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N.º 21. Sessão em 24 de Março 1849.

Presidencia do Sr. Rebello Cabral.

Chamada — Presentes 60 Srs. Deputados.

Abertura — Á meia hora depois do meio dia.

Acta — Approvada.

Correspondencia.

Officios. — 1.º Do Ministerio da Fazenda, remettendo a cópia da consulta do tribunal do thesouro publico, sobre o requerimento, em que a camara municipal de Coimbra pede se lhe concedam duas propriedades nacionaes que menciona. — Á commissão de Fazenda.

2.º Do mesmo Ministerio, remettendo um mappa dos porcos que se despacharam na alfandega das sete casas, satisfazendo deste modo ao requerimento do Sr. Deputado Lopes de Lima, feito em sessão de 5 do corrente. — Para a secretaria.

3.º Do Ministerio da Justiça, remettendo o mappa com esclarecimentos relativos ao numero e vacaturas das dignidades, canonicatos, etc. — Para a secretaria.

4.º Do mesmo Ministerio, remettendo um exemplar do mappa estatistico das congruas parochiaes; satisfazendo deste modo ao requerimento da commissão Eleitoral. — Á commissão Eleitoral.

5.º Do Sr. J. da Costa Xavier, participando que por molestia não comparece a esta sessão, e talvez a mais algumas. — Inteirada.

Tambem se mencionou na mesa

Representações. — 1.ª Da camara municipal do concelho de Alemquer, pedindo que na lei das estradas, que actualmente se está discutindo, se consigne a do Carregado ás Caldas da Rainha, Alcobaça, etc, etc, por Alemquer e Obidos. — Á commissão Especial de Estradas.

2.ª Da direcção da companhia lisbonense de illuminação a gaz, expondo as difficuldades com que tem luctado, e lucta ainda, para levar a effeito o objecto da sua empreza, e pedindo a antecipação de doze prestações mensaes de 4:000$000 réis cada, uma, para ser amortisada pelas futuras mezadas que tiver a receber, passado o anno deste adiantamento. — Á commissão de Administração Publica, ouvida a de Fazenda, sendo preciso.

3.ª Dos lavradores do concelho d'Obidos, pedindo efficazmente uma lei que reduza os tributos, com que estão onerados os nossos vinhos e agoas-ardentes. — Á commissão Especial dos Vinhos.

4.ª Dos proprietarios moradores no concelho de Aldea-Gallega da Merciana, pedindo medidas legislativas a beneficio da agricultura, especialmente da dos vinhos; attribuindo a decadencia della á agiotagem do commercio, e ás pautas. — Á commissão Especial dos Vinhos, ouvida a de Agricultura, sendo preciso.

5.ª Dos proprietarios moradores no concelho do Alemquer, agricultores de vinhos, pedindo promptas providencias a favor da agricultura deste genero, dando como causa da sua decadencia a agiotagem e as pautas. — Á commissão Especial dos Vinhos.

O Sr. Fontes Pereira de Mello: — É para apresentar o seguinte projecto de lei. (Leu, e tem por objecto prorogar por mais dez annos, a contar do dia 10 de março de 1850 em diante, a disposição da carta de lei de 10 de março de 1840.)

Ficou para segunda leitura, e quando a tiver, se transcreverá.

O Sr. Mello Gouvêa: — É para apresentar duas representações, uma dos habitantes da freguezia da Senhora da Graça da Ajuda, concelho de Maçãs de D. Maria, em que se queixam dos vexames que ainda se acham soffrendo pelo escandaloso uso de seus parochos fazerem officios obrigatorios pelas almas dos fallecidos: e outra dos escrivães de alguns juizos de paz do districto de Coimbra, queixando-se da diminuição que soffreram em seus emolumentos, pela ultima tabella dos salarios judiciaes. Peço a V. Ex.ª queira mandar estas representações ás commissões respectivas.

Sr. Presidente, a commissão d'Administração Publica não se acha completa, porque o Sr. Antonio Maria Couceiro ainda não compareceu nesta sessão, nem comparecerá, e como a commissão entendeu que os seus trabalhos devem ser compartidos por todos os seus membros, por isso traz á Camara a seguinte

Requisição. — «A commissão de Administração Publica pede á Camara dos Srs. Deputados a precisa auctorisação para que á mesma se reuna o Sr. Deputado Luiz Augusto Rebello da Silva.» — (Assignada pela maioria dos membros da commissão.)

Foi approvada.

O Sr. J. J. de Mello: — É para mandar para a mesa o seguinte parecer da commissão d'Instrucção Publica.

Mandou-se imprimir, e se transcreverá quando entrar em discussão.

O Sr. Passos Pimentel: — É para mandar para a mesa o seguinte parecer da commissão Ecclesiastica.

Ficou para ter seguimento em occasião opportuna, e então se transcreverá.

O Sr. Cunha Sotto-Maior: — Sr. Presidente, faz hoje 8 dias que eu annunciei uma interpellação ao Sr. Presidente do Conselho de Ministros. Annunciando esta interpellação, eu usava de um direito, e V. Ex.ª, communicando-a ao Sr. Ministro respectivo, cumpria um dever. O Sr. Presidente do Conselho falta a um dever rigoroso em vir responder á interpellação. Não m'importa, que elle venha aqui ou não; mas faço esta declaração para descarregar de mim certa responsabilidade. A interpellação não tem

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tido legal, porque o Presidente do Conselho não apparece. A Camara veja a desconsideração, com que é tractada, uni acintoso despreso, despreso inaudito —... que se a Camara tivesse sentimento da sua dignidade... (Vozes: — Ordem, ordem.) Fóra da ordem é um Deputado annunciar uma interpellação, e não apparecer o Ministro respectivo para responder: eu não me quero cingir a essa ordem.

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado usou do seu direito suscitando a sua interpellação, e dir-lhe-hei que depois da remessa da nota, logo se fez a communicação respectiva ao Sr. Presidente do Conselho, e até com uma nota d'urgente: depois disso a mesa não sabe mais nada a tal respeito

O Sr. E. J. Mascarenhas — É para mandar para a mesa o seguinte requerimento.

Ficou para segunda leitura, e quando a tiver se transcreverá.

O Sr. Rebello da Silva: — Mando para a mesa a seguinte

Nota de interpellação. — «Peço a V. Ex.ª se digne fazer communicar ao Sr. Ministro do Reino que o desejo interpellar ácerca da desapprovação dos estatutos da Liga dos interesses materiaes.» — Rebello da Silva.

O Sr. Presidente: — Faz-se a communicação.

O Sr. Ministro da Fazenda: — Eu não ouvi bem os termos, em que ha pouco se expressou o Sr. Deputado Cunha Sotto-Maior; mas parece-me, que em tudo quanto disse, commetteu uma grave injustiça. S. Ex.ª o Sr. Presidente do Conselho não e capaz de negar-se a qualquer interpellação, que o nobre Deputado fizesse: a camara deve estar convencida de que se o Sr. Presidente do Conselho não tem vindo á Camara, é porque objectos do serviço lírio impedem, e logo que esse impedimento cessar, S. Ex.ª apresentar-se-ha na Camara para dar uma prova, de que não tem a menor desconsideração pelos nobres Deputados, nem desejos de faltar aos seus de veres (apoiados.)

Segunda leitura.

Requerimento. — «Requeiro que se recommende ao Governo pela repartição competente, para que envie a esta Camara a informação, que na sessão proxima passada lhe foi pedida sobre a representação da camara municipal do concelho de Mondim, districto de Vizeu, na qual pede a concessão das hospedarias do extincto convento de Salzedas com o seu eirado, para collocação da roda dos expostos do mesmo concelho, — J. M. Botelho.

Foi admittido, e logo approvado.

O Sr. Lacerda (Antonio): — Tenho a honra de communicar á Camara que eu com o Sr. primeiro secretario fomos desanojar o Sr. Antonio José dos Reis, e pedir-lhe que quanto antes venha tomar parte nos nossos trabalhos.

Ordem do dia.

Continua a discussão do projecto n. 103 na generalidade.

O S.. Fontes Pereira de Mello: — Sr. Presidente, é desagradavel esta tarefa, sobre tudo quando se tem de continuar um discurso interrompido por 24 horas consecutivas. Por muita força que tenham tido os argumentos da vespera, é difficil conseguir que produzam ainda bom effeito no dia seguinte, acha-se quebrado naturalmente o fio das idéas para quem falla, e para quem ouve. Esta questão não e de bellezas oratorias, é uma questão naturalmente secca, e ainda, não se póde tractar sem entrar em certos desenvolvimentos technicos, que sempre enfastiam. Eu, Sr. Presidente, se tivesse querido fazer effeito, se o meu unico pensamento fosse o de opposição ao projecto, tinha tractado primeiro das materias de que hoje me hei de occupar, deixando para o fim a questão do imposto, que é a mais vulneravel de todas, debaixo de todos os pontos de vista: mas eu, Sr. Presidente, quiz só, tanto, quanto cabe nas minhas forças, fundamentar o meu voto, que não podia ser silencioso a este respeito; e por isso segui a ordem natural das idéas que me occorreram; o, comtudo, peço perdão á Camara para lhe dizer, que, na questão do imposto, ainda m'escaparam a combater algumas asserções, que não é possivel deixar sem resposta, e que por inadvertencia deixei talvez intactas.

O illustre Deputado, que me precedeu, e que, como disse hontem, tomou unia parte muito activa neste debato, se tentou a possibilidade de levantar 4 mil contos sobre o imposto, que se estabelece no projecto; mas S. Ex.ª quando viu depois aggredida a sua opinião por mim, dizendo-lhe que era impossivel realisa-lo com o pequeno producto que naturalmente havia de dar a contribuição alludida, disse que a amortisação deveria ser paga pela geração futura; entretanto, Sr. Presidente, o illustre Deputado, que defendia o projecto na essencia, e na fórma, não se lembrou por corto, que ha uma disposição terminante no mesmo projecto no artigo 27, que diz, que não só se paguem juros, mas que se pague tambem a amortisação tudo á custa do imposto das entradas. Eu leio á Camara o artigo 27, que diz o seguinte a A junta central poderá levantar na conformidade do artigo 11, n.º 7, sendo possivel, em cada districto, sobre o imposto addicional decretado por esta lei, as sommas, que julgar necessarias: estabelecendo, além dos juros correspondentes, a sua progressiva amortisação, por meio de consignações annuaes, pago tudo pelos fundos do mesmo imposto.»

E evidente por tanto, Sr. Presidente, que nesta parte torna-se de mais a mais impossivel o alvitre, apresentado pelo Sr. Deputado; porque suppondo, que havia quem imprestasse a 8 por cento de juro, com 6 por cento d'amortisação, é claro que eram necessarios 560 contos annuaes para occorrer a este encargo, ao mesmo tempo que o imposto póde apenas render 200 contos, suppondo que se verificava a hypothese mais lisongeira dos defensores do projecto — isto é que a decima o impostos annexos rendiam os 1.500:000$000 réis, que vem calculados no orçamento, e que ainda nunca se cobraram. E bom lembrar além de tudo o mais, que este alvitre de 4 mil contos se apresenta quando não ha quem empreste 10 contos para as obras da barra da cidade do Porto.

Em tudo isto. Sr. Presidente, deve notar-se que eu calculo unicamente com a parte do imposto correspondente ás estradas directas, e transversaes; nem podia calcular com outra cousa, porque o resto é destinado pelo projecto para os caminhos do concelho exclusivamente Eu não sei, se é por isto que um

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Illustre cavalheiro teve a lembrança de dizer, que a minha argumentação peccava pela base; irei, porém, tractando de mostrar successivamente á Camara, que não ha êrro nas minhas asserções.

Eu, Sr. Presidente, já hontem demonstrei que era impossivel levantar os 4 mil contos, porque eu não combato, o que está na mente do illustre Deputado, nem na mente dos illustres cavalheiros que redigiram este projecto; combato com as armas que me dá o que esta escripto, e já se tem visto que é impossivel que tal imposto renda o necessario para satisfazer este encargo. Ha um argumento muito frisante, na minha opinião a fazer, e que diz respeito ao terço que se destina para os caminhos visinhaes «ruraes; porque o projecto diz — que das sommas que produzir o imposto de 20 por cento sobre a decima e impostos annexos, se deduza um terço expressamente destinado para aquelles caminhos, determinando tambem n'um dos seus artigo, que ficam abolidos desde logo todos os impostos, que as camaras municipaes lançam nos seus respectivos concelhos para obras de estradas. Sabe V. Ex.ª a em quanto importa, em todo o reino, o imposto que as camaras municipaes cobram para estradas? Anda muito para cima de 100 contos de réis: (apoiados) pois é este imposto, que se paga já sem repugnancia, e que esta estabelecido desde longa data, que se quer ir substituir por outro, que tem caracter odioso, e que não rende se não 60 e tantos contos; quer dizer, dá-se ás juntas década um dos districtos pouco mais de metade do que effectivamente ellas tem hoje. Se o nobre Deputado tivesse reflectido sobre este objecto, estou persuadido que nesta parte tambem não diria, que o meu argumento peccava pela base.

Agora vamos ao imposto que o projecto estabelece: é preciso investigar se este imposto será o mais justo, o mais conveniente, e o mais proprio para chegar ao resultado que se deseja Não ha mais nada senão estabelecer um imposto seja sobre o que fôr? Porventura é indifferente que seja este ou aquelle o objecto, ou a industria sobre que elle vai pezar? Será esta circumstancia indifferente para o homem d'estado e para o legislador? E notavel o relatorio deste projecto, porque diz mais d'uma vez que o projecto esta d'accordo com a sciencia, eu tenho notado que esta expressão esta hoje muito em voga, porque a tudo quanto se quer approvar, se diz que está d'accordo com a sciencia (riso). Ora eu tractando de esclarecer-me sobre este ponto, não achei em nenhum dos economistas que tractam esta questão, opinião alguma que me podesse fortalecer, para approvar que o imposto recaisse sobre a propriedade; não achei opinião neste sentido senão a de Ricardo, economista inglez, e os poucos da sua escóla; mas desde João Baptista Say até aos mais recentes economistas, todos rejeitam o systema de sobrecarregar a propriedade territorial; preferem antes que se augmentem os impostos indirectos, quando isso seja indispensavel. Além disto, a nossa propriedade esta gravada com um imposto que é muito desigual pelo modo da sua arrecadação (apoiados); e é nesta propriedade assim giavada que se vai lançar exclusivamente o imposto para estiadas. Eu já ouvi dizer, que este imposto era lançado sobre a propriedade, porque ella havia de lucrai com as estradas. — Concordo até certo ponto com esta opinião; mas não é só a propriedade que lucra, lucra tambem o consumidor; pois se o consumidor lucra tambem, porque não ha de elle pagar, quando paga a propriedade territorial? É certo que a propriedade rustica effectivamente ganha com a9 estradas, porque leva os seus productos até aos mercados com mais facilidade; mas a propriedade urbana, que contribue em grande escala para o imposto que se cobra das decimas e impostos annexos, lucra por ventura directamente das estradas? Lucra como todos; mas não ganha immediata e directamente. Por conseguinte, não vejo razão nenhuma, ainda que não fôssem as opiniões illustradas de quasi todos os economistas, que me possa auctorisar para votar por este imposto, Se fosse preciso tirar argumentos daquillo que se tem feito modernamente, em apoio da opinião que emitto, achava muitos exemplos lá fóra. Ainda Mr, Villele quando foi Ministro, diminuiu o imposto da propriedade em França na importancia de 80 milhões de francos; seria por ventura por que elle entendesse que devia diminuir os rendimentos publicos? Pelo contrario, elle entendia que era necessario occorrer ás necessidades do thesouro publico, mas que o thesouro para ser rico precisava de que o paiz tambem o fosse, e sabia que uma das maiores necessidades da agricultura é a de ter capitaes para poder prosperar devidamente.

Disse o nobre Deputado que eu não queria impostos indirectos; peço perdão; o nobre Deputado propoz um augmento de impostos, e eu declaro que não acho inesgotavel esta fonte: pois nós não viemos a esta Camara senão para dar votos de confiança, adiar projectos, e votar impostos? Repugna-me acredita-lo. Não quero dizer que se me apresentarem uma substituição do imposto sobre decima pelo imposto indirecto, que eu até certo ponto não concorde com isto; porém o que eu combato e estou combatendo, é o exclusivo com que se onera uma só fonte de riqueza publica Sr. Presidente, este projecto resente-se de exclusivo em tudo: é um projecto systematicamente exclusivo; porque elle diz, nada de emprezas; nada de barreiras, imposto sòmente na propriedade, etc. etc. É este um dos maiores defeitos (na minha opinião) que o projecto póde ter. Mas ainda mais em abono da opinião que já emitti; — quer V. Ex.ª saber o que na sessão de 10 de dezembro de 1812 dizia Charles Dupin no parlamento francez, quando se tractava de alliviar o imposto do sal que é o mais gravoso que pésa sobre o povo, para augmentar o da propriedade territorial? E note-se que a proposta então era para alliviar o imposto do sal de um oitavo, e carregai a propriedade territorial sòmente na razão de 30 centimos por franco: pois apezar disso Mr. Charles Dupin oppoz-se não obstante ser o sal tão necessario á agricultura como todos sabem, e só porque era um imposto indirecto que se pretendia alliviar á custa d'outro directo sobre a propriedade.

Ha uma obra muito bem escripta, do Visconde de St. Chamans sobre o systema do imposto, que é digna de consultar-se. Aquelle economista escreveu a respeito da França; porém ha uma grande analogia das circumstancias relativas em que se achava a França, pelo que toca á relação das diversas industrias entre si com a situação em que se acha Portugal Aquelle economista é de opinião que senão póde, nem deve carregar por fórma alguma os impostos directos. Repelirei ainda uma vez, que eu não combato a imposição sobre as decimas, absoluta-

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mente fallando. Eu não quero que a propriedade não pague nada, mas não quero que pague só! E assim, Sr. Presidente, quando o imposto directo é tão mal lançado, quando a sua cobrança é acompanhada de tantos vexames, e tantas desigualdades; porque só quem nunca saíu de Lisboa, é que não sabe que por esse reino ha casas que não paga nem 1 por cento, em quanto outras pagam rigorosamente 10 por cento; quando ha muita gente que não paga, e creio que isto é sabido por toda a Camara; quando nós vemos no Diario do Governo grandes listas de devedores, além de outros que la não veem; quando ha muita gente que não paga, o que ha de acontecer, Sr. Presidente? Ha de acontecer que este imposto vai onerar os que pagam exactamente com os 20 por cento, em quanto os outros continuam a não pagar nada, nem o imposto primitivo, nem os 20 por cento addicionaes; parece-me que isto é evidente. (Uma voz: — Não ha de ser sempre assim.) O Orador: — Eu não sei se ha de ser sempre assim, o que sei é que o tem sido, e o passado dá alguns dados para julgar do futuro; a favor do futuro, Sr. Presidente, não tenho eu senão as boas intenções dos Srs. Ministros, e os bons desejo? dos Srs. Deputados; mas contra as intenções dos Srs. Ministros, e contra os desejos dos Srs. Depilados, tenho por outro lado toda a serie dos factos do preterito, e do presente. Oxalá que o fim deste projecto se realise! Não ha aqui nenhum Sr. Deputado que dê primeiro o seu voto para que haja estradas do que eu; todos o darão ao mesmo tempo; não ha porém nenhum que o dê primeiro; mas eu queria que ellas fossem uma realidade.

Eu sei muito bem que um projecto de estradas é um projecto organisador; sei muito bem isto, é sabemo-lo todos, é um projecto de receita até; mas é um projecto de receita para o futuro, e não é quando nós estamos corroidos por um deficit horroroso, que devemos lançar um tributo directo que não é para cobrir esse deficit; e com tudo eu entendo que elle senão deve cobrir com tributos novos, mas sim melhorando a arrecadação dos já existentes, e os seus meios de cobrança. Portanto, Sr. Presidente, o passado tem sido sempre como disse; ha muitos devedores que mão pagam; não sei o que será para o futuro, mas eu não estou resolvido a votar projectos ás cegas, confiado nos bons desejos dos Srs. Deputados, e nas boas intenções dos Srs. Ministros, que reputo taes, e de que sou o primeiro a dar testimunho.

Agora, Sr. Presidente, na parte em que o projecto exclue completamente as emprezas, já hontem disse bastante, e não direi muito mais, porque ha muito pouco mais que dizer. Pai atacaria tanto um projecto em que se me dissesse, que todas as obras se fariam exclusivamente por empreza, como ataco este projecto que me diz, que nenhuma obra será feita por tal meio. O que eu ataco é o principio de exclusivismo, que nasceu provavelmente de se querer prestar, para assim dizer, homenagem a esta opinião publica que se formou contra as estradas por emprezas. Mas os illustres Deputados que defenderam o projecto da commissão, não repararam que inutilisavam o seu argumento, dizendo que em Portugal nunca tinha havido emprezas, mas simplesmente empreitadas, e quasi que teem razão os illustres Deputados, mas neste caso argumentam com uma cousa que não é a mesma; de que se tracta não é de empreitadas, mas sim de emprezas.

Porém, Sr. Presidente, se me dissessem que tinha havido emprezas em Portugal, e que essas emprezas tinham produzido máo resultado, ainda assim não chegavamos á conclusão de exclui-las completamente, porque, como disse hontem, não é com o abuso de um principio, que se corrige outro abuso; entretanto a verdade é que não foi assim, como dizem os illustres Deputados, que são os primeiros a declarar, que só houve empreitadas; logo todos os males que teem vindo dessas cousas que teem havido, que não são emprezas, pela confissão dos illustres Deputados, já se vê que não podem applicar-se ás emprezas de que fallam os impugnadores do projecto. Mas, Sr. Presidente, na minha humilde opinião as emprezas são o resultado do principio de associação; proscreve-las completamente é anniquillar este principio, que é um elemento fortissimo de que se tem servido todos os paizes, que querem prosperar nos seus melhoramentos materiaes.

Mas dizem os illustres Deputados, que não proscrevemos o principio de associação, porque se podem associar para fazer emprestimos. Sr. Presidente, como se ha de associar ninguem para fazer um emprestimo, quando não ha caução que chegue para o pagamento integral dos juros, e da amortisação da somma emprestada? Pois não é completamente illusorio dizer, que se associem para fazer emprestimos, e estabelecer um fundo para pagar os juros, e capital, que não chega evidentemente para esse fim? Quem é que se ha de associar? Além disso não disse eu já hontem á Camara, não conhecem todos os Srs. Deputados, que em quanto houver a agiotagem, que absorve completamente todos os capitaes, é impossivel haver quem faça estes emprestimos? Sr. Presidente, o Governo acaba de dar já nesta sessão um documento publico de que é impossivel, com um juro rasoavel, achar quem empreste; se a minha memoria me não engana, e os meus ouvidos me não falharam, o Sr. Ministro da Fazenda apresentou este anno já ao Parlamento uma proposta para se levantar uma somma de 2:000 contos, entrando a terça parte em papeis de divida fluctuante; se me não engano, (não o vi ainda escripto) quando S. Ex.ª apresentou as suas propostas de fazenda este anno, repito, apresentou uma proposta para se levantarem 2:000 contos, entrando 666 contos, isto é, um terço em titulos de vencimentos do estado.

O Sr. Ministro da Fazenda: — Para acabar, e aproveitar o seu argumento, é necessario saber que receitas são aquellas sobre que se levanta o emprestimo, e quaes são os papeis.

O Orador: — E divida corrente, bem, pois lá vou; é divida corrente; mas o que prova isto, é que o Governo não acha que seja possivel levantar ao par um fundo qualquer em Portugal. Pois o Governo entende, que para levantar 2:000 contos precisa que entrem 666 de divida fluctuante... (O Sr. Ministro da Fazenda: — Não é divida fluctuante. Oh Senhor, pelo amor de Deos!) De divida corrente, bem, a mim servem-me todas as hypotheses; mas peço perdão, eu desejaria que S. Ex.ª me interrompesse, porque eu não quero proseguir em êrro. (O Sr. Ministro da Fazenda: — Não é preciso dizer mais.) Bem; S. Ex.ª quer deixar enterrar o meu argumento; mas não tem duvida, porque qualquer que

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seja a divida, esta por preço infimo no mercado. A como estão os titulos dos servidores do estado actualmente, neste mez? Não será isto divida corrente?

O Sr. Ministro da Fazenda: — Mas são pagamentos a que o Governo esta obrigado, que esta continuando a fazer, e para os quaes esta applicada a receita, que faz o objecto do emprestimo, por consequencia representam para o Governo dinheiro effectivo, não são papeis depreciados.

O Orador: — Depreciados estão todos os papeis do Governo; desgraçadamente todos; não é só este, nem aquelle. Tomára que me dissessem quaes são os papeis do Governo, que não estão depreciados; isto é que eu queria saber. Para o meu argumento, Sr. Presidente, importa pouco saber, se são mais, ou menos depreciados: o que é evidente e que o Governo, fazendo entrar no emprestimo 666 contos de titulos de vencimentos, prova que não é possivel levantar em Portugal fundos ao par O Governo não perde, diz o illustre Ministro; mas peço perdão, isso é outra questão, que eu tractarei, quando nos occuparmos desse negocio; não tracto de saber agora, se o Governo perde, ou ganha; o que tracto é de provar, que aquelles que emprestam, ganham. Ora quando o Governo é o proprio que reconhece, que não póde levantar fundos ao par, como se espera cousa alguma de associações para fazer emprestimos? E eu não ataco o Governo nisto; e uma consequencia necessaria dos factos; qualquer Governo que se sentasse nas cadeiras do Ministerio, havia de encontrar as mesmas difficuldades; o que eu quero para a minha argumentação é provar, que o Governo não póde levantar ao par um emprestimo qualquer, e tanto assim, que o emprestimo do projecto levanta-o com 666 contos de papeis depreciados; advertindo-se que eu chamo depreciado ao papel, quando representa nominalmente 100, e não me dão por elle senão 60, ou 50 no mercado; creio que com isto não offenderei os tympanos de SS. Ex.ªs Este argumento de que me sirvo para chegar ao meu resultado, ou eu me engano muito, ou colhe completamente. Os illustres Deputados, que pertendem sustentar o projecto, teem imaginado que era possivel levantar aos milhares de contos; o illustre Deputado pelo Algarve disse 4:000 conto, e note-se, que eu na minha argumentação anterior imaginei, por hypothese, que se levantassem 1:000 contos, para ver se assim era mais facil; porém achei afinal, que não era possivel com os fundos que se estabeleciam, como caução do emprestimo, satisfazer ao juro, e amortisação respectiva.

Vê-se por tanto, Sr. Presidente, que por este lado esta demonstrada a impossibilidade do resultado que se pretende pelo projecto.

Falta-me ainda responder a um argumento que se apresentou na ultima sessão, argumento que não foi directo, mas que foi applaudido, e dicto alto na Camara. O Sr. Ministro da Guerra fiz uma asserção, de que não vem fóra de proposito fallar, porque o projecto no art. 28 diz o seguinte «nas obras que a junta central fizer por sua conta, poderão ser empregados os soldados dos corpos que existirem nos diversos districtos, exigindo para esse fim do Governo o detalhe da força que poderá destacar cada um delles, e o tempo que devem trabalhar esses destacamentos. 55

Esta disposição além de estar consignada no projecto expressamente, foi adduzida pelo illustre Deputado pelo Algarve, como argumento para provar que era possivel haver nisto alguma economia para a construcção das estrada?; mas o illustre Ministro da Guerra, que estaca presente, e que sabe perfeitamente que não póde dispensar um soldado, como elle o disso nesta Camara, da força que tem á sua disposição, tornou inutil o argumento alludido. Eu não tive a fortuna de explicar-me depois que o Sr. Ministro da Guerra fallou aqui na fixação da força armada de terra, mas será desta vez: eu não pude informar a Camara de que S. Ex.ª exigia para o serviço 36:000 homens. S. Ex.ª disse que linha 9:000 homens em serviço, e que precisava de tres quartos revesados, por conseguinte disso que precisava de 36:000 homens (Uma voz: — Dois quartos). Não querem os tres quartos, muito bem, sejam dois, temos ainda 27:00) homens, serve-me tudo para a minha argumentação; o projecto esta tão deficiente que todas as hypotheses me servem, admitto tudo; temos pois 27:000 homens, quer dizer são precisos £7:000 homens para o serviço; mas na lei votaram-se apenas 24:000, logo não chegam para o indispensavel; por consequencia como so quer então licenciar força para ir servir para as estradas? Ainda tendo os 27:000 homens não era possivel licenciar nenhuma, pela conta do Sr. Ministro, quanto mais tendo só 24:000. Entretanto S. Ex.ª, disse em um áparte que se podiam empregar os grilhetas!... E será isto possivel? Será possivel que 3:000 mil grilhetas trabalhem sem guardas? Hão de ír pelo paiz fóra sem haver quem os vigie, quem se incumba da sua disciplina? Pois podem espalhar-se por esse reino 3:000 grilhetas? E essa gente não precisa de accommodações, podem andar a trabalhar nas estradas, e recolherem-se todos os dias a Peniche, a Lisboa, a Elvas, e a outras partes onde estão? Sr. Presidente, apresentar a favor do projecto similhantes argumentos, é compromette-lo mais. Eu não dou grande pêso a esta especie, que foi lembrada pelo Sr. Ministro da Guerra, naturalmente só com o interesse de que se faça alguma coisa; e eu não digo que os grilhetas não possam trabalhar nas estradas, ao pé das praças de guerra onde estão, mas isso não vale a pena do se tomar em linha de conta para se fazerem 800 legoas de estradas.

Mas, Sr. Presidente, ainda as emprezas; as emprezas diz que estão proscriptas pelos principios da sciencia, diz o relatorio: tem-me custado muito para achar estes principios da sciencia, e ainda os não pude encontrar. Eu o que vejo é que o principio d'associação é um principio fecundo, recommendado por todos os economistas, e pelos principios da sciencia; eu vejo em todos os paizes civilisados muitas das grandes obras que lá se encontram, feitas por emprezas; posso citar um grande numero das mais importantes nas principaes nações da Europa, feitas por emprezas, não só estradas, porem mesmo outras obras. Na Prussia, uma das melhores estradas que lá existem — de Bucholtz a Preuslau, — que conta 34 legoas de extensão, foi feita por uma companhia. (Uma voz: — Quer associações para tudo).

O Orador: — Não quero associações para tudo, quero-as só para o bem — admitto poucos principios em absoluto.

Tambem uma quadrilha de salteadores é um principio de associação, e eu não quero que a Camara pense que eu quero estender o espirito de associação

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a todas as cousas; ma o empilho de associação para fazer as estradas é uma cousa muito differente.

Os canaes de primeira ordem têem sido feitos por empresas. Em França, por exemplo, o canal de Briare que une o Loire com o Sena foi feito por uma companhia — O canal do Languedoc, uma das obras mais estupendas deste genero, que une o mediterraneo com o occeano, que tem 43 leguas de extensão, foi obra d'uma empresa. Poderia ainda citar muitas outras gigantescas devidas ao principio de associação, mas não quero abusar da paciencia da Camara. Mesmo em Portugal, Sr. Presidente, não fallando nesses monumentos antigos que attestam a nossa grandeza passada, e a nossa miseria presente como o convento da Batalha, o mosteiro de Mafra, e outros, que segundo o espirito da época, e a natureza de taes obras, foram mandadas executar á custa do Estado, eu não conheço nada feito modernamente, que se pareça com o que ha por essa Europa senão a ponte pensil no Porto, e essa foi feita por empreza (Uma voz: — E o theatro de D. Maria 2.ª?)

O Orador: — O theatro de D. Maria 2.ª!... Então por haver uma obra que não é devida ao principio de associação, segue-se que todas as outras o não devem ser? (Uma voz: — E esses monumentos antigos?) O Orador: — Essas obras antigas feitas pelos réis deste reino, não eram feitas por emprêsas, por que então ainda não era conhecido o espirito de associação, ou pelo menos não era praticado, nem a naturesa dellas o comportava.

Resta-me ainda fallar sobre outra parte importante do projecto que é as barreiras. As barreiras são quasi consequencia das emprêsas; não ha outro meio de entreter as estradas em toda a parte senão os direitos de barreira, e os transportes accelerados; que eu conheça não ha outros; ou então hão de ser entretidas as estradas á custa do thesouro, mas isso já provei que não era possivel com estes meios, e por consequencia é uma cousa que julgo já fóra da discussão.

(O Orador: — Foi aqui novamente interrompido, mas não foi possivel ao tachygrafo saber por quem, nem sobre que.)

O Orador: — Pois o illustre Deputado entende que ha de ser pelo thesouro que se ha de fazer o entretenimento das estradas?!... Não quero cançar a Camara com repetições, e eu já provei exuberantemente que era impracticavel fazê-lo com taes recursos.

Mas vamos a ver se as barreiras estão prescriptas pela sciencia e pela practica. Em 1828 dizia o engenheiro Cordier, membro da Camara dos Deputados, na sua excellente obra dos trabalhos publicos em França, que havia barreiras em toda a parte onde havia estradas, e que só na Russia, Hespanha, Portugal, e Constantinopla as não havia, porque tambem não havia communicações. As barreiras, Sr. Presidente, foram abolidas em França depois da revolução, porém deve notar-se que tinham começado a existir naquelle paiz, quando começaram lá as estradas no tempo de Henrique 4.º, sendo seu Ministro Sully. E porque começaram só então as barreiras em França? É por uma razão muito simples, é porque só então começou a haver estradas, methodicamente estabelecidas naquelle paiz. As barreiras estabeleceram-se depois na Inglaterra, e nos Estados Unidos. Aqui esta um illustre Deputado que conhece particularmente aquella nação, aonde me dizem que ha excellentes estradas; e note-se que é um paiz que presa muito a sua liberdade. Em quasi toda a Alemanha ha barreiras; na Bohemia, Prussia, Saxonia, Baviera, na Belgica, em Inglaterra existem barreiras; apenas deixa de havel-as no condado de Antrem na Irlanda, onde são as estradas á custa dos proprietarios de terras. Até ouvi dizer, Sr. Presidente, que as ha ultimanente nas provincias do norte em Hespanha. Portanto não sei onde esteja o principio da sciencia contra o estabelecimento das barreiras, porque nestes paizes todos, que tenho mencionado, ellas estão em uso.

Mas a França teve barreiras muitos annos; chegou ao tempo da revolução, e ainda depois da revolução, pela convenção nacional houve decretos regulando os direitos de barreira. Sabe V. Ex.ª uma opinião, que eu já vi escripta n'um auctor acreditado? É que Napoleão querendo ganhar grande popularidade, procurou tornar odioso o imposto das barreiras, e acabou com elle depois.... (O Sr. Ministro da Fazenda: — Mas isso prova contra o que quer o illustre Deputado). O Orador: — Não prova tal, perdôe-me V. Ex.ª; parece que é contra mim, mas não é quando eu disser ao Sr. Ministro como é que as barreiras eram estabelecidas em França, e dessa maneira não as quero eu para o meu paiz. As barreiras em França estavam ás portas das cidades e villas; o individuo quasi que não podia sair de sua casa, nem para ir ouvir missa, que não fosse obrigado a pagar o imposto de barreira; o trabalhador não podia levar o seu carro para o casal, nem o pastor levar o gado para o seu aprisco sem pagar na barreira, etc. assim não as quero eu em Portugal; Deos me livre dellas; por consequencia o argumento não colhe contra mim. Mas será impossivel estabelecer as barreiras de maneira que se não tornem vexatorias para os povos? Parece-me que sim, sem que com tudo se entenda que eu sou um grande partidario do systema de barreiras.

Diz-se tambem que este imposto onera a propriedade; pois é um imposto na propriedade o imposto das barreiras?!... Então até os impostos indirectos são sobre a propriedade; de baixo de um ponto de vista tão vago é certo que não ha tributo que não vexe a propriedade.

Sr. Presidente, eu estou persuadido, e agora devo fazer voltar o quadro; estou persuadido, que as barreiras em Portugal hão de dar pouco; sobre tudo se» ellas forem condicionadas, como eu entendo que o devem ser, para não serem vexatorias; entretanto é possivel, é natural, é uma consequencia necessaria, que logo, que as estradas se estendam pelo paiz, e movimento ha de apparecer, e este movimento ha de indispensavelmente augmentar o producto do imposto. Portanto é possivel haver entre nós barreiras de maneira, que, não sendo vexatorias, produzam alguma cousa para ajudar ao trabalho do intretenimento das estradas; eu não digo, que ellas contribuam só por si para esse intretenimento; mas hão de ajudal-o muito. Além de que ainda restam os transportes accelerados, os quaes, uma vez que as estradas se façam em maior escala, podem chegar a um grande resultado; não digo, que absolutamente bastem para occorrer ás despezas, mas hão de cooperar em grande parte.

Ora eu estou já cançado de fallar e a Camara de-

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ve estar mais cançada de me ouvir, porque isto é um discurso que já vem de hontem, e portanto, não póde, além da sua insufficiencia, inspirar muito interesse: com tudo, falta-me tocar em uma especie; ainda poderia dizer mais alguma cousa sobre as barreiras, mas não quero; como disse, falla-me tocar uma especie, que é da obrigação que se impõe no projecto de começarem as estradas em todos os districtos ao mesmo tempo. Determina o projecto n'um de seus artigos que as estradas comecem em todos os districtos simultaneamente. Esta idéa, é força confessal-o, tem por fundamento um motivo justo; entendeu-se que o povo pagava com repugnancia todas as vezes, que não visse ao pé da sua porta o resultado do imposto que lhe lançam. Este pensamento como disse é justo e politico; a unica cousa que tem de inconveniente, é o não ser possivel; aliás o pensamento era bom; porém este defeito é o maior de todos os inconvenientes; e porque disse eu que é impossivel, Sr. Presidente? E porque estou persuadido, que nem a Camara nem o Governo querem fazer uma lei, para que se construa meia legoa de estrada em cada districto por anno. Eu não posso admittir que seja esse o pensamento da Camara, porque realmente era tão mesquinho, que não posso convencer-me que o admittisse. Esta impossibilidade, todavia, em que eu fallo, entende-se sempre em relação ás provisões deste projecto. Se se quizer dar sinceramente um grande desenvolvimento ás estradas, é necessario que haja uma grande somma, para que ellas comecem pelas grandes arterias. Quando eu concluir o meu discurso, que não tardará já muito tempo, eu mostrarei qual é a minha opinião definitiva, porque não quero, que se diga, que tenho estado combatendo o projecto, sem apresentar uma idéa para substituir.

Agora direi qual é a minha opinião a respeito desta disposição, que obriga a começar as obras em todos os districtos ao mesmo tempo. Este pensamento veio na lei de 26 de julho de 1843; porque já vinha no officio do Sr. Mousinho de Albuquerque, dirigido ao Sr. Ministro do Reino, o Sr. Fonseca Magalhães em 1810; nesse relatorio tão cheio de considerações sábias a respeito deste assumpto. Com o systema que então se adoptou, estabelecendo-se a contribuição pessoal, ou capitação, é evidente, que se tornava indispensavel, que as obras começassem ao mesmo tempo, porque não seria possivel ir um homem a militas legoas de distancia para trabalhar n'uma estrada, que elle não tornava a ver; estrada que não passava proxima da sua habitação, e que ficando collocada a uma grande distancia, fazia perder ao trabalhador um tempo immenso na ida e na volta.

For isso, como o Sr. Mousinho de Albuquerque estabeleceu essa contribuição, entendeu, que era indispensavel, que as estradas começassem todas ao mesmo tempo; mas agora, que senão estabelece essa contribuição; que eu não venho defender, não só se torna impossivel esta disposição do projecto, mas até absurda, peço perdão, eu não chamo absurdas as intenções dos illustres Deputados, mas é a determinação em si; isto não irroga censura, nem priva da consideração devida os illustres cavalheiros que a tem defendido.

Sr. Presidente, parece-me, que mostrei á Camara, em primeiro logar, que o imposto não podia satisfazer ás obras necessarias das estradas; que em nenhuma das hypotheses era possivel have-las, quer fossem feitas por conta do Governo immediatamente, com o imposto de 200 ou de 300 contos, ou fosse levantando fundos de uma vez, ou fosse levantando fundos para as fazer successivamente, mostrei depois quanto em mim coube, que a contribuição proposta era desigual, impossivel de cobrar devidamente, e absurda no estado de desorganisação de fazenda publica: mostrei finalmente a inconveniencia das disposições deste projecto, e debaixo deste ponto de vista, tenho satisfeito a quanto me propuz, e o melhor que pude, e consegui, entendo eu, mostrar á Camara, que esta proposta não póde ser approvada por ella; porque contém disposições antinomicas, e porque é impossivel de executar.

Agora devo dizer á Camara com a franqueza, que me parece que tenho mostrado, que estou convencido de que, em quanto as nossas finanças estiverem no estado desgraçado em que se acham, que nós deviamos applicar todo o nosso tempo, em as fazer tirar desse cahos desgraçado, para as levar a um ponto de organisação conveniente. Entendo que primeiro que tudo se devia tractar deste objecto; mas quando mesmo, simultaneamente com a organisação da fazenda, se quizesse tractar de fazer estradas, sou de parecer, que deviamos fazer uma lei, em que se consignasse, primeiro, um imposto sufficiente, que não pesasse unicamente sobre a propriedade; não deviamos excluidas emprezas com tanto que fossem condicionadas, de sorte que podessem ser de vantagem para os empreendedores, o tambem para o estado; não deviamos igualmente excluir completamente as barreiras; n'uma palavra, entendo que só com o concurso de muitos meios, poderemos algum dia ter estradas. Eu quizera, Sr. Presidente, que fizessemos as grandes arterias, e depois fariamos o resto dos caminhos. Eu bem sei que estas estradas arterias devem ter confluencia com outras, e é dessa rêde de communicações que provém as grandes vantagens; ao contrario perdem necessariamente muitissima da sua importancia; mas na impossibilidade de fazermos tudo, não deixemos de fazer alguma cousa.

Quanto aos transportes accelerados entendo ser impossivel o seu estabelecimento, havendo apenas duas, tres, ou quatro legoas por districto; porque se torna uma perfeita utopia; podendo com tudo ser de grande proveito, quando se tenham executado grandes lanços de estrada.

Concluindo direi, Sr. Presidente, que o momento não é opportuno, em relação ao nosso estado actual de fazenda, entretanto poderia ser que fizessemos alguma cousa, mas era necessario haver todos estes principios consignados no projecto; ao contrario torna-se uma lei absurda. Nesta conformidade, eu vou mandar para a mesa uma proposta muito simples, que provavelmente não é approvada; mas não posso deixar de a fazer, segundo a posição em que me vejo collocado; eu entendo, que póde ser approvado um projecto de estradas, mas debaixo de um pensamento inteiramente differente deste, desde o primeiro até ao ultimo artigo; e por isso entendo, que deve voltar á commissão, para ella fazer uma cousa, que não seja impossivel de pôr em practica.

Nesta conformidade, Sr. Presidente, tenho a honra de mandar para a mesa a seguinte

Proposta. — «Proponho que o projecto n.º 103

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-volte á commissão respectiva para ser reconsiderado.» — Fontes Pereira de Mello. Foi apoiada.

O Sr. Presidente: — Esta apoiada, e entra em discussão.

O Sr. Assis de Carvalho: — Mando para a mesa a seguinte

Proposta. — «Proponho que o systema de imposto para as estradas seja substituido pelo systema de repartição.» — Assis de Carvalho.

O Sr. Presidente: — Esta proposta não póde agora ter seguimento; o que esta em discussão e o adiamento.

O Sr. Fontes Pereira de Mello: — Pedi a palavra para mostrar á Camara, que a proposta ultimamente apresentada pelo illustre Deputado pelo Algarve... (O Sr. Presidente: — Por ora não se póde tractar della.) Não tracto do merecimento da proposta; unicamente tracto de fazer ver á Camara, que a circumstancia de ser apresentada uma proposta que altera completamente o principio fundamental do projecto, pelo illustre Deputado que defendeu estrenuamente o mesmo projecto, mostra evidentemente a necessidade que ha de elle voltar á commissão. Nada mais tenho a dizer.

O Sr. Cunha Sotto-Maior: — Sr. Presidente, eu pedi a palavra, porque vejo que ninguem a pediu, desejando aliás fallar depois de alguem ter combatido o adiamento. Estranho muito que um projecto desta ordem, um projecto que vai gravar o paiz, nada menos, do que com um imposto de 20 por cento sobre a sua contribuição directa; que vai crear uma grande clientela, e que no fim de tudo é uma decepção, porque não nos ha de dar nem uma legoa de estrada, sinto, digo, que um projecto desta ordem tenha corrido tanto ao abandono, e, perdôe-me a Camara, isto não e irrogar-lhe nenhuma injuria, é um facto que não posso escurecer: a Camara tem deixado correr o projecto á revelia, não se tem interessado por elle: o projecto, apesar de declarado ministerial, não tem sido defendido pelos Srs. Ministros: o Sr. Presidente do Conselho a quem o projecto diz respeito intimamente, porque a administração do reino esta commettida á secretaria do reino, não tem dicto uma palavra sobre elle... (O Sr. Ministro da Fazenda: — Peço a palavra): o Sr. Ministro da Fazenda póde pedir a palavra, mas S. Ex.ª pedindo a palavra agora, não destroe o facto de o Sr. Presidente do Conselho, e Ministro do Reino não ter assistido á discussão, e por consequencia essa discussão tem corrido fria, morna, sem estar presente o defensor natural do projecto. Eu tinha tenção de apresentar uma proposta de adiamento para o projecto ír á commissão a fim de reconsiderar, e ver se é possivel apresentar alguma cousa practica, e não absurda; mas como o illustre Deputado apresentou essa proposta, apoio o adiamento, e desde já me comprometto a pedir a palavra se algum illustre Deputado o combater.

O Sr. Ministro da Fazenda: — Sr. Presidente, pedi a palavra unicamente para defender o Presidente do Conselho de Ministros, já duas vezes accusado hoje de não apparecer aqui... (O Sr. Cunha Sotto-Maior: — Ainda o ha de ser terceira.) O Presidente do Conselho, já o disse, não t»m apparecido na Camara por objectos do serviço, e na outra Camara tem S. Ex.ª sustentado (como costuma) o seu logar com dignidade; aqui, senão fosse esse motivo, havia tambem de apparecer, e defender o projecto como

lhe incumbia; mas ha uma circumstancia que tem descançado a S. Ex.ª ate certo ponto para deixar de cumprir este dever, o qual ainda não declinou: — a discussão tem corrido na generalidade; o projecto ha de ser discutido em algumas das suas especialidades, e então o Presidente do Conselho terá occasião de manifestar a sua opinião; mas em quanto o Presidente do Conselho senão desembaraça dos objectos de serviço que o tem impedido de vir assistir á discussão, S. Ex.ª tem confiado (mas muito erradamente) no seu collega da fazenda por ter sido um dos membros da commissão externa a quem coube a honra de elaborar o projecto; que foi tambem membro da commissão interna que deu sobre elle o seu parecer; e que hoje, não sei se feliz, se infelizmente, é collega de S. Ex.ª na Administração.

Estas considerações, Sr. Presidente, devem levar a Camara, (e de certo não era preciso que eu as expozesse) a dar ao Presidente, do Conselho todas as desculpas que elle merece (muitos apoiados); e o facto de eu estar inscripto já para fallar sobre o objecto, prova que tudo quanto tenho dicto, é com todo o fundamento (apoiados — muito bem.)

O Sr. Faria Barbosa: — Sr. Presidente, eu fazia tenção de não fallar nesta questão, em quanto ella versasse sobre a generalidade; porém agora, como vejo apresentar uma proposta de adiamento, direi alguma cousa sobre ella. Eu acredito que a Camara toda deseja que haja estradas, mas na verdade, pela longa discussão que tem havido sobre a generalidade, parece que não se querem estradas. O maior argumento que se tem apresentado é, — que os meios estabelecidos no projecto, não são sufficientes, ou não são nenhuns para a factura das estradas; porém no projecto appareceu só os 20 por cento? Parece-me que não; e muito de proposito não se tem querido fallar nas empreitadas, e nas portagens... (O, Sr. Cunha Sotto-Maior. — Esta é mais bonita!..); mas o que se quer só são as grandes emprezas; e na verdade as grandes emprezas póde ser que ainda venham a ser acreditadas, porém é preciso... (O Sr. Lopes de Lima: — Não são as grandes, são as pequenas que se querem); as pequenas lá estão no projecto, são as empreitadas... (O Sr. Lopes de Lima: — Não são)... Eu não sei porque não se hão de considerar as empreitadas como pequenas emprezas: pois as juntas de districto não podem contractar uma estrada de empreitada, e não é isso uma pequena empreza? Por consequencia, eu digo, que a lei offerece mais meios; as grandes emprezas estão na verdade odiadas principalmente em todos os sitios onde se confeccionaram algumas estradas; as portagens são tambem sufficientes, e não é preciso estabelecer outra vez as barreiras contra as quaes os povos justamente teem clamado, e o que sequer é pôr parreiras a cada canto das estradas, de legoa em legoa, ou de duas em duas legoas. Entendo pois, que o adiamento não póde ter logar, por isso mesmo que, quando se tractar da especialidade, se se julgar necessario mais alguma providencia, ou alterar algumas das que se acham no projecto, então se tractará disso.

O Sr. Gorjão Henriques: — Sr. Presidente, eu estou intimamente convencido de que ha necessidade deste adiamento, e um agglomerado de circumstancias me faz conhecer que falta muita cousa para o objecto se decidir como se deve decidir, É Indubitavel que quando este projecto veio á discussão, foi

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pedido o adiamento delle, e foi pedido pelo âr. Presidente do Conselho do Ministros, na qualidade de Ministro do Reino, como competente na materia: S. Ex.ª disse á Camara (e certamente toda esta bem presente neste facto) — que difficuldades havia a vencei para que se podesse entrar decisivamente na discussão deste projecto — difficuldades que S. Ex.ª não apresentou, mas que nós reconhecemos pela boa fé que prestamos á asserção do Sr. Ministro do Reino: pediu por consequencia S. Ex.ª o adiamento por 15 dias; isso é expresso na acta, e como S. Ex.ª não pertencia a esta Camara, um Sr. Deputado se encarregou de apresentar a proposta de adiamento. Na verdade, eu assento que não devemos suppor que fôssem vãs as palavras de S. Ex.ª, quando disse — que difficuldades havia que se oppunham á prompta discussão do projecto, e que estas difficuldades poderiam remover-se dentro de 15 dias — os 15 dias passaram, o projecto veio á discussão, e nós não temos conhecimento de que o Sr. Presidente do Conselho de Ministros dissesse que estavam removidas as difficuldades, pelo contrario temos visto, que esta discussão tem sido unicamente entregue á Camara, ate este ponto. Eu respeito muito o» motivos que têem obrigado o Sr. Ministro do Reino a não apparecer nesta discussão, e são certamente elles muito justificados pelo seu collega o Sr. Ministro da Fazenda, sem me importar que iguaes queixas tenha havido em outra parte, pela ausencia do Ministerio, entretanto o facto é, que a questão tem sido tractada, e a Camara não póde deixar de estar possuida da transcendencia do objecto, assim como da solidez das razões apresentadas por um e outro lado; e accrescendo a isto, que nos devemos convencer de que alguma cousa ha que a Camara não sabe: são talvez essas difficuldades apresentada, pelo Sr. Ministro do Reino, e que induziram ao primeiro adiamento. Parece pois justo que não termine esta discussão sem que sejam consideradas, tanto as propostas feitas por parte de differentes Oradores, como essas mesmas difficuldades que o Sr. Ministro do Reino parece que se comprometteu a mostrar eliminadas, para se poder levar ao cabo a discussão deste projecto, e em attenção ás quaes já a Camara votou um adiamento de 15 dias, a pedido do Ministerio, e do qual nada resultou, visto que a Camara não foi esclarecida como parecia que o seria pela promessa do Sr. Ministro do Reino.

Voto por tanto pelo adiamento do projecto no sentido, em que esta feita a proposta

O Sr. J. J. de Mello — Os termos em que esta concebida a proposta, creio que importam um adiamento indefinido, por conseguinte não e possivel que, nestes termos, a Camara o approve; (apoiados) porque o adiamento indefinido esta em contradicção com tudo quanto ouvi dos dois lados da Camara. Approvar um adiamento indefinido seria destruir o pensamento de haver estradas, que tem dominado em toda a Camara.

Quanto ás razões que acabei do ouvir, não podem de maneira alguma ter logar: e coito que se pedia esse espaço de tempo, mas tambem me parece que o pensamento do projecto não se acha obstruido deste ou do outro obstaculo, porque á discussão têem estado presentes dois membros do Gabinete, o não offereceram obstaculo algum para que ella progrida, ao contrario vejo que um delles tem pedido a para via para fallar a respeito do projecto, e se acaso houvesse algum inconveniente, de certo já haveria de ter sido apresentado por SS. Ex.ªs (apoiados),

O Sr. Corrêa Leal. — Peço a V. Ex.ª queira consultar a Camara sobre se a materia do adiamento esta sufficientemente discutida.

Decidiu-se affirmativamente, e pondo o Sr. Gorjão Henriques duvída, rectificou-se a decisão por 43 votos contra 22.

O adiamento — foi rejeitado.

O Sr. Presidente: — Continua a discussão na generalidade, vai ter a palavra o Sr. Ministro da Fazenda, mas antes disso devo propôr á resolução da Camara a proposta do Sr. Assis de Carvalho.

Foi admittida a discussão.

(Continuando) Esta proposta é mais propria da discussão da especialidade; tenho com tudo deixado progredir na discussão da generalidade mais amplamente do que devia, (pelo que já e tem consumido parto do dez sessões nesta discussão) no destino dever ss se conciliavam as opiniões neste objecto tão grave, e para se ganhar terreno quanto a discussão mi especialidade, devo porem observar que para a discussão na especialidade e que vem a maior parte das questões que se tem apresentado. Ahi e que deve tambem ter cabimento o methodo pedido. Esta proposta não póde agora ser considerada senão como substituição.

O Sr. Ministro da Fazenda: — Sr. Presidente, bastante incommodado de saude principio a entrar na discussão do projecto das estradas, que para isso me obrigavam tres razões, as quaes constituiam para mim um dever, ao qual não estou acostumado a faltar. A primeira destas razões, Sr. Presidente, e o haver tido a honra de ser membro da commissão externa, áquem foi encarregada pelo Governo a confecção d'um projecto de estradas: a segunda ter sido um dos membros da commissão nomeada por esta Camara para dar sobre elle o seu parecer, commissão de que tambem tenho a honra de haver feito parte; e ultimamente pertencendo hoje a Administração que trouxe a Camara o projecto, que se membro a uma commissão externa, e de que a Camara encarregou outra com missão de dar sobre elle o seu parecer.

Sr. Presidente, eu disse que tinha muita honra em haver pertencido á commissão externa que confeccionou o projecto das estradas, por que tenho a consciencia da boa fé e das boas intenções que presidiram aos trabalhos dessa commissão, desde que principiou ate que concluio o projecto (apoiados). Tenho á consciencia de que a commissão não teve em vista outra cousa senão consultar nesta obra de tanta importancia não só os principio»;, mas até a experiencia, — não só a experiencia do paiz, porque o objecto de estradas não nos era já desconhecido, mas tambem a experiencia que nos davam sobre este mesmo objecto os paizes estrangeiros — experiencia, Sr. Presidente, que a legislador nenhum e dado despresar todas às vozes que se tracta de fazer uma lei, e uma lei de tanta importancia, e magnitude como a que regula os melhoramentos materiaes de um paiz (apoiado).

Em troco desta dedicação com que a commissão externa tractava de apresentar um projecto sobre estradas, vieram inclusivamente os insultos, o projecto e absurdo, o projecto é monstruoso, o projecto, Sr. Presidente, é.... não sei que mais! (Os Srs. C.

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sento, C. Sotto-Maior, e F. P. de Mello -pedem a palavra) o projecto foi até feito debaixo da impressão desagradavel que haviam deixado no paiz todas as emprezas que tinham sido encarregadas até aqui da construcção das nossas estradas.

Sr. Presidente, o projecto não podia deixar de ser combatido, tem sido combatido effectivamente; mas as razões com que tem sido combatido, posso dize-lo, (ao menos com a convicção que tenho) importam um verdadeiro triunfo para esse projecto, por que a um dos nobres Deputados que o combateram, inclusivamente ouvi dizer que não era dado a qualquer situação, a qualquer Camara, a qualquer Governo o pensamento de desenvolver uma lei para promover os melhoramentos materiaes d'um paiz.

O nobre Deputado a quem me refiro, certamente não vota por esta lei, porque não é de uma situação, que póde fazer o objecto dos desejos do illustre Deputado; não vota por esta lei, porque póde sair d'uma Camara que não inspira asna confiança; não vota por esta lei, porque póde ser obra de um Governo, que igualmente lhe não merece confiança, muito embora o Governo tenha mostrado que a continua a ter no nobre Deputado.

Mas, Sr. Presidente, apesar de tudo no bom senso da Camara esta fazer com que d'aqui sáia uma boa lei de estradas (apoiado) no bom senso da Camara esta fazer com que desta situação (não obstante todos os desejos para que assim não seja) sáia feita uma lei de estradas que assegure por uma vez o desenvolvimento da prosperidade do paiz (apoiado) Isto asssegura-me a convicção que eu disse tinha de que todos os argumentos que se haviam apresentado contra o projecto, importam um grande triunfo para elle, por que o lançar mão destes argumentos prova que os não ha seguros e verdadeiros para o combaterem. Vieram tambem alguns de douctrina, douctrina que tive o sentimento de ver muito mal empregada na occasião em que me parecia estar ouvindo as lições de um illustre professor da sciencia, e que o nobre Deputado que se soccorreu a elles, não teve a cautella de ver que ahi mesmo se achavam douctrinas, que condemnavam a opinião, que o nobre Deputado defende, e eu terei occasião demonstrar que os nobres Deputados que teem combatido o projecto por este lado, teem estado em contradicção.

Mas no meio destes argumentos, que se teem produzido contra o projecto, appareceu felizmente a confissão ingenua de um outro illustre Deputado, que nunca, como todos, sabe faltar ás suas convicções, nem deixar de entrar nas discussões com aquella boa fé, da qual já por mais de uma vez tenho dado testimunho ao nobre Deputado; no meio, digo, desses argumentos, appareceu a confissão ingenua, de que nós podemos passar sem barreiras, e o nobre Deputado, a quem me refiro, sabe, sabia então, sabe ainda hoje a razão, porque disse, que nós podémos passar sem barreiras. Isto, Sr. Presidente, dicto da parte de um illustre Deputado, que combateu o projecto, é, como digo, vim triunfo completo para os principios, sobre os quaes este projecto assenta, principios que se desenvolveram na commissão externa, e que adoptou a commissão nomeada por esta Camara; mas não foi só isto que nos aqui apresentaram os nobres Deputados, que combateram o projecto, foi mais — que o tributo o comportam as fôrças dos contribuintes — e que quando o nobre Deputado voltou á discussão, accrescentou, que não podia haver uma lei de estradas, sem um tributo especial, que constituisse a dotação desta administração. Por consequencia, Sr. Presidente, se eu me apresentasse a fallar como membro que fui da commissão externa, que confeccionou o projecto, se me apresentasse como membro da commissão nomeada por esta casa, e se me apresento agora como membro da Administração, posso por ventura desejar mais em favor do projecto que esta em discussão?... Mas, Sr. Presidente, não me contento unicamente com isto, hei de entrar francamente na questão, hei de mostrar ao menos, que nós todos, que temos parte na confecção deste projecto, formámos uma convicção, em virtude da qual julgavamos, e julgamos ainda, que fizemos uma lei, que não só estava em harmonia com as conveniencias publicas, mas que della haviam provir mais facilmente os resultados, a que o Governo, a Camara, e nós todos desejamos chegar (apoiados.)

O projecto porém é máo, o projecto é pessimo, o projecto é... não sei que mais; no projecto não se attendeu nem á sciencia, nem á experiencia, á experiencia principalmente do que se passa em Inglaterra, aonde todos os melhoramentos materiaes, todo o desenvolvimento dos caminhos de ferro não era dado a poder nenhum executar senão á concorrencia de companhias poderosas; disse-se pois, que nós pozemos de parte todas as indicações da sciencia, e da experiencia de paizes mais adiantados que nós, e apresentou-se-nos as emprezas, como o modo mais facil, mais regular, e até o mais economico para pozermos ter estradas! As companhias dos caminhos de ferro apresentaram-nas como o grande elemento, que póde produzir, e o unico exemplo que devemos adoptar para termos estradas.

Sr. Presidente, eu estimo muito que se nos désse occasião de mostrarmos qual era a força desses argumentos, e depois verá a Camara quaes são as consequencias que delles se podem tirar; eu desejaria muito que os nobres Deputados, que viciam aqui argumentar com as companhias dos caminhos de ferro, tivessem o cuidado, antes disso, de examinarem bem tudo o que ha a respeito deste objecto para depois nos combaterem melhor, e por isso estimo muito, Sr. Presidente, ter esta occasião para mostrar até que ponto os nobres Deputados, que assim argumentam, estão illudidos a este respeito. Eu pensava que aquillo que os jornaes tinham publicado a respeito das companhias de caminhos de ferro, era bastante para se ter feito outro juizo, e que o nobre Deputado, que recorreu a este argumento, sabia que ellas haviam causado uma crise geral no commercio de todo o Mundo, as consequencias da qual ainda hoje se sentem.

Mas, Sr. Presidente, para que nos trouxeram esses exemplos do que se passa em Inglaterra, sem se attender a tudo o que se passa a respeito de companhias de caminhos de ferro?... A respeito das companhias de caminhos de ferro, eu apresentarei á Camara o que se acha escripto em alguma parte, para se poder avaliar a força dos argumentos a favor das emprezas, ás quaes se quer dar a construcção das nossas vias de communicação; a Camara sabe, mas vai ouvir como as companhias de caminhos de ferro appareceram, como se houveram, o que ellas foram, e o que fizeram.

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Sr. Presidente, é no = Annuario de economia politica — que tenho na máo, aonde se acha a demonstração do que tenho dito, aonde esta. escripto o juizo crítico de todas estas companhias, como ellas principiaram, e o que ellas foram, e deixarei a Camara, e a cada um dos nobres Deputado, o cuidado de tirarem todas as conclusões.

Diz se aqui (lendo) «que fôra a opposição radical em 1838, que fôra rejeitar representada por Mr. Arago a proposta de Mr. Mole, para a construcção de uma rêde vasta de caminhos de ferro por conta do Governo, e disse o Orador, que todos sabiam, que o Conde Mole era chefe de um Ministerio conservador, e elle que propunha estas construcções por conta do Governo, la tinha razões para isso, continuando a lêr disse o Orador, que a opposição radical tinha exaltado o poder da industria particular, coroando a sua obra, fazendo conceder a duas companhias poderosas os caminhos de París a Orleans, e de Paris ao Havre, e a uma terceira o de Bale a Strasbourgo, que porém ainda não tinha começado o anno de 1840, e já os concessionarios de 1838 tinham reconhecido a sua insufficiencia, reclamando uns um abatimento puro e simples das obrigações tomadas por elles, subvenções, minimos de juro, etc. etc.»

Já se vê pois, pelo que acabei de lêr á Camara, qual era a situação da» companhias dos caminhos de ferro em 1842, já se vê, que a opposição radical, representada por Mr. Arago, tinha feito rejeitar em 1838 a proposta, na qual o Gabinete Mole estabelecia que se conferisse ao estado a execução de uma vasta rêde de caminhos de ferro. E aqui, Sr. Presidente, direi outra vez que o Conde Mole era o chefe de um Ministerio conservador, e a Camara deve fazer-lhe a justiça de crer, que este homem d'estado devia ter razões sufficientes para propôr ao Parlamento a construcção de uma vasta rêde de caminhos de ferro por conta do Estado, sem as querer entregar á índustria particular; e tambem a Camara deve saber as razões que a opposição radical teria para combater a proposta do Conde Mole.

Mas, Sr. Presidente, a opposição radical tinha exaltado como a Camara ouviu, a superioridade, e o poder da Industria particular; e deu-se a duas poderosas companhias a construcção de caminhos de ferro, de Paris a Orleans, e de París ao Havre, e a uma terceira o do Bale a Strasbourgo, e o que succedeu. Ja a Camara tambem o ouviu: ainda o anno de 1840 não tinha principiado, e os concessionarios de 1848 pediam, e se lhe concederam os beneficios de que já fallei

Aqui esta, Sr. Presidente, o que aconteceu: ainda não tinha principiado o anno de 1840, quando os concessionarios de 1838 tinham reconhecido a sua insufficiencia, e reclamavam um abatimento puro e simples das obrigações contraídas por elles, e um soccorro do Estado, fosse debaixo da fórma de subvenções directas, ou fosse garantindo-lhe um minimo de juro aos capitaes empenhado nas emprezas. Effectivamente, Sr. Presidente, a estas companhias se concederam esses abatimentos puros, e simples nas obrigações que haviam contraído, e effectivamente se lhes concedeu uma amortisação de 1, e 3 por tento de juro Ora, Sr. Presidente, aqui está o que toraui, e como são julgadas estas grandes companhias que nos trouxeram para argumento e para exemplo, e ainda a este respeito tornarei a lembrar á Camara, que foi a opposição radical em França que combatem a proposta do Ministerio conservador, de que era el efe o Conde Mole, a respeito do qual a Camara deve suppôr que teria fortissimas razões para propôr, que as construcções dos caminhos de ferro fossem por conta do Estado, e não concedidas a companhias, assim como as razões que tenha a opposição radical, para combater a proposta do Ministerio conservador. A Camara tambem não deve perder de vista, que sendo essas construcções entregues ao podér da industria particular, não tardou muito que esta não viesse pedir um abatimento nas obrigações que tinha contraído, e uma amortisação dada pelo Estado, juros

Agora quer a Camara sabei a critica que os redactores do Annuario fazem destas companhias? (leu) Portanto o que daqui se conclue, e que nas companhias para a construcção dos caminhos de ferro, o fim principal era crear uns papeis de circulação para jogar não sobre as acções, mas sobre as promessas d'essas acções, e desgraçadamente no nosso paiz temos um recente exemplo disto mesmo, que foi, e ainda esta sendo muito fatal, e exactamente o que aconteceu, e esta acontecendo no nosso paiz, e com effeito na gazeta commercial se lê ainda na lista dos papeis de credito aonde vem especificado o nome, e preço de cada um delles no mercado, não se diz lá = acções da companhia das obras publicas = diz-se cautellas da companhia das obras publicas; é exactamente, Sr. Presidente, o que aconteceu a respeito das companhias dos caminhos de ferro, não se tractava de jogar sobre as acções, tractava-se de jogar simplesmente sobre as promessas d'essas acções. E não fica aqui ainda o juizo critico dos redactores a respeito destas companhias, mais adiante expressam-se deste modo (leu) Aqui esta, Si Presidente, não era o interesse geral do paiz, que apparecia neste objecto de construcções de caminhos de ferro, eram, Sr. Presidente, homens de negocio, porque desgraçadamente a experiencia demonstra que a respeito de todas as companhias, como terei occasião de fazer ver no progresso do meu discurso, que fóra da Inglaterra, porque só em Inglaterra essas emprezas, e essas companhias são possiveis, fóra disso, Sr. Presidente, não só as companhias que hoje se organisarem, mas as que existiram, e existem, são effectivamente a reunião de certa gente que não faz mais que pedir os capitaes a quem os tem, para com elles fazerem as construcções, e se proporem ás emprezas, que contractam. Mas não fica aqui o que ha a respeito deste negocio Sr. Presidente, a Camara sabe que a crise appareceu, a Camara sabe que para attenuar as consequencias dessa crise se quiz adoptar um meio, houve a idéa d'uma fusão, mas o que se vê, e que a crise senão evitou, porque era inevitavel, e tanto mais ella era inevitavel, quanto que essas companhias haviam tomado sommas consideraveis de capitaes. E aqui e occasião de notar que, vendo-se que isto affectava os interesses do todo o commercio, o governo inglez tomou uma medida singular, como tutor de todos os interesses, decretando a centralisação destas companhias, e a superintendencia administrativa de todos os seus negocios

Mas, Sr. Presidente, já que se nos fallou em companhias de caminhos de ferro, eu aproveito a occasião para me servir do argumento da construcção de

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caminhos de ferro contra as companhias; não se attenda sómente o que tem succedido em Inglaterra, que é um paiz excepcional a respeito de emprezas, veja-se o que se fez na Belgica no mesmo tempo, em que em França se dava a companhias a construcção de caminhos de feno; ahi o govêrno propoz, e conseguiu que ella fosse dada ao estado, e nesse paiz os caminhos de ferro de toda a rêde que se tinha traçado, foram principiados, e acabados por conta do governo, e mostraram naquelle paiz que este systema e preferivel ao das emprezas, se elle se puzer em paralello com o de companhias adoptado em França; na Belgica o govêrno fez aquillo que o ministerio francez propoz, mas com menos felicidade. Na Belgica votou se um systema de construcção de caminhos de feno por conta do governo, e o facto veiu provar que sendo esta construcção confiada ao governo, os caminhos de ferro foram a effeito, e acabaram-se em pouco tempo: os caminhos de ferro na Belgica apresentam um confiaste a essas construcções feitas nos outros paizes por meio de companhias.

Sr. Presidente, não é só na Belgica onde a construcção dos caminhos de ferro por conta do Governo teve logar, e que demonstia que a construcção por conta do Governo e preferivel a construcção por conta das emprêsas; é tambem nos Estados Unidos, onde se disse que havia caminhos de ferro por conta de emprêsas, nesses Estados da União, onde como em Inglaterra a riqueza esta em poucas mãos, e essas offerecem ao Governo certas desigualdades, por cima das quaes elle não póde passar para as poder fazer só, como em outros listados da União, onde se não da o mesmo inconveniente; o Governo faz estas obras por sua conta, porque effectivamente nesses Estados da União, onde a riqueza esta mais dividida, onde a propriedade esta mais repartida, o Governo faz tambem essas construcções por sua conta: já se vê que nestes dois paizes se apresentam exemplos a favor do systema que o Governo adoptou neste projecto, dando a preferencia ao de administração na construcção de todas as vias de communicação.

Mas isto pelo que pertence aos argumentos tirados das companhias dos caminhos de ferro, que se trouxeram para combater o projecto, porém elles devem tambem ser acompanhados de todos, que possamos ainda apresentar para o defender debaixo de outros pontos de vista. Vamos a entrar na questão francamente, porque o projecto tem sido combatido de tal maneira que é necessario lançar máo de todas os razões e de todos os argumentos, que possam justificar o systema que a commissão adoptou.

Sr. Presidente, disse-se que as emprêsas são o unico meio, pelo qual nós podémos ter estradas, mas tractando-se da sua construcção, nós por ventura devemos despresar a experiencia que temos tido até aqui? Não temos nos tido companhias desde 1837? E por ventura a experiencia destas companhias póde servir d'argumento para dar á industria particular a preferencia ou mesmo a concorrencia com o Governo para a construcção das nossas vias de communicação? A experiencia nos tem mostrado com tantas companhias que temos tido, que ellas a final não tem sido mais do que puras empreitadas, porque estando regulada cada braça d'estrada a 4$000 réis, estas braças feitas por conta das despezas de todas essas companhias, umas vezes nos tem saido a 16$ réis, e outras mesmo a 17000 réis. Pois esta experiencia deve ser perdida para o legislador, e sobre tudo quando se tracta de fazer uma lei, que deve ser regulada pela experiencia, porque ella é sempre a mestra do legislador, que não faz mais que tomar os factos para os reduzir a regras e principios. Mas fallou-se nos em systema mixto, quando nós combatemos a concorrencia da industria particular para a construcção das estrada; porem nós aqui não temos tido outra coisa senão um systema mixto, porque com todas essas emprêsas que tem havido, tem-se contractado as estradas por meio de barrei-as e subvenções; expropriações umas vezes todas por conta do Governo, e outras parte por conta do Governo, e parte por conta das companhias, barreiras, etc etc. Ora se nós temos lido já esse systema mixto, e desde 1837 que o adoptámos até agora, ainda não podémos ter estradas, se elle tem produzido pelo contrario grandes sacrificios que estão pesando sobre o paiz, a que o Governo se vê obrigado, como podémos optar por este systema?

Mas diz-se, as companhias são um meio promptissimo para ter estradas, sem as companhias não as podemos ter, e pelo systema que se propõe neste projecto, nós tarde as havemos de ter. Eu não posso respondei a estes argumentos, senão tambem com a experiencia, porque desde 1837 que temos emprezas, e até agora estamos ainda hoje sem estradas, desde 1837 que estamos contractando com differentes companhias, e ainda até hoje estamos sem estradas ainda hoje e que estamos fazendo uma lei, para podermos ter algum desses melhoramentos mas as estradas não são cousa, como disse o nobre Deputado a meu amigo o Sr. Assis de Carvalho, que assim que se contractem, immediatamente appareçam feitas; é necessario que haja tempo para poderem apparecer os effeitos de qualquer lei; nós adoptando um systema inteiramente opposto áquelle pelo qual ate aqui se tem tractado de prover á construcção das estradas, e necessario que esperemos que esse systema produza os seus effeitos, nós em Portugal não podémos ser mais bem succedidos do que tem sido outros paizes; em França, por exemplo, as estradas tem tido tambem toda essa demora que os Srs. Deputados receiam, porque segundo o que se lê tambem no Annuario de economia, a situação em França a este respeito em 1846, era a seguinte (leu)

Sr. Presidente, é necessario dar algum tempo para que d'um systema qualquer que se adopte, venham os resultados que se pertendem, mas não é certamente substituindo o systema que se acha neste projecto, não é adoptando o systema mixto, que nós havemos de ter as estradas com a pressa, que os nobres Deputados pertendem; porque com esse systema mixto, que é exactamente o que nós temos tido desde 1837, nós não temos tido estradas, nós não temos tido senão a successão d'emprezas, umas depois outras, e a final nem essas emprezas tem dado estradas, nem nós temos deixado de soffrer muitos inconvenientes que ellas tem causado.

Sr. Presidente, nós não temos só esta experiencia a respeito das emprezas, nós temos mais, temos uma opinião formada, e digamos a verdade como ella é; nós temos a opinião publica contra essas emprezas, fundada sobre os factos, não a respeito das emprezas grandes sómente, mas a respeito dessas emprezas pe-

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querias, porque quando os nobres Deputados fallam de emprezas, dizem logo vejam Já, nós não fallamos das grandes emprezas, essas não as queremos nós, nós fallamos das pequenas emprezas, pois a respeito destas pequenas emprezas, ha effectivamente uma opinião formada, a qual é preciso respeitai.

O que aconteceu, creio eu, em 1845, quando houve o pensamento de dar a uma companhia a construcção das obras da barra do Porto. Não se levantou a praça do commercio daquella cidade, reclamando contra semilhante idéa! Antes disso quando se tractou de ali mandar construir a bolsa, não exigiu a praça do commercio que esta obra se dirigisse por administração, e que não fosse dada a empreza nenhuma. Não se acha esta obra por administração muito adiantada, e corresponde inteiramente á esperança que tinha a praça de commercio, quando exigiu que ella não fosse dada a uma empreza, mas sim que tosse dada por administração? Mas não e só isto, ha outro exemplo desgraçadamente fatal que provou tudo contra essas emprezas pequenas, que os nobres Deputados querem, essa desgraçada obra da bana da Figueira, a qual sendo feita por uma empreza particular, sendo como dizem os nobres Deputados uma pequena empreza, em logar de produzir os resultados que se desejavam, esses resultados são todos negativos, porque aquella barra talvez passado bem pouco tempo se feche, e acabe de todo o commercio daquelle porto: aquella obra demonstra aquillo que os economistas escrevem a respeito das emprezas particulares, porque as emprezas particulares sacrificam tudo á barateza da obra, e é isto exactamente o que alli aconteceu A obra fez-se de tal maneira, justifica tudo o que se diz contra as emprezas particulares de tal modo, que se a empreza senão acautellasse, as aguas das mares eram bastantes para a deitar por terra, fez-lhe um reparo que ainda veio prejudicar mais o commercio daquelle porto, difficultando de tal maneira a entrada aos navios e embarcações que d'antes entravam dentro do porto a carregar, que umas já não podem entrar, e outras ficam fora para poderem receber a carga. Mas é só este o exemplo desgraçado que nós temos a respeito das emprezas? Não temos nós ahi essa obra da Valla d'Azambuja, essa obra cujos resultados estão patentes? Se acaso se tracta desta matei ía segundo os principios da sciencia, esses e que sòmente podiam justificar uma empreza no sentido desta que vem a ser a garantia de um minimo de Juro, mas esta obra sendo assim contractada, não esta ainda demonstrando tambem, que estas emprezas não preenchem de nenhum modo, nenhum dos fins, e que nem conforme os principios ellas são acceitaveis? Não esta o Governo pagando 15 contos a esta companhia correspondente aos juros do capital que ella tem despendido?

Sr. Presidente, e manifesto que os factos provam todos contra os nobres Deputados, que combatem o systema, que se acha consignado no projecto; provam os factos todos contra as companhias, com as quaes se argumenta, porque as companhias encarregadas de grandes melhoramentos materiaes, as dos caminhos de ferro, e das estradas, de certo não corresponderam aos principios em virtude dos quaes foram organisadas. Eu mostrarei ao illustre Deputado, pelo contralto quaes são os beneficios, que ellas tem trazido sempre, que tem apparecido com a sua influencia.

Mas, Sr. Presidente, contra isto não são só os factos, que provam, são tambem os principios da sciencia, porque esta já se tem encarregado de explicar esta materia, e de indicar qual é o meio a seguir, todas as vezes que se tracte da construcção d'um melhoramento material. E não me attribuam, que eu sou inimigo do espirito de associação, e das emprezas; ao contrario, sou amigo da concorrencia dos capitaes em qualquer objecto de utilidade publica, e digo que se acaso apparecer uma empreza qualquer, que tenha por objecto o desenvolvimento da prosperidade deste paiz, que tome conta d'algum negocio, donde venha uma grande utilidade publica, eu não só hei-de votar, porque essa companhia seja auctorisada, e protegido esse espirito de associação; mas sem faltar aos principios que tenho sustentado, hei-de conceder-lhe, todas as vezes que assim seja necessario, as izenções de que carecer, e todos 03 privilegios que o bem publico exigir. Mas a respeito de construcções e melhoramentos materiaes; a respeito de obras publicas, ellas não só estão em opposição aos principios, mas estão de encontro aos factos, que desgraçadamente temos presenciado.

Mas, Sr. Presidente, o projecto se apparecesse em Londres, ouvi hontem dizer, era rejeitado in limine, porque contrariava todos os principios da sciencia; porque continha absurdos; porque era cheio de inconvenientes; e porque não tinha uma só disposição que podesse aproveitar-se; entretanto eu vejo, ao menos neste livro que tenho presente, as lições de Mr. Chevalier, o systema de emprezas fortemente combatido. (leu)

Aqui temos, Sr. Presidente, como é considerado o engenheiro, que serve ás ordens de uma companhia; sacrifica tudo á barateza; porque não tem outro movel senão o seu interesse particular, que é o premio da companhia, se acaso a obra fôr feita por menos preço do que aquelle, porque esta orçado, e der conta da obra em menos tempo do que aquelle em que esta tambem orçada, porque nisto diminue tambem a despeza da companhia. — Continua o illustre economista dizendo, (leu)

Ora eis-aqui esta como são consideradas as emprezas particulares, em comparação do systema destas obras por conta do Governo; ellas sacrificam tudo á barateza dos trabalhos, e é em virtude disso que nós lamentamos, por exemplo, as obras da barra da Figueira terem sido feitas do modo como o estão, e é effectivamente como são feitas todas as que são dirigidas por companhias.

Mas dizem os illustres Deputados, nós não queremos as grandes emprezas, nós o que queremos é o systema mixto, e em virtude desse systema mixto, que as pequenas emprezas concorram, com o Governo, para a construcção das estradas.

Mas, Sr. Presidente, se acaso se dão nas emprezas em grande, nas grandes companhias, todos estes inconvenientes, no systema mixto, elles hão de apparecer na sua proporção indispensavelmente nas pequenas companhias, se acaso fossem chamadas a concorrerem com o Governo nos trabalhos publicos, e em qualquer obra, de que fôssem encarregadas; mas além disto, Sr. Presidente, como eu já disse, o systema mixto é exactamente o que temos tido, desde 1837, em todas as companhias que se tem organisado, sem effeito nenhum Ora essas companhias para se poder em admittir, o indispensavel, que se lhe concedam privilegios, mas entre ellas apparece

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um, contra o qual se levantam não só os exemplos do que esta succedendo em toda a parte, mas os proprios principios: é o direito de barreira, o qual eu tenho visto aqui elogiar, e considerar como o unico meio de conservação das estradas.

Sr. Presidente, em primeiro logar, nós devemos attender, quanto seria imprudente, nas circumstancias actuaes, crear um imposto, contra o qual em 1846 o povo já se pronunciou destruindo as barracas que já havia nas estradas do Minho, aonde este imposto se cobrava, e nós, Sr. Presidente, que recuamos diante da conveniencia de adoptai mos já a contribuição de repartição, que consideramos uma medida de organisação da fazenda publica, e que recuamos em virtude de algumas considerações, que não podem escapar á prudencia de um homem de estracto: seria por ventura conveniente irmos adoptar os direitos de barreira, contra os quaes o povo já se tem pronunciado?... O nobre Deputado a quem já me referi, o Sr. Agostinho Albano, não teria razões de conveniencia, quando disse que podiamos passar sem os direitos de barreira?... Já aqui se disse que Napoleão tinha abolido os direitos de barreira, e que este argumento o que prova, era que Napoleão se queria fazer popular; porém, Sr. Presidente, é necessario advertir, que se acaso Napoleão em alguma cousa errou, foi sómente como general mas como administrador não, merece senão ser elogiado, porque tudo quanto fez em administração, tudo se póde dizer, que é bom, e em tudo isso não ha nada, que não deva sei tomado como modello; (apoiados) e Napoleão, que aboliu os direitos de barreira, boas razões achou para o fazer, assim como o Duque de Toscana de que aqui tambem já se fallou, e, Sr. Presidente, tanto os direitos de barreira são inadmissiveis que os illustres Deputados confessam que em França ainda se não restabeleceram, e lá pagam-se nada menos de quarenta e quatro milhões de francos. Mas, Sr. Presidente, se acaso nós adoptassemos os direitos de barreira, poderiam elles produzir alguma cousa? Não foram elles já estabelecidos entre nós, assim como todos os outros tributos para a construção de estradas?.... E por ventura nós tivemos estradas? E se elles se adoptarem não seria necessario collocar um destacamento em cada ponto, aonde houvesse uma barreira? Seria isto conveniente ao serviço, e á disciplina do exercito?... Mas, Sr. Presidente, se os nobres Deputados entendem, que estabelecidas as barreiras entre nós, e creando todos esses encargos, que podemos ter estradas sem ter de pagar as expropriações que se fizerem, ou todas por conta do Governo, ou parte por conta do Governo, e parte por conta das companhias, estão perfeitamente enganados, e no que tem acontecido, esta a demonstração do contrario, porque não era possivel, que houvesse empreza que quizesse tomar conta da construcção das estradas, só com o subsidio do imposto, e com o imposto, e com o direito de barreira; porque não foi possivel nunca realizar-se nenhum contracto désse modo. O que é certo, e que as barreiras contrariam todos os principios, e para as estradas devem pagar todos quantos interessem em que ellas existam. Para as estradas, só não devem pagar os mendigos, e esses, que o não são em suas casas têem, em que devem ser collectados, e nenhum ha destes, que não interesse na construcção, e na boa conservação da? estradas.

Sr. Presidente, o imposto de barreira de mais a mais e desigual, porque aquelles que passam peias estradas não tem todos os mesmos meios para contribuirem; o desgraçado que conduz pela estrada uma carga qualquer, não esta nas mesmas circumstancias daquelle que passa pela estrada n'um carrinho; este tem outros meios de contribuir, que se não dão a respeito daquelle, que não tem mais que a desgraçada industria, em virtude da qual se lhe exige nas barreiras um direito como se exige ao outro.

Não obstante diz-se-nos que as barreiras têem feito em toda a parte as estradas, e que sem barreiras não é possivel conservarem-se. Mas, Sr. Presidente, não só já se tem dicto tambem que em França não ha barreiras, mas o que é certo é, que em toda aparte da Allemanha e em outros paizes, aonde se tracta de regular este negocio das estradas, ninguem quer admittir barreiras; o que é certo é, que mesmo em Inglaterra todos os annos se tem tractado de resgatar os povos deste imposto, odioso; o que é certo é que neste paiz, onde se diz que as barreiras, continuem já o habito do povo, sempre que o povo póde reagir contra a cobrança do imposto, faz com que deixe de cobrar-se, inclusivamente destruindo as barreiras, aonde elle se cobra. E na Inglaterra ha a Irlanda, aonde se não conhecem barreiras, e aonde as estradas segundo são accordes todos os escriptores, são as melhores que é possivel.

A vista disto não se diga que as barreiras são um meio necessario e indispensavel para se conservarem as estradas; o meio necessario e indispensavel para se conservarem e um tributo que pese igualmente sobre todos aquelles, que têem interesse na conservação das estradas; um tributo que pese igualmente sobre o proprietario, sobre o commerciante, e sobre o artista, porque todos estes têem necessidade, todos estes têem interesse em que saiam pelas estradas os productos da agricultura, da industria, e do commercio.

Já ouvi aqui dizer que o tributo era vexatorio, que o tributo não se podia sustentar, que o tributo não se podia votar, porque elle affectava só a propriedade, e a propriedade estava carregada. Oh! Sr. Presidente, pois o imposto que se apresenta no projecto, affecta só a propriedade? Pois a decima e os impostos annexos affectam só a propriedade? E não e tanto a uma como aos outros que o imposto das estradas ha de ser addicionado? Sr. Presidente, a decima e os impostos annexos affectam por igual não só a propriedade, mas affectam o cominei cio, e affectam a industria, affectam tudo quanto deve ser contribuido para as despezas do Estado. As barreiras consideradas debaixo deste ponto de vista é que são um tributo completamente vexatorio, desigual, e um tributo pezadissimo.

Ora mas se o tributo não se deve votar, perguntarei eu se por ventura e possivel que as companhia» ou emprezas que se pertendem substituir ao systema do projecto, venham empregar nas estradas os seus capitaes sem terem garantia nenhuma?

Sr. Presidente, o imposto que se acha no projecto, é aquelle que a commissão entendeu que podia mais facilmente satisfazer aos fins para que o destinava, a construcção das estradas: o imposto tem sido mal avaliado; é verdade que a commissão teve em vista a contribuição de repartição, e que adoptada esta, a administração das estradas podia ser dotada com uma

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receita mais sufficiente, entretanto considerada a cifra em que actualmente são estimadas no orçamento a decima, e os impostos annexos, os nobres Deputados não podem deixar de considerar que pelo projecto ha uma receita sufficiente para a dotação das estradas.

O nobre Deputado que acabou hoje de fallar, considerou que o producto do imposto na decima, e nos impostos annexos não dava a receita sufficiente; e considerou tambem que o Governo queria fazer estas estradas unicamente pelo producto da contribuição. E isto o que não póde passar pela cabeça de ninguem, porque não era possivel com 300 contos em que se póde calcular o producto do imposto na decima, e impostos annexos, não era só com esta somma que se podiam fazer as estradas, é indispensavel, que sobre ella se levantem alguns capitaes, com os quaes se façam essas obras; e 300 contos podem effectivamente dar meios para levantar fundos sufficientes para todas essas despezas; accrescendo que essas despezas estão já adiantadas, porque tudo quanto ha a respeito de estradas são despezas que já estão feitas, e que agora não e preciso fazer de novo.

E sóbe de 300 contos o que o imposto na decima, e impostos annexos póde render, principalmente depois que sejam approvadas as propostas que se acham na Camara para a reforma da decima, e dos impostos annexos, porque certamente reformado o lançamento da decima, e dos impostos annexos hão de estes tributos produzir uma somma superior áquella em que são estimados no orçamento, e por consequencia o imposto para as estradas ha de ser maior.

Pelo que respeita ao systema que a commissão adopta na organisação do projecto, compreendendo a legislação a respeito dos caminhos visinhaes, e de districto, a commissão entendeu que devia compreender em uma lei tudo quanto dizia respeito á legislação sobre a viação. Em França, por exemplo, acha-se disperso por uma immensidade de leis, por uma immensidade de regulamentos, até em ordenança», e até em arestos dos conselhos geraes a legislação a respeito de estradas, e de caminhos visinhaes; mas a commissão entendeu que sendo chamada a fazer um trabalho completo ácerca de estradas, ella devia tractar juntamente não só das grandes estradas, mas dos caminhos visinhaes, e dos caminhos de districto, para que deste modo podesse o paiz ser dotado com todas as vias de communicação, das quaes ha de resultar a sua prosperidade.

Sr. Presidente, o projecto tem estado em discussão já ha bastantes dias; a Camara póde tomar sobre elle a resolução que entender, o Governo pela sua parte deseja que haja uma lei de estradas; a Camara póde approvar o projecto na sua generalidade, e depois de o approvar na sua generalidade tem occasião na discussão da especialidade de introduzir nelle qualquer melhoramento, que as conveniencias publicas aconselharem (apoiados); o Governo tem considerado que as provisões que se acham no projecto, são aquellas que deviam ser adoptadas, para que effectivamente tivessemos estradas; o Governo, seja qual fôr a resolução da Camara, esta decidido anão fazer qualquer estrada senão em virtude do systema que nelle se acha estabelecido, porque esta convencido da sua preferencia a outro qualquer systema. Entretanto a Camara approvando o projecto na sua generalidade tem deste modo satisfeito a todas as indicações, e o

Governo na discussão da especialidade terá occasião de ver ser por ventura alguns melhoramentos no projecto são possiveis (muitos apoiados.)

O Sr. Faria Barbosa — Sr. Presidente, como já são mais de 9 dias de discussão de generalidade, pedia a V. Ex.ª tivesse a bondade de consultar a Camara sobre se a materia estava discutida.

Decidiu-se affirmativamente.

O Sr. Presidente: — Eu vou propôr á votação o projecto n.º 103 na sua generalidade, não importando a approvação da generalidade o prejuizo das propostas, que se mandaram durante a discussão, nem a approvação de um systema qualquer com preferencia, ou exclusão de outro; mas. só a necessidade, conveniencia, e opportunidade de se passar á discussão da especialidade, e de ahi se considerar, o melhor systema, e bases. Portanto, repito, a approvação do projecto na generalidade importa o mesmo que a necessidade, conveniencia, e opportunidade de se tractar do objecto de estradas, e de na discussão da especialidade se ver qual é o systema, e bases que devem votar-se.

O Sr. Lopes de Lima: — (Sobre a ordem,) Peço a votação nominal.

Propondo-se este requerimento á votação? disse

O Sr. Presidente: — Bastando que haja só um terço de votos, esta approvado que haja votação nominal por 32 votos, contra 33.

O Sr. Gorjão Henriques: — (Sobre a ordem.) A maneira porque V. Ex.ª explicou a votação a que vai proceder a Camara, decidiu inteiramente a minha votação; mas eu peço que seja consignada na acta essa mesma proposta de V. Ex.ª, (apoiados) assim como em outra occasião se fez a respeito da votação do art. 63.º da Carta: que seja bem expresso na acta — que aquelles que approvam o projecto na sua generalidade, tão sómente approvam o pensamento de que é de muita necessidade, e da maior urgencia para o paiz a feitura das estradas; que por tanto se vota unicamente isto.

O Sr. Presidente: — Sem questão nenhuma se ha de consignar na acta tudo o que se passa, principalmente sobre o modo da votação.

O Sr. Fontes Pereira de Mello: — Pedi a palavra para dizer a V. Ex.ª e á Camara, que me custai muito conformar-me com o modo, porque se vai propôr á votação este projecto na generalidade, e por uma razão muito simples; porque me parece que é summamente epigrammatico para a Camara discar nove dias cousa nenhuma; pois que da proposta que V. Ex.ª faz á Camara, e que se vai votar, a consequencia não é outra. O projecto esteve nove dias em discussão, ninguem o combateu por não querer estradas; por consequencia votar agora da maneira que V. Ex.ª propõe, é uma perfeita decepção; são nove dias de discussão perdida, e não se entenda que com isto pertendo irrogar a menor censura a V. Ex.ª; mas o parecer da commissão dizia, que devia haver uma só discussão na generalidade; a Camara creio que assim o tinha entendido, e por isso deixou correr a discussão com a maior amplitude; eu pela minha parte entendi-o dessa maneira; e agora, no fim de nove dias de debate, votar a Camara», se quer que hajam estradas, entendo que é um perfeito epigramma; entretanto ella decidirá como entender.

O Sr. Presidente: — E preciso declarar, que se se entendesse a discussão, e votação da generalidade,

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segundo a opinião do illustre Deputado, na especialidade nada havia afazer; e eu não quiz que ficasse prejudicada a opinião de qualquer Se Deputado com esta votação (apoiados.) Segundo a marcha adoptada desde que entre nós ha o systema representativo, não temos ligado ás discussões na generalidade a mesma importancia, que em outros paizes se dá, e por isso é que eu quiz que se entendesse bem a maneira porque se votava; isto mesmo aconteceu por occasião da discussão sobre o art. 63.º da Carta, em que houve talvez tuna discussão mais longa do que esta; (apoiados) mas se os Srs. Deputados querem outra cousa, vencendo-se assim, eu não tenho duvida em o propôr; mas propuz do modo como já indiquei, porque quiz salvar o escrupulo de todas as consciencias (apoiados.) (Vozes: — muito bem, muito bem, assim é que deve ser.)

O Sr. Rebello da Silva: — Peço a palavra.

O Sr. Agostinho Albano: — Direi muito pouco, porque desejo sempre ouvir o illustre Deputado, que acaba de pedir a palavra; e muito particularmente por estar já dicto, e muito bem dicto pelo Sr. Gorjão, o que eu queria, dizer.

Eu desejava que o modo da votação fosse consignado em acta tal qual V. Ex.ª o indicou, e desejava que V. Ex.ª o tornasse a annunciar, para que todos ficassem convencidos da maneira porque votavam; e accrescentarei sómente, que esta discussão, ainda que tem sido longa, tem sido importantissima; (apoiados) porque por ella nó» temos as nossas consciencias já dispostas para bem podermos entrar na materia especial, quando lá chegarmos, e pontos haverá em que, apezar da grande discussão que tem tido logar, o debate não ha de ser pequeno. Por isso peço a V. Ex.ª que antes de propôr á votação o projecto, haja de annunciar de novo o modo da votação, e que fique bem consignado na acta, para depois não haverem duvidas.

O Sr. Presidente: — Quanto ao segundo pedido do Sr. Deputado para que fique consignado na acta o modo porque foi feita a votação, não era necessario, porque a acta conota, e deve sempre constar fielmente de todas as decisões aqui tomadas (apoia dos.)

O Sr. Rebello da Silva: — Fui completamento prevenido por V. Ex.ª e pelo illustre Deputado que acabou de fallar. Na realidade era impossivel deixar de se conceder uma discussão lata sobre este objecto, que a Camara não póde deixar de julgar importantissimo, (apoiados.) Eu tambem nunca entendi que a discussão geral podesse prejudicar de maneira algum», na discussão especial, a opinião de qualquer Deputado: e não é novo este modo de considerar a discussão na generalidade de qualquer projecto: na discussão da lei eleitoral seguiu-se este mesmo methodo; e um illustre Deputado, que sinto não ver na sua cadeira por causa da doença em que embora, disse nessa occasião — que a discussão na generalidade da lei eleitoral nada e a mais do que estabelecer o principio, e esclarecer a Camara sobre a materia. Por tanto creio que não póde haver duvida em se proceder á votação da maneira, por que V. Ex.ª acaba de indicar, (apoiados)

O Sr. Gorjão Henriques. — Não se diga que foi inutil a discussão da generalidade, nunca foi inutil a discussão em geral de qualquer projecto, por que não só se discute a necessidade dessa medida contida no projecto; mas tambem a sua capacidade, e a necessidade de a levar ao fim. Por tanto, queira V. Ex.ª segundo já se pediu, ter a bondade deformar a propôr a Camara o modo de votação.

O Sr. Presidente: — Vai propôr-se á Camara se approva o projecto n.º 103 na generalidade. — Esta approvação importa sómente o reconhecimento da necessidade, conveniencia, e opportunidade de um projecto de lei sobre estradas. Não involve a decisão de qualquer das especies contidas no projecto, nem prejudica as differentes propostas que se tem apresentado, antes a seus auctores fica a liberdade de as poder renovar em qualquer occasião, que o julgarem opportuno, (apoiados vozes: — muito bem)

O Sr. Gorjão Henriques — A proposta da votação nominal e uma proposta decidida; mas se me é permittido, eu faço outra, pedindo que se dispense a votação nominal.

O Sr. Presidente: — O requerimento importa a annullação de uma decisão da Camara; mas é feito, quando, para assim dizer, tem mudado as circumstancias; porque quando se pediu a votação nominal, não estava ainda declarado o sentido em que se havia de votar, (apoiados).

Foi logo dispensada a votação nominal, e seguidamente posta a votos pelo methodo ordinario de levantados e assentados, e na forma proposta pelo Sr. Presidente o

Projecto na sua generalidade — foi approvado.

O Sr. Presidente: — Esta approvado o projecto na generalidade unanimenente...

O Sr. Cunho Sotto-Maior: — Eu reclamo contra a unanimidade.

O Sr. Presidente: — Tem razão, não reparei por não ver o Sr. Deputado, no logar que occupou: está approvado o projecto por todos os Srs. Deputados presentes, menos pelo Sr. Deputado Cunha Sotto maior.

Vai lêr-se a ultima redacção do projecto de lei sobre conselhos disciplinares para ser expedida com emendas para a outra Camara, d'onde veio.

Leu-se e foi approvado.

O Sr. Xavier da Silva: — Pedia a V. Ex.ª que consultasse a Camara se dispensava o regimento, para que segunda feira se entrasse na discussão especial do projecto que acabou de votar-se, sobre as estradas.

Decidiu-se affirmativamente.

O Sr. Presidente: — A ordem do dia para segunda feira, depois dos pareceres manuscriptos que estão na mesa, apresentados por differentes commissões, cuja resolução é indispensavel para seguirem os seus destinos, e o projecto n.º 81 do anno passado, e o projecto n.º 103 na especialidade; e logo que a commissão Eleitoral diga, que esta de posse dos esclarecimentos que pediu sobre o projecto n.º 48 do anno passado, visto que as emendas, por ella apresentadas ao mesmo projecto, já estão impressas sob n.º 21 e distribuidas desde 23 do corrente, será dado subsidiariamente, para ordem do dia. Está levantada a sessão. — Era mais das quatro horas da tarde.

O 1.º Redactor,

J. B. GASTÃO.

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