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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

28.ªSESSÃO

EM 8 DE SETEMBRO DE 1905

SUMMARIO. - Lida e approvada a acta, deu-se conta de tres officios e tiveram segunda leitura, sendo admittidos, os projectos de lei dos Srs. Manoel Antonio da Silveira e Ferreira da Fonseca. - Antes da ordem do dia falam os Srs. Ministro da Justiça (Arthur Montenegro), Visconde do Ameal, Ministro da Guerra (Sebastião Telles) e Queiroz Ribeiro. - Apresentam participações e requerimentos os Srs. Pereira Cardoso, Porto Carrero, Martins de Carvalho, Bernardo de Alpoim, Alberto Navarro e Ferreira da Fonseca. - O Sr. Ministro da Marinha (Moreira Junior) apresenta duas propostas de lei, uma modificando os vencimentos dos officiaes da armada, outra concedendo um exclusivo de aguas na Ilha do Fogo.

Na Ordem do dia (primeira parte) discute-se e approva-se o projecto de lei n.º 9, falando sobre elle os Srs. Alfredo Brandão, Ministro da Guerra e Antonio Rodrigues Ribeiro. Na segunda parte da Ordem do dia (continuação da interpellação do Sr. João Pinto dos Santos) falam os Srs. Carlos Ferreira e Joaquim Pedro Martins.

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2 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Presidencia do Exmo. Sr. Alfredo Pereira (Supplente)

Secretarios os Exmos.Srs.:

Conde de Agueda

Gaspar de Abreu de Lima

Primeira chamada - Ás 2 horas da tarde.

Presentes - 6 Srs. Deputados.

Segunda chamada - Ás 2 e 3/4 horas da tarde.

Presentes - 64 Srs. Deputados.

São os seguintes: Abel da Cunha Abreu Brandão, Alberto de Castro Pereira de Almeida Navarro, Albino Augusto Pacheco, Alexandre Proença de Almeida Garrett, Alfredo Cesar Brandão, Alfredo Pereira, Alvaro da Silva Simões, Antonio Augusto Pereira Cardoso, Antonio Caetano de Abreu Freire Egas Moniz, Antonio Cassiano Pereira de Sousa Neves, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio Maria de Carvalho de Almeida Serra, Antonio Rodrigues da Costa Silveira, Antonio Rodrigues Ribeiro, Antonio de Sousa Athayde Pavão, Antonio Tavares Festas, Augusto Faustino dos Santos Crespo, Augusto Guilherme Botelho de Sonsa, Carlos Augusto Ferreira, Conde de Agueda, Conde de Sucena, Diogo Domingues Peres, Duarte Gustavo de Roboredo Sampaio e Mello, Eduardo Valerio Augusto Villaça, Ernesto Julio de Carvalho e Vasconcellos, Eusebio David Nunes da Silva, Fernando Augusto Miranda Martins de Carvalho, Fernando de Sousa Botelho o Mello (D.), Francisco Pessanha Vilhegas do Casal, Francisco Xavier Correia Mendes, Gaspar de Abreu de Liina, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, João Augusto Pereira, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João Monteiro Vieira de Castro, João de Sousa Bandeira, Joaquim Augusto Ferreira da Fonseca, Joaquim José Pimenta Tello, Joaquim Pedro Martins, José Affonso Baeta Neves, José Alberto da Costa Fortuna Rosado, José Augusto de Lemos Peixoto, José Augusto Moreira de Almeida, José Cabral Correia do Amaral, José Christovão Patrocinio de S. Francisco Xavier Pinto, José da Cruz Caldeira, José Ferreira de Sousa Junior, José Maria Pereira de Lima, José Maria Queiroz Velloso, José Paulo Monteiro Cancella, José Simões de Oliveira Martins, José Vicente Madeira, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz Maria de Sousa Horta e Costa, Matheus Teixeira de Azevedo, Miguel Antonio da Silveira, Miguel Pereira Coutinho (D.), Pedro Doria Nazareth, Raul Correia de Bettencourt Furtado, Thomaz de Almeida Manoel de Vilhena (D.), Visconde do Ameal, Visconde das Arcas e Visconde de Pedralva.

Entraram durante a sessão os Srs.: Abel Pereira de Andrade, Antonio Alberto Charula Pessanha, Antonio Alves Pereira de Mattos, Antonio Centeno, Antonio Peixoto Correia, Antonio de Sousa Horta Sarmento Osorio, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Augusto de Castro Sampaio Cõrte Real, Augusto Cesar Claro da Ricca, Bernardo de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, Clemente Joaquim dos Santos Pinto, Conde do Alto Mearim, Conde de Castro e Solla, Conde de Penha Garcia, Eduardo Frederico Schwalbach Lucci, Emygdio Lino da Silva Junior, Francisco Miranda da Costa Lobo, Francisco Xavier Cabral de Oliveira Moncada, Francisco Xavier da Silva Telles, João Alberto Pereira de Azevedo Noves, João Joaquim Isidro dos Reis, João José Sinel de Cordes, João Maria Cerqueira Machado, João Serras Conceição, Joaquim Hilario Pereira Alves, José Coelho da Motta Prego, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Joaquim Mendes Leal, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, José Mathias Nunes, Julio Dantas, Julio Ernesto de Lima Duque, Luiz Eugenio Leitão, Luiz Pizarro da Cunha de Porto Carrero (D.), Luiz Vaz de Carvalho Crespo, Manoel Antonio Moreira Junior, Manoel Joaquim Fratel, Manoel Telles do Vasconcellos, Ovidio de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, Rodrigo Affonso Pequito e Visconde da Ribeira Brava.

Não compareceram á sessão os Srs.: Adriano Anthero de Sousa Pinto, Alfredo Carlos Le Cocq, Anselmo de Assis Andrade, Antonio Augusto Pires de Lima, Antonio Faustino dos Santos Crespo, Antonio Homem de Gouveia, Antonio José Garcia Guerreiro, Antonio José Gomes Lima, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio de Mattos Magalhães, Antonio Rodrigues Nogueira, Arthur da Costa Sousa Pinto Basto, Conde de Carcavellos, Conde da Paçô-Vieira, Conde da Ribeira Grande (D. Vicente), Eduardo Burnay, Eduardo Fernandes de Oliveira, Francisco Joaquim Fernandes, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Frederico Alexandrino Garcia Ramirez, Gil de Mont'Alverne de Sequeira, Henrique Carlos de Carvalho Kendall, Henrique de Carvalho Nunes da Silva Anachoreta, João Baptista Ribeiro Coelho, João Catanho de Menezes, João da Costa Santiago de Carvalho e Sousa, João Pinto Rodrigues dos Santos, João de Sousa Tavares, Joaquim José Cerqueira, Jorge Guedes Gavicho, José Antonio Alves Ferreira de Lemos Junior, José Maria de Oliveira Mattos, José Maria de Oliveira Simões, José Osorio da Gama e Castro, José Vieira da Silva Guimarães, Libanio Antonio Fialho Gomes, Luiz Filippe de Castro (D.), Luiz José Dias, Manoel Francisco de Vargas, Marianno >Cyrillo de Carvalho, Marianno José da Silva Prezado, Mario Augusto de Miranda Monteiro, Paulo de Barros Pinto Osorio, Sertorio do Monte Pereira, Vicente Rodrigues Monteiro, Visconde de Guilhomil, Visconde da Torre e Zeferino Candido Falcão Pacheco.

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SESSÃO N.º 28 DE 8 DE SETEMBRO DE 1905 3

ABERTURA DA SESSÃO - Ás 3 horas da tarde

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Officios

Do Ministerio dos Negocios Estrangeiros, remmettendo 50 exemplares da 1.ª parte do Livro Branco relativo ao commercio dos vinhos, para serem distribuidos pelos Srs. Deputados.

Para a secretaria.

Do Ministerio das Obras Publicas, remmettendo uma memoria sobre o projecto de prolongamento do caminho de ferro; do Barreiro a Cacilhas, em satisfação ao requerimento do Sr. Deputado José Maria Pereira de Lima.

Para a secretaria.

Do mesmo Ministerio; participando não existirem naquelle Ministerio os documentos relativos ao contrato provisorio para estabelecimento de varios cabos submarinos, mas sim no Ministerio dos Negocios da Marinha e Ultramar, pedidos pelo Sr. Deputado Visconde da Ribeira Brava.

Para a secretaria.

Do mesmo Ministerio, enviando um exemplar da organização dos serviços de fomento commercial dos productos agricolas, approvada por decreto de 22 de julho ultimo, satisfazendo assim o requerimento do Sr. Deputado Francisco Xavier da Silva Telles.

Para a secretaria.

Segundas leituras

Projecto de lei

Senhores: - Os habitantes do logar da Fazenda, da freguesia de Nossa Senhora do Rosario, concelho das Lages das Flores, districto da Horta, em numero aproximadamente de 1:000, estão distantes da igreja parochial cerca de 4 kilometros de pessimos caminhos, cujo transito é bem difficil e por vezes impossuvel na estação invernosa.

Para obviar a este inconveniente foi já criado um curato suffraganeo, abrangendo todos os seus fogos, mas são ainda muitas as dependencias da igreja parochial, que só desapparecem criando uma freguesia n'aquelle logar.

Sendo certo que este beneficio não traz novos encargos para o Estado, porque já ali existe um curato devidamente dotado, e torna mais facil áquelle povo o cumprimento dos seus actos religiosos, acho justa esta petição, e nestas condições tenho a honra de apresentar á Exma. Camara o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É criada para todos os effeitos legaes uma freguesia independente e autonoma no logar da Fazenda, da Ilha das Flores, actualmente pertencente á freguesia de Nossa Senhora do Rosario, concelho das Lages das Flores, districto da Horta.

Art: 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das Sessões da Camara dos Deputados, em 6 de setembro de 1905: = O Deputado, Miguel Antonio da Silveira.

Foi admittido e enviado á commissão de administração publica.

Projecto de lei

Senhores: - A actual organização das assembleias eleitoraes do concelho de Ceia, que pela lei vigente faz parte do circulo eleitoral n.° 12, offerece graves inconvenientes ao exercicio do direito do suffragio eleitoral.

A simples inspecção topographica d'aquelle concelho indica a viciosa distribuição da sede das assembleias, e o conhecimento das distancias que separam cada uma das freguesias, e os caminhos que as ligam, mostra que o legislador não attendeu ao regular e indispensavel agrupamento que proporcione commodidade aos eleitores.

Formou-se uma assembleia com a sede na freguesia de Vide, povoação que se encontra isolada entre as montanhas da Serra da Estrella, no extremo do concelho, para onde não ha estrada ou caminho regular que facilite o transito dos eleitores das outras freguesias que compõem esta assembleia, e que ficara a uma distancia superior a 10 kilometros.

Outras assembleias, porém, teem a sua sede em Torrosello e Sandomil, duas freguesias confinantes nos seus limites, e situadas a uma distancia inferior a 3 kilometros, fazendo-se concentrar nellas os eleitores de freguesias mais importantes no seu recenseamento, mais centraes; e situadas até a menor distancia da sede de outras assembleias.

Por estas considerações, principalmente, tambem pelas alterações que nestes ultimos annos se teem feito sentir no recenseamento eleitoral do concelho de Ceia, impõe-se a necessidade de remodelar a distribuição por que foram agrupadas as freguesias que formam as assembleias eleitoraes, e mudar a sua sede.

Tendo, pois, em consideração a commodidade dos povos e facilitar o livre exercicio do direito de votar, tenho a honra de submetter á vossa esclarecida approvação o seguinte projecto de lei, que tem por fim organizar as assembleias eleitoraes do concelho de Ceia, por um regular e justo agrupamento das freguesias mais proximas, estabelecendo-se a sua sede nos povos mais centraes e accessiveis ao transito dos eleitores:

Artigo 1.° O concelho de Ceia, que faz parte do circulo eleitoral n.° 12, fica dividido em quatro assembleias eleitoraes, com as respectivas sedes nas freguesias de Ceia, Loriga, Santa Eulalia e Paranhos.

A assembleia de Ceia é composta pelas freguesias de Ceia, S. Romão, Sabugueiro, S. Martinho e Santa Marinha.

A assembleia de Loriga é composta pelas freguesias de Loriga, Vallequim, Sandomil, Vide, Alvoco da Serra, Cabeça Sages e Teixeiras.

A assembleia de Paranhos é composta pelas freguesias de Paranhos, Touraes, Girabolhas, Lagens, Penhanços e Santa Comba.

A assembleia de Santa Eulalia é composta pelas freguesias de Santa Enlalia Vargea, Travancinha, Villa Cova, Folhadosa, Carragosella, Torrasella, Sameice e S. Thiago.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da Camara dos Deputados, em 6 de setembro de 1905. = O Deputado, A. Ferreira da Fonseca.

Foi admittido e enviado á commissão de administração publica.

O Sr. Presidente: - Participo á Camara que fui procurado por uma deputação de empregados da Companhia dos Tabacos, que me entregou uma representação, pedindo para ser lida na sessão e que depois seja publicada no Diario do Governo.

Leu-se. Vae por extracto no fim da sessão.

Consultada a Camara sobre se permittia a sua publicação no "Diario do Governo", resolveu affirmativamente.

O Sr. Ministro da Justiça (Arthur Montenegro): - Sr. Presidente: eu começo por explicar - como já come-

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cei a fazê-lo noutra sessão em que não pude proseguir, porque não havia antes da ordem do dia - que, tendo sido feitas umas observações acêrca de negocios que correm pela minha pasta por dois illustres Deputados nesta casa, os Srs. Abel Andrade e Navarro, não pude aqui vir immediatamente responder, porque estava empenhado num debate politico na Camara dos Pares, a que tinha de assistir. Este foi o motivo que me impediu de vir a esta Camara mais cedo.

As observações que se fizeram aqui dizem respeito a actos do Governo progressista nesta recente gerencia dos negocios publicos, actos de que tenho a responsabilidade, embora não tenham sido praticados por mim (Apoiados) e este facto não serve senão para tornar mais imparciaes as minhas palavras.

O Sr. Abel Andrade, referindo-se á portaria de 7 de dezembro de 1904, impugnou-a.

Esta portaria diz respeito á imprensa, aos casos em que podem ser apprehendidos os jornaes e aos termos em que se deve realizar, a apprehensão.

O illustre Deputado o Sr. Abel Andrade taxou esta portaria de illegal e dictatorial, por isso que era interpretativa. Ora, Sr. Presidente, devo dizer a V. Exa. que não attinjo bem o alcance do argumento.

Pode a portaria ser illegal, ou dictatorial ou ter outra pecha que eu desconheço; agora por ser interpretativa, é que eu não percebo o argumento que a contradiz. Não vejo o alcance d'elle, e não o vejo porque eu penso que ella é de facto interpretativa. Não ha duvida, mas eu procuro um decreto, um regulamento, ou um acto qualquer acêrca de uma lei que não seja interpretativa e não encontro. Tudo o que se publica acêrca de uma lei é interpretativo. Interpretativa é a opinião do orador que disserta, sobre uma lei, é a sentença de um tribunal que executa uma lei; interpretativo é um regulamento ou um decreto que regula ou addita as disposições de uma lei.

Tudo é interpretativo, e, por consequencia, a portaria ou decreto de 1904, acêrca da imprensa, é interpretativa. Não tenho duvidas no meu espirito a esse respeito. Qual seja, porém, o diploma que não seja interpretativo, isso não sei eu. Agora que a faculdade de interpretar as leis, pela Carta Constitucional, só seja da competencia do Parlamento, isso é com o que eu não concordo. A faculdade de interpretar leis pela nossa Carta Constitucional, e pelas Cartas Constitucionaes de todos os paizes, compete a todos que tenham de mexer em leis, seja para as compulsar ou para as executar. Ha só uma interpretação especial que pertence ao Parlamento, - mas essa não se differença da outra pela natureza, mas pela força. Esta é que é a grande differença.

A interpretação dada pelo Parlamento é uma interpretação que tem tanta força como a propria lei, interpretação dada pelo poder judicial ou pelo poder executivo, é uma interpretação que se desfaz com os proprios actos que o poder judicial ou o poder executivo tem de fazer. Não vejo, pois, como se possa taxar esta portaria de illegal por ser interpretativa.

Agora passo á critica do Sr. Alberto Navarro.

A critica de S. Exa. diz respeito ás promoções que tem havido na magistratura judicial e são acoimadas do mesmo vicio da portaria de 1904, quer dizer, tambem de promoções illegaes, promoções feitas em virtude de poderes que influiam com uma dictadura.

O Sr. Deputado Alberto Navarro fez um discurso que a Camara ouviu, mas que, como foi produzido já ha dias, eu lerei na sua synthese, para só comprehender melhor o que entendo dever responder.

S. Ex.ª resumiu o seu discurso a duas perguntas que segundo o extracto das sessões são as seguintes:

(Leu).

A esta pergunta respondo eu: presumo que o Ministro da Justiça procedeu assim fundando-se na disposição do artigo que vou indicar.

(Leu).

2.ª pergunta.

(Leu}.

Não foi em virtude de nenhum artificio que se pagou a esses juizes; foi ao abrigo do artigo 4.° do decreto de 13 de junho de 1900, que diz:

(Leu).

São estas as disposições legaes que encontro para responder ás perguntas que me foram dirigidas. Não sei se em outras encontrou o meu antecessor fundamento para proceder como procedeu, mas como estas são disposições legaes applicaveis entendi que as devia citar. E assim respondo ás criticas feitas aos actos praticados pelo meu Ministerio.

(O orador não reviu este discurso}.

O Sr. Visconde do Ameal: - É esta a primeira vez que tenho a honra de falar na Camara; despretenciosa e humilde, a minha voz nunca se fará escutar que não seja para defender a causa da minha bandeira ou dos legitimos interesses do meu circulo. Fiel ao meu programma vou desde já começar por pô-lo em pratica.

A cidade de Coimbra parece condemnada, pela nova organização do exercito, ao sacrificio da sua divisão militar.

Já a esta Camara foram apresentadas pelo meu illustre collega e amigo Sr. Oliveira Mattos representações da Associação Commercial e da camara Municipal d'aquella cidade, pedindo ao nobre Ministro a conservação da divisão.

Da resposta por S. Exa. dada então, tanto na commissão como no Parlamento, ao Sr. Oliveira Mattos, não me parece dever deduzir um absoluto indeferimento, o que me anima a, neste momento, em que na ordem do dia se estão discutindo as propostas de guerra, vir mais uma vez fazer lembrado o justo pedido da cidade de Coimbra.

Sr. Presidente: contando com a benevolencia, especialmente dos meus illustres collegas que fazem parte do exercito, entendo que, como filho de Coimbra e seu representante no Parlamento não devo deixar de referir a V. Exa. e á Camara os imperiosos motivos que determinaram a conservação em Coimbra da sede de uma divisão militar.

Todos ou quasi todos os escriptores militares que se teem occupado da defesa do paiz dividem o continente em tres zonas, ou theatros de operações - a do norte, que vae até o rio Douro; a do centro, que comprehende a região entre esse rio e uma linha que passa por Elvas, serra d'0ssa e rio Sado; a do sul, que abrange todo o resto ao sul d'essa linha.

D'estas tres zonas é evidentemente a segunda aquella que, em hypothese de guerra, maiores probabilidades offerece de vir a ser o theatro de quaesquer operações. As invasões ao nosso paiz podem, segundo a opinião dos escriptores militares, dar-se pela Beira Alta, Beira Baixa ou Alemtejo; podendo portanto, de uma maneira geral, affirmar-se que as forças que pretendam invadir Portugal deverão naturalmente convergir para o valle do Tejo, sul do Mondego, ou peninsula de Setubal.

É evidente que Coimbra occupa uma posição muito central relativamente ás provaveis invasões pela Beira Alta e Beira Baixa, e que as forças concentradas em Coimbra podem até, segundo a opinião dos tacticos, realizar um ataque de flanco ás forças que pretendam invadir Portugal pelo Alemtejo.

Ora, sendo além d'isso alguns escriptores militares de opinião, e d'entre elles destaco gostosamente neste momento a auctorizadissima opinião do Sr. Ministro da Guerra, de que Coimbra deve até mesmo ser fortificada para melhor se defenderem as duas margens do Mondego,

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parece naturalmente deduzir-se que Coimbra deva ser a sede de uma divisão militar.

A todas estas razões deve-se ainda accrescentar uma outra: o facto de estar aquella cidade ligada por meio de linhas ferreas com o Porto, Guarda, Viseu, Castello Branco, Lisboa e em breve com a Covilhã, pela linha ferrea chamada de Arganil, que ali virá a ter certamente o seu terminus, a sua testa natural, podendo d'esta forma communicar rapidamente com a fronteira ou retirar as suas forças sobre Lisboa, com a qual, na hypothese de um revés, está em directa communicação por meio de duas linhas ferreas.

As vantagens da posição de Coimbra teem sido tão extraordinariamente sustentadas e reconhecidas pelo Ministerio da Guerra que lá lhe collocou uma succursal da Manutenção Militar, que abastece Guarda, Viseu, Aveiro, Figueira da Foz, Covilhã e Alcobaça, e lá está actualmente, em construcção um deposito de fardamento destinado a fornecer as actuaes 2.ª e 5.ª divisões militares.

odos sabem, até mesmo os mais leigos, como eu, em assumptos militares, que, junto de um quartel general, deve sempre haver em deposito, condensada, o que em termos militares se chama impedimento, que, em hypothese de guerra, deverá ser transportada para os pontos de combate, e parece-me difficil, se não impossivel, encontrar outra terra como Coimbra que tanto satisfaça a essas condições, visto ser o cruzamento - por assim dizer, o nó - das linhas ferreas mais importantes do nosso paiz.

A cidade de Coimbra, tão nobre pelas suas tradições, tão importante pela sua população, pelo seu centro scientifico e ainda pela sua situação geographica; cidade por assim dizer de todos nós, porque todos nós lá passamos um dia, todos nós lá vivemos a nossa phase mais bella da mocidade, todos lá mandamos hoje ou amanhã os nossos filhos, essa nobre cidade tão digna, por tantos titulos, de apreço, de estima geral da nação, não tem positivamente nestes ultimos tempos caído na graça do poder central. (Apoiados).

Agora, quando, com a ascensão do partido progressista ao poder, uma nova era de resurgimento, de prosperidades parece ter despontado para a cidade de Coimbra, surge subitamente a triste noticia de que lhe vão tirar a sua divisão militar!

Sr. Presidente: se a meu ver essa medida, essa resolução representasse uma importante vantagem de ordem militar para a defesa do paiz, eu, apesar de ser filho de Coimbra e no Parlamento um dos seus representantes, seria o primeiro a curvar-me, a ceder perante o que julgo um impreterivel dever - a defesa do paiz, o bem nacional.

Mas tal hypothese afigura-se me não se dar e parece-me ter demonstrado a V. Exa. e á Camava a vantagem que pelo contrario resulta para a defesa do paiz da conservação em Coimbra da divisão militar.

O Sr. Ministro da Guerra, que, pelo seu saber, intelligencia e caracter, é seguramente uma honra para o exercito portuguez e um justo motivo de orgulho para o partido a que tenho a honra de pertencer e que o admira como um dos seus mais brilhantes ornamentos, não deixará de ver nas minhas palavras a justiça da causa que defendo, que, sendo a da minha terra, me parece ser tambem a da nação inteira. (Vozes: - Muito bem).

O Sr. Ministro da Guerra (Sebastião Telles): - Acaba o Sr. Visconde do Ameal de tratar de um assumpto muito sympathico, defendendo, como é justo, os interesses do circulo que o elegeu.

Eu já conheço este assumpto, porque a respeito d'elle já na outra epoca d'este anno em que as Côrtes estiveram abertas, me foram apresentadas representações da Associação Commercial e da Camara Municipal de Coimbra.

Nessa occasião a todos os Srs. Deputados do districto de Coimbra, que me procuraram para me falar no mesmo sentido, respondi que teria o maior pesar em ser desagradavel a Coimbra e que faria por isso todas as diligencias para poder attender as reclamações d'aquella cidade. Accrescentei ainda que, se isso não me fosse possivel, lhe daria compensações militares.

Comprehendo que os interesses das povoações se liguem com os interesses militares; estimo até que se dê essa ligação, porque ella é salutar, mas não é unica e simplesmente por um quartel general, que ali se pode estabelecer. Outros elementos ha com que essa aspiração se pode realizar, e são estes elementos que eu pretendo aproveitar.

Alem dos interesses locaes que o illustre Deputado muito naturalmente defendeu, o illustre Deputado apresentou outras razões para sustentar a causa de Coimbra. S. Exa. quiz achar naquella importante cidade certas condições militares com relação á defesa nacional, e disse com muita razão que o paiz é considerado, sob este ponto de vista, como dividido em tres zonas: a do norte, a do centro e a do sul, sendo a do centro a mais importante, no que aliás todos estão de accordo.

Disse S. Exa. que a zona central é a mais importante; sendo assim, Coimbra é um ponto estratégico, quer a invasão se faça pela Beira-Alta, quer pela Beira-Baixa, devendo por isso haver ali uma divisão militar. Neste ponto é que não posso concordar com o illustre Deputado.

Para o caso de uma invasão pela Beira Alta, a situação de Viseu é mais vantajosa. No caso de uma invasão simultanea pela Beira Alta e pela Beira Baixa haveria necessidade de centralizar as forças e então o ponto seria Thomar ou Abrantes.

Effectivamente Coimbra é um ponto importante, mas unicamente para linha de defesa, não para ter quartel general.

Eu sei que nessas representações se citavam fragmentos de um livro que publiquei com relação á defesa do paiz e em que dizia ser Coimbra um ponto estrategico importante; mas d'ahi não se pode concluir que deva ter quartel general. Se é um ponto importante da linha de defesa, não pode ter quartel general porque este então deve ficar á retaguarda.

Esta situação das forças em tempo de paz deve ser considerada em tudo que for possivel. Mas não é simplesmente aquillo que o Ministro considera, porque a situação em tempo de paz é uma e em tempo de guerra opera-se por meio de reuniões em pontos differentes.

Nunca se pode ter as forças num ponto em que teem de entrar em acção, porque isso seria reuni-las como se estivessem em campanha. Se umas que estão proximas d'esse ponto estão bem situadas ha outras distantes que o não estão.

Nessa parte estimaria muito que Coimbra estivesse nessas condições, porque então seriam satisfeitos os desejos d'aquella cidade, que são tambem os meus.

Mas debaixo de outro ponto de vista, não.

A resolução do problema, como V. Exa. vê, é bastante difficil. Vou no entanto estudá-lo, e verei o que se pode fazer.

Pela organização existente ha seis divisões militares, e pela organização que já foi votada pela Camara ficam apenas quatro, desapparecendo portanto duas. É provavel que sejam as duas mais modernas, e as mais modernas são as de Coimbra e Villa Real. Isto, como V. Exa. sabe, ainda não, está resolvido, mas o caminho a seguir deve ser este. É preciso não haver illusões.

Dadas todas estas circumstancias, farei o mais possivel, dentro dos limites impostos pelas necessidades da defesa do paiz, de ser o mais agradavel possivel a Coimbra.

Dentro d'esses limites, ha margem para se darem compensações a Coimbra, que assim poderá ser attendida em relação a outros pontos. Ha, por exemplo, a questão do quartel, que tenho estudado, e estou disposto a mandar

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proceder á sua construcção, para o que já estão tomadas muitas disposições.

É isto que tenho a dizer ao illustre Deputado, accrescentando que terei muito desgosto se não me for possivel satisfazer por completo as aspirações de Coimbra.

Tenho dito.

(O orador não reviu este discurso}.

O Sr. Pereira Cardoso: - Mando para a mesa a seguinte

Participação

Participo a V. Exa. e á Camara que acaba de ser constituida a commissão de commercio, sendo escolhido para presidente o illustre Deputado o Sr. D. Miguel Pereira Coutinho, e o participante para secretario. - Antonio Augusto Pereira Cardoso.

A secretaria.

O Sr. Queiroz Ribeiro: - Antes de entrar no assumpto para que pediu a palavra, deseja dizer que leu hontem num jornal com larga publicidade que o Sr. Presidente do Conselho, em conferencia com a commissão que representa os operarios manipuladores dos tabacos de Lisboa e Porto, tinha tomado com elles compromissos formaes e lhe tinha declarado que no parecer da minoria da commissão de fazenda seriam inseridas determinadas disposições vantajosas para elles, para depois serem submettidas ao Parlamento; e accrescentava que a commissão ficara plenamente satisfeita com essas declarações.

A camara não deixa seguramente de estranhar, como elle, orador, um procedimento tão incorrecto como este, por parte do chefe do Governo. É possivel que amanhã, depois de amanhã, daqui a oito dias, S. Exa. appareça na Camara para negar o que aquelle jornal noticiou; mas contra essa formal negativa, que seria a continuação de outras, surge uma carta da mesma commissão operaria de manipuladores, confirmando que tiveram de facto essa conferencia, mas que não ficaram por nenhuma maneira satisfeitos.

Quando, como, com que direito um chefe do Governo, sem pasta, desauctoriza por este modo o Parlamento e o Ministro da Fazenda?

Onde, quando, com que direito se viu um chefe de Governo, emquanto a commissão de fazenda do Parlamento está estudando aturada e conscienciosamente um assumpto de alta gravidade, tomar já compromissos fomnaes com individuos estranhos a essa commissão e ao Parlamento e mais ainda dividir a commissão que trabalha em unidade, afastando para a direita a minoria e os reprobos e excommungados para a esquerda?

S. Ex.ª procedendo de uma maneira tão desastrada sob todos os pontos, de vista, dá um desmentido formal ao Sr. Ministro da Fazenda, deixando-o na mais lamentavel das posições, pois que na commissão de fazenda havia este declarado que o Governo não tinha ainda ideias precisas sobre os operarios e que se limitava a manter-lhe as actuaes regalias e direitos; isto accrescentado com o voto banal de os attender no que fosse justo e razoavel.

O procedimento do Sr. Presidente do Conselho é o descredito do Parlamento Portuguez e do paiz.

A Camara certamente lamentará que factos d'esta natureza, surgindo todos os dias, aggravem uma questão já de si tão grave, e que no seio do Gabinete continue uma tal divergencia e falta de unidade de vistas, existindo apenas firme a vontade tenaz do Sr. Presidente do Conselho em fazer ir por deante o contrato e impô-lo á viva força ao paiz, que o condemna e rejeita.

Bem sabe que não está presente o Sr. Presidente do Conselho, nem o Sr. Ministro da Fazenda; mas o Sr. Presidente do Conselho se estivesse na Camara faria o mesmo que tantas vezes tem feito - dizer e desdizer: e o Sr. Ministro da Fazenda seguiria tambem notavelmente o mesmo procedimento que ultimamente adoptou - calar e calar; ou então faria o que fez na ultima sessão, pedir a palavra para explicações, provocar quem estava calado e depois pedir á sua maioria que por dedicação abafasse a voz d'aquelle que queria erguer-se para dizer que as palavras do Sr. Ministro da Fazenda uma vez mais deturparam a verdade.

A Camara recorda-se com certeza do que com elle, orador, succedeu já por duas vezes. Uma vez, levantou-se o Sr. Presidente do Conselho e dirigiu-lhe palavras que elle, orador, na limpidez da sua consciencia, julgou que exigiam uma resposta immediata da sua parte. Pediu a palavra, mas foi-lhe negada. Na sessão seguinte S. Exa. não veio á Camara!

Ante-hontem, o Sr. Ministro da Fazenda, contra o costume, falou, mas para explicações, quando eram quasi sete horas! Mas como falou? Di-lo o orgão officioso do Governo, o Correio da Noite, nos seguintes termos: "Disse o Sr. Queiroz Ribeiro que elle, Ministro, insinuara ao Sr. director geral da thesouraria a informação por elle dada no documento lido á Camara. É falso".

Falso?

O Sr. Ministro da Fazenda fez affirmação semelhante porque tinha as costas quentes, porque já sabia que a maioria não o deixaria falar a elle, orador, para repellir a sua asserção.

O Sr. Carlos Ferreira: - Observa que o Governo não tem a responsabilidade do que se escreve na imprensa e que, por consequencia, o que ella diz não pode ser invocado como argumento.

O Orador: - Quando se refere ao que se publica na imprensa fá-lo com o mesmo direito com que o teem feito outros Srs. Deputados, e ainda no outro dia o fez o Sr. Roboredo Sampaio com applauso da maioria. E elle, orador, não consente, não tolera que haja duas bitolas ali, uma para permittir e apoiar o procedimento de um collega seu, outra para impedir ou censurar o seu procedimento, quando é absolutamente igual ao d'esse seu collega.

Mas, diz o Correio da Noite ...

O Sr. Carlos Ferreira: - O que diz o Correio da Noite não vale nada para ali.

O Orador: - É bom consignar que, segundo o director do Correio da Noite, o que aquelle jornal diz não vale nada.

Fique-se sabendo que faz essa declaração o Sr. Deputado que ainda na ultima sessão declarava que estava com a sua penna inteiramente ao lado do Governo.

Continuava o Correio da Noite ...

O Sr. Carlos Ferreira: - Já disse que os Srs. Ministros não são responsaveis pelo que escreve o Correio da Noite, nem por elle teem de responder.

O Orador: - Para fazer a vontade ao Sr. Deputado, mas sem deixar de dar como verdadeiro o que no Correio da Noite se lê, completa essas informações com o que se encontra no Summario official.

Disse o Sr. Ministro da Fazenda, segundo o Summario, que não fez insinuações ao director geral da thesouraria, nem as costuma fazer. Isto quer simplesmente dizer que S. Ex.ª não comprehendeu o sentido em que elle, orador, empregou essa palavra, que não foi com a ideia de offensa, mas no sentido juridico - dar a perceber.

Mas, collocada a questão neste campo, o caminho está naturalmente indicado: é publicar os documentos e o publico que ajuize.

Nesse sentido mandará para a mesa um requerimento assignado tambem pelos Srs. Ovidio Alpoim, Antonio Centeno, Moreira de Almeida e Joaquim Cerqueira.

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SESSÃO N.° 28 DE 8 DE SETEMBRO DE 1905 7

Sente não ver presente o Sr. Ministro da Fazenda, com quem muito desejava defrontar-se, e por isso pede ao Sr. Presidente que lhe faça constar este seu desejo. S. Exa. poderá satisfazê-lo hoje mesmo, porque tendo pedido para que a commissão do orçamento reunisse hoje, quando se passasse á ordem do dia, é claro, a sua presença é dispensada na outra Camara.

Este assumpto é importante porque, tendo o Sr. Presidente do Conselho affirmado que não havia nenhuma inexactidão, elle, orador, deseja na presença do Sr. Ministro da Fazenda provar o contrario.

Num ponto apenas está de accordo com o Sr. Ministro: é quando S. Exa. disse que não foi elle quem insinuou os termos da consulta. Não foi S. Exa., não, nem elle, orador, o disse. O que disse é que tinha sido o Governo, isto é, o Sr. Presidente do Conselho, porque é S. Exa. quem avocou a si a questão dos tabacos. Ao Sr. Ministro da Fazenda não se referiu, porque toda a gente conhece a historia do contrato e sabe perfeitamente que nessa occasião S. Exa. tinha ideias, sentimentos, desejos que por forma alguma se coadugavam com essa insinuação.

A camara sabe que nessa ooeasião um jornal que, sem pertencer ao partido progressista, defendia o Governo e o contrato, accusava o Sr. Ministro da Fazenda... toda a Camara sabe de quê.

Termina mandando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeremos que, ouvido o Governo, sejam publicados no Diario do Governo, com a maxima brevidade:

a) A informação da Direcção Geral da Thesournria ao Sr. Ministro da Fazenda sobre a capacidade juridica da Companhia dos Phosphoroa para concorrer ao exclusivo dos tabacos;

b) A consulta enviada em 17 de dezembro proximo findo á Procuradoria Geral da Corôa, sobre o mesmo assumpto;

c) A resposta consultiva da Procuradoria Geral da Corôa. = Gaspar de Queiroz Ribeiro = 0vidio de Alpoim - Antonio Centena = José Augusto Moreira de Almeida = Joaquim José Cerqueira.

Foi approvado.

(O discurso do orador será publicado na integra quando devolver os notas tachygraphicas.)

O Sr. Presidente: - Como deu a hora, vae passar-se á ordem do dia. Os Srs. Deputados que teem papeis a mandar para a mesa podem fazê-lo.

O Sr. D. Luiz Porto Carrero: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro a V. Exa. para consultar a camara se consente que, durante a sessão, reuna a commissão do orçamento. = D. Luiz Pizarro da Cunha de Porto Carrero.

Foi approvado.

O Sr. Pereira Cardoso: - Mando para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que seja aggregado á commissão de commercio o illustre Deputado Sr. Alfredo Pereira. = Antonio Augusto Pereira Cardoso.

Foi approvada.

O Sr. Bernardo de Alpoim: - Mando para a mesa o parecer da commissão dos negocios estrangeiros sobre a proposta de lei n.° 5-B de 1905, que tem por fim tornar extensivas á ilha de Porto Rico as estipulações do accordo commercial de 22 de maio de 1899 entre Portugal e os Estados Unidos da America.

Foi a imprimir.

O Sr. Ministro da Marinha (Moreira Junior): - Mando para a mesa duas propostas de lei, que teem por fim:

l.ª

Modificar os vencimentos dos officiaes das differentes classes da armada.

2.ª

Autorizar o Governo a conceder, em concurso publico, pelo prazo maximo de 60 annos e segundo as bases annexas a esta proposta, o exclusivo para a captação e elevação das aguas que sobrem do consumo publico, no local das nascentes, no sitio denominado "Praia Ladrão", da ilha do Fogo, na provincia de Cabo Verde.

Foram enviadas ás commissões do ultramar e de fazenda, depois de publicadas no "Diario do Governo".

Vão na integra no fim da sessão.

O Sr. Martins de Carvalho: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que, com a maior urgencia, me seja fornecido um exemplar do ultimo relatorio da gerencia da Companhia dos Tabacos, ou uma copia do mesmo relatorio. = O Deputado, Fernando Martins da Carvalho.

Mandou-se expedir.

O Sr. Alberto Navarro: - Pedi a palavra para mandar para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro, com urgencia, nota dos notarios interinos que teem sido nomeados até hoje, e para que logares, nos termos do decreto de 4 de Julho de 1905. = Alberto Navarro.

Mandou-se expedir.

O Sr. Ferreira da Fonseca: - Mando para a mesa a renovação de iniciativa do projecto de lei n.°63-C de 1900, que tem por fim conceder a D. Anna Rosa Ferreira Brandão, filha do fallecido capitão Ezequiel Antonio Ferreira Brandão, gravemente ferido em combate, uma pensão mensal de 12$000 réis.

Mando tambem quatro representações:

1.ª Dos segundos officiaes do Ministerio da Marinha e Ultramar pedindo que sejam fixados em 600$000 réis os vencimentos de todos os segundos officiaes das secretarias de Estado;

2.ª Dos amanuenses da Junta do Credito Publico, Caixa Geral de Depositos, Tribunal de Contas, Procuradoria Geral da Corôa, e Torre do Tombo, pedindo que sejam fixados em 360$000 réis annuaes os seus vencimentos;

3.ª Dos segundos officiaes da Secretaria de Estado dos Negocios do Reino, pedindo que lhe sejam fixados em 600$000 annuaes os seus vencimentos;

4.ª Dos segundos officiaes do Ministerio da Fazenda, no sentido da antecedente.

A proposta ficou para segunda leitura.

As representações vão publicadas por extracto no fim da sessão.

PRIMEIRA PARTE DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Annuncia que vae ler-se, para entrar em discussão, o projecto relativo ao tempo para a reforma dos officiaes e funccionarios militares.

Leu-se. É o seguinte

PROJECTO DE LEI N.° 9

Senhores. - Á vossa commissão de guerra foi presente a proposta de lei n.° 1-F. Essa proposta, assente sobre bases de inteira e indiscutivel equidade, tende a legalizar

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8 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

e a regularizar uma situação positivamente instavel. A contagem, para effeitos de reforma, do tempo que os officiaes e funccionarios do Ministerio da Guerra serviram em empregos publicos dependentes do Governo e dos municipios, tem revestido até hoje o caracter de uma concessão individual. Impõe-se, portanto, a necessidade de, por uma medida geral, tornar essa concessão extensiva a todos os funccionarios e a todos os officiaes em identicas circumstancias, regularizando e legalizando a situação, e prevenindo assim a eventualidade de excepções menos justas. O mesmo principio de justiça levou o Governo a estabelecer, na mesma proposta de lei, a validade e a contagem para effeitos de reforma, do tempo que serviram no exercito como substitutos os individuos alistados anteriormente á portaria de 10 de agosto de 1886. A justiça de semelhantes medidas resalta do lucidissimo relatorio que acompanha a proposta do Governo.

A commissão de guerra, que cuidadosa e demoradamente ponderou esses documentos, é de parecer que pode e deve ter a vossa approvação, o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° A todos os officiaes e funccionarios dependentes do Ministerio da Guerra é contado, para effeitos de reforma:

1.° O tempo durante o qual desempenharam qualquer serviço publico, com direito a reforma ou aposentação, a cargo do Estado ou dos municipios;

2.° O tempo de serviço militar, qualquer que tenha sido a natureza e a data do alistamento, salvos os descontos preceituados em legislação especial.

Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da Camara dos Senhores Deputados, em 6 de maio de 1905. = João Serras Conceição = Francisco X. Correia Mendes = Antonio José Garcia Guerreiro = Jorge Guedes Gavicho = Lourenço Cayolla = Francisco Miranda da Costa Lobo = João J. Sinel de Cordes = Julio Dantas, relator.

N.º 1-F

Senhores. - É rara a sessão legislativa em que se não apresente ao vosso esclarecido exame algum projecto de lei, de interesse individual, autorizando que a varios officiaes e funccionarios do Ministerio da Guerra se conte, para a reforma, o tempo de serviço que elles passaram no desempenho de cargos publicos, uns dependentes do Governo, outros das camaras municipaes. Quasi sempre o parlamento tem sanccionado as pretensões d'esta natureza. Por vezes, porém, a urgencia de outros trabalhos de interesse geral tem obrigado a collocar, em segundo plano, aquelles projectos, que, embora contenham uma medida justa e equitativa, constituem, no entanto, questões minimas, sob o ponto de vista dos interesses nacionaes.

D'aqui tem resultado uma injustiça relativa, a que se tem procurado obtemperar, mandando, pela Secretaria da Guerra, liquidar o tempo de serviço para a reforma aos officiaes e funccionarios que o solicitaram, contando-se-lhes todo o tempo de serviço publico. Parecendo-nos que esta attribuição pertence exclusivamente ao poder legislativo, e desejando collocar todos os officiaes e funccionarios no mesmo pé de justiça e equidade, entendemos dever submetter á vossa apreciação a presente proposta de lei, que visa ainda a um outro fim, não menos justo.

Até 10 de agosto de 1886 não se contava, para effeitos de reforma, o tempo de serviço militar aos individuos alistados como substitutos. Em portaria d'esta data mandou-se contar esse tempo, para todos os effeitos legaes, mas tão somente aos que se alistassem posteriormente áquella data. Poucos são os funccionarios hoje existentes na actividade, a que não seja applicavel a benefica doutrina d'aquelle diploma; mas alguns existem, e tanto basta para a injustiça da excepção se fazer sentir.

Procurando acabar com esta desigualdade inexplicavel, incluimos na presente proposta uma disposição adequada a tal fim.

E tão justo o que se propõe e tão diminuto, o encargo para o Thesouro que, confiadamente, esperamos a vossa approvação.

Proposta de lei

Artigo 1.° A, todos os officiaes e funccionarios dependentes do Ministerio da Guerra é contado, para effeitos de reforma:

1.° O tempo durante o qual desempenharam qualquer serviço publico, com direito a reforma ou aposentação, a cargo do Estado ou dos municipios;

2.° O tempo de servido militar, qualquer que tenha sido a natureza e data do alistamento, salvos os descontos preceituados em legislação especial.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria de Estado dos Negocios da Guerra, 11 de abril de 1905. = Sebastião Custodio de Sousa Telles.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

O Sr. João Augusto Pereira: - Mando para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que no n.º 1.° do artigo 1.° do projecto n.° 9 seja substituida a expressão "ou dos municipios", pela seguinte "dos municipios e juntas geraes de districto".= O Deputado, João Augusto Pereira.

O Sr. Julio Dantas: - Pedi a palavra para declarar, por parte da commissão, que ella acceita a proposta apresentada pelo illustre Deputado Sr. João Augusto Pereira.

O Sr. Alfredo Brandão: - Não esperava que se discutisse hoje este projecto, estando na ordem do dia uma interpellação sobre assumpto importante; mas, emfim, não ha que estranhar, porque a norma agora é pôrem-se as questões militares acima de tudo.

Ha vinte dias que está aberto o Parlamento, e ainda não se fez outra cousa. As questões administrativas e financeiras, essas ficam para depois. O que é preciso é satisfazer o exercito.

Já disse, e repete agora, que o melhor era votar tudo por acclamação, para não se estar a gastar tempo inutilmente. Pela sua parte, se pediu a palavra neste momento não foi para fazer largas considerações, que reputa inuteis, mas para lavrar o seu protesto contra as arbitrariedades referidas no relatorio do projecto, e como reparação, embora tardia, de uma iniquidade revoltante.

No Ministerio da Guerra não se precisa do Parlamento para cousa alguma. Se este, por falta de tempo, deixa de attender qualquer pretensão militar, esta é depois attendida em portarias. Ha d'isto exemplos frisantissimos e o proprio relatorio os confessa.

O projecto em discussão tem uma vantagem: é acabar com esses abusos, e pôr termo a uma iniquidade revoltante que se dava no exercito. Os substitutos formavam uma classe á parte no exercito. Todos tinham direito á reforma, até os expulsos por incapacidade moral; só os substitutos eram exceptuados d'essa vantagem.

Ha officiaes que se reformam tendo passado quasi todo o tempo fora do serviço; e todavia, aquelles, que eram os que conheciam todos os cantos das casernas, porque eram os que effectivamente faziam serviço, esses não tinham direito a cousa alguma.

Eram desprezados, porque recebiam uma pequena remuneração, d'aquelles em cujos logares iam servir.

Isto affrontava os brios do exercito; mas não o affronta agora o facto de se servir do dinheiro das remissões, porque a remissão outra cousa não é senão a substituição dos substitutos.

Aggravou-se a taxa das remissões para haver mais praças a licencear, e alargam-se os quadros, quando fora d'elles ha nada menos de 1:868 officiaes.

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SESSÃO N.° 28 DE 8 DE SETEMBRO DE 1905 9

Como não quer ser incoherente gastando tempo á Camara com discussões que considera inuteis, limita-se a mandar para a mesa a seguinte

Moção

A Camara: considerando que no Ministerio da Guerra se dispensa a intervenção do Parlamento, providenciando-se arbitrariamente sobre assumptos da exclusiva competencia do poder legislativo, por meio de portarias, como se affirma no relatorio do projecto em discussão;

Considerando que os individuos alistados como substitutos no exercito até 10 de agosto de 1886 não gozam do beneficio da reforma, concedida a todos os militares e funccionarios do Ministerio da Guerra, e até aos excluidos do serviço por incapacidade moral;

Considerando que a situação deprimente, excepcional e odiosa dos referidos substitutos se origina no facto de ser considerado mercenaria e mercantil a retribuição com que os substituidos lhes pagavam os serviços que por elles ficavam prestando;

Considerando que essa industria das substituições é presentemente exercida pelo Ministerio da Guerra, e denominada remissão do serviço militar, com taxas fixas e esmagadoras, destinadas ao fundo das remissões, ou ao thesouro especial do exercito que este fundo designa:

Approva o projecto em discussão, como protesto contra as arbitrariedades mencionadas no respectivo relatorio, e como reprovação tardia e serodia de uma iniquidade monstruosa e revoltante. = Alfredo Cesar Brandão.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Ministro da Guerra (Sebastião Telles): - Sr. Presidente: não quero discutir com o illustre Deputado Sr. Alfredo Brandão as opiniões e ideias que S. Exa. tem a respeito do exercito e da sua confiança na defesa do paiz.

Já numa das sessões passadas tive a honra de sustentar ideias em completa opposição ás do illustre Deputado, sendo as nossas ideias e opiniões absolutamente irreconciliaveis nesse ponto.

Por conseguinte, não discuto essa parte e apenas darei uma explicação ás considerações que S. Exa. fez sobre o projecto em discussão.

Disse o illustre Deputado que approva o projecto em discussão, e a moção que S. Exa. mandou para a mesa confirma essa declaração. A moção do illustre Deputado tem por fim unicamente fazer uma censura a umas disposições contidas na lei, e que tinham sido postas em vigor apesar de não estarem em execução.

Tenho a declarar ao illustre Deputado que essas disposições não foram feitas por mim.

Ouvi as considerações do illustre Deputado e posso affirmar que por mim nunca foram applicadas essas disposições.

Quando fui Ministro da outra vez, apresentaram-se projectos neste sentido e foram approvados pela Camara, e para evitar que todos os dias o Parlamento se esteja a occupar de um assunto individual, que se deve generalizar a todos que tenham direito.

A camara sabe a difficuldade que ha para a approvação d'estes projectos de interesse individual sempre votados no fim das sessões.

Ora nestas questões de justiça o que se dá a uns deve tambem ser dado a outros, e tornar essa justiça dependente de influencias, e applicada a quem mais tenha essas influencias, não é justo, nem deve ser e por isso entendo que se deve generalizar, que é a unica maneira de acabar com essas injustiças.

O illustre Deputado decerto concorda com este principio, pois diz que os officiaes que estão nos Ministerios estão nas mesmas condições; mas não é assim, porque não deixam de estar sujeitos ao serviço militar e de um momento para o outro podem ser chamados.

Concordo tambem que aos substitutos deve-lhes ser contado o tempo, porque, o serviço que elles prestam é igual, absolutamente, ao que prestam os outros.
Elles são admittidos por uma lei e portanto não teem de que se envergonhar.

Parece-me ter respondido ao illustre Deputado.

(O orador não reviu).

O Sr. Alfredo Brandão: - Nas considerações que ha pouco fiz, apenas me referi a factos, sem me occupar das personalidades a cuja responsabilidade elles possam pertencer.

Tive o cuidado, quando me referi ao projecto e critiquei os factos a que allude o relatorio do Sr. Ministro da Guerra, de o fazer sem me preoccupar com personalidades; mas S. Exa. pretendendo varrer a sua testada, quiz, naturalmente referir-se ao Sr. Pimentel Pinto...

Uma voz: - Já ha muitos annos que o Ministerio é d'elle e por isso não admira que assim succedesse. (Riso).

O Orador: - E visto que o Sr. Ministro da Guerra se referiu ao Sr. Pimentel Pinto, darei uma explicação que não precisava, nem tencionava dar.

Sou amigo pessoal do Sr. Pimentel Pinto; devo lhe muitas provas de consideração e estima e, considero-o um dos marechaes do meu partido, e como Ministro da Guerra, o primeiro dos ultimos tempos. Egual a elle, só o Sr. Sebastião Telles. (Riso).

Áparte do Sr. Sinel de Cordes.

O Orador: - Sei muito bem isso.

O que é facto é que o que o Sr. Pimentel Pinto faz, o Sr. Sebastião Telles desfaz, e assim successivamente; se um organiza 4 divisões, outro organiza 6; se um compra cavallos, outro compra arreios; se um compra artilharia de campo, outro compra artilharia montada; se um compra espingardas, outro compra cartuxos.

Tudo isto para quê? Só para se arranjarem pretextos para se esvasiarem os cofres publicos!

Ha apenas uma differença entre S. Exas.; é que o Sr. Pimentel Pinto prestou um serviço valiosissimo ao paiz e s instituições, promovendo a acalmação do exercito, depois do ultimatum inglez.

O Sr. Presidente: - Está esgotada a inscripção. Vae ler-se para ser votada a moção do Sr. Alfredo Brandão.

Foi lida na mesa e rejeitada.

Foi approvada a emenda do Sr. João Augusto Pereira.

Foi tambem lido na mesa o artigo 1.° do projecto e approvado.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se para entrar em discussão o artigo 2.°

Leu se e foi approvado sem discussão.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se para entrarem discussão o projecto n.° 13 que altera a legislação actual sobre promoções e vencimentos dos officiaes do exercito.

Leu-se. É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 13

Senhores. - A vossa commissão de guerra apreciou com detido exame e dedicado estudo as propostas de lei n.ºs 1-E

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10 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

e 10-N, que nos foram respectivamente apresentadas nas sessões de 11 de abril e 21 de agosto ultimo. A primeira destina-se a introduzir, na legislação vigente sobre a promoção dos officiaes do exercito, algumas alterações reclamadas pela experiencia e pela necessidade do serviço. A segunda tem por fim melhorar um pouco os vencimentos dos officiaes do exercito, o augmentar os quadros das armas de artilharia e cavallaria.

Apesar de apresentadas em diferentes epocas e consagradas a assumptos differentes, estes relacionam-se e ligam-se tão intimamente, por dizerem respeito á situação de cada official na sua escala, e a beneficios que, ha muito, a existencia difficil dos que constituem a familia militar vem reclamando, que á vossa commissão de guerra pareceu conveniente englobar as duas propostas referidas num mesmo diploma e resumir num só os pareceres que sobre ellas poderiam convergir.

Emquanto á primeira, a que chamaremos a proposta das promoções, o illustre Ministro da Guerra fundamentou brilhantemente todas as suas disposições no sobrio, claro, e lucido relatorio com que a precedeu.

Nada temos a acrescentar ou a modificar aos argumentos convincentes que ali se apresentam e que plenamente justificam a nova doutrina que se pretende introduzir na nossa legislação militar. Limitar-nos-hemos por isso a dizer com a maior singeleza as razões que nos levaram a fazer algumas modificações na proposta ministerial.

Desde que a vossa commissão de guerra resolveu englobar as propostas n.ºs 1-E e 10-N num só projecto, claro e que tinha de modificar o artigo 1.° da proposta das promoções do forma a comprehender a doutrina da dos vencimentos.

O § l.° d'esse artigo resolveu a commissão eliminá-lo. Bem sabemos que a promoção por diuturnidade ao posto de tenente obriga a reunir todos os subalternos de cada arma num quadro, de que resulta distribuição desigual das duas classes, a dos tenentes e a dos alferes, pelos differentes corpos. Mas o posto de alteres é ainda na realidade como de aprendizagem da classe dos officiaes do exercito, como que uma especie de tirocinio para no futuro só poderem assumir maiores responsabilidades, e d'este modo justo é que a permanencia nesse posto seja igual para todos da mesma arma.

Com essas ideias concordou o Governo o tanto que o illustre Ministro da Guerra, na sua proposta sobre vencimentos, em rada beneficia a classe dos alferes, o que seria inadmissivel se se obtivesse o principio da diuturnidade, e o que confirma o pensamento de que a permanencia naquelle posto só se deve considerar transitóoia e de igual duração para os officiaes de cada arma.

Uma outra modificação importante introduziu a commissão na proposta a que nos estamos referindo. Foi a eliminação do § 6.° do artigo 1.°, que modificava a legislação actual a respeito dos limites de idade. Não ha duvida que a divisão dos limites de idade como a proposta a estabelecia era fundada em principios racionaes e logicos. Mas esta parte da legislação militar é de sua natureza muito delicada para dever ser alterada, embora ligeiramente, sem que razões muito graves e ponderosas a isso obriguem os poderes publicos. Essas razões não existem, porque os principios que entre nós vigoram acêrca de limites de idade teem sido adoptados e executados sem maiores difficuldades e estão por assim dizer já consagrados pela pratica. Nestes termos parece-nos mais conveniente, para não provocar sobresaltos e inquietações que não seriam compensados pelas vantagens immediatas da modificação proposta, manter os limites de idade, para se passar á situação de reforma, já fixados na nossa legislação.

No § 9.° introduzimos leves alterações. A proposta das promoções foi apresentada meses antes de se formular a dos vencimentos. Por isso naquelle se estabeleciam pequenos beneficios a favor da situação dos officiaes de vida mais difficil, como são os das classes dos capitães e tenentes. Mas sujeita á nossa apreciação a segunda proposta, que acode com muito mais largueza e mais amplo espirito de equidade ás necessidades estabelecidas pelos factos, claro é que se tornavam desnecessarias, por constituirem uma repetição de remedio para o mesmo mal, as disposições primeiro propostas para se melhorar a situação economica dos capitães e tenentes.

No § 11.º tambem a commissão entendeu dever eliminar os periodos relativos ao corpo, dos almoxarifes de engenharia e artilharia, ao dos almoxarifes de saude e ao quadro do corpo dos medicos militares, porque, mantendo-se o principio da diuturnidade para a promoção ao posto de tenente, as disposições ali contidas ficavam sem ter razão de ser.

A proposta relativa aos vencimentos dos officiaes está justificada da maneira mais completa no respectivo relatorio. E era até escusada semelhante justificação, de tal modo são conhecidas as difficeis e amarguradas condições da existencia da grande maioria dos officiacs do exercito. Os vencimentos estipulados pelas tarifas de 22 de agosto de 1887, todos os consideraram já então como deficientes em vista da carestia de vida em Portugal e da dignidade que os officiaes do exercito precisam manter, o que os obriga a despesas mais exageradas do que as da maioria dos restantes funccionarios do Estado. Os legisladores d'aquella epoca tiveram porem de se circumscrever ao que comportavam as forças do Thesouro e d'ahi o não poderem fazer a obra completa de justiça, que a sua consciencia decerto reclamava.

De então para cá tudo tem encarecido entre nós, em proporções superiores ás da maior parte das nações do mundo. Manter por mais tempo as tarifas de 1887 seria persistir-se numa iniquidade, contraria até ao estimulo e ao amor que os membros do exercito devem ter pela sua nobre profissão. Importam as providencias propostas num acrescimo de despesa, que está rigorosamente calculado no relatorio da proposta de lei e que ascende a 160:752$000 réis.

Mas nesse mesmo relatorio se demonstra que o augmento das despesas do orçamento do Ministerio da Guerra ficará muito inferior a esta quantia, visto o Governo ter proposto uma nova organização do exercito, que já mereceu o voto da Camara dos Deputados, pela qual se obtem uma reducção de despesas, que não ficará inferior a 100:000$000 réis, e a modificação das incluidas na proposta das promoções produzir tambem valiosa diminuição de despesa.

As modificações propostas no quadro das armas de artilheria e cavallaria justificam-se pelas necessidades, de serviço d'aquellas armas e para se combater a perturbação que se dá no quadro dos capitães das mesmas armas pela suppressão da promoção pelo quinto.

E expostas assim com a maior singeleza as ideias porque se guiou a vossa commissão de guerra, para introduzir as modificações que introduziu nas propostas que apreciou, temos a honra de vos propor, de acordo com o Governo, o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Na legislação em vigor sobre a promoção e vencimento dos officiaes do exercito, e sobre os quadros das armas de artilharia e de cavallaria, serão feitas as seguintes alterações:

1.° Reserva é a situação que comprehende os officiaes directamente nomeados para a reserva do exercito, e os que, tendo pedido a demissão, ficam, com o mesmo posto, obrigados ao serviço da reserva, ate completarem o tempo de serviço a que seriam obrigados como praças do pret, e, depois de o completarem, até pedir a demissão do official de reserva.

2.° Reforma é a situação que comprehende todos os officiacs eliminados dos quadros do exercito activo: por attingirem o limite da idade; desistirem ou não satisfazerem

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ás provas especiaes de aptidão para o posto de major ou de general de brigada; terem sido julgados definitivamente incapazes de todo o serviço ou do serviço activo por falta de aptidão physica ou capacidade moral, com exclusão dos separados do serviço.

Os officiaes reformados, excepto quando o tenham sido por falta de capacidade moral, ficam obrigados ao serviço das reservas, até serem julgados incapazes d'este serviço por uma junta militar de saude.

3.° O limite de idade para a admissão no posto de alferes é de quarenta e cinco annos.

4.° A promoção a mais dos quadros só será admittida por distincção e nos termos dos artigos 47.°, 48.°, 55.°, 56.º e 70.° da carta do lei de 12 de junho de 1901.

5.° A exigencia dos officiaes assistirem ou tomarem parte nos trabalhos das escolas praticas das differentes armas, como condição para a promoção, será estabelecida nos regulamentos especiaes d'essas escolas.

6.° As condições para os coroneis ou capitães serem admittidos ás provas especiaes para a promoção aos postos immediatos, serão estabelecidas em decreto especial. É fixado em um anno o tempo de serviço effectivo para o mesmo fim exigido aos capitães, no commando de uma companhia, esquadrão ou bateria.

7.° As vantagens de capitão de l.ª classe serão as da actual legislação e só serão concedidas aos que contem dez annos de bom e effectivo serviço neste posto.

8.° As vacaturas de alferes nas armas de cavallaria e de infantaria serão preenchidas: dois terços pelos aspirantes a official e um terço pelos sargentos ajudantes, pela ordem de antiguidade no posto de primeiro sargento, quando possuam a instrucção estabelecida nas escolas para praças de pret e satisfaçam ás demais condições de promoção.

9.° As vacaturas de alferes almoxarifes de engenharia e de artilharia serão providas pelos sargentos ajudantes das mesmas armas, formando uma escala unica por ordem de antiguidade no posto de primeiro sargento, quando possuam a instrucção estabelecida nas escolas para praças de pret e satisfaçam ás demais condições de promoção.

10.° A promoção dos officiaes combatentes e não combatentes, desde o posto de tenente até o ultimo dos seus respectivos quadros, far-se-ha conforme as vacaturas.

A promoção ao posto de general de brigada será regulada pelo estabelecido no artigo 8.° e seus paragrqaphos do decreto com força de lei de 7 de setembro de 1899, sendo promovidos para as vagas que se derem, depois de preenchidos os minimos, os coroneis dos quadros comprehendidos nos respectivos grupos que, sendo os primeiros nos seus quadros, contem maior antiguidade na data do começo do curso ou no posto de tenente, suppondo este adquirido oito annos depois do começo do curso.

A promoção dos coroneis que ascenderam a este posto antes de 7 de setembro de 1899 continuará a regular-se pela legislação actualmente em vigor.

11.° A promoção dos officiaes na situação de addidos será regulada a par dos immediatamente mais modernos dos seus respectivos quadros, quando satisfaçam a todas as condições exigidas para a promoção, nos termos dos artigos 197.° a 200.° e respectivos paragraphos, do decreto com força de lei de 7 de setembro de 1899.

12.° A promoção por distincção só pode ser concedida a quem tomar parte effectiva nas operações de campanha; e o Ministro da Guerra só a poderá propor, quando o official não estiver subordinado a autoridade superior que possa fazer a proposta, e terá sempre a data do feito que a motivou, dispensando o tempo de serviço e as provas especiaes exigidas para a promoção.

13.° Quando houver supranumerarios nos quadros de officiaes das differentes armas e serviços, entrará um por cada duas vacaturas, sendo a segunda preenchida por promoção na classe immediatamente inferior.

14.° O disposto no artigo 106.° da carta de lei de 12 de junho de 1901 não se applica aos capellães militares e officiaes de reserva.

15.° Aos officiaes do antigo corpo do estado maior são applicaveis as disposições da presente lei, sendo o tempo de serviço nos corpos substituido por igual tempo de serviço nos quarteis generaes de divisão ou de brigada.

16.° O soldo dos capitães e tenentes de todas as armas e serviço do exercito activo será augmentado de 5$000 réis mensaes.

17.° Será augmentada de 5$000 réis mensaes a gratificação de exercicio dos: tenentes-coroneis, majores e capitães das armas de cavallaria, de infantaria e do corpo de veterinarios militares; tenentes das armas de artilharia, cavallaria, infantaria e dos corpos de medicos e de veterinarios militares.

18.° O quadro da arma de artilharia será augmentado de tres tenentes-coroneis, quatro majores e doze capitães; e diminuido do vinte e dois tenentes.

Os grupos independentes de artilharia serão commandados por tenentes-coroneis ou majores, e os de artilharia de campanha, reunidos em regimentos, por majores.

Os ajudantes dos grupos de artilharia de guarnição serão tenentes.

As baterias de artilharia de campanha terão dois subalternos em tempo de paz e tres em tempo de guerra; e as de artilharia a cavallo tres e quatro nas mesmas condições.

19.° O quadro da arma de cavallaria será augmentado de seis capitães.

20.° Reunir-se-hão em um só diploma as disposições que ficarem vigorando sobre a promoção dos officiaes.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da commissão de guerra, 26 de agosto de 1905. = João Serras Conceição = Antonio José Garcia Guerreiro = José Mathias Nunes = Francisco Miranda da Costa Lobo = Jorge Guedes Gavicho = Julio Dantas = João José Sinel de Cordes = Lourenço Cayolla = Francisco Xavier Corrêa Mendes, relator.

Senhores. - A vossa commissão de fazenda concorda com o parecer da illustre commissão de guerra sobre as propostas de lei n.ºs 1-E e 10-N.

Sala da commissão, em 30 de agosto de 1905. = Marianno de Carvalho = Libanio Antonio Fialho Gomes = José Maria de Oliveira Mattos = Conde de Penha Garcia = José Cabral Correia do Amaral = João Pinto dos 8antos = Ovidio de Alpoim = José Augusto Moreira de Almeida = Gaspar de Queiroz Ribeiro = Joaquim Cerqueira = Antonio Centeno.

N.° 1-E

Senhores. - A presente proposta de lei tem por fim introduzir algumas alterações na legislação vigente sobre a promoção dos officiaes do exercito, todas ellas aconselhadas pela experiencia, pelas necessidades do serviço ou pela economia nas despesas publicas.

Em poucas palavras procuraremos justificar estas alterações.

A promoção por diuturnidade ao posto de tenente foi criada para se fazer a justa comparação entre os officiaes das differentes armas; mas produz aumento de despesa e a desigual distribuição das duas classes de subalternos pelos corpos das differentes armas. Estabelecendo se que a antiguidade de tenente se conte oito annos depois do começo do curso, ou que a antiguidade dos officiaes se conte a partir do começo do curso, obtem-se o mesmo resultado sem incorrer nos inconvenientes apontados. Assim se justifica a alteração contida no n.° 1.° da proposta de lei.

As alterações propostas nos n.ºs 2.° e 3.° estabelecem uma classificação mais precisa de officiaes de reserva e de reformados, terminando com disposições legislativas que

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se prestam a interpretações, que a pratica não tem nem pode confirmar.

A do n.° 4.e alarga o limite de idade para a admissão no posto de alferes até aos quarenta e cinco annos. É o limite que esteve em vigor até 1895, que é favoravel á classe de sargentos, e não ha razão para o não admittir desde que os subalternos podem conservar-se no serviço activo até á idade de sessenta annos. Ha, pelo contrario, toda a vantagem em aproveitar officiaes que começam a carreira com mais idade, porque embora ella seja curta no exercito activo, fornecem bons elementos para os quadros das reservas.

Pelo n.° 5.º a promoção a mais dos quadros só se poderá fazer em tres casos: para os postos de distracção; para os alumnos que terminarem os cursos de engenharia e de artilharia, que serão promovidos a alferes; e para os officiaes que completarem o curso de estado maior, que continuarão com as vantagens que a lei em vigor lhes concede.

A primeira excepção resulta da propria natureza da promoção por distincção. A promoção a alferes nas armas de engenharia e de artilharia é a justa recompensa de um curso mais longo, e, quando isso succede, já os alumnos de cavallaria e de infantaria que começaram o curso ao mesmo tempo, são alferes. A excepção para os officiaes habilitados com o curso de estado maior é da mesma natureza, é a recompensa de um novo curso sobre o da propria arma.

Uma outra consequencia resulta ainda d'esta alteração: é acabar a promoção por equiparação com a arma de infantaria, para um quinto dos quadros de capitão e de coronel das outras armas, mas esta alteração será justificada adeante.

A alteração contida no n.° 6.º é a que parece racional e logica com respeito a limites de idade.

Não discutimos o principio porque elle é geral e existe em todos os exercitos. O que se pode discutir é a sua applicação.

O que a logica diz é que deve haver o mesmo limite para os officiaes nas mesmas condições de serviço. Deve portanto fixar-se um limite para os officiaes que teem de marchar juntos com os soldados e geralmente a pé; outro para os que teem de marchar nos estados maiores dos corpos e a cavallo, e outro para os que marcham com os quarteis generaes e teem a missão, menos activa, mas mais importante, de dirigir.

D'aqui resultam tres limites: para subalternos e capitães, para officiaes superiores e para officiaes generaes.

Aproveitam-se os dois extremos que existem pela legislação em vigor, o medio será o limite actual de coronel augmentado de um anno, e desapparecem dois dos limites existentes.

A alteração indicada pelo n.° 7.° pretende unicamente tornar independente de disposição legislativa os tirocinios nas escolas praticas das differentes armas.

Parece-nos que se tem exagerado a concorrencia a estas escolas, sem as vantagens que em theoria se lhe attribuem e com grande prejuizo para o Thesouro.

Mas ainda que assim não seja, a exigencia d'aquella concorrencia deve variar conforme a organização das escolas, e, sendo esta fixada por meio de regulamentos do poder executivo, não deve aquella exigencia depender de disposição legislativa.

Pelo n.° 8.° se entrega a um decreto especial definir as condições para a admissão ás provas especiaes para a promoção a major e a general de brigada, que pela mesma forma são estabelecidas; e o tirocinio no posto de capitão é reduzido a um anno. É este tempo geralmente considerado como sufficiente, produz menos encargos para os officiaes que não estão arregimentados e não desejam abandonar as commissões que desempenham, e causa menor prejuizo ao serviço d'essas commissões.

Pela lei em vigor, as vantagens de capitão de l.ª classe são tambem concedidas por equiparação com a arma de infantaria; acabando esta equiparação, não tem a concessão razão de existir, e deve ficar reduzida ás condições de serviço effectivo no posto. A demora no posto de tenente que tem logar em algumas armas, e a que deve resultar da promoção por diuturnidade, hoje em vigor, a que no futuro pode dar-se, no posto de alferes, em consequencia, da organização das forças ultramarinas, leva-nos a estabelecer, para estes postos, vantagens analogas ás desde longa data concedidas aos capitães. É o que se pretende conseguir com a alteração n.° 5.° da proposta.

Pelo que se estabelece no n.° 10.º a promoção a alferes nas armas de cavallaria e de infantaria continua a fazer-se nas condições em vigor, mas dependendo de vacaturas para os alumnos que terminaram o curso d'aquellas armas, e accentuando que a promoção dos provenientes da classe de sargentos será regulada pela antiguidade de primeiro-sargento. A primeira modificação acaba com os supranumerarios, a segunda garante o principio que sempre se tem respeitado, mas que não está expresso na lei.

Uma outra alteração ás leis em vigor envolve ainda o n.° 10.°, e vem a ser que os tirocinios nas escolas praticas, em seguida ao curso da respectiva arma, não sejam fixados por lei, mas dependam da organização das escolas. As razões são as mesmas que foram apontadas com referencia ao n.º 7.°

No n.° 11.° applica-se á promoção dos almoxarifes de engenharia e de artilharia a mesma garantia da antiguidade de primeiro sargento, que no numero anterior se deu para as armas de cavallaria e de infantaria.

Alem d'isso, neste quadro, no quadro do corpo de medicos militares e no de almoxarifes do serviço de saude, faz-se a divisão dos subalternos em alferes e tenentes, o que é consequencia de terminar a promoção por diuturnidade a estes postos.

O n.° 12.° acaba com a promoção por diuturnidade ao posto de tenente em todas as armas e serviços, e com a promoção por equiparação aos postos de capitão e coronel no antigo corpo do estado maior o nas armas de engenharia, de artilharia e de cavallaria, e regula a promoção das vagas de general de brigada, que excedem os minimos das differentes armas e do antigo corpo do estado maior.

A primeira modificação relativa á promoção por diuturnidade ao posto de tenente já foi justificada quando nos referimos ao n.° 1.°

A equiparação nos postos de capitão e de coronel, como está estabelecida nas disposições definitivas da lei, tem o inconveniente de ser feita pela promoção de supranumerarios, que aumenta a despesa e não é justificada pelas necessidades do serviço, e do seu beneficio ser destruido pelo aggravamento das desigualdades resultantes da promoção de coronel a general de brigada.

Estes inconvenientes são muito maiores nas disposições transitorias, que vigoram hoje e que ainda devera vigorar por muitos annos. Por ellas a attenuação produz effeitos completamente contrarios. Longe de diminuir as desigualdades de promoção, aggrava as que já existiam.

De tudo isto se conclue que estas disposições não podem subsistir. Em seu logar estabelecemos a promoção a general de brigada nos termos do decreto com força de lei de 7 de setembro de 1899, adoptando precisamente o mesmo principio, que pela legislação em vigor serve para a equiparação nos postos de capitão e coronel.

Uma vez que se adopta o principio novo não podem reviver as discussões antigas. Se esse principio é justo para compensar as desigualdades de promoção nos postos de capitão e coronel, onde a promoção feita pelas regras geraes não aggrava as desigualdades existentes, mais justo deve ser para o preenchimento das vagas fluctuantes de general de brigada, onde a promoção feita pela legislação era vigor aggrava as desigualdades anteriores. Por esta

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SESSÃO N.º 28 DE 8 DE SETEMBRO DE 1905 13

forma vae fazer-se a attenuação no ponto em que havia um aggravamento, e consegue-se um resultado real e persistente.

A attenuação em vigor, nos postos de capitão e de coronel, é destruida na promoção a general, ficando no fim uma attenuação, se não inutil, pelo menos pouco productiva.

Alem do que deixamos indicado, o n.° 12.° ainda estabelece um periodo transitorio para a applicação das novas regras de promoção ao generalato, que por muitos foi julgado necessario, e que pode hoje ser adoptado sem inconvenientes.

Pelo n.° 13.° applica-se aos officiaes em serviço de ministerios estranhos ao da guerra as disposições que pela legislação vigente foram primeiro concedidas durante um largo periodo transitorio, e depois generalizadas aos officiaes em serviço no corpo de engenheiros de obras publicas. Dão garantias mais justas e iguaes, e não difficultam o emprego dos officiaes n'aquellas commissões.

O n.° 14.° precisa melhor as condições da promoção por distincção; o n.° 15.° prevê o caso de existirem supranumerarios, o n.° 16.° esclarece uma confusão da lei vigente, e o n.° 17.° serve apenas para collocar a promoção no antigo corpo do estado maior, em condições analogas ás das differentes armas.

A influencia que esta proposta de lei exerce nas despesas publicas é representada por uma pequena economia, por isso que o aumento resultante do disposto no n.° 9.° é inferior á diminuição proveniente de terminar a promoção por diuturnidade ao posto de tenente e por equiparação aos postos de capitão e de coronel.

Indicado assim rapidamente o alcance das differentes disposições da proposta que submettemos ao vosso esclarecido exame, confiamos que lhe dareis a vossa approvação.

Proposta de lei

Artigo 1.° Na legislação em vigor sobre a promoção dos officiaes do exercito serão feitas as seguintes alterações:

1.° Os tenentes e os alferes das differentes armas e serviços formam quadros distinctos, e cessa a promoção por diuturnidade de serviço áquelles postos.

2.° Reserva é a situação que comprehende os officiaes directamente nomeados para a reserva do exercito, e os que tendo pedido a demissão ficam, com o mesmo posto, obrigados ao serviço da reserva, até completarem o tempo de serviço a que seriam obrigados como praças do pret, e depois de o completarem, até pedira demissão de official de reserva.

3.° Reforma é a situação que comprehende todos os officiaes eliminados dos quadros do exercito activo: por attingirem o limite da idade; desistirem ou não satisfizerem ás provam especiaes de aptidão para o posto de major ou de general de brigada; terem sido julgados definitivamente incapazes do serviço activo por falta de aptidão physica ou capacidade moral, com exclusão dos separados do serviço.

Os officiaes reformados, excepto quando o tenham sido por falta de capacidade moral, ficam obrigados ao serviço das reservas, até serem julgados incapazes deste serviço por uma junta militar de saude.

4.° O limite de idade para a admissão no posto de alferes é de quarenta e cinco annos.

5.° A promoção a mais dos quadros só será admittida por distincção e nos termos dos artigos 47.° e 70.° da carta de lei de 12 de junho de 1901.

6.° Os limites de idade alem dos quaes os officiaes terão passagem á situação de reforma serão:

Officiaes subalternos e capitães, sessenta annos; officiaes superiores, sessenta e cinco annos; officiaes generaes, setenta annos. Exceptuam-se os corones não combatentes, cujo limite de idade será sessenta e sete annos.

.° A exigencia dos officiaes assistirem ou tomarem parte nos trabalhos das escolas praticas das differentes armas como condição para a promoção será estabelecida nos regulamentos especiaes d'essas escolas.

8.° As condições para os coroneis ou capitães serem admittidos ás provas especiaes para a promoção aos postos immediatos serão estabelecidas em decreto especial. É fixado em um anno o tempo de serviço effectivo para o mesmo fim exigido aos capitães, no commando de uma companhia, esquadrão ou bateria.

9.° As vantagens de capitão de l.ª classe consistem na gratificação de um sexto do soldo actual e só serão concedidas aos que contem dez annos de bom e effectivo serviço neste posto. Os tenentes com oito annos de posto e os alferes com seis, nas mesmas condições, serão tambem designados de l.ª classe, tendo direito a uma gratificação do sexto do respectivo soldo.

10.° As vacaturas de alferes nas armas de cavallaria e de infantaria serão preenchidas: dois terços pelos aspirantes a official quando completem, nas escolas praticas das suas armas, os tirocinios a que forem obrigados pelos respectivos regulamentos; e um terço pelos sargentos ajudantes, pela ordem de antiguidade no posto de primeiro sargento, quando possuam a instrucção estabelecida nas escolas para praças de pret e satisfaçam ás demais condições de promoção.

11.° As vacaturas de alferes almoxarifes de engenharia e de artilharia serão providas pelos sargentos ajudantes das mesmas armas, formando uma escala unica por ordem de antiguidade no posto de primeiro sargento, quando possuam a instrucção estabelecida nas escolas para praças de pret e satisfaçam ás demais condições de promoção.

O quadro do corpo de almoxarifes de engenharia e de artilharia será o fixado pelo decreto com força de lei de 7 de setembro de 1899.

O quadro do corpo de almoxarifes de saude será de um capitão, um tenente e um alferes.

No quadro do corpo de medicos militares os subalternos serão divididos em quarenta e quatro tenentes e dez alferes.

12.° A promoção dos officiaes combatentes e não combatentes, desde o posto de alferes até ao ultimo dos seus respectivos quadros, far-se-ha conforme as vacaturas.

A promoção ao posto de general de brigada será regulada pelo estabelecido no artigo 8.° e seus paragraphos do decreto com força de lei de 7 de setembro de 1899, sendo promovidos para as vagas que se derem depois de preenchidos os minimos, os coroneis dos quadros comprehendidos nos respectivos grupos que, sendo os primeiros nos seus quadros, contem maior antiguidade na data do começo do curso ou no posto de tenente, suppondo este adquirido oito annos depois do começo do curso.

A promoção dos coroneis que ascenderam a este posto antes de 7 de setembro de 1899 continua a regular-se pela legislação actualmente em vigor.

13.° A promoção dos officiaes na situação de addidos será regulada a par dos immediatamente mais modernos dos seus respectivos quadros, quando satisfaçam a todas as condições exigidas para a promoção, nos termos dos artigos 197.° a 200.° e respectivos paragraphos, do decreto com força de lei de 7 de setembro de 1899.

14.° A promoção por distincção só pode ser concedida a quem tomar parte effectiva nas operações de campanha; e o Ministro da Guerra só a poderá propor, quando o official não estiver subordinado a autoridade superior que possa fazer a proposta, e terá sempre a data do feito que a motivou, dispensando o tempo de serviço e as provas especiaes exigidas para a promoção.

15.° Quando houver supranumerarios nos quadros de officiaes das differentes armas e serviços, entrará um por cada duas vacaturas, sendo a segunda preenchida por promoção na classe immediatamente inferior.

16.° O disposto no artigo 106.° da carta de lei de 12

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de junho de 1901, não se applica aos capellães militares e officiaes de reserva.

17.° Aos officiaes do antigo corpo do estado maior são applicaveis as disposições da presente lei, sendo o tempo de serviço nos corpos substituido por igual tempo de serviço nos quarteis generaes de divisão ou de brigada.

18.° Reunir-se-hão em só diploma, as disposições que ficarem vigorando sobre a promoção dos officiaes.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria de Estado dos Negocios da Guerra, em 11 de abril de 1905. = Sebastião Custodio de Sousa Telles.

N.° 10-N

Senhores. - A presente proposta de lei tem por fim melhorar um pouco os vencimentos dos officiaes do exercito, e os quadros das armas de artilharia e de cavallaria.

A necessidade da melhoria de vencimento deve ser admittida por uma forma geral, logo que se attenda a que a ultima revisão das tarifas de vencimento dos officiaes data de 22 de agosto de 1887, e que desde então até hoje, se tornaram incomparavelmente mais caros, todos os elementos necessarios á vida.

Estas simples considerações, já teriam levado ha mais tempo a conceder algumas vantagens de vencimento, se não fossem as condições difficeis do thesouro, e não ser facil compensar o augmento de despeza que d'ahi resultaria. Hoje estas circumstancias estão modificadas.

A melhoria financeira do thesouro, embora felizmente accentuada, não consentiria ainda um tal augmento de despeza, e por isso o não proporiamos, se as condições actuaes da nossa organisação militar, não permittissem fazer economias, que o podem compensar.

O problema apresenta-se agora em novos termos. Não se exige ao thesouro o augmento de despeza que resulta d'esta proposta; exige-se apenas que não aproveite da economia que se póde fazer na organisação militar. Em condições sufficientemente desafogadas para admittir esta conclusão, está hoje o thesouro publico.

Ao pequeno augmento de quadros nas armas de artilheria e de cavallaria, se póde applicar iguaes considerações, notando ainda que, se esse augmento for justificado pelas necessidades do serviço, elle se deverá impor independentemente das condições financeiras em que temos fallado.

O que se torna pois necessario é apresentar os calculos do augmento de despeza proveniente d'esta proposta, e da compensação que elle póde ter com a economia resultante de propostas que já vos foram presentes, e de outras medidas que podem ser adoptadas.

Mas antes d'isso tratemos de justificar as disposições da proposta de lei.

Seria muito para desejar que o augmento de vencimento se podesse applicar aos officiaes de todos os postos e de todas as areias e serviços, como o fez em 1887 o governo saido do partido progressista, que então estava á frente dos negocios publicos; mas as condições restrictas que estabelecemos, mostram logo que esta aspiração geral tem de ser posta de parte.

Nào podendo applicar a todos a melhoria, deve então ser áquelles que mais a necessitem, isto é, aos que auferem menores vencimentos, e ainda assim, variando conforme outras condições dignas de ser attendidas.

Para estabelecer esta gradação, assentámos que o augmento de vencimento, seria feito no soldo e na gratificação, e em ambos os casos de 5$000 réis mensaes.

O augmento de soldo applica-se aos capitães e tenentes de todas as armas o serviços, ficando excluidos d'esta vantagem os officiaes de graduação superior a capitão, por isso que tendo maior vencimento podem melhor fazer face ás difficuldades que se apresentam a todos. É a consequencia do que anteriormente estabelecemos como regra geral.

Não estão nas mesmas condições os alferes das differentes armas e serviços, a quem se não augmenta o soldo, mas isto resulta de considerações de outra ordem.
A lei hoje em vigor, concedeu a promoção por diuturnidade aos postos de alferes e de tenente, e com isto uma vantagem muito importante, que tambem se traduz por um augmento da despeza publica.

Em vista d'isto, e ainda pela difficuldade na distribuição dos subalternos, entendemos dever propor-vos, na proposta alterando a lei de promoção, a suppressão d'aquellas vantagens.

Tratando-se agora do augmento de vencimentos, deviam, ser comprehendidos os alferes, e assim passava-se a augmentar o que se tinha diminuido.

Deixando pois estes officiaes na situação estabelecida, pela legislação actualmente em vigor, conservam-se-lhes vantagens importantes que dispensam o augmento de vencimento, tanto mais que esse posto deve ser considerado como de transição, onde se permanece um praso fixo e curto para cada arma. Assiin se justifica o disposto no n.° 1.° da proposta de lei.

O n.° 2.° da proposta trata do augmento de gratificação, applicado ainda por uma forma mais restricta, em vista de considerações de valor analogo ás anteriormente apresentadas.

O augmento de gratificação aproveita tambem aos capitães e tenentes, mas tanto n'um como n'outro posto, se estabelecem varias excepções.

Nos capitães excluem-se:

1.° Os do quadro do serviço do estado maior, das armas de engenheria e de artilheria, e do corpo de medicos-militares, pois que já hoje vencem gratificações superiores aos de cavallaria e de infanteria, e continuam com esta proposta, ainda em condições de superioridade;

2.° Os dos corpos de almoxarifes de engenheria e artilheria, administração e secretariado militar, pois que tiveram com a reforma do exercito de 1899 um importante augmento de gratificação;

3.° Os dos corpos de pharmaceuticos, capellães, picadores e almoxarifes do serviço de saude, porque estão sujeitos a condições muito mais faceis de admissão no exercito do que todos os outros officiaes.

Entendemos que para todos os capitães exceptuados, a melhoria do soldo que resulta do disposto no n.° 1.° da proposta é relativamente sufficiente.

Aos tenentes das differentes armas e serviços, applicam-se as mesmas excepções que fizemos para os capitães, resalvando apenas os tenentes das armas de artilheria e do corpo de medicos militares, a quem tambem se faz o augmento de gratificação, em vista da demora a que são obrigados n'este posto e das gratificações que actualmente lhes estão arbitradas.

Ha ainda uma ultima excepção que foi considerada; é a de applicar aos tenentes coroneis e majores de cavallaria, de infanteria e do corpo de veterinarios militares, o augmento da gratificação, não só porque são os officiaes superiores que percebem menor gratificação, mas tambem para não ficarem com gratificação igual á dos capitães dos mesmos quadros.

O disposto no n.° 3.° da proposta é justificado logo que se attenda a que, o novo material de artilheria de campanha, levando a adoptar baterias a 4 peças em vez de 6, permitte reduzir o numero de subalternos de cada bateria.

Esta diminuição, compensada com a disposição em que se destina o cargo do ajudante só para tenentes, produz uma economia que permitte augmentar 3 tenentes coroneis, 4 majores e 12 capitães, o que é aconselhado pelas necessidades do serviço e pelo atraso da promoção na arma.

O atraso da promoção nas armas differentes da infanteria, já levou a estabelecer na lei em vigor, a promoção por equiparação para um quinto a mais dos quadros de coronel e do capitão.

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Esta disposição produziu o augmento do quadro da arma de artilheria de 3 coroneis e de 17 capitães.

Tendo nós proposto a revogação d'esta disposição, em uma outra proposta de lei, ficariam 20 officiaes supranumerarios que mais desigual ainda tornaria a promoção.

O que se contém no n.° 3.° da presente proposta, é uma medida aconselhada pelas necessidades do serviço da arma, e alem d'isso uma compensação pela, revogação proposta nas alterações sobre a lei de promoção.

Não propomos augmento algum no quadro de coroneis, porque elle não seria justificado pelas necessidades do serviço.

As outras disposições contidas no mesmo numero da proposta, são tão simples que dispensam qualquer justificação.

O disposto no n.° 4.º, tem apenas por fim augmentar 6 capitães no quadro da arma de cavallaria, com o fim de compensar a perturbação proveniente de acabar a promoção para um quinto do quadro de capitães, não havendo alteração no quadro de coroneis pelas mesmas rasões que apontámos, referindo-nos á arma de artilheria.

Temos a observar que a compensação no quadro dos capitães não é completa, por isso que o quinto do quadro é 14; mas parece-nos ainda sufficiente, porque os atrasos não existem já hoje, e aquelles que se poderão dar de futuro, serão de certo compensados pelo augmento proposto.

Vamos agora avaliar o augmento de despeza produzido por esta proposta.

Contando com o numero de officiaes existentes no almanach do exercito ultimamente publicado e referido a 31 de dezembro de 1904, temos 701 capitães e 711 tenentes de todas as armas e serviços. O augmento de 5$000 réis mensaes no soldo, produz um augmento de despeza annual de.......... 84:720$000

O numero dos tenentes-coroneis, majores e capitães das armas de cavallaria, de infanteria e do corpo de veterinarios militares é de 570. O augmento de 5$000 réis mensaes na gratificação, produz o augmento annual de despeza de.................... 34:200$000

O numero de tenentes de artilheria, cavallaria, infanteria e dos corpos de medicos e veterinarios militares é de 573, e o augmento de gratificação produz o augmento annual de despeza de.................... 34:380$000

De onde resulta que o total do augmento de despeza proveniente das alterações propostas no vencimento dos officiaes é de.... 103:300$000

O augmento annual de despeza, proveniente das alterações no quadro da arma do artilheria contidas no n.° 3.° da proposta, é de................................. 2:772$000

e na arma de arma de cavallaria, proveniente do n.° 4.°, é de.................. 4:680$000

Temos, pois, um total do augmento de despeza resultante da presente proposta de lei, de...............................160:752$000

Como anteriormente dissemos, existem economias produzidas por outras propostas de lei, que já tivemos a honra de vos apresentar, que permittem compensar este augmento de despeza.

As alterações á organisação do exercito, feitas pelo projecto que já está em discussão n'esta camara, devem produzir, pelo menos, a economia de 100:000$000 réis.

A suspensão da promoção para um quinto a mais dos quadros de coronel e de capitão, nas armas differentes da infanteria, e que vos foi presente na proposta que introduz algumas modificações na lei de promoção, deve produzir, pelo menos, a economia de 9:000$000 réis.

Com a compensação d'estas duas verbas, o augmento de despeza resultante da presente proposta fica reduzido a 51:000$000 réis.

Não seria um sacrificio exagerado para o thesouro, em vista da justiça e das vantagens da proposta.

Mas, apesar d'isso, este augmento de despeza não se realisará, porque, com a reforma de alguns serviços do ministerio da guerra, e que não dependem de sancção parlamentar se pode fazer economias na importancia d'esta ultima verba.

Para conseguir este resultado, será sufficiente constituir o pessoal permanente das escolas praticas de artilheria, de cavallaria e de infanteria com unidades permanentemente destacadas dos correspondentes corpos do exercito activo. Estas modificações serão realisadas, quando o projecto de reforma do exercito for approvado e posto em execução.

Em vista pois das considerações que deixamos expostas, submettemos ao vosso esclarecido exame esta proposta de lei, esperando que lhe dareis a vossa approvação.

Proposta de lei

Artigo 1.° Na legislação em vigor sobre o vencimento dos officiaes e sobre os quadros das armas de artilheria e de cavallaria, serão feitas as seguintes alterações:

1.° O soldo dos capitães e tenentes de todas as armas e serviços do exercito activo, será augmentado de 5$000 réis mensaes;

2.° Será augmentada de 5$000 réis mensaes a gratificação de exercicio dos: tenentes coroneis, majores e capitães das armas de cavallaria, de infanteria e do corpo de veterinarios militares; tenentes das armas de artilheria, cavallaria, infanteria e dos corpos de medicos e de veterinarios militares;

3.° O quadro da arma de artilheria será augmentado de tres tenentes coroneis, quatro majores e doze capitães; e diminuido de vinte e dois tenentes.

Os grupos independentes de artilheria serão commandados por tenentes coroneis ou majores, e os de artilheria de campanha, reunidos em regimentos, por majores.

Os ajudantes dos grupos de artilheria de guarnição serão tenentes.

As baterias de artilheria de campanha terão dois subalternos em tempo de paz e tres em tempo de guerra; e as de artilheria a cavallo tres e quatro nas mesmas condições.

4.° O quadro da arma de cavallaria será augmentado de seis capitães.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da guerra, 21 de agosto de 1905. = Sebastião Custodio de Sousa Telles.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 1.°

O Sr. Correia Mendes: - Pedi a palavra para uma rectificação. Não assignei o parecer sobre o projecto que vae discutir-se, na qualidade de relator, conforme vem declarado no mesmo parecer, mas sim como simples membro da commissão.

O relator é o Sr. Deputado Lourenço Cayolla.

O Sr. Lourenço Cayolla (relator): - Manda para a mesa a seguinte

Proposta

Em nome da commissão de guerra e de accordo com o Governo, proponho que o n.° 17.° do artigo 1.° do projecto em discussão seja assim redigido:

"l7.° Será augmentada de 5$000 réis mensaes a gratificação do exercicio dos: tenentes-coroneis, majores e capitães das armas de cavallaria e infantaria, do corpo de almoxarifes do serviço do engenharia e artilharia e dos corpos de officiaes não combatentes do exercito, excep-

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tuando o corpo de medicos militares; tenentes das armas de artilharia, cavallaria, infantaria e de todos os corpos de officiaes não combatentes do exercito.

Sala das sessões da Camara dos Deputados, 8 de setembro de 1905. = Lourenço Cayolla".

Ficou em discussão com o projecto.

O Sr. Rodrigues Ribeiro: - Ao iniciar a discussão do projecto de lei n.° 13, propondo-me apreciar algumas das suas disposições, começarei, Sr. Presidente, por tomar em consideração as emendas, sobre o augmento de vencimentos, que acabam de ser enviadas para a mesa ainda antes do assumpto ser debatido e que são significativas do criterio e ponderação que presidiu á respectiva proposta de lei.

Sr. Presidente: o adiamento dos trabalhos parlamentares por tres meses, se não tornou effectivos os fins a que o Governo se propunha, na acalmação dos animos excitados por parte dos amigos da situação divergentes na proposta dos tabacos e na realização de emendas á mesma proposta, solicitadas e impostas pela opinião, produziu todavia um outro effeito, que eu não posso deixar de registar.

Refiro-me, Sr. Presidente, ás alterações, de certo aconselhadas pelo nobre Ministro e adoptadas pela illustre commissão de guerra, introduzidas na proposta de lei sobre promoções, da qual derivou o projecto ao presente em discussão.

Neste projecto foram englobadas as disposições relativas aos vencimentos dos officiaes do exercito e ao augmento dos quadros dos officiaes das armas de artilharia e cavallaria, que constavam de uma outra proposta de lei recentemente apresentada nesta casa do Parlamento.

Essas alterações, embora melhorassem e tornassem mais viavel a proposta primitiva sobre promoções, estão ainda longe de corresponder ás instantes e repetidas reclamações do exercito e ao beneficio de longa data reconhecido necessario para o bem estar d'aquelles que se devotaram a bem servir o paiz no afervoramento do prestigio das instituições militares; revelam todavia que o illustre Ministro, no intervallo decorrido com o adiamento das sessões parlamentares, sobreesteve no assumpto, reconsiderou, estudou e melhorou a sua obra.

A melhoria verifica-se: na suppressão de algumas disposições que irritavam a opinião, por cortarem pequenos beneficios concedidos pela legislação em vigor, tal era o da, promoção por diuturnidade ao posto de tenente dos alferes das armas de infantaria, cavallaria, artilharia e engenharia; na suppressão das alterações á lei do limite de idade, que a boa prudencia não aconselhava, desde que a sua implantação custou varios attritos, e ao presente é uma lei viavel, sem reclamações attendiveis, nem justificadas, e no supposto adicionamento da melhoria dos vencimentos e dos quadros dos officiacs das armas de artilharia o cavallaria.

ão estas as disposições principaes, que melhoraram o projecto; outras ficaram de pé, contra as quaes se levantam reclamações, e como estão em discussão, a ellas me referirei successiva e gradualmente.

Sr. Presidente: o projecto de lei que está em discussão é muito complexo e attentatorio do que se acha preceituado pelo artigo 122.° do regulamento d'esta casa do Parlamento, que diz: "Os projectos de lei serão divididos em artigos, e estes reduzidos, quanto possivel, a proposições simples e deduzidas por ordem racional".

Pois o illustre Ministro e a commissão de guerra vem submetter á discussão em um projecto unico, e este com um só artigo, alterações radicaes na lei de promoções, e outras relativas aos vencimentos e quadros dos officiaes.

Esta norma é um exclusivo do actual titular da pasta da Guerra, por isso que, em assumpto ainda de maior monta, o da organização do exercito, procedeu da mesma forma.

Referir-me-hei nas minhas considerações ás varias disposições da lei de promoções, vencimentos e quadros dos officiaes, pela forma como estão exaradas no projecto, querendo-me parecer que teria sido mais conveniente para a explanação e discussão do assumpto a sua separação.

Irei mais longe: no meu modo de ver, em logar de emendas e alterações, seria mais proficuo para o bem do exercito e para fomentar o regular funccionamento dos serviços da instituição militar, que o nobre Ministro, pondo em acção as suas notaveis faculdades de intelligencia e trabalho, em logar d'estes retalhos a introduzir na legislação respectiva, apresentasse á Camara projectos completos que regulassem de vez os assumptos referidos, e em que fossem attendidas as justas aspirações dos que se interessam pelo prestigio da instituição militar. (Apoiados).

Não foi esta a orientação seguida pelo nobre Ministro, o que sinceramente deploro.

Evitavam-se por aquella forma deficiencias na lei, que são essenciaes, e ainda se reservam para o poder executivo resolver.

Refiro-me ao disposto pela alteração 6.ª do projecto em discussão : "as condições para os coroneis ou capitães serem admittidos ás provas especiaes para a promoção aos postos immediatos serão estabelecidas em decreto especial".

É certo, Sr. Presidente, que essas provas estão regulamentadas por decreto, e todos sabem os perigos em que incorrem, quando não estejam convenientemente preparados para as satisfazer.

Mas o que todos passam a ignorar, no momento em que seja convertido em lei o actual projecto, são as condições a que devem satisfazer, para serem admittidos a essas provas.

Essas condições ficam na dependencia do arbitrio do illustre Ministro da Guerra; na mesma dependencia fica, portanto, a promoção dos coroneis e dos capitães aos postos immediatos.

O decreto regulamentar das provas pode ser alterado pelo illustre Ministro, é uma faculdade do poder executivo fazer os regulamentos das disposições legislativas; as condições a que os officiaes devem satisfazer para serem admittidos a essas provas são, pela sua natureza, da exclusiva competencia do poder legislativo. Tem sido sempre consideradas essenciaes e parte integrante das leis sobre o assumpto.

Pode no seu criterio o illustre Ministro exigir clausulas ou condições exageradas, que afastem da promoção o maior numero de candidatos, o que seria uma injustiça grave; ou ser tão facil nessas clausulas que facilite o accesso ou promoção aos officiaes que delle se achem privados ou excluidos pela legislação em vigor, o que redundaria em prejuizo manifesto da boa constituição dos respectivos quadros.

Encontrando-se essas condições tão claras, precisas e definidas na legislação em vigor, porque as não mantem o nobre Ministro, ou porque não apresenta á camara a sua substituição para ser apreciada e discutida?

Para que se reserva S. Exa. tornar a promoção dos coroneis e capitães aos postos immediatos dependente do seu arbítrio?

Não se explica o seu modo de proceder em assumpto de tanta responsabilidade.

Aquella disposição a que me venho referindo envolve uma auctorização encapotada, que o illustre Ministro se arroga a si para proceder como julgar mais conveniente.

Representa uma verdadeira invasão do poder executivo nas attribuições do poder legislativo. (Apoiados).

O illustre Ministro, ao proceder por esta forma, de certo não ponderou nas graves responsabilidades em que incorria.

Sr. Presidente: nas considerações que me proponho fazer sobre o assumpto, despir-me-hei de tudo quanto sejam retaliações de ordem politica partidaria, porque entendo e é minha opinião, como já affirmei nesta Camara, que os

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assumptos referentes á instituição militar, pela natureza e constituição intima do exercito e pela nobre e elevada missão que lhe está confiada na defesa do solo da patria e na manutenção da ordem social, não se casam nem se coadunam com os interesses politicos de ordem partidaria: o exercito só tem uma politica; a de bem servir o paiz. (Apoiados).

Um outro motivo se me impõe e aconselha esta orientação : qual é o reconhecimento da minha parte da necessidade de vir a tornar-se effectiva a sequencia logica que deve manter-se na conservação e transformação gradual e successiva das leis referentes á instituição militar; sequencia que tão apregoada tem sido nos ultimos tempos dentro e fora d'esta casa do Parlamento:

r. Presidente: entrando na apreciação do assumpto propriamente dito, começarei por me referir ás primeiras duas alterações constantes do projecto, declarando desde já que ellas merecem a minha approvação.

Estas duas alterações teem por fim definir a situação dos officiaes do exercito, depois de afastados do serviço activo.

Pela legislação em vigor, os officiaes do exercito, quer attingidos pelo limite de idade, quer julgados incapazes do serviço activo, passam para a reserva por cinco annos, ficando durante o mesmo espaço de tempo obrigados ao serviço das reservas.

Decorrido aquelle periodo nesta situação são reformados, ficando desligados de todo o serviço.

O illustre Ministro da Guerra oppõe á fatalidade d'este periodo a opinião de uma junta de saude militar, que decidirá da incapacidade de cada official para todo o serviço e lhe designará o dia em que se torna effectiva a sua completa desligação do mesmo serviço.

Na mesma situação inactiva passam a ser considerados immediatamente todos os officiaes attingidos pelo limite de idade.

Com estas disposições consegue o illustre Ministro fazer um alargamento no numero da officiaes da reserva, isto é dos julgados ainda capazes do serviço moderado; passamos a ter um nucleo importante de officiaes, de que podemos tirar partido, quando se tratar da mobilização do exercito: todavia a legislação respectiva mantem-se em estado embryonario.

Continua a prevalecer o erro de se attender nas sucessivas organizações quasi exclusivamente ao pé de paz do exercito com detrimento do pé de guerra, para que não teem sido previstos nem regularizados os respectivos quadros: a mobilização do exercito não tem sido considerada como era necessario e conveniente.

Ao illustre Ministro que actualmente sobraça a pasta da Guerra cabe a honra de ter dado o primeiro passo na preparação para a mobilização, decretando e pondo em pratica a instrucção da 2.ª reserva com excellente resultado. A isso se limitaram, porem, praticamente as suas preoccupações na preparação para a guerra.

Quando se tratar da mobilização, obrigada em todos os paizes a um prazo muito curto, será então que se hão de constituir os quadros dos officiaes das unidades da reserva, sendo de prever que por essa occasião já a maior parte d'esses officiaes teem perdido os habitos militares pela inercia e pela ociosidade, a que são votados. (Apoiados).

Impõe-se a necessidade de proceder á constituição dos respectivos quadros e á designação dos serviços a desempenhar pelos officiaes nesta situação. Não cabe neste logar fazer a designação d'esses serviços, todavia não passarei em claro a instrucção da segunda reserva, que até ao presente tem sido ministrada pelos officiaes dos quadros activos com prejuizo da instrucção d'estas unidades, quando podia ser proficuamente commettida aos officiaes da reserva.

O agrupamento d'estes officiaes nos districtos de recrutamento poderá até certo ponto servir de base para a constituição d'esses quadros.

No estado actual da legislação sobre este assumpto quasi se confundem as duas situações de reserva e reforma dos officiaes.

A terceira alteração do projecto envolvo um alargamento no limite de idade para a admissão ao posto de alferes até aos quarenta e cinco annos. Quer-me parecer que o illustre Ministro teve a intenção de visar com esta nova disposição os sargentos do exercito.

Neste sentido estou em completo accordo com S. Exa.

Em todos os paizes dotados de exercitos regularmente constituidos tem sido objecto de aturado estudo o recrutamento dos sargentos ou officiaes inferiores dos corpos, porque em todos elles se nota quanto vão rareando as praças com aptidão para o desempenho d'aquelles postos.

Em regra a maior parte das praças de pret que conseguem realizar a respectiva habilitação, apenas terminam a obrigação do serviço desistem da readmissão e procuram outras collocações, que lhe garantam melhor a subsistencia e o futuro.

O que succede nos outros paizes verifica-se em larga escala no nosso.

O recurso á melhoria de vencimento, limitado entre nós ás diminutas gratificações de readmissão, não tem produzido effeito: o recurso á garantia de emprego civil, passado um certo numero de readmissões, tem-se tornado inefficaz.

A lei que regula os empregos para os sargentos nem sempre tem dado na pratica os resultados a que visava.

Para os que persistem no serviço convem assegurar-lhes a garantia de que, em futuro mais ou menos proximo, podem ascender ao posto e grau de official. A disposição, quando em muitos casos se não torne effectiva, é pelo menos um estimulo, uma esperança.

Merece a minha sincera approvação.

No exercito sempre houve e continua existindo um certo numero de officiaes d'aquella procedencia que, com a instrucção ministrada nas respectivas escolas de sargentos, com a pratica do serviço e convivio com camaradas illustrados, se tornaram distinctos.

Já passou a epoca em que as habilitações literarias para sargentos se restringiam a saber ler e escrever. Os progressos da instrucção no exercito teem alastrado por uma forma superior, e d'elles teem partilhado em larga escala as praças graduadas.

O aproveitamento dos officiaes d'esta procedencia pode tornar-se muito proficuo na constituição dos nossos quadros de reserva.

Entretanto sobre esta alteração impõe-se-me fazer uma emenda, restringindo-a aos sargentos, para obviar aos abusos que podem resultar d'esta disposição combinada com as disposições de um outro projecto de lei votado na sessão de hoje, mandando contar aos officiaes, para effeitos de reforma, todo o serviço prestado em empregos civis com direito a aposentação.

Ficará por esta forma taxativa esta disposição para os sargentos, devendo subentender-se que para os outros candidatos a officiaes do exercito, vigora a legislação anterior.

Para esses o limite maximo de idade para a admissão ao posto de alferes é de trinta e cinco annos.

Passemos agora, Sr. Presidente, a examinar o preceituado pela quarta alteração do projecto.

Por esta alteração o illustre Ministro mantem as disposições da lei em vigor relativas á promoção a alferes nas differentes armas, á promoção por diuturnidade ao posto de tenente, e as que regulam a situação nos respectivos quadros dos tenentes das mesmas armas que se habilitaram com o curso do estado maior.

Annulla todavia um artigo da citada lei, relativo á promoção por equiparação com a arma de infantaria para um

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quinto dos quadros de capitão e coronel das outras armas.

Esta disposição é sem duvida uma das de maior importancia do projecto, pelos reparos que determina com os seus effeitos; por isso a ella me referirei um pouco mais detidamente.

Sr. Presidente: o principio vital, que em todos os tempos tem presidido á constituição intima dos exercitos regularmente formados, reside na disciplina militar.

"Sem disciplina, já dizia Morand, não ha exercito possivel. Os homens reunidos sob esta denominação, quando não tenham sido educados sob os principios da disciplina, não constituem senão um bando de animaes selvagens".

A disciplina militar é o laço obrigado entre a lei, de que deriva, e a organização militar, a que preside.

Sómente a disciplina torna effectivos os esforços do conjunto, baseada no principio de que para todo o inferior o "chefe é a lei"; acostuma o subordinado á obediencia passiva para com o superior, determina as bases da hierarchia, isto é, a successão dos poderes desde o soldado até ao Ministro da Guerra, e sobe até ao proprio Chefe do Estado.

É o primeiro elemento da força militar, porque sem disciplina não ha organização possivel.

Nesta ordem de ideias facil se torna reconhecer com quanta circumspecção, prudencia e correcção tem de se proceder na confecção das leis reguladoras dos assumptos militares, e mormente na das promoções destinadas a fomentar a emulação nas fileiras do exercito e a remunerar serviços prestados, para que nellas não seja inserida qualquer disposição que, quando não seja attentatoria da disciplina, possa, todavia, concorrer para o seu afrouxamento.

As disposições do projecto em discussão enfermam em alguns pontos d'essa doença, como provarei na devida altura.

sempre assumpto melindroso a mudança periodica na legislação militar, como vem succedendo entre nós nos ultimos annos; em regra redunda sempre em prejuizo da disciplina.

Justo se torna aspirar a que quaesquer alterações a introduzir na legislação não sejam determinantes do mesmo mal.

No caso em discussão, alterações á lei de promoções, tenho de me referir ás disposições em vigor, causas que as determinaram e seus effeitos, para poder apreciar o criterio com que em assumpto tão melindroso procedeu o nobre Ministro da Guerra, desinteressando-se ao mesmo tempo da disciplina militar, que lhe incumbe fomentar.

Sr. Presidente: para a irregular constituição dos quadros dos officiaes do nosso exercito e para as suas immediatas consequencias tem convergido, durante os ultimos annos, a attenção dos illustres officiaes que teem gerido a pasta da Guerra.

A varios estudos se tem procedido com o fim de corrigir essas consequencias; mas nem todos se teem levado á pratica por terem sido julgados inefficazes.

m proveito da disciplina muito conviria que o accesso dos officiaes das differentes armas se fizesse ao par com o fim de manter a situação relativa de todos na escala hierarchica: a isso teem obstado varias causas, sendo a principal a constituição pouco harmonica dos quadros, em que nunca foi possivel inserir a mesma relação para cada arma, entre o numero dos officiaes superiores e o dos outros postos.

Persistindo, em todas as transformações por que tem passado a constituição organica do nosso exercito, a mesma desharmonia, por circumstancias exclusivamente economicas, recorreu-se com a legislação actualmente em vigor, e que se pretende emendar, ao emprego de providencias que, quando não debellassem, ao menos attenuassem essas desigualdades que ora se pronunciavam mais numa arma, para, a breve trecho, prevalecer noutra, sendo a arma de artilharia a que nos ultimos tempos mais prejudicada se encontra. (Apoiados).

As providencias a que me refiro estão consignadas nas disposições em vigor em dois principios novos, cujos effeitos se não podem ainda apreciar devidamente, por isso que eram de applicação recente: data a sua applicação de 1901, prazo relativamente muito curto, que tem decorrido de então até ao presente para o fim que se tem em vista.

Esses principios consistiam: na promoção por diuturnidade ao posto de tenente dos alferes de todas as armas, para se poder fazer a justa comparação dos officiaes das mesmas; e na promoção por equiparação com a arma de infantaria para um quinto dos quadros de capitão e coronel das outras armas.

Estes principios estavam conjugados para o mesmo fim: attenuar a desigualdade de accesso entre as differentes armas com o fim salutar e previdente de fomentar a disciplina, mantendo, quanto possivel, a situação relativa dos officiaes dos differentes quadros pela sua ordem hierarchica, tão necessaria para o afervoramento da mesma disciplina.

Propunham-se estes dois principios realizar uma aspiração que corre risco de sossobrar pelas perturbações constantes a que está submettida a nossa legislação militar.

Nada ha mais perturbador da disciplina do que o caso anormal, frequentemente repetido, de na concorrencia de serviço por officiaes das differentes armas o subordinado de hoje converter-se amanhã em chefe, para em curto prazo voltar novamente a subordinado, como permittia a legislação em vigor, antes de nella serem inseridos os dois principios referidos.

O primeiro principio, o da promoção por diuturnidade ao posto de tenente, tão justo é que, tendo sido repudiado pelo illustre Ministro da Guerra na sua proposta de lei, com o fundamento de produzir augmento de despesa e desigual distribuição das duas classes de subalternos pelos corpos, a breve trecho o mesmo Ministro o perfilha e mantem nos termos da legislação em vigor.

Os argumentos apresentados pelo illustre Ministro contra aquelle principio careciam de fundamento: o augmento de despesa era diminuto, em presença dos effeitos salutares a que era destinado; o serviço dos subalternos, tenentes e alferes, encontra-se regulamentado por igual em cada arma.

O posto de alferes de ha muito está considerado como posto de transição destinado a aprendizagem para o exercicio das funcções de subalterno.

Não partillhou da mesma sorte o principio da promoção por equiparação. Estou certo, Sr. Presidente, de que, só decorresse mais algum tempo, se o nobre Ministro estudasse bem o assumpto e ponderasse reflectidamente o principio e as suas consequencias immediatas, sobreestaria no seu proposito revelado pela proposta de lei e confirmado no projecto em discussão (Apoiados). Este principio manifestamente attenuava a desigualdade de accesso em larga escala.

Repudiado elle e expurgado da legislação sobre promoções, aquella desigualdade ha de affirmar-se em maior escala em futuro mais ou menos proximo.

Serão então improficuos ou muito difficeis na pratica quaesquer outros meios que tentem empregar-se para o mesmo fim.

A existencia de supranumerarios, e o augmento de despesa, que não é justificada pelas necessidades do serviço, são os dois argumentos com que o illustre Ministro se propõe justificar a suppressão da promoção por equiparação.

É certo, Sr. Presidente, que o quadro de cada posto e em cada arma não deve conter senão os officiaes em nu-

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mero justificado pelas necessidades do serviço, mas tambem é certo que a somma dos coroneis e tenentes-coroneis em cada arma, assim como a dos capitães e tenentes, se mantinha constante pela disposição em vigor.

Augmentava pela promoção por equiparação um certo numero de coroneis, ou de capitães, diminuia-se igual numero de tenentes-coroneis ou tenentes.

E o illustre Ministro não me pode contestar que nas differentes armas não haja commissões e serviços que indifferentemente possam ser desempenhados por coroneis ou tenentes-coroneis e outros por capitães ou tenentes.

O augmento de despesa traduz-se pela differença entre o vencimento dos postos de coronel e tenente-coronel multiplicado pelo numero de coroneis supranumerarios prqmovidos, o pela differença entre o vencimento de capitão e e tenente multiplicado pelo numero de capitães supranumerarios promovidos.

Esse numero, tanto de coroneis como de capitães supranumerarios, era limitado pelo quinto dos respectivos quadros, podia ser inferior ao quinto e podia mesmo ser nullo. O augmento de despesa não era excessivo, e tinha a vantagem de ser variavel com tendencia para a annullação quando os quadros se approximassem.

A correcção que se conseguia pelo emprego d'este principio era já notavel e impunha-se para ser conservada. (Apoiados).

Reconheço porém que corre risco de sossobrar pela enfermidade que vem affectando a nossa legislação militar nos ultimos nnnos.

Estabelecem-se disposições novas reguladoras de qualquer assumpto ou serviço; ainda não são conhecidas nos seus effeitos, veem logo a seguir disposições novissimas, que as alteram ou supprimem com grave prejuizo da instituição militar e do regular funccionamento d'esta machina de rodas complicadas que se chama exercito.

As duas disposições a que me venho referindo, uma conservada, outra repudiada pelo nobre Ministro da Guerra, quando fossem conservadas na pratica por maior espaço de tempo, poderiam dar orientação para uma lei geral de quadros, em que fossem previstas todas as deficiencias e irregularidades de que estão affectadas.

Supprimindo o principio da promoção por equiparação, vejamos agora como procedeu o illustre Ministro para o compensar, e evitar perturbações e descontentamentos nos officiaes das armas de artilharia e cavallaria, esbulhados de uma vantagem concedida pela lei em vigor.

Reconhece-se que o illustre Ministro tinha o proposito e a intenção de supprimir de vez a disposição da lei relativa, á promoção por equiparação.

Compenetrado porém, do atraso em que se encontra a promoção dos officiaes de artilharia nos differentes postos, a despeito mesmo da promoção por equiparação já feita no maximo, resolveu fazer um augmento no quadro dos officiaes d'aquella arma.

Na sua louvavel orientação do não aggravar despesas, limitou-se a dar áquella arma um augmento sensivelmente igual ao que já usufruia pela lei dos quintos.

Aqui procedeu como se diz vulgarmente: deu com a mão esquerda o que já lhe havia tirado com a direita.

Pela lei em vigor a arma de artilharia podia ter tres coroneis supranumerarios, diminuindo-se igual numero de tenentes-coroneis e dezasete capitães supranumerarios, sendo diminuido igual numero de tenentes. Isto era no maximo da applicação da lei.

Pelo projecto em discussão a mesma arma passa a ser augmentada no seu quadro com tres tenentes-coroneis, quatro majores e dezaseis capitães, sendo eliminados vinte e dois tenentes.

É caso para perguntar ao illustre Ministro onde se verifica a economia apregoada pelo relatorio que precede a sua proposta de lei?

Devo porém accrescentar, Sr. Presidente, para elucidação da Camara, que neste caso o illustre Ministro procedeu por forma tal que; preenchidas as vagas de tenente-coronel, consequencia da lei em vigor, o augmento feito é de tal ordem que dá o seguinte resultado: ficam supranumerarios tres coroneis e são promovidos tres tenentes a capitães. É o que se verifica nos dois postos extremos de official, pelos quaes, em regra, se costuma afferir o movimento com relação ás outras armas.

Quer-me parecer, Sr. Presidente, que a arma não melhorou e o quadro fica estacionario por muito tempo com a existencia dos supranumerarios no posto superior.

O Sr. Presidente: - Deu a hora de se passar á segunda parte da ordem do dia.

O Orador: - Vou terminar por hoje as minhas considerações.

Como já disse, a arma de artilharia é, sem duvida, no presente a mais atrasada no accesso, assim como a que maior alargamento tem soffrido nos seus serviços technicos e no desenvolvimento das obras de defesa de Lisboa e seu porto.

O campo entrincheirado de Lisboa tem ao presente proporções vastas e uma guarnição irrisoria para o seu largo desenvolvimento, obras concluidas, e missão a desempenhar.

Impõe-se proceder a um alargamento das unidades destinadas á sua guarnição e consequentemente do respectivo quadro dos officiaes.

O Sr. Ministro da Guerra compenetrando-se das circumstancias actuaes da mesma arma, poderia perfeitamente proceder a esse alargamento sem que ninguem pudesse contestar-lhe esse direito e opportunidade. (Apoiados).

A despeito de todos estes progressos materiaes o serviço continua a ser desempenhado polo mesmo numero de officiaes que havia anteriormente á sua existencia.

Referir-me-hei ainda a uma outra circumstancia.

A mobilização da arma de artilharia, não se pode tornar effectiva com o concurso de officiaes das outras armas.

São tantos e tão vastos os conhecimentos technicos exigidos para os officiaes d'esta arma, e tão grandes as suas responsabilidadcs no emprego do armamento moderno, que se não pode confiar este serviço especial a officiaes de emprestimo: era esta mais uma razão que se impunha para a melhoria do respectivo quadro.

O Sr. Presidente: - Previno o Sr. Deputado que vae passar-se á segunda parte da ordem do dia.

O Orador: - Vou terminar as minhas considerações, não me dispensando de voltar opportunamente ao assumpto.

A arma de cavallaria, reduzida a um augmento de seis capitães, teve ainda menos sorte que a do artilharia.

Fica dotada com tres coroneis supranumerarios, que lhe hão de tornar estacionario o accesso por largo período.

Nenhuma das duas armas consideradas pelo illustre Ministro tem motivo para só rejubilar com as liberalidades de S. Exa.

No meu modo de ver só havia um caminho a seguir para resolver o problema da actualidade, a questão do quadro da artilharia. Consistia em manter a promoção por equiparação, como está preceituado na legislação em vigor, e dotar a arma de artilharia com um augmento no quadro dos seus officiaes, conforme as necessidades do serviço e as cirçumstancias do Thesouro o permitissem.(Apoiados).

Vou terminar, visto que se pretende entrar na segunda parte da ordem do dia.

Não posso porém fazê-lo sem me referir, embora de passagem, á questão dos vencimentos.

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O illustre Ministro, propondo-se a melhorar os vencimentos dos officiaes, usou de um tal criterio na sua proposta que deu em resultado desigualdades que irritam e exclusões que se impõem a reparo.

D'essas exclusões algumas já foram previstas na sessão de hoje com propostas de emenda da iniciativa de alguns illustres collegas da maioria parlamentar, o que não abona muito o estudo que o illustre Ministro fez do assumpto.

Bom será que sejam tomadas em consideração para restringir o numero dos descontentes.

Melhor fôra ter sido mais previdente e equitativo para não errar em assumpto tão melindroso.

Foram uns attendidos, outros esquecidos, e as necessidades da vida fazem-se sentir por uma forma geral.

Entre as varias auctorizações que constituiam a carga da barcaça ministerial da Fazenda em imminente perigo de naufragio figurava uma que se propunha eliminar ou pelo menos reduzir o imposto de rendimento proveniente das leis de salvação publica. Seria preferivel ter começado por ahi, tornando effectiva aquella disposição, que era de applicação mais geral e portanto mais equitativa, para em seguida proceder a uma revisão geral da tarifa dos vencimentos dos officiaes e prover de remedio os que d'elle carecessem.

Appello para o illustre Ministro para que se imponha em salvar do naufragio previsto e inevitavel aquella medida providencial.

Tenho dito. (Vozes: - Muito bem).

(O orador foi muito cumprimentado pelos Srs. Deputados da esquerda da Camara).

O Sr. Ministro da Guerra (Sebastião Telles): - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - São horas de passar-se á segunda parte da ordem do dia. Eu reservo a V. Exa. a palavra para a sessão seguinte.

SEGUNDA PARTE DA ORDEM DO DIA

(Continuação da interpellação do Sr. João Pinto dos Santos)

O Sr. Presidente: - Continua o Sr. Carlos Ferreira com a palavra que lhe ficou reservada da sessão anterior. S. Exa. tem ainda 20 minutos para falar.

O Sr. Carlos Ferreira: - Nos 20 minutos de que dispõe, vae tentar concluir as suas considerações, em resposta ao discurso do illustre Deputado o Sr. Queiroz Ribeiro, rebatendo-o argumento por argumento.

S. Exa., no seu inflammado discurso contra o Governo, tratou de varias cousas. Na primeira parte referiu-se aos celebres telegrammas trocados entre o Governo e o nosso representante em Paris.

Essa questão poderia considerar-se esgotada depois das declarações feitas, tão categoricamente, pelo illustre Presidente do Conselho, em resposta ao Sr. João Pinto dos Santos. E, nesta altura, seja-lhe permittido abrir um parenthesis. As dissenções politicas não fazem esquecer a amizade pessoal; por isso, em seu nome e, pode dizer, no de todos os seus amigos politicos (Apoiados); sente profundamente a ausencia de S. Exa., por um acontecimento tão doloroso, e sente-a tanto mais quanto, no decorrer das suas considerações, aproveitaria o ensejo de se referir às considerações de S. Exa.

Na questão dos telegrammas trocados entre o Governo e o nosso representante em Paris, bem andou o Governo.

Bom foi que um illustre Par do Reino pedisse copias d'esses telegrammas, e ainda bem que o Governo lhas deu, - e podia deixar de lhas dar, - porque no estado actual d'esta questão dos tabacos todos os documentos devem ser publicados, absolutamente todos. O Governo e todos os seus partidarios querem luz e luz bastante, luz viva, luz intensa, que penetre até ao intimo d'esta questão. E nesse intuito bem andou a Camara, permittindo que todos esses documentos fossem publicados no Diario do Governo.

É com estas publicações, é com esta luz, que o Governo responde ás investidas ferozes da opposição.

Que significava esse telegrarnma do Governo?

Estava no principio das operações. Para procurar saber se as nossas obrigações teriam cotação no mercado de Paris, fosse qual fosse a companhia arrendataria, enviou elle um telegramma ao Sr. Thomás Rosa, Ministro de Portugal em Paris, dizendo-lhe que, secretamente, se informasse sobre aquelle ponto.

Mal procederia o Sr. Presidente, do Conselho, mal procederia todo o Governo, porque o telegramma é da responsabilidade de todo o Ministerio, como o declarou o Sr. José Luciano de Castro, mal andaria se procedesse de outra forma.

O nosso Ministro em Paris investigou e respondeu segundo o seu dever.

Da propria redacção do telegramma enviado pelo Governo tira-se a conclusão de que elle queria desligar-se dos meandros d'esta questão e subtrahir-se a pressões de qualquer natureza.

Será isto, porventura, proteger qualquer companhia?

Todo o mal d'este Governo, toda a guerra que é movida, provém da nobre altivez e independencia que elle desde o principio assumiu.

Qual foi a resposta do Sr. Thomás Rosa?

S. Exa. disse, como opinião sua, absolutamente particular, e com a qual o Governo não tem nada, que lhe parecia que uma das condições necessarias para alcançar a cotação das obrigações dos tabacos na Bolsa de Paris seria a liquidação da questão Reilhac.

O Governo, repete, não tem nenhuma responsabilidade nesta resposta.

Tem elle dito que durante o curso das negociações nem uma só palavra se trocou a respeito da questão Reilhac. Effectivamente assim é, e neste telegramma não vê elle, orador, senão a confirmação d'aquella affirmação.

Numa das passagens mais inflammadas do seu discurso, disse o Sr. Queiroz Ribeiro que o Sr. Presidente do Conselho se sobrepunha a todos os seus collegas e que recebia, em sua casa, os negociadores do contrato dos tabacos.

Contesta, elle, orador, estas affirmações. O Sr. Presidente do Conselho, como chefe do Governo, numa questão d'esta ordem e de accordo com todos os seus collegas, tinha de tomar uma altitude energica e de intervir nella.

Mas S. Exa. não chamou a si a questão, tanto como se diz; a todas as reuniões nunca deixou de assistir o Sr. Ministro da Fazenda.

Na segunda parte da sua oração referiu-se o Sr. Queiroz Ribeiro á consulta da Procuradoria Geral da Corôa.

Não é novidade para ninguem que se levantou, na imprensa, e até no seio da Companhia dos Phosphoros, uma discussão acalorada, sobre a competencia, ou não competencia juridica da mesma companhia, em concorrer ao exclusivo dos tabacos.

Havia quem dissesse que aquella companhia, pelos seus estatutos e lei vigente, só podia concorrer ao exclusivo d'aquillo de que já tem contrato, o exclusivo dos phosphoros.

Ora o Governo, tendo duvidas sobre este ponto, interrogou o director geral da thesouraria do Ministerio da Fazenda; a resposta d'este funccionario foi desfavoravel á Companhia dos Phosphoros. O Governo então consultou a Procuradoria Geral da Corôa.

Nestes termos, se o Governo tivesse como filha dilecta a Companhia dos Tabacos, teria consultado a Procuradoria Geral da Corôa, podendo deixar de o fazer?

E, ainda depois da consulta da Procuradoria, que foi

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favoravel á Companhia dos Phosphoros, se o Governo tivesse o proposito de proteger a Companhia dos Tabacos, e visto que a Procuradoria tem voto consultivo e não executivo, não teria aproveitado a informação desfavoravel da thesouraria do Ministerio da Fazenda?

E, no entanto, não o fez.

D'aqui se vê que não havia propósito algum de proteger a mesma Companhia dos Tabacos.

Pergunta pois: quem anda embriagado com o fumo? É o Governo e os seus amigos, com o fumo dos tabacos, ou é o Sr. Queiroz Ribeiro e os seus companheiros, com o dos phosphoros?

Uma duvida apresentou o illustre Deputado, dizendo: "haverá só este telegramma?" Elle, orador, affirma que ha só este. E para isso, basta tê-lo hontem affirmado o Sr. Presidente do Conselho.

Mas, entrelaçada ainda nesta questão administrativa, vem a questão da nota franceza.

Disse o Sr. Queiroz Ribeiro: "e este espectaculo é tão triste que o Governo Portuguez vae pedir auxilio ao Governo Francez, para proteger a Companhia dos Tabacos, que foi fazer queixa do Governo Portuguez".

Aqui nota-se uma contradicção: se essa companhia era a filha predilecta do Governo Portuguez, como é que ella vae fazer queixa d'esse Governo ao Gabinete Francez?!

Mas então, pergunta o Sr. Queiroz Ribeiro: quem communicou essa nota ao Governo Françe ? Foi o nosso Ministro em Paris?

Não foi. O Governo tinha dirigido uma nota confidencial ao seu Ministro em Paris e é evidente que esse Ministro, homem zeloso e, cumpridor dos seus deveres, não iria dar publicidade a uma nota tal; se o fizesse, incorria num grave erro; mas não incorreu.

Quem podia ser então?

Pois se em 30 de janeiro o Governo Portuguez tinha mandado um officio a diversas companhias, convidando-as a concorrer ao exclusivo dos tabacos, não teriam essas companhias, até 4 de fevereiro, o tempo necessario, para communicarem esse officio ao Governo Francez?

O Sr. Presidente do Conselho tem ali dito por varias vezes, e disse-o na commissão de fazenda, que estava assegurada a cotação das obrigações. Effectivamente, assim é. O actual contrato é vazado nos mesmos moldes, com differença do preço das obrigações, para melhor, do contrato celebrado pelo Governo regenerador.

O Sr. Pereira dos Santos: - Isso ha de ver-se.

O Orador: - É a sua opinião.

O Sr. Pereira dos Santos: - Por sua parte é de opinião absolutamente contraria.

O Orador: - No contrato celebrado pelo Governo regenerador a cotação das obrigações era cousa decidida.

Ora se o presente contrato é negociado pelas mesmas entidades e com maiores garantias, razão ha para affirmar que essa cotação continua no actual.

Não citou o contrato do Sr. Pequito como simples truc ou peça de effeito, mas simplesmente para confirmar a persuação em que está da sinceridade das razões e dos fundamentos com que o Governo tem feito as suas declarações.

Num dos seus impetos oratorios disse ainda o Sr. Queiroz Ribeiro que não discutia a honra pessoal do Sr. Presidente do Conselho, mas que essa honra não podia cobrir o contrato dos tabacos.

A isto responde elle, orador: não ha de S. Exa. cobri-lo com a sua honra pessoal, mas com a honra do seu partido, com os deveres que lhe impendem, como chefe de partido.

Diz ainda S. Exa., cada vez mais inflammado contra o Governo: "a opinião publica protesta contra esse contrato e a opinião publica somos nós".

A opinião publica podem ser todos, menos aquelles que, concordando de principio com o contrato, agora não concordam.

Nunca, no meio das polemicas politicas, viu ninguem aggredir o seu partido, como o fazem agora os illustres Deputados.

No entanto, a tal opinião publica ha de julgá-los, e a todos.

A opinião publica ha de dizer se um chefe de partido que após tantos annos de serviços a esse partido e ao seu paiz, que até os seus adversarios mais intransigentes lhe reconhecem, se um homem publico que até hoje tem sido respeitado, não só na integridade das suas medidas governativas, mas na sua absoluta honestidade, a opinião publica ha de dizer se esse homem, em face de uma questão administrativa, não ha de defender a questão politica que representa a integridade do seu partido e se o ha de deixar contaminar e esphacelar por uma scisão que no seu seio se manifesta.

A opinião publica não protesta; pelo contrario, manifesta o seu agrado por um homem que tantos serviços tem prestado ao paiz.

O Sr. Presidente: - Adverte o orador de que decorreu o tempo destinado ao seu discurso, tendo, no entanto, S. Exa. mais um quarto de hora para o concluir.

O Orador: - Esse homem está ali cheio de energia, como nos tempos da sua mocidade, para repellir todos os ataques, desfraldando a bandeira do partido progressista e expondo-a tão alto como Loulé e Braamcamp.

O seu nome não ha de, pois, ser immaculado; ha de ser glorificado.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Joaquim Pedro Martins: - Ao ter a honra de, pela primeira vez, usar da palavra nesta sala do Parlamento, muito desejaria eu, Sr. Presidente, poder associar-me ao clamor ardente e enthusiastico do illustre Deputado Sr. Carlos Ferreira, que hontem abriu o seu agitado e eloquente discurso com uma saudação viva e calorosa ao contrato dos tabacos.

Muito desejaria eu, Sr. Presidente, poder, com desassombro e verdade, dirigir ao Sr. Presidente do Conselho o mesmo appello vehemente do Sr. Carlos Ferreira, que, na sessão de quarta feira, exhortou S. Exa. a que, com coragem e sem receio, avançasse com o contrato dos tabacos.

Muito desejaria prestar ao Sr. Presidente do Conselho, nesta malfadada questão, o tenue e fraco apoio da minha voz e do meu voto.

Mas, por mais profunda que seja a consideração e o respeito que tenha pelo Sr. Presidente do Conselho e mais vivo o desejo que eu sentisse de offerecer a S. Exa. homenagem da minha adhesão, eu não podia, Sr. Presidente, acompanhá-lo no caminho tortuoso e mal illuminado por que o Sr. Presidente do Conselho enveredou nesta malfadada questão dos tabacos, sem faltar ao que julgo ser meu indeclinavel dever civico perante mim, perante o partido progressista e perante o paiz, e sem estrangular, os protestos da minha consciência indignada contra essa monstruosidade economica, esse ludibrio financeiro e esse insulto á dignidade nacional que se chama o contrato dos tabacos. (Apoiados).

Entre o que julgo meu dever civico e a minha consciencia e o Sr. Presidente, do Conselho não hesitei nem hesito.

Cumpro resolutamente o meu dever, obedeço alegre-

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mente á minha consciencia e, neste ponto, abandono, embora com sentido pesar, o Sr. Presidente do Conselho, que continua a teimar em ficar amarrado ao pelourinho do contrato dos tabacos. (Apoiados).

Não vim, Sr. Presidente, para a politica torturado por ambições insoffridas e inconfessaveis, ou seduzido por miragens brilhantes de elevação ou poderio. Não, Sr. Presidente. E continuo a pensar que, por mais alta que seja a envergadura que a nossa justa razão reconheça ou a nossa generosa phantasia dê ou empreste a qualquer individualidade, esta é sempre acanhada e insignificante para que nós tenhamos o direito de sacrificar-lhe o cumprimento do nosso dever, ou o nosso respeito pelos principios e interesses do paiz. (Muitos apoiados).

Eis, Sr. Presidente, os motivos por que não devo e, por isso, não posso acompanhar o Sr. Carlos Ferreira na saudação enthusiastica ao contrato dos tabacos e ao seu principal, se não unico, negociador por parte do Governo Portuguez, o Sr. Presidente do Conselho.

Mas, se não posso acompanhar o Sr. Carlos Ferreira, tambem me não associo á exhortação patriotica e eloquente que o illustre parlamentar e meu querido amigo Sr. Queiroz Ribeiro dirigiu ao Sr. Presidente do Conselho para que abandonasse o contrato dos tabacos. Não, Sr. Presidente, por que não seja meu ardente desejo o abandono desse contrato, mas porque, infelizmente, sei que seria tempo perdido. O Sr. Presidente do Conselho está no Governo só para fazer vingar o contrato dos tabacos; a razão da sua existencia ministerial é esse infamado contrato.

E, entretanto, nenhuma vantagem economica e financeira desculpa a apostasia dos bellos e leaes principios que na opposição o partido progressista inscrevera na sua gloriosa bandeira.

Se a, ordem do dia fosse a discussão do contrato dos tabacos, eu mostraria a V. Exa. e á Camara que enomre monstruosidade economica é esse contrato, como o Sr. Presidente do Conselho negociou de animo leve a adjudicação do exclusivo do fabrico, não salvaguardando devidamente os interesses do Thesouro, e mostrando se quasi estranho, ao valor e á potencialidade economica e financeira da industria dos tabacos e até a leis e factos economicos rudimentares. Ao analysá-lo na sua contextura economica, eu recebo a impressão de que foi redigido em Paris pelo Barão de Neuflize e assignado de cruz em Portugal pelo Governo Portuguez.

Valeram-nos ainda as circumstancias externas da concorrencia que se manifestou?

Mas essas, Sr. Presidente, longe de serem criadas ou aproveitadas em beneficio do Thesouro e do paiz, foram contrariadas de todas as formas pelo Sr. Presidente do Conselho em favor da que se diria, a sua desvelada e irresistivel enamorada e amante - a Companhia dos Tabacos.

Se fosse ordem do dia a discussão do contrato dos tabacos, eu demonstraria a V. Exa. e á Camara que mal disfarçado ludibrio financeiro está subjacente á decantada conversão e ao novo emprestimo que a acompanha; dada a nossa actual situação economica, financeira e diplomatica perante o mercado internacional, a abundancia de disponibilidades de numerario nos mercados europeus e americanos, a excellencia e segurança da garantia e o longuissimo prazo da amortização do emprestimo e da adjudicação do exclusivo.

Mas, Sr. Presidente, isto, que já seria muito para determinar nos espiritos uma corrente de antipathia e propositos de reprovação, isto, a ruindade economica, financeira e politica do contrato dos tabacos, que desde a sua leitura attenta, já me firmara no proposito inabalavel de o rejeitar - proposito que nunca dissimulei, antes mesmo da sessão da commissão de fazenda em que a maioria d'esta definiu em termos eloquentes assua rejeição - cede hoje o passo a um outro aspecto mais grave, mais melindroso, que os acontecimentos a que aqui temos assistido teem dado um relevo particular. Refiro-me, Sr. Presidente, ao aspecto moral da questão dos tabacos. (Apoiados).

Infelizmente, Sr. Presidente, já não estamos só em face de uma simples, embora gravissima, questão economica e financeira; estamos também, e sobretudo, em presença de uma questão de alta moralidade politica e financeira.

E digo, infelizmente, Sr. Presidente, porque este aspecto - tão grave e tão melindroso - da questão não é uma allucinação de espiritos opposicionistas ou suspeitosos, ou uma invenção adrede fabricada para illudir ou perverter a opinião publica, ou suscitar uma questão politica, como disse o Sr. Carlos Ferreira.

Não, Sr. Presidente. Não somos nós, os adversarios d'esse maculado contrato, quem o inventou; foram os factos, que resistem a todas as explicações engenhosas do Sr. Presidente do Conselho, e que não podem apagar-se, tanto mais que as explicações do Sr. Presidente do Conselho, ora contradictorias, ora - perdoe-me S. Exa. - futeis, só teem servido para os pôr em destaque.

Com effeito, Sr. Presidente, o que acontece?

O Sr. Presidente do Conselho, na sessão de 7 de maio da commissão de fazenda, declarou que pelo contrato do 4 de abril se liquidava a questão Keilhac.

Produzida esta declaração na Camara pelo illustre Deputado Sr. João Pinto dos Santos, a cuja inteireza de caracter e leal e bello espirito de rectidão e de verdade ninguem deixa de prestar a mais funda e respeitosa homenagem, começa de desenrolar-se ante nós uma scena interessante. É a das explicações do Sr. Presidente do Conselho sobre a questão Reilhac.

Na primeira sessão - a de 16 de agosto - S. Exa. declarou que, se havia qualquer cousa para Reilhac, não era o Governo que a pagava.

Esta, a primeira explicação do Sr. Presidente do Conselho. Não nega o facto; procura explicá-lo; acceita-o implicitamente, pois que, como então lucidamente observou o Sr. Conselheiro João Franco, a quem folgo de prestar a homenagem do meu respeito, não se explica o que se não deu; repudia-se, nega-se terminantemente.

Na sessão de 21 de agosto já a explicação é outra.

O Sr. Presidente do Conselho explicou que estava convencido de que se liquidava pelo contrato a questão Reilhac, porque no relatorio da proposta de 16 de julho, subscripto pelo Sr. Pequito, se dizia estar assegurada a cotação das obrigações e o Governo Francez não a consentia sem o pagamento a Reilhac.

Isto, Sr. Presidente, quando na sessão da commissão de fazenda nem em cotação de titulos se falara!

Na sessão de ante-hontem o Sr. Presidente do Conselho repetiu que nunca reconhecera a questão Reilhac e que o Governo não consentirá que do preço das obrigações do emprestimo, da renda do exclusivo dos tabacos ou de qualquer receita proveniente do contrato saia qualquer quantia - um real, um franco que seja - para pagar a Reilhac ou a quem represente Reilhac.

Mas se lhe perguntarem quem paga a Reilhac responderá que nada tem com isso.

Em todas as suas declarações, o Sr. Presidente do Conselho, do mesmo passo que affirma ousadamente que nem do preço firme ajustado das obrigações nem da renda dos tabacos sae dinheiro para Reilhac, tem a cautela de não excluir, antes figurar sempre, a hypothese do pagamento a Reilhac.

Esta insistencia, acaso involuntaria, mas a que o força o poder da verdade, é, Sr. Presidente, para os menos lidos nos discursos e entrelinhas do Sr. Presidente do Conselho, a prova provada de que o pagamento a Reilhac se faz em virtude do contrato.

Não paga o Governo directamente, nem do preço das obrigações, nem da renda dos tabacos? Creio-o, porque o contrario seria o reconhecimento formal e categorico da legitimidade das pretensões de Reilhac, a que com razão

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se teem opposto todos os Governos Portugnezes; e tal reconhecimento só um Governo de vendidos a Reilhac o podia fazer.

Mas tambem, Sr. Presidente, em 1891 o Governo que pagou a Reilhac não o fez directamente, pelo motivo confessado de que isso poderia julgar-se um reconhecimento de pretendido direito de Reilhac.

Não ha no contrato referencia ao pagamento a Reilhac, como disse o Sr. José Luciano?

Tambem não a havia nos diplomas relativos ao contrato de 1891.

É o relatorio da commissão de inquerito que o assevera; são os diplomas de 1891 que se calam a esse respeito, é o Ministro da Fazenda de então, o Sr. Augusto José da Cunha, que declara tambem: "que a indemnização aos portadores dos titulos de D. Miguel não saía do mesmo emprestimo, em cujo contrato nenhuma clausula se encontrava a ella referente"; é, Sr. Presidente, o proprio Conde de Reilhac a affirmar, conforme se lê no relatório, no seu depoimento num processo que então moveu, salvo erro, ao Comptoir d'Escompte, "que nenhuma somma saiu do producto do emprestimo dos tabacos destinada aos portadores dos titulos do emprestimo de D. Miguel; que nunca os concessionarios do monopolio respectivo foram auctorizados a distrahir um real dos dinheiros do Estado para o applicarem a tal fim."

Mão parece, ao ler o que confessava o Sr. Augusto José da Cunha e declarava o Conde Reilhac, que estamos a ouvir o Sr. José Luciano de Castro?

E fez-se ou não se fez o pagamento de 2.500:000 francos pelo menos? Deixou ou não de entrar no Thesouro esta quantia, que legitimamente lhe pertencia?

O que importa, pois, não é averiguar se o Governo paga directamente; o que é absolutamente preciso que o Governo nos diga é se o pagamento a Reilhac se effectua pela maneira por que se fez o de 1891.

A isto é que o Sr. Presidente do Conselho ainda não respondeu categoricamente -sim ou não - como era indispensavel.

Invariavelmente limita-se a dizer que, se alguem paga a Reilhac, nada tem com isso!

Nada tem com isso? Pois acaso o dinheiro sae do bolso particular do Sr. Presidente do Conselho ou de algum de nós? Não sae porventura da margem dos lucros dos contratadores, calculados já sobre a base expressa da quantia para pagar a Reilhac? E não foi, porventura, o Sr. Presidente do Conselho que deu essa margem de lucros aos contratadores para pagamento a Reilhac? Não é o pagamento de 2.500:000 francos pelo menos funcção do preço das obrigações? (Apoiados).

Não se paga do que effectivamente se recebeu? Paga-se do que se deixa de receber e legitimamente pertencia ao Estado. Não sae do Thesouro? Mas deixa de entrar, como devia. E acaso não é o mesmo o alcance e valor economico e financeiro dos dois phenomenos?

Repete-se pois, o que se deu em 1891 ; aggravam-se, porventura, as irregularidades que se deram quanto aos titulos a pagar e á forma do seu pagamento e a questão Reilhac fica pairando em nosso horizonte financeiro, prompta a cair outra vez sobre nós ao primeiro ensejo que lhe deparemos, com o primeiro emprestimo em Paris.

E o peor, Sr. Presidente, é que na consciencia nacional vae tomando vulto a ideia de que Reilhac não é já só aquelle aventureiro que tão ultrajantemente nos diffamou; de individualidade physica e real vae passando a symbolo, a bandeira que pode cobrir toda a especie de torpe contrabando.

O pagamento a Reilhac em virtude do emprestimo, Sr. Presidente, é pois, com dolorosa magua o affirmo, um facto exacto e tristemente humilhante. E para que V. Exa. e a Camara avaliem a alta gravidade do proceder do Sr. Presidente do Conselho, não esqueça V. Exa. que, conforme S. Exa. aqui por mais de uma vez declarou, já pelo relatorio do Sr. Rodrigo Pequito alcançara a convicção de que se liquidara a questão Reilhac, e a 10 de janeiro o nosso Ministro em Paris lhe asseverava terminantemente - cotação das obrigações depende da questão Reilhac.

Os celebres telegrammas de janeiro trocados entre o Governo e o nosso Ministro em Paris o Sr. Thomás Rosa, vieram dar á questão Reilhac um novo e dolorosissimo aspecto.

Em 9 de janeiro o Governo telegraphava ao Sr. Thomás Rosa, nos termos que são conhecidos de todo o paiz.

(O orador lê o telegramma).

A importancia d'este telegramma para o Sr. Presidente do Conselho é manifesta; deliberado em Conselho de Ministros, é, segundo S. Exa. affirma, redigido pelo Sr. Ministro dos Estrangeiros de accordo com o Sr. Ministro da Fazenda e assigna-o o Sr. Presidente do Conselho, chefe do Governo, personalização do Gabinete.

Todas as circumstancias externas, Sr. Presidente, dão a este telegramma uma importancia particular.

Nem a assignatura do Sr. Presidente lhe dava caracter menos official, como S. Exa. já se lembrou de allegar; para com os nossos representantes no estrangeiro, o Presidente do Conselho, que personaliza o Gabinete, tem, pelo menos, a mesma qualidade official que o Ministro dos Estrangeiros.

No dia immediato recebia o Governo a conhecida resposta do Sr. Thomás Rosa.

Tem-se allegado que neste telegramma tudo é dubitativo e conjectural. Protesto, Sr. Presidente. Este telegramma encerra uma affirmação terminante e positiva: diz que a cotação depende da questão Reilhac.

E não se venha com a subtileza, usada aqui na sessão de ante-hontem pelo Sr. Presidente do Conselho e reproduzida no Correio da Noite, de que a referenciará questão Reilhac do telegramma do nosso Ministro significa que, no seu entender, a questão Reilhac poderia prejudicar a cotação.

Em primeiro logar, o nosso Ministro não se limita a dizer que a questão Reilhac poderia prejudicar. Em segundo logar, o nosso Ministro não expõe uma impressão pessoal; dá uma informação, no cumprimento das ordens que tinha recebido. O que se lhe ordenára? Obtenha informações officiosamente com reserva. O que é o telegramma do nosso Ministro? O resultado d'essas informações. Dizer pois que quando elle diz que a cotação depende da questão Reilhac, exprime apenas uma impressão pessoal, é o mesmo que dizer que elle não cumpriu as ordens do Governo e irrogar-lhe grave censura, que elle, Sr. Presidente, absolutamente não merece.

Affirma-se tambem que a correspondencia, não só telegraphica, mas de qualquer ordem, terminou com os dois telegrammas mencionados. E rematou o Sr. Presidente do Conselho - é uma questão de facto, que se não pode discutir. Seja assim; comquanto eu tenha o direito de notar a V. Exa. e á camara que tambem a questão Reilhac é uma questão de facto, e sobre ella tem-se produzido aqui, na Camara, por parte do Governo, tantas variantes quantas as vezes em que elle se tem visto obrigado a explicá-la - e estas desde a contradicção manifesta entre o Sr. Presidente do Conselho e o Sr. Espregueira, - esse duende, esse phantasma, a quem ainda chamam Ministro da Fazenda.

Mas, voltando á questão, como o Sr. Presidente do Conselho pode dizer que o não haver mais correspondencia é uma questão, de facto que se não discute, eu tenho o direito de responder-lhe que é uma questão de facto que se não explica.

Pois o Governo julga importantissimo assegurar-se do mercado de Paris para a cotação das novas obrigações, envia um telegramma, assignado pelo proprio chefe do Go-

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verno, em que ordena ao Ministro colha as informações precisas; este responde sem, alem da questão Reilhac, dar qualquer outra informarão precisa, e o Governo, para quem o assumpto era de importancia tão capital que, era vez de procurar primeiro que tudo fazer um bom contrato, deixando sobretudo a cargo dos contratadores a cotação, começa por ella, não mais se preoccupa com o assumpto, não encarrega o Ministro em Paris de proseguir e precisar as suas informações?

Sr. Presidente, é verdadeiramente inexplicavel que num dia se julgue de importancia maxima a cotação das novas obrigações e no outro se julgue o contrario, sem que haja quaesquer factos que expliquem a mudança.

A não ser que o Sr. Presidente do Conselho quizesse assegurar-se de que a cotação dependia da questão Reilhac. É a unica informação terminante do nosso Ministro e o Sr. Presidente do Conselho que, segundo affirma, não queria mais informações, é porque talvez julgou esta bastante para continuar nas negociações.

A não ser, Sr. Presidente, que essas informações, julgadas indispensaveis, lhe fossem fornecidas por outra via e que emissarios, semelhantes aos que em 1891 o Governo de então entendeu dever empregar, fossem os informadores officiosos do Sr. Presidente do Conselho. Mas isto, Sr. Presidente, que seria gravissimo, não o quero eu acreditar.

Allega-se que tanto esses telegrammas não visavam a proteger a Companhia dos Tabacos que o Governo abriu concurso por vinte dias para todos os que a elle quizessem vir.

Sr. Presidente: o que foi esse pseudo-concurso está na memoria de todos. A imprensa, numa quasi unanimidade, verberou-o rija mas justamente; e o representante em Lisboa da casa Hambro, o Sr. Weinstein, apreciou-o devidamente nos officios que em 23 de fevereiro e 1 de março dirigiu ao Governo. Não alluda o Sr. Presidente do Conselho a esse concurso, que é a prova provada da sua parcialidade pela Companhia dos Tabacos, a qual, sentindo-se em paiz conquistado, levou a sua falta de consideração pelo Governo a desdobrar a proposta, e que o officio não permittia, e a só no fim de vinte e quatro horas, depois de terminado o concurso, auctorizar o Governo a abrir os celebres sobrescriptos.

É que, Sr. Presidente, nessa altura, a 20 de fevereiro, a Companhia dos Tabacos já estava absolutamente certa de que, houvesse o que houvesse, fossem quaes fossem os concorrentes, a ella e ao seu syndicato financeiro iriam parar o appetecido emprestimo e o saboroso exclusivo.

O telegramma de 9 de janeiro mostrou ao Governo Francez que as predilecções do Sr. Presidente do Conselho continuavam a ser pelo mercado de Paris, e que, dado este facto, facil seria aproveitá-lo para fazer valer toda a cupidez da finança franceza e do Conde de Reilhac.

Quando porém, em 30 de janeiro, o Sr. Presidente do Conselho, sob pena de ser considerado cumplice, na obra de desaggregação de elementos financeiros a que procediam aquelles que, na sua phrase jactanciosa, tinham feito o vacuo em torno de Portugal, dirigiu convite ás duas companhias rivaes e acceitou quaesquer outras propostas, - que fez a Companhia dos Tabacos, Sr. Presidente?

Corre pressurosa á Franca a queixar-se do que para ella era uma ousadia, - as clausulas do convite do Governo Portuguez, - e solicita do Governo Franez o apoio que a sustentasse e defendesse contra a opinião publica portugueza e contra quaesquer eventualidades que, aliás, sem vontade do Sr. Presidente do Conselho, forçassem este a não lhe entregar os lucros do novo emprestimo e a continuação do exclusivo.

Com effeito, Sr. Presidente, segundo informam os jornaes do tempo, a 6 de fevereiro corria para Paris, ainda mal convalescente de uma grave enfermidade, o Sr. Conde de Burnay, presidente do conselho de administração da Companhia dos Tabacos. Seis dias depois, a 12 do mesmo mez, rebentava na chancellaria portugueza a affronta humilhante da nota do Governo Francez, que agora, não já officiosamente, mas officialmente, nos intimava que negociassemos com o consortium dos tabacos, sob pena de recusa da cotação das novas obrigações.
Sr. Presidente: é esto um dos momentos mais vergonhosos e deprimentes para o brio nacional. Uma companhia portugueza a supplicar a intervenção do estrangeiro na regulamentação de um negocio puramente nosso, de caracter interno!

É ignominioso! (Apoiados).

Mas como se comportou o Governo perante esta situação gravissima e humilhante para o brio nacional?

Ao Governo Francez respondeu com a nota anodyna e incaracteristica de 20 de fevereiro, em que nem sacode a affronta nem corrige a exigencia illegal da intervenção dos obrigacionistas no funccionamento e vida da nova companhia. Á Companhia dos Tabacos, nove dias depois, com a manobra da sobrescriptos em favor da mesma companhia, sob cujas solicitações o Governo Francez chicoteara o brio e a dignidade nacional.

Desde então, Sr. Presidente, o negocio dos Tabacos assume um aspecto estranho.
Ergue-se irresistivelmente na nossa consciencia um temeroso sobresalto.

Pois o Sr. Presidente do Conselho assiste ao desenrolar dos acontecimentos, é nelles actor dominante, recebe a affronta do Governo Francez, sabe - e S. Exa., se bem ouvi, ainda hontem aqui o disse, - que essa affronta humilhante é solicitada pela Companhia dos Tabacos, uma companhia portugueza; depois não lhe pede responsabilidades, não procura desaffrontar-se e desaffrontar-nos, não estimula, antes procura diminuir a concorrencia, despreza a proposta e a boa vontade dos americanos, e dá tempo a que o Barão de Nenflize continue afincadamente a negociar por forma que a adjudicação do exclusivo vá parar inevitavelmente ás mãos da Companhia e a conversão e emprestimo ao seu syndicato financeiro, ficando sobretudo naquelle mal acautelados os interesses nacionaes e seguramente garantidos os da Companhia! E admira-se o Sr. Presidente do Conselho de que falemos em Reilhac?

Depois de tudo isto, Sr. Presidente, poder-se-ha, dizer que é demais a nossa insistencia para que tudo se esclareça, se illumine com luz clara e limpida, por forma a varrer-se esta atmosphera baça e irrespiravel, verdadeira atmosphera de hospital, que á actual politica portugueza trouxe o contrato dos tabacos?

Sr. Presidente, é absolutamente preciso que tudo seja, não simplesmente affirmado, mas satisfatoriamente explicado, isto é, sem contradicções.

Diga-se o que se quizer: que por nossa parte tudo isto é uma questão politica; clame-se que o contrato dos tabacos é mero pretexto; grite-se que o procedimento da commissão de fazenda foi uma conspiração o que conspiradores são os que, como eu, a acompanharam resoluta e enthusiasticamente, e a seu lado permanecerão com alegria em quanto ella mantiver galhardamente hasteado o pendão da moralidade politica e financeira que, só tudo isso ou mais é preciso soffrer quem não queira votar essa monstruosidade economica, esse ludibrio financeiro, e essa affronta á dignidade nacional que se chama o contrato dos tabacos, eu acceito tudo resolutamente, mas, firme na minha consciencia e apoiado no meu dever, continuo a ter, Sr. Presidente, para mim esta legenda de honra: Abaixo o contrato dos tabacos! (Muitos apoiados. - Vozes: - Muito bem).

O Sr. Presidente: - Amanhã ha sessão; A ordem do dia é: na primeira parte a continuação da discussão do

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projecto n.° 13, mais os projectos n.ºs 17 e 18. Na segunda a interpellação, se o Governo puder comparecer.

Está encerrada a sessão.

Eram 7 horas da tarde.

Documentos enviados para a mesa nesta sessão

Propostas de lei apresentadas pelo Sr. Ministro da Marinha

Proposta de lei n.° 20-A

Senhores. - A Ilha do Fogo é, talvez, de todo o archipelago de Cabo Verde, a menos dotada de todos os recursos e, entre estes de um essencialissimo á vida - a agua.

A sua população pobrissima soffre por este factos, tormentos que é facil imaginar, sabendo-se que as regiões em que se tem de ir colher a agua para os gastos mais imprescindiveis da vida, exclusivamente os da alimentação, estão situadas a mais de 8 kilometros dos locaes habitados. Neste serviço perdem os desgraçados habitante d'aquella ilha tempo precioso, tanto mais que o cauda de taes fontes é de regra diminuto.

A seca habitual naquelle archipelago e a constituição geologica e o relevo accidentado do terreno da Ilha de Fogo explicam aquella escassez de agua e a difficuldade economica e technica de canalizar as fontes que existem para abastecimento das povoações.

Ha, porem, no local denominado Praia Ladrão uma nascente que, pela abundancia do seu manancial e relativa proximidade da villa (fica a 8 kilometros d'ella), está em condições de melhor ser aproveitada para consumo da povoação; e, effectivamente, d'estas nascentes se abastece a villa, indo os seus moradores buscar a agua por um longo, escarpado e perigoso caminho, fazendo o transporte em geral, á cabeça. A captação faz-se da forma mais rudimentar, em escavações abertas na areia, onde a agua borbulha; de tempos a tempos o mar invade tudo cobre de areia as nascentes e toda aquella povoação fica privada de a colher ali. Não tendo outro ponto tão apropriado e abundante em que o faça, soffre longamente de sêde.

A captação e elevação d'estas aguas constituiriam um beneficio para a Ilha do Fogo. Infelizmente, para as canalizar até á villa teria primeiro de ser elevada a agua a uma cota de cerca de 200 metros acima do ponto actual do affloramento, o que exigiria uma custosa installação de importantes machinas, bombas elevatorias e canalizações, e uma exploração tanto mais cara quanto é certo que, pela falta de caminhos e por o mar raras vezes permittir o desembarque no local, o transporte de combustivel seria bastante difficil, alem de ser necessario contratar fora pessoal permanente habilitado. Para notar é tambem que, em caso de avaria nas machinas, seria bem difficil conseguir na ilha as reparações convenientes.

Dadas estas despesas de installação e exploração, que julgamos incompativeis com os recursos da ilha e até com a situação financeira actual da provincia, e sendo, certo que o rendimento que se poderia obter com a venda da agua não compensaria sequer os gastos de exploração, só uma empresa que tenha por fim principal a irrigação de vastos terrenos poderá fazer a captação e elevação das aguas com algumas probabilidades de lucro; e então facil seria para o Estado obter d'ella o volume de agua precisa para distribuir á população.

Não é fantasia o que acabamos de referir; ao Governo já foi requerida a concessão relativa á captação e elevação das aguas que excedem o consumo publico, no local das actuaes nascentes.

Nestes termos, e porque a melhor forma de conseguir todas as vantagens da adjudicação d'este exclusivo será o concurso publico, tem o Governo a honra de propor á apreciação do Parlamento a seguinte proposta de lei.

Artigo 1.° É o Governo autorizado a conceder em concurso publico, pelo prazo maximo de sessenta annos e segundo as bases annexas a esta proposta de lei, o exclusivo para a captação e elevação das aguas que sobrem do consumo publico no local das nascentes, no sitio denominado Praia Ladrão, da Ilha do Fogo, na provincia de Cabo Verde.

Art. 2.° É concedida a isenção de direitos aduaneiros e de outros quaesquer impostos de caracter municipal ao material e machinas empregadas para o fim indicado no artigo 1.°

Art. 3.° É igualmente concedida a isenção de quaesquer impostos ou contribuições geraes ou municipaes que venham a incidir sobre a empresa ou entendidade de concessionaria, pelo facto do exclusivo de que trata esta proposta de lei.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrario.

Bases a que se refere a proposta de lei d'esta data

l.ª Os concessionarios comprometter-se-hão a realizar nas nascentes da Praia Grande todos os trabalhos necessarios para a boa captação das aguas, construindo fontes em que o publico, o Estado ou o municipio se abasteça gratuitamente de toda a agua que queiram colher, seja qual for o seu fim e destino; bebedouros para gados e assim todas as obras necessarias para defender as nascentes da invasão do mar e das areias; correndo igualmente por sua conta as despesas com a guarda, limpeza e conservação das referidas obras.

2.ª Toda a agua das nascentes da Praia Ladrão que sobrar do consumo indicado na condição l.ª será elevada pelos concessionarios e applicada na sua industria, excepto um decimo d'essa agua que será gratuitamente posta á disposição incondicional do Governo no ponto de maior cota a que a agua for elevada:

3.ª A quantidade de agua fornecida gratuitamente ao Estado, a que se refere a condição 2.ª, não poderá nunca ser inferior a 50 metros cubicos diarios, nem superior a 100 metros cubicos; quando, porem, o Estado carecer de um volume superior a este, serão os concessionarios obrigados a fornecê-la, pagando aquelle este excesso á razão de 200 réis o metro cubico.

4.ª Os concessionarios serão obrigados a ceder gratuitamente ao Estado, junto do local de maior cota a que a agua for elevada, os terrenos que este carecer para construcção dos depositos, pias chafarizes e mais installações que queira montar para o aproveitamento da agua a que se referem as condições 2.ª e 3.ª, e bem assim o permittir gratuitamente as servidões necessarias para o abastecimento do publico e para a installação das tubagens em que o Estado canalizar estas aguas.

5.ª Os concessionarios terão de apresentar á approvação do Governo da Provincia, com a necessaria antecipação, o projecto circunstanciado de todas as obras a realizar, quer para o cumprimento das condições antecedentes, quer para o exercicio da sua industria, apresentando os desenhos e descrições de todas as installações, motores e bombas para a elevação da agua.

Secretaria de Estado dos Negocios da Marinha e Ultramar, em 8 de setembro de 1905. = Manoel Antonio Moreira Junior.

Proposta de lei n.° 20-B

Senhores. - É hoje verdade incontroversa que todos os elementos indispensaveis á vida se tornaram incomparavelmente mais caros, e que por isso se impõe a necessidade de melhorar os vencimentos das corporações militares, tão uteis quanto queridas por todo o pais, por terem

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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS 26

sabido sempre manter com reluzente brio as gloriosas tradições do nosso passado, quer sacrificando a vida, quer perdendo a saude nas regiões inhospitas dos climas tropicaes, a fim de conservar illesa a honra da bandeira e do nome português.

Assim o entendeu o Governo, submettendo ao vosso esclarecido exame, pelo Ministerio da Guerra, em sua proposta de lei n.° 10-A, medidas tendentes a melhorar os vencimentos de algumas classes das differentes armas do exercito, em que as circunstancias de vida se tornavam mais espinhosas, sendo tambem certo que em epoca recente se attendeu aos serviços que os officiaes das differentes armas do exercito são chamados a desempenhar no ultramar, determinando-se-lhes, alem de outras vantagens, importante melhoria nos seus vencimentos pelo decreto de 14 de novembro de 1901.

Somente nos officiaes das differentes classes da corporação da armada, cujo serviço na metropole e nas colonias bem digno é de toda, a consideração e apreço, se teem conservado os vencimentos que lhes foram regulados pelo decreto de 31 de marco de 1890, e mantidos pela lei de 14 de agosto de 1892, epocas em que as condições de vida eram bem differentes das actuaes, sob o ponto de vista economico.

Justo e equitativo se torna pois estender a melhoria de vencimentos a estes servidores do Estado por uma forma analoga á que se propôs para os officiaes de algumas das classes do exercito, traduzindo-se, em parte, a presente proposta de lei; em applicar os vencimentos dos officiaes da arma de artilharia; modificados pela proposta apresentada pelo Ministerio da Guerra, a algumas das classes da corporação da armada, visto que actualmente percebem iguaes vencimentos, e que desde longa data existe a equiparação de honorarios entre estas duas armas.

Nesta ordem de ideias o aumento que se propõe será de 5$000 réis mensaes no soldo dos officiaes de todas as classes da corporação da armada, com a graduação ou patente de primeiros ou segundos tenentes, e de 5$000 réis mensaes nas gratificações de exercicio dos officiaes com a graduação ou patente de segundos tenentes, com a excepção dos officiaes pertencentes á classe dos engenheiros navaes, que actualmente percebem gratificações superiores ás das outras classes.

1gualmente se aumentam as gratificações de exercício aos officiaes do quadro dos auxiliares do serviço naval com a graduação de primeiros tenentes, e aos capellães navaes com as graduações de capitães-tenentes, primeiros e segundos tenentes, de 5$000 réis mensaes, porque aquelles percebem presentemente a gratificação de exercicio de 10$000 réis e estes a exigua quantia de 8$000 réis em todas as mencionadas graduações, exceptuando-se os capellães embarcados nas escolas de alumnos marinheiros que por lei especial teem gratificações superiores; e os que teem a graduação de guarda-marinha, por isso que pela presente proposta de lei se lhes garante a promoção por diuturnidade de serviço nesta graduação.

Presentemente existem na corporação da armada, vencendo pelo Ministerio da Marinha, 169 officiaes com a graduação ou patente de primeiros tenentes e 215 com a de segundos tenentes, como se vê no mappa seguinte:

(Ver tabela na imagem)

O aumento de despesa resultante da approvação d'esta proposta de lei, na parte relativa ao aumento de vencimentos será de 35:940$000 réis annualmente, incluindo o aumento de gratificação de 5$000 réis mensaes a 3 capellães navaes com a graduação de capitães-tenentes que presentemente existem.

No exercito ha a promoção por diuturnidade do posto de alferes a tenente em todas as armas e serviços, e por isso julgou o Governo desnecessario aumentar os vencimentos dos alferes, visto conservar-se-lhes tal vantagem.

Pela presente proposta de lei, igualmente se procede para com os officiaes das differentes classes da armada, com a graduação de guarda-marinha, que teem promoção por diuturnidade de serviço, segundo a legislação em vigor.

Existindo, porem, algumas classes na corporação da armada que não logram a promoção a tenentes por diuturnidade de serviço, justo será tornar-lhes extensiva a lei de 9 de julho de 1903, que garante aos machinistas navaes de 3.ª classe com a graduação de guarda marinha, a promoção ao posto de segundo tenente, quando tenham de permanencia naquella situação seis annos com bom e effectivo serviço na arma, ficando assim a existir paridade com o que dispõe o artigo 56.° da carta de lei de 12 de junho de 1901, relativamente ás classes não combatentes do exercito; e assim se regula a triste situação dos machinistas conductores e dos officiaes de administração naval, que permanecem no posto de guarda-marinha cerca de quatorze annos, e dos officiaes do quadro dos auxiliares do serviço naval, que em breve tempo poderão permanecer em tal posto de doze a quinze annos.

Concedendo ás classes citadas a diuturnidade para a promoção a segundo tenente, e aos capellães navaes por isso que presentemente só a tem no fim de dez annos de serviço, resultará o aumento de despesa annual de réis 9:708$000.

Para que não haja com a approvação da presente, proposta de lei aumento de despesa alem do já fixado, limita-se o numero de officiaes com a graduação de segundos tenentes, que podem existir nas differentes classes beneficiadas com a promoção por diuturnidade, representando esse limite a somma dos actuaes quadros nos postos de segundos tenentes e guardas-marinhas.

Logrando porem pela approvação d'esta proposta de lei os machinistas conductores a promoção por diuturnidade, forçoso se torna organizar um quadro unico constituido pelos machinistas provenientes da classe dos conductores, visto que a sua promoção era até hoje regulada por leis especiaes e dependentes do numero de promoções que houvesse dentro dos quadros dos machinistas navaes de 2.ª e 3.ª classe, determinando-se-lhes quando poderão embarcar a bordo dos navios da marinha de guerra.

Resumindo, teremos que o aumento de despesa resultante da approvação da presente proposta de lei será de 45:648$000 réis annualmente.

Em vista das considerações expostas submettemos ao vosso esclarecido exame a seguinte proposta de lei;

Artigo l.º Na legislação em vigor sobre os vencimentos dos officiaes das differentes classes da armada serão feitas as seguintes alterações:

l.ª Os soldos dos officiaes das differentes classes da armada com as graduações ou patentes de primeiros ou segundos tenentes são aumentados de 5$000 réis mensaes:

.ª As gratificações de exercicio dos officiaes pertencentes ao quadro dos auxiliares do serviço naval, com a graduação de primeiros ou segundos tenentes, são aumentados de 5$000 réis mensaes.

3.ª As gratificações de exercício dos officiaes pertencentes ao quadro dos capellães navaes, com excepção dos que se acharem embarcados nas escolas de alumnos marinheiros, e dos que teem a graduação de guarda-marinha, são aumentados de 5$000 réis mensaes.

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4.ª As gratificações de exercicio dos officiaes das outras classes da armada, com a graduação ou patente de segundo tenente, exceptuando os officiaes pertencentes ao quadro dos engenheiros navaes, são aumentadas de 5$000 réis.

Art. 2.° É extensivo ás classes de machinistas conductores, capellães navaes, officiaes de administração naval e officiaes do quadro de auxiliares do serviço naval o disposto no § 1.° do artigo 1.° da lei de 9 de julho de 1903 relativa aos machinistas navaes.

§ unico. O numero de officiaes com a graduação de segundos tenentes nas classes da armada abaixo designadas não poderá em caso algum exceder o seguinte:

Machinistas conductores, 21.
Capellães navaes, 6.
Administração naval, 35.
Auxiliares do serviço naval, 33.

Art. 3.° Os actuaes machinistas supranumerarios aos quadros de machinistas navaes de 1.ª e 2.ª classe, provenientes da classe dos conductores de machinas, e os machinistas conductores constituirão um quadro especial com a denominação de quadro dos machinistas conductores, correspondendo os que teem a graduação de primeiros tenentes a machinistas conductores de 1.ª classe, de segundos tenentes a machinistas conductores de 2.ª classe, de guardas-marinhas a machinistas conductores de 3.ªclasse.

§ l.° Este quadro compõe-se de vinte e tres officiaes, sendo dois machinistas conductores de l.ª classe e vinte e um de 2.ª ou 3.ª classe, não podendo em caso algum ser excedido.

§ 2.° A promoção dos machinistas conductores de 2.ª classe á 1.ª far-se-ha quando houver vacatura nesta classe e satisfazendo as condições geraes de promoção.

§ 3.ª Os machinistas conductores com a graduação de segundos tenentes poderão embarcar em navios em que o encarregado da machina seja official mais antigo ou de patente superior.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria de Estado dos Negocios da Marinha e Ultramar, 8 de setembro de 1905. = Manoel Antonio Moreira Junior.

Foram enviadas ás commissões do ultramar e da fazenda.

Representações

De uma commissão delegada dos empregados ao serviço da Companhia dos Tabacos de Portugal, pedindo providencias tendentes a tornar effectivas e garantidas, de futuro, as regalias e beneficios que lhes concede a lei vigente, referente ao contrato dos tabacos.

Apresentada pelo Sr. Presidente, mandada publicar no "Diario do Governo", e enviada depois á commissão de fazenda.

Dos segundos officiaes do Ministerio da Marinha e Ultramar, pedindo que sejam fixados em 600$000 réis os vencimentos de todos os segundos officiaes das secretarias de Estado.

Apresentada pelo Sr. Deputado Ferreira da Fonseca, e mandada enviar á commissão do orçamento.

Dos amanuenses da Junta do Credito Publico, Caixa Geral de Depositos, Tribunal de Contas, Procuradoria Geral da Coroa e Torre do Tombo, pedindo para que sejam fixados em 360$000 réis annuaes os seus vencimentos.

Apresentada pelo Sr. Deputado Ferreira da Fonseca, e mandada enviar á commissão do orçamento.

Dos segundos officiaes da Secretaria de Estado dos Negocios do Reino, pedindo que lhes sejam fixados em réis 600$000 annuaes os seus vencimentos.

Apresentada pelo Sr. Deputado Ferreira da Fonseca, e mandada enviar á commissão do orçamento.

Dos segundos officiaes do Ministerio da Fazenda, no sentido da anterior.

Apresentada pelo mesmo Sr. Deputado, e mandada enviar á commissão do orçamento.

O REDACTOR = Barbosa Colen.

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