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N.º 13. Sessão em 20 de Abril 1849.

Presidencia do Sr. Rebello Cabral.

Chamada — Presentes 64 Srs. Deputados.

Abertura — Pouco depois do meio dia.

Acta — Approvada sem discussão.

EXPEDIENTE.

Officios: — Um do Ministerio da Fazenda, participando que o Sr. Deputado eleito pelo districto de Angra do Heroismo, J. I. de Almeida Monjardim, recebera pelo cofre central daquelle districto, a titulo de despeza de transito para esta capital, a quantia de 62$500 réis, moeda insulana, equivalente a 50$000 réis moeda forte; é que a referida quantia fica lançada em conta na dotação da Camara. — Para a secretaria.

O Sr. J. J. de Mello: — Mando para a Mesa o seguinte requerimento, cuja urgencia peço.

Requerimento. — Requeiro que se pergunte pela repartição competente: — quanto pagam actualmente os professores de instrucção primaria e secundaria pelo titulo de sua mercê: direitos de mercê; portaria de lapso de tempo; registo na Tôrre do Tombo; sello, e quaesquer outros emolumentos. — J. de Mello.

Foi julgado urgente, e approvado sem discussão.

O Sr. Corrêa Leal:. — Pedi a palavra para mandar para a Mesa uma representação da sociedade Folgoza, Junqueira, Santos, e Companhia. Esta representação reclama da commissão de Fazenda a maior urgencia na sua apreciação, e até me parece que a illustre commissão de Fazenda não deixará de dar, no mais curto praso possivel, o parecer especial a respeito della.

Representa á camara a sociedade, que tendo um processo contra si instaurado no tribunal do commercio por letras no valor de 51 contos novecentos e tantos mil réis, pede, que em attenção a não serem senão caucionarios destas letras, se lhes dê uma auctorisação para solver o pagamento dellas com inscripções que tambem por caução das mesmas letras tem em seu podér. Peço portanto a V. Ex.ª que, com a maior urgencia seja enviada á commissão de Fazenda, para ella dar o seu parecer.

O Sr. Euzebio Candido — Mando para a Mesa um requerimento de 26 capitaes das diversas armas do exercito, em que se queixam de estarem preteridos e prejudicados nos direitos de antiguidade por 4 officiaes dos antigos voluntarios da Rainha, que se se acham collocados no exercito; e pedem ao Poder Legislativo providencias, que harmonise as disposições da carta de lei de 5 de novembro de 1840 com os direitos que assistem aos requerentes.

O Sr. Castro Pilar — Sr. Presidente, pela leitura do Diario vim no conhecimento, de que hontem chegou á Mesa resposta da Secretaria dos Negocios ecclesiasticos e de Justiça ao requerimento da commissão, em que se pediam esclarecimentos para dar o parecer sobre o projecto, que eu apresentei ácerca do art. 630 da Novissima Reforma judicial.

A resposta da Secretaria é a mesma, que eu antevia, e que a mesma commissão tambem perfeitamente antevia, mas qualquer que seja a resposta, a commissão não esta isenta de dar o seu parecer, pelo qual insisto com toda a urgencia; mesmo para de uma vez se refutarem e pulverisarem as analyses irracionaes, que mãos furtivas estão inserindo nos jornaes ácerca do projecto mencionado, cuja analyse deve ser feita competentemente só no Parlamento.

O Sr. Silvestre Ribeiro: — Sr. Presidente, se ha um portuguez que em paiz estrangeiro, e perante a Europa desempenha a nobre tarefa de pugnar pelo credito de Portugal, prestando ao mesmo tempo os mais relevantes serviços, ás lettras e ás sciencias, é por certo o Sr. Visconde de Santarem (apoiados).

Este illustre sabio, depois de haver demonstrado, do modo mais brilhante e incontestavel, a prioridade dos descobrimentos portuguezes na Costa Occidental da Africa, no que prestou um optimo serviço ao nosso paiz, emprehendeu escrever uma obra, que nos faz muita honra, e se torna indispensavel á nossa historia. Os nossos chronistas e historiadores occupam-se, pela maior parte, em narrar façanhas militares, e em expor noticias geneologicas, por vezes este réis, emquanto que nada, ou bem pouco dizem ácerca da verdadeira vida social dos povos De balde se procurará nos ditos nossos chronistas e historiadores o exame das questões economicas, o desenvolvimento das fontes de riqueza publica, o progresso das sciencias, das lettras, e das artes, e sobre tudo essas relações politicas e commerciaes de Portugal com as demais nações civilisadas do Mundo, (apoiados)

Esta lamentavel lacuna tractou de encher o Sr. Visconde de Santarem, compondo o «Quadro Elementar 5? obra altamente recommendavel, para cujas despezas o Governo portuguez, com louvavel pensamento, contribuiu generoso. Consta que o subsidio do Governo para um tão util fim não continua, e eu, sem querer fazer a menor censura ao Governo, de cuja illustração formo ornais subido conceito, desejo saber, o que ha de verdade sobre este ponto, desejando ardentemente que o dito subsidio continue, para bem da gloria de Portugal; e neste sentido mando para a Mesa o seguinte

Requerimento. — Requeiro que pelo Ministerio competente seja informada esta Camara, se o Governo continua a fornecer os subsidios para a publicação do «Quadro Elementar das relações politicas e diplomaticas de Portugal com as diversas potencias do Mundo, desde o principio da Monarchia até aos nossos dias, ordenado e composto pelo Visconde de Santarem. 55 — J. Silvestre Ribeiro.

Peço a urgencia.

Foi julgado urgente, e approvado sem discussão.

O Sr. Presidente: — Deve-se passar á ordem do dia, e continuar sobre o projecto n.º 13; mas não esta presente o Sr. Ministro da Guerra, e adoptando o principio seguido pela Camara numa das sessões anteriores, não póde continuar esta discussão, em quanto S. Ex.ª não estiver presente. Segue-se depois o projecto n.º 33, mas para este projecto ainda ha maior razão de ser adiado, porque recae sobre uma proposta do Governo, assignada por todos os

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Srs. Ministros. Passa-se por tanto ao projecto n.º 36, sobre pesos e medidas.

O Sr. Silvestre Ribeiro. — (Sobre a ordem) Sr. Presidente, este projecto de pesos e medidas é um objecto altamente importante; parece-me, que não devia discutir-se, sem que estivesse presente o Sr. Ministro do Reino.

O Sr. Presidente: — Tenho a notar, que não ha outro objecto para entrar em discussão: portanto vai lêr-se, e depois se decidirá, se deve ou não ser adiado, (leu-se)

O Sr. Lopes de Lima: — Sr. Presidente, difficilmente poderão continuar os trabalhos desta Camara, continuando este abandono ministerial. Este projecto, de que se vai tractar, é altamente ministerial; digo mais, devia ter sido apresentado pelo Governo; muita honra faz ao seu auctor a sua apresentação, porém não póde discutir-se na ausencia do Governo. Em geral, Sr. Presidente, tudo que se discute nesta camara, é de interesse publico, e os Srs. Ministros devem estar aqui; esta é que é a marcha dos governos representativos; mas realmente eu vejo que o systema representativo entre nós vai tomando uma marcha inteiramente nova: eu não sei, como esta Camara ha de decidir-se a respeito de um projecto, que demanda providencias, as quaes exigem grandes despezas; não nos illudamos; isto não se faz com palavras; e preciso saber, se o Governo se conforma com as idéas do projecto, se esta habilitado para o por em execução.

Mas faz corar olhar para aquelle banco, (indicando o banco dos Srs. Ministros) e ve-lo vasio! E um vacuo no systema constitucional. Os Srs. Ministros hoje tinham duplicada obrigação de comparecerem aqui, porque dois delles tinham de ser interpellados; e não só para isso, mas para virem assistir ás discussões dos projectos, porque todos elles têem relação com os differentes Ministerios, e este que tem uma relação muito intima com o Ministerio do Reino, porque é um assumpto altamente administrativo, e comtudo nem para uma cousa, nem para a outra aqui comparecem; e nesse caso eu mando para a Mesa a seguinte

Proposta. — «Proponho que se adiem os trabalhos desta Camara até que esteja presente o Ministerio.» — Lopes de Lima.

Considerada como adiamento, foi apoiada, e entrou em discussão.

O Sr. Cunha Sotto-Maior: — Este projecto de pesos e medidas é uma questão altamente administrativa e muito importante; e eu entendo que nós não devemos discutir este projecto sem que esteja presente o Governo, porque não podemos saber, se elle esta de accordo com muitas das suas disposições. Ora nós temos visto, que muitas vezes o Governo pede para se adiar um ou outro projecto, porque o deseja reconsiderar; e por consequencia todo o trabalho que antes se tem tido em discutir, torna-se inutil; e por consequencia entendo que a Camara deve dirigir um voto de censura ao Governo, porque em summa é necessario que a Camara dê a entender ao Governo que não é cumplice nesta inercia; e se o Governo não vem aqui, se o Governo não faz nada, nós não havemos de estar a trabalhar inutilmente.

V. Ex.ª aventou a idéa de que nos iriamos embora se não discutissemos este projecto, porque não havia mais nada dado para ordem do dia. Eu adopto esta idéa: a questão é um adiamento, mas adoptado o adiamento, não havendo nada para ordem do dia, a consequencia natural é irmo-nos embora; e devemos faze-lo, porque declaramos por este facto, por esta retirada, que nós censuramos asperamente o Governo. Em summa não havemos de estar aqui feitos escravos de gleba, discutindo só quando o Governo quer aqui vir, o Governo tem obrigação de vir ao Parlamento todos os dias, aqui é o seu logar.

O Sr. Fontes Pereira de Mello: — Havia tres projectos dados hoje para ordem do dia; dois eram de iniciativa ministerial, e este terceiro não é sobre proposta do Governo, mas é de uma alta importancia, que toda a Camara reconhece. Os dous primeiros projectos foram adiados por V. Ex.ª, segundo o que a Camara tinha decidido ha poucos dias; realmente não era possivel que projectos da iniciativa immediata do Governo, e em que elle havia de emittir necessariamente a sua opinião, e acompanhar a discussão, se tractasse delles na ausencia do Governo; mas este ainda que não é da immediata iniciativa do Governo, é um projecto de tanta importancia para todo o paiz, e affecta tão particularmente todas as classes da sociedade, que é impossivel que se discuta sem que o Gabinete apresente a sua opinião. Nós temos visto mais de uma vez que o Governo correndo á discussão, tem discordado em pontos importantes das disposições consignadas em projectos até apresentados por elle, quanto mais de um projecto que não é apresentado originariamente pelo Governo, e que com quanto esteja muito bem elaborado (tenho toda a consideração pelos illustres Deputados, membros da commissão) comtudo é possivel que o Governo não concorde em todas as disposições, sobretudo em disposições importantes. Sr. Presidente, não é preciso dizer muito para provar evidentemente á Camara que um projecto desta natureza não póde ser discutido na ausencia do Governo; é impossivel. A adopção do novo systema de pesos e medidas em França foi uma cousa tão difficil, que levou annos a conseguir-se, e foi com a reluctancia de grande numero de cidadãos e de difficuldades em todas as classes da sociedade, que se conseguiu alterar o antigo systema de pesos e medidas em França. Ora em Portugal quando se vai tractar de pôr em practica o systema de pesos e medidas debaixo do principio do systema metrico, em que se alteram todas as medidas, sejam de extensão, sejam de pêso, sejam de capacidade, que affecta as classes mais baixas, mais numerosas do Estado, as classes mais ignorantes do povo, é possivel que um negocio desta natureza se discuta, sem que o Gabinete interponha o seu parecer, sem que acompanhe a discussão, e dê a sua opinião sobre ella? Já era para sentir que entrasse este projecto em discussão segundo a ordem dos trabalhos, sendo a terceira parte da ordem do dia, era para sentir, porque é projecto de tal importancia que é necessario que se estude profundamente; mas emfim era ordem do dia, devemos todos estar habilitados para entrar nella; mas realmente na orfandade em que se acha a Camara, não é possivel, nem decoroso, nem conveniente discutir o projecto.

Portanto, Sr. Presidente, approvo o adiamento, seja qualquer que fôr a consequencia, que se siga,

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quer vamos trabalhar em commissões, quer nos occupemos de outra cousa; o que é impossivel é discutir o projecto.

O Sr. Cunha Sotto-Maior: — No estado da questão mando para a Mesa a seguinte

Proposta. — Proponho, visto não estar presente o Governo, que a Camara vá trabalhar em commissões. — Cunha Sotto-Maior.

1 Sendo esta proposta tambem considerada como adiamento, foi apoiada, e ficou em discussão conjunctamente com o do Sr. Lopes de Lima.

O Sr. Silvestre Ribeiro: — Quando se annunciou que este projecto entrava em discussão, lembrei a conveniencia de que o Ministerio estivesse presente, mas é do meu dever declarar que a commissão convidou o Sr. Presidente do Conselho de Ministros, para que a honrasse com a sua presença. Talvez pareça que eu estou em contradicção; mas effectivamente não o estou. S. Ex.ª convicto com os principios do projecto; mas como na discussão podem apparecer idéas ou opiniões que possam mudar as de S. Ex.ª, nesse sentido é que emitti a opinião de não se tractar deste projecto sem estar presente o Governo. Porém devo declarar que a commissão esta prompta entrar em discussão, se a Camara entender que deve entrar nella.

O Sr. Lopes de Lima: — Sr. Presidente, não me importa o que se passou entre o Sr. Presidente do Conselho e a commissão, nem a Camara lhe deve importar isso; o que se passa no interior das commissões não vale nada para aqui; aqui é preciso que o Ministerio esteja alli (apontando para o banco dos Srs. Ministros) para responder perante nós, e perante a Nação pelas suas opiniões a respeito de um projecto de tão alta monta E não se diga que vamos discutindo a generalidade deste projecto, a generalidade é o principal (apoiados); porque na generalidade hão de-se considerar os meios ou a carencia de meios, e outras circumstancias sobre as quaes é necessario ouvir o Governo: não sei que se possa dizer nem uma palavra logo desde o principio sobre este projecto, sem que esteja alli (nos bancos do Ministerio) o Governo para responder perante nós.

O Sr. Silvestre Ribeiro: — Não posso deixar de lamentar com o illustre Deputado que o Ministerio não esteja presente, porém certamente terá justificado motivo para assim proceder. Agora no que não posso concordar é em que senão possa discutir a generalidade do Projecto sem estar presente o Sr. Ministro do Reino, porque a presença de S. Ex.ª é apenas indispensavel para as questões de opportunidade, de difficuldade de execução etc.; mas na ausencia de S. Ex.ª póde-se muito bem encetar a discussão da generalidade do projecto, no que toca ao seu pensamento generico, e aos largos principios, que lhe servem de fundamento.

O Sr. Corrêa Leal: — Sr. Presidente, entre as duas propostas que se acham na Mesa eu não tenho duvida de votar por uma dellas; a do Sr. Lopes de Lima não me offerece difficuldade nenhuma, mas não me acontece assim a respeito da outra que mandou o nobre Deputado pelo Algarve, que me parece que propoz, que a Camara se resolva em commissões; a sessão hoje (isso havemos de nós confessar) abriu-se muito mais cedo do que do costume, e por isso não faça a Camara motivo de admiração o não estar já presente algum dos Srs. Ministros. (Entrou o Sr. Ministro da Guerra).

Cedo da palavra, Sr. Presidente, e não continúo.

O Sr. Presidente: — Como entrou o Sr. Ministro da Guerra esta prejudicada esta questão, porque está o Governo presente; entretanto vou dar a palavra aos Senhores que a pediram, e se seguiam a fallar.

O Sr. Castro Ferreri: — Sr. Presidente, eu pedi a palavra para mostrar tambem a importancia do projecto que se ia discutir, e que um projecto tão importante de administração não se podia discutir sem estar o Governo presente; quero dizer o Sr. Ministro respectivo; um projecto que fere costumes, usos, habitos e interesses, um projecto tão vasto não se podia discutir realmente sem se achar na Casa algum membro da Administração, e então pedi a palavra para rogar a V. Ex.ª, que o adiasse e entrasse em discussão o projecto n.º 13; e agora muito mais conveniente acho esta minha idéa, por se achar presente o Sr. Ministro da Guerra; mesmo até para que se adiante este projecto, visto que com a morosidade com que elle vai caminhando, teremos projecto para immensas sessões. Como V. Ex.ª já disse que esta questão devia findar, não tenho mais nada a accrescentar.

O Sr. Presidente; — Uma e outra proposta estão prejudicadas. Entrou o Sr. Ministro da Guerra, por consequencia passa-se á ordem do dia.

O Sr. Peixoto: — (Sôbre a ordem) Pedi a palavra para mandar para a Mesa um parecer da commissão de Administração Publica sobre um emprestimo que pede a camara da capital da ilha de S. Miguel.

Mandou-se imprimir para entrar em discussão em occasião opportuna.

Ordem do dia.

Continuação da discussão especial do projecto n.º 13 sobre habilitações e promoções militares.

Leu-se na Mesa o § unico do artigo 20.º que foi approvado sem discussão, e da mesma maneira foram approvados os artigos 21 e 22 e sobre o artigo 23 disse:

O Sr. Ministro da Guerra: — Sr. Presidente, a idade, que aqui se marca, já esta prejudicada, e por conseguinte eu proporia a eliminação destas ultimas palavras. (leu) Esta prejudicada em virtude do que se tem vencido nos outros artigos, (apoiados) Mando pois para a Mesa a seguinte:

Emenda. — Proponho que sejam eliminadas as palavras — ou tendo mais de 55 annos deidade. — Barão de Villa Nova d'Ourem.

Foi admittida, e não havendo quem mais pedisse a palavra, foi approvada a primeira parte do artigo, e seguidamente approvou-se a emenda de eliminação, proposta á segunda parte. Os artigos 24 e 25 foram approvados sem discussão, e sabre o unico deste ultimo disse:

O Sr. Pereira de Barros: — Sr. Presidente, este paragrafo unico do art. 25 tem relação com um projecto de lei apresentado na sessão de 46, pelo qual se pertendia passar os officiaes de artilheria, que não tinham as habilitações, para a arma de cavallaria, e para a de infanteria: isto era a injustiça a mais fla-

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grante que se conhece, e hoje pertende-se fazer uma cousa similhante; pertende-se passar os officiaes de artilheria, que não teem habilitações, para as praças de primeira ordem com accesso, isto é, para o estado maior das praças de primeira ordem, com preferencia aos mais officiaes das armas d'infanteria e cavallaria. Ora a fallar a verdade, isto é realmente uma injustiça tão flagrante, que dá nos olhos logo á primeira vista. Pois se estes officiaes não teem as habilitações, serão collocados alli! Para que são estados maiores das praças, Sr. Presidente? Quer sejam officiaes de cavallaria, de infanteria, ou mesmo de artilheria, é para abrir e fechar as portas.

Ora quando a praça tiver um assedio, quem ha de servir nas respectivas armas, hão de ser aquelles officiaes, que tiverem as habilitações competentes; mas irem os officiaes de artilheria servir nas praças de guerra, com preferencia aos outros officiaes que muitas vezes podem ter mais habilitações do que os proprios officiaes de artilheria, é isto uma grande injustiça. A vista disto vou mandar para a Mesa a seguinte

Emenda. — Proponho que se eliminem as palavras — com preferencia a qualquer official. — Pereira de Barros.

Foi admitida á discussão.

O Sr. I. J. de Sousa: — Quando na commissão se discutiu este paragrafo, reconhecemos logo a grande opposição que havia de ler, principalmente por parte de alguns dos nossos collegas que pertencem ás armas de infanteria ou cavallaria; que haviam de julgar as suas armas prejudicadas pela preferencia que se dá aos capitães de artilheria: mas eu peço ao illustre auctor da proposta, que note bem, que pelo projecto actual, se exigem habilitações para aquelles individuos que não tendo o curso completo das armas, com tudo tem de ser despachados segundos tenentes; e estas habilitações são taes que ellas importam em nada menos que os conhecimentos de arithmetica, de artilheria, de geometria, e da lingoa franceza, em quanto que as habilitações para as armas de infanteria e cavallaria são muito poucas (apoiados) O que eu não esperava ouvir dizer ao illustre auctor da proposta, era, que as obrigações dos officiaes despachados para as praças de primeira ordem, são só as de abrir e fechar as portas! Permitta-me S. Ex.ª que lhe diga, que talvez não tenha reflectido sufficientemente sobre as habilitações dos officiaes empregados no serviço das praças: o official que tem de servir n'uma praça, tem muitas vezes occasião de fiscalisar, e mesmo de executar trabalhos de summa importancia, não só em quanto ao serviço, mas em referencia ao material de guerra. Se acaso um individuo que tem passado, por assim dizer, desde a sua primeira infancia n'uma arma que é propriamente dedicada ao serviço desta ordem, não estiver habilitado no posto de capitão para entrar nestes trabalhos praticos, e satisfazer a esta necessidade de serviço estou convencido que o official de infanteria ou cavallaria muito menos poderá satisfazer a estas condições (apoiados). Ora se o nobre Deputado propozesse que para taes logares houvesse concurso entre os officiaes de infanteria e cavallaria, e os de artilheria, eu annuiria de muita boa vontade a essa proposta, e estimaria vêr os officiaes de infanteria e cavallaria competirem com os de artilheria e obterem a preferencia! Mas não se entenda do que disse eu pertendo menoscabar o merecimento dos officiaes, que não são de artilheria, pois que assim como reconheço que os officiaes de artilheria não são proprios para commandar um corpo de cavallaria ou dirigir uma escóla de equitação, tambem digo que os officiaes de infanteria e cavallaria não são os proprios para satisfazer esta qualidade de serviço. Além disso estes officiaes a quem o artigo dá preferencia, não são officiaes que não tenham habilitações, pelo contrario tem muitas; e com quanto não tenham o curso tal qual se exige para os outros da mesma arma, contudo teem habilitações superiores aos officiaes de infanteria e cavallaria, como já disse, e teem conhecimentos especiaes e technicos do serviço que se exige nas praças de guerra. Por todos estes motivos não posso approvar a proposta do nobre Deputado, e concluo votando pelo paragrafo tal qual se acha redigido.

O Sr. Pereira de Barros: — Sinto bastante que o nobre Deputado me não entendesse; mas sinto ainda mais que caisse na mais reconhecida contradicção. Pois no art. 25 não se diz que os capitaes de artilheria, que não tiverem as habilitações competentes não podem ser majores, e que por isso serão collocados nas praças de primeira ordem? Já se vê que um official, que nestas circumstancias passa a servir nos estados maiores das praças, não póde ser empregado na arma de artilheria, porque não tem as habilitações necessarias; por isso é que o Governo entendeu que devia collocar estes officiaes nas praças de primeira ordem, por se acharem em identicas circumstancias com os officiaes de infanteria, e cavallaria. Escandalisou-se o nobre Deputado que eu dissesse que o serviço que estes officiaes fazem nas praças é abrir, e fechar as portas: pois é exactamente isto, não fazem outra cousa, Portanto desejava que o nobre Deputado me dissesse, porque motivo estes officiaes de artilheria, que não tem senão identicas habilitações aos dos outros officiaes de differentes armas, hão de ser empregados nos estados maiores das praças de primeira ordem, com preferencia a outros officiaes que teem tantas habilitações como elles? Eu peço ao nobre Deputado que me declare qual o serviço, que estes officiaes devem ter nas praças: porque eu entendo que os officiaes de artilheria que não teem as habilitações competentes, que lhes marca o art. 25, e que passam, pelo paragrafo unico deste artigo, para as praças de guerra, não podem ser empregados na arma de artilheria ainda mesmo no caso extraordinario, que houvesse assedio de praça, por isso que elles não teem as habilitações necessarias. Portanto a minha proposta é para evitar que se pratique um acto injusto; e entendo que deve ser approvada.

O Sr. Corrêa Leal: — Eu peço licença ao illustre Deputado, auctor desta proposta, para lhe dizer, que S. Ex.ª labora n'um equivoco. A disposição deste artigo quando diz — que o capitão de artilheria que não tiver o curso, seja com preferencia despachado para major dos estados maiores das praças de primeira ordem, quer dizer que o serviço das praças seja feito com preferencia pelo official que tenha servido na artilheria; esta é que me parece ser a mais genuina intelligencia deste artigo. Os officiaes de artilheria podem não ter o curso competente; mas são os unicos exclusivamente habilitados (na minha opinião) para bem servirem, e desempenharem as suas

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funcções nas praças de guerra. O major d'uma praça não abre, e fecha portas; quem abre, e fecha as portas é o ajudante da praça, que vai a casa do governador buscar as chaves, acompanhado de uma escolta, e depois de abrir ou fechar as portas, recolhe as chaves n'uma caixa fechada. O major d'uma praça tem outras funcções a desempenhar; tem que entender no trem da praça; e posto que haja um director proprio para isto, todavia elle pelas attribuições, que exerce, tem uma grande ingerencia neste trem. Neste trem fazem-se reparos; montam-se, e desmontam-se peças etc. O major tem ingerencia nos laboratorios aonde se enchem as granadas, e lanternetas, e aonde se fazem mixtos para as vellas, e espuletas etc. etc. Por consequencia o major d'uma praça tem sempre que entendei mais sobre objectos de artilheria, do que em nenhum outro ramo das differentes armas do exercito. Portanto entendo que senão estabelece injustiça nenhuma. A intelligencia do artigo é, no caso de ter que se despachar um major de praça, e havendo um capitão de infanteria, ou de cavallaria, ou de artilheria, seja com preferencia despachado a capitão de artilheria; e já que não foi a major por falta de curso completo, vá para major de praça. Parece-me pois, que senão deve approvar a proposta de eliminação; porque na verdade o serviço d'uma praça de guerra, acredito que será sempre mais bem desempenhado por um official d'artilheria, sendo major de praça, do que por um official d'infanteria ou cavallaria, porque estes não se tem dado aos conhecimentos practicos daquella arma; pelo menos hão de ver-se em grandes embaraços no exercicio das suas funcções.

O Sr. Lacerda (Antonio): — Sr. Presidente, lamento de veras que se esteja gastando tempo com um objecto que me parece simplicissimo, e da maior clareza; por conseguinte eu irei reduzir á expressão mais simples o que está consignado neste paragrafo para ver se deste modo se póde justificar a proposta do illustre Deputado. A sua proposta versa essencialmente nas palavras — com preferencia a qualquer outro official. Ora pergunto, devem ou não ser preferidos os officiaes de artilheria para majores de praças? Toda a questão se refere a isto, e parece-me que não póde duvidar-se que os officiaes d'artilheria estão mais aptos para esse serviço do que os das outras armas; até parece incrivel que isto seja objecto de discussão, que não tem outro resultado, senão gastar o tempo, como já disse; e na verdade elle é precioso para não dever ser assim perdido. Eu não quero negar todo o merecimento que os officiaes de infanteria e cavallaria teem; mas para majores de praças entendo que os de artilheria hão de melhor fazer este serviço, por que são educados para aquelles variados misteres. Eu não farei agora uma longa relação do que precisam saber os officiaes que são majores de praças; sómente direi que muito bem foi consignada esta prescripção no projecto, por que demais a mais a lei tem em vista que os officiaes de infanteria e cavallaria tem uma saída, que os de artilheria não tem, por que tendo feito os annos de serviço que lhes marca a lei, passam a majores; é verdade que estão muito longe de ser majores de praça, porque se exige um curso, o qual é preciso que elles tenham completado nos seus primeiros annos; porque nenhum individuo vai para esses estudos depois de ler o posto de capitão, nem depois de ter 50 annos. Ora a lei previu todos os casos, para não fazer injustiça, e como os officiaes d'artilheria são mais proprios para este serviço do que os d'infanteria, nesta qualidade, por isso é que lhes deu a preferencia. Para não levar mais tempo, concluo dizendo que me parece que a proposta não póde ser approvada; e estou persuadido de que o illustre Deputado que a apresentou, se ha de convencer d'esta verdade.

O Sr. I. J. de Sousa: — Sr. Presidente, depois do que acabou de dizer o meu illustre Collega da commissão, não tenho a accrescentar mais nada. Eu na verdade não percebi bem aonde o illustre auctor da proposta conheceu a contradicção em que me achou, o § 14 diz (teu).

Ora se o nobre Deputado attendesse a estas habilitações, havia de reconhecer que as da arma de artilheria são as mais adequadas para o serviço d'uma praça de guerra, que de certo senão limitam a abrir e fechar as portas, como já observei a S. Ex.ª e por isso terminarei votando ainda pelo artigo.

O Sr. Pereira de Mello: — Sr. Presidente, não e com a enumeração dos deveres e obrigações, que estão a cargo dos majores das praças, que se combate ou sustenta a doutrina deste artigo; eu estou persuadido, de que para os officiaes d'artilheria que entrarem na carreira d'esta arma, na conformidade das condições do art. 14, nenhuma injustiça se faz, por que estão patentes as condições a todos; e aquelles que tiverem vocação para servir nesta arma, desde o momento que se sujeitarem a ellas, não tem direito de se queixar; por consequencia, para os officiaes que entrarem na carreira da arma d'artilheria, segundo as condições do art. 14, este artigo é justo, e não póde deixar de se sustentar; ainda que eu estou intimamente convencido de que o Governo, em quanto durar a actual legislação e organisação do corpo d'artilheria, não ha de ter muitos officiaes scientificos para fazer esta differença; estou convencido disto. Em quanto os alumnos militares tomarem as outras armas, persuado-me que a artilheria não os ha de ter em abundancia; mas em fim a lei passou, tenho obrigação de me sujeitar a ella.

Sr. Presidente, o principio que me impressiona neste artigo, é a injustiça que provem da retroactividade, porque pelo que eu vejo no artigo, não se faz excepção alguma; nos outros artigos subsequentes vejo que se fez uma excepção quanto aos sargentos, que passando da idade de 25 annos, estivessem servindo até á publicação da lei; ora o principio que me impressionou a respeito destes, é o mesmo que me impressiona a respeito dos capitães d'artilheria, e só o que pergunto é, se a lei prohibe o accesso aos capitães, que estão servindo, com quanto não tenham o curso estabelecido pela lei de 1337? (Uma voz — Prohibe). Então estou d'acordo, e escuso de cançar a Camara com mais palavras; a lei prohibe, por consequencia o artigo não faz injustiça, e por isso voto por elle.

Julgou-se a materia discutida, por não haver mais ninguem inscripto, e depois de rejeitada a emenda, foi approvado o § unico.

Passou-se ao art. 26 que foi approvado sem discussão, e sobre o § unico disse:

O Sr. Pereira de Mello: — Sr. Presidente, o principio que me impressionou, e que me obrigou a fallar no artigo precedente, é o que me obriga a fallar

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agora. O corpo do estado maior foi creado muito anteriormente á lei de 1837, e nelle haviam officiaes de differentes armas; a lei deu faculdade ao Governo para os conservar, appesar de não terem habilitações, e com quanto não as tivessem, a lei entendeu que eram muito aptos para desempenharem este serviço; esses officiaes por tanto continuaram a estar, e estão no corpo do estado maior por virtude dessa mesma disposição da lei de 1837, parece-me por conseguinte que a disposição deste artigo fere os direitos desses officiaes que tem sido conservados em virtude da lei, e na esperança de continuarem alli a sua carreira; por que supposto não tenham o curso, podem ter comtudo habilitações, até muito superiores a esse curso, pelos seus talentos, pelos seus conhecimentos praticos, e pela sua assiduidade a esse estudo pratico. Ora a esses officiaes é que me parece, que se devem ressalvar esses direitos, e não ir a lei tirar direitos adquiridos. Desejo ouvir os illustres membros da commissão, e conforme a sua resposta, pedirei a palavra, se assentar ser-me necessario.

O Sr. Palmeirim. — Sr. Presidente, em Portugal não havia antigamente um corpo de estado maior organisado devidamente; os officiaes que faziam aquelle serviço eram designados, como em commissão, e era para todas as armas do exercito. Em 1834, quando o Imperador organisou o exercito, e o estado maior, foi de tal fórma, que muitos officiaes que pertenciam a outras armas, então tiveram promoções, e d'alli iam sahindo para differentes corpos; por exemplo, para o batalhão naval, para cavallaria, e infanteria, porque como era um corpo novo, era muito mais facil alli o accesso; mas depois viu-se que aquelle corpo por sua condição devia ser scientifico e por isso quando em 1837 se organisou o estado maior, a lei estabeleceu um curso especial para elle, o qual na verdade é muito pezado; o Governo foi interpellado nesta Casa a este respeito, e na lei do orçamento introduziu-se uma condição para que este corpo do estado maior fosse reorganisado; e como então não houvesse tempo de haver alumnos habeis ou officiaes com os estudos proprios, porque estavam recentemente creados, deu-se a preferencia áquelles que tinham o curso da antiga academia de fortificação, que tivessem o curso de engenharia, ou artilheria, e os que pelos seus conhecimentos se tornassem dignos de alli continuarem a ser conservados; e por ultimo publicou-se uma lei que determinou, que o corpo do estado maior fosse competentemente organisado chamando-se para esse corpo do estado maior os officiaes que tivessem essas habilitações de que acabo de fallar

O Governo (parece-me que era então Ministro da Guerra o Conde de Bomfim) veio a esta Camara, e declarou que o corpo do estado maior não poderia ter sido reorganisado anteriormente, e preenchido, segundo mandava a lei por falta d'officiaes na classe superior competentemente habilitados, mas que o Governo prestaria a esse negocio toda attenção, e procuraria preenchel-o encontrando officiaes com os serviços e habilitações necessarias. Neste meio tempo (parece-me que foi em 1812) houve uma promoção geral no exercito, e o Governo fez uma promoção no corpo do estado maior, veio esta promoção e concluindo-se que era um facto consummado praticado pelo Governo, deste facto consummado exigiu-se um

direito, e disse-se o corpo do estado maior esta organisado assim, e estando organisado assim não deve tocar-se-lhe; mas isto foi um perfeito abuso, porque não se podia fazer uma promoção dentro de um corpo que era mandado reorganisar e dissolver. (apoiado.)

É realmente doloroso fallar a respeito de militares, e dizer alguma cousa que possa julgar-se que vai ferir o merito d'algum individuo desta nobre classe a que me honro de pertencer, porque todos temos mais ou menos relações d'amizade, mas obrigado como relator da commissão a explicar o pensamento que presidiu este artigo e paragrafo respectivo, sou forçado a entrar com bastante magôa neste detalhe.

Sr. Presidente, é um facto incontestavel que o corpo do estado maior tem conservado em seu seio individuos que lá não deviam ter entrado, e que deviam delle sahir em consequencia da lei de 1837, porque estes individuos se se teem conservado n'aquelle corpo, e adquirido esses suppostos direitos, é pelo simples facto de se ter feito uma promoção em que foram comprehendidos, mas que não podem a elle pertencer por não terem as habilitações necessarias. Quando o serviço dos officiaes do corpo do estado maior demanda estudos fortes e fortissimos, e uma grande experiencia para desempenhar as importantes commissões de que póde ser encarregado um official superior d'aquelle corpo, seria irregular e inconvenientissimo que algum desses officiaes que não tivesse -estudos fortes acompanhados da experiencia, podesse passar a official superior n'aquelle corpo. É por estas razões que a commissão entende que este paragrafo deve ser approvado, além de que a estes officiaes não se dá um destino novo, da-se-lhes um destino no qual podem ter as vantagens que lhes competirem em consequencia da disposição da lei.

O Sr. Pereira de Mello: — Sr. Presidente, os factos que eu indiquei, são apresentados e confessados pelo illustre membro da commissão de Guerra. S. Ex.ª viu que não truquei de falso, porque reconheceu e confessou que no corpo do estado maior, e nos postos superiores estão officiaes, que não teem este curso estabelecido pela lei de 12 de janeiro de 1837; mas respondeu ao meu argumento com a provisão do artigo antecedente, dizendo, que os officiaes comprehendidos nestes paragrafo do art. 26 estavam em paridade com os daquelle artigo; porém parece-me que não é assim, e mesmo pela resposta que acabou de dar-se a respeito do artigo antecedente, porque eu perguntei ha pouco, se os officiaes de artilheria, que não tivessem o curso da respectiva arma podiam ser promovidos a majores, e respondeu-se-me que não, e então desisti do meu argumento, porque entendi que estava destruido no que toca os majores da arma de artilheria; mas isso que se dá a respeito de uns, não se dá a respeito dos capitaes do estado maior, porque até o nobre Deputado confessou que houve uma promoção. (Vozes. — Por abuso). O Orador: — Não sei sei se é abuso; é um fado que existe á sombra da lei; é uma promoção feita pelo Governo, e eu entendo que o Governo não deve praticar abusos, vejo que é um facto praticado pelo Governo, e o nobre Deputado sabe perfeitamente que o direito nasce do facto, e muito mais de factos desta natureza, praticados pelo Governo; e eu estou persuadido que não

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obrou mal, e que o Governo fez isto muito bem feito, porque não tinha nessa occasião officiaes habilitados para compôr o corpo do estado maior, e então impellido pela necessidade absoluta que tinha de estabelecer o corpo do estado maior, e não tendo officiaes habilitados em consequencia do disposto na lei de 1837, que havia de fazer senão ir procurar esses officiaes, aonde os encontrasse? Digo pois que se e certo que o Governo praticou este facto, nós devemos reconhecel-o; quero suppôr, devo suppôr que o Governo praticou o que devia praticar; e se isto não é assim, neste projecto deve vir uma nova provisão, para collocar fóra do corpo do estado maior todos os officiaes que nella se acham, e reorganisar o corpo de novo; mas nem por isso deixam de ser feridos os direitos daquelles officiaes, que por esse facto do Governo estão no corpo do estado maior, e que já têem servido em differentes commissões nessas campanhas, que desgraçadamente têem havido neste paiz, e para as quaes elles têem sido chamados a fazer todos os serviços, que póde apresentar nestas occasiões o corpo do estado maior, e não me consta, nem ainda vi em alguma das ordens do exercito, accusado algum desses officiaes por ter faltado aos seus deveres (apoiados) por consequencia devo acreditar que todos elles têem cumprido com os seus deveres, e, se têem cumprido com os seus deveres, não é justo que os fulmine a provisão desta lei, porque têem direitos adquiridos, que devem ser respeitados.

Eu quizera, Sr. Presidente, que nas armas scientificas não estivesse individuo algum, que não tivesse habilitações; mas desgraçadamente as nossas circumstancias, as contendas civis porque temos passado, fizeram com que fossem despachados para o corpo do estado maior alguns individuos, não dos que deviam estar habilitados conforme a lei de 12 de janeiro de 1837, mas daquelles que encontrou com maiores habilitações. É isto que se suppõe que o Governo devia fazer; entretanto seja como fôr, é um facto que esses individuos que o Governo, bem ou mal, despachou para o corpo do estado maior, têem direitos adquiridos, e esses direitos devem ser mantidas, e espero que a illustre commissão não desprese estes principios de justiça, que são de inteira verdade. Nesta conformidade peço licença para mandar para a Mesa uma emenda que salva esses direitos.

O Sr. Castro Ferreri: — O nobre Deputado que acaba de fallar, se reparasse bem no art. 26, que acabou de ser approvado, veria que em logar de estar pugnando a favor dos officiaes do estado maior que tem o posto de capitães, os estava prejudicando, porque os esta reduzindo a ficarem eternamente nesse posto. Eu leio o art. 26 (leu). Ora já se vê que nenhum capitão do corpo do estado maior póde subir aos postos superiores, sem ler estas habilitações, e o respectivo curso estabelecido pela lei de 12 de janeiro de 1837; e o nobre Deputado que deseja que aquelles que não tiverem essas habilitações, não fiquem fóra do corpo do estado maior, é o mesmo que dizer — não quero que estes officiaes subam aos postos superiores. — E que dispõe este paragrafo que se discute? (leu) O Governo habilita esses officiaes a poderem ser promovidos, porque determina que possam voltar para os mesmos corpos d'onde saíram, e que segundo a sua antiguidade possam ser despachados, e até como o nobre Deputado argumentou com direitos adquiridos, devo dizer que se não offendem direitos adquiridos, porque poderá acontecer que na arma de artilheria possam ter logo uma vantagem muito superior. Portanto este paragrafo em logar de tirar direitos, vai garantir-lhes direitos, e conferir-lhes vantagens que não podiam ter no corpo do estado maior.

Em quanto ao nobre Deputado dizer que um abuso póde dar direitos, entendo que um abuso nunca póde dar direitos. Embora o Governo naquella época fizesse uma promoção, isso não tem nada para dar direitos, porque essa promoção não podia conferir outros direitos, senão aquelles que fôssem regulados pela lei de 1837. O Governo não tinha individuos habilitados para fazer uma promoção naquelle corpo, e por isso foi forçado a conservar nelle os officiaes que estavam, e que devia conservar unicamente até que tivesse officiaes competentemente habilitados. Ora eis-aqui a razão porque se conservaram nesse corpo officiaes, que lá não deviam pertencer. É verdade que se fez uma promoção, mas esta não era senão uma promoção provisoria, nem podia considerar-se d'outra maneira ate que houvesse officiaes nos corpos scientificos com as necessarias habilitações, porque é destes corpos d'onde deviam saír os officiaes para o corpo do estado maior. Pois como queria o nobre Deputado que no corpo do estado maior, sendo um corpo puramente scientifico, passassem para os postos superiores officiaes que não tivessem as habilitações marcadas na lei? Portanto já o nobre Deputado vê que esta provisão além de ser util, é vantajosa para estes officiaes, para que possam ter accesso nas, armas respectivas d'onde sairam. (apoiados).

O Sr. Presidente: — O Sr. Pereira de Mello mandou para a Mesa a seguinte

Emenda. — A disposição deste paragrafo não comprehende os officiaes, que ao tempo desta lei forem capitães do estado maior, — Pereira de Mello.

Foi admittida á discussão, conjunctamente com o § unico.

O Sr. Ministro da Guerra: — Sr. Presidente, este paragrafo não podia deixar de ser assim concebido, depois da maneira porque esta redigido o art. 25.º e § unico do mesmo artigo. No art. 25.º determinou-se quaes as habilitações que era preciso tivessem os capitães de artilheria para passarem a majores, e vendo quaes haviam de ser, vinha naturalmente o que havia de fazer-se dos capitaes daquella arma, que não possuissem o curso respectivo, e foi isto o que determinou o paragrafo antecedente que esta vencido; é o que se tem já determinado muitas vezes; não se faz mais do que executar e fazer reviver as disposições legislativas em vigor, e que não se tem executado, como muito bem disse o nobre Deputado relator da commissão — por abuso. — > E agora direi de passagem, que a lei determina, que nenhum capitão de artilheria, que não tenha o curso da arma, passe a major, e de preferencia aos officiaes de qualquer arma. os officiaes de artilheria passem para o corpo do estado maior; e se acaso se tem faltado a esta regra, tem sido um abuso; porque de preferencia aos officiaes de qualquer arma, sempre os officiaes de artilheria é que passaram para officiaes de estado maior das praças, e isto é muito natural e indispensavel. Ora mande-se um official de cavallaria dos mais competentes na sua arma, para uma praça; a praça é ameaçada de ser sitiada, e diga-se-lhe

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— faça um mappa dos petrechos de guerra necessarios para defender essa praça pelo espaço de 3 mezes, conforme á sua força e circumstancias da sua guarnição. — Pergunto, qual é o official de cavallaria ou infanteria, por mais habil que elle seja na sua arma, que possa dizer quantas balas, quantas granadas, quantas bombas, quantas lanternetas, quantas espoletas, quantas peças de calibre 18, 24, 48, etc, etc, tudo quanto é necessario para defeza de uma praça de guerra? Nenhum; tudo para elle é novo; tudo é materia em que póde ser, que tendo elle uma longa carreira militar, nem se quer tenha ouvido fallar. Eis aqui porque se estabelece, que de preferencia vão para lá os officiaes de artilheria, e se isto senão tem feito, é por abuso. Quem pão sabe que em uma praça aonde concorrem dois officiaes da mesma graduação, é o official de artilheria quem manda? Que em um terreno chato plano, o official de cavallaria, e em terreno montanhoso o official de caçadores ou infanteria? Isto esta estabelecido ha muito tempo, e senão pergunto ainda, que se ha de fazer a estes capitaes, que não teem as habilitações necessarias para passarem a majores? Os que as tem, seguem o seu curso, mas os que as não tiverem? Poder-se-lhe-ha dar um destino mais justo, do que o que o artigo determina?

Pois, Sr. Presidente, póde julgar-se aggravado algum official, quando não tem as habilitações necessarias para estar n'uma collocação? Quando esta em uma collocação illegal, e que se lhe diz que vá para o que pertence? Pois um abuso póde dar direito? Ainda mais, eu não sei que um official que esteja no estado maior, sem ter as habilitações necessarias, possa continuar a estar alli. Pois um official de cavallaria ou infanteria, por muito instruido que seja, dizendo-lhe o general — faça um reconhecimento, reduza-o a papel e traga — está no caso de poder bem cumprir esta ordem? Que ha de elle fazer? Nada absolutamente, porque não sabe; e muitos outros serviços de igual natureza, que sem habilitações não se podem desempenhar.

O corpo de estado maior foi mandado crear em 1834; é por isso que alguns officiaes foram alli collocados incompetentemente. Disse-se em 1837 — reorganise-se esse corpo, e o Governo sem o organisar conforme devia, pegou nos officiaes, que lhe pareceu e despachou-os, e disse depois, esta organisado; mas não esta tal, nem tem commandante, andam como judeos errantes sem organisação alguma.

Mas passou o artigo, e ámanhã hão de despachar-se officiaes para estado maior, e os capitães que não teem habilitações, lá ficam eternamente capitaes. E então não é melhor que elles passem para as armas donde saíram, e aí sejam considerados como senão tivessem saído nunca, e tenham O seu accesso nas promoções seguintes? O que esta estipulado, e que póde dar direito a alguns officiaes, que estão collocados no estado maior, a que se conservem nesse corpo, é para aquelles que lá estão desde o principio da campanha contra o usurpador; estes é que podem ter direitos adquiridos, pois por lerem servido naquelle corpo por muitos annos, se considera que estão no caso de continuarem a servir nesse corpo; mas os outros não teem esse direito, nem podem, nem lhe convém ser conservados alli. Eu creio que é mesmo uma vantagem para estes officiaes, o passarem para as armas, a que pertenciam, como se nunca dellas tivessem saído; mas neste mesmo projecto se estabelece um artigo com uma provisão, pela qual senão ferem os direitos destes officiaes, nem os que podem ler na» outras armas para onde vão, porque lá se diz que o Governo passará para as armas de cavallaria e infanteria os officiaes que não tenham essas habilitações, e lá mesmo diz (leu.)

Ora aqui esta uma igualdade de justiça feita a todos, e que nenhum terá motivo de se estimular; todavia, Sr. Presidente, se se entender que depois de se ter votado o art. 25, agora no art. 26 se deve fazer uma especie de contradicção, determinando que se conservem estes direitos adquiridos, que não sei quaes são, embora; mas parece-me que o paragrafo deve ser approvado como esta redigido; ou mesmo o § unico do art. 26 da proposta primordial do Governo, que esta mais claro. Entendo pois que a emenda do Sr. Deputado pela Estremadura é ociosa nesta parte.

O Sr. Castro Ferreri: — Depois do que acabou de dizer o Sr. Ministro da Guerra, nada tenho a accrescentar para combater a emenda do illustre Deputado, e estou certo de que o illustre Deputado conhecerá que o seu additamento vai prejudicar muito mais estes officiaes do que se passar o paragrafo como esta redigido, porque diz o art. 26 (leu).

No caso que passasse a emenda ou additamento eram reduzidos estes officiaes a capitaes eternamente, sem poderem ter outra vantagem; no entretanto inda para as armas, de onde sairam, podem subir aos postos superiores, o que senão dava pelo additamento do illustre Deputado; e por isso em logar de lhe ser util, era-lhe prejudicial. Por consequencia não tenho mais nada a dizer, porque o Sr. Ministro já respondeu cabalmente.

O Sr. Presidente: — Não ha mais ninguem inscripto, por isso julga-se a materia discutida, e vota-se primeiramente o § unico, e depois se votará a emenda do Sr. Pereira de Mello, porque ainda que foi considerada como emenda, para o fim de entrar em discussão com o paragrafo, a votação ha de ser depois.

Approvou-se o § unico, e seguidamente foi rejeitada a emenda do Sr. Pereira de Mello. Passou-se ao art. 27.

O Sr. Fontes Pereira de Mello: — Sr. Presidente, não me levantei para me oppor ás disposições do art. 27, porque se adopta para o corpo de Engenheiros uma provisão similhante á que se tem adoptado para o posto de major das outras armas; mas no modo porque esta redigido, importa uma idéa, que na minha opinião é impossivel de se executar, porque quer que o capitão de engenharia, para poder estar habilitado para passar a major, faça um exame encyclopedico, que senão póde exigir de official algum, nem mesmo de artilheria.

Primeiramente devo dizer á Camara que no corpo de engenheiros em geral, a não ser em campanha, o serviço dos officiaes daquella arma é o mesmo que o de qualquer official de patente regular, porque aquelles officiaes são empregados em todas as commissões, por tanto, essa disposição não vem muito para o caso, a não ser em campanha; mas prescindindo disso, digo que é impossivel exigir que um capitão de engenheiros possa desempenhar regularmente similhante trabalho; porque, Sr. Presidente, em Portugal o corpo de engenheiros esta organisado

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de sorte que é quasi encyclopedico. O que em outros paizes comprehende pelo menos tres classes distinctas, em Portugal acha-se comprehendido n'uma só. Por exemplo, em França ha engenheiros de pontes e calçadas, que são os engenheiros civis; ha engenheiros geógrafos e hydrografos, que é outra classe; ha os engenheiros militares, que é outra, e não sei se ha outra que é a dos engenheiros hydraulicos; mas sei que ha tres. e qualquer destes ramos é bastante para um homem estudar toda a sua vida, principalmente quando os conhecimentos humanos caminham tão velozmente.

Um official do corpo de engenheiros, que tem, em Portugal, de comprehender todas estas especialidades, que nos outros paizes formam tres ramos distinctos pelo menos, obriga-lo a um exame, em que se mostre habilitado completamente em qualquer (note-se bem) importante trabalho que possa caber a um official superior da sua arma, isto é impossivel; tem este inconveniente que é o maior de todos os inconvenientes na minha opinião; não se póde conseguir. Por tanto, Sr. Presidente, eu desejo que o artigo seja alterado... (Uma voz: — Isso é redacção); não é redacção; quando uma certa redacção importa uma/Certa idéa, a alteração da redacção não é coisa insignificante, é alteração do pensamento. Vou pois mandar para a Mesa uma emenda muito simples, que não tende a alterar de maneira nenhuma o principio que se adoptou para todas as armas do exercito, a respeito do corpo d'engenheiros; não era justo que se fizesse uma excepção nesta arma, quando em todas as outras se exigem habilitações especiaes para o posto de major; não é essa a minha intenção; a unica cousa que quero é tornar isto possivel, e a emenda é a seguinte:

Emenda. — A respeito de algumas das especialidades, que elle comprehende, á escolha do interessado. — Fontes Pereira de Mello.

Isto parece absurdo, mas effectivamente póde-se tornar illusoria a disposição da lei, se acaso se não deixar á escolha do official a especialidade, em que quer ser examinado: isto é uma especie de concurso; as especialidades são diversas, e portanto e necessario que o official diga qual, é a especialidade a que mais se tem applicado, porque um homem que toda a sua vida tem estudado um ramo especial, que se tem dedicado, por exemplo, á engenheria militar, póde talvez não estar habilitado para resolver um problema de engenheria civil; não é possivel exigir delle similhante cousa; e vice versa, o mais habilitado em engenheria civil não póde ser obrigado a resolver um problema complicado de engenheria militar, e assim successivamente. Parece-me portanto que é indispensavel, que seja á vontade do individuo a especialidade, em que ha de ser examinado, e por isso entendo que se deve consignar esta disposição no artigo. Eu não insisto por esta redacção, e ainda que pelo modo, porque esta concebida a proposta, parece ser um additamento, eu desejava que V. Ex.ª a classificasse como emenda, porque altera completamente o pensamento do artigo: eu podia talvez redigi-la de uma outra maneira, que, sem ser additamento se podesse classificar immediatamente como emenda, mas no momento em que a redigi, não me occorreu o modo de a fazer de sorte que fosse immediatamente classificada como emenda para poder entrar em discussão com o artigo; e sendo classificada como additamento, póde acontecer passar o artigo e ficar completamente prejudicada a minha idéa; V. Ex.ª comtudo classificará a proposta como entender.

Depois de lida na mesa foi admittida, e ficou em discussão com o artigo.

O Sr. Pinheiro Furtado: — Sr. Presidente, eu concordo perfeitamente com a substituição ou emenda que offereceu o illustre Deputado, que acaba de fallar, porque o regulamento de 1812, do corpo de engenheiros, reconhece tambem, que não é possivel encontrar em todos os officiaes a universalidade de conhecimentos; são muito variadas as commissões em que os officiaes engenheiros podem ser empregados, e por isso aquelle regulamento deixou ao commandante do corpo de engenheiros o conhecer da capacidade e habilidade, que devem ter os officiaes segundo a natureza do serviço para que forem destinados. Julgo por tanto necessario que o artigo seja substituido por essa proposta do illustre Deputado.

O Sr. Barão de Francos: — Parece-me ouvir dizer ao illustre Deputado por Cabo Verde, que este artigo estava demasiadamente vago, ou cousa similhante; eu acho que se póde harmonisar este artigo com a duvida em que esta o illustre Deputado, accrescentando ao artigo as seguintes palavras et em relação ao serviço militar??: mando pois para a Mesa uma emenda neste sentido, porque assim fica o artigo mais restricto, e parece-me que tira toda a duvida.,

Emenda. — Em relação ao serviço militar. — Barão de Francos.

Foi admittida, e ficou em discussão conjunctamente com o artigo.

O Sr. Fontes Pereira de Mello: — Sr. Presidente, eu sinto não podér concordar com a emenda, que mandou agora para a Mesa o illustre Deputado, o Sr. Barão de Francos; já é alguma cousa no sentido da minha opinião; já é restringir e determinar de algum modo o que deve ser o exame para oposto de major; mas ainda não satisfaz completamente; esta muito longe disso, e na minha opinião, estabeleceu uma desigualdade injusta, porque dá preferencia a um ramo, que talvez se possa dizer o menos importante, scientificamente fallando. Se acaso se estabelecer esta referencia unicamente em relação ao serviço militar, a primeira cousa que tenho a perguntar a S. Ex.ª é o que entende por serviço militar? Pergunto eu, o serviço topografico será serviço militar? (O Sr. Barão de Francos: — >E serviço militar) V. Ex.ª ha de concordar que tudo então é serviço militar. O serviço geodesico é servido militar? O serviço hydraulico e serviço militar? Quando se manda construir um cáes ou fazer obras n'uma barra, é isso serviço militar? (O Sr. Barão de Francos: — Não é) Não é serviço militar? Muito bem; o serviço da construcção de pontes por onde ha de passar o exercito, a artilheria, as bateiras fluctuantes...... baterias fluctuantes são as pontas que se constroem sobre os rios; esta idéa foi-me suggerida por um illustre Deputado, e repeti-a como relogio de repetição (riso); baterias fluctuantes são as pontes que se constroem sobre os rios, e esta claro que esse serviço depende de conhecimentos especiaes: portanto, Sr. Presidente, no caso de se approvar a emenda do illustre Deputado, é preciso determinar o que se en-

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tende por serviço militar. O serviço de pontes é calçadas, que é o serviço firais importante que temos no paiz, e para desempenhar o qual são chamados os engenheiros militares, não ternos uma classe de engenheiros civis, isto é, não está organisado completamente, e são os engenheiros militares que tem sido encarregados, até hoje, de todas ás obras de engenheria civil, que se teem verificado: pergunto eu, hão de ser desattendidos estes serviços? O official que desde o principio da sua carreira scientifica se tiver dedicado a êstes trabalhos, ha de ficar preterido, menos considerado do que aquelle que se tiver applicado aos trabalhos militares? Certamente que sim porque, como não e possivel reunir todos os conhecimentos no mesmo individuo, aquelle official que se tiver dedicado mais especialmente ao ramo de engenheria civil, e claro que ha de por força ficar inferior áquelle que se tiver applicado ao ramo de engenheria militar; isto é inquestionavel: portanto a emenda do illustre Deputado importa uma desigualdade injusta, porque vai favorecer aquelles que se teem dado especialmente ao ramo de engenheria militar, que é tanto ramo do corpo de engenheiros como qualquer dos outros, não obstante que para esse talvez se exige menos profunda applicação. Insisto pois pela minha emenda redigida como Se quizer; não tenho grande apêgo ás minhas redacções, sobre tudo quando as faço aqui sobre a carteira; qualquer que seja a redacção, de muito boa Vontade a acceito, com tanto que exprima o meu pensamento; isto é, que esta especie de exame seja sobre cada uma das especialidades a que os officiaes se tenham dedicado na carreira da sua vida militar, não sé especificando determinadamente o ramo militar, porque isso seria estabelecer uma injustiça relativa com aquelles que se teem applicado a outro ramo de conhecimentos tão pertencente ao corpo de engenheiros, como aquelle que o illustre Deputado indica.

O Sr. Ministro da Guerra: — A emenda proposta pelo illustre Deputado que acabou de fallar, era uma cousa magnifica certamente, mas nunca vista, nem ouvida; porque estabelecer-se a favor de uma classe que fosse examinada naquella especialidade que escolhesse, era cousa magnifica; não havia nada tão bom: «você ha de fazer um exame, mas sobre aquillo que escolher!..» Desta maneira nunca se saía reprovado. Mas, Sr. Presidente, se o illustre Deputado, que não impugnou a materia do artigo, nem a podia impugnar, reparasse bem, que as habilitações que se exigem, são as do curso da arma, havia de conceber, que não era possivel exigir-se do candidato que fizesse exame em assumpto, que não fosse dos compreendidos na sua arma; ninguem póde ser obrigado a fazer exame de uma cousa que nunca estudou. O exame que estes officiaes devem fazer, ha de ser em objecto relativo ao curso da sua arma, e sendo objecto relativo ao curso da sua arma, teem obrigação de o saber, e segundo o regulamento de 1812 é é general commandante daquella arma, que ha de destinar qual deve ser a materia sobre que se ha de fazer exame. Porém diz o illustre Deputado as obras topograficas serão por ventura trabalhos militares? São sim, Senhor; bem sabe o illustre Deputado que levantar a planta topografica de um paiz é trabalho militar. Mas as obras hydraulicas são trabalhos militares? São sim, Senhor; pois então o tirar agoa d'um fosso, o desvia-la de um rio, cujo alveo se pretende atravessar para construir uma ponte, não é obra militar? Os trabalhos geodesicos serão trabalhos militares? São sim, Senhor; então querendo-se Construir uma praça, não e necessario ter conhecimento do terreno e tirar a respectiva planta? O construir um caes será trabalho militar? E sim, Senhor: quando n'uma praça maritima é necessario fazer um dique, desembarcadouro ou molhe, e um trabalho militar. Finalmente disse o illustre Deputado que a profissão da engenheria e uma profissão encyclopedica; sim, Senhor, os engenheiros teem obrigação de ser encyclopedicos nessa materia, porque não ha trabalho nenhum talvez que não possa referir-se ao serviço militar; e então com quanto eu me persuada que o artigo deve passar, como esta redigido, se alguma emenda houvesse de admittir-se, entendo que devia ser a do Sr. Barão de Francos, a respeito dó serviço militar. O official de certo não póde ser examinado senão em materias relativas ao seu curso, e que tenha sido obrigado a estudar; não ha de ser de certo obrigado afazer exame sobre uma materia que não tenha estudado, e não faça parte do seu curso» e que tenha referencia ao serviço militar. Repito corri quanto eu esteja persuadido de que o artigo esta claro, e em harmonia com os anteriores a respeito de todas as armas; e entendendo que não deve fazer-se a respeito desta uma excepção que senão fez a respeito da arma de artilheria, cavallaria, infanteria, e estado, maior, se alguma emenda ha que se possa admittir, é a do Sr. Barão de Francos.

O Sr. Fontes Pereira de Mello. — Vejo que o Sr. Ministro da Guerra se oppõe á minha emenda; receia talvez que esta disposição vá d'encontro a algum principio de disciplina, e que talvez seja uma injustiça relativa em relação ao que se tem Votado já nesta Camara, porém eu vou demonstrar, é em poucas palavras, que isto nem fere nenhum principio de disciplina militar, nem importa nenhuma injustiça relativa. O modo porque esta redigido o artigo é que se oppõe a que possa ser approvado tal qual esta.

Diz o nobre Ministro da Guerra, que o engenheiro ha de ser examinado no seu curso e nada mais; mas esse curso compreende objectos inteiramente distinctos, objectos que, em outros paizes, formam tres classes de engenheiros, e então como é possivel obrigar um homem a fazer um exame do seu curso completo?... Aonde é que se faz semilhante cousa? Em parte nenhuma do Mundo se obriga um individuo a fazer de uma vez um exame do seu curso completo, tanto mais quando esse curso compreende immensos ramos, e inteiramente differentes uns dos outros. Nas Universidades, e nas escólas ordinariamente examina-se o alumno, quando acaba de frequentar qualquer ramo d'ensino compreendido no curso a que se applica; isto é, no que se compreende no anno que estuda; mas nunca se faz um exame completo do curso inteiro, porque isto e impossivel, especialmente na arma de que tractamos. Se passai o artigo tal como esta, e uma arma que fica na mão do Governo para despachar quem quizer. E quando faço esta reflexão, não é em relação a este, nem áquelle Governo, e a todos. Repito: e uma arma que fica na mão do Governo para despachai quem elle quizer; e um individuo terá de ficar no mesmo posto 10, 15, 20, e 30 annos.

Sr. Presidente, um individuo do corpo de enge-

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ribeiros ordinariamente applica-se mais a um que a outro ramo da sua arma, e pergunto eu: póde por ventura ir de momento fazer um exame sobre pontos especiaes a que não se tem dedicado tanto como a outro? Obriga-lo a isto, e obriga-lo a ser reprovado; appello para os nobres Deputados conhecedores desta materia, e elles que me digam, se isto é possivel. Em todas as outras profissões ha um certo curso que esta todo em harmonia; no corpo de engenheiros não acontece isso, são muitos, variados, e desencontrados os objectos do curso d'engenharia: força-se um homem a uma cousa quasi impossivel, e a respeito desses ramos que compõem o curso, ha diversas especialidades, que são fixadas pelo commandante geral do corpo de engenheiros, as quaes aliás deviam ter sido fixadas por lei, como estabelecer entre as diversas especialidades um corpo diverso, com illação aos diversos serviços, mas a lei hoje deixa ao commandante geral do corpo d'engenheiros o fazer essa differença, e o que é certo e, que segundo esta disposição, ha engenheiros que se applicam mais a um ramo de serviço que outro; ha officiaes que estão no caso de desempenhar perfeitamente uma commissão, mas que o não estão com relação a outros; e entretanto pela disposição do artigo ha de ser o engenheiro obrigado a estudar todas as matei ias, de que se compõe o estudo d'engenheiro, e que, como já disse, em outros paizes formam tres iamos differentes, e ha de n'um momento fazer um exame completo a respeito de tudo que se contem nesse estudo. Isto e absolutamente impossivel.

Considerações especiaes têem feito, com que no corpo de engenheiros não se tenham estabelecido estas tres differentes classes. Além de outras considerações tem sido uma dellas, que sendo nós um paiz pequeno, e não carecendo de um grande numero de officiaes, estas classes haviam de produzir um certo estimulo em cada uma dellas, e talvez estabelecer um certo conflicto, o que seria prejudicial ao corpo de engenheiros, e de nenhuma vantagem para o serviço publico, alem disso estabelecer-se-ia, em cada uma destas classes, um estado maior, e isso não seria muito economico, e como o principio de economia deve presidir ás nossas organisações, e essa uma das razões que tem feito, com que se não tenham estabelecido essas classes, por ventura muito convenientes a muitos respeitos.

Sr. Presidente, como a Camara sabe, eu pertenço ao corpo de engenheiros; tenho direito ao meu adiantamento futuro; não quero (porque não é muito proprio) dizer á Camara qual foi o meu curso; mas o que posso assegurar á Camara é que eu esperava qualquer dia passar ao pôsto de major, mas agora vejo que é absolutamente impossivel, perdi já todas as esperanças; eu tenho dado uma certa direcção aos meus estudos durante certo numero de annos, e não posso ser obrigado de momento a responder a qualquer questão sobre um objecto, que não tenha investigado muito de perto, e com quanto seja objecto da minha profissão, com tudo eu não poderei responder tão convenientemente sobre um ponto dado, como poderá responder outro official que a esse ponto se tenha applicado mais decididamente. Ora no caso em que eu estou, ha muitos, e então já se vê que fica inteiramente coitado o accesso. Havendo pois todas estas especialidades, é impossivel deixar de consentir que o objecto, ou materia de exame fique á escolha do interessado, e nisto não se estabelece injustiça nenhuma relativa a respeito do que se fez com as outras armas, porque não me consta, que na infanteria, cavallaria, artilheria e estado maior se dêem as mesmas circumstancias, que se dão no corpo de engenheiros. Nas outras armas não se dão as especialidades que tenho apontado; as outras armas estão em circumstancias inteiramente diversas. Por tanto não se póde fazer a respeito desta arma o mesmo que se fez a respeito das outras: não é possivel admittir a disposição do artigo, e de certo com o meu voto não ha de passar tal disposição. Eu não fallo nesta questão por interesse proprio; fallo pelo interesse de uma corporação inteira, que tenho obrigação de defender neste logar; de uma corporação a que me honro muito de pertencer. Se passar o principio, que esta no artigo, commette-se uma injustiça muitissimo grande.

Ora o nobre Ministro disse que concordava com a emenda do Sr. Barão de Francos, mas eu peço licença para dizer a S. Ex.ª, que concordando na emenda do Sr. Barão de Francos discorda, com tudo, na intelligencia dada pelo nobre Deputado á sua emenda; porque eu perguntei ha pouco ao Sr. Barão de Francos, se certos serviços, que faz o engenheiro, eram serviços militares, como por exemplo, nas obras hydraulicas, ou trabalhos geodesicos, e este nobre Deputado respondeu-me que não; no entretanto o Sr. Ministro disse-me que sim. (O Sr. Ministro da Guerra — Agora diga o nobre Deputado qual é a sua opinião.) A minha opinião é que obras hydraulicas, obras de barcos, trabalhos geodesicos, encanamentos de rios, etc, com quanto feitos por officiaes engenheiros, com tudo não são obras militares, só considero obras militares o que tender para fazer alguma operação militar. Por tanto insisto ainda que a emenda do Sr. Deputado Barão de Flancos, com quanto já restrinja mais a disposição do artigo, com tudo vai tambem dar logar a graves injustiças.

Como já não posso fallar outra vez, porque esta é a terceira que fallo, e provavelmente V. Ex.ª deu-me a palavra em attenção a ser eu auctor de uma moção, peço desculpa por ter usado desta concessão, talvez um pouco mais do que devia, e digo que se não respondi a algumas das objecções do illustre Deputado, e do nobre Ministro, é porque não me occorre qual seja essa objecção, aliás faria diligencia para responder. Tenho sustentado o meu pensamento, porque é da minha obrigação, em consequencia da posição especial em que estou, e é da obrigação de todos nós fazer uma lei, que seja justa a respeito de todos os individuos, que hão de ser comprehendidos nas suas disposições.

O Sr. Pereira de Mello: — Sr. Presidente, estão em discussão o artigo, e as emendas que se offereceram. Eu lamento que se tenha perdido o tempo em uma questão de mera redacção. Na minha fraca opinião não approvo nenhuma das emendas, porque não quero fazer injustiças; não quero ser injusto para com o respeitavel corpo de engenheiros militares portuguezes. (O Sr. Ministro da Guerra. — Apoiado). Eu não vejo no artigo a palavra exame, em que tanto se falla. (O Sr. Corrêa Leal: — Apoiado). É verdade que se empregou um verbo em um tempo que parece ter implicita a idéa de um exame futuro, para um official ser despachado major ou capitão de engenheiros, porque se diz — e der provas; — parece-me

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que estas palavras comprehendem em si implicita a idéa de que o official ha de passar por um exame futuro, para ser despachado major. Mas, Sr. Presidente, pelo amor de Deus não fallemos mais em exames! Entendo que fallar em exame neste caso e uma injuria feita a todos os capitaes engenheiros (apoiado). Exames! Pois o alumno desde que entra na carreira de primeiro tenente de engenheiros não tem passado pelos exames, que a lei tem prescripto? Não tem adquirido todos os conhecimentos theoricos, que são necessarios para desempenhar bem os deveres de official de engenheria? E desde esse momento o que se segue? A practica. O official de engenheiros é empregado durante o tempo em que exerce o posto de tenente e durante o tempo em que exerce oposto de capitão em diversos e muito distinctos trabalhos pertencentes á sua arma; da aptidão, da maior ou menor intelligencia, com que elle tem desempenhado esses trabalhos devem existir informações exactas no quartel general do seu corpo; o commandante do corpo de engenheiros deve estar habilitado para saber e conhecer em qual dos iamos é mais forte este, aquelle, ou aquelToutto capitão; a lei a isso o obriga. E então como. ou porque motivo ha de o official ser despachado capitão ou major? Pelo que elle ha de fazer, ou pelo serviço que tem feito? Pelas provas que ha de dar ou pelas provas que já tiver dado? Pergunto aos illustres Deputados, ha de ser pelas provas que tiver dado ou pelas que der de futuro?

É este que acabo de expor o motivo porque troco esse futuro der pelas palavras que tiver dado, e é nesta conformidade que mando uma substituição para a Mesa: não quero exames. Que obras será obrigado a fazer o major de engenheiros que não tenha feito o capitão dessa arma? Em o nosso paiz, Sr. Presidente, em que um capitão do engenheiros conta 10, 12, 15 annos em capitão, qual será a qualidade de obra, a qualidade de trabalho que o major não tenha feito já em capitão de engenheiros? Por consequencia nada de exames; longe de nós a idéa de exames; era uma injuria que se fazia ao respeitavel corpo de engenheiras militares; elles não entraram para aquelle corpo, senão depois deterem adquirido todos quantos conhecimentos theoricos são necessarios para bem desempenhar as funcções da sua arma. Depois da theoria o que se segue? A practica de muitos annos: ora durante esses annos não dará provas de aptidão? Não terá o commandante de engenheiros os dados precisos e necessarios para saber qual é mais forte, se aquelle, se este official? Sabe, tem obrigação de saber, a lei incumbe-lhe sabe-lo. Logo não fallemos mais em exames.

Por tanto entendo que o artigo deve ser redigido na conformidade da substituição que vou mandar para a Mesa, e que diz assim

Emenda. — Em logar de se dizer no artigo — e der provas — diga-se — e tiver dado provas. — Pereira de Mello.

Continuando disse: — Porque lá estão as informações do commandante, aonde se deve dizer — este official é habil, ou mais habil neste ou naquelle ramo. Os exames que elle tem obrigação de fazer, são aquelles que já tiver feito; as provas que tem obrigação de apresentar, são as que já tiver apresentado, quer dizer os trabalhos e as obras de que esse capitão tiver sido encarregado, são sufficientes exames e sufficientes provas; por elles ha de ter manifestado a sua maior ou menor intelligencia, a sua maior ou menor aptidão, e este é que é o exame, estas é que são as provas

Lida na Mesa a emenda do Sr. Pereira de Mello, foi admittida, e ficou em discussão conjunctamente com as outras e com o artigo.

O Sr. Barão de Francos: — Julguei que a minha emenda não daria motivo a que o illustre Deputado por Cabo-Verde tomasse tamanho fogo para a combater; parece-me que o illustre Deputado não tinha razão para isso. O illustre Deputado parece-me que eleve a gastar muito tempo para mostrar a sua eloquencia e verbosidade, porque creio que S. Ex.ª mesmo esta convencido de que quando esse posto lhe tocar, e estimarei que seja muito breve, o seu merecimento ha de ser reconhecido, e ha de desempenhar muito bem esse logar.

Ora, Sr. Presidente, eu não sei que especie de papão é este que tem o artigo! Elle diz — quando desempenhar satisfatoriamente qualquer commissão da sua posição que lhe fôr incumbida. Isto é negocio melindroso a dizer a verdade, e o illustre Deputado sabe que elle o é, e realmente não se póde ser tão claro quanto se desejaria ser; mas de certo o illustre Deputado não negará que podem ter havido alguns officiaes que effectivamente tenham tido algumas commissões, que lhe fossem incumbidas, e não as tenham desempenhado bem; não sei se assim é, mas póde ser: e então dá-se ao official uma commissão, e o resultado póde ser avaliado por um digno official de engenheiros, não por exemplo por mim, que não tenho a fortuna de ser dessa arma, mas competentemente, e se não a tiver cumprido bem, não se promove. Aqui esta o que se faz; mas o illustre Deputado esteve a levantar um grande castello, que elle mesmo derribou, porque fallou a respeito de si proprio, quando por ora não lhe pertence esse posto; quando o illustre Deputado fôr capitão de certo ha de ser feito major, porque se ha de reconhecer o seu merecimento, por ora o caso não é com S. Ex.ª

O illustre Deputado tambem não tinha motivo para querer que sejam só aquelles trabalhos que teem relação com o serviço militar; porque o illustre Deputado sabe perfeitamente, que ha muitos que não teem relação com o serviço militar, e que são comtudo praticados por officiaes engenheiros: presentemente, alguns officiaes de engenheria ha de distincto merecimento que estão empregados em serviços que não são militares.

Nada mais tenho a dizer na questão. Agora direi que me parece que não estive em contradicção com o Sr. Ministro da Guerra: eu disse que as obras hydraulicas parece-me que em todas as especialidades não tinham relação com a vida militar; não sei se o illustre Ministro disse alguma cousa diversa no mesmo ponto; póde haver algumas occasiões em que tenham relação, mas serão muitissimo poucas. Portanto sustento o meu additamento. Não havendo quem mais pedisse a palavra, julgou-se a materia discutida, e procedendo-se á votação, foi approvado o artigo até ás palavras — boas informações. Seguidamente approvou-se a, emenda do Sr. Pereira de Mello; e consecutivamente approvou-se o resto do artigo, e rejeitaram-se as emendas dos Srs. Fontes Pereira de Mello, e Barão de Francos.

O Sr. Fontes Pereira de Mello: — (Sobre a or-

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dêm.) Queria perguntar a V. Ex.ª se pela disposição da emenda, que se approvou ficam os capitães que passarem a majores sem nenhuma obrigação de dar provas especiaes.

O Sr. Presidente: — Eu não posso responder mais do que diz a emenda: a emenda o que diz é — «que tiver dado provas de que sabe desempenhar...» — em logar de «der provas» que é o que estava no artigo.

O Sr. Fontes Pereira de Mello: — Bem; então não ha exames, peço que se consigne isso, não ha exames para majores.

O Sr. Pereira de Mello: — Quaes exames! O Sr. Presidente: — A idéa foi: — exames anteriormente feitos — não obriga a exames futuros.

Passou-se ao art. 28, que foi approvado sem discussão. — Seguiu-se o art. 29, e sobre elle disse

— O Sr. Ministro da Guerra: — Sr. Presidente, a respeito do art. 29 tenho a dizer o mesmo que a respeito do art. 18; esta idade esta prejudicada, estas palavras devem ser eliminadas, para o artigo ir em harmonia com o que se approvou já. (O Sr. Pereira de Mello: — Apoiado.)

O Sr. Presidente: — Convido o Sr. Ministro a mandar a sua proposta de eliminação, e é bom que a faça extensiva a todas as disposições de similhante natureza, para não haver perda de tempo, porque depois compete á Mesa fazer essas eliminações.

O Sr. Ministro da Guerra: — Mando para a Mesa a seguinte

Emenda. — Proponho a eliminação da palavra — ou tendo mais de 60 annos de idade. — Barão de Villa Nova d'Ourem.

Foi admittida, e não havendo quem mais pedisse a palavra, julgou-se a materia discutida, e foi a)) -provado o artigo com a emenda do Sr. Ministro da Guerra.

Passou-se ao art. 30.

O Sr. Ministro da Guerra: — Sr. Presidente, com quanto eu supponha que um coronel com mais de 65 annos de idade, por via de regra, para nada prestará, comtudo para ir em harmonia este com os outros artigos mando para a Mesa esta

Emenda. — Proponho a eliminação das palavras

— ou tendo mais de 65 annos de idade. — Barão de Villa Nova d'Ourem.

Sendo admittida, e não havendo quem mais pedisse pedisse a palavra, julgou-se a materia discutida, e foi approvado o artigo com a emenda do Sr. Ministro da Guerra.

O Sr. Andrade Nery (Sôbre a ordem): — Mando para a Mesa um parecer da commissão do Ultramar sobre a proposta do Governo para a exportação da urzella nas provincias Ultramarinas.

O Sr. Emilio Brandão (Sobre a ordem) — Mando para a Mesa um parecer da commissão de Administração Publica sobre a representação da camara municipal de Coimbra sobre as licenças e sello das lojas.

O Sr. Presidente: — O primeiro manda-se imprimir para ser dado opportunamente para ordem do dia; o segundo fica reservado para ser discutido em occasião conveniente.

Continua a ordem do dia, e entra em discussão o art. 31.

O Sr. Fontes Pereira de Mello: — Sr. Presidente, vou combater este artigo porque me parece injusto a respeito de todos os officiaes que se acham no posto de coronel actualmente, e porque me parece pouco exequivel a respeito mesmo daquelles que se promoverem.

A organisação militar no nosso paiz não soffre tantas modificações que seja possivel adquirir em grande escala em todas as armas do exercito a instrucção especial, de que se obriga a fazer um exame pelo art. 31. do projecto. Eu, Sr. Presidente, tenho sustentado sempre nesta Camara a necessidade que ha de dar vantagem ao merecimento em relação á antiguidade; já defini aqui especificadamente, como eu entendo o merecimento, já disse que o merecimento como eu o entendo, não diz respeito unicamente ás habilitações academicas, mas ao serviço praticado nos diversos exercicios, de que o official, segundo a arma a que pertence, é encarregado; isso, Sr. Presidente é que eu chamo merecimento, e o merecimento de serviço não exclue o merecimento scientifico, sobre tudo e muito principalmente nas armas scientificas.

Entretanto devo dizer a V. Ex.ª e á Camara, que me surprehendeu a resolução que se acabou de tomar ha pouco a respeito dos majores do corpo de engenheiros; surprehendeu-me, Sr. Presidente, e pela minha parte declaro que nem a solicitei, nem a agradeço; aquella disposição estabeleceu uma excepção, que se alguma cousa e, não é honrosa, é odiosa, a respeito do corpo de engenheiros: quando em todas as outras armas se exige o merecimento para se passar ao posto de major, determina-se por uma resolução da Camara que em engenharia, a primeira arrua do exercito, se passe a major unicamente por antiguidade! Eu, na emenda que mandei para a Mesa, consignei bem clara e terminantemente qual é a minha opinião a este respeito; queria que naquelle corpo apesar de haver habilitações prefixas, muito determinadas antes de se chegar, a ser official daquella arma, a exemplo do que se pratíca a respeito da infanteria, da cavalaria, e tambem de artilharia, que é um corpo scientifico, se estabelecessem tambem algumas provas, visto que o projecto tinha estabelecido essas provas a respeito de todas as armas do exercito; se não houvesse já esta disposição anterior, tambem não diria agora qual a minha opinião, por que não vem para o caso; mas desde que se estabeleceu em todas as armas uma habilitação especial para passar ao pôsto do major, não quereria que deixasse de se estabelecer igual condição para a arma de engenharia. Até aqui queria-se que o capitão de engenheiros que passasse a major, fizesse um exame vago, e agora não querem que faça nenhum. E notavel este salto! Em quanto digo isto, não me refiro ao nobre Deputado, que apresentou a proposta; refiro-me á resolução da Camara; com tudo não a censuro, e sòmente me refiro a ella. Realmente o projecto estabelecia um exame, apesar de que o nobre Deputado disse que não via nenhuma disposição por onde se entendesse, que havia de haver exame; eu peço licença para lhe dizer, que pelo modo que o artigo estava redigido, importava o exame...

O Sr. Presidente: — O artigo já não esta em discussão, porque se votou; e o nobre Deputado não póde discutil-o, a não querer propôr a reconsideração do objecto.

O Orador: — Eu não proponho a reconsideração

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do artigo, por que não quero gastar a Camara tempo inutilmente; ainda que não era exemplo novo: tenho precedentes, e por consequencia estou auctorisado, pelo que se tem practicado nesta Camara, para o poder fazer; e até mesmo o regimento o permitte, porque diz — que na sessão immediata se possam dar explicações sobre aquillo que se praticou anteriormente. Porem vou entrar já na materia, e não insisto mais nisto.

Sr. Presidente, eu entendo que as disposições do art. 31, que é aquelle que esta em discussão, são inexequiveis, assim como o eram aquellas que se estabeleciam a respeito dos capitães de engenheiros para passarem a major. Diz o artigo (leu). Isto que se exige aqui, no estado actual do nosso exercito, a dizer a verdade, é uma lastima; é preciso dizer a verdade para poder discutir este artigo convenientemente. Pois sem haver grandes reuniões de tropas, e passando-se annos que se não juntam para manobrar, como é possivel obrigar os coroneis, que servem desta maneira, a fazerem um exame pratico no campo, sobre tudo nas diversas armas combinadas? E de certo chegar a um resultado que não esta provavelmente na mente da maioria da commissão; é chegar ao resultado de que quasi todos os coroneis (com, raras excepções por que as ha) hão-de ser reprovados. Note-se que o artigo, nos termos em que esta concebido, offerece uma tal ambiguidade que póde dar em resultado graves injustiças relativas; por que diz — uma ou mais armas combinadas — e o Governo está no seu direito de fazer com que o coronel manobre só com a arma de cavallaria ou infantaria ou com as armas combinadas, por consequencia aqui estabelece-se uma desigualdade relativa tão grande, que é contraria aos principios de justiça. O coronel de infanteria habituado nesta arma desde o principio da sua carreira a commandar corpos de infanteria, deve estar habilitado para commandar uma brigada de infanteria; mas ao que não póde estar obrigado, é a commandar uma divisão, composta de cavallaria e artilharia; nem selhès póde exigir isto, em quanto não houverem escólas geraes, aonde estes officiaes se exercitem (apoiados). Em Portugal não ha estas escólas; nem se quer mandar officiaes intelligentes do nosso exercito ver e observar o que se faz nas outras nações; e quando uma vez isto se fez, logo toda a gente gritou contra isto. Era preciso não mandar um só, era preciso mandar mais alguns, e que se revezassem (apoiados).

Portanto da maneira, porque isto esta organisado, não havendo estas escólas geraes, entendo que se não podem obrigar os coroneis a fazer uma cousa que não aprendem, e uma cousa que se não aprende no gabinete, e que só se póde aprender no campo, para o que é necessario que o individuo tenha á sua disposição uma porção de tropa, e não póde ter esta, senão quando o Governo lhe facultar. Por conseguinte esta disposição é inexequivel, e injusta, quando estabelece uma provisão a respeito de um ou outro individuo, quando diz — uma ou mais armas combinadas. Isto é pelo que diz respeito aos coroneis de de infanteria e cavallaria; quanto aos coroneis de artilheria póde dizer-se o mesmo, e talvez com mais razão: porque os coroneis de artilheria têem obrigação de trabalharem com corpos da sua arma, e podem estar habilitados para commandar uma brigada de artilheria, mas trabalharem com as outras combinadas não lêem obrigação, e não o podem fazer, porquê não têem escólas praticas. Mas a respeito do estado maior de engenharia com quanta mais razão não é injusta esta disposição? Estes officiaes nunca foram obrigados a fazer estas manobras em grande escala; nem com uma só arma quanto mais com as outras armas combinadas! E agora vai-se impôr uma obrigação a officiaes de armas especiaes, que têem funcções tambem especiaes, e que póde fazer com que elles não possam satisfazer a esta condição que se lhes exige, ao mesmo tempo que podem desempenhar perfeitamente as obrigações da sua arma (apoiados). Pois um coronel do estado maior não póde ser um bom coronel na sua arma, e fazer muito bom serviços sem com tudo estar obrigado a commandar uma brigada? De certo que sim; até mesmo póde ter um certo acanhamento; porque quando se vive longe dos corpos, perde-se uma certa energia, que é indispensavel para poder manobrar com os corpos. Se perguntarem a um official engenheiro do estado maior, como se fazem estas manobras, póde-o dizer; mas não tem obrigação de ir executar, porque isto depende de habilitações praticas; podendo aliás ser muito util, e bom official para o estado maior no desempenho das mais importantes funcções, de que for encarregado (apoiados). Além disso estes officiaes do estado maior não são encarregados de manobrar com tropas; alguns ha que têem esta aptidão especial; mas por haverem estes com esta aptidão, não se deve impôr a todos uma similhante obrigação: e muito menos ainda que sejam commandantes de brigadas, e divisões. Portanto estes officiaes só podem ser obrigados a commandar os corpos, ou seja uma ou outras armas combinadas, quando pelo seu primitivo serviço na arma de infanteria, cavallaria, e artilheria tiverem a pratica necessaria, ou quando tenham uma dedicação especial que os habilite a isto, mas nunca forçal-os.

Creio que me farão a justiça de acreditar que eu não fallo por mim; creio que nunca chegarei a ser coronel, apezar da boa vontade do Sr. Barão de Francos, o que muito lhe agradeço; só lá chegarei, se viver muito, e segundo os principios desta lei ha um grande methodo para se viver, e póde ser que á força de viver chegue talvez a este ponto. Eu como sou mais moço, tractarei de desempenhar estas obrigações nos diversos pontos que tenho a seguir, e tractarei de me habilitar com esta pratica, que se exige aqui, mas para os que actualmente existem mais adiantados em idades, e que não tem esta aptidão especial, e que nunca se dedicaram a este serviço, realmente é injustissima esta disposição. Portanto não farei mais reflexões a este respeito. As reflexões que fiz ao principio a respeito do major de engenheiros, eram para reforçar de algum modo o que tinha a dizer a respeito dos brigadeiros: quero que hajam provas para todos os postos, mas que sejam combinadas de maneira que se tornem exequiveis; o contrario é um absurdo (apoiados) alem de se estabelecer aqui uma injustiça relativa a respeito dos individuos, que se acham hoje no posto de coronel, porque vão ser obrigados a um exame, para o qual não estão habilitados praticamente. Portanto se esta minha opinião fôr combatida, pedirei a palavra para a sustentar; e neste sentido mando para a Mesa uma emenda que altera completamente as disposições do art. 31; se esta emenda não passar, e o artigo for appro-

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vado, neste caso farei uma proposta para que se salvem os direitos adquiridos; porque caso julgue conveniente que esta disposição passe para aquelle, que vierem de futuro, comtudo entendo que se não deve applicar aos que já existem. Mando para a Mesa a seguinte

Emenda. — O pôsto de brigadeiro será conferido na conformidade do alvará de 27 de fevereiro de 1801, mas regulado pelo modo seguinte:

§ 1.º Nenhum coronel será promovido ao posto de brigadeiro, sem que 1.º — as informações dos generaes, etc. etc. até ao fim. — Fontes Pereira de Mello.

Foi admittida, e ficou em discussão conjunctamente com o artigo.

O Sr. Xavier da Silva leu, e mandou para a Mesa o parecer da commissão de Fazenda sobre o orçamento da despeza do Estado.

Mandou-se imprimir para entrar convenientemente em discussão.

O Sr. Presidente — Antes de continuar a discussão sobre o objecto da ordem do dia, chamo a attenção da Camara sobre um facto, que a Camara poderia reputar de menos deferencia que a Mesa tinha para com ella. Na sessão de tres do corrente apresentou o Sr. Ferreira Pontes um projecto de lei sobre os egressos, e requereu a publicação delle no Diario do Governo; a Camara não deferiu a este requerimento, comtudo vem hoje publicado no Diario do Governo, acompanhado de todo o immenso relatorio, e vem debaixo da epigrafe, da Camara dos Srs. Deputados. A Mesa logo que viu isto, tractou de indagar a razão deste acontecimento, e soube que não era por culpa nem da Tachygrafia, nem da Secretaria; depois mandou officiar ao director da imprensa nacional, o qual respondeu ao official maior da secretaria da maneira seguinte

«Em resposta ao officio de V. S.ª que recebo agora, digo que o projecto sobre egressos do Sr. Deputado Ferreira Pontes foi publicado, gratuitamente te, a rogo do mesmo Sr. Deputado, invocando a auctorisação do Ex.mo Sr. Duque de Saldanha

O Sr. Duque de Saldanha tinha-me dicto ha poucos dias que o Sr. Deputado se lhe tinha dirigido a pedir a publicação deste projecto, e eu disse a S. Ex.ª qual tinha sido a deliberação da Camara, e que portanto não a podia mandar fazer; mas o Sr. Deputado entendeu que se devia dirigir directamente ao director da imprensa, invocando o testimunho do Sr. Ministro do Reino, e o director menos reflectidamente não duvidou fazer esta impressão. Ora este facto não é novo, a Camara sabe, que o anno passado já succedeu o mesmo com outro projecto apresentado pelo mesmo Sr. Deputado, o qual apesar de saber que não podia ser impresso, rogou a S. Ex.ª o Sr. Presidente do Conselho que lh'o mandasse imprimir; mas neste caso, como S. Ex.ª sahia qual era a resolução da Camara, disse-lhe que em logar de o mandar publicar, devia mandar ordem em contrario. Deste facto se vê que S. Ex.ª não houve menos deferencia para com a Camara; mas que a ha de alguem, não entra em duvida. Em consequencia disso vou tomar as providencias competentes, assim como declaro que vou mandar fazer um annuncio, para que as impressões necessarias para o serviço da Camara sejam feitas por concurso, a fim de evitar certos inconvenientes.

Continua a discussão do art. 31, com a emenda offerecida pelo Sr. Fontes Pereira de Mello.

O Sr. Corrêa Leal: — Sr. Presidente, eu tinha pedido a palavra antes do nobre Deputado por Cabo Verde, e se V. Ex.ª ma tivesse dado em primeiro logar, tivera eu a preeminencia da proposta que fez o illustre Deputado. Agora não me é dado fazer mais reflexão alguma sobre o artigo, porque todas foram apresentadas superabundantemente pelo illustre Deputado, auctor da proposta, e por consequencia limito-me a mandar para a Mesa uma emenda, a qual, posto que seja quasi o mesmo, todavia differe d'alguma maneira, e póde ser, que a Camara tenha de optar entre uma, e outra.

Emenda. — Proponho a eliminação do art. 31, e para substitui-lo com a mesma numeração a douctrina do seu § 1.º — Corrêa Leal.

Foi admittida, e ficou em discussão conjunctamente com o artigo.

O Sr. Pereira de Mello: — Não quero ter só para mim a gloria, (porque ella cabe tambem a muitos dos meus collegas) porém parece-me poder dizer, que me cabe a honra, e a gloria de ter defendido a honra da officialidade portugueza. Parece-me, se me não engano, que o artigo em discussão offende sobremaneira, e gravemente o credito de todos os coroneis actuaes do exercito. Lamento muito, que o illustre Deputado por Cabo Verde, estando em perfeito accordo com as minhas idéas sobre este artigo, o não estivesse a respeito do outro artigo que já se discutiu, e foi votado pela Camara, e sinto que tivesse a lembrança de lançar uma censura sobre a maioria, por ter approvado a minha emenda, dizendo — «ao principio queriam os exames geraes; agora não se querem exames especiaes.?> — Sr. Presidente, pois não tem o illustre Deputado nesse artigo, da fórma porque esta redigido, todos os exames quantos são necessarios, para os capitaes de engenheiros poderem ser providos a majores? E permitta-me a Camara, que eu me affaste um pouco da discussão do artigo, visto o illustre Deputado chamar-me a esse campo, aonde eu não posso deixar de ir, para lhe responder. Pois no art. 27 — nas palavras — «e tiver dado provas de que sabe desempenhar qualquer importante trabalho etc.» — não estão envolvidas todas quantas especialidades o Sr. Deputado quizer lembrar na arma de engenheria? Pois as palavras — «qualquer importante trabalho» — não compreende todas as especialidades, que tem a arma d'engenheria? E faz o illustre Deputado tão pouca honra ao corpo a que pertence, que entende ser necessario, para um capitão de engenheiros passar a major, que faça um exame sobre artigos especiaes da sciencia de engenheria! Sr. Presidente, um capitão de engenheiros, torno a dizer, não chega a esse posto sem ter as habilitações necessarias, e sem ter cursado alguns annos, ou sem ter feito alguns exames, e isto além da muita practica, porque ha capitaes que tem 15, 20, 25, e 30 annos de serviço, e qual será o trabalho de que elles possam ser encarregados como majores, de que o não tenham sido já como capitaes? Ainda mais; não devem existir no corpo todas as informações a respeito desses officiaes; não se saberá alli se elles tem desempenhado esse «qualquer importante trabalho? II Não saberá o commandante em qual dos ramos da sciencia será mais habil este, ou aquelle official? Querer-se-ha que aquelle que fôr provido áquelle posto, seja pelos serviços que ha de prestar, e não pelos que já tem prestado? E é a isso que se

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chama progresso? Isto não é progresso, é retrocesso! O mesmo direi a respeito do artigo em questão.

Sr. Presidente, sobre este artigo estou perfeitamente de accordo com o illustre Deputado, que mandou para a Mesa a sua proposta, o exame que este artigo faz necessario para por elle passar todo o coronel que tem de ser despachado a brigadeiro, a meu ver, e uma offensa que se faz ao merecimento de qualquer dos coroneis actuaes; e declaro que não estou advogando individualmente a causa de coronel algum; estou advogando a causa que entendo ser de interesse para o bem do paiz. Não posso deixar de lamentar, que se lance assim um labeo sobre a reputação dos actuaes coroneis do exercito portuguez. Em primeiro logar devo lembrar á commissão que a redacção do artigo esta um pouco obscura; porque não sei o que quer dizer — metade das vagaturas será preenchida por um dos dez coroneis mais antigos etc.

Se esta metade forem dois, como ha de ser preenchida por um?... Se a metade forem cinco como ha de ser essa metade preenchida por um dos dez coroneis; confesso que isto esta um pouco obscuro. Não duvido, que as intenções da illustre commissão sejam muito justas; mas e necessario que faça as suas cousas de fórma, que não apresente estas obscuridades. Agora pelo que toca ao exame de uma, ou mais armas combinadas, tambem não entendo o que seja; se é exame para general, então deve ser de todas as armas combinadas; mas, Sr. Presidente, torno a repetir, um exame destes para coroneis que têem prestado serviços ha 25 e 30 annos!... Se elles não eram capazes, não deviam ter chegado ao posto de coroneis.

Sr. Presidente, em campanha a maior parte das brigadas são commandadas por coroneis; na campanha peninsular, houve uma occasião em que uma brigada foi commandada por um tenente, porque todos os mais officiaes estavam fóra do combate, por feridos, ou mortos; por majores e tenentes coroneis são commandadas algumas vezes, mas por coroneis muitas, ou quasi sempre; e appello para o testemunho de um dos illustres membros da commissão, que não póde deixar de recordar-se dos relevantes serviços que fez seu pai, que sendo coronel de um corpo por muitos annos commandou uma brigada; e se a practica esta mostrando isto; se a experiencia de 25, e 30 annos, que têem esses coroneis, do serviço, os deve ter habilitado para commandar uma brigada, porque motivo hão de passar por um exame? E pergunto, qual ha de ser a sorte desse coronel, que ficar reprovado?... Como poderá esse coronel ser outra vez empregado no serviço militar a bem da sua patria, com vantagem para si, e para o serviço publico, principalmente agora neste campo de opiniões de partidos politicos, em que o merecimento do homem se decide pela religião politica que professa? Oh, Sr. Presidente, pelo amor de Deos, eu peço á maioria da Camara, como ao Sr. Ministro da Guerra toda a liberdade, mas este principio não e possivel approvar-se; na actualidade eu preferiria, e permitta-me a Camara que o diga, a legislação de um tempo, aliás chamado absoluto; e permitta-me a Camara que lhe leia o que diz o alvará de 27 de fevereiro de 1701 a este respeito, (leu)

Pergunto, que ha de a lei actual fazer a respeito destes coroneis, que não têem estado em commando de corpos, mas que têem estado em outras commissões, e que têem dado provas de talento, zêlo e actividade no serviço nacional? Eu quero que me tirem desta impressão em que estou, porque se houverem razões, que me convençam, cedo de bom grado; mas o que me parece é que esta provisão é um pouco injusta. Eu queria que se deixasse em vigor a lei de 1808, muito embora S. Ex.ª não deseje tanto arbitrio para o Governo; mas eu entendo que a respeito da disciplina militar, e organisação do exercito, não e possivel que o Governo deixe de ter algum arbitrio; é uma corporação excepcional, que senão póde regular pelo direito commum.

Esta restricção no meu vêr e injusta; Vai pôr fóra do serviço officiaes muito benemeritos, porque nem todos têem a presença de espirito necessaria para passar por um concurso publico, podendo aliás ser muito habeis, (apoiados) Eu conheço muitos militares que aliás no campo são bravos e valentes, e que em occasiões muito ordinarias lhes falta a força moral; muitos officiaes superiores foram por 4 e 5 annos companheiros meus nos trabalhos da Torre de S. Julião, os quaes tendo dado provas de valentia no campo da honra, succumbiram na Torre; não tiveram força para arrostar com aquelles trabalhos, e lá ficaram, porque caíram no desalento. Não será possivel que hajam muitos coroneis a quem isto aconteça, porque não são cousas que estejam na mão do individuo, e muito mais hoje que se avalia o saber de cada um segundo os principios politicos que professa? Em outro tempo podia ser muito bom esta provisão, mas no actual acho uma grande offensa aos coroneis do exercito.

O Sr. Ferreira Pontes: — Tendo saído da sala, sou agora informado que da Mesa se fizeram algumas observações sobre a impressão do meu projecto, que vem impresso no Diario de hoje, e como naquellas observações se inflingiu uma censura, preciso dar a esse respeito algumas explicações...

O Sr. Presidente: — Devo dizer ao Sr. Deputado que aquillo que se disse ha pouco por parte da Mesa, não foi para o Sr. Deputado, foi para a Camara, nem a Mesa tem obrigação de ver, se os Srs. Deputados estão presentes. Eu quiz dar conta á Camara da razão porque no Diario do Governo de hoje vinha um facto contra a sua decisão; por consequencia o caso foi com a Camara, e não com o Sr. Deputado, nem sobre este objecto póde ter a palavra sem consentimento da mesma Camara.

O Sr. Ferreira Pontes: — Pois eu peço a V. Ex.ª que consulte a Camara se me concede que dê uma explicação a este respeito.

Consultado a Camara, resolveu affirmativamente.

O Sr. Ferreira Pontes: — Sr. Presidente, pondo de parte os inconvenientes da Mesa não esperar que eu estivesse presente para me fazer uma tão grave censura, a fim de poder logo contestal-a, direi que ainda que a Camara não deferiu ao meu requerimento para se imprimir no Diario o projecto, que apresentei sobre as pretenções dos egressos, nem por isso me julguei inhibido de promover a sua impressão á minha custa, e para isso me dirigi á imprensa nacional e não encontrando alli o administrador geral fallei com o director da typographia, e lhe disse que o entregasse ao administrador, e da minha parte lhe dissesse que queria que se imprimisse no Diario

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pagando eu as despezas da impressão, e até me offereci para lhe deixar o dinheiro em que importaria, ao que não quiz annuir, mas ficou segundo a minha recomendação de me mandar a conta da despeza para eu a satisfazer; este é o facto, veja a Camara se nisto se contem alguma falta de consideração á sua deliberação; se a Camara tivesse determinado a impressão, a despeza tinha de ser satisfeita pela administração da Casa, mas esse indeferimento não contem a prohibição de se imprimir, nem se podia conter, porque até estava fóra do alcance das suas atribuições; o Diario do Governo para com a Camara é como qualquer outro jornal, nada tem com elle mais do que pagai-lhe as despezas do que por sua ordem alli se imprime, tendo contractado com essa empreza podia contractar com qualquer outra, e a um Deputado é livre fazer alli imprimir não só qualquer projecto, mas qualquer discurso, assim como em qualquer outro jornal, e imprimindo-se alli os communicados e annuncios particulares não póde dar-se razão que justifique a prohibição que se pertende estabelecer; eu ao menos da minha parte não estou resolvido a considerar-me inhibido de mandar alli fazer outras impressões similhantes, se se me offerecer occasião; á vista destas explicações creio que a Camara se persuadirá que não a offendi.

O Sr. Presidente: — Vai lêr-se o officio que veio do director da imprensa, e que servirá d'explicação ao Sr. Deputado (leu-se.) Isto é um negocio desagradavel, e que deve sei vir de norma para o futuro. A Mesa e a executora das ordens da Camara: a Camara decidiu em sua sabedoria que o projecto do Sr. Deputado não fosse impresso; assim consta da acta de 3 de abril, e o mesmo decidiu pouco depois a respeito do projecto do Sr. Moraes Soares, e outros; por consequencia não podia ser impresso no Diario do Governo. O Sr. Presidente do Conselho de Ministros ha alguns dias perguntou-me, se haveria algum inconveniente em se publicar o projecto do Sr. Deputado no Diario do Governo, e eu disse-lhe qual tinha sido a resolução da Camara, e S. Ex.ª reconheceu que senão podia publicar; porque desgraçadamente já o anno passado tinha havido um facto similhante contra a decisão da Camara, em que S. Ex.ª a pedido do Sr. Deputado mandou publicar um projecto seu, cuja publicação a Camara lhe tinha negado.

A Mesa vio hoje a impressão do projecto no Diario do Governo, e para não ser aggredida pela Camara, chamou o official maior da secretaria e exigiu saber como se tinha mandado imprimir aquelle projecto; o official maior disse que nada sabia a este respeito: a mesma pergunta fez a Mesa aos empregados da tachygrafia, e todos disseram que nada tinham com isso: em consequencia ordenou a Mesa que o official maior da secretaria officiasse ao director da imprensa, a fim de saber á ordem de quem tinha sido feita aquella publicação, e de mais a mais logo em seguida a outro projecto e que a Camara decidiu que se publicasse.

Eis aqui o que se passou, o Sr. Deputado tem de certo podér para mandar publicar o que quizer, mas não debaixo da epigrafe Camara de Deputados. Isto foi pois uma explicação não ao Sr. Deputado, mas á Camara, porque ella não suppozesse que da Mesa se ía d'encontro com as suas decisões.

O Sr. Ferreira Pontes: — Sr. Presidente, da primeira vez que fallei, logo disse que não havia tractado com o administrador geral da imprensa, e o que se diz no officio que o projecto fóra impresso gratuitamente a rogo meu, é inexacto, ou não é bastante explicito, é verdade que eu pedi a impressão, mas offerecendo-me a pagar a despeza, e até logo quiz deixar dinheiro para ella, como já disse, isto mesmo estou muito certo ha de confirmar aquelle empregado com quem tractei; se porém para me obsequiar quizeram faze-la gratuita, declaro não acceitar este obsequio, e hei-de insistir em a pagar, por que não gósto de receber obsequios desta ordem. Quanto á allusão que se faz ao nobre Duque de Saldanha, digo que quando lhe entreguei o projecto, lhe disse me parecia que nenhuma duvida podia haver na impressão, uma vez que eu me promptificava a paga-la, que isto mesmo me dissera o Sr. Presidente do Conselho, e que caso a houvesse, elle não teria duvida em dar ordem para se imprimir: e como felizmente esta presente, peço a S Ex.ª declare se é ou não verdade o que acabo de expor. (O Sr. Presidente do Conselho: — Apoiado) Eu não pensava que fosse precisa esta auctorisação, e se por incidente disse o que havia passado com o Sr. Ministro do Reino, foi para dar mais força á minha opinião e para desfazer qualquer duvida que por ventura se podesse offerecer, ainda que -em fundamento, pois que, de novo repito, eu considero o Diario como qualquer outro jornal, para alli se mandar imprimir qualquer projecto ou communicado, uma vez que se pague a despeza e se responda pela sua doutrina.

Disse-se que havia sido impresso debaixo da epigrafe — Camara dos Srs. Deputados — e em primeiro logar que outros, que vem impressos no mesmo numero, a que respondo que não designei o logar em que se havia de imprimir, e que me era muito indifferente que viesse alli ou em qualquer outra parte; mas que quanto avir debaixo d'aquella epigrafe era menos exacta essa observação, por quanto sendo admittido á discussão em sessão de 3 do corrente e estando a 20 não podia vir debaixo da epigrafe da sessão de hontem, de mais entre o extracto desta sessão, e o projecto ha dois artigos diversos, um de differentes commissões ou rectificações, e outro de erratas, ambos separados com linhas como se póde ver. E além disto os extractos da sessão do Diario não são officiaes, são como os de qualquer jornal, e se aí vem com mais alguma exactidão de extensão, é por que talvez assim convenha á imprensa nacional.

Não posso tambem deixar de notar a diligencia e pressa, com que a Mesa se houve em mandar saber a razão porque alli se fizera a impressão do projecto, pois que parece só lhe competia não abonar essa despeza, caso viesse lançada em conta, e depois de se lhe dizer que fóra gratuitamente, isto é, que se não exigiria nada á Casa por elle, nada mais tinha a obrar fosse qual fosse o motivo porque a impressão se tivesse feito. Em vista do que tenho exposto, persuado-me que a Camara ficará convencida de que sem faltar á consideração que é devida ás suas resoluções, podia promover a impressão do projecto, como fiz, que ella não prohibiu a impressão, o que fez foi não determinar que a impressão se fizesse por sua ordem, para ser paga pela folha da Casa.

O Sr. Presidente: — Torno a declarar que se a

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Mesa procedeu assim, foi pela responsabilidade moral, que tem sobre a despeza que se faz com a imprensa, e para ver se sim ou não devia legalisar esta despeza, por que naquillo que se publica no Diario, a Mesa é muito escrupulosa, e não póde deixar de o ser, por que a despeza é muito grande. Este incidente esta concluido.

O Sr. Lopes de Lima: — Sr. Presidente, estava annunciada para hoje por V. Ex.ª uma interpellação minha ao Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros; S. Ex.ª não appareceu e eu respeito muito os motivos, que podia ter para isso, mas dezejo que se intenda que não desisto da minha interpellação, e por tanto peço a V. Ex.ª que me conserve a palavra para na primeira sessão em que S. Ex.ª appareça, eu a poder verificar.

O Sr. Presidente: — Fica-lhe reservada a palavra. Estamos na hora da prorogação: ha uma interpellação do Sr. Pereira dos Reis ao Sr. Ministro do Reino; não sei se V. Ex.ª póde responder já. O Sr. Deputado requereu que a Camara lhe concedesse a palavra, logo que estivesse presente o Sr. Ministro, mesmo antes da hora da prorogação, mas como não póde ter logar até agora por se não dar o caso de V. Ex.ª estar presente, agora que estamos na hora da prorogação, não é necessaria a licença da Camara, e (em a palavra o Sr. Pereira dos Reis para fazer a sua interpellação.

O Sr. Pereira dos Reis: — V. Ex.ª obriga-me a exercer uma especie de tyrannia sobre a Camara, pois que são já quatro horas e meia; com tudo eu vou fazer a minha interpellação.

Sr. Presidente, esta interpellação perdeu parte do interesse que tinha, porque o facto, que vou referir em breves palavras, foi em parte remediado pelos proprios caixas do contracto do tabaco; mas sendo possivel que se repita, desejo saber do Sr. Ministro do Reino se tem adoptado algumas providencias, não só a respeito destes, mas d'outros que possam occorrer de futuro. Como disse, farei uma breve exposição do negocio, que esta perfeitamente authenticado.

No dia 22 de janeiro ultimo na cidade de Béja foram como assaltadas tres casas muito repeitaveis cercadas por força armada do regimento n. 11 de infanteria, e invadidas por quatro guardas ou agentes subalternos do contracto do tabico, não havendo, segundo consta destes papeis, a interferencia aliás indispensavel da auctoridade civil, ou administrativa. Entraram os quatro guardas da fiscalisação com o contigente militar que cercava estas casas; deram um varejo a todas ellas, e sairam do mesmo modo que entraram. Eu não conheço nenhum dos individuos, que tiveram de passar por essa especie de vexame; mas sou informado que todos são dignos da maior consideração, e entre elles figura o presidente da camara municipal de Béja. É claro que o administrador do tabaco obrou de facto proprio e força sua; que senão cumpriu a obrigação do contracto; que foi violada a caria de privilegio; que não appareceu a auctoridade civil, que devia apparecer em tal acto, e que em tudo isto houve uma manifesta violação da inviolabilidade da casa do cidadão

Nesta occasião devo declarar, porque costumo ser franco, que é preciso que nos expliquemos uma vez por todas a respeito deste negocio. Eu acho que talvez por defeito de informações os caixas do contracto do tabaco não tem ido bem na escolha dos seus agente; parece que o refugo da sociedade esta incumbido desta fiscalisação; os guardas a cavallo são homens de nenhuma respeitabilidade; eu tenho estado fóra de Lisboa, tenho examinado este negocio de perto, e entendo que n'esta parte, que entende com as classes mais desvalidas da sociedade, não tem havido o cuidado necessario na escolha dos empregados, porque até não se exige d'um guarda a cavallo senão a compra de um cavallo.

É certo que se estão praticando vexames escandalosos; nem tenho outros termos com que os possa expressar. A idéa de privilegio tem outra idéa associada a ella, e é a necessaria precaução para que se devam evitar os abusos; é certo que a caria de condições e privilegios, com que se me póde argumentar, concede isto; e ainda que talvez esses privilegios sejam um pouco excessivos, com tudo ahi mesmo, quanto é possivel, se acautellam os abusos. Ora o que eu creio, e que o Governo não tem dado as suas ordens, ou se as tem dado, então tem sido mal executadas; e eu entendo que o Governo deve regular com muita cautella o exercicio deste direito, que se concede aos contratadores. Nenhum destes varejos, nenhuma destas visitas devia ser praticada sem que comparecesse a auctoridade administrativa.

Sr. Presidente, sobre este objecto parece-me que basta o que tenho dicto; eu ouvirei a resposta de S. Ex.ª o Sr. Presidente do Conselho, não só sobre se teve conhecimento deste facto, e se deu todas as providencias necessarias, mas se tem tomado as providencias preventivas, para que não possam novamente ter logar estes factos; e pedirei tambem a S. Ex.ª que me diga, se as condições do contracto do tabaco tem sido executadas, como o devem ser da parte do Governo; isto é, se o Governo tem attendido á qualidade do genero vendido pelo contracto, porque effectivamente estou informado, e para isso não preciso ter grande trabalho, porque estou vendo o que corre por baixo da minha inspecção, e não preciso para isso auxilio, de que os generos do contracto não são da melhor qualidade.

Ouvirei pois o que disser S. Ex.ª o Sr. Presidente do Conselho, e se entender que devo dizer mais alguma cousa, então pedirei a palavra.

O Sr. J. Izidoro Guedes: — Sr. Presidente, eu pedi a palavra para um requerimento, e é para que V. Ex.ª consulte a Camara, se depois de fallar o Sr. Presidente do Conselho de Ministros, permite que eu falle nesta questão especial, e muito especial para mim; mesmo em vista das graves accusações que se fizeram ao contracto do tabaco.

O Sr. Presidente: — O Sr. I. J. de Sousa tambem pedio a palavra, não sei se é para o mesmo fim]

O Sr. I. J. de Sousa: — E para o mesmo.

Consultada a Camara, resolveu-se que tanto o Sr. Guedes, como o Sr. I. J. de Sousa tivessem a palavra nesta interpellação.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Sr. Presidente, o facto a que se referiu o illustre Deputado, é exacto, e oxalá que elle fosse o unico. No dia 31 de janeiro teve o Governo conhecimento deste facto, e com essa mesma data, e nesse mesmo dia 31 dirigiu o Governo uma portaria ao governador civil de Béja fazendo-lhe todas as recommendações, que eram proprias daquella occasião. No dia 6 de feve-

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feiro respondeu o governador civil que tinha dado todas as ordens e providencias que estavam ao seu alcance; e que a ordem não tinha sido alterada, mas que tinha estado a ponto de o ser, e que até linha corrido grande perigo a auctoridade fiscal do contracto do tabaco.

Mas, Sr. Presidente, desgraçadamente não ha só este facto; na freguezia de Gondomar, peito de Ponte de Barca, houve um facto atrocissimo, e o Governo ainda hoje pelos proprios Srs. Caixas acaba de ter conhecimento de um facto ainda mais atroz do que esse. Um homem conhecido como empregado continuamente no contrabando, como os Srs. Caixas dizem, foi encontrado por alguns empregados que julgaram que elle levava algum contrabando, e depois de o revistarem, e apesar de não lhe encontrarem genero nenhum de contrabando, levaram-no préso, e no meio do caminho fizeram-lhe tirar a jaqueta e a camisa, e chibataram-no. Isto é atrocissimo! Sr. Presidente, e o Governo e as auctoridades hão de procurar todos os meios de virem ao conhecimento dos auctores de semilhante attentado.

Agora em quanto á qualidade dos generos, por muitas vezes tanto official, como não officialmente tem chegado ao conhecimento do Governo que os generos são mãos, em alguma parte o Ministerio do Reino tem intervindo para que o genero seja substituido por outro bom, e em quanto ao modo porque foi feito o contracto do tabaco não nos pertence a nós de certo, e eu lamento muito que se saisse daquelle caminho, que se tinha seguido desde o tempo em que o contracto Começou. O contracto do tabaco esta auctorisado a empregar toda agente que quizer, e todos os seus empregados são livres do recrutamento; o Governo não os póde impedir, mas é necessario que não abuzem; a Camara sabe perfeitamente até onde chegam os limites da auctoridade administrativa, e por isso já se passou o processo ás mãos do poder judiciario, e o illustre Deputado póde ter a certeza que o Governo tem dado toda a influencia para que isso se faça com toda a força e com todo o valor.

O Sr. J. I. Guedes: — Sr. Presidente, eu agradeço á Camara a benevolencia que teve comigo, em permittir que eu podesse dar uma explicação sobre este negocio. Sinto não ter sabido que teria hoje logar esta interpellação, que julguei estar abandonada, por ser de tão longa data, para ter presentes os documentos com que poderia fazer observações ponderosas para que a Camara tivesse um conhecimento pleno do objecto a que allude o illustre Deputado, mas na falta desses documentos parece-me que poderei consegui-lo nanando succintamente os acontecimentos de Béja taes quaes foram, e a Camara ha de conhecer que da parte do encarregado daquella commissão não houve senão o cumprimento pleno do seu dever.

Sr. Presidente, quando chegou ao conhecimento dos caixas geraes que em Béja se tinham praticado buscas nas casas de alguns cidadãos em procura de contrabando que não appareceu, os caixas Geraes sentiram, como sempre sentem, que alguem soffresse os vexames de uma busca, que sempre incommoda, roas não teve nada que censurar ao seu empregado, porque elle fez uso de um direito que pertence ao contracto, e houve-se no seu desempenho com toda a discrição, e ordem.

O encarregado da administração de Béja, e chefe da fiscalisação naquelle circulo é o Sr. José Ricca; e posso dizer sem receio de ser contrariado que o seu nome dá garantias bastantes da regularidade, da ordem, e da justiça com que elle procedeu — este cavalheiro tem uma longa carreira na sua vida sem mancha — é de uma probidade e integridade que raras vezes é igualada, quando elle se encarregue de qualquer assumpto é descançar, porque nem affrouxará em zêlo, nem parará diante de nenhuma consideração que o impeça do cumprimento dos seus deveres, porque é elle da tempera tão rara nesta época — de antes quebrar que torcer. — E quando eu fallo aqui deste individuo, é porque é necessario não só dar-lhe um testimunho publico perante a Camara, mas na presença de tantos cavalheiros que o conhecem, e que sabem que eu só lhe faço justiça (apoiados). Mas não se pense, Sr. Presidente, que eu pertendo com os elogios áquelle empregado livrar os caixas geraes da responsabilidade que lhes tocar; não, Senhor, elles estão sempre promptos a dar á Camara ou ao Governo, todas as explicações necessarias, e a responder por todos os actos da sua administração, podem faze-lo com a cabeça levantada, e com a mão sobre a consciencia.

Em tres partes se divide a censura do illustre Deputado; a primeira sobre as buscas dadas ria casa de tres cidadãos em Béja — a segunda sobre a má escolha de empregados do contracto — e a ultima sobre a má qualidade do genero, que o contracto esta fornecendo ao publico. Os factos são na verdade graves, mas felizmente, ou são inexactos, ou não lhes cabe censura como o illustre Deputado ha de convir.

Quanto á primeira é verdade, que foram ultimamente dadas buscas nas moradas de tres cidadãos em Béja, como outras teem sido feitas. Os caixas do contracto informaram-se dos seus empregados, se por ventura teria havido menos prudencia nestas buscas, por isso que tem havido sempre uma constante recommendação aos empregados, para fazerem um uso muito parco deste direito do contracto, e por essa occasião foram informados de que tendo chegado ao conhecimento do chefe da fiscalisação, que uma quantidade de charutos tinham sido introduzidos em Béja, nas casas dos cidadãos em que foram dadas as buscas, e tendo chegado a convencer-se da verdade do facto, não hesitou em proceder, porque a circumstancia do contrabando ler relação com pessoas de mais consideração, ou mais ricas lhe não devia obstar. Mas não foi como o illustre Deputado disse um assalto naquellas casas, foi uma busca rigorosa, como o devem ser as buscas, porque os empregados do contracto, assim como tem ordem para fazerem o menor uso possivel do direito das visitas domiciliarias, e só quando tenham uma quasi certeza da existencia do contrabando, assim tambem tem obrigação de fazer essas visitas o mais rigorosas possiveis, sem todavia tractarem com menor civilidade, attenção, e decencia, as pessoas a quem são forçados a incommodar. O contracto tem tudo a perder, e nada a ganhar em ser perseguidor; nem isso esta nos seus interesses, nem na indole e educação dos seus gerentes. O illustre Deputado esta muito mal informado, pois que apezar de os officiaes do contracto do tabaco terem provimento e exercerem as mesmas attribuições que os officiaes publicos exercem; os caixas geraes teem recommendado sempre aos empregados que não

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dee em buscas, nem varajos sem irem acompanhados da auctoridade competente, e no caso especial de que se tracta, posso assevera-lo á Camara, o empregado fiscal estava acompanhado da auctoridade administrativa (apoiado.)

Sr. Presidente, fez-se aqui uma gravissima injustiça, quando se tractou de atacar uma classe inteira como é a dos empregados do contracto, que eu tenho a honra de defender com toda a energia; porque ella foi barbaramente atacada. Nem nesta occasião, nem em nenhuma outra, tem chegado ao conhecimento dos caixas que se tenha abusado, e os empregados estão longe de merecerem um similhante tractamento, ainda que um ou outro facto tenha acontecido, mas pouco importante, o seu numero é tão limitado que ha muito maiores motivos para elogiar, do que para censurar os empregados; elles exercem uma occupação odiosa, roas isso são as consequencias do monopolio; é preciso que nos desenganemos disto; officio mais facil de evitar estes inconvenientes é acabar com o monopolio; mas quem acceita um principio, tem forçosamente de se sujeitar ás consequencias. Eu não quero entrar em grandes desenvolvimentos a este respeito; direi sómente que muitas buscas se teem feito, e nunca se deram a respeito dellas as susceptibilidades que se dão a respeito desta; desde o momento em que se tocou na pessoa A ou B. a agitação foi tal que o nosso empregado sujeitou-se a um grande perigo. Eu não creio que esta excitação fosse promovida por parte dos individuos a quem se fez a busca; francamente digo, que não acredito isso; estou persuadido que o excitamento viera da grande indisposição que os povos teem contra todos os empregados do contracto do tabaco, por os não deixarem contrabandear, porque o contrabando é uma cousa que achou sempre grande simpathias na maxima parte dos povos, e se nós reflectirmos bem, poucas pessoas poderemos separar, que não conheçam mais ou menos o uso do contrabando. Em consequencia da guerra civil, o contrabando foi considerado como commercio licito; depois que os povos pagaram o arratel de sabão a quatro vintens e a tostão, e o dos cigarros a doze vintens, e assim todos os outros generos, a difficuldade da fiscalisação subiu de modo tal, que não ha comparação alguma entre a difficuldade de fiscalisar hoje com a que havia antes da guerra civil. O contracto tem feito quanto humanamente se póde fazer para não ser perseguidor: porém em pouco mais de 12 mezes fizeram cêrca de 5:000 tomadias, e a diminuição do consumo no primeiro anno depois da guerra civil, andou por cousa de 300 contos!... Peço attenção á Camara para isto; porque, Senhores, é muito facil vir aqui fallar nos vexames da fiscalisação; mas se se examinar bem qual a situação do contracto depois da guerra civil, se se observar que no primeiro anno depois della diminuiu o consumo quasi na quantia de 300 contos, e que em pouco mais de 1 anno se fizeram 5:000 tomadias, numero que talvez não tivesse havido durante muitos annos nos contractos anteriores, ha de reconhecer-se que é necessario um certo vigor em quanto á fiscalisação do contracto, e uma certa indulgencia para a considerar: comtudo para satisfação da Camara devo dizer, que ha alguns mezes a esta parte, que essa fiscalisação esta muito menos vexatoria; entretanto note bem V. Ex.ª e a Camara, não tenho duvida de o dizer alto e bom som, os caixas quando mandam proceder a essa fiscalisação, estão sempre dentro das condições do contracto, que não sei se são boas ou más.

O nobre Presidente do Conselho de Ministros disse «foi máo que o contracto saisse do estado ordinario dantes: «perdôe-me S. Ex.ª, não ira condição alguma essencial que se alterasse, pelo que diz respeito á fiscalisação... (O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Ah!...) Pelo que respeita á fiscalisação, e mesmo na generalidade das condições, o contracto actual não tem mais privilegios do que o contracto findo; no contracto actual não ha condição essencial que não estivesse nos contractos anteriores. Portanto a arrematação do contracto do tabaco não saíu do estado ordinario senão em uma cousa; isto é, em o Governo obter 4000 contos em moeda sonante com o juro de 5 por cento, n'uma occasião em que, poucos mezes antes, o Governo estava pagando juros de 30, 35, e 40 por cento; foi nessa occasião em que o contracto do tabaco fez o emprestimo de 4$000 contos para emprestar ao Governo, em moeda sonante, com o juro de 5 por cento!... Eu não digo isto para allegar serviços da parte do contracto, e em consequencia delles exigir a benevolencia da Camara; mas o nobre Presidente do Conselho fallou em casos especiaes, e caso especial não ha senão este do emprestimo de 4$000 contos.

Posso asseverar ao illustre Deputado, ao nobre Presidente do Conselho e a toda a Camara, que os caixas tem tomado quantas disposições humanamente se podem tornar, para que os seus empregados procedam regularmente; e posso dizer, que não houve ainda um unico facto notavel que tem sido em mui limitado numero, que não fosse severamente punido, e punido pela demissão do empregado, que é até onde póde chegar a alçada dos contractadores; e uma vez demittido um empregado não torna a entrar; não ha empenhos, não ha forças humanas que o façam readmittir; póde-se apresentar esta administração como typo de disciplina, e ordem. O nobre Presidente do Conselho acabou de referir ha pouco um facto do qual tem conhecimento, por que o contracto lho communicou; hoje mesmo tivemos noticia delle, e immediatamente demittimos os empregados que o praticaram, recommendando ao Governo que os mandasse processar: que mais podiamos nós fazer? Que mais podem fazer. Os caixas do contracto quando qualquer dos seus empregados procede irregularmente, do que demitti-lo, e pedir ao Governo que o mande processar? Não podémos fazer mais nada, procedemos com todo o zêlo, e efficacia no cumprimento do nosso dever, nem podemos ter responsabilidade alguma; da nossa parte não ha protecção; apenas um empregado prevarica, é demittido irremissivel mente. Disse o illustre Deputado — «Os caixas geraes teem feito má escolha de empregados; por exemplo, para os guardas a cavallo não se exige senão que comprem cavallo:» Sr. Presidente, o contracto do tabaco, depois da guerra civil, tem tornado mais 500 guardas, e 500 guardas não são 500 cavalheiros, são 500 homens que ganham doze vintens por dia, que andam com uma arma ás coitas, pelo interior das provincias, e que se dão a um trabalho improbo; diga-me o illustre Deputado como é que se póde escolher de modo que nunca os caixas sejam enganados, e que sempre acei-

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tem com homens de uma vida e costumes morigerados?.O illustre Deputado acha que facilmente se podem achar homens proprios para este serviço para ganhar doze vintens, que tenham uma conducta illibadissima? De certo que entre elles sempre ha de haver alguns de uma conducta menos regular; comtudo posso assegurar ao nobre Deputado que estes empregados não são admittidos sem informações, e informações ordinariamente dos commandantes dos corpos onde teem servido, porque a maior parte delles foram militares; ha só uma cousa a que o contracto não tem attendido; isto é, o contracto tem unicamente procurado homens que satisfaçam plenamente ao serviço, sem se importar saber da sua cor politica, e eu digo sinceramente, que esperava que o nobre Presidente do Conselho nos agradecesse isto, porque é um serviço que lhe fazemos; e posso dizer a S. Ex.ª que durante a ultima guerra civil, só quatro empregados do contracto desertaram, só quatro se metteram em politica; e grande cousa é não obrigar um homem pela fome e pela miseria a fazer aquillo que por ventura não faria, se tivesse de que viver. Por tanto os empregados do contracto do tabaco não são a escoria da sociedade como gratuitamente disse o nobre Deputado, que tão injusto foi para com uma classe numerosa, que tão pouco lho merece, e que tão pouco conhece, por que se a conhecesse, não diria uma cousa que não e exacta; posso dizer ao illustre Deputado, que nunca ©contracto do tabaco teve melhores empregados do que tem actualmente; tem sido rarissimos os casos em que tem havido necessidade de os corregir.

Uma outra organisação foi feita ao contracto, e essa, na minha opinião, não é menos grave. O illustre Deputado disse — que os generos do contracto são maos; — eu declaro porque o sei de sciencia certa, que o contracto do tabaco e sabão tem feito grandissimos melhoramentos no preparo dos generos; algumas vezes póde acontecer não sair um genero tão perfeito como se deseja; mas o contracto tem tomado todas as providencias para que sejam bons; não se tem poupado a despeza alguma para conseguir esse fim; tem comprado sempre dos melhores generos, e tem feito mais alguma cousa; — tem dado ordem a todos os administradores, para que o primeiro genero máo que appareça, seja immediatamente trocado.

Sr. Presidente, nisto vai o interesse dos contractadores; todo o homem com meio minuto de reflexão ha de comprehender, que do bom genero gasta-se mais, e a grande vantagem do contracto esta em vender muito, porque do preço do custo para o preço da venda vai uma differença espantosa; o contracto inquestionavelmente interessa, que os generos sejam bons, porque maior será o seu consumo: o bom genero evita o contrabando, o bom genero augmenta o consumo, e a. differença no primeiro custo do genero bom, ou do genero máo quasi que não é nenhuma; posso dizer francamente que não e nada em relação á importancia deste objecto. Mas effectivamente o contracto tem feito grandes melhoramentos no preparo dos generos; citarei por exemplo, nos sabonetes que rivalisam com os sabonetes francezes, temos um inspector na fabrica do sabão áquem damos 600$000 réis, unicamente para o melhoramento deste genero; nunca no contracto houve similhante empregado, e é um empregado muito intelligente.

Julgo ter dado as explicações necessarias pora demonstrar quanto injustas, e infundadas foram as observações do nobre Deputado.

O Sr. I. J. de Sousa: — Sr. Presidente, eu serei muito breve porque não quero abusar da faculdade que a Camara me deu para tomar parte nesta questão; eu sou Deputado pelo Além-Téjo, a natural da cidade de Béja, e por isso entendi dever pedir a palavra, e não ficar silencioso quando se tracta deste objecto; logo que teve logar este acontecimento, foi-me communicado pelo proprio Presidente da Camara, e vendo eu que neste negocio não tinha havido falta da parte das auctoridades administrativas, e sim de uma outra auctoridade que se não acha debaixo das immediatas ordens do Sr. Ministro do Reino, e não vendo neste caso motivo para fazer uma interpellação maxime tendo eu toda a confiança no Governo como Deputado da maioria, resolvi apresentar-me a S. Ex.ª, e dar-lhe conhecimento do acontecido, assim o fiz, e appello para o testemunho de S. Ex.ª (O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — E verdade). Dei pois conhecimento deste ponto ao Sr. Ministro do Reino, S. Ex.ª disse-me que não tinha ainda participação alguma delle; porém que ia immediatamente expedir as ordens necessarias a tal respeito não só relativas a saber officialmente como elle se passou, mas a ordenar o devido procedimento contra quem tivesse abusado; fiz mais, entendi-me aqui mesmo nesta Casa com os srs. caixas geraes do tabaco, e S. Ex.ª o Sr. Guedes disse-me que depois de tirar as devidas informações do negocio, havia de dar uma satisfação cabal. (O Sr. Guedes: — Apoiado).

Sr. Presidente, eu sei que o presidente da camara municipal de Béja é um homem muitissimo respeitavel (apoiados) é digno de toda a consideração, é incapaz de commetter um acto qualquer, que o possa deslustrar perante a sociedade, eu não tenho a honra de conhecer o Sr. Rica, mas com quanto seja pessoa muito capaz, não o posso antepor ao digno presidente da camara municipal de Béja. O digno presidente da camara municipal foi tractado d'uma maneira insolita, como auctoridade nenhuma ainda inferior foi tractada na cidade de Béja (apoiados).

Este cidadão foi intimado por um official para se lhe dar uma busca em casa, este cidadão recebeu a intimação, e logo nesse mesmo momento fez abrir todas as suas portas ao official, e fez com que tivesse logar a busca a mais minuciosa possivel, mas a busca não só foi minuciosa, mas tambem foi rigorosa; este cidadão mostrou tudo, fez examinar tudo ate os potes do azeite, e isto para lhe servir de testemunho e de escudo: sinto não ter presente alguns documentos que possuo a respeito deste negocio (que não esperava se tractasse hoje) e por elles conheceria a Camara tudo que se deu a similhante respeito. Eu não posso deixar de dizer que fiquei bastante maravilhado, quando vi que o nobre Deputado pelo Douro annunciava esta interpellação. O que S. Ex.ª o Sr. Deputado por Vizeu referiu, é exacto, em relação aos empregados do contracto do tabaco, não ponho em duvida cousa alguma, mas só direi á Camara, para sua informação, que no districto de Béja pelas informações que tenho a respeito de taes empregados, não lhes são muito favoraveis; e a respeito de côres politicas direi só que esses individuos, na sua maxima parte, pertenceram á companhia e guerrilha do com-

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mando do Galamba, e de certo esta circumstancia não depõe muito a favor delles; e taes homens, quer do partido setembrista, quer cartista são daquelles que estão sempre promptos a practicarem os maiores vexames, e excessos. Por decencia não direi agora á Camara o que esses empregados têem praticado com algumas pobres mulheres, que, a titulo de revistar o contrabando, têem sido victimas de actos os mais indecorosos, estes e outros factos e preciso que sejam d'uma vez por todas cohibidos (apoiados).

O Sr. Pereira dos Reis: — Sr. Presidente, acredito que o Sr. Presidente do Conselho deu as ordens necessarias, e convenientes sobre o facto que apontei; mas não acredito que tenham sido pontualmente executadas, e por outra parte, admiro que taes ordens, que dizem respeito a negocio tão grave e importante, não tivessem um logar nas columnas do Diario do Governo para serem conhecidas do publico.

O nobre Deputado por Viseu pareceu querer indicar que eu tinha andado neste negocio com certa leveza; comtudo vê-se bem pelo que expuz, e pelo que ainda terei de referir, que não houve da minha parte a menor leveza; sei tanto, ou mais, como o nobre Deputado, o que se passou a respeito deste facto. Não obstante ter-se-me dado conhecimento do facto, eu procedi logo a todas as indagações as mais minuciosas. Escrevi a um cidadão que alli esta, porque houvesse de me informar sobre tudo que se tinha dado a respeito do facto; e isto porque em tres contas ou papeis que tenho na mão, dando-se-me conta deste negocio, se me pedia que eu houvesse de fazer uma interpellação ao Governo a este respeito, e apezar de eu crer nestes papeis, com tudo existindo em Béja um cidadão meu patricio, em quem tenho a maior confiança, e é o delegado do procurador regio, o Dr. Eliseu, escrevi-lhe, pedindo, que me desse informações particulares sobre o objecto. Tenho presente a sua informação; não a lerei toda á Camara, só a farei conhecedora de dois periodos dessa informação; e tendo sido este cavalheiro testimunha ocular do facto, tem toda a presumpção a seu favor; diz elle o seguinte (leu)

Mostra-se pois que aquellas casas foram assaltadas por uma força militar, e sem concorrencia alguma de auctoridade administrativa. Dizem-me que o juiz de direito censurara asperamente o administrador ou agente do contracto do tabaco por ter procedido a esta busca da maneira porque o fez, faltando ás condições prescriptas na lei; e que os cidadãos donos dessa casa se haviam queixado ao juiz de direito, mandando este proceder na fórma da lei.

Eu declaro que não conheço nenhum dos cidadãos, cujas casas foram assaltadas, porém tenho a respeito delles as mais excellentes informações; tambem não conheço o Sr. Rica, mas tenho delle boas informações; porém aquelles cidadãos são dignos de todo o respeito, e o agente do contracto não andou regularmente neste negocio. Dizem-me que quando o presidente da camara municipal foi juiz substituto, houvera entre este, e o agente do contracto uma certa desintelligencia; disto me informa o mesmo delegado, e que isto talvez desse origem a que o agente do contracto buscasse um motivo para invadir a casa deste cidadão, e assim lançar sobre elle a suspeita de contrabandista. Agora quanto aos empregados do contracto, eu não lhes fiz a injuria que o Sr. Deputado me attribuiu, eu o que disse foi, que não podiam dizer os contractadores que elles sempre tivessem sido felizes na escolha de seus empregados; estou certo que lhes é impossivel descobrir outros melhores, mas é certo que esses homens fazem mal ao contracto em vez de promoverem os seus interesses; mas a respeito desta questão não direi mais.

Agora quanto ao genero; queria eu que o Governo cumprisse os seus deveres neste negocio; sei que é do interesse dos contractadores procurarem o melhor genero, mas o que é certo é que nem o Governo por si ou por suas auctoridades tem exercido fiscalisação alguma sobre este ponto, e o que é certo, é que com quanto seja do interesse dos contractadores que o genero seja bom, comtudo geralmente é máo, e era sobre este ponto que eu desejava que as auctoridades não se descuidassem de cumprir os seus deveres, vendo até que ponto o contracto cumpria os seus deveres a este respeito.

Sr. Presidente nada mais direi sobre este objecto, o meu fim esta preenchido.

O Sr. Presidente: — Ha um requerimento do Sr. Costa Lobo para tambem poder tomar parte nesta interpellação, porém não posso consultar a Camara quanto a este requerimento, porque não ha numero na Casa; e não póde ter segunda vez a palavra o Sr. Guedes, segundo o regimento; havia-se de consultar a Camara para isso, e já não ha numero. A ordem do dia para amanhã é a que estava dada, e as interpellações que se acham pendentes. Está levantada a sessão. — Eram cinco horas da tarde.

O Redactor,

JOSÉ DE CASTRO FREIRE DE MACEDO

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