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N.º 15. Sessão em 21 de Fevereiro 1849.

Presidencia da Sr. Rebello Cabral.

Chamada — Presentes 71 Srs. Deputados

Abertura — A uma hora depois do meio dia.

Acta — Approvada.

Correspondencia.

Officios: — 1.º Do Ministerio da Justiça, enviando uma Relação nominal das Dignidades, Conegos, e Beneficiados das duas extinctas Igrejas — Patriarchal, e Basilica de Sancta Maria de Lisboa — que não foram contemplados no Quadro da nova Sé Metropolitana Patriarchal em 1844: satisfazendo assim ao Requerimento do Sr. Ferreira Pontes. — Para a Secretaria.

2.º Do Ministerio da Guerra, contendo alguns esclarecimentos ácerca do Capitão addido á Companhia de Veteranos de Belem, Rodrigo Affonso de Athouguia. — Idem.

3.º Do Sr. Costa Xavier, participando que por motivo de molestia não póde comparecer á Sessão de hoje, e talvez a mais algumas — Inteirada.

O Sr. Secretario Corrêa Caldeira: — Fizeram constar ria Mesa os Srs. Forjaz, e Bispo Eleito de Malaca que, por doentes, não podem assistir á Sessão de hoje.

O Sr. Silvestre Ribeiro: — Mando para a Mesa o seguinte Parecer da Commissão d'Administração Publica. (Leu, e era, sobre o Requerimento de José Carlos d'Aguiar Vianna, concluindo por pedir esclarecimentos ao Governo)

O Sr. Presidente: — Como a Commissão conclue por pedir esclarecimentos ao Governo, não e precisa votação da Camara: mandam-se pedir.

Por esta occasião tenho a prevenir a Camara que ámanhã, na Primeira Parte da Ordem do Dia, hão de decidir-se Pareceres de Commissões, não impressos, que estão adiados.

O Sr. Faria Barbosa: — Mando para a Mesa uma Representação da Camara Municipal da Villa da Povoa de Varzim, que pede, que quando se tractar da Divisão Territorial, haja de ser elevada a Cabeça de Concelho.

Ficou para se lhe dar destino.

O Sr. Mexia: — Mando para a Mesa uma Representação da Camara Municipal da Cidade de Lagos, na qual pede a esta Camara, que lhe seja concedida a propriedade do Convento dos Frades Capuchos da mesma Cidade, hoje em total ruina, os seus logradouros, e Igreja, a fim de ser alli edificado um cemiterio de que muito carece. São ponderosissimas as razões que abonam tão justa pretenção, as quaes vêem referidas na mesma Representação: e eu espero que esta Representação merecerá toda a consideração em objecto tão importante e urgente.

Ficou para ter seguimento opportunamente.

O Sr. Presidente: — Não ha Segundas Leituras. Passa-se á Ordem do Dia, que é a continuação da discussão do art. 1.º do Projecto n.º 48, sobre a Lei Eleitoral, e Emendas ao mesmo artigo offerecidas, uma do Sr. Corrêa Caldeira, e outra do Sr. Lopes de Lima; e continua com a palavra que lhe ficou reservada da Sessão anterior o Sr. Lacerda (Antonio)

Ordem do dia.

Continua a discussão do Projecto n.º 48, na fórma acima enunciada pelo Sr. Presidente. (V. Sessões n.º 7 de 9, e n.º 10 de 13 deste mez).

O Sr. Lacerda (Antonio): — Sr. Presidente, na ultima Sessão coube-me a palavra, quando a hora estava já tão adiantada, que apenas pude dar as razões, porque a Commissão Eleitoral consignou no Projecto a eleição directa; entendi que seria uma grave injuria para a Maioria da Camara, que votou o anno passado a não constitucionalidade do art. 63.º, sem suspeitar a sua coherencia, e não podia fazer outra cousa.

Eu, illustre Deputado pela Estremadura disse, quaes os motivos que levaram o Immortal Dador da Carta a consignar nella o methodo indirecto; motivos que se fundavam principalmente no estado da Europa, e do Paiz. Por esta occasião observei, que o Libertador, prestando homenagem aos principios eternos da razão, e da justiça, sabia que quando uma Nação póde exercer os seus direito, os não deve delegar, e por isso era impossivel, que elle considerasse constitucional o art. 63.º da Carta, ou que não podesse ser derogado por uma Legislatura Ordinaria; quando esta derogação podia ser necessaria de um momento para o outro, e apenas mudassem as circumstancias. Passando finalmente ao campo constitucional do art. 63.º, rematei fazendo ver, que a eleição indirecta deixa muitas vezes de ser a expressão da vontade nacional, para ser unicamente a das facções; e como a este proposito me referi a um facto, que foi mal entendido, ou mal interpretado, peço licença á Camara para o repetir.

Em 1834, quando o Libertador foi ao Porto mostrar á sua Augusta Filha aquelles muros tão regados do mais precioso sangue Portuguez, aquelles baluartes em que tinha revivido o heroismo dos antigos tempos com todo o seu brilho, e energia; não só os habitantes da Cidade eterna, mas os de um raio de mais de vinte legoas exultaram de jubilo, e envidaram todos os esforços para evidenciar o seu enthusiasmo ardente, e sincero, a sua alegria do coração. As salvas, os sinos, os vivas reboavam mesclados, e todo aquelle Povo de differentes partes era unisono em patentear ao Libertador a sua gratidão, o seu affecto, a sua devoção inteira, e completa. Nessa mesma occasião uns poucos de homens estavam reunidos n'uma Igreja triste, e solitaria, e faziam uma eleição pelo methodo indirecto, que trouxe á Camaia como Representantes do Porto, aonde o Imperador era adorado como um Deos, homens que lhe vieram disputar a Regencia, e que lhe deram acerbos desgostos. E esta a verdade com que aquella eleição representa a vontade nacional! (Apoiados) Agora passarei a responder a alguns argumentos, que os meus illustres Amigos defensores do Projecto me deixaram respigar.

Um illustre Deputado pela Estremadura disse —

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Olhai bem, que rasgaes a Carta! — Isto é Um immerecido estygma, que se lançava aos que defendem o Projecto, quando elles só levam em vista, que a Carta não seja sofismada, nem calumniada pela inflexibilidade de uma interpretação juridica. Argumentos similhantes recochetam com mais força contra quem delles se sorve; pois que tambem se póde dizer, que os que defendem a eleição indirecta, matam o espirito da Carta com a sua lettra.

Não se quer violar a Carta; mas pelo contrario, que ella brilhe, e fulgure em todo o esplendor das suas intenções liberaes. Qual foi o Orador, que, defendendo o art. 1.º do Projecto, invocou a Salvação Publica? De nenhum me consta o fizesse; portanto não vem a proposito os exemplos de Cicero, e Catilina, pois não se tracta de violar a Constituição, nem isso é permittido dizer-se, depois do que o anno passado decidiu uma Maioria de 61 votos. Os exemplos de Cicero, e Catilina se os querem applicar com fundamento aos defensores do Projecto, devem soffrer antes as consequencias do quem mais de uma vez violou a Carta. (Apoiados) Aos rigoristas de occasião, aos escrupulosos da inflexibilidade dos principios, lembrarei tambem um facto historico — quando Lacedemonia collocou á testa do Governo de Athenas trinta Cidadãos, começaram elles por ser tão rígidos observadores da Constituição, e das Leis, que ora uma admiração, e uma benção; mas assim que se assenhorearam da influencia, se transformaram nessa Oligarchia ferrea, e despotica, conhecida pelo nome dos — Trinta Tyrannos!

Pertendeu-se assustar a Camara com a necessidade da dissolução, se por ventura se adoptasse a eleição directa: a Camara devia rejeitar com indignação similhante argumento: a Camara não receia, nem teme uma dissolução; mas se isso fosse inevitavel, ella não recuaria ante o seu dever, nem sacrificaria ao seu egoismo os interesses do Paiz. Se o prefere, é que mereceria ser dissolvida.

Sobre os methodos direi, que o coração, a vida da liberdade esta na sinceridade da eleição, na realidade da Representação Nacional: se se provar que a eleição directa contribue mais efficazmente para se alcançarem aquelles importantes fins, ficará demonstrada uma excellencia sobre a eleição indirecta.

Uma Nação só póde delegar por impossibilidade do exercer a sua auctoridade; e não sei como um Paiz, que gosa ha mais de vinte annos do Systema Representativo, não possa exercer direitos de que tom consciencia, não esteja habilitado para, dentro dos limites da capacidade eleitoral, eleger os seus Representantes.

Todavia um illustre Deputado por Traz-os-Montes, reproduzindo o que tinham asseverado outros illustres Deputados, quando disseram, que o Paiz tinha impossibilidade de exercer os seus direitos por falta de instrucção, civilisação, finalmente, por falta de capacidade, o illustre Deputado repeliu — «Na actualidade não podemos ter eleições directas!

Este sofisma da opportunidade já tinha sido apresentado em 1821, já então se havia allegado este motivo; e todavia os illustres Membros do Congresso, tão adulados pelos que impugnam a eleição directa, por terem sido feitura da eleição indirecta, foram elles proprios que julgaram, que os inconvenientes do methodo indirecto eram muito superiores, e por isso consignaram na Constituição a eleição directa.

Mas, perguntarei eu — Póde dar-se a mesma impossibilidade vinte e oito annos depois? — Note bem a Camara, que se tinham passado vinte e oito annos depois que se havia allegado tamanha incapacidade; e que nesse longo trado de tempo em que as revoluções succederam ás revoluções, em que Portugal foi uma longa, e encarniçada lucta de interesses, do direitos, de opiniões, de crenças; em que viu alterada a sua Magistratura, o seu Clero, a sua Administração; em que a terra folgou libertada dos dizimos, e alcavallas; em que a Imprensa, e o Jury fizeram penetrar nas Classes mais baixas da Sociedade a discussão da justiça, e do direito; nesse periodo mais importante do que muitos Seculos, Portugal não aprendeu nada!

Os que allegam tamanha impossibilidade de exercer direitos depois da transformação social, porque o Paiz tem passado, querem que a lenda alemã de Frederico Barba-Rôxa seja o mytho do Povo Portuguez: pois querem que elle tenha dormido por sete annos, o mais sete annos, e mais sete annos, e mais sete annos, acordando sómente para perguntar, se os corvos já passaram, e depois tornando a dormir, a dormir!

Uma tal incapacidade não se póde dar depois de vinte e oito annos, pelo menos não é provavel que se dê; o Povo Portuguez póde exercer immediatamente os seus direitos, e por consequencia a Representação Nacional que se baseasse no principio opposto, aproximava-se muito do sofisma.

Além disto é sabido que as Leis são a expressão da vontade geral, declarada pelo orgão de seus representantes legitimos, ornais precioso direito é concorrer para essa expressão. Era segundo estes principios que nas Republicas da antiguidade todos os Cidadãos concorriam para a feitura das Leis. Nas Nações modernas e isto impossivel pela sua extensão o outras causas, e então se já se coarctasse um direito, ir-se-ia restringi-lo ainda mais privando-as de votar directamente os seus Representantes Quando estes dependerem directamente dos seus Representados haverá um maior vinculo de confiança e responsabilidade, que são uma grande garantia para a liberdade, pois que arreigam em todas as classes o amor do Systema Representativo.

No entretanto o illustre Deputado por Traz-os-Montes disse que na eleição directa o Representante não esta em contacto com o Eleitor: sempre eu desejava saber se n'uma eleição em que ha corpos intermedios, como na indirecta, esta mais em contacto o Representante com o Representado? Se o illustre Deputado poder demonstrar que dous corpos que têem outros intermedios estão em mais proximo contacto do que os que os não têem, terá conseguido resolver um problema, do qual nenhum Mathematico ainda foi capaz até agora (Apoiado).

Um outro inconveniente apresentado pelo mesmo illustre Deputado é, que a Nação não conhece áquem elege. A este argumento podia responder como ao da incapacidade; mas a propria experiencia se encaneça de o destruir e pulverisar.

As eleições de 1838, mas principalmente as de 1848, trouxeram á Camara tudo quanto de mais notavel havia em Portugal nas diversas parcialidades Politicas. Nos Estados-Unidos vêem-se os homens mais distinctos ser eleitos pelo directo não só para a Camara dos Representantes, mas tambem para as Provinciaes; e as nomeações dos Governa-

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dores e Presidentes dos diversos Estados recaírem nas pessoas mais dignas, A Camara Franceza de 1818, eleita pelo methodo directo, foi uma da melhores que teve a França.

O mesmo illustre Deputado disse, referindo-se a Beijamim Constant, que as eleições estavam alli nimio desacreditadas, mas sem attender ás circumstancias em que se achava a França, quando elle escrevia. As paixões dos Partidos estavam na sua maior exaltação; a reacção arvorara o seu estandarte, os laços sociaes estavam rotos; e as Leis não eram obedecidas. Em taes circumstancias qualquer eleição havia de produzir identicos resultados. (Apoiados)

Para que se argumenta pois com os males da eleição directa, e com os abusos que se commettem? Em quanto aos primeiros, se se puzerem em confrontação com os a que têem dado causa a eleição indirecta, ninguem hesitará em conceder, que os desta são muito maiores. Lembre-se o illustre Deputado que se serviu deste argumento — Que a Convenção Nacional que ensanguentou a França, e mostrou á Europa monstros de incrivel ferocidade, foi eleita pelo methodo indirecto. — Do mesmo modo foram feitas algumas eleições do tempo do Directorio e do Consulado, que déram em resultado a subserviencia, ou o mutismo. Finalmente as eleições de 1814 produziram a Camara Introuvable.

Entretanto tudo isto pouco prova; assim como dos abusos e irregularidades que se dão em ambos os methodos, não deviamos fazer o nosso cavallo de batalha. O que todavia parece inquestionavel é que, quando mesmo os que se encontram na eleição indirecta não fôssem muito consideraveis, bastava para pesar na balança o gravissimo inconveninte da corrupção.

Não é por ella senão podér dar tambem na eleição directa; mas na indirecta é muito mais facil, e mais escandalosa. Os vicios são tanto mais consideraveis quanto vêem de mais alto, e o seu effeito é na mesma razão muito mais nocivo. A corrupção que se póde dar nos Collegios Eleitoraes, não é só perniciosa, como falsificando a Representação Nacional, mas principalmente como uma elevada escóla de immoralidade, aonde o Povo vai aprendel-a dos seus Superiores; e a semente que de tão alto é lançada á terra, ha de produzir centuplicada.

Demonstrei conscienciosamente as vantagens do methodo directo, e os inconvenientes do indirecto; e não se diga que quando mesmo aquellas se dêem, o Povo não tem sufficiente illustração para fazer uma boa escolha. Diz Montesquieu: — O Povo tem um instincto admiravel para escolher os seus Representantes. A experiencia dos tempos que se seguiram tão ferteis em glandes acontecimentos, mostraram a justeza da asserção do celebre Publicista, que de certo não póde ser taxado de revolucionario. (Apoiados)

Montesquieu neste ponto não fez mais do que ser o éco das opiniões de alguns Filosofos e Varões illustres; e não posso achar razão a um illustre Deputado pelo Douro, quando, para impugnar aquellas opiniões observou que o Povo Romano em vez de nomear os seus Tribunos da Classe Senatoria, os elegia Plebeus. S. Ex.ª quiz talvez dar assim a entender que o Povo escolhia mal; mas eu entendo que a razão era contraproducente, pois julgo que o Povo fazia bem em ir buscar os seus Magistrados populares á sua propria Classe. (Apoiados)

O illustre Deputado por Trás-os-Montes ainda repetiu mais uma vez um pensamento apresentado pelos que combatem o Projecto, dizendo: — O bem do Povo não depende absolutamente da Lei Eleitoral. Eu peço tambem licença para repetir o que já disse em outra occasião, isto é — Uma Lei que habilita o Paiz para todos os interesses, todos os direitos, todas as opiniões virem combater ao campo legal, é sobre todas a que mais affiança o bem do Povo; pois que concorre para a reconciliação, e a paz, á sombra da qual unicamente podem realisar-se todos os melhoramentos materiaes e intellectuaes, todas as reformas, todas as prosperidades do Povo Portuguez. (Apoiados)

Resumindo direi, que a eleição directa concorre poderosamente para a Representação Nacional ser mais real e verdadeira; contribue energicamente para a fusão dos diversos interesses e Classes de que se compõe a Sociedade; finalmente presta homenagem ao principio da elegibilidade, que por ella mais se fortifica e retempera.

É preciso que o Povo faça caso do seu voto, e tenha consciencia do que vale, para que nutra no peito o sancto enthusiasmo da liberdade, e interesse pelo Systema Representativo, e por uma fórma de Governo, para que elle immediatamente concorre. Mas para esse enthusiasmo, esse interesse existir é preciso que vote directamente os seus Representantes.

Não se queira insinuar que o verbo Conservador vem encarnar na eleição indirecta. Mr Guizot disse em 1846 no banquete de Lisieux, que o Partido Conservador comprehendia todos os progressos, e os havia de pôr por obra: eu em nome do Partido Conservador Portuguez adopto aquella declaração.

Nós não fazêmos Leis para um Partido e contra os seus adversarios; mas para o Paiz, para a Nação inteira. (Apoiados)

Eu espero que a Camara approve a eleição directa; não só pelo seu amor á liberdade, e á fidelidade da Representação Nacional, mas porque a Maioria de sessenta e um vetos empenhou nesta questão, pelo valor moral da decisão do anno passado, a sua reputação, o seu pundonor, a sua honra. Eu, como um illustre Deputado que se assenta no banco superior, direi tambem. — Escolhei entre o remedio e o veneno! — O remedio esta na vossa coherencia, esta na approvação da eleição directa; o veneno esta no descredito de que vos haveis de cobrir, se vos mostrardes tão levianos, versáteis, e inconsequentes, que a não approveis. Escolhei entre o remedio, e o veneno!

Mas se a Camara, o que não é de suppôr, escolher mal, se não approvar a eleição directa, os seus defensores se curvarão ante essa decisão; e satisfeitos de que o Paiz haja registrado os seus esforços, exclamarão: Fictrix causa dus placuit, sed victa.....

Conclui.

O Sr. Xavier da Silva: — Sr. Presidente, na altura em que esta a questão, depois de 18 dias de discussão sobre se o artigo é ou não constitucional, e sobre se a eleição ha de ser directa ou indirecta, é muitissimo difficil attrair a attenção da Camara; e ainda que o negocio é grave, tendo-lhe a Camara dado a importancia que elle merece, entendo, que ha muito podia estar decidido; (Apoiados) podendo qualquer das decisões que se tome ser util ao Paiz;

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(Apoiados) porque, Sr. Presidente, eu estou convencido de que (talvez esteja em êrro, mas se em êrro estiver, tenho a satisfação de achar muitos concordes comigo) o Paiz o que precisa, é uma boa Lei de Eleições; que seja directa, que seja indirecta, estejam certos os Srs. Deputados, tanto os que votam por uma, como os que votam pela outra, que por mais que trabalhem, difficilmente hão de evitar que ella possa deixar de ter todas as fraudes, todas as irregularidades que se têem observado. Trabalhemos por fazer a melhor Lei possivel, e se o conseguirmos, teremos feito um bom serviço ao nosso Paiz. (Apoiados)

Quando, Sr. Presidente, na Sessão, parece-me que de 15 de Abril, eu tive a honra de fallar nesta Camara sobre a constitucionalidade ou não constitucionalidade do art. 63, e disse, nem podia deixar de dizer, que eu não queria invectivar as opiniões daquelles que sustentavam a opinião opposta á minha, eu estava convencido, e ainda estou, de que o art. 63 combinado com outros artigos da Carta e um artigo constitucional; posso estar em êrro, os outros Srs. Deputados que estão convencidos de que o artigo não é constitucional, estão na mesma liberdade de discutir como nós, sem precisarem ir buscar argumentos a pessoas, e injuriarem-se reciprocamente, porque isso não faz bem á Causa Publica.

Sr. Presidente, a maior necessidade que nós temos, e que é precisa sempre nos Govêrnos Constitucionaes, o a tolerancia das opiniões de cada um dos individuos; se essa não existe, não ha liberdade Para que pois aquelles, que votam, ou que pensam de uma maneira differente dos outros, tirarem argumentos das pessoas para sustentarem a sua opinião?...

Sr. Presidente, eu sou um desses escrupulosos, como acabou de dizer o nobre Deputado, que me precedeu; sim, Senhor, sou um desses escrupulosos, que entendem que o artigo é constitucional; e digo — Oxalá que elle se possa alterar, e modificar por um modo legal, pelo modo que a Constituição permitte, porque então esteja certo o illustre Deputado de que me havia de achar ao seu lado votando pela eleição directa.

Eu, Sr. Presidente, devo dizer francamente apezar de ser isto conhecido de todos, sou um desses que tenho a honra de vir a esta Camara pela eleição directa, e pela indirecta; por tanto já vê o nobre Deputado, que não posso recear d'uma ou de outra, nem para o futuro, porque o futuro hade ser o que o bom senso dos Eleitores entender, nem quanto ao passado posso ter motivo pessoal contra qualquer dellas; mas a verdade é que a experiencia de alguns annos me tem feito conhecer quaes os defeitos, que tem uma e outra eleição, porque ambas os têem.

Tem-se querido inculcar, que a eleição indirecta é a eleição, onde entra a corrupção Eu, Sr. Presidente, declaro que estremeço, quando ouço dizei isto a pessoas tão respeitaveis, a amigos meus que me merecem tanta consideração. Pois nós que estamos sentados nesta Camara, e que fomos eleitos pela eleição indirecta, para sustentarmos que a eleição directa deve ser preferida á eleição indirecta precisamos impôr sobre nós o ferrete da ignominia, dizendo que as eleições indirectas são eleições de corrupção!...

Estou certo de que se as eleições não fossem indirectas, talvez os resultados não fossem os mesmos, que tem muitas vezes apparecido; mas não posso attribuir isto á corrupção, só o attribuo a influencias, e a muitas outras causas que não vem para aqui; mas e estas esteja certo o illustre Deputado que hão de apparecer sempre, seja qual fôr o methodo da eleição. Se se seguisse a opinião dos illustres Deputados, de que não póde haver corrupção, quando é maior o numero dos eleitores, talvez se podesse tirar a conclusão, certamente bem errada, de que as Camaras Legislativas em logar deferem compostas do numero do Membros que actualmente tem, o deviam ser de 500 ou 600, para que a corrupção não viesse no Parlamento

Mas, Sr. Presidente, não se tire o argumento de que a corrupção só se póde dar em um numero limitado, porque eu poderia apresentar exemplos para demonstrar, que em eleições directas, nesse numero immenso de eleitores, eu tinha presenciado a corrupção em todo o seu auge.

Trouxe-nos o illustre Deputado tambem um argumento da visita, que fez o imperador á Cidade do Porto. Sr. Presidente, se eu quizesse argumentar com o exemplo apresentado pelo illustre Deputado, talvez podesse tirar uma conclusão contraria á que S. Ex.ª tirou. Que eleições se faziam no Porto, quando o Immortal Duque de Bragança lá esteve? Eram directas ou indirectas? Eram indirectas E quaes foram os eleitos, quaes foram os nomeados? Foram individuos que seguiam a opinião do Imperador, ou foram individuos que seguiam a opinião contraria? O Sr. Presidente, pois então o Imperador estava no Porto, quando se tractava de uma eleição tão importante para uma Camara, era que se lhe queria negar a Regencia do Reino, a esse Homem Libertador dos Portuguezes? — Faz-se essa eleição, e sáem eleitos os homens que votaram pela opinião contraria á continuação da sua Regencia, e quer-se dizer que as eleições indirectas são eleições de corrupção? Pois então a presença do Imperador não póde corromper (no sentido do nobre Deputado) a opinião dos eleitores que estavam nessa Assemblea reunidos, e póde a corrupção entrar nos outros Collegios Eleitoraes!.. Mas qual foi o resultado que houve? O resultado foi que a essa Camara a Maioria da Nação trouxe Deputados, que sustentaram a Regencia do Imperador; felizmente para este Reino assim se resolveu nessa occasião.

Concluiu o illustre Deputado o seu Discurso pedindo á Camara que fosse coherente com a sua decisão anterior. Eu não sei para que trazer aqui sempre este argumento; eu não sei que da resolução tomada pela Camara em 17 de Abril de 1848 possa deduzir-se, que a Camara esta presa para adoptar este ou aquelle systema de eleição, (Apoiados) e parece-me que estou em bom terreno para dizer isto, porque sou um dos que sustentaram, que o artigo era constitucional. Mas, para que sustentar a preferencia da eleição directa com argumentos, que só servem para vêr se se prendem o espiritos daquelles, que não seguem a opinião do illustre Deputado?... E é tal o empenho nesta questão, que aquelles mesmos que tem sempre em despreso as opiniões do Governo, aquelles mesmos que não lhes importa se o Governo vai para a Direita, se vai para a Esquerda, se pensa deste ou daquelle modo, agora querem ligar esta Camara a que siga uma opinião, que en-

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tendem estar de accordo com o que disse o Sr. Presidente do Conselho nesta Camara!...

O Sr. Lacerda (Antonio): — Com o que disseram os 61 contra os 36.

O Orador: — Nem os 36, nem os 61 disseram nada neste ponto, e tenho a liberdade de pensar assim, como os mais a têem de pensar o contrario.

Sr. Presidente, daqui deduzo eu um argumento... E seguirei este caminho, porque estarmos a discutir se deve ser directa ou indirecta, se é constitucional ou não é constitucional um artigo da Carta, é inutil, a Camara esta cançada, já ninguem tem paciencia para ouvir; vamos a ver se respondendo a estes argumentos novos que se tem apresentado, ainda se póde dizer alguma cousa, que não esteja dita por outros Oradores, não sei o que ha de ser, e eu entendo para mim que cada um de nós tem a sua convicção formada, e que é inutil, digo mais, não é parlamentar, o tempo que estamos aqui gastando com uma questão que entendemos em nossas consciencias estar decidida... Pois o Paiz a reclamar mil providencias, e a Camara a questionar se o artigo é constitucional, ou não constitucional! E assim se gastam Sessões e Sessões, e o Paiz sempre a reclamar! Já não ha paciencia para tanto... Estejam certos os illustres Deputados que quer se decida a eleição directa, quer a indirecta, nem por isso os fundos hão de subir, nem por isso o Governo ha de ter mais credito. (Muitos apoiados); O Paiz o que quer, é uma boa Lei de eleições, e que ella se faça o mais simples que for possivel, e se possa melhor executar, para que a eleição seja o melhor que puder ser...

Uma voz: — Conforme a Carla. O Orador: — Assim nunca se ha de fazer; é necessario dizer a verdade.

Sr. Presidente, e tal a desgraça deste Paiz, que -na questão sujeita ale se quer tirar argumento das pessoas que fallam pro ou contra... Porque fallou o individuo — A — não póde a questão deixar de ser decidida desta maneira; puis se este individuo fallou assim, é porque o negocio esta assentado... Sr. Presidente, nós devemos convencer-nos de que cada um representa o que é, e nada mais. Ora a mim parece-me que não êrro se asseverar que todas, as eleições neste Reino se podem reputar indirectas, e vou explicar o meu pensamento. Em quanto eu, Sr. Presidente, vir, que para as eleições hão de influir, como não póde deixar de ser, o Cabo de Policia com o visinho de pé da porta, que depende delle; o Regedor, os Juizes Eleitos, os Escrivães, os Juizes Ordinarios, os Contractadores das rendas reaes etc. etc. que todos estes podem influir pela dependencia que delles tem a sociedade, as eleições hão-de ser indirectas, (Apoiados) e eu citarei um exemplo.

Eu já vi um Juiz de Direito, que não esta aqui, o qual querendo fazer-se Eleitor (e era a eleição directa) mandou citar pelos seus Officiaes de Justiça todas as pessoas que deviam concorrer á eleição; chamou a si todos os processos de Fazenda, e todos os processos crimes; tractou de ver quem eram os individuos que podiam ter dependencia os da Fazenda ou da Justiça, e depois de chamar a um e um perante si, disse-lhes — a Eu quero ser Eleitor, e se não votar em mim conte que o seu processo-A — em que tem de ser julgado pela Fazenda ou pela Justiça ha de ser decidido contra você.» O dito Juiz de Direito não saiu Eleitor, apesar de se pôr á porta da Igreja com os Officiaes de Justiça e Escrivão dando listas de côr, e fazendo toda a qualidade de immoralidade, e no dia seguinte mandou para a cadeia uns poucos destes individuos, a outros fez-lhes execuções; em fim foi um perseguidor de todo o Concelho. Eis-aqui as boas cousas que se conseguem das eleições dilectas.

Por consequencia não pensem Os illustres Deputados que quando as eleições forem directas, não hão de ver clamar contra ellas. Nós temos neste Paiz eleições directas e indirectas; temos as Camaras Municipaes com eleições directas; os Juizes Ordinarios, os Juizes Eleitos, e muitas outras Auctoridades, e pergunto eu, deixa por ventura de haver vicios e reclamações contra taes eleições? O que vejo e que aquelles que ficam vencidos, sempre clamam, ainda que não seja senão para tirar o salvo-conducto.

Sr. Presidente, qual e o estado de civilisação, em que esta o Paiz? E esta pergunta faço eu em resposta a Proposta que fez um illustre Deputado por Lisboa, quando quiz que só podessem votar os que soubessem lêr. Se eu tivesse a consciencia de que havia um grande numero de individuos no Paiz que soubessem lêr, eu votava pela Proposta do illustre Deputado, porque queria persuadir-me que o eleitor quando ia votar, sabia o nome da pessoa em que tinha votado; sendo tal a desgraça do Paiz, que a maior parte dos que votam, não sabem em quem votam, a não ser no seu Regedor, ou no seu amigo, ou no seu Parocho, ainda assim perguntam se lá esta na lista o seu amigo, ou o Parocho, ou o Regedor; mas se seguisse o que quer o illustre Deputado, havia de haver Concelho, aonde não houvesse mais de 3 ou 4 votos.

Sr. Presidente, eu entendo que este negocio esta sufficientemente discutido. Qualquer dos methodos tem seus inconvenientes. Eu votei que o artigo é constitucional, e todas as vezes que se alterar a Carta pelo modo que nella esta estabelecido, contem que hei-de votar pelo methodo directo, não por deixar de julgar que ambos tem inconvenientes, mas por entender, que o directo é o mais conveniente para evitar a influencia do Governo, e lá esta isto mesmo no meu Discurso de 15 ou 16 de Novembro. E, Sr. Presidente, ninguem o póde dizer melhor do que eu, que vindo em 1840 a primeira vez ao Parlamento, e lendo-se em consequencia da dissolução da Camara dos Deputados, resolvido nessas reuniões que então se faziam, e agora tanto se criminam, que os Deputados da Direita que sustentavam o Governo, voltassem outra vez, e que o Governo vigiasse pela sua eleição (e eram eleições directas, e lá entrava a influencia maligna do Governo, como se quer entender, que os recommendava para os circulos) sendo aliás no circulo, por onde me propuz a sair Deputado, que foi o de Alemquer, por elle votados tres Deputados dos que se chamavam Ministeriaes; e a Opposição tractando de trazer os seus Candidatos, e o Governo, fiel aos principios que tinha adoptado, querendo ser grato aos Deputados que nessa occasião o tinham coadjuvado nos trabalhos Parlamentares, tractando de ajudar a eleição; quer V. Ex.ª saber o resultado? Foi que eu, e o Sr. Pereira dos Reis, que não eramos protegidos pelo Governo, nem pela Opposição, atravessamos pelos dois centros, e aqui viemos; e mais alguem aproveitou com isso.

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Ora por aqui podem os illustres Deputados ver, se eu antes devia querer ou não as eleições directas, porque eu pelo systema que adoptei de votar a favor e contra os Govêrnos, conforme a minha consciencia, declaro, que se tivesse ambição de tornar a ser Deputado, a eleição directa era a que me fazia mais couta; e estou persuadido que em se fazendo os circulos pequenos, mais por aqui, ou mais por alli, algum ha de escapar pela malha.

Concluo votando contra o art. 1.º e approvo a Substituição que se apresentou, que as eleições sejam indirectas, quer dizer, conforme com o methodo estabelecido no art. 63 da Carta Constitucional. (Apoiados)

O Sr. Lacerda (D. José). — Sr. Presidente, depois do que tem dicto tantos e tão distinctos Oradores sobre a questão que se tracta, na verdade ha pouco para accrescentar; e a tal ponto e isto exacto que eu porei de parte os apontamentos que tinha tomado, e limitar-me-hei a muito pouco. Ha para isto uma outra razão que é o manifesto máo estado da minha saude: vê V. Ex.ª e é patente á Camara que mal posso fallar, e portanto não sei mesmo se esta desagradavel situação me permittirá expor o pouco, que tenho resolvido aqui apresentar.

Sr. Presidente, o que é que se discute? E o art. 1.º da Lei Eleitoral, que estabelece o methodo das eleições; mas na verdade é este o ponto que menos tem sido discutido, porque uns Oradores directamente, outros indirectamente, tem levado sempre a questão para o debate que teve logar no anno findo, isto é a constitucionalidade cru inconstitucionalidade do art. 63 da Carta.

Sr. Presidente, eu entendo que não e o que se tem feito, o que devia fazer-se; e entendo ao mesmo passo que se fez inutilmente grande dispendio de erudição, e de argumentos, porque aquella, e estes foram trazidos fóra de todo o tempo, e, até accrescentarei, de todo o logar; de todo o logar, repito, porque, ainda que o logar para similhantes questões seja a Camara, não é este agora o logar, em que a questão da constitucionalidade ou não constitucionalidade do art. 63 possa ser de novo tractada; aqui já não ha que discutir a tal respeito; a questão com respeito a esta Camara já esta resolvida, e só n'outro logar póde ser renovada. Sr. Presidente, o facto é incontestavel, a questão esta decidida, segundo a opinião de alguns Srs. Deputados — muito bem, e segundo a opinião de outros — muito mal; mas ou a Camara decidisse bem ou mal, o facto é que decidiu, e o que esta feito, está feito.

Porém a resolução desta Camara não é uma Lei, é a evasiva a que geralmente se ha recorrido. Não é uma Lei, concordo perfeitamente, e ninguem ha que não concorde. Mas essa resolução lin de ter necessariamente alguma significação, e o menos que póde significar, o menos que póde importar e, que cada um dos illustres Deputados esta na liberdade de votar, segundo julgar mais conveniente ao Paiz, ou pelo methodo directo das eleições, ou pelo methodo indirecto; e assim adhiro completamente ao que sobre este proposito acabou de observar o illustre Orador que me precedeu. Eu não sou, nem fui nunca de opinião que da resolução tomada por esta Camara na questão do art. 63 se possa tirar argumento para forçar agora a votação quer dos que sustentaram a constitucionalidade do art. 63, quer dos que sustentaram a sua não constitucionalidade (Apoiados,) Entretanto o que tenho por logico, e rigorosamente necessario, é não voltar atraz para não cair n'uma contradicção manifesta, e monstruosa qual será — que esta Camara se occupou largo tempo com uma questão, que foi resolvida em votação nominal com a maior solemnidade para não decidir cousa nenhuma! Esta conclusão seria irrisoria, de descredito para esta Camara, de todo o ponto absurda, e póde isto admittir-se? De nenhuma sorte. Mas, como acabei de dizer, se aquella resolução significa alguma cousa, e já se vê que significa, o menos que póde significar é a plena liberdade para todos, e cada um dos Membros desta Camara de dar preferencia ao methodo directo sobre o indirecto, ou a qual dos dois methodos mais lhe agradar. (Apoiado.) E se isto assim é, como tenho por sem duvida, e parece geralmente concordar-se, a que vem agora aqui de novo a questão da constitucionalidade do art. 63 da Carta Constitucional?..

Sr. Presidente, a questão que deve occupar-nos é unicamente a da preferencia do methodo: tudo o mais será excellente, mas, como visto fica, não é para aqui.

Sr. Presidente, tracta-se da preferencia do methodo eleitoral: e qual dos dois methodos conhecidos será o preferivel? Será o methodo indirecto, ou o directo? Manifestamente o directo. E porque? Porque a douctrina, e os factos concorrem a dar-lhe essa preferencia.

A douctrina é de tal sorte evidente a este respeito, que todos os illustres Deputados que tem fallado nesta questão, com excepção de um ou dois, e desses mesmos um que foi o nobre Deputado por Traz-os-Montes, concordaram que prefeririam o methodo directo se para isso gozassem de liberdade — liberdade, em que todavia julgo ter mostrado acharem-se todos os illustres Membros desta Camara. — E é tão evidente a demonstração da douctrina, que, forçando as intelligencias tão superiores de alguns dos nobres Deputados que se assentam nesta Camara, linha forçado já anteriormente a de todos os mais notaveis Publicistas, que todos são concordes em preferir o methodo directo. E nem podia deixar de ser assim, porque á evidencia não se resiste, e é de evidencia que a eleição directa é só a que produz de modo incontestavel a verdadeira Representação Nacional; e é por esta mesma razão que foi preferida em todos os Governos Constitucionaes da Europa, que todos a teem adoptado. E nem outra cousa era possivel, porque é evidente que não póde de outra sorte haver inteira segurança de que o voto nacional ha sido exprimido, e representado com verdade, nem de que não será illudido, e defraudado. E de mais quem é que póde duvidar ser este methodo o em que o Eleitor, e o Deputado tem uma verdadeira significação constitucional, por isso que ficam sujeitos a mutua responsabilidade? Se é possivel que tenha logar a verdadeira expressão do voto nacional, na hypothese do methodo indirecto, e eu concordo que é possivel, e fôra absurdo não concordar (Apoiados) comtudo os factos mostram que mais d'uma vez se tem realisado a falsificação do mandato, ficando escarnecidos os Constituintes. E que mais será preciso accrescentar? A evidencia não se demonstra, e a da verdade enunciada, e por mim sustentada, é de tal natureza, que produziu os resultados que temos visto, e

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só por isso tomam desnecessario todo o ulterior desenvolvimento.

Mas se a doctrina, como deixo evidenciado, nos leva á preferencia do methodo directo sobre o indirecto, os factos fixam de modo irrevogavel, ainda entre os mais escrupulosos, todas as opiniões a este respeito.

Que dizem os factos? Que os abusos são por ventura inevitaveis em ambos os methodos, mas que são muito mais frequentes no methodo indirecto.

Argumentou-se aqui contra esta asserção com as eleições de 1820. Mas, Sr. Presidente, as eleições de 1820 não servem de argumento pela innocencia dos tempos: se em 1820» as eleições fossem feitas pelo methodo dilecto, correriam de igual sorte. Argumentou-se igualmente com as eleições de 1838, mas tão pouco o argumento conclue: então o Paiz achava-se numa situação excepcional, e as paixões irritadas haviam de desenvolver-se de igual modo fosse qual fosse o methodo eleitoral então seguido.

Em 1820, quer a eleição fosse directa, quer fosse indirecta, havia de correr sempre tão placida como correu, porque não havia divisões de opiniões, e de parcialidades politicas, como teem tido logar posteriormente: e em 1838 havia de correr tão tempestuosa como foi, ainda que fosse feita pelo methodo indirecto, porque os Partidos exaltados tinham resolvido renovar junto da uma os combates que tinham começado a pelejar no campo da batalha. Mas ponhamos de parte esses dois factos, e lancemos os olhos ao que depois disso tem occorrido.

As de 1837, pois que não foram combatidas, não nos subministram nenhum esclarecimento. A urna foi desamparada pelo Partido Cartista, e o Partido dominante venceu as eleições em paz; triumfou sem combater. Daí para cá, temos só a examinar as eleições indirectas; e que vasta materia não apresentam ás nossas investigações! Offerecera-nos em tanta parte tantos escandalos, que de certo não póde argumentar-se com ellas para dar preferencia ao methodo indirecto.

E todavia eu concordarei com o illustre Deputado que acabou de fallar, em que não devemos estar aqui a lançar censuras sobre censuras, contra o methodo das eleições indirectas, ás quaes devemos ha tantos annos a honra de ter um assento nesta Camara. Entretanto a verdade esta antes de tudo, e nós não iremos bem, se por uma mal intendida lisonjearia, sacrificai mos a verdade a essas vãs considerações. (Apoiados) Nas eleições indriectas a possibilidade do abuso, que por uma parte salta aos olhos de todos, por outra tem sido confirmada de anno a amuo, senão em todos, de certo em muitos Circulos Eleitoraes. E eu não recordarei o exemplo de um antigo Collegio Eleitoral do Alemtejo, que citou um dos illustres Membros da Commissão, nem topouto citai el o exemplo de outro Collegio Eleitoral, que mereceu tão notavel distincção rio seu curioso Opusculo ao infeliz Principe Lichnouski; nem recordarei os escandalos de outros Collegios Eleitoraes, e materia de todos conhecida, e não preciso referir um a um cada facto particular; mas chamarei a attenção dos nobres Deputados, sobre todos elles em geral, a fim de que tirem de todos elles a inferencia, que deve tirar-se.

Esses factos provam, que sempre que um interesse poderoso actua nos Collegios Eleitoraes, e facil, formando uma opinião ficticia, attribuir aos Constituintes, senão a opinião particular dos Eleitores. E e desta maneira, que respondo ao illustre Deputado que me precedeu, o qual, respondendo tambem a outro illustre Deputado que o havia a elle precedido, fez referencia ao facto occorrido no Collegio Eleitoral do Porto. O facto tal qual foi trazido á Camara, prova a verdade da minha asserção, e da asserção daquelle illustre Deputado. Aquelle Sr. Deputado tirou argumento do -proceder do Collegio Eleitoral do Porto, na epoca a que alludiu, para provar, que muitas vezes os Collegios defraudam o voto dos Constituintes, inconveniente que não póde ter logar nunca nas eleições dilectas.

Neste sentido, e que o argumento tinha sido apresentado, e neste sentido colhe perfeitamente. Aquelles Povos tinham demonstrado que queriam para seus Representantes os homens sinceramente adherentes aos principios do immortal Dador da Carla, e não adversarios seus, e que fez o Collegio Eleitoral? Fez aquillo a que vulgarmente chamam batota (Riso) e elegeu os homens, que contrariavam a opinião do Partido dominante na segunda Capital do Reino. Os Eleitores falsificaram o voto dos seus Constituintes. (Apoiados)

Resumindo: a doutrina e os factos provam, que se deve dar preferencia ao methodo directo sobre o indirecto. A questão anterior não e para aqui.

Se pois a Camara esta em plena liberdade de escolha: se a doutrina juntamente com os factos provam que a preferencia se deve dai ao methodo directo; qual é a rasão, porque deixamos de optar pela eleição dilecta? E bastava a consideração de que se são possiveis abusos em ambos os methodos», o indirecto compendeia os abusos de um e de outro: aos abusos possiveis no primeiro grao, que são os da eleição directa, accrescem os abusos tão frequentes nos Collegios Eleitoraes, e que são exclusivos á eleição indirecta.

Este argumento é de grande força, e bastaria elle para nos decidir a approvar o art. 1.º da Lei, ou o que vale o mesmo o methodo directo. (Apoiados)

Mas eu hei de accrescentar ainda duas palavras para tomar em conta algumas observações, que foram lançadas na Camara no decurso do debate, e que não tem sido respondidas, acaso porque os illustres Membros da Commissão as julgaram menos importantes. Serei breve.

A primeira foi a de um illustre Deputado, que disse, que não via razão nenhuma sufficiente para dar preferencia ao methodo directo sobre o indirecto. De certo que assim aconteceu, porque o illustre Deputado não se collocou convenientemente para bem ver e observar o objecto de que se tracta, senão veria o illustre Deputado, que as razões, que foram já apresentadas, e que moveram os Publicistas de maior nota, a darem preferencia ao methodo directo, não era possivel que deixassem de o convencer, de que o abuso que póde ter logar nos Collegios Eleitoraes, nunca póde dar-se na eleição directa; e veria ao mesmo passo, que nesta a voz da uma e sempre a expressão genuina da vontade dos Cidadãos activos, isto é o voto nacional; e veria finalmente, que a Europa Constitucional vio muito differentemente do illustre Deputado.

Outro illustre Deputado disse que não votava pelo methodo directo, porque não queria seguir a

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meda. Mas a moda, Sr. Presidente, em questões desta natureza não é um capricho vão e pueril, a moda é, neste caso, a opinião, e a opinião é a Rainha do Mundo, ante a qual, come disse Voltaire, o Sabio que não dobrar o joelho, torna-se igual ao louco, e, como o louco, ha de ser constrangido a fazer por força o que podia fazer por vontade ou condescendencia.

Outro illustre Deputado disse que não sabia se eram sinceros os desejos dos que queriam a eleição directa.

O Sr. Deputado (não o vejo presente) pelo menos auctorisa-me a suspeitar das intenções dos que querem a eleição indirecta; mas eu não serei tão injusto para com os illustres Deputados, que partilham esta opinião, como o illustre Deputado o foi para com os que defendem a eleição directa. Somos sinceros em querer o methodo que, na nossa opinião, póde assegurar ao Paiz a eleição, que mais lhe convem, a eleição, por via da qual o voto Nacional póde ser verdadeiramente significado.

O mesuro illustre Deputado disse-que a resolução do anno passado ou significava uma interpretação, ou não significava nada — eu declaro que este dilemma é que não significa nada para mim. Será defeito meu, ou do illustre Deputado? A resolução do anno passado, com respeito á questão de que se tracta, significa o mesmo que significou a resolução da Camara com respeito no Casamento (Apoiado), á Menoridade, e á Regencia (Apoiados).

Outro Sr. Deputado recommendou á Maioria, que rejeitasse o artigo para não se desconsiderar; eu digo-lhe que o approve pela mesma razão: isto é, digo-lhe que approve a eleição directa para não se desconsiderar; e porque se desconsideraria a Maioria votando a eleição indirecta? Porque tendo-se lançado nesta Camara o argumento ad terrorem de uma proxima dissolução, no caso de se approvar a eleição directa, a Maioria mostraria que sacrificava os interesses communs ao egoismo (Apoiados), e como não quero que ella se desconsidere, não querelei que se dê um passo, donde não póde deixar de lhe vir um tal desdouro. E posto que, como se tem dicto e repelido, da approvação do principio da eleição não houvesse de seguir-se lai consequencia, porque não se tem seguido em casos analogo, e porque não e tal dissolução uma consequencia necessaria; comtudo bastava a idéa de que qualquer Deputado tinha preferido o amor da Cadeira que aqui occupa, ao que lhe dictava a razão e a consciencia, para isso lhe servir de maior descredito: o todavia tal consideração fôra de todo o ponto improcedente, porque seria sem fundamento para os illustres Membros desta Camara o temerem deixar de merecer aos Eleitores Primarios o mesmo favor, que tem merecido aos Collegios Eleitoraes.

O mesmo illustre Deputado aconselhou ao Governo a que governasse com as idéas da Maioria. — O illustre Deputado não póde nunca dar máos conselhos, e por isso eu com ella me conformo completamente; mas qual é a Maioria em questões desta natureza? Não será a Maioria dos homens illustrados e competentes para apreciarem o alcance de similhantes questões] E qual é a opinião de todos os homens mais illustrados, de todos os mais notaveis Publicistas, e da Europa Constitucional? E a eleição directa (Apoiados); regule-se pois o Governo pela Maioria verdadeiramente esclarecida, não só sobre esta questão, mas sobre todas as outras de que tem a occupar-se (Apoiados).

Outro Sr. Deputado observou — que se devia attender ás circumstancias dos Povos, o que por consequencia quando a ellas se oppunham as opiniões dos Publicistas (cuido que foi esta a força do seu argumento) deviam estas ser despresadas, e aquellas preferidas. — Sr. Presidente, este modo de argumentar é de tal modo vago e indeterminado, que ou prova muito, ou não prova nada. Quaes são essas circumstancias dos Povos? O illustre Deputado que encetou hoje a discussão, já notou, e notou bem, que se o Paiz não esta habilitado depois de 28 annos de pratica constitucional, daqui a 10 annos da mesma maneira se argumentará, e daqui a 20, e daqui a 30!... Este sofisma da opportunidade tem toda a elasticidade; e o illustre Deputado, que de certo não o empregou como sofisma, mas que leve esta lembrança, tantas vezes tem argumentado com tal força contra o sofisma da opportunidade, que eu agora, contra elle, offereço os mesmos argumentos, com que o illustre Deputado tão energicamente o tem fulminado. O que resta saber é quaes são as condições dessa opportunidade; e nem o illustre Deputado as definiu, nem é possivel a ninguem defini-las. Por tanto o argumento do illustre Deputado não prova, porque provaria demasiadamente; isto é, provaria, ou delle se poderia inferir, que o Povo nunca se achará em circumstancias de se lhe conceder o methodo eleitoral directo, que é, até por confissão do illustre Deputado, o methodo mais perfeito.

O mesmo illustre Deputado notou que em questões desta natureza era preciso estar seguro da opinião publica, mas que era ao mesmo tempo indispensavel que essa opinião constasse de modo authentico. Este argumento tem a natureza do antecedente; é nimiamente vago. Quaes são as condições da authenticidade da opinião? O que é preciso para que a opinião publica, que hoje se pertende endeuosar, tributando-lhe todos os encomios, mas que o anno passado foi aqui martyrisada em circumstancias analogas, tenha as condições que o Sr. Deputado deseja? A opinião publica, Sr. Presidente, julgo a de sobejo demonstrada a este respeito, porque a opinião publica, neste caso, não póde ser a dos homens idiotas, dos ignorantes, dos homens estranhos a tão altos assumptos; a opinião publica nestas questões, é, e não póde deixar de ser, a opinião de todos os homens, que têem destas materias o mais profundo conhecimento, dos homens que a têem estudado, e meditado longe do tumulto das paixões do momento, dos homens, cujo proveito pessoal não vai interessado em que a questão se decida por esta, ou por aquella fórma. E não esta neste caso a opinião, que ha pouco acabei de invocar? Não será esta a opinião dos Publicitas mais notaveis; e a de toda a Europa Constitucional? Sem duvida, porque á excepção da Prussia, cujo systema talvez seria (na minha opinião) preferivel, não ha nenhum outro Paiz, onde a eleição directa não seja o methodo preferido.

Outro Sr. Deputado disse — Que rejeitava o methodo directo, porque a verdade não prescreve nunca. — Este argumento suppõe a questão. Qual é a verdade neste caso? E a eleição directa ou a indirecta? É responder á questão com a questão: o que se

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discute, é em qual dos methodos esta a verdade, e o illustre Deputado não podia fazer referencia ao art. 63, porque essa questão já não era para aqui; é uma questão morta; já fóra de tempo o logar.

Sr. Presidente, não devo continuar, não me permitte o estado da minha garganta, como vê, e toda a Camara esta observando; e esta dicto de sobejo o que havia de dizer. Resumindo, compendiarei em duas palavras o que tenho expendido. A Camara esta em perfeita liberdade de escolha; póde preferir dos dois methodos o que julgar mais opportuno; é esse, pelo menos, o resultado da resolução que aqui foi tomada: a douctrina e os factos mostram que deve preferir-se a eleição directa; voto pela eleição directa. (Apoiados, muito bem)

O Sr. Pereira de Mello: — Sr. Presidente, nos termos em que vai esta discução, depois da materia ter sido tão magistralmente tractada d'um e outro lado por tão conspicuos Oradores, e por certo temeridade, e direi mais, é mesmo fatuidade o pretender enunciar idéas novas; porém eu tinha pedido a palavra, e então que lhe hei de fazer? Ceder della? De maneira nenhuma; ao menos quero motivar o meu voto. Usarei por consequencia da palavra para dar as razões do voto que hei de emittir, que para a Camara e para V. Ex.ª já não póde ser duvidoso, nem para a Nação, porque eu sou homem que já mais apostarei da Religião que uma vez professei; (Apoiados) ainda não chegou esse momento das conveniencias em que qualquer dellas me fizesse sequer trepidar; e então já se vê, que tendo eu votado pela constitucionalidade, estou perfeitamente preso, e não posso de maneira nenhuma votar senão pela eleição indirecta, porque entendo que o art. 63 involve um dogma da Religião que professei, e perante V. Ex.ª e a Camara jurei sustentar. (Apoiados, muito bem) Ao principio tomei apontamentos; mas comecei a ver que a discussão se affastava dos seus verdadeiros termos, e então deixei de os tomar: por tanto entenda V. Ex.ª e entenda a Camara, que o que eu disser, é exactamente aquillo que me dicta a minha convicção; não é filho de estudo sobre os livros, e tenho lido todos os que os Srs. Deputados que têem fallado, tambem têem lido; mas as razões sobre que apoio o meu voto, desde já digo aos nobres Deputados, hão de ser principios, e hão de ser factos contemporaneos; e tambem sei que os principios são as consequencias dos factos, mas factos já de seculos, que se converteram em opiniões, e de opiniões em principios Porém artes disso não posso resistir á tentação de observar quão deslealmente, quão pouco logicamente se houveram alguns dos nobres Deputados, que fallaram em favor do artigo, lançando-se no campo inteiramente alheio á materia que se discutia, no campo da constitucionalidade do artigo: e isto para que? Só com um fim. Os nobres Deputados, cujas luzes, cujos conhecimentos, cuja eloquencia eu reconheço, não tinham precisão de lançar mão desta arma; mas fizeram-no para assim captarem de alguma fórma a convicção da Camara, querendo fazer persuadir que todos aquelles que, tinham votado pela inconstitucionalidade do art. 63, não se podiam affastar da decisão que a Camara tinha tomado a este respeito. Mas para que é vir a este campo? Para que vieram todos esses argumentos e até os ad terrorem, e ad hominem? Porque veio para a discussão o nobre Presidente do Conselho de Ministros? Foi para inculcar à Maioria, que S. Ex.ª tinha declarado Ministerial a questão, e que aquelles que tinham votado pela inconstitucionalidade do art. 63, hoje não podiam affastar-se de maneira nenhuma de votar pela eleição directa; não se lembrando que na Acta estava a clausula corroedôra deste mesmo argumento, que o fez cair logo por terra...

Outro Sr. nobre Deputado por Viseu, o qual quando começou o seu Discurso, declarou á Camara que os Deputados que tinham fallado até então, nada tinham dito sobre o verdadeiro ponto da questão, é elle que se lança no mesmo campo, e começa a discutir a constitucionalidade do art. 63, querendo fazer vêr que a Maioria estava perfeitamente ligada pela decisão que tinha tomado o anno passado, e que já senão podia affastar de modo nenhum da eleição pelo methodo directo. E este mesmo nobre Deputado, que entre outros argumentos serviu se deste que de alguma fórma offendeu, nem podia deixar de offender o melindre de todos os Deputados que tinham votado pela constitucionalidade do artigo — que esses que assim tinham votado, queriam as eleições indirectas, porque queriam as listas carimbadas, queriam a fraude na urna, e queriam o dólo. — Mas nem isto é argumentar de homem logico, nem é proprio dos vastos conhecimentos de S. Ex.ª. Eu sinto-me forçado a fallar neste argumento, porque o quero repellir com toda a energia de que sou capaz, não só em meu nome, mas em nome de todos aquelles que abraçando o principio, temos defendido as eleições indirectas (Muitos apoiados), nós não queremos a fraude e o dólo defendendo as eleições indirectas (Apoiados) todos nós, ou a maior parte, que votámos pela constitucionalidade do art. 63 temos vindo a esta Camara por um e outro methodo de eleição. E agora pergunto, qual foi o Partido que nos deu o exemplo, pela primeira vez, de listas carimbadas? Não foi o Partido, cujos principios (não digo que os siga) quanto á maneira de eleição, defende o nobre Deputado? Não foi este Partido o primeiro que se apresentou com listas carimbadas, com a denominação de Sociedade Civica, e outras similhantes? E somos nós os Deputados que votámos pela constitucionalidade do artigo, aquelles que querem a fraude nas eleições?... Eu logo mostrarei ao nobre Deputado, que por isso mesmo que não queremos a fraude, por isso mesmo votámos pelas eleições indirectas (Apoiados).

Outro Sr. nobre Deputado por Viseu no seu Discurso defendendo a Commissão disse — a Commissão foi logica, foi sensata, não podia de maneira nenhuma separar a constitucionalidade do art. 63 da eleição directa. — Devo declarar que ninguem mais do que eu, respeita as intenções, os conhecimentos, as luzes, e a verdadeira independencia de todos os nobres Deputados, que assignaram o Parecer da Commissão; entre elles tenho até alguns Amigos intimos e antigos; e por isso, entenda-se que nem é meu caracter nunca atacar e aggredir, sem ser atacado o aggredido; nem é minha intenção querer offender individualmente qualquer dos nobres Membros, que assignaram o Parecer da Commissão; mas só vou responder ao argumento, que o nobre Deputado apresentou. Pois a Commissão e logica, é sensata, e contenta-se com uma decisão desta Camara a respeito da constitucionalidade do art. 63, que nada vale em Direito Constitucional, ao mesmo tempo que no seu Re-

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latorio declara que sente amargamente não podér destruir o art. 65, o que só depois de elle interpretado ou revogado e que se póde fazei obra completa? Pois e constitucional o artigo que estabelece uma qualificação, e não e constitucional aquelle que estabelece um preceito, qual é o art. 63? Pois e constitucional o artigo que declara uma das qualidades que deve ter o Eleitor, que ha de ir votar debaixo das regras estabelecidas pela Carta, e não é constitucional o artigo que marca o methodo da eleição, quando diz que as eleições dos Deputados hão de sei feitas pelo methodo indirecto? Não importa isto um preceito em Direito Constitucional? Em que consiste a substancia do Direito Eleitoral senão no exercicio delle?

Mas ainda aqui não esta a contradicção logica, e juridica da Commissão; pois a Commissão que deu tanto pêso á decisão tomada pela Camara, vem com um artigo no Projecto estabelecendo as eleições dilectas, e deixa ficar subsistindo o censo estabelecido na Carta para a massa dos Cidadãos? Aonde esta aqui a analogia logica, e juridica, estabelecendo a eleição directa com o censo marcado para a massa do Cidadãos? Que significa isto senão um suffragio universal? Pois a eleição directa com o censo marcado no art. 65.º da maneira que foi interpretado pela Lei, pagando cada Eleitor 1000 réis de contribuição directa, não é o suffragio universal estabelecido em Portugal? (Apoiados) Eu quero ouvir a resposta a este argumento... Já se vê pois, que a Commissão não foi tão logica, e tão ensaia, quanto pertendeu o nobre Deputado, que assim o avançou.

Agora vamos ao campo da verdadeira discussão; e oxalá que fosse elle o unico em que os nobres Deputados, que teem fallado, tivessem entrado; isto é — a preferencia das eleições directas sobre as indirectas. Vamos a principios. E veja-se que isto em mim é superabundancia, pois a Camara sabe, que ou estou ligado a votar pelas eleições indirectas, por que não quero apostar da Religião que professo, nem quebrar a Imagem que adoro. Diz-se — São os principios, é a opinião publica, a soberana do Mundo, que quer a eleição directa. — Eu começo rebatendo este principio. Cada um Paiz tem a sua opinião publica; mas esta opinião publica, este voto nacional o que é, e o que significa? Eu abraço o principio que apresentou um dos nobres Deputados, que fallou a favor do Projecto, quando disse — Que a opinião publica de um Paiz era a opinião dos homens mais esclarecidos delle — isto é, é a opinião dos homens que teem vontade, e a sabem ter, que sentem, e sabem sentir, e que sabem avaliar aquillo que votam; o justamente esta a opinião publica de um Paiz. Mas agora pergunto, não com referencia só a Portugal, mas com referencia a todo o Mundo civilisado, com referencia mesmo a esses Paizes aonde se diz, que a illustração esta no seu maior auge, pergunto — qual será a proporção que nesses Paizes haverá entre as massas que os compõem, o os homens illustrados delles? Qual será a proporção? — Quererão os nobres Deputados, que seja de um para dez, de um para sete, ou para menos ainda? Eu dou aos nobres Deputados o menos que possa ser; porque estou corto, que não podem de maneira nenhuma querer, que as massas todas sejam illustradas, como os homens mais illustrados, e mais virtuosos

de um Paiz: mas supponhamos que a proporção o de um para dez, qual será o resultado, não digo de uma eleição directa, mos do suffragio universal t O resultado ha de ser, que ha de affastar-se tanto o suffragio universal, ou a eleição directa, do verdadeiro voto nacional, quanto fôr a desigualdade, e o desproporção que ha entre as massas ignorantes, e estupidas, e os homens illustrados, o virtuosos desse Paiz, isto é, aquelles que teem vontade, e a sabem ter, que sentem, o sabem sentir, aquelles finalmente, que conhecem o bem, e o mal que fazem. Por consequencia mesmo no voto, ou suffragio universal, isto a que se chama o delicado, e o apuradinho, o caminho aberto á verdadeira Representação Nacional, dá-se perfeitamente o contrario do que se quer concluir.

Sr. Presidente, disse-se que nas eleições directas a opinião nacional ha de sobresair tanto mais, quanto menor e a distancia, que ha entre o constituido, e o constituinte; se assim necessariamente fosse, desgraçados estavam os pobres constituintes, que tem demandas, porque quasi todos seriam sacrificados pelos Advogados. — Mas o primeiro argumento que se apresenta, para mostrar que essa razão não procede, o a fallibilidade dessa mesma razão; porque o illustre Deputado não póde assegurar que o constituido não haja de representar a vontade do constituinte, nem de que elle de affasta dessa vontade, por tanto o caso começa por não haver meio disso se pode assegurar, e ahi esta a fallibilidade dessa razão. Em segundo logar pergunto, seguindo-se o methodo indirecto, o constituido não partilha as mesmas razões do interesse que tem o constituinte pelo bem do Paiz? Não tem igual desejo que elle prospere? Por tanto falha essa razão; e então para que vem dizer-se que o voto nacional ha de sei exprimido tanto melhor, quanto mais proxima se faça a eleição, entre o constituido, e o constituinte? Esta é uma razão que admitte muitas em contrario; admitte em primeiro logar a fallibilidade do cumprimento da vontade do constituinte, ficando por tanto em liberdade de poder affastar-se dessa vontade; e em segundo logar tem contra si a outra razão do que nunca por qualquer modo que elle se constitua, se deve presumir, que o constituido não partilha igual desejo ao constituinte, e por tanto jámais se affastará da vontade do constituinte. Ora estes é que são os principios.

Sr. Presidente, na confecção d'uma Lei abrem-se diante do Legislador duas estradas, que elle tem a seguir, uma e a dos principios, que é a dos factos antigos, filhos de muitos seculo, que passaram a ser convertidos em principios, e em douctrinas; e a outra vereda a seguir é a dos factos contemporaneos, acontecidos na propria nação para que se legisla. Quanto a principios acabei de demonstrar, o de rebater aquelles que se tem apresentado na discussão como os unicos; o digo-o assim, porque não ouvi outros de maior monta.

Aproveitando a occasião, direi ao illustre Deputado que acabou de fallar, que essa opinião dos Publicistas não é tão universal: ainda não ha £4 horas, que eu li duas Obras dos mais modernos, e vi que um delles, depois de dar para a direita, e para a esquerda, acabou dizendo, que seria muito para desejar, que fosse a eleição por cathegorias; diz elle, que seria esse o unico modo de fazer apparecer

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o voto nacional; e note-se, por uma razão, porque o voto nacional é o voto dos homens illustrados, dos homens virtuosos, e dos homens honestos de uma nação: e esta Auctoridade é muito insuspeita para a questão. Por isso, digo, não é tão geral a opinião dos Publicistas como o illustre Deputado a apresentou, pelo contrario os mais modernos, que são depois dos acontecimentos de França, dizem, como já referi, que a eleição seria muito para desejar que fosse por cathegorias, por ser o unico meio de fazer exprimir o voto nacional, e a razão é clara, é por que as massas ignorantes não podem nunca, em materias politicas, saber, ou conhecer o que lhes é mais util, ou mais conveniente. E quanto a Portugal direi, que se acaso se propozesse, se queriam a Inquisição, aposto que achava a maioria de votos para isso!

(Uma Voz: — Á Ordem)

O Sr. Presidente: — O Orador está na Ordem.

O Orador: — Quem é que me chama á Ordem?

O Sr. Avila: — Sou eu, (O Orador: — Não me admira) porque o Sr. Deputado disse, que a Nação Portugueza quer a Inquisição.

O Orador: — Não disse tal, ahi está como o illustre Deputado é exacto!... É justamente a honra, que eu esperava do Sr. Deputado, porque já suppunha que me não ouvisse com attenção.

O Sr. Avila: — Estimo muito, que o Sr. Deputado não dissesse tal.

O Orador: — Sr. Presidente, até agora fallei a respeito dos principios, agora vamos aos factos.

Já se vê, que o Legislador que tem de confeccionar uma Lei para um Paiz abraçando a vereda dos factos, não póde deixar de colher, ou recolher o maior numero possivel desses factos, para por elles ver, se descobre qual é exactamente o voto nacional, a fim de que nesse sentido possa fazer a Lei: é claro por tanto, que tractando-se de uma Lei de eleições para Portugal, não é possivel deixar de ír buscar esses factos. E então tractarei dos factos em geral, e procurarei tirar uma conclusão. Todos nós sabemos o que se tem passado entre nós, tanto em eleições indirectas, como em eleições directas que em umas e outras (é necessario que se diga esta verdade) se tem praticado toda a qualidade de violencias, suggestões, intrigas, mentiras, empregando-se para isso o poder, e dinheiro. Mas qual é o maior numero de eleições, nas differentes localidades, que nós temos? O maior numero de eleições é segundo o methodo directo, porque são directas as eleições Municipaes, são directas as eleições dos Juizes Eleitos, são directas as eleições de Juizes de Paz, e são directas as eleições de Juizes Ordinarios. E o que vemos nós acontecer nestas eleições?... Vemos um total despreso. Ora parece-me, que n'uma eleição destas, como é a de um Juiz Eleito, que está mais em contacto com os Povos, que bebe com o seu subalterno na taberna, que lhe deita a coima, parece-me, digo, que os povo não deviam ter maior interesse, em nenhuma outra eleição, mais do que nesta, e o que acontece? É que ninguem apparece a essa eleição. Aqui em Lisboa sei eu, que alguns desses Juizes são eleitos por sete votos, e outros por tres, e isso é porque o seu Escrivão vai votar, e pede a um ou dois seus amigos, que votem n'aquella pessoa. O mesmo acontece a respeito das Camaras Municipaes, em muitas partes não se tem feito está eleição, e tem sido necessario nomearem-se Commissões Municipaes. Qual será a rasão disto?... Qual será a causa deste abandono em eleições directas, em que senão mette entre o constituinte e o constituido nenhum outro gráo?... A causa é a que todos nós sabemos, a causa é porque nenhuma eleição se faz senão debaixo de influencias, são as influencias locaes, que fazem as eleições (Apoiados)

Sr. Presidente, a mim a experiencia de muitos annos faz-me dizer uma coisa, pela qual talvez seja notado de retrogado, e absurdo, mas lá vai, não posso deixar de dizer o que sinto (Apoiados) — não ha no Mundo civilisado eleição alguma, que não seja indirecta — esta é a minha convicção, (Apoiados) essas mesmas chamadas directas as vezes são feitas em tres, quatro e cinco gráos; (Apoiados) para que havemos de estar pregando theorias ao Povo?... Digam-lhe a verdade, e a verdade é esta. Querem saber o que é uma eleição directa. Para isso não é preciso saír desta Sala. (Prolongados apoiados)

Ora eis aqui está a rasão, porque eu não voto pela eleição directa, e porque entendo que no Mundo não ha eleição nenhuma que seja directa, isto é, sempre que os homens influentes senão pozerem em campo, que não façam juntar os seus amigos e parentes, acabou-se, não vai ninguem votar, muito principalmente em Portugal.

São estes os factos, e a elles ajuntarei um principio estabelecido pelos Publicistas em que fallou o illustre Deputado, que me precedeu. E ainda que se me metteu na cabeça que tambem sou Publicista, como agora acabo de mostrar pela opinião emittida, de que não ha eleição nenhuma directa no Mundo, que todas são feitas por influencia maior ou menor, com tudo ajuntarei, como disse, esse principio e é elle — que em todos os Paizes sufficientemente illustrados, em que as massas estão nas circumstancias de poder conhecer aquillo que é util, e aquillo que é perigoso, e de poder discriminar os homens que mais capazes sejam de promover os seus interesses — dizem todos os Publicistas, que n'um tal Paiz onde se dão estas circumstancias, se póde admitir, e deve admittir a eleição directa. Não é esta a minha opinião, e a dos Publicistas, que eu refiro em resposta ao meu nobre Amigo, a quem ha pouco alludi.

Dizem pois os Publicistas, que nas nações que tenham as circumstancias que venho de mencionar, e, segundo elles entendem, admissivel, e preferivel talvez a eleição directa, porque nos Paizes onde a illustração não se ache neste estado, onde as massas não conhecem nem podem conhecer os homens, que são capazes de defender os seus direitos, e os seus interesses, em taes Paizes, dizem os Publicistas, e sabem os nobres Deputados, que alguns destes Publicistas são Republicanos, e outros são Demagogos, repito, dizem elles, que em taes Paizes as eleições deveriam ser indirectas, porque é o meio unico de fazer com que as eleições sejam o mais aproximadas possivel do voto nacional, já que o voto nacional é a opinião dos homens illustrados, dos que estão no caso, que ha pouco apontei.

Sr. Presidente, sobre a materia que diz respeito a factos, ainda podia ir mais longe, mas a Camara esta já fatigada, e tem rasão para o estar. Entendi porém que devia dar rasão ao fundamento do meu voto. Por tanto, eu que estou convencido de que não ha

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eleições nenhumas directas, que todas se fazem por meio de influencia; eu que votei pela constitucionalidade do art. 63.º dá Carta, como poderei votar por um methodo de eleições, que não seja o indirecto. Sr. Presidente, por isso mesmo que não quero, como já disse, quebrar a Imagem que adoro, nem rasgar a bandeira que sempre segui, rejeito o art. 1.º do Projecto da Commissão, e voto pela Emenda apresentada pelo meu nobre Amigo o Sr. Deputado Corrêa Caldeira. (Apoiados) Peço á Camara toda a indulgencia, por lhe ter tomado todo este tempo (Apoiado, muito bem.)

O Sr. Abreu Castello Branco: — Peço a V. Ex.ª que consulte a Camara sobre se a materia do art. 1.º esta sufficientemente discutida.

Decidiu-se affirmativamente por 59 votos contra 21.

O Sr. Xavier da Silva: — Requeiro, que se consulte a Camara sobre se a votação da primeira parte deste art. 1.º deve ser nominal. (Apoiados)

O Sr. Avila: — Eu ha pouco pedi a palavra sobre a Ordem, e V. Ex.ª ainda m'a não deu....

O Sr. Presidente: — Eu ouvi o illustre Deputado pedir a palavra, tomei nota, porém não lhe posso agora dar a palavra sobre a Ordem.... (Apoiados)

O Sr. Avila: — V. Ex.ª póde, e deve dar-me agora a palavra sobre a Ordem....

O Sr. Presidente: — Não posso agora dar a palavra sobre a Ordem ao nobre Deputado, em quanto não estiver decidido o Requerimento que se fez para consultar a Camara sobre se a votação da primeira parte do art. 1.º, e da Emenda a ella deve ser nominal. (Muitos Apoiados)

O Sr. Avila: — Então desculpe-me V. Ex.ª, porque cuidei que já se tinha votado esse Requerimento.

Pôsto a votos o Requerimento do Sr. Xavier da Silva, decidiu a Camara, que a votação sobre a Emenda do Sr. Corrêa Caldeira, e a primeira parte do art. 1.º fosse nominal.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra sobre a Ordem o Sr. Avila.

O Sr. Avila: — Sr. Presidente, eu pedi a palavra sobre a Ordem, a fim de pedir ao nobre Deputado, que fallou em ultimo logar sobre a materia do art. 1.º, que retirasse uma frase que soou mal, e faço este pedido, fundado no nosso Regimento, porque nelle se diz que, se no calor da discussão se proferir alguma palavra mal soante, ou offensiva a algum Deputado, poder-se-ha reclamar findo que seja o Discurso; e foi precisamente por esta circumstancia, que eu exigi desde logo a palavra: o nobre Deputado usou de uma fraze, que estou certo não foi com intenção offensiva, porem a fraze usou-se, e é preciso retiral-a: o nobre Deputado disse — «Quão deslealmente andaram os nobres Deputados, que sustentaram, etc.? — Estou persuadido, que o nobre Deputado não quiz dizer, que nós andavamos deslealmente; estou persuadido que a Mesa não ouviu esta fraze, porque se a ouvisse, teria convidado o nobre Deputado a retiral-a. Ota como na occasião em que o nobre Deputado usou desta fraze, tractava de se referir á questão da constitucionalidade do art. 63.º, e como por parte da Commissão, quem tinha entrado mais nessa questão foi um Cavalheiro que não esta presente, eu entendi que era do meu dever tomar nota da fraze, e pedir ao nobre Deputado, que a retirasse, que repito, estou certo que a não empregou com intenção de offender.

O Sr. Presidente: — Declaro que não ouvi a expressão que referiu o Sr. Deputado Avila; o dado o caso que ella existisse, estou certo que ella não tem nada de offensivo, porque o Sr. Deputado a quem se attribue a frase, fallava sempre em hypothese, (Apoiados) e creio que se referiu á argumentação, e não a intenções. (Apoiados) No entretanto o Sr. Pereira de Mello tem a palavra, e melhor rectificará o que disse.

O Sr. Pereira de Mello: — Sr. Presidente, escuso de dizer á Camara aquillo que toda a Camara ouviu: eu antes que formasse os meus argumentos, tractei de fazer a mais solemne declaração do aprêço em que tinha os conhecimentos e virtudes pessoaes, que concorrem em todos os Membros que compõem a Commissão, e dos nobres Deputados que tinham, fallado em sentido contrario ao meu. (Apoiados) Não me lembro se usei da palavra — deslealmente — mas se usei, entenda V. Ex.ª e entenda a Camara que foi com referencia a argumentos, ao modo de argumentar, mas nunca ás pessoas, (Apoiados, muito bem) nem era possivel outra cousa depois da declaração que eu tinha feito: não era possivel suppôr nos nobres Deputados uma intenção desleal. (Apoiados)

O Sr. Avila: — Peço a palavra sobre a Ordem.

O Sr. Presidente: — Eu creio que este incidente esta findo depois da declaração que se acaba de fazer. (Apoiados)

O Sr. Avila: — Póde estar findo no entender de V. Ex.ª mas não no meu, porque não me dou por satisfeito com a declaração fera pelo nobre Deputado.

O Sr. Presidente. — Muito bom, tem a palavra o Sr. Avila.

O Sr. Avila: — Sr. Presidente, a frase que eu notei que o Sr. Deputado tinha empregado, foi ouvida aqui por mim, o tambem pelos nobres Deputados que se sentam deste lado, (Apoiados) o mesmo nobre Deputado não negou; entendo ouvido essa frase entendi ser do meu dever convidar o nobre Deputado á retiral-a; agora pergunto a V. Ex.ª que me diga se como Presidente desta Camara se dá por satisfeito com a explicação, que deu o nobre Deputado? Eu louvo-me em V. Ex.ª se V. Ex.ª se dá por satisfeito, eu não digo mais uma palavra a este respeito.

O Sr. Presidente: — O nobre Deputado explicou bem a intenção com que tinha fallado; não fallou com intenção da menor injuria. (Apoiados) Se houvesse injuria, de certo a Mesa não deixaria de cumprir os seus deveres, (Apoiados) porém a Meza não descobre tal circumstancia; e se este caso é um daquelles que mereça a reparação pedida, então a mesma se devia dar, quando se usa das frases — absurdo, heresia, êrro, inconveniencia — e outras que taes, que muitas vezes se têem usado, e com tudo não se julga que nellas, por argumentação, haja injuria. (Apoiados) O illustre Deputado declarou, que não se lembrava de ter usado da frase deslealmente, mas que se tal se dou, foi no caso apontado pelo mesmo Sr. Deputado com referencia a argumentação. A Camara todavia, se para ella recorre o illustre Deputado, póde decidir neste ponto, ainda que o attribuição da Meza.

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O Sr. Avila: — Estou satisfeito; não quero continuar na palavra...

O Sr. Presidente: — Tem ainda a palavra sobre este incidente o Sr. Pereira de Mello.

O Sr. Pereira de Mello: — Sr. Presidente, mais claro do que eu fallei, não e possivel fallar; eu declarei que nunca me referi, nem podia referir-me a individuos; se empreguei o termo — deslealmente — não me lembro de tal, declaro-o com toda a franqueza, mas se tal se deu, foi em relação á argumentação, foi em relação ao modo de argumentação, e não ás pessoas; porque até isso seria esquecer os principios de civilidade. (Apoiados) Por consequencia já se vê que o deslealmente é quanto á fórma, e não quanto a pessoas. (Apoiados) Se querem ouvir alguma outra Explicação daquellas que tenho por costume adoptar, estou prompto a dal-as como, e quando se quizer. (Vozes da Meza, e da Camara: — Ordem, ordem).

O Sr. Presidente: — Esta vencido por 59 votos contra 21, que a materia do art. 1.º do Projecto n.º 48, e Emendas offerecidas sobre elle, se acha sufficientemente discutida: pediu-se que a votação fosse nominal sobre a materia da Emenda do Sr. Corrêa Caldeira, e da primeira parte do art. 1.º, o que foi approvado. Estavam inscriptos sobre a materia — pro — os Srs. J. J. de Mello, Costa Lobo, Moniz, Guedes, Pessanha, Castro Ferreri, Cunha, Carlos Bento, e Avila. — contra — os Srs. Passos Pimentel, Cabral de Mesquita, Lopes Lima, Mendes de Carvalho, Silvestre Ribeiro, Pereira dos Reis, Corrêa Leal, Sousa Lobo, Faria Barbosa, Crespo, Corrêa Caldeira, Mexia, Rodrigues da Costa, Pilar, e Silva Cabral.

Fizeram uso da palavra dezóito Oradores, sendo nove a favor do artigo, e nove contra, além do Sr. Ministro da Fazenda.

Muitos Srs. Deputados pediram a palavra para Explicações. Eu faço a sua leitura para evitar contestações, quando devam ter logar as Explicações: ainda estão pois inscriptos para esse fim — pro — os Srs. Cunha, Carlos Bento, e Avila; e contra — os Srs. Cabral de Mesquita, Crespo, Faria Barbosa, Corrêa Caldeira, Mexia, Pilar, Silva Cabral, Xavier da Silva, e Corrêa Leal.

O Regimento na disposição 8.ª addicional diz, que são permittidas as Explicações, quando são de facto ou de Discurso sómente durante a discussão aos Deputados aí mencionados. Eu creio que a Camara neste objecto não quererá o maior rigor, que quererá dar mais latitude aos nobres Deputados, que, em geral, pediram a palavra para Explicações, porque a Camara ha de reconhecer a posição delicada em que estão muitos Srs. Deputados, que pediram a palavra para Explicações, (Apoiados) e julgo que será vontade da Camara deixar as Explicações para depois da votação. (Apoiados)

A primeira parte do art. 1.º do Projecto n.º 48 soffreu uma Emenda, que offereceu o Sr. Corrêa Caldeira. Segundo o Regimento deve votar-se primeiramente a Emenda. Se esta não fôr approvada, deverá fazer-se segunda votação sobre a primeira parte do artigo. Parecia me por tanto, que fazendo-se um quesito que abrangesse a disposição da primeira parte do artigo do Projecto, e a Emenda seria muito melhor para a votação (Apoiados.) Neste caso, vista a manifestação da Camara, o quesito é =:Se a eleição deve ser directa ou indirecta =? (Apoiados.) Os Senhores que pertendem que seja a directa» dizem approvo; e os Senhores que querem o contrario, isto é, que seja «indirecta» dizem rejeito (Apoiados.) Fique bem explicito; os Srs. Deputados que querem que a eleição seja «directa» dizem approvo, e os Srs. Deputados que querem que seja indirecta» dizem rejeito. Assim haverá uma votação em logar de duas (Apoiados — muito bem.)

E procedendo-se logo á votação nos termos propostos pelo Sr. Presidente, disseram

Approvo — Os Srs. Lacerda (Antonio), A. B. da Silva Cabral, A. Emilio Corrêa de Sá Brandão, A. J. d'Avila, A. M. Fontes Pereira de Mello. A. X. Palmeirim Barão de Francos Bispo Eleito de Castello Branco, Carlos Bento da Silva, O B. de Castro Ferreri, Conde de Tavarede, Francisco Antonio da Fonseca, F. Assis de Carvalho, F. J. da Costa Lobo, G. A. Franco de Castro, D. Guilherme Germano da Cunha Reis, J. José de Sousa, J. J. de Mello, J. A. d'Oliveira Cardoso, J. P. d'Almeida Pessanha, J A. Paes Villas Boas, J.Honorato Ferreira, Joaquim José Falcão, J. R. Ferreira Pontes, J. I. Guedes, Lacerda (D. José), José Maria Marques, L. José Moniz, L. Augusto Rebello da Silva, D. Marcos Pinto Soares Vaz Preto, Sebastião Corrêa de Sá Brandão, Sebastião Grim Cabreira.

Rejeito — Os Srs. A. N. da Silva Fevereiro, A. Albano da Silveira Pinto, Albano Caldeira Pinto de Albuquerque, D. Alexandre J. Botelho, A. A. Mello Castro e Abreu, A. Avellino Correa Pinto, Antonio Corrêa Caldeira, A. Ferreira da Motta, Antonio José dos Reis, Antonio Mello Borges e Castro, Antonio Pereira dos Reis, A. Do R. Faria Barbosa, A. V. Peixoto, A. X. Cerveira e Sousa, A. X. da Silva, Barão da Tôrre, Bento Cardoso Gouvêa Pereira Côrte Real, B. M. d'Oliveira Borges, C. Ribeiro d'Abranches Castello Branco, Conde de Linhares, D. M. Pereira de Barros, Eusebio Candido Cordeiro Pinheiro Furtado, E. D. Poças Falcão, Filippe José Pereira Brandão, Filippe Marcelly Pereira, F. L. Pereira da Costa Bernardes, F. de Passos d'Almeida Pimentel, H. de M. Lemos e Alvellos, João Amaro Mendes de Carvalho, J. B. da Silva Lopes, J. Chrysostomo Freire Falcão, J. Pereira Crespo, J. R. da Costa Cabral, J. de Sande Magalhães Mexia, J. Albuquerque Caldeira, J. A. Vidal da Gama, J. Elias Rodrigues da Costa, J. J. Pereira de Mello, J. José Pereira da Silveira, J. M. da Fonseca Abreu Castello Branco, José Augusto Corrêa Leal, José Bernardo da Silva Cabral, José Caldeira Pinto d'Albuquerque, José Cancio Freire de Lima, J. I. d'Andrade Nery, J. J. Lopes de Lima, J. Lourenço da Luz, José Manoel Botelho, José Maria de Sousa Lobo, José de Mello Gouvêa, José Silvestre Ribeiro, Luiz d'Almeida Menezes e Vasconcellos, Luiz Coutinho d'Albergaria Pereira, Luiz do Pilar Pereira de Castro, Miguel Antonio Francisco Sardeira, Manoel de Freitas Costa, N. Carolino Ferreira, Visconde de Castellões, Z. Teixeira Cabral de Mesquita.

O Sr. Presidente: — Esta portanto approvada a Emenda do Sr. Corrêa Caldeira por 59 votos contra 32.

Vai pôr-se á votação a segunda parte do artigo até á palavra u collectados» salva a Emenda do Sr. Lopes de Lima a este respeito; creio que a Ca-

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mara não quererá votação nominal sobre isto (Apoiados.)

O Sr. Lopes de Lima — Como não me chegou a palavra, peço que se mede quando a minha Emenda e pozer á discussão, para a sustentar.

O Sr. Presidente: — Já esteve em discussão simultaneamente com o artigo, e não póde renovar-se agora a discussão.

Posta logo a votação a

Segunda parte do art. 1.º até á palavra — collectados — foi approvada, salva a Emenda do Sr. Lopes de Lima.

Emenda do Sr. Lopes de Lima. — Rejeitada

Poz-se logo á discussão o n.º 1.º

E não havendo quem pedisse a palavra, disse

O Sr. Presidente — Os Srs. que approvam o artigo no n.º 1.º...

O Sr. Ferreira Pontes: — Sobre a Ordem...

Foi logo aprovado o n.º 1.

O Sr. Presidente — Não ha palavra sobre a Ordem, quando se esta fazendo a votação; os Srs. Deputados sabem muito bem o Regimento, e os precedentes

O Sr. Carlos Bento: — Póde caducar com a votação que houve; peço a V. Ex.ª que attenda a isto; o artigo foi rejeitado. (Vozes: — Esta approvado.)

E postos successivamente a discussão, e logo á votação por não haver quem sobre elles pedisse a palavra.

Os n.ºs 2.º e 3.º — Foram approvados.

O Sr. Avila — (Sôbre a Ordem) Sr. Presidente, eu tinha dicto que me parecia que no caso de ser rejeitada a base do art. 1.º, devia voltar o Projecto á Commissão; mas levanto-me agora para retirar o que então disse, porque me parece que nós podêmos continuar no Projecto sem que elle volte á Commissão; (Apoiados) não sei se os meus illustres Collegas da Commissão concordam todos nisto; e talvez da minha parte haja imprudencia nesta declaração, visto que não tive a honra de os ouvir a este respeito; mas ao menos dois dos illustres Cavalheiros que pertencem á Commissão, approvam o que eu digo. A Commissão tem de apresentar algumas alterações graves e importantes que devem ser impressas para serem consideradas; mas quando lá chegarmos, eu estou convencido de que a Commissão poderá ter apresentado o seu trabalho, de maneira que não seja necessario interrompei a discussão por este motivo.

Eu peço a V. Ex.ª que acceite esta declaração, e que regule em vista della os trabalhos da Camara; na certeza de que não ha necessidade nenhuma de que este Projecto volte agora á Commissão. (Apoiados)

O Sr. Presidente: — Vai continuar a discussão sobre o Projecto.

Art. 2.º u Tem igualmente direito de votar: 1.º Os Empregados do Estado, que estejam em effectivo serviço, quer jubilados, aposentados, ou reformados, quer pertençam ás Repartições extinctas, que tiverem de ordenado, soldo ou congrua, cem mil réis annuaes: não se comprehendendo as soldadas da classe de marinhagem, os salarios dos artifices, e mais empregados braçaes das diversas Repartições, nem os vencimentos das praças de pret: exceptuando os Aspirantes a Officiaes, que tiverem o vencimento de doze mil réis mensaes; os Sargentos Ajudantes, os Sargentos Quarteis-Mestres do Exercito, o os das Guardas Municipaes.»

O Sr. Avila: — Pedi a palavra para explicar o pensamento da Commissão.

Tudo o que diz respeito neste Projecto á verificação da renda pela contribuição é tirado da Legislação, que existe a este respeito. Se o censo de mil réis importasse pois o voto universal, como disse um illustre Deputado, havia muito tempo que o voto universal existia entre nós! O pensamento que a Commissão teve, foi o de arredar deste Projecto o maior numero possivel de pontos controversos. Sem offensa comtudo dos bons principios, para que a Lei podesse passar sem grandes delongas.

Se por ventura nós quizessemos alterar a base da verificação da renda estabelecida na Carta, vínhamos lançar na Camara um assumpto, que podia dar margem a discussões interminaveis. Ouvem-me muitos illustres Deputados que foram Membros do Parlamento em 1840, quando se discutiu a Lei do Censo, e que sabem o tempo que levou essa discussão: a Commissão quiz evitar, este inconveniente, e entendeu que a Camara teria o bom senso de approvar aquillo que já estava consignado na Legislação anterior, e contra que não houvesse grandes objecções. O nosso fim não era estabelecer o Suffragio Universal: eu pela minha parte declaro que o não quero: não teria medo delle na eleição indirecta, mas estamos presos pelo artigo terminante da Carta: qualquer que seja a maneira porque a Camara lenha considerado a douctrina do art. 63.º, é certo que é constitucional o artigo da Carta, que exige o rendimento para se podér gosar do direito de Eleitor. Ora se isto assim é, é evidente que não podêmos estabelecer o Suffragio Universal; mas se nos fosse concedido estabelecel-o, eu não leria difficuldade em o estabelecer, bem entendido, com a eleição indirecta, com a directa não o estabelecia ainda.

Repito, que não fizemos senão consignar o que esta em toda a Legislação anterior; e por consequencia o argumento que se apresentou contra nós — de que tinhamos estabelecido um meio de verificação da lenda muito longe do pensamento da Carta — não tem fundamento, ou então esta estabelecido ha muito tempo

Eu espero que a Camara aceitando esta declaração haja de fazer o mesmo que fez a Commissão, isto é, não discutir senão aquillo que é materia nova; aquillo que é materia consignada em todas as Leis Eleitores, seria melhor que se deixasse passar. Isto não é coarctar o direito da Camara; mas os motivos que nós tivemos para assim o julgar, parece-me que merecerão tambem a sua approvação.

O Sr. Presidente: — Não ha ninguem inscripto, vou pôr á votação o

Art. 2.º n.º 1 — foi approvado.

Poz-se á discussão o seguinte

2.ª — Os Egressos que tiverem de prestação annual cem mil íeis 5

O Sr. Ferreira Pontes: — Sr. Presidente, neste numero contem-se uma limitação, que restringe o direito eleitoral aos Egressos, que tiverem cem mil réis de prestação annual, e com quanto entenda, que aos das Ordens Mendicantes se devia dar a mesma, que aos das outras, e que em umas modicas prestações alimenticias não fôra a proposito, e antes talvez injusta uma similhante distincção; entretanto esta feita, e a Carta exige a renda liquida de cem mil réis; não posso por conseguinte exigir, que este

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direito se estenda aos que assim foram desconsiderados: porém o que pertendo, é que ao menos não sejam privados delle os das outras Ordens, a quem pelo Decreto de 28 de Maio de 1834, que extinguiu as Ordens Religiosas, foram arbitradas as prestações mensaes de doze mil réis, ou de cento e quarenta e quatro mil réis annuaes. Bem se vê pois, que a prestação legal excede muito a renda, que a Carta requer; porém como, por um abuso do Podér, estão temporariamente privados de receberem metade dos seus vencimentos por terem sido, contra todas as regras da justiça, collocados nas Classe inactivas de não consideração, podem suscitar-se duvidas a este respeito que se podem agora evitar, indo consignada na Lei uma ampliação, ou explicação a esta parte do artigo, que se discute; e que se contém no Additamento, vou manda-lo para a Mesa, e é a seguinte

Proposta. — «Que estiverem estabelecidas por Lei, ainda que temporariamente só recebam metade.?? — Ferreira Pontes.

Foi admittida.

O Sr. Presidente: — E considerado como Additamento; mas toma-se como Emenda para o fim de podér entrar simultaneamente em discussão com a materia principal.

O Sr. Avila: — Eu não acho inconveniente nenhum em que se approve a idéa do Additamento, uma vez que elle se limite a pedir, que sejam as prestações estabelecidas por Lei. O nobre Deputado deve ter em consideração, que o espirito deste artigo é precisamente consignar os vencimentos estabelecidos por Lei aos Empregados Publicos; nem se lhes consideram hoje de outro modo, deduzem-se-lhes 25, 20, e 10 por cento, e no entretanto são sempre considerados para este fim os ordenados sem essas deducções: aqui tracta-se dos vencimentos a que elles teem direito pelas Leis vigentes, as deducções que lhes teem sido feitas são transitorias, filhas das nossas desgraçadas circumstancias, e não podem prejudicar o Direito Politico. Em todas as nossas Lis anteriores assim tem sido sempre entendido.

Repito: eu não acho inconveniente em se votar o Additamento, salva a redacção, e não só para este n.º 2, mas para todo o artigo.

O Sr. Xavier da Silva: — Eu fui um tanto prevenido pelo Sr. Presidente da Commissão. Não tenho duvida de votar pelo Additamento; mas o que desejo é que se estabeleça o principio em toda a generalidade. Os Egressos que teem uma prestação de cem mil réis, com quanto estejam agora uns a 25 por cento, outros a 50, devem-se reputar os seus vencimentos para a eleição, como aquelles a que teem direito pelos seus titulos; da mesma maneira o Empregado, o Jurista, todos aquelles que estão sujeitos a impostos nos seus vencimentos. Um Jurista da Junta do Credito tem Inscripções, que lhe rendem cem mil réis; mas elle hoje recebe unicamente 65 por cento, dêm-se-lhe os cem mil réis de renda para o exercicio do direito de votar; um Empregado Publico tem o ordenado de quatrocentos mil réis; mas hoje unicamente recebe 300, não se lhe deve tirar por isso o direito de eleger, o de o elegerem.

Adoptada a idéa debaixo desta base, não tenho duvida de approvar o Additamento; e espero que a illustre Commissão consigne o principio de modo que contemple o direito de todos, e não especialmente de uma certa Classe, porque isso seria prejudicar as outras; e eu não quero que os Empregados Publicos sejam prejudicados, além de outros prejuizos que já teem, no direito de irem á urna.

O Sr. Ferreira Pontes. — Sr. Presidente, visto que se não tem impugnado o Additamento, nem o pensamento que involve, e ter o illustre Presidente da Commissão asseverado que fóra essa a mente da Commissão quando redigiu o artigo, nem podia ser outra, aliás seguir-se-ia uma violencia a outra, não póde haver duvida em se approvar; e por este modo ficam tirados os motivos e pretextos para duvidas no futuro, e se não fôr consignada expressamente na Lei esta idéa, muitos Egressos serão excluidos devotar, e dar-se-ha occasião a muitas arbitrariedades. A justiça pede que ainda que selhès não pagam por inteiro as prestações, que lhes foram affiançadas no Decreto da extincção das Ordens, e a que tem um direito sagrado, não fiquem privados de outro ainda que de menos valor, muito importante, não tanto para elles que pouca vantagem d'ahi lhes resulta, mas para a Sociedade que interessa sempre em que venham á urna homens de virtude e saber, como do ordinario são os Religiosos que passaram a maior parte da sua vida entregues ao estudo, o á pratica das virtudes christãas e religiosas.

Ainda estão na lembrança de todos os factos praticados nos recenseamentos preteritos, e para que não continuem similhantes abusos, é necessario que nesta Lei vão consignadas todas as providencias que tendam a tirar todas as ambiguidades, que, pôsto que haja as maiores cautellas, assim mesmo receio ainda continuem a praticarão; porém não serão tantas, e poderão os lesados reclamar melhor contra ellas. Por estas razões insisto, e espero que o Additamento que propoz, será approvado.

O Sr. Castro Ferreri: — Sr. Presidente, não me parece muito claro o que expendeu o illustre Presidente da Commissão Eleitoral. Diz S. Ex.ª que approva o Additamento, dizendo-se vencimentos consignados na Lei: ora o Sr. Deputado, Auctor do Additamento, quer tocar uma especialidade, e dizendo — «os vencimentos marcados por Lei.> — não consegue o que deseja: vou dar a razão.

As classes inactivas passaram a ter 50 por cento, isto foi em consequencia de uma Lei, a do Orçamento, que passou como Lei do Estado; logo, na sua grande maioria, não tem o censo para votarem; e se se disser — «valem para votar os vencimentos consignados nas Leis do Estado> — nem por isso se lhes concede cousa alguma, porque effectivamente a Lei do Orçamento que as reduziu a 50 por cento, é Lei do Estado. Se se dissesse. —. «os vencimento consignados nas Leis primitivas?? — então estavam no caso, conseguia-se o que se queria, mas desta fórma não se faz nada.

O Sr. Xavier da Silva: — Sr. Presidente, parecia-me que ora melhor, que a Commissão redigisse o artigo sobre a idéa apresentada, e que este objecto lhe fosse remettido para esse fim, como muitas vezes aqui acontece; vota-se ás vezes a idéa, e a Commissão depois consigna-a; o isto para não nos arriscarmos depois a ouvir dizer — o que a Commissão fez, não é o que a Camara votou

O mesmo exemplo que o illustre Deputado apresenta a respeito dos Egressos, dá-se a respeito dós Amnistiados. Pois o Amnistiado, porque está sujeito a muitas deducções, porque o seu vencimento é muito pequeno, não ha de ao menos computar-se na-

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quillo que te lhe prometteu, para poder usar do seu direito eleitoral?... Pois os Empregados das Repartições extinctas, que tinham um vencimento, e que depois se lhes fizeram córtes e diminuições, não hão de ter o direito de votar?... Por consequencia não vamos commetter excepções de Classes; não são só os Egressos que estão neste caso; todos que tiverem ordenado determinado por Lei tem direito de ir á urna. Voto pois no sentido da Proposta; uma vez que a illustre Commissão se comprometta a pôr esta idéa muito clara no artigo — que todos os que tiverem cem mil réis determinados por Lei, embora tenham soffrido diminuição, tem direito de ir á urna.

O Sr. Avila: — Parecia-me que me tinha explicado sufficientemente, mas -e os illustres Deputados querem mais clareza na Lei, podem mandar para a Mesa as suas Emendas, ou Additamentos, para serem depois tomadas em consideração na redacção definitiva.

Sr. Presidente, quando se extinguiram as Ordens Monasticas, no mesmo Decreto da sua extincção se determinou o subsidio ou prestação que deviam ficar recebendo os Egressos: é verdade que depois tem havido diminuições, mas essas diminuições não devem impôr ainda a perda do direito devotar. Tambem eu desejo que se consigne esta idéa bem clara no Projecto, e desejo que se não estabeleça isto só para esta Classe, quero que seja para todas; e por isso disse que as declarações que pediam os illustres Deputados, que se fizessem ao n.º 2 do art. 2.º, se deviam estender aos outros numeros. E se esta declaração não é sufficiente, peço aos illustres Deputados que mandem as suas Emendas ou Additamentos para a Mesa, para a Commissão os tomar em consideração, quando redigir definitivamente o Projecto; redacção que ainda ha de ser submettida á approvação da Camara, que a póde rejeitar, se vir que a Commissão não comprehendeu devidamente o seu pensamento.

O Sr. Pereira dou Reis: — Mando para a Mesa uma Proposta, que creio incluir todas essas idéas; porque eu tambem desejo que esta Lei seja o mais clara, e a capacidade eleitoral o mais ampla que ser possa (Apoiados).

Proposta. — «Estes vencimentos serão contados sem attenção a quaesquer deducções temporarias que possam experimentar.? — Pereira dos Reis. é

Foi admittida.

O Sr. Presidente: — É um Additamento a todas as disposições do art. 2.º ha de entrar em discussão em separado, segundo o Regimento. — lista em discussão o n.º 2, e Emendas.

O Sr. Castro Ferreri: — Posso mandar para a Mesa a minha idéa a respeito désse artigo ser reconsiderado na Commissão?

O Sr. Presidente: — Póde.

Proposta. — «Todos o Pensionistas, a quem tenha sido marcado primitivamente, por Lei, cem mil réis de renda, tem direito a votar, não obstante quaesquer reducções, que posteriormente tenham soffrido. >» — Castro Ferreri.

O Sr. Presidente: — Tem relação com o n.º 3, que ainda não esta em discussão; fica reservado para essa occasião.

E havendo-se logo a materia por discutida, disse

O Sr. Presidente: — A Proposta do Sr. Ferreira Pontes tinha sido considerada com relação ao n.º 2. A do Sr. Pereira dos Fieis é mais geral. Por tanto a boa ordem pede que se vote uma e outra cousa na mesma occasião, e senão complique agora a discussão do n.º 3. Visto que a Proposta do Sr. Pereira dos Reis comprehende todos os numeros, fica para ser votada depois do n.º 3, e nessa occasião se votará tambem a do Sr. Ferreira Pontes (Apoiados).

E pondo-se logo á votação o

N.º 2 — foi approvado.

E pondo-se á discussão o

N.º 3 — foi logo approvado.

Foi admittida a Proposta do Sr. Ferreri.

O Sr. Presidente: — Ha uma Proposta geral, e duas especiaes; por consequencia vou primeiro propôr á votação a geral. Se fôr approvada, ficam prejudicadas as duas especiaes, que estão incluidas nella (Apoiados). A geral é a do Sr. Pereira dos Reis.

Foi nestes termos approvada.

E pondo-se successivamente á discussão o

Art. 3.º e seus n.ºs 1,2, 3, 4, 5, e 6 — foram logo approvados.

O Sr. Avila (Sôbre a Ordem): — Aqui deve entrar um artigo que consigne as qualificações necessarias para ser Eleitor de Provincia; visto que foi rejeitado o art. 1.º: e então eu peço a V. Ex.ª que faça continuar a discussão dos outros artigos, que a Commissão se compromette a apresentar ámanhã o artigo que falla (Apoiados).

Poz-se á discussão o seguinte:

Art. 4.º «São habeis para ser eleitos Deputados todos os que podem ser Eleitores, e que, além disto, no ultimo Lançamento immediatamente anterior ao Recenseamento, houverem sido collectados:

1.º Em quarenta mil réis de decima de juros, fóros ou pensões, ou de quaesquer proventos de empregos de Camaras Municipaes, Misericordias, e Hospitaes.»

O Sr. Corrêa Leal: — Sr. Presidente, eu não tenho ainda bem fixada a minha opinião a respeito das habilitações para Deputado, mas não quero deixar passar o artigo sem fazer bem sciente a Camara d'uma idéa, que tenho a respeito dos Estrangeiros Naturalizados. Aqui no artigo diz. (Leu) Eu desejava que podessem ser habilitados para Deputados da Nação Portugueza não os Estrangeiros Naturalisados que tivessem 25 annos de idade, mas os que tivessem 30 annos de residencia no Paiz, sendo cazados, e tendo familia... (Vozes: — É contra a Carta) O Orador: — E contra a Carta?.. Então desisto de continuar a fallar.

O Sr. Xavier da Silva: — Mando para a Mesa uma Emenda a este art. 4.º que diz (Leu).

Ora a minha Emenda é para que se não diga — os que forem collectados — mas sim — os que tiverem pago.

Todos sabem como se fazem as cousas no nosso Paiz, por isso convem que o artigo vá deste modo, por que; a não ser assim todos se podem preparai para serem Deputados, e Eleitores; não ha nada mais facil; as Juntas do lançamento da decima e impostos annexos não duvidam a qualquer Cidadão, que se queira sujeitar a pagar 10 ou 30 mil réis de decima, assentar-lhe lá o nome, e collecta-lo nisso que elle quer, uma vez que é em proveito do Estado; agora a duvída toda esta quando se paga; e eu tenho visto, quando se tracta de eleições, como os lançamentos crescem; até acontece mais, cobranças duvidosas tornam-se certas, e os devedores instam para pagar; e ha Cidadãos tão patriotas que ate se

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encarregam de pagar por os outros. (Apoiados) Eu não quero tirar o direito de votar a cada um que estiver nestas circumstancias, só quero que seja quem tiver pago no anno anterior, por que de outra maneira não vale nada o censo. Por consequencia mando para a Mesa a seguinte

Emenda. — «Eliminem-se as palavras — que houverem sido collectados — e ponha-se em seu logar — que tenham pago.» — Xavier da Silva.

Foi admittida.

O Sr. Avila: — Sr. Presidente, eu desejo expor a Camara qual foi o pensamento da Commissão, quando redigiu este artigo; para isso é necessario ter em vista o que diz a Carta. (Leu)

A verificação da renda pela contribuição estabeleceu-se em 1840. Nessa occasião houve suspeita de que toda e qualquer ingerencia que se désse ao Governo nos recenseamentos, podia reverter em prejuizo dos Eleitores. Este pensamento tem sido consignado em todas as Leis Eleitoraes que se tem feito neste Paiz, e eu peço aos illustres Deputados que pensem e reflictam que o lançamento da decima não efeito arbitrariamente, o lançamento efeito por um Junta, a qual attende ao rendimento do collectado, e aquillo em que deve ser collectado; se o collectado vê que esta lesado, tem direito para reclamar, assim como tambem se vir que foi collectado em menos do que -devia ser, póde reclamar o que o priva do seu Direito Politico, para pagar o que lhe compete; e la esta a Junta para attender a um e outro caso. Mas diz o illustre Deputado, a Junta, reclamando o collectado para se lhe impôr maior collecta, defere sempre a reclamação; mas nesse caso a culpa e da Junta, e do Governo, que esta sufficientemente representado nessa Junta. Mas diz o illustre Deputado — assim todos querem ser collectados, para serem recenseados, mas na occasião do pagamento não querem pagar — muito bem, e quem nos assegura no caso opposto, que na occasião do pagamento haja recebedores, que de proposito não queiram receber a collecta a um ou a outro individuo para assim o impossibilitar de poder votar?

Sr. Presidente, o espirito que presidiu á redacção deste Projecto, foi eminentemente liberal, foi unicamente o da Carla: a Curta falla de renda, e não de pagamento de contribuições, e uma vez, que qual quer Cidadão Portuguez mostrar que deve ser collectado em uma certa somma, e que em virtude della lhe pertence o direito devotar, não póde ser inhibido desse direito (Apoiado).

O Sr. Silvestre Ribeiro: — Eu voto no sentido do illustre Deputado que acabou de fallar. Entendo que a Lei Eleitoral deve ser feita em conformidade com o que determina a Carta Constitucional, e não me parece coherente que esta Lei sirva para promovei o pagamento dos impostos: esse não é o ponto de vista debaixo do qual devemos encarar esta questão; devemos encara-la debaixo do ponto de vista de dar a maior latitude possivel ao Direito Eleitoral. Se não se pagam os tributos, promova-se o seu pagamento: o Governo tem meios á sua disposição para isso. e de mais, se o contribuinte não pagou, e se esse contribuinte é proprietario, lá tem a propriedade para hypotheca. Por consequencia voto inteiramente no sentido em que acabou de fallar o illustre Deputado Membro da Commissão, e rejeito a Proposta do illustre Deputado o Sr. Xavier da Silva.

O Sr. Presidente; — Tem a palavra o Sr. Xavier da Silva. (Voes: — Deu a hora).

O Sr. Xavier da Silva: — Eu digo pouco. Não duvido acceitar as reflexões do meu nobre Amigo o Sr. Deputado pela Madeira, em quanto aos Proprietarios, porque esses lá tem a propriedade, e por ella poderão pagar; mas V. Ex.ª sabe muito bem, e sabe a Camara, que tambem serve de censo a decima industrial, e é muito difficil ás vezes entrar na verdadeira analyse de qual é o rendimento de cada um dos Cidadãos, pela decima industrial. Mas, Sr. Presidente, eu entro nesta questão desapaixonadamente; não tracto só daquelles que se queiram recensear, tracto mesmo dos Governos que queiram mandar recensear, e é necessario que a Lei previna tambem esse caso. Pois como e que são formadas as Juntas do Lançamento? São compostas do Administrador do Concelho, do seu Escrivão, e do Delegado do Procurador Regio, todos de nomeação inteiramente do Governo; e então não tem o Governo na sua mão o mandar incluir no recenseamento centos e milhares de pessoas como pagando decima industrial sem effectivamente nada terem, e nada pagarem? Da mesma maneira não podem outros reclamar que sejam recenseados, figurando de capitalistas e de proprietarios, sem terem nem propriedades, nem capitaes? Sr. Presidente, eu entendo que o que devemos diligenciar, e fazer a Lei de modo que produza effeitos reaes; por consequencia é minha opinião, que é necessario ter a collecta sido paga, e que tenha sido a do ultimo lançamento. E não proponho esta Emenda como medida financeira, ainda que não teria vergonha nenhuma de a sustentar por esse lado. Pois o Cidadão quer gosar dos Direitos Politicos, e não quer carregar com os encargos da Sociedade? E Cidadão para votar e para reclamar, e não é Cidadão para pagar?, Eu julgo que a minha Emenda deve ser adoptada, e não me opponho a que se faça alguma restricção a respeito da Propriedade, se a Camara assim o entender; mas é necessario que depois se uniformise a Lei, e quando se tractar de dar o direito de votar aos Juristas e Accionistas de Companhias, deve haver uma limitação a esse respeito, porque nós sabemos muito bem como se figura de Jurista e Accionista de Companhias sem effectivamente se ser Jurista ou Accionista (Apoiados); por consequencia devemos estabelecer todas as regias, não só para que se não tire o direito áquem o tem, mas tambem para que senão conceda áquem o não tem. Por consequencia parece-me que a minha Emenda não póde ser rejeitada in limine, como quizeram propôr, mas que deve sei considerada pela Commissão; porque eu desejando tombem que haja a maior amplitude no direito de votar, não quero com tudo que se dê esse direito a quem o não tem.

O Sr. Presidente: — Deu a hora. Na primeira parte da Ordem do Dia d'amanhã ha-de-se tractar d'alguns Pareceres de Commissões, que estão sobre a Mesa, e entre elles o Parecer n.º 6 sobre o Contracto das Sete Casas; depois continua a mesma discussão, dando-se a para via aos Srs. Deputados, que a teem piara Explicações. Está levantada a Sessão. — Era mais das quatro horas.

O 1.º Redactor,

J B. GASTÃO.

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