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SESSÃO DE 19 DE ABRIL DE 1871

Presidencia do ex.mo sr. Antonio Cabral de Sá Nogueira

Secretarios — os srs.

Domingos Pinheiro Borges

José Bandeira Coelho de Mello

Summario

Apresentação de representações, requerimentos e propostas. — Ordem do dia: Approvação do adiamento do projecto n.º 11 — Approvação, na generalidade, do projecto n.º 9, regalando a contribuição pessoal — Discussão na especialidade.

Chamada — 46 srs. deputados.

Presentes á abertura da sessão — os srs. Alberto Carlos, Pereira de Miranda, Soares de Moraes, Sá Nogueira, Antunes Guerreiro, Freire Falcão, Santos Viegas, Telles de Vasconcellos, Falcão da Fonseca, Eça e Costa, Ferreira de Andrade, Conde de Villa Real, Pinheiro Borges, Pereira Brandão, Eduardo Tavares, Francisco de Albuquerque, Francisco Mendes, Pereira do Lago, Coelho do Amaral, Costa e Silva, Pinto Bessa, Barros Gomes, Candido de Moraes, Barros e Cunha, Ulrich, J. J. de Alcantara, Mendonça Cortez, Alves Matheus, Nogueira Soares, Faria Guimarães, Gusmão, J. A. Maia, Bandeira Coelho, Rodrigues de Freitas, Almeida Queiroz, Mexia Salema, José Tiberio, Julio do Carvalhal, Julio Rainha, Luiz de Campos, Affonseca, Marques Pires, Lisboa, Mariano de Carvalho, D. Miguel Coutinho, Visconde de Montariol, Visconde de Moreira de Rey.

Entraram durante a sessão — os srs. Adriano Machado, Agostinho de Ornellas, Osorio de Vasconcellos, Braamcamp, Villaça, Teixeira de Vasconcellos, Veiga Barreira, A. J. Teixeira, Pequito, Sousa de Menezes, Rodrigues Sampaio, Antonio de Vasconcellos, Barjona de Freitas, Cau da Costa, Augusto de Faria, Barão do Salgueiro, Francisco Beirão, Bicudo Correia, Van-Zeller, Freitas e Oliveira, Jayme Moniz, Zuzarte, Pinto de Magalhães, Dias Ferreira, Mello e Faro, Elias Garcia, Figueiredo de Faria, Mello Gouveia, Nogueira, Paes Villas Boas, Pedro Roberto, Sebastião Calheiros, Visconde dos Olivaes, Visconde de Valmór, Visconde de Villa Nova da Rainha.

Não compareceram — os srs: Arrobas, Pedroso dos Santos, Saraiva de Carvalho, Barão do Rio Zezere, Bernardino Pinheiro, Caldas Aulete, F. M. da Cunha, Guilherme Quintino, Silveira da Mota, Palma, Santos e Silva, Mártens Ferrão, Augusto da Silva, Lobo d'Avila, José Luciano, Latino Coelho, Moraes Rego, Rodrigues de Carvalho, J. M. dos Santos, Mendes Leal, Teixeira de Queiroz, Lopo de Mello, Augusto Pimentel, Camara Leme, Pedro Franco.

Abertura — Á uma hora e meia da tarde.

Acta — Approvada.

EXPEDIENTE

A QUB SE DEU DESTINO PELA MESA

Officios

1.° Do ministerio da fazenda, remettendo a nota dos 15 maiores contribuintes residentes no concelho de Murça, pedida pelo sr. deputado Julio do Carvalhal de Sousa Telles.

2.° Da camara dos dignos pares do reino participando a approvação de diversas proposições já approvadas pela camara electiva.

Representações

Ácerca das propostas tributarias do governo, e especialmente a da contribuição industrial

1.ª Dos caixeiros de balcão e marçanos de Villa Real.

2.ª Dos habitantes da povoação rural de Mogofores.

Acerca de outros assumptos

1.º Da camara municipal de Villa Verde, districto de Braga, pedindo a revogação do decreto de 30 dezembro de 1868, relativa á engenheria districtal.

2.ª Da camara municipal de Sousel sobre alguns pontos das propostas de lei sobre a administração publica.

3.ª Dos foreiros á collegiada de Guimarães que pretenderam aproveitar-se das disposições do decreto de 14 de julho de 1870, pedindo para o laudemio ser reduzido á quarentena.

Foram remettidas ás respectivas commissões.

Requerimento

Requeiro que, pelo ministerio da guerra, seja mandada a esta camara declaração do numero dos doentes em tratamento no hospital militar da Estrella no dia 17 do corrente, e bem assim qual o maximo numero de doentes que podem ser tratados no mesmo hospital.

Sala das sessões, 18 de abril de 1871. = O deputado por Elvas, João José de Alcantara.

SEGUNDAS LEITURAS

Projecto de lei

Senhores. — O junco preparado paga pelo artigo 96.° da pauta actual o direito de 100 réis por kilogramma.

Este direito é quasi prohibitivo.

A sua maxima applicação é para varetas de chapéus de sol e chuva, Pelo que se póde considerar materia prima para os industriaes. N'este sentido, e para facilitar a sua importação foi proposto pelos ministros da fazenda, o sr. José Dias Ferreira em 23 de maio de 1868, proposta n.º 13, no dizer: obra de palha, palma, esparto, cannas, juncos, vimes, etc.; o direito de 10 por cento ad valorem, o sr. conde de Samodães em 18 de maio de 1869 e o sr. Carlos Bento da Silva em 5 de dezembro de 1870, renovando a dita proposta de lei.

Isto bastaria para mostrar a necessidade que ha de ser reduzido o direito d'aquelle artigo, mas acresce dever notar-se que, sendo tal genero principalmente empregado na confecção dos chapéus de sol e chuva, pagam estes o direito de importação de 20 por cento, emquanto o junco empregado em fabricar esses chapéus pagaria hoje mais de 80 por cento se tal imposição não tivesse impedido a sua importação.

É sendo urgente dar prompto remedio a este inconveniente, que tolhe a industria nacional, tenho a honra de propor o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Fica reduzido a 10 por cento ad valorem o direito de importação do junco preparado.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, em 18 de abril de 1871. = O deputado, Antonio Maria Barreiros Arrobas.

Projecto de lei

Senhores. — Uma das verbas mais quantiosas e avultadas que sobrecarregam o orçamento da guerra é a destinada ao provimento de pão aos soldados, e de forragens aos cavallos e muares.

Basta dizer, que só n'estes artigos indispensaveis, gastaria o nosso pequeno exercito, quando ascendesse a 30:000 homens uma somma muito proxima de 1.000:000$000 réis annuaes, isto é, quasi um terço da despeza total avaliada no orçamento geral do ministerio da guerra para 18:000 homens effectivos. Ainda assim esta despeza é de 700:000$000 réis, numeros redondos.

Se fosse possivel, sem alterar a qualidade e a quantidade da ração de pão e das forragens, reduzir esta enorme despeza, grande serviço se prestaria ao paiz, nas circumstancias estreitas e angustiosas que vamos atravessando.

Não é difficil, senhores, o mostrar que de jacto se podem

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fazer notaveis e quantiosas economias n'este artigo do orçamento da guerra, por uma simples inversão de methodo e transformando o systema de (...) mento directo, como se pratica em paizes mais adiantados e melhor governados, e como se ha experimentado entre nós com os mais felizes resultados, se bem que em pequena latitude.

Não é agora occasião, senhores, de mostrar as excellents e vantagens do systema de fornecimento directo sobre o de arrematações. Se é principio aceito que o exercito deve na paz preparar-se para a guerra, mal se comprehende a arrematação, que na guerra é impossivel sobre despendioso na paz.

Por varias vezes foi aventada e demonstrada esta verdade assim no parlamento como na impressa. Na sessão de 1869 mostrou um distincto official, então e agora membro d'esta casa, o sr. Luiz Augusto Pimentel, que economias importantes se podiam fazer nos fornecimentos, que elle propunha por administração directa e conforme um plano systematico, e em grande parte adequado ás necessidades do exercito com felicidade de concepção.

Com igual e não menos louvavel empenho propoz um outro distincto official, tambem então e agora deputado, o sr. Luiz de Campos, um quadro de reducções e economias, entre as quaes avultava a dos fornecimentos por administração directa.

Compenetrado d'estes salutares principios, cuja verdade tinha sido demonstrada pelos dois distinctos officiaes acima mencionados, quiz applica-los o illustre e honrado general, o sr. marquez de Sá, quando ultimamente transitou pelos conselhos da corôa e geriu a pasta da guerra.

Os resultados obtidos não desmentiram a predicção, e compulsando o relatorio da administração militar, referido ao trimestre de 1870, vê-se que as economias sobem já a uma verba momentosa.

É de facto, senhores, a padaria militar de Lisboa forneceu ás tropas da capital, Elvas e Tancos 761:469 rações de pão durante aquelle trimestre, na importancia de 26:242$825,21, réis sendo cada ração na rasão de 37,09 réis.

Ora, como cada ração, pelo preço da ultima arrematação, saíu a 58 réis, segue-se que houve uma economia de réis 13:755$728,4.

A economia annual será de 55:026$913,6 réis

O numero de rações diarias de pão que o estado fornece é de 20:450, sendo a differença entre o preço da arrematação e o da administração directa computada em 20,91 réis, a economia total seria annualmente de 156:097$467,5 réis. Segundo O mesmo relatorio official, o fornecimento directo de cada ração de grão produziu a economia de 72,1 réis, com relação ao preço da ultima arrematação que foi de 250 réis. Em cada ração de palha houve uma economia de réis 34,27, sendo o preço da ultima arrematação 82,5 réis. De sorte que no fornecimento das forragens da 1.ª divisão militar houve a economia trimestral de 6:516$490,03 réis.

A economia annual será 26:061$960,12 réis

As forragens abonadas no orçamento são 2:906 por cada dia. Fazendo o calculo a economia total seria 112:825$595,30 réis.

Sommando as duas verbas annuaes temos

Economia no pão................... 156:097$467,50

Economia nas forragens.............. 112:825$595,30

Economia total..................... 268:923$062,80

E deveis notar que esta avultadissima economia, que concorre para alliviar mui sensivelmente os encargos geraes da nação, é real, palpavel e póde ser desde já applicda por uma simples inversão do systema, isto é, forrando o estado os ganhos muitas vezes fabulosos do intermediario arrematante. Não julgueis que n’estes numeros he a menor exageração. São rigorosos os calculos, sabre dados officiaes e por mais de uma vez repetidos, com o orçamento á vista. A differença entre o preço da ultima arrematação e o de administração directa é rigorosa para Lisboa e variavel para os outros pontos do paiz, em alguns dos quaes e maior e n'outros menor. A differença média deve ser esta. Mas para evitar qualquer surpreza, aliás improvavel e mui pouco possivel, poderemos distrahir da somma de quasi 70:000$000 réis, e a economia certa será de 200:000$000 réis, numero reduzido, entrando as despezas de armazenagem, installação, etc. Tendo, pois, na maxima attenção este valioso resultado, vou submetter á vossa esclarecida apreciação o seguinte projecto de lei.

Artigo 1.º Ficam abolidas as arrematações de pão e forragens para o exercito.

§ unico. Exceptuam-se os casos imprevistos e de força maior a cargo e responsabilidade do ministerio da guerra e os destacamentos.

Art. 2.° Na cidade de Porto estabelecer-se ha o serviço do fornecimento á similhança do de Lisboa, sem que por isso seja necessario augmentar o pessoal.

Art 3.° As tropas estacionadas ao longo das vias ferreas ou que possam estar em facil communicação com Lisboa e Porto, serão fornecidas pelas administrações militares d‘estas doas cidades.

Art. 4.º Em todas as outras terras onde estacionem regimentos ou batalhões, será nomeado um official, capitão ou subalterno, um sargento e quatro soldados, para fazer o serviço do fornecimento.

§ 1.° A inspecção, compra de generos e gerencia de fundos competem ao conselho administrativo, sob a fiscalisação do commissario de mostras

§ 2.° O official terá 3$000 réis de gratificação mensal; o sargento 40 réis diarios, e os soldados 20 réis.

Art. 5.° O governo fará os regulamentos para o exacto cumprimento da presente lei.

Art. 6.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala das sessões, em 1 de abril de 1871. = Alberto Osorio de Vasconcellos, deputado por Trancoso = Mariano Cyrillo de Carvalho, deputado pelo circulo n.º 79 = José Dionysio de Mello e Faro, deputado pela Regua.

Projecto de lei

Senhores. — O projecto de lei que hoje venho submetter á vossa illustrada apreciação é de tal importancia, que forçado me vejo a largamente justificar a sua conveniencia e urgente necessidade de o ver traduzido em lei do estado.

Uma reforma de pautas é assumpto tão grave e tão importante que ninguem deve ousar pôr mãos a tal obra, sem primeiro se cercar de muitos e variadissimos elementos que lhe podem fornecer já a estatistica commercial e industrial, já a analyse das condições economicas do paiz, já finalmente o conselho de pessoas que, por estudos especiaes e por dilatada experiencia, podem encaminhar o viandante por caminhos tão cortados de difficuldades.

Se esta é uma verdade que não póde ser rasoavelmente contestada, se os homens publicos que successivamente têem gerido entre nós a pasta da fazenda têem dado a taes estudos, no que respeita á pauta das alfandegas do continente, as attenções e cuidados que a importancia do objecto reclama, podendo soccorrer-se de elementos de grande valor, e ainda assim os parlamentos acham que alterar e corrigir nas propostas de lei, que são submetidas ao seu exame e approvação, como não será maior e mais instante a necessidade de um estudo dilatado e minucioso, quando as reformas de pautas tenham de ser executadas em as nossas provincias ultramarinas, tão distantes umas das outras no espaço, como distantes no progresso, e desenvolvimento das suas naturaes riquezas. E a esta difficuldade, que ninguem póde seriamente contestar, vem juntarse outra de não somenos valor. A pauta as alfandegas de qualquer das nossas provincias ultramarinas não póde ser elaborada, tendo exclusivamente em vista os interesses commerciaes e industriaes d'essa mesma provincia; tem ella de attender aos das outras partes da monarchia. A attenção e cuidado dos estadistas devem procurar o meio

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mais equitativo de conciliar interesses que podem ser diversos, mas não oppostos, e que as conveniencias publicas e o progresso do paiz recommendam que se harmonisem.

A situação em que se encontrava, ainda ha pouco, a nossa legislação aduaneira nas colonias era de tal modo confusa, que uma reforma completa desde muito que era pedida com instancia. E se os estadistas que successivamente têem passado pelo ministerio da marinha não apresentaram ao parlamento as propostas conducentes a melhorar o estado que todos consideravam como grave e nocivo, era isso devido, por um lado á instabilidade dos governos, por outro á gravidade do assumpto, que é d'aquelles que só depois de madura e seria meditação póde ser resolvido de accordo com os interesses geraes do paiz.

Um cavalheiro que occupa um logar eminente em Portugal, que nas letras, no prefessorado, na imprensa e na tribuna parlamentar tem conquistado um logar distincto, o sr. Rebello da Silva, voltou a sua attenção, emquanto geriu a pasta dos negocios do ultramar, para a reforma e modificação da nossa legislação colonial, em relação ás alfandegas. Não ha senão que louvar n'este proposito do illustrado ex-ministro em dedicar a sua attenção para assumpto que, por tantas rasões, desde muito reclamava a meditação dos poderes publicos.

São da iniciativa do illustrado ex-ministro os decretos de 12 de novembro, de 7 e 16 de dezembro de 1869, que alteraram as pautas da provincia de Moçambique, do estado da India, do Ambriz, de Timor e de S. Thomé e Principe.

Considerando exclusivamente as pautas das nossas possessões de Africa, que mais particularmente devem chamar a nossa attenção pela importancia que hoje tem já o commercio entre as nossas provincias n'aquella parte do mundo e a metropole, vemos com assombro que o sr. Rebello da Silva no importante relatorio de 12 de novembro de 1869, trabalho notavel como todos que saem de penna tão primorosa, nem uma palavra diz para justificar a abolição total do favor concedido aos generos reexportados da metropole para as provincias ultramarinas.

Pois não é tão limitada a parte que no commercio com a nossa Africa tem a reexportação, que não subisse no anno de 1868 a 922:664$700 réis, isto é, a mais de dois terços do valor total dos generos exportados e reexportados de Portugal para aquellas nossas colonias.

Valia bem a pena justificar com argumentos irrespondiveis a resolução tomada de acabar com as relações commerciaes entre a metropole e as possessões africanas que quasi tanto significa a extincção do favor concedido, e que ainda hoje gozam os generos reexportados de Portugal para a provincia de Angola.

Manter as relações hoje existentes entre a mãe patria e as vastas provincias de Africa onde tremula a bandeira, portugueza, estreita las e desenvolve-las, deve de ser o constante empenho de quantos sonham para esta terra de Portugal um futuro auspicioso, digno de um passado que occupa na historia da humanidade algumas paginas brilhantissimas.

Abrimos outr'ora com a cruz e com a espada regiões vastissimas, onde a fé ardente dos nossos missionarios, e a espada invencivel dos nossos soldados iam conquistando terras para a patria e almas para Deus.

Passou a epocha das assombrosas descobertas e das gloriosas conquistas. Hoje é o trabalho o elemento poderosissimo que transforma desertos em povoados, terrenos safaros e inhospitos em regiões abundantes e saudaveis, e é mister que os homens que, na aurora da idade moderna, empunhando a bandeira das quinas, íam descobrindo novos mares e novos mundos, conservem e mantenham o logar de honra na vanguarda das nações que se immortalisam nas glorias da paz.

Cumpre-nos completar a nossa honrosa missão, cujo principio foi a descoberta e conquista, patenteando ao mundo civilisado essas vastas regiões de Africa, educadas por nós nos usos e praticas das sociedades modernas.

E o elemento que mais nos póde auxiliar n'este proposito louvavel é o elemento commercial. Podemos e devemos recorrer a elle, sem prejuizo d'aquellas vastas provincias de alem mar, e com incontestavel vantagem para a mãe patria.

Um ponto capital se deve ter em, vista ao traçar uma reforma de pautas para o ultramar. É o collocar a provincia para onde se legisla a par das colonias ou paizes que lhe ficam proximos, de modo que não se offereça incitamento a desviar d'ellas a maior somma de transacções. Depois d'isso não cercar o commercio de peias e obstaculos que tolham o seu natural desenvolvimento e progresso. E finalmente identificar por todos os modos as colonias e a mãe patria, de maneira que, chegado, porventura, o dia da emancipação d'aquellas, esta as encontra sempre a seu lado, e prestando se mutuo auxilio nas diversas espheras da actividade humana.

Se hoje, quando começam a fructificar as sementes, que lançámos á terra nas provincias africanas, com sacrificios enormes de dinheiro, e com sacrificios incommensuraveis de vidas, vamos desviar, fascinados por principios absolutos que a sciencia de bem governar manda modificar na pratica, a torrente commercial das nossas colonias para os paizes estrangeiros, podemos adiantar (e é isso ainda muito contestavel) o termo do completo desenvolvimento colonial, mas perdendo a metropole, que, em occasiões bem angustiosas, esquecia os proprios males que eram grandes, e tão grandes que ainda hoje não desappareceram de todo, para só se lembrar das desgraças das suas colonias, auxiliando-as por todos os modos.

Conceder aos generos e mercadorias de producção nacional, e aos nacionalisados pelo pagamento dos direitos de consumo no continente, um beneficio de 50 por cento nos direitos a pagar nas colonias, é um acto de innegavel justiça, e a compensação do favor igual que nas alfandegas do continente gosam os generos produzidos em as nossas colonias. Nem as reformas de 1869 contrariam este principio. Apenas o realisaram de modo diverso ao compararmos as pautas das provincias de Moçambique, e de S. Thomé e Principe. N'aquella os generos e mercadorias de producção do continente do reino, das ilhas adjacentes, ou das provincias ultramarinas, e bem assim os nacionalisados nas alfandegas do continente do reino e das ilhas adjacentes pelo pagamento dos direitos do consumo ficam sujeitos ao pagamento de 70 por cento dos direitos marcados na respectiva pauta. N'esta ficam os generos e mercadorias nas mesmas circumstancias sujeitos a 20 por cento dos direitos marcados na pauta.

Nada ha que justifique tal distincção, e bem pelo contrario os principios de justiça recommendam que os generos, exportados da metropole nas condições mencionadas, sejam equiparados no beneficio aos generos coloniaes despachados para consumo nas alfandegas do continente do reino.

Conservar aos generos reexportados da metropole para as provincias de Africa um beneficio que compense as despezas que esses generos fazem em Portugal, e dando mais uma pequenissima margem, a indispensavel para manter o movimento commercial de Lisboa, que hoje tira a sua actividade, em grande parte, do commercio com Africa, parece-nos uma medida acertada, politica, e financeiramente fallando.

Politicamente, porque tende a tornar intimas as relações da metropole com aquellas possessões, e d'aqui as vantagens que todos podem medir, e que os estreitos limites de um modesto relatorio não permittem desenvolver.

Financeiramente, porque esse commercio de reexportação significa augmento de receita, determinando a afluencia de navios que conduzam os generos estrangeiros a Lisboa, e que recebam os generos coloniaes para os diversos portos da Europa e America.

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Todo esse movimento significa acrescimo de receita, por direitos de tonelagem, e reexportação por trabalhos de descarga e embarque, e incitando o commercio de Lisboa, augmenta ainda a receita publica, já pelo imposto industrial, já pelo imposto de sêllo, já pelo imposto do correio, já pelas variadissimas maneiras por que o progresso commercial contribue para as finanças publicas.

E depois, senhores, ao estudar minuciosamente este grave assumpto se vê clara e incontestavelmente que da abolição do favor até hoje concedido á reexportação não provém prejuizo ao consumidor colonial.

O importador que recebe em Africa os generos directamente de paizes estrangeiros tem uma vantagem manifesta sobre o que os recebe indirectamente, e por intermedio da metropole. Tem aquelle por isso nas suas mãos o meio de afastar do mercado o segundo, e, quando se encontra só, é elle que marca os preços ás suas mercadorias. Se da extincção do direito differencial para a reexportação podessem advir as vantagens que se apregoam, não teria deixado a classe commercial, sobretudo a da nossa Africa occidental, já hoje tão importante e illustrada, de pedir tal beneficio. Não o tem feito e por duas rasões. A primeira porque ella vê que os interesses das colonias devem crescer constantemente de accordo com os da mãe patria. A segunda porque sabem praticamente que de tal medida não tiraria o commercio colonial as consequencias favoraveis que algumas pessoas imaginam. Bem pelo contrario no ministerio da marinha e ultramar deve parar uma representação do corpo commercial da provincia de S. Thomé e Principe, ponderando a conveniencia de manter a distincção de direitos para os generos reexportados.

Pedindo um beneficio de 30 por cento nos direitos para a reexportação, pedimos ainda assim menos que em alguns casos era até agora concedido, e aceitamos o quantum que foi estabelecido no artigo transitorio do decreto de 25 de janeiro ultimo, que approvou a nova pauta da provincia de Cabo Verde. Convém todavia demonstrar que n'este pedido não ha exageração, e para isso citaremos um exemplo.

São as fazendas de algodão o principal artigo de commercio para Africa. Em 1868 toda a exportação de Portugal para as nossas possessões africanas, comprehendendo as mercadorias nacionaes, nacionalisadas e reexportadas subiu, como já indicámos em outro ponto d'este relatorio a 922:664$700 réis, e n'esta importancia figuram os tecidos de algodão por 720:596$900 réis, ou proximamente 80 por cento distribuidos pelo seguinte modo:

Exportação nacional....................107:410$00

Exportação nacionalisada............... 6:118$000

Reexportação.......................... 607:059$400

Os algarismos que ahi ficam indicados dizem eloquentemente qual seria o resultado para as relações commerciaes entre a metropole e as colonias da Africa, se se mantivessem as disposições das ultimas reformas, e se o mesmo principio se estendesse á pauta da provincia de Angola, que ha tempos está sendo estudada no ministerio da marinha.

Mas porque as fazendas de algodão têem uma parte tão importante no commercio da Africa, será entre ellas que iremos buscar a demonstração de que o favor de 30 por cento nos direitos nada tem de excessivo. Todos os dados que apresentâmos são tirados de documentos que merecem inteira fé.

Dez peças de algodão cru que pesam, termo medio, 30k,700, custam.......................... 17$430

Na provincia de S. Thomé e Principe pagarão de direitos na rasão de 90 réis por kilogramma.. 2$763

Concedido o favor da reexportação pagariam as mesmas dez peças 70 por cento ou.......... 1$934

Mas estas estão sujeitas ao direito da reexportação 1 por cento ás despezas de frete, descarga, companhia na alfandega, embarque, e a todas as despezas a que é obrigada uma casa commercial, que computâmos em 1 1/2 por cento, calculo que ninguem ousará ter como exagerado, antes talvez seja elle inferior á verdade.

Temos, pois, que as dez peças de algodão branco reexportadas da metropole ficam sobrecarregadas com 2 1/2 por cento do valor, ou 435 réis, que juntos aos 70 por cento dos direitos prefaz 2$369 réis, havendo portanto um beneficio real para a reexportação apenas de 394 réis, ou 39,4 réis em peça ou quasi 2,26 por cento. É a differença minima que convem conceder para animar a continuação do commercio de Lisboa. E aqui convem notar uma circumstancia importantissima, a falta d'este favor póde determinar muitos individuos a fazerem as suas transacções directamente de Inglaterra sem que o fisco possa exercer sobre elles fiscalisação alguma, e fugindo completamente a toda a acção do imposto.

Demonstrada a conveniencia da continuação do favor concedido até agora á reexportação, importa dizer poucas palavras em relação á pauta do Ambriz, por isso que circumstancias especiaes determinaram a adopção de uma medida excepcional.

No já citado relatorio de 12 de novembro de 1869 indica-se como fundamento principal, ou antes o unico, da adopção de um direito geral de 6 por cento ad valorem, comprehendendo 2 por cento com destino especial para obras publicas, a vantagem de attrahir para o Ambriz o commercio que direitos exagerados haviam afastado para as feitorias abertas no Quicembo, no Ambrizete e em outros pontos da costa situados ao norte do rio Loge. Desde que n'aquelle documento official se certifica que o commercio estrangeiro aceitára favoravelmente aquella nova disposição aduaneira auctorisada pela portaria de 31 de dezembro de 1868 pelo governador geral, porque o direito de 6 por cento era uma compensação da segurança com que, sob a protecção da nossa bandeira, aquelle commercio ali fazia as suas transacções, não ha o menor receio de ver de novo desviar para o norte do rio Loge o movimento commercial que convem attrahir para o Ambriz.

Era indispensavel por esta occasião reparar ama falta sensivel que se encontra no decreto de 12 de novembro que alterou a pauta do Ambriz, e que deve prejudicar em grande escala os interesses publicos. Para cobrar os direitos ad valorem determina o artigo 1.° d'aquelle decreto que elles sejam calculados sobre o preço dos mercados exportadores. O valor do genero não é só o do custo no mercado exportador, mas tambem se deve ter em conta as despezas até o mercado importador. Tem-se sempre entendido assim, e a legislação de 1869 manda addicionar 10 por cento ao valor dos generos no mercado da origem, a titulo de despezas de transporte, seguro e commissão, e sobre este valor total se hão de calcular os direitos de importação nas pautas de Moçambique, do estado da India e de S. Thomé e Principe. Estender a mesma disposição, justissima como ella é, á pauta do Ambriz, entendemos ser indispensavel.

Pareceu tambem conveniente aproveitar a opportunidade para pôr um termo á interpretação excessivamente latitudinaria que todos os governos têem dado ao § 1.° do artigo 15.° do acto addicional. Não era, nem podia ser, intenção do legislador o considerar negocio urgente, para ser resolvido na ausencia do parlamento, uma reforma de pautas. Desde que as provincias ultamarinas têem em côrtes os seus legitimos representantes, justo é que o parlamento considere e discuta assumptos de tão subida importancia. Não se coarctou por isso o direito que o governo, e as auctoridades superiores das provincias ultramarinas devem ter de modificar, em circumstancias excepcionalissimas, qualquer disposição das pautas. Havendo junto do ministerio da fazenda uma estação official que, pelos especiaes conhecimentos dos membros que a compõe, muita importa ouvir em assumptos que dizem respeito ao commercio, o conselho geral das alfandegas, julgou-se util determinar que, antes de

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se apresentar ao parlamento qualquer proposta de lei tendente a modificar as pautas das provincias ultramarinas, seja ouvido o mesmo conselho.

Sendo hoje verdadeiramente importantes as relações commerciaes com as provincias africanas, e podendo desenvolver-se muito mais, por motivos que se não dão nas possessões situadas nas outras partes do mundo, é o motivo porque o projecto de lei, que tenho a honra de apresentar, trata exclusivamente das pautas d'aquellas provincias.

Pelas rasões que largamente deixo expostas, e por muitas outras que, para não abusar da vossa attenção, omitto, tenho a honra de apresentar á vossa consideração o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Os generos e mercadorias de producção do continente do reino, das ilhas adjacentes ou das provincias ultramarinas, e bem assim os nacionalisados nas alfandegas do continente do reino e das ilhas adjacentes, pelo pagamento dos direitos de consumo, pagarão, quando importados nas provincias de Moçambique, S. Thomé e Principe, e Cabo Verde, em navios portuguezes, 50 por cento dos direitos estabelecidos nas pautas respectivas.

Art, 2.° Os generos e mercadorias, nas condições indicadas no artigo 1.°, pagarão, quando importados na alfandega do Ambriz, 2 por cento ad valorem.

Art. 3.° Os generos e mercadorias, reexportados das alfandegas do continente do reino e das ilhas adjacentes, pagarão, quando importados nas provincias de Moçambique, S. Thomé e Principe, e Cabo Verde, em navios portuguezes, 70 por cento dos direitos estabelecidos nas pautas respectivas.

Art. 4.° Os generos e mercadorias nas condições indicadas no artigo 3.º pagarão, quando importados na alfandega do Ambriz, o direito de 2 1/2 por cento ad valorem.

§ 1.° Os generos e mercadorias mencionados n'este artigo e no artigo 2.° ficam igualmente sujeitos ao direito de 2 por cento, destinado para obras publicas, a que se refere o artigo 2.º do decreto com força de lei de 12 de novembro de 1869, que modificou a pauta do Ambriz.

§ 2.° Os direitos na pauta do Ambriz serão regulados pela fórma prescripta nos artigos 8.° dos decretos com força de lei de 12 de novembro e 16 de dezembro de 1869, que modificaram as pautas das provincias de Moçambique, e S. Thomé e Principe.

Art. 5.º A disposição do § 1.° do artigo 15.° do acto addicional á carta constitucional não é applicavel ás alterações nas pautas das alfandegas das provincias ultramarinas.

§ 1.° Quando circumstancias excepcionaes obriguem o governo ou os governadores geraes das provincias ultramarinas a alterar, temporariamente, em qualquer ponto, as pautas das alfandegas, o governo dará conta d'esse facto ao parlamento na sua primeira reunião.

§ 2.° Toda a proposta de lei que o governo tenha de apresentar ao parlamento, tendente a modificar, por qualquer modo, a pauta das alfandegas de qualquer das provincias ultramarinas, deverá ser acompanhada do parecer do conselho geral das alfandegas.

Art. 6.º Fica completamente revogado o artigo transitorio do decreto de 25 de janeiro de 1871, que approvou a nova pauta da provincia de Cabo Verde, e toda a outra legislação em contrario.

Sala das sessões, em 18 de abril de 1871. = O deputado, Antonio Augusto Pereira de Miranda.

Foram admittidos, e enviados ás commissões competentes.

O sr. Visconde de Moreira de Rey: — Pedi a palavra para mandar para a mesa uma representação de varios individuos que pagavam fôro á collegiada de Nossa Senhora do Oliveira da cidade de Guimarães, e que requereram a remissão emquanto vigorava o decreto de 14 de julho de 1870.

Estes individuos representam á camara dos senhores deputados, allegando que, debaixo do imperio d'esta lei, fizeram todas as despesas, e colleccionaram todos os documentos precisos para requererem em commum, que os seus requerimentos devidamente documentados, deram entrada na repartição competente; e que se os seus pedidos de remissão não foram attendidos e as remissões não ficaram completas, não foi culpa d'elles, mas das repartições, que, de certo por falta de tempo, não as poderam concluir.

Pedem os signatarios para que se adopte uma providencia a este respeito, e confiam na sabedoria da camara para este negocio ficar resolvido.

Aproveito a occasião de estar presente o nobre presidente do conselho e digno ministro do reino para chamar a sua attenção ácerca de um assumpto relativo ao mesmo concelho.

A camara municipal de Guimarães requereu um decreto de expropriação de uma arvore e grade em volta, que o cabido da collegiada diz pertencer-lhe e que elle reputa um monumento digno de ser conservado.

Do ministerio do reino foi ordem para o cabido ser intimado; passou o praso para as reclamações que acabou em 11 de fevereiro ultimo, e respondeu logo o delegado do procurador regio ácerca d'este pedido.

Affirmam que o administrador do concelho, que segundo a lei deveria dirigir o processo immediatamente ao governador civil no praso de tres dias, em vez de o fazer, tem demorado o mesmo processo até agora, isto apesar das repetidas reclamações que lhe tem sido dirigidas pela camara municipal que se interesse muito no breve andamento da expropriação.

Eu não quero dar a este assumpto a importancia de ácerca d'elle fazer uma interpellação, porque a reputo desnecessaria, e confio plenamente que o nobre presidente do conselho e digno ministro do reino, cuja attenção chamo para este assumpto, providenciará promptamente de uma maneira que satisfaça a todos e especialmente que a lei seja cumprida com todo o rigor.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Marquez d'Avila e de Bolama): — Pedi a palavra para declarar ao illustre deputado, que tomo nota das observações que s. ex.ª fez e para que chamou a minha attenção, e que hei de empregar os meios necessarios, a fim de que sejam satisfeitos o mais depressa possivel os desejos do illustre deputado.

Sinto não lhe poder dar mais algumas explicações sobre este objecto, mas não estava preparado; hei de examinar o estado da questão e proceder como for de justiça.

O sr. Visconde de Moreira de Rei: — Agradeço ao nobre presidente do conselho a explicado que acaba de me dar, e novamente previno a v. ex.ª que está affecto á secretaria um requerimento da camara municipal, relativamente a este assumpto.

O sr. Falcão da Fonseca: — Mando para a mesa uma representação da camara municipal de Souzel, sobre as propostas apresentadas pelo governo.

Eu desejava ter á camara esta representação, mas como a hora está adiantada, limito-me a pedir a v. ex.ª que lhe dê o destino conveniente.

O sr. Francisco de Albuquerque: — Ha uns poucos de dias successivos que tenho pedido a palavra, esperando que o sr. ministro da justiça estivesse presente antes da ordem do dia, porque desejava fazer-lhe algumas perguntas a respeito de dois pontos que eu reputo importantes.

Como porém me não tem sido possivel encontrar aqui o sr. ministro antes da ordem dia, de certo pelos muitos afazeres que tem na sua repartição, e como s. ex.ª ha de ter o Diario da camara, por elle verá as considerações que mui succintamente passa a expor á camara, chamando a sua attenção para dois assumptos que eu reputo da maior importancia.

Um d'elles, que ainda ha poucos dias aqui foi tratado pelo sr. Alves Matheus, com a proficiencia que costuma, versa sobre a dotação do clero.

Eu desejava perguntar ao sr. ministro da justiça qual o

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estado em que se acham os trabalhos da divisão parochial, em que tem de assentar essa dotação, e ao mesmo tempo se s. ex.ª tenciona apresentar algum projecto que satisfaça ás justas reclamações do clero, porque ao passo que alguns parochos estão vivendo em verdadeira indigencia, outros estão desfructando rendosos passaes, e isto contra todos os principios de justiça (apoiados).

Eu não posso deixar de levantar a minha debil voz, e de secundar os esforços do sr. Alves Matheus, porque entendo que esta classe está muito desconsiderada (apoiados). Ha muito tempo e por muitas vezes tenho lido nos discursos da corôa, que a dotação do clero é um dos pontos de que os governos se hão occupar com interesse; e até hoje o que temos visto, sr. presidente? O mais completo olvido por tão importante assumpto! (Apoiados.) O clero queixa-se e com rasão. É necessario dar a cada um o que se lhe deve.

Eu desejo que o sr. ministro da justiça pondere estas reflexões que são muito justas, e espero que s. ex.ª as ha de tomar na devida consideração para fazer concluir este importante negocio, visto que na secretaria a seu cargo devem estar todos os dados precisos sobre a divisão parochial. Acabem por uma vez as desigualdades, e faça-se justiça a uma classe que tantos e tão importantes serviços presta ao paiz. Não levantarei mão d'este assumpto emquanto não vir attendidas as minhas justas reclamações, que são as de uma classe inteira, e especialmente da parochial.

O outro ponto é sobre a reforma da tabella que hoje está regulando as conservatorias. (O sr. Eduardo Tavares: — Apoiado.)

Este ponto é muito importante porque, ao passo que em alguns pontos os conservadores têem na tabella uma retribuição a meu ver exagerada, n'outros não têem nenhuma; e não está sobre tudo o trabalho compensado, conto deve ser.

Para as bases d'este serviço foi apresentado um trabalho pelo sr. Luciano de Castro, com o qual na maxima parte eu me conformo. Entendo que é da maior conveniencia não só para os proprietarios, porque isto importa para elles uma contribuição (apoiados), mas tambem para a boa organisação do serviço, que se harmanisem estes dois elementos e que se publique uma tabella, que satisfaça a estas duas condições, e que ao mesmo tempo se adoptem em relação a este assumpto as medidas que se precisam para que este serviço preencha o fim para que foi creado. Não é necessario ter muito conhecimento d'esta materia para ver que o registo entre nós esta muito longe de attingir o fim para que é destinado (apoiados).

S. ex.ª ha de comprehender que eu pela minha parte satisfaço um dever, chamando a sua attenção para estes dois importantes ramos de serviço publico, tendo a convicção de que v. ex.ª ha de tomar em consideração o que acabo de expor.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Tenho de me retirar para a outra camara, porque é ali necessaria a presença de um membro do governo, e por isso não poderei responder tão cabalmente como desejava ás observações que fez o illustre deputado para conhecimento do sr. ministro da justiça, mas posso dizer alguma cousa com relação ao primeiro pedido que s. ex.ª fez.

Em 1857 teve a honra de gerir a parte do ministerio da justiça, e já n'essa occasião entendi que havia necessidade de attender muito seriamente á dotação do clero, pela grande desigualdade que existe o que era absolutamente indispensavel que se remediasse.

N'essa occasião convenci-me de que um dos meios que havia de contribuir mais efficazmente para esse resultado era lei da desamortisação de que me occupei e tive a fortuna de apresentar no parlamento.

Essa lei já habilita muito o governo a apresentar algum trabalho no sentido em que indicou o illustre deputado, e o governo não póde deixar de considerar que este trabalho faz parte essencial de uma boa organisação da fazenda no

nosso paiz, porque não resta duvida que ha grandes desigualdades que convem acabar (apoiados).

Ha parochias cuja dotação é pequena, e outras ha cujas dotações são feitas, não digo com grande largueza, mas com alguma, e por consequencia se fizermos uma justa distribuição dos meios com que póde ser dotado o clero, com certeza se os parochos não ficarem inteiramente satisfeitos, não têem motivo para ficarem descontentes.

Hei de chamar a attenção do meu collega, o sr. ministro da justiça, para este assumpto, do qual s. ex.ª se occupa tão seriamente, como eu me occupei e todos nos occupâmos, e creia o illustre deputado que na occasião em que se discutir o orçamento do ministerio da justiça, e a camara sabe que o orçamento está sendo estudado na commissão de fazenda de uma maneira que honra muito a commissão (apoiados), demonstrando ao mesmo tempo que o governo está prompto a acompanhar a commissão da melhor vontade, repito, quando se discutir o orçamento do ministerio da justiça, estou certo que o meu collega ha de estar habilitado para apresentar a sua opinião á commissão, e que ha de vir a um accordo que póde produzir alguma vantagem, como tem acontecido emquanto aos pontos em que o governo tem accordado com a commissão de fazenda, com relação aos orçamentos que têem sido discutidos.

Vozes: — Muito bem.

O sr. Candido de Moraes: — Mando para a mesa a declaração de que não posso continuar a fazer parte da commissão de guerra; e ao mesmo tempo peço a v. ex.ª o obsequio de fazer chegar ao destino conveniente os papeis que me foram remettidos pelo sr. Luiz Augusto Pimentel, que julgo continua incommodado.

Como já disse, não posso continuar a fazer parte da commissão de guerra, mas não quero que por este facto os individuos a quem dizem respeito esses papeis possam de alguma fórma ficar prejudicados.

O sr. D. Miguel Coutinho: — Mando para a mesa um requerimento pedindo esclarecimentos ao governo (leu).

Como está breve a discussão do orçamento, e me consta que uma das reformas a fazer no ministerio da marinha é a extincção do hospital da marinha, eu desejo estar habilitado com os respectivos esclarecimentos, a fim de poder tratar d'essa questão.

O sr. Alves Matheus: — Mando para a mesa uma representação da camara municipal de Villa Verde, em que se associa ás rasões apresentadas na representação da camara municipal de Coimbra, e que foi enviada a esta camara em sessão de 25 de fevereiro ultimo.

A camara do concelho que tenho a honra de representar, diz que se associa á representação da camara municipal de Coimbra, em que pede a extincção da engenheria districtal, com a qual faz uma despeza de que não tira resultado algum, fiando assim coarctada a acção municipal.

Diz a camara que quando for necessario proceder á construcção de qualquer estrada, ella o fará com os meios mais economicos.

As rasões que vem exaradas n'esta representação parecem-me judiciosas, e peço a v. ex.ª que lhe dê o destino conveniente.

O sr. Julio do Carvalhal: — Mando para a mesa um requerimento do tenente Francisco de Paula Soares Brandão, em que pede melhoramento de reforma.

Este official está reformado em tenente ha bastantes annos, e não obstante tem continuado a servir no supremo tribunal de justiça militar, e applicando-se-lhe á justiça que tem sido applicada a outros individuos em iguaes circumstancias, elle não pedia demasiado, se pedisse a reforma em capitão com o soldo respectivo, mas elle limita-se a pedir a patente de capitão sem soldo.

Mandando para a mesa este requerimento, peço licença para observar a v. ex.ª e ao sr. primeiro secretario que me parece que elle não importa augmento de despeza e por isso poderia deixar de ser ouvida a commissão de fazenda, o

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que simplificará mais a resolução que haja de se tomar a este respeito.

O sr. Conde de Villa Real: — Mando para a mesa uma representação dos caixeiros de balcão e marcanos do districto de Villa Real, contra o augmento da taxa que lhes é imposta pela tabella da proposta de lei sobre a contribuição industrial.

(Occuparam os logares de primeiro secretario o sr. Adriano Machado e o segundo secretario o sr. Azevedo Villaça.)

PRIMEIRA PARTE DA ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do projecto n.º 11

O sr. Presidente: — A primeira parte da ordem do dia é o projecto n.º 11.

Ha sobre a mesa um proposta de adiamento apresentada pelo sr. Julio do Carvalhal e que hontem não se votou por se passar á segunda parte da ordem do dia.

Vae ler-se a proposta de adiamento, para se votar.

Leu-se na mesa a proposta, que foi approvada sem discussão.

SEGUNDA PARTE DA ORDEM DO DIA

Continuação da discussão na generalidade do projecto de lei n.º 9

O sr. Bandeira Coelho: — Primeiro que tudo tenho a pedir desculpa aos oradores que ainda estão inscriptos na discussão sobre a generalidade do projecto, por os ter de alguma fórma prejudicado no uso da palavra, em consequencia de eu a ter agora pedido sobre a ordem, mas devo dizer a v. ex.ª e como satisfação a esses cavalheiros que eu pedi a palavra sobre a generalidade antes de a ter pedido o Sr. Rainha, cujo testemunho invoco, e v. ex.ª não me inscreveu, de certo porque não ouviu a minha voz.

Dada esta explicação, creio que me desculparão de ter vindo tomar um logar que, se por um lado prejudica os oradores inscriptos, por outro satisfaz a necessidade que sinto de dizer algumas palavras sobre o projecto em discussão.

Em vista da altura que tem tomado o debate, tratarei de ser resumido nas minhas observações, e peço desculpa á camara de vir tambem entremetter-me em um assumpto tão importante, e que me não leve á conta de vaidade oratoria o que o não é, porque conheço-me bem para não dar cabida a tão injustificado sentimento.

Pretende simplesmente expor a minha opinião em phrases singelas, obedecendo a um impulso da minha consciencia.

A minha moção de ordem é a seguinte (leu).

Como v. ex.ª e a camara vêem, ha n'esta proposta tres fins, fazer uma melhor distribuição d'esta contribuição, conseguir que ella dê em resultado uma maior importancia do que aquella que se calcula que dará por meio do projecto em discussão, é a final um adiamento.

Eu entendo que hão é com pequenas reducções, nem com pequenos impostos que salvâmos o paiz e que se resolve a questão financeira. No estado a que chegámos entendo que são necessarias todas as reducções e todos os impostos compativeis com as forças do paiz (apoiados). Votar todos os annos uns pequenos impostos e umas pequenas reducções que mal chegam para pagar os juros dos supprimentos, de fórma que ficâmos sempre no mesmo estado, mas esgotando gradualmente as forças contributivas do paiz e o recurso dos sacrificios pedidos ao funccionalismo, não me parece o melhor meio de resolver a questão, que eu entendo que deve ser resolvida de prompto e no menor espaço de tempo possivel (apoiados).

O projecto que se discute apresentar um pequeno augmento de imposto, augmento para mim ainda muito problematico (apoiados), e alem d'isso assenta sobre uma base que de fórma nenhuma posso aceitar.

O resultado immediato d'este projecto é que no anno civil de 1871 vamos fazer uma distribuição do imposto pessoal pelas actuaes matrizes, o que equivale a fazer uma nova distribuição por districtos, mas sobre outra base, em ordem a gravar muito certos districtos alliviando outros (apoiados).

Alguns oradores que me precederam mostraram, creio eu, exuberantemente que os resultados d'esta distribuição; segundo a base indicada no projecto, era muito mais iniqua do que as que actualmente se davam com o systema que se tem seguido, de repartição (apoiados). Para apoiar esta opinião eu peço licença a v. ex.ª e á camara para tambem dar conta de alguns apontamentos que a este respeito tomei.

Citou-se aqui com uma certa intenção o districto de Vizeu, como um d'aquelles que estava mais favorecido com a actual distribuição e como uma prova evidente da necessidade da substituição do actual systema pelo do imposto de quotidade.

Eu digo a v. ex.ª e á camara que o districto de Vizeu aquelle em que as matrizes estão mais bem organisadas (apoiadas), quero dizer, onde_accusam mais elementos de imposto. Para isto basta só citar que n'este ramo da contribuição pessoal é, depois de Lisboa e Parto, o districto que tem mais causas descriptas na matriz, pois tem 6:714. No valor locativo d'estas mesmas casas, e o que occupa o primeiro logar, depois de Lisboa, Porto e Coimbra. No numero de cavalgaduras descriptas na matriz, é o primeiro, mais do que o districto de Lisboa e Porto, pois conta 2:808, emquanto que o de Lisboa só accusa 2:450.

No numero de creados é a 5.ª; está primeiro Lisboa, Porto, Santarem e Evora. No de vehiculos é igualmente a 5.ª, estando primeiro Lisboa, Porto, Evora e Braga. Ora, quando se nota que a percentagem complementar sobre as casas devia ser maior ou menor conforme o seu valor locativo e o rendimento das taxas fixas, já se vê que accusando as matrizes d'aquelle districto maior numero de objectos sobre que recaíam as taxas fixas, e maior numero de casas e maior valor locativo sobre que recaía a percentagem complementar, necessariamente havia de resultar que essa percentagem seria muito mais pequena (apoiados).

E era isto mesmo o que se pretendia com essa base.

Segundo o que já se disse n'esta casa, e a nota que tenho, é certo que a percentagem complementar sobre o valor locativo das casas, no districto de Vizeu, é de 1,515 por cento. Ora eu chamo a attenção da camara para o seguinte facto.

O districto onde a percentagem sobre o valor locativo das casas tem sido maior é o de Aveiro, onde a percentagem é de 10,304 por cento.

Eu vou comparar a percentagem d'este districto com a do districto de Vizeu, que é a mais pequena, depois do districto de Villa Real, e creio que hei de demonstrar exuberantemente a v. ex.ª e á camara que não ha desigualdade no pagamento do imposto n'estes dois districtos, e que se a ha, é de certo a favor do districto de Aveiro.

Eu conheço aquelles dois districtos, onde tenho passado a maior parte da minha vida publica.

No districto de Aveiro, vejo eu o seguinte: tem uma população de 136:583 habitantes, pouco menos de metade da do districto de Vizeu; tem 292:522 hectares de superficie, mais de metade da do districto de Vizeu; tem a maior parte d'esta área cultivada, porque é um districto litoral, em quanto que o districto de Vizeu é quasi todo montanhoso; e tem finalmente mais condições proporcionaes riqueza, como desenvolvimento de viação; etc.

Ora, vejamos o que ali têem pago. Segundo os esclarecimentos que foram publicados n’esse livro, a que já se tem alludido, do sr. Fradesso da Silveira, a importancia da contribuição pessoal em 1868 no districto de Aveiro foi de 3:655$463 réis; e no districto de Vizeu foi de 6:322$079 réis, isto é, proximamente o dobro. Em 1869 a importancia no districto de Aveiro foi de 5:113$049 réis, e no dis-

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tricto de Vizeu foi de 9:901$729 réis, que é ainda a mesma proporção. Note-se que as taxas fixas davam em 1868 no districto de Vizeu a quantia de 5:083$123 réis, emquanto que no de Aveiro davam 1:488$868 réis, e que o valor locativo das 6:714 casas do districto de Vizeu é 81:779$895 réis, emquanto que no de Aveiro estão apenas inscriptas 1:712 casas com o valor locativo de 21:405$277 réis!

Já se vê, pois, que a relação approximada de um para dois, que se encontra nos dois districtos, desapparece nas matrizes dos objectos sujeitos ás taxas fixas e à percentagem complementar, por deficiencia no districto de Aveiro. E assim se explica a elevação e differença de percentagem complementar n'este districto relativamente ao de Vizeu.

A desproporção da percentagem não vem da desproporção da distribuição, mas sim da deficiencia da matriz. Posso asseverar a v. ex.ª e á camara que de certo o districto de Aveiro, pagando metade do que paga o districto de Vizeu de contribuição pessoal, não estava desfavorecido.

A base que até hoje nos tem servido dá esse resultado. Hoje, indo-se lançar uma quota de 6 por cento sobre o valor locativo das casas inscriptas na matriz, alliviando o districto de Aveiro (onde a quota era de 10,304, por omissão ou falta de cumprimento da lei), e sobrecarregando o de Vizeu (onde a quota era de 1,515 em consequencia do zêlo e exactidão), é estabelecer um mau principio e fazer uma grave injustiça (apoiados).

Eu podia ainda comparar os concelhos do districto de Vizeu com os concelhos do districto de Aveiro, e mostrar mais claramente a verdade da minha asserção. Direi só que os concelhos de Agueda, Ovar, Estarreja, Feira, Oliveira de Azemeis, Arouca, etc. todos têem menos casas inscriptas na matriz, e menor valor locativo do que um concelho o districto de Vizeu, que citarei como exemplo, e que é o que mais me doe (riso), porque é o meu concelho de Oliveira e Frades. Este concelho tem inscriptas na matriz 313 casas com um valor locativo de 2:566$000 réis. Para mostrar a exorbitancia que ha no valor locativo e na inscripção d'estas casas começarei por soccorrer-me ao argumento do meu illustre amigo, o sr. Francisco de Albuquerque, que citou aqui o concelho de Mangualde, de que tem a honra de ser digno representante, como já gravado.

O concelho de Mangualde tem inscriptas na matriz 125 casas de habitação; Oliveira de Frades tem 313; o concelho de Mangualde tem de valor locativo 2:019$200 réis; Oliveira de Frades tem de valor locativo 2:566$000 réis. Resultado: sommando-se a importancia das taxas fixas e percentagem complementar, o concelho de Mangualde paga 161$973 réis; Oliveira de Frades 219$200 réis.

Ora, o concelho de Oliveira de Frades não póde comparar-se com o de Mangualde, e eu appello mesmo para o testemunho do sr. Francisco de Albuquerque, que começou n'aquelle concelho a sua carreira publica, como administrador, deixando lá muitas saudades. Não ha ali 313 casas que devam estar inscriptas na matriz. Eu declaro a v. ex.ª e á camara que se me dissessem — vá escolher em Oliveira de Frades 313 casas, tomando conta d'ellas para pagar de renda 2:566$000 — eu não queria tal negocio.

Ainda mais. O meu illustre amigo o sr. José Tiberio, que fallou no mesmo sentido do sr. Francisco de Albuquerque, fazendo sentir a desproporção que havia nos concelhos da Guarda citou tambem o exemplo de um dos mais sobrecarregados, que é Pinhel.

Eu quero ainda comparar o concelho de Oliveira de Frades com o de Pinhel. Pinhel tem descriptas nas matrizes 222 casas. Oliveira de Frades 313. Em Pinhel o valor locativo das casas é de 1:692$000 réis. Em Oliveira de Frades é de 2:566$000 réis. De fórma que Pinhel, que é uma cidade, e que tem um bispado, tem menor numero de casas descriptas na matriz com o valor locativo menor que o concelho de Oliveira de Frades!

Estas observações que faço a respeito do concelho de Oliveira de Frades, podia faze-las a respeito dos concelhos de S. Pedro do Sul, Vouzella e outros do districto de Vizeu que estão nas mesmas circumstancias (apoiados); mas para restringir as minhas observações tomei aquelle concelho como typo de comparação.

Sabe v. ex.ª a rasão por que eu me insurjo contra este systema? É porque elle traz, por assim dizer, um castigo em vez de um premio aquelles que têem cumprido o seu dever e zelado a execução da lei (apoiados).

Posso dizer a v. ex.ª, que no concelho de Oliveira de Frades não ha um unico predio fóra das matrizes. Quando aqui passou a lei de 36 de agosto de 1869 que não garantia transacção alguma sobre as propriedades sem estas estarem descriptas nas matrizes, n'aquelle concelho correu á matriz tudo quanto estava fóra d'ella, e por tal modo que o concelho de Oliveira de Frades figura como aquelle que tem mais predios inscriptos na matriz no districto de Vizeu; este concelho apparece como o quinto ou sexto na ordem dos que têem mais predios em todo o reino. Figuram discriptos na matriz 70:000 e tantos predios, e alguns ha que não deviam lá apparecer. E o que aconteceu? Aconteceu, que quando ultimamente se tratou de lançar a contribuição especial sobre os bens omissos ou sonegados n'aquelle concelho, mandou-se, pelo menos os empregados de fazenda assim o entenderam, mandou-se avaliar todos esses predios que tinham entrado de novo na matriz para sobre elles ir lançar a contribuição especial creada pela lei de 23 de agosto de 1869.

Eu vim aqui, e n'uma das sessões passadas chamei a attenção do sr. ministro da fazenda sobre este ponto, e s. ex.ª prometteu-me que se informaria, e daria as suas ordens a este respeito. Não sei o que tem havido. Sei apenas que os trabalhos têem estado parados, nem podiam deixar de estar, porque não era possivel que se fosse agora lançar sobre todos os predios omisssos ou sonegados uma contribuição especial sem serem primeiro louvados os predios antigos que andavam na matriz; alguns d'esses carregavam com toda a contribuição que pertencia aos que entraram de novo.

Que se faça a avaliação dos novos predios fazendo-se ao mesmo tempo a dos antigos, entende-se, mas que se faça uma sem a outra é uma cousa que se não póde admittir, é um absurdo que salta aos olhos de todos, e que espero se não ponha em pratica.

Eu escuso de fazer mais comparações. Não desejo cansar a attenção da camara, e creio que as que já fiz são bastantes para mostrar as injustiças e desigualdades a que vae dar logar a adopção do systema contido n'este projecto de lei; mas permitta-me v. ex.ª e permitta-me a camara que eu ainda diga alguma cousa a este respeito.

Alem da desigualdade que resulta da distribuição feita segundo este system, não só de districto para districto, mas de concelho para concelho, ha ainda a desigualdade natural e obvia que se ha de dar no mesmo concelho, porquanto o valor locativo das casas é uma cousa muito similhante ao rendimento collectavel dos predios. Se todos nós sabemos que não se póde fazer obra pelo rendimento collectavel da matriz, para se lançar o imposto sobre a propriedade, da mesma fórma o valor locativo das casas é uma base que não tem base, por assim dizer.

Eu bem sei que o nosso actual systema de distribuição tem inconvenientes, mas não me parece que seja pelo systema do projecto que elles se attenuam. Parece-me que ha melhor maneira de obviar a estes inconvenientes.

Se nós não podemos pretender por fórma alguma attingir a perfeição na distribuição, e effectivamente o nosso fim deve ser melhora-lo, parece-me que conservando-se o imposto de repartição, em vista dos esclarecimentos que hoje já temos, principalmente para a contribuição pessoal, por esse livro a que todos temos recorrido, publicado pelo sr. Fradesso da Silveira, e mesmo pelas nossas informações pessoaes, podemos fazer uma melhor distribuição do contin-

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gente pessoal, dando novamente ás juntas geraes attribuição de fazerem essa distribuição pelos concelhos, com audiencia do delegado do thesouro, que póde dar para isso todas as informações, e aos concelhos a faculdade de a fazerem pelas parochias, de fórma que as parochias a façam a final pelos contribuintes.

Cabe aqui dizer que tambem tenho que fazer uma accusacão ao partido reformista, o qual tem sido aqui accusado por quasi todos os oradores que têem fallado sobre este assumpto.

Eu, vendo que na commissão de fazenda se acham tantos membros d’este partido, lamento que se não aproveitasse a occasião de consignar para esta contribuição o grande principio dos gremios (apoiados).

Desde o momento em que á parochia seja commettida a distribuição do contingente, quer da contribuição pessoal, quer da predial, quer da industrial, e em que ella seja interessada immediatamente em faze-la, a distribuição ha de ser muito mais bem feita que por delegados do thesouro e escrivães de fazenda.

E não se me diga que com este systema se vae inaugurar tambem o systema da denuncia. Creio que todo o odioso da denuncia desapparece diante de uma povoação no estimulo dos interesses individuaes.

No systema de quota vejo eu exactamente o contrario. O contribuinte não tem interesse nenhum em auxiliar o fisco, fazendo que os outros contribuintes paguem a mesma quota; aqui é que a denuncia toma todo o seu odioso, emquanto que com o systema de repartição aperfeiçoado, como elle deve e póde ser, todos são interessados em fazer entrar na matriz aquillo que lá devia estar; porque d'ahi resulta o beneficio commum em ser a sua percentagem mais modica. É por estas rasões que proponho que o projecto volte á commissão, e que se adopte o systema de repartição, melhorando e fazendo uma nova distribuição por districtos.

Já vê v. ex.ª e a camara que eu não impugno o imposto, que pretendo só que elle se distribua com mais equidade e justiça; pretendo mesmo que elle se eleve, porque entendo que se póde elevar com uma melhor distribuição, o que a contribuição pessoal póde dar mais do que dá actualmente e do que calcula a commissão e o governo no seu projecto. Mas para que isto se dê, para que se faça uma repartição assim, e para que este imposto possa augmentar-se, é necessario que volte á commissão, que ella leve algum tempo a fazer de novo este trabalho, e este tempo, devo ser franco em dizer que o desejo, e que o desejo para que primeiro que seja votado este augmento de imposto, se apresente aqui o orçamento para ser discutido e votado (apoiados), se é certo como se afiança que vão fazer-se grandes reformas e reducções. Eu desejo todas as reducções possiveis e compativeis como serviço publico, sem o desarganisar. Entendo que ellas devem ser acompanhadas tanto quanto possivel da elevação do imposto, para que a questão de fazenda se resolva.

Não voto o augmento do imposto que resulta d'esta contribuição, senão depois de votado aqui, não digo, todo o orçamento, mas parte d'elle, que me assegura que essas reformas e economias se hão de realisar. Mas depois de votadas as reducções no orçamento, voto uma maior contribuição, um augmento de contribuição maior do que é proposto n'este projecto.

Creio ter justificado a minha proposta em phrases singelas, mas conscienciosas. Não quero cansar mais a attenção da camara. Termino dizendo a v. ex.ª que se o projecto que está em discussão precisasse do meu voto para ser approvado na generalidade, porque de ser rejeitado por não ter esse voto se seguiria uma crise politica, eu votava o projecto na generalidade. Já v. ex.ª vê que eu sacrificava n'isto a minha opinião á necessidade de termos governo, e de termos governo para que não andemos continuamente n'estas instabilidades de administração publica, que atrazam tudo e que são o peior de todos os males (apoiados. — Vozes: — Muito bem). Mas, como eu creio que a maioria da camara approva o projecto na generalidade, e que as minhas observações contra elle não serão attendidas, escuso de fazer ao bem do paiz esse sacrificio da minha consciencia; o paiz ficará salvo, e a minha consciencia satisfeita.

Mando para a mesa a minha proposta.

Vozes: — Muito bem.

(O orador foi comprimentado por muitos dos seus collegas.)

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Proponho que o projecto n.º 9 volte á commissão de fazenda, a fim de que esta com a base do imposto de repartição distribua pelos districtos do continente o contingente da contribuição pessoal, de fórma que a importancia total seja superior á calculada n'este projecto.

Sala das sessões, 19 de abril de 1871. = José Bandeira Coelho de Mello.

Foi admittida.

O sr. Pereira do Lago: — Requeiro que v. ex.ª consulte a camara sobre se julga esta materia discutida.

Julgou se sufficientemente discutida a generalidade do projecto.

Foram rejeitados os adiamentos propostos pelos srs. Freitas e Oliveira e Bandeira Coelho.

Foi approvada a generalidade do projecto por 48 votos contra 13.

Entrou em discussão a especialidade.

Foi admittida a proposta apresentada pelo sr. Barros e Cunha ao artigo 1.º, e ficou em discussão juntamente com a materia do mesmo artigo.

O sr. Francisco de Albuquerque (sobre a ordem): — Competia-me fallar depois do meu collega e amigo o sr. Bandeira Coelho, porque era eu o primeiro que se seguia na ordem da inscripção quando a discussão da generalidade foi abafada.

A não ser assim, se me competisse a palavra segunda vez sobre a generalidade, declaro a v. ex.ª que eu teria feito um requerimento para que se julgasse a materia discutida, e para que os oradores que se achassem ainda inscriptos, podessem tomar parte de preferencia a outros na discussão da especialidade.

Mas, sr. presidente, se temos levado muito tempo n'esta discussão, parece-me que o paiz tem lucrado, e que o parlamento se tem acreditado, mostrando que ás questões mais importantes, e que podem concorrer muito para o nosso progresso e bem estar como nação, presta aquella attenção que ellas merecem (apoiados).

O sr. Presidente: — Peço ao sr. deputado queira ler a sua moção de ordem.

O Orador: — A minha moção de ordem é a seguinte (leu.)

Nas circumstancias em que se acha o paiz, e desde o momento em que a actual contribuição pessoal se acha ha muito aceita pelo paiz, não podemos vir aqui propor que ella acabe, por assentar em bases que a economia politica e todos os principios da sciencia da administração dos estados apontam como falsas; porque uma das primeiras qualidades que devemos exigir nas contribuições é que ellas sejam bem aceitas dos povos, não levantando da parte d'elles reluctancias.

Esta acha-se já introduzida e aceita, e por consequencia não podemos, repito, porque não devemos vir aqui questionar se a devemos ou não conservar. Está aceita, e as necessidades do thesouro são por tal fórma imperiosas que não temos remedio senão mante-la, embora injusta e contraria a todos os bons principios de economia politica.

Em vista d'estas considerações, cessa quanto possa adduzir-se n'esta discussão sobre o merito da contribuição pessoal que até agora tem existido. Mas de que eu não podia dispensar-me era de tomar segunda vez a palavra para

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mostrar à camara que, posto me falleçam os decursos intellectuaes e dotes necessarios para poder bem demonstrar que a base sobre que vae assentar a nova contribuição, porque é uma nova contribuição a que no projecto se propõe, é falsa, (...), mil vezes peior que as bases sobre que a contribuição actual assenta, apesar d'isso é tal a força da minha convicção, que julgo offerecer à camara mais alguns esclarecimentos, em virtude dos quaes julgo que ella ficará sobejamente convencida da verdade das proposições que tenho avançado.

Eu tambem não podia dispensa-me de responder a alguns dos argumentos que foram apresentados pelo illustre relator da commissão e pelo nobre ministro da fazenda; mas antes d'isso quero que fallem os numeros, e chamo para elles a attenção da camara; porque realmente elles mostram que, se nós não temos governado mal, pelo menos não tem havido diligencias e zêlo da parte dos empregados fiscaes no cumprimento da lei, e dos deveres que ella lhes impõe (apoiados). Em todo o caso mostram, que a base que vamos adoptar para a contribuição pessoal é imperfeitissima. Vou notar uns poucos de exemplos que são frisantes.

Temos por exemplo Salvaterra de Magos e Thomar. Dois concelhos do districto de Santarem.

Salvaterra de Magos tem mar valor locativo na importancia de 5:607$140 réis; e Thomar que é um A cidade importante e cabeça de comarca, e que é uma terra que possue 34:748 hectaras de superficie, 23:122 habitantes e 13 freguezias (ao passo que Salvaterra de Magos possue só 21:079 hectaras de terreno, 4:200 habitantes e apenas 2 freguezias), tem 3:511$200 réis de valor locativo. Veja v. ex.ª que base!

D'aqui em diante ficará pagando Salvaterra de Magos 336$428 réis, fóra os 40 por cento addicionaes de viação, ao passo que Thomar pagará 210$672 réis.

Veja v. ex.ª se isto é uma base que possa servir para a contribuição que vae gravar summamente alguns districtos.

O meu illustre collega o sr. José Tiberio, que defendeu tambem a opinião que eu professo, e defendo n'este momento, não com a proficiencia com que s. ex.ª o fez, apresentou argumentos, a meu ver, irrefutaveis e que exuberantemente provam a nossa opinião.

Disse s. ex.ª que as matrizes estavam tão imperfeitas, que havia concelhos, como de Vianna do Castello, onde na matriz pessoal se achavam inscriptos seis vehiculos e nenhum cavalgadura! Ha seis vehiculos e não ha um só cavallo que os conduz! Ha ainda mais. Não é só n'este concelho que se dá o phenomeno.

No districto do Porto, no concelho de Vallongo existem descriptos na matriz pessoal dois vehiculos nenhuma cavalgadura!

Uma voz: — São velocipedes!

O Orador: — É provavel que sejam velocipedes os puxados por jumentos que não pagam contribuição.

Creio que isto está abaixo de todo o raciocinio e de toda a critica.

Em Villa Pouca de Aguiar, districto de Villa Real não ha na matriz pessoal nem creados, nem vehiculos e tem 770 habitantes! A matriz pessoal não tem um unico elemento para a contribuição pessoal de taxas fixas. Vejam que justiça de bases!

E saiba v. ex.ª e a camara, que até aqui eram todos interessados em que a contribuição de taxas fixas fosse a que devia ser; porque quanto mais houvesse de taxas fixas, menos percentagem havia a lançar e por isso a pagar.

No districto da Villa Real temos os seguintes concelhos, Alijó, (...) Chaves, Mesão Frio, Mondim de Basto Montalegre, (...) Ribeiro de Pena, Santa Martha e Villa (...) onde um matriz pessoal se não acha descripto nenhum creado, e pergunto, é esta uma base justa para sobre ella recáe o imposto? Parece-me que ninguem dirá que sim. (O sr. José Tiberio: - Apoiado.)

Em o districto de Portalegre tambem não ha um só creado, nem uma só cavalgadura ou vehiculo, nos concelhos de Fronteira, Gavião e Marvão. E pergunto não as haverá n'estes concelhos?

Uma voz: — Ha creados de agricultura.

O Orador: — Pois nem o juiz de direito, o delegado, o administrador do concelho ou o parocho terão um creado? Isto é inteiramente impossivel.

Mas ha mais. No concelho de Castello Vide ha um creado, um cavallo e um vehiculo, quer dizer existe n'aqulle concelho um vehiculo, um cavallo d'esse vehiculo e um creado para esse cavallo! Ao menos ha symetria.

Em Souzel ha tres creados, tres cavalgaduras e tres vehiculos. Será isto exactidão da matriz? Não póde ser; ou então não se adopte uma base tão imperfeita como esta.

Em S. Thiago de Cacem, districto de Lisboa ha tres vehiculos e apparece apenas uma cavalgadura. Pergunto, póde haver aqui exactidão na matriz?

No districto de Leiria ha oito cavallos onde não existe um só creado, e em todo o districto creio que ha vinte!

No districto de Faro ha nove concelhos, sem creados, e tres que são Alcoutim, Castro Marim, e Monchiqne, onde não ha um unico creado nem cavalgadura, nem vehiculo. Póde então ser isto uma base justa para se lançar um imposto?

Uma voz: — Vão-se fazer as matrizes.

O Orador: — D'essa reforma das matrizes ha de resultar ficarem as cousas ainda peior, e se para o futuro eu tiver assento n'esta casa hei de perguntar o que é que resultou d'essa reforma das matrizes.

Creia o illustre deputado que essa reforma, longe de acabar com as desigualdades ha de augmenta-las, e o valor locativo se subir em algum districto, n'outro ha de diminuir.

No districto de Evora ha tres concelhos, que são: Alandroal, Mora, e Redondo, onde tambem não ha um creado, nem uma cavalgadura, nem um vehiculo. Pois n'estes concelhos que têem a importancia que todos lhe reconhecem, não haverá um creado, uma cavalgadura ou vehiculo, que não seja destinado á agricultura? Isto mostra o desleixo que tem havido n'este serviço.

Em Villa Nova de Portimão ha dois vehiculos e tres cavalgaduras; mas dá-se outro phenomeno, não ha creado nenhum, servem-se elles a si proprios, ou então os creados são empregados na agricultora. Ora isto é muito natural!

Em Bragança ha seis concelhos onde não ha nem uma cavalgadura, nem um creado, nem um vehiculo na matriz.

Creio que v. ex.ª (o orador dirige-a ao sr. Barros Gomes) ha de concordar commigo em que esta base é muito justa para se elevar a contribuição pessoal, e com uma importancia tão pequena 6 por cento!

Em Beja ha tres concelhos, Serpa, Vidigueira e Alvito, onde na matriz pessoal não existem nem cavalgaduras, nem creados nem vehiculos.

Veja v. ex.ª como em todos os districtos está bem feita a matriz!

Isto é para mostrar que não é só n'um districto que se dão estas desigualdades, é em todos desde o primeiro até ao ultimo (apoiados).

No districto de Vizeu onde não ha as desigualdades que se notam em outros districtos...

O sr. Barros Gomes: — Com relação a Mangualde?

O Orador: — Sim, senhor; Mangualde é grande peccador, porque é do meu circulo...

Eu aceito a apreciação que fez o sr. Bandeira Coelho e a comparação entre o concelho de Oliveira de Frades e o de Mangualde. Não creio que a differença seja tão saliente como s. ex.ª quer fazer ver, nem que o concelho de Oliveira de Frades esteja tão exageradamente sobrecarregado, como tambem s. ex.ª disse; mas o facto é que no concelho de Oliveira de Frades as matrizes estão muito elevadas. (apoiados), mas creio v. ex.ª e a camara que as de

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Mangualde estão feitos com bastante exacção, e que as da contribuição predial estão até muito exageradas no valor do rendimento collectavel. Quando porém mesmo houvesse a desigualdade que notou o meu amigo o sr. Bandeira, nada mais isso provava senão que essas matrizes, apesar de mais perfeitas, não servem para base do imposto. Continue a fallar a estatistica.

No districto de Braga ha um concelho onde não ha uma taxa fixa, e no concelho de Esposende ha quatro vehiculos, quatro cavalgaduras, e não ha tambem nenhum creado.

Veja v. ex.ª que exactidão de matrizes!

De tudo isto concluo eu que, desde o momento em que temos uma base tão imperfeita, é impossivel aceita-la para sobre ella recaír uma contribuição que vae affectar de uma maneira tão onerosa alguns concelhos, ao passo que allivia outros, o que aliás eu estimaria que acontecesse a todos, mas o que não póde ser.

Em virtude d'esta contribuição, e districtos de Vizeu vem a pagar tanto como quatro outros districtos; e, posto que eu reconheça, em abono da verdade, que é mais importante do que qualquer d'elles.

O sr. Barros e Cunha: — É mais importante.

O Orador: — Não o diga v. ex.ª ironicamente, porque o é na verdade, mas no que eu não posso concordar é em que a sua importancia seja igual á somma da importancia de quatro outros districtos (apoiados).

Pois os districtos de Aveiro, Castello Branco, Guarda e Leiria vem a pagar com pequena differença, sommados todos elles, tanto como o districto de Vizeu.

Digam-me se isto é justo!

Quando se trata de reformar as contribuições por este modo, assentando a reforma em bases tão injustas, ha de ser grande a repugnancia, o que eu sinto, da parte dos contribuintes em pagarem este imposto.

Porque se não hão de evitar tantos inconvenientes?

Evitem-se emquanto é tempo.

Ha localidades que vão ficar oneradas em mais de 200 por cento.

Quer v. ex.ª saber o que vae acontecer em alguns concelhos?

Em Mangualde, onde ha sessenta casas que pagavam 30$590 réis de taxa fixa, refiro-me a 1888, e podiam pagar de percentagem complementar 60$000 réis, este imposto sebe a 169$615 réis. Veja v. ex.ª a differença!

Ora, se este augmento fosse proporcional; em todo o paiz, o concelho de Mangualde que pagou em 1868 30$690 réis de percentagem complementar, e que com os addicionaes poderia vir a pagar cerca de 60$000 réis, ha de pagar por virtude do projecto que se discute 169$615 réis! Veja v. ex.ª a differença!

Ora, se este augmento fosse proporcional em todo o paiz, concordava que se realisasse em vista das circumstancias do thesouro, mas havendo desigualdades tão revoltantes, não posso deixar de protestar com todos os meus recursos e com o meu voto contra tal systema.

O concelho de Penalva de Castello, no districto de Vizeu, que pagou em 1869, 12$258 réis, vem a pagar réis 59$388, mais de 200 por cento!!

O concelho de Satam, que pagou em 1869, 9$227 réis virá a pagar de futuro 40$983 réis. Ora isto não póde ser... Não póde ser, porque é mil vezes injusto.

Chamo a attenção da camara, especialmente a dos illustres deputados que representam os districtos que vão ficar muito aggravados, para este ponto que é realmente importante (apoiados).

(Àpartes que não se ouviram.)

Mas quando não tiver em abono da minha opinião os dados estatisticos que tenho apresentado, tenho não só os argumentos adduzidos pelo illustre ministro da fazenda e pelo illustre relator da commissão, que, a meu ver, provam o mesmo que desejo provar, mas tenho tambem os que apresentou o sr. Alves Matheus, no seu brilhante discurso, que tanto agradou á camara, e nos mostrou como são elevados os seus dotes oratorios e os recursos da sua intelligencia (apoiados).

Estou convencido que s. ex.ª ha de ficar em harmonia com a minha opinião, porque para mostrar que estava convicto em que é imposto de quota é superior e preferivel ao imposto de repartição, disse: «se as bases actuaues são falsas, se são más, se exprimem desigualdade, parece-me que ha um meio efficaz de se remediarem ou attenuarem, quanto possivel, esses defeitos pela renovação das avaliações e pela faculdade das reclamações que por este projecto fica consideravelmente alargada!»

Aqui temos mais uma vez o argumento das avaliações, mas creia s. ex.ª que as desigualdades hão de continuar na mesma escala, e que ha de haver muitos districtos que pelas novas avaliações hão de ficar com o valor locativo das casas muito inferior aquelle que hoje tem. O que é pena é que aquelles infelizes que praticam a boa acção moral e edificante de dizerem a verdade, vão ficar mais sobrecarregados, mas hão de arrepender-se de ter praticado o bem, porque em premio hão de pagar mais do que aquelles que fazem o mal. E de futuro hão de emendar-se, e têem rasão. De mais eu estou convencido de que em geral a nova avaliação ou reforma ha de dar pequenissimos resultados em todos os sentidos (apoiados).

Disse s. ex.ª: «que a faculdade das reclamações fica por este projecto consideravelmente alargada!!»

Parece-me que s. ex.ª não reparou bem na proposição a que avançou, porque acontece exactamente o contrario.

Por este projecto, a faculdade das reclamações fica muito coarctada: até aqui reclamava-se á junta dos repartidores, e havia o recurso para o conselho de districto e para o conselho d'estado, porém hoje ha só a reclamação até ao conselho de districto, não ha para o conselho d'estado, por consequencia é menos uma garantia que existe n'este projecto, e mais uma rasão para que s. ex.ª veja que as matrizes não hão de ficar tão bem feitas como s. ex.ª julga.

Estabeleceu-se um recurso extraordinario para o governo, mas só para diminutissimos casos. Mas o recurso para o conselho d'estado ficou supprimido.

Dizia-nos s. ex.ª que era necessario que acabasse o patronato, porque só assim haviamos de ter boas matrizes. É d'isso que me queixo. Homo sum, disse Terencio. Era muito bom que os homens fossem assim, mas não são. O patronato não acaba, nem, infelizmente, é possivel que acabe; e então como havemos nós de ir calcular sobre ama base d'estas, tendo em vista elementos, que não podem pela força das circumstancias, pela immoralidade que estamos vendo hoje em quasi todo e quasi todos, dar resultados se quer proximos da verdade?!

O illustre ministro da fazenda apresenta-nos differentes argumentos para mostrar que deve ser preferido o imposto de quota ao de repartição; mas esses argumentos nada provam, ou, se provam alguma cousa, é em abono da opinião que eu sustento.

Disse s. ex.ª, que uma das vantagens que tinha o imposto de quota, era não pagarem mais os contribuintes com o rigor do fisco. Peço perdão; mas o que se me afigura é que hão de pagar mais com o rigor d'elle, e muito mais com as suas injustiça.

Desde o momento em que se introduzam; na matriz mais predios do que aquelles que realmente lá devam figurar, é claro que ficam prejudicados os respectivos donos. E não se me argumente com os recursos, porque a maior parte dor contribuintes prefere muita» vezes pagar mais ao incommodo de recorrer. Alem d’isso é certo que não raras vezes o contribuinte sabe quanto paga senão quando lhe é pedido o imposto.

Ha mais, disse s. ex.ª que era este o principal argumento que tinha para esta mudança — que não pagava mais o visinho, porque o outro pagava menos. Pois os estimava mais que de ficar alliviado o meu visinho outro pagasse

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mais, porque é provavel que esse outro se queixasse, e assim se apurasse a verdade. Era um meio de fiscalisação commodo e economico. Mas quando isso fosse vantagem, ella estava já no systema de repartição. V. ex.ª sabe bem que a percentagem havia de ser igual para todos os concelhos do districto, e nos concelhos estava ella em harmonia com o valor locativo das casas.

E vem aqui a proposito dizer, que me conformo com as idéas do sr. Bandeira Coelho sobre a formação dos gremios para esta contribuição, bem como para as outras.

O sr. Bandeira Coelho: — Apoiado.

O Orador: — Era de maxima conveniencia, porque era o interesse proprio que chamava os contribuintes a distribuir com igualdade, havia todas as garantias de que na matriz entravam os elementos que deviam entrar, para que exprimissem a verdade, tirando-se melhor resultado para o thesouro, sem aggravamento e queixa dos interessados.

Disse tambem s. ex.ª nas suas considerações, aliás feitas com aquella eloquencia que s. ex.ª costuma, que não lhe era possivel fazer reducções importantes na arrecadação dos nossos rendimentos, porque já se haviam feito muitas reducções n'essa arrecadação, e era necessario que os exactores de fazenda fossem interessados na cobrança dos impostos. Não posso concordar com a opinião emittida pelo sr. ministro da fazenda.

Entendo que isso dá logar a dois graves inconvenientes; já o que muitas vezes ha, de haver da parte dos exactores da fazenda vexames que não haveria, já o que se se considera o interesse como unico movel para estes empregados, é claro que, tendo, por exemplo, a receber o valor de 10, se houver quem lhes dê bons juros correspondentes á demora que elles concederem, não recebe o thesouro, mas o empregado lucrou.

(Áparte.)

Tambem eu entendo que é necessario retribuir bem os empregados para se lhes poder exigir um serviço conveniente, mas entendo que o incentivo do empregado não deve ser só esta retribuição (apoiados).

E em abono mesmo d'estes empregados, entendo que se acaso lhes fosse marcado um ordenado fixo, em harmonia com o trabalho e responsabilidade que elles têem, seria uma economia, para o thesouro e uma vantagem grande mesmo para o serviço (apoiados).

Uma voz: — E garantia do logar.

O Orador: — Tambem, mas em todo o caso o ordenado. Note-se que os empregados contra quem o povo mais alana, são os recebedores, porque effectivamente têem um interesse desproporcional na maior parte das comarcas.

Uma voz: — Mais de 1:200$000 réis.

Outra voz: — O de Vizeu, por exemplo, e que não exerce por si o cargo.

O Orador: — É verdade que ha retribuição demasiada em muitos d'estes logares, mas eu não curo de individualidades, fallo genericamente. O sr. ministro da fazenda adquiriria ainda mais popularidade do que a que tem, apresentando um projecto de lei pelo qual se marcasse um ordenado certo a estes empregados. Não tivesse s. ex.ª receio de que deixassem de cumprir os seus deveres.

Eu faço justiça ao illustre ministro; estou convencido de que s. ex.ª ou qualquer outro cavalheiro collocado na posição que s. ex.ª occupa, tendo energia, conhecendo o serviço publico e tendo boa vontade de satisfazer áquillo que deve ao paiz e ao desempenho dos seus deveres, não havia de consentir que empregados seus subalternos faltassem ao cumprimento das suas obrigações e fossem negligentes, embora não tivessem interesse immediato na recepção aos impostos. Se não cumpriam, advertiam-se, e se ainda não, demittiam-se. A moralidade e zêlo devia partir dos chefes.

Como creio que o sr. ministro da fazenda não apresentou mais argumento algum, limitando-se a fazer considerações geraes sobre o estado financeiro do paiz, passarei a examinar os argumentos apresentados pelo illustre relator da commissão, para mostrar que devia mudar-se do systema de repartição para o systema de quota.

S. ex.ª citou dois districtos para provar que em vista das desigualdades que n'elles havia era necessario mudar-se o systema de lançamento do imposto, por isso que era impossivel que um concelho ficasse pagando 1:900$000 réis approximadamente, emquanto outros nas mesmas circumstancias pagavam 9:000$000 ou 10:000$000 réis.

Eu hei de mostrar que este argumento prova de mais, por isso que é falso, ou então prova tanto, como quer o illustre relator.

Examinemos porém primeiro outros argumentos.

O illustre relator da commissão, querendo rebater os argumentos que eu tinha apresentado, disse o seguinte (leu).

É exactamente contra isto que eu me revolto. Pois os governos propõem, e a camara é alguma chancella para approvar tudo o que os ministros apresentam? A camara não está aqui para examinar as bases sobre que o governo diz que fez a distribuição? De certo que está. Se s. ex.ª quiz apresentar este argumento para mostrar que o meu era erroneo, provaria sómente que, ou havia menos zêlo da parte do parlamento no cumprimento do seu dever de examinar com a devida attenção as propostas apresentadas pelo governo, ou que o governo na sua repartição não examinára este assumpto, tanto quanto o devia, antes de o apresentar ao parlamento. Mas, sobretudo, se ha motivo de queixa é contra o parlamento, que não tomára as contas que devia ao governo.

Mas ha mais.

Disse v. ex.ª, em relação a esta contribuição, que a actual contribuição não tem base verdadeira, e antes pelo contrario tinha uma base que era de todas a mais falsa.

Não sei como sua ex.ª podesse avançar a tal proposição, porque se não ha lei alguma que determine que para esta distribuição houvesse tal e tal base, o governo tinha obrigação de tomar os differentes dados estatisticos que tinha na repartição, e sobre elles apresentar a distribuição; e se o governo via que a base mais justa era a do valor locativo, adoptasse-a, e o parlamento que examinaste a rasão do seu procedimento. Tal argumento é pois simplesmente destituido de fundamento. Pois hoje ha alguma base ou ha (ou deve haver) differentes elementos para ella? Creio que a que existe é muito mais justa do que a base por que se vae substituir. E se o governo adoptava um só elemento para fazer esta distribuição, a culpa era do governo e do parlamento que a approvava sem maior exame, porque podia e devia adoptar todos os elementos que sommados dessem um resultado proximo da verdade (apoiados).

Mas o illustre relator da commissão quiz-nos apresentar aqui dois districtos a que s. ex.ª chamou «sem nome», dizendo que se os citasse viriam logo os srs. deputados das respectivas localidades protestar contra os argumentos que a este respeito apresentasse.

Ora, eu dei-me ao cuidado de examinar a estatistica, e conheci que os districtos a que o illustre relator da commissão se quiz referir são os de Bragança e Portalegre.

O districto de Bragança tem (leu).

O districto de Portalegre (leu).

A congrua no districto de Bragança foi (leu).

No districto de Portalegre (leu).

Eram estes os dois districtos que s. ex.ª citou e que tomou para mostrar as injustiças e a desigualdade que se davam na distribuição; mas essa desigualdade não é tão grande como a pintou o illustre deputado.

(Á parte do sr. Barros Gomes.)

Eu sei que s. ex.ª a modificou depois, e até disse que em um havia duas cidades importantes. Mas isso é pouco.

S. ex.ª não fallou no valor locativo que está nas matrizes d'esses districtos, porque do contrario havia de ver que essa desigualdade, nem é tão grande como s. ex.ª quiz fa-

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zer ver, nem pelo projecto que estamos discutindo, desapparece, antes continua quasi na mesma escala.

O sr. Barros Gomes: — Diminue muito.

O Orador: - Eu estou certo que ha de augmentar: o tempo o mostrará. Tive o cuidado de fazer o calculo necessario para provar o que acabo de dizer.

Portalegre pagou de percentagem complementar em 1868 5:999$947 réis, e Bragança 1:228$457 réis. E havia aqui os addicionaes, que proporcionalmente cresciam n'um e outro districto.

Já se vê que a differença não é tão saliente como s. ex.ª pretendia.

Mas quer a camara saber quanto depois vem a pagar, para ver que não ha essa desigualdade? Vem a pagar o districto de Portalegre, mettendo em conta os addicionaes, quasi tres partes a mais do que o districto de Bragança. É realmente não devemos admirar-nos tambem n'esta parte, porque é fóra de duvida que o districto de Portalegre é mais importante e rico que o de Bragança.

Por consequencia este argumento não prova o que o illustre relator quiz, e póde provar demais, porque se é certo que ha hoje revoltante desigualdade (do que é culpado o governo e o parlamento), ella continua, posto que em menor escala, o que não póde deixar de proceder das pessimas matrizes que temos, por isso não deve s. ex.ª querer tal base, como quer.

Emquanto a s. ex.ª dizer que, quando se estabeleceu entre nós este systema da repartição, nós fomos victimas das idéas ou exemplos adoptados pela França, eu entendo que os ministros e os estadistas que seguirem esta opinião não eram tão miopes que não vissem os inconvenientes de implantar no paiz um systema novo, adoptando uma base mais justa.

Eu não vi que por parte do illustre relator da commissão, posto que estimasse muito ouvir o discurso, summamente substancioso, com que s. ex.ª illustrou a camara e com que mais uma vez veiu corroborar a opinião de que lhe está sem duvida reservado um logar importante na representação politica d'este paiz, e com toda a justiça; não vi, repito, e com muito sentimento o digo, que fosse apresentado argumento algum solido, convincente, para fundamentar a mudança da contribuição de repartição para a contribuição de quota, que me parece ser o ponto primario a tratar.

Mas, por mais que se houvessem apresentado, não eram elles capazes de destruir as desigualdades das matrizes.

Em Lisboa, apesar da obrigação de os proprietarios ou senhorios darem relações dos inquilinos, do valor locativo das casas, acontece que no bairro occidental faltaram 508 d'estas declarações. Isto é um facto importante que mostra que nós não podemos nunca chegar a obter um resultado perfeito da nova organisação das matrizes. E honra seja feita ao escrivão de fazenda, que não conheço, e que teve o cuidado de mandar fazer listas á sua custa e de as mandar distribuir por um individuo a esses 508 individuos que não tinham dado declarações.

Sr. presidente v. ex.ª ha de permittir-me que eu apresente mais algumas considerações, porque me parece que, desde o momento em que a proposito d'este projecto todos os illustres membros d'esta casa, que têem tomado parte no debate, têem apresentado a sua opinião sobre a maneira de melhorar a fazenda publica.

Eu, humilde como sou, tambem estou no direito de expender a minha opinião ácerca do nosso estado financeiro, e não me posso dispensar de o fazer, porque me parece que d'esta fórma cumpro melhor o meu dever.

O nosso paiz tem muitos recursos que estão abandonados, recursos por meio dos quaes podemos em grande parte remediar os males que tanto nos affligem.

Já se pediu, e eu não repetirei, posto que me conforme, a reforma da instrucção publica. Já se pediu a reforma do exercito, muitas outras reformas, e já se pediram tambem reducções.

Eu tambem sou partidario convicto das reducções. Entendo que muitas e muitas reducções se podem fazer (apoiados).

Mas entenda-se bem, que são sem prejuizo do serviço publico, porque, reducções que prejudicam o serviço publico, não são reducções, são prejuizos (apoiados); não são economias, são desperdicios (apoiados).

A economia não consiste em gastar pouco, mas sim productivamente (apoiados).

O que eu desejo, e creio que todos que fazem parte do partido a que tenho a honra de pertencer partilham as mesmas idéas, é que as reducções, que se fizerem, sejam meditadas e examinadas, que se córte aquillo que é propriamente excrescencias do orçamento (apoiados); mas por fórma nenhuma que se desorganise o serviço publico (apoiados).

Eu creio que essas reducções hão de effectuar-se antes pela organisação do serviço do que pela desorganisação d'elle. Tambem creio que as reducções hão de apparecer como consequencia da melhor organisação de serviço. Concordo pois, que se façam reducções, mas reducções com prejuizo do serviço, não. Quero reducções feitas com estudo e prudencia. Mas se eu quero isto, tambem quero que o imposto, que reconheço que é uma necessidade elevar-se, se augmente com todo o cuidado (apoiados); porque o imposto tem sido augmentado, e augmentado consideravelmente ha dezeseis annos a esta parte, e o paiz não se tem recusado a este augmento; porém é necessario que não se abuse (apoiados).

Disse e repito, que votava o augmento da contribuição pessoal, se assentasse sobre outras bases, e talvez vote outros impostos; mas a respeito do augmento de um d'elles faço uma excepção, e por isso declaro muito categoricamente que sem que da parte do governo sejam dadas as garantias que reputo precisas e indispensaveis, para a propriedade e para o proprietario, eu não voto, seja qual for o governo, augmento da contribuição predial. É necessario que se dê á terra e aos proprietarios as garantias de que elles precisam e que são indispensaveis para elles poderem melhorar a sua agricultura e satisfazer aos seus muitos encargos (apoiados). E necessario uma lei que regule a introducção dos cereaes. Hoje se o paiz produz muito, fica o cereal nos celleiros ou vende-se ao desbarato. Se ha pouco, mas sufficiente para o consumo, as portas abertas vem fazer com que meia duzia de monopolistas lucrem, e os nossos cereaes, sobretudo os das provincias, pela difficuldade dos transportes, fiquem sem extracção. Vejam que situação a do lavrador!

Para o governo melhorar o estado afflictivo em que o paiz se acha, parece-me que deve aproveitar as forças productivas do mesmo paiz; fazendo-o, os resultados salutares hão de nascer espontaneamente sem haver precisão de se exigirem ao paiz tantos sacrificios como hoje.

Tambem me parece que uma das maneiras para chegar aos resultados desejados, é a reforma da nossa administração (apoiados). Acabar com essas velharias que ahi temos n'um codigo administrativo promulgado dictatorialmente em 1842, modelado nas leis francezas de 31 de março de 1831 e de 18 de julho de 1837, codigo que assenta sobre principios que o paiz não póde hoje aceitar, porque n'aquella epocha curava-se especialmente de fortalecer o poder central, suppondo-se que assim ficava o governo mais habilitado para combater a anarchia; codigo que está em desaccordo completo não só com as idéas mais avançadas de descentralisação, e geralmente aceitas, mas tambem com as circumstancias peculiares do nosso paiz.

Precisa-se, pois, de uma reforma cabal na nossa administração, e n'esta parte direi a v. ex.ª, no que sou insuspeito, que temos um trabalho importantissimo que honra o

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paiz e que honra principalmente o seu auctor perante nacionaes e estrangeiros, a reforma administrativa apresentada pelo sr. Mártens Ferrão, trabalho que é uma base d'onde póde derivar muita luz para qualquer commettimento que se queira emprehender sobre esta materia (apoiados).

Eu sou insuspeito dizendo isto, porque em alguns pontos d'essa reforma administrativa estou em desaccordo com o seu illustre auctor, principalmente no que diz respeito à circumscripção territorial.

É aquillo que temos de melhor sobre administração e era de muita vantagem que, com as alterações que a experiencia tenha mostrado que se lhe devem fazer, nós a adoptassemos, porque assim fariamos um grande beneficio ao paiz (apoiados).

Isto de fazer reformas a retalho em administração é inhibir que de futuro se possa fazer uma reforma mais completa; e por assim dizer cergir com linha branca mais um remendo a essa tunica esfarrapada que se chama codigo administrativo. (Vozes: — Muito bem.)

Ha um ponto importantissimo, para o qual chamo a attenção do nobre ministro da fazenda, d'onde nos podem provir grandes recursos, e é o dos terrenos incultos que existem entre nós, os quaes montam a tres quintas partes da superficie total do paiz.

(Áparte.)

Os dados estatisticos contidas em um bem elaborado relatorio da commissão geodesica, auxiliada por alguns engenheiros e por outros empregados, dizem-nos quaes são os hectaras de superficie que se acham por cultivar.

A commissão geodesica calcula que o paiz tem 8.962:531 hectaras de superficie, e calcula em 4.314:000 hectaras os terrenos incultos propriamente ditos.

Nas suas considerações muito sensatas, e em seguida a estes dados estatisticos diz a mesma commissão que ha muitos milhares de hectaras de terreno que não recebem cultura senão com grandes intervallos de tempo e outros muitos milhares de hectaras que só recebem a cultura pelo tradicional systema dos alqueires.

A final, feito o calculo dos hectaras de terreno que em cada anno ficam sem cultura, diz a commissão serem 5.000:000. Ora, de 5.000:000 para 8.962:531 ha a differença de 3.962:531, já vê v. ex.ª e a camara que os terrenos incultos orçam por tres quintas partes da superficie do paiz.

Portanto, se o governo adoptar uma medida pela qual se consiga reduzir a cultura apropriada os terrenos desaproveitados, se providenciar convenientemente com relação aos baldios, achará uma importantissima fonte de receita, porque na realidade a temos ahi. Se a governo distribuir, por exemplo, gratuitamente os baldios pelos povos para elles os arrotearem, creia v. ex.ª que dentro em poucos annos havemos de ter um grande augmento de receita, porque havemos de ter muito maior riqueza do que a que hoje possuimos. E creia v. ex.ª que medidas d'esta ordem serão sempre com prazer e com toda a boa vontade recebidas pelos povos. Lucra elle e lucra o thesouro.

Este ou qualquer outro alvitre póde dar resultados e vantagens immensas.

Já ouvi calcular esse resultado em tantos contos de réis, e isto por pessoas competentes, que elles só bastavam para saldar o nosso deficit. Eu não digo tanto, nas creio que d'aqui podem vir resultados valiosissimos (apoiados).

Não posso concluir sem dizer a v. ex.ª, e n'esta parte talvez precisasse de mais algum tempo do que aquelle que resta até dar a hora, para tambem fazer algumas apreciações politicas.

(Áparte.)

Politicas para imitar os oradores que me têem antecedido. A justiça deve-se igualmente a todos. Como aqui têem sido citados dados estatisticos para mostrar que o partido reformista tem sido delapidador... delapidador, sr. presidente que não tem sido economico! que de 1868 para cá houve grande augmento de despesa, eu podia tambem apresentar dados estatisticos para demonstrar que de então para cá tem havido muito mais redacções do que nunca houve, e muito maior economia (apoiados), e que as despezas publicas não têem augmentado, e, se pequenissimo augmento tem havido, é elle proveniente dos muitos encargos que vieram dos governos passados. Falta o tempo, por isso resumirei.

Quer porém saber v. ex.ª emquanto augmentou a despeza de 1865 a 1867, periodo da gerencia do governo do sr. Fontes? Augmentou em 2.600:000$000 réis, isto é um dado estatistico. E desde 1868 até hoje, ou tem estado estacionaria, apesar dos encargos vindos dos governos anteriores, ou se augmentou foi em uma cifra muito e muito insignificante, talvez não superior a 100:000$000 réis. Veja a camara a differença que ha entre um e outro algarismo. Para que, pois, vir aqui lançar insinuações ao partido reformista? Digam que tem sido dissipador, anti-economico, desorganisador, que o paiz lhe fará a justiça que aqui se lhe nega (apoiados).

Desejaria que nós não viessemos aqui para desprestigiar os partidos, uns aos outros, nem os homens publicos; tanto aqui, como na imprensa (apoiados). Esse systema deve acabar por honra d'esses mesmos partidos (apoiados).

Pela parte que me toca e como membro humilissimo de um partido, declaro que respeito tanto o partido reformista, como o partido historico, o partido regenerador ou esse partido nascente que creio que se denomina constituinte. Todos têem merecimentos e defeitos.

Entendo que nos devemos respeitar mutuamente. Desde o momento em que não ha esse respeito, e se viermos para a imprensa ou para o parlamento discutir pessoas, insultar os homens publicos, em vez de se lhe apontarem, com verdade os seus erros, e descurando o interesse geral do paiz, nós iremos n'um caminho ruinoso, como temos ido até hoje, e fazemos perder o prestigio aos homens publicos, prestigio que elles precisam n'aquellas cadeiras para iniciar as suas reformas e faze-las aceitar pelo povo. (Apoiados — Vozes: — Muito bem.)

Ouvem-se aqui declamações para mostrar que tal partido gastou mais, e que não deve ser chamado ao poder. Ao passo que se descura dos interesses mais caros do paiz, ao passo que não se trata das questões mais palpitantes e de interesse geral. Isto não póde nem deve continuar.

Compenetremo nos todos da difficuldade da nossa posição e das obrigações que pesam sobre os homens publicos. Pela minha parte faço votos para que haja união. (Interrupção.)

Não quero fusões. As fusões fazem se de idéas e não de partidos. A fusão de dois homens ou de dois partidos, sem offensa de ninguem, é minha opinião, que entra mais n'ella a especulação do que a boa fé de servir o paiz.

Portanto unam-se todos aquelles que desejam ver o para livre dos males que o affligem, e, ligados por esse patriotico sentimento, preste cada um, segundo suas forças, os serviços de que póde dispor. A civilisação de hoje construe a felicidade dos povos sobre condições muito mais duradouras, porque são humanas e justas, do que as civilisações extinctas, que bem podem chamar-se barbaras, porque edificavam sobre ruinas e cadaveres.

Aproveitemos, pois, os recursos que nos restam, e lembremo-nos do que devemos a nossos maiores, a nós mesmos e ao paiz.

De contrario continuaremos na senda ruinosa em que nos temos precipitado, e da qual é necessario saír (apoiados.

Tenho dito.

Vozes: — Muito bem.

O orador foi comprimentado por muitos srs. deputados.

Mandou para a mesa a seguinte.

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Proposta

Proponho a eliminação do artigo 1.°, ficando em vigor a disposição do artigo 1.° da carta de lei de 30 de julho de 1860. = Francisco de Albuquerque.

O sr. Presidente: — Peço ás commissões que apresentem alguns trabalhos, porque na mesa não os ha para discussão.

A ordem do dia para ámanhã é trabalhos em commissões; e para sexta feira, na primeira parte, a discussão do projecto n.º 6, e na segunda parte a continuação d'esta discussão.

Está levantada a sessão.

Eram quatro horas da tarde.

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