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12 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Pessoalmente não sinto qualquer má vontade contra as crenças de cada um, desde que se não queiram servir d'ellas para dominar os povos.

Se sou anti-clerical, desesperadamente anti-clerical, não sou antagonista da religião de ninguem, musulmano ou christão, judeu ou budhista.

Não professando nenhuma religião, sendo profunda e reflectidamente atheu, tolero de toda a minha alma as crenças dos outros; apenas, pertence-me o direito de lamentar que depois de tantos milhares de annos de historia da humanidade, depois de tantas centenas de séculos desde que o cerebro humano se construiu na maravilhosa machina que nos assombra, ainda hoje, tanta sciencia realizada, tanta verdade conquistada, ainda hoje se esteja nas condições das primitivas idades, ainda hoje se viva na adoração dos idolos, precisamente a mesma altura dos rebanhos de homens que povoam os sertões da Africa.

Na conquista do registo civil obrigatorio não ha nenhuma aggressão ás religiões.

O que só ha é a necessidade de nos tornarmos um povo civilizado e não ha civilização, não ha reformas sociaes, não ha conhecimento da situação exacta de um povo no ponto de vista economico, no ponto de vista do seu bem estar material, no ponto de vista do futuro da raça, sem o conhecimento exacto do seu movimento demographico - e não ha demographia possivel sem a obrigatoriedade do registo civil.

A mesma desigualdade entre nos e a Espanha na questão dos accidentes do trabalho.

Mercê dos progressos da sciencia, as industrias teem-se desenvolvido por modo tão extraordinario que nunca se pudera prever, e a par e passo das prosperidades industriaes teem-se aggravado todos os dias os riscos profissionaes.

Portugal é o unico país da Europa civilizada que se não tem preoccupado com o assunto.

Na Inglaterra, Dinamarca, Suecia, Noruega, na Allemanha, na Austria-Hungria, Italia, Franca, Belgica, na Hollanda, Finlandia, Luxemburgo, e por fim na Espanha, tem-se legislado para os accidentes de trabalho.

Em Portugal ainda se não sentiu a necessidade de uma tal lei, e succede até que alguma tentativa isolada se não procura estudar, mesmo se apregoa a necessidade de a lançar para o limbo das cousas inopportunas.

É o caso da proposta do illustre Deputado Estevam de Vasconcellos.

É, não tem duvida, uma proposta que precisa para a sua efficacia de funda remodelação.

Sobretudo, não é possivel a pratica de uma lei de accidentes de trabalho sem uma garantia para o operario.

Podem-se legislar indemnizações e pensões á vontade. Se não houver alguma cousa que as garanta, o mesmo é que legislar para ficar no papel. E essa garantia só pode ser dada ou pela obrigatoriedade do seguro, como na Italia, ou pelo seguro obrigatorio, como é o regime das caixas allemãs.

Por mim, quereria a importação desse regime. É seguramente uma cousa complexa, de difficil estudo, a lei allemã dos accidentes do trabalho.

Mas é uma cousa perfeita. Não é certamente um simples descargo de consciencia como quando a lei se limita a obrigar ao seguro.

Mas é uma vigilancia attenta, cuidadosa, continua, da applicação da lei, e a garantia do operario é completa.

Seja como for, o que é verdade é que a proposta do Sr. Vasconcellos pode e deve servir de base para estudo e discussão. Pois já ha quem ameace de a deixar morrer nas commissões. Por honra do Parlamento Português não penso que tal se faça.

Uma lei de accidentes de trabalho é uma necessidade social no momento presente.

Estamos bem no oecidente da Espanha.

O Sr. Presidente: - Chegou a hora de se passar á ordem do dia; mas se V. Exa. quer, consulto a Camara.

Vozes: - Fale, fale.

O Orador: - Então requeiro a V. Exa. consulte a Camara, se permitte que eu continue nas minhas considerações.

Consultada a Camara, resolveu affirmativamente.

O Sr. Presidente: - Pode V. Exa. continuar as suas observações.

O Orador: - Agradeço á Camara o obsequio que me fez, permittindo que eu continue nas minhas considerações.

Ia eu dizendo, que estamos bem ao oecidente da Espanha, e estamo-lo ainda na questão que nos vae agora occupar.

A Espanha, com effeito, em regime penitenciario, tem realizado o que ha de mais moderno e mais progressivo, ao passo que nós... Vamos ver o que é o nosso regime penitenciario.

Em 1885 estabelecemos o regime penitenciario que actualmente vigora. Pois bem, fomos então buscar o que, havia longos annos, estava já condemnado por toda a parte, salvo na Belgica, onde floresce na mesma extensão que em Portugal, mas com attenuações e cuidados que lhe tiram uma parte da sua nocividade.

O que então estava condemnado por toda a parte era o regime cellular absoluto, e condemnado desde longos annos. Pois foi esse o regime que fomos buscar para implantar em Portugal.

De uma maneira geral, podem-se agrupar em tres categorias os regimes penitenciarios: o velho systeraa da Pennsylvania, isolamento absoluto durante todo o tempo da pena, o systema de Auburn, isolamento de noite e trabalho em commum de dia, e o systema progressivo ou irlandês.

É este ultimo o mais notavel, porque é o mais educador e o que melhores resultados tem dado na pratica.

No systema pennsylvanico o condemnado tem perdido toda a esperança de futuro que não seja o termo da pena em que foi sentenceado, e nada no mundo lhe permitte abreviar um dia que seja nesse periodo que sobre elle pesa como uma fatalidade.

No systema irlandês o condemnado passa por quatro periodos sucessivos: isolamento de alguns meses, trabalho em commum na cadeia, trabalho em meia liberdade fora da cadeia em que tem despido o uniforme da prisão, e liberdade condicional.

Todos esses periodos podem ser encurtados pela boa conducta do preso, pelo seu amor ao trabalho, e essa conquista de dias, meses ou annos de liberdade é a melhor lição de cousas que se lhe pode ensinar e que vale por todas as predicas, por todos os conselhos que ouça dos funccionarios da prisão.

Na pratica, o resultado é uma diminuição de recidivas, pelo menos em Inglaterra.

O regime cellular absoluto, o nosso, é o regime do terror.

O condemnado vive entre as quatro paredes de uma cella, podendo ver apenas uma. nesga de céu, quando não é uma parede nua, fria e dura, pela fresta aberta ao alto da sua prisão, e ahi apodrece o espirito na contemplação da sua miseria, na absorpção da sua desesperança. O silencio tem de ser absoluto e a obediencia cega. É verdade que pode receber a visita dos superiores da prisão: directores, medicos, padre, professor. Mas o que pode ser a convivencia necessaria para uma tentativa de regeneração, diz o numero d'esses funccionarios, talvez não mais de cinco, comparado com a população da nossa Penitenciaria - 500 ou 600 condemnados, Conta Max Treu, no seu-