel tirar d'ahi bons resultados, por isso que nós então tinhamos Esquadras respeitaveis, que crusavam em todos os mares do globo, e não pareça isto de mais, nem se julgue que vai muito longe essa epocha, ainda no principio deste Seculo tinhamos uma Esquadra de 12 Náos, 10 fragatas etc, tinhamos Esquadras constantemente no Mediterraneo, nas Costas da America, e Navios de grande lote fundeados em Lisboa e em alguns pontos da Europa: por consequencia tinhamos ainda essa Escóla practica era grande escala, e nella [odiamos instruir os nossos Officiaes, que habilitados já com os conhecimentos theoricos adquiridos em terra, obtinham no mar os conhecimentos praticos necessarios para a nobre carreira a que se destinavam, mas hoje acontece (desgraçadamente para nos) absolutamente o contrario Ainda ha poucos annos estiva determinado, que em todas as ferias grandes, fossem alguns Aspirantes a bordo de Correios estabelecidos para as nossas Possessões Ultramarinas, fazer um pequeno tirocinio; porem esses Correios acabaram, e actualmente nem os Alumnos embarcam nem os Correios existem, (está visto que não podem embarcar sem ter aonde) e não e possivel mandatos para Estações longas, como nós ainda temos nas Costas d'Africa, porque isso faz com que perdessem o seu anno. Ora ainda se fazia mais alguma cousa nesse tempo (eu faço estas reflexões para que se não argumente com o bom resultado que deu a Escóla organisada como ella se achava nos ultimos annos, isto é, ha 10 ou lo annos) então só se mandaram os Alumnos (como disse) fazer um tirocinio nas ferias grandes, mas todos os Domingos e dias santos iam a bordo de Navios fundeados no Tejo, e apparelhavam-os completamente desde os mastros reaes ale envergar o panno; fazia-se tudo, e fazia-se ao vivo; assim podia-se ainda tirar partido do systema; mas pelo methodo actual nada se propõe a este respeito, estabelece-se uma Escóla de Alumnos inteiramente externos sem nenhum meio pratico d'applicação, sem nenhum tirocinio sobre as agoas, e considerando se, por pouco que seja, a especialidade da vida maritima em que o homem tem de renunciar quasi completamente a todos os seus habitos, em que tem de passar a uma vida interinamente excepcional, Ve-se a grande necessidade que ha de contrahir estes costumes, que só se ganham sobre as agoas do Oceano e dentro do Navio em que se ha de vivei largo tempo. Mas, Sr. Presidente, parece-me que não é preciso gastar muitas palavras para provar aquillo que está hoje demonstrado praticamente em todas as Nações da Europa, não só na applicação a Marinha de Guerra, mas a quasi todos os outros Estudos especiaes; o systema collegial tem hoje ganho proselytos em toda a parte, isto é, practica-se em quasi todas as Nações não só para as applicações Navaes, mas mesmo para as applicações Militares em terra.

Sr. Presidente, os Estudos que querem exigir dos Alumnos que são destinados para a Armada, tão impossiveis nos tres annos como se quer estabelecer, sendo Alumnos externos, porque nas idades proprias em que se deve cursar a Aula, geralmente fallando, a não sei um genio ou um talento transcendente, não ha individuos capazes para dar conta das Disciplinas que se exigem em um praso fatal, e note V. Ex.ª que esse praso fatal não se póde alargar indefinidamente; é necessario que o Curso se faça em tres annos sob pena do individuo quando passa á parte pratica, que é toda sui generis, não estar já em disposição e idade de contrair os habitos da vida maritima, e mesmo até certo ponto, em tão curto espaço de tempo, não e possivel habilitar os Officiaes com os conhecimentos theoricos necessarios.

Disse-se aqui, Sr. Presidente, (e nessa parte peço licença para não concordar com o illustre Deputado que proferiu esta asserção, por maior que seja o meu respeito pelos seus elevados conhecimentos) que a Escóla Naval era uma Escóla de Applicação, e por consequencia só se deviam ensinar nessa Escola conhecimentos praticos e não theorias, e sobre este ponto que eu desejo do illustre Deputado, porque em todas as Escólas de Applicação que existem nos diversos Paizes, e mesmo entre nos, se ensinam theorias. Peço licença para notar ao illustre Deputado a Escóla do Exercito, por exemplo, que é uma Escóla de Applicação, onde se ensinam diversas theorias, as theorias de Construção Civil, de Artilharia, de Fortificação, etc. A Escóla de Metz, por exemplo, em França, que é uma Escóla de Applicação da primeira ordem, onde se ensinam as theorias, que acabo de indicar, além de outras. A Escóla Naval de

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Brest; infelizmente não tenho aqui a nota do que se ensina na Escola Naval de Brest, esqueceu-me em casa; mas posso assegurar ao illustre Deputado, que o que ali se ensina, é ainda muito mais do que se exíge neste Programma. Recordo-me, por exemplo, da theoria de navio, que é uma theoria muito importante, que não vem comprehendida no Curso do Programma que faz parte deste Projecto, e com tudo ensina-se na Escóla Naval de Brest. Entre nós, na Escóla do Exercito, como já disse, ensinam-se effectivamente diversas theorias onde se applicam as Mathematicas Puras, e é por isso que se chamam de Applicação; porque o illustre Deputado sabe melhor do que eu que as Mathematicas Puras são a chave, por assim dizei, por onde se entra em todas as outras Sciencias, pelo menos nas Sciencias chamadas de applicação, e até em grande parte das Sciencias Naturaes; e como são a chave de todas as outras Sciencias, chamam-se Sciencias Applicadas aquellas em que se applicam as Mathematicas Puras; mas nem por isso deixa de ensinar-se theoria nessas Escolas Eu, Sr. Presidente, não quero que para a Malinha se exija uma grande somma de conhecimentos especiaes, quero dizer, de conhecimentos mathematicos. Eu entendo que para o serviço de Applicação não se carece da mesma instrucção que se exíge para o Professorado; é claro que não: aquelles que querem professorar uma Sciencia, necessitam de se habilitar muito mais desenvolvidamente, do que aquelles que precisam unicamente dos elementos dessa Sciencia para a applicar na pratica; mas tambem restringir

demasiadamente esta instrucção..... (O Sr. J. J. de Mello: — Eu não quero tal). Eu sei que não é essa a intenção do illustre Deputado, mas eu agora não respondo ao illustre Deputado, respondo a uma opinião muito geral a este respeito, porque se entende que a Marinha não precisa de grande instrucção theorica para poder satisfazer com vantagem as suas attribuições. Eu, Sr. Presidente, não desejava roubar muito tempo á Camara; mas levado do amor que tenho por esta Corporação, do amor que tenho pior este Paiz estou persuadido que necessita talvez mais de Marinha que do Exercito; e eu não sou suspeito porque sou do Exercito, mas entendo que o Paiz necessita talvez mais (talvez, entenda-se bem) de Malinha que de Exercito; um Paiz onde todas as suas glorias antigas estão ligadas com a Marinha; um Paiz cuja Lingoa se estuda la fóra para se lêr o Homem que cantou os Feitos dos seus Navegadores, porque lá fóra apenas se lê em Portuguez o Camões, e Camões cantou principalmente os Feitos da Ala rinha; um Paiz, digo, cuja Malinha de Guerra está ligada com as suas tradições de Gloria, e onde ainda é uma necessidade para conservar as suas importantes Colonias, deve pois, repito, deve organisar convenientemente a sua Escóla Naval. Portanto, Sr. Presidente, eu entendo que ha necessidade de Marinha de Guerra, e se essa necessidade e reconhecida por todos os illustres Deputados, todos hão de convir comigo que é necessario dotal-a com uma instrucção sufficiente para poder preencher os fins a que se destina. Um Official a quem se encarrega uma Commissão difficil, a cujo cuidado se entreguem alguns centos de vidas de homens, a quem se confiam objectos da mal? alta importancia; que vai dentro de uma machina todo ella cheia de machinas, que se move dentro de um fluido que é movido por outro fluido,

pensar que se póde dispensar em um homem destes, os conhecimentos de Sciencias Exactas, e de Applicação, principalmente a Mechanica, e realmente desconhecer completamente a elevada missão, que taes individuos têem a desempenhar na Sociedade.

Sr. Presidente, desde que se inventou a Navegação a Vapor, chega a ser absurdo imaginar que o homem, que ha de dirigir um navio, cujo unico motor é aquelle agente applicado por intervenção de mechanismos complicadissimos, hade ser hospede na Sciencia de Mechanica: eu peço aos Srs. Deputados que me digam, se um Official está habilitado a fazer uso desta machina, sem ter os conhecimentos necessarios daquella Sciencia, talvez a mais perfeita, e uma das mais difficeis que se conhecem! Eu com com estas observações não quero senão tirar algumas duvidas, que teriam muitos dos nobres Deputados julgando talvez que nesta Escóla se ensinassem materias de mais. Ora um dos objectos, cujo ensino eu julgo necessario na Escóla de Marinha, e um pequeno Curso de Litteratura, e de Historia Portugueza; isto faz parte do Curso da Escóla Naval em França; e aqui está que nesta parte está deficiente o Programma que se nós apresenta. Ninguem dirá que um Official, que tem de representar o seu Paiz em localidades tão distantes, que tem de corresponder-se com as primeiras Auctoridades das Provincias Ultramarinas, e com os Ministros das diversas Côrtes, deixe de ter um conhecimento sufficiente da Lingoa e Historia do seu Paiz

Restringindo-me pois ao ponto em questão, direi, que o Systema Collegial está hoje adoptado em quasi todas as Nações; por exemplo, na Russia, na Hollanda, e em Inglaterra este Systema é seguido; mas com os Collegios em terra. Em Inglaterra póde considerar-se, que o Collegio em terra existe em Portsmout, ao mesmo tempo que os Collegios a bordo são as suas immensas Esquadras (Apoiados) onde teem os Mestres necessarios para ensinar os seus Alumnos; e os Officiaes depois de terem sido habilitados convenientemente, são obrigados a fazer os seus exames na Academia de Portsmout. Em Inglaterra não se segue este desgraçado systema de antiguidades, religiosamente observado aqui em Portugal; lá dão grande importancia á sua Marinha de Guerra; debaixo deste ponto de vista estabelecem premios, e concedem postos de distincção a todos os homens, que se mostram mais eminentes na Sciencia de Navegar, sem se importarem com a religiosa antiguidade. Entre nós, porém, observa-se este fatal systema, de maneira, que um homem por mais serviços que faça (a excepção dos serviços feito» no campo da batalha), por mais talentoso que seja, como não tem antiguidade, ha de marchar constantemente no mesmo terreno... isto e muito triste... sobre esta falta de estimulo é que eu desejava chamar a attenção dos Srs. Ministros: como está presente o nobre Presidente do Conselho, que é tão instruido, e conhecedor deste assumpto, chamo a attenção de S. Ex.ª sobre este negocio, e penso que elle deve, mais que ninguem, procurar estabelecer estimulos no Exercito, e Armada; e prevenir, que um homem que tem merito, não marche atraz de um individuo, que não tem nem serviços, nem merecimento. Isto talvez pareça interesse particular por aquella Classe, porém declaro, que o interesse que tenho o do meu Paiz; porque não havendo estimulo,

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não póde haver homem nenhum transcendente, por que não é provavel que se entregue a estudo, e as meditações, e que procure fazer serviços a sua Patria, senão tiver uma esperança de recompensa. Aqui só em Portugal é que se segue o systema de antiguidades, nem em França, nem em Inglaterra, nem mesmo em Hespanha elle está adoptado, somos nos o Paiz sui generis talvez a diga, que seguindo se este systema, e a maneira de fugir aos inconvenientes do patronato, não duvido que houvesse algum patronato adoptando se outro systema, póde ser que o houvesse, e dahi resultasse injustiça, mas que males não resultam do systema actual? Por ventura porque não e obvia a maneira de resolver estes inconvenientes, não «e deve fa7er uma Lei, que concilie, da mineira possivel, o» interesses do Exercito com a moralidade, e interesse publico Peço perdão a V. Ex.ª, e a Camara de ter feito esta digressão, e assim voltando ao ponto em questão do Adiamento, que é aquella de que devo occupar-me, digo, o insisto em que o Adiamento não deve ser concebido da maneira, que o illustre Deputado o apresentou quero que o Projecto seja adiado, mas desejo que se recommende ao Governo, que apresente aqui um Orçamento da despeza necessaria pura constituir o Collegio a bordo, e para constituir o Collegio em leria, e logo que o Governo apresentar o Orçamento para a organisação da Escóla Naval, e junctamente os esclarecimentos necessarias sobre o Systema Collegial abordo, e em terra, eu Camara fica habilitada para julgar de um, e outro Systema, de sorte, que quando não seja possivel adoptar-se nem um, nem outro Systema, pelo não permittir o estado das nossas Finanças, então so nesse caso e que devemos adoptar este Projecto, (Apoiados) mas para esse tempo reservo-me para provar a Camara, que elle não póde ser approvado, tal como se acha Portanto parece-me ter dicto bastante para fundamentar esta minha opinião, e concluo dizendo, que approvo o Adiamento nos termos, que acabo de expor, e segundo os quaes vou mandar para a Mesa uma Proposta, a qual peço a V Ex.ª submetta a approvação da Camara.

Proposta — Proponho que o Projecto em discussão seja remettido ao governo, para que apresente a Camara o Orçamento da Escóla Naval com o Systema Collegial a bordo, e com o Systema Collegial em terra, a fim de ficar a Camara habilitada a poder resolver esta questão. — Fontes Pereira de Mello

O Sr. Presidente: — É minha obrigação informar a Camara do modo como tem proseguindo esta questão, porque não dezejo que fiquem estabelecidos precedentes para o futuro.

Quando se tractou da discussão de generalidade deste Projecto, foi mandada para a Mesa uma Proposta de Adiamento e estavam inscriptos sobre a questão do Adiamento os seguintes Senhores (Leu a Inscripção) Ficou extincta esta Inscripção na Sessão de hontem, mas por falta de numero não se póde sujeitar a decisão da Camara a materia do Adiamento Hoje logo que se entrou na Ordem do Dia, a Mesa propoz se o Adiamento estava sufficientemente discutido — a Camara decidiu que sim — e sujeitando a sua decisão primeira e segunda vez a Proposta de Adiamento, não póde haver decisão, por que não chegou a haver 37 votos por um dos lidos Logo que a Carreira e achou em maior numero disse que ia tornar a sujeitar a sua decisão este negocio, mas o Sr. Deputado Fontes Pereira de Mello requereu, e a Camara lhe concedeu a dispensa do Regimento para poder ainda fallar, não obstante ter-se julgado discutida a Proposta de Adiamento. Concedi a palavra ao Sr. Deputado, e agora n'este estado da questão manda para a Mesa uma Proposta de Adiamento

Ora segundo o Regimento não posso dar andamento a esta Proposta, por que está fóra dos termos delle, visto que está julgada discutida a materia do Adiamento, (Apoiados) e além disto, esta Proposta vai alterar o estado da discussão, porque o nobre Deputado e cedeu o fim para que pediu a Camara lhe concedesse a palavra Entretanto o Sr. Deputado póde fazer um Requerimento, para que se dispense o Regimento nesta parte

O Sr. Fontes Pereira de Mello: — Apezar da determinação do Regimento, pedia a V. Ex.ª que tomando em consideração a minha Proposta, houvesse de consultar a Camara, se a admittia a discussão, dispensando para isso o Regimento, se for necessario.

Consultada a Camara sobre se dispensava o Regimento para este fim, revolveu negativamente.

O Sr. Presidente: — Vou novamente submetter á votação da Camara o Adiamento proposto pelo Sr. Jeronymo José de Mello, porém devo notar que este Adiamento pela maneira que está proposto, póde admittir duvída sobre se e indefinido e por isso convido o seu Auctor a declarar qual foi a sua intenção?

O Sr. Jeronymo José de Mello: — Eu proponho o Adiamento definido, e com urgencia.

O Sr. Presidente: — Então consulto a Camara, se approva o Adiamento neste sentido.

Foi approvado.

O Sr. Presidente: — Passa-se ao Projecto n.º 103. É o seguinte

Parecer. — Senhores. A Commissão Especial, procurando desempenhar o encargo, com que a honrou a Camara, examinou com a attenção devida a Proposta do Governo sobre a construcção e melhoramento das Estradas do Reino A Commissão entendeu, que, para corresponder á confiança nella depositada, lhe cumpria unir a maior diligencia no exame a maior actividade de trabalho, e não poupou para este hm nenhum esfôrço ou sacrificio

A Proposta do Governo abrange um verdadeiro Codigo de vias de communicação, como se carecia, e como se desejava ha muito tempo. O systema é facil e claro, os principios, em que assenta, são os que a Sciencia proclama, e a experiencia confirma. Uma discussão geral, que tome os pontos fundamentaes para base, e se occupe delles sem rastejar até a minuciosa analyse das provisões, que lhe reservam de desenvolvimento, e, no Parecer da Commissão, a maneira unica de apreciar o systema, que se preferiu exemplo de todos os Parlamentos o conforme em apontar este methodo como o mais adequado, e talvez como o so possivel e conveniente

A Commissão seguindo-a tambem, não descende a individuar senão os principios mais importantes em que prende toda a harmonia, e toda a acção da Proposta Expostos estes, e demonstrada a sua utilidade, está provada igualmente a vantagem do Systema

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A Proposta, divide-se em tres partes, sobre que deve recair a discussão principalmente. A Administração, o Imposto, e as Expropriações por Utilidade Publica A primeira inclue os methodos de execução, a segunda os meios pecuniarios; a terceira facilita, respeitando o sagrado dos direitos, a prompta solução dos conflictos entre a propriedade, e a administração.

De tres Systemas Practicos em differentes Paizes, a Proposta escolheu o que confere ao Estado a execução directa das Estradas. O Systema por emprezas, além de outros, offerece todo o odio dos monopolios, impede o melhoramento gradual, e tem de indemnisar os interessados dos avanços do capital, que fazem na esperança de bons lúcios. O rigor das Pautas de Barreira, e o vexame dos Povos são as consequencias deste methodo, que entre nós, por motivos obvios, não deve nem ser lembrado. O Systema Mixto, que de balde lenta conciliar a Empreza, e o Estado, apresenta todos os defeitos de ambos, ou, em realidade, não e outra cousa mais do que um seguro de perda para resalvar os erros das Companhias.

Por estas razões a Commissão julga, que o principio de execução dilecta das Estradas pelo Estado e o unico admissivel em Portugal; e viu com a maior satisfação, que a Proposta do Governo o adopta plenamente. Nas circumstancias particulares deste Paiz, com a sua economia, e com os seus habitos, qualquer ou II o só podia ser ruinoso.

A Proposta não se limita ás Estradas dilectas e transversaes, mais largo e completo, o seu pensamento abraça os Caminhos de Districto, e os Caminhos Visinhaes, e Ruraes. Liga logo ás antenas as veias necessarias para tomar a circulação facil, commoda, e prompta Foi este methodo os Povos apalpam desde logo a utilidade da obra, e sentem em sua casa o beneficio destes melhoramentos, e a sua experiencia dentro em pouco tempo será o argumento mais forte, que no seu espirito ha de animar o zêlo pelo progresso o conservação das listradas.

Uma Junta Central preside aos trabalhos geraes, e.1 unias de Districto dirigem a feitura dos Caminhos de Districto. As Municipalidades estão commettidos os Caminhos Visinhaes, e Ruraes. Estas Juntas, adstritas a uma responsabilidade severa e effectiva pela sua gerencia, e reciproca e gradualmente dependentes, são de Eleição Popular.

Por este methodo os Povos teem toda a garantia, e exercem a acção conveniente. E attendido o interesse local sem lhe sacrificar com tudo a unidade e harmonia dos trabalhos. A nossa Arma de Engenheria e chamada a um serviço activo e util, e o Exercito mesmo aproveitado na proporção devida para auxiliar o aperfeiçoamento geral.

Os meios pecuniarios consistem no Imposto de vinte por cento Addicional aos Impostos Directos. Nenhum outro encargo mais se estabelece, abolindo-se os Direitos de Barreira, os Impostos Municipaes applicados a Estradas, e proscrevendo-se o Tributo Capitação como vexatorio. Toda a administração e cobrança do Imposto Addicional é da privativa competencia das Juntas, com as mal escrupulosas providencias para elle não ser desviado da sua applicação. Além da responsabilidade, que lhes está inherente, as Juntas tem tambem a fiscalisação reciproca do Governo, ao qual é consignado o direito de as dissolvei em abusando.

Esta garantia dada ao imposto das Estradas, que não sae nunca assim da acção popular, nem póde ser desviado do seu objecto, e a mais constitucional, e a mais propria para attrahir a confiança do Paiz. Ninguem com sombra de verdade poderá incutir suspeitas no animo dos Povos, porque o desengano está ao pé delles, nessas Juntas electivas e suas, unicas que administram e arrecadam o Tributo. A questão das Expropriações tambem está comprehendida na Proposta. Respeitando o principio da Carta Constitucional, e os Direitos Individuaes declarados nella, regula se a fórma de expropriar, e de avaliar, e pagar a indemnisação, adoptando-se no Processo Administrativo methodos, que dão todas as garantias aos Proprietarios sem admittir delongas e embaraços, donde resultasse prejuiso ás obras em execução. Parte das provisões a este fim tendentes acha-se já na Legislação vigente; e a que se declara pela primeira vez agora, mostra-se justificada pela equidade das Compensações, e pela utilidade geral da Sociedade.

As Communicações Fluviaes são igualmente contempladas; a sua combinação com as Vias terrestres, e a navegação dos maiores Rios, que banham o nosso fertil Territorio, completa o Systema, e deve executar-se pelo mesmo methodo applicado ás Estradas.

Uma Lei de Estradas é uma providencia profundamente organisadora, como meio de receita efficaz, e como estimulo de Commercio e Civilisação. A Proposta comprehende uma Legislação completa e harmonica, que em outros Paizes se acha dispersa e desconnexa, e não só está conforme com principios da Sciencia, mas com as tendencias e particular estado do nosso Paiz. Traçadas segundo o seu pensamento, as Vias de Communicação hão de tornar-se populares, e a repugnancia ao Imposto desaparecem completamente. Nenhum outro Systema podia ser menos oneroso do que este, que reduz a um unico imposto a receita para as Estradas, que entrega a Juntas Populares a sua applicação, e desembaraça o transito e o trabalho pessoal do gravame das Barreiras e da Capitação.

Por estas razões, que são as que principalmente se devem considerar em objectos desta importancia, a Commissão é de parecer, que a Proposta é conveniente e util, abrindo-se ácerca della uma só discussão na generalidade, que aprecie o Projecto no seu pensamento, sem perder um tempo precioso em debates microscopicos, que muitas vezes mutilam a Lei, tornando-a antinomica.

A Commissão não propõe um Voto de Confiança, porque entende que, em materias de Imposto e sua Fiscalisação, é indispensavel todo o escrupulo; porém julga que, pelo meio indicado, será facil conciliar a economia do tempo com a auctoridade da prerogativa parlamentar, e com o esclarecimento necessario dos principios essenciaes; o propõe que a Proposta do Governo seja convertida no seguinte Projecto de Lei. — Barão de Filia. Nova d Ourem, (Presidente), Francisco de Assis de Carvalho, Augusto Xavier Palmeirim, Augusto Rebello da Silva, (Secretarios, Eusebio Candido Pinheiro Cordeiro Furtado, José Joaquim Lopes de Lima (Com observações), A. R. O. Lopes Branco, (Relator).

Veja-se a Proposta a que se refere este Parecer no Vol. 8. das Sessões de 1848. — na Sessão n.º 9, de 10 da gosto a pag. 1, primeira col.)

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O Sr. Fontes Pereira de Mello — Pedi a palavra sobre a Ordem para dizei que não estando presente o Ministerio, não se póde discutir um Projecto desta ordem.

O Sr. Presidente: — O Projecto ainda se não leu; e por isso julguei que quando o Si Deputado pedia a palavra sobre a Ordem, era para pedir a dispensa da leitura.

O Sr. Corrêa Leal. — Peço a V. Ex.ª que consulte a Camara se dispensa a leitura na Mesa deste Projecto

Assim se resolveu

O Sr. Avila: — Não sei se algum Sr. Deputado já propoz a questão de Adiamento sobre esse Projecto?

O Sr. Presidente — Ainda ninguem propoz o Adiamento

O Sr. Avila — Eu não sei como se possa discutir este Projecto, quando lia Contractos pendentes que é necessario terminar antes de se proceder a esta discussão, eu pedia a palavra persuadido que já havia Proposta de Adiamento, porque o queria sustentar.

O Sr. Presidente — Ainda ninguem propoz o adiamento, o Sr. Deputado tem duello de o propor, fallou-se por incidente que não estava presente o Governo, mas não se mandou Proposta nenhuma para a Mesa, nem era occasião propria, porque o Governo está representado pelo Sr. Ministro da Fazenda que se acha na Sala, entretanto o Sr. Deputado se quer fazer alguma Proposta, póde mandal-a para a Mesa.

O Sr. 4vi!a — Como o Sr. Ministro da Fazenda pediu a palavra, não faço Proposta alguma sem ouvir a S. Ex.ª, porque póde sei que o Governo tenha alguma razão para querer que o Projecto passe.

O Sr. Ministro da Fazenda: — Eu não faço mais que lembrar á Camara uma Proposta, que o Sr. Presidente do Conselho de Ministros apresentou-ha poucos dias, dizendo, que havendo talvez alguma difficuldade em discutir-se o Projecto das Estradas antes de o Governo ter concluido estas negociações pendentes, seria conveniente que a Camara se occupasse da discussão da Lei Eleitoral Esta Proposta foi acolhida pela Camara, e talvez seja conveniente tomar-se uma resolução a este respeito, visto dizer-se que ainda senão tomou, porque o Governo reservar-se-ha para pedir a discussão da Lei das Estradas, quando assentar que é occasião opportuna.

O Sr. Presidente: — Em quanto não houver Proposta regular de Adiamento, continua o Projecto em discussão; houve sim a declaração de S. Ex.ª que importa o mesmo; mas nessa occasião não se podia propor o Adiamento, porque os trabalhos da Camara não se podem alterar senão pelo meio que determina o Regimento

O Sr. Avila — (Sôbre a Ordem.) Sr. Presidente, eu vou propôr o Adiamento do Projecto, porque a declaração do Sr. Ministro da Fazenda demonstra evidentemente, que o Governo não tem empenho em que elle se discuta por em quanto, com isto não se deve suppôr que nós queremos que o Paiz fique privado de uma boa Lei de Estradas, pelo contrario tenho a convicção intima, de que a havemos de ter a mais perfeita possivel, S. Ex.ª o Sr. Presidente do Conselho de Ministros fez-me a honra de me nomear para a Commissão de Liquidação de Contas da Companhia das Obras Publicas, Commissão de

que eu pedi a S. Ex.ª houvesse por bem de me excluir, mas não fui attendido, e então entendi que devia tractar de desempenhar quanto podesse os deveres que me impunha essa Commissão, e do Estudo que tenho feito sobre o estado das contas da Companhia das Obras Publicas, colloquei-me na posição de saber as circumstancias em que esse negocio estava antes da organisação daquella Companhia, e o estado em que se acha até ao presente, e vejo que toda e qualquer discussão que agora se fizer sobre este negocio, e completamente inutil; e ainda mesmo que se vote esta Lei, não podemos começar ou continuar as Estradas, em quanto o Governo não liquidar as contas com a Companhia. Portanto se e inutil o trabalho desta discussão; senão havemos de fazer nada, entendo que é melhor discutir outro Projecto de que se posa já tirar algum partido. Eu sinto-me embaraçado bastante sobre o tempo, porque hei de propôr o Adiamento. O Ministerio declarou já que não tinha empenho em que o Projecto se discutisse, por consequencia a minha duvida não é em o propôr, e em marcar o praso, dentro do qual deve vigorar esse Adiamento. Com tudo aproveitarei a idéa de um illustre Deputado que se assenta a meu lado, e mando para a Mesa a seguinte

Proposta. — Proponho o Adiamento do Projecto n.º 103, até que o Governo declare terem cessado os obstaculo. que existem para se votar esta Lei. — Avila.

Foi apoiada, e entrou em discussão.

O Sr. Assis de Carvalho — Sr. Presidente, sinto-me um pouco incommodado de saude, e não fazia mesma tenção de fallar nesta Sessão; mas não posso deixar de dizer duas palavras sobre o Adiamento deste Projecto

A Sessão deste anno vai sendo a Sessão dos Adiamentos, (Apoiados) todos os Projectos que tem vindo á discussão, teem sido adiados; apresenta-se agora o Projecto das Estradas, pede-se o Adiamento, porque o Governo deu a entender directa, ou indirectamente que não tinha empenho nesse negocio, como disse o illustre Deputado.

Sr. Presidente, seja-me permittido fazer alguma reflexões, pelo que diz respeito á consideração que esta Camara deve merecer ao Paiz. Nos temos feito declinar um pouco o direito da nossa Iniciativa, temos feito perder um pouco esta preciosidade, porque primeiramente para quasi todos Os Projectos de Lei que teem sido discutidos, exigimos a presença do Ministerio, para dizer — se sim ou não e conveniente que se discuta. Em segundo logar examinando a Synopse dos trabalhos da Sessão passada, vi que dos Projectos de Lei que foram discutidos, os que tiveram Iniciativa do Governo, comparados, com os que tiveram Iniciativa dos Deputados, estão na razão de vinte para um; se se metter em linha de conta a tabella dos Projectos que o Governo veio apresentar a Camara para serem approvados, então teremos a proporção de cem para um, e se notarmos quanto» e quaes Projectos ficaram por discutir, acharemos noventa e sete todos não Ministeriaes, já se vê portanto que esta Camara vai sendo sòmente a Chancellaria do Governo, porque os Projectos de Lei ainda os mais insignificantes, não se discutem sem estar presente o Governo, ou sem que elle dê licença para se discutirem, lamento que a Camara va declinando um pouco da sua dignidade, em materia de discus-

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são de objectos que tão de interesse a todo o Paiz; feitas estas considerações passarei a discutir o Adiamento offerecido ao Projecto. O Adiamento, senão fossem as considerações devidas ao illustre Deputado que o propoz, não havia alguma outra o sufficiente para ser apoiado. As razões que o illustre Deputado expoz são as seguintes «que estão pendentes liquidações com a Companhia das Obras Publicas?» e que póde dar-se a convicção de que será mais conveniente restituir os Contractos dessas Companhias ao seu estado primitivo.

Sr. Presidente, parece-me que a dicussão desta Lei é independente da liquidação dessas Companhias, porque se as Companhias teem direito á liquidação com o Estado — vai procedendo a ella, assim como o Projecto vai seguindo a sua marcha regular, sem que uma questão possa servir de obstaculo á outra. Portanto, sendo este um Projecto em que o Governo mostrou tanto empenho na Sessão passada; que o apresentou num dia, que foi nomeada a Commissão no dia seguinte, que a Commissão apresentou o seu Parecer dentro em pouco tempo, e que é um negocio de interesse para todo o Paiz, não vejo que inconveniente posa haver em que pelo motivo da liquidação dos contas da Campanha o Projecto seja adiado! Se o illustre Deputado espera que cheguemos á convicção de que é mais conveniente entregar novamente os Contractos ás Companhias, não é tambem essa esperança que póde tornar inutil a discussão do Projecto, porque, ou o Contractos caducaram por uma força maior, e o Governo fica na liberdade de indemnisar, ou não caducando, como o primeiro ponto cardeal da discussão é determinar o systema que havemos de seguir entre os tres seguintes, o de administração, o mixto, e o exclusivo por emprezas, então terá logar a discussão dos interesses e direitos particulares das Companhias, (Apoiados) porque me parece absurdo pensar que uma Lei de interesse geral, tão grave, deva ser adiada pela presença de direitos e interesses particulares que nunca deixam de ser isso, que são qualquer que seja o resultado da discussão. (Apoiados)

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Eu julgo conveniente, fazer uma rapida exposição deste negocio, para que a Camara tom cabal conhecimento delle possa tomar uma resolução a respeito do Adiamento.

Sr. Presidente, quando se organisou a Companhia das Obras Publicas, existiam já tres Contractos sobre listradas: dois sobres as Estradas do Minho, e um sobre a Estrada do Porto a Lisboa. No primeiro Contracto de Estradas sobre o Minho era a Companhia obrigada a abrir a listrada do Porto a Braga, de Braga a Guimarães, e de Guimarães ao Porto, e por esse Contracto não era o Governo obrigado a pagar-lhe sobrevenção alguma; tinha unicamente de pagar parte das expropriações, e as obras d'arte, e a Companhia tinha o Direito por trinta annos do imposto de Barreira, e o exclusivo de diligencias, e transportes accelerados. No segundo Contracto tinha a Companhia as mesmas vantagens, mas o Governo era obrigado a pagar uma sobrevenção de tres mil réis por braça.

O Contracto celebrado com Lombré e Companhia era para se abrir a Estrada de Lisboa ao Porto, com a ramificação para as Caldas da Rainha. A Companhia das Obras Publicas foi depois auctorisada a haver a si todos n3 Contractos existentes, e em consequencia contractou com aquella Companhia, e comprou o Direito que tinha aquella Companhia á do Minho por 200 contos, sem que o Governo fosse obrigado a dal-os; quanto ás outras Estradas que eram contractadas com um outro Emprezario, exigiu elle pelo seu Direito 236 contos; e a Companhia obrigou-se apagar esses 236 contos por conta do Governo; e as Estradas continuaram; mas a Companhia ficou com os Direitos daquellas Estradas.

Ora a primeira questão que ha a resolver, tão depressa se apresentem as Contas de que tem sido encarregada a Commissão Presidida pelo illustre Deputado o Sr. Avila, é sobre essa questão dos 200 contos que tem de se pagar á Companhia, para o Governo ficar com o Direito de fazer as Estradas, ou ter ella de as fazer á sua custa: este é um ponto que só se póde decidir depois que a Commissão tenha emittido a sua opinião a esse respeito. — Depois ha ainda outro Contracto a respeito das Estradas do Porto a Lisboa. — A Companhia das Obras Publicas comprou o Direito por 500 contos de réis á Companhia Lombré. Destes 500 contos de réis a Companhia Lombré recebeu apenas 157 contos de réis. Agora a questão a resolver e, se convirá que o Governo pague o resto que vai de 157 contos a 500, para que a Companhia deixe de ter algum Direito sobre elle, ou se convirá, como a Companhia propõe, que esses 157 contos fiquem á conta daquillo que o Governo deve pagar pelas Estradas, e continuar ella com a sua construcção. Mas então vem aqui o inconveniente que se dá com a Lei que esta proposta, que se basea no principio de que não haja Direitos de Barreira, e por tanto tendo as Companhias estabelecidos nos seus Contractos estes Direitos, uma por trinta annos, outra por vinte, segue-se que depois de approvada esta Lei, já não podem continuar afazer as Estradas, porque lhes falta uma das principaes estipulações, com que contractaram. Eis aqui uma exposição clara do estado em que se acha este negocio. A Camara ha de decidir do Adiamento como entender em sua alta sabedoria, na intelligencia de que a Commissão da Liquidação das Contas tem feito tudo quanto estava ao seu alcance para acabar estes trabalhos, que julgo acabará em mui pouco tempo. (Muito bem)

O Sr. Cunha Sotto-Maior: — Desde a ultima vez que pedi a palavra nesta Camara. um profundo aborrecimento se apodei ou de mim, a ponto que estava resolvido a não abrir mais a minha bocca no Parlamento. Porém, Sr. Presidente, o Adiamento proposto pelo nobre Deputado pésa por tal fórma sobre as minhas intenções, que não posso neste momento prescindir do direito que tenho como Deputado.

O Parlamento está aberto, as Commissões organisadas, e todos os Projectos de utilidade publica que se apresentam á discussão têem sido adiados! Foi adiado o Projecto sobre a plantação do Café em Cabo Verde; foi adiado o Projecto sobre a organisação da Escóla Naval; e acaba de ser adiado o Projecto para a organisação da Fazenda Militar; e agora vem-se propor o Adiamento do Projecto sobre as Estradas!!... Eu não sei se este Projecto das Estradas contende com as liquidações das Companhias; só lembrarei á Camara que o Governo o anno passado nomeou uma Commissão para estas liquidações. O que tem feito pois a Commissão?!... Será justo; será conveniente; estará no interesse do Paiz, que um Projecto da maior

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utilidade publica fique prejudicado, porque ha uma liquidação com a Companhia7... O Governo pela sua Imprensa, em quanto esteve fechado o Parlamento, estava todos os dias a annunciar-nos que se occupava, no remanso do Gabinete, dos Projectos que haviam de trazer a este Paiz os melhoramentos de que tanto preciso. Abre-se o Parlamento, e o Governo não vem aqui senão para adiar todos os Projectos, e todas as medidas, que reclamam as necessidades publicas! E é deste modo que se attende aos interesses dos Povos! E é deste modo que se satisfazem os interesses do Paiz!,.. Pois os interesses do Paiz querem que se adiem todas os medidas da maior utilidade publica!!... Pois nós estamos aqui para adiar Projectos sobre Projectos, quando o Paiz reclama de nós medidas promptas para remedio de seus males!! (Apoiados) Então melhor e adiar a Camara, ou dissolver o Parlamento.

Pois que estamos nós aqui a fazer? Apresenta-se um Projecto de alguma utilidade, levanta-se um Sr. Deputado, e diz — Peço que se adie esse Projecto — Isto e intoleravel 1!...

Este negocio. Sr. Presidente, é puramente administrativo E necessario não confundir as duas especies. Se no Projecto ha alguma disposição que contrarie as condições das Companhias, os Srs. Ministros têem a palavra, podem usar della e contrariar essa disposição Mas isto não e motivo para se adiar um Projecto desta natureza. (Apoiados) N'um Paiz tão falto de communicações, onde para ir d'aqui ao Porto por terra se gastam seis dias!!... Estamos ainda no mesmo terreno; estamos ha seis annos a disputar como havemos de abril uma estrada, construir uma ponte, etc. Isto e realmente irrisorio. A Camara póde approvar o Adiamento. Eu declaro alto e bom som, que o rejeito.

O Sr. Faria Barbosa — Sr. Presidente, eu acho esta questão de bastante gravidade, (Apoiado) e o motivo e porque este Projecto e um dos reclamados geralmente pelos Povos. Não se tendo apresentado, nem na Sessão preterita, nem na actual, nenhuma das medidas (e não são poucas) que geralmente se reclamam, não sei que pense, apparecendo agora esta, apresentar-se logo um Adiamento pelo motivo de dizer-se que estão Contractos pendentes! Estes Contractos como acabei de ouvir ha pouco da bocca do Sr. Presidente do Conselho, versam sobre celtas e determinadas Estradas, e não comprehendem todas as estradas do Reino. Por conseguinte no meu fraco modo de entender parece-me que esses Contractos, não podem de maneira nenhuma destruir o systema geral do Projecto, e que a Lei póde tractar-se. (Apoiados) E ainda que continuada a factura dessas Estradas não possam progredir algumas, creio que podem progredir as outras em grande numero das que se necessitam. Ora neste sentido pedia eu á Camara prestasse a maior attenção a este objecto pela impressão que este Adiamento póde produzir lá fóra, porque de facto esta medida é das mais necessarias, e que o Paiz reclama com mais brevidade. (Apoiados) E então se se póde discutir, como entendo que póde, sem dependencia dos Contractos a que se alludiu, parece-me que o Adiamento não devêra ter logar.

Ouvi tambem dizer ao illustre Deputado que me precedeu, que o Governo não vem aqui senão fazer Adiamentos. Isto o que eu não posso admittir. O Governo e que faz os Adiamentos nesta Camara? (O Sr. Cunha Sotto-Maior — E.) Eu da minha parte rejeito similhante idéa. A Canina é quem faz Os Adiamentos. Então o illustre Deputado queixe-se da Camara, e nunca do Governo e da Camara quando faz os Adiamentos e por assim o entender. (O Sr. Cunha Sotto-Maior — Obrigado.) E não se diga que a Maioria vem aqui tambem fazer Adiamentos. Eu sou Deputado da Maioria, e combato o Adiamento. Da minha parte rejeito o Adiamento proposto.

O Sr. Castro Ferreri: — Sr. Presidente, este Projecto e um dos mais importantes que se tem apresentado nesta Camara, reclamado ha muito tempo por toda a gente, que deseja o bem do seu Paiz. O Governo na Sessão passada reconheceu a importancia delle, qu indo aqui veio apresenta-lo. A Commissão a que foi encarregado este negocio, occupou-se delle com o maior disvelo; apresentou este Projecto, e agora vem o nobre Deputado propôr o seu Adiamento! V. Ex.ª e a Camara tem visto as instancias com que este Projecto tem sido reclamado, porque e o Projecto mais importante que aqui se tem apresentado; um Projecto que póde felicitar o Paiz: Projecto importantissimo que os Povos reclamam, porque tende a tirar este desgraçado Paiz do estado em que se acha (Apoiados).

Ora, Sr. Presidente, que temos nós a fazer com as Companhias? Ha de haver uma indemnisação. Pois nós havemos de demorar o Systema geral do Projecto, que se póde adoptar, porque ha de haver uma indemnisação as Companhias? Para que vem aqui dizer-se que se está procedendo a essas liquidações? O Governo ha de propôr a maneira de satisfazer essas indemnisações, mas nós agora não ternos nada com isso; porque com essas liquidações póde haver delongas e pleitos, e nós e o Paiz não podémos estar á espera que terminem essas pendencias, para então entrar em discussão este objecto (Apoiados). Acho por tanto que essas liquidações, essas indemnisações das Campanhas, não tem nada com o Projecto, que envolve um Systema novo d'Estradas, e realmente não podémos approvar o Adiamento que se propõe. Por tanto julgo conveniente entrar quanto antes na discussão do Projecto. Voto contra o Adiamento.

O Sr. Agostinho Albano — Maravilho-me na verdade que em tão solemne occasião, e em taes circumstancias, se tracte do Adiamento de um Projecto, que é do maior interesse ao Paiz. Entendo que este e um dos objectos de maior importancia que o Paiz reclama (Apoiado, apoiado). Eu faço justiça ao nobre Deputado que propoz o Adiamento; rei quaes são as suas idéas a este respeito, e que está como eu convencido de que este é um objecto importantissimo, que deve merecer a attenção do Parlamento. (O Sr. Avila: — Apoiado). O motivo a que o nobre Deputado alludiu, para sobre elle assentar a razão principal do Adiamento, parece-me de pouco fundamento, porque quaesquer que sejam as liquidações que haja a fazer a essas Companhias; qualquer que seja o resultado dessas liquidações, isto não póde ter cousa alguma com a Lei nova de que se vai tractar.

Sr. Presidente, desde que o pensamento geral das Estradas, o grande pensamento que em 1815 se converteu em Lei, para tractar d'Obras Publicas, e que foi este projecto confiado a uma Companhia chamada d'Obras Publicas, depois que com esta outras Com-

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panhias, quaesquer que fossem, tractaram; o certo é que os Contractos que se fizeram anteriormente deixaram d'existir para esses individuos, e reuniram-se todos naquella Companhia d'Obras Publicas; o certo é que caducaram as outras Companhias, e com ellas caducaram pois todos os Contractos. As Companhias pois havendo caducado, não lhes fica nada e não direito da parte daquelles individuos que as representavam para haverem do Governo as competentes e devidas indemnisações. Pois porque existem estas reclamações, porque ha direitos a verificar da parte dos que os reclamam, porque nós leremos de satisfazer indemnisações que podem exigir-se daquelles a quem as devemos, ha de uma Lei tão reclamada pelo Paiz, da maior utilidade para o interesse dos Povo, deixar de discutir-se, porque ha essas reclamações ou esses direitos a verificar?!... O, Sr. Presidente, eu penso que isto é a contradicção mais flagrante que póde imaginar-se (Apoiado). Mas esses direitos podem envolver alguma cousa a discussão da Lei? Entendo que não podem. Se esses direitos existirem é necessario que o Governo proponha na Lei do Orçamento os meios necessarios para satisfazei ás reclamações procedentes desses direitos, e venha pedi-los ao Corpo Legislativo. De outro modo não entendo que posa haver Fazenda Publica nunca (Apoiados).

Se pois ha alguem que tem direitos a haver, penso que não póde existir outra cousa senão a restituição, e para restituir, ou compensar taes direitos ha de necessariamente o Governo vir ao Corpo Legislativo pedir em separado o meios, com os quaes esses direitos hão de ser preenchidos ou indemnisados; mas que tem este objecto com a discussão da Lei?... P013 o Systema de listradas, a Lei que se vai discutir tem alguma cousa com o Systema de Estradas, que caducou assim como caducaram os Contratos então feitos?...

Todos esses Contractos caducam completamente, não se póde faz r obra por elles, nem em virtude delles: o que resta pois hoje é formar e estabelecer uma nova Lei, em virtude da qual se possa preencher este glande objecto. — Pôr o Adiamento a questão de sua natureza ião grave, tão importante, tão salvadora, para o Paiz, e tão necessaria, e que sem ella não póde haver Fazenda Publica, que é a base de grande parte dos rendimentos da Fazenda Nacional, sem cujo facil transito não é possivel que a industria agricola e fabril possam progredir, nem mesmo que o Commercio interno possa ter grande desenvolvimento; se estas são as fontes de que devem manar os rendimentos publicos; como podemos nós retardar uma Lei, que ha de romper este canal d'onde hão de vir tantos bens?... Suspender a sua discussão não é senão, no meu modo de pensar, a mais perfeita contradicção com aquillo que todos nós entendemos, nesta parte não podem haver dois votos. (Apoiados)

Se o Governo precisar de providencias para satisfazer a estes direitos, a estas restituições de que se tracta para resolver os quaes já foi nomeada uma Commissão, e esta Commissão tem já em grande andamento os seus trabalhos, e foi muito bom isso, e que assim se tractasse esse objecto, que venha aqui o Governo -pedir taes providencias, com que possa terminar essa questão; mas esse objecto nada tem, absolutamente nada com a lei de que nos devemos occupar, entre uma cousa e outra nada póde haver de commum no novo Systema de Estradas, e o objecto de restituições de direitos, ou indemnisações por perda de direitos não póde, por modo algum embarcar o objecto de que tracta o Projecto em discussão; e pergunto eu essas restituições, e indemnisações hão de ser julgadas por esta Lei das Estradas?... Não de certo, porque esta Lei é destinada unica e simplesmente para o estabelecimento do Systema geral da construcção das Estradas; essas indemnisações ainda quando sobre ellas haja uma combinação ou convenção, e o Governo não tenha meios para as satisfazer ha de vi-los necessariamente pedir ao Corpo Legislativo, e as respectivas medi las, quaesquer que ellas sejam não tem nada, absolutamente nada com o Systema geral das Estradas, nem relação com os meios que forem consignados para a feitura das Estradas; póde ser que alguem imagine, que dos meios consignados para a feitura, conservação e aperfeiçoamento das Estradas se posa distrair alguma somma para ser applicada as indemnisações, ainda mesmo, nessa hypothese, de maneira nenhuma aqui se póde involver disposição sobre ella, essa hypothese quando se dê, deve ser objecto de nova Lei, e não na Lei que estabelece o Systema a seguir na feitura, conservação e aperfeiçoamento de Estradas, é objecto alheio, porque esta Lei não tem nada com o que existe, ou possa existir a respeito de antigas Emprezas, para indemnisar essas Emprezas ou individuos contractantes; cujos meios e modo deve ser proposto em outra Lei inteiramente destacada desta Lei que ora nos occupa.

Eu não posso suppor, que se queiram hoje os mesmos meios que foram votados e consignados para a Lei de 22 de Julho de 1843, taes meios já não são possiveis, parece-me que não ha aqui quem -queira hoje restabelecer, a Capitação. (Apoiados) Querer-se-ha hoje votar esse meio?... De certo não. (Apoiados) Nem mesmo o outro meio que era o Quinto, ou &20 por cento sobre a quota decimal, acham porventura os nobres Deputados que se poderá hoje, nas circumstancias em que nos achamos, lançar máo desses impostos no ponto em que foram então votados?... Não me parece; mas esta questão não é para agora, nós a resolveremos quando ella se tractar.

Por tanto concluindo direi, que sejam quaesquer que forem as indemnisações que hajam de se verificar, seja qual fôr o resultado das liquidações a que se está procedendo, isso não póde ter a mais leve influencia sobre a Lei, que tracta de estabelecer o Systema geral de Estradas, porque isso deve ser objecto de Lei especial, e como as liquidações, e seus resultados não podem, nem devem influir directa ou indirectamente no Systema geral de Estradas, por isso voto contra o Adiamento.

O Sr. Rebello da Silva: — Sr. Presidente, eu não esperava que a questão do Adiamento suscitasse tanto calor; esperava que os motivos apresentados pelo Sr. Deputado Avila, e a declaração feita por parte do Governo, fossem sufficientes para que em vista d'uma e outra cousa, o aditamento fosse approvado, votando-se immediatamente. Mas não aconteceu assim; e serviu a questão do Adiamento não só para fazer recair o odioso sobre a Camara, como tambem sobre o banco dos Ministros. Para que é uma discussão tão acalorada?... Quer-se por ventura o Adiamento indefinido deste Projecto?... Não

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tem por fim o Adiamento dar logar a que se terminem certos incidentes que occorrem neste negocio, para depois se decidir o Projecto com a maior utilidade para o Paiz? Depois destes incidentes terminados não ficará a Camara com mais liberdade para adoptar o Systema que lhe parecer mais conveviente?... A Camara não quer adiar indefinidamente este Projecto, porque a Camara sabe e reconhece que o Paiz carece desta Lei, e os beneficios que ella lhe offerece, mas a Camara entende tambem que lhe cumpre adoptar os meios que tornem maiores e mais reaes estes beneficios com menor gravame do Paiz. (Apoiados) Ora os nobres Deputados que combatem o Adiamento, deviam considerar o estado actual da Commissão que ha de sustentar este Projecto. A Commissão Especial que o anno passado foi encarregada de dar o seu Parecer sobre este objecto, tinha no seu seio dois individuos que são actualmente Membros do Gabinete, e são os Srs. Lopes Branco, e Barão de Villa Nova de Ourem; a Mesa foi encarregada de preencher e5sa Commissão, e ella nomeou para este fim os Srs. Lopes de Lima, e Fontes de Mello, e a Commissão depois de assim organisada ainda não teve tempo para fazer reunião alguma, e saber se todos os Membros dessa Commissão adoptavam as bazes que contem o Projecto; o Sr. Lopes Branco era o antigo Relator; e então pergunto como se ha de discutir, e defender a Commissão este Projecto, se ainda não tem Relator especial, se ainda a mesma Commissão se não reuniu para saber se todos os -seus Membros estavam de accordo nas bazes adoptadas no Projecto, ou se seria mais conveniente adoptar alguns outros, ou outro Systema?...

Sr. Presidente, para que este Projecto se discuta, e se discuta pausada o devidamente é necessario vêr o accordo da Commissão, e nomear o competente Relator; e necessario que haja quem o defenda; uma materia tão importante como esta não é possivel estar na discussão desacompanhada de taes circumstancias; e por isso eu tinha tenção de propôr tambem o Adiamento, e já o teria feito, se o Sr. Avila se não tivesse antecipado.

Ouvi dizer que tudo nesta Sessão tem sido adiado Pergunto: quaes são os Adiamentos que esta Camara tem feito?... Eu o digo. A Camara adiou o Projecto relativo ao Café de Cabo Verde, mas porque o adiou?... Porque o Governo declarou que tinha tenção de apresentar uma medida mais ampla, o que se tornasse extensiva a todas as Provincias do Ultramar, que della carecessem; póde isto ser objecto de accusação?... Pois póde arguir-se uma Camara porque adiou um objecto com o intuito de querer tornar mais geral o beneficio d'uma Lei qualquer?... De certo não. (Apoiados) Taes Adiamentos fazem sempre honra á Camara que os adopta. (Apoiados) Adiou tambem o Projecto da Escóla Naval, porque os Membros da Commissão não estavam accordes sobre o Projecto, porque o Relator dessa Commissão declarou que o não defendia, porque reconheceu ser mister reorganisal-o, em attenção ás nossas actuaes circumstancias. Adiou um terceiro Projecto, da organisação da Fazenda Militar, que envolvia um Voto de Confiança, mas adiou-o porque um Membro da Commissão o pediu, e porque o Governo adoptou esse Adiamento, porque tinha em vista apresentar um Projecto completo a respeito da

materia sujeita. E não seria este Adiamento tambem justo? De certo que sim, porque justo é que se discuta antes aqui uma Lei completa, do que uma simples auctorisação sobre negocio tão importante. (Apoiados) Por tanto não se póde sustentar a proposição de censura, que se lançou sobre os Adiamentos, que tem tido logar, por quanto todos elles fazem muita honra á Camara por têl-os adoptado. (Apoiados)

O Adiamento do Projecto que nos occupa é necessario, porque esse Adiamento póde concorrer muito para que esta Lei sáia daqui perfeitissima, e nós devemos discutir estas questões, que são graves, com aquella madureza que ellas requerem, a fim de que os seus resultados nos façam honra lá fóra, e aproveitem ao Paiz. (Apoiados) Mas, Sr. Presidente, diz-se que a razão dada, isto é, a razão das liquida ções é uma razão facil, e não deve ella servir para adiar o Projecto. Não o direi eu assim. Ao Governo apresentaram-se questões graves sobre o assumpto das Estradas; o Governo nomeou uma Commissão, de que é Presidente o Auctor do Adiamento, para proceder ás competentes liquidações de direitos da parte de certas Companhias; precisa este negocio liquido para depois ver qual o plano que será mais conveniente seguir no Systema de Estradas, e de certo a Lei não póde discutir-se sem previamente se terem feito taes liquidações.

Sr. Presidente, este Projecto é de grande interesse publico, é necessario que a Camara o discuta com pausa e com todo o conhecimento. Todos nós estamos conforme n'este assumpto, todos nós queremos a discussão do Projecto de Lei sobre Estradas, porque póde vir a ser com o tempo uma das fontes de receita Publica, mas é preciso que essa discussão se dê em occasião que a Camara esteja em liberdade de escolher ou adoptar o systema que melhor for para o Paiz, e não vejo agora razão plausivel contra o Adiamento. Supponha-se que o Governo queria que viesse a Lei das Estradas á discussão dizia-se fique para traz a Lei das Estradas para se discutir a Lei Eleitoral; quando o Governo pede a discussão da Lei Eleitoral, porque a Lei das Estradas precisa de um Adiamento temporario, diz-se: vamos á Lei das Estradas: de maneira que estamos continuamente atacando o Governo pelo que faz, e pelo que deixa de fazer!...

Sr. Presidente, eu entendo que o Adiamento n'esta questão é a unica medida possivel em presença da liquidação pendente; e entendo mais que o Projecto da Lei Eleitoral que deve entrar em discussão, é tão importante n'um sentido, como n'outro sentido é importante a Lei das Estriadas.

O Sr. Avila: — Sr. Presidente, eu ignorava que o Governo havia pedido este mesmo Adiamento; disseram-me agora que um Sr. Ministro tinha pedido á Camara, que por ora se não discutisse o Projecto... Eu, Sr. Presidente, tenho um dever a preencher; eu não podia deixar de me oppor a que se discutisse diante de mim este Projecto, quando estava convencido de que a sua discussão era completamente inutil. (Apoiados) Se eu soubesse, que este Projecto entrava hoje em discussão, havia de apresentar um documento, em virtude do qual estou convencido que a convicção da Camara se formaria, como se formou a minha a respeito da inutilidade desta discussão agora. E preciso que a Camara saiba

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que a Companhia das Obras Publicas de Portugal se não creou por voto meu: e julgo conveniente dize-lo, porque vi que se tomou demasiado calor nela discussão; e pareceria talvez que eu venho aqui advogar os interesses da Companhia das Obras Publicas. (Vozes: — Não, não) Esta Companhia, digo que não se creou por voto meu, cuja creação eu combati, comprou por 200 contos á Companhia das Estradas do Minho o seu Contracto.. Peço á Camara toda a attenção sobre este objecto, porque é preciso que eu apresente os motivos que tinha para propôr o Adiamento, e que não desenvolvi quando fiz a minha Proposta, porque imaginei que os Srs. Deputados que combaliam o Adiamento, os sabiam como eu; agora é necessario que eu os apresente, porque não só os Srs. Deputados que o combateram, parece-me que os ignoram, mas tal vez tambem a Camara. Eu não trouxe aqui Projecto nenhum, referem-se a mim como se eu fosse o Governo, que trouxe este Projecto, ou se tivesse a honra de ser um dos Chefes da Maioria Parlamentar; nem sou Membro do Gabinete, nem tenho a honra de fazer parte da Maioria; -ignoro por que se trouxe este Projecto á discussão; mas não posso ignorar o dever de consciencia que tenho de cumprir neste Parlamento, de dizer a verdade, offenda a quem offender. A Companhia das Obras Publicas de Portugal, como dizia, comprou por 200 contos á Companhia das Estradas do Minho o seu Contracto, obrigando-se a pagar a essa Companhia as despezas que ella tinha feito no estado em que as Estradas se achavam, quando ella as recebeu, e a dar-lhe além disso 200 contos pelos interesses, pelas vantagens que essa Companhia esperava receber do seu Contracto, e a que renunciou. A Companhia das Obras Publicas obrigou-se por escriptura solemne a não exigir do Governo o reembôlso desses 00 contos. Vieram os acontecimentos de 46, e a Companhia que viu que não podia continuar, não rescindiu o seu Contracto; (Apoiados) entenda-se bem, mas veio pedir o embolso das sommas, que havia despendido, e aquelles mesmos 200 contos de que fallei.

A Commissão de Liquidação das Contas dessa Companhia não abonou esta somma, pelo motivo que já dei; mas eu, que tenho a honra de ser Presidente dessa Commissão entendi, e assim o disse ao Governo n'uma occasião em que o mesmo Governo pediu a minha opinião a este respeito, que aquillo que a Commissão não podia abonar á Companhia, o Governo tinha obrigação de o tomar em consideração; porque a Companhia tinha comprado por 200 contos vantagens que ella não tinha fruído, e por consequencia que ou o Governo havia de embolsar a Companhia destes 200 contos, ou fazer-lhe bom o seu Contracto. Agora é possivel, que o Governo julgue mais interessante em logar de dar á Companhia estes 200 contos, restituir-lhe o seu Contracto, póde ser que o Governo entenda que isso é mais conveniente. Ainda isto não é tudo, Sr. Presidente. — Existia a Companhia Lombré, para a Estrada de Lisboa ao Porto e o Governo entendeu que devia a Companhia das Obras Publicas comprar tambem á Companhia Lombré o seu Contracto. Esta questão já foi tractada aqui, e eu sinto, que o tivesse sido como foi, e peço que se entenda que não a tracto da mesma maneira: entro só nestes pormenores porque é necessario que eu os apresente, para que se vejam os motivos do meu Adiamento.

A Companhia Lombré vendeu á Companhia das Obras Publicas, isto é ao Governo por 500 contos o seu contracto, e por um terço dos direitos de transito daquellas Estradas durante 20 annos. A Companhia das Obras Publicas de Portugal obrigou-se apagar estes 500 contos por conta do Governo; não é a condição do Contracto das estradas do Minho; no Contracto das Estradas do Minho a Companhia das Obras Publicas contractou que não exigiria o embolso; mas no Contracto da Estrada de Lisboa ao Porto os 500 contos foram dados unica o simplesmente por conta do Governo. Ora destes 500 contos ainda senão déram senão 157 contos, devem-se por consequencia á Companhia Lombré 343 contos. Eu agora noto á Camara, que a obra feita pela Companhia Lombré, avaliada pelos Engenheiros foi calculada em 90 contos, o maximo. Pergunto eu, não será talvez mais conveniente hoje entregar á Companhia Lombré, o seu Contracto, descontando os 157 contos nas sommas, que tem direito a receber do Estado, do que dar lhe 343 contos, recebendo em troco dessa somma e dos 157 contos que se lhe deram, obra que não vale senão 90 contos?... Peço á Camara que pense nisto; eu se fosse Governo talvez entendesse que é mais conveniente em logar de ir pagar estes 343 contos além dos 157 que já se déram, que é melhor restituir o Contracto. Ora, Sr. Presidente, mas as bazes deste Contracto são os direitos de Barreiras, e os direitos de Barreiras são completamente eliminados neste Projecto... Ora digo eu: o que vamos discutir?... Peço me digam em consciencia, porque é em consciencia que estou apresentando estas considerações. Aqui foram dirigidas algumas palavras ao Sr. Deputado, que não percebemos) O Sr. Deputado com os seus ápartes é que quer converter a Camara em Chancellaria, quer que eu, por isso que o Governo trouxe o Projecto o anno passado, abdique o direito de Deputado que tenho para apresentar as minhas idéas ao Parlamento... Então o que sou eu nesta Camara?... Conheço estes factos, não os hade dizer á Camara?.. (Apoiados). Ora agora indo-se votar este Projecto, pergunto, vai o Governo ámanha acabar a Estrada de Lisboa ao Porto?,.. Não; porque diz a Companhia Lombré — pagai-me 343 contos que me deveis. Vai o Governo acabar as Estradas do Minho?... Não; por que diz a Companhia das Obras Publicas — deveis-me 200 contos de réis que paguei por esse Contracto, pagarmos... Se soubesse que este objecto havia de vir á discussão hoje, e que o Adiamento havia de ser combalido, tinha-me previnido com os dados convenientes; fiquei surprehendido, porque me persuadi que toda a gente havia de convencer-se facilmente de que era uma necessidade o Adiamento: tanto não tinha tenção de apresentar estes factos, que estou desajudado dos documentos competentes; mas a Camara acredita que digo a verdade. (Apoiados). Ora digo, votar-se esta Lei, não se vota nada, porque as Estradas principaes do Paiz não se fazem, por que as Companhias veem dizer — São nossas, pagai-nos primeiro o que nos deveis.

Disse o illustre Deputado, e fez uma allusão immerecida á Commissão de que tenho a honra de ser Presidente — Mas então está a Commissão ha um anno a trabalhar, sem nada ter concluido. — A Com-

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missão não está ha um anno a trabalhar, nem mesmo ha um anno que foi creada, nem se lhe deram logo os Empregados, de que tinha necessidade, e digo aos illustres Deputados — liquidações desta ordem não se fazem a correr. (Apoiados) Nós estamos a trabalhar, e com toda a actividade possivel. Primeiramente que tudo devo dizer, que eu fiz o que pude para alcançar a minha demissão dessa Commissão, S. Ex.ª o Sr. Ministro do Reino não quiz reconhecer as razões que eu apresentei, razões ponderosissimas, mas que S Ex.ª não julgou sufficientes, resignei me, e tenho trabalhado nessa Commissão quanto tenho podido. A necessidade de desempenhar a Commissão de que fui encarregado, obrigou-me a estudar os documentos, que dl/em respeito a essa liquidação Ha contas, por exemplo, que se julgam muito simples, e não o são. e preciso ver todos os documentos que as explicam, porque não nos basta ter as contas, que apresentou a Companhia das Obras Publicas, e necessario ver em que gastou o dinheiro que pede, e se o podia gastar por consequencia vemo-nos obrigados a estudar até os Contractos anteriores a organisação dessa Companhia, e uma serie de documentos, que enchem uma casa

Portanto posso asseverar, que a Commissão senão tem andado nisto com brevidade, tem andado quanto e possivel, mas neste negocio não se póde andar depressa, (Apoiados) e uma liquidação de 1$000 e tantos contos

Fico aqui, mas peço só a Camara, que acredite, que eu, por nenhuma maneira, quero embaraçar o progresso deste negocio, por nenhuma maneira quero que deixe de se fazer uma boa Lei de Estradas, mas entendo que não se pode fazer nada agora utilmente, porque a primeira cousa que O Governo tem de fazer, e examinar a situação em que estão os Contractos de maneira porque o Governo resolver as questões, que esses Contractos suscitam, não póde deixar de modificar mais ou menos o Projecto, que entendo que deve apresentar para a feitura d'uma boa Lei de Estradas (Apoiados)

O Sr. Fontes Pereira de Mello — Sr. Presidente, In duas razões importantes, que se teem apresentado para so vencer o Adiamento por parte do illustre Deputado pela Beira Alta uma das razoes e a difficuldade em que se vai collocar esta Camara, em consequencia das questões pendentes que existem, para as quaes está nomeada uma Commissão ha tempo, e a outra e, por ser o Governo que pediu o Adiamento desta questão Pelo que diz respeito a primeira parte, o illustre Deputado que acabou de fallar, provou, na minha opinião, com solidas razões a necessidade que ha de adiar a discussão do Projecto, por isso que ella se achava complicada com as resoluções, que se houvessem de tomar a respeito da Companhia das Obras Publicas, e Contractos passados. Pelo que diz respeito a outra consideração, que o illustre Deputado notou, permitti-me V. Ex.ª, e a Camara, que eu apresente apenas duas razões.

O Governo, Sr. Presidente, apresentou o anno passado a Lei das Estradas nesta Camara, e o Governo parece-me que não julgou, que havia considerações nessa época, que o levassem a não promulgar esta Lei, entretanto o que é certo, e que o Governo bem, ou mal julgou, que devia emendar a mão, e hoje apresenta-se no Parlamento, pedindo que se retire da discussão o Projecto da Lei das Estradas

.Nesta parte, permitta-me V. Ex.ª, e a Camara, que lhe diga, vou ser Maioria Eu apoio o Adiamento, porque o Governo e o competente para saber, se está ou não habilitado para entrar nesta discussão, e estou convencido de que a Camara não ha de querer resolver uma questão desta ordem, que é verdadeiramente governamental, sem a presença do Governo Pois se o Governo e o primeiro a dizer, que não está habilitado para discutir, ha de a Camara obriga-lo a entrar por força na discussão Ainda mais a Maioria que deve apoiar o Governo, e a que quer que a discussão va por diante, quando o Governo declara, que não está habilitado para entrar nella!. Isto e extraordinario!...

Ora, Sr. Presidente, se approvando-se o Adiamento nós ficassemos com as mãos debaixo do braço por não ter que fazer, ainda a Opposição se poderia oppôr ao Adiamento, porque não havia nada que discutir, mas a Maioria e que não está nesse caso, porque a Maioria defende o Governo, e o Governo e quem pede o Adiamento. (O Sr. Passos Pimentel — Não e o Governo) O Orador — Não e o Governo? Sr. Presidente, ha poucos dias o Sr. Presidente do Conselho apresentou-se nesta Casa, e pediu, qu» o Projecto das Estradas fosse posposto ao da Lei Eleitoral... (O Sr. Passos Pimentel — Não se tracta disso agora, não e o que diz o Sr. Deputado) O Orador — O Sr. Deputado póde dizer o que quizer, mas não póde contrariar um facto, que foi ouvido por toda a Camara, (Apoiados) o Sr. Presidente do Conselho e que póde dizer o contrario, mas o Sr. Deputado, que não e Presidente do Conselho, não está auctorisado para isso, respeito o muito, mas não lhe conheço essa auctorisação O certo e que o Ministerio disse, que se deixasse o Projecto das Estradas em consequencia de certas difficuldades, que era necessario remover primeiro, por consequencia parece extraordinario, parlamentarmente fallando, que seja a propria Maioria, que queira impôr ao Governo o discutir um Projecto, que o Governo diz não estar habilitado para discutir Eu supponho que o Projecto das Estradas e muito preciso, e indispensavel, e urgentissimo, e deve discutir-se quanto antes mas parece-me com tudo, que o Projecto da Lei Eleitoral e mais importante, porque, constitucionalmente fallando, e superior a tudo, e sobre tudo n'um Paiz aonde a não ha.

Portanto resumo os meus argumentos ao seguinte Entendo que não podemos forçar o Governo a entrar em uma discussão, para a qual elle declara que não está habilitado Ainda ha pouco o Si Ministro da Fazenda disse que deseja que senão entrasse nella agora.. (O Sr. Ministro da Fazenda — Não disse tal, não ouviu bem) O Orador — Bem, eu retiro, pareceu-me que foi isto que S Ex.ª disse, e que em consequencia disso e que se tinha pedido o Adiamento, mas senão foi o Sr. Ministro da Fazenda, foi o Sr. Presidente do Conselho n'outro dia, e por consequencia o meu argumento fica em pé. Voto pelo Adiamento.

O Sr. Passos Pimentel — (Sobre a Ordem) Eu tambem estou maravilhado de ouvir dizer ao Sr. Deputado que a Maioria quer pôr em tortura o Governo, o Governo se figura nesta questão, foi pela de

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claração que fez o Sr. Presidente do Conselho, mas o que está em discussão é o Adiamento proposto pelo Sr. Avila, e não o que disse o Sr. Presidente do Conselho. Se e desagradavel que se discuta uma Lei sem estar presente o Governo, muito mais desagradavel é, Sr. Presidente, adiar-se um objecto tão importante, de que o Paiz está á espera, e que o Paiz declama. Eu estou n'uma posição difficil a respeito deste negocio, e por isso preciso, e vou explicar-me.

Eu na Sessão passada, quando fui para a minha Provincia, ouvi a individuos muito competentes, que estavam esperando os nossos trabalhos, perguntar-me o que tinhamos feito? E posso asseverar á Camara que a Lei das Estradas era a que todos esperavam, e julgavam mais necessaria no Paiz. Confiando, como confio, ao Ex.mo Presidente do Conselho, não duvidei declarar que seria um dos primeiros trabalhos de que a Camara se occuparia logo que se abrisse, e agora como posso eu votar pelo Adiamento?...

O Sr. Presidente: — Eu observo no illustre Deputado que não póde continuar a discutir, porque ainda lhe não chegou a palavra sobre a materia.

O Orador: — Mas eu preciso explicar-me...

O Sr. Presidente: — Pois espere para quando lhe competir a palavra, que ainda não é agora.

O Orador — Pois eu vou já dar o meu voto...

O Sr. Presidente: — Não o póde fazer agora.

O Orador — Pois então peço a palavra para um Requerimento para fundamentar o meu voto.

O Sr. Presidente: — Faça o seu Requerimento, mas não póde agora fundamentar o seu voto.

O Orador: — Peço a V. Ex.ª que proponha á Camara, se acaso está pelo Adiamento, e se está que este seja mais definido, e se marque uma época em que deva acabar; finalmente que tenha um termo, e que a Nação saiba, qu findo este termo seentia logo na discussão do Projecto.

O Sr. Presidente: — Peço licença ao Sr. Deputado para lhe dizer que não tem estado na Ordem; que o que está em discussão é o Adiamento; e o Sr. Deputado para dizer o que a final propoz, podia pedir a palavra para um Requerimento; não o fez, e não é possivel alterar a Ordem. Essa Proposta que o illustre Deputado acaba de fazer, podia faze-la nos termos do Regimento, mas não fundamenta-la; (Apodados) por consequencia não sendo apresentada nos temos do Regimento não lhe posso dar seguimento, e continua a discussão.

O Sr. Ministro da Fazenda: — Sr. Presidente, pedi a palavra para rectificar o que disse ha pouco tempo, no principio desta discussão, porque certamente o illustre Deputado que fallou penultimamente, e meu Amigo, não me comprehendeu,

Eu não propuz o Adiamento; o que disse foi, que não fazia mais na ausencia do Sr. Presidente do Concelho, do que lembrar a Proposta que S. Ex.ª ha dias havia feito, para que, em virtude de algumas difficuldades que se apresentam em relação ao objecto de Estradas, se sobreestasse na discussão desse Projecto; o como havia outro, não menos importante, que via a Lei Eleitoral, esse se desse para Ordem do Dia com preferencia ao das Estradas.

Ora eu entendo que nem a Opposição, nem a Maioria, e ainda menos o Governo tem a mais pequena intenção de adiar indefinidamente o Projecto das Estradas, e se se attribuir á Camara ou ao Governo essa intenção, e uma grave injustiça, que se lhe faz.

Por quanto a Camara e o Governo conhecem a urgente necessidade que ha, de quanto antes se tractar deste importante assumpto; mas a Camara não póde deixar de conhecer tão bem como o Ministerio, a conveniencia que ha em o Governo remover primeiro as difficuldades que se apresentam sobre este assumpto, e depois trazer o negocio liquido á Camara, declarar que está habilitado para discutir, (Apoiados) e entrarmos na questão inteiramente desembaraçados, porque estou persuadido que logo que este objecto principie, a Camara não lhe levanta mão, porque é uma medida que o Paiz reclama.

Portanto, se se podesse admittir um meio têrmo; o Adiamento indefinido não, nem era isso que o Sr. Avila queria, mas, como se deve entender, um Adiamento definido, o Governo não se oppunha a isso, e assim se terminava uma questão que já vai durando muito tempo.

Pedi pois a palavra para declarar que não tinha proposto o Adiamento, nem mesmo por parte do Sr. Presidente do Conselho, houve a mais pequena idéa de apresentar o Adiamento indefinido do Projecto.

O Sr. Presidente do Conselho: — Sr. Presidente, eu creio que o Paiz todo de certo faz justiça ao Governo; não é possivel que haja um só Portuguez que com o Governo não conheça, que de uma boa Lei de Estradas depende a fortuna do Paiz. (Apoiados) Existem questões graves sobre este objecto; o Governo em presença dellas, e da grande vontade que tem de dotar o Paiz com uma Lei convenientemente organisada, entendeu ser seu dever fazer conhecer á Camara, que era conveniente discutir primeiro a Lei Eleitoral, e no entanto vêr se obtinha resolver essas difficuldades que appareciam. Mas agora para evitar contestações, e para que senão queira estar a misturar a Maioria com o Ministerio, e o Ministerio com a Maioria, proponho em nome do Governo o Adiamento do Projecto pelo espaço de 15 dias. (Apoiados) Espero que nestes 15 dias a Commissão, encarregada das liquidações dará tonta dos seus trabalhos, que já vão adiantados, e depois resolver o negocio como fôr mais justo. É absolutamente necessario, Sr. Presidente, resolver primeiro as questões pendentes, porque o objecto é nada menos que carregar o Paiz com 600 contos de réis: isto é muito serio; e por isso proponho em nome do Governo o Adiamento do Projecto por 15 dias. (Apoiados)

O Sr. Silva Cabral: — O Ministerio não póde mandar Propostas para a Mesa.

O Sr. Passos Pimentel: — Mando eu para a Mesa a seguinte

Proposta — Proponho o Adiamento do Projecto n.º 103 por 15 dias. — Passos Pimentel.

Foi apoiada esta Proposta, e ficou em discussão conjunctamente com a do Sr. Avila.

O Sr. Presidente: — Eu devo dar um pequena informação á Camara, em vista da contradicção que tem havido sobre o estado da questão. Depois da Mesa ter annunciado para Ordem do Dia qualquer Projecto, não póde retira-lo sem decisão da Camara. (Apoiados) Este Projecto foi o primeiro dos dois que estão dados, que se deu para Ordem do Dia, e em quanto qualquer Projecto não entra em discussão, ninguem póde propôr o seu Adiamento. A Mesa não podia retira-lo da discussão, como já disse, por isso que tinha sido dado para Ordem do Dia; o Governo não tinha proposto o Adiamento, (Apoiados)

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nem o podia propôr senão hoje, e quaesquer considerações que em outra occasião fizessem os Membros do Gabinete, não podiam servir de norma para a Mesa se dirigir. Está em discussão o Adiamento. (Vozes: — Já deu a hora.) Ouço dizer que deu a hora; não sei se a Camara quer acabar este incidente, ou que fique para ámanhã..... (Vozes: —: — Para ámanhã.)

O Sr. Palmeirim. — Proponho que se prorogue a Sessão até se resolver este incidente. (Vozes: — Nada, nada, ámanhã.)

Consultada a Camara resolveu negativamente.

O Sr. Presidente: — Não está approvado; por consequencia a Ordem do Dia para ámanhã é a mesma; o Projecto das Estradas, e o da Lei Eleitoral. Está levantada a Sessão. — Eram quatro horas da tarde.

O Redactor,

JOSÉ DE CASTRO FREIRE DE MACEDO.

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