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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
çamento de 1867-1868 foram pedidos 1.000:000$000 réis para aquellas estradas e 250:000$000 réis para estas, differença para menos 420:000$000 réis. É bastante sensivel esta differença, e só póde justificar-se em presença das graves difficuldades com que ha muitos annos luta o nosso thehsouro.
Se fizermos a leitura do relatorio de um dos mais illustrados ministros que têem gerido a pasta das obras publicas, publicado em 1869, conhecer-se-ha que ha pouco mais de um anno tinhamos a construir 30:000 kilometros de estradas segundo as cartas de lei de 15 de julho de 1862 e 14 de novembro de 1864, e as classificações já feitas comprehendendo-se n'ellas 20:000 kilometros das municipaes, e se estivermos pela opinião d'aquelle illustre estadista ser-nos-ha necessario levar oitenta annos para construirmos os 30:000 kilometros que nos faltam, visto que a media da construcção n'estes ultimos annos tem sido de 365 kilometros por anno.
Isto, senhores, depois de enormes sacrificios que temos feito, depois de termos gasto 16,000:000$000 réis (desde 1852) com as estradas, 20.000:000$000 réis com os caminhos de ferro e 1:500:000$000 réis com as estradas das ilhas adjacentes, isto é, 37.000:000$000 réis em dezesete annos!
Mas se os sacrificios têem sido enormes, nem por isso deixam de ser bem merecidos.
A facilidade das communicações não é uma questão de riqueza material, é tambem e sobretudo uma questão de civilisação e liberdade. Assim se expressava ha pouco tempo um dos vossos homens d'estado. A construcção das estradas concelhias e vizinhaes precisa de um grande impulso e reclama providencias muito energicas e decisivas. Sem estas estradas e sem os ramaes ás estações dos caminhos de ferro, não podem estas nem as estradas reaes corresponder aos grandes sacrificios que a nação fez para construir esses caminhos de ferro, essas estradas reaes e districtaes.
As cartas de lei de 15 de julho de 1862 e 6 de junho de 1864 prestaram um valiosissimo serviço á viação publica. A lei de 6 de junho, especialmente, tem dado muito bons resultados, embora na pratica tenha offerecido uns obstaculos, como era natural, obstaculos que devemos opportunamente e com perfeito conhecimento de causa remover, guiando-nos pela experiencia d'estes ultimos annos.
Posteriormente á promulgação d'aquellas duas leis, veiu o decreto de 30 de outubro de 1868 que organisou as repartições de obras publicas districtaes.
Á confecção d'esta lei não podia deixar de presidir, como presidiu, fazendo a devida justiça ao illustre ministro que a referendou, o maior zêlo pelo serviço publico; e por certo o nobre ministro, animado dos mais louvaveis desejos e das melhores idéas, entendeu que das suas disposições deviam brotar os mais proveitosos resultados: não aconteceu porém assim.
Por mais luminosas que sejam as idéas do legislador, por mais louvaveis que sejam os seus intuitos, a experiencia muitas vezes encarregar-se de demonstrar que o resultado não podia corresponder á expectativa, e por isso, ou a lei deve ser revogada ou modificada, segundo a experiencia indicou. Acontece isto muitas vezes, e nem por isso a opinião publica recebe com desfavor o nome do ministro, quando reconhece a indispensabilidade de revogação da medida ou modificação de algumas das suas disposições.
A execução d'este decreto de 30 de outubro veiu annullar em grande parte as sabias disposições das leis de 15 de julho e 6 de junho, é dever nosso
confessa-lo.
As camaras e concelhos municipaes assim o declaram nas suas representações que têem dado entrada camara dos senhores deputados, e muitos dos meus collegas no parlamento se associam ao pensamento de algumas representações e pedem tambem a revogação do dito decreto.
Queixam-se as camaras e os concelhos municipaes do continente e ilhas de que o supracitado decreto, creando a engenheria districtal, em vez de contribuir efficazmente para o augmento da viação municipal, tem pelo contrario sido um constante obstaculo ao seu desenvolvimento, e um inutil gravame para os concelhos que se vêem obrigados a subsidiar repartições que elles julgam absolutamente dispensaveis.
Têem rasão as camaras peticionarias. As rasões que ellas allegam são justas, e verdadeiros os seus argumentos.
As camaras municipaes têem muitos fundos em cofre, pretendem construir as suas estradas, precisam dar trabalho aos braços que se perdem na ociosidade, e não podem consegui-lo, e ninguem contestará que os dinheiros que existem em cofre não significam um desperdicio, por se conservar ali um capital morto, em detrimento da viação municipal!...
Ainda ha poucos dias foi publicado pelo ministerio do reino um mappa que nos certifica a existencia de valiosos fundos nos cofres municipaes, importando esses fundos em 450:000$000 réis com applicação á construcção das estradas de 3.ª ordem.
Qual é a rasão por que existe uma somma tão forte n'alguns cofres, sendo certo que a viação municipal só lentamente se desenvolve?
Qual é a rasão porque no districto de Faro, estando só em construcção 10 kilometros, existem nos cofres municipaes 40:000$000 réis approximadamente?
E no districto da Guarda, não constando que esteja em construcção kilometro algum de estrada, existem comtudo nos cofres municipaes 12:000$000 réis?
No districto do Leiria, onde não chegam a estar em construcção 2 kilometros, nos cofres existem 23:000$000 réis!
No districto de Lisboa, onde não chegam a estar 3 kilometros em construcção, existem nos cofres 38:000$000 réis!
Em Portalegre, 8 kilometros, e nos cofres 46:000$000 réis!
Em Vianna do Castello, 1 kilometro, e nos cofres réis 23:000$000!
Em Villa Real, 3 kilometros, e nos cofres 20:000$000 réis!
Em Vizeu não chega a 4 kilometros, e nos cofres réis 43:000$000!
Deixo a pessoa mais competente e auctorisada a resposta a estas perguntas. O que é certo, senhores, é que esta questão, sendo da mais alta importancia, precisa ser resolvida com a maior urgencia e merece a vossa particular attenção. O mal existe, e importa remedia-lo.
Representam mais aquellas illustres corporações, nos termos mais cortezes e convenientes, que os estudos e orçamentos de obras municipaes lhes ficam successivamente caros, quando as municipalidades podiam conseguir esses trabalhos muito mais baratos, subsidiando apenas o pessoal technico quando carecessem do seu serviço.
As camaras que têem representado são as seguintes: Coimbra, Santarem, Leiria, Beja, Angra do Heroismo, Faro, Guarda, Lamego, Loulé, Extremoz, Goes, Caminha, Crato, Barreiro, Seixal, Poiares, Villa Verde, Elvas, Cintra, Arruda, Estarreja, Villa Nova de Foscôa, Mourão, e outras.
Para melhor esclarecer a questão e mostrar a justiça que assiste aos referidos municipios, consignarei n'este relatorio alguns excerptos das suas representações.
Pelo seguinte mappa se vê evidentemente que as sommas destinadas para a viação municipal, e em conformidade da carta de lei de 6 de junho de 1864, são, em grande parte, absorvidas com a sustentação infructuosa das repartições de obras publicas districtaes, o que alem de ser um desperdicio é reconhecidamente prejudicial ao desenvolvimento da viação.