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N.º 13. Sessão em 16 de Fevereiro 1849.

Presidencia do Sr. Rebello Cabral.

Chamada — Presentes 72 Srs. Deputados.

Abertura — Aos tres quartos de hora depois do meio dia

Acta — Approvada.

Correspondencia.

Officios. — 1.º Dos Professores da Escóla Veterinaria, enviando alguns exemplares de uma Memoria ácerca da mesma Escóla, para servirem de esclarecimento, quando se tractar do Projecto apresentado na Sessão Legislativa do anno passado, sobre a reforma da dicta Escóla. — Á Secretaria, que mandará distribuir os exemplares na forma do estylo.

2.º Do Sr. Deputado Queiroz Machado, participando, que o seu máo estado de saude o tem impedido de vir tomar parte nos trabalhos da Camara, o que fará apenas lhe seja possivel. — Inteirada.

Representação. — Dos Parochianos da Freguezia de S. João de Almedina da Cidade de Coimbra, apresentada pelo Sr. Mexia, pedindo uma Lei declaratoria da de 16 de Junho de 1848, ou que se auctorise o Governo a applicar os rendimentos das Collegiadas extinctas, para a sustentação dos Parochos, e reparo dos Templos. — Á Commissão Ecclesiastica,

O Sr. Pereira de Mello: — É para mandar para a Mesa os seguintes Pareceres da Commissão de Legislação. (Leu-os, e de cada um delles se dará conta, quando entrarem em discussão.)

O Sr. Presidente: — Como dois destes Pareceres, o primeiro e o terceiro que acabam de ler-se, teem de se imprimir, julgo que a Camara não quererá que se proceda a nova leitura na Mesa: no entanto consulto a Camara.

Decidiu-se a dispensa de nova leitura; mandaram-se imprimir dois dos Pareceres; e o terceiro ficou para se discutir em occasião propria.

O Sr. J. E. Rodrigues da Costa: — Sr. Presidente, mando para a Mesa uma Representação da Camara Municipal do Concelho de Mira, do Districto de Aveiro, pedindo a creação de uma Cadeira de Grammatica Latina na cabeça daquelle Concelho, e outra de Instrucção Primaria na Freguezia da Mamarrosa. É indispensavel, e convenientissima a creação daquellas Cadeiras, por quanto contendo o Freguezia da Mamarrosa uma população de mais de 500 fogos, só a distancia de uma legoa ha uma escóla de primeiras lettras; e a Cadeira de Latim mais proxima fica na Capital do Districto, mais de cinco legoas de distancia.

Peço, pois, que esta Representação seja remettida á Commissão de instrucção Publica.

Ficou para se lhe dar seguimento opportunamente.

O Sr. Corrêa Leal: — Sr. Presidente, de todos os Srs. Deputados, que teem a honra de tornar a palavra nesta Casa, de certo, e sem modestia o digo, eu sou o que menos poderia tomar sobre mim similhante encargo, porque nem confio nas minhas luzes, nem na minha illustração: todavia, Sr. Presidente, é bastantemente custoso, que as poucas palavras, que aqui pronuncio, quando tomo a liberdade de fallar, se me transtornem. Hontem levantei aqui a minha voz, a Camara sabe o assumpto de que me occupei, e por isso não quero cançar a sua attenção, repetindo-o; mas hoje vou lançar os olhos ao Extracto da Sessão, e vejo completamente transtornado o que aqui disse, e para não deixar a Camara em duvida da verdade, vejam a incorrecção (Leu.)

Não quero ler mais; toda a Camara conhecerá, se isto é um Extracto: como podem as pessoas, que veem isto, dizer se foi do Deputado, ou se foi do Extractor? Mas, Sr. Presidente, aquillo, que eu mandei pela minha lettra para a Mesa, que foi aquella minha Proposta, não sei se a escrevi bem, nem se a escrevi mal; mas tomo sobre mim a responsabilidade do que escrevi; essa mesma Proposta vem alterada: por consequencia, Sr. Presidente, tem-se aqui fallado muitas vezes sobre este assumpto, e é necessario que se tome alguma providencia a este respeito: um Deputado, que tem o desfavor de ser pouco ajudado pelas suas faculdades, e pela sua illustração, ao menos nessas poucas vezes em que falla, não tenha mais a desgraça de se ver assim copiado.

Portanto peço a V. Ex.ª para que proveja de remedio a similhante cousa; e peço tambem, que esta errata da minha Proposta, se mande inserir no Diario.

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O Sr. Presidente. A Mesa, nada tem com esse objecto. Segundo a resolução da Camara ha uma Comissão especialmente encarregada de melhorar os Extractos das Sessões desta Camara, que se publicam no Diario do Governo; e a essa Comissão e que esta afecta este objecto, à vista disto cada vez mais se conhecerá a razão, com que a Mesa procedia até então neste negocio, em que sempre declinou a responsabilidade.

O Sr. Cunha Sotto-Maior: Sr. Presidente, eu não pude assistir outro dia à Sessão, mas hoje informaram-me, que sou acusado de uma coisa, de que não tenho culpa: tracto do Requerimento apresentado contra o Tesoureiro do Terreiro Publico: entregaram-me aqui na Camara esse Requerimento assinado por cinco individuos; eu vi, que o objecto, de que ele tratava, era grave, mandei-o para a Mesa, e a Comissão deu o seu Parecer; mas ontem um Sr. Deputado tratando desse objecto, disse que as assinaturas eram falsas: como eu não sou Tabelião, não tenho obrigação de conhecer, se as assinaturas são falsas; tambem não sei, se S. Ex.ª tem documentos para provar que elas são falsas; eu não posso adivinhar, se quem me entrega um Requerimento procede de boa ou de má fé; tambem não tenho obrigação de ter na memoria todos os artigos do Regimento; e por consequencia mandei o Requerimento para a Mesa; mas se effectivamente o Requerimento é falso, eu demito-me de toda e qualquer responsabilidade, não só perante a Camara, mas perante o Tesoureiro do Terreiro; mas é necessario, que o ilustre Deputado apresente as provas desta sua asserção, porque não basta só o Sr. Deputado, por quem eu tenho muita consideração, dizer que as assinaturas são falsas: é isto que eu queria participar a V. Ex.ª e à Camara; porque eu entendo que para fazer honra a um homem, senão devem desvirtuar cinco.

O Sr. Presidente: Eu devo observar que este incidente não é susceptivel de discussão; e torno por esta ocasião a declarar que, segundo a disposição do Regimento, não é permitido apresentar em Sessão Publica Requerimentos particulares, e só sim Representações de Corpos Colectivos, ou de Classes.

O Sr. Correia Leal: Quando eu ontem dei conhecimento à Camara deste caso, nem sabia quem tinha sido o Sr. Deputado que tinha apresentado o Requerimento, nem sabia, se o Requerimento tinha sido lançado na Caixa, nem outro qualquer pormenor a este respeito; mas o que sabia, era que, por informações, e pela maior parte dos Empregados daquela Repartição, e por um grande numero do individuos, Negociantes de trigo, me foi asseverado que, desde que aqui apareceu aquele Requerimento e o respectivo Parecer, lançado no Diario do Governo no Extracto da Sessão de 10 de Fevereiro, se tinham todos dado ao trabalho de investigar, por todas as maneiras possiveis, o conhecer uma só pessoa, que tivesse o nome de uma das cinco que Vinham assinadas no Requerimento, não sendo possivel conhecer um só individuo, e que por consequencia as assinaturas eram supostas: mas, Sr. Presidente, disse o ilustre Deputado, por quem eu tambem tenho muita consideração, que para fazer honra a um homem, senão devem desvirtuar cinco nomes; eu faço honra a um homem que todos conhecem pela sua honradez, enquanto que os cinco no

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mes que vêem no Requerimento, ninguem os conhece; e eu para obviar a um semelhante caso, é que fiz a minha Proposta, para que se não admitissem Requerimentos, senão em papel selado, e conforme a Lei, com assinaturas reconhecidas; não me parece decoroso que um Parlamento se ocupe de um Requerimento, em que se fazem acusações de tal monta, sem que as assinaturas venham reconhecidas; o por isso ontem disse que para mim aquelas assinaturas eram de toda a suspeita; e isto serve para responder ao ilustre Relator da Comissão de Administração Pública, que ontem parece que não entendeu bem, ou eu me expliquei mal, que apresentando-se na Camara o Requerimento, ao mesmo tempo se apresentou outro ipsis verbis na Secretaria da Fazenda, para que não falhasse de modo nenhum o efeito, que se queria tirar deste caso; e é por esta razão que eu disse que o Requerimento que tinha ido para a Secretaria da Fazenda, era do mesmo teor, do que tinha vindo para a Camara: eu lavo as minhas mãos, Sr. Presidente, entendi que devia fazer isto, por descargo da minha consciencia, e por honra daquele cidadão digno e honrado.

O Sr. Presidente: Este objecto deve terminar, mas como o Sr. Deputado pediu a palavra por parte da Comissão, tem a palavra.

O Sr. Silvestre Ribeiro: Sr. Presidente, já ontem eloquentemente respondeu sobre este assunto o Sr. Redactor da Comissão; vejo que hoje ainda se trata deste objecto; pede a honra da Comissão, que se diga alguma coisa. Nós no Parecer, que assentamos, muito claramente dissemos que as assinaturas não vinham; mas que os factos aduzidos no Requerimento eram de tal gravidade, que o Governo devia informar-se acerca deles, e tomar as providencias que entendesse, se o caso existia; isto é, o que a Comissão fez, e o que devia fazer: (Apoiados) Podem os factos não serem verdadeiros, mas nós temos obrigação, não só de fazer Leis, mas de velar que elas se executem. Esse homem, que se defenda; oxalá que ele esteja tão puro, como o sol; mas o Governo tem obrigação de tomar as providencias a este respeito.

A Comissão não tem empenho nenhum em lançar um estigma sobre esse Empregado: repito, oxalá que ele esteja tão puro como o sol do meio-dia, oxalá que ele se defenda; mas nós, na presença de um facto tão grave, de uma importancia extraordinaria, deviamos fazê-lo saber ao Governo; isso fazemos: e não calámos circunstancia nenhuma, porque, dissemos que as assinaturas não vinham reconhecidas; e a Camara a tudo disse, sim, por que reconheceu, que o facto era grave, e que por isso o Governo devia tomar dele conhecimento.

O Sr. Presidente: Ainda segunda vez repito, que não devem ser apresentadas na Camara senão Representações de Corpos Colectivos, ou de Classes diversas. O Requerimento a que se tem aludido, por certo não estava nos termos do Regimento, e o ilustre Deputado que o apresentou, é o primeiro a declarar que não se responsabiliza pela sua exactidão, nem mesmo conhece as pessoas que assinaram o Requerimento. Por tanto este incidente não pode continuar.

O Sr. Correia Leal: V. Ex.ª não me pode negar a palavra; espero que ma conceda, porque ou tenho necessidade de responder ao Sr. Deputado.

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O Sr. Presidente: Estes incidentes ocupam muito tempo à Camara sem utilidade alguma; o Parecer da Comissão de Administração Pública foi ao Governo para resolver neste negocio; a Proposta que o Sr. Correia Leal fez, foi remetida à Comissão do Regimento; e tanto o Governo, como a Comissão hão-de obrar dentro dos limites que lhes estão marcados. Por tanto não ha nada que tratar agora.

O Sr. Correia Leal: Então peço a palavra para uma Explicação; por que eu preciso justificar-me.

O Sr. Presidente: O Sr. Deputado sabe perfeitamente, o que manda o Regimento, quanto a Explicações. Eu consulto a Camara se quer conceder-lhe a palavra agora, para esse efeito; mas o Sr. Deputado ha-de referir-se a algum dos outros Srs. Deputados; e por tanto aqui teremos uma discussão sem proveito para a Causa Pública (Muitos apoiados).

O Sr. Correia Leal: — Sou eu só que tenho que me explicar.

O Sr. Presidente: Não e só o Sr. Deputado, hão-de ser os mais a quem o Sr. Deputado se referir, porque todos têm igual direito, (Apoiados) e o Sr. Cunha tambem já pediu a palavra.

Decidiu-se, que não se concedesse a palavra a mais alguem sobre este incidente, que por isso terminou.

O Sr. Vidal da Gama: A Comissão de Estatística acha-se instalada, tendo nomeado para Presidente o Sr. Agostinha Albano, para Relator o Sr. Baptista Lopes, e a mim para Societario.

O Sr. Presidente: Vai ler-se o seguinte Parecer da Comissão de Verificação de Poderes.

Parecer. Foi admitido à Comissão de Verificação de Poderes o diploma do Sr. Joaquim de Albuquerque Caldeira, Deputado eleito pelo Colégio eleitor da Provincia da Beira Baixa, cuja eleição foi aprovada por esta Camara, e confrontando-o com a Acta do apuramento definitivo, e com os mais documentos respectivos, o achou legal, e em devida forma; e por isso de Parecer que o Sr. Joaquim de Albuquerque Caldeira seja proclamado Deputado da Nação, admitido a prestar juramento, e a tomar assento na Camara.

Sala da Comissão, em 16 de Fevereiro de 1849. D. José de Lacerda, Antonio José de Ávila, Augusto Xavier da Silva.

Requerimento. Requeiro que o Governo, pela Repartição competente, exija do Director da Alfandega da Cidade do Porto, e remeta a esta Camara com a maior brevidade os esclarecimentos seguintes

1. Qual o numero de pipas de vinho, jeropiga, e aguardente, que existia dentro das Barreiras, e nos armazens de primeira qualidade, na ocasião do primeiro varejo dado a estes liquidos em virtude do art. 7.º º da Lei de 21 de Abril de 1843.

2. Qual o número de pipas de vinho, e jeropiga que depois deste varejo, deu entrada nos mesmos armazens de primeira, até o varejo dado no fim do ano proximo passado; qual a saída, e com que destino.

3. Com que guias, e a que ano respectivas, deu entrada o vinho, jeropiga, e aguardente; depois de posta em execução a sobredita Lei de 21 de Abril até ao fim do ano passado.

4. Qual o número de pipas de aguardente admitido nos armazens de primeira qualidade, e por deposito; qual o numero consumido no adubo dos vinhos, qual o desfalcado, tudo no periodo do n.º 3.º

5.º Qual o desfalque, que nos vinhos, e jeropigas da primeira qualidade nos armazens de deposito, tem sido verificado em cada um ano do referido prazo.

6. Que medidas de cautela tem posto em pratica o Director da mesma Alfandega, para que os vinhos da segunda qualidade não sejam desembarcados em postos, para onde só vinhos de primeira qualidade podem ser despachados, e como evitado que vinhos aparentemente descarregados em portos de segunda, não sejam realmente desembarcados em portos de primeira.

7.º Que meios tem ele empregado para que o desfalque nos armazens de primeira não seja preenchido com vinhos de diversa qualificação.

Outro sim requeiro que o Governo pela mesma Repartição exija da Companhia de Agricultura dos vinhos do Alto Douro, que satisfaça, não só aos quesitos supra naquela parte, que for da sua competencia, mas tambem aos quesitos seguintes

1.º A que número de pipas de vinho, e jeropiga tem ela dado extracção de primeira qualidade, em cada um dos anos da sua gerencia.

2.º Qual o resultado da existencia do vinho, e jeropiga de primeira qualidade, por ocasião do primeiro varejo dado no Douro, em consequencia do art. 7.º º da Lei de 21 de Abril de 1843.

3.º Qual a quantidade que ficou cada ano effectivamente na primeira qualidade, posto de parte o vinho separado da primeira.

4.º Que desempenho tem a mesma Companhia dado ao 4.º do citado art. 7.º º da sobredita Lei; que meios tem empregado a bem da fiscalização dos vinhos, e jeropigas da primeira qualidade; que ingerencia tem ela verificado na sua contabilidade, para conhecer da sua existencia, que legal e realmente devia existir no fim do ano de 1848 Ferreira da Mota.

Sendo admitido, foi aprovado.

O Sr. Presidente: Tenho afazer uma recomendação à ilustre Comissão de Verificação de Poderes. Dois dos Srs. Deputados eleitos por Gôa acham-se em Lisboa ha muito tempo, e todos os dias aparecem nos corredores da Camara solicitando de mim que faça apresentar o Parecer sobre o processo das suas eleições. Escuso de chamar a atenção de cada um dos ilustres Membros da Comissão sobre a urgencia deste negocio, nem de dizer que devia ser tratado desde logo, porque estou certo que os Srs. Deputados não quererão estabelecer um precedente contrario às praticas Pai lamentares, e ao proprio Direito Eleitoral. (Muitos apoiados) Por consequencia recomendo-lhe que apresente o seu Parecer; não é censura ou prevenção de voto, que eu dirija à Comissão, mas é o desejo que tenho de que se coloque em bom terreno a este respeito.

O Sr. Lacerda (D. José) Sr. Presidente, a Comissão reconhecendo a gravidade do assunto, porque os papéis pela natureza de muitos deles, e mesmo pela forma do processo são dificultosos de examinar, para chegar ao seu alcance, julgou, que devia empregar no exame do processo da eleição de Gôa todo o escrupulo, ou mais, por assim dizer, do

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que o ordinario. A Comissão reuniu-se, e considerando os papéis em geral, e a questão que havia principalmente a tratar, entendeu depois, que para poder chegar a formar uma opinião exacta de todo o processo, era mais conveniente que os papéis fossem vistos em particular para cada um dos Membros da mesma Comissão: parte deles já os examinaram; acham-se hoje em poder de um dos Membros da Comissão, que já declarou que brevemente os entrega, e logo que ele os dispense, a Comissão ha-de reunir-se para apresentar o seu Parecer, e eu por parte da Comissão declaro, que espero que muito brevemente ha-de ser este negocio presente à Camara. O Sr. Ávila: Peço a palavra. O Sr. Presidente: Sobre este assunto não pode ter a palavra; foi unicamente uma recomendação à Comissão de Poderes; o Sr. Relator explicou-se; e por tanto não ha mais nada a tratar.

O Sr. Silvestre Ribeiro: Já não pode haver palavra sobre isto?

O Sr. Ministra da Fazenda: Peço a palavra para antes da Ordem do Dia.

O Sr. Presidente: Já não posso dar a palavra ao Sr. Deputado, porque se passou às segundas Leituras. O Sr. Ministro dirá se o que tem a expor, é sobre este objecto, ou com relação a alguma parte da Ordem do Dia?

O Sr. Ministro da Fazenda: Como esta para entrar em discussão o Projecto n.º 100 relativo ao Decreto de 19 de Novembro, vulgarmente conhecido pelo Decreto do Banco, parece-me que em presença das circunstancias actuais, conviria muito que este Projecto voltasse à Comissão de Fazenda, por isso mesmo, que a Comissão actual não é a que o ano passado apresentou o Parecer que esta na Mesa. Isto não e querer adiar este objecto, ao contrario é o interesse, de que a discussão corra mais livre de embaraços, do que correria se por ventura a Comissão não visse este trabalho; e mesmo porque se podem dar outras vantagens, que eu acredito se hão-de dar, da lealdade, e franqueza com que os ilustres Membros da Comissão de Fazenda se propõem a estabelecer conferencias de todos os Srs. Deputados, que quiserem prestar-lhe as suas luzes. Esta discussão não pode esclarecer-se senão por esse meio; e como ha mais objectos a tratar, e este tem os inconvenientes que já citei, pedirei a V. Ex.ª para consultar a Camara, a fim de que o Projecto volte à Comissão, e ela com urgencia apresente um trabalho, que sirva de tema à discussão.

O Sr. Presidente: O Sr. Ministro tenha a bondade de mandar a sua Proposta, que me parece importar um Adiamento. (Uma. voz: Não pode propor o Adiamento, não é Deputado). O Adiamento é sobre Proposta do Governo, e como Ministro pode fazê-la. (Apoiados) É a seguinte

Proposta. Proponho que o Projecto n.º 100 vá à ilustre Comissão de Fazenda, para que revendo-o, e consultando todos os Membros desta Casa, que julgar conveniente, apresente com urgencia o seu Parecer para entrar em discussão. Lopes Branco

O Sr. Presidente: Esta Proposta diz respeito ao Parecer e Projecto n.º 100, que é da Comissão de Fazenda da Sessão passada, cujo Parecer recaiu sobre uma Proposta do Governo. Este negocio esta dado para Ordem do Dia ha muito; e a Proposta

do Sr. Ministro equivale a uma Proposta de Adiamento, que segundo o Regimento só teria lugar no começo da discussão do Projecto. E necessario por tanto que a Camara julgue se sim, ou não se deve desde já admitir. Foi admitida.

O Sr. Agostinho Albano: Eu apoio muito o Adiamento proposto pelo nobre Ministro da Fazenda, porque não acho que seja um Adiamento inutil, antes e necessario, e muito necessario; tanto mais quanto que esta Camara resolveu nomear uma Comissão de Inquerito, para examinar as contas do Banco, as quais tem inteira correlação com o Projecto n.º 100. A Comissão está nomeada: mas não sei se já os seus respectivos Membros receberam a competente participação, eu de certo a tenho, e creio que os mais a lerão tambem recebido; mas não sei se da parte do Governo já foi mandada ao Banco a participação de que lá se lhe havia de apresentar esta Comissão. Ora eu não me persuado que o Projecto n.º 100 possa ser convenientemente discutido, sem que o Relatorio que esta Comissão houver de confeccionar, seja mandado a esta Camara; parece-me que não; porque os dados essenciais para se discutir este Projecto devem necessariamente partir daquilo, que houver de conhecer a Comissão de Inquerito. Não me oponho tambem a que a Camara faça algum trabalho por parte da Comissão de Fazenda, e da maneira que lembrou o nobre Ministro, convocando os Colegas Deputados, para lhes prestarem os seus auxilios; mas note-se bem, que por mais desejos que a Comissão de Inquerito tenha de concluir o seu trabalho, que tem de certo muitos, e eficazes desejos de o concluir da maneira melhor que lhe for possivel, talvez o não possa fazer sem muitas conferencias, porque é um objecto que não vai com essa facilidade; não por falta de zelo da Comissão, mas pela natureza do objecto: e por isso, para se conseguir um bom resultado, acho que o Adiamento proposto pelo Sr. Ministro da Fazenda é muito aceitavel. Entendo que se deve proceder neste negocio com urgencia, mas uma urgencia sem ser definida. Certamente este negocio carece de alguma explicação; e carece, por tanto, de voltar á Comissão, a qual não pode deixar de ter tanto ou mais interesse do que a do ano passado teve nesta questão; mas não é trabalho que se possa apresentar rapidamente, porque primeiramente tem de ouvir os ilustres Deputados, que forem convocados para prestarem os seus auxilios, e além disso não pode colher as informações necessarias para poder vir ao cabal conhecimento do negocio, sem que se obtenham todos os esclarecimentos da Comissão de Inquerito. Estas são as observações que faço quanto à urgencia; entretanto aprovo o Adiamento, porque o julgo necessario.

E havendo-se por discutida, e pondo logo à votação a

Proposta do Adiamento foi aprovada.

Ordem do dia.

Continua a discussão do Projecto n.º 48 (V. Sessões antecedentes.) O Sr. Rebelo da Silva (*) Sr. Presidente, o

(*) Em razão da morte repentina de seu ilustre Pai, não havendo o Sr. Deputado restituído o seu Discurso, passou-se para aqui o muito resumido Extracto, que vem no Diario do Governo de 17 de Fevereiro.

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assunto de que a Camara se ocupa é grave, e a questão de que se trata é, se o método da eleição deve ser directo ou indirecto. Não estranho que aqueles Senhores que votaram pela constitucionalidade do art. 63 º tenham escrupulos sobre o método directo, mas não posso deixar de estranhar que os que acharam o artigo não constitucional, venham agora impugnar o mesmo método.

Na época em que vivemos, e depois do que se tem passado na Camara, seria uma injúria trazer à arena da discussão outro objecto que não seja o método da eleição, isto é se ha-de adoptar o sistema directo ou indirecto. A eleição directa não foi considerada por alguns Oradores, como conciliadora dos Partidos, nem como o ramo de oliveira, por não ter havido representação dos Povos, ou Corporações a pedir esse método de eleições; mas eu acho que seria isso uma injúria ao Povo Português, o qual não pode ser indiferente à formação de uma Lei Organica, a ter uma Lei de Representação Nacional, mais regular, mais propria a tomar verdadeira essa Representação. Depois de a Camara ter resolvido que o art. 63 não é constitucional, aqueles que votaram desta maneira, mostram falta de convicção não aprovando agora a eleição directa.

Aqueles que perguntam onde esta a opinião pública, que pede esta Lei, respondo que a opinião pública neste ponto é a luz moral, que fez vencer todas as batalhas do Porto, e as que se deram até Asseiceira; é a luz moral, que fez com que 7:500 homens vencessem a força bruta de 80:000; é a luz moral, que é a base de todas as coisas grandiosas.

Quanto ao argumento apresentado acerca da Camara Francesa que em 1831 fez uma Lei Eleitoral, direi, que essa Camara não continuou no exercicio de suas funções, pela circunstancia de ter feito a Lei Eleitoral com o mesmo método que estabelecia aquela pela qual era Camara, e sim porque a Camara Francesa de 1831 tinha de desenvolver os principios da Revolução de Julho (Apoiados) porque tinha de responder à França, com todas as Leis Organicas que foram sujeitas á sua consideração; (Apoiados) e assim a Camara Portuguesa de 1848, ainda mesmo que faça uma Lei Eleitoral pelo método directo, não pode ser dissolvida por tal facto. (Muitos apoiados) Seria um absurdo admitir a doutrina, de que por uma Camara fazer uma Lei Eleitoral com sistema diverso daquele porque foi eleita, devesse logo ser dissolvida. (Muitas apoiados) A Camara Portuguesa de 1848 não pode ser dissolvida por este facto; (Apoiados) e mesmo porque tendo sido chamada depois de uma Revolução a preencher uma missão importante, a de dar certas Leis Organicas ao País, não pode ser dissolvida em quanto não responder ao País com todos os actos, que ele tem a esperar dela. (Apoiados)

A Camara pela sua propria dignidade, não pode hesitar em fazer uma Lei Eleitoral pelo método directo. (Apoiados) A Camara não pode estar em contradição com a resolução tomada em 17 de Abril de 1848. (Apoiados) A Camara cumpre levar ao cabo o sentido implicito com que tomou essa resolução, senão terá talvez de ver tomar corpo de verdade o que por ai corre, de que a Camara receosa de uma dissolução, não adopta a Lei Eleitoral pelo método directo, e para fugir à dissolução foge aos principios que abonam a eleição directa, e deixa correr e reger as prepotencias do método indirecto sobre as conveniencias do directo. (Apoiados) Em nome pois da dignidade e honra da Camara, peço que ela seja superior a essas considerações mesquinhas, e ao egoismo Parlamentar. (Apoiados)

(Fez varias considerações em abono da eleição pelo método directo citando para isso varios exemplos, e continuou.)

Sr. Presidente, ao método directo de eleições deve a Inglaterra as suas grandes Conquistas, a sua liberdade Politica, (Apoiados) e em fim o seu Progresso a todos os respeitos. (Muitos apoiados)

A autoridade de grandes Publicistas vem ainda a favor do método directo, sendo que a Camara electiva não a pode haver perfeita sem que seja resultado de uma eleição directa; e a razão é a eficácia do mandato, e a necessidade da confiança pública que anime o Governo, e essa confiança publica não aparece se não quando a Camara Electiva vem da eleição directa. (Apoiados)

Sr. Presidente, a Camara votou pela inconstitucionalidade do art. 63, e depois disto não vejo razão para que deva votar a eleição indirecta sobre a directa. (Apoiados — muito bem)

O Sr. Mexia Salema: Sr. Presidente, tambem venho prestar homenagem aos principios. Respeitando as opiniões alheias, conservo inflexivel a minha: a rectidão do pensar não é monopolio de ninguem; o combate das opiniões é um direito do raciocinio, como é tambem uma necessidade do Sistema Representativo. Tenho aplicado, o aplicarei sempre ouvidos atentos a todos, dentro e fora do Parlamento, e abraçarei sempre a verdade donde quer que ela venha; assim eu me convença, que ela realmente o é. Sr. Presidente, em ocasião tão solene não desejo ser silencioso, enunciando apenas o meu voto; vou defender a minha opinião, e para o meu Discurso imploro equidade: vozes mais elevadas tem combatido em defesa da doutrina, que professo, e a minha voz é debil física e moralmente: os Cavalheiros, sectarios das duas opiniões diversas, são sabios, a Camara igualmente o é, e a verdadeira sabedoria é indulgente e generosa.

Sr. Presidente, ouvi com toda a consideração o eloquente Discurso do ilustre Orador, que me precedeu; não sou do seu pensar, e protesto ante V. Ex ª e a Camara, que hei-de responder a todos os seus engenhosos argumentos; espero, que nenhum deles ficará sem resposta, se a tanto me ajudar engenho e arte. (Hilaridade)

Sr. Presidente, porque não posso eu votar na actualidade pela eleição directa? Perguntará V. Ex.ª e a Camara. Fácil e peremptoria é a minha resposta: vedam o meu dever, o devei da minha consciencia; um juramento, Sr. Presidente! Artigos eminentemente constitucionais da nossa Carta estão levantados diante de mim, como colunas de Hércules. (Apoiados)

Sr. Presidente, desde a fundação de Roma, tempos de Rómulo e Remo, os muros da Cidade foram declarados santos; desde que ha Leis Fundamentais escritas, elas foram entre todos os Povos consideradas como sagradas. (Numerosos apoiados.)

Sr. Presidente, a Comissão da Lei Eleitoral, que se compunha e compõe de Caracteres tão ilustrados e distintos, interpretou o artigo 63 da Carta Constitucional; e neste sentido foi essa declaração da Ca-

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toara, a que se alude, Esse artigo, Sr. Presidente, é minimamente claro, e, quando uma Lei o clara, não carece de interpretação; é principio usual em Hermeneutica, e já aqui foi invocado por um distintissimo Orador. É um, Sr. Presidente, o artigo 144, que em última analise se torna objecto de interpretação. E não será este artigo d I Carla eminentemente constitucional! Pela afirmativa estão, permita-se-me a figura, Gregos e Troianos. Como pois podemos nós, Camara Ordinaria, interpretar autenticamente este soberano artigo 141? Não o creio. (Apoiados) Hei-de demonstra-lo com principios de eterna verdade, até já consignados em velhissimas Leis.

O nobre Orador, que me precedeu, desdenhou das citações das Leis Romanas, aduzidas por um Cavalheiro, meu actual Colega na Universidade, e meu Ouvinte em outro tempo, para demonstrações em questões politicas; Sr. Presidente, já lá vai esse tempo, em que o Direito Natural, e o Direito Politico se comprovava com Leis do Digesto e Decretaes; porém quem pode censurar o uso dos principios de eterna justiça, que se acham consignados em muitas dessas Leis. Não subsistem ele através dos seculos, falando uniformemente para todas as Instituições, e para todos os tempos? Não se citam pela autoridade extrínseca, porque são Leis Romanas ou Leis Canonicas, suposto que, como tais, mereçam consideração, porém sim pela autoridade intrínseca, pelo peso, que tem na balança da razão. São sentenças, e as sentenças, para me aproveitar da metáfora de um Sábio, são cravos agudos, que para sempre se pregam na memoria; são enunciadas em belo latim, na lingua dos Sábios, que coadjuva muito a reminiscencia, como a experiencia atesta a cada um de nós. Demais, não curamos da Filosofia do Direito; de uma interpretação se trata, e invocaram-se os principios, sempre os mesmos de Hermeneutica, comuns para a inteligencia de toda e qualquer Lei. (Apoiados)

Disse, Sr. Presidente, o mesmo nobre Orador, a que me refiro, que um dos defensores da teoria, que sigo, e que primeiro falou, citara as Leis que lhe faziam conta, mas que se esquecera de uma, que não o abonava. Non tamen spectandum est quid Roma; factum est, quam quid fieri debeat. Defendo o meu Colega: essa Lei não lhe esquecia por certo; se bem me lembro, é de Próculo D. de Offic. Praesid. porém a que seria chamada uma tal Lei, quando se trata de jure constituido? Se tratassemos de estabelecer direito, de jure constituendo, então nós estatuiriamos não o que se observa em Roma, ou em Portugal, mas o que devesse ser na presença da Ciencia de Legislação.

Sr. Presidente, tamanha é a verdade por parte da minha asserção, que aquela Lei Romana, primeiramente invocada pelo Orador, que defendo, foi transcrita, sendo perfilhada, por Bacon, esse Jurisconsulto e Publicista insigne de Inglaterra, na sua Obra Filosófica, Moral, e Politica. E porque não hei de eu pois, Sr. Presidente, valer-me sempre que o entenda dessas velhas Leis, que nunca perderão de moda? (Vozes: — É verdade.)

Sr. Presidente, a proposição que já em outra ocasião apresentei à consideração da Camara, e que hoje de novo me proponho demonstrar, vai aparecer tão clara como uma proposição de Geometria. Podemos nós por ventura interpretar o invocado

Vol. 2. Fevereiro 1849

artigo constitucional 144.º? Não podemos, não, Sr. Presidente. São dois aforismos reais e verdadeiros, fundados em velhas Leis e Canones, Cujus est interpretari, ejus est condere, unde jusprodiit, interpretatio quoque procedat. E faculdade de umas Cortes Constituintes em geral, ou daquelas em particular, eleitas e convocadas na conformidade do art. 142.º da Carta, o fazer ou reformar Leis Fundamentais ou Constitucionais. Logo evidente e, que só exclusivamente a essas Cortes compete interpretar autenticamente tais Leis. (Apoiados)

Apenas, pois, Sr. Presidente, temos procedido a uma interpretação doutrinal. E quem ha aí, que duvide que tais interpretações, por mais felizes que sejam, não têm mais autoridade que aquela, que costumam ter os votos dos Sábios. Ora, Sr. Presidente, as razões, que os Sábios aqui produziram pela não constitucionalidade, não me convenceram, e foram elas contrastadas por outras de maior valia, no meu entender. Quem, Sr. Presidente, ha aí que não saiba quão grandes são muitas vezes as dificuldades, que oferece, na aplicação, essa arte conjectural, essa arte que para nós e o sumit pro vero, o habet pro vero, da Jurisprudencia Politica e Civil, a Hermeneutica? São a cada passo em vão os seus esforços; e grande é a distancia que vai da presunção à certeza. (Vozes: Muito bem)

Porém diz-se A Carta fala só da alteração ou reforma, e não de interpretação. Mas quem, Sr. Presidente, nos assegura, que a interpretação autêntica não seja em último resultado uma alteração, uma reforma Nem sempre o será; mas pode sê-lo muitas vezes. Diz Reiffenstuel, que o Principe, declarando autenticamente alguma Lei, não declara tanto a intenção pessoal do primeiro Legislador, como o sentido em que a Lei deve depois receber-se, e observar-se. Sr. Presidente, já que o nobre Orador que acabou de falar, confia tanto na autoridade do Sr. Silvestre Pinheiro, a quem ouvi elogiar, por ser nacional e pela gravidade das suas doutrinas, eu vou ler o que ele diz, parecendo ter-nos presentes nesta ocasião solene, nos numeros 285 e seguintes, da sua oitava Conferencia do Poder Legislativo T.

1.º Manual do Cidadão. (O Orador leu e continuou) As dúvidas, Sr. Presidente, apareceram; opiniões diversas se ostentaram por um, e por outro lado; a Comissão da Lei Eleitoral hesitou, veio buscar e inteligencia da Camara; a Camara acordou, que o problema submetido à Camara voltasse à Comissão, para primeiro emitir e formular o seu Parecer: a Maioria da Comissão votou pela constitucionalidade do artigo. Quem é pois, Sr. Presidente, que pode dizer com certeza moral, é ou não constitucional? O que se não conhece é como se não existisse: non entis et non apparentis idem est judicium. E dizia Confúcio Em dúvida, abastem-te. (Apoiado)

Sr. Presidente, antes de ir avante, reflectirei, que, quando eu invoquei o testemunho autêntico do Sr. Silvestre Pinheiro, que opina não competir ao Congresso interpretai a Lei reconhecida por escura, mas considera-la como nula, e de nenhum efeito, previ logo que a réplica deve de ser prova de mais. Sr. Presidente, o argumento é incontestavel: a doutrina racional, e experimental do Sr. Silvestre Pinheiro prova por força de compreensão, e de maior razão; prova o suficiente, e não prova de mais.

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Sr. Presidente, V. Ex. e a Camara já deve saber, que estou mais afeito a invocar a Lógica, que fala mais directamente ao entendimento, do que a Retorica, que se dirige mais ao coração, para me insinuar no qual não terei muita propensão; mais o deverá fazer numa questão toda de Direito positivo. Chamem embora a este, e outro que tal, meu Discurso, Tentativa Teológica, porque quando não mova a vontade, poderá ilustrar o entendimento. Eu contínuo firme no meu proposito. Dois elementos, afora outros, devem entrar como auxiliares na inteligencia das Leis o filosófico, e o historico; deste me aproveitarei agora para fazer sobressair a importancia, e seriedade de uma interpretação autêntica.

Sr. Presidente, quando a nossa Casa da Suplicação tinha, por delegação do Soberano, poder para interpretar autenticamente nossas Leis, em conformidade da Ordenação, Livro Titulo 5.º, e Lei da Boa Razão em data de 18 de Agosto de 1769, o Desembargador devia abster-se de julgar, quando ele entrasse em duvida sobre a inteligencia da Lei, ou quando ela por si nascesse, dizendo o Advogado do autor, que a Lei se devia entender de outro modo, e pertencendo o do réu, que se devia entender de outro modo; e devia propor a dúvida ao Regedor para, em Mesa Grande, se proceder à decisão dela por Assento. Grave era sobremaneira o objecto, que a seu respeito o Regedor devia consultar os mais elevados Membros de todos os Tribunais, que deviam tornar parte no mesmo Assento!

Sr. Presidente, e deixaremos nós, proclamando a eleição directa, ambulante o direito do artigo? Aparecerá uma ordem de eleger diferente daquela manifestada na Carta, e conservará esta ao mesmo tempo a sua disposição soberana? Sr. Presidente, bem previdentes, e providentes eram os nossos velhos Legisladores, e, nesta parte sujeita, mais constitucionais que nós Determina a Ordenação do Livro 2.º, Titulo 44.º Que se não entenda derrogada por El rei Ordenação, se da substancia dela não fizer expressa menção; e diz no contexto Posto que se diga, que o fazemos de nossa certa ciencia, e sem embargo de nossas Ordenações em contrario. Que Legislação tão cautelosa, e liberal, Sr. Presidente! Que veleidade hoje a nossa em revogar Leis, e as Leis das Leis! (Sensação)

Sr. Presidente, se hoje nos regera a Constituição de 1838, votará eu contra a eleição indirecta. Os Legisladores de 1838, no art. 71.º, proclamaram constitucional a base da eleição directa; e no art. 138.º inibiram qualquer alteração, ou reforma, que não fosse feita nos termos desse mesmo artigo, e por uma Camara munida de Poderes especiais. Oh! Sr. Presidente, pois a correlação da razão não é aqui a mesma? Dir-se-á que a invocada Constituição excluiu a teoria da constitucionalidade, ou não constitucionalidade em relação aos artigos de uma Lei Fundamental. Bem sei, Sr. Presidente, que as modernas Constituições, e bem hajam, inserem só em seus artigos a doutrina propriamente Constitucional. Bem sei eu, que o art. 141.º da Carta é, para assim dizer, uma excrescencia; foi traduzido, e copiado à letra do Curso da Politica Constitucional de Benjamin Constant. Por isso mesmo, Sr. Presidente, é que em dúvida devemos sempre reputar constitucional o conteudo em artigo escuro: como tal tem sido reputado o art. 144.

Porém clama-se a Camara declarou já a doutrina do art. 63.º não constitucional, e essa solene declaração é compulsiva, n — Ainda bem, louvado Deus, que um nobre Orador, adversario estrénuo da nossa opinião, nos fez justiça, dizendo, que os que votaram pela constitucionalidade do artigo estavam em optimo campo, e iam coerentes com os seus principios. Sr. Presidente, esta instancia já por alguns nobres Oradores do meu lado foi plenamente satisfeita. Mas perguntarei eu, Sr. Presidente, por ventura já tambem prescreve a verdade? Nullum tempus, nulla prescriptio occurrit veritati. O que é injusto no seu começo, não pode mudar de natureza, nem vir a ser legítimo pelo tracto do tempo: tempus in se, diz Grocio, nullam habet vim effectricem. Recordo-me, Sr. Presidente, que o nobre Deputado, que acabou de falar, citou a autoridade de Mr. de Chateaubriand em abono da sua opinião; recorro a ela mesma para rebocar à memoria o que ele tambem dizia na Tribuna Francesa: não ha refugio senão nos principias, fora deles tudo é falso, inconstante, e perigoso Il n'y a de refuge que dans les principes: hors de la tout est faux, changeant et dangereux. E quem de nós não estará convencido, que, assim como o Mundo, para fisicamente subsistir, demanda Leis invariaveis, que regulem o seu movimento, assim tambem uma Nação, para moralmente se conservar, exige sempre normas constantes e inalteraveis, que dirijam sua vontade e acção?.. (Vozes: — Muito bem.)

Mas, Sr. Presidente, havemos de parar diante do Março divisorio da Carta entre o direito constituido, e o direito constituido? Não descemos nós à análise dos principios filosoficos do Direito Politico? Sr. Presidente, não tenho pensamento reservado; nada ocultarei; e serei bem explicito, Creia V. Ex. e creia a Camara, que estou na melhor boa fé (Apoiados), e que a mesma justiça faço a todos os meus Colegas, embora de pensar diferente do meu; implicitamente prestámos juramento de calúnia, pelo qual, segundo o direito, foi nossa tenção litigarmos de boa fé, e abster-nos de toda a tergiversação e fraude neste grande e nacional processo da Carta Constitucional. Aqui não ha Partido, não ha paixão que cegue o entendimento; a prova evidente esta em que os soldados das diferentes bandeiras tem desta vez divergido entre si mesmos acerca da materia sujeita; é uma questão puramente científica. Longe vá daqui o que dizia certo Escritor Conheço a difficuldade de fazer reconhecer a evidencia nas questões Politicas, porque as paixões tem mais interesse em as desnaturar; já disse? Leibnitz, que, se os homens tivessem interesse em negar as verdades matemáticas, estas seriam postas em duvida.

Inquire-se qual das duas ordens de eleição é a melhor; eu em tese já me pronunciei pela directa, e se não levo a efeito o meu voto, é porque ainda me veda a Lei Constitucional, tal qual ela está.

Vou entrar na apreciação das duas ordens de eleições, mas primeiro que tudo, permita-me V. Ex.ª e a Camara, a fim de não me esquecer depois, que eu rebata uma asserção historica, aqui aduzida para provar, que o Povo nunca abusa, e na escolha é o melhor juiz do merecimento; foi ela primeiro lembrada por um ilustre Orador, que combatendo pela minha opinião pareceu-me nada deixar a desejar, e depois reproduzida por aquele, que acaba de me

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preceder, com a sua costumada elegancia de estilo no seu assaz erudito Discurso.

Sr. Presidente, quando ouvi proferir um tal asserto, para concluir pela preferencia a eleição directa, como a unica que podia bem exibir a vontade nacional, ouvi simultaneamente invocar, como documento importante', o testemunho de Benjamin de Constant. Tenho muitas vezes lido a obra deste exímio Publicista, não a compulsei porém agora. O que sei, Sr. Presidente, é que essa doutrina, dele colhida, baseada nas Autoridades, a que ele se reporta, vem na Ciencia de Legislação de Filangieri, que tambem não li de momento, mas tenho bem presente desde muito tempo. Pretende este. Escritor, que numa Democracia, ou antes numa República, segundo ele, o Povo é quem deve dar os empregos, e não o Senado, porque aquele, e não este é o justo avaliador do merecimento. Para o comprovar invoca a Historia de Roma e Atenas. Em Roma o Povo, depois de muitas queixas e tumultos, obteve, que os plebeus fossem elevados aos cargos da Republica, porém jamais se atreveu a escolhei-os; quando os Tribunos se estabeleceram, podia eleger entre as duas classes; quando se tratou da sua eleição, todos quatro foram procurados nadasse dos Nobres. Em Atenas era permitido por uma Lei de Aristides escolher Magistrados em todas as Classes dos Cidadãos; não ha exemplo, diz Xenefonte, do Povo ter verificado em si a eleição de empregos importantes, que respeitassem a sua suma felicidade e gloria. A Historia Romana, que eu saiba, não produz tal abonação: os quatro Tribunos não foram todos da ordem dos Nobres; nós sabemos quais foram aqueles, que por parte cio Povo haviam sido enviados ao Monte Sagrado, e que de entre eles fora Lúcio Junio quem. vendo, depois do conhecido Apólogo de Menenio Agrippa, os animos já dispostos a entregar-se nas mãos deste, clamou, que a segurança do Povo exigia a criação de um certo número de Oficiais escolhidos anualmente no seu Corpo, revestidos de uma autoridade capaz de garanti-lo da opressão do Senado, e de sustentar os seus direitos; nós sabemos, que os mesmos Tribunos no mesmo ano da sua eleição tiveram a faculdade de escolher no seio do Povo dois Oficiais anuais, que tiveram o nome de Edis, com o fim de coadjuva-los nas suas funções, e que effectivamente na sua classe foram sempre escolhidos. Tão certo é que a multidão não conhece limites nas suas pretensões; que um favor concedido produz novas reclamações! Nem tambem, Sr. Presidente, me convence o apoio, que Filangieri procurou, e aqui foi seguido pelo Orador, a quem respondo, nas observações de Xenefonte sobre a Historia da Grecia. Xenefonte, o grande Discípulo de Sócrates, vituperava de Atenas, por ter adoptado uma Constituição viciosa, e dizia, que estimava dirigir-se pelos conselhos de pessoas depravadas; porque era esse o muco meio de poder conservar-se num estado popular; a Lei do Ostracismo por si oferece suficiente prova de que a virtude nem sempre é procurada pelo Povo na outorga dos cargos da Republica. Além de que, Sr. Presidente, a asserção inculcada de Xenefonte é vaga, e como tal, que prova pode merecer? (Muito bem, muito bem).

Rectificado assim este facto historico, segundo o meu humilde entender, em resultado de minhas antigas lucubrações, vou de um rapido lançar de olhos

entrar no conhecimento das conveniencias e inconveniencias que tem o método directo, das vantagens e desvantagens que tem o método indirecto. Uso desta fraseologia de método, por seguir a que aqui se tem adoptado, com quanto outra seja a ideia que eu ligo aos diferentes modos de eleger.

Sr. Presidente, aproveitar-me-ei do que diz um Publicista, que já aqui citei em outra ocasião. Ambas as ordens de eleições tem suas vantagens e desvantagens: a directa exprime melhor o voto do Povo, porque todos os Cidadãos ali concorrem directamente: a indirecta é mais depurada e acurada, porque podendo as escolhas ser mais discutidas, podem assim ser feitas com mais discernimento: a indirecta parece favorecer mais o merito, porém tambem por outro lado pode concorrer mais facilmente para o suborno, menos dificil de se exercer sobre um pequeno numero, que sobre um grande numero; a directa excita mais agitação, porque é feita por homens mais apaixonados: a indirecta é mais reflectida e tranquila, porque é feita por homens mais escolhidos, e consequentemente mais razoaveis. Em suma são estas em maxima parte as suas conveniencias e inconveniencias praticas; outras muitas poderão aparecer, e algumas por já aqui relatadas, ócio seria mencionar.

Sr. Presidente, V. Ex.ª e a Camara muitas vezes devem ter meditado no célebre Sistema das Compensações, o qual se tem aplicação à ordem física, não menos a deve ter em relação á ordem moral. Aqui o vemos nós verificado não poucas vezes: assim, V. g. a difficuldade maior de subornar o Povo, quando a eleição é directa, é contrabalançada ou compensada pela maior facilidade de o levar pelo cego entusiasmo; por ele se excitam no momento impressões apaixonadas, que são favoraveis aos Partidos; se destes os cabeças ou os seus instrumentos não dirigissem as massas dos homens inexperientes e ignorantes, não colheriam por certo resultado (Apoiados).

Sr. Presidente, forçoso é confessar, que a avaliar as duas formas de eleições pelos inconvenientes ou abusos, que na pratica por diferentes vezes tem mostrado, como por um e por outro lado tem sido referido pelos Oradores de diferente pensar, nenhum método, experimentalmente, tem ainda até hoje obtido a primazia. Por consequencia não temos, Sr. Presidente, senão razões filosoficas, que nos decidam. E em virtudes destas que eu me pronuncio pela eleição directa; é minha profunda convicção, e folgo muito reiterar esta declaração solene.

Sr. Presidente, a eleição directa tem mais verdade, digamos assim, porque dá aos Cidadãos os intérpretes directos, ao passo que a indirecta lhes dá os indirectos. Os intérpretes directos são como as testemunhas oculares, que jamais enganam, quando são sinceras; os intérpretes indirectos são como testemunhas auriculares, que podem enganar quando elas mesmas tem sido enganadas. E tambem plenamente convenho com o que já notou aqui um nobre Orador, que as eleições directas estabelecem relações mais imediatas entre o Eleitor e o Eleito.

Sr. Presidente, estas razões só por si, afora outras que já aqui têm sido aduzidas, recomendam como preferivel a eleição directa, por ser a mais perfeita à face da Filosofia do Direito Publico Universal. Quando seja possivel estabelecer esta forma de elei-

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çâo mais correcto, poder-se-ão remediar com adaptadas provisões os inconvenientes, que ela possa apresentar, com especialidade na pratica, feita por uma Nação não muito moralizada e instruida.

Mas, Sr. Presidente, que flagrante contradição! Se a eleição directa é em verdade a melhor, porque votarei eu contra o artigo do Projecto, que a proclama? Sr. Presidente, a resposta já eu dei logo no principio do meu Discurso; o em confirmação, senão em aditamento, declaro a V. Ex.ª e à Camara, que coerente com a minha opinião sobre a constitucionalidade do artigo, eu contínuo a votar pela eleição indirecta, porque é esta a maneira de salvar os principios, que a Carta consigna.

Sr. Presidente, o nobre Deputado por Viseu, Relator da Comissão, falou por incidente num método de eleições por Classes; é a teoria dilecta do Sr. Silvestre Pinheiro. Aproveito a lembrança, que me suscitou, e pergunto: se vier uma Camara, uma vez que não ha constitucionalidade na forma da eleição, a quem agrade uma tal Representação por Classes, haverá quem com direito a argua de legislar de um modo diferente da Carta. Ainda mais, Sr. Presidente, se vier uma Camara retrógrada, que quê-la fazer reviver a nossa antiga Representação pelos Três Estados, contentando-se com estender o chamado Braço do Povo a todas as Camaras do Reino, quem a increpará de falta de direito? Oh! Sr. Presidente! A que absurdos somos levados, quando sai-mos dos principios! Abyssus abyssum invocai. (Muitos apoiados)

O mesmo nobre Deputado, a quem respondo, invocou, como para nos incitar á imitação, o exemplo de Inglaterra; encareceu muito a beleza da sua Lei Eleitoral para lhe atribuir em maxima parte a grandeza, e prosperidade a que ha chegado este Reino. Sr. Presidente, V Ex.ª e a Camara sabe, que a verdadeira reforma da Lei Eleitoral foi em 1832, que até ali ela era reputada assaz viciosa. Em verdade é fazer estranho agravo a esta Potencia, de longo tempo tão eminentemente avaliada, o julgar, que só foi próspera desde o anão de 1832. Pois acaso este Povo até essa época da sua regeneração eleitoral foi selvagem? Em verdade o argumento aduzido prova de mais (Apoiados.) Sr. Presidente, hoje é velho, e já proscrito pelo bom senso o querer atribuir o estado próspero e decadente de uma Nação a uma só causa; é ele sempre devido a uma concomitancia de causas: querer referir a felicidade de Inglaterra á Lei Eleitoral é o mesmo que se nós, falando da queda do Imperio Romano, atribuissemos a mesma a esta, ou àquela causa isolada, quando aliás elas foram muitas, que simultaneamente concorreram; só Gibbon, se bem me lembro, numera 14; outros Escritores porém ha que referem, cada um, aquela, que melhor lhe apraz.

Tambem o nobre Deputado chamou em seu auxilia os precedentes em relação a artigos da Carta, que havia já no Parlamento Português, sendo o primeiro deles em 1834. Não me demoro na refutação, porque jamais de uma vez se satisfez nesta mesma Camara a esta instancia. Sr. Presidente, V. Ex.ª e a Camara sabe o que é identidade de razão, e quais são os seus elementos constitutivos Não ha identidade, nem mesmo paridade, como já se demonstrou; e por consequencia o argumento carece da força, que inculca. Além de que, Sr. Presidente, invocou-se então a suprema razão de estado; e que razão de Estado ha no presente caso?

Igualmente o Cavalheiro, a quem respondo, se socorreu ao argumento de comparação tirado da Lei de 11 de Abril de 1845, que regulou as habilitações do Pariato. Como que quis dizer, que de alguma forma alterava o estatuido na Carta Constitucional no art. 39, e seguintes. Sr. Presidente, esse argumento prova então de mais, porque nos leva a uma consequencia mais extensa, isto é, o poder o Pariato deixar de ser vitalicio e hereditario, uma vez que uma Lei simplesmente ordinaria de Cortes assim o declare. Mas, não, Sr. Presidente; quando a Lei, embora Fundamental ou Constitucional, não exprime expressamente uma proibição, dá direito a providenciar em tudo o que não foi explicitamente restringido; a liberdade alcança até ai. A Carta nem marcou o censo, nem enunciou que qualidades devia ter o Pariato. Uma Lei devia suprir estas faltas; e esta Lei foi regulada pelos principios de Direito Publico Constitucional, adoptados em tais casos pelas demais Nações Cultas (Apoiados.)

Finalmente confessou o mesmo nobre Deputado, que, quando a Camara aprovou a não constitucionalidade do artigo, não fora ela impelida por deferencia a Partidos, ou às luzes do Século, porém fora arrastada pela sua profunda convicção; a Camara encarnou, para assim dizer, na alma esta crença. Sr. Presidente, contra isto nada tenho que dizer; acompanho o nobre Deputado nessa sua confissão, porque tambem é a minha: faço justiça á boa fé de todos, e espero que igual se me conceda (Apoiados.)

Sr. Presidente, parece-me ter respondido, tanto quanto posso, aos argumentos do nobre Deputado, de que tomei nota; ainda que mais quisesse produzir em favor da minha doutrina, vejo eu, que o mesmo peito, por cansado, já me não ajuda. Oradores mais conspicuos e eruditos se hão de ainda seguir; no que faltar apelo para eles.

Sr. Presidente, por tem a mesma propria justiça, que nos fazem os nobres Oradores pela opinião oposta, eu, sob pena de ser incoerente com os meus principios, e consequencias deles, não posso de forma alguma votar pela eleição directa. Sr. Presidente, protesto ante V. Ex.ª, a Camara, e a Nação, que hei-de votar pela Lei Eleitoral, a mais liberal, que aqui se apresente, uma vez que esteja dentro da orbita da Carta Constitucional. (Apoiados) Sr. Presidente, ouvi aqui invocar o nome do Sr. Derramado, já em outra ocasião eu o invoquei; é uma prova da saudade, que nesta Casa nos causa a falta deste Varão ilustre e conspicuo. Pertenceu este Cavalheiro a uma Comissão de Lei Eleitoral, de que foi Presidente, e a que eu imerito tive tambem a honra de pertencer. Essa Comissão havia elaborado um Projecto com eleição indirecta nos termos da Carta, o mais liberal possivel; nele apareciam circulos pequenos, e não sei que a Carta se lhes oponha. (Vozes: Não se opõe), nele aparecia um capítulo ou titulo de penalidade, e tal, que o suborno seria dificílimo, senão impossivel, porque as provisões eram cautelosas e as penas infaliveis, etc. Sr. Presidente, eu havia declarado que votava por esse Projecto, em tudo quanto não aparecesse na discussão ser incompativel com artigo constitucional da Carta. Ratifico solenemente o meu voto.

Sr. Presidente, para no meu voto poder ser livre, sin-

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to profundamente, que o art. 63.º da Carta não esteja reformado, como devêra ser na conformidade della. Voto consequentemente pela eleição indirecta, porque não posso de outra sorte salvar a letra expressa do artigo constitucional. Sr. Presidente, permitta-me a Camara recordar-lhe, que o Delicano tirando o sangue do proprio peito para alimentar seus filhos com a letra — Pela Lei e pela Girei — era a Divisa d'El-Rei D. João II. Seja esta a nossa divisa na observancia da Carta, como o foi na sua Restauração. Sr. Presidente, conta-se, que Democles promulgara uma Lei com pena de morte contra os que fossem armados á praça publica; que um dia, descuidando-se, e desapercebendo-se nella elle mesmo apparecera armado; e que interrogado porque elle mesmo violava a Lei, que proprio promulgara, respondeu — eu

Vou confirma-la, e arrancando da espada matou-se. Sr. Presidente, exemplos de rigidez na observancia da Lei em velhos tempos ha muitos; tocava ella em fanatismo: hão de ser sempre menos os inconvenientes, que hão de nascer deste fanatismo, embora extremo vicioso, do que aquelles, que procedem, e são irremediaveis, deste cynismo, digamos assim, que em nossos dias muitas vezes se ostenta ácerca da execução da Lei. (Vozes: — Muito bem, muito bem, excellentemente.).

O Sr. Presidente: — A Ordem do Dia para ámanhã é a continuação da mesma de hoje. Está levantada a Sessão. — Eram quatro horas da tarde.

O 1.º Redactor,

J. B. GASTÃO.

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