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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Discurso do sr. deputado Telles de Vasconcellos, que deixou de ser publicado na sessão de 26 do corrente, pag. 438, segunda parte da ordem do dia.

O sr. Telles de Vasconcellos: — Sr. presidente, tudo tem as suas epochas; em outros tempos era moda fallar-se no fomento, no progresso moral e material d'este paiz... na descentralisação administrativa... n'esta famosa palavra... mas infelizmente palavra magica e sem ventura! Hoje? Já não é moda fallar-se em todas estas cousas. Hoje? É moda fallar-se na perequação do imposto... na tremenda questão de fazenda... que traz sobresaltados todos os espiritos e incommodados todos os animos; e quem não fallar n'isto, quem não fizer calculos, quem não estudar a sciencia das cifras, está isento de todas as grandes homenagens, de todas as considerações devidas aos grandes talentos parlamentares. Eu, que fui alcunhado em outros tempos de andar muito á moda, tinha-me imposto o preceito de emenda, e a este proposito se deve este silencio profundo a que me tenho remettido durante toda esta sessão, e do qual só me poderiam tirar os illustres deputados que encetaram este debate, os quaes foram injustos commigo, com os meus constituintes e com os funccionarios publicos do districto da Guarda, por isso que vieram declarar a esta camara que no circulo que eu represento não ha materia collectavel, tinha desapparecido tudo.

Eu tive, sr. presidente, a infelicidade de não ouvir os illustres deputados, não estava n'esta casa, nem podia mesmo calcular que s. ex.ªs seriam tão inexactos nas suas apreciações, nem que viriam aqui asseverar factos tão destituidos de fundamento, para serem ao mesmo tempo tão injustos para com os empregados d'aquelle circulo, e principalmente para com o seu chefe, que é um homem distincto e honrado, e oxalá que em todos os districtos do paiz o sr. ministro tivesse empregados tão distinctos como ha no districto da Guarda; basta que todos sejam tão distinctos, tão trabalhadores e tão honrados como é o delegado do thesouro que tem estado n'aquelle districto.

Não assisti á sessão em que começou este debate, não ouvi os illustres deputados, não tive tempo para ler os seus discursos, ouvi apenas o que pronunciou o sr. relator da commissão, e confesso a v. ex.ª e á camara que o ouvi com aquelle acatamento e reverencia que pedia o assumpto, o logar, a occasião e a pessoa. (O sr. Barros Gomes: — Muito obrigado.)

Mas do discurso do sr. deputado só pude inferir que os meus collegas, que combateram o projecto que está em discussão, se não tinham querido soccorrer aos argumentos dos economistas ou das escolas que combatem a adopção do imposto de repartição, e sustentam o de quota e vice-versa; mas que nem mesmo tinham recorrido, nem haviam querido tirar argumentos ou rasões dos resultados praticos que este imposto tem dado no nosso paiz, pois, como é sabido por todos, nós já substituimos o imposto de quota pelo de repartição, que os illustres deputados a que me refiro haviam mesmo abandonado a historia do imposto de quota e repartição, que podiam estudar na historia da administração dos paizes onde actualmente existem esses impostos, mas que haviam baseado nas matrizes toda a sua argumentação, que, na opinião de s. ex.ªs, são documentos falsificados, que por vezes se têem querido emendar, aproveitando-se differentes providencias, contra as quaes tudo se tem levantado sempre sem nada se poder fazer (apoiados).

Mas, sr. presidente, se as matrizes são falsas para sobre ellas recaír o imposto de quota, tambem são igualmente falsas para sobre ellas recaír o imposto de repartição e vice-versa; por consequencia, seria mais comezinho, e seria muito melhor que os illustres deputados a quem me refiro tivessem abandonado os calculos, e se tivessem limitado a pedir ao governo que mandasse reformar as matrizes (apoiados).

Não pude portanto inferir do discurso do sr. relator da commissão o que os illustres deputados haviam dito contra as matrizes do meu circulo. Encontrei porém um amigo, que de semblante triste e carregado me deu os sentimentos pela pobreza financeira a que estava reduzida a minha terra; não ha lá nada de riqueza, me disse elle, não ha lá matrizes, segundo os calculos dos deputados, não ha lá materia collectavel; confesso a v. ex.ª, sr. presidente, que o meu espirito ficou altamente contrariado com estas palavras, e eu pensei que um grande cataclysmo tinha feito paragem por sobre aquellas terras... e que os meus amigos, os meus vizinhos, os meus constituintes e camaradas politicos estavam reduzidos á maior das calamidades! Estavam mergulhados em uma grande desgraça!! Predizpuz-me logo para vir a esta camara, coberto de crepe, appellar para o coração generoso de v. ex.ª, para as almas nobres dos meus collegas, appellar mesmo para o governo, e pedir aos poderes publicos toda a casta de providencias.

Mas, sr. presidente, fiz caminho pelas repartições publicas, e perguntei o que havia de novo com relação a este assumpto, e lá responderam-me: «Não ha nada, está tudo no mesmo estado, está nas matrizes a mesma riqueza, não houve nenhum cataclysmo!!» Fiquei surprehendido de contentamento, fui ler os discursos dos srs. deputados, e guiado pelas suas citações fui comprar este livro que aqui tenho, por onde s. ex.ªs fizeram os seus calculos, é o livro de algarismos e dados estatisticos publicado pelo sr. Fradesso da Silveira; mas o mappa 36 d'este livro está errado, e é por isso que os srs. deputados erraram; era facil, com pequena attenção, conhecer o erro do mappa, porque na columna da percentagem complementar está repetido o valor locativo das casas, e o que diz respeito a um concelho está debaixo da denominação de outro; guiados por estes algarismos, os illustres deputados encontraram o absurdo, ficaram contentes com elle, e não quizeram saber qual era o verdadeiro motivo da sua existencia, porque seguiram o principio de que tudo é mau emquanto se não provar que é bom, devendo partir do principio opposto.

Sr. presidente, se os illustres deputados tivessem partido de melhor principio, e tivessem confrontado o mappa 36 com o mappa 64, veriam que era maior ainda o absurdo, e que não era possivel haver de anno para anno uma desproporção de tal ordem (apoiados).

Não sei portanto explicar como s. ex.ªs vieram declarar n'esta casa, a pretexto de combater o projecto em discussão, da contribuição pessoal, que as matrizes da Guarda estão por tal fórma falsificadas, que a percentagem complementar seria pelo projecto em discussão 60$000 réis!!! Que havia lá só dois creados, e pouco mais; parece isto incrivel, mas é verdade, pois não era necessario muito cuidado nem muita reflexão para não serem aceitos como exactos os algarismos d'este livro, a que os illustres deputados recorreram; e não pensem que vae n'isto grande censura para o auctor do livro; nada mais facil do que errar-se a collocação de um algarismo, o que póde dar em resultado o erro de todo o mappa; mas o que é facil, e n'este caso facillimo, é verificar que o mappa está errado; mesmo quando de qualquer operação nos resulta um absurdo, é prudente investigar as causas d'esse absurdo, e não querer logo attribui-las a menos zêlo do funccionalismo, ou a toda a casta de corrupção; se esta lavra fundo no paiz, ha ainda tambem muita honradez, muita probidade, e Deus nos livre que assim não fosse (apoiados).

O sr. Francisco de Albuquerque: — Peço a palavra.

O Orador: — O illustre deputado que pediu a palavra n'este momento foi por certo provocado a isso pelas minhas observações; folgo muito que assim succedesse, porque o sr. deputado, que ainda ha pouco esteve á frente da administração d'aquelle districto, era o que mais rasão devia ter, rasão de conhecimento do que no mesmo districto se passava, rasão de não ignorancia do que era, e é, a riqueza do meu circulo, cabeça do districto, para não asseverar no parlamento uma falsidade e repetir calculos errados.