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N.º 7. SESSÂO EM 9 de FEVEREIRO. 1849.

Presidencia do Sr. Rebello Cabral.

Chamada - Presentes 61 Srs. Deputados.

Abertura — Á meia hora depois do meio dia.

Acta — Approvada.

Não houve correspondencia, porém mencionou-se na Mesa as seguintes

Representações. — 1.ª De alguns individuos residentes na Freguezia de S. Pedro da Cova, Concelho de Gondomar, apresentada pelo Sr. Assis de Carvalho, queixando-se da injustiça, que se lhes fez, em consequencia de se negar a habilitação para lavrar umas minas a Jeronymo Ferreira Pinto Basto, com quem os Supplicantes estavam contractados. — Á Commissão de Administração Publica.

2.ª Dos habitantes da Freguezia de S. Bartholomeu da Cidade de Coimbra, apresentada pelo Sr. Mello Gouvêa, em que pedem uma providencia que faça applicar os rendimentos das Collegiadas extinctas á sustentação de seus Parochos, com preferencia ao Seminario da mesma Cidade. — Á Commissão Ecclesiastica.

3.ª Dos Egressos das extinctas Ordens Religiosas do Porto, apresentada pelo Sr. Assis de Carvalho, pedindo providencias, para que pelo Thesouro seja expedida ordem ao Governador Civil do Porto, para abrir o pagamento aos Egressos dos mezes, que se tem pago em outros Districtos, e dos que se lhes estão devendo. — Á Commissão de Fazenda.

4.ª Dos Guardas a bordo da Alfandega de Setubal, apresentada pelo Sr. Mello Gouvêa, pedindo augmento de seus ordenados. — Á Commissão de Fazenda.

5.ª Da Junta de Parochia e Parochianos da Freguezia de Santa Justa da Cidade de Coimbra, apresentada pelo Sr. Mexia Salema, em que pedem a revogação e declaração da Lei de 16 de Junho de 1848, na parte que applica os rendimentos das Collegiadas para os Seminarios, pelo que diz respeito á Diocese de Coimbra, e applicar delles á congrua dos respectivos Parochos. — Á Commissão Ecclesiastica.

O Sr. J. José de Mello: — Mando para a Mesa este Parecer da Commissão d'instrucção Publica.

Mandou-se imprimir, e se transcreverá quando entrar em discussão.

O Sr. Lopes de Lima: — Sr. Presidente, o Sr. Ministro da Fazenda está presente, e ainda agora lhe perguntei, se S. Ex.ª está habilitado para respondei á Interpellação, que eu annunciei; e S. Ex.ª teve a bondade de me dizer, que sim. Peço portanto a V. Ex.ª, porque me parece que o objecto é urgente, se sirva de consultar a Camara, a fim de dispensar o Regimento, para que eu faça esta Interpellação, antes de se entrar na Ordem do Dia.

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Lopes de Lima annunciou uma Interpellação ao Sr. Ministro da Fazenda, e acaba de dizer, que o Sr. Ministro se declara habilitado para ella; mas como as Interpellações só podem ter logar na ultima hora da Sessão, o Sr. Deputado requer á Camara a dispensa do Regimento, a fim de já ter logar a Interpellação.

Dispensou-se o Regimento na dita conformidade.

O Sr. Lopes de Lima: — Sr. Presidente, na passada Sessão Legislativa discutiu-se nesta Camara uma Proposta do Governo, para se conceder aos máos Pagadores, que tinham demorado os seus pagamentos á Fazenda, um premio de 40 por cento pela sua commissão, recebendo-se os seus debitos em Notas do Banco de Lisboa, destinando a mesma Portaria as receitas, que d'ahi proviessem para se pagar na mesma moeda, isto é, com desconto tambem de 40 por cento aos Servidores do Estado, as suas quinzenas atrasadas, em castigo da sua fidelidade e do seu serviço. Eu nessa occasião tachei esta Lei de iniqua e injusta, disse-se porém, por parte do Ministerio, disse o Sr. Ministro da Fazenda que então era, que não havia outro modo de pagar, nem esses tristes 60 por cento dos vencimentos atrasados, que se deviam aos Servidores do Estado, e eu, e creio que mais alguem, contra a sua consciencia, votámos por essa Proposta, apesar da sua immoralidade, e da sua injustiça, para não privar désse pequenissimo recurso, essa infelicissima classe dos Empregados, sobre a qual tem pesado quasi essencialmente todos os flagicios e calamidades deste Paiz, e que tem sido condemnada a cobrir ella só o deficit do Orçamento, e até a supprir com os atrasos dos seus pagamentos as despezas irregulares, que no mesmo Orçamento não foram votadas. Essa Proposta reduziu-se a Lei, e foi publicada com a data de 23 de Maio de 1848: em consequencia della procedeu-se á cobrança das dividas atrasadas: a voz publica diz, que se cobraram avultadas quantias em Notas, e assim deve ser, porque é sabido, que essa divida foi avaliada aqui em 8:000 contos, e ainda que se viesse a cobrar só uma decima parte, deveria montar, pelo menos a 800 contos: viu-se porém, que com ella não se pagaram senão as quinzenas de Junho, Julho, e apenas hoje o Diario do Governo começa a annunciar a de Agosto, vê-se pois, que o que se tem pago daquellas quinzenas pouco excederá a 300 contos de réis, sabendo-se, que aquellas quinzenas soffrem o rebate da decima, e todos os descontos: por consequencia vê se, que o que se tem pago apenas montará a 300 contos, ou pouco mais.

Quando eu entrei no Parlamento, desejei esclarecer-me sobre este negocio; em consequencia disso dirigi ao Governo um Requerimento, e que foi approvado pela Camara, para me serem enviados os esclarecimentos, que me poderiam habilitar, para entrar melhor nesta Interpellação, respondeu-se, remettendo-me para os Relatorios, que haviam devir: depois disso o Sr. Ministro da Fazenda do Ministerio sem Programma despediu-se aqui de nós com um Relatorio, acompanhando o Orçamento; mas, por mais, que o folheei, não achei lá os esclarecimentos, que desejava: é verdade, que S. Ex.ª disse que tinha ainda umas contas para mandar; mas depois disso S. Ex.ª despediu-se, e despediu-se, porque quiz, e eu não sei, se essas contas virão ou não virão, porque agora o querer e o não querer são razões muito cabaes: á vista disto eu não tenho outro remedio, para poder esclarecer-me, para que a Camara tambem nessa formar o seu juizo, e o publico igualmente, o

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que é certamente de grande utilidade para o credito do Governo, senão o Interpellar o Sr. Ministro da Fazenda.

Lá fóra geralmente se acredita que o Governo pagou muito menos, do que recebeu; e o Sr. Ministro da Fazenda, antes de o ser, havia de ouvir o mesmo a este respeito: em S. Ex.ª por certo não recáe responsabilidade alguma pelos actos do seu Antecessor; mas herdou delle a responsabilidade de dar explicações, porque a Nação tem direito de saber, como se gasta o seu dinheiro.

Nestas circumstancias, pois, eu peço a S. Ex.ª o Sr. Ministro da Fazenda, que queira ter a bondade de me responder a tres quisitos — 1.º Se me póde dizer em globo ao menos as quantias que se cobraram em virtude da Lei de 23 de Maio de 1848. — 2.º Se por algum caso d'urgencia algumas dessas quantias se desviaram para outras despezas, que não fôssem o pagamento das quinzenas, para que estavam applicadas pela mesma Lei. — 3. Se poderá em breve tempo trazer a esta Camara as Contas documentadas dessa Gerencia, a fim de que não só a Commissão de Contabilidade, mas mesmo a Camara e o Publico fiquem elucidadas sobre este objecto: esperarei a resposta de S. Ex.ª e depois tomarei a palavra, se o julgar conveniente.

O Sr. Ministro da Fazenda: — Sr. Presidente, a Lei, a que acaba de referisse o illustre Deputado, não produziu effectivamente os resultados, que se aqui prometteram, e com os quaes se contava; porque os devedores, ou seja porque as circumstancias do Paiz não lhe permittiram satisfazer de prompto, e nos prazos marcados nas Leis, ou seja porque estavam ainda á espera de novos favores, não concorreram a pagar, como o Governo então e a Maioria da Camara julgavam: e eu já francamente faço sentir á Camara e ao Paiz, que, por qualquer attenção que seja, é inutil o conceder mais favores. (Apoiados) Trago um Mappa das quantias recebidas, e das pagas, satisfazendo desta maneira ao empenho do illustre Deputado, e de toda a Camara; porque, Sr. Presidente, em quanto eu estiver á frente da Administração, esteja o nobre Deputado certo, que a publicidade será das condições essenciaes da minha Gerencia. Do Mappa que tenho na mão, e de que me preveni, apezar de não ter sido enviado senão hontem o Officio que recebi desta Camara, se verá, que a somma cobrada desde Junho a Novembro monta a 506 contos, havendo cinco Districtos Administrativo, aonde nestes mezes ha uma falta immensa de cobrança, e dalguns delles, note a Camara, que desde Junho a Novembro não se recebeu, em Um só destes mezes, quantia alguma. Eu não faço menção dos Districtos, porque seria isso um pouco mais serio: mas o Governo confia nas Auctoridades que estão á testa daquelles Districtos; e por alguma rasão que certamente essas Auctoridades podem dar, é que a cobrança senão tem realisado ao ponto, que o Governo, e a Camara esperavam. Ora desta somma dos 506 contos tem-se pago 379 contos; e independentemente da Interpellação do nobre Deputado, eu, em virtude dos principio?, que estabeleci, já, talvez ha oito dias, expedi ordem para as Provincias, afim de ser pago um mez de soldo aos Officiaes; e creio que na Casa está um nobre Deputado, que ha de ter conhecimento da informação a que mandei proceder, e depois de recebida, hei-de mandar ordem para nas Provincias se pagar aos Empregados tambem um mez dos seus ordenados, e aqui em Lisboa vem hoje annunciado já o pagamento désse mez, que é o Setembro de 1847.

Desta maneira ficam satisfeitos os dois primeiros quesitos da Interpellação do illustre Deputado: e fica tambem demonstrado, que é completamente inutil o conceder mais favores aos devedores; e o Governo tem já resolvido apresentar á Camara uma Proposta neste sentido, disposto a empregar todo> os meios, sem consideração de ninguem, para entrarem nos Cofres do Estado todas as sommas, e todas as quantias, de que o Estado é credor, sejam quaesquer que forem os devedores, ou sejam de devedores dilectos ou de devedores indirectos, ou sejam daquelles que devem ao Governo os impostos, ou dos que tendo-os recebido não tem dado conta do dinheiro. (Apoiados).

. Mas daqui se vê que a voz publica não é tão exacta como o nobre Deputado se persuadiu que ella o era, porque o facto prova o contrario — não se recebeu senão 506 contos, conta redonda; e a differença que vai para os 379 coutos, que se tem pag, está em Cofre.

Agora em quanto ao terceiro quisito parece-me que o nobre Deputado ha de convir comigo em que effectivamente não se tem distraído fundos desta receita. Eu estou convencido de que não ha distracção; pelo menos não tenho achado na Societaria documentos em virtude dos quaes, ou com os quaes o nobre Deputado possa provar que houve distracção de sommas além da sua applicação devida; estou certo que se não distraíram fundos desta receita; porque a differença que ha entre os 506 contos que se receberam, e os 379 contos que se dispenderam, é a differença necessaria para se pagar este mez de soldos, e ordenados que já mandei pagar. Por tanto tenho dicto quanto é possivel em resposta ao objecto que faz parte da Interpellação do nobre Deputado. (Apoiados)

O Sr. Lopes de Lima: — Agradeço ao nobre Ministro da Fazenda, a franqueza, a lealdade e a urbanidade com que acaba de responder á minha Interpellação. S. Ex.ª estará lembrado do vaticinio que eu fiz aqui o anno passado, quando essa Lei veio á discussão, constantemente disse, que era immoral, injusta, e acrescentei tambem, e inefficas; toda a Camara estará lembrada disto, e ale se me fez uma arguição por empregar estes termos. Os factos por S. Ex.ª relatados vieram infelizmente confirmar a minha profecia. Como o passado não tem remedio, ao menos sirvam estas lições de experiencia ao Ministerio, e á Camara; e sobre tudo ao Ministerio, que é a quem compete dirigir as Propostas, sobre as quaes ha de haver votação desta Camara. — Em quanto á resolução que S. Ex.ª acaba de annunciar a respeito da inflexibilidade para com os devedores, apoiado, apoiadissimo lhe digo eu; Deos permitta que S. Ex.ª possa ter a força necessaria para levar a diante esta sua resolução. (Apoiados)

Passando agora á questão propriamente da receita e dos pagamentos, direi a S. Ex.ª que na verdade a opinião publica, com quanto fosse talvez algum tanto exaggerada, (como sempre costuma) não foi inteiramente injusta; quando suppoz que se tinha recebido mais do que que se tinha pago: e S. Ex.ª acaba de dizer que se teu» recebido 500 e tantos contos, e

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que não se pagaram senão 370 e tantos; por consequencia nada mais facil do que persuadir-se que em logar de 500 se tivesse recebido 800 contos. S. Ex.ª marcou uma época, até Novembro; e desde então para cá é provavel que alguma cousa mais se terá recebido.

S. Ex.ª disse tambem, que se não tinha distraído daquella receita quantia alguma para outro objecto; eu desejaria saber se S. Ex.ª se acha habilitado para fazer, a este respeito, uma declaração solemne á Camara; declarar formalmente se nenhuma quantia se distraiu daquella receita para outro objecto. (O Sr. Ministro da Fazenda: — Peço a palavra). Por occasião de S. Ex.ª fallar nas Contas que prometteu mandar á Camara, apontou um facto que trouxe uma nuvem de tristeza sobre todos aquelles que desejam ver a nossa Administração organisada: porque S. Ex.ª disse — Que nada constava de cinco Districtos — isto prova o desmazelo que tem havido na cobrança dos dinheiros publicos: e estou persuadido de que o desmazelo que tem havido nesta cobrança, o ha de ter havido em todas as outras: isto é realmente muito para lamentai.... Não sei se aquella confiança que o nobre Ministro diz que tem nas Auctoridades, que não sei quem são, porque não sei quaes são os cinco Districtos, é bem fundada; Deos queira que o seja; mas a fallar a verdade os precedentes não dão muito bom fundamento para isto. Assim não vamos bem... (Uma voz: — Vida nova). Vida nova se disse ao meu lado; assim eu quereria; mas desgraçadamente já ouvi disposições para a vida velha. Entretanto confio nas boas intenções annunciadas pelo nobre Ministro da Fazenda; Deos lhe dê fôrças para poder sustentar as suas idéas, e para poder ser rigoroso não só com os devedores do Estado, mas tambem com os Delegados do Governo, para que cumpram as suas obrigações; aliàs tudo quanto votarmos aqui, são puerilidades e fantazias que indo á pratica não se executam. Faço estas observações que me occorreram, e declaro que estou satisfeito com as explicações que S.Es.8 deu; e unicamente lhe pedia que declarasse se se achava habilitado para affirmar positivamente que se não distraiu quantia nenhuma das sommas recebidas, senão para aquelle fim que a Lei mal cava, isto é, para o pagamento dos ordenados atrasados aos Servidores do Estado.

O Sr. Ministro da Fazenda — Parece-me que com aquillo que eu tinha dicto da primeira vez o nobre Deputado devia ficar contente; mas vejo que insiste de novo n'um ponto, e por isso tornarei a repetir o que disse, para assim satisfazer ao nobre Deputado. Ao quesito de — se se tinham distraído algumas sommas desta receita — eu respondi — que não tinha motivo para me persuadir que tal distracção houvesse, antes confiava, accrescentei eu, que effectivamente senão tivesse distraído sommas nenhumas, porque comparada a differença entre o que se havia recebido, e o que se tinha pago, habilitados os Cofres Como estão em Lisboa, e nas Provincias, para se pagar um mez de soldos, e um mez de ordenados, entendia que esta differença entre os 506 contos recebidos, e os 379 que se pagaram, era sufficiente para satisfazer a estes mezes: e agora accrescento (porque me obriga um devei de lealdade e pundonor) que estou muito longe de suppôr que de facto se distraissem sommas desta receita, porque tenho plena confiança na hora a e probidade do meu Antecessor. Á vista disto não sei que mais possa dizer ao illustre Deputado; parece-me que se reputará satisfeito (Apoiados.)

O Sr. Assis de Carvalho: — Sr. Presidente, pedia a V. Ex.ª consultasse a Camara se me permitte fazer uma pergunta ao Sr. Ministro da Fazenda nesta Interpellação.

Consultada logo a Camara resolveu affirmativamente.

O Sr. Assis de Carvalho: — Eu agradeço á Camara a concessão que acaba de me fazer. A palavra que eu pedi, é para perguntar a S. Ex.ª o Sr. Ministro da Fazenda — se está habilitado para mandar á Camara as Contas, que eu pedi, da Gerencia dos Fundos Publicos desde Agosto do anno passado até Janeiro deste anno.

A Commissão de Contabilidade foi eleita para este fim, e até hoje não tem podido funccionar, porque não tem Contas que contai. Pergunto pois a S. Ex.ª se se acha habilitado para mandar estas Contas á Camara, para a Commissão poder funccionar?

O Sr. Ministro da Fazenda — Não ser se poderei satisfazer cabalmente ao Requerimento do nobre Deputado: em um objecto ião vasto, e de tanta importancia não é possivel estar ao facto neste momento; e mesmo porque, como ha pouco disse em resposta á Interpellação do Sr. Deputado Lopes de Lima, ha cinco Districtos d'onde não consta, que desde Junho a Novembro se tenha realisado alguma desta receita que faz parte do pedido do nobre Deputado. Entretanto pela consideração que tenho por esta Camara, porque reconheço a obrigação do Governo para com o Parlamento, prometto que não me hei de descuidar de satisfazer tanto quanto fôr possivel o Requerimento do nobre Deputado, mandando tudo quanto houver das Contas da Gerencia, a fim de que a Commissão de Contabilidade possa satisfazer á Missão de que a Camara a incumbiu...

O Sr. Presidente: — Esta terminado este incidente Tem a para via o Sr. Luz.

O Sr. J. L. da Luz — Em quanto me persuadi que as malevolas insinuações dirigidas contra o Banco de Portugal tinham origem na inveja, no despeito, nas pretenções mesquinhas, e até no espirito de Partido, conservei-me tranquillo, e descançado esperando que o tempo havia de fazer justiça ao Estabelecimento; esperava que no fim de um certo e determinado tempo os homens honestos, e despreoccupados fariam justiça as intenções das Direcções do Banco de Portugal. Mas, á vista do que se tem passado, não é possivel, Sr. Presidente, esperar mais tempo; é necessario romper o silencio As calumnias tem comovido os homens mais indifferentes, e a desconfiança veiu penetrar até no seio da Representação Nacional! Esta Camara não póde ser indifferente a tantas reclamações. Se ao Banco de Portugal não estivessem ligados tantos interesses nacionaes, se aquelle Estabelecimento existisse sómente para lucro de Particulares, deixa-lo-ia luctar com ósseas competidores, porque não desconfio do triunfo.

Sr. Presidente, é necessario que uma vez se conheça qual é o modo porque o Banco de Portugal cumpre as Leis que o constituiram, e governam; e qualquer que seja o conhecimento que o Governo tenha do que alli se passa, é indispensavel que esta Camara seja informada directamente por uma Dele-

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gação tirada desta Casa. Peço portanto licença para apresentar a seguinte

Proposta.. — «Proponho que esta Camara nomeie uma Commissão de Inquerito, composta de tres dos seus Membros, a qual pelos meios que julgar mais convenientes, examine se no Banco de Portugal se cumprem as Leis que o governam, e informe esta Camara do modo por que alli são tractados os negocios da sua competencia.» — J. Lourenço da Luz.

Foi julgada urgente, e ficou em discussão.

O Sr. Assis de Carvalho. — Sr. Presidente, essa Proposta é de tanta importancia, como aquella minha, que foi remettida a uma Commissão; eu não sei se ella e susceptivel de alguma Emenda ou Additamento, porque nós não podémos rapidamente consideral-a; por tanto eu era de opinião, que a Proposta fosse á mesma Commissão, que é a de Legislação, aonde foi a outra que eu tive a honra de apresentar.

O Sr. Avila: — Eu acho que a nomeação de uma Commissão de Inquerito é muito necessaria, e até conveniente, para que se rasgue o veo a respeito de tudo o que haja de mysterio, e tenha logar n'uma Repartição como esta, que hoje attrae os olhos do Publico, e nisto exerce a Camara um dos seus direitos. Eu não me opponho a que vá á Commissão: sustento a idéa do illustre Deputado, que acaba de fallar; e o que pediria era, que a Commissão de Legislação, a quem supponho que irá a Proposta, a examine com a maior brevidade possivel, e dê com urgencia o seu Parecer para esta questão se terminar o mais depressa que for possivel.

O Sr. J. L. da Luz: — Sr. Presidente, eu julgo a Proposta urgentissima, porque creio estar dado para Ordem do Dia o Projecto, que tem base no Decreto de 19 de Novembro, no qual reconheço a necessidade de se fazerem Emendas, e desejava que a Camara soubesse, ao tempo da discussão, pelo orgão dos seus Membros, o que se passa no Banco de Portugal. E este um negocio em que entra materia muito delicada, que precisa ser tractada com madureza, e tambem com toda a verdade. Não posso pois conformar-me com a demora que resultaria de a Proposta ir a uma Commissão.

Ainda direi á Camara, o meu desejo a respeito dos caracteres que devem compor a Commissão Inspectora, ou de Inquerito. Sem deixar de dar á Camara toda a liberdade na escolha, é obvio que, se ella assim o entender, não deve essa Commissão ser composta de interessados no Banco. (Apoiados) Eu desejo, que quem lá for, senão fascine: não é isso de esperar; mas póde ser que sendo interessados, se julgue, que hão de ter em vista a conservação, e melhor estado do Estabelecimento, o que nem sempre é conforme com os interesses geraes. Não faço Proposta, mas desejaria que a Commissão não fosse composta de interessados na Companhia, cuja gerencia se vai examinar.

O Sr. Pereira de Mello: — Sr. Presidente, eu tinha pedido a palavra sobre a materia, mas desisto della, porque não contesto a idéa de que a Proposta vá a uma Commissão. Porém pedi a palavra sobre a Ordem como Relator da Commissão de Legislação, para responder ao Requerimento que fez o Sr. Assis de Carvalho, que me parece não ser a Commissão de Legislação a mais competente para lhe ser a Proposta remettida: e dou a razão. Se o direito de nomear esta Commissão fosse um ponto de Jurisprudencia Constitucional duvidoso, então entendia eu que era conveniente que fosse á Commissão de Legislação, para dar o seu Parecer; mas não vendo eu que na Camara haja a menor duvida de que ella tem o poder de nomear essa Commissão, em vez de me parecer conveniente que a Proposta vá á Commissão de Legislação, entendo pelo contrario, ao olhal-a pela sua natureza, que a Commissão mais propria neste caso seria a Commissão de Fazenda. Nada mais direi, porque foi só para isto que pedi a palavra a fim de responder ao illustre Deputado pelo Algarve.

O Sr. Avila. — Peço a V. Ex.ª que tenha a bondade de mandar ler a Proposta do Sr. Deputado, sobre que versa a discussão (Leu-se).

O Orador: — Eu tinha pedido a palavra para dizer á Camara, que os escrupulos do illustre Deputado, Auctor da Proposta, são muito louvaveis (Apoiados); o illustre Deputado tem razão em querer que esta Proposta seja approvada, mas não sei se a Camara quererá approva-la assim; porque este objecto é grave, é gravissimo, é a primeira vez que se nomeia uma Commissão desta natureza; eu faço votos para que com a maior brevidade seja conhecido na sua verdadeira luz este negocio; mas para que a Camara vote com verdadeiro conhecimento, parecia-me que, ao menos, devia haver o intervallo de uma Sessão entre a apresentação do Requerimento, e a sua discussão; o que agora já não é possivel, em vista da votação da Camara: e não sei se será conveniente que está discussão tenha logar, sem que esteja presente o Governo. Eu desejava, que a Proposta fosse a uma Commissão, por esta razão; mas que a Commissão désse o seu Parecer com a maior brevidade; as razões apresentadas pelo illustre Relator da Commissão de Legislação são fortes; mas eu entendo que ou a essa, ou a outra, que se nomeie especialmente, o negocio deve ser entregue, e para senão demorar mais tempo é que disse, que fosse á Commissão de Legislação, por ser sem contradicção, a Commissão mais competente: por tanto insisto em que vá a esta, ou á Commissão que a Camara determinar, e que sejam convidados os seus Membros a apresentarem com a maior brevidade o seu Parecer sobre essa Proposta.

O Sr. Silva Cabral: — Sr. Presidente, a questão é simplicissima, mas o objecto é grave, não obstante a simplicidade que me parece acompanha-lo; e de certo deve ser tractado como um negocio serio, e com a sizudeza que elle merece; porém nessa mesma simplicidade está já, por assim dizer, definido o modo, porque a Camara ha de proceder.

O illustre Deputado, Auctor da Proposta, é digno dos maiores elogios (Apoiados); porque não é só o illustre Deputado que fallou, é tambem o Director do Banco de Portugal que se apresentou a querer ir adiante de todos os preconceitos que, bem, ou mal, tem existido a respeito d'aquelle Estabelecimento. A questão por consequencia é de saber, se a Camara se deve ou não julgar habilitada para decidir desde já este negocio que, em outras circumstancias, tinha sido trazido por um illustre Deputado que se senta nos bancos superiores: eu entendo que não se póde deixar, desde já, de decidir este objecto, é entendo que não ha motivo absolutamente nenhum, para que, a Camara não use

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de uma attribuição, que ninguem lhe póde contestar.

Tem-se aqui requerido muitas vezes nomeações de Commissões de inquerito, mas para que fim, em que termos, e em que conjuncturas?... Tem-se requerido, póde ser, com mais ou menos justiça pelos illustres Deputados da Opposição para o fim de inquerir tal, ou tal ponto que intendem, ou que entendiam ser ou dever ser objecto da sua Interpellação, para o effeito de censurar algum acto da Administração. Não me compele agora investigar se por ventura Os Govêrnos, e as Camaras, neste ponto, decidiram bem ou não em evitarem as nomeações de taes Commissões, que sempre, que se apresentaram, foi como meio de opposição; mas na actualidade variou muito a questão; na actualidade apresenta-se um Membro desta Camara, um Deputado, que tambem não declina a sua responsabilidade como Director do Banco de Portugal, apresenta-se, digo, da maneira a mais explicita com a reunião destas duas qualidades, e diz — Vai tractar-se d'uma grande e solemne questão; esta grande questão diz respeito á organisação do Banco de Portugal; preciso, antes de tudo, que esta Camara, por meio d'alguns de seus Membros va ver como aquelle Estabelecimento tem preenchido os seus deveres, e marchado na sua administração» — e nestas circumstancias, a Camara dos Deputados ha de recuar diante d'uma petição, e nomeação que o mesmo Banco lhe vem pedir, a fim de que se conheça como tem sido a sua gerencia? E ha de ser uma questão de methodo que impeça o conhecer-se, e preencher-se um objecto de tanta gravidade?... Haverá motivo digno d'attenção que possa impedir o decidir-se já sobre este negocio?... Não ha muitas circumstancias que justificam o proceder da Camara nomeando a Commissão «obre objectos de similhante natureza?... A Carta Constitucional diz que ás Côrtes pertence velar na guarda da Constituição, e vêr se por ventura ella e as Leis teem sido observadas, e outro sim ter em attenção o bem geral do Estado: não é fóra de duvida que, por mais de uma vez, se tem sustentado, e mostrado que os interesses do Banco estão unidos hoje aos interesses da Nação, e que os interesses da Nação estão inteiramente ligados com o Banco; velar pois pela manutenção das Leis que dizem respeito aos interesses do Banco é velar pela manutenção do que diz respeito aos interesses da Nação; póde pois dizer-se que no espirito da Carta estão auctorisadas taes Commissões.

Cumpre aqui o observar que taes esclarecimentos podem ser ministrados pelo Governo, que este tem interesse em nos apresentar todos os esclarecimentos; mas quando estes esclarecimentos podem vir por maneira tão solemne, e tão official vindo por uma Commissão que sáia do seio desta Camara, e claro que não póde deixar de se dizer que isto deve satisfazer mais, e habilitar para julgar melhor que outros esclarecimentos, que venham por outro modo qualquer.

Por tanto não é possivel primeiramente duvidar-se que esta Camara tenha o direito, como um dos iamos do Poder Legislativo, de dispor tudo aquillo, que julgue que é conveniente, para ver se a Constituição, e as Leis se observam; e, neste caso, é impossivel que a Camara deixe de se prestar a nomear uma Commissão, a fim de ver se o Banco tem prehenchido os preceitos da Lei, se na sua gerencia tem, em tudo, e por tudo, marchado em harmonia com a Lei; mas tambem se no mais tempo tem caminhado convenientemente: dá-se neste objecto a maior latitude, e nenhumas outras instrucções ha que se possam fornecer a uma Commissão: e ha de hoje a Camara recuar diante da Proposta de nomeação d'uma Commissão sua?.... Sr. Presidente, prender-se a Camara por essa nomeação, por motivos de mera formalidade, e, sem dúvida nenhuma, deferir para longo tempo o que, por mais de uma vez, se tem declarado não só urgente, mas urgentissimo. Eu não vejo motivo nenhum para que, em objecto de tanta gravidade, sómente por esta questão de methodo, se haja de espaçar negocio similhante.

Por consequencia justas, e concludentes foram as rasões que apresentou o illustre Relator da Commissão de Legislação, quando sustentou, que não havia necessidade de esta Proposta ir á Commissão, porque se se não contesta á Camara o direito de nomear a Commissão de Inquerito, para que ha de deixar de resolver já este negocio, mandando-o previamente a uma Commissão para o examinar? Não ha motivo plausivel para a Proposta ir a uma Commissão, por que a Commissão não tem nada a fazer sobre este ponto. Voto por tanto pela Proposta para que a Commissão resolva já o pedido que nella se faz. (Apoiados)

O Sr. Assis de Carvalho: — Sr. Presidente, o negocio é simples, e verdade, mas tambem é grave: ninguem duvida do direito, que a Camara tem para nomear esta Commissão de Inquerito; mas o negocio não é simples quanto ás attribuições que se devem dar á Commissão, e em quanto á redacção, que deve ter esse Requerimento, quando pertende definir as attribuições da Commissão, que sendo de Inquerito, não precisa ser definida. Eu entendo, que havendo-se julgado urgente o Requerimento, seria necessario, que fosse a uma Commissão para formar os termos em que deve ser approvado; nomear uma Commissão de Inquerito para ir examinar se as operações do Banco estão legaes, entendo, que não preenche as vistas, nem os desejos do Publico, e da Camara; as operações do Banco podem estar muito conformes, muito em harmonia com o Decreto de 19 de Novembro, ou outras Leis especiaes, que regulam este objecto; mas é preciso examinar se, não obstante essas operações estarem legaes, são ellas ou não prejudiciaes ao Credito Publico, ao dos Accionistas, e a outros grandes Estabelecimentos; se o monopolio, e privilegios de que o Banco vive, lhe devem ser concedidos em tão grande extensão por Utilidade Publica, etc; ver as relações desse Estabelecimento com outros Estabelecimentos de identica naturesa: e não sei que isto se possa conseguir com a nomeação da Commissão tal como se requer, porque o Requerimento dá attribuições restrictas á Commissão de Inquerito; desejo que se lhe dê attribuições mais amplas, todas as que são inherentes a uma Commissão de Inquerito. E por isso não achava conveniente decidir este negocio na mesma Sessão, a fim de ver quaes devem ser as attribuições dessa Commissão, que devem ser mais alguma cousa do que examinar se as operações do Banco estão legaes: e para tal fim é mister que a Proposta vá a uma Commissão; lembrei-me da Commissão de Legislação, por ser aquella onde já existe alguma cousa a tal respeito.

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O 81 Presidente — Cumpre-me notar ao illustre Deputado, que a Proposta da á Commissão a maior latitude possivel. (Apoiados) E como o Sr. Deputado talvez não esteja bem ao alcance dos termos em que ella e concebida, por isso vou lei essa Proposta; diz ella. (Leu)

O Sr. J. L. da Luz — Eu pedi a palavra para declarar que não trago commissão do Banco para fazer esta Proposta. O Sr. Conselheiro Silva Cabral quando se referiu á minha pessoa, pareceu indicar que eu representava aqui o Banco, não represento, mas não posso declinar a responsabilidade de tudo que la se tem feito. (Apoiados) Devo declarar que sobre a Proposta que apresentei, não houve reunião, ou resolução alguma tomada a tal respeito na Administração do Banco: a Proposta e pura e simplesmente minha.

Eu disse que era necessario que a Camara fosse examinar o que se passa naquelle Estabelecimento, porque me parecia que a Camara tinha direito para o poder fazer, (Apoiados) e se quizesse esperar as informações que hão de VII pelo Governo, então esperaria o resultado do Parecei que for dado sobre a Proposta ha dias aqui feita pelo Sr. Deputado Assis, (Apoiados) mas eu queria mais alguma cousa que S. S.ª, o nobre Deputado pertendeu que o Governo examinasse por meio de inquerito, ou por outro algum meio, ou modo o que ha a respeito de operações do Banco; pois eu quero que a Camara vá directamente ao Estabelecimento, por meio dos Membros que nomear, que examinem tudo, e que depois venham á Camara dizei o que la se passa (Muitos apoiados)

Em quanto á restricção que o Si Deputado AssÍ3 entendeu que traria a Proposta, parece-me que já deve estar satisfeito, depois da leitura que ella teve m Mesa — a Proposta e o mais simples possivel, não se restringe só a que se veja se as operações estão feitas segundo as Leis ou auctorisação do Governo, ou das Côrtes, mas sim amplia-se a todos os actos practicados pela Administração do Banco, para vêr se em tudo, e por tudo andou conforme os interesses Publicos e particulares, isto é, dos interessados no Estabelecimento; não havendo Estabelecimento algum de credito que possa subsistir se os interesses que são nelles comprehendidos, se não casarem com os interesses communs P01 tanto desejo que se veja tudo quanto se tem feito, e espero que depois de um tal processo, a Camara ha de ficar satisfeita. (Apoiado, apoiado)

O Sr. Fana Barbosa. — Sr. Presidente, estou convencido que nem a Camara contesta o direito da nomeação, nem recusa diante da Proposta que se fez. eu julgo a questão simples, com tudo julgo-a tambem grave, e por isso entendo que devemos ter em vista duas cousas; primeiro que se dê o tempo necessario para a Camara podér ver quem serão as pessoas mais competentes, e mais habilitadas para compor essa Commissão, e preciso saber-se que mandato lhe dá a Camara, e até que ponto podem chegar as suas attribuições, e isto que me parecia que devia sei sujeito a uma Commissão, e não farei questão sobre qual deve ser, não direi que vá a esta ou aquella Commissão Agora o que me parecia que, pelo menos, era indispensavel, era que a Commissão, caso ser approvada a Proposta, não fosse eleita hoje, que se desse tempo para a Camara pensai: não me opponho a que a Proposta dê bastante latitude a Commissão para ella fazei bem o seu exame, e va depois dizei á Camara o estado do Banco, mas opponho-me a que a Commissão seja nomeada hoje, quero que se dê tempo para a Camara pensar quaes d'entre os seus Membros serão os mais habilitados para compor essa Commissão.

O Sr. Rebello da Silva: — Sr. Presidente, eu conformo-me inteiramente com as razões apresentadas pelo Sr. Deputado que se senta no banco superior, o Si Silva Cabral, não vejo razão plausivel para demorar a approvação de uma Proposta que verba sobre negocio, que toda a Camara tem necessidade de conhecer, (Apoiados) e isto e tanto mais attendivel quando está proxima uma discussão grave, relativa ao Estabelecimento de que se tracta. A Camara quer entrar na discussão do Decreto de 19 de Novembro de 1846, carece de informações a tal respeito, e ella não os poderei aqui, nem mais completos, nem mais terminantes que aquellas que sanem de pessoas do seu seio Foi conseguinte não vejo razão nenhuma para mandarmos uma Proposta destas para o Oratorio de uma Commissão: acho da maior conveniencia que este negocio corra o mais breve possivel, e a brevidade neste caso não exclue essa medida Entendo que é da honra do Parlamento discutir o Decreto del9 de Novembro, mas munido de dados verdadeiros, para podér conhecer se as accusações que se teem feito são exactas, e mesmo se aquelle Estabelecimento carece ou não carece de modificações importantes, o que não poderemos saber, sem VII mos no conhecimento dos factos

Voto por tanto porque seja immediatamente considerada pela Camara a Proposta, e não por que va a uma Commissão, que sobre ella dê um Parecer. O Sr. Silva Cabral — Sr. Presidente, parece que te nos sempre a recuar diante do verdadeiro progresso parlamentar em vez de aproveitarmos as lições da experiencia, e daquelles Paizes que nas practicas Parlamentares estão mais adiantados que o nosso, estamos a tornar duvidoso aquillo que nunca o foi para esses Paizes, muito mais no estado de adiantamento e que elles se acham.

Maravilha me que quando se tracta de uma Commissão de Inquerito se duvide qual e a theoria Constitucional a semelhante respeito. — Tambem me maravilha que se estaes aqui a dizer que uma Commissão de Inquerito proposta para um Estabelecimento não tem toda a latitude possivel para o considerar a todos Os respeitos. (Apoiados) Isto em uma Camara Alta podia ainda ter alguma desculpa, mis na Camara dos Eleitos do Povo de certo não deve semelhante theoria passar pela imaginação de ninguem. (Apoiados)

Sr. Presidente, porventura tractamos nós de questionar a Camara o direito de nomear esta Commissão de Inquerito? Não. Temos nos algum motivo para duvidar da necessidade do fim para que ella é estabelecida? Não Pois se estas duas cousas, se estes dois objectos, se estes dois pontos eram os unicos que nos podiam impedir de tomar uma resolução no sentido em que se propoz, e se ahi não temos duvída nenhuma, para que havemos nós de impedir o andamento de um negocio que mais de uma vez temos declarado urgente? (Apoiados)

Sr. Presidente, nunca se tractou, a ninguem passou pela imaginação que esta Commissão de Inquerito fosse eleita na Sessão de hoje; não passou isto

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pela imaginação de ninguem (Apoiados) É certo que o illustre Auctor da Proposta quando a apresentou, ou pelo menos quando fallou sobre ella, disse que lhe parecia que nenhum do, interessados no Banco devia sei Membro da Commissão, e é necessario que esta declaração seja muito bem entendida, porque desta maneira eu acho que nem Directores nem Accionistas devem entrar no numero dos Membros dessa Commissão, e que os illustres Deputados que tiverem uma ou outra qualidade, hão de ter sufficiente coragem, hão de ter bastante prudencia, e de certo a tem cada um delles, para dizerem — Eu não posso ser Membro da Commissão per que estou n'uma ou n'outra classe. É necessario que o voto dessa Commissão venha o mal, insuspeito que é possivel (Apoiados), e para que venha o mais insuspeito que é possivel, e preciso que sobre o ponto dado não haja nem direitos nem interesses, por mais rectas que fôssem as intenções dos illustres Membros da Commissão que fosse nomeada, uma vez que se desse nelles uma ou outra qualidade, poderia muito bem ajuizar-se, ainda com injustiça, sobre a rectidão das duas intenções. (Apoiados)

Sr. Presidente, escusado e trazer para aqui a historia dessas immensas Commissões de Inquerito, e a que se está a proceder com bastante frequencia no Parlamento Inglez (Apoiados) Alli tracta-se do Correio manda-se uma Commissão do Parlamento examinar este vastissimo Estabelecimento em todas as suas ramificações, alli tracta-se da Companhia das índias, e uma Commissão de Inquerito sahe do Parlamento a examinar o negocio de que se tracta em toda a sua extensão alli tracta-se do Banco, outra Commissão de Inquerito, e mais de uma vez desde 1799 se têem nomeado Commissões de Inquerito para tractarem deste Estabelecimento Pois será menos importante, na atenção das nossas faculdades, a nomeação de uma Commissão de Inquerito pua o Banco de Portugal, que bem ou mal tem excitado tantas apprehensões. Para o Banco de Portugal que é necessario preparar-se par V utilidade publica, e não sómente destes ou daquelles interessados no mesmo Banco, com todos os meios para fazer com que a opinião publica, e com que o juizo do Parlamento asserte sobre bases justas e retas? De certo, Sr. Presidente, não vejo motivo nenhum para que um objecto de 1 mesmo tão explicito, tão claro seja defendo se nós tivessemos duvída em algum dos pontos que se apresentam, de certo deviamos proceder com a circumspecção com que estes Corpos, com que uma Camara deve proceder, mas fóra disso, não havendo essas duvidas, não vejo para que deferir este negocio (Apoiados)

Sr. Presidente, eu não podia referir me ao meu illustre migo, o Si Deputado por Lisboa no sentido em que me pareceu tocar, a que me pareceu illudir, porque ninguem e mais restricto em consideração pelas pessoas do que eu, póde alguem ser tanto, porem mais não Eu considero que existem aqui Deputados, e sòmente Deputados, mis quando o illustre Deputado por mais de uma vez tinha alludido as suas qualidades de Deputado, e de Director do Borico, quando tinha dito que, por m tis que se dissesse, estas duas qualidades eram nelle inseparaveis, quando a snd Proposta tinha vindo desta dúplice qualidade, e claro que eu não podia deixar de tornar esta circumstancia sensivel a Camara para mostrar que o illustre Deputado tinha razões fortissima», razões justissimas, e que lhe deviamos toda a consideração, todo o reconhecimento por vir propôr nessa duplicada qualidade um objecto tão importante nesta Camara S. Ex.ª como Deputado podia fazer o seu Requerimento, mas quando a essa qualidade ajunta a de Director do Banco de Portugal, e vem com tanta franqueza apresentar os actos daquelle Estabelecimentos ao conhecimento da Camara, e requerer um exame delles, disse eu que negar-lh'o era commetter uma duplicada injustiça foi sómente neste sentido que eu fallei, accrescentando que era louvavel o procedimento do illustre Deputado em dois sentidos, porque era Deputado, e por que era Director do Banco, poraue vinha, para assim dizer, prevenir todas as objeções que se podiam fazer Por consequencia já vê que eu não podia suppôr que o illustre Deputado Venha representar o Banco, já que o Banco não tem aqui representantes, nem os poderes, aqui o que ha e Representantes da Nação, do Banco ou de qualquer outro Estabelecimento, não admitto aqui não vejo representado senão o Poder Executivo pelo Ministerio, e o Legislativo pelos Membros da Camara.

Por tanto parece-me que o illustre Deputado deve ficar ao facto das minhas intenções, e convencido de que eu não podia alludir a S Ex.ª de outra maneira.

O Sr. Assis de Carvalho — Sr. Presidente, e para mim realmente admiravel, que o illustre Deputado, que se senta no banco inferior, empenhasse todo o seu talento, e eloquencia para impugnar opiniões abstractas, opiniões que ninguem aqui apresentou. O illustre Deputado principiou dizendo, que realmente esta Camara ía um pouco no retrocesso das suas attribuições, quando queria contestar o direito que tinha de nomear uma Commissão de Inquerito. Eu não vi ainda que se proferisse similhante opinião na Sessão de hoje ninguem duvída de que esta Camara tem o direito de nomear Commissões de Inquerito. Continuou o illustre Deputado empenhando o mesmo calor, o mesmo talento, e a mesma eloquencia para nos demonstrar o que era uma Commissão de Inquerito Tambem me parece, que empenhou glande preciosidade sem precisão, para uma demonstração, que é de simples intuição Eu disse, Sr. Presidente, que se a Proposta do illustre Deputado pela Estremadura se reduzisse simplesmente a dizer, que queria uma Commissão de Inquerito, todos nós sabemos o que é uma Commissão de Inquerito, e então eu votiva por ella, mas como a Proposta do illustre Deputado fallava de uma Commissão de Inquerito para ver se se cumpriam as Leis, dizia eu, que podem fazer objecto de questão as attribuições, que se davam a essa Commissão de Inquerito já se vê portanto, Sr. Presidente, que o empenho que o illustre Deputado tomou em nos demonstrar o que era uma Commissão de Inquerito, e em nos demonstrar, que esta Camara tinha direito de nomear essa Commissão, foi inutil, porque nenhum de nos impugna o direito que esta Camara tem de nomear essa Commissão, e nenhum de nós deixa de conhecer o que é uma Commissão de Inquerito, sem que seja necessario reforçar esta opinião com argumentos usados dos Parlamentos estrangeiros se alguma censura podia caber no empe-

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nho, que o illustre Deputado tornou nesta opinião, é ao illustre Auctor da Proposta, quando dizendo-nos, que se nomeasse uma Commissão de Inquerito, queria definir as attribuições, que eu não queria que se definissem, queria que se dissesse sómente — uma Commissão de Inquerito — porque então todos votavamos sem difficuldade, porque todos sabemos o que é uma Commissão de Inquerito. Já se vê, que o empenho que o illustre Deputado tomou não póde ser referido ao que eu disse.

Mas, Sr. Presidente, é necessario passar a um terceiro ponto. O illustre Auctor da Proposta, e o illustre Deputado a que me refiro, empenharam-se muito em fazer convencer a Camara de que a Commissão, que se houvesse de nomear, não devia ser composta nem de Directores, nem de Accionistas do Banco de Portugal. Sr. Presidente, eu conformo-me nesta douctrina perfeitamente, e tanto assim, que se não viessem antecipar-me em uma opinião, que me póde ser lisongeira, eu tinha tenção de dizer a V. Ex.ª e de declarar á Camara, que se fosse nomeado para essa Commissão, não acceitava, e declaro ainda mais, que se de hoje por diante deixasse de ter Accionista do Banco de Portugal, estando no direito de ser no meado para a Commissão, assim mesmo não ia lá: por consequencia se os Srs. Deputados, que pertendem estabelecer esta practica, se referem a mim, em quanto eu possa fazer parte dessa Commissão, declaro a V. Ex.ª e á Camara, que ainda que seja nomeado para ella, não vou lá.

O Sr. Presidente: — Esta exhausta a inscripção, e sufficientemente discutida e Proposta.

Vou pois antes de tudo consultar a Camara sobre se a Proposta ha de ou não ir a uma Commissão...

O Sr. Pereira de Mello: — Eu perguntava a V. Ex.ª se na Mesa ha alguma Proposta nesse sentido?

O Sr. Presidente: — Não é precisa Proposta por escripto; o Regimento ou Estylo para isto não o exige.... Como houve Proposta oral, e discussão sobre este ponto, não posso deixar de a submetter á votação da Camara. — Os Srs. que approvam que esta Proposta seja remettida a uma Commissão, para sobre ella dar o seu Parecer, tenham a bondade de se levantarem.

Não foi isto approvado. — E posta logo á votação a Proposta, foi approvada.

O Sr. Presidente: — Na Sessão immediata ha de proceder-se a Eleição desta Commissão.

O Sr. Palmeirim: — Eu pedi a palavra para mandar para a Mesa um Requerimento assignado por 40 Senhoras, Pensionistas de não consideração, e pedem providencias.

Sr. Presidente, a materia da Interpellação, que hoje teve logar nesta Camara, é por si só bastante para avaliar precisamente a desgraça em que se acham estas Senhoras; entretanto, eu peço a V. Ex.ª que me permitta ter alguma cousa das palavras, que as mesmas Senhoras proferem....

O Sr. Presidente: — Peço licença ao Sr. Deputado para lhe observar, que na Camara não se apresentam Requerimentos de uma ou outra Senhora; apresentam-se só Representações de Corporações: esses Requerimentos lançam-se na Caixa; não é estylo, nem se póde admittir, que se apresentem na Camara. Por consequencia convido o Sr. Deputado a mandar o Requerimento para a Caixa.

O Sr. Palmeirim: — Como o Requerimento é

collectivo, é de 40 Senhoras, por isso o apresentei: entretanto em vista do que V. Ex.ª diz, vai para a Caixa.

O Sr. Presidente: — Não obstante não ser de Corporação, manda-se extractar, e dar-se-lhe-ha seguimento.

O Sr. Alexandre José Botelho: — Sr. Presidente, o meu Projecto vai despido de Relatorio, por ser muito simples na fórma, e pelo julgar tambem simples no fim. Elle tem por objecto fazer declarar, que Jurisconsultos, que exercem o Officio de Julgadores, e ainda mais de Relatores, são Juizes. — O Projecto é o seguinte. (Leu)

Ficou para segunda leitura, e quando a tiver, se transcreverá.

segundas leituras.

Iniciativa que renovou o Sr. Rebello da Silva, do Projecto sobre a Propriedade Litteraria, apresentado em 1840 pelo Sr. Garret. (Está a pag. o85 do Vol. de Julho de 1840).

O Sr. Presidente: — A Camara ouviu, que o Sr. Deputado Rebello da Silva, renova a Iniciativa do Projecto de Propriedade Litteraria, apresentado pelo Sr. Garret na Legislatura de 1840; esta é a segunda Leitura. Consulto pois a Camara sobre a admissão á discussão.

Foi admittido á discussão, e remettido á Commissão de Instrucção Publica.

Continuou-se na segunda Leitura da seguinte

Proposta. — Proponho, que á Commissão de Fazenda sejam adjunctos dois Membros de cada uma das Commissões de Administração Publica, de Legislação, Ecclesiastica, de Guerra, e de Marinha e Ultramar, eleitos por ellas, e que comporão a Commissão, que ha de dar o parecer sobre o Projecto de Lei da Despeza do Estado.» — Ferreira Pontes.

Foi admittida, e entrou em discussão.

O Sr. J. L. de Mello: — Sr. Presidente, eu não pedi a palavra para combater a Proposta, adopto o pensamento della, porque me parece que dahi ha de vir muita utilidade. É justo que na Commissão de Fazenda haja conhecimento de todas as especialidades das outras Commissões; mas a experiencia tem mostrado que as Commissões muito numerosas, ordinariamente, embaraçam-se nos seus trabalhos. Por consequencia eu proponho que em vez de dois Membros de cada Commissão, seja só um, por exemplo, o seu Relator, e mando para a Mesa neste sentido a seguinte

Proposta. — «Proponho que á Commissão de Fazenda sobre o objecto do Orçamento se aggregue o Relator década uma das Commissões lembradas pelo Sr. Pontes.» — J. L. de Mello.

Foi admittida, e considerada como Emenda d do Sr. Ferreira Pontes.

O Sr. Ferreira Pontes: — Sr. Presidente, a minha Proposta não foi combatida, antes se reconheceram os fundamentos com que a sustentei. A Emenda a ella sómente se limita ao numero, para que em logar de dois Membros de cada uma das cinco Commissões seja um só, e este o Relator: não insistirei no numero, depois de ouvir as razões em que se fundou a Emenda, porque nella se incluiu o mesmo pensamento, que é ser a Commissão de Fazenda, para a confecção da Lei da Despeza do Estado, coadjuvada pelas Capacidades especiaes de cada uma das di-

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Versas Repartições, a fim de se attender convenientemente a todos os ramos do serviço publico.

O Sr. Agostinho Albano: — Sr. Presidente, não me levanto para me oppôr á Proposta, creio ao contrario que se deve dar toda a amplitude possivel aos desejos que ha da parte da Camara que todos os objectos de Fazenda lhe sejam bem conhecidos; não me opponho pois a isso. Mas, Sr. Presidente, é necessario marchar de modo que possamos obtêr os resultados que desejamos. Nesta Casa, em outro tempo já houve uma Commissão chamada do Orçamento, que era metade da Camara; os resultados dessa Commissão, ou Assembléa são bem conhecidos; creio que V. Ex.ª, eu, e muitos mais que estamos aqui, fomos Membros desse Synnedrio, do qual não resultou a utilidade, e vantagem que se esperava.

Eu convenho, que particularmente na discussão do Orçamento intervenham quanto seja possivel as Commissões desta Casa, que mais directa relação tiverem com o mesmo Orçamento, como a Commissão de Legislação, a de Guerra, a de Marinha, a Ecclesiastica etc. que devem ter conhecimentos muito especiaes sobre os diversos pontos que alli se tractam; mas só na questão do Orçamento; agora tudo que são negocios privativos da Commissão de Fazenda, esses devem ser tractados sómente por ella. Entretanto não me opponho a que a Commissão em vez de ser composta de sete Membros seja de 14, 21, ou 50, quanto mais, melhor; mas o resultado é que se o negocio fôr feito, como se costuma fazer nas grandes Commissões, a final Não de assignar, não digo de cruz, mas, como se lá diz, na fé dos padrinhos. Algumas vezes tenho eu assignado assim, ainda o anno passado prestei a minha assignatura a um Projecto de que hoje estou muitissimo arrependido, mas não ha já remedio, o não tenho duvida em declarar que errei, porque errare humanum est. Assim me aconteceu com a Lei de 26 de Agosto, aonde se estabelecei as disposições, que eu não assignava, se tivesse lido com mais alguma attenção, mas depois não tinha remedio. Por isso digo que por as Commissões serem muito numerosas, nem por isso se segue que sejam as mais proveitosas, e então parecia-me que bastava que se nomeasse um Relator de cada uma das Commissões que tem parte no Orçamento para tractarem não só do Orçamento da Despeza, mas tambem do da Receita. Entendo que assim ficavam preenchidos os desejos do illustre Deputado, e da Carnal a, e neste sentido voto pela Proposta do illustre Deputado.

O Sr. J. L. de Mello — O pensamento da minha Emenda concorda exactamente com o que acaba de dizer o illustre Deputado, o Relator só parecia-me que prehenchia o fim, que quer o illustre Deputado. Eu entendo que o fim é obter a Commissão de Fazenda os esclarecimentos necessarios nessa materia do Orçamento, e para este fim basta o Relator de cada Commissão. À experiencia tem mostrado, como acaba de dizer o illustre Deputado, que tanto mais numerosas são as Commissões, quanto menos bem trabalham, e isso é que eu quero evitar, propondo que fosse só o Relator de cada Commissão.

O Sr. Xavier da Silva. — Peço a V. Ex.ª que tenha a bondade de mandar lêr as duas Propostas.

(Leram-se)

O Sr. Xavier da Silva: — Eu concordo com a opinião do illustre Deputado, Auctor da Proposta mas não pela maneira porque ella está redigida. O illustre Deputado o que deseja, é que dois Deputados nomeados por cada uma das Commissões juntamente com a Commissão de Fazenda tractem de examinar d Orçamento na parte da Despeza; pois, Sr. Presidente, eu vou mais longe do que o illustre Deputado, porque como tenho a honra de pertencer á Commissão de Fazenda, estimo vêr junto de mim muitos illustres Deputados que me possam alliviar do grande cargo, que tem aquella Commissão; mas eu não só quero que os illustres Deputados façam parte da Commissão para examinarem a Despeza, como tambem quero que tractem da Receita; porque não ha nada melhor do que a Guerra querer ter as suas Repartições competentes, a Justiça o mesmo, os Ecclesiasticos tambem, a Marinha etc. e ninguem querer dizer os meios, porque isso se hade fazer: essa é que é a parte odiosa, porém como querem os commodos, queiram tambem os incommodos.

Eu proponho que haja uma Commissão de Orçamento para examinar toda a Receita e Despeza, e para isto até não são precisos lá os Membros da Commissão de Fazenda, póde nomear-se uma Commissão Especial para esse fim, que vá buscar depois os esclarecimentos ás Commissões e á Camara: é melhor que haja uma Commissão Especial para tractar desse objecto, porque até ficam os Membros da Commissão menos embaraçados com trabalhos, e assim todas as Classes podem ser representadas.

Por tanto requeiro que se nomêe uma Commissão de Orçamento, e que esta Commissão, ou seja tirada da Camara, ou de um numero igual de Membros de cada uma das Commissões; e tambem não digo, que sejam os Relatores, seja quem fôr: muitas vezes um Deputado n'uma Commissão não quer ser Relator, porque não quer estar sempre em campo, mas não deixa por isso de ter grandes conhecimentos. Concluo, repito, pedindo que se nomêe uma Commissão de Orçamento para examinar a Lei da Receita e Despeza em todas as suas partes, e que seja como a Camara quizer.

O Sr. Presidente: — A Proposta do Sr. Deputado J. J. de Mello parece-me que comprehende uma e outra cousa; mas se a idéa do Sr. Deputado, a quem convido para a declarar, não foi esta, então convido o Sr. Xavier da Silva a mandar a sua Proposta. Parece-me com tudo que a Proposta do Sr. J. J. de Mello comprehende as duas cousas, Receita, e Despeza.

O Sr. J. J. de Mello — Sim, Senhor.

O Sr. Palmeirim: — Pedi a palavra apenas para manifestar que é impossivel serem os Relatores das Commissões Membros natos da Commissão do Orçamento. O anno passado fui eleito para organisar o Orçamento do Ministerio da Guerra, em consequencia da divergencia que houve entre as Commissões de Fazenda, e Guerra, que deu logar a crear-se uma Commissão Mixta a que presidiu o Governo para assim se resolver o negocio: mas sendo o Orçamento da Guerra o mais difficultoso tambem este anno sou Relator da Commissão de Guerra; assim como tambem pertenço ás Commissões de Marinha, Estradas, e Contabilidade: o Governo apresentou algumas medidas importantissimas, que devem ser examinadas nestas Commissões; quem ha de tractar disso são os Relatores; mas como o podem fazer indo destacados para a Commissão do Orçamento? Pare

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era-me pois que o mais conveniente seria nomear cada uma das Commissões um dos seus outros Membros mais aptos para adjuntos áquella Commissão do Ornamento.

O Sr. Carlos Bento: — (Sobre a Ordem) Pedi a palavra, porque me parecia, que se podia attalhar esta discussão, e passarmos á Ordem do Dia..São duas horas e meia.

O Sr. Presidente: — É uma cousa que não valia a pena de gastar tanto tempo — mas agora não póde interromper-se sem se decidir. (Apoiados)

O Sr. Ferreira Pontes — Sr. Presidente, o unico argumento que se produziu contra a Proposta foi a de ficar a Commissão composta de um grande numero de Membros, e com os inconvenientes que já se experimentaram, quando foi composta por semilhante modo, que foi não se levar ao cabo nenhum trabalho: mas os precedentes para mim pouca força tem, porque os ha para tudo, e alguns pouco parecem ser seguidos.

Eu propuz que esta Commissão désse só o seu Parecei sobre a Despeza; porque nesta parte e que a Commissão terá mais precisão de ser coadjuvada, por não ter talvez todos os conhecimentos especiaes dos diversos remos do Serviço: o que é indispensavel é que esta razão, em que principalmente me fundo, se não verifique quanto á parte do Orçamento, que diz respeito a Lei de Meros.

Os meus desejos é que se tracte em primeiro logar desta Lei, isto e da Receita, e assim o propuz na Sessão postada, para que a cifra que ella produzisse, se sujeitasse a da Despeza; porém este methodo não foi adoptado, nem tenho esperança que o seja agora; se o fôr, não acontecerá o que se está observando, que é não haver meios para cobrir metade da Despeza que se decretou, e assim acontecera sempre.

O Sr. Xavier da Silva. — (Sobre a ordem) Sr. Presidente, o meu empenho (e mando uma Proposta para a Mesa, se fôr necessario) e que esta Commissão pelo modo que se queira organisei, ha de tractar da Lei da Receita e da Despeza. Se a Camara entende que as Propostas que estão na Mesa, abrangem esta idéa, escuso de mandar a minha Proposta neste sentido.

O Sr. Presidente: — Eu já disse ha pouco que o Sr. Jeronymo José de Mello na sua Proposta comprehendeu uma e outra cousa. O illustre Deputado assim o declarou Por consequencia quando propuzer á votação a Proposta do Sr. Deputado, ha de sei debaixo desta idéa. Com tudo se o Sr. Deputado quer mandar outra Proposta, póde fazel-o.

O Sr. Xavier da Silva. — Não quero, não Senhor, uma vez que seja debaixo deste ponto que se vote, e que se entenda que os Srs. Deputados que vão das differentes Commissões, vão constituir uma Commissão Especial. (Apoiados) Digo isto para que ião aconteça que os Srs. Deputados que forem formados nelas respectivas Commissões, senão apresentem na Commissão de Fazenda simplesmente como Delegados das suas Commissões, ou Informadores. (Apoiados) Vão alli sei Membros da Commissão de Fazenda, hão de julgar, votar e ter a mesma responsabilidade de que os outros. (Apoiados)

O Sr. L. J. Moniz — Desejava que V. Ex.ª tivesse a bondade de me dizei pelo Sr. Secretario se as Commissões de Instrucção Publica, o Diplomatica estão tambem mencionadas (O Sr. Xavier da Silva: Hãoo de ser todas as que tem relação com o Orçamento).

O Sr. Presidente: — Não está nem uma, nem outra. O Sr. Moniz — Nesse caso mando para a Mesa a seguinte

Proposta. — «Proponho que sejam consideradas nesta Proposta todas as Commissões, que figuram no Orçamento. - Morais

(Continuando) Pois eu entendo que deviam ser declaradas, ou que devia dizer-se — Todas as Commissões que figuram no Orçamento — porque irem algumas, e deixar outras, não me parece justo. (Apoiados) (O Sr. Xavier da Silva: — Todas, todas) O Orador. — Ora bem, apoio a Proposta neste sentido. Quanto ao numero, Sr. Presidente, parece-me que o de dois é demasiado, maiormente agora que augmenta o numero das Commissões; parecia-me que se satisfaria melhor aos desejos do illustre Deputado, Auctor da Proposta, e aos da Camara decidindo-se que cada uma das Commissões enviasse um de seus Membros. Tambem não me parecia mais conveniente que cada uma das Commissões fosse obrigada a mandar exclusivamente de qualquer outro o seu Relator: entendia eu que convinha melhor que ficasse livre mandar o Relator ou aquelle que julgassem mais proprio; porque muitas vezes o Relator geral não é o mais conveniente sobre o objecto especial do Orçamento; ou está tão sobrecarregado de negocios na sua respectiva Commissão, que poderá julgar-se mais proprio encarregar outro desta missão. Por isso entendo que deveria nomear-se ou o Relator, ou outro, conforme fôr mais conveniente.

Agora quanto á materia parece-me justo que as pessoas que forem alli enviadas tomem a seu cargo uma e outra cousa — não só a Lei da Despeza, mas a da Receita — dentro de cada uma das Commissões que as enviam. os Membros Ordinarios da Commissão de Fazenda são para tractarem dos Projectos de Lei, e mais negocios da Fazenda em geral: Membros Addicionaes são para os objectos de Receita e Despeza relativamente a cada uma dar, Commissões Delegantes 1 Proposta foi admittida á discussão.

O Sr. Presidente: — Esta Proposta considerada uma Emenda á do Sr. J. J. de Mello Dicute-se junctamente com ella....

O Sr. Cunha Sotto-Maior: — Requeiro que se passe á Ordem do Dia.

O Sr. Presidente: — Peço que se note que este objecto não é de gastar tempo. Tracta-se de nomear uma Commissão para trabalhos, e trabalhos importantes; é a razão porque tenho deixado progredir a discussão, e não ena occasião em que está em andamento, e quasi a resolver-se que se requer para se passar á Ordem do Dia. (apoiados)

O Sr. Cunha Sotto-Maior: — Então requeiro, que V. Ex.ª consulte a Camara se julga que a materia está discutida.

Decidiu se affirmativamente. E pondo-se á votação a

Emenda do Sr. J. L. de Mello — foi approvada.

Dita do Sr. Moniz — approvada.

O Sr. Presidente — Por esta votação ficou prejudicada a Proposta do Sr. Ferreira Pontes. Convido o Sr. Visconde de Campanhã a prestar juramento como Supplente á Presidencia, porque se póde tornar de necessidade vir occupar esta Cadeira.

Prestou o juramento

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O Sr. Presidente: — A Meza vai dar conta á Camara do modo como desempenhou o seu mandato «obre a nomeação da Commissão do Codigo Florestal: são nomeados para ella

Os Srs. Agostinho Albano da Silveira Pinto.

Francisco Assis de Carvalho.

Jeronimo José de Mello.

João Elias da Costa Faria e Silva.

José Silvestre Ribeiro. Lourenço José Moniz.

Segundo os precedentes sujeito esta nomeação á approvação da Camara

Sendo proposta á cotação, foi approvada.

O Sr. Presidente. — (Continuando) Por parte da Commissão de Petições representou-se se á Meza, que esta Commissão não podia funccionar, porque faltavam alguns de seus Membros. — A Meza notou que se acham na Casa os Srs. Agostinho Nunes da Silva Fevereiro, Antonio Augusto de Mello e Castro de Abreu, Filippe José Pereira Brandão, Francisco Leite Pereira da Costa Bernardes, e João da Costa Xavier. Por consequencia está em numero bastante apezar de faltarem os Srs. Joaquim Queiroz Machado. Com tudo se se julgar, que é necessario completar-se o numero de seus Membros, a maioria da Commissão o requisitará. Mas parece-me que os Membros presentes são sufficientes. (Apoiados)

ordem do dia.

Pose á discussão o Projecto N.º 43 da Sessão Legislativa de 18J8, que é o seguinte

Relatorio. — Senhores: A realidadade do systema representativo reside na eleição. Se a Lei, que a regula, não fôr sincera, ou trahir os verdadeiros principios, nenhum direito, nenhum dever, poderá resistir por muito tempo á ruina lenta, mas efficaz, operada por uma corrupção cada dia mais hajil, e tambem por isso mesmo, em cada hora, mais perigosa e audaz. Dentro em poucos annos as garantias, á sombra das quaes o Governo Constitucional repousa, serão convertidas em ficção pura, e a liberdade servira apenas de pretexto para se dar um nome santo á blasfemia das verdades politicas soffocadas no continuo estreitar deste circulo vicioso.

Todos os que reflectem se convenceram, ha muito, de que o systema representativo, vive ou adoce, segundo a eleição representa ou falsifica a vontade geral. Uma boa Lei eleitoral, disse com motivo uni engenho illustrado da França Dynastica, encerra toda a Constituição. Ha de supprir o que não houver, o crear o que faltai; mas quando a propria Lei eleitoral for um sofisma, nada a poderá substituir a ella.

Com eleições livres, inacessiveis á fraude, que representem os interesses mais numerosos e importantes, e sejam à expressão fiel de todas as opiniões illustradas, o paiz não terá nunca que receiar pela sua prosperidade. Todos os elementos estaveis, todos os direitos, e todas as paixões generosas, virão luctar ao recinto legal, e resolver o problema do Governo só pela força da intelligencia.

Foi este o pensamento, que a Commissão eleitoral procurou seguir no desempenho do encargo com que a Camara a honrou. No projecto, que hoje vem submetter ao seu exame, não vio senão a necessidade de garantir o direito, e de fazer livre e pleno o seu exercicio. Satisfeitas estas duas condições, sem as quaes elle degenera em sofisma, o resto da sua missão pareceu-lhe relativamente facil

Desde 1856 até á época presente, a Lei de 9 de d'Abril de 1838 é o unico monumento parlamentar consagrado ao direito eleitoral. Todos os Decretos, que em diversos periodos se mandaram vigorar emanados de um podér incompetente, são actos de dictadura, que se ressentem da sua origem, e attenderá m ás circumstancias da actualidade. Caberá pois á Camara de 1848 a honra de pôr termo á usurpação forçosa mas consuetudinaria do Executivo em materia de tal transcendencia, fixando n'uma Lei permanente os principios e os methodos mais adequados para obter a verdadeira expressão da vontade do paiz.

A Commissão entendeu que era do seu dever ouvir a opinião do Governo sobre as bases essenciaes do projecto, a fim de caminhar de perfeito accordo com ella, a ser possivel.

O Governo adherio inteiramente ao pensamento do projecto, conformando-se em tudo com as suas disposições principaes. Deste modo ha a certeza de que o projecto não irá encontrar nenhuma das conveniencias, que o Governo, mais do que outro qualquer, está no caso de apreciar.

Penetrando-se bem do sentido liberal das resoluções da Camara ácerca da não constitucionalidade do art. 63º da Carta Constitucional, a Commissão não hesitou um instante em adoptar o methodo da eleição directa. No estado de clareza em que estão hoje as questões praticas de Direito Politico, seria abusar da benevolencia de uma Assembléa deliberativa, fatiga-la com a repetição dos fundamentos da preferencia. Esses acham-se no exemplo de todos os Reinos, e na critica severa, porém justa, que eliminou dos Codigos regulamentares da Europa livre, o methodo indirecto.

Foi ainda, intendendo na sua recta e generosa idéa, o pensamento da Camara, que a Commissão, tendo de fixar os limites da capacidade eleitoral, seguro a doutrina, de que em um Governo livre o direito não se restringe sem peccar contra os principios. Tomando a base do censo de mil réis para indicador do rendimento de cem mil réis, marcado na Carta, como presumpção de capacidade electiva, deu-se ao voto da Camara, (crê a Commissão,) o seu verdadeiro sentido, e á Carta a intelligencia mais liberal, e mais sincera; se por ventura se adoptasse o censo exigido aos Eleitores de Provincia, destruia-se o gráo mais directo, restringia-se o direito por um sofisma, calumniava-se pelo odio da interpretação o espirito da Carta, constituia-se scientemente uma Olygarchia eleitoral, cujo reinado seria breve, mas fertil em funestos resultados. A Commissão, portanto, absteve-se de elevar o censo, chamando pelo contrario ao exercicio dos direitos politicos tudo o que dá vida e força á sociedade, ao trabalho industrial e agricola, á propriedade e á intelligencia; e praticando isto, não fez mais do que executar o pensamento da Carta, onde esta idéa nobre e fecunda transluz de todos os preceitos.

A Commissão havia de ser mesmo mais severa, se a Carta não parecesse vedar lho Os ordenados ou

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salarios dos Empregados amoviveis, nunca leriam sido considerados como censo (verdadeiro), se a Lei fundamental não designasse o rendimento do emprego como habilitação de capacidade eleitoral.

A esperiencia prova o abuso que se fez do voto destes Eleitores, salariados pelo Estado, e de ordinario coegidos e intimidados, sem livre opção de suffragio; e torna de certo evidente a necessidade de interpretar ou reformar o artigo 65.º da Carta, para a uma 60 receber votos, filhos da plena independencia da escolha, e da inteira liberdade moral e física do Eleitor.

Ainda no pensamento de garantir a maior liberdade possivel a eleição, se consagrou o principio das incompatibilidades relativas. Todos os Empregados, que pelas suas funcções podem exercer influencia devida ao cargo, e não unicamente á confiança que inspirarem como cidadãos, são ineligiveis nos Districtos e Comarcas, onde as suas funcções podem coegir a vontade dos Eleitores, e valer-se da authoridade para extorquir um voto ás consciencias timidas.

A exigencia da renuncia dos cargos para os Empregados de confiança das Ilhas adjacentes e Provincias Ultramarinas, foi admittida em virtude das necessidades particulares do serviço naquellas regiões. A independencia e a moralidade pareciam mesmo reclamar que esta restricção se applicasse ao Continente do Reino tambem, e até como consideração do exacto e zeloso desempenho das funcções publicas; porém invocando se a razão da falta de capacidades especiaes, tanto para o exercicio dos logares de Administração civil e militar, como para a parte pratíca das funcções legislativas, a Commissão, que I por unanimidade, resolveu excluir do direito não activo da elegibilidade esta clausula aliás importante.

Na formação e revisão das listas eleitoraes teve-se em vista evitar á fraude todo o pretexto de eliminar a titulo de falla de prova de capacidade, direitos sanccionados na Lei. Para o sofisma não prevalecer adoptaram-se os methodos mais segui os, entregou-se aos pares do recenseado a investigação da validade da sua aptidão eleitoral, e estabeleceram-se, com plena facilidade de as intentar, todas as possiveis instancias de recurso Não existindo organisado, como Tribunal administrativo supremo, o Conselho de Estado, para nelle se decidirem as petições de recurso, por allegação contenciosa, a Commissão deferiu ás Relações respectivas, temporariamente, a resolução destes recursos, não podendo fraudar o Eleitor de um direito sacratissimo, e não devendo substituir a acção efficaz de Tribunaes» activos pela ficção irrisoria de um Tribunal, que, pela suspensão que sobre elle peza, está interdicto quanto as funcções do contencioso administrativo.

A Commissão procurou além disto garantir por uma penalidade justa, mas rigorosa, a perfeita lealdade dos recenseamentos, e a verdade de todos os actos eleitoraes, e ousa asseverar, que sendo executada a Lei, como a propõe, a fraude e a violencia são impossiveis, sem immediata punição, e completo desaggravo dos direitos lesado ou offendidos.

Quando a questão da circumscripção eleitoral se apresentou, um ponto se debateu com interesse. Resolveu se crear no Continente maior numero de Collegios eleitoraes, excedendo os designados nos Mappas das Leis de 9 de Abril de 1838, e 27 de Julho de 1846, e estabelecendo como têrmo medio dois a tres Deputados por Circulo. Esta idéa, que encena grandes vantagens para a sinceridade da eleição, apezar de envolver alguns obstaculos, foi adoptada. A Commissão, sobre os ultimos Mappas estatisticas, que para este fim lhe ministrou o Governo, examinou a nova divisão eleitoral em sessenta Circulos no Continente do Reino, Ilhas adjacentes e Ultramar, a que se procedeu no respectivo Ministerio; e ouvindo os conhecimentos praticos dos Deputados mais competentes, convenceu se de que a circumscripção eleitoral, que propõe de accordo com o Governo, não achará nos locaes nenhum embaraço grave, colhendo-se do novo systema todas as vantagens, que o fizeram perfilhar por quasi toda a Europa Constitucional.

É pois, sobre estas bases que a Commissão eleitoral elaborou o projecto de Lei, que hoje offereço á discussão O seu pensamento foi sanccionar o direito com toda a sua extensão legal; garantir-lhe, na esfera d'actividade propria, toda a independencia e liberdade: e evitar a fraude, a coacção, e o sofisma, ou na verificação do direito, ou no acto do seu exercicio. Deste modo, lisongeia-se a Commissão de que muitos abusos cairão para sempre, e que a urna, desaffrontada dos desacatos e falsificações eleitoraes, dará a paz ao paiz, fazendo sair do escrutinio a verdadeira expressão da vontade Nacional.

Projecto de lei.

TITULO 1.

Dos Eleitores e Elegiveis.

Art. 1.º A eleição dos Deputados é directa. Nella têem direito de votar todos os cidadãos portuguezes, ou os estrangeiros naturalisado», que estiverem no goso de seus direitos civis e politicos; que tiverem completado vinte cinco annos de idade; e que no lançamento, immediatamente anterior ao recenseamento, houverem sido collectados:

§ 1.º Em dez mil réis de decima de juros, fóros, pensões, ou quaesquer proventos de empregos de Camaras Municipaes, Misericordias e Hospitaes

2. Em cinco mil réis de decima de predios rusticos e urbanos arrendados.

3. Em mil réis de decima de predios rusticos e urbanos não arrendados, e de qualquer rendimento proveniente de industria.

Art. 2 o Tem igualmente direito de votai:

1.º Os Empregados do Estado, quer estejam em effectivo serviço, quer jubilados, aposentados, ou reformados; quer pertençam ás Repartições extinctas, que tiverem de ordenado, soldo ou congrua, cem mil réis annuaes: não se comprehendendo as soldadas das classes de marinhagem, os salarios dos artifices, e mais empregados braçaes das diversas Repartições, nem os vencimentos dos praças de pret: exceptuando os Aspirantes a Officiaes, que tiverem o vencimento de doze mil réis mensaes; os Sargentos Ajudantes, os Sargentos Quarteis-mestres do Exercito, e os das Guardas Municipaes.

2.º Os Egressos, que tiverem de prestação annual seja mil réis.

3.º Os Pensionistas do Estado, que tiverem de

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pensão annual, qualquer que seja a sua origem, cem mil réis.

Art. 3.º São excluidos de votai:

1. Os menores de vinte cinco annos, nos quaes se não comprehendem os casados, e Officiaes militares, que forem maiores de vinte um annos; os Clerigos de Ordens sacras, os Doutores e Bachareis formados pela Universidade de Coimbra, ou por alguma Universidade ou Academia estrangeira, os que tiverem o Curso completo da Escóla Polytechnica de Lisboa, da Academia Polytechnica do Porto, das Escólas Naval e a do Exercito, e das Escólas Medico-Cirurgica de Lisboa e Porto; os quaes podem votar achando-se comprehendidos em alguma das disposições do art. 1.º.

2.º Os filhos-familias, que estiverem na companhia de seus paes, salvo se servirem Officios publicos.

3.º Os criados de servir, em cuja classe não entram os Guardas-Livros e primeiros Caixeiros das Casas de Commercio; os criados da Casa Real, que não forem de galão branco; e os Administradores das Fazendas ruraes e Fabricas. Todos estes podem votar estando comprehendidos em algumas das disposições do art. 1.º.

4.º Os criminosos pronunciados em querela.

5º Os fallidos, emquanto não forem julgados de boa fé.

6.º Os libertos.

Art. 4.º São habeis para ser eleitos Deputados todos os que podem ser Eleitores, e que, além disto, no ultimo lançamento immediatamente anterior ao recenseamento, houverem sido collectados:

1.º Em quarenta mil réis de decima de juros, fóros ou pensões, ou de quaesquer proventos de Empregos de Camaras Municipaes, Misericordias e Hospitaes.

2.º Em vinte util réis de decima de predios rusticos e urbanos arrendados.

3.º Em quatro mil réis de decima e impostos annexos de predios rusticos e urbanos não arrendados, V de qualquer rendimento proveniente de industria.

Art. 5.º São igualmente habeis para ser Deputados:

1.º Os Empregados do Estado, quer estejam em effectivo serviço, quer jubilados, aposentados, ou reformados; quer pertençam ás Repartições extinctas; tendo de ordenado, soldo ou congrua, quatrocentos mil réis annuaes.

2.º Os Pensionistas do Estado, que tiverem de pensão annual, qualquer que seja a sua origem, quatrocentos mil réis.

Art. 6.º Não podem ser eleitos Deputados:

1.º Os Bispos e Arcebispos, excepto se forem resignatarios ou titulares.

2.º Os naturalisados portuguezes.

3. Os que, depois da publicação desta Lei, arrematarem rendas ou obras publicas do Estado, em quanto durarem os seus contractos.

§ unico. Os Deputados, que arrematarem rendas ou obras publicas do Estado, perdem igualmente o logar de Deputados.

Art. 7.º São respectivamente ineligiveis:

1. Os Magistrados administrativos, e os Secretarios Geraes dos Governos Civis nos respectivos Districtos, Concelhos ou Bairros.

2.º Os Thesoureiros Pagadores e os Delegados do Thesouro, nos Districtos administrativos onde exercem as suas funcções.

Voi. QS — fi vi striRO — 1349.

3.º Os Governadores Geraes, os Secretarios dos Govêrnos do Ultramar, e os Escrivães da Juntas de Fazenda em todas as Possessões Ultramarinas; e sendo eleitos em qualquer outro circulo, acceitando a eleição, renunciam aos seus logares Esta disposição é extensiva aos Governadores Civis, Secretarios Geraes, e Empregados de commissão das Ilhas adjacentes.

4.º Os Vigarios capitulares e os Governadores temporaes nas suas Dioceses.

5.º Os Parochos nas suas Freguezia.

6.º Os Commandantes das Divisões Militares nas suas Divisões, e os da Força Armada nas Provincias Ultramarinas.

7.º Os Governadores militares das Praças de guerra dentro das Praças.

8.º Os Commandantes dos Corpos de primeira linha ou Batalhões Nacionaes, nas terras em que os mesmos se acharem.

9.º Juizes de primeira Instancia e os Delegados do Procurador Regio nas Comarcas e Provincias Ultramarinas em que exercem jurisdicção ou as suas funcções.

10.º Os Procuradores Regios e os seus Ajudantes no Districto Administrativo em que estiver a séde do respectivo Tribunal.

11.º Os Directores das Alfandegas das Provincias Ultramarinas no Districto da jurisdicção das mesmas Alfandegas

Art. 8.º Todo o cidadão, que, depois de eleito Deputado, acceitar condecoração, ou mercê honorifica, ou commissão subsidiada, ou melhoria de commissão, posto, -ou emprego, que legalmente lhe não pertença em virtude de concurso publico, ou por accesso de escala e antiguidade na carreira a que pertencer, perdêra o logar de Deputado; mas poderá ser reeleito.

Art. 9.º Não perdem, porém, o logar de Deputado, nem o deixam vago, aquelles que, em tempo de guerra ou de rebellião manifesta, forem empregados para servir tão sómente durante as circumstancias extraordinarias, precedendo licença da Camara, e não accumulando nunca as funcções de Deputado com o exercicio da sua commissão. No caso de não estarem a esse tempo abertas as Côrtes, poderá o Governo nomear Deputados para Commissões extraordinarias, dando-lhes conta deste procedimento, logo que ellas se reunam.

§ unico. Deixam vago o logar de Deputado, e podem ser reeleitos, os que forem nomeados para os cargos de Ministro e Secretario d'Estado e de Conselheiro d'Estado.

Art. 10.º Os cidadãos portuguezes, em qualquer parte que existam, são elegiveis em cada Districto eleitoral para Deputados, ainda quando aí não sejam nascidos, residentes ou domiciliados.

TITULO II

Da formação e revisão das listas eleitoraes.

Art. 11.º O recenseamento dos cidadãos activos e elegiveis será por Commissões especiaes.

§ 1.º Estas Commissões serão de sete Membros, formadas, em cada Concelho, dos cinco maiores contribuintes, tirados acoite d'entre os quinze mais collectados; do Parocho mais antigo; sendo presidida

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sempre pelo Presidente da Camara Municipal respectiva; e servindo de Secretario, sem voto, o Secretario da Camara Municipal.

§ 2.º Nos Concelhos de Lisboa e Porto haverá tantas Commissões, quantos são os Bairros em que estes dói Concelhos se dividem; presidindo o Vereador para isso delegado pela Camara Municipal, e servindo de Secretario um dos Membros da Commissão por ella nomeado.

Art. 12.º Nenhum cidadão poderá ser recenseado senão no seu domicilio politico.

Art. 13.º O domicilio politico dos cidadãos portuguezes, é no Concelho em que residem a m dor parte do anno; o dos Empregados Publicos naquelle em que, na época do recenseamento, exercem as suas funcções; e o dos Militares na Freguezia onde, na d Li a época, estiver o seu quartel ou habitação.

Art. 14.º E permittido a qualquer cidadão transferir o seu domicilio politico para outro Concelho, comtanto que tres mezes antes de começarem as operações do recenceamento, assim o declare por escripto á Camara Municipal do Concelho em que reside, e á daquelle para onde quer transferir o mesmo domicilio.

Art. 15.º O recenseamento por effeito da collecta de que tractam os art.1 1. e 4.c desta Lei, será inalteravelmente feito em vista do ultimo lançamento de Decima.

Para este fim as Auctoridades competentes o enviarão ás Commissões, tres dias antes de começar o praso para as operações do recenseamento.

Art. 16.º O rendimento proveniente de Acções do Banco ou Companhias, ou de Inscripções e Apolices de divida publica, que não forem sujeitas á decima, será contemplado para todos os effeitos desta Lei, tendo em consideração o rendimento do anno anterior áquelle em que se fizer o recenseamento.

Art. 17.º Serão contempladas cumulativa e proporcionalmente as quotas da decima provenientes de origens diversas, sujeitas a esta contribuição; e bem assim os rendimentos da mesma, isentos e designa-los nesta Lei, como se demonstra do seguinte exemplo:

«Ver Diario Original»

§ 1.º Por similhante modo serão calculados todos os casos occorrentes para eleitores e elegiveis.

§ 2.º O quinto representa a metade do rendimento correspondente á Decima, para todos os casos especificados.

§ 3.º A Decima de juros, fóros ou pensões, será contada para o recenseamento daquelle por conta de quem foi paga.

§ 4 o Ao marido se levará em conta, para todos os effeitos do recenseamento, a Decima dos bens da

mulher, posto que entre elles não haja communicação de bens; e ao pai a Decima dos bens do filho, quando por direito lhe pertencer o usofructo delles ou vice-versa.

Art. 18.º Todo o cidadão, que chegar á idade legal, ou adquirir a renda annual para ser Eleitor ou Deputado, poderá requerer, em qualquer tempo, a sua inscripção no recenseamento á Commissão competente ou ao Conselho de Districto, na conformidade do disposto nesta Lei.

Art. 19.º Sob pretexto algum poderá ser recenseado o cidadão que, no lançamento immediatamente anterior, se não achar collectado nas quantias fixadas nos art.os 1.º e 4.º da presente Lei, ou não tiver rendimento algum dos contemplados nos mesmos artigos. Não poderá por nenhum caso deixar de ser inscripto aquelle que satisfizer a este requisito.

§ 1.º Para complemento da quantia necessaria para qualquer cidadão ser recenseado, ser-lhe-hão levadas em conta as verbas de Decima, em que elle se achar collectado, em qualquer outro Concelho do Reino, e o rendimento, que tiver dos mencionados nos referidos artigos, uma. vez que as respectivas addições sejam provadas com documentos authenticos.

§ 2.º Todo o cidadão portuguez residente no Continente do Reino, que, perante a Commissão de recenseamento do Concelho da sua residencia, justificar, por documentos authenticos, que nas Ilhas Adjacentes ou no Ultramar possue em bens de raiz, capitaes, commercio e industria o rendimento necessario para ser recenseado, sê-lo-ha, ainda que em Portugal se não ache collectado em nenhuma das verbas de Decima e Impostos annexos que esta Lei exige

§ 3.º Do mesmo modo será nas Ilhas Adjacentes e no Ultramar recenseado o cidadão, que justificar achar-se collectado n'algumas destas verbas no Continente do Reino.

Art. 20.º Os cidadãos que se julgarem indevidamente excluidos do ultimo lançamento, ou nelle collectados em quantia inferior á que compete aos seus rendimentos, e por isso prejudicados nos seus direitos politicos, podem, até ao dia 15 d'Abril, apresentar a sua reclamação perante o Presidente da respectiva Junta de lançamento.

§ 1.º As Juntas ficam auctorisadas para attender ás reclamações, que por esta causa possam ser feitas, e são obrigadas a decidi-las até ao dia 18 d'Abril, reunindo-se para este effeito por aviso do Presidente.

§ 2.º Das collectas provenientes das reclamações, que forem attendidas, se formará um Additamento ao lançamento, o qual será tambem presente ás Commissões de recenseamento até ao dia 21. Este Additamento, ou certidão authentica do seu contheudo, a respeito de qualquer cidadão, valerá para ter logar o recenseamento

Art. 21.º Os Administradores de Concelho ou Bairro, os Recebedores, e os Regedores de Parochia assistem ao recenseamento, a fim de prestarem com escrupolosa exactidão todas as informações necessarias; mas estas nunca podem prevalecer contra o theor dos lançamentos; nem em caso algum eximem as Commissões de recenseamento da sua responsabilidade.

Art. 22.º Do recenseamento se extrairão duas relações: a primeira comprehenderá todos os cidadãos, que em virtude dos art.08 1.º, 2.º e 3.º tem direito de votar; a segunda comprehenderá todos aquelles,

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que em conformidade dos art.os 4.º e 5.º podem ser eleitos Deputados,

§ 1.º Cada uma destas relações conterá o nome e appellido dos recenseados; a sua idade, estado, profissão, ou emprego; a verba ou verbas da competente collecta, com declaração da sua origem, e a dos Concelhos em que lhes foram lançadas, a origem e importancia dos vencimentos pagos pelo Estado, e a data da sua naturalisação se fôr naturalisado Portuguez.

§ 2.º Os recenseamentos serão classificados por Parochias e em ordem alfabética.

Art. 23.º Se houver Concelho, em que o numero dos recenseados não chegue a sessenta, completar-se-ha este numero com os immediatamente mais collectados.

§ unico. Se nas verbas immediatas estiverem collectados mais cidadãos, do que os necessarios para se perfazer o indicado numero, serão todos addicionados á respectiva relação.

Art. 24.º As listas dos Eleitores e elegiveis para Deputados são permanentes, e ficarão guardadas nos archivos das Camaras Municipaes; mas serão revistas annualmente para se inscreverem os que de novo se forem habilitando para entrar nellas, ou se riscarem os que tiverem morrido, ou perdido as qualidades legaes.

Art. 25.º No dia 10 dê Maio de cada anno as Commissões especiaes de recenseamento e revisão annunciarão, por Editaes, o local, dia, e hora das suas reuniões; e procederão á formação e revisão das listas dos cidadãos do seu Concelho ou Bairro que tiverem os requisito» exigidos para votar, ou para serem votados para Deputados.

Art. 26.º Os cidadãos, que estiverem nas circumstancias de ser inscriptos ou riscados das listas poderão fazer as suas declarações perante a respectiva Commissão, tanto pelo que a elles respeita, como pelo que respeitar a terceiro.

Art. 27.º Das listas dos cidadãos habilitados para votar em cada Parochia e da dos apurados para elegiveis para Deputados, de que tracta o art. 25.º, serão affixadas cópias exactas nas portas da Igreja parochial no dia 25 de Maio, Tanto as relações originaes, como as cópias, sei do assignadas pelos Membros das Commissões de recenseamento.

§ unico. O recenseamento original estará presente nas casas de reunião das Commissões a todas as pessoas, que o quizerem examinar, e todo o cidadão póde tirar cópias delle, e pedir certidões authenticas, as quaes nunca poderão ser recusadas pelas Commissões.

Art. 28.º No dia 30 de Maio as Commissões de recenseamento se constituirão em sessão publica para decidir as reclamações dos cidadãos, que se julgarem lezados nos Seus direitos, ou nos dos seus comparochianos. Estas reclamações serão apresentadas por escripto.

§ unico. Do mesmo modo qualquer individuo recenseado póde reclamar contra a inscripção, ou exclusão de qualquer cidadão, que julgar indevidamente inscripto, ou excluido.

Art. 29.º Até ao dia 6 de Junho serão as duas listas definitivas remettidas por cópia á Camara Municipal respectiva, a qual formará das listas das Parochias do Concelho duas relações: uma dos cidadãos habilitados para Eleitores, e a outra dos apurados para elegiveis para Deputados.

§ unico. Estas duas relações serão affixadas no dia 16 de Junho nas portas da casa do Concelho.

Art. 30.º Nos dias 22, 23 e 24 de Junho constituir-se-hão as Camaras Municipaes, em sessão publica, para deferir ás reclamações dos cidadãos, que não reclamaram perante as Commissões de recenseamento, ou não foram por ellas attendidos nas suas reclamações, ou nas de terceiro.

§ unico. As Camaras Municipaes decidirão summariamente, e com audiencia dos interessados estas reclamações, sendo motivadas na Lei as decisões.

As decisões de exclusão em virtude de reclamação de terceiro, serão, dentro de tres dias precisos, notificadas ao interessada pelo Escrivão da Camara, ou quem suas vezes fizer.

Art. 31.º As Camaras Municipaes terão dois livros numerados, e rubricados pelo Presidente da Camara: um para o registo dos que podem ser Eleitores, e o outro para registo dos que são elegiveis para Deputados. Estes livros serão guardados no Archivo da Camara, e delles se poderão passar Certidões, e extrair cópias, que forem necessarias.

Art. 32.º Em resultado das decisões, de que tracta o art. 30.º, será addicionado ás relações o nome dos que novamente foram recenseados, e eliminado o daquelles que foram excluidos.

Art. 33.º No dia 6 de Julho publicarão as Camaras, e Commissões do recenseamento, pela fórma prescripta no art. 27.º, as alterações feitas no mesmo recenseamento, em virtude das referidas decisões.

Art. 34.º Das decisões dos Camaras Municipaes ha recurso para o Conselho de Districto.

§ unico. O recurso interpõe se, por escripto, perante a Camara respectiva, até ao dia 22 de Julho, e deve ser logo acompanhado das allegações, e documentos, que lhes servem de fundamento.

Art. 35.º O recurso para o recenseamento justifica-se por certidão das verbas, em que no ultimo lançamento, ou additamento delle, tiver sido collectado o cidadão, cuja inscripção se reclamar.

§ 1.º O recurso para a exclusão do recenseamento justifica-se por certidão, ou despacho, que mostre, que o recenseado não está collectado em quantia alguma de decima, ou que o está em quantia inferior á exigida por esta Lei.

§ 2.º Estas certidões serão promptamente passadas pelo Recebedor, ou por qualquer outro funccionario, em cujo poder estiverem os lançamentos, sem dependencia de despacho, com preferencia a qualquer outro trabalho, e pela retribuição de quarenta réis por cada verba.

Art. 36.º O recurso para a admissão no recenseamento de qualquer cidadão comprehendido na disposição dos art. 1.º 2.º e 4.º, e n.º 1 e 2 do art. 5.º justifica-se pelo diploma, (original, ou publica fórma) que mostre qual seja o respectivo rendimento.

§ unico. O recurso para a exclusão prova-se por documento authentico, contradictorio da especie a que este artigo se refere.

Art. 37.º Da entrega dos recursos, e dos documentos que os acompanharem, se dará recibo ás partes que o pedirem.

Art. 38.º As Camaras recorridas informarão sobre o recurso até ao dia 2 de Agosto, e o remetterão logo, assim instruido, ao Governador Civil, cobrando recibo da entrega.

Art. 39.º O Conselho de Districto decidirá todos

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os recursos até ao dia 13 de Agosto, e o Governador Civil os devolverá immediatamente ás Camaras ou Commissões recorridas.

§ unico. As decisões do Conselho de Districto serão motivadas, e dentro do praso de oito dias precisos notificadas ao recorrente pelo modo prescripto no § unico do art. 29.º

Art. 40.º O recenseamento fica definitivamente concluido com as rectificações que nelle se fizerem, em virtude das decisões do Conselho de Districto.

Art. 41.º Das decisões do Conselho de Districto, em quanto não estiver organisado o Conselho distado como Tribunal Administrativo, haverá recurso para a respectiva Relação, o qual será interposto por petição apresentada ao Governador Civil até ao dia 26 de Agosto.

§ 1.º O Governador Civil remetterá á Relação, até ao dia 3 de Setembro, a petição acompanhada de todos os documentos, com que o recurso foi instruido perante o Conselho de Districto, e do Accordão por elle proferido.

§ 2.º A petição será distribuida na Relação com os feitos da quarta classe; e o Relator a mandará immediatamente com vista ao Ministerio Publico,»que responderá no praso improrogavel de 24 horas.

§ 3.º Findo este praso o Escrivão cobrará o feito, fa-lo-ha concluso ao Relator, e este o proporá logo em sessão publica, com cinco Juizes, sendo a decisão tomada em conferencia por tres votos conformes. Para este fim haverá sessão todos os dias.

§ 4.º Se da Relação se recorrer em revista, será o recurso interposto dentro dos mesmos prasos, pela mesma fórma, e com preferencia a todos os demais processos.

§ 5.º Nas Relações ficará sòmente o traslado da confissão ou contestação do Ministerio Publico e do Accordão.

§ 6.º Estes feitos serão gratuitamente processados, e sem assignatura ou preparo

Art. 42.º Logo que o Conselho d'Estado seja organisado como Tribunal Administrativo, passarão para elle todos os recursos eleitoraes deferidos ás Relações.

§ 1.º O praso da apresentação das petições de recurso ao Governador Civil, e o da remessa dellas para o Conselho d'Estado, é o marcado no artigo antecedente, e no seu § 1.º seguindo em tudo os mesmos tramites nelle indicados.

§ 2.º A petição será distribuida no Conselho de Estado á Secção do Contencioso administrativo, e o Relator a mandará logo com vista ao Ministerio Publico, que responderá dentro do praso improrogavel de 24 horas.

§ 3.º Findo este praso o Secretario do Conselho d'Estado fará o processo concluso ao Relator, e este o proporá logo em sessão publica de tres Conselheiros, sendo a decisão tomada em conferencia de votos. Para este fim haverá sessão todos os dias

§ 4.º Na Secretaria do Conselho d'Estado sòmente ficará o traslado da petição, da confissão ou contestação do Ministerio Publico, e da decisão do Tribunal.

§ 5.º E4es feitos serão gratuitamente processados, sem emolumentos ou preparo.

Art. 43.º As Camaras Municipaes farão nas listas dos Eleitores e elegiveis, as alterações que forem julgadas pelo Conselho d'Estado ou pela Relação, em

quanto elle não estiver organisado; mas o recurso, de que tractam os artigos antecedentes, não suspende o progresso das operações eleitoraes.

Art. 44.º O recenseamento definitivamente concluido e rectificado, será impresso e distribuido aos Membros do Corpo Legislativo, aos Governadores Civis, e a todas as Camaras Municipaes.

TITULO III.

Dos Circulos e Assembléas Eleitoraes.

Art. 45.º As eleições dos Deputados far-se-hão por Circulos eleitoraes. Pastes Circulos elegem um Deputado e um Substituto por cada seis mil e quinhentos, a sete mil fogos.

§ unico. Se a fracção restante dos fogos de qualquer Circulo eleitoral foi igual, ou superior a quatro mil trezentos e trinta e dous fogos, eleger-se-ha mais um Deputado.

Art. 46.º O Continente de Portugal é para esse fim dividido em quarenta e nove Circulos eleitoraes; as Ilhas Adjacentes em quatro; e as Provincias Ultramarinas em sete; os quaes constam do Mappa N.º 1, que faz parte da presente Lei.

§ unico. O numero de Deputados e Substitutos, que competem a cada Circulo eleitoral, é o que se acha designado no mesmo Mappa.

Art. 47.º Os Substitutos sómente podem ser chamados para os logares que ficarem vagos, quando a Camara dos Deputados se constituir. Depois della constituida, ou no caso de vagatura proceder-se-ha a nova eleição.

Art. 48.º Os Circulos dividem-se em Assembléas eleitoraes, e na formação destas impreterivelmente se guardarão as regras seguintes:

§ 1.º Todo o Concelho que não exceder a dous mil e quinhentos fogos, constituirá uma só Assembléa, a qual se ha de reunir nas casas da Camara, ou em algum outro edificio publico ou municipal da Cabeça do Concelho, que para isso tenha capacidade; ou não o havendo, na Igreja Matriz delle.

§ 2.º Nos Concelhos e Parochias que excederem aquelle numero de fogos, haverá as Assembléas que forem designadas pelas Camaras Municipaes, com tanto que nenhuma se componha de menos de mil fogos; que as Parochias, ou povoações dellas, que houverem de se annexar, para constituir cada Assembléa, sejam sempre as mais proximas; e que a reunião tenha logar no edificio, Igreja, ou Capella mais central.

Art. 49.º As designações de que tracta o artigo — antecedente, contendo o numero das Assembléas, os limites, e o logar da reunião dellas, serão annunciadas por editaes das Camaras, affixados nas portas das Igrejas parochiaes, e nos logares mais publicos.

§ unico. Nos mesmos editaes irá declarado o dia e a hora em que as Assembleas se hão de reunir.

Art. 50. Havendo no Concelho uma só Assembléa, preside a ella o Presidente da Camara: havendo mais de uma, o Presidente da Camara preside á que se reunir na Parochia principal do Concelho; e ás outras os Vereadores. Se os Vereadores ainda não forem bastantes, presidirão cidadãos idoneos, nomeados d'entre os que desempenhassem cargos municipaes nos annos anteriores.

§ unico. A Parochia principal do Concelho é a

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da Cathedral; e onde a não houver, a Igreja Matriz do Concelho.

Art. 51.º As Camaras enviarão aos Presidentes das Assembleas eleitoraes, quinze dias antes do aprasado para a eleição, dous cadernos dos Eleitores que podem votar em cada Assembléa.

§ unico. Estes cadernos serão, quanto ao nome e ao numero dos recenseados, exactamente conformes ao recenseamento definitivo, e rubricados em todas as fôlhas pelos Presidentes das Camaras, e pelos mesmos assignados.

Art. 52.º As Camaras enviarão igualmente aos Presidentes das Assembléas cadernos rubricados pelo seu Presidente, a fim de nelle se lavrarem os actos da eleição.

TITULO IV.

Da Eleição.

Art. 53.º No dia aprasado para a eleição, reunidos os Eleitores pelas nove horas da manhã, no local designado, o Presidente chamará, em qualidade de secretarios, escrutinadores e revesadores, seis cidadãos escolhidos d'entre os eleitores mais velhos e os mais moços da Assembléa.

§ 1.º Em caso de duvida, ácerca da idade, decidirá o Presidente.

§ 2.º Assim formada a Mesa interina, começará logo em seguida a votação, para a constituir definitivamente.

§ 3.º Cada eleitor entregará ao Presidente uma lista, na qual serão designados dous Eleitores: um para secretario, outro para escrutinador, e dous para revesadores, marcando a qualificação adiante do nome. O Presidente deporá a lista na urna em presença do proprio eleitor, cujo nome se descarregará no competente caderno.

§ 4.º Em nenhum caso se encerrará a votação antes das onze horas do dia, salvo se todos os eleitores tiverem votado.

§ 5.º Terminada a votação, corrêra o escrutinio; e verificado o numero dos votantes pelas notas dos cadernos de descarga, ficarão definitivamente escrutinadores, secretarios e revesadores os oito cidadãos relativamente mais votados.

§ 6.º A Mesa será composta de dous secretarios, dous escrutinadores e quatro revesadores.

Art. 54.º Da formação da Mesa se lavrára acta; e o secretario, que a lavrar, a lerá immediatamente.

§ unico. Uma relação, contendo os nomes dos Approvados para compôr a Mesa, assignada pelo Presidente e por um dos secretarios, será logo affixada nas portas da Igreja ou edificio em que a Assembléa estiver reunida.

Art. 55.º A Mesa eleitoral, que fôr eleita antes da hora marcada no art. 53.º, é nulla.

Art. 56.º Se uma hora depois da fixada para a reunião da Assembléa, o Presidente ainda não tiver comparecido, ou comparecendo, se acaso se ausentar, tomará a Presidencia o cidadão, que para isso fôr escolhido pelo maior numero dos eleitores presentes.

Art. 57.º A Mesa da eleição será collocada no corpo do edificio, de maneira que todos os eleitores por todos os lados possam ter livre accesso a ella, e observar os actos eleitoraes.

Art. 58.º Constituida a Mesa são válidos todos os actos eleitoraes, que legalmente se praticarem, comtanto que estejam presentes, pelo menos, tres vogaes.

Art. 59.º As Mesas decidem provisoriamente as duvidas que se suscitarem á respeito das operações da Assembléa.

§ 1.º Todas as decisões da Mesa sobre quaesquer duvidas ou reclamações, serão motivadas.

§ 2.º Todos os documentos, que disserem respeito a reclamações, serão a ellas appensos e rubricados pelos vogaes da Mesa e pelo reclamante.

§ 3.º As decisões serão tomadas á pluralidade de votos. No caso d'empate, o Presidente tem voto de qualidade.

Art. 60.º A votação é por escrutinio secreto de tal modo, que de nenhum eleitor se conheça, ou possa vir a saber o voto.

§ unico. Não serão admittidas listas em papel de côres, ou que tenham qualquer outro signal, marca, ou numeração externa.

Art. 61.º Ninguem póde ser admittido a votar, se o seu nome não estiver inscripto no recenseamento dos eleitores. — Exceptuam-se:

1.º Os Presidentes das Mesas, que podem votar nas Assembléas a que presidem, ainda que ahi se não achem recenseados.

2.º Os cidadãos que se apresentarem munidos de Accordão da Relação, ou de resolução do Conselho de Estado, mandando-os inscrever como eleitores, e que ainda não estiverem inscriptos.

Art. 62.º Os vogaes da Mesa votam primeiro que todos os eleitores.

Art. 63.º Ao passo em que cada um dos eleitores chamados se aproximar á Mesa, um dos escrutinadores e uni dos secretarios o descarregarão nos dous cadernos, de que se faz menção no art. 47.º, escrevendo o seu proprio appellido ao lado do nome do votante. O eleitor só então entregará ao Presidente a lista da votação, dobrada e sem assignatura; e o Presidente a lançará na urna.

§ unico. As listas deverão conter o duplo de Deputados, que compele a cada Circulo eleitoral. O Presidente da Mesa assim o annunciára antes de acceitar as listas.

Art. 64.º Não se apresentando mais eleitores, o Presidente ordenará uma chamada geral dos que não tiverem votado.

Art. 65.º Duas horas depois desta chamada, o Presidente fará contar as listas que se acharem na urna, e confrontar o seu numero com as notas de descarga postas nos cadernos do recenseamento.

§ unico. O resultado desta contagem e confrontação será mencionado na acta, e immediatamente publicado por edital affixado na porta da casa da Assembléa.

Art. 66.º Concluida a contagem das listas, nenhuma outra poderá ser recebida.

Art. 67.º Seguir-se-ha o apuramento dos votos, tomando o Presidente successivamente cada uma das lutas, desdobrando-a e entregando-a alternadamente a cada um dos escrutinados, o qual a lerá em voz alta e a restituirá ao Presidente: o nome dos votados será inscripto por ambos os secretarios ao mesmo tempo, com os votos que forem tendo, numerados por algarismos, o sempre repelidos em voz alta.

Art. 68.º São válidas as listas dos votantes, ainda quando contenham nomes de menos ou de

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mais. Neste ultimo caso não serão contados os derradeiros nomes excedentes.

Art. 69.º As Mesas eleitoraes apurarão os votos, que recaírem em qualquer pessoa, cujo nome se ache inscripto no recenseamento dos elegiveis; excepto se os votos forem contidos em listas não conformes ao disposto no § unico do art. 60.º Neste casos serão taes listas declaradas nullas.

§ unico. As listas annulladas por este fundamento, ou por qualquer outro, por que o devam ser, não se contam para a maioria nem para outro algum effeito.

Art. 70.º As listas, que as Mesas considerarem viciadas, serão rubi içadas pelo Presidente, e juntar-se-hão ao processo eleitoral, que ha de ser presente á Junta preparatoria da Camara dos Deputados.

Art. 71.º Se houver dúvida sobre a numeração dos votos,.ou se o numero total delles não fôr exactamente igual á somma dos que as listas contiverem, e algum eleitor reclamar a verificação delles, proceder-se-ha a novo exame, ou leitura das listas.

Art. 72.º Se a eleição se não podér concluir toda n'um dia, em cada um daquelles que ella dura, se sobr'estará na sua continuação a tempo de se fazer até ao pôr do sol, e pelo modo determinado nos artigos 64. e 66.º, a confrontação e contagem das listas recebidas, o respectivo apuramento de votos, e a publicação prescripta no artigo seguinte.

Art. 73.º Terminado o apuramento, uma relação de todos os votados será publicada por edital affixado nas portas da casa da Assembléa, e em presença della serão as listas queimadas.

Art. 74.º Da eleição — se lavrára acta, na qual mencionarão:

1.º Todas as dúvidas que occorreram, e reclamações que se fizeram, pela ordem com que foram apresentadas, e a decisão motivada que sobre ellas se tomou.

2.º Quantos dias a eleição durou, e se em cada um delles se fez o apuramento prescripto no art. 68.º

Art. 75.º As dúvidas, que occorrerem no acto das eleições, serão decididas pelas Mesas á pluralidade de votos Em caso d'empate, o Presidente terá voto de qualidade.

§ unico. Das decisões das Mesas eleitoraes só havei á recurso para a Camara dos Deputados.

Art. 76.º Da acta se tirará cópia authentica, a qual, conjunctamente com um dos cadernos de que tractam os artigos 51.º e 52.º, será logo remettida ao Presidente da Camara Municipal da Cabeça do Circulo eleitoral. A remessa far-se-ha pelo seguro do Correio, havendo-o, ou por proprio, que cobrará recibo da entrega.

Art. 77.º Tanto as actas originaes, como as cópias, serão assignadas por todos os vogaes da Mesa. Se algum delles deixar de assignar, o secretario mencionará esta circumstancia, e o motivo della.

Art. 78.º Os mesarios nomearão dois d'entre si, que no dia designado se apresentarão, com a acta de que forem portadores, na Cabeça do Circulo eleitoral.

§ 1.º Tanto a cópia da acta, de que tracta o art. 74.º como a acta original, serão fechadas e lacradas; e além disto levarão no reverso do sobrescripto os appellidos dos membros da respectiva Mesa, postos por letra de cada um.

§ 2.º Quando os Concelhos se dividirem em mais de uma Assembléa, os portadores das actas se reunirão com a necessaria antecipação na Cabeça do Concelho, e elegerão d'entre os dois, que serão os portadores de todas as actas do Concelho.

§ 3.º Os portadores das actas das Ilhas dos Açôres, em que não está collocada a Cabeça do Circulo, reunir-se-hão, no logar designado pelos Governadores Civis, em cada uma dessas Ilhas, e elegerão d'entre si dois, que levem as mesmas actas á referida Cabeça do Circulo.

§ 4.º Os portadores da acta da Ilha do Corvo deverão concorrer no logar que lhe fôr designado na Ilha das Piores, na fórma e para o fim declarado no paragrafo antecedente.

§ 5.º Se algum dos dois portadores de actas se impossibilitar, depois de nomeado, e não podér concorrer á Cabeça do Circulo eleitoral, deverá apresentar ao Presidente da Junta a sua desculpa com a necessaria antecipação, e este a attenderá se fôr legal. Esta desculpa será apresentada pelo portador da acta, que concorrer á Junta da Cabeça do Circulo eleitoral.

Art. 79.º Nas actas se deverá declarar, que os cidadãos, que formam a Assemblea, outhorgam aos Deputados, que, em resultado dos votos de todo o Circulo eleitoral, se mostrarem eleitos na Junta delle,.a todos, e a cada um in solidum, os mais amplos poderes para que, reunidos com os dos outros Circulos eleitoraes da Monarchia Portugueza, façam tudo quanto fôr conducente ao bem geral da Nação.

TITULO V.

Do apuramento dos votos na Junta do Circulo eleitoral.

Art. 80.º No dia designado se reunirão pelas 10 horas da manhã, nas casas da Camara da Cabeça do Circulo eleitoral, os portadores das actas de todo o Circulo, com o Presidente da Camara. Este fará logo proceder á eleição da Mesa, em conformidade com o que fica disposto nos art.os 53.º e seguintes.

Art. 81.º Constituida a Mesa, o Presidente da Camara lhe apresentára, fechadas e lacradas, as cópias das actas de que faz menção o art. 74.º; e logo se procederá ao apuramento dos votos, que nas actas parciaes tiver cada um dos votados; observando-se, no que fôr applicavel, o que se determina no» art. 66.º e seguintes.

§ 1.º Em nenhum caso poderão as Juntas do Circulo eleitoral annullar actos, ou deixar de contar os votos, nelles referidos, aos cidadãos em que recaissem.

§ 2.º As Juntas do Circulo eleitoral, no caso de acharem nullidade nos processos de alguma das Assembleas eleitoraes, especifical-as-hão na acta geral, que fizerem da eleição, para a Camara dos Deputados resolver.

Art. 82.º Para qualquer cidadão se haver por eleito Deputado, ou substituto, é preciso que obtenha a maioria absoluta. Os mais votados são os Deputados, e os immediatos em votos, substitutos.

§ unico. Maioria absoluta é o numero inteiro immediatamente superior á metade leal do dos votantes. Assim, a maioria absoluta de qualquer numero impar é a mesma que a do numero par immediatamente inferior.

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Art. 83.º Só não obtiverem maioria absoluta cidadãos bastantes para preencher o numero dos Deputados, e seus respectivos substitutos, far-se-ha uma relação, que contenha em tresdobro o numero dos que faltarem, composta dos nomes daquelles, que tiverem mais votos, e com declaração de quantos cada um teve. A mesma relação será lida publicamente, affixada na porta da Igreja, e lançada nas actas.

Art. 84.º O Presidente fará logo tirar pelos secretarios tantas cópias daquella relação, quantos forem os Concelhos do Circulo eleitoral: verificada a sua exactidão, serão assignadas pela Mesa, e immediatamente enviadas pelo Presidente a todas as Camaras do Circulo eleitoral.

Art. 85.º Os Presidentes das Camaras dos Concelhos remetterão immediatamente cópia das relações, tiradas pelas secretarios das mesmas e por ambos assignadas, aos Presidentes que foram das Assembléas eleitoraes, os quaes as farão logo registar nos cadernos competentes, que para isso lhes terão sido pelas Camaras enviados, e lhes darão a maior publicidade, fazendo-as affixar na porta da Igreja, e nos logares mais publicos.

Art. 86.º Ao mesmo tempo convocarão as Camaras os eleitores para nova Assembléa, annunciando, — por editaes, que ella se ha de reunir d'ahi a quinze dias no mesmo local e á mesma hora em que se reuniu a primeira; declarando o numero dos Deputados e dos substitutos de que os eleitores devem formar suas listas; e que uns e outros devem ser tirados d'entre os incluidos na relação, que fôr remettida pela Junta de Cabeça do Circulo eleitoral. Esta relação será litteralmente transcripta nos editaes.

Art. 87.º Reunidas as Assembléas eleitoraes, se procedêra em tudo conforme ao que fica disposto nos art.os 55.º e seguintes até 78.º; sendo mesarios 03 que serviram nas primeiras Assembléas, e devendo os portadores das actas desta segunda eleição apresentar-se na Cabeça do Circulo eleitoral d'ahi a oito dias.

Att. 88.º No segundo apuramento de votos basta a pluralidade relativa para a eleição dos Deputados e substitutos.

Art. 89.º Acabado o apuramento de votos tanto do primeiro como do segundo escrutinio, se farão publicos por Editaes os nomes dos Deputados e substitutos eleitos.

Art. 90.º Da eleição se lavrará acta em que se declarem os nomes dos Deputados e substitutos; o numero de votos que cada um teve; e de como, pelas actas das Assembléas de todo o Circulo eleitoral, consta que os eleitores dellas outhorgaram aos cidadãos, que sairam eleitos Deputados e substitutos, os poderes declarados no art. 78.

Art. 91.º Da acta do apuramento se entregarão cópias, assignadas por toda a Mesa, a cada um dos Deputados e substitutos que presentes estiverem: aos, ausentes se enviarão com participação official do5 respectivo Presidente.

Art. 92.º A acta do apuramento na Cabeça do Circulo eleitoral, conjunctamente com as actas, cadernos e mais papeis, que tiverem vindo das Assembléas eleitoraes, serão immediatamente remettidos ao Ministro e Secretario d'Estado dos Negocios do Reino, para serem presentes á Junta preparatoria da Camara dos Deputados.

TITULO VI.

Disposições geraes.

Art. 93.º O Governo, por Decreto, deverá declamar o dia da convocação dos Circulos eleitoraes, marcando, para este fim, um Domingo em que terão principio as eleições.

No terceiro Domingo seguinte terá logar a reunião dos portadores de actas na Junta da Cabeça do Circulo eleitoral.

No sexto Domingo seguinte o segundo escrutinio; e no oitavo a reunião dos portadores das actas, e a conclusão das eleições.

Art. 94.º Todo o processo eleitoral, comprehendendo o recenseamento, as reclamações, os recursos, os documentos com que forem instruidos, as petições, os requerimentos, as resoluções do Conselho de Estado, etc, serão escriptos em papel não sellado.

Art. 95.º N'um só requerimento se póde reclamar, ou recorrer por muitos ou por todos os que se considerarem prejudicados nos seus direitos politicos.

Art. 96.º Os Parochos das Freguezias, que constituem as Assembléas eleitoraes, assistem á eleição para informar sobre a identidade dos votantes.

§ 1.º Faltando o Parocho, a Mesa nomeará um Sacerdote, ou a pessoa que julgar mais idonea, para fazer as suas vezes.

§ 2.º O Parocho, ou quem suas vezes fizer, tomará logar na Mesa ao lado do Presidente. (

Art. 97.º A Junta preparatoria da Camara dos Deputados pertence a decisão definitiva de todas as dúvidas e reclamações, que se suscitarem, ou fizerem nas Assembléas eleitoraes, e nas Juntas de Cabeça de Circulo.

Art. 98.º Nas Assembléas não se póde discutir ou deliberar sobre objecto algum estranho ás eleições. Tudo o que, além d'isso, se tractar, é nullo e de nenhum effeito.

Art. 99.º Aos Presidentes das Mesas incumbe manter a liberdade dos eleitores, conservar a ordem regular a policia das Assembléas.

§ unico Todas as Auctoridades darão inteiro cumprimento ás requisições que as Mesas, para este fim, lhes dirigirem: e são, sob sua responsabilidade, obrigados a evitar que, por qualquer modo, se attente contra a segurança dos eleitores.

Art. 100.º Nenhum individuo póde apresentar-se armado na Assembléa eleitoral; e ao que o fizer, ordenára o Presidente que se retire.

Art. 101.º A nenhuma força armada é permittido apresentar-se nas Assembléas eleitoraes ou Juntas do apuramento de votos, nem em logar proximo ao edificio em que ellas se celebrem, excepto se apresentar requisição escripta da Mesa.

§ 1.º Apparecendo força armada, suspendem-se os actos eleitoraes, que só poderão continuar uma hora depois da sua retirada.

§ 2.º Nas terras em que se reunirem as Assembléas eleitoraes, ou as Juntas de apuramento, a força armada se conservará nos quarteis ou alojamentos, durante os actos das ditas Assembléas ou Juntas.

§ 3.º Esta disposição não comprehende a força indispensavel para o serviço regular, nem individualmente os militares que estiverem recenseados.

Art. 102.º A nenhum cidadão é permittido votar em mais de uma Assembléa.

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Art. 103.º Nenhum cidadão, qualquer que seja o eu emprego ou condição, póde ser impedido de votar, sendo recenseado para eleitor.

Art. 104.º Os Deputados, eleitos por mais de um Collegio eleitoral, representam o Districto da naturalidade; na falta desta o da residencia; na falta da residencia aquelle em que tiverem obtido maior numero de votos; e em igualdade devotos o que a sorte designar.

TITULO VII.

Disposições penaes.

Art. 105.º A transgressão dos art.0 15.º e seguintes ale 20.º, inscrevendo-se indevidamente no recenseamento, ou deixando de se inscrever qualquer cidadão, ou negando-se-lhe documentos, será punida segundo o gráo de dólo ou malicia, com a mulcta de dez a cincoenta mil réis; e com a inhabilidade, de seis mezes a um anno, para todo o emprego publico.

Art. 106.º A transgressão dos art.os 16.º, 17.º, e 35 § 2.º, não se passando dentro de quarenta e oito horas, contadas da apresentação do requerimento, as certidões que se pedirem, será punida com as penas de suspensão do emprego de tres a seis mezes, e uma mulcta de cinco até quinze mil réis.

Art. 107.º A transgressão do art. 27.º, quanto á affixação na porta das Igrejas Parochiaes, da cópia exacta das listas do recenseamento, e do § unico do art. 51.º alterando-se o recenseamento original nos cadernos que forem enviados aos Presidentes das Assembleas, será punida, segundo o gráo de dólo ou malicia, com as penas estabelecidas no art. 109.

Art. 108.º O Commandante de qualquer força, que transgredir a disposição do art. 101.º, será punido com a pena de prisão de dois a seis mezes, e com a perda do soldo e antiguidade relativa a este tempo.

§ 1.º Se o dicto Commandante fôr official inferior, terá a mesma pena de prisão, e baixa de pôsto de tres mezes a um anno.

§ 2.º Nenhuma ordem vocal relevará o infractor, e mesmo nenhuma ordem por escripto, a não ser a original requisição da Mesa.

Art. 109.º A transgressão do disposto no § 1.º do art. 101.º, chamando-se força armada sem a requisição da Mesa eleitoral, será punida com a mulcta de dez a cincoenta mil réis, e inhabilidade, por um a dois annos, para qualquer emprego publico.

Art. 110.º A transgressão do § unico do art. 99.º commettida pela auctoridade administrativa, que não empregar todos os meios de impedir a acção de individuos contra o livre uso do direito eleitoral, ou seja usando de ameaças, ou recorrendo a vias de facto, será punida com as penas de perdimento de emprego, e inhabilidade por tres annos para exercer aquelle ou qualquer outro.

Art. 111.º O cidadão que practicar os factos de que tracta o artigo antecedente, ou seja por falta de providencias da auctoridade administrativa, ou apesar dellas, será punido com a mulcta de dez a trinta mil réis: porém se de taes factos resultar crime, a que pelas Leis caiba maior pena, esta lhe será imposta.

Art. 112.º Todo o funccionario publico, de qualquer ordem ou cathegoria, que abusar da sua auctoridade para intimar ou fazer intimar os eleitores a fim de se apresentarem nos dias da eleição, conduzindo-os, ou fazendo-09 conduzir até á casa da Assemblea, ou perto della, distribuindo-lhes, ou fazendo-lhes distribuir listas por mando, ou suggestão sua, ou practicando quaesquer outros actos de superioridade, que não sejam da sua competencia, será punido com o perdimento do emprego e inhabilidade de seis annos para qualquer outro, e prisão de tres mezes a um anno.

Art. 113.r O que transgredir a disposição do art. 101.º, votando em mais de uma Assemblea, ou sob nome supposto, será punido com a mulcta de dez a cincoenta mil réis, e inhabilitado por um anno para todo o emprego publico.

Art. 114.º A transgressão dos art.08 60.º § unico, 61.0 e 69.º recebendo-se listas diversas das que por esta Lei são qualificadas, ou contando-se os votos que ellas tiverem, pondo-se ou consentindo-se que se ponha a nota de descarga em eleitores que não votaram, ou lançando-se na urna maior numero de listas, que o dos votantes; ou trocando na leitura das listas o nome dos votados; ou diminuindo-os a uns e accrescentando-os a outros no acto de os assentar; será punida, em qualquer destes casos, com a mulcta de dez a cincoenta mil réis, e inhabilidade, por um a tres annos, para todo o emprego publico.

Art. 115.º Todos os crimes contra o direito eleitoral, e exercicio deste direito, que ficam enumerados nos artigos antecedentes, serão perseguidos por querela dada perante o Juiz do Julgado em que elles forem commettidos.

§ 1.º E competente para querelar, qualquer dos eleitores inscriptos no recenseamento.

2.º O direito de querelar prescreve por tres annos, e o de accusar por dez annos.

§ 3.º Para se dar a querela e seguir a accusação por estes crimes contra Empregados Publicos, ou Auctoridades de qualquer ordem ou cathegoria que sejam, não é necessaria licença do Governo.

§ 4.º O Ministerio Publico póde assistir á formação do corpo de delicto, querendo, para o que será sempre intimado; mas a sua assistencia não é precisa para a validade delle.

§ 5.º O Juiz competente, logo que requerido seja, procederá sem demora á formação do corpo de delicto; e é obrigado a proseguir nos mais termos do processo, dentro dos prazos marcados em a Novissima Reforma Judiciaria, para os demais casos crimes. O Juiz, que assim não fizer, commette um abuso do Poder, pelo qual póde tambem querelar-se delle.

§ 6.º O despacho de indiciação obrigará sempre os indiciados a prisão e livramento, e nestes crimes não tem logar a fiança.

§ 7.º O Poder Judicial, sempre que ache motivo para condemnar, applicará, conforme o que fica disposto, as penas de perdimento de emprego, e de inhabilidade para qualquer outro.

TITULO VIII.

Disposições especiaes ácerca das Ilhas Adjacentes e do Ultramar.

Art. 116.º Nas Ilhas Adjacentes e Provincias Ultramarinas os respectivos Governadores Civis e Governadores Geraes darão a devida execução ás dis-

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posições desta Lei, designando para os actos eleitoraes os logares e os dias que forem compativeis; guardando-se em tudo os indispensaveis intervallos, segundo as distancias e os meios de communicação.

Art. 117.º Os Deputados pelas Provincias Ultramarinas, eleitos para uma Legislatura, continuam na seguinte até que sejam legalmente substituidos.

Art. 118.º As despezas de vinda e volta dos Deputados das Provincias Ultramarinas, ser-lhes-hão satisfeitas pelos Cofres das respectivas Provincias.

Art. 119.º Igualmente concorrerão as Provincias Ultramarinas com a quota correspondente ao Subsidio, que o Thesouro pagar aos seus Deputados.

Art. 120.º Os Deputados que vierem do Ultramar, vencerão o mesmo subsidio no intervallo das Sessões, que durante estas; o que se não entenderá, quando essas Provincias nomearem Deputados cidadãos naturaes ou estabelecidos no Reino de Portugal, a respeito do; quaes se terá então a mesma regra estabelecida para os outros do Continente.

Art. 121.º As eleições do Estado da India continuarão a ser reguladas pelas Instrucções de 22 de Abril de 1815, na parte em que ellas se não oppozerem ás disposições da presente Lei.

Art. 123.º Os Governadores Geraes das Provincias ultramarinas, ouvido o Conselho do Governo, são auctorisados a tomar as providencias para a melhor execução da presente Lei; e de todas as que tomarem, darão parte ás Côrtes.

Sala da Commissão eleitoral, em 5 de Junho de 1848. — Antonio José d'Avila, Luiz Augusto Rebello da Silva, João Francisco de Vilhena, Zeferino Teixeira Cabral de Mesquita, João Pereira Crespo, Tem voto do Sr. Antonio Augusto de Portugal Corrêa de Lacerda.

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MAPPA N.º 1.

Mappa dos Circulos Eleitoraes, e o numero de Deputados, que deve eleger cada um dos Districtos Administrativos, e Provincias Ultramarinas.

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MAPPA N. 2.

Desenvolvimento do Mappa dos Circulos Eleitoraes, e do numero de Deputados que devem eleger os mesmos Circulos.

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«Ver Diario Original»

Começando o Sr. Secretario a lêr o Projecto, requereu o Sr. Xavier da Silva que se dispensou-se a leitura na Mesa, e assim se decidiu.

O Sr. Cunha Sotto-Maior — Requeiro que se dispense a discussão na generalidade, e se passe a especialidade.

Decidiu-se negativamente.

O Sr. Poças Falcão: — Sr. Presidente, com difficuldade vou entrar nesta questão, porque reconheço a minha insufficiencia para entrar nella. Todavia não recusarei em apresentar a minha opinião acerca do Projecto, em cuja discussão ainda não emitti o meu voto, e que vou emittir com toda a franqueza de que sou capaz.

Sr. Presidente, tendo de votar contra o Projecto em discussão na sua generalidade, não posso deixar de apresentar algumas razões para fundamentar o meu voto. Sr. Presidente, eu como todos tambem teem reconhecido, estou persuadido que é indispensavel uma boa Lei Eleitoral. (Apoiados) Estou persuadido que todos nós ternos interesse em que essa Lei se discuta, (Apoiados) mas que se discuta de maneira tal que possa apparecer uma Lei tal qual a necessita o Paiz. (Apoiados) Mas quando eu vejo que o Projecto em discussão se oppõe a um principio que se acha expresso na Carta Constitucional, não posso deixar de emittir francamente a minha opinião á Camara; não posso deixar de dizer desde já que respeito como devo a opinião da Maioria desta Camara (respeito-a em quanto respeito a opinião de cada um dos illustres Deputados que a compõem) todavia entendo de mim para mim, que uma decisão desta Camara não produz effeito (Apoiado, apoiado) a ponto que possa entrar em discussão livremente o Projecto que se apresenta (Grande agitação — Varios Oradores pedem a palavra.) Dizia eu, Sr. Presidente, que não podia deixar de emittir francamente a minha opinião, quando se apresenta um Projecto de Lei Eleitoral, que vai contrariar um principio expresso na Carta Constitucional, que eu como todos devemos respeitar.

Sr. Presidente, não quero agora trazer novamente á arena Parlamentar o art. 63.º da Carta — não se supponha isso — porque com quanto eu entenda que esse artigo e constitucional, e constitucionalissimo, (Apoiados) todavia não podia de maneira alguma trazer novamente essa questão a Camara, porque como disse ha pouco, respeito a opinião dos meus illustres Collegas da Maioria, para trazer novamente á discussão, a constitucionalidade ou não constitucionalidade daquelle artigo, com quanto me não prive de referir-me a ella, como fundamento da minha opinião. Digo que não tracto de fundamentar a minha opinião a esse respeito; porque entendo que na actualidade nada vem para o caso, e demais a mais não faria senão repetir aquillo que respeitaveis talentos já aqui apresentaram, não iria senão parodiar mal aquillo que talentos mui distinctos apresentaram já com toda a clareza. E além disso não poderia agora convenientemente faze-lo.

Ma, Sr. Presidente, um outro receio me priva que vê assim mesmo entrar na discussão deste Projecto, e é sobre este ponto que eu quero chamar a attenção da Camara.

Ainda que se entenda ou se conheça que a opinião da Maioria da Camara é de que o art. 63.º não e constitucional, entendo todavia que essa decisão nada obriga, (Apoiado) entendo além disso que, para que ella podesse obrigar, era preciso que seguisse os tramites legaes. (Vozes: — Nem assim) Sr. Presidente, já ponho de parte a minha opinião, já ponho de parte as opiniões seguras de que o artigo e constitucional; mas perguntarei e desejo que se responda com sinceridade e franqueza, — haverá ou não haverá duvida ácerca da constitucionalidade ou inconstitucionalidade do artigo? Creio que ninguem podéra negar que ha duvída, e grande duvída, e se alguem m'o quizesse negar, eu diria — não ouviste aqui uma acalorada e prolongada discussão, ácerca de similhante objecto? Não viste tantos distinctos e respeitaveis Oradores em campos oppostos? Não viste como afinal ficaram cada um com as suas opiniões por assim dizer vencidas, mas não convencidas? (Apoiados) E quando Oradores tão distincto, quando talentos tão respeitaveis assim se dividem, é forçoso confessar, que o logar é obscuro, quero dizer, é

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muito duvidoso se o artigo é ou não constitucional; o nestas circumstancias julgamos interpretado o artigo só por uma decisão da Maioria da Camara dos Deputados! Eu entendo que não, porque os termos legaes não são esses; e se é duvidoso, se carece de interpretação, forçoso é que se faça pelos tramites legaes. E então, Sr. Presidente, visto que eu entendo que não ha ainda essa interpretação, visto que eu entendo que ella é absolutamente indispensavel para que se possa entrar na discussão do Projecto que se apresenta, visto que eu tenho de mim para mim, que sem essa interpretação não e possivel discutir-se um Projecto, que traga como principio fundamentar da eleição o opposto áquelle marcado na Carta Constitucional que não está revogado, nem interpretado désse modo, concluo, que não posso de maneira nenhuma convir em que se entre na discussão do Projecto nelas circumstancias: e nem se diga, que nós já sabemos qual é a opinião da Maioria da Camara; respeito-a, mas seja ella qual for, não é possivel que nós sobre ella façamos obra, por isso mesmo que não se póde dizer interpretado um artigo da Carta, sobre que ha muita duvida, só por uma resposta desta Camara a um quesito proposto por uma Commissão; digo que isso é ousadia. Nem se diga, Sr. Presidente, como e natural que se diga, que nós deste modo vamos demorar a discussão da Lei Eleitoral; isso não deve servir-nos de obstaculo, por isso mesmo que eu entendo, que desta maneira é que póde acontecer que nós estejamos a trabalhar debalde; quer dizer, se no fim de uma discussão muito longa e muito melhorada, como é natural que leve este Projecto, a Camara dos Pares disser que o artigo é constitucional, todo o nosso trabalho está perdido, (Apoiados) e então entendo, que quando queremos adiantar, atrasamos e atrasamos muito. Por estas considerações declaro que hei de votar contra o Projecto, p não posso deixar de maneira nenhuma de pronunciar a minha opinião, porque, como digo, ainda que conheço a minha insufficiencia, não posso nem devo recuar quando se apresenta um Projecto que eu entendo que repugna com os verdadeiros principios; e por agora não direi mais nada.

O Sr. Carlos Bento: — (Sobre a Ordem) Sr. Presidente, o illustre Deputado que acaba de fallar estabeleceu uma questão preliminar, e et» pediria a S. S.ª que tivesse em consideração, que o seu voto (permitta-me S. S.ª) é barbaro, condemnando um Projecto inteiro, porque ha nelle uma da posição que não approva. (Apoiados) Peço perdão ao illustre Deputado; sei que as suas intenções não são estas, mas veja S. S.ª que ha barbaridade em condemnar um Projecto inteiro a despeito da excellencia de disposições, que nelle existem, da qual S. S.ª não póde duvidar: presto homenagem ao seu bom senso. No Projecto existem disposições que S. S.ª approva, e que defenderia se fôssem atacadas; e então hade querer o illustre Deputado que, por uma duvida que tem a respeito de um ponto deste Projecto, seja retirado da discussão.... (Vozes. — Ordem, ordem; não tem a palavra sobre a materia).

O Sr. Presidente: — Queira fazer a sua Moção de Ordem; o Sr. Deputado está discutindo, está fallando sobre a materia....

O Orador: — Não respondo a V. Ex.ª....

O Sr. Presidente: — Nem póde responder, porque estou no uso de um direito, que me compete...

O Orador: — De me mandar calar!... Eu fallava para convidar o illustre Deputado a mandar uma Moção de Ordem, ou uma questão preliminar para a Me«a.....

O Sr. Presidente: — Não estava na ordem procedendo assim; e sobre tudo não era precizo chamar barbara á opinião do Sr. Deputado; (Muitos apoiados) não tem direito de o fazer...

O Orador: — Peço perdão; não dou direito a V. Ex.ª para alterar o que acabo de dizer; eu disse que essa opinião tinha uma consequencia barbara, e isto é muito differente de chamar barbara á opinião...

O Sr. Presidente: — Invoco o testimunho da Camara; o Sr. Deputado chamou barbara á opinião do Sr. Poças Falcão (Repetidos apoiados); não tinha direito para o fazer, muito principalmente sobre a ordem, e sem estar na ordem; não póde assim continuar; assim lho declaro, porque me cumpre dirigir os trabalhos. O Sr. Deputado queria convidar o Sr. Poças Falcão a mandar uma questão preliminar para a Mesa; mas na discussão na generalidade o Sr. Deputado podia combater a base.....

O Orador: — Mas V. Ex.ª chamou-me a ordem....

O Sr. Presidente: — Não o chamei á ordem; disse que não podia progredir assim....

O Orador: — Peço perdão a V. Ex.ª; pareceu-me que me tinha chamado á ordem, e se por acaso me persuadisse que tinha offendido o Sr. Deputado, era o primeiro a pedir-lhe perdão....

O Sr. Presidente: — Muito bem por esse lado. O que eu disse ao Sr. Deputado, foi que o convidava a fazer asna Moção de Ordem, por isso que estava fallando sobre a materia; é o que eu disse, e digo novamente; queira mandar a sua Moção de Ordem...

O Orador. — Mas eu preciso explicar-me de.... (Com vehemencia) de nada. O illustre Deputado disse — que para se discutir este Projecto era necessario, que uma resolução que teve logar nesta Camara, passasse á outra Camara, o como entendia que isto era necessario, votava contra a generalidade do Projecto; — ora, parecendo-me que isto é duro em relação a todas as disposições que se contém no Projecto, julgo que esta questão se póde e deve reduzir a outros termos, isto é — se a Camara entende que a sua resolução sobre a inconstitucionalidade do artigo 63 deve ser redusida a um Projecto de Lei, para que a Camara dos Pares se pronuncie sobre este ponto — e póde tracta-se da Lei Eleitoral independentemente desta questão;... (O Sr. Poças Falcão: — Não póde) pois não se póde tractar da divisão dos circulos, por exemplo? Não ha muitos outros pontos nesta Lei a respeito dos quaes o Sr. Deputado não tem duvida nenhuma? Desta maneira não parava o Projecto.

O Sr. Presidente: — Queira mandar a sua Proposta. (Pausa)

Leu-se logo na Mesa a seguinte:

Proposta. — a Proponho que se discuta como Moção preliminar a questão suscitada pelo Sr. Poças Falcão, sobre se a questão da Constitucionalidade do artigo 63 da Carta Constitucional deve seguir o tramites d'um Projecto de Lei, passando á Camara dos Dignos Pares. 5? — Carlos Bento da Silva.

Foi admittida.

O Sr. Presidente: — Era escusado lembrar á Camara, que tractando-se da discussão na generalidade

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do Projecto n.º 48, e sendo a bale deste Projecto — a eleição directa — os Srs. Deputados que quizessem combater o Projecto, podiam sustentar que a eleição directa era contra a Carla. (Apoiados) Esta é a base principal do Projecto; e é sobre esta base que versa principalmente a discussão na generalidade (Apoia -dos) ha outras bases secundarias; mas esta é a capital de todas. Não obstante isto, por occasião da votação declararei os termos precisos desta.

O Sr. Poças Falcão. — Sr. Presidente; eu pedi a palavra simplesmente para dizer a V. Ex.ª e á Camara, que acho muito rasoavel a Proposta que acaba de mandar para a Mesa o Sr. Deputado por Vizeu, e não tractarei de qualificar a sua opinião como elle se dignou qualificar a minha; sómente direi a S. Ex.ª... (O Sr. Carlos Bento: — Não tenho excellencia) que, se quiz convidar-me a apresentar a Moção, por delicadeza poderia fazel-o; se me quiser dar um conselho, dir-lhe-hei, que em muitas occasiões precisaria dos seus conselhos, mas na actual felizmente não precisava; se foi por me julgar na obrigação de o fazer, essa opinião é que eu quero contestar. Eu não quiz aqui apresentar nem uma Moção de Ordem, nem uma questão preliminar; quiz simplesmente apresentar a minha opinião sobre o Projecto, e creio que era occasião de o fazer, quando estava o Projecto em discussão na generalidade, por isso mesmo que eu entendo, que caindo o pensamento do Projecto sobre que eu fallei, cae todo o Projecto; as disposições que ficam subsistentes, são de bem pouca transcendencia; creio que são as relativas a um e outro methodo de eleição: por consequencia entendi eu que estava perfeitissimamente no meu direito; mas emquanto ás consequencias que se podem tirar desta opinião, eu não posso responder por ellas; esta e a minha opinião; se a Camara a admittir, a Camara ha de responder por ella; se a não admittir, então tambem não ha responsabilidade; e devo accrescentar além disso, Sr. Presidente, que a questão da maneira porque vem proposta, talvez ache apoio na Maioria da Camara, e talvez mesmo que a achasse em mim, porque eu entendo que a Maioria da Camara ainda convencida de que o artigo não é constitucional, estou persuadido que ha de reconhecer, que não está ainda interpretado, e por consequencia que é necessario seguir os tramites de que eu fallei. Por tanto entendo que de maneira nenhuma fallei contra a ordem, e além disso, que não estava na obrigação de mandar para a Meza a Moção, a que o nobre Deputado alludiu

O Sr. -Presidende: — Mas eu peço aos Srs. Deputados que pedem a palavra sobre a Ordem, que se limitem precisamente á Ordem; Apoiados) não é quando se pede a palavra sobre a Ordem, que se podem combater os argumentos contrarios.,.apoiados)

O Sr. Moraes Soares. — Sr. Presidente, apenas se annunciou a Ordem do Dia (todos somos testemunhas do que se tom passado nesta Camara) annunciou-se uma daquellas discussões cheias de calor, de fogo e de vida parlamentar; o eu felicito me com a Camara por desenvolver tanta energia em questões de tanta grandeza: mas como vejo uma tendencia para se perder o sangue frio, eu peço a todos os meus illustres Collegas que tractem esta materia com a circumspecção e seriedade de espirito que o necessario; e eu farei o mesmo. Da bocca d'um illustre Deputado, que é distincto Ornamento desta Camara saio um vaticínio, que senão queria Lei Eleitoral; (O Sr. Cunha Sotto-Maior: — É um vaticinio) e agora ouvi dizer á minha direita, a um Deputado que já tomou parte no debate, que um Sr. Deputado meu particular Amigo tinha estabelecido um principio, cujas consequencias eram barbaras; ora se as consequencias eram barbaras, o principe» era tambem barbaro. (O Sr. Cunha Sotto-Maior: — Isto não e sobre a Ordem). O Orador: — Eu tenho ouvido o Sr. Deputado sempre com attenção, e ainda que seria muitas vezes necessario trazer algodão nos ouvidos para o escutar, com tudo tenho escutado sempre silencioso o Sr. Deputado, e peço-lhe que tenha a bondade de me ouvir tambem. Digo que desta vez não ha de realisar o vaticínio que se proferiu, nem se hão de estabelecer principios, cujas consequencias sejam barbaras.

Sr. Presidente, eu entendo que em questões desta ordem deve-se marchar com toda a circumspecção: e por esta occasião lembro a divisa da Politica de um grande homem, que hoje vive no exilio, que é Mr. Guizott a divisa da sua Politica era — Via, recta brevissima — isto é que devemos marchar sempre pelos caminhos rectos, e deixar os tortuosos: mas para marcharmos por um caminho recto, e preciso que esta questão venha aqui despida de todas as difficuldades, e que se apresente debaixo dos seus verdadeiros pontos de vista. (Apoiados) Eu tinha a palavra sobre a generalidade do Projecto, mas como não posso usar della, cinjo-me á questão de Ordem, e digo que esta questão não póde proseguir, em quanto se não resolver uma outra questão; isto é, sem so resolver se nós podémos fazer uma Lei contraria á expressa determinação da Carta Constitucional. A Carta Constitucional diz no art. 63, que as eleições serão indirectas, e apresenta-se nesta Camara um Projecto, cujo base é a eleição directa. Nós não podémos funccionar senão dentro da orbita da Carta Constitucional, o por isso entendo que a questão sobre o Projecto que se aqui apresenta, não póde proseguir sem primeiro se resolver a questão previa, que annunciou o Sr. Carlos Bento: e então para obstar a este inconveniente, mando para a Meza um Projecto de Lei para que V. Ex.ª tenha a bondade de lhe dar o seguimento marcado no Regimento. o seguinte

Projecto. — Art. 1.º a Não é constitucional o methodo estabelecido no art. 63 da Carta para se proceder á eleição dos Deputados da Nação.

Art. 2.º «Fica por este modo authenticamente interpretado o art. 63 da Carta Constitucional.»» — Moraes Soares.

O Sr. Presidente: — Devo consultar a Camara solve o andamento que tenho a dar a esta Proposta; porque ella importa um Adiamento do Projecto em discussão (Apoiados).

Foi considerada como Adiamento, e depois de apoiada entrou em discussão.

O Sr. Cunha Sotto-Maior: — Eu quero entrar nesta questão com muita lealdade; por isso pergunto, se eu, que tenho a apresentar uma nova Proposta, e posso mandar para a Mesa?

O Sr. Presidente. — O Sr. Deputado póde mandar a sua Proposta, mas não póde alterar a ordem da inscripção, aproveitando-se da liberdade de a fundamentar; o ainda que alguns Senhores o fizeram,

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foi contra minha vontade, e contra a expressa determinação do Regimento.

O Sr. Cunha Sotto-Maior: — A Proposta e a seguinte:

Proposta. — «Póde a Camara na discussão da generalidade do Projecto reconsiderar incidentemente a sua votação sobre a constitucionalidade do art. 63.º — Cunha Sotto-Maior.

O Sr. Presidente: — Esta Proposta é quasi inutil, porque importa em essencia o mesmo que a Proposta do Sr. Moraes Soares, e mesmo a anterior (Apoiados) por consequencia fica considerada prejudicada, ou prevenida.

O Sr. Avila — Sr. Presidente, não posso deixar de dizer que é altamente significativo o que se está passando na Camara, é um acontecimento que deve ficar legislado (Apoiados). Admira que um nobre Deputado que votou, o anno passado, pela não constitucionalidade do art. 63.º da Carta, venha hoje pedir a interpretação desse artigo da Carta. Eu estava preparado para muito, ma) não estava preparado para isto... (Apoiados). Eu pergunto, já examinou o nobre Deputado se lemos faculdade de interpretar a Cita?

O Sr. Pereira de Mello — Póde-se fazer.

O Orador; — Para que possamos interpretar um artigo da Carta, é necessario que estejamos munidos dos necessarios poderes, e nós não temos auctorisação para iVo (Apoiados): por consequencia o simples facto da interpretação prova que esta Legislatura a não póde fazer (Adultos apoiados). Eu peço aos Srs. Deputados que vejam bem a situação em que estamos collocados, nó não lemos Lei Eleitoral, e sem Lei Eleitoral a Representação Nacional nunca póde ter o caracter de significar a verdadeira expressão da Vontade Nacional; por consequencia o Systema Representativo pecca pela sua primeira base (Muitos apoiados). Eu peço aos Srs. Deputados que se lembrem de que o anno passado, quando esta questão veio á Camara, houve muita gente que receiou que a Lei se fizesse, e que o resultado disto fosse a dissolução da Camara; estamos no segundo anno de Legislatura, e estamos discutindo a generalidade da Lei Eleitoral, e ainda que so empregasse a melhor vontade, e se discutisse a Lei com brevidade, estou convencido de que ella não passaria aqui nesta Sessão: na Sessão seguinte passaria ella, quando muito, na Camara dos Dignos Pares; e se alli se lhe fizessem alterações, como é minto de presumir, tinha o Projecto de voltar a esta Camara, e só poderia por tanto estar convertido em Lei no ultimo anno desta Legislatura. Logo a dissolução, por aquelle motivo, era impossivel.

Quando querem os nobres Deputados dar cumprimento ao art. 70.º da Carta? Será á ultima hora, ou querem que o Governo continue a regular o methodo pratico de eleições por Decretos?

Mas, Sr. Presidente. era na occasião em que a Commissão veiu a esta Camara pedir que resolvesse como questão de methodo, que só como questão de methodo podia resolver, se o art. 63 era ou não constitucional, que se poder ia fazei alguma Proposta no sentido da que hoje o Sr. Deputado apresentou mas que aconteceu então? Aconteceu que na larga discussão que teve logar a este respeito, que durou 10 dias, em que fallaram 3ó Oradores, em que não se fechou o debate, acabou-se; porque não havia mais Inscripção, em que por consequencia discutimos o objecto até a saciedade, neste longo debate, não houve ninguem, que mandasse uma Substituição neste sentido, e é só depois de uma discussão de 10 dias que se acabou, por não haver quem quizesse fallar; e agora, repito, que se pede a reconsideração dessa decisão?.. (Uma voz: — Não se quer.) Sr. Presidente, eu poderia ainda dizer mais, e di-lo-hei, porque a este respeito é necessario dizei tudo (Apoiados.) Quando esta questão foi discutida na Commissão Eleitoral, era Presidente d'essa Commissão o Sr. Ministro da Fazenda, que me ouve, e aqui está o quesito que se propoz (Leu.)

Então reconheceu-se nesta Casa a auctoridade de decidir esta questão, não houve um só voto que duvidasse desta auctoridade; a Camara resolveu que o quesito voltasse á Commissão para que ella desse o seu Parecer sobre elle; a Commissão satisfez a este mandato, ninguem duvidou da competencia da Camara; porque todos os illustres Deputados, Membros da Commissão, assignaram o Parecer; e tanto a Maioria, como a Minoria da Commissão, reconheceram que esta Camara tinha auctoridade para resolver a questão; como é que agora se põe isto era duvida?.. Quererá o illustre Deputado, que se diga que a razão deste proceder agora e simplesmente o facto de existirem sentados naquellas Cadeiras (Indicando as Cadeiras dos Srs. Ministros) dois Cavalheiros que votaram pela constitucionalidade do art. 63? Que a Camara votou que o artigo não era constitucional, quando Ínvia um Ministerio compacto, que declarou, que essa era a fim opinião, o agora porque dois dos Cavalheiros que se acham no Ministerio, votaram pela não constitucionalidade do artigo, a Camara vota, ou quer votar, que o artigo é constitucional? É necessario que a Camara veja bem a situação em que vai collocar-se. Os dois Cavalheiros estão em um muito bom terreno, não necessitam deste cumprimento da Camara: SS. Ex.ªs foram de opinião que era constitucional o artigo, mas SS. Ex.ªs, pelo menos um dos Srs. Ministros que tomou a palavra, demonstrou que a eleição dilecta era a unica que so devia adoptar, e que não podia haver questão entre esta e a eleição indirecta, que só se oppunha a constitucionalidade do art. 63... (O Sr. Ministro da Fazenda: — Peço a palavra; isso não é assim) O Orador: Peço perdão a S. Ex.ª isto foi o que S. Ex.ª, disse, isto é o que está escripto no Diario da Camara, que aqui tenho. Apresento estas considerações para demonstrar que os illustres Deputados podem votar pelas eleições directas sem estarem em contradicção com as opiniões dos dois novos Ministros; porque uma vez resolvido que não era constitucional o art. 63, SS. Ex.ªs ficaram em bom terreno para votarem se podessem votar, pela eleição directa.

Foi laxada de barbara a opinião do illustre Deputado, que abriu o debate, de que se devia rejeitar este Projecto, porque o art. 1.º offendia o art. 63 da Carta: eu peço perdão ao illustre Debutado para dizer, que aquella expressão foi justa Se o illustre Deputado e de opinião que o art. 63 e constitucional, e que se deve por isso adoptar a eleição indirecta, é isso razão para rejeitar todo o Projecto? (Apoiados.) Rejeitar o Projecto na sua generalidade equivale a dizer que não se quer Lei Eleitoral: o illustre Deputado podia, quando se tractasse do methodo de eleição deveria combate-lo, e offerecer uma Subs-

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tituição; porque sendo admittida, o que podia acontecer era ir o Projecto á Commissão para o pôr em harmonia com essa decisão: mas o illustre Deputado disse a voto contra todo o Projector este voto importa o dizer; não quero que se faça a Lei Eleitoral, porque o facto é que approvado este Projecto na sua generalidade não fica approvada nenhuma das suas disposições (Apoiados.) Notarei ainda aos illustres Deputados da Maioria da Camara, que se vão collocar em uma muito má situação, porque se dirá, que o anno passado o Ministerio se poz á frente desta questão declarando que faria questão Ministerial da Lei Eleitoral; não da questão da constitucionalidade do art. 63, mas sim da Lei Eleitoral: disse o mesmo este anno no seu Programma quando declarou que havia de tractar com efficacia de dotar o Paiz com uma Lei Eleitoral; isto quer dizer — que se poria á frente da discussão da Lei Eleitoral; — dir-se-ha pois, que no anno passado se decidiu por uma grande Maioria de votos a não constitucionalidade do art. 03 da Carta Constitucional; porque o Ministerio sustentou essa douctrina, e que este anno se faz o contrario, porque dois illustres Deputados, que votaram contra, se. acham no Ministerio: dir-se-ha tambem, que o illustre Deputado, cuja Proposta deu logar a esta questão de Adiamento, obrou assim por deferencia com os dois illustres Cavalheiros; deferencia, de que SS. Ex.ª não precisam, porque estão em muito bom terreno, como já demonstrei.

Sr. Presidente, eu tenho muito pouca consideração pela opinião publica, quando é desvairada; porque entendo que tenho obrigação de a esclarecer; mas quando a opinião publica não o desvairada, é necessario que a respeitemos Querem os illustres Deputados saber o que se dirá ainda, senão se quizer fazer a Lei Eleitoral?... Ha de dizer-se que se querem conservar os mesmos vicios, e os mesmos defeitos; que não se quer Lei Eleitoral, porque se não quer fazer a divisão dos Circulos mais pequenos; porque se quer que venham 20 e 30 Deputados por um Circulo; porque se quer deixar este Paiz com 800 Eleitores de Provincia, a que o Governo com muita facilidade póde dar a Lei.

Sr. Presidente, eu não vejo que podesse haver receio nenhum em que se entrasse agora, clara, franca e lealmente na discussão desta Lei; porque entendo que por melhor vontade que tenhamos para que ella passe, nem nesta, nem na Sessão seguinte póde estar votada; resta só um anno, mas e mais que provavel, que o Projecto passe ainda para a Sessão desse anno: se senão começar agora, se nos pozermos com duvidas a respeito de uma questão que já se decidiu, declaro que entendo que não fazemos Lei Eleitoral nesta Legislatura.

Sr. Presidente, eu não digo mais nada: do que tractei foi de demonstrar á Camara que eu rejeito o Adiamento: que o reputo como inconveniente e impolitico, e faço votos para que a Camara medite seriamente na situação em que se vai collocar approvando a Proposta, que foi para a Mesa.

O Sr. Moraes Soares: — Eu pedi a palavra para uma Explicação...

O Sr. Presidente — O Sr. Deputado sabe muito bem qual é a disposição do Regimento, por tanto agora não póde ter logar. Tem a palavra o Sr. Poças Falcão.

O Sr. Poças Falcão: — Ainda que a minha opinião tem sido taxada de barbara, não deixarei de insistir nella; porque respeitando mui lo a opinião do illustre Deputado que acaba de fallar, eu peço licença a S. Ex.ª para dizer, que será má para S. Ex.ª a minha opinião, que muitos assim a julgarão, mas que eu, e talvez mais alguem, supponha barbaridade o chamar barbara á minha opinião; estamos em igual direito; eu respeito muito o talento dó nobre Deputado; mas parece-me que me tracta com demasiada severidade, quando quer mostrar que eu sou incoherente; quando quer mostrar que esta opinião e extravagante, ou como elle chamou — barbara.

Sr. Presidente, tracta-se, não de perguntar á Camara se póde reconsiderar a decisão que tomou o anno passado; eu, Sr. Presidente, até entendo que não e preciso reconsideral-a; não disse isso, o que eu entendia é que deviamos dar uma nova ordem a essa resolução, dar um destino novo, por assim dizer, um destino necessario, é preciso que se dê um caracter de Lei a essa decisão da Camara, porque é sem questão nenhuma, que a interpretação de um artigo da Carta não póde fazer-se senão pelas vias legaes, e não unicamente por uma resposta dada a uma pergunta de uma Commissão.

O nobre Deputado começou primeiramente por apresentar á Camara certos receios, dizendo que visse a Maioria na precisão em que se collocava, e que S. Ex. observava uma cousa para que não vinha preparado. Sobre isto devo dizer que quando a Camara não admittiu á discussão a Proposta do nobre Deputado pelo Algarve, foi por considerar que o que se achava na Mesa, importava ou involvia a mesma questão, e nestes termos para que seria necessaria uma segunda Proposta? Por consequencia nisto não houve discordancia alguma. O nobre Deputado impugnou esta discussão, e o destino que quer dar á resolução da Camara; porque entendeu que não era preciso interpretação, porque a Camara tem podér para tomar uma resolução tal como aquella, sem concorrencia de outras e quaesquer circumstancias: mas se se quizer a interpretação, disse o illustre Deputado, é preciso que os Deputados venham com os Poderes necessarios para interpretar um artigo da Carta Constitucional.

Ora, Sr. Presidente, o nobre Deputado acha muita facilidade n'uma cousa, e muita difficuldade n'outra, por um lado não quer o nobre Deputado que os tres Ramos do Poder Legislativo tenham poder de interpretar a Carta, e por outro quer que seja só objecto desta Camara uma decisão, da qual resulta uma interpretação da Carta. Pois então os tres Ramos do Poder Legislativo não podem fazer essa interpretação, e póde só fazel-a esta Camara!... Declaro que não sei argumentar assim, (Apoiados) e se é necessario, forçoso é que assim se faça.

O nobre Deputado quiz lançar uma censura a parte da Camara, que diz talvez traga esta questão por receiar logo a sua dissolução; eu creio que a Camara não terá esses receios. (Apoiados)

Sr. Presidente, eu por minha parte, visto que fui quem abri a discussão, devo declarar em primeiro logar, que entendo que ainda que agora principias se a discutir-se a Lei Eleitoral, ella não viria a tempo de dissolver a Camara se se quizesse a eleição para Deputados em conformidade da mesma Lei, que aqui se tracta; eu pois declaro que não tenho receio que a Camara se dissolva, e creio que os meus

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Collegas estão nas mesmas idéas ou circumstancias (Apoiado, apoiado). Portanto não é esse receio, não é esse o motivo que obrigue a que se demore a discução da Lei Eleitoral; se discutirmos primeiro a questão preliminar não podémos, de maneira nenhuma, fazer uma Lei Eleitoral nesta Legislatura, não se fará a Lei, não se quer Lei Eleitoral, eis o que o nobre Deputado tambem disse. Ora eu peço ao nobre Deputado licença para dizer que ninguem o quer embaraçar, (Apoiados) que nós queremos a Lei Eleitoral, e que quando se diz isto, pelo menos da minha parte assim é, o dizemos com a mesma sinceridade como S Ex.ª o póde dizer (Muitos apoiados). Alludindo a deliberação desta Camara, disse o nobre Deputado — que então não houve quem impugnasse ou pozesse em duvída se a Camara podia ou não podia decidir este quesito que lhe foi feito, e que era agora que se apresentava esta questão?

Sr. Presidente, eu por mim digo que não tomei parte na discussão o anno passado, e mesmo que a tomasse, isso não queria dizer que ficava privado todo e qualquer Deputado de vir trazer a Camara qualquer questão a este respeito, que essa deliberação da Camara não impedia que um Deputado trouxesse uma questão sobre o modo como se devia interpretar o artigo da Carta no sentido deliberado (Apoiados). Mas diz-se, ninguem protestou; é verdade, mas eu faço justiça á maioria d'esta Camara que quando votou que o artigo não era Constitucional, não quiz com isso dizer que ficava assim legalmente interpretado este artigo da Carta (Apoiados) foi esta a hypothese em que houve a deliberação (Apoiados). Disse o nobre Deputado — que talvez se modificasse a opinião da maioria da Camara por deferencia a alguns Cavalheiros, que hoje compõem o Ministerio, e que naquelle tempo foram da opinião da constitucionalidade, do art. 63 da Carta.

Sr. Presidente, sobre isto parece-me que não ha mais que a opinião do nobre Deputado. (Apoiado) Se se considerar um pouco sobre o ponto, e sobre o modo como tem sido discutida, ver-se-ha que não póde existir o menor receio de que esta questão veio por deferencia com os Cavalheiros, que se sentam naquellas cadeiras do Ministerio.

Sr. Presidente, quando se entendeu que o art. 63.º não era constitucional, podia todavia entender-se tambem, como se entendeu, que não podia ser interpretado do modo que se quer que seja interpretado por uma deliberação da Maioria d'esta Camara, só por uma deliberação desta Camara, entendo que é necessario um novo modo de interpretar, e querendo que para isto se sigam os termos legaes, não contestemos nem á Commissão o direito de vir perguntar á Camara se o art. 63.º era ou não Constitucional, nem contestemos á Camara o direito de lhe responder como lhe respondeu (Apoiados) agora o que contestamos é o effeito do exercicio désse direito, contestamos que por uma pergunta d'uma Commissão, e uma resposta da Camara a essa pergunta, se dê força interpretativa d'um artigo da Carta. (Apoiados) E sobre esse ponto que eu entendo que não póde, de maneira nenhuma, deixar de admittir-se á discussão o Projecto que ha pouco foi para a Mesa, e não se póde, antes disso, discutir a Lei Eleitoral, sendo certo que eu voto contra elle, nos termos em que vem concebido, como deve suppor-se. Mas diz o nobre Deputado, que, deste modo não teremos Lei Eleitoral, teremos demorada a sua discussão, e não se quer Lei Eleitoral, quer-se que continuem os abusos, e vicios que existem no processo actual de Eleições — Eu admiro que o nobre Deputado, que se diz Senhor das practicas Parlamentares, que venha assim irrogar uma censura tão aspera sobre todos os seus Collegas, que teem mais razão para lhe a lançarem (Apoiados).

Disse tambem o nobre Deputado, que era preciso attender á opinião publica, e marchar em harmonia com ella, e não devemos, neste caso, espaçar a discussão da Lei Eleitoral. Sr. Presidente, a opinião publica é digna de todo o respeito, ella clama por uma Lei Eleitoral, o Sr. Deputado, por isso, a quer, tambem nó a queremos, no que divergimos é no modo como essa Lei deve ser aqui discutida, o Sr. Deputado entende que essa discussão póde já ter logar, porque a Camara está habilitada, e livre para a escolha da base dessa Lei, eu entendo o contrario, e entendo que sendo base da discussão o Projecto que se apresentou, o resultado póde ser que, sendo ella contra o que está marcado na Carta, cáia o Projecto, e ter de apparecer, depois de uma longa discussão, um novo processo a tal respeito, e por isso, com quanto queira a Lei Eleitoral, quero primei to que tudo, que se dê á resolução tomada toda a força de que ella precisa, e, para isso, parece-me que é necessario interpretar primeiro, pelas vias legaes, o art. 63º da Carta, esta é a minha opinião. (Apoiado, apoiado) É preciso que nesta declaração de que o artigo não é constitucional entre a concorrencia dos tres Ramos do Poder Legislativo, e assim ficar authenticamente interpretado o art. 63º da Carta, e nem se poderá dizer, por isto, que haverá mais demora na discussão da Lei Eleitoral, por que entendo, que tendo-se em vista a deliberação já tomada o anno passado pela Camara, agora indo-se a esta nova fórma, será desnecessaria grande discussão, porque a Camara decidira, com facilidade, a approvação do Projecto, que ha pouco foi mandado para a Mesa, e contra que eu hei de votar, e deste modo se não podéra espaçar muito a discussão da Lei Eleitoral, e poderemos entrar na discussão do Projecto da Lei Eleitoral, sobre está base nelle apresentada. Com quanto pois eu lenha de votar contra o artigo do Projecto, entendo que a Maioria da Camara. a quem faço justiça de acreditar, que conservará a sua opinião, póde, e até deve formular a sua idéa, a fim de lhe dar a força que não tem um Projecto sobre esta base. Por consequencia quando estiver interpretado o artigo da Carta Constitucional, nós marcharemos com mais segurança, e não nos havemos de expor a que seja reprovado este principio, e por conseguinte a termos de discutir outro Projecto

O Sr. Gorjão Henrique: — (Sobre a Ordem.) Eu desejava que V. Ex.ª me dissesse o que é que está em discussão.

O Sr. Presidente: — E o Aditamento proposto pelo Sr. Deputado Moraes Soares.

O Sr. Gorjão Henriques: — Então é uma Proposta d»1 Adiamento.. Eu não quero tomar á Camara tempo algum, e não quero augmentar e>ta confusão de Babel, em que vejo que vai entrando esta questão... que ainda agora vai no seu principio. queria só perguntar a V. Ex.ª — Se uma Explicação que eu tenho a dar, ha de sr dada no um

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da discussão de adiamento; visto que o Discurso do Sr. Deputado, a que me refiro para dar esta simplicissima Explicação pessoal, foi justamente na questão do Adiamento: — se finda a questão do Adiamento hei de dar a Explicação, ou se então fica para o fim dessa interminavel questão em que estamos envolvidos.

O Sr. Presidente: — A oitava disposição addicional do Regimento diz (Leu)

Para que as Explicações de facto, ou de Discurso de quem proscriptas depois da discussão, e antes ou depois da votação; e sejam permittidas sómente durante a discussão ao Deputado que fallar as vezes, e que o fizer, nos termos do art. 49.º do Regimento de 1057, e dos art. 80,º e 81.º do Regimento de 1837.

Por conseguinte V. Ex.ª, se não fallar as vezes, que permitte o Regimento, ou não conseguir a dispersa do mesmo Regimento, não póde ter a palavra para a Explicação, que ainda não classificou.

O Sr. Gorjão Henriques: — Mas creio que ha um remedio em outro paragrafo do mesmo artigo, que diz o seguinte (Leu)

Quando porém a Camara, por algum caso extraordinario, especialmente permitta as Explicações...

O Sr. Presidente: — isso e sobre as Explicações pessoaes.

O Sr. Gorjão Henriques: — Pois bem, a minha Explicação é pessoal.

O Sr. Presidente: — Mesmo para essas ainda é depois — na hora da prorogação.

O Sr. Gorjão Henriques: — Estou satisfeito, nada mais desejo.

O Sr. Rebello da Silva: — Sr. Presidente, esta questão é gravissima; gravissima pela significação que tem. gravissima pelas consequencias que envolve. A Camara antes de proferir, sobre este negocio, uma decisão, medite bem o alcance que ella ha de ter; medite bem, porque vale a pena de meditar.

Sr. Presidente, em materias destas aos corpos deliberativos não é permittido retractarem-se: uma vez pronunciada uma opinião, subsiste; deviam saber o que dizem, e faziam. Não é licito a uma Camara, em materias desta ordem, fazer reconsiderações; mormente em tão pequeno espaço: este acto, quaesquer que sejam as fórmas que lhe dêem, é sempre uma reconsideração, reconsideração que nenhum motivo justifica. (Apoiados)

Sr. Presidente, ha outra circumstancia mais. Eu não estranharia que qualquer dos nobres Deputados, levado hoje por escrupulos de consciencia, desejasse que, antes de o Projecto passar á outra Camara, se trouxesse aqui esta questão; mas nunca julguei que se viesse matar a generalidade do Projecto Eleitoral, que se abrisse esta discussão com uma Proposta de similhante natureza; com uma Proposta, que tende a ficar a Lei sepultada nos limbos da Camara, para aquella Legislatura em que Deos fôr servido permittir, que ella se discuta. Era muito melhor proferir, sobre este desgraçado Projecto, o Parce Sepultis, e remette-lo para os artigos aonde estão, ha muito tempo, muitas Leis, muita cousa importante... Ouço dizer que fica convertido em Projecto fossil. (Riso)

Sr. Presidente, eu desejaria saber qual é a circumstancia que leva a Camara a ir instaurar sobre a materia do art. 63.º, tão largamente debatida na Sessão passada, a nova questão de interpretação authentica. Perguntarei mais ao illustre Deputado, que fez a Proposta, e aos que a apoiam, se veem aonde ella os vai levar. (Vozes: - Veem, veem.) Pois então devem saber, que esta Legislatura não tem mandato sufficiente para fazer a interpretação authentica. (Vozes — Tem.) Se tem, desejarei que me provem.

Sr. Presidente, fazer Leis, interpreta-las, ou reforma-las, não e interpretar, ou reformar a Carta n'um dos seus Artigos: a interpretação authentica do Artigo da Carta não é fazer qualquer Lei, ou interpreta-la, é interpretar a base do direito eleitoral; é interpretar, o principio fundamental de uma Lei Organica; é pôr em duvida a intelligencia que esta Camara deu ao art. 63.º; porque quando este Camara, respondendo ao quesito da Commissão, julgou que o artigo não era constitucional, disse que não podia haver duvida, porque se podesse haver duvida, era necessaria a interpretação authentica. Os illustres Deputados tomam a Carta simplesmente no sentido litteral; porque veem lá a palavra — Reforma — entendem que não ha mais nada, que na terra do seu mandato está o direito de a fazerem na mesma Carta: perdõem-me os nobres Oradores; a opinião geral de todos os Publicistas é que reformar, e interpretar um Codigo Fundamental exige novo mandato, e poderes que esta Camara não tem. E se os illustres Deputados querem oppôr o direito da sua intelligencia parcial á intelligencia de uma Camara, eu tambem contesto o direito com que fizeram uma interpretação authentica; tambem hei de contestar esse direito.

Mas disse-se?? Foi contrariado um artigo, o principio da Carta, da eleição indirecta, e esse principio deve ser respeitado por todos??? Sr. Presidente, não sou eu que faço esta censura á Camara, não sou eu que digo que a Camara decidiu contra os principios, quando tomou a sua resolução sobre o art. 63.º; eu entendi sempre, e entendo hoje que não foi contrariada a Carta, nem o seu espirito, decidindo-se que não podia haver duvida sobre não ser constitucional o art. 63.º Eis-aqui o sentido que a Camara lhe deu; Os illustres Deputados que lhe dão outro hão de travar o combate com os Senhores daquelle lado — e desde já lhes auguro poucos louros, e nenhum exilo feliz.

Diz-se ainda — Que a decisão da Camara não obriga, porque não é uma Lei do Estado. — Mas a decisão da Camara obrigar moralmente aquelles que a tomaram; ha Compromisso moral para todos os que a tomaram: para obrigar a todos os Cidadãos Portuguezes, de certo que era preciso que tivesse passado pelos tres Ramos do Poder Legislativo; mas a decisão obriga a Camara: ora a Camara não podia alterar essa decisão sem ter fortes e poderosos motivos para isso; e eu quero que me apontem esses motivos: para se reconsiderar esta resolução era preciso haver motivos, e eu não vi apresentar um só, que justificasse o tornar-se atraz sobre opinião tão grave.

Mas diz-se «Há uma razão immensa, uma razão fortissima para nós virmos agora recorrer á interpretação authentica, e que nessa luminosa discussão appareceram talentos distinctos divididos, e combatendo cada um por seu lado.? Permitta-se-me, que diga: — Se a divisão dos talentos distinctos n'um

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questão, fosse motivo para voltar afra7, não havia ama só Lei no Paiz; era querer a unidade das opiniões n'uma discussão: e assim havia só discussões e nunca Leis — As Minorias venciam as Maiorias. — Se a Proposta não tiver outro argumento, parece-me que este a condemna; ao menos não chega a fazer aos olhos de todos prova moral para se tornar atraz sobre o que se decidiu.

É necessaria a interpretação authentica.» Oh! Sr. Presidente! Então por que não se votou isso, quando se discutiu aqui o art. 63.º? Agora tantos escrupulos de consciencia, e então tamanhas facilidades! Pois não era occasião opportuna antes de se fazer este Projecto; não era então o momento proprio de pedir a interpretação authentica, quando ella era indicada por aquelle lado, quando era pedida por um illustre Deputado, que se senta agora na Mesa? Agora e que é precisa a interpretação authentica, agora, para se lançar essa interpretação authentica como um sudario, e mandar com elle á sepultura este Projecto!...

Mas estará interpretado o artigo da Carta só pela resposta da Camara ao quesito da Commissão? Não está interpretado, não se interpretou, a questão não foi essa; uma Commissão veio perguntar como base do seu trabalho — Se era constitucional o art. 63.º; a Camara respondeu que não podia haver duvida que não era constitucional: ora se a Camara podesse duvidar, havia de então pedir a interpretação authentica; mas a Camara não votou a interpretação, porque não viu essa necessidade, porque não duvidou da não constitucionalidade do artigo.

Mas diz-se «Então nós havemos de estar a trabalhar debalde? E se a outra Casa do Parlamento não votar neste sentido, se não quizer a base da eleição directa, havemos nós de trabalhar debalde.)? Oh! Sr. Presidente! Esta Camara nas suas opiniões, nas suas decisões, nos seus actos responde a si e ao Paiz; não olha para traz, não olha para diante; (Apoiados) tem a sua consciencia para a guiar, a sua razão para a alumiar, e o seu dever a cumprir: os Membros da Camara Electiva teem de sustentar as decisões da Camara, quando estas decisões forem justas, hão de obedecer aos Decretos do Corpo Legislativo legalmente sanccionados, como todos os Cidadãos Portuguezes; mas aqui como Deputados devem sustentar a liberdade desta Tribuna, e a inviolabilidade das suas opiniões, e neste ponto não podem ceder a ninguem. Não trabalhamos debalde, pelo contrario far-se-ha muito, quando tivermos feito uma Lei Eleitoral e quando se poder dizer ao Paiz — A Camara de 1819 desempenhou a promessa do Partido Cartista — Fez uma Lei Eleitoral sincera e livre, e se alguem a não acceitar, fique lhe a responsabilidade; mas não a esta Casa; a esta Casa que é aquella que moralmente está obrigada por dever seu a marchar na vanguarda do progresso, porque todos suspiramos.

Sr. Presidente, a mas o Projecto da Commissão Eleitoral repugna aos verdadeiros principios;» eu desejava saber aonde está no Projecto da Lei Eleitoral esta repugnancia aos principios. A censura foi tão severa que tenho o direito de perguntar em que é que o Projecto repugna aos verdadeiros principios? Eu tenho direito de perguntar se será um grande absurdo no seculo 19, no anno de 1849 pugnar-se pelos principios da eleição directa? (Apoiados) Eu perguntarei mais, se fiscalisar as operações eleitoraes para que a fraude não tenha logar nos recenseamentos será um grande absurdo, se será estar longe das verdadeiras regras, o ferir os verdadeiros principios? Eu perguntarei tambem, se evitar que a influencia do Empregado Publico possa viciar as eleições, será ir contra as verdadeiras regras, será ferir os verdadeiros principios? Eu perguntarei ainda, se pôr qualquer cidadão fóra do alcance da violencia será ferir os verdadeiros principios? Eu perguntarei finalmente, sé consignar n'um Projecto tudo quanto a experiencia tem mostrado que não é anarchico, mas civilisador, que não é desordenado, mas organisador para dotar com uma boa Lei Eleitoral o Paiz, será ferir os verdadeiros principios] (Apoiados)

Sr. Presidente, deram-se os parabens á Camara por parte de um illustre Deputado meu Amigo, porque esta questão a ia tirar da somnolencia em que parecia jazer, e chama-la á actividade, chama-la á vida, e é o mesmo illustre Deputado que felicita a Camara por este motivo, um instante depois o proprio que assassina essa actividade, que crava o punhal na sua esperança, e nos torna ao silencio sepulcral que o magoava; (Apoiados) e é a mesma Camara que em 1818 decidiu, que o artigo 63 da Carta não era constitucional, que em 1849 tem duvida sobre aquillo que decidiu em 1848!... (Apoiados9.

O mesmo nobre Deputado, desejando que a Camara neste negocio marchasse, segundo a divisa de M. Guizot — pela via recta brevissima; como termina o seu discurso propondo o Adiamento da questão?.... Pois eu direi a S. Ex.ª que uma Proposta de Adiamento desta ordem prova pouco o desejo de que a discussão marche pela via recta brevissima; pelo contrario mostraria intenção de que ella caminhe com a velocidade da tartaruga, (Apoiados) ou com a rapidez de certo animal tardigrado, que não póde andar senão para traz e aos saltos. (Riso — apoiados.) Isto poderá ser tudo o que quizer o illustre Deputado, mas nunca a tal via recta brevissima; pelo contrario, eu chamar-lhe-hei via recta longissima. (Apoiados)

Não e por esse caminhar, que a Camara ha de conseguir o que por tantas vezes pareceu desejar, não é por este caminhar que se ha de chegar á Terra da Promissão, que deseja o nobre Deputado, porque se forem por esta vereda, sem duvida se hão de perder no meio do deserto, e receio muito que não haja um Jehova para dispensar o maná. (Apoiados)

Sr. Presidente, esta questão, como ella foi proposta, na occasião em que o foi, e depois dos compromissos da Camara, e uma questão que eu classifico de altamente inconveniente. (Apoiados) Ainda haveria margem para ella se propôr depois de concluida a discussão do Projecto na generalidade, se alguem quizesse tomar nisso a Iniciativa, mas não era por certo nesta occasião; (Apoiados) ainda podia vir na occasião da discussão do artigo 1.º, mas não no começo da discussão na generalidade; não era na generalidade, aonde está a base da Commissão, aonde se não tracta senão do pensamento do Projecto, aonde senão tracta senão do decidir se devemos ou não ter uma Lei Eleitoral, que semilhante Proposta podia ter logar. (Apoiados)

Não poderia alguem reputar esta chamada interpretação authentica como um protexto para se não discutir o Projecto 1 (Apoiados) porque todos sabem

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que o nosso mandato não nos confere o podér de interpretar a Carta; eu sinto que se possa notar que a interpretação authentica serve de pretexto para se adiar o Projecto indefinidamente; por consequencia que a Lei não se discute, e pelos symptomas que se apresentam, não se faz nesta Legislatura, ou se se fizer, não ha de representar todos os principios de verdadeira liberdade que a Commissão desejou estabelecer; não sei se o conseguia, mas desejou-o.

A Commissão entendeu que esta era a unica bandeira de paz e união da Familia Portugueza, que podia desenrolar no seio deste Paiz dilacerado por tantos males; a Commissão entendeu que era este o unico meio de abrir as portas da arena Politica a todos os Partidos sem distincção. (Apoiados — O Sr. Carlos Dento: — Muito bem.) Tinhamos entendido isto, tinha-o entendido com a Commissão a Maioria da Camara em 1848, oxalá que não recue, oxalá que a Camara não dê o direito a alguem para dizer que tinha decidido precipitadamente no momento do perigo, e que recua depois desse perigo passar; oxalá que por este modo não vamos em 1849 dar um triunfo aos nossos maiores inimigos, que têem recorrido a todos os nossos actos para nos desconceituar na opinião do Paiz.

Sr. Presidente, a estabilidade não está senão na consciencia com que os Parlamentos e os Governos juram os principios, e vão por diante, ou cáem diante delles. Desde o momento em que a Camara voltar atraz, desde o momento em que decidir o contrario do que votou o anno passado; que garantia póde dar de coherencia nas suas decisões? Que reputação póde ter? Que confiança podem inspirar ao Paiz os seus actos? Que certeza póde haver de que questões tão importantes como esta, sejam decididas hoje de um modo, e passado um mez sejam annulladas ou alteradas? Veja a Camara aonde nos leva similhante proceder; veja as consequencias, e os inconvenientes que daqui podem resultar. Como se póde justificar esta mudança repentina de opinião? Como póde a maioria da Camara, que em 1848 votou de uma maneira, voltar atraz com a sua opinião em 1819? Quaes são os fundamentos que tem para isto? Aonde estão as razões, que a levam a voltar atraz com a decisão que tomou em 1848? Pois a Camara toma uma decisão desta natureza, e depois retira-a, e manda-a para a bagagem?! Isto não são principios de bagagem. (Apoiados) Sr. Presidente, não cabe censura alguma á Opposição, que em 1848 votou pela constitucionalidade do art. 63.º da Carta; assim o entendeu então, e assim o entende ainda hoje; (Apoiados) mas cabia de certo aspera censura a quem votou em 1848 de uma maneira, e em 1849 recua diante da sua decisão, (Apoiados) para votar de outra.

Concluo, Sr. Presidente, dizendo que a Camara, tem um dever sagrado a cumprir, e este dever é a Lei Eleitoral. A Camara prometteu dotar o Paiz com uma Lei Eleitoral; deve cumprir a sua promessa, a não querer ser contraditoria comsigo mesma, (Apoiados) a não querer justificar os vaticinios sinistros; e o modo de os destruir e discutir a Lei Eleitoral.

O Sr. Presidente: — Dei a palavra ao Sr. Deputado Rebello da Silva como Relator da Commissão Eleitoral do anno passado, mas a Commissão Eleitoral, este anno, como acabo de verificar, teve alguma alteração, e ainda senão declarou installada. Foi consequencia convido os seus Membros a installarem a Commissão, e a nomearem o seu Relator para podér marchar a discussão nos termos do Regimento.

Devo ainda informar mais a Camara, visto que se avançaram alguns factos que talvez não sejam exactos, sobre o estado da questão. Houveram tres Propostas sobre o objecto; a primeira, do Sr. Carlos Bento, que foi offerecida e classificada como questão preliminar; a segunda, do Sr. Moraes Soares, que foi offerecida em um Projecto de Lei ordinaria, classificada como Adiamento; a terceira finalmente, do Sr. Cunha, que se julgou prejudicada ou prevenida pelas anteriores, e por isso não houve votação sobre ella.

Observarei por ultimo, que quando se sujeitou a votação o Parecer da Commissão Eleitoral no anno passado, expressamente se declarou que a votação de que o art. 63.º da Carla não era constitucional, não importava a approvação da eleição directa. Isto está consignado na Acta de 17 de Abril. (O Sr. Carlos Bento. — Isso é discussão.) O Orador: — Não é discussão, Sr. Deputado, é expor o estado da questão segundo o meu dever, por isso que a discussão está marchando sobre bazes inexactas; (Apoiados) nem devo admittir que o Sr. Deputado venha intrometter-se no cumprimento dos deveres da Presidencia. Cumpri-os no que fiz. (Apoiados)

Deu a hora. A Ordem do Dia para ámanhã é a mesma de hoje em todas as suas partes. Está levantada a Sessão. — Eram quasi quatro horas e meia da tarde.

O 1.º Redactor,

J. B. GASTÃO.

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