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APPENDICE Á SESSÃO DE 16 DE JULHO DE 1890 1292-A

O sr. Francisco Machado: - Sr. presidente, começo por agradecer ao sr. ministro da marinha a fineza de ter accedido ao meu pedido, comparecendo na sessão de hoje a fim de lhe poder dirigir algumas perguntas ácerca das armações de pesca de Peniche. Vou tratar este assumpto com a maior serenidade possivel, o em harmonia com a consideração que me merece o sr. Julio de Vilhena.

V. ex. sr. presidente, sabe o que a respeito d'este assumpto se tem passado, e as peripecias que se têem dado, porque já hontem a elle me referi nesta casa, e estou certo, que se fosse o sr. Julio de Vilhena que gerisse a pasta da marinha na occasião das eleições, se não tinham dado os acontecimentos tão lamentáveis e que todos deploram. E, não sou só eu que o digo; toda a gente com quem tenho fallado relativamente a este assumpto faz justiça ao caracter do sr. Julio de Vilhena e está confiante em que s. exa. logo que tenha conhecimento da injustiça que se praticou, acudirá a remedial-a. Eu pela minha parte confesso tambem estar animado das mesmas disposições e crente para suppor, que s. exa. ha de dar remédio aos males que affligem a classe piscatória de Peniche, e que tendo conhecimento cabal e completo do assumpto, ha de prover de remedio immediatamente.

Sr. presidente, na occasião das eleições mandou o sr. Arroyo, então ministro do marinha, levantar duas armações de pesca que estavam estabelecidas legalmente pelas concessões feitas pelo ministerio da marinha, e de que os concessionários haviam pago as respectivas contribuições, alvarás de licença, etc., etc.

Estas armações estavam legalmente estabelecidas, e até hoje, por mais diligencias que particular e officialmente se tenham feito, não tem sido possível conseguir-se, que as referidas armações sejam de novo lançadas ao mar.

Todos suppunham que, passada a lucta eleitoral, terminaria a perseguição, mas todos vêem com surpreza, que a perseguição recrudesceu ainda mais.

Preciso dizer a s. exa. que os individuos da classe piscatoria, que estavam empregados n'aquellas armações não têem outro modo de vida e não ganham para se sustentar a si e as suas familias, o que é grave e serio. Preciso declarar também, que eu não tenho interesses directos nem indirectos ligados a este assumpto. Defendo apenas os interesses d'aquelles, que me elegeram deputado para pugnar pelo que em minha consciência entender que é justo e legal, e eu declaro que não conheço nada mais justo nem mais legal do que o pedido que faço. Mais uma vez digo e repito, que nunca pedi que se restringisse o lançamento de armações a quem quer que fosse, e desejo que s. exas. tomem nota desta declaração, que tenho feito sempre, que repito agora e hei de repetir para o futuro, porque não desejo que se imagine que eu quero que se permitia o lançamento de armações só aos meus amigos, com detrimento dos outros que o não são.

Eu não peço, que se restrinja o lançamento de armações a quem quer que seja. O que eu peço e o que tenho pedido, é que se permitta a liberdade de exercer esta industria a todos em geral.

O que peço é que, o mesmo favor que o governo faça aos indivíduos que imagina seus partidários, o faça tambem a todos, principalmente áquelles que já tinham armações estabelecidas com licença de quem a podia dar e que foram obrigados a levantar por causa das eleições, perdendo assim um grosso capital.

Ha em Peniche duas especies de armações, umas redondas e outras valencianas. As primeiras lançam-se na bahia de Peniche desde o tempo de D. Diniz e têem continuado a lançar-se até á actualidade, e nunca só levantou a mais pequena difficuldade no lançamento destas armações. Quem queria lançar armações ia no primeiro domingo de janeiro á camara municipal d'aquelle concelho tirar uma sorte para, ficar determinado a ordem porque havia de lançar a sua armação e todas as semanas mudava de logar, como é costume antigo.

Estas armações são lançadas todas a seguir umas às outras, e todas as semanas mudam de posição. A que fica mais ao mar na semana seguinte vem para u terra e assim successivamente.

E isto fazia-se com toda a tranquillidade e na melhor harmonia. Nunca ali houve a mais pequena desordem. Todos se combinavam e viviam irmãmente, tratando cada um da sua labutação.

O anno passado o ministerio da marinha, não sei porque suggestões, avocou a si este serviço e immediatamente começaram os conflictos, que nunca mais cessaram até hoje. Note a camara, que desde o tempo de D. Diniz até ao anno ultimo, em que as armações redondas estavam confiadas á camara municipal, não houve nunca a mais pequena occorrencia. Do anno passado para cá, em que o governo avocou a si este serviço, não mais cessaram os conflictos, que têem trazido uma povoação inteira sobresaltada. O systema de centralisar tudo no Terreiro do Paço produz dcstas consequencias.

O que eu posso asseverar á camara é que nunca houve reclamações, e logo que este serviço passou para o ministerio da marinha, anda. tudo embrulhado, ministro, repartições, capitania do porto, empregados, localidade, deputado, tudo emfim, e o que é mais grave é que não ha meio de desembrulhal-o.
Os ministros filiam esta questão na política; quem dá votos ao governo ou se imagina que póde dar, lança quantas armações quer; quem não dá, não tem licença para armar as suas. armações, herdadas dos seus avós.

Porque é que se não deixou este systema de pesca no estado era que estava anteriormente? Não comprehendo porque é, que o governo havia de avocar a si este serviço, serviço que tinha corrido até ali sem inconveniente.

Estavam antes das eleições estabelecidas em Peniche duas armações, uma redonda e outra valeqciana, alem das que lá existem pertencentes às pessoas que o governo imagina suas partidárias, que tinham sido concedidas legalmente, e tanto que o ministerio da marinha mandou um delegado seu marcar o local onde a armação valenciana devia ser estabelecida. A armação lá esteve o anno passado, apanhou muito peixe, com que lucrou o governo, os maritimos, o proprietario e a terra.
Tudo isto se passou com a maior regularidade, e tanta assim é, que este anno em janeiro seguiu-se o systema da annos anteriores, e estabeleceram-se as armações. As proprietárias da armação redonda em 2G de janeiro matricularam as companhas e fizeram os adiantamentos ou abonos que é costume fazer-se na occasião da matricula dos maritimos, que hão de trabalhar na industria da pesca. Em 26 de janeiro já estava no poder o partido regenerador.

Portanto, se aquellas proprietarias, a sra. D. Angelica Gonçalves e suas irmãs não tivessem licença para estabelecer a referida armação, o delegado maritimo não consentiria esta matricula.

Ha mais, sr. presidente, a industria da pesca era ainda ha pouco tempo em Peniche uma verdadeira escravatura branca e ainda o é para os que seguem o antigo systema do contrato com os pobres maritimos.

Basta dizer-se, que emquanto os maritimos quaai morriam de fome e auferiam pequeníssimos lucros, os armadores enriqueciam.

Quando se effectuavara os contratos, ou se matriculavam as companhas, faziam-se os chamados adiantamentos ou abonos de dinheiro a cada um dos maritimos, que começavam desde logo a vencer juros desde esse dia até ao dia em que terminava o contrato.

D'ahi por diante todo o peixe que se apanhava era vendido e o dinheiro recebido pelo proprietario da armação. Os pobres maritimos pagara juro pelo seu proprio dinheiro.

Eu não vou explicar á camara como se fazem esses con-

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