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N.º 28.

RELATORIO

DO

MINISTERIO DOS NEGOCIOS DO REINO

EM 1849.

SENHORES:

O Relatorio, que tenho a honra de submetter á consideração das Côrtes, tem por objecto dar a conhecer o estado actual da administração a cargo do Ministerio do Reino.

Os ramos de serviço mais importantes a que alludo, correspondem ás partes, em que o Relatorio é dividido.

PRIMEIRA PARTE.

Tranquillidade geral.

§ 1.º

Segurança pública.

Ainda duravam os odios e as funestas consequencias das ultimas luctas civis, quando fui chamado aos Conselhos da Soberana, na qualidade de Presidente do Conselho de Ministros, com o encargo de Ministro e Secretario d'Estado dos Negocios Estrangeiros, e depois com o da Repartição dos Negocios do Reino.

Profundamente convencido, que a ordem e segurança pública eram a primeira necessidade dos Povos, e que, sem estes elementos, considerados como base indispensavel para todos os melhoramentos e refórmas administrativas nos interesses do Paiz, não haveria nunca sociedade possivel, entendi, que os primeiros e maiores cuidados do Governo deviam ser consagrados á sustentação da paz e da tranquillidade geral da Nação.

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Armado, então, com os poderes constitucionaes, e com os principios de justiça, de moderação, e bem entendida tolerancia politica, o Governo, fazendo dar a mais ampla e completa execução ao acto solemne do amnistia, que cobrira com o seu manto de clemencia os actos e crimes da revolta, e rehabilitára os cidadãos desvairados para voltarem a obediencia das Leis, chegou a effeituar a reconciliação de toda a Familia Portugueza, a restabelecer o repouso e socego publico, que têm sido até ao presente inalteravelmente mantido.

Não ignorava todavia o Governo, que estes meios de brandura nunca poderiam, por si sómente, conter os homens turbulentos, e habitualmente sediciosos, maiormente quando elles, animados pelo estampido da explosão revolucionaria em differentes Paizes da Europa, intentassem accender de novo, entre nós, o fogo da discordia.

Para domar, pois, as paixões violentas dos agitadores, e prevenir as suas criminosas tentativas, não deixou o Governo de empregar os seus desvelos na administração e collocação da força pública, a fim de ameaçar com ella, ou por ventura rebater a ousadia de quem quer que se arrojasse a levantar o grito da revolta; e pede a verdade, que agora se declare, que o Exercito, as Guardas Municipaes, e os Corpos Nacionaes, têm sido um seguro penhor de paz, contribuindo poderosamente, pela sua lealdade e disciplina, para a conservação das Liberdades Constitucionaes, e para a manutenção da ordem estabelecida.

Por esta occasião fallarei do serviço, relativo á força pública, na parte que pertence ao Ministerio do Reino.

Recrutamento.

O recrutamento, feito pelas Authoridades Administrativas, na conformidade dos Regulamentos e Instrucções do Governo, para se apurarem 4:200 mancebos, destinados a preencherem a força do Exercito, que se acha fixada pela Lei de 24 de Abril de 1848, tem soffrido, e ainda está soffrendo, gravissimas difficuldades, que muito retardam e damnificam o seu bom resultado.

Tambem o § 1.º artigo 7.º titulo 2.º da Carta Constitucional da Monarchia, statuindo, que os filhos de pae estrangeiro, nascidos em Portugal ou nos seus Dominios, sejam considerados portuguezes uma vez que alli não residam por serviço do seu Paiz, tem feito levantar duvidas, se por ventura esta disposição será preceptiva ou simplesmente facultativa, e dahi procederam reclamações Diplomaticas, e novos embaraços ao serviço do recrutamento.

Para remover uns e outros inconvenientes procurou o Governo colligir os elementos necessarios para duas Propostas de Lei, sendo uma destinada a se fazerem na legislação do recrutamento, as indispensaveis modificações, exigidas pela experiencia, e a outra consagrada a solicitar do Poder Legislativo uma interpretação authentica ácêrca da verdadeira intelligencia do citado artigo da Carta.

Guardas Municipaes.

Os Corpos Municipaes, creados para coadjuvarem as Authoridades Administrativas no exercicio das suas funcções de policia geral, existem hoje unicamente em Lisboa e Porto, debaixo da immediata inspecção do Ministerio do Reino.

A Guarda Municipal de Lisboa, commandada por um distincto e valente Official de Cavallaria do Exercito, torna-se credora dos maiores elogios pela extremada subordinação, vigilancia e actividade com que faz o serviço da sua competencia, mantendo o socego e completa segurança, de que os habitantes desta populosa Capital estão gosando.

A Guarda Municipal do Porto, no estado actual de sua recomposição e força legal, satisfaz amplamente a todos os fins, e a todas as condições da instituição desta milicia.

§ 2.º

Segurança individual.

Não só a segurança individual, se não ainda a liberdade e a propriedade, soffreram grandes violencias durante a ultima revolta, pois que, devendo esses direitos civis e politicos receber a sua maior força e garantia da fiel observancia das Leis, e do exacto cumprimento das obrigações sociaes, reconhecido é, que todos estes vinculos foram despedaçados naquella época de anarchia, de confusão e desordem.

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Um dos effeitos mais desastrosos de tão grande mal, fui a desmoralisação pública, que em todos os tempos foi considerada como uma das causas geradoras e impulsivas dos crimes, dos delictos, e de todos os actos illegaes.

Assim mesmo, depois que o restabelecimento da tranquillidade começou a generalisar-se, e que desafrontados de instigações insidiosas, os homens illudidos, ou incautos, principiaram a entregar-se novamente ao exercicio das suas profissões, debaixo da influencia benefica da grande conciliação, póde assegurar-se, que na moralidade pública tem havido progressivo melhoramento, — que a diminuição dos crimes é cada vez maior, — e que a segurança individual e a propriedade não cessam de receber grande consistencia e mui efficaz protecção. O Documento N.º 3 comprehende a statistica criminal de 1848.

Muitos malfeitores, dos que tem infestado alguns Districtos ao norte do Reino, foram, nestes ultimos mezes, capturados, e entregues aos Tribunaes, em resultado das boas diligencias das Authoridades Administrativas, a respeito das quaes cabe aqui dizer, que todas ellas se hão mostrado activas e zelosas na execução das Leis e Regulamentos, que prescrevem o serviço de policia preventiva.

A prevenção dos crimes é, por certo, uma das mais importantes funcções administrativas; seja-me com tudo permittido observar, que os maiores exforços da policia preventiva serão sempre inefficazes ou menos valiosos, se por ventura, em apoio delles, náo vier a acção da policia judiciaria, e a influencia da moralidade pública.

Procure obter-se, que a punição de todos os crimes e delictos seja inevitavel, pela execução completa o rapida das leis de repressão, fundadas em uma boa organisação judiciaria, e que a moralisação pública chegue ao seu possivel aperfeiçoamento, por effeito de bem calculadas leis de administração, reguladoras dos differentes ramos de serviço publico, e protectoras de todos os interesses industriaes e sociaes, e veremos então resultar d'ahi a extincção, ou uma grande diminuição, dos crimes, veremos, que a segurança individual e a tranquilidade geral ficarão então estabelecidas em bases solidas e permanentes.

SEGUNDA PARTE.

Administração Geral.

O systema administrativo, reorganisado entre nós pelo ultimo Codigo em 1842, ficou dependente de algumas providencias subsidiarias para o bom resultado de sua execução.

Uma dessas medidas reguladoras era a creação de um Tribunal, perante o qual podessem ser intentados os recursos estabelecidos pelo Codigo sobre o contencioso de administração, visto que seria sempre baldada essa garantia da justiça administrativa em quanto não fosse convenientemente fixado o modo pratico de a realisar.

Foi por isso sanccionada a organisação de um Tribunal superior, junto ao Conselho d'Estado, o qual, tomando conhecimento, por meio de recurso, das contendas particulares em materia contenciosa, e dos conflictos de jurisdicção e competencia entre as Authoridades Administrativas e Judiciaes, ou entre as Authoridades Administrativas, podesse além disso auxiliar o Governo na deliberação das gravissimas questões de administração geral, e na dos mais importantes negocios do Estado.

Este Tribunal cuja legislação organica, consignada na Lei de 3 de Maio de 1845, e no Regulamento de 16 de Julho do mesmo anno, fôra suspensa pelo Decreto de 29 de Maio de 1846, acha-se novamente investido no exercicio de suas legitimas funcções, em virtude da Lei de 19 de Agosto de 1848, que revogára a suspensão decretada.

O modo porque se mandou dar execução a esta Lei para a nova installação do Tribunal, os Vogaes de que elle se acha composto nas suas diversas Secções e Commissões, e os Empregados existentes na respectiva Secretaria, tudo se deixa vêr do Documento N.º 4.

Muitas são as medidas, até aqui adoptadas, para dar impulso e força a diversas outras disposições do

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Codigo; mas pede a verdade dizer-se, que os resultados não têem correspondido as necessidades do serviço.

Entre as causas que concorrem para a existencia e duração do mal, póde assegurar-se, que a primeira dellas é a irregular e má divisão territorial, que serve de base ao actual systema administrativo.

Ninguem já hoje desconhece, que a multiplicidade de Freguezias, de Concelhos, e Districtos, produzira um grande numero de cargos sem habilitações nem responsabilidade para o funccionalismo; e que, entre aquellas unidades do systema administrativo, não fôra guardada a necessaria proporção e igualdade, nem houvera o devido respeito á população, aos limites naturaes do territorio, nem ás sympathias moraes dos Povos; e que tudo isto tem feito nascer graves inconvenientes, offensivos dos interesses dos administrados, e levantar não menores difficuldades ao cumprimento das obrigações das Authoridades encarregadas da administração.

Já a Lei de 29 de Maio de 1843, reconhecendo algumas destas consequencias, havia authorisado o Governo para occorrer a ellas por meio de certas reducções nos Districtos e Concelhos do Continente do Reino.

O Governo, para levar a effeito essa refórma, encarregou os trabalhos della a uma Commissão; e esta, depois de repetidas investigações e conferencias, chegou a apresentar o resultado que lhe parecêra mais conforme ao pensamento da lei; mas, sobrevindo innumeraveis representações sobre a collisão de interesses collectivos e individuaes, que por esta occasião se antolhava aos Povos, foi mister dar logar á reconsideração da materia.

Além disso:

E reconhecida a vantagem de se effeituar a nova divisão territorial, com attenção ás conveniencias do serviço, nos ramos de administração ecclesiastica, judicial, militar e de fazenda.

Todos os interesses estão reclamando, que a divisão do serviço, no ponto de vista administrativo, seja regulado por modo, que sobre elle possa estabelecer-se uma carreira, organisada com habilitações, accessos, e vencimentos, e com responsabilidade, fiscalisação, e inspecção, que, depois de bem definidas, se tornem reaes e effectivas.

É um sentimento universal, que esta divisão fique tambem sendo a base geral para um systema de grandes economias, e de grandes melhoramentos em todo o circulo da pública administração.

Para se alcançarem tão proveitosos resultados não são certamente bastantes as disposições da citada Lei de 29 de Maio de 1843. Cumpre que em logar dellas, cheguem a sanccionar-se outras Bases conforme aos principios que ficam expendidos. Tenho por tanto a honra de submetter á vossa consideração, para esse fim, uma Proposta de Lei, aqui junta.

Statistica.

Se a divisão territorial é uma base essencialmente organica da administração nas suas diversas relações, tambem a statistica, quando fôr um quadro fiel das necessidades, e do valor de todos os productos reaes e pessoaes do Paiz, não poderá deixar de ser apreciada como um dos mais poderosos auxiliadores da mesma Administração, indicando os recursos, e fornecendo os esclarecimentos necessarios para a sustentação da vida material, e para a manutenção dos vinculos civis e moraes da sociedade.

Levado destes principios, e do cuidado que, por effeito delles, deve haver no aperfeiçoamento da statistica, entendeu o Governo, que, para se alcançar este fim, muito podia concorrer a formação de um Cadastro, modelado por algum daquelles, que, nos Paizes mais adiantados na sciencia administrativa, preenchessem melhor as condições da sua instituição.

Resolveu então o Governo, como effectivamente nomeou, por Decreto de 8 de Novembro de 1846, ao Conselheiro Antonio José d'Avila, para ir estudar e comparar os methodos, as operações, e as diversas questões cadastraes, e investigar e colligir os elementos mais adequados para a organisação e progressivo melhoramento de um Cadastro geral do Reino.

O Conselheiro Avila, dando conta do estado das investigações e estudos a seu cargo, inculcou a conveniencia de imitarmos a organisação de um Cadastro topographico parcellar, coordenado sobre, a base da grande triangulação, e planta geral do Paiz, que servisse para facilitar as operações dos lançamentos e cobrança das contribuições, prestando ao mesmo tempo garantias seguras e permanentes aos importantes e variados interesses da propriedade predial. Mostrou igualmente, que para esta obra se realisar, seria de grande vantagem nomear-se uma Commissão de Engenheiros, de Economistas, de Administradores, de Agricultores, e de Jurisconsultos, que, estudando profundamente a questão, applicada ás nossas circumstancias, compozesse as instrucções necessarias para as operações indispensaveis do Cadastro.

Em conformidade com estas idéas passou o Governo, pelo seu Decreto de 30 de Agosto de 1848, a

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nomear uma Commissão composta de 22 Vogaes, encarregando-a de preparar as instrucções, os trabalhos, e o orçamento das despezas necessarias para a effectiva organisação e conservação do nosso Cadastro.

A Commissão, entendendo, que as operações cadastraes não podiam principiar antes de acabada a triangulação, a que se estava procedendo para o levantamento da Carta geral do Reino, propoz que, para apressar estes trabalhos, se ordenasse o augmento do pessoal da Commissão geodesica, a construcção de quarenta e cinco piramides, e de seis barracas para deposito e abrigo dos instrumentos, e a compra de seis theodolitos, e um circulo repetidor.

Estes instrumentos foram já encommendados para Londres e Pariz; as barracas vão ser construidas no Arsenal do Exercito; estão dispostos os elementos para successivamente se proceder á construcção das piramides; e, quando chegarem os instrumentos, será augmentada a Commissão geodesica, que actualmente se acha de facto incorporada na Commissão do Cadastro.

Prepara-se o Orçamento das despezas de uns e outros trabalhos. A importancia dellas será opportunamente reclamada ás Côrtes por uma Proposta de Lei especial.

Benificencia Pública.

Os Estabelecimentos de benificencia, comprehendendo os de caridade e piedade, ressentem-se dos estragos e consequencias das nossas dissensões politicas. A consideravel diminuição nos seus rendimentos, reunida a muitas outras causas geraes e particulares, desde longo tempo existentes, têem poderosamente concorrido para a decadencia destes Asylos da desgraça.

O Governo reconhece a grande importancia de um ramo de administração, que abrange toda a esphera dos soccorros publicos, devidos á humanidade desvalida, no estado de infancia, de doença, e de extrema velhice. Deseja regularisar tão valioso serviço; mas conhece que os exforços governamentaes, atalhando muitos dos inconvenientes actuaes, nunca poderão ter a força sufficiente para os extinguir sem o concurso do Poder Legislativo.

Induzido por esta convicção, não duvidou o Governo apresentar ás Côrtes, na Sessão de 1843, uma Proposta de Lei para a reorganisação do systema de benificencia. Ainda chegou a ser approvada na Camara dos Senhores Deputados; não podendo porém ser discutida dentro da Legislatura na Camara Hereditaria, veio por isso a caducar.

Quereria o Governo renovar desde já essa Proposta; mas as circumstancias mudaram. O systema de benificencia tem muitas e variadas ramificações, que, no estado actual de sua existencia, carecem de grandes reformas. É necessaria uma reorganisação geral e completa, que, sem faltar á unidade entre todos os Estabelecimentos de benificencia, regule a acção, a responsabilidade, e a fiscalisação de cada um delles. Tudo isto demanda mui serio estudo e variadas combinações, que só podem fazer-se com vagar e reflexão no centro de todos os esclarecimentos e dados statisticos.

É por estas razões, que o Governo não póde ainda propôr uma lei sobre tão importante reorganisação. Quando houver colligido e coordenado os elementos necessarios para ella, não se demorará em a elevar ao conhecimento das Côrtes.

Saude Pública.

O serviço de administração e policia medica carecia de ser reformado, assim nos portos de mar como no interior do Reino. Esta reforma, authorisada pela Lei de 10 de Fevereiro de 1844, effeituou-se por Decreto de 18 de Setembro do mesmo anno, e teve o seu complemento na Lei de 7 de Abril e Decreto de 6 de Novembro de 1845.

Toda esta legislação foi posteriormente suspensa por Decreto de 21 de Maio de 1846, ficando reposto em vigor o systema sanitario do Decreto de 3 de Janeiro de 1837.

Por effeito desta providencia veio a ser attenuado o influxo e acção da policia medica, não menos que a inspecção central do Conselho de Saude. Os abusos multiplicaram-se por falta de meios de repressão. Tudo concorria para que o serviço sanitario ficasse subordinado a grandes irregularidades, e ainda maiores prejuizos.

O Governo de Sua Magestade veiu então a conhecer a urgente necessidade de provêr de remedio a tantos males. Entendeu, que alguns delles podiam ser desde logo reparados pelas Côrtes. Não deixou por isso de apresentar com esse objecto a esta Camara, na Sessão de 18 de Março de 1848, uma Proposta de Lei, que não chegou a ser discutida.

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Póde essa Proposta ser ainda agora tomada em consideração, até que o Governo, habilitado com os trabalhos e esclarecimentos, que anda colligindo, se ache nas circumstancias de propôr uma Lei organica para todos os ramos de administração sanitaria.

Cholera-morbus.

As primeiras noticias dos estragos, que fazia a cholera-morbus na Europa, foram recebidas no fim de Setembro de 1847.

O Governo fez immediatamente expedir as ordens necessarias ao Conselho de Saude, para tomar as providencias preventivas da sua competencia, e aos Agentes Consulares para darem informações exactas do progresso do mal, e das providencias contra elle adoptadas nos diversos Paizes da Europa.

O Conselho de Saude, attendendo á falta de um Lazareto regular, propoz algumas medidas, que pareceram ser por extremo rigorosas e prejudiciaes ao commercio. O Governo consultou as Academias de Medicina; — e, apoiado no parecer dellas, e do mesmo Conselho, resolveu adoptar as providencias, que se acham consignadas na Portaria regulamentar de 28 de Agosto de 1848, publicada no Diario do Governo sob N.º 204.

Em seguida cuidou desde logo o Governo em melhorar o Lazareto existente na Torre Velha, supprindo a sua insufficiencia por meio de pontões no Téjo, os quaes, na conformidade do systema usado em Inglaterra, servissem de Lazaretos fluctuantes. Mandou além disso estabelecer Lazaretos no Porto, no Funchal e em Ponta Delgada.

Para o caso de invasão da cholera neste Paiz, fez o Governo organisar, em todas as Parochias do Reino, Commissões de soccorros encarregadas de acudirem aos indigentes, que viessem a ser atacados da molestia; — e para tornar mais proficua esta providencia, e mais igual a distribuição dos soccorros, creou na Capital, por Decreto de 11 de Dezembro de 1848, uma Commissão Central presidida pelo Cardeal Patriarcha, e composta do Governador Civil, do Presidente da Camara Municipal, e de seis Deputados das Commissões Parochiaes, e encarregada superiormente de as dirigir e fiscalisar. Expediu ordens aos Governadores Civís, para, de accôrdo com as Camaras Municipaes, procederem opportunamente á organisação de Hospitaes destinados ao tractamento singular dos doentes, encarregando especialmente de tal serviço em Lisboa a Commissão Administrativa da Santa Casa da Misericordia desta Cidade.

Este variado serviço tem exigido, e virá ainda a exigir muitas despezas. O Governo procurou recorrer ás mais urgentes por meio de um credito de 20:060$000 réis, aberto por Decreto de 24 de Outubro de 1848, conforme a authorisação da Carta de Lei de 26 de Agosto do mesmo anno.

As ultimas participações recebidas nos mezes proximamente findos, mostram, que a cholera-morbus, na maior parte dos pontos por ella invadidos, não ha tido grande intensidade; e esta circumstancia faz esperar que a Divina Providencia livrará o nosso Paiz daquelle terrivel flagello.

TERCEIRA PARTE.

Instrucção Pública.

A Instrucção Pública, estreitamente ligada ás primeiras necessidades do Paiz, e ao desenvolvimento de todos os interesses sociaes, é um dos objectos, que pela sua alta importancia, não tem cessado de excitar as mais sérias considerações do Governo.

Haviam sido ultimamente decretados os Regulamentos de 10 de Novembro, 1 e 24 de Dezembro de 1845, e 30 de Janeiro de 1846, para fixarem a execução da Legislação litteraria, especialmente a que se comprehendia na Lei de 16 de Novembro de 1841, e na Reforma de 20 de Setembro de 1844.

Acham-se consignadas, nessa legislação, as disposições principaes, e por ventura as mais necessarias para o aperfeiçoamento de um systema geral de ensino elementar, accommodado á generalidade dos

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cidadãos, e do ensino especial ou professoral, applicado ás classes laboriosas, ou ás classes superiores da sociedade.

Por effeito deste systema progrediam, lenta, mas gradualmente e com regularidade, os melhoramentos no ensino publico, quando os desastrosos acontecimentos politicos de 1846 vieram paralysar o andamento ordinario da administração litteraria.

Foi um acontecimento funesto. Muitos trabalhos elementares, que se preparavam para regularem o ensino de differentes disciplinas ficaram suspensos. Às Escólas estiveram por longo tempo fechadas. Os Professores, e os discipulos dispersaram-se espavoridos.

Mas quem deixa de saber que as letras fogem sempre do estridor das armas, e que sómente podem vegetar e florescer no remanso da paz, e á sombra da prosperidade!

Ainda hoje, depois do restabelecimento da ordem e socego publico, quando já se acham restituidos os Mestres á regencia das Cadeiras, e os discipulos á frequencia das Aulas, nota-se que a marcha da administração litteraria é vagarosa, contrastada, e interrompida.

Por outra parte; as apuradas circumstancias da Fazenda Pública, não podendo acudir ao pagamento regular dos Professores, tem feito, que algumas Cadeiras, por falta de Oppositores, se achem vagas, e sem exercicio, e que a organisação dos Lycêos não tenha chegado a completar-se em todos os Districtos.

Na presença destas circumstancias, alheias e estranhas á natureza e organisação do systema litterario, mal póde apreciar-se, se por ventura a Legislação que o rege carece de algumas reformas. Limitar-me-hei por tanto a dar uma idéa geral do estado da Instrucção Pública nos seus differentes ramos, tendo principalmente em vista a época anterior ás commoções politicas.

§ 1.º

Instrucção Primaria.

Cadeiras.

As materias de Instrucção Primaria no Continente do Reino, e Ilhas Adjacentes ensinam-se em 2:253 Escólas de ambos os sexos.

Destas Escólas são pagas 1:169 pelas rendas do Estado; a saber, 1:123 do sexo masculino — e 46 do sexo feminino.

As Escólas publicas acham-se distribuidas pelas differentes Provincias e Districtos, na fórma seguinte:

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[Ver Diário Original]

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As Escólas particulares não figuram ainda na statistica litteraria com um assentamento exacto de todas as condições de sua existencia. Muitos Directores e Mestres de taes Estabelecimentos, desconhecendo os interesses proprios, e os da sociedade, têm procurado subtrahir-se ao cumprimento da Lei, que os obriga a declarações sobre o objecto e collocação das suas Escólas, e a mostrarem a sua proficiencia intellectual, e moralidade necessaria para o ensino e educação dos Alumnos. A perseverança da Authoridade fará remover estes obstaculos. Então facil será a formação regular de um quadro statistica sobre este ensino.

Nas Ilhas é grande o número de Escólas particulares; — e muitas são pagas pelos rendimentos das Municipalidades e Confrarias.

Apoiado neste saudavel exemplo, e na disposição do artigo 9.º do Decreto de 20 de Setembro de 1844, o Conselho Superior de Instrucção Publica dedicou-se mui zelosamente a promover, no Continente do Reino, a fundação de Escólas com as sobras dos rendimentos dos Municipios, Confrarias e irmandades. Appellou para o patriotismo dos seus Delegados. Todos os exforços foram baldados! Nem ainda nas Povoações que requeriam, com mais urgencia, a creação de Escólas, foi possivel obter subsidio daquelles Corpos moraes.

Mais tarde, quando a administração municipal e a de benificencia, estiverem devidamente reguladas, quando conhecerem melhor os beneficios da instrucção, não será tão difficil prestarem-se a favorecer e auxiliar o ensino dos seus proprios administrados.

As Escólas d'asylo, fundadas pela benificencia particular para proverem gratuitamente á educação physica e moral da infancia desvalida, são estabelecimentos da maior importancia e utilidade. As que temos deste genero satisfazem completamente aos fins de sua instituição. Não ha louvores bastantes para o extremado zelo e subido patriotismo das almas nobres e generosas, que concorrem para a manutenção destas Casas verdadeiramente maternaes e phylantropicas. Os valiosos serviços prestados á humanidade, por effeito de tão distinctas virtudes, merecem neste logar um testemunho de gratidão e reconhecimento.

A multiplicação das Escólas primarias é o pensamento constante do Governo, por entender que a instrucção popular é a base de organisação da sociedade moderna, e a origem real da força dos Governos.

Mas as circumstancias desfavoraveis do Thesouro offerecem obstaculos invenciveis á creação de novas Cadeiras. Chegam a fazer retardar, senão a impedir, a concorrencia ao provimento de 64 Cadeiras, que se acham actualmente vagas. Aguardemos pois pelo melhoramento da Fazenda Pública para então se poder equilibrar o numero das Escólas com as necessidades do Paiz.

Professores.

O ensino primario acha-se confiado a 1:235 Professores publicos, contando os Ajudantes das Escólas de ensino mutuo, e os Substitutos dos Professores de ensino simultaneo.

Ha grande difficuldade em se encontrarem Mestres competentemente habilitados.

Não podemos contar com elles sem que tenhamos Escólas normaes, nas quaes se possam formar. Felizmente está proxima a entrar em exercicio a nossa primeira Escóla normal, fundada junto á Casa Pia em Belem.

Alumnos.

O numero dos alumnos, que frequentam as Escólas primarias de ambos os sexos, é de 66:332; a saber, 47:546 em Aulas publicas, e 18:786 em Escólas particulares.

Se compararmos este numero com a massa total da população do Reino, veremos que está na razão de 1-53; e se fôr calculado em 682:500 o número total dos individuos, chamados pela Lei á frequencia deste ramo de instrucção, será o numero dos que frequentam, para o numero dos que devem frequentar na razão de 1-8 nas Provincias do Minho e Traz-os-Montes, de 1-10 na Beira, de 1-15 no Além-Téjo, de 1-16 na Estremadura, e de 1-8 no Algarve.

Livros elementares.

Objecto é este, que tem merecido, e que não cessa de excitar a particular attenção do Conselho Superior de Instrucção Pública. Procura organisar uma collecção de bons livros elementares para dar impulso

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efficaz ao progresso e melhoramento do ensino primario. Cuida em fazer traduzir os melhores modêlos que ha em outros Paizes. Para uso das Escólas tem o Conselho adoptado, d'entre os livros nacionaes, os que pareceram a esse fim mais accommodados. Cuida-se incessantemente na traducção e imitação dos melhores modêlos, que neste genero existem em outros Paizes. Já subiram á estampa algumas obras de merecimento em diversos ramos de ensino, que nas respectivas Escólas estão servindo de compendios.

Despeza.

Importa a somma votada pela Lei de 22 de Agosto de 1848, para os ordenados dos

Professores de instrucção no Continente e Ilhas................ 108:614$175

Abatidos os impostos da Lei de 26 de Agosto de 1848............ 11:450$005

Fica sendo a despeza real e effectiva.......................... 97:164$170

Esta despeza em relação a 47:546 alumnos nas Aulas publicas, corresponde á despeza annual de 2$043 réis por cada alumno.

§ 2.º

Instrucção Secundaria.

O ensino secundario achava-se organisado sobre a unica base dos estudos classicos; mas uma tal organisação não podia satisfazer cabalmente ás necessidades da época actual.

Além das habilitações, que offerece para os estudos superiores e para a carreira ecclesiastica, a instrucção secundaria ou complementar, deve tambem servir de base ao desenvolvimento da industria agricola, commercial e fabril, e habilitar as classes médias para as occupações mais ordinarias da vida social.

Para estes fins se obterem era necessario, que na instrucção secundaria entrassem tambem os estudos philosophicos, figurando ahi a Geometria, a Mechanica, e a Chymica, com applicação ás artes e á agricultura, ensinadas debaixo do ponto de vista pratico; e foi por isso que a Legislação litteraria de 1836 e 1844 assim o decretou, commettendo ás lições do tempo e da experiencia a creação das disciplinas industriaes nos Lycêos nacionaes, segundo fosse reclamado pelas necessidades locaes.

A civilisação material é hoje o espirito do seculo; a tendencia dos Povos cultos. Por toda a parte se procura economisar braços, simplificar processos, aperfeiçoar productos, encurtar distancias. O Governo, conhecendo que da instrucção complementar devem sahir muitas luzes e habilitações theoricas e praticas para desenvolvimento daquelles proveitos, forceja por fazer adoptar este systema de ensino ao maior numero possivel de Professores diversos.

Mas isto não póde obter-se de repente. É mister d'ante mão preparar edificios para a collocação das Escólas: cumpre educar primeiro os Professores especiaes, habilitando-os com o conhecimento dos methodos e praticas seguidas nos povos illustrados, que ha muito nos precedem neste genero de ensino. É indispensavel ter promptos os meios pecuniarios para as despezas deste serviço.

Escólas.

Sem entrar na resenha da legislação relativa á instrucção complementar, nem ainda na designação das disciplinas dos respectivos cursos, limitar-me-hei a dizer sómente, que o ensino dellas deve, na conformidade da Lei, ser dado em 21 Lycêos, e Cadeiras annexas a cada um desses Estabelecimentos, e distribuidas pelas Provincias e Districtos na fórma seguinte:

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[Ver Diário Original]

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Pelo Decreto, com força de Lei, de 20 de Setembro de 1844, foi authorisada a creação de 120 Cadeiras de Latim nas maiores povoações do Paiz em distancia das Capitaes de Districto. Devendo, porém, o systema de ensino ser posto em harmonia com os progressos da civilisação geral, sem dar maior importancia ás lingoas mortas que aos estudos professionaes, e ás lingoas vivas, ou aos conhecimentos industriaes e commerciaes, tem-se abstido o Governo de estabelecer novas Cadeiras de Latim; achando-se no proposito de só fazer uso dessa faculdade com o maior escrupulo e parcimonia.

Alguns Lycêos não estão definitivamente constituidos por falta de edificios publicos para a collocação das Escólas, e por não se haverem ainda habilitado os antigos Professores com os exames e provas publicas requeridas pela lei para os cursos biennaes. Acham-se vagas 27 Cadeiras. Algumas dellas não têem sido postas a concurso porque o provimento trazia despeza certa, sem probabilidade alguma de serem frequentadas.

Alumnos.

A facilidade com que hão sido até aqui admittidos aos estudos superiores, ou á carreira do sacerdocio muitos individuos com simples attestados de frequencia em Escólas particulares, tem feito diminuir a concorrencia ás Aulas publicas, onde se observa mais regularidade de ensino e vigor de disciplina.

O numero de alumnos nos Lycêos e Aulas annexas não excedem a 2:098. Quando as habilitações dos Lycêos forem condições indispensaveis para o provimento de Empregados publicos, ou para os exames de accesso aos estudos academicos e ecclesiasticos, crescerá desde logo a povoação das Aulas secundarias, diminuindo as candidaturas de gente inepta ás carreiras de serviço publico, e aos cursos de sciencias superiores.

Despeza.

A despeza votada pela ultima Lei do Orçamento importa na quantia de.. 58:889$325

Abatidos os impostos da Lei de 26 de Agosto de 1848.................. 8:871$905

Fica sendo a despeza real............................................ 50:017$420

Neste resultado deve ainda descontar-se a importancia dos vencimentos das Cadeiras vagas, e a das propinas de 1$920 réis pagas pelos alumnos. A despeza então de cada um delles orçará pela quantia de

17$560 réis.

§ 3.º

Escólas de instrucção especial.

Bellas Artes.

Temos duas Academias de Bellas Artes, uma em Lisboa, e outra na Cidade do Porto, consagradas ao ensino de Desenho, Pintura, Architectura e Gravura.

Na época em que vivemos careciam as Bellas Artes de ser apropriadas aos costumes, aos habitos, e aos modos da existencia actual. Deviam offerecer auxilios e meios de melhoramento aos officios e ás artes industriaes. Os elementos de ensino que havia, faltando a estas condições, achavam-se além disso derramados por diversos estabelecimentos sem unidade, sem nexo, nem disciplina. Para remover tantos inconvenientes effeituou-se a organisação das duas Escólas Academicas, que ficaram sendo o centro de todos os conhecimentos artísticos.

As Aulas dá Academia das Bellas Artes em Lisboa, á qual de dia concorrem 172 alumnos, são frequentadas de noite por 216 officiaes, aprendizes ou curiosos das artes fabris, recebendo alli gratuitamente o ensino, que mais analogo é ás suas respectivas profissões.

Nas exposições triennaes tem apparecido alguns productos artísticos, obrados com tanto gosto e pureza de estylo antigo e moderno, que bem podem ser considerados como um testemunho permanente da grande tendencia nacional para as obras mais excellentes das Bellas Artes.

A despeza votada para a Academia das Bellas Artes de Lisboa, liquida de impostos é de 12:392$230 rs.

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A Academia Portuense das Bellas Artes frequentada por 159 alumnos custa a quantia liquida de 4:744$500 réis.

Em resultado devo declarar que a nova organisação produziu vantagens para a regularidade do serviço escolar, e para o desenvolvimento dos interesses industriaes; mas cumpre-me declarar tambem que esta organisação deixa ainda muito a desejar; e que o Governo não perderá occasião de propôr ás Côrtes as modificações legislativas que pela experiencia forem reclamadas como mais necessarias e urgentes.

Conservatorio Real de Lisboa.

As Escólas de Declamação, de Musica e Dança, ligadas ao Conservatorio, são frequentadas por 171 alumnos de ambos os sexos, que alli recebem gratuitamente o ensino e habilitações para os trabalhos da Arte Dramatica, e de diversas outras profissões.

A Escóla de Declamação carece de ser reorganisada. Já foi, com esse intuito, supprimida uma das suas Cadeiras por Decreto de 28 de Setembro de 1848, fundado na Lei de 23 de Maio de 1843, que authorisará o Governo para a organisação de um systema de providencias tendentes ao aperfeiçoamento da arte dramatica.

Já o Governo decretou o Regulamento de 30 de Janeiro de 1846, fixando as regras geraes de administração para os theatros e espectaculos publicos, e as regras especiaes para o theatro de Dona Maria Segunda, edificado na Praça de Dom Pedro, em virtude da Lei de 16 de Novembro de 1841, e para os theatros de S. Carlos em Lisboa, e de S. João na Cidade do Porto. Decretou igualmente os quatro Regulamentos de 28 de Outubro de 1847 sobre a manutenção da scena portugueza, e sobre outras providencias disciplinares e economicas no theatro normal de declamação. Não tardará a completa reforma deste ramo de serviço.

§ 4.º

Instrucção Superior.

Este ramo de instrucção comprehende a Universidade, a Academia Polytechnica, e as Escólas Medico-Cirurgicas de Lisboa, Porto e Funchal.

Universidade.

A Universidade de Coimbra, reorganisada pelos Estatutos de 1772, regida ainda hoje por esse Padrão de gloria nacional, e aperfeiçoada pela legislação subsequente até á ultima reforma litteraria em 1844, dá o ensino das sciencias ás classes mais abastadas da sociedade em cinco Faculdades; as de Direito, Philosophia, Mathematica, Medicina, Theologia.

A distribuição das Cadeiras e das materias de ensino pelos cursos das diversas Faculdades, as obras scientificas publicadas por alguns dos Professores, a adopção de compendios novos, elevados á altura actual dos conhecimentos humanos, são outras tantas circumstancias, que, apesar da irregularidade do anno, lectivo findo, recommendam a Universidade á consideração pública.

Foram 899 alumnos os que frequentaram as Aulas Academicas no anno lectivo de 1847-1848; a saber:

Na Faculdade de Direito........................................... 567

Na Faculdade de Philosophia....................................... 103

Na Faculdade de Mathematica....................................... 90

Na Faculdade de Medicina.......................................... 35

Na Faculdade de Theologia......................................... 104

899

Comparada esta frequencia sobresahe o desequilibrio causado pela consideravel affluencia á Faculdade de Direito.

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A tendencia para os empregos publicos, e a esperança de se alcançar o provimento delles, pela habilitação exclusiva dos cursos juridicos nas carreiras do Fôro, do Ministerio Publico, e da Magistratura Judicial, são a causa de tanta desigualdade.

Seria de grande conveniencia a creação de uma Faculdade de Sciencias economicas e administrativas, para habilitação indispensavel de quem se destinasse ás carreiras de administração geral. Este plano, seguido em alguns Estados de Allemanha, foi ultimamente adoptado em França.

Nós podiamos estabelecer tambem um corpo systematico e graduado de ensino administrativo, aproveitando-nos dos muitos elementos que para isso possuimos na Faculdade de Direito, e nos outros centros academicos. O Governo medita nesta reforma; procura obter esclarecimentos, por onde se possa exactamente apreciar a sua importancia, e opportunamente fará ás Côrtes a devida Proposta de Lei.

Despeza.

Para o custeamento da Universidade estão votadas as seguintes verbas:

Vencimentos liquidos de impostos................................. 49:102$750

Premios e Partidos a estudantes.................................. 3:300$000

Despezas annexas................................................. 9:500$000

61:902$750

Academia Polytechnica.

Os cursos desta Escóla tiveram 179 alumnos. A sua despeza importa:

Vencimentos liquidos de impostos................................. 8:710$970

Premios............... 480$000

Despezas annexas...... 400$000 ............................... 880$000

9:590$970

Escólas Medico-Cirurgicas.

A frequencia das aulas nestas Escólas foi de 202 alumnos, sendo 188 na Escóla de Lisboa, 94 na do Porto. A sua despeza votada é a seguinte:

Lisboa

Vencimentos liquidos de impostos................................. 7:679$000

Despezas annexas................................................. 1:000$000

8:679$000

Porto

Vencimentos liquidos de impostos................................. 7:168$500

Despezas annexas.....................,........................... 660$000

7:828$500

Funchal

Vencimentos liquidos de impostos................................. 859$200

Despezas annexas................................................. 100$000

959$200

Todas as Escólas d'ensino superior carecem de reformas materiaes. Os grandes centros scientificos, instituidos para a cultura e engrandecimento das sciencias, nunca podem prosperar sem o concurso de Estabelecimentos annexos para os exercicios da sua competencia; taes são os Theatros anatomicos, as Enfermarias clinicas, Museos, Laboratorios chymicos, Gabinetes de physica, Jardim Botanico etc.

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Tambem não basta a creação destes Estabelecimentos annexos ás Escólas Superiores, mister habilita-las com meios para poderem sustentar-se, e collocar-se, pelo seu aperfeiçoamento, a par das sciencias naturaes sempre em progresso. Mas tudo isto demanda despezas extraordinarias e avultadas; e sabido é, que o Governo nem ficou authorisado para occorrer a ellas por meio de creditos supplementares, ou pela applicação das sobras de algumas verbas do orçamento, nem o estado da Fazenda Pública daria logar desde já a esses sacrificios.

Resultados.

A instrucção elementar, pela sua grande importancia, e pela influencia que exerce na vida social e moral dos povos, deve ser ampla e genericamente diffundida entre todas as classes da sociedade. Quaesquer sacrificios da Fazenda Pública, pela multiplicação e melhoramento das Escólas primarias, ficarão de sobejo compensados com as vantagens, que do ensino nellas deve resultar ao Estado.

A Instrucção Secundaria deve ser encaminhada a promover principalmente a cultura e aperfeiçoamento industrial das classes medias e laboriosas; cumprindo por isso que d'ante mão se vão preparando os Estabelecimentos materiaes, e os Professores que hão de ser empregados no ensino das disciplinas, e sciencias professionaes.

A Instrucção Superior carece sómente da creação de uma Escóla de Administração, e da organisação ou melhoramento dos Estabelecimentos annexos ás Escólas Superiores, a fim de se conservar na prefeição devida o ensino prático, de que principalmente depende a parte util das Sciencias.

A inspecção central dos estudos pelo Conselho Superior de Instrucção Pública, tem sido feita com regularidade digna de louvor.

Os Governadores Civís, em geral, têem prestado sincera e efficaz coadjuvação ao Conselho, mostrando alguns delles decidido zêlo e dedicação á Instrucção Pública. Dos outros Delegados, os que continuarem a ser remissos no cumprimento dos seus deveres, serão dispensados de uma Commissão, que não sabem ou não querem desempenhar.

Uma serie de Documentos, juntos á collecção dos que vão annexos a este Relatorio, dá variados esclarecimentos statisticos sobre os diversos ramos de Instrucção Pública, e ácêrca da despeza geral e parcial de cada um delles.

QUARTA PARTE.

Interesses Industriaes.

I.

Trabalhos publicos.

§ 1.º

Os trabalhos de interesse geral, ou sejam para obras de construcção ou reparo nos edificios publicos, ou para os de abertura, conservação ou melhoramentos de estradas, pontes e canaes, consagrados á segurança, á facilidade e protecção das grandes vias de communicação, são, pela sua influencia, na prosperidade, um objecto de tamanha importancia social, que não cessa elle de excitar as mais sérias considerações e cuidados da parte do Governo de Sua Magestade.

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Ao dar conta do estado dos trabalhos a cargo do Ministerio do Reino, quizera eu apresentar um quadro satisfactorio, pelos resultados da applicação dos fundos destinados á feitura daquellas obras.

Sinto, porém, vêr-me obrigado a declarar que a verba de setenta e um conto seiscentos e tantos mil réis, que fôra votada pela Lei do Orçamento de 26 de Agosto de 1848 para as despezas com os trabalhos publicos, é uma dotação tão escassa e limitada, que, tiradas as sommas absolutamente indispensaveis para se obviarem ás ruinas dos edificios nacionaes, nunca poderão ficar recursos sufficientes para grandes obras de utilidade e protecção aos variados interesses da industria.

Ainda assim, procurando o Governo applicar a maior somma possivel da dotação para os trabalhos de mais reconhecido interesse público, teve occasião de prover ás obras de construcção, melhoramento e conservação de diversas estradas é pontes, attendendo a muitos e diversos outros trabalhos protectores da industria agricola, fabril e commercial.

Muitos dos trabalhos, principiados ou desenvolvidos no anno de 1848, ainda hoje continuam. Os Engenheiros addidos á Inspecção Geral das Obras Publicas occupam-se constantemente nos estudos de projectos, na formação de orçamentos, e na investigação de factos e esclarecimentos adequados, para a Administração se habilitar a emprehender os trabalhos que forem de maior urgencia. Os que agora merecem a particular attenção do Governo, são os de melhoramento na Barra do Rio Douro, e nos campos do Rio Mondego.

Barra do Rio Douro.

A Lei de 21 de Agosto de 1848 mandou proceder ás diligencias necessarias para se dar principio ás obras de melhoramento na Barra do Douro, authorisando o Governo a levantar um emprestimo, se tanto fosse necessario, para o custeio desses trabalhos.

Aquella Lei impõe á Administração o dever de dar conta ás Côrtes dos resultados da sua execução. Para satisfazer a este preceito, cumpre-me dizer o seguinte:

Logo que a citada Lei foi sanccionada, passou o Governo a nomear uma Commissão composta de tres dos mais habeis Officiaes do Real Corpo de Engenheiros para considerar o assumpto em relação ao projecto da obra que mais conviria adoptar-se, e em relação á sua direcção e administração.

A Commissão apreciou os dois planos, que já d'antes haviam sido propostos e discutidos, sendo o primeiro traçado pelo Coronel Oudinot, plano vastissimo e de grande dispendio, que chegou a servir para se fazerem os importantes trabalhos, que ainda se divisam na Barra, e o segundo fundado na utilidade do quebramento das pedras ou rochedos existentes fia foz do Douro. Comparados entre si estes projectos; e, vendo a Commissão, que as sommas dispendidas com as obras de lai natureza quasi nunca andam em proporção com os seus resultados; e que, não raras vezes, chegam a ser inuteis, entendeu, que conviria antes adoptar-se o segundo plano, o qual, por ser menos dispendioso, e de mais facil execução, serviria até para se apressarem os melhoramentos projectados.

Foi neste sentido que a Commissão fez a sua proposta; accrescentando, que as obras deviam ser dirigidas e executadas por mestres e operarios vindos de Inglaterra, com as machinas e utensilios para isso necessarios.

A Associação Commercial da Cidade do Porto, que, pela citada Lei de 21 de Agosto de 1848, é chamada tambem a tomar parte neste ponderoso negocio, sendo ouvida, foi de opinião que se désse preferencia ao plano do Coronel Oudinot, mediante certas modificações ultimamente feitas.

Não se acordando entre si as diversas opiniões, foi necessario submetter o negocio a novo exame e deliberação em uma conferencia dos mesmos Engenheiros, e de outras pessoas igualmente illustradas e competentes. Ahi, depois de mui esclarecidas e profundas considerações, foi assentado, que se devia adoptar o systema do quebramento dos rochedos, que, a juizo dos maritimos, contribuissem para tomar difficil ou perigoso o accesso á Barra, tractando-se simultaneamente da reparação das muralhas, que formam parte do projecto do Coronel Oudinot, e que existem a oeste da Capella do Anjo.

Conformando-se o Governo com o parecer da conferencia, resolveu, que, para execução delle, se observasse o seguinte:

1.º Que se colligissem informações sobre o custo das machinas e utensilios proprios para os trabalhos da Barra, e bem assim sobre o estipendio do mestre e operarios estrangeiros, que houvessem de ser empregados nessas obras.

2.º Que a Associação Commercial da Cidade do Porto, fosse encarregada de levantar um empres-

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timo de 40:000$000 réis, que aproximadamente se presumia ser a importancia das despezas necessarias para a compra dos utensilios, e para o custeio dos trabalhos.

3.º Que ao pagamento do capital e juros do emprestimo, depois de approvado pelo Governo, sómente podesse ser applicada a quantia de 4:000$000 réis equivalente á metade do rendimento do imposto de tonelagem, cobrado na Alfandega do Porto, e legalmente destinado para estas obras, ficando a outra metade reservada para a conservação dos trabalhos, que se fossem concluindo.

O Governo adoptou este ultimo arbitrio por conhecer, que a segunda parte da dotação votada pelo artigo 2.º n.º 2, da citada Lei, para aquelles trabalhos, dependente como está da conclusão do edificio da Praça do Commercio da Cidade do Porto, tardiamente poderá ter a applicação que lhe é dada. A Associação Commercial tem já em seu poder as informações havidas ácerca das machinas, apparelhos, e operarios estrangeiros. Se o emprestimo se effeituar, as obras de melhoramento na Barra do Douro deverão começar na primavera proxima.

Campos do Mondego.

A Lei de 28 de Agosto de 1848 authorisou o Governo a fazer um adiantamento até 12:000$000 réis ás Camaras Municipaes do Districto de Coimbra, nos Concelhos confinantes com o Rio Mondego, para ser applicada a sua importancia ás obras necessarias para o exgotamento das aguas estagnadas nos campos adjacentes, muitos dos quaes, por essa causa, se acham desde longo tempo reduzidos á esterilidade; e são nocivos á saude pública.

Para execução desta Lei, foi, nos termos della, nomeada uma Commissão pelo Governador Civil de Coimbra, e encarregada da formação de um projecto dos trabalhos de abertura de vallas nos campos, e bem assim da repartição da somma votada para a despeza das obras, nos Concelhos onde ellas fossem necessarias.

A Commissão ouviu os Administradores e as Camaras Municipaes dos Concelhos adjacentes ao Mondego, ouviu Facultativos e Proprietarios intelligentes e praticamente conhecedores das necessidades locaes, e, colligindo muitas e encontradas opiniões, submetteu tudo ao exame e ao parecer de um Official do Real Corpo de Engenheiros, o Director das obras do Mondego.

Este Engenheiro occupa-se do plano geral das obras, concertado em harmonia com as reclamações dos diversos interessados, com as necessidades agricolas e sanitarias, e com a importancia da dotação estabelecida para a execução das obras.

Por sua parte o Governo, depois de ter dado este impulso á execução da citada Lei, abriu, por Decreto de 3 de Outubro ultimo, o credito supplementar que por ella é authorisado para o custeamento dos trabalhos; e não cessa de repetir as ordens necessarias para que, preenchidas as condições e solemnidades prescriptas pela mesma Lei, possam as obras começar com a maior brevidade debaixo da influencia de uma boa direcção e fiscalisação.

Encanamento do Mondego.

Tem o Governo muito a peito fixar as regras de administração das obras deste rio, estabelecendo definitivamente um systema adequado para o regimen dos trabalhos.

Além disso as obras do encanamento não podem deixar de ter mui íntima relação com os trabalhos agora projectados nos campos adjacentes ao Mondego; e por estas razões procura o Governo fazer adiantar a organisação de um Regulamento, que proveja a todas as conveniencias de tão variados serviços.

Lei de 19 de Abril de 1845.

Por esta Lei foi confirmado um Contracto entre o Governo e a Companhia das Obras Públicas de Portugal, pelo qual se compromettêra ella a fazer não só as estradas mencionadas no artigo 1.º da Lei de 26 de Julho de 1843, senão ainda muitas outras obras, alludidas no referido Contracto, estabelecendo ahi os direitos e obrigações, que reciprocamente ficariam pertencendo ás partes contractantes.

Este Contracto começava a ter o seu devido effeito. Chegaram a ser mui importantes os trabalhos, maiormente na Provincia do Minho. A interrupção, porém que em todas essas obras foi feita pela Companhia deu occasião a repetidas declarações entre ella e o Governo, por onde veio a reconhecer-se a impossibilidade, que havia de continuarem a ter observancia as estipulações existentes.

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Não tem faltado entre nós este pensamento, apoiado, desde remotas eras, por muitas e diversas leis agrarias. Mas nunca poderá conseguir-se o verdadeiro aperfeiçoamento e progresso da agricultura sem o concurso de outras providencias, que, promovendo a diffusão das luzes e o desenvolvimento simultaneo de todos os ramos industriaes, possa excitar um movimento geral em todo o systema economico do Estado.

Que importa o fomento dos cereaes e mais productos agricolas, se faltarem as vias de communicação para o seu transporte? De que valerão as estradas, os rios e os canaes, se faltarem os capitaes para as emprezas de trabalhos ruraes, se o gravame nos terrenos excederem o rendimento delles, ou se faltar a liberdade á circulação dos productos, e a protecção ao gyro e especulações do commercio?

Para se obter a prosperidade da agricultura deve tudo ser ligado. A instrucção agricola, menos pelo ensino da sciencia, que pelo da arte, e do officio, ha de ser um dos meios para aquelle resultado. Escólas praticas de agricultura, e economia rural e veterenaria, são as que mais podem convir. Escólas, que reunam em si os mais importantes processos e ensaios de cultura, accommodada á natureza e condições physicas das diversas localidades, que signifiquem todos os melhoramentos agricolas em relação aos mais perfeitos instrumentos, ás plantas mais raras, ás melhores sementes, e que sirvam para o ensaio da creação tios gados, do melhoramento das raças, e de hygiene animal.

São estas as Escólas creadas pela Lei de 20 de Setembro de 1844, e de 24 de Setembro de 1845, para cuja execução tem o Governo já preparadas instrucções e regulamentos. A sua definitiva organisação depende de meios para a acquisição de edificios e quintas annexas, e para a instrucção pratica, em Paizes estrangeiros, de alguns individuos habilitados com os estudos superiores de phylosophia, que, munidos de conhecimentos de applicação por experiencia propria, possam vir depois reger as novas Escólas praticas.

Depois destas Escólas estabelecidas, em ponto pequeno, com a menor despeza e maxima utilidade, cuidará o Governo das granjas exemplares, onde se trate, em ponto grande, de apreciar tanto os methodos de cultura como os productos dos generos, e os lucros de empreza, sendo para desejar, que estas granjas, obrigadas a fazerem maiores despezas possam ser fundadas por associações particulares, protegidas pelo Governo, o animadas por elle com premios e mercês.

Em quanto se não realisar esta instrucção agricola especial, não descança o Governo de a promover por outros meios entre as classes laboriosas; taes são, não só a multiplicação das Escólas de instrucção primaria, que, obrando como causa e effeito, serve para lhes desenvolver a sua intelligencia, habilitando-as para empregarem o raciocinio nos trabalhos materiaes, se não ainda a fundação das Escólas industriaes dentro e fóra dos Lycêos, como em outra parte deste Relatorio fica exposto.

Tambem o Governo, com o mesmo objecto, em execução da citada Lei de 20 de Setembro de 1844, tem feito estabelecer sociedades agricolas em todos os Districtos. A sua missão é vulgarisar os conhecimentos agronomicos, e promover os possiveis melhoramentos na agricultura.

Por estes meios, e pelos que se adoptarem na legislação — para que os trabalhos das grandes obras nas vias de communicação tenham o devido desenvolvimento, para que os capitaes refluam e sejam applicados ás emprezas, agronomicas, e para que efficaz protecção seja dada a todas as industrias, espera o Governo que a agricultura venha a ter grande incremento, concorrendo para a prosperidade pública, e para a felicidade domestica do nosso Paiz.

Subsistencias.

A colheita de cereaes, e de quasi todos os productos agricolas, foi no passado anno tão abundante, que póde afoutamente dizer-se, que as subsistencias do povo se acham seguramente garantidas. Por effeito desta abundancia haviam já sido revogadas, em Março de 1848, as providencias prohibitivas até alli adoptadas sobre a exportação dos cereaes.

Occupa-se agora o Governo na formação de um systema de statistica agricola, que, pelo conhecimento do producto das colheitas, sirva de base ás medidas governativas, e ás especulações commerciaes, que em caso de escacez de generos se tornavam necessarias para sua importação e abastecimento.

Mineraloqia.

Depois de abolida a Repartição da Intendencia das Minas e Metaes do Reino, ficou, pela Lei de 25 de Novembro de 1836, permittida a lavra das minas ás emprezas particulares, que para isso se habilitassem. Em conformidade com as habilitações, e condições daquella Lei, têem sido as licenças concedidas

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para a exploração e cultura de minas. Pelo Documento N.º 20 mostra-se o numero, localidades, e movimento dessas minas, e a natureza dos mineraes descobertos; a saber: antimonio, asphalto, azougue, chumbo, cobre, estanho, ferro, mercurio e ouro.

Limitadissimos são ainda os resultados de tão importante industria, pois raro ha sido o concessionario que tenha emprehendido trabalhos de mineração em que nelles haja perseverado.

Não admirará este desalento se considerarmos que as emprezas de tal ordem, pela unica influencia de industria particullar, carecendo de grandes capitaes, e de muitos meios de acção, nunca poderão prosperar ou fazer grandes progressos em quanto a confiança pública, abalada pelas ultimas commoções politicas, se não achar completamente restabelecida.

Accresce, que a sciencia de exploração das minas e da metallurgia tem sido pouco estudada, e que a Lei reguladora da industria mineral carece de algumas modificações no seu systema organico e administrativo. É por isso que o Governo, querendo occorrer a todos esses inconvenientes, tracta de preparar com esse fim uma Proposta de Lei, que vae ser com muita brevidade apresentada ás Côrtes.

Minas de carvão de pedra.

A exploração das minas de carvão de pedra tinha sido concedida, pelo Alvará de 4 de Julho de 1825, a uma Empreza particular, por tempo de vinte annos, mediante compensação annual de dez contos de réis.

Este exclusivo havia de findar no dia 10 de Dezembro de 1848. Por esse facto, e pelo disposto na Lei de 15 de Novembro de 1836 deviam as minas de carvão de pedra ser consideradas, como todas as mais, em estado de serem cultivadas por quem para isso se habilitasse. Mas, entendendo o Governo que ainda convinha dar de arrendamento por outros vinte annos as minas de carvão de S. Pedro da Cóva, e de Buarcos, apresentára, para esse fim, em 19 de Julho daquelle anno, na Camara dos Senhores Deputados uma Proposta de Lei, a qual, alli approvada, não teve o mesmo exito na Camara dos Dignos Pares do Reino, pelos motivos que na discussão foram expostos.

Chegou no emtanto o termo do Contracto. Ficaram as minas de carvão na regra geral. Diversos emprehendedores pediram a concessão das minas de S. Pedro da Cóva, habilitando-se nos termos da mesma Lei.

Em circumstancias taes, não devendo suspender-se o effeito da Lei, cuja execução era reclamada pelos interessados, nem deixar de attender-se ás necessidades do consumo de carvão extrahido exclusivamente da mina de S. Pedro da Cóva, para os usos domesticos em Lisboa e Porto, não hesitou o Governo, fortalecido ainda pelo parecer dado em uma conferencia por muitas pessoas esclarecidas, em resolver o negocio, concedendo a referida mina ao pretendente que apresentava melhores habilitações, debaixo da clausula de se fazer o abatimento de 240 réis no preço da venda de cada carrada de combustivel, e de ficar esta concessão subordinada a qualquer decisão, que a tal respeito houvesse de ser tomada pelas Côrtes.

§ 2.º

Industria fabril.

É muito sensivel o estado de adiantamento em que se acha a industria manufactureira. Diversas fabricas, especialmente de tecidos de lã e algodão, e de fundição de ferro, hão sido, nestes ultimos tempos, estabelecidas no Reino. Têem apparecido alguns artefactos, que muito honram os emprehendedores, e os artistas portuguezes.

Estes progressos, devidos em grande parte ao genio emprehendedor e activo, que felizmente se vae desenvolvendo entre nós, mediante a adopção de machinas movidas por vapôr, e de alguns outros apparelhos obrados ou introduzidos no Paiz, têem por certo o seu principal fundamento nos direitos protectores dos nossos interesses industriaes.

§ 3.º Industria commercial.

O estado da nossa industria commercial póde apreciar-se pelo movimento do commercio que fazemos com differentes Nações do Globo. Acha-se bem reconhecido o movimento commercial, pela ampla collecção de factos e esclarecimentos consignados nos Documentos annexos a alguns dos Relatorios do Ministerio da Fa-

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zenda, sobre a qualidade e quantidade dos generos importados e exportados pelas Alfandegas maiores e menores do Reino, com a declaração dos direitos que, na conformidade das Leis, foram obrigados a pagar.

Tambem pelo Ministerio dos Negocios Estrangeiros se tem dado conhecimento ás Côrtes dos Tractados de Commercio, celebrados entre Portugal e diversas Nações estrangeiras.

Uns e outros Documentos prestam noticias tão uteis a quaesquer especulações commerciaes, e ao aperfeiçoamento das nossas Pautas, que eu me contento de fazer allusão a esse quadro statistico.

Não deixarei, porém, de mencionar que o estado actual do commercio dos vinhos do Douro e da Estremadura, não é por certo lisongeiro. A extraordinaria desproporção entre a producção daquelle genero e o seu consumo, e as circumstancias em que se acham os mercados da Europa, são em grande parte as causas mais poderosas da decadencia de uma industria, que, entre nós, tem a maior influencia na riqueza e prosperidade do Paiz.

O Governo applica toda a sua attenção ao estudo de tão grave e importante negocio, para lhe dar toda a protecção compativel com as faculdades, e reclamar do Poder Legislativo as providencias que dependerem da sua exclusiva cooperação.

QUINTA PARTE.

Contabilidade.

§ 1.º

Orçamento.

O orçamento das despezas do serviço a cargo do Ministerio do Reino para o anno economico de 1849-1850, fazendo parte do orçamento da receita e despeza geral do Estado, foi apresentado á Camara dos Senhores Deputados da Nação Portugueza, na Sessão de 23 de Janeiro ultimo.

Pelo contexto daquelle orçamento, comparado com a Legislação que lhe serve de base, facil será reconhecer-se que todas as sommas applicadas aos differentes serviços do Ministerio do Reino, se acham legalmente authorisadas. Observa-se tambem que a importancia das despezas orçadas é menor que a importancia das despezas da Lei; procedendo essa differença de se haverem deixado de incluir no orçamento as verbas de despeza relativa aos Estabelecimentos, que não poderão ser ainda constituidos no proximo anno economico, e aos vencimentos de logares, cujo provimento se torna por ora desnecessario.

Daqui resulta o conhecimento, que a execução dada ao artigo 52.º de Lei da despeza addicional de 26 de Agosto de 1848, e que os principios de economia, combinados com os interesses do serviço publico, foram as bases adoptadas pelo Governo para a estimativa das despezas do Ministerio do Reino.

§ 2.º

Pagamentos.

Para satisfação das despezas do Ministerio do Reino no anno economico de 1848-1849, foi authorisada a quantia de 1.068:943$777 réis pela Carta de Lei de 22 Agosto de 1848. Esta somma reduzida á de 991:588$330 réis liquida de impostos, foi classificada para os diversos encargos do Ministerio pelo modo constante da Tabella approvada por Decreto de 2 de Setembro de 1848 (Documento N.º 21).

Em conformidade deste Decreto, regulamentar da Lei citada, têem sido processadas as despezas parciaes de cada um dos serviços do Ministerio. As excepções das regras assim estabelecidas, dizem respeito ao serviço da Saude Publica, á Secretaria e Tribunal Administrativo do Conselho d'Estado, á 7.ª Companhia da Guarda Municipal de Lisboa, e ao meio vencimento de pret ás familias das praças, que morreram em 1847 na acção do Alto do Vizo.

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A despeza com o serviço da Saude Pública, é supprida por um credito supplementar de réis 20:000$000, que, segundo a authorisação dada ao Governo, pela Carta de Lei de 26 de Agosto de 1848, artigo 2.º § 3.º, foi aberto por Decreto de 24 de Outubro do mesmo anno.

A despeza com o Tribunal Administrativo do Conselho d'Estado, definida pela Lei de 3 de Maio de 1845, e Regulamento de 16 de Julho do mesmo anno, é satisfeita em virtude da authorisação da Carta de Lei de 19 de Agosto de 1848, que repuzera em vigor e observancia aquella Legislação, suspensa até esse tempo pelo Decreto de 29 de Maio de 1846.

A despeza com a 7.ª Companhia da Guarda Municipal de Lisboa, creada por Decreto de 18 de Outubro de 1846, e a importancia do meio vencimento de pret ás familias das praças fallecidas na acção do Alto do Vizo, estabelecido pelo Decreto de 14 de Maio de 1847, são pagas em virtude do disposto na Carta de Lei de 19 de Agosto de 1848, que confirma, até serem alterados, ou derogados pelo Poder Legislativo, os Diplomas, que, contendo materia Legislativa, haviam sido publicados pelo Governo desde 20 de Maio de 1846.

§3.º

Contas.

As irregularidades no serviço, que as ultimas commoções politicas levaram ás Repartições de Fazenda, e a muitos outros Estabelecimentos do Estado, deram causa ao retardamento das contas e documentos justificativos das despezas parciaes de sua respectiva responsabilidade, tornando impossivel a organisação definitiva das contas da despeza geral do Ministerio do Reino, verificada até ao fim de anno economico proximo findo. Mas tal é o empenho e cuidado que se emprega nesse importantissimo trabalho que de esperar é, que em breve possa elle chegar á sua conclusão.

Secretaria d'Estado dos Negocios do Reino, era 30 de Março de 1849,

Duque de Saldanha.

ERRATAS.

Erros Emendas

Pag. 4, linh. 43 — Resolveu então o Governo............... Resolveu então o Governo nomear,

Pag. 7, linh. 1 — e de ensino especial ou professoral,.... e de ensino especial ou professional,

Pag. 16, linh. 44 — contribuissem para tomar.............. contribuissem para tornar

Pag. 21, linh. 13 — compativel com as faculdades,......... compativel com as suas faculdades,

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N.º 29.

RELATORIO

DO

MINISTERIO DOS NEGOCIOS ECCLESIASTICOS E DE JUSTIÇA.

SENHORES:

O Governo tem sido authorisado pelo Corpo Legislativo, não sómente na primeira Sessão da presente Legislatura, mas ainda em outras anteriores, para regular, e melhorar diversos objectos de pública administração. O fim destas authorisações acha-se em parte preenchido pelo Governo; em parte, porém, ainda não poude realisar-se cabalmente. Cumpre-me dar-vos conhecimento do que a este respeito se tem feito, em relação aos negocios pertencentes ás Repartições do Ministerio a meu cargo.

Ao mesmo tempo offereço ao vosso exame e deliberação algumas Propostas, que julgo desde já necessarias de adoptar-se; e successivamente vos apresentarei outras, que mais urgentes e uteis pareçam.

REPARTIÇÃO dOS NEGOCIOS ECCLESIASTICOS.

DIVISÃO ECCLESIASTICA.

DIOCESES.

Pela Carta de Lei de 29 de Maio de 1843, foi o Governo authorisado (no Art. 5.º) a reduzir até o numero de doze as Cathedraes do Continente do Reino, Ilhas Adjacentes e Provincias Ultramarinas, precedendo o necessario concurso da Santa Sé Apostolica; e bem assim (Art. 9.º) a tratar, nos mesmos termos, do arredondamento e fixação de limite dos territorios das Dioceses que devessem ficar subsistindo.

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Por Decreto de 1 7 de Junho do mesmo anno, foi nomeada uma Commissão de pessoas competentes, Ecclesiasticos e Seculares, á qual se encarregou o negocio, combinando, quanto fosse possivel, a nova divisão das Dioceses com a dos Districtos Administrativos, a respeito dos quaes o Governo recebêra pela mesma Lei igual authorisação. Esta Commissão foi nomeada pelo Ministerio dos Negocios do Reino: os seus trabalhos estão adiantados; mas ainda não póde com a segurança e clareza que convém fazer-se a competente Proposta, especialmente pelo que respeita á parte Ecclesiastica. As razões de conveniencia pública, civil e religiosa, que recommendam esta reducção, têem já sido indicadas nos Relatorios deste Ministerio desde 1843, assim como os embaraços que sempre apparecem em negocios de tal natureza. O Governo tem na maior consideração o assumpto, e espera, que muito brevemente se poderá realisar o util fim a que a citada Lei se propoz, ou seja em virtude e nos termos da authorisação della, ou seja por effeito de outra, que o Governo vos proponha.

FREGUEZIAS.

A Carta de Lei de 2 de Dezembro de 1840, authorisou o Governo para proceder no Continente do Reino, Ilhas Adjacentes, e tambem nas Provincias Ultramarinas, á divisão, união e suppressão de Parochias, para todos os effeitos civis e judiciarios; havendo, porem, o devido concurso das respectivas Authoridades Superiores Ecclesiasticas, quanto aos effeitos Ecclesiasticos.

O Governo tem sido sollicito em colligir e ordenar todos os esclarecimentos que possam habilita-lo a fazer o uso conveniente daquella authorisação, e muitas providencias se tomaram já a esse respeito, como tem sido publico pela Folha Official. Ha ainda muito mais que fazer neste assumpto; e o Governo o tem na maior consideração, por se persuadir, que delle depende ò principio mais seguro de toda a outra divisão do territorio.

É, porém, reconhecida a difficuldade de obrar desembaraçadamente em negocios desta naturesa, como já por vezes se tem repetido pelos meus antecessores no Ministerio.

Cabe aqui annunciar-vos, que durante a anterior Administração se deu inteiro cumprimento á Carta de Lei de 26 de Março de 1845, relativamente á creação e dotação de novas Parochias, e ao augmento de congruas das já existentes, no Bispado do Funchal, com os meios provenientes dos reditos dos Beneficios vagos de Collegiadas da mesma Diocese. Na Folha Official (Diario n.º 188) de 10 de Agosto de 1848, se publicaram os Regios Diplomas, por que se deu a devida execução á citada Lei, os quaes têem a data de 24 de Julho do mesmo anno.

COLLEGIADAS.

Pela Carta de Lei de 16 de Junho de 1848 (Diario n.º 145), concedeu-se authorisação ao Governo para proceder, com o concurso da Authoridade Ecclesiastica, á extincção, suppressão e organisação das Collegiadas do Reino; e bem assim para tomar diversas providencias tanto com respeito á applicação dos seus bens, como ao provimento de seus Beneficios.

O Governo expediu em 29 de Agosto do mesmo anno a Circular, que se publicou na Folha Official (Diario n.º 209), para colligir os pormenores e esclarecimentos indispensaveis, para satisfazer á authorisação que recebêra.

Em 10 de Outubro seguinte, addicionou aquella primeira Circular, com o fim de facilitar a execução della.

Já subiram de varias Dioceses os esclarecimentos pedidos; faltam, porém, ainda muitos. O Governo trata de dar cumprimento á Lei successivamente, á proporção que se obtiverem os esclarecimentos sufficientes a respeito de cada uma das Dioceses; e opportunamente dará conta, como lhe cumpre, da execução que tiver a mesma Lei.

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DOTAÇÃO DO CLERO.

Quanto ao Clero curado, a sua dotação continúa a ser regulada, segundo a Lei de 20 de Julho de 1839, prorogada, com algumas alterações, pela de 8 de Novembro de 1841.

Quanto ao Clero não curado, parte subsiste dos reditos proprios dos respectivos Beneficios; e outra parte, a maior, recebe subsidios provisorios, nos termos do que se resolveu na Lei das despezas, votada na antecedente Sessão Legislativa.

É innegavel a necessidade e a conveniencia de occorrer, por modo mais amplo, efficaz e regular, á congrua sustentação do Clero em geral, occupado no serviço publico da Igreja. Esta necessidade e conveniencia, têem sido reconhecidas pelos meus antecessores no Ministerio, como se vê de seus Relatorios; mas não póde duvidar-se que, por muitas considerações que a vossa sabedoria bem saberá estimar, existem com effeito graves difficuldades e embaraços em prover com a promptidão desejada a este importantissimo objecto.

O Governo o tem na maior consideração; e para o tratar procurou auxiliar-se de uma Commissão de pessoas, que teve por illustradas e competentes, creada por Decreto de 10 de Novembro do anno proximo findo (Diario n.º 275).

Esta Commissão reuniu-se effectivamente, e se occupou do negocio. Depois, porém, de meditada discussão, resolveu, na ultima conferencia que teve, que, dependendo a segurança, e a efficacia do meio, que tivesse a propôr sobre a materia, do systema geral de contribuições publicas directas, e constando á Commissão, que se tratava, por parte do Governo, de offerecer suas Propostas sobre o systema actual das mesmas contribuições, devia ella suspender os seus trabalhos, até o resultado dessas projectadas alterações, para se regular depois por ellas no que definitivamente tivesse de apresentar ácêrca do objecto de que fôra encarregada.

O Governo occupa-se com effeito da materia, a que acima se faz referencia; e em tempo vos apresentará, pela via competente, o que julgar mais util a esse respeito.

Dou-vos conhecimento destas circumstancias, para que fiqueis certos do que se obrou em desempenho das declarações, que perante vós fez o meu antecessor na ultima Sessão Legislativa, com respeito ao negocio de que se trata.

INSTRUCÇÃO DO CLERO,

Ainda não está em inteira execução, como séria de reconhecido interesse publico, civil e religioso, a Carta de Lei de 28 de Abril de 1845, que proveu á educação e instrucção da mocidade, que se destina á vida ecclesiastica, nos Seminarios das Dioceses.

Por Decreto de 20 de Setembro do dito anno (Diario n.º 2.24), nomeou-se uma Commissão para propôr um Plano de Regulamento para os mesmos Seminarios. Esta Commissão, antes de apresentar trabalho preparado sobre o assumpto, foi dissolvida por Decreto de 14 de Outubro de 1847, por se ter no Decreto, datado de 30 de Setembro do mesmo anno, creado outra Commissão, á qual, entre outros, se commetteu o encargo da confecção daquelle Plano de Regulamento. Esta ultima Commissão, porém, não tem continuado os seus trabalhos.

A causa principal da falta de execução da Lei provêm das circumstancias da Fazenda Publicadas quaes não tem até agora permittido, que possam destinar-se, para os Estabelecimentos de que se trata, as sommas necessarias. O Governo, porém, não tem cessado de olhar com a attenção, que merece este importantissimo assumpto, e confia em que successivamente, em virtude de providencias já legisladas, e d'outras que venham a adoptar-se, se irão obtendo, sem maior gravame do Thesouro Nacional, os meios sufficientes para se melhorarem os Seminarios, já existentes, e se dar começo aos que de novo convêm crear-se em algumas Dioceses.

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CONVENTOS DE RELIGIOSAS.

Com a data de 23 de Maio do anno proximo preterito, o Governo offereceu á vossa deliberação uma Proposta de Lei, a respeito das Casas Religiosas do sexo feminino, que ainda existem neste Reino. Essa Proposta foi remettida á Commissão Ecclesiastica da Camara, a qual não chegou a emittir sobre ella o seu parecer.

O Governo tenciona fazer algumas modificações na dita Proposta, das quaes em tempo opportuno tereis competentemente conhecimento.

REPARTIÇÃO DA JUSTIÇA.

Com o Relatorio de 31 de Janeiro de 1848 foram apresentados ás Côrtes os Decretos que, involvendo providencias legislativas, se expediram pelo Ministerio da Justiça, durante a interrupção dos trabalhos parlamentares, nas datas de 29 de Março, 3 de Agosto, e 24 de Desembro de 1846, e de 18 de Fevereiro, 10 de Março, 19, 20, 21 e 24 d'Abril, e 30 de Junho de 1847.

A materia sobre que versa cada um destes Decretos, e a sua confirmação, ou revogação pelo Corpo Legislativo, acham-se declaradas neste Relatorio em os logares competentes.

SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA.

Pela Carta de Lei de 19 de Agosto de 1848 (Diario n.º 197), deixou de ser confirmado o Decreto de 10 de Março de 1847 (Diario n.º 64), pelo qual o numero dos Conselheiros deste Tribunal fôra elevado a 15, comprehendido o Presidente; ficando assim subsistindo o numero legal de 11 Conselheiros, incluindo o Presidente, nos termos do Art. 7.º da Reforma Judicial.

Foram, porém, conservados pela referida Carta de Lei os 3 Conselheiros, que em virtude daquelle Decreto chegaram a ser nomeados.

RELAÇÃO DOS AÇORES.

Retirada a Proposta que se havia feito em 27 de Março de 1848, para a abolição deste Tribunal, tem o Governo tratado efficazmente de prover, como lhe cumpria, ao regular expediente do mesmo Tribunal, preenchendo logo as vacaturas, que pôde promover, pela aposentadoria dos Juizes que se achavam impossibilitados, unico meio legal que se lhe offerecia para conseguir aquelle fim com mais promptidão.

Os Juizes que já estão em exercicio, e os que em breve passam a tê-lo, asseguram a regularidade de que ha muito carece, por circumstancias extraordinarias, o serviço desta Relação.

TRIBUNAES DE COMMERCIO DE 1.ª INSTANCIA.

Foram confirmados pela dita Carta de Lei de 19 de Agosto de 1848, os Decretos de 19, 20, 21 e 24 de Abril de 1,847, assim como o de 30 de Junho do mesmo anno (Diarios n.ºs 98, 100 e 180), pelos quaes se estabelecem Tribunaes de Commercio de 1.ª Instancia nas Cabeças de Co-

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marca onde os possa haver; se determinam as alçadas destes Tribunaes; se fixa a jurisdicção dos Juizes civis a respeito das causas commerciaes; e se provê ácêrca das murtas impostas nas causas appelladas para as Relações, e não preparadas no praso da Lei, em que o Ministerio Publico fôr parte principal.

Aguardam-se as informações exigidas sobre as Propostas já feitas pela Presidencia da Relação Commercial, para a organisação dos Tribunaes do Commercio de 1.ª Instancia, de que se trata, a fim de se adoptar com segurança a resolução que mais propria e adequada se mostrar.

PROCESSO ESPECIAL SEM JURY.

Foi igualmente confirmado pela Carta de Lei de 19 de Agosto de 1848, o Decreto de 30 de Junho de 1847 (Diario n.º 180), na parte em que revogou o outro Decreto de 24 de Dezembro de 1846 (Diario n.º 307), que estabelecêra provisionalmente o processo especial sem jury, a respeito de varios crimes. Por este modo acabou a excepção, e passou a ter plena observancia a regra geral consignada na Legislação anterior.

PROCESSO CONTRA OS RÉOS AUSENTES.

Tambem foi confirmado pela Carta de Lei de 19 de Agosto de 1848, o Decreto de 18 de Fevereiro de 1847 (Diario n.º 43), nas disposições que respeitam ao processo dos réos ausentes ou contumazes. Assim ficou satisfeita uma das grandes necessidades do serviço publico deste Paiz, até pela falla de reciprocidade que se dava sobre tão importante objecto entre Portugal e Hespanha.

JUIZES PRIVATIVOS DO TABACO, SABÃO E POLVORA.

Pelo Decreto de 8 de Setembro de 1848 (Diario n.º 231), foi regulada a execução da Lei de 29 de Novembro de 1844, e das demais disposições relativas aos Juizes Privativos do Contracto do Tabaco, Sabão e Polvora, a fim de conhecerem exclusivamente de todas as causas que versarem sobre contrabando e descaminho de generos pertencentes ao Contracto, e sobre a apprehensão de quaesquer outras mercadorias em que fôr encontrada conjunctamente alguma porção daquelles generos, por minima que seja.

Foram já nomeados para Juizes Privativos de Lisboa e Porto os Juizes Commerciaes de 1.ª Instancia das mesmas Cidades.

TRANSFERENCIAS DE JUIZES.

Publicou-se a Lei de 18 dê Agosto de 1848 (Diario n.º 204), pela qual foi regulada a transferencia dos Juizes de Direito de 1.ª Instancia. Por este motivo deixaram de ser objecto da Lei de 1,9 de Agosto de 1848 os Decretos de 29 de Maio, e 3 de Agosto de 1846, relativos a transferencias, e publicados nos Diarios n.º S 126 e 181.

Em conformidade pois das disposições da citada Lei de 18 de Agosto de 1848, foram já decretadas as transferencias de todos os Juizes que deviam sair dos Logares por estar findo o praso estabelecido. Tambem se decretaram algumas transferencias por bem do serviço publico, como a Lei permitte. Acham-se já em exercicio quasi todos os Juizes transferidos.

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ORGANISAÇÃO DO PODER JUDICIAL.

Por Decreto de 19 de Agosto de 1848 (Diario n.º 199), foi nomeada uma Commissão para apromptar os Projectos de Lei que se mostrarem necessarios a bem da organisação do Poder Judicial. Esta Commissão tem trabalhado com muito zêlo, e apresentou já os Projectos sobre a antiguidade dos Juizes e sobre a classificação das Comarcas, os quaes me apresso a levar á vossa presença, como Propostas do Governo.

TABELLAS DOS EMOLUMENTOS E SALARIOS JUDICIAES.

Logo que se publicou a Lei de 28 de Julho de 1848 (Diario n.º 188), pela qual foi authorisado o Governo para reformar as Tabellas dos emolumentos e salarios judiciaes, nomeou-se, por Decreto de 14 de Agosto do mesmo anno (Diario n.º 194), uma Commissão para se occupar do projecto dessa reforma. Concluidos os trabalhos desta Commissão, os quaes pareceram dignos de ser inteiramente approvados, confirmaram-se, por Decreto de 26 de Dezembro de 1848, as novas Tabellas, que sairam publicadas no Diario n.º 2 do corrente anno.

As grandes difficuldades que este objecto offerecia por sua natureza tornaram-se ainda maiores na falta absoluta de verdadeiros dados estatisticos, sobre o movimento geral dos processos, e sobre o interesse particular que resulta a cada um dos Funccionarios que nelles figuram. Estas difficuldades só com o tempo se poderiam vencer; mas a urgencia da reforma não permittia que se interpozessem mais demoras. O Governo, porém, havendo de reconsiderar este trabalho em vista das representações que acabam de lhe ser presentes, reserva para outra occasião o dar-vos conta do uso definitivo que tiver feito da authorisação concedida.

SECRETARIAS DOS TRIBUNAES, DA PROCURADORIA GERAL DA COROA, E DAS PROCURADORIAS REGIAS.

Ha muito que era reconhecida a necessidade de prover a este importante objecto, para se conseguir, como sempre convém, a regularidade do serviço. Com este fim se vos apresenta agora uma Proposta em que se consignam as providencias que pareceram indispensaveis. No Relatorio que a acompanha, se expendem os motivos que aconselharam essas providencias.

Secretaria d'Estado dos Negocios Ecclesiasticos e de Justiça, em 26 de Março de 1849.

José Marcelino de Sá Vargas.

NA IMPRENSA NACIONAL.

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