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Discurso que devia lêr-se a pag. 174, col. 1.ª, lin. 32, da sessão n.° 12 d'este vol.

O sr. Rebello da Silva—Na sessão antecedente, em que tive a honra de expor algumas idéas sobre o assumpto que se discute, occorreu um incidente a respeito do qual devo dar uma explicação que não foi pedida, mas que julguei precisa, em referencia ao meu antigo amigo e collega o sr. barão das Lages, peço licença para citar o seu nome. Estava deduzindo, em resposta a s. ex.ª, algumas observações, quando fui interrompido pelo meu nobre amigo, e me soaram desagradavelmente certas phrases suas. Não occulto, que na excitação do momento perdi por instante a serenidade, que é o primeiro dever da tribuna, e não ouvi por isso as palavras de cortezia, com que me disseram depois, que s. ex.ª tinha annunciado a interrupção. Feriu-me esta falta, e sobretudo os termos da rectificação, e eis a rasão por que não attendi, como o illustre deputado merece pelo seu caracter e pelas nossas antigas relações, as reflexões que desejava apresentar; cumpre-me pois declarar, que, se porventura no sentido ou na phrase empreguei alguma expressão, em que o meu nobre amigo podesse achar motivo de queixa, de que podesse inferir-se a mais leve suspeita ácerca da rectidão das suas intenções, de boa mente o retiro, porque a minha intenção não era essa. Solemne e voluntàriamente dou esta satisfação sem me ser nem sequer lembrada, porque entendo que a delicadeza e o respeito reciproco são condições essenciaes para manter na devida altura a polidez e o lustre da tribuna.

Entrando agora no debate, e esperando que me fosse desculpada a digressão, deploro que a debilidade do orador possa atraiçoar a causa. Alem do pouco valor, que reconheço em mim, sinto-me abatido pela consideração da temeridade que arrisquei, atrevendo-me a tanto, e lendo de continuar um discurso interrompido, situação das menos favoraveis como de certo hão de attestar quantos por longa pratica mediram já de perto os perigos da tribuna. Não estou fazendo falsas ostentações, retrato fielmente o estado do meu espirito. (Toses: — Muito bem.)

Para ligar de algum modo o que disse hontem com os pontos de que devo tratar hoje, peço licença á camara para resumidamente recapitular, avivando-as, as duas idéas em que insisti mais, porque as reputo capitaes, no meu systema de exame sobre esta situação politica: organisação da camara com as esperanças, que póde prometter a paz e estabilidade das instituições, e os deveres de um governo forte e illustrado, constituido em harmonia com o pensamento parlamentar e as necessidades publicas.

Para mim, repito, a gloria do systema representativo depende da illustração da tribuna, e da sabedoria dos parlamentos, acompanhadas de uma habil iniciativa do gabinete. Quanto maior for o numero das capacidades, quanto mais alto se elevar o poder da palavra, finalmente quanto mais se provar a aptidão do corpo legislativo para resolver com os homens competentes as difficuldades da administração, tanto mais seguras e duráveis serão as garantias dadas ás instituições, e mais firmes se assentarão os fundamentos da liberdade e do progresso. Só os entes acanhados e mediocres pregam a intolerancia como dogma! A camara, em que eu acho os nomes que honram a tribuna, a sciencia e as letras, e a administração, não ha de assustar me, mas ensoberbecer-me. Não receio que a discordia a desmembre, porque a intelligencia a allucine. Os pigmeus nunca ergueram monumento que se visse. Não é das trevas que póde surgir a lição dos povos. O paradoxo de que as assembléas devem obedecer sempre ao engenho de poucos chefes, seguir-lhes passos, e sanccionar-lhes as vontades, cáe por vicioso e futil. Seria o mesmo que dizer, que os ultimos e mais obscuros eram os primeiros e os mais sabios. Não esperem acertos da mediocridade, nem imaginem que as esquadras disciplinadas de votantes mudos dêem força e auctoridade ar lei, que viram passar, mas que não ajudaram a fazer.

Os senados silenciosos de Tiberio, servis e aduladores, decretam os caprichos do déspota, mas ainda apodrecem primeiro do que elle. Em um paiz livre os seus representantes devem ser a expressão fiel do seu estado moral e intellectual; só assim é que a resolução dos negocios sairá revestida da influencia, que unicamente póde tirar do concurso nacional, e que a administração fundada em larga base do verdadeiro desenvolvimento physico e materia] admittirá com exito as amplas reformas, que de toda a parte nos são pedidas, e convem não demorar. (Apoiados.)

Outro assumpto não menos digno de attenção, é o que suscitaram algumas das interrogações, formuladas pelo meu nobre collega o sr. Nogueira Soares. Na sessão anterior, sem as ladear nem lhes alterar o sentido, procurei explicar o que entendia ácerca d'ellas, embora o seu objecto viesse levantar de repente as mais graves questões, que no coméço da legislatura podiam propôr-se a uma camara.

Foi com este fim, que eu, firmando-me nas regras inalteraveis d'estt systema, desejei considerar de perto os obstaculos apontados pelo illustre deputado, e parece-me, que nos principios e na execução sincera das instituições parlamentares descobri o modo de atravessarmos qualquer crise (quando a houvesse) resolvendo as incompatibilidades possiveis no futuro sem exorbitarmos da esphera natural, e sem nenhum abalo sensivel perturbar o andamento ordinario dos negocios. Seria novo e capaz de causar profunda estranheza, que a nomeação ou a queda constitucional dos ministros se elevasse ás proporções de quasi irreparavel commoção politica. Essas idéas falsas de certo as não abraçou o meu nobre amigo, nem as ha de nunca admittir quem vê as cousas com imparcialidade e clareza; e senos planos deploraveis de alguma facção obcecada podesse entrar a funesta esperança de saír da difficuldade, recorrendo á creação violenta de gabinetes extra-parlamentares, á suspensão, ou como nós dizemos, ao adiamento indefinido das côrtes, o desvario, creio em Deus, só duraria instantes, porque a lealdade e elevação de animo do chefe do estado, e a educação liberal do paiz, depressa dariam terrivel desengano aos illudidos (Muitos apoiados.)

Sr. presidente, a epocha em que entrâmos é quasi nova, e fundada felizmente em principios de tolerancia á sombra do sceptro liberal, sob os auspicios de um principe que todos nós admirâmos pelas elevadas qualidades do seu espirito, e pela sinceridade dos seus sentimentos. (Apoiados.)

Tudo nos convida e anima a aproveitarmos a occasião; estou certo de que ha de tratar-se de emendar os êrros de muitos annos; porque na realidade, e não admira, o nosso noviciado constitucional fez-se como em toda a parte á custa de illusões e desenganos. Nenhuma administração podera julgar-se isenta d'elles sem esquecer a fragilidade humana e a triste condição de que nem as maiores intelligencias se libertam. E com isto esta mui longe da minha mente offender a qualquer dos gabinetes passados; respeito-os a todos; mas tenho direito de notar as difficuldades que atravessaram, e apontando aquellas a que déram causa, notar só os escolhos e os naufragios para servirem de aviso e de lição aos que vierem depois.

A epocha é nova, repito, e auspiciosa. Mal de nós se a não soubermos aproveitar! Mas as epochas novas aspiram sempre a grandes cousas, e exigem poderes fortes e situações bem constituidas.

O actual ministerio, cujo programma foi explicado concisamente rios ultimos dias da legislatura finda, não podia apresentar senão um programma transitorio a muitos respeitos. A decisão do conflicto que provocara a saída do ga-