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Discurso que devia ler-se na sessão n.° 13 d'este vol. pag. 168, col. 1.ª, lin. 57.

O sr. Abilio Costa: — Eu mando para a mesa a seguinte substituição ao artigo 2.° (Leu.)

Eu creio que quando se trata de organisar uma repartição d'esta ordem, o nosso ti in é dotar o poro portuguez com todas as providencias, que conjuntamente com os meios therapeuticos possam concorrer para que elle gose daquelle gráu de saude compativel com as nossas condições locaes e sociaes: parece-me que este é o pensamento da commissão e de nós todos.

Para isto não basta, sr. presidente, quase determine se as providencias de tal ou tal paiz devem ser permanentemente ou temporariamente sujeitas ao regimen sanitario, e não basta mesmo que se determine as medidas e regras a seguir nos lazaretos, portos, costas e outros logares reservados; não basta que se adoptem certas medidas que a invasão ou receio da invasão de uma molestia pestilencial póde tomar necessarios; não basta mesmo que se exerça a policia mais vigilante sobre todos os generos de consummo, e principalmente sobre as aguas potáveis; não basta que se propaguem a vaccina e os soccorros aos afogados e asphixiados, e que se ponha em acção tudo quanto póde dictar a policia sanitária; é necessario mais alguma cousa, é necessario tambem que se tomem providencias sobre o exercicio da medicina e profusões annexas, como pharmaceuticos, parteiras, etc., a fim de que o cidadão não encontre a morte quando procura a saude; é necessario regulamentos para o uso dos remedios secretos, e sobre o uso das aguas mineraes e maritimas; e necessario tudo isto que se chama policia sanitária, t como corollario do que acabo de dizer, não posso aceitar o artigo 2.º do projecto, por isso que este artigo está concebido de maneira tão vaga e indefinida, que das suas palavras não se conhece explicitamente quaes as attribuições do conselho, nem ellas comprehendem tambem a policia medica; e nada admiraria em presença da redacção do artigo que o conselho se recusasse a fazer qualquer regulamento de policia medica quando este lhe fosse incumbido. É por isso que mando para a mesa a presente substituição. N'esta substituição não se admirem os meus collegas de que eu desça a particularidades, que só apresento como exemplo.

Eu podia exemplificar a policia medica e sanitária com assumptos mais importantes, como os lazaretos e policia dos portos, etc.; mas estes assumptos estou certo que não esquecerão á repartição de saude, e os exemplos que apresento tem por fim principalmente chamar a attenção do governo sobre assumptos especiaes que parecem ler esquecido, e dos quaes muito depende a saude dos habitantes das provincias e principalmente das aldeias Acho-me em condições que me obrigam a proceder assim.

Eu, sr. presidente, nasci no campo, vivo no campo e espero morrer no campo, e ali exerci por alguns annos a clinica medica, sou deputado por um circulo rural; e por consequencia estou nas circumstancias de apontar algumas medidas que se devem tomar a respeito da saude dos povos das provincias, e até creio que as minhas condições especiaes me impõem essa obrigação. Entendi que tratando-se de policia sanitária, devia lembrar a necessidade de maior inspecção sobre os alimentos e todos os artigos de consummo, não esquecendo a policia das fontes de aguas potaveis. Inda ha pouco, quando marchava para a capital, vi estar a vender peixe podre, e com isto não quero censurar o administrador do concelho, porque nada me custa a crer que elle ignorasse o facto, em vista da nossa viciosa administração. A observação tem-me mostrado que uma grande parte das molestias nos campos e devida á impureza e falta de policia sobre as fontes das aguas potaveis.

Ainda não ha muito tempo, sr. presidente, que eu tive noticia de uma epidemia que devastou um antigo concelho da Beira, e parece-me que não se podia attribuir a outra cousa senão ao estado da impureza das aguas das fontes.

As povoações da Beira, sabem quasi todos que são collocadas em altos logares, arejadas, e mesmo algumas arborisadas; emfim ha ali todas as condições para serem sadias. Mas ha frequentes apparições de epidemias em algumas d'estas povoações; as fontes em algumas d'essas povoações estão collocadas nos lados das ruas onde se lançam as estrumeiras, e em nivel muito inferior aos das ruas, e por esta condição de posição, os liquidos e saes produzidos por decomposições pútridas, facilmente se misturam com as aguas das fontes e lhe communicam suas propriedades nocivas á saude publica; estes effeitos, não se tornam tão sensiveis no inverno: ena primavera, porque a estação não favorece o desenvolvimento d'essas epidemias, mas na estação calmosa, pela diminuição das nascentes, estes principios nocivos acham-se mais concentrados, e não admira que conjuntamente com o calor da estação e outras cousas que escuso agora referir produzam os estragos que por vezes tenho observado; ainda não ha muito que eu soube que n'uma povoação a desynteria reinava só na pai te que fazia uso da agua de uma fonte, em quanto a outra da povoação se achava livre; eu podia referir outros factos d'esta ordem.

Apresentei este exemplo, esperando que o governo e o novo conselho de saude tenham em consideraçao a esse objecto, que não deixa de ser muito importante. E espero que o governo e conselho não prestem attenção só ás grandes capitaes! mas dirijam tambem as suas vistas para. as provincias e aldeias, onde tambem ha cidadão muito prestáveis, que com o seu arduo trabalho muito concorrem para o augmento da producção e riqueza do paiz, e tem direito, a exigir que se véle pelo seu bem estar, até para. repellir essa proverbial censura que nas provincias se faz ao governo de não curar senão das grandes cidades, e aos srs. deputados de que em vindo para Lisboa, passam o Lethes e se esquecem das provincias; censura que não é exacta mas que não deixa de se apoiar sobre alguns factos, embora devidos a outras causas.

Agora, sr. presidente, seja-mo tambem licito chamar a attenção do governo sobre a necessidade de crear cirurgiões ministrantes nas parochias ruraes, que existiram legalmente em outro tempo, e existem ainda hoje de facto, e a que vulgarmente se dá o nome de barbeiros por accumularem ali este officio.

Essa primeira ordem da hyerarchia facultativa foi extincta por uma lei especial, e não posso saber qual a rasão por que foi extincta, e só me lembra que seria essa tendencia que têem os legisladores entre nós, de fazerem leis só com os olhos fitos nas grandes cidades esquecendo as aldeias. O legislador reconhecendo que esses homens eram inuteis nas cidades onde ha medicos e cirurgiões, e mesmo nas villas onde ha facultativos, decretou por lei a sua extincção, mas como a lei da necessidade é mais forte que todas as leis, estes homens continuam a existir nos campos, e nem póde deixar de ser assim.

Sr. presidente, a observação clinica mostrou-me que nas parochias ruraes, o exercicio da arte de curar não póde prescindir d'esta genio. Os medicos ou cirurgiões são poucos e ás vezes não ha um só em cada concelho; uma epidemia que ataque uma povoação, basta muitas vezes para ocupar um facultativo, em tempos ordinarios mesmo, o medico não póde tratar todas as molestias só locaes de um concelho inteiro; seria possivel que o medico furasse todos os abscessos, tratasse de todas as contusões, reduzisse todas as luxações e fracturas tão frequentes nos campos, e assistisse com frequencia e assiduidade a todas as molestias, mesmo as mais vulgares? era possivel que um homem podesse fazer tal serviço, n'um concelho que hoje tem quatro e cinco leguas de area? não póde ser, era preciso ser immenso. De mais ainda que um tal serviço fosse possivel, o medico não o poderia fazer sem sacrificar a sua dignidade e os seus