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N.º 17. Sessão em 23 de Fevereiro 1849.

Presidencia do Sr. Rebello Cabral.

Chamada. — Presentes 66 Srs. Deputados.

Abertura — Á meia hora depois do meio dia.

Acta — Approvada.

Não houve correspondencia.

O Sr. Castro Pilar: — Sr. Presidente, pedi a palavra para mandar para a Mesa um Projecto de Lei, tendente a alterar o art. 630.º da Novissima Reforma Judiciaria, e a suscitar a Legislação antiga a respeito de execuções. Sr. Presidente, eu sou da opinião de um Judicioso Historiador (Tacito), que reputa a multiplicidade das Leis um signal de corrupção da Republica; mas ao mesmo passo estou persuadido, que uma ou outra disposição legislativa, que se ha tornado ruinosa ao bem publico, deve ser reformada, quando a utilidade publica urge, como ácerca do citado art. 630.º

Sobre este objecto circulou ha dias na Camara um Opusculo elaborado por um distincto Juiz, abalisado em conhecimentos Juridicos e Litterarios, que contém idéas mui distinctas; o qual me despertou a idéa do Projecto que apresento, que é o seguinte. (Leu.)

Peço por tanto á Commissão de Legislação, que dê quanto antes o seu Parecer sobre o Projecto, attenta a sua reconhecida importancia, declarando, que se a illustre Commissão tiver algum Projecto mais acabado, que apresentar, não duvido annuir, a que seja preferido: o que pertendo é, que se resalve o pensamento de obviar a multiplicidade de aggravos frivolos, com que no Fôro se costumam sustar as Execuções, depois de demonstrada a verdade juridica discutida nos Processos, por uma Sentença passada em Julgado.

Ficou para segunda Leitura, e se transcreverá quando a tiver.

O Sr. Crespo: — É para participar a V. Ex.ª, que o Sr. J. A. Mendes de Carvalho não compareceu á Sessão de hontem, nem comparece á de hoje, e talvez a mais algumas, por motivo de doença.

O Sr. Forjaz: — Mando para a Mesa uma Representação, que a Direcção do Banco Commercial do Porto, em desempenho da obrigação que lhe impoz a Assembléa Geral de seus Accionistas, novamente dirige á Camara, mostrando a inconveniencia e ruinosa consequencia de algumas provisões contidas no Decreto de 19 de Novembro, e Carta Regia de 26 de Dezembro de 1846, e que affectando mais ou menos os interesses geraes, prejudicam consideravelmente os deste Banco.

Sem fazer observação alguma sobre a importancia e justiça, que assiste a esta Representação, peço que, com urgencia seja remettida á Commissão de Fazenda, para a tomar na devida consideração, na revisão do Projecto de Lei n.º 100.

Mando para a Mesa outra Representação da Direcção da Sociedade de Beneficencia de Coimbra, para Asylos da Infancia Desvalida, implorando do Poder Legislativo a graça do uso gratuito do extincto Collegio de Santo Antonio da Pedreira, aonde permanece desde 1836, pagando annualmente vinte mil réis de renda.

Esta Representação vem acompanhada dos Regulamentos, Contas, e Impressos, que manifestam o movimento do Asylo, nas épocas principaes da sua existencia, o seu actual desenvolvimento, e a sollicitude, com que apesar da estreiteza dos recursos, a Direcção se esmera em levar á maior perfeição este Estabelecimento, unico nas Provincias do Norte, excepto o Porto.

Sr. Presidente, é escusado o pintar as incalculaveis vantagens das casas de Asylo da Infancia, mormente da Desvalida, pois a nada menos alcançam, que a regeneração dos costumes e moralisação das ultimas classes da Sociedade: será gloriosa tarefa para esta Camara acudir a esta bella instituição, livrando-a do onus da renda annual, a exemplo do que em 1840 se practicou com o Theatro Academico, a cuja Sociedade foi concedido o uso gratuito do extincto Collegio de S. Paulo.

Mando tambem para a Mesa 95 exemplares de um Folheto, impresso no Porto, pelo Sr. Gonçalo Lobo Pereira Caldas de Barros, sobre a formação de um Banco para garantir ao Lavrador do Douro, o preço da cultura e adubo indispensavel de seus vinhos: peço que sejam distribuidos pelos esclarecimentos que dão, filhos dos talentos, conhecimentos, e amor da Patria do meu illustre Amigo, rico Lavrador do Douro.

O Sr. Presidente: — Quanto ás Representações mandam-se extractar para seguirem os devidos termos.

Quanto á offerta dos exemplares do Folheto, creio

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que a Camara a recebe com especial agrado. (Apoiados.)

A Cantara conveiu. Os exemplares mandáram-se distribuir

O Sr. Rodrigues da Costa: — E para mandar para a Mesa uma Representação da Camara Municipal, Auctoridades Administrativas, Judiciarias, e Fiscaes, e de mais sessenta e tantos Cidadãos do Concelho, e Julgado de Angeja, Districto de Aveiro, que pedem o provimento da Cadeira de Grammatica Latina, que ha dezoito annos esta vaga, depois do fallecimento do ultimo Proprietario; e não se carecendo de medida Legislativa para satisfazer á justa pretenção da Camara, e mais individuos impetrantes, por quanto a Cadeira de que se tracta, já esta estabelecida, e só falta pô-la a concurso, e provê-la, peço que seja opportunamente remettida ao Governo, para que, ouvindo o Conselho Superior de Instrucção Publica, este a faça prover convenientemente.

Ficou para ter opportuno seguimento.

O Sr. Baptista Lopes: — Sr. Presidente, quasi no fim da Sessão do anno passado mandei para a Mesa uma Representação da Misericordia da Cidade de Lagos, pedindo um terreno para edificar o Hospital da mesma Cidade, esta Representação foi remettida á illustre Commissão de Fazenda. Mandei tambem um Projecto de Lei, que foi remettido á Commissão Ecclesiastica. Ambas estas Commissões pediram alguns esclarecimentos ao Governo, e até ao presente consta-me, que não teem vindo: por isso pedia, que se renovasse o pedido, a fim de ver, se estes objectos se podiam discutir na actual Sessão Legislativa.

Tambem offereci na Sessão do anno passado dois Projectos de Lei, que foram á illustre Commissão de Guerra: pedia igualmente a V. Ex.ª houvesse de convidar a Commissão, para que apresentasse, o mais breve possivel, os Pareceres sobre aquelles dois Projectos.

O Sr. Presidente: — Quanto aos esclarecimentos, peço ao Sr. Deputado, que queira mandar a sua nota para a Mesa para se renovar a requisição. — Quanto aos objectos affectos ás Commissões de Guerra, e Fazenda, ás quaes o Sr. Deputado fez a sua recommendação, espero que apresentarão os seus Pareceres: e por esta ocasião renovo o pedido a todas as Commissões, porque é necessario expedir Os objectos que lhes estão commettidos.

O Sr. Pereira de Mello — Sr. Presidente, ha dez annos, que tenho a honra de me sentar nesta Casa, o direi, que nunca até agora, senão sómente hoje, por infortunio, vou chamar a attenção de V. Ex.ª, e tambem da Clamara, para o objecto de que me vou occupar. No Extracto da Sessão do dia quarta feira, que appareceu hontem no Diario, vi eu, que pondo-se por extenso o Discurso de um illustre Sr. Deputado, que sustentou o artigo do Projecto em discussão, não appareceram os dos outros Deputados, que combateram esse artigo; nem se quer uma razão, uma das razões, que apresentaram. Accresce que o Discurso do nobre Deputado, que appareceu por extenso, occupava tres columnas do Diario, e não podia, de maneira nenhuma, ir para a Imprensa, se já não estivesse escripto; porque não cabia no tempo escrever-se depois da Sessão, para entrar no prelo. Não quero com isto fazer censura ao illustre Deputado, que teve o trabalho de trazer o seu Discurso escripto, para o mandar imprimir, porque tivemos o gosto, e a satisfação de ver escriptas as bellas razões que empregou; mas o que é revoltante, é que devendo haver igualdade no Extracto, não apparecesse nelle a mesma cópia das razões, que cada um dos outros Deputados produziu. Sei muito bem, que taes Extractos são feitos por um Empregado desta Casa, que esta encarregado de os mandar para a Empreza do Diario, assim como tambem sei, que esse Empregado não póde ter a constancia de recusar a um illustre Sr. Deputado um Discurso, que lhe entrega para o fazer imprimir; mas a esse Empregado deviam merecer igual consideração todos os outros Srs. Deputados; e pois que a sua incumbencia é extractar, não devia acceitar um Discurso por extenso.

Sr. Presidente, nunca eu quiz campar por Orador, nem por Sabio; nem entrei, nem aspirei a entrar nesse Congresso dos Savants, nessa reunião que ahi ha em Lisboa composta dos Savants, na qual não é permittido a todos entrar; nunca tambem me importei com as sandices, e absurdos, que já pozeram na minha bocca; entretanto importa-me a dignidade que tenho, e isto não só a meu respeito, mas de todos o, Deputados desta Casa. Portanto peço a Camara, e a V. Ex.ª que tome isto em muita consideração: porque em muitas partes hão de acreditar, que uns Deputados apresentaram bellas razões, ao passo que os outros ficaram calados, e hão de dizer, o que é descredito para nós — «Eis aqui a injustiça, com que a Camara decidiu» — porque apresentando-se ião bellas razões de um lado, do outro nada disseram. Espero pois que V. Ex.ª haja de chamar a attenção da Commissão desta Casa, encarregada de apresentar providencias a este respeito, para que abbrevie este objecto; ou que pelo menos seja vedado a qualquer Membro desta Casa o entregar ao Empregado, que esta encarregado do Extracto das Sessões, Discurso algum para ser impresso Logo que são Extractos, devem ser Extractos para todos, e não Discursos para uns, e Extractos para outros: a mim pozeram-me as primeiras, e as ultimas palavras, e por fim «Votou por isto.» Repito; espero que V. Ex.ª recommende á Commissão, para que apresente o seu Parecer, a fim de não terem mais logar injustiças, e parcialidades desta monta.

O Sr. Presidente: — A Empreza do Diario, já por muitas vezes se disse desta Cadeira, é uma Empreza particular. Não obstante ter havido muitas requisições a este respeito, a Mesa declarou, que não tinha tempo nem meios para obter a exactidão nos Extractos; é certo com tudo que se requereu uma Commissão especial para providenciar a este respeito, essa Commissão, que estava encarregada desse importante objecto, por ora ainda não apresentou o seu Parecer; e é ella composta d'alguns nobres Deputados que mais reclamações fizeram á Mesa para attender a este objecto. Agora esses Senhores tomem sobre si essa responsabilidade; e o que é muito preciso é que cada um cumpra aquillo que lhe pertence. (Apoiados)

O Sr. Fontes de Mello: — Por parte da Commissão Especial encarregada de propor algum meio para remediar a desigualdade que apparece na publicação dos Extractos no Diario do Governo, devo declarar a V. Ex.ª e á Camara que a Commissão não se tem descuidado d'esse negocio; mas ninguem

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melhor que V. Ex.ª sabe que elle offerece difficuldades — que não é de facil e prompta execução — e por isso não póde ser arguida a Commissão por não o ter ainda resolvido definitivamente. E por esta occasião devo declarar a V. Ex.ª, que eu nunca argui a Mesa pelo que diz respeito a Extractos, antes me limitei sempre a pedir-lhe que désse algumas providencias atai respeito. Ora o que é certo, e que tendo sido a Mesa auctorisada com uma certa somma para prover sobre este objecto, e isto ha mais de oito mezes, e não o lendo decidido nesse tempo, não admira que a Commissão o não tenha resolvido em quinze dias. Porém a Commissão ha de apresentar em breve o» seus trabalhos, que se não são completos, ao menos hão de concorrer alguma cousa para que nos Extractos haja mais exactidão: talvez aqui sejam presentes d'entre de dois ou tres dias.

O Sr. Presidente: — A Mesa foi auctorisada com um Credito, mas não basta só a auctorisação do Credito. (Apoiados) A Mesa não tem tido fundos nenhuns para este objecto, nem mesmo para as publicações ordinarias rio Expediente; e a tal respeito terá talvez de suscitar brevemente alguma providencia da Camara. Por consequencia que importa que a Camara votasse um Credito, se a Mesa não tinha effectivamente o dinheiro para remediar estes inconvenientes... (Apoiados)

O Sr. Lacerda (Antonio): — O nobre Deputado que primeiro fallou em Extractos, referiu-se a um Discurso, que vem publicado com mais extensão no Diario do Governo de hontem. E na verdade bastante ardua a asserção do illustre Deputado, quando disse que esse Discurso linha sido trazido escripto para a Camara; causou-me, confesso, não pequena admiração o que S. S.ª aventurou tão de leve: não seguirei o illustre Deputado para esse campo, e só lhe direi, que se á sua affirmativa eu oppozesse sómente uma negativa formal, não haveria na Camara mais rasão para acreditar um do que outro. (Apoiado) Perguntarei ao nobre Deputado, que provas teve para aventurar o que disse? (Apoiados), Viu por ventura o nobre Deputado esse Discurso escripto no tempo a que se referiu? E se não viu, para que é vir dizer aqui na Camara que este Discurso já estava escripto? (Apoiados.) Sr. Presidente, sinto deveras que se falle desta maneira em objectos destes; e sinto-o tanto mais, quando palavras inconsideradas partem d'um Amigo meu. (Apoiados)

Mas, Sr. Presidente, eu vou contar o que houve a este respeito, e conto-o com toda a lealdade e franqueza que costumo. Tendo-me mostrado sentido, porque no dia antecedente tendo eu fallado mais de um quarto de hora, apenas apparecessem no Diario quatro palavras, quatro palavras que não significavam, senão que eu tinha fallado no objecto que se discutiu, a pessoa a quem referi esta circumstancia respondeu-me, que se queria evitar que na seguinte Sessão se desse a mesma circumstancia, ella não teria duvida em me confiar as notas do extracto para eu as revêr, e foi assim, e em resultado d'isto, que o Extracto appareceu um pouco mais Extenso, e não em virtude de nenhuma outra circumstancia. Se fosse necessario invocar o testimunho d'alguem (Não é, não é) eu invocaria o dos Srs. Tachigraphos. Ora, Sr. Presidente, depois do que singellamente tenho exposto, não verá o illustre Deputado n fdta de razão das suas palavras? (Apoiados)

Agora pelo que toca a uma tal sociedade dos Savants cuja existencia ignoro; direi ao nobre Deputado, que apezar de motejada por S. S. desejaria muito pertencer-lhe, se me considerasse com meritos para isso. Se o illustre Deputado se refere a outras Sociedades, a que tenho muita honra em pertencer, só direi que ellas estão superiores a apodos; e que se muito pouco as frequento, é porque reconheço a mingoa das minhas fôrças, e pouco ou nada que com as minhas luzes posso coadjuvar os meus consócios, a quem embora como molejo chamem Savants... Sr. Presidente, não irei mais adiante neste terreno, porque elle podia tornar-se um pouco desagradavel. (Apoiados) E a mim repugna-me tal campo. Sinto, repito, que se tivessem apresentado asserções de tal ordem, (Apoiados) e que,... mais nada d:rei a este respeito»

O Sr. Pereira de Mello: — Sr. Presidente, eu pedi a palavra para dar uma Explicação, e nada mais. A susceptibilidade nesta Casa vai chegando a um gráo tal, que o Deputado quasi que se vê nas circumstancias de não poder fallar: m não disse que o nobre Deputado pertencia á Sociedade dos Savants; o que disse foi que Eu não lhe pertencia, e de dizer isto a dizer que o nobre Deputado lhe pertencia, vai uma distancia immensa. (Apoiados) Quanto aos mais notei a circumstancia da>extensão do Discurso para em vista della chamar a attenção da Camara, e da Meza, a fim de adoptar algum meio, pelo qual fizesse desapparecer uma desigualdade de similhante natureza.

O Sr. Gorjão Henriques: —;Sr. Presidente, eu pedi a palavra para repetir o que já disse n'uma occasião identica. Fui nomeado para uma Commissão Especial que deve apresentar alguns trabalhos a respeito deste objecto, porém eu votei contra essa Commissão; e votei por muitos motivos, sendo talvez o principal, o modo como esta materia se tracta nos Periodicos: desde que eu vi que já no Diario, já n'outros Jornaes os Discursos veem alli escriptos d'uma maneira mais bella que eu não ouvi nesta Casa, e acompanhados dos competentes — Repetidos apoiados, muito bem, excellentemente, apoiadas geraes, etc — (Riso) Eu, Sr. Presidente, sou homem que nunca mandei Discursos escriptos, nem Extractos, mandam-me ás vezes as notas dos meus Discursos, e como os não revejo, porque tenho pouco anímo para revêr aquillo que esta mal descripto, lá apparece no Diario da Camara a nota de que não restitui o meu Discurso.

Conheço que a respeito do objecto em questão, ha muitas difficuldades; sem grandes recursos, sem se impôr responsabilidade a quem esta encarregado deste trabalho, ou talvez sem um privilegio exclusivo, entendo que se não póde fazer nada. (Apoiados)

Os dois nobres Deputados que fazem parte da Commissão Especial, têem a seu cargo ver o que cumpre fazer a tal respeito; e, Sr. Presidente, não basta só vir aqui fazer arguições, é preciso que quem vem notar defeitos a respeito do que se faz, offereça logo os meios de remediar esses defeitos. (Apoiados) O Sr. Palmeirim: — Sr. Presidente, a Commissão das Estradas que foi nomeada este anno, constituiu-se com o numero de cinco de seus Membros, e elegeu para seu Presidente o Sr. Deputado Eusebio Candido, para Relator o Sr. Deputado Fontes de Mello, e para Secretario a mim.

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O Sr. Poças Falcão: — Pedi a palavra para mandar para a Meza um Requerimento a respeito do qual peço a urgencia; é o seguinte (Leu)

Requerimento. — «Requeiro que se peça ao Governo, pela Secretaria de Estado dos Negocios do Reino: — Os balanços e relatorios annuaes que a Companhia dos Vinhos do Alto Douro devo ter enviado ao Governo em cumprimento do art. 17 da Lei de 21 de Abril de 1843. — 2.º Os juizos do anno, que a mesma Companhia deve ler enviado na conformidade do art. 44 do respectivo Regulamento. — 3.º — O relatorio da mesma Companhia de 11 de Julho de 1813, a que se refere o Decreto de 7 de Agosto do mesmo anno.» — Poças Falcão.

Julgado urgente foi logo approvado.

O Sr. Freitas Costa: — A Commissão do Codigo Penal acha-se constituida, e nomeou para seu Presidente o Sr. Marcelly Pereira, para Secretario o Sr. Conde de Tavarede, e a mim para Relator.

O Sr. Fontes Pereira de Mello: — Ha pouco foi participado á Camara que eu tinha sido nomeado Relator da Commissão de Estradas: declaro que não tive noticia dessa eleição senão agora aqui; Sr. Presidente, o anno passado foi nomeada uma Commissão para dar o seu Parecer sobre o objecto das Estradas, esse anno tambem se nomeou, e como saissem dois de seus Membros, a Meza fez-me o favor de para ella me nomear: porém depois disso não assisti a reunião alguma que ella haja feito. Demais eu não concordo com grande parte das disposições deste Projecto, por consequencia já se vê que não posso ser Relator da Commissão, porque não hei de ser obrigado a defender um Projecto, com o qual não concordo em muitas das suas partes. Faço esta declaração á Camara, e ella a tomará na consideração devida.

O Sr. Palmeirim — Sr. Presidente, é necessario historiar á Camara o que ha relativo a esta Commissão de Estradas. O anno passado nomeou-se uma Commissão Externa, composta de certas Notabilidades, essa Commissão confeccionou os seus trabalhos, e foi apresental-os ao Governo, e o Governo apresentou-os como seus nesta Camara; nomeou-se aqui logo uma Commissão Especial para dar o seu Parecer com urgencia; com effeito esse Parecer veio, e não entrou elle em discussão por estar a Sessão muito adiantada. Este anno, por occasião de se nomearem as Commissões, foi esta Commissão das Estradas reorganisada, entraram para ella alguns Membros, novos, e sairam depois dois delles, porque foram nomeados Ministros de Estado; attendendo-se a essas vacaturas foi encarregada a Meza de as preencher, e com effeito a Meza nomeou, e foi approvado, o Sr. Deputado por Cabo Verde, e o Sr. Deputado pela Estremadura. A Commissão tinha de se constituir, havia com tudo certas especialidades que impediam a reunião de todos os Membros, porém ella devia constituir-se para nomear o Membro que devia represental-a nesta Camara, tanto mais quanto que o Projecte n. 103 já tinha sido dado para Ordem do Dia de hoje. Eu tive a honra de pertencer á Commissão o anno passado, e este anno, e convidei todos os meus Collegas, na qualidade de simples Membro da Commissão, para que nos constituissemos por ser isso de grande necessidade; mas dois illustres Deputados que são Membros da Commissão, recusaram concorrer a ella, e disseram em termos cathegoricos que não iam lá. Agora o illustre Deputado por Cabo Verde não tem razão nenhuma de se queixar deste acto de deferencia que a Commissão prestou aos seus talentos e habilidade, nomeando-o para Relator. Em fim a Commissão entrega o facto á Camara, ella decidirá o que convem fazer; mas é preciso reconhecer-se que a Commissão fica desfalcada de dois dos»eus Membros.

O Sr. Presidente: — E este um incidente que não soffre discussão A Commissão foi nomeada em todo o seu numero; senão querem comparecer, isso é outra cousa, e motivo, que influirá na apreciação do dever de cada um, mas esta ainda em Maioria para poder funccionar, e se carecer d'auxilio póde reclama-lo.

O Sr. Lopes de Lima: — Não gósto de occupar a Camara com questões pessoaes, por isso me não tenho explicado; mas sou agora chamado á autoria, e não ha remedio senão dizer duas cousas.

Sou eu um desses dois Membros que dei aquella resposta, que o illustre Deputado, Membro dessa Commissão das Estradas, acaba de mencionar; mas não tenho senão a repetir a V. Ex.ª e á Camara o que disse ao illustre Deputado: — segundo a opinião de S. S.ª, e de muitos outros em these a eleição directa é a verdadeira expressão da opinião de qualquer communidade. Ora a eleição directa desta Camara em todas as eleições de escrutinio passou-me uma patente de idiotismo para esta Sessão (Riso), até na minha propria Profissão! Avista disto eu respeitando muitissimo a opinião pronunciada da Camara, fiz desde logo tenção de me reputar inhabil para todos os trabalhos da Commissão, em quanto me não fôr levantado este anathema de incapacidade, mas levantado, já digo, por aquelle methodo de eleição, que segundo os illustres Deputados expressa a opinião das Maiorias.

Eu tive a honra de ser nomeado pela Mesa para tres Commissões, não foi só para esta; mas em consequencia desta minha determinação, declaro a V. Ex.ª que não acceito a honra que me fez a Mesa, com quanto reconheça a sua imparcialidade, pelo motivo exposto, porque não quero offender a opinião pronunciada desta Camara na sua Maioria a meu respeito — de incapaz para Membro de Commissão, até daquella Profissão que estudei toda a minha vida.

Sr. Presidente, eu estou determinado por esta Sessão a inscrever nesta Cadeira um rotulo similhante ao celebre epithafio de Piron.

Nada sou nesta Sessão.

Nem Membro de Commissão (Riso.)

Segundas leituras.

1.º D'uma Proposta de Lei, apresentada hontem pelo Sr. Ministro da Guerra sobre conservação de Batalhões Nacionaes, e mais disposições a este respeito.

2.º D'outra Proposta do Lei, igualmente apresentada hontem pelo Sr. Ministro da Guerra, sobre a fixação da Fôrça de Teria de 1849 a 1850.

Foram julgadas urgentes, approvadas para serem remettidas á Commissão de Guerra, e mandadas imprimir no Diario do Governo.

N.B. Dar-se-ha conta destas Propostas, quando entrar em discussão o Parecer sobre ellas.

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F lcndo-sc tambem o Requerimento do Sr. hsis de Carvalho (que esta transcripto na Sessão de hontem) disse

O Sr. Mimstio da Fazenda: — Sr. Presidente, eu respeito muito as intenções do illustre Deputado, e fdço-ihe a justiça de cier que não é senão com as mais puras, que elle exerce nesta Casa as funcções do seu logar, e tambem o nobre Deputado de\e fazer ao Ministro da Fazenda a justiça de que elle não quei fazer monopolio, nem segrêdo dos negocios da sua Repartição. Mas eu se tivesse sido prevenido pelo illustre Deputado ácerca cio Requerimento que S. S.a hontem apresentou nesta Casa, usando da libeidade, e da amizade com que me honra, pe-dii>-lhe-ia que o formulasse em outros termos, porque me parece que não esta consignado em nenhuma Lei escripta aquillo que o nobre Deputado pertende impôr ao Governo; e é bom que a Camara, que os Corpos Legislttivos conheçam ate onde chegam as suas attribuições, para as sepaiaiem das que pertenceu ao Governo.

Lu já disse aqui uma vez que a publicidade seria uma das condições essenciaes da minha administrarão, e hei de cumprir a promessa, e hei de sempre < onfojmar-rne com os bons costumes que achei estabelecidos na minha Repaitição a este respeito, e conformes aos desejos do illustre Deputado; mas uma cousa é condescender o Governo com estes desejos, outra

Oia o Governo tem publicado de differentes mo-clos, e em dilfeieutes tempos a Conta que o nobre Deputado pertende agora, e eu não posso ainda ser íesponsavtl por alguma falta que tenha havido dessa publicação, porque não estava auctorisado pelo meu illustre Anteeessoi para fazer a publicação do mez antecedente, sendo no ultimo desse mez que entrei no Ministerio. Quando se chegar ao principio do mez que vem, senão apparecer aquella que diz respeito ao primeiro mez da minha gerencia, então é que podeiei meiecej alguma censura, mas uma ien-sura moral, porque effectivamente não esta escripto em Lei nenhuma que o Governo publique essas Contas; tendo só a obrigação de apresentar ás Côrtes as Corrias da sua gerencia, fazendo-as primeiramente julgar pelo Tribunal de Contas.

Foi consequencia nesta conformidade espero, e até peço, que o nobre Deputado reduza o seu Requerimento a outros termos, para que o Governo satisfaça, principalmente á segunda parte, porque e aquella que naturalmente póde vir mais ao caso, e em que o Governo póde satisfazer ao illustre Deputado; quero dizei, explicai o que são esses encontros que apparecem nas Contas que S. S.ª tem visto no Diario do Governo. Se o illustre Deputado fizesse o seu Requerimento neste sentido — «Que encontros são esses que têem apparecido nas Contas mensaes, publicadas no Diario» — não havia duvida; mas impôr-lhe que explique nessas Contas de que procedem esses encontros, e o que elles são, e que publique forçosamente essas Contas no Diario do Governo, isto não esta escripto em Lei nenhuma: era preciso que o Sr. Deputado formulasse uma Proposta de maneira que, sendo adoptada, o Governo podesse ser por isso obrigado a tal publicação.

Por tanto o Requerimento parece-me que não esta no caso de ser approvado nos termos em que se acha concebido.

O Sr. Assis de Carvalho: — Eu tambem principiarei por declarai que antes de S. Ex.ª ser Ministio, já me honrava com a sua amisade, e que por sua probidade me tem merecido sempre muita confiança, mas tenho um presentimento particular e infeliz, que me faz acreditar, que não tardará muito tempo que não estejamos em opposição, e infelizmente (Riso) uma das provas d'essa infelicidade esta no que se passa na Sessão hoje. S. Ex.ª ainda ha poucos dias disse, que um dos caracteres essenciaes da sua administração seria a publicidade de Contas, (O Sr. Ministro da Fazenda: — Apoiado.) e diz-nos hoje que para ser obrigado a publicar Contas é precisa uma Lei! Pois todas as vezes que se exija nesta Camara que o Governo publique alguma determinada Conta, será preciso fazer um Projecto de Lei! Pois não fará parte da essencia do Governo Representativo a publicidade de Contas? E se na essencia do Governo Representativo esta a publicidade das Contas, como é que para dizermos ao Governo que publique Gontas, precisamos de Projectos de Lei? A essencia do Governo Representativo subentende já estas Leis. E admira-me que diga isto o Sr. Ministro da Fazenda, que ainda ha poucos dias nos disse que seria franco a este respeito, que não faria cousa alguma de que não desse conta publicamente. Em hypothese podia prescindir do meu empenho, porque estou informado de que desses bilhetes admissiveis na quarta parte não existe senão um conto, ena sexta parte senão sete contos; estão quasi extinctos. Mas o Sr. Ministro esta contrariando um principio que é da essencia do Governo Representativo, e por isso é que digo que tenho o presentimento infeliz, de que não tarda muito tempo que não esteja em opposição com S. Ex.ª

O Sr. Jeronymo José de Mello: — Sr. Presidente, eu tambem unirei o meu voto ao do illustre Deputado, Auctor do Requerimento, para render o meu culto de homenagem -á publicidade, que é a primeira condição do Governo Representativo: e, salvando a redacção do Requerimento, que ao correr da leitura não pude vêr se estará realmente conforme, adopto comtudo inteiramente o pensamento; nem me parece que S. Ex.ª o Sr. Ministro da Fazenda se possa recusar ao que se pede. Pois numa Camara que tem a Iniciativa sobre impostos, poderá negar-se qualquer meio de publicidade para se dar conta do consumo que se faz do rendimentos publicos? E será sómente esta Camara que tenha necessidade de saber isto, não será tambem o Povo de quem nós somos Representantes? Creio que toda a publicidade que se der ao consumo dos rendimentos publicos, tudo quanto fôr saber o como elles se gastam, é muito interessante, e que é cousa a que o Sr. Ministro da Fazenda e o Governo em geral, por sua dignidade, se não deve nunca negar.

Diz-se — Não ha Lei escripta.» — Ha a Lei do Justo e Honesto, que é quanto basta; mas parece-me que ha Lei escripta; parece-me que a Carta Constitucional póde obrigar a essa publicação, quando diz no art. 37.º — «Que pertence a esta Camara decretar a accusação dos Ministros» — e no art. 14-5.º $ 27.º — «Que os Empregados Publicos são strictamente responsaveis pelos abusos e ommissões que practicarem no exercicio das suas funcções, e por não faze-

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rem effectivamente responsaveis aos seus subalternos» — E não estejam os illustres Deputados surprehendidos desta citação, porque eu não sei qual foi o motivo que moveu o illustre Deputado a fazer esta Proposta; mas póde ter havido uma apprehensão muito séria no Publico sobre esses Bilhetes do Thesouro, que sendo admittidos nas Alfandegas, póde suppor-se que já não devia existir nenhum, e póde recair sobre nós uma suspeita de que não temos accusado o Ministerio por não ter apresentado essas contas... (O Sr. Ministro da Fazenda: — Mas isso é com a Camara.) O Orador: — Mas nós somos Representantes do Povo, e por consequencia devemos dar-lhe contas de tudo. Por tanto entendo, que o Ministerio por sua dignidade não deve recusar-se ao que pede o illustre Deputado, e que o Requerimento deve ser approvado, salva a redacção.

O Sr. J. J. Falcão: — Só direi duas palavras. Agradeço a S. Ex.ª o Sr. Ministro da Fazenda a allusão que fez á minha pessôa; e peço a V. Ex.ª que dê as suas ordens para se concluir a publicação das contas do tempo, em que eu estive na Administração. Quando saí em 29 de Janeiro, tinham-se publicado as contas dos cinco mezes do semestre findo, faltava o de Dezembro; e já se me havia dito que estavam promptas tambem as desse mez para irem para a Imprensa: e eu declaro á Camara que nunca ordenava quando a conta devia ir para a Imprensa, apenas recommendava que fosse logo que se acabasse de apromptar, mas tem-se publicado todas. Por consequencia peço ao Sr. Ministro da Fazenda que logo que possa, ordene que se imprimam as do que faltam, isto é as de Dezembro; e não só estas contas, mas tambem muitos documentos que dizem respeito a transacções, e transações muito importantes: agora quanto aos 29 dias de Janeiro, ha de seguir-se a mesma marcha. E isto são as contas chamadas da Thesouraria; por que ha contas de Thesouraria, e contas de gerencia; as contas de Thesouraria facilmente se pode arranjar para se publicarem, o que não acontece ás contas chamadas de gerencia.

Agora quanto aos Bilhetes das Alfandegas de que fallou o illustre Deputado, effectivamente todos os mezes tem vindo, tanto a respeito da Alfandega Grande, como das Sete Casas, esse encontro de Bilhetes designadamente; não tem vindo do Porto, por que alli não ha uma conta de caixa. Estes Bilhetes tem entrado nas Alfandegas, e tem-se publicado no Diario a sua amortisação; mas aproveito a occasião para dizer que a divida desses Bilhetes hoje póde-se considerar extincta.

Quanto aos encontros de que se falla, faz-se esta pergunta por que a palavra encontro não vem desenvolvida nas contas publicadas no Diario do Governo; mas segundo a minha reminiscencia este encontro eram contas do semestre de 1848, que dizem respeito ás contas do contracto do Tabaco.

O Sr. Ministro da Fazenda: — Eu sinto que o illustre Deputado manifestasse um sentimento pouco proprio do conceito, que eu posso merecer á Camara em presença das declarações que tenho já feito, e ás quaes não sou capaz de fallar. Eu disse uma vez e continuo a dizer, que a publicidade ha de ser uma condição essencial de toda a minha administração, e hei de cumpri-lo. Mas a questão é de methodo, e de attribuições; se o illustre Deputado tivesse feito um Requerimento pedindo francamente que o Governo mandasse á Camara tudo quanto o illustre Deputado quer que o Governo publique no Diario do Governo, eu immediatamente mandava vir todos esses documentos. Mas a que vem a Carta para aqui? A Carta não serve de argumento senão para o que eu digo. Pois quem nega ao illustre Deputado o direito que tem de pedir todos os documentos e informações, em virtude das quaes possa fazer uso do seu direito, inclusivamente o de accusar o Governo? Mesmo sem ser por esta forma, não respondi já á Interpellação que se me fez ácêrca da arrecadação dos dinheiros publicos, e da applicação que tinham tido? Sr. Presidente, todos sabem quanto é melindroso entrar o Governo nas attribuições do Corpo Legislativo, ou o Corpo Legislativo nas attribuições do Governo; e assim como o Parlamento não quer que o Governo entre nas suas attribuições, no mesmo caso está o Governo para com o Parlamento.

É preciso que se entenda bem: eu não combato o Requerimento, por não estar resolvido a publicar as contas, porque, como já disse, essa é uma condição essencial da minha administração, e por que não posso faltar ao costume louvavel que achei na minha Repartição; mas o que não acho proprio da dignidade do Governo, é deixar passar em principio — que está obrigado a uma cousa, a que Lei alguma o obriga. — Se o illustre Deputado estivesse neste logar, quereria subscrever a um Requerimento, que vai do encontro com as attribuições do Systema Representativo? O illustre Deputado se aqui estivesse, havia de oppôr-se tanto como eu a esse Requerimento.

Já disse que as contas devem ser publicadas, já o meu Antecessor publicou as do tempo da sue gerencia, e eu hei de seguir a mesma marcha, mas quero que isto seja em virtude de um costume que o Governo estabeleceu, e não imposto por obrigação, porque por ora não ha Lei, e a Camara não póde impôr ao Governo um preceito, quando não ha Lei que o obrigue a isso.

Por tanto, se o illustre Deputado quer que as contas que pertende venham á Camara, formulando o seu Requerimento nesse sentido, muito bem; e por ellas póde o illustre Deputado fazer o uso que quizer, nisso não ha duvida; mas querer que no Diario do Governo preceptivamente se publiquem contas, que se não tem publicado se não em virtude de um systema estabelecido, a isso é que o mesmo illustre Deputado se estivesse aqui, se havia de oppôr.

Concluo, que a respeito de contas não posso deixar de seguir o systema que está estabelecido, de as publicar no Diario do Governo, mas só em virtude de um systema muito louvavel adoptado pelo Governo anterior.

O Sr. Assis de Carvalho: — A questão é de attribuições, e por isso não desisto do meu Requerimento como está redigido; o meu Requerimento tem duas partes; a segunda está conforme com a idéa do Sr. Ministro, que é, que diga á Camara o que entendo por Bilhetes de encontro, e na primeira pertende, que quando o Governo publicar a Conta do mez, declare quanto fica existindo em Bilhetes admissiveis nas Alfandegas.

Agora discutindo os principios, a saber, se esta Camara tem auctorisação para exigir do Governo esta publicação, direi que pela natureza dos principios e

VOL. 2.º — FEVEREIRO – 1849.

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precedentes da Camara, o (inverno tem contrahido essa obrigação em todas as Legislaturas; quem lê os Diarios desta Camara, vê Requerimentos similhantes ao meu, em que se pede que o Governo faça publicar Contas, não só suas, mas de Repartições que lhe são subalternas, e elle tem publicado.

Em quanto a principios direi, que ha certos direitos e obrigações nos Poderes Politicos, que se subentendem pela natureza do Systema Representativo. Quando esta Camara suscita a idéa de uma obrigação que se deduz desses principios, suscita a execução de uma Lei; não precisa de uma Lei escripta para a sua execução. Neste caso esta a publicidade das Contas, e parece-me que não e da intenção do Governo querer subtrahir-se á execução de principios, que formam a dignidade do Systema Representativo; nem eu quero aggredir as attribuições do Governo, mas tambem não quero fazer declinar nem um — dx — a dignidade desta Camara. Por tanto, não desisto do meu Requerimento tal qual esta redigido; se a Camara o não quizer approvar como esta, seja rejeitado, porque não estou disposto a fazê-lo de outra maneira.

O Sr. Ministro da Fazenda: — Quando comecei a ouvir agora o illustre Deputado, julguei que a questão se dirigia mais á redacção do que áquillo de que eu estava inicialmente persuadido; mas o illustre Deputado terminou o seu Discurso de maneira, que ficamos no mesmo estado em que estavamos, ou ainda em peior situação. Se o Requerimento da illustre Deputado se reduz a querer que o Governo mande a esta Camara esses documentos, já disse que essa obrigação ninguem a contesta; o Governo e obrigado a mandaria esta Camara todos os esclarecimentos, que os illustres Deputados lhe queiram pedir, e muito mais, se é possivel, em objectos de Fazenda, porque os illustres Deputados tem em virtude do seu Mandato obrigação rigorosa de velar pela applicação, que o Governo dá aos dinheiros publicos; reconheço nos illustres Deputados esse direito, e em mim a obrigação deo satisfazer. E note-se bem, que eu não declino a obrigação moral que tenho de seguir o costume ate aqui observado de se publicarem estas Contas no Diario do Governo, não me recuso a isso; [mas realmente exigir-se como obrigação positiva que o Governo faça o que não e obrigado senão por um dever moral que se tem imposto, por um costume estabelecido, isto é que é confundir inteiramente as attribuições; e os nobres Deputados que são (como devem ser) tão zelosos pela sua dignidade, hão-de tambem querer, que o Governo seja zeloso pela sua. Se o sentido que o Sr. Deputado dá á segunda parte do seu Requerimento, é que o Governo mande aqui a explicação do que são esses encontros, eu pela minha parte sou o primeiro a pedir á Camara, que approve o Requerimento, porque nessa parte reconheço o direito que o illustre Deputado tem de o fazer; mas é que pela redacção, o que se entende é que o Sr. Deputado exige, que na Conta que apparecer no Diario, o Governo faça esta explicação, e isto é que eu pretendo impugnar: será escrupulo de mais, mas é escrupulo que me deve ser louvavel, ao mesmo tempo que eu declaro e declaro solemnemente, com a franquesa que me é propria, que não declino a obrigação moral que tenho como Ministro da Fazenda de continuar com o costume de publicar as Contas no Diario do Governo.

Por tanto se o Sr. Deputado quer, que esta explicação lhe seja remettida como Membro do Parlamento, para exercer o seu direito de Deputado; se é neste sentido que se acha redigida a segunda parte do seu Requerimento, eu desde já digo, que a Camara approvando-a approva uma cousa justa: mas em quanto á primeira parte, que se refere á Conta que se deve publicar no Diario do Governo, eu torno a dizer, que me hei-de regular em virtude do costume estabelecido, e que o hei-de seguir.

O Sr. Presidente — Ainda tem a palavra pela terceira vez o Sr. Assis de Carvalho, como Auctor do Requerimento.

O Sr. Assis de Carvalho: — É para rectificar as minhas idéas, que o Sr. Ministro da Fazenda diz que foram modificadas. Não sou eu que costumo modificar com tanta brevidade as minhas idéas, senão quando argumentos muito fortes como S. Ex.ª costuma produzir, ordinariamente me convencem do contrario; mas até agora ainda me não convenci da necessidade de modificar as minhas primeiras idéas. O meu Requerimento consta de duas partes; a primeira parte é para que o Governo nas contas que costuma publicai mensalmente, declare quanto fica existindo de Bilhetes admissiveis nas Alfandegas; a segunda é para que o Governo diga a esta Camara o que entende por Bilhetes de encontro: já se vê que na primeira parte tem logar a questão de principios, e na segunda esta S. Ex.ª d'acordo comigo, e não fui eu que modifiquei as minhas idéas, e S. Ex.ª que entende melhor a redacção do meu Requerimento... (O Sr. Ministro da Fazenda. — Não entendo, é o nobre Deputado que explica) Quando se diz — no primeiro periodo — que o Governo publique — e no segundo — que o Governo diga — entende-se que estas duas verbas tem duas significações especiaes, e dizendo eu no primeiro artigo — que o Governo publique — e no segundo — que o Governo diga — deve-se entender que ha differença entre o dizer e o publicar. Feita esta rectificação das minhas idéas que não subentende modificação, insisto pelo meu Requerimento.

E havendo se logo a materia par discutida, disse O Sr. Ministro da Fazenda (Sôbre a Ordem): — É para pedir a V. Ex.ª que depois da redificação que o illustre Deputado acaba de fazer, tenha a bondade de dividir o Requerimento em duas partes, pondo á votação a primeira, e depois a segunda modificada nos termos, porque o illustre Deputado explicou a redacção.

O Sr. Presidente: — Não sei se o Sr. Deputado quer mandar alguma Emenda para a Mesa, senão ha de se votar o que esta escripto na Proposta, dividindo-se em duas partes.

O Sr. Assis de Carvalho: — Só a Proposta em duas partes; mais nada; a primeira parte — que o Governo publique; a segunda — que o Governo diga.

Foi approvada a primeira parte por 39 votos contra 24 e successivamente approvada tambem a segunda.

O Sr. Presidente: — Passa-se á Ordem do Dia; na primeira parte tinha eu dicto que teriam logar as Explicações sobre a discussão do Projecto n.º 48 se a Camara o permitisse; consulto a Camara a este respeito.

Decidiu-se negativamente.

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O Sr. Presidente — Passa-se portanto ao Parecer n.º 6.

ORDEM DO DIA.

Continua a discussão do Parecer n.º 6.

O Sr. J. J. Falcão. — Sr. Presidente, vou continuar a ardua tarefa de que hontem principiei a occupar-me, e com bastante difficuldade em consequencia do meu estado de saude. Tinha hontem mandado para a Mesa, para se reunir ás notas que devem explicar o meu Discurso, um documento assignado por mim, em que se prova em toda a evidencia, que na somma das addições, que apparecem como Receita nos cinco Diarios do Governo, que foram citados, se tinha feito duplicação dos saldos, que passam de mez para mez, e esta duplicação, que póde ser analysada por todos que quizerem consultar aquelles cinco Diarios do Governo, sommava 390 e tantos contos de réis: se a esses 390 e tantos contos se juncta o saldo, que passa do mez de Dezembro para o mez de Janeiro, porque não é um recurso effectivo da gerencia de que se tractava, o calculador commetteu um erro acima de 400 contos de réis!... E para este êrro, que eu reclamei hontem, e reclamo hoje com a maior necessidade a attenção da Camara, para demonstrar que, calculando-se a Receita de que o Governo linha disposto, em 3:890 contos, não sómente havia o erro, que acabei de mencionar, mas havia o erro de todo o excesso que vai de 2 476 contos, incluindo o saldo para Janeiro (que é unicamente a Receita de que o Governo dispoz na sua conta de Thesouraria) a 3:890 contos: mas para demonstrar de que fórma o Orador andou para chegar a estes 3:890 contos, importa que eu desça ás addições de que esta quantia se compõe. Diz o Orador — Que desta quantia se devem deduzir 590 contos para supprimentos, e transferencias para as Provincias; — eu responderei, que desta quantia não se deve deduzir nada, porque eu quero effectivamente ser onerado com todas as quantias, que estão manifestadas na conta. A conta, na parte chamada — Despeza — manifesta já essas transferencia»; e na parte chamada — Receita — manifesta tambem as transferencias, que veem das Provincias para Lisboa, por consequencia nem quero favor, quando se tracta de Despeza, nem tão pouco admitto, que o Orador vá sommar as transferencias das Provincias com a Receita, porque as contas publicadas contéem já essas transferencias; logo todas as transferencias, que o illustre Deputado entendeu, que podia junctar á Receita que vem no Diario, são de mais. O Orador suppoz, que, além desta Rice ta, havia ainda a Receita proveniente de certas operações, que o Governo linha consummado; eu digo á Camara, que tambem não admitto isto, porque nessa conta que eu publiquei, se acha sommado o resultado dessas operações; logo toda a quantia que vai de 2:476 contos (repito-o muito altamente) ale 3.890 contos, é Receita imaginaria.

Agora passarei á outra parte desta questão, que é aquella que diz respeito a Despeza; porque o Orador exaggerou por um lado a Receita em 1:400 e tantos contos, e por outro lado teve o recurso de diminuir a Despeza; e realmente espanta, que o nobre Deputado, valendo-se da Receita que estava nos cinco Diarios do Governo, para fazer carga ao Governo, não se valesse dos mesmos Diarios para a parte da Despeza: porém quando tractou da Despeza, fez realmente o que se chama um improviso, e improviso em materia de tanta ponderação, que imporia em nada menos que tirar conclusão á distracção dos fundos publicos!... Mas para que era este improviso, para que era este triumfo, para que era esta gloria de poucas horas? Pois os proprios documentos que o Sr. Deputado apresentava, não mencionavam tambem a Despeza? Era preciso que o Sr. Deputado descesse a mostrar, que essa Despeza era falsa: assim como o Sr. Deputado se serviu dos Diarios do Governo para calcular a Receita, devia servir-se dos mesmos Diarios para calcular a Despeza; mas o que fez o Sr. Deputado? Depois de preceder este calculo de certos preparatorios do atrazo de pagamentos ás Classes activas, do atrazo de pagamento ás Classes não activas, do atrazo de pagamento dos prets do Exercito; e quando fallou do Exercito, que enthusiasmo, que compaixão, que amor lhe não mereceu este Exercito, para querer fazer suppôr, que não merecia a attenção do Governo! E eu logo mostrarei este atrazo, da maneira porque se pronunciou na Camara, da maneira porque se tractou aqui, foi tractado de uma maneira desleal, mostrando-se a medalha por um lado tão sómente, não se quiz ver o reverso da medalha. Mas torno á questão. Quando se tractava de fazer carga ao Governo com a Receita contida nos Diarios, e com aquella que se imaginou, e de que nego todas as addições que se improvisaram, devia-se fazer a comparação com a Despeza contida nos proprios Diarios, ou provar a sua falsidade. Não se fez assim; improvisou-se tambem uma Despeza arbitraria, e disse-se que o Ministerio tinha pago só tres mezes, por uma comparação que logo mostrarei, que não era exacta; e proseguindo, affirmou mais, que a Despeza publica, segundo eu tinha declarado, não sei em que Sessão, era de 540 contos mensaes; logo como o Ministro pagára só tres mezes, toda a Despeza importava em, 1:620 contos de réis. Bello calculo este para um Romance. O Governo recebeu 3:890 contos de réis, (inexacto) deduzamos desta quantia os 1:620 contos de réis, que o Governo tem despendido com a Despeza Ordinaria nestes tres mezes, faltam 2:270 contos de réis! Logo onde estão estes 2:270 contos de réis de differença!

Ora vamos de vagar com esta questão. Estou seguro, que não abuso da paciencia da Camara (Apoiados), porque tenho a sua benevolencia. Não abuso, porque não fallo só de mim, fallo tambem do Governo de que fiz parte, e seria grande falta, ainda que seja obrigado ao maior esfôrço, se não tracta-se de ir demonstrando com toda a paciencia o injustificavel modo como se vem ao Parlamento accusar, o Governo em materia tão séria, com argumentos de imaginação, possuindo os documentos. Fazendo-o assim não tracto só de mim, não tracto do Governo a que pertenci, tracto de todos os Govêrnos, que por modos analogos teem sido injustissimamente accusados. (Apoiados do banco dos Srs. Ministros.)

Tres mezes de Despeza a 510 contos, deram 1:620 contos, disse o calculador, e não tractou de mais nada.

Sr. Presidente, tenho aqui um documento, que se não chegou a publicar, e que ainda o será nos documentos Officiaes do Thesouro, que é o desenvolvi-

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mento de toda a Receita e Despeza desses seis mezes, este documento e o Resumo de toda a Despeza, que vem nesses Diarios, que o Sr. Deputado occultou, e com a qual deveria unicamente argumentar, e não o fazendo, faltou aos seus deveres, e isto importa a deshonra de quem assim procedeu, quando se provar que quiz motivar a deshonra do Governo, com dados falsos.

O Sr. Silva Cabral — Peço a V. Ex.ª que tome nota desta fraze, porque tenho de retribuir...

O Orador — Póde V. Ex.ª tomar nota: factos desta natureza tenho sentimento que me levem á vehemencia no Discurso, porem não classificarei, não darei nomes a estes factos, se bem que é necessario dar ás cousas os seus verdadeiros nomes... entretanto apresento as cousas como ellas são, e os nomes, e o que ellas significam, alguem lh'os dará. Realmente accusar-se um Governo de dilapidação dos fundos publicos, não vou muito longe quando disser, que isto causa a deshonra desse Governo, (Muitos apoiados) quando elle se não justificasse; e quando o Governo se justifica, e prova, que o modo foi desleal, e infundado, de que lado estará a honra? Ora, Sr. Presidente, para prova do que digo, mando para a Mesa, assignado por mim, o Resumo da Despeza, extraído dos documentos Officiaes, extraído dos proprios documentos de que o Sr. Deputado se serviu para a accusação do Governo.

Toda esta Despeza somma 2 410.863$000 réis, e é sobre esta Despeza, que tenho de fazer demonstrações, para destruir os improvisos do Sr. Deputado. O Sr. Deputado, querendo demonstrar a Despeza, limitou se a dizer, que se pagaram tres mezes da Despeza publica: isto dicto em abstracto traz um êrro fatal para o Orador. Se o Governo mostrar, que pagou seis mezes de pret ao Exercito, e mais de seis mezes; se mostrar que aos proprios Empregados pagou mais dos tres mezes; se o Governo provar, que acudiu ao fornecimento do Exercito durante seis mezes, se o Governo mostrar, que pagou á Guarda Municipal de Lisboa seis mezes de soldos, prets, e forragens; se o Governo provar, que acudiu ao» Estabelecimentos Pios, com prestações regulares; aos Hospitaes o mesmo — as Ferias de todos os Arsenaes, Marinhagens, etc. Tudo isto importa o complemento de seis mezes no geral. Logo calcular só tres mezes de Despeza, e por um algarismo arbitrario, é caír n'um êrro fatal, e tanto mais para admirar, porque não havia necessidade nenhuma de caír nesse êrro, porque havia os Diarios do Governo, e nesses estava a Despeza de que fallo. Mas quiz-se tirar um resultado anthmetico de um improviso, e não o resultado da verdade, e dos documentos todos. Ahi estão pois os documentos Officiaes; podem-se tirar delles todos os esclarecimentos, porque já disse que tenho a coragem de responder por tudo quanto digo. Não temo estes ataque, porque não valem nada em presença da verdade, que é só uma, e unica, (Apoiado) e por isso mando para a Mesa o Resumo de toda a Despeza, que acima declarei:

Conta das despezas de todos os Ministerios segundo os Avisos expedidos pela Thesouraria do Ministerio da Fazenda nos seis mezes de Julho a Dezembro de 1848, como Resumo das Contas publicadas nos Diarios do Governo N.ºs 190, 235, 266, 280, e 290 do anno de 1848, correspondentes aos cinco mezes de Julho a Novembro, addicionando mais a despeza de Dezembro de 1848, que se achava prompta na Thesouraria do Ministerio da Fazenda para se publicar.

[VER DIARIO ORIGINAL]

Agora passarei ao ponto do pagamento dos prets. Tractarei primeiro da maneira como aqui se quiz apresentar esta especie de pagamento ou despeza publica, fallando-se ao sentimentalismo — preveniu-se a Camara de que se ía fazer a enumeração do atrazo em que se acha o Exercito, e exclamou-se (e esta escripto no Discurso do Orador).

Á 1.ª Divisão pagou-se ultimamente a 2.ª quinzena de Setembro.

Á 2.ª dita, a 2.ª dita de Agosto.

A 3.ª a 1.ª de Dezembro.

A 4.ª a 2.ª de Novembro.

A 5.ª a 1.ª de Setembro.

Á 6.ª e 7.ª, a de Outubro

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Á 8.ª, a 1. de Agosto,

Ao enunciar-se a questão assim, parece que se quiz inculcar que esta Administração tinha levado o exercito a este atraso, escondendo-se qual era o atraso em que se estava em Janeiro de 1848, ou em Julho de 1848, que era o ponto de partida das combinações do Orador.

Este modo e artificioso, mas de verdade merecia que se comparassem as épocas; é o que eu faço lendo o estado destes pagamentos, e dos prets, comparando Julho de 1848 com Janeiro de 1849, época em que orava o meu accusador.

Em Julho de 1848 devia-se

Á 1.ª Divisão, 6 quinzenas.

Á 2.ª dita, 6 ditas.

A 3.ª » 4»

Á 4.ª » 4»

Á 5.ª » 8»

Á 6.ª » 3»

A 7.ª » 9»

Á 8.ª 10»

Na occasião em que o Orador fallava devia-se

A 1.ª Divisão 6 quinzenas.

Á 2.ª dita, 7 ditas.

Á 3.ª 4 «

A 4.ª » nenhuma.

Á 5.ª » 7 quinzenas

Á 6.ª » 4 ditas.

Á 7.ª » 6»

Á 8ª» 7»

Tinha-se pago pois, dentro de seis mezes

A 1.ª Divisão, 12 quinzenas.

Á 2.ª dita, 11 ditas

Á 3.ª 12,»

Á 4.ª «16»

A 5.ª » 13 «

Á 6.ª » 11»

Á 7.ª » 15»

Á 8.ª » 15»

Vê-se pois que, com excepção da 2.ª e 6.ª Divisões, em que houve uma quinzena por menos, e que deveria estar paga por providencias que se tinham dado nos ultimos dias, as Divisões receberam mais de seis mezes.

Sr. Presidente, o pagamento de prets mereceu sempre muita attenção ao Governo; fallo diante de muitos Collegas Governadores Civis, que darão disto testemunho.

Era necessario analysar assim estes factos, para se concluir com o artigo do Exercito, e não fazer tanta sensação. (Apoiados)

Isto é extraído de documento recebido do Ministerio da Guerra, Repartição competente: e além disso tenho aqui uma carta do Governados Civil do Algarve o Sr. Antonio Maria Couceiro, em que me dava os parabens por ter feito com que o atraso em que estava aquella Divisão se diminuisse. Por consequencia, em quanto ao atraso do pret, provei que o pret tambem entra no numero das despezas, e que se pagaram seis mezes dentro de seis mezes, e mais de seis mezes. Agora provarei que, além do maior numero de quinzenas que se pagaram dentro dos seis mezes, houve um pagamento que era de grande proveito para a Fazenda.

O Sr. Ministro da Guerra deu baixa a um grande numero de Praças, que venciam mais um vintem, porque tinham entrado com esta condição, as quaes tiveram baixa, e levaram as suas contas em dia.

Passarei agora a mostrar como se distribuiram os pagamentos ás Classes inactivas, e verei se acaso poderei provar que o Governo fez todos os esforços durante o anno economico em que estamos, para pagar um mez em cada mez; e que chegou a uma certa altura em que o não póde fazer, e por isso tentava fazer contractos. No principio do anno economico achava-se, para com as Classes activas, em começo o pagamento do mez de Março do anno de 48; o seguinte, que vou ler, é um mappa que demonstra como se fizeram os pagamentos ás Classes activas no segundo semestre de 1848, de mezes do anno de 1847 e de 1848;

Pagamento ás Classes activas dentro do semestre de Julho a Dezembro de 1848.

[VER DIARIO ORIGINAL]

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Addicionamento dos pagamentos dos mezes do anno de 1847 feitos no mesmo semestre

[VER DIARIO ORIGINAL]

Além disto tudo constar do Diario do Governo, consta tambem de um Boletim Official dos Negocios da Fazenda, onde se encontrarão estes e outros muitos factos, ou tudo quanto é Official da Fazenda: assentei que fazia nisto um serviço, porque quando sequer indagar alguma cousa da Fezenda, escusa-se de correr todos os Diarios do Governo, saltando de um para outro (Apoiados)

Vê-se pois deste Mappa, que dentro do semestre, além de mais de dois mezes que paguei de 1817, paguei de 1818 um mez em cada mez, e só em Novembro e Dezembro de 1848 é que não pode continuar: o mez de Agosto de 1818 principiei o seu pagamento em 11 de Novembro, e todo o mez de Dezembro se passou sem o podér acabar. No 1.º de Janeiro fui eu quasi demittido moralmente, porque faltando-me os meios com que contava, vi que não era possivel receber o resultado das medidas que esperava; vi tambem que se queriam levantar outras medidas para substituir estas, as quaes eu não quiz acceitar: desde esse dia fiquei isolada a um rendimento ordinario, sem poder contar com meios extraordinarios para podér continuar estes pagamentos. Logo tenho mostrado que dentro destes seis mezes, apezar das grandes difficuldades que existiam, se pagaram parte da quinzena de Março, as quinzenas de Abril, Maio, Junho, o mez de Julho, e parte de Agosto, o que tudo é mais do que seis mezes, o que se não póde dizer da receita, confundida que seja uma com a outra: eu tinha pago regularmente um mez em cada mez. O atrazo só decahiu, para mais, mez e meio; quem quizer ter a paciencia de calcular os annuncios publicos, e o que se acha nas Peças Officiaes, verá que isto é exacto; e a razão foi porque me faltaram os meios; eu tinha contado com um Contracto, e o Contracto não foi avante; apresentaram-se-me outros meios, porém eu não os quiz acceitar: desejarei que estes meios dêem força ao novo Ministro da Fazenda para poder viver, e acudir ás despezas a que esta obrigado. Por consequencia mostrei nestas poucas ou muitas cousas que tenho dito, que o atrazo dos pagamentos foi mal calculado, mesmo a respeito dos Empregados; que das maiores despezas publicas se pagaram seis mezes, e mais de seis mezes, dentro de seis mezes; e que só ficaram em atrazo relativamente mez e meio mais do que aquillo que eu desejava pagar, os Empregados, os ordenados e soldos de Classes Activas. Por consequencia não ha as duas asserções, pelas quaes o illustre Deputado quiz fazer imputação ao Governo, o excesso da receita por um lado, e por outro a falha de pagamentos; o que não teria acontecido, se o Orador se tivesse dado á paciencia de calcular, e não despresasse as Peças Officiaes, algumas das quaes lhe serviram para o que lhe fez conta.

Mas, continuando, o Orador esforçou-se para querer achar aonde tinham sido consumidos 2.200 contos imaginarios; e nos seus calculos concedeu que o Governo tivesse feito algumas remessas para Londres para pagar aos Officiaes da Guerra Peninsular, e outras que quiz generosamente conceder, para minorar a triste situação do Ministerio. Já disse que taes concessões são nullas para o calculo que apresento officialmente, porque todas as remessas para Londres, e o mais de que se lembrar o nobre Orador que fôr verdade, lá se achará na mesma despeza; por consequencia rejeito a concessão. Feita a concessão, diz o Orador, faltam 1:850 contos, ou seis milhões, como os milhões estivessem reduzidos actualmente a 300 contos, ou serão milhões estrangeiros; destes e de outros êrros estão cheios os calculos do Orador.

Como ia dizendo, o nobre Deputado fez toda a qualidade de diligencia para achar o desvio e a distracção destes 1:850 contos, e por mais que se esforçasse, vendo que o não podia encontrar, foi buscar 19!. contos de réis que o Governo tinha distrahido para pagar as dividas do Exercito de operações, commandado pelo Marechal Saldanha, nobre Presidente do Conselho de Ministros; foi buscar a 7.ª Companhia da Guarda Municipal de Lisboa; foi buscar um excesso de despeza á Policia Preventiva, e acabou na despeza do Retrato; o que tudo sommava 100 contos de réis. Ora, de pois de todos estes favores, que rejeito, e computadas todas estas despezas, que tambem rejeito, porque as despezas lá estão todas na minha conta, por esta poesia e concessões se vê que faltam 400 contos! É verdade que se fez esta liquidação de conta ao Exercito de operações; mas isto é uma liquidação que se faz, como todas as outras; é uma requisição do Ministerio da Guerra, requerendo os meios para se pagar; ora a negativa a esta requisição importava, de qualquer maneira, uma fraude, o que era um acto improprio do Governo, e que não esta nos costumes; porque depois de se ter consumido, no fim da Guerra o dinheiro dos particulares, os generos e os cereaes, havia de se lhe negar um meio qualquer de pagamento? Pois houve quem assim o entendesse, e que viesse exaggerar esta despeza dizendo, que o Governo tinha gasto mais de 196 contos, e eu posso dizer a V. Ex.ª e á Camara, que não chegou a 10 contos o que effectivamente se pagou a dinheiro; porque, tendo estabelecido uma prestação de 5 contos mensaes, não cheguei a completar dois mezes de pagamento, e não estaria o Governo auctorisado para isto, uma vez que a receita anterior era para pagar divida anterior? O mais que se fez,

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foi representar esses creditos por escriptos, que é uma especie de liquidação. O Governo tinha divida anterior a receber, e devia pagar esses escriptos, e quando visse que não tinha meios, o Parlamento devia providenciar. Ora não chegando a 10 contos o que se pagou a dinheiro, não se diga que esse acto veio diminuir os meios existentes para outros pagamentos, o que é falso, Era uma divida sagrada, que devia sei satisfeita immediatamente. E este Parlamento não é um Parlamento fraudulento que negasse a sua sancção a dividas contrahidas para fins e por motivos de defeza do Throno e das Instituições, pelas quaes elle existe. De certo que não.

Sr. Presidente, o meu fim todo é provar que esta liquidação, contra a qual se tem dito tantas cousas, não veio trazer atrazo nenhum, porque della apenas se pagaram 9 ou 10 contos. Mas diz-se, que o Sr. Franzini tinha tido uma resistencia muito grande, para annuir a esta liquidação dos fornecimentos do Exercito, com o nobre Marechal, e que tinha resistido a este pagamento. Não tenho presente o Diario do Governo aonde vem a Portaria do Sr. Franzini; isto disse-se na Camara, mas os Documentos Officiaes provam o contrario, e a Camara dirá se acredita o Orador, se os Documentos. Como achei o Diario do Governo, que ha pouco citei, pela leitura que vou fazer verá a Camara o que é, que o Sr. Franzini negou; é o Diario N.º 241, do anno de 1847 (Leu).

Hontem pois este Diario a Portaria de 13 de Outubro de 1847, do Sr. Franzini, na qual se ordena aos Contractadores do Tabaco, que entreguem, para pagamento destas despezas, o producto do papel sellado. Effectivamente quando eu entrei para o Ministerio, devia pagar mensalmente 7 contos pelo producto do Papel Sellado para aquelle destino: parece-me, que ainda se pagaram a estes credores por este modo duas mesadas, depois que entrei na Administração; mas peorando as circumstancias, e tendo rebentado a Revolução de França, facto que logo me privou de qualquer meio de contractar, foi forçoso lançar mão dos meios mais promptos, e fui eu, é forçoso que se falle a verdade, que suspendi, contra minha vontade, e debaixo de promessas, que daria outro modo de pagamento, que pedi aos credores o favor de esperarem. As Camaras fecharam-se em Agosto, pediu-se o cumprimento desta obrigação, e mediante requisições do Ministro competente, que liquidou a divida, estabeleci o meio de pagamento suave e temporario.

Ora aqui tem a Camara o grande crime, o horroroso attentado commettido pelo Ministro da Fazenda, a que todos os Ministerios se tinham negado, cuja differença de dinheiro nesta verba não foi mais de 7 a 8 contos de réis. Fallou o Orador tambem em certo pagamento na importando de 76 contos de réis, de dividas de 43 a 45. E uma asserção em abstracto, qualquer que seja a especie lá deve estar nas minhas contas, e estou prompto a dar explicações, logo que se precise, sobre a despeza de que se tracta; mas desde já digo, que os 76 contos devem ser vistos pelo mesmo prisma, que foi vista a certeza dos outros calculos; porque não ha similhante quantia de dividas daquella época, até aí chega a minha memoria, e o que houver de real estou prompto a responder, e a dar os motivos, porque este é o dever do homem de bem: nesta

parte não entrarei mais, e mostrarei, recapitulando, que a receita toda de que eu dispuz, foi de 2:476 contos, incluindo o saldo para Janeiro: tudo o que vai desta quantia á de 3:890 contos, é um excesso de receita que não existiu, e foi inventado. Póde imaginar-se a receita que se quizer, assim como se disse, que apenas se tinham pago tres mezes, quando se pagaram mais de seis.

Agora vou entrar em outra materia, que para mim não deixa de ser um pouco difficil, e sinto ter de entrar nella; porém, que ha de fazer um Governo accusado tão fortemente de distracção de fundos publicos, e accusado de ter feito um Contracto ruinoso, se não mostrar os motivos que teve para fazer esse Contracto. Sr. Presidente, disse-se aqui, que o Governo foi auctorisado com meios sufficientes; eu digo, e já o disse, que a Lei de Meios, de receita e despeza, não produziu, nem produzirá o que se apresenta; porque algumas das verbas de receita não se realisaram; fallo do Contracto do Tabaco, do Agio das Notas, diminuição dos rendimentos das Alfandegas, e da reducção feita aos Empregados, e que estas falhas excedeiam a 1:000 contos; mas o que lastimei mais é que o Governo se achasse na posição ainda muito peior, pela difficil arrecadação das rendas publicas, como já disse em outra occasião, e então, qual é o meio de que qualquer Governo deve lançar mão, quando as receitas são demoradas na cobrança? É representai -as; é recorrer ás operações de Credito, e ir ás fontes donde lhe parecer que póde obter esses meios; e o Banco do Portugal que é aonde naturalmente todos os Ministros teem recorrido, e donde se tem sempre obtido recursos; parece que affastando-se um Ministro delle, haveria um tal, ou qual desejo de não proteger os interesses deste Estabelecimento. Não queria entrar nesta parte do Banco; mas como o Governo foi altamente accusado, tem de se defender.

Sr. Presidente, o Banco de Portugal estava auctorisado pela Assembléa Geral, a prestar um recurso ao Governo até 100 contos; o Governo entrando na Administração prevaleceu-se desta faculdade, e pediu ao Banco de Portugal que lhe emprestasse, por varias vezes, certas, e determinadas quantias, e o Banco com a melhor vontade se prestou a este Emprestimo: o Governo effectivamente, logo nos primeiros mezes, se utilisou de quantias que, aproximadamente, andaram por uns noventa e tantos contos de réis. Ora isto não podia ser um recurso sufficiente, na falta de tantos meios. Eu já hontem mostrei á Camara, que na receita publica, relativa aos Impostos Directos, havia uma sobra no Orçamento de perto de 1:800 contos, que estava por arrecadar; já se vê, que o Ministerio falho de recursos tão fortes, tinha de recorrer a alguma das fontes; os 90 contos não era possivel que chegassem; por diversas vezes fui ao Banco a sollicitar transacções, e o Banco respondeu, que não podia exceder aquella faculdade. Estava no seu direito!.... Sr. Presidente, eu vejo uma certa falha na Camara; não vejo nenhum dos Srs. Directores do Banco, e não me parecia justo fallar nesta materia, sem estar presente alguns dos meus Collegas, que representam aquelle Estabelecimento, para poder responder-me, sobre algum ponto, em que eu esteja em equivoco; entretanto posso continuar sobre outro objecto, reservando este, para quando se achar presente algum dos referidos Senhores.

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(Entrou o Sr. Xavier da Silva.)

O Orador — Estimo muito que chegasse um dos Srs. Deputados a que alludo. (

O Sr. Xavier da Silva: — Eu já disse o outro dia, que nesta Casa não sou Director do Banco; sou Deputado da Nação.

O Orador — Dizia eu, Sr. Presidente, que o Banco de Portugal prestou ao Governo até á quantia de 100 contos de réis, pela faculdade que tinha da sua Assembléa Geral; mas effectivamente occasiões se deram em que tive de recorrer ao Banco para lhe pedir alguns meios, e ás vezes em quantias de bem pequena monta, e o Banco não póde satisfazer essas requisições; em 11 de Abril de 1848 pedi ao Banco 25:800$000 réis, o Banco respondeu que não podia ser, porque isto excedia as suas faculdades, e disse-me que não podia dar senão 4:000$000 réis; recebi esses 4:000$000 réis, porque tudo ao homem pobre faz conta. A 5 de Junho dirigi-me ao Banco pedindo-lhe 12:000$000 réis, e o Banco representou que effectivamente não podia dai se não réis 10:000$000; recebi esses 10:000$000 réis: muito bem; estava no seu direito. D'outra vez pedi que me désse 1:000 libras para Inglaterra, respondeu-se que era essa uma operação, que não estava ao alcance do Banco. Pedi d'outra vez me dessem dinheiro em Bragança, a respeito do qual o Banco tinha feito os annuncios publicos, que o tinha nas differentes Delegações para transferir para Lisboa: esta operação não se póde realisar; trago estes factos não para fazer a menor censura ou arguição ao Banco, mas sim para mostrar que o Governo não podia, além dos 100:000$000 réis, obter do Banco algum outro recurso; fiz-lhe immensas reclamações pessoaes, e por escripto, e isto deu occasião ao Banco dizer, que convinha aos seus interesses desligar-se do Governo por espaço de dois annos. Logo quero eu daqui concluir, que na presença do credito publico pouco favoravel, na falta de individuos que quizessem prestar dinheiros, na presença da declaração do Banco, que não podia, o Governo viu-se na necessidade de recorrer a algum meio, e eis aqui a razão do negocio das Sete Casas, porque o Governo viu, que por este Contracto tinha 90 contos cada mez, o que não podia haver do Banco de Portugal, porque este já havia declarado, que era conveniente aos seus interesses ser abandonado pelo Governo por espaço de dois annos; e isto ao tempo que me parece devia reconhecer, que é interesse reciproco, que nem o Governo abandone o Banco, nem o Banco abandone o Governo (Apoiados.) Não é pois conveniente nem que o Banco abandone o Governo, nem é conveniente que o Governo abandone o Banco, e o Banco sabe que os maiores lúcios que obtem vem sempre das operações que faz com o Governo, e veja-se a sua ultima conta, e agora cumpre-me fallar a respeito de uma circumstancia, que demonstra a cautela, e prudencia com que se deve fallar em algarismos: porque estes teem certa magia; e para prova disso recorrerei ao Relatorio e contas que o Banco publicou, com referencia á sua conta do anno de 1848, e que vem no Diario de 9 de Fevereiro; alli se diz, entre outras cousas, que o Banco auxiliou o Thesouro Publico, descontando-lhe Letras na importancia de 533 contos de réis; nesta parte no Relatorio nada mais se diz.

Ora qualquer pessoa das não costumadas á indagação de algarismos, fazendo esta leitura, e em toda a parte onde se lêr este Relatorio, sem mais analyse, o que se conclue immediatamente, é que o Governo teve no anno de 1848 um recurso prestado pelo Banco de Portugal de 533 contos; mas não foi assim, e parece-me que eu hei de mostrar a esta Camara, que os 533 contos só são 93, ou 94, e hei de mostrar, que os 94 contos não são senão 30 e tantos contos. Darei um exemplo das minhas transacções com o Banco.

O Banco, supponhamos, empestou 90 contos, e eu dei-lhe letras de 30 contos cada uma a 1, 2, e 3 mezes; no fim do primeiro mez satisfiz a primeira letra no Porto, dei o dinheiro ao Banco, e depois disse ao Banco — dá-me outra vez 30 contos, porque o Governo tem necessidade delles, e esta exigencia esta dentro da faculdade dada ao Banco até aos 100 contos, e mesmo porque o Banco tem 1 por cento de interesse por estas premutaçôes, e por isso não teve difficuldade de dar os 30 contos; no segundo mez paguei a segunda lerra, no terceiro a terceira, e todas pagas no Porto, e já se vê que isto era um meio indirecto de fazer a transferencia do dinheiro do Porto para Lisboa; ao Banco davam-se novas letras, ruas nunca lhe devi acima dos 100 contos, e recebia os seus juros a 1 por cento de transferencia. Esta renovação continuada é que na conta mercantil do Banco leva a dizer-se, que se descontaram 533 contos de letras; mas seria melhor ter dito logo aqui, que durante essas transacções tinha sido pago das leiras vencidas, e renovado outras, o que para o Thesouro não foi recurso de 533 contos, e sim de 91, porque o Governo pagou a differença, e isto se vê da conta em algarismos, que precede o Relatorio; mas como quasi ninguem se dá ao trabalho de contar, que é o que quer dizer lêr uma conta, lá fica o publico impressionado de que tive um auxilio de 533 contos, que são unicamente 94. Agora lesta mostrar que estes 94 são unicamente 30 e tantos.

No meu Relatorio de 28 de Fevereiro se diz, que de Contractos anteriores á minha Administração se deviam ao Banco 56 contos em Notas, que o Banco devia receber pela cobrança das decimas de Lisboa; o Governo pagou ao Banco durante esse anno esses 56 contos, logo um devedor que deve ao Credor 94 contos, que paga durante esse anno 56 contos a esse mesmo Credor; pergunto com quanto dinheiro fica o Devedor para as suas operações para girar? Para viver?.... Fica com 38. Ora eis aqui esta a grande somma que ficou ao Governo para elle podér girar; e trago toda estas circumstancias para demonstrar que o Banco não prestou ao Governo tanta protecção como alguem julgara á vista do paragrafo do Relatorio, que ha pouco li á Camara.

O que é certo é que o Banco não se prestando a fazer pequenas operações, a respeito das quees não precisava auctorisação especial, porque são operações que o Banco costuma fazer, o Governo ver-se-hia obrigado a recorrer a alguns individuos, que quando se prestavam a fazer alguma operação, era sempre por um preço muito mais subido do que aquelle que o Banco costuma fazer; eu achei-me nessa situação. Quando quiz recorrer ao Contracto do Tabaco, notei que o Contracto era obrigado, pela Lei de $6 d'Agosto de 1848, a dar no Governo

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a quantia integral do seu Contracto; mas o Contracto tinha tambem por outro lado reclamações que dizia fundadas em Lei, e em questão de direito entre nos; se eu exigia o pagamento da quantia marcada na Lei de 26 d'Agosto o Contracto replicava-me com outra Lei; eu não cedi, mandei consultar o Tribunal do Thesouro Publico, mas o facto é que não recebi. Eu estou bem persuadido que se o Contracto estivesse abundante de moios, como em outras épocas, em que nunca abandonou o Governo, eis que lhe prestou auxilios, elle não faria questão sobre este ponto e prestava ao Governo os meios que tinha de lhe pedir; pois que o Contracto foi sempre prompto em acudir ao Governo, as vezes ate sem documento escripto; o Contracto foi sempre generoso; tudo vai da opportunidade; ainda não ha muito tempo, que se deu um facto em abono desta minha asserção, quando eu quiz pagar o mez de Outubro aos Oficiaes arregimentados disse ao Contractadores — são necessarios 10 contos para ámanhã — Os Contractadores responderam-me, não temos — repeli são necessarios 10 contos para amanhã para tal fim, disseram-me então conte com elles; disse-se, e deu-se isto sem documento nenhum!

Ora, Sr. Presidente, passando agora a outro ponto, que é talvez unicamente explicação entre mim, e o Sr. Ministro da Fazenda actual, eu digo a S. Ex.ª que alguma sensação me fez o ver publicar uma Portai ia, em que se fallava a respeito de suspensão de Ordens, fallo da Portaria de 30 de Janeiro ultimo, não trago este negocio com o fim de censurar, não o trago com fim nenhum senão o de me explicar a respeito da natureza dessas Ordens.

A Portaria falla de certas ordens de prets, soldos e vencimentos de certas Classes, e que estas podem ser pagas, e as outras deviam ficar adiadas. (O Sr. Ministro da Fazenda: — Peço a palavra.) Não venho fazer censura á Portaria, venho simplesmente explicar-me sobre este objecto. V. Ex.ª sabe, Sr. Presidente, que isto já foi objecto de algumas observações, e quasi foram interpellações, estando eu doente em minha casa, e vou entrar na explicação sobre este ponto, porque se suppoz que havia algumas ordens que o Ministerio actual queria supprimir, ou porque conhecia que não tinha meios, ou porque as reconhecia illegaes. Eu sómente quero explicar que a respeito de ordens não póde havei nenhumas expedidas, não póde havei nenhuma que o fosse pelo Ministerio da Fazenda, senão aquellas proprias desse Ministerio, ou pelos Encargos Geraes, porque todas as mais ordens são da responsabilidade e da attribuição dos outros Ministros; o Ministro da Fazenda não faz senão mandar Avisos de Credito, e os Ministros das. outras Repartições é que expedem as Ordens. E agora que S. Ex.ª esta na melhor disposição de sustentar o Credito, ha de ver que é bem fatal o systema dos saltos; a respeito dos Contractos, e sempre necessario e indispensavel, para a marcha regular de um Governo, o respeita-los. Ora se as Ordens pelo Ministerio da Fazenda são illegaes, lá deve constar dos talões. (O Sr. Ministro da Fazenda: — Não são por certo illegaes) Eu sei que S. Ex.ª quer ir á divisão do anno economico, e ao art. 22.º da Lei; mas isto e uma questão que eu hoje por cançado deixo de tocar, porque já não tenho forças para entrar nella; mas é questão em que convem entrai, porque essas douctrinas não estão estabelecidas no nosso Paiz: o motivo porque não ha contabilidade publica é porque estas theorias não estão estabelecidas: têem-se feito certos improvisos, e cada um entende as cousas a seu modo. Entra um Ministro de Fazenda, dá certas ordens, vem outro, dá outras, e ainda se não assentou n'uma cousa fixa, n'um systema certo, a toda a hora se estão a pedir contas, esclarecimentos ás Auctoridades, em tal quantidade, e de tal maneira, que o resultado e não vir cousa nenhuma: os Governadores Civis dependem dos Administradores de Concelho, o Ministro da Fazenda dos Governadores» Civis, os Governadores Civis são sobrecarregados de trabalho em consequencia de diversas Leis, que têem a fazer executar, o Tribunal de Contas pede pelo seu lado; o Ministro pede ás vezes as mesmas cousas, e no fim não e possivel satisfazei á decima parte do que se pede, e se ordena, e direi á Camara em ultime resultado sobre este ponto em que eu não entro hoje, porque me parece terei mais occasião de fallar nesta materia, que S. Ex.ª em quanto á contabilidade publica ha de vêr que eu lancei as bases para essa contabilidade se desenvolver em todo o Reme, e a tempo proprio: logo que a Lei de 26 d'Agosto foi votada, tractei desse objecto seriamente, mesmo porque entendi que era eminentemente necessario tractar delle, e sei que a contabilidade publica seja sempre uma cousa ilusoria no nosso Paiz, se não fizermos um dia um ponto, e se não simplificarmos as rodas désse machinismo que esta muito complicado. Se se quizer hoje entendei na contabilidade de todas as questões antigas, que estão pendentes, nada se póde fazei, o tempo vai-se perdendo, e não se tracta daquillo que é necessario. Não entrarei agora nesta theoria, mas não tardará que o faça, e mesmo até desejo este debate.

E vou terminar, Sr. Presidente Eu não costumo nestas cousas fazei nunca allusões, elogios pessoaes, não costumo fallar da minha pessoa, tão pouco tenho pertenções de Orador, nem de. brilhai na Tribuna, porque sei que não tenho os requisitos necessarios para me apresentai com essas pertenções; sou de mais a mais um homem pacifico, não desejo entrar nestes combates, nestas lides, e amo o meu socego de preferencia a tudo. por consequencia quando vim a este combate, foi por devei da minha posição social e pessoal, foi para cumprir um devei, sem o que o homem morre; e é preciso não morrer, é preciso que a honra, quando se acha atacada, que seja tambem defendida, e defendida com coragem, esta é a razão porque pedi a palavra e fallei na questão, este é o motivo que me trouxe a este combate; se tenho sido violento em algumas expressões, será isso devido ao calor que tenho tomado, e não á vontade de offender: essas são as minhas intenções

Eu, Sr. Presidente, sou conhecido nesta Capital ha trinta annos; exerci por diversas vezes a confiança dos particulares, que me entregaram as suas casas e os seus cofies, e dei contas constantemente; esta confiança e amisade, que ainda hoje conservo para com essas familias, são as melhores provas de que não faltei aos meus deveres. Fui obrigado a emigrar, porque sempre fui Cartista desde que ha Carta, e antes da Carla, e apresentando-me em Inglaterra offereceram-me se eu queria ir a uma transacção para o Mexico, e eu disse, que uma vez que tinha recebido subsidios do Cofre dos Emigrados, havia de correr a sorte dos meus compatriotas, e companheiros

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do exilio: abandonei esses lucros que me offereciam, passei d'alli para a Belgica, e fui subsidiado da Belgica para a Ilha Terceira; mal cheguei áquella Ilha honraram-me com o logar de Membro da Commissão de Fazenda: d'alli fui mandado á Ilha de S. Miguel, a Ponta Delgada, com Poderes Discricionarios para tomar posse de todos os Cofres; cumpri esta commissão com a maior diligencia, porque a causa era a da salvação publica; tomou-se effectivamente posse de todos os Cofres, dos dinheiros do Contracto do Tabaco, e de todas as rendas publicai.

Nesta Commissão, acompanhado de honrados Empregados, fiz uma escripturação para a arrecadação dos dinheiros. Mas, Sr. Presidente, quando voltei á Ilha Terceira dei contas, e tenho uma Portaria a respeito dessas contas que prestei; estou liquido com a Fazenda Publica. Tendo passado da Ilha de S. Miguel á Terceira uni-me ao Exercito Libertador, que vinha para Portugal; offerecia-se-me ficar na Ilha Terceira, sendo Administrador do Tabaco; mas eu assentei, que a minha honra pedia que eu não ficasse ocioso, e que devia seguir a sorte dos meus Camaradas do Exercito Libertador. Desembarquei no Mindelo, e passado certo tempo as necessidades publicas exigiram, que um homem fosse tractar a Hespanha de fornecimentos para o Exercito, que se achava na maior penuria; fui encarregado disto, e desempenhei o que se me incumbiu; e logo depois fui encarregado de uma missão secreta para instaurar as relações com algumas terras de Portugal: ambas as Commissões desempenhei, e tive a felicidade de voltar ao Porto debaixo das ballas, para que não se dissesse, que eu tinha saido do Porto para escapar ao perigo. Entrando no Porto ainda assisti ás ultimas batalhas de Julho.,

No Porto dei contas na Commissão do Thesouro Publico. O Governo, logo ha minha volta de Hespanha, me nomeou Pagador da Armada; recolhendo a Lisboa, chamado pelo Governo, o infeliz Agostinho José Freire, a pedido meu nomeou uma Commissão para me tomar as contas; fiquei quite, entreguei o saldo que possuia nos Cofres Publicos, e recebi o Conhecimento em fórma da sua entrega. Sua Magestade Imperial, sem que eu o rogasse, me nomeou Contador Geral de Marinha, Repartição que administrei desde 1833 até 1840, creando um Systema de Administração, que a todos satisfez, e tive sempre naquelle logar a mais illimitada confiança de todos os Ministros, nunca abusei, e administrei para cima de dois milhões annuaes. Em 1840 tive a honra de vir para estes bancos. Veiu depois a caber-me, cousa espantosa, a sorte de ser Ministro da Marinha; ahi fiz nessa Repartição a gerencia mais proveitosa, que me parece que podia fazer para o bem publico; (Apoiados) porque posso dizei, que toda essa Malinha que ahi ha hoje, deve-se a essa Administração. No Ministerio da Marinha não havia material nenhum de guerra, o Arsenal foi fornecido de antenas, e de mastros, e todo o mais material; vieram de Inglaterra para cima de duzentas boccas de fogo; os nossos Navios de Guerra se teem hoje artilheria, é isso devido á época em que eu estive na Administração da Marinha, com alguns Collegas que vejo presentes, e um que se acha nos bancos do Ministerio — quasi tudo alli mudou de face — tanques de ferro, lastros, fornecimento em grande, e abundantes, e constante navegação, e construcção.

A Náo Vasco da Gama, que estava ainda em ôsso, foi acabada no tempo da minha Administração; a Fragata D. Fernando e Gloria, que estava ha dez annos em Diu, mandei daqui tudo quanto foi necessario para poder seguir viagem para Lisboa; ahi esta, e é a unica Fragata que esta capaz de navegar, só lhe falta parte da mastreação. Acabei a Corveta íris, que estava em começo; fiz o Brigue Douro, o Serra do Pilar, o Mondego. Mandei vir uma grande maquina, Draga, para dragar o Téjo; comprei o Vapôr Mindelo; concertei o Vapôr Terceira; mudei o systema a toda a construcção, ás Officinas; lá teem já maquinas, e estou dizendo isto diante do Sr. Visconde ele Castro, que tem por aquella Repartição igual zêlo ao que eu tinha, e eu não posso deixar de confessar, que tenho os maiores desejos, e paixão por ver prosperar aquella Repartição. (Apoiados)

Tambem lancei umas bases para um Quartel em Alcantara; salvei o Estabelecimento de Valle de Zebro, que estava quasi perdido... (O Sr. Ministro da Marinha: — Creou um Monte-Pio.) O Orador: — Isso é já uma cousa particular; concorri muito para se fechar o dique, e quero só mostrar, que nesta gerencia de fundos procurei tirar os melhores resultados, porque sem fazer muitas cousas destas tambem se podia dispender este dinheiro; e trago isto tambem para dizer, que quando entrei no Ministerio da Marinha deviam se naquella Repartição 70 contos de réis a diversos fornecedores do Estado, e quando saí, fiquei devendo 92 contos, isto é, 22 contos mais de divida do que quando entrei; mas deixei em resultado todos estes objectos, que acabo de mencionar, cujos effeitos não serviram para então, serviram para depois, e estão servindo para agora.

Mas para que trouxe eu tudo isto? Foi para mostrar um êrro fatal; para mostrar o mal que resulta de se não satisfazerem os saidos, que passam de umas Administrações para outras; sei que o Sr. Ministro da Fazenda esposa os mesmos principios, que eu segui, de que os Contractos, o. Compromissos não devem soffrer pela mudança de um, ou outro Ministro; mas sabe V. Ex.ª o que aconteceu naquelle tempo? Foi que a Repartição de Marinha não pagou o que fiquei devendo, ficando os armazens com 800 barris de carne, ficando outros armazens cheios de carvão de pedra para consumo dos Vapores, ele, e todo esse immenso material de guerra; mas em fim era uma revolução, falai, que se seguia para emendar os nossos êrros. A vista de todos estes factos, que são bem patentes, e que todo o Paiz conhece, parece-me que tinha algum direito a esperar não ser apontado do dissipador dos dinheiros publicos; (Apoiados) e trago estes factos como inducções moraes; mas eu mesmo os despreso, quando se tracta da defeza destas accusações, contra as quaes tenho os documentos Officiaes, porque eu não quero favor algum, quero só justiça.

Depois de tudo isto, ainda tenho de faltar á minha palavra. Eu disse que não tornava a fallar nas Sete Casas; mas as Sete Casas são o principio, o meio, e o fim que envolve este negocio todo. Tenho que fallar nellas, porque entre as muitas cousas que se disseram a seu respeito, tambem vieram as chamadas apprehensões, e fallou-se em luvas. As luvas costumo calça-las da maneira que tenho dicto, e se algum miseravel tivesse a ousadia de suppôr, que um

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-Ministro da Corôa era capaz de abaixar, e se vandijar a fazer um Contracto para ser venal, se quizer uma prova do contrario, eu aqui estou, elh'-a.posso dar de uma maneira irrecusavel; digo-o a esta -Camara, e ao Publico, porque lh'o posso mostrar. (O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: — Muito bem.) No fim de tudo isto, Sr. Presidente, tenho a dizer, que a gerencia publica, que as Leis que a Camara votou ao Governo, tiveram todas a devida execução; que a receita de que o Governo dispoz, esta publica, e continuará a ser publica; e que quando larguei o Ministerio, visto que tinha o cuidado de ler uma conta diaria contra mim proprio, de que tenho aqui dois livros, deixei no dia 29 de Janeiro no Thesouro Publico 40 e tantos contos de réis, que não é tudo dinheiro, parte em Notas. O dinheiro foi com que o Sr. Ministro pagou o resto de Agosto, e que eu reservava para o pret da tropa, porque não esperava mais recursos naquelle mez. Digo mais, que a minha gerencia não onerou a Fazenda Publica com divida consolidada alguma; que tive a coragem de fazer a reducção nos juros, e só nos cinco semestres dos annos de 1817 — 1848, e primeiro de 1349 trouxe um abatimento de mais de 2:000 contos na despeza publica; que no meu tempo não creei divida alguma consolidada,e por esforços feitos pela Junta do Credito Publico, que me coadjuvou, se amortisaram 600 mil libras de Bonds, que estavam hypothecadas; que a amortisação das Notas vai em progresso; e finalmente, para responder sobre qualquer ponto da gerencia da minha Administração, continúo a estar nestes bancos. Tudo póde ser facilmente exaram ido, e peço que o seja pela Commissão de Contabilidade.

A vista pois de tudo quanto tenho dicto, concluo pedindo á Camara, que me releve alguma expressão que tenha pronunciada menos cabida em tão longo, e impertinente Discurso, porque as minhas intenções não eram senão defender o Governo a que pertenci, e defender-me das accusações que se me fizeram de dissipador dos dinheiros publicos. (Apoiados) (Vozes: — Muito bem, muito bem.)

O Sr. Presidente: — Passa-se á

«SEGUNDA PARTE DA ORDEM DO DIA.

O Sr. Presidente: — Devia principiar pelo Projecto n.º 103, mas attendendo ao adiantamento da hora continua a discussão sobre o Projecto n.º 48.

Eslava em discussão o art. 4.º no principio, e n.º 1, e havia uma Proposta do Sr. Xavier da Silva, que foi considerada como Emenda, que é a seguinte (Leu, e veja-se a Sessão de 21 deste mez). A este respeito já tinham fallado, depois do Sr. Xavier da Silva, os -Srs. Corrêa Leal, Avila, Silvestre Ribeiro, e Xavier da Silva, e ficou com a palavra o Sr. Carlos Bento.

O Sr. Cabral de Mesquita: — Eu pedia a V. Ex.ª que consultasse a Camara se queria que neste pequeno intervallo que resta para dar a hora, nós dessemos as Explicações; porque eu, e alguns Membros da Commissão, precisamos indispensavelmente dar essas Explicações (Apoiados).

O Sr. Presidente: — Sobre o objecto de Explicações já hontem se propoz á Camara a sua admissão, e não houve votação, porque não se deram 37 votos por um dos lados, e hoje já na primeira parte da

Ordem do Dia foi tambem consultada a Camara, e não as permittiu comtudo, como o Sr. Deputado insta ainda que eu consulte a Camara sobre este objecto, eu o faço, porque se tracta da dispensa do Regimento.

A Camara approvou que se dessem agora as Explicações.

O Sr. Cabral de Mesquita: — Sr. Presidente, V. Ex.ª não faz idéa da satisfação que tenho de ter chegado a occasião de poder explicar o meu voto, porque tendo havido dois illustres Deputados que me tacharam de contradictorio, eu quero provar-lhes que realmente não ha essa contradicção, e que o meu procedimento foi conforme aos bons principios, o espero faze-lo, tanto mais quanto sendo estes dois illustres Deputados meus Amigos, estou convencido que me II rogaram esta -censura na melhor boa fé.

Sr. Presidente, na Sessão do anno passado defendi aqui com a força de que sou capaz, a constitucionalidade do art. 63, e disse por essa occasião, que desejava sinceramente de todo o coração as eleições directas, porém que não podia votar de fórma alguma por este Systema, porque entendia que elle era opposto a um principio estabelecido na Carta, que eu reputava eminentemente constitucional; a Camara resolveu outra coisa na sua sabedoria, e eu admitti o facto; mas, Sr. Presidente, é preciso notar que este facto que eu admitti, não podia tambem deixar de produzir em mim a mais profunda convicção de que a Maioria da Camara devia dar a essa questão o andamento regular, isto é, que a questão da constitucionalidade ou inconstitucionalidade do art. 63 fosse decidida pelos tres Ramos do Poder Legislativo, nem eu podia intender outra cousa, porque se assim não fosse, que de facto não foi, seguir-se-hia que a questão que se ventilou o anno passado sobre o art. 63 era inutil, e não tinha resultado algum. Mas qual foi a razão porque assignaste sem declaração? Sr. Presidente, eu não tinha obrigação nenhuma de assignar com declaração, porque a minha douctrina era corrente, as minhas idéas, as minhas opiniões foram expendidas com toda a clareza nesta Casa; por consequencia eu intendi, e intendo ainda hoje, que qualquer Explicação, que désse a este respeito, era inteiramente inutil, e inteiramente superflua. E ainda bem, Sr. Presidente, que este meu procedimento é abonado pelos precedentes desta Camara. A minha obrigação sabe V. Ex.ª qual era? Era que antes que se discutisse a Lei Eleitoral, eu provocasse por todos os modos possiveis a questão prévia, e invoco por esta occasião o testemunho dos meus illustres Collegas, para que digam se eu não lhes trouxe á lembrança a necessidade em que estava collocado de provocar essa questão; ella foi apresentada pelo meu illustre Amigo, Deputado por Traz-os-Montes; o illustre Deputado retirou essa questão»; não sei os motivos que teve para isso, o que sei é, que me collocou na triste posição de votar por um Systema, que aliás entendo que não é preferivel (Apoiados). Isto o que mostra da minha parte não são ruins tenções, mas um verdadeiro amor aos principios.

Mas, Sr. Presidente, na questão que se ventilou aqui ha poucos dias, não digo que se andasse com deslealdade; mas o que é certo (no meu entender) é que se andou com muita paixão. Houve um illustre Deputado, que querendo achar-me em contradic-

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ção, querendo ate esmagar-me com a força da sua intelligencia, foi buscar um trexo do Discurso que aqui pronunciei o anno pasmado, para provar que eu realmente estava em contradicção, e foi um illustre Deputado que eu respeito muito pela sua intelligencia, e muito principalmente pelo modo delicado como entra em todas as questões. Quer V. Ex.ª saber qual foi a contradicção em que fui encontrado? Aqui esta, (Leu) e daqui concluiu o illustre Deputado, que a não constitucionalidade do artigo importava o estabelecimento das eleições directas; ma é que o illustre Deputado (permitta-me que lhe diga) não se deu ao trabalho de ler mais duas linhas do meu Discurso, porque então veria, que esta proposição que me attribuiu, foi estabelecida por outros illustres Deputados, e eu apresentei-a para a refutar, como se vê pela continuação do meu Discirno, que diz assim. (Leu)

Aqui tem o illustre Deputado como a proposição que me attribuiu, não foi mais que uma proposição estabelecida por outros illustres Deputados, e que eu trouxe aqui para a combater. Realmente custa-me quando vejo argumentar de um modo similhante, que não posso attribuir, é verdade, a animo deliberado da parte do illustre Deputado de me desconsiderar, porque me tem dado provas de amisade, pelo modo attencioso com que sempre me tem recebido, mas a que seguramente o posso attribuir, é á paixão com que defendia o seu systema, e então achava contradicções onde realmente não as havia.

Outro illustre Deputado, com cuja amisade me honro, suppoz-me intenções que eu não tinha, e a respeito deste illustre Deputado custa-me mais, porque me conhece ha mais tempo, e sabe perfeitamente, que eu fui eleito Deputado, sem recommendação nenhuma do Governo, e mesmo porque recommendação do Governo naquelle tempo era contraproducente; mas ainda mais; o illustre Deputado sabe muito bem, ou se o não sabe, estão aqui muitos illustres Deputados que assistiram as operações do Collegio Eleitoral do Douro, e sabem que fui eleito Deputado contra a vontade de muitos homens influentes naquelle Collegio: (Apoiados) sabe o illustre Deputado a quem eu devo a minha candidatura? A 35 eleitores a quem se concedeu a triste graça de darem um Deputado!... E por isso que eu me hei-de pronunciar nesta Camara contra a absurda e monstruosa organisação dos Collegios Eleitoraes, como ella se acha estabelecida; a este respeito estou inteiramente conforme com os meus illustres Collegas da Commissão; e por esta occasião seja-me permittido dizer, que quando se ventilou a questão sobre o methodo directo ou indirecto, eu liguei-lhe toda a minha attenção, e vi que a maior parte dos argumentos, ou quasi todos, não eram contra o principio indirecto, mas sim contra a pessima organisação dos Collegios Eleitoraes; (Apoiados) esse e que é o grande defeito, e se nós pudermos conseguir (como eu espero) acabar esse grande defeito, temos conseguido uma grande cousa.

Eu, Sr. Presidente, não sei se satisfiz os illustres Deputados, mas parece-me ter demonstrado não haver contradicção da minha parte, e parece-me que procedi com toda a coherencia, votando do modo porque votei.

O Sr. Crespo: — Sr. Presidente, tractarei tambem de dar uma Explicação pessoal, visto que me não coube a palavra para entrai na discussão da Lei Eleitoral, e serei muito breve, porque o nobre Deputado que acabou de fallar, me preveniu, por isso que esta nas mesmas circumstancias. Eu pretendo sómente dizer os motivos, porque assignei o Parecer da Commissão, tendo votado pela constitucionalidade do artigo. — Votei pela constitucionalidade do artigo, porque me persuadi que elle era constitucional, e ainda hoje estou convencido de que não só é constitucional, mas é constitucionalissimo; assignei o Parecer da Commissão depois da resolução tom ida por esta Camara, de que o artigo 63 não era constitucional, mas na hypothese de que esta resolução importaria legalidade, e seguiria o andamento legal e authentico.

Sr. Presidente, assignei o Parecer da Commissão, porque queria a eleição directa; ainda hoje a quero e a julgo preferivel, mas quero chegar a esse fim pelos meios consignados na Carta, e por uma resolução tornada legal e authenticamente... e isto deu-se? Não de certo: por consequencia eu, tendo votado pela constitucionalidade do artigo, não podia deixar de votar pelo methodo indirecto.

Concluo portanto dizendo, que votei pelo methodo indirecto pelos motivos, que acabo de dizer, e declaro mais, que votaria pela eleição dilecta se me achasse em plena liberdade; ao mesmo tempo tambem declaro, que estou conforme com a illustre Commissão em todos os outros pontos, salvo o direito que poderei ter de modificar a minha opinião no decurso da discussão.

O Sr. Atila — Si, Presidente, eu renunciaria á palavra se por ventura não a pedisse para explicar um facto, que se refere ao Ministerio de que eu fiz parte, e estimo muito que esteja presente o Sr. Ministro da Fazenda, que foi quem me obrigou a pedir a palavra para esta Explicação.

O Sr. Ministro da Fazenda disse, que ao mesmo tempo que eu exigia que o Ministerio fizesse da Lei Eleitoral questão Ministerial, me tinha esquecido de que no Ministerio de que eu tinha feito parto, o Presidente do Conselho de Ministros tinha declarado, que as questões verdadeiramente nacionaes não eram questões Ministeriaes, e que eu tinha feito a mesma declaração: quando S. Ex.ª me foz esta imputação, entendi que da parte do nobre Ministro tinha havido equivocação a meu respeito; mas lendo no Diario do Governo do dia seguinte, o Extincto do Discurso do S. Ex.ª vi repetida a mesma idéa, e sinto que o nobre Ministro antes de me fazer esta imputação se não tivesse dado ao trabalho de ler o meu Discurso, a que se referiu, porque se o tivesse lido, havia de ter visto, que ou tinha dicto perfeitamente o contrario do que S. Ex.ª indicou: aqui tenho esse Discurso; não o lerei, porque não quero fatigar a Camara, e eu mesmo (como já disse) não tractaria de dar esta Explicação, se porventura o facto não se referisse ao Ministerio de que eu fiz parte, e se o nobre Ministro não tivesse tambem feito uma censura ao Presidente desse Ministerio, que não estava presente, e não podia defender-se.

Sr. Presidente, o Presidente do Ministerio de que me honro de ter feito parte, não disse o que S. Ex.ª lhe imputou; o seu Discurso aqui esta: o que disse foi, que a questão dos Foraes, que se ía tractar, era uma questão de tal importancia, que o Ministerio entendia que nela não devia haver direita nem esquerda, que não devia haver Opposição: por

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parte da Opposição entendeu-se que o Presidente do Conselho tinha dicto — «Que uma questão eminentemente nacional não era questão ministerial» — e eu quando fallei, disse, que estava perfeitamente de accordo em que as questões eminentemente nacionaes eram questões eminentemente ministeriaes; (O Sr. Ministro da Fazenda faz um gesto negativo) e visto que o nobre Ministro da Fazenda insiste neste ponto, ha de permittir que lhe leia a parte do meu Discurso, em que emitti esta opinião: disse eu, (Leu) — «Que as questões eminentemente sociaes são questões eminentemente ministeriaes; conformo-me inteiramente com isso.» —

Mas se S. Ex.ª se tivesse dado ao trabalho de ler esta discussão, havia de vêr, que as declarações que eu fiz nessa occasião, foram declarações que satisfizeram plenamente a Opposição; aqui esta o Discurso do nobre Deputado (então) o Sr. José Estevão, que o illustre Ministro da Fazenda sabe perfeitamente bem que não faria favor á Administração a que eu pertenci: o Sr. José Estevão disse nessa occasião. (Leu) — «Eu vi que o sr. Ministro da Fazenda tinha entendido perfeitamente a importancia desta Lei; eu vi que tinha reconhecido que era uma das columnas que sustentavam o Edificio da nova Monarchia; que era possivel aperfeiçoal-a; dar-lhe mais feição nesta ou naquella ordem d'Architectura, mas nunca destruil-a, porque então desabava o edificio completamente.»

Por tanto, Sr. Presidente, o facto é, que as declarações que eu fiz nessa occasião... (O Sr. Ministro da Fazenda: — Faz favor de me mandar o livro?) pois não... e parecia-me que o nobre Ministro me devia fazer a justiça de crer que eu sei ler, (O Sr. Ministro da Fazenda conversava com algum Srs. Deputados) e assim como me pede que lhe mande o livro, devia dar mais attenção áquillo que eu dizia; a cortezia pelo menos assim o pede.. (O Sr. Ministro da Fazenda: — A cortezia!... valha-me Deos!.. A Cortesia) O Sr. Ministro da Fazenda não era Membro desta Camara, quando se discutiu a Lei a que S. Ex.ª se referiu; S. Ex.ª não sabia por si o que então se passou, mas S. Ex.ª tem um Collega no Ministerio, que então fazia parte desta Camara, o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, a quem podia consultar; mas visto que S. Ex.ª não o consultou, devia ter lido o Diario da Camara, e no Diario da Camara havia de vêr o contrario do que S. Ex.ª me imputou. Pois que S. Ex.ª me pede que lhe mande o livro, como para mostrar que eu não fui exacto na leitura que fiz, devo notar, que essa leitura a devia ter feito antes S. Ex.ª, e devia dar mais credito ao que eu digo, porque não costumo nunca faltar á verdade.

Sr. Presidente, eu não disse (torno a repetir), que as questões eminentemente nacionaes não eram questões ministeriaes; disse perfeitamente o contrario. S. Ex.ª não se contentou com dizer isto na Camara, no dia seguinte apparece a mesma idéa no Extracto do seu Discurso... (O Sr. Ministro da Fazenda: — Não o mandei para o Diario.) não sei se S. Ex.ª o mandou, mas sei que S. Ex.ª o disse; ora o meu Discurso prova perfeitamente o contrario: e mesmo o Discurso do meu collega Ministro do Reino e Presidente do Conselho não contém uma só expressão das que S. Ex.ª referiu; e quando elle não esta presente, tenho eu a obrigação de o defender. O digno Presidente daquelle Ministerio veio dizer o seguinte. (Leu)

«O Governo não póde considerar esta questão como questão do Governo, considera esta questão como questão altamente nacional; o Governo limita-se por ora a declarar que entende que é essencialmente necessario que se façam algumas reformas no Decreto de 13 de Agosto. Em segundo logar o Governo declara que adopta para texto da discussão este Projecto da Commissão, e que o Governo mesmo adopta grande parte das suas douctrinas; mas não se segue disto que o Governo não seja, em consequencia da discussão, levado a admittir alguma modificação, mas tambem entende que não se deve fazer desta questão, uma questão de opposição: é isto o que o Governo tem a declarar.»

E depois de eu ter fallado, ainda aquelle Cavalheiro se explicou do modo seguinte (Leu)

«Eu não disse que uma questão altamente nacional era uma questão, em que devesse deixar de tomar parte; o Governo; eu disse pelo contrario, que o Governo devia acompanhar esta discussão.. Eu disse o mesmo que disse o meu illustre Collega; (O Sr. Ministro da Fazenda: — É verdade.) eu comecei por dizer que era preciso fazer algumas modificações no Decreto de 13 de Agosto; quem diz que é preciso fazer algumas modificações no Decreto de 13 de Agosto, sustenta o principio do Decreto de 13 de Agosto; mas o Sr. Deputado não o entendeu assem: além de que eu não me limitei a isto, e accrescentei ainda, que o Governo adoptou na generalidade os principios admittidos por este projecto.»

Parece-me que esta simples explicação dada por aquelle Cavalheiro não contem as idéas, que S. Ex.ª referiu. Em quanto a mim, a imputação é a mais injusta que se póde dar, porque eu declarei, que as questões sociaes eram eminentemente ministeriaes; (Apoiados) e emitti a opinião do Governo ácerca desta Lei, e disse expressamente que o Governo acceitava a base do Decreto de 13 de Agosto, e só queria que se fizessem neste Decreto as modificações, que a experiencia de nove annos tinha tornado necessarias; e que estas explicações satisfizeram cabalmente a Opposição. Sou obrigado pelas denegações do S»-. Ministro da Fazenda a ler alguns trechos do Discurso d'um dos seus Membros mais notaveis. Quando eu acabei de fallar

ti Boa lição» — disse o Sr. José Estevão — «do banco dos Ministros a alguns dos Ministros; boa lição para aquelles que cuidam, que o Poder suppre todas as condições da racionalidade!»

O Sr. José Estevão pois, dizia, que eu tinha dado uma boa lição ao meu Collega Ministro do Reino, por lhe parecer (e não tinha razão) que o que o Ministro do Reino havia dicto, não era tão explicito como eram as minhas palavras Este illustre Cavalheiro, continuando o seu Discurso, disse ainda:

A importancia da questão não podia deixar de de ser percebida pelo Ministerio; porque em fim apezar destas combinações, e destas intrigas, apezar deste odio á intelligencia, em fim sempre se presta alguma homenagem ás condições deste Systema; busca-se uma lingoa, e busca-se uma cabeça: ainda bem que ella appareceu no Ministerio!

a.... Comprazo-me com S. Ex.ª pela declaração que fez de que primeiro pensamento da Administração a que preside... a que preside não, a que de-

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via presidir... (Riso) que o primeiro pensamento dessa Administração é conservar primeiro que tudo os bens materiaes produzidos pelo Decreto de 13 de Agosto, as suas consequencias publicas, em fim o pensamento liberal, que presidiu á redacção desse Decreto.»

Por consequencia vê-se que eu satisfiz cabalmente a Opposição, e que a arguição, feita pelo nobre Ministro da Fazenda a esta Administração é injusta; e permitta-se-me que diga, quando mesmo fosse justa, isto não provava que o Governo tivesse feito bem, declarando, que a Lei Eleitoral não era questão ministerial, porque não é o Governo que declara as questões ministeriaes: ainda mesmo que o Ministerio de que fiz parte, entendesse que a questão dos Foraes não era ministerial, isto não justificava de maneira nenhuma o Gabinete actual de deixar de fazer questão ministerial aquillo que o é. Agora não me resta se não ver, que este mesmo Ministerio considere como questão ministerial aquillo que em Parlamento nenhum do Mundo é considerado como tal. (Riso)

O Sr. Faria Barbosa: — Na verdade custa-me incommodar a Camara, e mesmo dar explicações na altura em que a hora se acha, mas sou obrigado a fazel-o por isso que apresentando eu razões ou argumentos para mostrar os motivos, porque votava pela eleição indirecta, alguns nobres Deputados julgaram rebater estas razões com argumentos ad odium. Um dos nobres Deputados disse, que eu me inculcava como orgão da Maioria, nem tal ao pensamento nunca me veio; era preciso estar destituido de siso, para me pronunciar de tal fórma neste logar. Por ver que se lançavam censuras á Maioria, dizendo-se, que aquelles Deputados que votaram pela não constitucionalidade do art. 63, estariam contradictorios se não votassem pela eleição directa, e que ou me referi á Maioria, dizendo, que a Maioria não podia de modo nenhum assim ser considerada. Estou persuadido que a Camara deve reconhecer, que nunca foram taes as minhas intenções. (Apoiados)

Outro argumento mais acre, e digno de censura se apresentou aqui neste mesmo gosto; e o que admira mais é ser proferido por um nobre Deputado, que a fallar a verdade no campo da discussão sempre se apresenta como uma especie de jasmim que se resente do mais pequeno rigor da estação; este argumento foi referindo-se ao nobre Deputado pelo Minho, quando respondeu aos argumentos de um Sr. Deputado por Vizeu. O Sr. Deputado disse, que em presença da falla do nobre Duque de Saldanha na Sessão do anno passado relativamente á questão do art. 63, nessa occasião elle se tinha declarado pela não constitucionalidade do artigo, e pela eleição directa; fazendo estas questões verdadeiramente ministeriaes. Ora parece-me que foi por todos reconhecido, que daquellas palavras tal senão podia concluir nem colher; e muito menos que o Sr. Deputado entendesse, que o nobre Duque tivesse declarado nossa Sessão a questão ministerial, e ainda mesmo que d'aí se tivessem tirado algumas allusões neste sentido, estava claro, que nunca fôra intenção do nobre Duque declarar a questão ministerial. Na verdade isto deve convencer a Camara de que os Deputados vendo que os argumentos que se apresentaram, não tinham resposta, lançaram mão desta arma, que não serve senão para introduzir a sizania e a intriga entre os Collegas, e entre o Governo, e não para destruir as razões apresentadas, que não teria duvída nenhuma de tornar a repetir.

O Sr. Corrêa Caldeira: — Sr. Presidente, a Camara está deserta, mas eu não posso deixar de fazer algumas observações, visto que tenho a palavra para Explicação. Principio por lamentar, que duas vezes tenha sido obrigado a dar Explicações nesta Camara, por causa do mesmo individuo, alludo ao nobre Deputado por Vizeu...

O Sr. Avila: — Sr. Presidente, eu fui inscripto para Explicações depois do nobre Deputado, e V. Ex.ª deu-me a palavra com preferencia a elle.

O Sr. Presidente: — Eu peço perdão para lhe dizer, que não tem fundamento a sua indevida interrupção e censura. Aqui está a relação ou quaderno que contém as inscripções, sem emenda, por onde se vê que eu inscrevi o Sr. Deputado, e lhe dei a palavra, segundo a resolução da Camara, na ordem que lhe competia.

O Orador: — Este incidente é mais uma prova da exactidão do que acabou de dizer o meu illustre Amigo que me precedeu, quando comparou o nobre Deputado a um jasmim; eu todavia modificarei a comparação, dizendo que o nobre Deputado é uma sensitiva sempre que se tracta delle, e é um tojo bravo sempre que se tracta dos outros. O nobre Deputado que vem dar lições de cortezia, falla sempre de um modo improprio, não só para com a Camara, mas para com os individuos que se levantam e usam da palavra para defenderem principios, que não sejam os do illustre Deputado. Eu podia appellar até para V. Ex.ª mesmo, que não será talvez a primeira vez que seja offendido pelo nobre Deputado: porém... posto isto de parte, tractarei do objecto especial para que pedi a palavra.

O nobre Deputado por Vizeu seguindo-se-me na ordem da discussão, fez o favor de me attribuir duas injurias, e uma descortezia...

O Sr. Avila: — Eu já declarei que retirava tudo quanto podesse offender o Sr. Deputado, e parece-me que assim estavam dadas todas as satisfações de Cavalheiro para Cavalheiro.

O Orador: — O que o nobre Deputado retirou, foi o que me attribuira com relação aos illustres Membros da Commissão Eleitoral, mas ficaram em pé as imputações que me fez com referencia ao Sr. Presidente do Conselho, a um illustre Deputado, para com o qual me suppoz descortez, e em fim as palavra de que se serviu, quando alludiu ás intenções do meu voto; o que lhe era absolutamente prohibido pelo Regimento.

O nobre Deputado disse, que eu tinha começado o meu Discurso por fazer uma injuria atroz ao nobre Presidente do Conselho, declarando-o em flagrante contradicção perante a Camara. A fallar a verdade não sei como qualificar o procedimento do nobre Deputado para comigo, eu não tinha dicto uma só palavra que offendesse o Presidente do Conselho; a accusação que o nobre Deputado produziu contra mim foi por tanto toda graciosa da sua parte. A primeira cousa a notar é, que não ha injuria sem intenção; e o nobre Deputado nem podia com justiça attribuir-me similhante intenção, nem podia alludir ás minhas intenções, ainda supposto, mas não concedido, que eu tivesse proferido palavras que podessem parecer offensivas ao Sr. Presidente de Conselho. O nobre Deputado attribuiu-me (repito) o

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facto e a intenção de apresentar o Sr. Presidente do Conselho como contradictorio nesta Casa, eu protesto neta Explicação contra similhante interpretação, que o nobre Deputado deu ás minhas palavras, desfigurando-as, ou alterando-as: não quero dizer que o Sr. Deputado foi desleal, mas direi, na frase do Regimento, que foi menos correcto. Eu bem sabia, como sabe o nobre Deputado, que nunca foi declarado ministerial este celebre debate eleitoral, começado já pelo art. 63 da Carta, e continuado pelo art. 1.º do Projecto n.º 48, eu bem sabia, como sabe o nobre Deputado, que se acaso o illustre Presidente do Conselho tivesse feito a questão ministerial o anno passado, e agora a não fizesse, então poderia ter caído n'uma contradicção, ora se isto assim é, como podia o nobre Deputado vir ao menos com plausibilidade, com verosimilhança, attribuir-me uma injuria, que além de fundada em falsidade de facto, não podia por mil outras razões e considerações, passar ao menos pelo meu pensamento? Pelo menos significa este modo de proceder absoluta falta de benevolencia da parte do nobre Deputado para comigo, e eu tenho a convicção de que não merecia ser assim tractado pelo nobre Deputado.

A segunda accusação que o nobre Deputado me fez é, que eu injuriara os Membros da Commissão Eleitoral (e não sei mesmo se a Maioria da Camara) chamando-lhes revolucionarios e anarchistas — nesta parte escuso de dar Explicações, porque o nobre Deputado retirou todas as palavras que tinha dito, mas sempre lembrarei que receando já quando estava fallando que as minhas palavras não fossem ouvidas, repeti em voz bem alta — «Note-se que não chamo revolucionarios nem os Illustres Membros da Commissão, nem os que seguem igual opinião, digo sómente, que na douctrina da 1.ª parte do art. 1.º do Projecto em discussão, os illustres Deputados abraçaram o Credo, a douctrina revolucionaria.»

Apezar desta prevenção não pude evitar que o illustre Deputado pertendesse lançar sobre mim o odioso, de que eu chamara revolucionarios e anarchistas, aos Membros da Commissão Eleitoral.

A terceira parte da accusação, a que respondo; é a descortezia que o illustre Deputado me attribuiu, para com outro illustre Collega nesta Casa, que sinto não ver presente quando lhe notei que tendo votado o anno passado pela constitucionalidade do art. 63, votasse agora pela eleição directa.

O Sr. Avila: — Foi palavra que não disse.

O Orador: — Se S. Ex.ª não disse isto, então cessou a necessidade da minha explicação neste ponto, mas parece-me, que ainda tenho nos meus ouvidos as seguintes palavras — que eu fora descortez quando affirmava que aquelle Sr. Deputado não expozera á Camara as razões, que modificaram a sua opinião.

O Sr. Avila: — Taes palavras não disse.

O Orador: — Basta; visto que o Sr. Deputado insiste em que tal não disse, acabou-se esta questão.

Agora vamos aos motivos máos. S. Ex.ª sabe perfeitamente, que é prohibido em termos expressos pelo Regimento, que na discussão se alluda a motivos máos, qualquer que seja a opinião, que um Deputado defenda, ou sustente, mas o Sr. Deputado disse «eu bem sei a razão, porque o Sr. Deputado vota pela eleição indirecta, é porque tem saudades do tempo antigo.»

O Sr. Avila: — Não disse tal.

O Orador: — Então acabou-se, se tambem não disse isto, então acabou-se a questão.

O Sr. Avila: — Peço licença. O Sr. Deputado tinha dicto, que nós, a Commissão, tinhamos acceitado o credo anarchista, e eu disse, que tendo examinado o Projecto, não lhe achava principio nenhum, que merecesse esta imputação, e que talvez o principios que se achavam no Projecto, que merecessem esta imputação, fossem as provisões para manter o sigillo do escrutinio, e para evitar, que as Auctoridades forçassem a consciencia dos Eleitores, e por esta occasião accrescentei, que talvez o nobre Deputado tivesse saudades do tempo, em que o segredo da Urna não era respeitado, e em que as Auctoridades impunham a Lei aos Eleitores: mas apenas o nobre Deputado explicou o seu Discurso, eu declarei, que retirava tudo o que o tivesse podido offender, e fiz-lhe um elogio, que retiro agora.

O Sr. Corrêa Caldeira: — Dispenso os seus elogios.

O Sr. Avila: — Retiro agora, porque o Sr. Deputado não entende essa lingoagem. O Sr. Deputado tinha dado uma explicação, que era tão offensiva, como a frase a que se alludia, porque nessa explicação continuava a dizer, que nós tinhamos acceitado o credo dos anarchistas, e eu tive a generosidade de me dar por satisfeito, e de retirar tudo o que tivesse dicto, que tivesse desgostado o Sr. Deputado: entre Cavalheiros estavam dadas as explicações, mas o Sr. Deputado não entende esta lingoagem, e eu não posso ensinar outra ao Sr. Deputado nesta Casa. Eu felicitei o Sr. Deputado pela explicação que havia dado, felicitei-me a mim, e felicitei a Camara por tal acontecimento; appello para os Srs. Deputados que me ouviram nessa occasião, digam elles senão foi esta a minha lingoagem. (Apoiados) Portanto torno a dizer, entre Cavalheiros, as explicações estavam dadas, e não era no fim de dez dias que o Sr. Deputado devia vir renovar este assumpto, servindo-se da lingoagem, que empregou. O Sr. Deputado devia saber, que quando se retira uma frase, é o mesmo que se essa frase não tivesse sido pronunciada.

O Sr. Corrêa Caldeira: — Em vista do que o Sr. Deputado acaba de dizer, asseverando, que retirou tudo o que tinha dicto, não quero continuar porque lhe abandono tolo o merito da linguagem, que usa. O Sr. Deputado affirma que retirou todas as expressões que julgou offensivas, mas eu entendi, e entenderam muitos que ficara em pé a imputação que me fora feita com relação ao nobre Ministro do Reino, a supposta descortezia, e as taes saudades do tempo em que se viciava o escrutinio.

O Sr. Avila: — Não deixei em pé cousa alguma, porque disse que retirava tudo.

O Sr. Correa Caldeira: — Não, não; ficou em pé a allusão que dirigiu a respeito do meu comportamento, ou que alguem poderia reputar a elle allusiva, e eu quero dizer bem alto, na minha vida publica, no desempenho das minhas funcções tenho a consciencia de não ter uma só vez faltado ao meu dever, fazem-me essa justiça todos os Partidos Politicos, eu posso ter mais sympathia por um do que por outro Partido, mas nunca por isso fallei aos deveres que a Lei e a minha consciencia me impõe, nem para com os Partidos, nem para com os individuos, accrescento mais, que no exercicio do meu

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emprego, e em todas as relações da minha vida publica, sempre que sem quebra do meu dever tenho tido occasião de ser officioso e obsequioso para com individuos das differentes cores politicas, sempre o tenho sido; e o Empregado Publico que procede desta maneira, não merece que se lhe faça a allusão, injustissima de approvar o methodo indirecto, porque tem saudades do tempo em que se carimbavam listas, em que se viciava o segredo do escrutinio, em que se coegiam os Eleitores. Sr. Presidente, estas allusões se são lançadas sobre o meu Pai tido, rejeito-as em nome d'elle; se são sobre mim, rejeito-as tambem com indignação; porque não commetti nunca, porque nunca hei-de commetter fraudes e crimes, e porque não posso tolerar que se pertenda assim lançar suspeitas sobre o meu caracter, que se façam semilhantes allusões por parte de pessoas que deviam pezar as suas palavras, e que julgam remediar a inconveniencia e injustiça das que proferem declarando extemporaneamente, e desde que produziram effeito, que retiram o que disseram!... O Sr. Deputado accrescentou quando retirava as suas expressões offensivas e injustas, que tinha por mim especial simpathia Se o Sr. Deputado costuma mostrar as suas sympathias do modo porque as tem manifestado para comigo, quero que o Sr. Deputado saiba que prescindo absolutamente dellas e d'elle.

O Sr. Avila — Eu tinha direito de me queixar de V. Ex.ª por ter collocado o Sr. Deputado em um logar para a sua explicação, que não lhe pertencia. (O Sr. Corrêa Caldeira: — Foi a decisão da Camara.) O Orador — O Requerimento do Sr. Deputado, foi para quem quizesse fallar a favor, ou contra o artigo, e não para as explicações. (Uma voz: — Foi para tudo) O Orador: — E quando V. Ex.ª leu a lista das pessoas que tinham pedido a palavra para explicações, eu não ouvi o nome do Sr. Deputado.

O Sr. Presidente: — Convido o Sr. Deputado a vir lêr a inscripção tal qual se acha no Quaderno da Mesa, feita com todo o cuidado, para ver se esta ou não o nome do Sr. Deputado. Eu não consinto, que se me faça essa injuria, porque eu não sou capaz de apresentara inscripção viciada (Apoiados.)

O Sr. Silvo, Cabral: — Peço a palavra; eu vou tomar a satisfação ao Sr Deputado.

O Sr. Avila: — Eu não respondo ao Sr. Deputado, porque não foi a S. Ex.ª que me dirigi; estou prompto a dar satisfação, mas e á Mesa.

O Sr. Presidente — O Quaderno das inscripções esta patente a todos os Srs. Deputados, sem emenda alguma, porque eu tenho o maior cuidado em inscrever os Oradores, para que não hajam estas scenas (Apoiados)

O Sr. Avila: — Mas o Sr. Deputado pediu a palavra antes de mim.

O Sr. Presidente: — Não foi só o Sr. Deputado, ha outros mais que a pediram, mas a inscripção foi feita nas duas columnas de pro e contra conforme a votação da Camara, e tenho dado a palavra alternadamente.

O Sr. Avila: — Eu não entendi assim.

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado devia entender assim a votação da Camara (Apoiados.)

O Sr. Avila: — Sr. Presidente, eu quero responder ao que o Sr. Deputado disse, que eu queria compromette-lo para com o Sr. Presidente do Conselho, lembrando-lhe, que S. Ex.ª achava-se presente, quando o Sr. Deputado fallou, e que portanto não podia fazer obra pelo que eu tinha dicto, senão fosse exacto, mas sim pelo que S. Ex.ª ouvira ao Sr. Deputado. Eu ouvi ao Sr. Deputado dizer, que a Opposição estava em maioria na Commissão, e que os conselhos da Opposição nem esclareciam nem salvavam; isto é que é entrar demais nas intenções; e isto vem escripto no Diario do Governo. O Sr. Deputado disse, que nós tinhamos abraçado o credo dos anarchistas, e na sua explicação não fez senão confirmar o que tinha dicto; eu dei-me por satisfeito, porque quiz ser generoso com o Sr. Deputado; mas na realidade nenhum de nós ficou satisfeito com tal explicação, que nos collocou ainda em peior situação, porque nos dava a entender, que alem de anarchistas eramos tidos por tolos; porque estavamos com os anarchistas sem saber que o estavamos: mas eu dei-me por satisfeito com a explicação do Sr. Deputado, porque não o queria collocar em máo campo, nem continuar uma questão irritante: e depois de o ter tractado com a maior urbanidade disse, que retirava tudo o que linha dicto, que podesse offender o Sr. Deputado. — Disse, ou não disse isto?.. (Vozes: — Disse.) Sr. Presidente, eu faço juizes aos meus Collegas que me ouviram. Mas eu vejo que o illustre Deputado esta ainda com o mesmo calor que então teve, e se quizesse dar uma prova de que me não queria offender, no mesmo momento em que acaba de ouvir pelo testemunho de Deputados inscriptos, que as cousas se passaram como eu as descrevi, devia declarar, que sentia não me ter ouvido, e que se arrependia do que tinha feito. (O Sr. Corrêa Caldeira: — Ainda!) avalie a Camara por este áparte o Sr. Deputado. Isto é o que eu tinha feito no seu logar; porque ninguem tem culpa de não ser ouvido pelo Sr. Deputado. Mas o Sr. Deputado apesar de todas estas explicações continua ainda a offender-me, e não tem senão uma desculpa, e é a de que quando julga ferido o seu amor proprio, não vê, nem ouve, parece não estar no uso pleno das suas faculdades fysicas, e intellectuaes... (Vozes — Ordem, O idem.) (O Sr. Corrêa Caldeira dirigindo-se para a Presidencia: — Peço a V. Ex.ª que não consinta similhantes cousas (Apoiados.)

O Sr. Avila: — Mas quaes são essas cousas, que o nobre Deputado não quer «que o Sr. Presidente consinta?..

O Sr. Corrêa Caldeira: — E o que diz respeito ao uso pleno e perfeito das faculdades fysicas, e moraes..

O Sr. Avila: — Esta frase não tem a accepção, que o Sr. Deputado lhe deu... (Riso)

O Sr. Corrêa Caldeira: — É uma frase que contém em si uma perfeita injuria (Apoiados.)

O Sr. Avila: — Eu termino dizendo que o nobre Deputado póde dizer o que quizer daqui em diante, porque para mim é como senão existisse. (Vozes: — Ordem, Ordem.)

O Sr. Corrêa Caldeira: — Fico-lhe muito obrigado pelo favor.

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Avila ha de reconhecer, que fallou muito fóra da Ordem. (O Sr. Avila: — Reconheço); ha de reconhecer, que foi injusto quando arguiu a Mesa d'inexacta. (O Sr. Avila: — Sim, Senhor.) Agora direi, que o nobre Deputado na verdade usou ultimamente d'algumas

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frases, com relação ao Sr. Deputado Caldeira, que eu entendo que o Sr. Deputado Avila deve retirar (Apoiados), e vem a ser as frases = Se o nobre Deputado estivesse no uso pleno, e perfeito das suas faculdades fysicas, e moraes =, taes frases não são proprias desta Camara. (Muitos apoiados) e, de certo, o nobre Deputado ha de reconhecer a necessidade de retirar similhantes expressões. Assim convido o nobre Deputado para que o faça (Apoiados)

O Sr. Avila — Eu retiro esta fraze, que foi, mal interpretada, assim como todas e quaesquer expressões, que V. Ex.ª entende que não se deviam proferir nesta Casa. (Apoiados) Eu sou o primeiro a acatar a dignidade do Parlamento, sou o primeiro a retirar tudo quanto posa de algum modo ferir essa mesma dignidade, nunca concorro para estas scenas, e se alguma vez entro nellas, é porque sou a isso forçado por cousas, que aqui se dizem, e que não podia esperar ouvir nesta Casa. (Apoiados)

O Sr. Presidente: — Cumpre-me dizer quem são os Senhores que ainda estão inscriptos para explicações, e parecia-me muito mais conveniente, que antes terminassem hoje, do que passasem para uma outra Sessão. (Apoiados) Esta tambem inscripto o Sr. Guedes para um Requerimento, e o Sr. Silva Cabral, o Corrêa Caldeira, sobre a Ordem. Para explicações estão inscriptos, pela ordem alternada como correu a discussão principal, os Srs. Mexia, Pilar, Silva Cabral, Xavier da Silva, Corrêa Leal, Ministro da Fazenda, e Corrêa Caldeira

Tem por tanto a palavra para um Requerimento

O Sr. Guedes.

O Sr. J. J. Guedes: — Eu vejo que a Camara está deserta, e por isso entendo dever pedir a V. Ex.ª, que levante a Sessão; e se é preciso Requerimento eu o faço, mas vejo que não tem numero para se votar. Ora tanto mais os trabalhos devem terminar, quanto que já deu a hora, e não se votou que se prorogasse a Sessão além da hora

O Sr. Presidente: — Em primeiro logar devo advertir ao nobre Deputado que, em rigor, a hora em que a Sessão deve ser fechada, ainda não chegou, porque a Sessão não se abriu ás 11 horas, (Apoiados) e por esta occasião cumpre-me notar, que muito seria para desejar, que os nobres Deputados que são exactos na hora de fechar a Sessão, o fôssem tambem na hora da abertura da mesma Sessão (Apoiados), porque é ás 11 horas que aqui devem estar para se abrir a Sessão, (.Apoiados) e seria muito para estimar que os Srs. Deputados não faltassem a essa hora. (Apoiados) Agora quanto ao mais a Camara decidiu que tivessem logar as Explicações, o entendo, que foi debaixo da ideia de se verificai em hoje todas as Explicações. (Apoiados: — É verdade) Por tanto hoje a Camara não se póde occupar de alguma outra cousa, (Apoiados) assim como não devem transferir-se para outra Sessão as Explicações. (Apoiados)

O Sr. Silva Cabral: — Sr. Presidente, talvez alguem recrie que eu diga muitas palavras, e mesmo que me refira a tudo quanto se tem passado neste objecto de explicações; mas não é assim. O nobre Deputado já reconheceu a injustiça com que se dirigiu á Mesa: porém eu tinha entendido, que era dever desta Camara, desde que se dirigiu uma censura á Mesa, desde que se taxou de injusta, reivindicar a injustiça da Mesa (Muitos apoiados); porque não é possivel que a Camara conserve a sua dignidade todas as vezes que se não respeitem, e observem religiosamente as deliberações tomadas pela Mesa, quando essas deliberações são fundadas em justiça. (apoiados repetidos.) Eu já disse nesta Casa, e repito, que não reconheço pessoas, reconheço principios, e quando vi que o nobre Deputado, de certo por um equivoco, porque não podia deixar de ser por outra causa, se dirigiu á Mesa taxando-a d'injusta, entendi que era dever meu pedir a palavra para repellir a injuria, (Apoiados) que era injustissima, (Apoiados) por que a Mesa tinha obrado como devia (Apoiados) não sendo possivel no objecto — Explicações — seguir a mesma ordem adoptada para o Debate principal. (Apoiados) Mas quando o nobre Deputado por sua propria declaração retirou as frazes que tinha usado, reconheceu por isso a injustiça que tinha feito á Mesa, e assim esta preenchido o meu fim; porque justiça foi feita á Mesa. (Apoiados)

O Sr. Mexia: — Sr. Presidente, serei limitadissimo na minha explicação.

Tres foram os meus Discurso por occasião da controversia da constitucionalidade do Artigo, um em 27 de Março, outro em 10 d'Abril, e o ultimo em 17 do mesmo mez. O nobre Deputado por Cabo Verde, querendo collocar-me em contradicção. citou um periodo desmembrado do meu primeiro Discurso. Como nós discutimos na melhor fé, e só curamos da verdade, logo que acabou de fallar, familiarmente lhe mostrei qual a minha fiel coherencia a vista de todos os meus Discursos.

Sr. Presidente, Deos nos livre, que nó quizessemos avaliar da douctrina d'um Escriptor por um periodo em singular, ainda quando elle seja claro o terminante. E sem duvida offender as disposições e espirito das Leis o servir-se qualquer d'nma parte destacada dellas, tomando-a em sentido diverso daquelle, que lhe dá illação com o todo — diz Domat, e se apoia na boa razão, até n'uma Lei Romana. O mesmo se applica a todo e qual pior escripto.

Não admira, Sr. Presidente, que attentando-se exclusivamente a esse periodo invocado, passasse eu para o nobre Deputado por incoherente, quando pe la falta d'esta notoria regra de Hermeneutica passa em axioma, e muitas vezes como lai invocado, o que o não é V. g. Quandoguidem bónus dormitai Homerus — Homo sum, rtihil ame humani alienum puto — Estes versos desmembrados fazem dizer a Horácio e a Terencio o que elles não dizem, attendendo aos antecedentes e aos consequentes, e a todo o contexto; no entanto o sentido, que desde muitos annos um abuso lhes tem feito ligar, passa já como hereditar o até as bôca dos Sabios. Não quero ser extenso; senão eu mostrai ía como Jurisconsultos nossos, abriisados, em invocar Leis para as suas affirmativas commetteram o abuso, de que me queixo.

Sr. Presidente, á differentes o multíplices interpretações não escapou o Divino Espirito; basta dizer, que as palavras Sagradas de Jesus Christo — Hoc estenim corpus mewn — teem admittido oitenta e duas significações, segundo me lembra ter lido n'um Livro de Hermeneutica.

Sr. Presidente, o nobre Deputado sabe qual era a douctrina, que ou sustentava, e que era incompativel com ella o que destacadamente apparece nesse periodo, não se attendendo aos antecedentes e arre consequentes. Sr. Presidente, as idéas são a medulla

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do pensamento, as palavras são a sua superficie, dizem os Hermenêuticos. Olhemos côro preferencia para aquellas, e iremos sempre com mais acerto

Agradeço ao nobre Deputado a benevolencia, com que tractou os meus argumentos, e peço-lhe licença para dizer, que não é exacto o eu dar como effectivos os inconvenientes da eleição directa para a rejeitar por elles. Eu indiquei em hypothese as vantagens e desvantagens d'uma e d'outra forma de eleição; e igualmente para responder a argumentos complexos não se deve destacar um dos seus membros. Pronunciei-me formalmente pela directa em razão da preferencia, que eu mesmo mostrei merecer Nesta parte acredito, que foi lapso de redacção, involuntariamente commettido por quem quer que fez o Extracto, pois presto justiça ao nobre Deputado, para cujo testemunho e para o de toda a Camara appello em abono da fidelidade do que disse nesse Discurso a que alludo, ha tão poucos dias proferido.

O Sr. Corrêa Leal — Sr. Presidente, tendo eu votado pela não constitucionalidade do art. 63.º da Carta, poderia dizer alguem que votando depois pelas eleições indirectas estava em contradicção (Vozes Não, não) com tudo eu quero dizer muito solemnemente, que para mim ainda e convicção que o art. 63.º não é constitucional; acho que este artigo é regulamentar, pois que versa puramente sobre o methodo d'eleição; com tudo estando eu pela não constitucionalidade, não ficava obrigado, por isso, a preferir o methodo contrario ao marcado nesse artigo, nem podia sei assim; por que tambem e convicção minha, que o methodo indirecto para eleições é o melhor (Apoiados.

O Sr. Ministro da Fazenda — Sr. Presidente, eu tinha algum direito para ser tractado, pelo nobre Deputado a quem fiz allusão, d'uma maneira mais delicada; (Apoiado) mas tambem o nobre Deputado não quiz exceptuai-me, afim de que me acontecesse a mim o mesmo que acontece a todos que entrem em discussão com o nobre Deputado, que ficam sempre com pouca vontade de se encontrarem em discussão com S. Ex.ª — Tambem, eu fui tractado pelo nobre Deputado como descortez (O Sr. Avila: — Não foi tal) (Riso) O Orador: — O nobre Deputado disse que eu tinha pouca cortezia.

O Sr. Avila: — Não Senhor, eu repito o que disse, se V. Ex.ª da licença, não quero que pense que o censurei de mal educado, eu disse que me parecia que os deveres da cortezia deviam levar o nobre Ministro á convicção etc.

O Orador: — Isto não veio senão para não deixar passar sem alguma observação uma idéa, que a fallar a verdade não é propria do cavalheirismo do nobre Deputado, nem da sua educação.

Mas sobre o objecto em que o nobre Deputado sr explicou, lealmente eu fiz a allusão que lhe disse eu tinha feito; e parece-me que o nobre Deputado não tinha muita razão de se offender, porque a questão é sabei se por ventura o Sr. Antonio José d'Avila era Membro ou não do Ministerio de que era Presidente o Sr. Joaquim Antonio d'Aguiar. (O Sr. Avila. — Sim, Senhor, era). Então se isto assim é, pergunto, como podia o illustre Deputado naquelle tempo, Membro já de um Ministerio Solidario, recusar a responsabilidade de uma proposição, que o Presidente désse Ministerio aqui apresentou na Camara? O Presidente do Conselho disse então (Leu). (O Sr. Aula — Mas as minhas frases) O que aconteceu com este Projecto de Foraes? O Sr. Visconde de Castellões, então Ministro da Fazenda, veio aqui apresentar um Projecto que toda agente considerou que era Projecto do Governo, e sendo interpellado a respeito delle, o illustre Cavalheiro de quem fallo, teve a franqueza de dizei que o Projecto era Ministerial; mas sabia-se a opposição que se fazia ao Projecto por causa das bases sobre que elle era feito, porque se queria um Projecto mais liberal, e o illustre Cavalheiro de quem fallo, teve de se retirar declarando na Camara que o Projecto era unicamente seu, e então já se vê, Sr. Presidente, a razão porque se veio depois dizer que o Projecto dos Foraes não era um Projecto Ministerial, dando-se depois seguidamente o sentido que se entendeu que se devia dar para não perigar o Ministerio, de que o Ministerio adoptava todas as modificações que se lhe quizessem fazei, porque o que queria, era unicamente acompanhar a discussão, mas debaixo deste sentido annunciado aqui pelo Presidente do Conselho de que elle não fazia questão de Governo sobre o Projecto, que era uma questão eminentemente nacional. Por tanto parece-me que eu não podia ser censurado pelo illustre Deputado por apresentar aqui o termo de comparação daquillo que o nobre Deputado queria agora, e daquillo que o nobre Deputado quiz quando era Ministro da Fazenda do Ministerio, de que era Presidente o Cavalheiro, que em nome de todo o Governo declarou não ser aquella Lei questão Ministerial... (O Sr. Avila — Eu expliquei as frases do Presidente do Conselho). Peior, porque então de duas uma — ou o Presidente do Conselho quando apresentou aqui uma opinião, que não era de todos os seus Collegas, faltava á verdade, ou era ella de todos os seus Collegas, inclusivè o nobre Deputado, e então o nobre Deputado depois se arrependeu, pondo-se em contradicção com elles.

O Sr. Corrêa Caldeira: — Eu pedi de novo a palavra, porque o Sr. Deputado que fallou depois de mim, repetiu que eu quizera injuriar os Membros da Commissão Eleitoral. Torno por tanto a affirmar, que nem a minha educação, nem os meus sentimentos, nem a minha posição consentem que eu offenda pessoa alguma. Invoco o testimunho da Camara para ficar bem, e irrecusavelmente estabelecido que não proferi no meu Discurso uma palavra que fosse offensiva, nem para o Sr. Presidente do Conselho, nem para o Ministerio, nem para algum dos Membros da Commissão, nem para a Camara, nem mesmo ao Sr. Deputado que me provocou tão excessiva, e tão immerecidamente.

Sr. Presidente, reputo necessaria esta declaração foi mal que faço, para que seja ella unica e exclusiva resposta ao que todos acabamos de ouvir. — Se as minhas palavras não fossem sufficientemente claras, como são, accrescentaria apenas que nunca tive a intenção de offender com ellas alguem, e por isso nem os Membros da Commissão; e todos sabem, Sr. Presidente, que não póde haver injuria sem intenção.

O Sr. Presidente: — Estão acabadas as Explicações, porque os Srs. Deputados que não estão presentes, e que tinham a palavra, perderam o direito a explicarem-se. A Ordem do Dia é a continuação da mesma; com a declaração de que na primeira parte ha de continuar a dicussão do Parecer n.º 6, e na

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segunda parte a dos Projectos n.º 103, e n.º 48. Fique entendido de uma vez para sempre, que a primeira parte da Ordem do Dia só dura ale ás duas horas, e d'ahi por diante é a segunda parte. Está levantada a Sessão. Era mais das quatro horas e meia da tarde.

O 1.º Redactor,

J. B. GASTÃO.

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