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10 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

chocamo-nos a cada passo com os inconvenientes que d'essa mesma politica resultam.

Entretanto não é facil hoje, depois de inveterados habitos, modificar usos antigos, estabelecendo nas nossas colonias uma legislação especial.

Mas isto não está nas nossas condições. Havemos de continuar assim, ou pelo menos modificar a nossa politica muito gradualmente, mas muito vagarosamente.

O alcool que é um artigo indispensavel para a permuta nos sertões, principalmente de Angola é um artigo de facil producção, porque em qualquer parte os pretos sabem construir um distillador, não precisando de grandes capitaes, nem de grandes meios para ser posto em acção e encontram tambem com facilidade materia prima para a distillação com qualquer cousa.

Por conseguinte hão de produzir o alcool sendo muito difficil a fiscalização, e qualquer medida tendente a supprimir esse vicio que é prejudicial sim, mas muito difficil de extirpar.

No entanto, devo dizer a V. Exa. que era muito bom que pudessemos rapidamente transformar a industria do alcool, como se pode transformar a do açucar.

Mas essa transformação depende de uma evolução muito lenta, que de nenhuma maneira se pode apressar, e que ha de ir caminhando gradualmente.

Tanto assim é, que no Congresso de Berlim reconheceu-se que era preciso marcar um largo periodo para a transformação dessa industria. Marcaram, creio, um periodo de 10 annos.

Sobre o assunto já tomei providencias e devo declarar á Camara que já dei instrucções ao governador para que não permitta a entrada de apparelhos distillatorios nas alfandegas quando sejam de importação estrangeira e que procurasse pelos meios legaes, dependentes d'elle, de difficultar quanto possivel a prodtrcção do alcool.

Como a Camara deve calcular, é trabalho muito difficil, que não se pode fazer de um dia para o outro, por alem de muitas outras razões, elle ser um artigo principal, indispensavel para a permuta com o sertão.

Estas permutas vão-se realizando cada vez em maior quantidade pelo motivo de os meios de communicação não serem rapidos e frequentes.

É realmente para lastimar que esses meios de penetração não sejam rapidos e aperfeiçoados.

Esta deficiencia só muito devagar a podemos remediar.

Como V. Exa. sabe, em alguns pontos salubres do districto de Mossamedes, onde a raça branca se dá bem, varias colonias tentaram estabelecer-se ali, o que não conseguiram pelo motivo de falta de communicações.

Se ali se estivessem estabelecido, certamente que produziriam cereaes com que se abastecessem os mercados da Europa.

A provincia de Angola, pelas suas condições especiaes, tem collocado a parte productiva bastante afastada do litoral o que não permitte a facilidade do commercio.

Uma cousa tambem que muito contribue para a falta de iniciativa e afastamento de capitães nas nossas colonias, e por consequencia impede o estabelecimento de mais fabricas de açucar em outros pontos, é a instabilidade das nossas leis sobre productos coloniaes, pois que muitas vezes mudamos e fazemos leis novas sobre esses assuntos.

O estrangeiro que quer empregar capitaes nas nossas colonias, fica sem saber, pois, que garantias pode ter para esses capitaes.

Citarei a esse respeito dois exemplos frisantes.

Estabeleceu-se na fronteira de Loureriço Marques, no ponto em que a linha, ferrea corta a nossa fronteira, uma fabrica de aguardente no logar denominado Ressano Garcia. Essa fabrica foi montada em grandes proporções, e era destinada a introduzir aguardente no Transvaal.

Quando se realizou a Conferencia de Bruxellas, filia cortou o voo a essa iniciativa, e a fabrica teve de fechar e liquidar.

Outra vez fez-se uma tentativa com a industria de sabão. Foi estabelecida em Quelimane uma fabrica em larga escala, pois tinha ao pé de si todas as materias primas necessarias.

Pois a nossa legislação oppôs-se ao desenvolvimento dessa fabrica, impondo um tributo exaggerado sobre a madeira destinada aos caixotes necessarios para o respectivo acondicionamento, e de tal modo, que a fabrica teve de fechar, desmontar os seus apparelhos e ir estabelecer-se para a colonia do Natal.

Isto mostra que é preciso remodelar toda a nossa legislação ultramarina mas sem sobresaltos. (Apoiados).

A respeito da borracha, seria muito conveniente desenvolver essa industria no sertão de Angola, onde ella se dá muito bem, e devo dizer ao illustre Deputado, o Sr. Vilhena, que esse assunto merece a attenção do Governo, que espera trazer á Camara uma proposta de lei que regule o assunto. Se essa proposta for considerada pelo Parlamento, poderão pois ser removidas as difficuldades que existem.

Estou, portanto, pronto a dar ao illustre Deputado a quem tenho a honra de estar respondendo, ou a qualquer outro Sr. Deputado que assim o deseje, todas as informações especiaes e minuciosas sobre o assunto, quer no Parlamento, quer no meu gabinete. (Vozes: - Muito bem).

(O orador não reviu).

O Sr. Miguel Bombarda: - Sr. Presidente: é no cumprimento de um dever que ouso sair do meu papel modesto de professor e de conferente para falar numa assembleia como esta, cujo aspecto basta por si só para intimidar os mais corajosos.

É um dever de consciencia e um dever de piedade este que vou cumprir.

Um dever de consciencia porque em razão da especialidade das minhas funcções e dos meus estudos eu possuo conhecimentos que não são do dominio de todos e me levam a pensar que o regime penitenciario, tal como elle vigora entre nós, não obedece a um ideal de justiça integral, não obedece mesmo á justiça como ella impregna os nossos codigos, uma justiça sem sentimentalismos, sim, mas tambem sem excessos nem violencias.

Um dever de piedade, porque aquelles miseraveis da Penitenciaria inspiram a todo o homem de coração e que sabe o que é o crime, uma commiseração infinita.

Lançados naquelle inferno, que é a cadeia cellular, por uma grande parte d'ahi saem para cair noutro inferno quasi tão torturante que é o inferno de Rilhafolles, e uma vez aqui só conseguem libertar-se pelo repouso que a morte traz.

Sei bem que o momento é difficil para que o Parlamento se possa absorver no estudo das revindicações sociaes e procure dar satisfação aos clamores de justiça que de toda a parte se levantam.

A agitação politica a tido domina. Meses passámos da mais violenta oppressão a que se possa sujeitar um povo livre. Meses soffremos de ansia pelos nossos destinos, torturados por verdugos mais desalmados que os que fizeram a dominação castelhana, porque esses não eram filhos de Portugal e os outros disseram se e ainda hoje cynicamente se dizem nossos irmãos.

Meses inteiros gememos de agonia moral e de riscos de vida em que assistimos a esse crime hediondo de se estrangular a liberdade e de se calcarem aos pés os direitos soberanos do povo que tanto sangue tinham custado e que são o alicerce mesmo da constituição politica dos povos modernos.

Foi um periodo atroz de vergonhas e de coleras represadas que ainda hoje se não recorda sem o calafrio dos perigos que passaram.