O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 152

(152)

N.º 8. Sessão em 10 de Maio 1849.

Presidencia do Sr. Rebello Cabral.

Chamada — Presentes 52 Srs. Deputados.

Abertura — Aos tres quartos de hora depois das onze da manhã.

Acta — Approvada

Officios — 1.º Do Ministerio do Reino, acompanhando o officio do director das Obras Publicas do districto do Porto, encarregado da demarcação do terreno necessario para a lavra da mina de carvão de pedia, situada na freguezia de S. Pedro da Cova; e bem assim o respectivo auto de demarcação, e a planta daquelle terreno: satisfazendo por este modo ao requerimento da commissão de Administração Publica. — A commissão de Administração Publica.

2.º Do Ministerio da Marinha e Ultramar, dando os esclarecimentos pedidos pela commissão de Marinha sobre a pertenção de Mana Caetana, que na qualidade de herdeira de seu filho, Antonio Pinto de Oliveira, fallecido em Angola, pede que se lhe paguem as letras sacadas pela Junta de Fazenda daquella provincia sobre o pagador da Matinha, visto o producto do espolio do dito seu filho ter sido applicado em Loanda as despezas do Estado — A commissão de Marinha.

Representações. — 1.ª Da Camara Municipal de S. João da Pesqueira, apresentada pelo Sr. Freire Falcão, em que pede se restabeleça naquella villa a cadeira de grammatica latina, que alli existiu até 1834, visto não haver nenhuma outra senão na distancia de oito legoas. — A commissão de Instrucção Publica, ouvida a do orçamento.

2.ª Da Camara Municipal da villa de Santa Cruz, na ilha da Madeira, apresentada pelo Sr. Moniz, em que pede seja alterado o § 2.º do art. 1.º da lei de 2 de agosto de 1839, na parte que ordena que a Camara Municipal reparta com as nove Camaras do districto a quarta parte do producto imposto sobre cereaes, e que em logar della reparta metade do dito producto. — A commissão de Administração Publica.

O Sr. Presidente: — Cabe-me a honra de communicar á Camara que a deputação por ella encarregada de ir saber do estado da importantissima saude de Sua Magestade, e felicitar A Mesma Augusta Senhora pelas suas melhoras, assim como de ir assistir ao enterro de S. Alteza o Principe D. Leopoldo, cumpriu hontem a sua missão, e teve a satisfação de saber, por via d'El-Rei, que sua Magestade A Rainha ia com progressivas melhoras; noticia muito agradavel por certo á Camara, e necessaria ao paiz, da qual a Camara ficará inteirada, (apoiados)

O Sr. Silva Cabral. — Sr. Presidente, vou mandar para a Mesa um artigo addicional ao regimento, que eu entendo da primeira necessidade. To-

Página 153

(153)

dos sabem que o nosso regimento esta falho de muitas providencias, e que em consequencia disto a Camara mais de uma vez tem nomeado Commissões para apresentarem um projecto de regimento mais conforme ás praticas parlamentares, porque e fóra de duvida, que aquelle regimento foi feito n'uma época em que essas praticas não eram muito conhecidas. E sobre tudo bem examinados muitos artigos se vê manifestamente o espirito que presidiu á redacção daquelle regimento: o Poder Executivo é que o fez; por tanto devia apresentar muitas providencias mais conformes para satisfazer os seus fins, do que para regular trabalhos parlamentares. Em todo o caso esse não é o objecto, porque a illustre commissão estou certo hade desempenhar com zêlo, e já não é muito cedo, este importantissimo trabalho. É comtudo certo que nelle não se estabelece a maneira porque se hade regular a votação por sentados e levantados, e em todos os paizes do Mundo onde se admitte este meio de votação (e em quasi todos, porque um não exclue o outro) se declara o numero dos votantes pro e contra, ainda que se não digam os nomes delles, a fim de se conhecer qual é a maioria que acompanha as votações; neste sentido eu entendo, que esta pratica conforme á razão deve ser trazida para o nosso Parlamento, e por isso mando para a Mesa a seguinte:

Proposta. — «Proponho que quando mesmo as votações da Camara sejam por sentados e levantados, se declare o numero dos votos pro e contra qualquer disposição. « — Silva Cabral.

Peço a urgencia.

Approvada a urgencia, entrou em discussão.

O Sr. Xavier da Silva — Eu não acho inconveniente nenhum em se adoptar a proposta do nobre Deputado no sentido generico, para que em todas as votações se declare o numero que ha pro e contra. É verdade que este systema demora mais, por isso que é necessario proceder-se á contagem dos votos por um e outro lado; mas é tal a vantagem que resulta de se saber a maioria com que uma medida é adoptada ou rejeitada, que admitto a proposta no sentido generico.

Julgando-se discutida, e pondo-se á votação disse:

O Sr. Presidente: — Alguns Senhores não votaram, por que na Casa ha mais que o numero legal; entretanto apparecem só 45 votos por um lado e 1 contra, o que dá em resultado não haver numero legal, e por consequencia não póde haver votação; assim eu convido todos os Srs. Deputados a votarem por um ou por outro lado; torna-se a propor.

Foi approvada por 55 votos contra 1.

O Sr. Presidente. — Não ha segundas leituras.

O Sr. Corrêa Leal (Sôbre a ordem): — E para perguntar a V. Ex.ª se a deliberação que a Camara acaba de tomar, principia desde já a vigorar... (Vozes: — Já vigorou). Bem; como ha uma commissão de Regimento, cuidei que ella devia ser ouvida.

O Sr. Presidente — Principia desde já a vigorar, e a Camara tem visto que quando havia duvída sobre alguma votação, ou quando esta recáia sobre negocio grave, ainda mesmo não havendo esta disposição regimental, sempre se declarava o numero de votos que havia pro e contra (apoiados) mas quando a votação se conhecia decididamente vencida, era escusado estar-se a notar o numero pro e contra. Vai entrar-se na ordem do dia. (Vozes: — Não estão presentes os Ministros). A Camara sabe, que por determinação sua tinha sido dado para ordem do dia com preferencia a qualquer outro objecto, o orçamento da despeza, principiou este a discutir-se, e já foram adiados dois Ministerios, o do Reino em 5 deste mez, por não estar presente o Ministro respectivo, e o da Justiça em 7, tambem por não estar presente o respectivo Ministro: discutiram-se os orçamentos que respeitavam aos Ministerios da Fazenda, e da Guerra, e agora não esta presente senão o Sr. Ministro da Fazenda, e S. Ex.ª diz que não póde encarregar-se da defeza da especialidade dos objectos pertencentes aos outros Ministerios. (Uma voz: — De certo). Nesse caso proporei á Camara se quer occupar-se de algum outro objecto. Os projectos dados para ordem do dia, eram o n.º 42 que é este de que se tracta; o n.º 35 que é sobre administração publica (Uma voz: — Esta no mesmo caso); o n.º 36 sobre pezos e medidas (Uma voz: — Não esta cá o Ministro); o n.º 20 sobre recompensas militares; e o n.º 41 sobre a urzella que tambem recae sobre proposta do Governo, e por consequencia nenhum delles se póde tambem discutir.

O Sr. Ministro da Fazenda: — Eu pedi a palavra para dizer á Camara, que se os meus collegas não apparecem não é isso por menos consideração aos trabalhos que estavam dados para ordem do dia, nem por se esquivarem á sua propria responsabilidade e aos seus deveres. Hontem á noite ás 10 horas ou 10 e meia, em que estive com os meus collegas, achavam se elles na firme resolução de vir á Camara hoje... (Entra o Sr. Ministro da Justiça) esta acabada a desculpa que estava principiando, e concluiria recommendando á Camara que podia principiar a discussão, por que entretanto chegaria algum dos meus collegas.

O Sr. Presidente: — Com a chegada do Sr. Ministro da Justiça cessou o motivo para se propôr á Camara outro objecto de que se podesse occupar, por consequencia vai tractar-se do orçamento do Ministerio da Justiça.

Página 154

(154)

Ordem do dia.

Continua a discussão do projecto n.º 42.

MINISTERIO DOS NEGOCIOS ECCLESIASTICOS E DE JUSTIÇA.

[Ver Diário Original]

Página 155

(155)

[Ver Diário Original]

Página 156

(156)

[Ver Diário Original]

Capitulo 1.º

O Sr. Silva Cabral: — Sr. Presidente, eu não sei quaes foram os motivos que dirigiram a commissão para augmentar 100:000 réis ao ordenado do ajudante do porteiro; ma firme nos meus principios, eu não posso annuir a este augmento, e não posso annuir, porque me parece que não é na actualidade das circumstancias, circumstancias difficilimas para a fazenda publica, que se devem augmentar ordenados. Poderá ser que o empregado de que se tracta, tenha justiça relativa; poderá ser mesmo que tenha qualidades e serviços que o tornem merecedor de alguma contemplação especial; mas quando nós vemos, comparando a receita com a despeza, os escassos meios de que dispõe o Thesouro, não me parece que seja agradavel, que faça boa impressão o augmentar, nesta posição particular, o ordenado do ajudante do porteiro da secretaria da Justiça, e proporei portanto a diminuição desta verba, para que as cousas fiquem no estado em que estão, em quanto se esperam melhores circumstancia?, a fim de que o Governo e a Camara hajam de considerar este empregado, não só debaixo dos principios da justiça absoluta, mas de justiça relativa. Não me parece que se possa mesmo augmentar com a comparação de outros empregados, porque a Camara deve estar lembrada de que nesse mesmo sentido, um illustre membro daquelle lado da Camara (esquerdo), propoz que o vencimento de um empregado da secretaria da Guerra, ou para melhor dizer, da repartição geral da Guerra se reduzisse a uma quantia igual ao de outro empregado do arsenal da marinha, e a Camara, talvez por coherencia, não admittiu essa diminuição: ora, quando a Camara não admitte diminuição, não entendo que deva tractar agora de dar o seu voto para augmentar; muito mais considerando as circumstancias especiaes em que estamos. Portanto eu proponho a eliminação deste augmento, sem comtudo querer de maneira nenhuma ferir, nem os serviços deste empregado, nem mesmo os principios de justiça relativa; mas entendo que as circumstancias actuaes, a que a Camara principalmente deve attender, não podem de maneira nenhuma leva-la a votar um augmento para este empregado, ou para qualquer outro: tenha a paciencia de continuar ate que as secretarias sejam devidamente organisadas, e em tudo equiparados os differentes serviços.

Leu-se logo na Mesa a seguinte

Emenda. — a Proponho a eliminação do augmento do ordenado do ajudante do porteiro. « — Silva Cabral.

Foi admittida

O Sr. Poças Falcão; — Sr. Presidente, o motivo que levou a commissão a propôr este augmento, foi o equiparar o ordenado deste empregado com o de todos os outros de igual cathegoria das outras repartições. No Ministerio da Fazenda havia um ajudante do porteiro com ordenado superior a todos os outros das outras repartições, assim como o porteiro, e a commissão reduziu-os para os equiparar aos outros que estavam mais abaixo; porém como o ajudante do porteiro da secretaria da Justiça, e creio que outro de outra secretaria, tinham um ordenado ainda inferior, entendeu a commissão que sem grande prejuizo do Thesouro poderia equipara-los, e acabar com esta injustiça relativa, e por isso á commissão se resolveu a fazer esta alteração neste Ministerio, tendo sempre em vista a economia do Thesouro, como teve a respeito dos outros Ministerios.

O Sr. Xavier da Silva: — Sr. Presidente, voto pela emenda do nobre Deputado; e foi essa a minha opinião tambem na commissão; mas parece-me que a Camara talvez não esteja em circumstancias de a poder approvar, se quizer ser coherente com as suas resoluções. Sr. Presidente, o ajudante do porteiro do Ministerio do Reino tem 400:000 réis, o do Ministerio da Fazenda tinha 480:000 réis, o da Guerra 300:000 réis, e o da Justiça 300:000 réis; o Sr. Ba-

Página 157

(157)

rão de Francos como Ministro da Guerra, mandou o anno passado para a Camara uma proposta de lei, para que o ordenado do ajudante do porteiro do Ministerio da Guerra fosse equiparado ao de outras secretarias, isto é que fosse elevado a 400:000 réis: este negocio não póde o anno passado ser resolvido pela commissão, mas felizmente foi-o este anno, e o ordenado desse empregado foi elevado a 400:000 réis contra o meu voto. Accresce que no vencimento do ajudante do porteiro do Thesouro só diminuiram 80$ réis, porque tendo fallecido o porteiro, cujo ordenado era de 700:000 réis, e querendo-se igualar este vencimento aos das secretarias d'Estado, o agraciado vence agora não 700:000 réis como o seu antecessor, mas sim 000:000 réis; e o que passou a ajudante que era contínuo, ficou não com 480:000 réis como era d'antes, mas sim com 400:000 réis; ficou com menos que o seu antecessor 80:000 réis, mas passou de 300:000 a 400:000 réis, e já não foi máo. A commissão sendo coherente com estas resoluções entendeu que não havia motivo para deixar de elevar o ordenado de ajudante do porteiro do Ministerio da Guerra a 400:000 réis para o equiparar ao da Fazenda áquem se tirou 80:000 réis, porque tinha 480$ réis; e por esse mesmo fundamento, e porque se diminuiu no porteiro do Thesouro 200:000 réis, entendeu que ao ajudante do porteiro do Ministerio da Justiça se devia dar 400:000 réis: isto é negocio já decidido pela Camara, que já votou o augmento quanto ao ajudante do porteiro do Ministerio da Guerra, e creio que não quererá deixar de o votar quanto ao do Ministerio da Justiça, Parece-me pois que a Camara não poderá, por coherencia de resolução, acceitar a emenda proposta, nem sei que haja motivo para que um só dos ajudantes de porteiro de todas as secretarias, fique com os 300:000 réis. Eu declaro que voto pela emenda, porque tenho votado contra todos os augmentos, e a Camara na sua sabedoria tractará de harmonisar a sua resolução.

O Sr. Ministro da Justiça: — Sr. Presidente, são difficeis as circumstancias do Thesouro, e essa difficuldade faz com que seja necessario pagar aos empregados que servem o Estado em proporção dos poucos meios que ha; mas se este principio é exacto, não o é menos o de que — aonde se dá igual serviço, se dê igual recompensa. — (apoiados) Como o serviço deste empregado é identico aos de igual cathegoria, por esta razão fundamental voto contra a emenda; e tanto mais voto contra ella, quanto que a Camara ha poucos dias votou uma verba igual a respeito de outro empregado que estava no mesmo caso. (apoiados) O Sr. Silva Cabral. — Sr. Presidente, admira-me que a comparação de serviço seja apresentada como argumento para defender um augmento de despeza, porque esta comparação é uma perfeita decepção; parece-me impossivel que se venha na ultima escala de ajudante de um porteiro estabelecer como regra essa comparação para se podér argumentar a favor de um augmento de despeza.

Sr. Presidente, eu peço a cada um dos nobres Deputados que consultem a sua consciencia, e que vejam se no orçamento por ventura estão igualados os ordenados com os serviços?... Se por ventura na carreira militar, na carreira civil, e mesmo na ecclesiastica ha esta igualação de ordenados?... Se nós seguirmos esse principio de comparação de serviços com ordenados poderemos jámais estabelecer o ordenado de um governador civil? E note-se que, em todos os sentidos, é um empregado de primeira ordem; mas poderemos nós comparar o ordenado desse empregado com o de um official ordinario de uma secretaria de Estado? Em diversos tribunaes compararemos, por exemplo, o do secretario do Supremo Tribunal de Justiça que tem 2 contos fóra os emolumentos, com o primeiro empregado do Estado?... De certo que a comparação de serviços neste ponto em questão foi inconvenientissimamente trazida. Não ha só uma classe a considerar nesta comparação de ordenados, serviços, e cathegorias, ha muitas, e essa igualação, essa harmonia é de absoluta necessidade; esse o motivo porque mais de uma vez tenho fallado na organisação das secretarias, é aí que se deve resolver este importante objecto, e não na discussão de um orçamento, e de mais a mais n'um caso isolado, (apoiados)

Sr. Presidente, as difficuldades do Thesouro são grandes, em presença dellas não é justo estarmos a votar augmentos de despeza sem absoluta necessidade delles: os augmentos de despeza trazem o augmento dessas difficuldades; desde o momento em que se fizerem mais augmentos nos ordenados, mais difficil se toma o seu pagamento: (apoiados) se a receita não chega para pagar aos ordenados que actualmente ha, muito menos chegará para os satisfazer augmentando-os.

Agora devo dizer que não ha comparação nenhuma entre o ajudante do porteiro da secretaria da Justiça com os ajudantes de porteiro das demais secretarias: o trabalho da secretaria de Justiça é muito pequeno á vista do das outras; não é preciso ser tão assiduo e continuado como nas outras secretarias; os negocios alli não são em tão grande escala. Mas, além disto, quando nós vemos outros empregados, a quem se exigem coitas habilitações, receberem 300$ réis, havemos ir dar a um ajudante de porteiro, a quem senão exige habilitação alguma, 400$ réis, e isto ao tempo em que um amanuense tem 300000 réis? Pois um homem que tem certas habilitações, sem as quaes não póde occupar certos logares, ha de ter 200 ou 250$000 réis, e o ajudante do porteiro, a quem senão pedem habilitações, ha de ter 400$ réis?...

Sr. Presidente, repito, é preciso que se faça a organisação das secretarias, é preciso que haja uma igualdade absoluta nas differentes classes do Estado: não se tracte de comparações de serviço em casos isolados; não se lance mão destes meios parciaes, porque não é desta maneira que se attendem as cousas convenientemente.

A situação do Thesouro é muito precaria, ella exige que nós sejamos muito parcos; não permitte augmento na despeza publica, antes reclama a maior reducção.

Como pois, no caso em questão, não vi motivo plausivel que impugnasse a minha proposta, voto ainda por ella. E a respeito da verba já votada ao ajudante de porteiro da secretaria da Guerra, isso não póde servir de argumento, porque a respeito dessa ainda póde ter logar a reconsideração, e esta é uma consequencia immediata da approvação da minha proposta.

O Sr. Corrêa Leal: — Sr. Presidente, quasi que podia dispensar-me de fallar, depois que o illustre membro da commissão de Fazenda, que apoiou a emenda, explicou com tanta clareza as razões de

Página 158

(158)

justiça que assistiram á commissão, quando propoz este augmento para o empregado de que se tracta, e as que assistem á Camara quando esta lh'o votar, ou concedei; depois S. Ex.ª o Sr. Ministro da Justiça expoz logo laconica e concludentemente tudo quanto a este respeito esta Camara tem a considerar e attender. Todavia ainda tenho alguma cousa mais a accrescentar ás razões que, por parte dos dois membros desta Camara, áquem me refiro, foram apresentadas.

O auctor da proposta argumentou com muita força de logica, não ha duvida nenhuma, mas S. Ex.ª tambem me permittirá que eu, com a mesma logica, vá destruir o principal ponto da sua argumentação, porque S. Ex.ª em que fez mais força, foi em comparar as posições sociaes com os ordenados grandemente diminutos; mas o que S. Ex.ª não tractou, e muito adrede fugiu disso, foi de fazer vêr que um amanuense vencesse menos soldo ou ordenado que outro amanuense, e pergunto eu: um amanuense n'uma secretaria tem menos vencimento que tem outro amanuense n'outra secretaria?... Aqui esta o ponto principal que deve occupar a attenção da Camara; a Camara em primeiro logar deve tornar-se superior a tudo, deve ser justa. As razões que S. Ex.ª apresentou, quando considerou financial mente a questão, são verdadeiramente acceitaveis: mas então acceitem-se para todos, proponha-se para todos a mesma these; isto é, tirem 100$000 réis a cada um dos outros ajudantes de porteiros, e então para aí vou eu, e desde já, de todo o meu coração, e segundo a minha proposta o resultado será mais vantajoso do que S. Ex.ª procurou, e que quando apresentou a eliminação desta verba, não quiz ver; mas quando esta Camara augmentou 100$000 réis ao ajudante de porteiro da secretaria da Guerra, para o equiparar ao ajudante de porteiro da secretaria do Reino, e quando approvou a diminuição de 80$000 réis a outro ajudante de porteiro da secretaria da Fazenda, para tambem o equiparar aos outros, ha de ficar isolado e órfão este empregado de igual cathegoria, e com esta desigualdade?... Isso não póde a Camara querer, porque não ha de querer fazer injuria áquelle empregado, e ha de reclamar-se logo o argumento da curialidade e da justiça. Por conseguinte se se quer que se diminua aos outros ajudantes de porteiros a quantia que lhes tocai, para ficarem iguaes, para que todos fiquem chorando ou rindo igualmente, irei para aí, mas não para esta desigualdade de ordenados em empregados da mesma cathegoria, e dar-se esta desigualdade n'um desses empregados, que approvando-se a proposta do nobre Deputado, fica fóra da igualdade em que se achamos outros.

E, Sr. Presidente, muito teria que dizer este empregado, e com muita justiça quando a Camara não votasse esta verba que aqui esta, ha de dizer que apesar de todas as razões que se deram, quando se apresentou uma proposta para não subsistir a verba das obras do arco do Terreiro do Paço, com cuja discussão não houve considerações que senão fizessem, apesar de todas essas razões para sustentar a eliminação de 10:400$000 réis no orçamento, a Camara votou essa verba, e agora para 100$000 réis a um ajudante de porteiro da secretaria das Justiças para ficar em igualdade com os outros da mesma cathegoria, e das mesmas funcções ou dos mesmos misteres, a Camara acceitou essas razões, e approvou a eliminação da verba!..

Sr. Presidente, entendo que a Camara approvando este augmento dará um documento de justiça, e igualdade (apoiados.)

O Sr. Assis de Carvalho: — (Sobre a ordem.) Mando para a Mesa a seguinte

Emenda. — «Proponho que os ordenados de todos os ajudantes de porteiro das secretarias d'Estado sejam de 300$000 réis (apoiados) reconsiderando-se as decisões já tornadas a respeito dos orçamentos da Guerra e Fazenda.» — Assis de Carvalho, Fontes Pereira de Mello.

Foi admittida.

O Sr. Presidente: — Fica em discussão considerada como emenda quanto a este capitulo, e como uma substituição quanto aos outros.

O Sr. Lopes de Lima: — Sr. Presidente, quero ler occasião de mostrar que sou coherente ou que tenho aquella coherencia de principios de que ha pouco fallou um nobre Deputado. Como fui um daquelles (e não fui unico apesar de ter sido appellidado como tal) que votaram contra as obras do arco do Terreiro do Paço, e por isso mereci já o nome de Erostrato, isto é que fui comparado a esse incendiario que queimou o templo de Diana em Efeso: agora quero continuar a ser Erostrato approvando a proposta que acabou de mandar para a Mesa o nobre Deputado pelo Algarve. Sr. Presidente, eu conheço o estado das nossas finanças; e parece-me que nem todos ainda bem o conhecem; nem todos conhecem a coragem que é precisa para se conformarem a esse estado: brevemente ha de vir a lei de meios, e então hão de abrir os olhos; é por isso que estou resolvido a votar todas as economias possiveis ou pelo menos a parte respectiva, porque muito é preciso economisar, (apoiado) e já aqui tenho apresentado algumas economias que não eram pequenas, hei de mostrar que não só fui Erostrato em votar contra os 10 contos e tanto para o arco do Terreiro do Paço, como não tive medo de propôr uma economia no arsenal do exercito de 15 contos, e não hei de tambem deixar de propôr na marinha outra de 31 contos, e mais alguma cousa. Respondo com isto áquelles que dizem que nós queremos levantar uma falsa popularidade: deste modo se vê que eu não aspiro a adquirir a popularidade de pé descalço: a popularidade que nós queremos adquirir, é a da economia, para não nos vermos obrigados a vexar os povos com tributos com que não podem (apoiado) porque este ha de ser o ultimo resultado. Os nobres Deputados que vão approvando ás cegas todos os augmentos que se forem propondo, como não hão de pagar da sua algibeira — hão de pagar a quota que lhes pertencer, mas não hão de pagar tudo — não lhes custára isso muito: do seu podem ser generosos, mas não podem ser generosos da bôlsa alheia.

Sr. Presidente, tenho sido um daquelles que mais tem lamentado as miserrimas circumstancias dos empregados publicos: entendo realmente que já não póde cortar-se-lhes nada do que têem, porque já se lhes têem cortado de uma maneira barbara: (apoiado) e bem alto levanto a minha voz para o dizer; já fui accusado de sentimentalismo, mas esse sentimentalismo é ser coherente com os meus principios, porque não entendo que ao passo que se estão fazendo estes córtes a todos: a um ou outro empregado se augmente o que tem (apoiado): e isto não é só pela importancia da economia em si; é pelo odioso

Página 159

(159)

que isto lança, e pelo crime que apparece entre as diversas classes dos servidores do Estado, ciume bem fundado pela injustiça relativa que se pratica. O nobre Deputado que sustentou o augmento, fallou em cathegorias: pois bem vamos a ver ou examinar se neste artigo tambem se offendem cathegorias não se approvando o augmento, ou se os ordenados dos ajudantes de porteiros estão na proporção das cathegorias como vem aqui: desafio o nobre Deputado para esse campo, hei de mostrar-lhe que neste orçamento não se attende nem a serviços, nem a cathegorias. Por ventura as cathegorias dos empregados do Thesouro Publico estão em proporção com aquellas dos empregados das diversas secretarias d'Estado? Diga-o o nobre Deputado, ahi esta o orçamento.....

(Uma voz: — Agora é o Ministerio das Justiças...) O Orador: — Bem sei que é o Ministerio das Justiças, mas estou respondendo em geral á these que o nobre Deputado apresentou: parece-me que posso ser livre para fallar na generalidade: direi mesmo a classe militar em proporção as cathegorias não esta equiparada ás outras classes; a classe da marinha não esta equiparada com a classe scientifica que lhe cor- responde, como provarei quando fôr tempo, e muitas outras: por conseguinte não se venha argumentar com as cathegorias; e depois perguntarei, qual é a cathegoria do ajudante de porteiro? Não o sei: o nobre Deputado póde dizer a que lhe corresponde? Por ventura o ajudante de porteiro será mais que capitão? O capitão tem d'ordenado (figurado) 300$ íeis; e até não chega bem, e qual é a sua cathegoria? Por muito que respeite a cathegoria do ajudante de porteiro não posso pô-la a par dos capitães do exercito (apoiado) além disso creio que é muito menor a despeza que tem afazer o ajudante de porteiro, e até o trabalho destinado a um e outro é muito differente. Portanto approvo a proposta que foi mandada para a Mesa pelo nobre Deputado pelo Algarve, e hei de approvar que não se augmente nada neste orçamento (apoiado), e tudo quanto possa ser d'economia que se diminua.

O Sr. Poças Falcão: — Sr. Presidente, não sei se a Camara esta resolvida a reconsiderar as votações que tem feito a respeito de ordenados aos ajudantes de porteiros de todas as secretarias d'Estado, porque se o estiver, declaro pela minha parte que não terei duvida em votar pela proposta do Sr. Assis de Carvalho, (apoiado); mas se a Camara não o resolver assim, não estou disposto, nem creio que a Camara o estará a fazer uma injustiça tão manifesta. Ainda que se quiz argumentar com cathegorias, parece-me que se argumentou sem fundamento — não sequer dizer que haja uma perfeita equiparação entre todos os ordenados dos differentes empregados de todas as repartições, e todos os ajudantes de porteiros, mas simplesmente a respeito de empregados de igual cathegoria. Não sei que differença possa haver entre o ajudante de porteiro d'uma secretaria d'Estado, e o ajudante de porteiro d'outra secretaria, e ainda do Tribunal de Contas, e mesmo do Supremo Tribunal de Justiça, porque, se bem me lembro, é certo que teem todos o ordenado de 400$000 réis, que a commissão propoz para este com o principal fundamento de que não devia ser o unico que houvesse de ser inferior aos outros ajudantes de porteiros. Ainda na sessão passada se votou igual ordenado ao ajudante de porteiro da societaria da Guerra, e não sei como, havendo as mesmas razões a respeito desse que ha a respeito deste, os nobres Deputados senão oppozeram a esse augmento, e só vem agora oppor-se a este que é o unico que ficaria com ordenado inferior! Por conseguinte, Sr. Presidente, se a Camara esta disposta a tomar a resolução de que venham todos a 300$000 réis, muito bem; mas o que eu não posso votar é porque todos os ajudantes de porteiros tenham o ordenado de 400$000 réis menos o da secretaria das Justiças, porque em verdade parece-me isto uma injustiça revoltante.

Concluo pois que votarei se fôr proposta a emenda do nobre Deputado pelo Algarve, mas depois não posso deixar de votar que se equiparem os ordenados destes empregados aos dos outros de igual cathegoria.

O Sr. Rebello da Silva: — Sr. Presidente, consequente á logica do discurso do nobre Deputado que nos apresentou razões fortes, e tão fortes para não fazermos uma reducção parcial unica sobre este orçamento, foi a proposta do nobre Deputado pelo Algarve (apoiados). Essa proposta tende a collocar a Camara n'uma situação de coherencia em relação a todos os empregados inscriptos debaixo desta mesma designação, e em relação ás obrigações que nos impõem as circunstancias criticas do thesouro publico (apoiados).

Sr. Presidente, não sou nem desejo ser defensor destas reconsiderações, sem motivo e sem causa, que não fazem senão comprometter a dignidade e credito do Parlamento; quero dizer dessas reconsiderações a que não se póde proceder sem taxar o Parlamento de menos considerado n'uma gravissima deliberação que tornasse; mas em objecto desta natureza, quando na discussão do orçamento se apresenta a possibilidade de fazer reducções de importancia, não vejo que fique mal ao Parlamento o reconsiderar essa sua deliberação, quando ella não importa menos consideração, antes gloria, porque o Parlamento sempre adquire gloria, quando fiscalisa os rendimentos publicos, e quando procura que a despeza seja a menor possivel.

Por tanto espero que a Camara ha de votar a reconsideração proposta pelo nobre Deputado, e ha de reduzir a 300$000 réis com absoluta egualdade todos os ordenados de ajudantes de porteiro. É esta uma necessidade que vejo até provada pela declaração do nobre Ministro da Justiça, porque S. Ex.ª começando por no declarar que as circunstancias do Thesouro eram as mais estreitas, impoz á Camara e a si mesmo a necessidade rigorosa de promover a maior economia da despeza, e esta é uma economia que ninguem poderá negar.

Sr. Presidente, tambem tenho muito pouca sympathia por esses argumentos de auctoridade que vejo invocar mais vezes do que desejava; por que um abuso existe, argumenta-se que ha de ser eterno, por que temos uma despeza, argumenta-se, que deve continuar! Mas chega-se mesmo ao ponto de se declarar que é uma injustiça, todas as vezes que a queremos fazer cessar, porque não ha nada que a justifique! Assim por este caminho não podemos ir a parte nenhuma boa. nem podémos fazer melhoramento nenhum ao paiz.

Acabarei por dizer á illustre commissão de Fazenda e ao illustre relator, que vejo aqui no art. 2.º a diminuição de um ordenado de official ordinario da

Página 160

(160)

secretaria de Justiça, desejo saber donde provem esta reducção: eu desejo muito as economias, mas tambem desejo saber a razão por que esta aqui esta.

O Sr. Cabral de Mesquita: — Sr. Presidente, eu entendo que esta materia esta discutida, nem vale a pena uma grande discussão sobre um ponto deste, mesmo não ha nenhuma razão para isso, em se observando que todas as razões estão a favor da proposta do meu illustre amigo que se senta deste lado.

Sr. Presidente, comparando o ordenado de um ajudante de porteiro com os ordenados dos outros empregados para que se exigem outras habilitações, ha uma completa desigualdade, mas ainda mesmo fallando absolutamente, eu entendo que o ordenado de um ajudante de porteiro na importancia de 400$ réis é um ordenado de luxo; agora fazendo a comparação digo que realmente até é um absurdo; um juiz de direito tem 400$000 réis de ordenado, eu acho que a differença que ha de um ajudante de porteiro para um juiz de direito de uma comarca é muito grande, um delegado do procurador regio tem 300$000 réis, por consequencia tem menos que um ajudante de porteiro; outros empregados ha para os quaes se exigem habilitações e estudos proprios, que teem menor vencimento, quero fallar, por exemplo, dos tachygrafos desta Camara, alguns dos quaes creio que não teem este ordenado. Ora á vista desta razão de desigualdade que ha do ordenado deste emprego para os de outros de maior consideração, e para os quaes se exigem habilitações de outra ordem, e até mesmo absolutamente, eu entendo que de fórma nenhuma se deve conceder o ordenado de 400$000 réis.

Agora o illustre Deputado que se senta no banco superior disse que não sabia se esta Camara estaria disposta a reconsiderar esta materia; é necessario notar que nós não votamos ainda senão as verbas para os ajudantes de porteiro das secretarias distado dos Negocios da Guerra e da Fazenda; mas é certo que apparecendo uma razão plausivel pela qual se deva reconsiderar esta materia, eu entendo que a Camara não deve ter duvida nenhuma para a reconsiderar.

A vista pois destas razões, parece-me que se deve approvar a proposta do illustre Deputado que se senta a meu lado, e mesmo porque esta em harmonia com á opinião de todos os que teem fallado contra a proposta do illustre Deputado, que se senta no banco inferior, pois dizem que não se deve adoptar, a propo-la da eliminação do augmento porque todos os outros ajudantes de porteiro teem 400$000 réis, e tendo o da secretaria da Justiça só 300$000 réis ha desigualdade; mas não dizem que o ordenado de 400$000 réis seja pequeno, antes pelo contrario todos sustentam que o ordenado de 400$000 réis é um ordenado muito grande.

Acho portanto muito justa e muito rasoavel a proposta do illustre Deputado que se senta a meu lado.

O Sr. Silva Cabral: — Sr. Presidente, eu vejo que se invoca aqui constantemente a justiça, e se lhe não dá a verdadeira significação que ella tem. A justiça, Sr. Presidente, não vem senão da lei, a justiça não póde invocar-se sem que a pessoa ou individuo que a invoca, ou a favor de quem se invoca, tenha direito a exigir aquillo que se lhe quer outhorga

Sr. Presidente, o ajudante do porteiro não tem direito algum a um augmento, não o póde ter, por que o ajudante do porteiro quando entrou a servir, sabia que o seu ordenado era de 300$000 réis; como se póde logo dizer que era uma injustiça revoltante o não se lhe dar 400$000 réis? A primeira cousa que se deve indagar, é se a lei lhe concedia mais, e ainda concedendo-lhe mais, e claro que fica sempre reservado ao Corpo Legislativo o estabelecer-lhe aquellas diminuições, que as necessidades publicas exigem; por que é fóra de duvida que em materia de ordenados, e em materia de gratificações tudo fica sujeito a imminente necessidade publica: se nós estivessemos argumentando sem que subordinassemos todas as nossas decisões ás necessidades do paiz, a que conclusão, a que cahos não seriamos levados?... Sr. Presidente, o principio, em objecto de ordenados, é que se deve, dar ao empregado tudo o que for necessario, absolutamente necessario para bem servir o seu paiz, mas nada, absolutamente nada mais, além dessa necessidade. Ora ainda se não demonstrou que fosse absolutamente necessario augmentar, e que não podesse haver um ajudante de porteiro sem ter 400$000 réis, logo invocarem-se os principios de justiça para sustentar um augmento, é verdadeiramente contrariar as idéas de justiça até agora admissiveis. Mas não admira, Sr. Presidente, por que eu tenho visto invocar a justiça de mui differente maneira; e um illustre Deputado que me precedeu a fallar, tocou em um ponto, tocou em uma ferida que devia sem duvida nenhuma fazer ver á Camara o que é a justiça, quando ella é deturpada, quando ella é mal invocada O illustre Deputado disse: quero explicações da razão por que vem aqui uma diminuição de 600$000 réis. Quer explicações? Ellas aqui estão ao meu lado direito: (olhando para o Sr. Pereira dos Reis) um empregado que na sua vida publica tinha dado sempre as mais constantes provas da sua dedicação ao partido da ordem (apoiados), esse empregado, Sr. Presidente, vê hoje aqui cortado o seu ordenado, e vê-o cortado como consequencia immediata do acto mais despotico e mais tyrannico, d'um acto verdadeiramente irracional (apoiado). É sobre isto que eu queria ver invocados os principios de justiça da Camara, por que a diversidade de uma opinião, e unicamente a diversidade de uma opinião, n'um Ministerio que Invoca os principios de tolerancia, foi bastante para fazer uma victima. E quando se faz uma victima, não se levanta aqui uma voz, ao passo que tractando-se de augmentar um ordenado, diz-se que não o augmentando se alteram e se transtornam os principios de justiçai

Sr. Presidente, a justiça de Deos não dorme, não dorme tambem a justiça dos homens 1 Os acontecimentos succedem-se uns aos outros. No acto de que se tracta, não foi sómente ferido esse principio dos bons serviços feitos a uma nação, não foi só isso, Sr. Presidente, foram feridas outras conveniencias, outras conveniencias que estão inteiramente ligadas com os verdadeiros principios do Governo Representativo, Já de outra vez disse, o que seria a liberdade de voto, o que seria a liberdade de opinião diante de semilhante acto? Não se me respondeu; não se respondeu, nem se podia responder, mas a violencia continua.

Eu tambem sou dos Deputados que mais de uma vez aqui teem ponderado á Camara, que deve ser mui cautelosa nas suas reconsiderações; por que se

Página 161

(161)

uma póde ter logar, repelida ella, desanctora inteiramente a dignidade da Camara (apoiados): tambem sou desse principio; mas isso é inteiramente subordinado a uma questão de principios ou de sciencia especulativa, e não de maneira nenhuma a um objecto positivo como é aquelle de que se tracta; aqui tractamos de um ordenado positivo, tractamos de fazer justiça como ella se deve fazer na presença das necessidades publicas. Eu não tenho duvida alguma nem nunca a poderia ler, em votar pela proposta do illustre Deputado pelo Algarve, por que votei contra. todos os augmentos, e desde logo disse no Parlamento, e mais de uma vez o tenho dicto, que não hei de approvar augmento nenhum, absolutamente augmento nenhum, em quanto o Ministerio não nos propuzer os meios para esses augmentos, em quanto o Ministerio não disser — eu não sómente tenho meios para aquillo que propuz, mas para os augmentos — e esses meios sem irem seccar as verdadeiras fontes da prosperidade publica, sem irem ferir na sua origem os germens dos rendimentos publicos; por que quando se tractar desse ponto, eu hei de oppor-me com todas as minhas fôrças, embora as votações sejam ou não superiores, embora me sigam ou não; por que o meu fim não é esse; de êrro sobre êrro, de uma successão de erros, é que ha de necessariamente sair a verdade, e ha de saír a verdade triunfante.

Quando apresentei a emenda não podia excluir de maneira nenhuma a proposta do nobre Deputado; e tanto não a excluia, que eu tinha tenção de a propôr como consequencia immediata á segunda parte da minha emenda: o nobre Deputado preveniu-me; porem eu estou nas mesmas idéas, porque quando nós todos conhecemos as necessidades do Thesouro, e as criticas circumstancias da fazenda, não devemos, nem podemos mesmo approvar qualidade nenhuma de augmento de despeza. Em razão disto não posso deixar de votai pela proposta, por isso que envolve a minha idéa, e amplia o ponto identico da minha emenda, que não podia deixar de ter implicitamente a mesma disposição.

O Sr. L. J. Moniz: — Sr. Presidente, eu tambem gosto de defender ou combater antes principios, do que individuos. Quando se tractou de supprimir no orçamento verbas relativas aos professores da escóla polytechnica, só pela razão dos logares estarem vagos, eu oppuz-me, por achar que este principio traz comsigo grandes inconvenientes, porque se o serviço publico daqui a alguns mezes exigir que se faça a nomeação para estes logares vagos, não se acha no orçamento meios para aquelle individuo, ou individuos, de quem se tiver necessidade. Sustento ainda a mesma douctrina, e não approvo o principio que se quer estabelecer, apezar de ter ouvido dizer, que nos creditos supplementares ha recursos a este respeito; porém isto parece-me mais difficil e mais sujeito a abusos, do que votar-se as verbas respectivas aos quadros, e não se pagar effectivamente senão quando se faz a nomeação.

Em quanto á outra questão declaro que não voto pela reconsideração desta materia; porque &e fossemos reconsiderar o orçamento todo por esta ou outra circumstancia de igualdade, para sermos justos, tinhamos de fazer uma obra collossal, o que pela minha parte não posso fazer.

Agora pelo que respeita á verba especial de que se tracta, tambem não voto por ella, apezar da razão de igualdade; parece-me que actualmente progrediremos melhor remediando como for possivel, ale melhor occasião de se poder applicar este principio de igualdade para todos.

O Sr. Xavier da Silva: — Pedi a palavra a favor da emenda apresentada pelo Sr. Deputado pelo Algarve: e entendo que a Camara será mais coherente em adoptar esta emenda do que em acceitar aquella apresentada pelo Sr. Deputado Silva Cabral. Eu com quanto ficasse vencido na resolução que se tomou; com tudo cumpre-me zelar a dignidade da Camara, e entendo que ella deve fazer justiça a todos na devida proporção; e por consequencia será tambem mais justo acceitar a emenda da commissão e ficarem todos os empregados em igualdade de circumstancias, do que agora, depois de se ter votado que uns emprega dos tenham maiores vencimentos, tirar a outros os vencimentos que tem. Para mim tem muito pêso a idéa, de que é muito desgraçada a situação d'um empregado que tem o seu ordenado marcado por lei, e que estremeceria cada vez que se tracta do orçamento, sem saber qual o vencimento que lhe pertence. Eu que desejo todas as economias possiveis, não posso deixar de observar á Camara que veja bem a maneira como acceita a emenda proposta pelo Sr. Deputado; adoptado este principio tem de o applicar depois, e não se venha argumentar com o direito que cada um tem no ordenado que lhe esta marcado, porque mais adiante tenho de fazer outras emendas.

Tem-se considerado excessivo o ordenado de 400$ réis que se dá a um ajudante de porteiro de secretaria; porém não é por este lado que eu approvaria a emenda, porque para um empregado que tem obrigação de residir em Lisboa, e andar limpo e decente, que tem de se apresentar no gabinete do Ministro e tractar com pessoas de consideração, 300 ou 400$000 réis em Lisboa não é de mais; sabendo todos as despezas indispensaveis para se poder viver em Lisboa

O nobre Deputado por Vizeu perguntou á Commissão qual o motivo, porque linha eliminado do orçamento 600$000 réis? A commissão nesta parte já mereceu a defeza que lhe fez o illustre Deputado pela Estremadura o Sr. Silva Cabral: mas a razão é facil; a commissão entendeu que devia eliminar do orçamento todos os ordenados de logares que não estavam preenchidos; e entendeu com mais razão eliminar este, por isso que o quadro da secretaria da justiça não só esta preenchido, mas tem alguns addidos: e para não acontecer que por qualquer motivo este logar podesse ser preenchido, a commissão de accordo com o Governo assentou que se eliminasse esta verba, para de futuro não dar logar a alguns abusos. A mim não me pertence justificar ou accusar o Governo nesta occasião pelo acto da demissão do Sr. Deputado Pereira dos Reis, cujos serviços todos nós reconhecemos... (apoiados); esses extraordinarios serviços, que em occasiões criticas S. Ex.ª fez ao paiz, não são só apreciados pelos Deputados das Provincias do Noite que foram testimunhas delles, tambem o são pelos Deputados de Lisboa que entretiveram com S. Ex.ª relações e correspondencia, e estavam ao facto do risco que S. Ex.ª correu nessa occasião, e do auxilio que prestou (apoiados); e não deixaram de magoar-se bastante quando viram

Página 162

(162)

esta demissão!... Entretanto espero que o Governo ainda uma vez se ha de persuadir da conveniencia de fazer justiça a todos, e que esta injustiça feita ao nobre Deputado ha de ser reparada.

Por tanto a Camara precisa ser muito cautelosa em reconsiderações; de contrario nunca se sabe o que se vota, nem o que esta votado; mas a Camara precisa ser coherente e justa; e uma de duas, ou ha de admittir a proposta da commissão de Fazenda, que é aquella que esta mais em harmonia com o que já se tem votado, ou tem de admittir a proposta do nobre Deputado pelo Algarve para que se adopte um principio economico em todos os Ministerios: eu que não votei pelo augmento de vencimentos estou no direito de votar pela proposta do nobre Deputado, porem a Camara faça aquillo que entender mais justo.

O Sr. Pereira dos Reis: — (Sobre a ordem) Sr. Presidente, abstenho-me de entrar na questão principal; e pedi a palavra sómente para fazer uma declaração que entendo poderá conduzir á maior rapidez da decisão deste negocio. Tem-se alludido ao meu nome; e eu não posso deixar de estar commovido pelos obsequios que tenho recebido durante esta discussão; mas com a franqueza que me é propria, devo declarar á Camara, que não aceito a restituição do logar de que fui espoliado, em quanto ao Ministerio actual presidir o nobre Duque de Saldanha.

O Sr. Corrêa Leal — Talvez, a Camara se persuadisse que tendo eu sido a causa principal, que provocou a proposta do nobre Deputado que se senta no banco superior, me deixasse de tal maneira surprehender por ella, que não me atrevesse a tomar a palavra para a combater; porque havia apresentado no meu discurso uma contradicção flagrante, e agora ou havia de ser esmagado debaixo desta contradicção,,ou havia devotar por aquella proposta para me não desdizer d'uma asserção, que avançara no primeiro discurso que fiz, e que havia de ir, por assim dizer, cair no loco, que eu pelas minhas proprias mãos havia tecido. O nobre auctor da proposta, e outros que com S. S.a conceberam esta esperança, podem ter a certeza de que se enganaram completamente; porque tendo eu acabado de fazer um rapido e fugitivo discurso para contrariar a proposta primitiva que foi para a Mesa, servi-me d'uma argumentação de que agora sequer lançar mão e aproveitar, mas aproveitar só em parte, não querendo entender o sentido amplo, em que trouxe este ponto da minha argumentação. Ora eu peço á Camara que tenha a benevolencia de me ouvir, e se a rainha explicação não a satisfizer, conceitue-me como eu merecer ser conceituado, que eu sujeito-me de bom grado ao seu juizo.

Disse eu que se S. Ex.ª o auctor da primitiva proposta, em vez de supprimir uma verba de 100$000 réis a um empregado, como vinha no orçamento, viesse propor a suppressão de outra igual quantia a todos os empregados para ficarem iguaes, que S. Ex.ª me acharia a seu lado, é verdade; palavras taes não as posso negar, hão de já estar nas notas tachygraficas; protesto á Camara que não as hei de riscar, que ellas hão de apparecer, no extracto da sessão, no Diario do Governo, ámanhã, e quando ahi não venham no Diario da Camara apparecerão impressas.

Mas, Sr. Presidente, no sentido em que tomei a palavra pelo artigo, se vê o modo porque eu apresentei esta argumentação; como havia eu de presumir, quando convidava S. Ex-a a trazer uma proposta neste sentido, que S. Ex.ª na rectidão dos seus principios, na coherencia de suas votações, viesse trazer uma tal proposta, que não abrangesse em muito mais largo campo todas essas eliminações? Poderia eu presumir quando suscitava, e desafiava a lembrança de. S. Ex.ª ou uma proposta sua, havia eu presumir, digo, fazer-lhe a injustiça de que S. Ex.ª vinha lançar esse stygma a quatro ajudantes de porteiros das secretarias d'Estado, e que havia de ser eu que pedisse por uma proposta que se acha na Mesa, sobre a qual pedi a palavra e estou fallando, que pedisse á Camara uma reconsideração tão essencial só a respeito de tres, ou quatro individuos, quando tantas verbas a respeito de outros já estão votadas, quando outras se hão de votar daqui por diante até ao fim do orçamento? Não era possivel, e não era possivel, por uma razão mais forte, a qual é que eu quando apresentei este argumento de que se tem feito agora um bom e brioso cavallo de batalha, quando eu o apresentei, estava bem certo que senão havia de lançar máo delle, e que se se lançasse mão, nem por isso havia de ter o resultado que talvez espere o seu illustre auctor; razão forte que a Camara não ha de desconhecer e que ha de attender, não por ser por mim avançada, mas por sua propria dignidade, e pela propria votação que ha pouco; dias teve logar, em consequencia das razões apresentadas neste recinto, e eloquentes considerações por S. Ex.ª auctor da primitiva proposta, sobre um assumpto de reconsiderações; a Camara fez justiça a S. Ex.ª porque a Camara votou levada da força das razões, com que S. Ex.ª a convenceu; S. Ex.ª disse-lhe que era indecoroso para a Camara reconsiderar continuamente as suas decisões, que vinha dahi uma quebra da sua dignidade; eu tive o arrojo, a ousadia de combater este argumento de S. Ex.ª mas fiquei vencido, porque nem a minha voz, nem as rainhas razões podiam comparai-se com as razões que S. Ex.ª apresentou, as quaes provocaram da Camara um voto da sua sabedoria; por consequencia para que vem agora pedir-se uma reconsideração, se a Camara votou antes de hontem contra esse systema, systema que eu direi, algumas vezes se tem seguido sobre pontos de douctrina, mas que a Camara não quiz conceder-me apezar de ser sobre a transferencia d'um projecto, d'uma para outra commissão; pois se nem isso me permittiram, nem as minhas razões valeram; porque as minhas razões eram que em logar de ir a uma commissão, podia ir a outra; não me acceitaram os meus argumentos, e hão de acceita-los agora em assumpto tão grave, que vai tirar pão áquem já o tem por deliberação da Camara, e por direitos antiquissimos? Isso não; isso não, Sr. Presidente?...

Emquanto ás outras razões, com que o illustre Deputado que se senta ao lado do illustre auctor da proposta, a quiz tambem sustentar, fallando a respeito das equiparações de cathegorias, e igualdade de ordenados, disse que os Srs. juizes de direito tinham 400$000 réis, e que um ajudante de porteiro tinha tambem 400$000 réis; ora pergunte S. Ex.ª a um juiz de direito, (e dê-se 600$000 réis ao ajudante de porteiro em logar de 400$000 réis que tem o juiz de direito) e pergunte-lhe se quer trocar; (riso) (O Sr. Silva Cabral: — Tem aprendido para outra cousa.) O Orador: — Mas a Camara sabe bem o que

Página 163

(163)

eu quero dizer nisto, e tambem o auctor do argumento sabe mui bem que os srs. juizes de direito não tem só os 400$000 réis; tambem os escrivães tem 30$000 réis de ordenado, e fazem 2:000$000 réis no fim do anno; por consequencia, para que se trazem essas comparações, se nós sabemos que isso não é assim?

Sr. Presidente, não pense a Camara que um porteiro das secretarias d'Estado, ou um ajudante do porteiro é o Mr. Pipilet dos Mysterios de Pariz; não é um guarda portão, ou porteiro dos Mysterios de Pariz; o porteiro da secretaria d'Estado sabe toda a Camara, e quem entra nas secretarias, qual é o seu exercicio, e a intelligencia que tem necessidade dè ter para bem exercer o seu logar.

Sr. Presidente, eu peço á Camara desculpa de a ter incommodado, e declaro que tenho devotar contra a proposta do illustre Deputado com muita magoa do meu coração, digo que tenho de votar contra a proposta, porque a Camara não póde vir á reconsideração deste ponto, sem vir á reconsideração de todo o orçamento, e então eu ia propor para o reconsiderar, desde a primeira verba dos encargos geraes até á ultima do ultimo Ministerio; era como eu acharia justo que a Camara reconsiderasse este ponto; por consequencia voto contra a reconsideração do que esta votado.

O Sr. Ministro da Fazenda: — Sr. Presidente — «a justiça exige que todos os direitos se derivem da lei — disse o illustre Deputado, e eu acceito este principio; é em virtude delle que entendo não podér a Camara approvar nenhuma das propostas que se acham sobre a Mesa, principalmente a que diz respeito á reconsideração das votações que têem tido logar. A proposta para reconsideração, apresentada pelo illustre Deputado, imporia, por uma simples votação, revogar a Camara as leis que estabelecem os ordenados aos ajudantes de porteiros, cujos ordenados a Camara já tem approvado antecedentemente.

Sr. Presidente, a Camara tem estabelecido como principio, não só este anno, mas nos annos antecedentes, em que se tem discutido o orçamento, que a despeza nelle estabelecida em virtude de leis não pode ser revogada; e esta tem sido a douctrina apresentada, e sustentada pelos illustres Deputados, tanto o auctor da proposta, como dos outros Senhores que a defendem.

Sr. Presidente, o ordenado dos ajudantes de porteiros no orçamento do Ministerio a quem elles pertencem, tem sido já aqui approvado, acha-se estabelecido por lei; e a approvar-se a reconsideração, importava a revogação de uma lei, o que effectivamente não esta nas attribuições da Camara, quando discute o orçamento. Ora a razão que a illustre commissão de Fazenda teve para apresentar esta differença, para mais, dos ajudantes dos porteiros, de que se tracta, já foi explicada pelo illustre relator da commissão: era menos justo que um ajudante do porteiro, estando nas mesmas circumstancias em que se acham os outros das secretarias, estivesse vencendo menos do que os outros. Esta questão já aqui foi trazida, e fui eu que tive a honra de a apresentar á Camara, para que se igualasse este vencimento; e só um motivo de escrupulo muito elevado, de que haveria augmento de despeza, daria talvez que essa igualação deixasse de ser feita: o mesmo escrupulo vem agora fundado por certo na razão economica que o illustre Deputado apresentou; mas S. Ex.ª não ouviu que os motivos que levaram a commissão de Fazenda a apresentar esta alteração, vem de neste orçamento já se achar estabelecida uma grande economia. Pois o illustre Deputado não observa que não ha hoje o chefe de continuos com o ordenado de 700$000 réis, nem um ajudante com 480$000 réis, e não vê a reducção que vem de 700$000 a 500$000 réis, e de 480$000 a 400$000 réis, que imporia isso mesmo que o illustre Deputado pertende alcançar em virtude das propostas que foram para a Mesa? Não vê, que ha aqui uma economia de 280$000 réis que cobre, e sobeja desse augmento, que se apresenta nesta verba de despeza? Sr. Presidente, é preciso sermos justos, e quando se invocarem os principios, vermos se achamos nesses principios as consequencias, que pertendemos deduzir.

Pelo que pertence á reconsideração, os illustres Deputados veem que não ha motivo para ella, porque os ordenados já approvados são estabelecidos por lei, e a Camara, como já disse, não tem podér para revogar as leis na discussão do orçamento: é este o principio que em todos os annos tenho ouvido defender pelos illustres Deputados, que sustentam hoje as suas propostas. Quanto ao argumento que o illustre Deputado, auctor da proposta, apresentou, baseado no principio economico, esse já esta satisfeito, porque a illustre commissão de Fazenda achou ter feito reducções bastantes, para podér propor este augmento de despeza. Ora se a Camara approvasse a proposta do illustre Deputado, era necessario que acceitasse todas as suas consequencias, as quaes eram ter de igualar os ordenados de todos os individuos, a respeito dos quaes se desse a mesma desigualdade, e a Camara havia ficar ipso facto obrigada a reconsiderar todos os ordenados, e iguala-los em todas as cathegorias, em que effectivamente se desse essa desigualdade; mas o illustre Deputado não vê que não é na discussão do orçamento que podemos estabelecer essa igualdade.

Sr. Presidente, eu acho que á vista destas considerações a Camara não póde approvar a proposta de reconsideração: primeiro porque importa uma revogação de todas as leis, e a Camara não tem essa auctoridade; em segundo logar, porque esse fim que os illustres Deputados querem conseguir, já esta alcançado, em vista de a commissão apresentar effectivamente uma reducção da despeza para menos, do que o augmento, que se acha no orçamento.

Já que estou levantado, e apesar de que a questão não é do Ministerio da minha repartição, eu não posso deixar de me unir aos votos com que á maioria da Camara deu um testemunho solemne de consideração aos serviços prestados pelo nobre Deputado o Sr. Pereira dos Reis, e os quaes, Sr. Presidente, nem todos se acharam com coragem bastante para practicar. A questão da reintegração do nobre Deputado é differente, e a Camara tem andado bem a esse respeito, em não haver emittido a sua opinião: parece-me que fallo com assentimento do meu illustre collega, dizendo que elle não póde ter duvida, em que se conserve no orçamento a verba da despeza para este empregado, em quanto o seu logar se acha vago, mas que póde alguma vez ser provido.

O Sr. Fontes Pereira de Mello: — Sr. Presidente, eu assignei a proposta do Sr. Deputado, propondo a reconsideração das verbas, e não me levan-

Página 164

(164)

tei logo para a defender, porque me pareceu, que a Camara estava inclinada a approvada; e por isso entendo que é da minha obrigação dizer algumas palavras para insistir em que a proposta apresentada seja effectivamente approvada.

O nobre Ministro que acabou de fallar, apresentou como o mais forte dos seus argumentos — que a Camara não podia (não era pratica) alterar as verbas votadas por lei, n'uma votação do orçamento; — mas S. Ex.ª não se lembrou, que a illustre commissão de Fazenda propõe effectivamente, o que a Camara não póde fazer. Perguntarei, Sr. Presidente, estará a Camara no seu direito de alterar o orçamento para mais do que esta votado por lei, e não estará no seu direito de alterar as verbas para menos? Senão ha razão para uma cousa, tambem a não ha para a outra (apoiados);,e foi aqui, Sr. Presidente, em que S. Ex.ª firmou toda a sua argumentação; mas se o argumento valesse, só servia para justificar a proposta apresentada pelo illustre Deputado pelo Algarve, e assignada por mim.

Mas, Sr. Presidente, argumenta-se contra a reconsideração; eu não gosto de principios absolutos; nem de reconsiderações para tudo, nem tambem que senão reconsidere cousa alguma: pois quando se apresentam razões fortes, e razões de economia, e de igualdade, porque foi depois de se invocarem taes principios que se apresentou esta proposta, para que se estendesse a regia de igualdade para todos; nestas circumstancias, pois, Sr. Presidente, e sobre tudo a respeito de economias, quando as circumstancias, em que nós estamos, são tão difficeis, quando nos vemos necessitados a exigir do paiz sacrificios, com que talvez elle não possa, não deverá a Camara reconsiderar uma votação sua? A verba é pequena, Sr. Presidente, mas não é pequeno o principio.

Sr. Presidente, para que estamos nós a augmentar alguns centos de mil réis em verbas de ordenados? É para termos o gosto de lhe lançar 20 ou 30 por cento? Pois augmentar, Sr. Presidente, para lançar imposto áquelles mesmos, a quem se augmenta? Senão ha logar de reconsiderai esta votação, então não sei, quaes são as reconsiderações.

Mas, Sr. Presidente, disse o illustre Deputado, que desta maneira os empregados se achavam collocados n'uma posição difficil, porque quando se discutia o orçamento, estavam sempre receando que se lhes tirasse aquillo que já tinham, e não podiam contar com cousa alguma; não é esse o caso; aqui o de que se tracta, é de estabelecer o principio que se invocou da igualdade; por conseguinte essa reflexão não póde fazer pêso na opinião dos illustres Deputados que sustentam a verba. Eu, Sr. Presidente, já tenho mais de uma vez expendido a minha opinião a respeito de despezas publicas, que consiste em reduzir a cifra da despeza que onera o Thesouro Publico, á unicamente indispensavel para as necessidades do serviço; os meios não são faceis de se obter, e parece-me que isso devia ser mais uma razão para sermos muitissimo cautelosos a esse respeito: e nestas circumstancias entendo que não deve a Camara deixar de approvar a reconsideração que se pede

O Sr. Silva Cabral: — Sobre a ordem.) Peço a V. Ex.ª que tenha a bondade de lei, senão ha inconveniente nisso, os nomes das pessoas, que estão inscriptas.

O Sr. Presidente — Os Senhores inscriptos são o Sr. Silva Cabral sobre a ordem, e sobre a materia, e os Senhores.....

O Sr. Silva Cabral: — Nesse caso uso da palavra sobre a materia, porque quero deixar a palavra sobre a ordem ao illustre Deputado por Vizeu.

Sr. Presidente, eu folgo sempre com que das cadeiras ministeriaes appareça certa energia para defender qualquer principio, que entenda abem do serviço publico; não posso portanto deixar de congratular-me com o illustre Ministro da Fazenda, que apesar de ter declarado no principio da sessão, que senão achava habilitado para entrar na discussão do orçamento da despeza... (O Sr. Ministro da Fazenda: — Nas especialidades) Muito bem — na especialidade — do Ministerio da Justiça, viesse com tanta energia em apoio do seu digno collega! Mas permitta-me S. Ex.ª lhe diga que formou um castello em arêa, porque os dois principios, a que quiz agarrar-se, para defender as suas idéas, e impugnar as propostas, são inteiramente contra-producentes: e senão, que me diga o illustre Ministro, com a boa fé com que argumenta, se porventura aquillo de que se tracta, não é uma alteração dos ordenados? Uma de duas, ou entende, que a lei neste ponto se estende até aos ajudantes de porteiros, e nesse caso é evidente, que uma vez demonstrado, que o ordenado do ajudante de porteiro era de 300$000 réis, não podia de fórma alguma ser augmentado; ou ha de conceder, que esse ordenado não vem na lei, e então esta inteiramente dependente da decisão das Camaras. É preciso notar, que eu não estou pelo principio; e é preciso explicar tambem a verdadeira theoria deste principio. Não é possivel admittir-se que, em materia de despezas publicas, as Camaras fiquem inhabilitadas de alterar os ordenados, não é possivel admittir isto; seria vir a um absurdo, não ha paiz nenhum do Mundo, onde se tracte do orçamento das despezas que não fiquem sujeitas aos coites que as necessidades publicas exigirem: e pergunto eu, o que fez a Camara o anno passado? Não cortou os ordenados? O que foi o sacrificio geral não só dos empregados, mas dos credores do Estado, senão um côrte nesses mesmos ordenados? Que se fez em geral a respeito de tal e tal ordenado? A respeito do arcebispo de Lisboa, não se lhe cortou o ordenado, não se cortaram igualmente a respeito dos bispos eleitos? O que aconteceu? Que um dos córtes foi approvado na Camara dos Pares, e o outro não o foi, e por isso teve logar a commissão Mixta, nem era possivel outra cousa: por consequencia é minha opinião, que a Camara póde diminuir ou augmentar os ordenados na occasião de se discutir o orçamento, attendendo ás necessidades publicas.

O que se não póde alterar sem ser por lei, são os quadros das repartições; note-se bem; isso é um caso muito differente; porque o orçamento sendo só para designar a despeza não póde a Camara entrar no exame do serviço publico, que deve ser objecto privativo de uma lei; este foi o principio que adoptou a commissão de Fazenda o anno passado, e que creio, adoptou este — que em materia de logares não se póde entrar no orçamento — mas em materia de ordenados sim, Senhor; e o contrario era estabelecer um absurdo. Mas admitido um principio é necessario deduzir todas as consequencias que vem desse principio, Se o ajudante do porteiro tinha 300$000 réis, se se quer agora augmentar esse ordenado, e o

Página 165

(165)

Sr. Ministro admitte e sustenta o augmento, é porque o mesmo Sr. Ministro entende que o principio que estabeleceu, não era exacto; mas é preciso que se diga tudo que ha a este respeito. O Sr. Ministro mostrou que não estava ao facto da organisação da repartição da secretaria, e permitta-me dizer-lhe, que não viu decerto a lei que organisou essa repartição. O ajudante do porteiro é um logar creado pelo Ministro; não existe na lei da organisação das secretarias. Na lei da organisação das secretarias existe unicamente um porteiro e um correio, que serve para ajudar o porteiro no serviço interno da secretaria, mas não existe o ajudante do porteiro. Em outro tempo o porteiro de uma secretaria tinha funcções muito privativas e importantes; era archivista da secretaria, e como tal exigiam-se delle conhecimentos muito especiaes, e escuso de lembrar aqui Pedro de Alcantra e outros, que sem duvida nenhuma apresentam a idéa do que era aquelle logar; mas posteriormente, como ha sempre uma tendencia para crear logares, e estabelecer ordenados para servir afilhados, estes ajudantes foram estabelecidos pelos differentes Ministros, e por isso é que não ha unanimidade, porque ao passo que cada Ministro na sua secretaria creava este logar, ia lhe dando tambem o ordenado que lhe parecia, e é a differença porque uns tem mais do que outros Ora já que tractei disto, pergunto, devemos nós na actualidade das circunstancias augmentar ordenados? Estará o paiz nas circunstancias de supportar esses augmentos? Diz o Sr. Ministro, — note a Camara que se diminue na secretaria da Fazenda alguma cousa ao porteiro, e que essa diminuição que ahi se faz, justifica o augmento que aqui vem. — Ora com effeito eu não esperava ouvir este argumento das cadeiras Ministeriaes!... Não esperava por certo. Pois por que se diminue uma verba qualquer, segue-se que se deve augmentar outra? Pois isto são idéas que a Camara possa admittir para o augmento ou diminuição dos ordenados? Pois porque se diminue? E por que as necessidades publicas exigem que se diminua, e é por esta mesma razão que se desse aqui augmentar; porque de outra sorte não se podia nunca fazer diminuição alguma, pois seguir-se-ía, que sempre que houvesse de se fazer uma diminuição, se podia fazer um augmento; era esta a conclusão que se tirava. Por tanto não póde argumentar-se deforma alguma com as diminuições que se tem feito em outras partes, para aqui se estabelecer este argumento.

Sr. Presidente, nós temos um deficit excessivo, deficit para o qual, até ao presente, não se estabeleceram meios, nem vejo circunstancias para o fazer; fica pois subordinado aos principios da necessidade publica, e esses principios determinam que não se faça augmento nenhum, quando não fôr rigorosamente exigido pela mesma necessidade publica. Ora o ajudante do porteiro tem servido até aqui, póde continuar a servir, não tem de que se queixar, porque o seu ordenado era certamente, quando entrou, aquelle, que actualmente lhe fica estabelecido; e hoje o que faz a Camara, se approvar esta verba? E mais do que um augmento, é uma verdadeira mercê, é uma perfeita doação, e para mercê e doações desta natureza nunca se póde argumentar com jus

O Sr. Ministro disse que não era no orçamento que se devia estabelecer a igualdade dos ordenados, que não era para a discussão do orçamento que de viam vir estas questões; é por essa mesma razão, por esse mesmo principio que S. Ex.ª estabeleceu, que eu combato o augmento da verba; mas S. Ex.ª diz isto, e ao mesmo tempo diz que se diminuiu nos outros porteiros para ficarem iguaes!... isto é que eu não entendo; o orçamento não é proprio para estabelecer igualdade de ordenados; logo não devemos insistir para que o ajudante do porteiro da secretaria da Justiça tenha mais 100 mil réis do que actualmente tem. Isto é que é concludente, isto é que são os principios. Por consequencia eu não podia deixar de admittir a proposta do Sr. Assis de Carvalho, pela qual hei-de votar, indo assim conforme com os mesmos principios de S. Ex.ª; quero dizer, que não se podem augmentar aqui 100 mil réis ao ajudante do porteiro, por isso mesmo que não é no orçamento o logar proprio para estabelecer ordenados; por tanto o mesmo Sr. Ministro veiu dar mais força ao argumento que se tem produzido da parte dos que combatem a verba.

Sr. Presidente, é muito facil augmentar e diminuir ordenados, é muito facil recorrer mesmo a argumentos de sentimentalismo é muito facil recorrer á modicidade das quantias; mas é muito difficil achar modo de fazer os pagamentos dos ordenados, é tudo muito difficil, quando lançarmos a vista sobre o passado, e quizermos concluir como homens de Estado lançando-a sobre o futuro. Augmentar ordenados,.. como? Pois quando, principiando por esta Camara, esta tudo em um atraso consideravel; quando pela maior parte estamos com seis mezes, perto de sete de atraso, havemos de estar a dar o exemplo fatal de augmentar ordenados? Perguntarei a todos os illustres Deputados — teremos nós alguma esperança de augmento de receita, ou pelo contrario temos esperança de diminuição della? Temos nós meios para pagar o que estamos votando? De certo que não; porque se julgarmos do futuro pelo passado, as difficuldades hão de augmentar consideravelmente, e então mesmo quando necessario seja algum sacrificio, é preciso primeiro que nos achemos fortes, que estabeleçamos o nossa força de posição nas reducções que tivermos feito, e em conservar restrictamente o necessario para nos podermos habilitar na opinião publica a respeito dos meios que podémos propor para occorrer a essas despezas publicas, porque não ha nada mais fatal para o Estado do que estar a votar despezas a esmo, sem saber d'onde hão de vir os meios para as satisfazer. Estes é que são os verdadeiros principios, e não os que apresentou o illustre Deputado pela Estremadura. Não ha nada mais fatal para uma nação do que prometter aos seus empregados uma subsistencia qualquer, e depois faltar-lhes com os meios necessarios para viver.

E não se diga que isto são mesquinhas quantias de 100 nem de 200 mil réis; a tudo isto é preciso attender para nos podermos constituir em uma posição legal, para que quando seja impossivel deixar de exigir algum sacrificio da nação, estejamos habilitados a dizer-lhe — fizemos quanto podemos, e vimos que não é possivel achar os meios necessarios para occorrer ao serviço publico, e nesse caso é preciso tal sacrificio: — mas se se fizer o contrario, e quando chegar essa occasião, se nos disser — para que augmentastes 100$000 réis ao ajudante de um porteiro? Para que fizestes mais este e aquelle au-

Página 166

(166)

gmento? Pois não sabíeis as circumstancias em que estava o paiz! — Que havemos de, responder? Como podemos nós exigir mais sacrificios da Nação, sem lhe mostrarmos que fizemos todos os possiveis para diminuir os seus encargos? É preciso restabelecer estes principios, porque sem elles não podemos apparecer na opinião publica: e eu que, como já disse, não quero senão o bem do meu paiz, e como tambem já disse, não hei de funccionar em outro sentido com a Camara, e não quero, para conservação da ordem, que ella deixe de se acreditar na opinião publica; entendo, que é indispensavel mostrar que considero as coisas com relação aos principios de conveniencia publica, e não a interesses mesquinhos; sendo sómente neste sentido que tenho defendido a minha proposta, e approvo a do Sr. Deputado pelo Algarve.

O Sr. Rebello da Silva: — É para mandar para a Mesa uma proposta, que me parece dimanar das observações que fez o Sr. Ministro da Fazenda (leu, é a seguinte)

Proposta. — «Proponho a conservação da verba de 600$000 réis, que foi eliminada do orçamento do Ministerio da Justiça, no art. 2.º capitulo 1.º « — Rebello da Silva, J. L. da, Luz, Mendes de Carvalho, Pereira de Barros, Silva Cabral, Lopes de Lima.

Tendo-se proposto á admissão, disse

O Sr. Presidente: — Foi admittida por todos, menos pelo Sr. Pereira dos Reis.

O Sr. Ministro da Fazenda: — Sr. Presidente, é verdade ter eu dicto na Mesa a V. Ex.ª que não podia encarregar-me da discussão do orçamento que ainda faltava, e que na sua especialidade compreendia tambem o Ministerio da Justiça, mas quando o meu illustre Collega entrava na Sala, tractava eu de desculpar a falta tanto de S. Ex.ª como dos outros meus Collegas, principiando por dizer que não tardariam muito, segundo hontem á noute tinhamos combinado; e estava pedindo a V. Ex.ª que abrisse a discussão no orçamento; e nem o meu illustre Collega precisava certamente que eu ou alguem do Ministerio viesse em seu auxilio.

Sr. Presidente, a Camara não precisa restabelecer-se na opinião publica, porque ainda não tem perdido nada dessa opinião, tendo feito quanto esta ao seu alcance fazer a bem do paiz; e se acaso não tem feito tudo quanto era de desejar, não tem sido por menos zêlo de nenhum dos seus membros: circumstancias tem havido que lhe não permittiram fazer mais.

Em quanto á proposta do nobre Deputado, eu entendo que a Camara não póde ser levada a approvar a reconsideração, sem transgredir todos os principios; e por mais que o nobre Deputado se esforçasse por mostrar que a approvação da sua proposta era conforme com os principios, não pude chegar á conclusão, sem reconhecer que na discussão d'um orçamento não se póde estabelecer ordenados, que não se achem votados, e não estejam estabelecidos por lei. O nobre Deputado o anno passado a respeito d'um empregado na bibliotheca fez o mesmo que eu agora faço a respeito deste. (O Sr. Silva Cabral: — Não fiz). Mas o que é a reconsideração dos ordenados que já estão approvados por esta Camara? Não e revogar ordenados já estabelecidos por lei? A Camara sabe perfeitamente que a respeito do ordenado do empregado na bibliotheca, se davam as mesmas circumstancias, e o mesmo caso que hoje se dá neste empregado, que eu agora sustento. A Camara sabe que não póde alterar ordenados estabelecidos por lei; e a lei é muito clara nesta parte, porque até estabelece e confere um direito de propriedade aos empregados que pagaram direitos e emolumentos desses mesmos ordenados; por consequencia não era possivel, nem esta no arbitrio da Camara alterar os ordenados todas as vezes que se discutisse o orçamento

A igualdade de que eu fallei não era comparando os empregados d'um cathegoria com os d'outra cathegoria, mas sim uns com os outros da mesma cathegoria, que é a igualdade de que se tracta. Por ventura não esta este equiparado aos outros empregados dessa mesma cathegoria? Não se acha elle nas mesmas circumstancias: e se se acha, qual é a razão porque ha de ser um ordenado inferior ao dos outros seus collegas?

Sr. Presidente, eu lastimo que este escrupulo todo se reduza a uma insignificante quantia de 100$000 réis: os nobres Deputados poderiam em outros ordenados dar uma prova do seu zêlo propondo reducções mais importantes, e das quaes se conseguisse o grande fim de reduzir as despezas para depois os nossos constituintes não pagarem senão aquillo que nós lhe mostramos deverem pagar, a fim de se perfazer a somma geral da despeza do Estado. Pois os nobres Deputados, inclusivamente... (não direi inclusivamente, porque a palavra talvez exprima mais do que eu quero) mas nos orçamentos que já estão approvados, os nobres Deputados não tinham margem para apresentar differentes propostas no sentido de reduzir as despezas, e de as reduzir consideravelmente, principiando por darmos uma prova do nosso desinteresse? Mas, Sr. Presidente, o zêlo todo vem a respeito d'um ajudante do porteiro que esta soffrendo uma injustiça, em quanto é considerado com um ordenado inferior áquelle dos outros seus collegas da mesma cathegoria. Pois não ha tantos ordenados de ajudantes de porteiro? Não se votou já o do Ministerio da Fazenda e do Ministerio da Guerra? Por, que razão pois senão ha de votar o mesmo ordenado para o ajudante do porteiro do Ministerio da Justiça? Eu espero que a Camara não quererá infringir este principio. Pois o illustre Deputado não reconheceu que havia uma lei que creou os ajudantes de porteiro? Então ha lei, ou não ha? Se ha lei, deve haver o mesmo ordenado, e vigorar o mesmo principio, para todos, quero dizer, é uma lei consuetudinaria, é uma lei que fez apresentar os ajudantes de porteiro no mesmo principio, e é de rigorosa justiça e necessidade igualar este aos outros para, gosar as mesmas vantagens; o mesmo principio legal que estabelece o ordenado aos ajudantes de porteiros de todas as secretarias, é o que garante a este o que a commissão propõe.

Não tenho mais nada a accrescentar: era do meu dever responder ao illustre Deputado para justificar a justiça com que a commissão procedeu; e mostrar que não se póde approvar a proposta sem se violar os principios; considerando-se que não esta nas attribuições desta Camara reduzir ordenados estabelecidos por lei.

O Sr. Cunha Sotto-Maior: — Sr. Presidente, nunca ouço fallar o Sr. Ministro da Fazenda que

Página 167

(167)

não fique pasmado, e peço a S. Ex.ª licença para lhe notar que não venho aqui dizer injurias, digo aquillo que em verdade me parece conducente para exprimir as minhas convicções. O Sr. Ministro disse que se deve approvar o orçamento sem exame, isto não é possivel, os Ministros tem o Governo, e a Camara tem o poder; o Ministro é o executor das disposições que nós aqui decidirmos; e nessa discussão do orçamento se se não augmentar ou reduzir as verbas, então não ha discussão, e é inutil a nossa missão; se estamos aqui só para o orçamento em globo, então é inutil a discussão, repito.

Sr. Presidente, a reconsideração não é uma injuria para a Camara, esta Camara já muitas vezes tem reconsiderado as suas decisões, todos os Parlamentos reconsideram muitas vezes as suas decisões, e ultimamente a assembléa de Francfort, que é nada menos do que a representante de 60 milhões de habitantes, não teve duvida em reconsiderar a approvação do armisticio de Malmoé, que indirectamente pertendia desannexar o ducado de Scheslwig-Holstein do territorio a que está ligado por uma longa occupação, e por tractados; e effectivamente a assembléa de Francfort não teve duvida nenhuma em reconsiderar a sua votação. SS. Ex.ªs parece que andam os olhos fechados, e não sabem o que se passa nos outros Parlamentos. Pois a Camara cairia em deshonra se reconsiderasse uma verba para os ajudantes de porteiro? Acaso será o orçamento tão inviolavel, que se não possa eliminar a verba dos ajudantes de porteiro??

Sr. Presidente, o Parlamento é a magistratura financeira, e se não nos compete fiscalisar os dinheiros do povo, então o nosso mandato é illusorio, e a discussão esteril: o systema dos Srs. Ministros é com, modo e facil, visto que devemos approvar o orçamento sem exame: se tão errada theoria vingasse, V. Ex.ª deve concordar comigo que o que nós estamos aqui a decidir, é inutil e absurdo. O que vemos nós? Vemos que o Ministerio pede 12:000 contos para despezas; e vemos tambem que a receita não póde exceder a 8:000 contos, por consequencia ha um deficit de 4:000 contos: isto é, que os Srs. Ministros, com a deturpação de todos os seus algarismos, não podem negar. Podemos fazer que os 8:000 contos dêem para pagar os 12:000? Não é possivel. Havemos de impôr mais tributos? Não, porque o povo não tem para pagar. O Diario do Governo apresentou-nos a relação dos devedores á fazenda nacional, e dessa relação se deprehende, que os districtos mais ricos estão debitados em grandes quantias; vê-se que os devedores não se aproveitaram dos beneficios da lei; e porque? Porque não puderam, porque não tiveram com que pagar; e no entretanto o Ministerio quer continuar nesta decepção; de tal sorte que quando ha uma proposta para qualquer diminuição, não é approvada; quem ouvir esta discussão, ha de julgar que o Thesouro esta especado para suster o pêso do ouro, e não é assim.

Eu não direi que o Parlamento tenha perdido na opinião publica; mas digo que perderia muito nessa opinião, se fosse contradictorio rejeitando, a proposta do illustre Deputado pelo Algarve; e seria contradictoria, porque ainda hontem recusou uma proposta para igualar o vencimento do inspector do arsenal do Exercito com o do inspector do arsenal da Marinha; como póde pois hoje a Camara, sem caír em flagrante contradicção, approvar que os ajudantes dos porteiros das secretarias de Estado sejam igualados em vencimentos, tendo rejeitado hontem a minha proposta para ser igualado o inspector do arsenal do Exercito, (que faz por anno 6:000 crusados de ordenado) ao inspector do arsenal de Marinha? Pois a Camara invocando hoje o principio da igualdade que hontem não quiz admittir, não cáe precipitadamente em contrasenso manifesto? Sr. Presidente, se a proposta não viesse dos bancos dos Srs. Ministros, talvez eu votasse pelo augmento; mas para ir de accôrdo com os meus principios, e tambem porque o Governo não acceitou n'outro dia uma proposta identica, rejeito esta; pois se a igualdade é um principio de justiça, como é que colhe para o ajudante de um porteiro, e não colhe para um inspector? Voto pela proposta do illustre Deputado pelo Algarve. A Camara póde ter muita opinião de si, mas não póde dizer que tem uma opinião divina, porque somos homens, e como taes sujeitos a errar; de mais a mais a Carta Constitucional que é uma lei superior ao orçamento, e ás palavras dos Srs. Ministros diz (leu) Pois que é o orçamento? E uma lei aonde se deve estabelecer os ordenados a todos empregados; se nós não podemos estabelecer estes ordenados como manda a Carta Constitucional, então é melhor não discutir; é necessario não acreditar cegamente nas palavras dos Srs. Ministros; para tanto seria necessario que SS. Ex.ªs fossem uma especie de Alcorão. Não se apresenta proposta alguma de eliminação que não seja rejeitada; permitti-me, Senhores,,que vos diga que esta discussão é a cousa mais ociosa que tem havido.

O Sr. Pereira de Mello: — Sr. Presidente, — eu lamento, e todos conhecem que não sou dos mais emprasadores, que pelo augmento de 100 mil réis se haja perdido tanto tempo, e tenhamos gasto talvez mais dessa quantia. Eu tenho o meu nome por baixo do parecer da commissão, e hei-de votar por elle; por consequencia, pedi a palavra para fazer algumas observações que servirão de fundamento ou base á minha assignatura e ao meu voto. Sr. Presidente, a commissão foi coherente; se os illustres Deputados que tem fallado, propugnam pelos principios de justiça, de certo o primeiro attributo da justiça é a igualdade, e a commissão olhou a este principio, e quando se lhe propoz por parte de um dos Srs. Ministros o augmento para um dos logares de ajudante do porteiro da secretaria, a commissão respondeu — i vamos a examinar que ordenados teem os outros ajudantes dos porteiros das outras secretarias, — e então observando um principio de justiça relativa, e principio de justiça relativa com referencia á classe de que se tracta, que fez a commissão? Foi á secretaria da Fazenda, o vendo que um porteiro tinha 700 mil réis, e que os outros tinham 500 mil réis, cortou 200 mil réis no que tinha 700, e igualou a classe dos porteiros; voltou á outra classe dos ajudantes, e vendo um com 480 mil réis de ordenado, que fez a commissão? Cortou-lhe 80 mil réis, e que fez mais a commissão? Tractou de igualar os ajudantes das outras secretarias com este, e por Isso veiu apresentar o augmento de 100 mil réis para o ajudante do porteiro da secretaria da Justiça, assim como augmentou ao da Guerra a mesma quantia, augmento que já foi approvado por esta Camara, para todos ficarem com 400 mil réis. Ora eis-aqui

Página 168

(168)

que em refilado não ha augmento da despeza, por que a commissão se por um lado augmentou 200 mil réis, 100 a cada um destes individuos, por outro lado cortou 280 mil réis, e por tanto já a Camara vê que a commissão foi coherente.

Sr. Presidente, eu não venho armar á popularidade á custa dos empregados publicos, e declaro á Camara que para estas e outras economias similhantes não tem o meu voto. Todos me conhecem, todos sabem a minha vida publica e particular, não sou desperdiçador, nunca o fui; não como á mesa do orçamento, não advogo a minha causa; quero economias; primeiro que tudo economias; mas não estas economias mesquinhas; quero economias de outra maneira; quero ver repartições de que o Estado não tira utilidade nenhuma, reduzidas, ou acabadas. Não quero ver cortar ridículos ordenados a tristes empregados, que já hoje não tem de comer, e estão sujeitos a mendigar uma esmola, e se não mendigam ainda esmola, mendigam emprestimos para podérem ír para os seus empregos. Por tanto economias desta ordem não as quero. Desejo economias, mas de outra maneira; não quero ver o Thesouro Publico montado pela fórma que esta; não quero ver dezesete districtos administrativos, e nelles outras tantas repartições de fazenda; não quero ver tribunaes que não comportam as fôrças do paiz. Para isto esta o meu voto prompto; para estas economias mesquinhas, não entendo; e nisto não offendo em nada, nem as theorias, nem os principios do Systema Representativo.

Muito embora se reconsidere a decisão da Camara, mas entendo que dessa reconsideração não póde vir bem algum. Pelos mesmos motivos que os illustres Deputados apresentam aqui a proposta para a reconsideração, é por esses mesmos principios que eu entendo que a Camara não tem necessidade dessa reconsideração. É possivel que em uma questão de principios a força dos argumentos possa levar a Camara a votar por um principio diverso daquelle que já tinha adoptado; mas por um principio igual a outro, a necessidade de reconsiderar a votação não tem logar nenhum. E sabe a Camara quaes são os sacrificios que são obrigados a fazer o empregados publicos? Já a commissão do orçamento apresentou a lei dos meios? De certo que não.

Entendo por tanto que sobre a materia não devo tomar mais tempo á Camara. E concluo dizendo, que voto pelo parecer da commissão, e rejeito todas as emendas que se apresentaram.

O Sr. Vaz Preto — Peço a V. Ex.ª que consulte a Camara se a materia esta discutida.

Decidiu-se affirmativamente por 42 votos contra 21.

O Sr. Presidente — Offereceram-se algumas propostas que foram classificadas como emendas. A primeira e a do Sr. Silva Cabral, propondo a eliminação do augmento de ordenado ao ajudante do porteiro da secretaria de Justiça; a segunda é a do Sr. Assis de Carvalho, propondo que os ordenados dos ajudantes de porteiros sejam de 300 mil réis, reconsiderando-se para isso o que se venceu com applicação aos Ministerios de Fazenda, e Guerra; e a outra foi do Sr. Rebello da Silva para a conservação da verba dos 600 mil réis, que foi eliminada do orçamento deste Ministerio no artigo 2.º do capitulo 1. Por bem da votação, convem principiar pela votação da proposta do Sr. Assis de Carvalho, porque é mais ampla, e póde dizer-se que prejudica a votação da outra, se for vencida.

Não havendo objecção alguma, vai lêr-se para se propor á votação.

Leu-se, e foi rejeitada por 45 votos contra 28.

Emenda do Sr. Silva Cabral — rejeitada por 43 votos contra 22.

Emenda do Sr. Rebello da Silva — approvada por 66 votos contra 3.

Capitulo 1.º — approvado por 54 votos contraíu.

Passou-se ao

Capitulo 2.º

O Sr. Cunha Sotto-Maior: — Proponho que a verba de 12 contos de réis do Cardeal Patriarcha seja reduzida a 8 contos de réis. A Camara não deve admirar-se desta minha proposta, porque o arcebispo de París que não é menos em jerarchia que o Cardeal Patriarcha, o arcebispo de París que tambem é Cardeal, e que esta em París, e não aqui, tem apenas 40:000 francos, e o Cardeal Patriarcha, que tem hoje 12 contos de réis, ficando só com 8 contos de réis que vem a ser mais de 48:000 francos, vem a ter mais que o arcebispo de París, e vem até a ter mais que o proprio Papa. Eu vou dizer a V. Ex.ª e á Camara em poucas palavras o meu pensamento, póde ser que seja errado, mas eu tenho pena de não podér entender o estado do nosso paiz como alguns Senhores parece quererem entende-lo. Estou capacitado, e muito, que o paiz esta pobre, que não esta nadando em dinheiro como alguns Srs. Deputados parecem querer indicar com as suas votações; para mim a miseria do paiz é grande, e a prova é que vem uma verba votada no orçamento para 12 mezes, e apenas se paga desses 12 mezes 3 ou 4 aos empregados publicos, e as viuvas têem fome, a fazenda publica esta n'uma confusão completa, o paiz não póde com a despeza de 12 contos de íeis; é preciso que a despeza esteja em harmonia com as possibilidades do povo, não vamos exigir delle o que elle não póde dar, é preciso harmonisar uma cousa com outra, para que as cousas do paiz marchem regulai mente; eu quero que o meu paiz enriqueça, e prospere, tenho aqui os meus pequenos interesses, tenho neste paiz os meus affectos, a minha existencia, não tenho fortunas lá fóra para emigrar, estou tão agarrado a este paiz como a ostra esta agarrada á concha (riso) bem vedes que devo desejar o bem desta terra, não tenho para onde, nem com que fugir; não hei de nunca contribuir para que alguem calque aos pés os misérrimos despojos deste paiz; tenho tenção de marchar no caminho que encetei, e de propôr todas quantas reducções forem compativeis com a nossa situação, que é bem pouco lisongeira: esta reducção que agora proponho, é uma deducção logica dos nossos apuros financeiros; mando-a para a Mesa, é a seguinte

Emenda — «Proponho que a verba do Cardeal Patriarcha, capitulo 2.º art. 4.º seja reduzida a 8 contos de réis. — Cunha Sotto-Maior.

Fui admittida por 37 votos contra 29.

O Sr. Ferreira Pontes: — Sr. Presidente, não pedi a palavra para combater a verba designada para a fabrica da sé de Lisboa, antes eu a apoio, e hei de votar por ella, mas para chamar a attenção da Camara sobre ella, e para lhe fazer sentir a desigualdade, e injustiça com que são tractadas as outras ses, porque em quanto se propõe para esta 7:965$600

Página 169

(169)

réis, se propõe para 9 designadas no art. 9.º do capitulo seguinte 1 conto de íeis. Entre estas ha uma, que é a de Braga, que não é inferior em cathegoria á sé de Lisboa, e aonde não ha menor assiduidade na celebração dos officios divinos, e demais funcções do culto, e até aonde chegam os seus meios não se celebram com menos pompa, e esplendor. Attendendo-se a ser a sé primacial das Hespanhas, aos diminutos rendimentos proprios, e a outras mais circumstancias, já por decreto de 7 de dezembro de 1835 se estabeleceu para esta fabrica 1 conto de réis, este decreto não tem tido a execução que devia ter, mas é tempo de se lhe dar, e deve inserir-se no orçamento esta verba. Não venho propôr uma despeza que senão ache estabelecida por lei, e se os decretos do Poder Executivo que espoliaram a igreja da sua propriedade, e dotação foram tão promptamente executados, porque ha tanta difficuldade em se executar este? Não queiram se diga que se regateia uma pequena verba destinada para o culto, em quanto se desperdiçam sommas avultadas com empregados inuteis, com gratificações excessivas, e com obras de luxo. Mando para a Mesa uma emenda para ser tomada em consideração em occasião opportuna, e para então me reservo para fazer outras mais considerações, e a sustentar.

Proposta.. — «Proponho que á verba designada para a sé de Braga se augmentem, em execução do decreto de 7 de dezembro de 1835, 750$000 réis.»» — Ferreira Pontes.

O Sr. Presidente: — Esta proposta não tem cabimento algum neste capitulo, mas sim no capitulo 3.º, e por isso fica reservada para então. Por esta occasião lembrarei á Camara que o decreto a que o nobre Deputado fez referencia, é um documento sobre o qual já dei informações, e segundo estas lembro á Camara que esse decreto não chegou a ser publicado, nem foi expedido, ou não surtiu effeito nenhum; esta informação devo eu dar á Camara para que não haja surpresa (apoiados.)

O Sr. Xavier da Silva: — Sr. Presidente, eu voto confia a emenda apresentada pelo Sr. Cunha, para ir coherente com as bases que acceitei na commissão nestes trabalhos, e já era a minha opinião na commissão no anno passado. Estou disposto a acceitar todas as medidas de economias; conheço quanto são difficeis, e apuradas as circumstancias do Thesouro; mas desejarei sempre que se façam economias sem attenção a pessoas, pois todas as vezes que nós formos á discussão de economias pessoaes, havemos de collocar-nos em difficeis circumstancias; e de ordinario quando se tracta de economia pessoal, o resultado é que votam quasi sempre as maiorias as propostas de augmentos, e poucas vezes as de economias. Os nossos recursos são poucos, e tão poucos que talvez nos vejâmos forçados por isso a obrigar todas as classes da sociedade a um sacrificio na proporção dos subsidios que vençam do Estado; e para então é que me parece o logar competente de se attender ao cerceamento que se pertende fazer neste capitulo. A Camara não póde deixar de adoptar o mesmo systema que a respeito do Ministerio da Guerra já foi approvado. A commissão o anno passado tinha feito algumas reducções pessoaes cortando varias gratificações, assim como tambem o anno passado no Ministerio das Justiças de que se tracta, diminuiu o subsidio concedido ao Cardeal Patriarcha. Mas todos sabem como se discutiu esse negocio, e qual foi o resultado da votação; a Camara dos Deputados adoptou a reducção, mas essa reducção não tendo sido adoptada pela outra Camara houve a commissão Mixta, e o resultado de tudo isto foi que a verba se restituiu. Ora, Sr. Presidente, este anno a commissão do Orçamento seguindo um caminho diverso daquelle que se tinha seguido o anno passado, adoptou a idéa de fazer córtes em grande escala em todos os vencimentos sem attenderá pessoas: parece-me que este methodo ha de ser muitissimo melhor, porque isto abrange todos os empregados por mais alta que seja a sua cathegoria, os quaes hão de sujeitar-se a essa regra geral, chegando-se por este modo ao mesmo fim, sem se discutirem pessoas. Por taes motivos a commissão este anno restabeleceu todas as gratificações que o anno passado se tinham tirado, e na parte que diz respeito ao Ministerio da Guerra já estão votadas, por consequencia restituidas; e deverá a Camara adoptar um systema diverso a respeito do logar de que se tracta? Não será mais coherente que quando considerar o systema, que lhe apresente a commissão de Fazenda com relação á lei dos meios, haja de adoptar os córtes que lhe parecer conveniente a respeito deste e outros subsidios?.. O Sr. Ministro da Fazenda na lei de meios que apresentou, sujeitou os ordenados a certos sacrificios como de 10 por cento, 15, 20, e até 30 por cento. Pois, Sr. Presidente, como lá estão marcados quaes são os vencimentos que devem ficar sujeitos a esta regra geral, nessa occasião é decerto o logar mais proprio, tendo em attenção as circumstancias do Thesouro, para se augmentar ou diminuir esses sacrificios, como a Camara entender conveniente. Parece-me pois que a emenda do nobre Deputado não póde ser approvada para a Camara ir coherente com o que tem adoptado até agora (apoiados)

O Sr. Cunha Sotto-Maior: — Sr. Presidente, ouvi com muita attenção o nobre Deputado, membro da commissão, e realmente queria que S. S. me explicasse o que entende por questão pessoal. O orçamento é uma tabella de nomes, e estes estão cotados á margem com um valor ou quantia que lhe pertence; por tanto eu não posso nesta questão de reducções abstrair a cifra da pessoa representada por um cargo; queria que S. S.ª me explicasse isso, queria que me dissesse como posso eu desligar a verba de 12 contos da pessoa do Cardeal Patriarcha?... Pois o Cardeal Patriarcha não é uma pessoa?... Parece que o nobre membro da commissão, pelo modo porque argumentou, entendeu que S. Eminencia não era uma pessoa! O que vejo pela doutrina do nobre Deputado, membro da commissão, doutrina confirmada pelo nobre Ministro da Fazenda, é que o orçamento deve ser approvado sem se lhe mexer; se assim, é não se gaste mais tempo, approve-se já tudo que lá esta. Sr. Presidente, a questão é pessoal, nem póde deixar de o ser, por que o Cardeal Patriarcha de Lisboa não é impessoal. Sustento a minha proposta, mas não discuto a pessoa, não tenho nada com ella, e sim com averba que lhe vem designada; eu tenho pela pessoa do Cardeal Patriarcha de Lisboa muito respeito, mas, quando entro as portas desta Sala, venho tractar dos principios, e não das pessoas (apoiados). Não venho aqui ao Parlamento fazer comprimentos, nem recitar adulações, nem lisonjas, venho aqui para expor tudo quanto sinto no meu coração,

Página 170

(170)

para dizer tudo aquillo que o paiz tem necessidade de ouvir constantemente, e hei de repeti-lo uma, cem, e mil vezes: e não se diga que eu procuro armar á popularidade, esperando que eu rejeite essa insinuação: tenho bastante coragem para dizer que a procuro, e tenho bastante dignidade e sentimentos para a querer merecer: quando eu vejo que no orçamento vem designado para o Cardeal Patriarcha de Lisboa 12 contos de réis, e para o Arcebispo Primaz das Espanhas 2:400$000 réis, devo notar esta grande desigualdade. O Cardeal Patriarcha tem ainda alguns rendimentos da mitra, tem fóros, tem duas quintas, e tem um palacio para morar, e o Arcebispo de Braga tem bem pouco ou quasi nada disto, entre o Patriarcha e o Arcebispo Primaz das Espanhas ha uma desproporção immensa: o Patriarcha pelas honras de Conselheiro d'Estado, e Par do Reino não tem rigorosa obrigação de sair da Diocese, e o Arcebispo tem essa obrigação, e de mais a mais a de vir a Lisboa (apoiado). A Camara vote como entender esta proposta de reducção a 8 contos de réis, a proposta é rasoavel, e exigida pelas nossas circumstancias.

Sr. Presidente, eu quereria que esta Camara e que os Srs. Ministros se compenetrassem bem de que o paiz esta pobre, que o paiz não póde com estes luxos de despezas, o Arcebispo de Pariz, e até o proprio Papa tem menos que o Cardeal Patriarcha de Lisboa, torno a repelir. Sr. Presidente, as razões que eu vi apresentar por parte da commissão, collocam-nos na situação de não discutirmos nada, é melhor e por ventura mais digno approvar já todo o orçamento sem lhe bolir; mas eu entendo que as verbas do orçamento podem ser diminuídas ou augmentadas, a nossa situação pede diminuições e não augmentos, ha uma grande disparidade entre a receita e despeza, é preciso procurar harmonisa-la; quando vier a lei de meios, a Camara ha de ver-se em grandes difficuldades, e estas augmentam, se se augmenta a despeza; o povo não póde pagar 12 contos déreis; esta minha asserção é uma verdade incontestada e incontestavel. Que lei de meios hão de SS. Ex.ªs apresentar aqui para cobrir um deficit de 4 mil contos, e satisfazer as suas palavras, tantas vezes dietas na Camara, de pagar em dia? Não hão de pagar; e se Deos nos der vida e saude, e a Camara não for dissolvida o nós aqui voltarmos, havemos de ver que o estado dos pagamentos ha de ser peior; até hoje tem-se pago 4 mezes no anno, quer dizer que para o seguinte ha de se pagar outros 4 ou ainda menos, e SS. Ex.ªs não hão de dar contas, por que contas não se dão ha muito; distribuiu-se á dias o relatorio do Tribunal de Contas — este documento official diz logo no principio — o Tribunal não póde dar contas, por que os Ministerios não lhe teem enviado contas algumas de 43 para cá 1 Ris o que esta escripto, e o que todos podem ler.

Por consequencia insisto na minha proposta, parece-me racional, e se a Camara a adoptar, dá realmente um testemunho de que quer economias, porque não bastam sómente as palavras e promessas dos Ministros, o Paiz não ganha nada com isso, o paiz esta farto de promessas, e tambem de leis. Se um paiz se devesse reputar feliz pelas leis que tem, confesso que nenhum o era mais do que o nosso; não temos necessidade de mais, as que temos na Ordenação bastavam; dado o caso de se querer governar legal e lealmente: ha na Ordenação do Reino sufficientes leis, o caso esta em que se cumprissem. Mas dizer-se — o paiz ha de ter economias, havemos de equilibrar a receita com a despeza, e no fim ver-se que o orçamento é o mesmo do anno passado, e que ainda em cima a illustre commissão propõe augmentos, e que ainda o Parlamento ha de votar creditos supplementares, e que no fim de tudo isto o Ministerio não ha de pagar a ninguem, confesso que não entendo. Sustento a minha proposta, porque as razões que deu o illustre membro da commissão qualquer que seja a minha consideração e estima para com S. S.ª, não são razões, são palavras e frazes, e nada mais. Só lhe ouvi dizer que a questão era pessoal, (foi a unica) e que deviamos tractar de questões impessoaes.

O Sr. Lacerda (D. José): — Sr. Presidente, o illustre Deputado que me precedeu, propoz que a verba proposta para o Eminentissimo Cardeal Patriarcha fosse reduzida a 8 contos de réis, e pela proposta do Governo esta verba é reduzida a 8:400$000 réis: por conseguinte já se vê que a questão não é de tanto momento, quanto parecia querer figurar-se. O reduzir a verba a 8 contos de réis, como quer o illustre auctor da proposta, não leria para mim muita difficuldade se por ventura ao Eminentissimo Cardeal Patriarcha se pagassem effectivamente 8 contos de réis; porém nem os 8 contos de réis se lhe pagara, e por ventura pouco mais se lhe pagará de dois terços dessa somma. E certo que este argumento serve para todos os empregados, mas serve tambem de resposta, no caso de que se tracta, á lembrança da congrua concedida em França ao Arcebispo de Pariz, que de certo alli é paga integralmente, com exactidão, e sem os atrasos, e sem os descontos, porque são pagos entre nós os ordenados de todos os funccionarios publicos.

Agora porém cumpre-me observar, para esclarecimento, que a commissão não fez mais que manter a verba, que tem sido votada em todos os orçamentos ao Eminentissimo Cardeal Patriarcha, não só pelo conhecimento que tem das despezas a que elle esta obrigado, já como alta dignidade ecclesiastica, já como afta dignidade civil, cada uma das quaes traz comsigo immensas despezas, além das que como prelado herdou dos seus antecessores.

N'outra occasião pertendeu-se aqui tambem diminuir esta mesma verba, e então se desenvolveu largamente as obrigações a que o Eminentissimo Cardeal Patriarcha esta subjeito, muitas das quaes lhe tem vindo como observei, dos seus predecessores, e que seria sobre maneira desairoso deixar de satisfazer. Muitas são as obrigações impostas ao Eminentissimo Pathiarcha na qualidade de primeiro prelado da Igreja Lusitana, e é sabido que uma dellas que muito pezo faz, e que sendo preceito para todos os christãos, é obrigação particularissima dos bispos, é soccorrer os pobres; e todavia o prelado da Igreja de Lisboa acha-se em circumstancias de não poder satisfazer a este respeito da religião, e a esta condição impreterivel que tanto aliás recommenda os prelados á veneração dos fieis!...

Como alto funccionario civil ninguem póde ignorar as grandes despezas, que traz a S. Eminencia a assistencia e obrigações da Côrte, e a sua alta posição politica já como Vice-Presidente da Camara dos Dignos Pares, já como Vice-Presidente do Conselho de Estado, etc. As despezas são tanto maiores quan-

Página 171

(171)

to mais elevada é a cathegoria do funccionario; e a cathegoria de Cardeal Patriarcha de Lisboa não tem igual entre nós. Não me deterei com o que se disse do Arcebispo de Braga. Não entrarei na comparação, porque sempre de taes comparações resulta algum tanto de odioso; mas é bem visto que o Sr. Arcebispo de Braga, residindo fóra da Côrte, limitado a um circulo muito circumscripto nas suas relações, e obrigações civis, e desobrigado pela sua idade e molestias de comparecer na Camara a que pertence, não póde de maneira nenhuma, ao menos por ora, pôr-se em parallelo, na questão que se tracta, com o Eminentissimo Cardeal Patriarcha, que a tantas despezas esta obrigado per tantos motivos differentes.

Por conseguinte, por um lado não póde ter comparação a situação do Eminentissimo Patriarcha com a situação do Sr. Arcebispo de Braga; as despezas a que um esta sujeito, são muito diversas das a que o outro esta obrigado: e por outro lado o máo estado dos pagamentos entre nós, e a regularidade com que elles são feitos em França collocam na maior desigualdade o Eminentissimo Cardeal Patriarcha com o Arcebispo de Pariz, que aliás não esta hoje obrigado a similhantes despezas

Na comparação que se fez com o Sancto Padre não entro, porque o que S. Sanctidade tem, não sabemos nós apezar do almanack de Gotha, e do que a este respeito observou um Sr. Deputado; devemos confessar que é tudo muito incerto; e o que S. Sanctidade terá daqui por diante tambem ainda não se sabe.

Assim pois, não tendo diminuido de força nenhuma das considerações, que ate agora levaram o Parlamento, desde 34, a estabelecer ao Eminentissimo Cardeal Patriarcha a dotação que lhe esta estabelecida por lei; não tendo variado as circumstancias que fizeram julgal-a indispensavel, pois se variaram, é para a tornar mais evidente pelo pessimo estado dos pagamentos, claro esta que a commissão devia manter intacto o que estava estabelecido.

Alem disto e preciso observar que esse ordenado tem sido sujeito aos coites legaes, e geraes, que se têem feito a todos os empregados; e que, como observei de principio, a proposta ainda do Governo reduz a dotação quasi á mesma verba, que propõe o illustre auctor da proposta, porque, tendo essa dotação de perder 30 por cento, fica reduzida a verba em discussão a 8:400$000 réis; e o illustre auctor da proposta de certo quando designou os 8 contos, não os quiz ainda sujeitar ao coite da medida presente, porque manifestamente se veria que não era possivel com a dotação do tal fórma reduzida, fazer face ás despezas a que esta obrigado o Eminentissimo Cardeal Patriarcha, e conservar ao mesmo tempo a decencia indispensavel a uma tão alta dignidade.

Sustento pois a disposição do artigo.

Agora fallarei da proposta do illustre Deputado por Traz-os-Montes....

O Sr. Presidente — Se allude á proposta do Sr. Deputado Ferreira Pontes, ainda não esta em discussão.

O Orador: — Então na occasião competente tomarei a palavra.

O Sr. Silva Cabral — Sr. Presidente, o illustre Deputado que me precedeu, devia fazer aquillo que fez, isto é, oppor-se á eliminação; porque, para assim dizer, era forçado pela sua propria posição, (apoiados) é até um certo ponto digno o seu procedimento, quando lucta a favor do seu chefe no Patriarchado; mas parece-me que se acaso se attender aos principios da verdadeira e rigorosa justiça, não poderá de fórma alguma deixar de se approvar a proposta.

Sr. Presidente, eu tenho toda a consideração pela pessoa digna de que se tracta, tenho toda a consideração por essa pessoa, não sómente pela representação ecclesiastica que tem, mas pela representação politica, e ainda mais pelos seus dotes pessoaes; (apoiados) mas nem os seus dotes pessoaes, nem a sua representação ecclesiastica, nem a sua representação politica podem cousa alguma diante dos principios da justiça, ao menos não devem poder.

Sr. Presidente, se eu, tendo propugnado pela eliminação do augmento para um ajudante de porteiro, ficasse silencioso, procurando sustentar a coherencia dos meus principios, com relação á personagem de que se tracta, que occupa o mais alto vértice da cathegoria ecclesiastica, de certo deveria ser reprehensivel o meu comportamento: mas eu espero que a Camara e o Publico, observando todo o meu procedimento, hajam de notar que eu não vejo diante de mim pessoas, que tracto das cousas em harmonia com os principios da justiça, e em harmonia com as conveniencias publicas.

Sr. Presidente, todos os argumentos que se têem estabelecido, cáem diante de uma unica consideração, e vem a ser, que nós não tractamos aqui de reduzir ou estabelecer ordenado para o Cardeal Patriarcha de Lisboa, D. Guilherme, mas para o logar do Arcebispo de Lisboa; nós tractamos de estabelecer o ordenado conforme comportam as circumstancias do paiz, e em harmonia com essas circumstancias: portanto devemos abstrair inteiramente de pessoas, porque não é de pessoas que devemos aqui tractar.

A illustre commissão quiz defender a conservação dos 12 contos de réis com o systema novo que tinha a seguir este anno, dizendo que os córtes ficaram para se estabelecerem por uma regra geral na proporção dos differentes vencimentos; muito bem; mas perguntarei eu á illustre commissão — será isto exacto em toda a extensão da palavra? Não terá a commissão mesmo contrariado o seu proprio procedimento em verbas muito significativas, e que não podem deixar de ser pessoaes? Pergunto — que fez a illustre commissão nos encargos geraes, quando veio á Familia Real? Que fez a respeito da Imperatriz viuva, e das Infantas? Seguiu por ventura essa regra? Que lhe fez? Não diminuiu desde logo n'uma 50 por cento, quero dizer, nada menos que a metade das suas dotações? Será isto pessoal, ou o será a hypothese de que tractamos? Alli considerou-se as pessoas, e aqui considera-se o logar. Por consequencia a commissão não póde de maneira nenhuma argumentar cora este seu systema; porque se era systema, esta quebrado, não só pelo seu parecer, mas pela votação da Camara.

Gratificações restituidas!... Foi um dos grandes males que fez a Commissão, (apoiados) Se a Camara o anno passado tinha adoptado a eliminação das gratificações com relação ao Ministerio da Guerra, este anno, não estando mais prospera a fazenda publica, não podia fazer uma similhante excepção. Não sabe a commissão que estas gratificações não estão de mais

Página 172

(172)

a mais sujeitas ás reducções? Não sabe a commissão que estas gratificações são privilegiadas, e que são estabelecidas em tempos mais prosperos do que hoje, e que o paiz não póde actualmente com ellas? Eu não tracto de procurar a popularidade, nem de uma nem de outra classe, eu tracto, sem me importar de classes, de seguir os principios de justiça; e os principios de justiça, neste ponto, não se fundam só nos principios de igualdade, sendo os de igualdade mathematica ás vezes uma perfeita injustiça; eu exijo uma igualdade proporcional; o mais é um absurdo gravissimo (apoiados)

Mas diz o nobre Deputado: «observai que nós o anno passado fizemos este côrte, e não foi approvado; e depois houve uma commissão mixta que o estabeleceu.» — é mais uma razão para que a Camara sustente o seu pensamento e a sua dignidade Se por ventura esta Camara entende que teve motivo justo e plausivel para fazer aquelle côrte, deixando de instar agora na sua propria opinião, sabe o nobre Deputado, o que vai fazer? Vai dar armas aos seus contrarios, e mostrar que a Camara dos Deputados foi irreflectida, sendo a outra Camara a que foi reflectida (apoiados)

Isto é que me persuado que o illustre Deputado não quer, porque houve justificado motivo para se fazer aquillo que se fez. Este ordenado é especialissimo, não tem outro igual; por consequencia não póde tambem deixar de ter uma especial disposição. Eu pergunto ao nobre Deputado, se a Camara adoptar o systema apresentado pelo Ministerio de sujeitar a novos sacrificios os differentes ordenados, que proporção tem um ordenado de 400 mil réis para soffrer este côrte, comparado com 12 contos déreis? Não sabe a Camara que as obrigações que pezam sobre os empregados que teem de sujeitar-se a estes sacrificios, não são menores que as do illustre funccionario de que se tracta? É verdade que é um logar mais eminente, mas não concedo que seja o primeiro; concedo que seja o logar mais eminente com relação ao Patriarchado, mas não com relação ao paiz Mas, Sr. Presidente, é preciso notar-se que, por exemplo, o Arcebispo Primaz de Braga que tiver de vir a Lisboa cumprir Os seus deveres, ha de aqui fazer despezas proprias da sua alta elevação, e o illustre funccionario de que se tracta, não esta sujeito a estas despezas; por que tem um palacio que o Estado lhe dá, e tem demais amais duas quintas. E preciso que se vote além disto, que este illustre funccionario quanto ás mais obrigações não as tem maiores, do que as tem outros empregados que tem 2 contos de réis: por que se é obrigado a ír á Côrte, tambem, os empregados o são, se elle e obrigado a apparecer, não com fausto, mas dignamente, tambem aos empregados lhes acontece o mesmo; se tem de fazer despezas, tambem os empregados as tem de fazer talvez maiores em proporção, por que elles não teem espolio que lhes ficasse do arcebispado, e se quizerem viver na Corte hão-de compral-o á sua custa. Por consequencia, que differença não ha entre uma e outra cousa, para se querer argumentar com esta igualdade? Sr. Presidente, nós não tractamos aqui deste empregado nominalmente, tractamos do Arcebispo de Lisboa, tracta-se de que o Arcebispo de Lisboa esta muito mais habilitado do que outro qualquer bispo ou arcebispo, quando lhe cabe as mesmas attribuições, e por consequencia não podem ter força alguma os argumentos, que os nobres Deputados apresentam.

Mas diz-se — «o ordenado era sufficiente se se lhe pagasse?» — porém esta razão e para todos os empregados; logo concedem os illustres Deputados que se deve votar pela proposta, porque geralmente todos os ordenados que se arbitram aos empregados, são sufficientes, se se lhes pagasse; e então já se vê que este illustre funccionario fica na mesma posição que os demais empregados, e agora de tal modo que pela tabella que se adoptou, elle esta muito primeiro que todos os outros que vem na mesma tabella.

Portanto, Sr. Presidente, qualquer que seja a votação da Camara, eu entendo que não devia ficar silencioso sobre esta verba, quando tinha levantado a minha voz a respeito d'uma verba mais diminuta: que o ordenado que se propõe é muito sufficiente, ou se compare com aquelles doutros paizes aonde as despezas são maiores, ou se compare com outros empregados em differentes relações tanto ecclesiasticas como politicas; e por isso não posso deixar de votar pela proposta.

O Sr. Xavier da Silva: — Tive a infelicidade de não ser entendido, assim como de ser combatido por um Deputado que muito respeito, e cujas idéas estimaria abraçar: mas permitta-me V Ex.ª e a Camara que eu faça sentir melhor qual a minha opinião a este respeito. A emenda que esta sobre a Mesa, tem por fim reduzir este subsidio ou ordenado a 8 contos, quer dizer, eliminar a terça parte do ordenado; mas a Camara vera que a questão que se suscita, com quanto seja olhada só pelo lado da economia, se reduz a muito pouco, porque segundo a carta de lei de 26 de agosto de 1816, todos os ordenados que excedessem a 600$000 réis ficavam sujeitos a um côrte de 25 por cento; mas a lei foi tão providente que no paragrafo ultimo do mesmo artigo determinou que esta diminuição não teria logar nos vencimentos que já tivessem soffrido corte. O que aconteceu em resultado disto? Foi que este ordenado ficou sendo de 9 contos. Por consequencia o ordenado não deixou de soffrer côrte, e ficou na proporção de todos os outros: foi isto que as Camaras entenderam que se devia fazer, e é isto o que ahi determina. O que é que propõe o Governo? O Governo propõe que os ordenados que excederem a 1:400$000 réis fiquem sujeitos a um corte de 30 por cento; ora 12:000$000 réis a 30 por cento, da em resultado 3.600$000 réis para menos, já se vê que adoptando se este côrte, não póde soffrer outro. Por consequencia a questão que se agita com tanto calor, e de 400$000 réis; e a Camara não sabe ainda, se os córtes em logar de serem de 30 por cento, hão de ser de 35.

Sr. Presidente, disse o illustre Debutado, que a commissão não tinha proposto bem o augmento das gratificações, porque essas não estavam sujeitas a reducções, perdôe-me o illustre Deputado dizer-lhe que se enganou, porque no art. 8.º da carta de lei de 26 d'agosto de 1848 as gratificações dos militares ficaram sujeitas a reducções, excepto as dos commandantes dos corpos: o illustre Deputado sabe muita bem que não esta votada a lei de meios, e que o Governo entendeu fazer algumas reducções, e segundo a idéa da commissão posso dizer, que os córtes para as gratificações hão de ser em uma escala diversa da

Página 173

(173)

dos ordenados, quando isso vier á Camara o illustre Deputado avaliará a proposta da commissão.

Sr. Presidente, trouxe-se para aqui a lista civil, eu fui daquelles, bem como a commissão, que votei por esta reducção, e entendemos, não sei se bem, se mal, mas entendemos que era melhor fazer logo uma deducção na lista civil, executando-se como regra geral. é esse o systema, póde ser que seja minto máo, mas foi o que a commissão adoptou, e em que assentou, muito mais depois da resolução que Sua Magestade tinha tomado a este respeito sobre a sua dotação.

Ora, Sr. Presidente, pelo mesmo motivo porque o illustre Deputado chama a attenção da Camara para que sustente a sua dignidade, com o mesmo argumento voto eu contra a proposta, ou emenda. O anno passado esta Camara foi d'accôrdo com a commissão em todas as reducções, eu sinto ter que referir-me a esses acontecimentos, mas os Srs. Deputados é que me obrigam a entrar neste terreno, porem a outra Camara não concordou; e os illustres Deputados hão de lembrar-se, que depois foi mister uma commissão Mixta para decidir o negocio: se pois a Camara tem os meios, sem conflicto com a outra, de conseguir esse resultado, não será mais decente, antes fazer as propostas de sorte que não vão de encontro ás resoluções já tomadas, e que tendem ao mesmo fim que o illustre Deputado quer? S. Ex.ª pretende que o ordenado de 12.000$000 réis seja sujeito em logar de ires decimas a tres decimas e meia, eu digo que se consegue o mesmo côrte sem fazer uma questão pessoal, approvando-se a verba como esta, e neste sentido e que eu fallei em questão pessoal. Quanto porem ás gratificações dos militares que se restabelecerem, quando esse negocio vier a discussão, então se vera qual e a minha opinião

Sr. Presidente, eu faço justiça as rectas intenções do illustre Deputado que me precedeu; certamente nunca se podia persuadir S Ex.ª, que eu tivesse em mente que era questão pessoal o sustentar a proposta, mas o illustre Deputado assim o quiz entender porque assim lhe conveiu estabelecer o argumento para depois lhe responder. Eu o que pretendi, foi indicar um arbitrio, que tirando da discussão como agora esteve, um alto empregado, consiga o mesmo fim de lhe fazer corte no ordenado, tendo a Camara na sua mão votar esse coite seguindo as regras geraes, embora saiba que elle vai ter com este ou outro individuo. Parece-me que este é o melhor meio; e é esta a minha opinião: entretanto a Camara em sua sabedoria resolvera como lhe approuver.

O Sr. Rebello da Silva — Sr. Presidente, creio que não esta nem póde estai em discussão a pessoa a quem se refere esta verba, pessoa cuja elevada posição toda a Camara reconhece, e a cujas luzes presta a devida homenagem, mas creio que por maior que seja o seu honroso cargo, não inhibe o Pai lamento do exercicio do direito inalienavel que tem de fiscalisar os ordenados de todos os empregados. — Sr. Presidente, á vista do orçamento da despeza que foi aqui apresentado, e de que vou vendo correr a discussão, suppuz eu, que se tinha desde o anno passado até hoje, descoberto ou inventado uma grande mina de riqueza, e que as circumstancias fataes que no anno anterior foram invocadas para nos impellir afazer um sacrificio doloroso, deixaram de existir, e se tinham convertido não em um melhoramento mediocre, mas em grande beneficio da nação portugueza, porque tanta liberalidade, tanta generosidade nas promessas fazem crer que, se por ventura as palavras assentam sobre calculos verdadeiros, grandes deverão ter sido as vantagens. Eu desejo ver a lei de meios, e observar os glandes recursos financeiros que apparecem para cobrir esta enorme despeza, tenho anciedade por vêr isto, porque nas verbas que se tem augmentado aquellas que já vinham no orçamento do anno passado, são despezas improductivas, são despezas daquellas que o Estado lança para não colher. E os argumentos em que essas verbas tem fundamento são os proprios com que se responde para sustentar a sua eliminação, as mesmas que a illustre commissão de Fazenda trouxe o anno passado a esta Casa; vindo aliás hoje convidar-nos a que sejamos generosos, que demos tudo, como se se tivesse descoberto uma Califórnia nova, aonde podessemos ir buscar o ouro que nos fosse preciso.

Sr. Presidente, eu creio pouco nessas venturas que se promettem, e nas receitas que se hão de haver tom a lei de meios, mas creio muito na fome e miseria dos empregados publicos, que são necessariamente as victimas de todos estes rasgos de liberalidades, e concessões; não é só o Sr. Cardeal Patriarcha a quem senão pagam os ordenados em dia, é a todos os servidores do Estado, os quaes estão morrendo á mingua pelos hospitaes; e de certo não são os que tem maiores ordenados os que padecem mais, esses pela sua posição não estão nas circumstancias dos que vão morrer, como ha pouco nos constou que foi morrer um antigo servidor da nação, coberto de miseria, ao hospital: o Sr. Cardeal Patriarcha não esta nesse caso, porque tem quintas, e tem a renda da mitra; e de mais S. Eminencia é muito virtuoso para não se dever lembrar de que era preciso sujeitar-se a regia, porque se fazem os pagamentos; por consequencia esse argumento não colhe; elle esta nas mesmas circumstancias em que estão todos os servidores do Estado, nem podia estar n'outras segundo o systema constitucional. — Mas disse mais S. Ex.ª — a É um alto funccionario ecclesiastico e civil.»

Sr. Presidente, quantos estão nesta Camara, e na outra Casa do Parlamento, tambem altos funccionarios ecclesiasticos e civis, com glandes despezas, com grandes obrigações, com familia obrigada, e que tem de tractar-se com a pompa necessaria e com grandes despezas nas vestes para o exercicio do cargo que rigorosamente hão de representar? Será só o unico que exige um ordenado elevado, o Patriarcha? Não são todos os que exercem os altos cargos da sociedade? Não terá grandes encargos em comparação do seu rendimento, o Arcebispo de Braga, que não póde deixar de vir ao Parlamento, em cujos transpottes faz uma glande despeza, assim como na estada nesta Côrte segundo a alta posição que pertence a tão elevado cargo?... Eis aqui portanto que o illustre Arcebispo de Braga tem maiores despezas, por isso que tem de vir aqui, e ha de vir sempre que houver Parlamento, quando a sua saude não for a causa da excepção.

Sr. Presidente, mas porque senão havia de acceitar o parallelo da fórma de viver em Pariz? Pois os altos ecclesiasticos que existem em Pariz, não terão tambem obrigação de soccorrer os pobres; não terão obrigação de enxugar as lagrimas dos afflictos, e não

Página 174

(174)

a tem todos aquelles que exercitam as funcções do Apostolado? For consequencia já se vê que esse argumento da Hespanha e França colhe necessariamente.

Concluo votando a proposta do nobre Deputado no sentido em que tinha sido apresentada o anno passado, isto é, que averba seja reduzida a 8 contos; este e o sentido da proposta, que não póde deixar de ser approvada pelo Parlamento em presença das circumstancias actuaes, e em presença dos deveres que lhe incumbem durante a gravidade dessas circumstancias.

O Sr. Antunes Pinto. — Sr. Presidente, apezar de ser clerigo, não estou nas circumstancias (como ha pouco disse um illustre Deputado) daquelle que pela sua posição ecclesiastica era forçado a votar pela maneira que tinha votado, contra a proposta. Ainda que sou clerigo nada como da cleresia, nem do orçamento, não podendo por isso ser suspeita a minha opinião, nem pelo lado daquelles que constantemente estão a gritar — come do orçamento — nem pelo lado do illustre Deputado, que suppoz forçada uma opinião por ser ecclesiastico quem a sustentou, e como tal tinha obrigação de pugnar pelos direitos do Eminentissimo Cardeal Patriarcha. Não se dão por consequencia a meu respeito nenhuma dessas considerações, que podiam tornar suspeita a minha opinião. A minha opinião é pois livre, franca e conscienciosa; entendo que é necessario fazer reducções e economias, esse é o voto do povo, esse deve ser o voto de cada um dos Representantes da Nação, mas essas economias devem fazer-se de maneira que o serviço publico não soffra. O parecer da commissão apresenta 12 contos de réis de ordenado ao Patriarcha de Lisboa, e ha uma proposta que pede e exige uma reducção neste ordenado de 4 contos de réis. Os argumentos que se tem trazido a favor desta diminuição reduzem-se a comparar a dignidade do Patriarcha de Lisboa com os grandes funccionario, publicos, a compara-la com outra dignidade ecclesiastica de Portugal, que immediatamente se segue, que é o Arcebispo de Braga; a compara-la com o Arcebispo de Pariz, e até se foi comparar com o ordenado do Pontifice.

Sr. Presidente, se a questão fosse pessoal como o illustre Deputado a quiz fazer, e para isso o auctor da proposta perguntou — o Cardeal Patriarcha não será uma pessoa? — A isto respondo eu: o Cardeal Patriarcha se Lisboa é uma pessoa eminentemente distincta pelas suas virtudes, e pelo seu saber. A questão pois não póde deixar de tomar o caracter de pessoal desde o momento em que o illustre Deputado veio perguntar: se elle era pessoa? Sr. Presidente, questões desta gravidade não se devem tractar senão com muita circumspecção.

Se se tractasse de comparar o Patriarcha de Lisboa com o Arcebispo de Braga Primaz das Hespanhas, se se tractasse de comparar as suas pessoas, cada um de nós que tem conhecimento destes dois distinctos Principes da Igreja os póde considerar iguaes em virtudes; e invoco o testemunho de todos os illustres Deputados que foram discipulos delles na Universidade, creio que estão aqui? condiscipulos meus, e alguns lentes, invoco muitos que foram meus contemporaneos para que digam se quando frequentaram a Universidade, ouviram nunca destes distinctos Prelados a mais pequena asserção que os podesse menoscabar na opinião publica? Pelo contrario; entre estudantes, aonde quasi sempre se levantam calumnias, se póde dizer, contra os caracteres mais distinctos, nunca me chegou aos ouvidos cousa alguma que não fosse em abono do caracter e virtudes delles, nunca se disse cousa alguma em seu desabono; e quando o illustre Deputado quizer saber o conceito em que estão estas pessoas, póde invocar o testemunho de todo o Reino, e verá o que a voz publica diz a respeito destes distinctos Varões.

Se tractassemos da comparação quanto á despeza, por exemplo, entre Lisboa e Braga; serão iguaes as despezas que se fazem em Braga, ás que se fazem em Lisboa? Mudada a residencia do Arcebispo de Braga para Lisboa, por ventura, faria elle aqui as suas despezas com a mesma parcimonia com que as faz em Braga? Fará tanta despeza em Braga como precisaria fazerem Lisboa? Realmente argumentos desta natureza são inteiramente futeis. As dignidades são distinctas; o Arcebispo de Braga é Primaz das Hespanhas, mas o ordenado do Arcebispo de Braga e Primaz das Hespanhas não póde de modo algum ser igualado ao ordenado do Patriarcha de Lisboa.

Quero agora entrar tambem na comparação da dignidade do Patriarcha de Lisboa com a dos primeiros funccionarios publicos, ou do Conselho d'Estado, ou do Supremo Tribunal de Justiça, Porventura tem comparação a despeza que é necessario fazer o Patriarcha de Lisboa com aquella que qualquer desses funccionarios deve fazer? Por ventura o Patriarcha de Lisboa não tem necessidade de sustentar um maior estado? Eu bem sei que nos primeiros seculos da igreja havia mais parcimonia, bem sei que os Apostolos viviam pobres; mas não estamos nesse tempo; desde que a igreja foi levada a uma certa cathegoria, é necessario sustenta-la; desde que se estabeleceram cardeaes, arcebispos, bispos etc. desde que se estabeleceu esta graduação, e gerarchias, que exigem maior somma de despezas, e attribuições, é necessario satisfazer estas despezas. Quando pois se faz a comparação, ella é toda em favor do pensamento que presidiu á commissão, e contra a proposta que se apresentou, isto é, inteiramente contra a reducção. Tambem se trouxe a comparação com o Pontifice, e essa comparação é inteiramente fóra de toda a igualdade; não póde haver, nem vislumbres de comparação. Em primeiro logar eu duvido que o ordenado do Pontifice Romano seja sómente o que se diz, elle como Rei Temporal tem necessidade deter uma Côrte com a decencia devida áquelle logar. E fazem os illusões Deputados idéa dos interesses que a Curia Romana deve fazer em emolumentos? Sabem os illustres Deputados os emolumentos que se alli exigem como esmolas, não só por aquellas graças que dizem respeito a toda a christandade, mas áquelles que se exigem pelas dispensas dos impedimentos matrimoniaes, e outros muitos objectos? Não será tudo isto uma somma immensa? Póde pois comparar-se o ordenado do Patriarcha de Lisboa com os emolumentos da Curia Romana? De certo que não; por consequencia ainda que em Roma o Papa não tivesse ordenado nenhum, bastavam os emolumentos só para -senão podér comparar ao ordenado do Patriarcha de Lisboa. Portanto os argumentos que se trouxeram, nada valem.

Ora a reducção que se fez o anno passado ao ordenado deste distincto Prelado, que é o mesmo que

Página 175

(175)

a commissão propõe este anno, quasi que anniquila a proposta que o illustre Deputado mandou para a Mesa, só com a differença de 400$000 réis; por consequencia ainda olhando por este lado, o parecer da commissão é preferivel ao que se quer fazer.

Tambem se disse que o Patriarcha tem palacios de graça, e quintas; este argumento tambem não colhe; a questão não é essa, a questão é se o Patriarcha póde sustentar a posição em que se acha politica, e ecclesiasticamente com o ordenado diminuto, e insignificante que se lhe quer estabelecer E porventura os illustres Deputados já tiveram em linha de conta as despezas que o Patriarcha tiver necessidade de fazer, quando cumprir com a sua obrigação de visitar o patriarchado? De certo que não; por consequencia de qualquer lado que se olhe a questão, não póde deixar de votar-se a verba que esta no orçamento, e rejeitar-se a proposta; esta é que é a minha opinião.

O Sr. Faria Barbosa — Peço a V. Ex.ª que consulte a Camara se a materia esta discutida.

Decidiu-se affirmativamente por 48 votos contra 18. E pondo-se logo á votação a

Emenda do Sr. Cunha — foi rejeitada por 40 votos contra 19.

Capitulo 2. — approvado por 52 votos contra 10.

O Sr. Xavier da Silva: — Mando para a Mesa seis pareceres da commissão de Fazenda.

O Sr. Presidente: — Aos tres pareceres que concluem por pedir informações ao Governo, dá-se o destino desde já. Os outros tres, que concluem por projectos de lei, mandam-se imprimir. (Transcre-ver-se-hão, quando se discutirem)

Poz-se logo á discussão o

Capitulo 3.º

O Sr. Presidente: — Quando se discutia o capitulo 2.º, o Sr. Ferreira Pontes mandou para a Mesa a seguinte proposta que vai lêr-se.

Não foi admittida por 38 votos contra 27.

O Sr. Passos Pimentel: — Sr. Presidente, muito pouco tenho que dizer, pois confio que os nobres Deputados hão de concordar com o que brevemente vou expor, por isso que é de toda a justiça. Vendo as dotações que vem consignadas para as fabricas das differentes Ses do Reino, não vejo mencionada a Sé do Porto; com isto não quero irrogar censura á illustre commissão, por que de certo ella guiou-se pelo orçamento do anno passado, em que não veio contemplada: não sei o motivo disto; e só sei que quando o anno passado se tractou de dar algumas providencias ao pessoal da Sé do Porto, não instei para que a sua fabrica fosse attendida; porém se o anno passado era reclamada com justiça uma providencia para aquella Cathedral como 2, este anno é como 100. A Camara deve saber que aquella Cathedral não tem 5 réis para a sua fabrica; chega a ponto de os Conegos se cotisarem entre si aos crusados novos, para mandar correr uma telha, e varrer a igreja. Isto é uma verdade, que até os mesmos periodicos da Cidade do Porto o tem dicto com louvores para certos nomes, por que não dizem que é o Cabido inteiro; quando elle é que tem concorrido para aquellas obras. A Camara sabe que a Sé do Porto esta em effectivo serviço; que tem um Bispo que exerce as suas funcções nas quatro festas do anno; que tem as Dignidade, e tem o Cabido quasi completo, e que tem côro como todas as outras Cathedraes: porém o que não tem, é 5 réis para fabrica. Eu dezejo, e quero economias; conheço o estado em que se acha o nosso Thesouro, mas quero tambem a decencia do culto, e não posso prescindir d'esta circumstancia por principio nenhum. Uma nação que professa a Religião Catholica e Apostolica Romana, deve olhar com toda a attenção para a decencia do culto divino; e a Camara de certo não quererá ver o desprezo extraordinario em que esta aquella Cathedral: eu estou fallando diante de Deputados que conhecem isto mesmo. Além disto devemos lembrar-nos que a Sé do Porto ainda esta furada das balas do tempo do Cerco; ainda os buracos das balas se não taparam, e as grades de ferro ainda estão vergadas; e chove-lhe dentro como na rua. Os conegos não teem para a sua decencia, quanto mais para acudir ao edificio. É verdade que a Camara o anno passado dotou os Conegos com 15 mil réis, mas que podem elles fazer com esta quantia? Por tanto eu vou mandar para a Mesa uma proposta; e não sou muito exigente, por que peço apenas uma quantia igual á lançada para a Sé de Braga, que vem a ser de 250 mil réis: e espero que ella tenha o destino que merece.

Leu-se logo na Mesa a seguinte

Emenda. — «Proponho que para a fabrica da Sé do Porto se estabeleça no orçamento uma verba de 250 mil réis annuaes.» — Passos Pimentel.

Foi admittida por 56 votos contra 3.

O Sr. Ministro da Guerra (Sôbre a ordem): — Pedi a palavra para mandar para a Mesa as contas da gerencia da escóla polytechnica no anno de 1847 a 1848; cumprindo assim a minha promessa feita na ultima sessão; e não mando já as contas do anno de 1848 a 1849 por não ser possivel, por isso que o anno não esta ainda completo.

Foram remettidas á commissão de contabilidade.

E continuando a discussão do cap. 3.º disse O Sr. Lacerda (D. José): — Limitar-me-hei a responder ao que o nobre Deputado acaba de dizer, na proposta que apresentou. A commissão resolveu não augmentar verba nenhuma de despeza; e em quanto ao ponto que se tracta, a commissão procedeu devidamente ao exame das informações que existem relativas á necessidade de cada uma das diversas fabricas das Sés do Reino, e guiando — e por estas informações fez a distribuição que se acha aqui lançada.

Relativamente á Sé do Porto não appareceram nenhuns esclarecimentos, nem foram communicados pela secretaria respectiva: e não havendo esclarecimentos nenhuns relativamente a esta, e constando a necessidade das outras Sés, dividiu-se a somma destinada para este fim segundo o conhecimento que havia da situação das fabricas das differentes Sés. Nem a commissão podia fazer esta distribuição doutra maneira. Por consequencia já se vê que não podia dar somma nenhuma para a fabrica da Sé do Porto, por isso mesmo que não lhe constava authenticamente que ella necessitasse dos soccorros que o nobre Deputado acaba de dizer que ella carece. Ora, se a Sé do Porto esta nas circumstancias que o nobre Deputado acaba de referir, devia já ter feito constar a esta Camara essa necessidade; porém os esclarecimentos na secretaria não concordam com as declarações feitas pelo illustre Deputado; e na falla de esclarecimentos sufficientes, em que a commissão

Página 176

(176)

se achava, não podia proceder de modo differente porque procodeu; nem se póde declarar a favor da proposta do nobre Deputado, por que não esta sufficientemente esclarecida para proceder na conformidade do que o nobre Deputado deseja. Se o nobre Deputado apresentar razões que possam esclarecer a commissão e provar a necessidade allegada, para se conceder, em harmonia com a resolução tomada, um subsidio para a fabrica da Sé do Porto, a commissão não terá duvída em aceitar a proposta do illustre Deputado.

O Sr. Pereira dos Reis: — Sr. Presidente, em desempenho d'um dever que não declino, como homem que por força do seu emprego se viu precisado a estudar negocios ecclesiasticos, entrarei brevemente na discussão, que se agita.

Durante este debate (confesso a verdade) tenho-me lembrado d'umas palavras attribuidas ao abbade Mornay, que foi diplomata em Portugal no tempo do Senhor Dom João V. Dizia o abbade: «que o amor da ostentação constituia entre os Portuguezes uma molestia, pelo menos esporádica. Eu diria antes que essa molestia era endemica ou permanente. Não vemos o nosso estado, não considerâmos a decadencia das nossas circumstancia, tudo são projectos grandiosos!

Pois é necessario, Sr. Presidente, que mudemos de rumo; é forçoso reconhecer a verdade da nossa situação, p tractar de vencer as difficuldades, que nos cercam. Só por meio da mais severa economia poderemos evitar a catastrofe que no» ameaça. Tratemos do strictamente indispensavel; verbas de luxo -ão hoje inadmissiveis; deixemos a sancção dellas para tempo mais feliz, (apoiados)

Neste capitulo ha um ponto, que merece a nossa particular attenção, peço que lha prestemos.

A secretaria da Justiça distinguiu-se sempre por um empenho economico, que faz muita honra a todos os homens, que modernamente a dirigiram. Não direi que o Ministro actual se aparta neste ponto dos seus antecessores; mas é certo que o orçamento em discussão nos dá idéa de que os principios economicos, adoptados e seguidos naquella secretaria, acabam de soffrer notavel modificação.

Sr. Presidente, já não ha programmas que prestem. O Ministerio, que nos governa prometteu ser economico. Mas como vai elle satisfazendo a sua promessa? Augmentando a despeza publica, exacerbando verbas, que haviam sido reduzidas, e provido empregos desnecessarios. Já não ponho fé em programmas, torno a dizer. Programma é mentira, são palavras synonimas Estou farto de ver desmentidas na pratica as promessas mais solemnes dos nossos homens de Estado: se apparece um ou outro, que resiste aos desperdicios, e que vê o precario das nossas circumstancias, move-se-lhe desde logo uma guerra incessante, que o mala em breves dias.

Sr. Presidente, pois o apuro do Thesouro permittia por ventura que o Ministerio se lembrasse agora de nomear novos bispos?... Será este facto acreditavel para quem conhece a miseria, que nos assola?

Em 1842 pediu o Governo auctorisação para supprimir algumas dioceses, e govêrnos civis. Se esta providencia, Sr. Presidente, era então necessaria como dez, é hoje precisa como cem.

As novas nomeações eram dispensaveis em todo o tempo: hoje são altamente condemnaveis, porque o Thesouro não as comporta, e o serviço da Religião, e do Estado não as exige. Francamente fallando, direi que me parece excessivo o numero actual das dioceses; algumas estão clamando por uma suppressão ou annexação immediata. Que significa um bispado com 50 parochias? Para que serve outro, por assim dizer, encerrado n'uma praça de guerra? Como se sustentam alguns que até carecem de igreja Cathedral?... (apoiados)

Estas verdades, Sr. Presidente, são geralmente conhecidas; sabe-as, tambem como eu, o Ministerio actual, mas que importa sabel-as? Lá vem o nepotismo, que o céga, e o obriga a sair do verdadeiro caminho!

Sr. Presidente, somos condemnados de importunos, e de menos generosos os homens que impugnâmos as larguezas do orçamento. Descobriu-se agora o meio de nos tornar odiosos; diz-se que descemos a discussões pessoaes e portanto inconvenientes, e mesquinhas. Esta pertensão é miseravel. Não merece discussão seria. Em outra parte, não a deixaria eu sem resposta. Como querem os rabulas, que sustentam similhante opinião, que tratando-se aqui exclusivamente de pessoas, ponhamos de lado as pessoas?... (apoiados)

Pela minha parte, declaro que sou indifferente ás injurias, que com este motivo se me lançam. Onde eu encontrar abuso, desigualdade, ou injustiça, creiam que não hei de ficar silencioso. Estou disposto a correr com todas as difficuldades do meu mandato.

Sr. Presidente, firme neste principio, vou impugnar uma verba, que figura no presente capitulo. Entendo dar nisto um documento de independencia, que podem avaliar como lhes approuver. A verba diz respeito a um collega nosso, a um amigo meu, cujas qualidades respeito, como devo.

Parece-me que não póde conservar-se o subsidio de 2:400$000 réis annuaes aos Bispos Eleitos. A obrigação, em que o Thesouro Publico se constituiu para com elles, é nova, e não assenta em disposição legal Este subsidio já no anno passado foi reduzido a metade; e creio que assim convirá ficar. As circumstancias actuaes, em relação ás do anno preterito, não justificam, antes condemnam, a restituição que apparece no orçamento

Tractando de Bispos Eleitos, seja-me permittido insistir n'uma pergunta, que já dirigi aos Srs. Ministros, e que hei de desenvolver em occasião mais opportuna: é uma simples digressão, em que prometto não absorver muito tempo.

Que diligencias tem o Ministerio empregado para a confirmação dos Bispos Eleitos? Quaes são os obstaculos, que se oppõem a essa confirmação? Prevalecem ainda Os pretextos de que a Côrte de Roma se serviu para invalidar as nomeações de Sua Magestade a Rainha? Ficaremos assim eternamente?...

Um desses Bispos Eleitos, varão dignissimo por letras e virtudes, já morreu cortado de desgostos, victima do enredo mais atroz, e mais torpe de que ha noticia. O Governo nunca tomou (digo-o com vergonha) nunca tomou a respeito delle a posição que lhe cumpria, (sensação, apoiados) Os outros Bispos Eleitos conservam-se n'uma expectativa, que deshonra indelevelmente o Ministerio Portuguez, hoje curvado ás exigencias mais absurdas... Não as admiro, Sr. Presidente, nem me espanto de as ver obedecidas. Depois que ouvi, em pleno Parlamento, que a exis-

Página 177

(177)

tenete do tribunal da Legacia nestes reinos constituia um dogma (dogma que não observamos por espaço de dezeseis seculos) estou aparelhado para tudo. Tal opinião, Sr. Presidente, se alguem ousasse aventural-a na reinado do proprio Affonso V. não ficaria sem a devida conecção... Hoje póde dizer-se tudo!. Uma das melhores obras do Duque de Bragança — o decreto que extinguiu o tribunal da Legacia — é publicamente apodado de contrario ao dogma!

Temos retrocedido muito, Sr. Presidente, em relação á Côrte de Roma, carecemos totalmente de vontade. Querendo ella, é quanto basta! O Governo sabe, porque o sabe o Mundo inteiro, que Sua Sanctidade mandou ultimamente convocar um Concilio em Hong-Kong, para resolver a grande questão do padroado da India; e não ignora que deste concilio foram excluidos os prelados portuguezes. E que obra a este respeito o nosso Ministerio? Manda retirar da India o Arcebispo de Gôa para tornar mais facil a usurpação, que se projecta! Custa a crer o que estamos vendo; parece mythologica tanta inacção ou tanta subserviencia; porém os factos ahi estão; e, á vista delles, não ha logar para duvidas!... Vou entrar de novo na questão, que mais particularmente nos occupa.

Ha neste capitulo, Sr. Presidente, uma notavel desigualdade a respeito dos vencimentos dos vigarios capitulares e vigarios geraes. Observa-se que uns vencem 1:000$000 réis annual, e outros 200$000 réis; sem que a respeito de todos haja differença substancial de cathegoria ou de attribuições, graças á nova disciplina, adoptada entre nó, desde a visita que nos fez Monsenhor Capaccini. É verdade não sei a razão, porque auctoridades, iguaes hão de ser retribuidas diversamente, e n'uma desproporção, tão extraordinaria como e a que vai de duzentos mil réis a um conto de réis. Tomara que me expliquem o fundamento de tamanha differença.

Admirei que se pozesse em duvida a exactidão da lista civil, em que fallou um illustre deputado pelo Algarve, e que diz respeito ao Pontifice Pio IX. E maravilhei-me de que se dissesse que sua Sanctidade recebia emolumentos. Quem isto asseverou, dá a conhecer que não tem uma só idéa da organisação financeira dos Estados Pontificios. O Papa recebe 40 mil francos para sua sustentação, e nada mais. Este facto andou ahi em todos os jornaes; e creio (se não me engano) que vem confirmado no Almanack de Gotha de 1348. A recepção de emolumentos, attribuida ao Pontifice, implica para elle uma injuria, que póde equivocar-se com a imputação de symonia. (O Sr. Silva Cabral. É verdade.)

Sr. Presidente, parecem-me tão incontroversos os fundamentos, com que impugnei este capitulo, que me não demoro em dissertar mais largamente a favor delle. Vou mandar para a Mesa duas propostas. A Camara faça o que entender; eu desempenhei a minha obrigação (apoiados)

Leram-se logo na Mesa as seguintes:

Emendas. — 1.ª «Proponho que o ordenado aos Bispos Eleitos seja reduzido no Continente a 1:200$ réis. «

2.ª Proponho que o ordenado aos vigarios geraes e capitulares, que não forem Bispos Eleitos, seja reduzido á quota de 200$000 réis annuaes.?; — Pereira dos Reis.

Foram admittidas por 50 votos contra 8.

O Sr. Antunes Pinto: — Sr. Presidente, o primeiro Deputado que encetou a discussão sobre este capitulo, e que mandou para a Mesa a primeira proposta, isto é, a proposta para se augmentar o subsidio para a fabrica da Se do Porto fez uma exposição do estado em que se acha a Sé daquella cidade, exposição que acredito em toda a sua extensão, porque estou convencido de que um Deputado quando entra nesta Casa, não tem desejo, principalmente quando se tracta de factos, senão de dizer só e unicamente o que é verdade: cada um póde ter uma opinião errada sobre qualquer questão, mas quando se tracta de factos que se apresentam, é necessario que elles sejam conformes com a verdade. Acreditando por consequencia inteiramente na exposição do auctor da proposta, voto por ella, porque certamente no estado em que se acha a Sé do Porto, entrando-lhe a chuva por toda a parte, sendo necessario para os pequenos reparos os auxilios dos conegos, sendo além disso incontestavel que cada um desses conegos o que tem, é apenas um subsidio de 15$000 réis por mez, é da maior evidencia que se deve votar por esta proposta.

Sr. Presidente, a Carta Constitucional estabelece que a Religião do Estado seja a Católica, Apostolica, Romana: é necessario pois que o Estado concorra com todas as despezas que são necessarias para que esta Religião seja conservada e mantida; mas quando se tracta de propor reducções como aquellas que acaba de propor o nobre Deputado que me precedeu, que são nas congruas dos vigarios capitulares, e dos vigarios geraes, parece-me que não selem muito em vista este principio, e o que mais me admirou, foi que saisse esta proposta de um illustre Deputado, que foi um chefe ião distincto na repartição da Justiça, e que sabe perfeitamente o que é necessario para o estado ecclesiastsco. A respeito de S. Ex.ª já se tem dicto hoje bastante, sou eu o primeiro a dar testimunho dos seus bons serviços, a dar testimunho do muito que merece, S. Ex.ª sabe que eu sou seu amigo, e é por essa consideração que ha pouco votei affirmativamente em uma votação que lhe dizia respeito; faço justiça e dou testimunho ao seu saber em materias ecclesiasticas, e faço justiça ás suas opiniões conscienciosas; mas parece-me que com a sua proposta deslisa muito daquelles conhecimentos que tem a respeito do estado ecclesiastico; parece-me que esquece a necessidade que ha de que o estado ecclesiastico seja mantido e conservado. Eu não quero que o clero viva em luxo e em grandeza, mas tambem é necessario que se lhe dê o que é indispensavel para a sua subsistencia.

O nobre Deputado sabe muito bem a differença que ha entre um vigario capitular, e um vigario geral; mas disse o nobre Deputado, o vigario capitular póde ser vigario geral, e por consequencia póde ter emolumentos, essa grande riqueza de que um bispo esta privado. O nobre Deputado se fizesse uma comparação entre o que é o clero de hoje, e o que era em outro tempo, no tempo antigo em que tinha muita jurisdicção temporal, em que tinha dizimos e outras muitas cousas, em que o clero era rico, veria que hoje não se póde dizer isso; pelo contrario, S. Ex.ª sabe muito bem que a jurisdicção do clero se reduz ao meramente espiritual, e que os seus rendimentos são modicos e insignificantes. Quer saber o

Página 178

(178)

nobre Deputado o que eu tive de emolumento no espaço de 2 annos, em que fui vigario capitular em Leiria? Não chegou a 10 moedas, talvez me não acredite, mas é a verdade: aqui tem a grande riqueza que vem dos emolumentos ecclesiasticos; e por consequencia reduza-se um vigario capitular ao ordenado de 200$000 réis, porque póde ter essa abundancia, e essa riqueza!... Por estas razões é que não posso de maneira nenhuma votar pela proposta do nobre Deputado relativamente ás reducções.

A respeito de um bispo eleito sabe muito bem o nobre Deputado que elle já esta em outra cathegoria, e por consequencia que precisa mais alguma receita para supprir as suas despezas, já não é simples clerigo como e um vigario capitular.

Por consequencia e de justiça que sejam conservadas e mantidas estas verbas, como se acham no orçamento.

Por esta occasião direi duas palavras a respeito da fabrica da Sé de Lisboa. O orçamento contem para a fabrica da Se de Lisboa 2:500$000 réis. (O Sr. Xavier da Silva: — Não é nada).

O Orador: — Nisto refiro-me a alguma cousa que ouvi daquelle lado (o esquerdo) parece-me que ao Sr. Deputado Ferreira Pontes; mas desta quantia tiram-se 700$000 réis para a musica instrumental, e fica só 1:800$000 réis. Esta quantia de 1;800$0000 estou convencido de que não é excessiva, ella tem applicação para tudo o que é necessario quanto a aviamentos, e estes aviamentos póde acontecer muitas vezes que importem n'um conto de réis, mais ou menos: além disso tem applicação para concertos que é necessario fazer, roupas lavadas e outras despezas miudas, cuja importancia é incerta. Ora eu fallo neste objecto para fazer

uma recommendação ao Sr. Ministro da Justiça, eu estou certo do zêlo de S. Ex.ª por tudo quanto respeita aos negocios da sua repartição, mas consta-me que a respeito destes 1:800$000 réis, que vai para as mãos do cabido (Eu devo tambem dar testimunho a respeito das pessoas que compõe o cabido, que todas tenho na melhor reputação, são pessoas de muita probidade e honra), que o cabido tem exigido contas á pessoa que se encarrega desta quantia, e que ella sentem negado a prestadas (O Sr. Silva Cabral: — E falso), e nós temos obrigação de zelar o dinheiro da nação. Eu quero dar occasião a que os nobres Deputados me dêem sobre isto explicações, porque posso estar illudido, mas a verdade é que alguem que eu supponho estar perfeitamente informado, me disse o que acabo de expor, e eu não vinha aqui dizer uma cousa, senão tivesse a certeza de que assim era. Mas só trouxe este facto para representar ao nobre Ministro que exigisse que o cabido tivesse um cofre, aonde os sobejos que crescessem daquella quantia que se vota cada anno, ficassem reservados para as despezas extraordinarias. Era esta a recommendação que eu tinha a fazer.

Senão tivesse dado a hora, eu tinha muitas cousas a dizer relativamente ao que disse o nobre Deputado; e então peço a V. Ex.ª que me conserve a palavra para ámanhã,

O Sr. Presidente: — A. ordem do dia para ámanhã é a continuação da discussão do orçamento. Está levantada a sessão. — Eram cinco horas da tarde.

O 1. Redactor,

J. B. GASTÃO.

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×